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A PRÉ-HISTÓRIA

Saudações

Olá, honorável estudante. Tudo bem contigo? Como tem passado esse período de isolamento? Tá osso

pra todo mundo, mas nós do Base estamos fazendo nossos esforços para auxiliar você naquilo que nós

podemos e não deixar você sem conteúdo para que, findada essa crise, possamos tocar em frente. Como diria

o nosso Aldir Blanc: “O show tem que continuar”.

O tema da aula de hoje é pré-história. Esse é um assunto muito complexo, já que abarca a maior parte

da existência humana aqui na terra e é o que menos temos informações. Interessante é que você aborde as

questões ligadas à evolução com seus professores de biologia, pois eles te darão uma visão muito mais ampla

e precisa dos processos de adaptação e transmissão genética. Lembre-se, os vestibulares pedem de você um

conhecimento que integre diversas áreas, portanto toda interdisciplinaridade é imprescindível, não só para que

você tenha sucesso nas avaliações, mas para ter uma boa leitura do mundo. Beleza?

Agora, simbora pra aula.

1. Problemas

a) O termo pré (antes) História

Termos sempre são difíceis nas ciências humanas exatamente pelo seu teor generalizante1 e pela

diversidade das experiências humanas. É como se a gente pegasse um monte de coisa diferente e colocasse

tudo em um mesmo “balaio de gatos” e dissesse, “É isso”. E quando tu pega períodos históricos longos é que

dá mais um nó na cabeça da pessoa, pois estamos falando de 70 mil anos. O Egito há 3000 anos era politeísta

e construiu as pirâmides, no começo da antiguidade tardia era de cristãos coptas e hoje é um país de maioria

muçulmana. Isso com “apenas” 5mil anos de história. Olha como mudou.

No caso da pré-história ou Prehistória, esse termo foi cunhado pela escola positivista, que considerava

como Documento Histórico apenas documentos oficiais ESCRITOS, por entender que só era História aquilo

que podia ser narrado. Esses artefatos deixados pelos seres humanos antes do advento da escrita, evidenciavam

a ação humana no tempo, mas como não tinha o documento que narrava como era a vida dessas pessoas, então,

a gente diz que foi “antes da história”, ou seja, “antes da escrita”. 2Os historiadores atuais rejeitam essa

visão, mas como o termo já tá aí há muito tempo, ficou.

Isso nos leva a um segundo problema.

b) A “documentação”, os resquícios.

Beleza, professor, entendi que não tinha escrita e tal. Mas então como é que podemos saber como essas

pessoas viveram? E como construir narrativas confiáveis a respeito desse período.

A resposta é: analisando os indícios, resquícios que eles deixaram. Isto é, as ferramentas, os

sepultamentos, as pinturas rupestres etc. Mas não somente isso. É preciso juntar esses dados a outros que

envolvem análises climáticas, resquícios de fauna (os animais que vivem em um ecossistema), a flora (as

plantas de um ecossistema), porque isso nos dá mais informações do regime alimentar dessas sociedades.

Outro método importante de análise é a comparação com sociedades caçadoras e coletoras atuais.

Lembremos que durante muito tempo fomos caçadores e coletores e que essas sociedades que ainda subsistem

dessa forma nos dão indícios de como era a organização social desses grupos. Outra utilidade desse método é

a partir da análise dos mitos que são transmitidos de geração em geração há milhares de anos.

1 Que parte de generalizações, tomando por foco as semelhanças em detrimento das diferenças – p.ex: chamar de religiões animistas

o Candomblé e o neopaganismo nórdico. Ambas são completamente diferentes, mas consideram sagradas certas forças da natureza. 2 A tendência atual é classificar os artefatos em Culturas e grupos.

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Figura 1 Homem leão de Stadel. c. 30 mil anos atrás.

OBS: É claro que é impossível termos uma representação fiel ao que foram essas sociedades, o que

temos são indícios, aproximações.

Veja essa imagem:

c) Os demais hominídeos.3

Aqui vai um questionamento importante. Sabemos que ao

longo das eras e do processo evolutivo muitas espécies de uma

mesma família conviveram: umas estão aí até agora, e outras foram

extintas. A nossa espécie também conviveu com outros seres

humanos de espécies diferentes, mas de mesmo gênero, o gênero

Homo (Homo erectus, Homo habilis, Homo neandertalensis e Homo

Sapiens). Todas essas espécies são do gênero humano, compartilham

de uma semelhança genética e deixaram resquícios materiais como:

produção de ferramentas sofisticadas, sepultamentos, uso de

fogueiras etc. Será que devemos contar a história deles como a nossa

também?

Outras perguntas que ficam no ar são? Por que as demais

espécies humanas foram extintas? Elas se reproduziram entre si?

Geraram descendentes férteis – que podem ter filhos? E infelizmente

para essas perguntas temos pouquíssimas respostas claras. Muito do

que sabemos dessas espécies vem de fósseis incompletos e escassos.

3 Independente da fé que você professa, a evolução e o processo de adaptação das espécies é um consenso científico. O ENEM e os

vestibulares vão te cobrar isso, portanto saiba separar as coisas.

O que podemos deduzir

com esta obra?

A obra O Homem-leão de Stadel

representa um alguém que, ou

tem uma máscara de leão, ou tem

a cabeça de leão. Foi esculpida

em marfim e é datada em mais

de 30 mil anos.

A obra pode nos evidencia que

nessa época já havia uma

percepção artística e pessoas que

se especializavam nisso, muito

provavelmente por uma prática

religiosa, talvez ele fosse um

xamã ou um espírito guardião.

Obras de arte evidenciam um

pensamento abstrato.

Gênero e Espécie.

Espécies: São indivíduos que em

condições naturais podem acasalar

entre si e produzir descendentes

férteis – que podem ter filhos.

Gênero: São as famílias, são

espécies que descendem de um

ancestral comum, mas que

seguiram se separaram

evolutivamente. Exemplo: Cavalo e

burro são da família dos equinos,

mas são de espécies diferentes. Se

ambos cruzarem não geram

descendentes férteis, como a Mula.

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Por exemplo, descobriram que 5% de DNA neandertal nos Homo Sapiens atuais, através de exames

laboratoriais. Ou seja, houveram incursões sexuais entre esses hominídeos, mas não pode se dizer se foi uma

prática generalizada, vista a pequena parcela que em nossa estrutura genética.

Entretanto essas perguntas são importantes para ver os caminhos evolutivos que passamos e a forma

com que “dominamos o mundo”. Infelizmente o Homo sapiens é o maior predador da história natural – somos

tão predadores que podemos levar à nossa própria extinção, como já temos levado milhares de espécies

animais e vegetais. Como disse o historiador Yuval Harari:

Imagine o que poderia ter acontecido se os neandertais ou denisovanos tivessem sobrevivido ao

lado do Homo sapiens. Que tipos de cultura, sociedade e estrutura política teriam surgido em um mundo

em que várias espécies humanas diferentes coexistissem? Como, por exemplo, as fés religiosas teriam se

desenvolvido? O livro do Gênesis teria declarado que os neandertais descenderam de Adão e Eva, Jesus

teria morrido pelos pecados dos denisovanos, e o Corão teria reservado lugares no Paraíso para todos os

humanos corretos, independentemente da espécie? Os neandertais teriam recebido um lugar no sistema de

castas hindu, ou na vasta burocracia da China imperial? A Declaração da Independência dos Estados

Unidos teria considerado como uma verdade evidente que todos os membros do gênero Homo foram

criados iguais? Karl Marx teria instado os trabalhadores de todas as espécies a se unirem?

(HARARI, Yuval Noah. Sapiens – Uma breve história da humanidade; tradução Janaína

Marcoantonio – Porto Alegre, RS: L&PM, 2018)

2. Periodização

A divisão histórica mais comum divide a pré-história em dois períodos: Paleolítico e Neolítico. Há

outras divisões, colocando no meio o Mesolítico, porém a mais comum é a binária mesmo. Essa divisão toma

por base o tipo de tecnologia usado em cada período, pelas evidências materiais deixadas.

a) Paleolítico

Também conhecido como Idade da pedra velha ou da pedra lascada. Basicamente toma como ponto

de partida o surgimento dos hominídeos e até a sedentarização dos Homo Sapiens. As sociedades se

caracterizavam por serem grupos nômades e caçadoras e coletoras. Produziam ferramentas rudimentares, a

partir do homo habilis, e o domínio do fogo. Esse é o nosso plano de fundo, aprendam isso.

Apesar de parecer pouco coisa, é neste período que vemos as características que fizeram dos seres

humanos os maiores predadores do planeta – Eu sei que parece cruel, mas é isso mesmo. E aqui nós vamos

estuda-las e problematiza-las um pouco.

• A Teoria da Evolução das espécies.

O ser humano é uma espécie, o ser humano também evolui.

A primeira coisa que você, honorável estudante precisa aprender para nortear seu entendimento sobre

este assunto é:

A TEORIA NÃO DIZ

!!!!NÃO DIZ!!!! QUE OS SERES HUMANOS

VIERAM DO MACACO

Uma das grandes polêmicas envolvendo essa teoria é a profunda carga semântica que ela nos impõe.

Explico melhor. Há muito tempo nós, seres humanos, achávamos que éramos o centro do Universo; que nós

estávamos na Terra para possuí-la e domá-la, juntamente com toda a vida animal e vegetal. Éramos a Elite da

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criação. E era exatamente porque éramos lindos, sensuais e gostosos que a

Terra ficava no meio do Universo e o Sol girava ao redor dela, por causa da

gente. Se você se lembrar do Renascimento e da Revolução técnico-

científica, vai ver que Galileu quase ia pro saco por dizer que era a Terra que

girava ao redor do Sol, porque isso tirava um pouco da nossa centralidade

na criação. Se dizer isso já deu o que falar, imagina dizer que o Ser Humano

é só mais uma espécie animal entre as outras? E mais, dizer que, pelas

semelhanças morfológicas, nós somos aparentados a primatas como Gorilas,

Bonobos e Chipanzés, a ponto de deduzir, a partir daí que podemos ter um

ancestral comum! Para uma mente ocidental herdeira da cultura judaico-

cristã [e islâmica também] que tem no Criacionismo a sua base de

compreensão do mundo, isso até hoje soa mal.

E a isso somemos a falta de critérios técnicos para entender a teoria

que levou as pessoas a reduzirem a frase: “Os grandes primatas

compartilham de muitas semelhanças genéticas com os seres humanos, o

que nos leva a crer que num passado distante eles tiveram um ancestral em

comum, mas que depois, seguiram linhas evolutivas diferentes” para “o

homem veio do macaco”. O nome disso é reducionismo. CUIDADO!

• A Evolução humana.

O que é Evolução

Bem, resumindo em

uma única frase

podemos dizer que:

Evolui quem melhor

se adapta.

Evolução basicamente

é uma mudança

genética e morfológica

provinda de um

processo de adaptação.

Por exemplo: girafas

com pescoços maiores

conseguem pegar mais

frutas do que aquelas

com pescoços menores,

as mais bem

alimentadas

sobreviviam mais e as

outras morriam, com o

tempo os descendentes

foram herdando essa

característica e

possuindo pescoço

maiores. Isso é

evolução.

Muitas linhas evolutivas

Observe bem a imagem ao lado.

Percebem que ao invés de uma

linha reta, a gente tem várias linhas,

e que algumas duraram muito,

outras menos? Isso ocorre porque

não existiu essa coisa de que uma

espécie humanoide gerou a

seguinte, o Homo erectus não é pai

dos neandertais, e os neandertais os

nossos. Cada um era uma espécie

separada da outra. Acontece que

essas espécies se extinguiram e só

sobramos nós, a última espécie do

gênero Homo.

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O nosso processo evolutivo, portanto, também resultou de um processo de adaptação. O que levou a

esse processo e como ocorreu essa mudança ainda é um mistério para os pesquisadores. O que se sabe é que

em um determinado momento da história surgiu uma espécie de primata bípede4 e que passava a maior parte

do tempo no chão e não em árvores. Essa característica foi sendo passada ao longo das gerações de processos

evolutivos, de maneira que o gênero Homo é totalmente bípede. Esses primatas também começaram a

adquirir hábitos alimentares diferentes dos seus parentes, principalmente pelo consumo de carne. A

alimentação, é claro, trouxe mudanças bioquímicas que foram sendo passadas pra frente, mas isso a gente vê

daqui a pouco. Outra coisa importante a se perceber é que o bipedismo deixou os membros superiores livres

para exercerem outras tarefas; uma das mais importantes foi o melhor manuseio de matérias, o que permitiu

futuramente a fabricação de ferramentas. Outra característica importante dos Hominídeos era que eles

possuíam cérebros maiores que os demais primatas, ou seja, mais inteligentes que os demais, o que certamente

favoreceu no processo de adaptação e de distribuição das espécies humanas. Em resumo:

Mas há outra característica muito importante sem a qual até hoje não podemos sobreviver: Os seres

humanos são animais sociais. Não existe possibilidade de um ser humano sobreviver sem estar inserido em

um meio social. Ao contrário de muitas outras espécies, onde os recém nascidos já podem se locomover e

procurar seu próprio alimento, um bebê humano deixado por si só falece em questão de horas. E isso é muito

importante porque boa parte do nosso processo evolutivo provém dessa característica, inclusive na forma com

que os seres humanos se alimentam.

Cozinheiros

A partir do Homo Erectus (observe a imagem acima), os hominídeos passaram a manipular o fogo, o

que significou não somente um ganho na defesa contra predadores e uma forma de se aquecer, mas a

possibilidade de cozinhar os animais abatidos. E tá aí uma coisa que só a gente faz: Nós somos a única espécie

que cozinha. Segundo o antropólogo Levi-Strauss, cozinhar pode ser tomado como uma metáfora de sair do

estado natural para o estado cultural. E cozinhar também é um ato social, não é à toa que até hoje toda

celebração gira em torno de comer e beber. Por outro lado, ninguém nasce sabendo cozinhar, porém o

organismo humano não sobreviveria sem o consumo de comida cozida, ou seja, cozinhar está em nosso DNA.

E por quê? No seu livro Cozinha: uma história natural de transformações, Michael Pollan explica:

Se nossos ancestrais proto-humanos não tivessem controlado o fogo e o utilizado para preparar

sua comida, jamais teriam evoluído até chegar à condição de Homo sapiens. Pensamos no ato de cozinhar

como uma inovação cultural que nos eleva a um plano acima da natureza, como uma manifestação de

transcendência humana. Porém a realidade é muito mais interessante: a capacidade de cozinhar está agora,

de certa forma, fundida na nossa biologia, e não temos outra opção a não ser usá-la se quisermos alimentar

nossos cérebros grandes, ávidos por energia. Para a nossa espécie, cozinhar não significa se afastar da

natureza — é parte da nossa natureza, e a esta altura é algo tão inevitável quanto o impulso que os pássaros

têm de construir ninhos.

Submeter o alimento ao calor do fogo o transforma de várias maneiras — algumas de natureza

química, outras de natureza física —, mas todas com o mesmo resultado: disponibilizar mais energia para

as criaturas que o ingerem. A exposição ao calor desnatura as proteínas — desdobrando suas estruturas em

forma de origami de modo a expor uma maior área à ação de nossas enzimas digestivas. Com tempo, o

calor também transforma o resistente colágeno dos tecidos conjuntivos dos músculos numa gelatina macia,

facilmente digerível. No caso dos alimentos de origem vegetal, o fogo gelatiniza os amidos, primeiro passo

para quebrá-los em açúcares simples. Muitas plantas que são tóxicas quando ingeridas cruas, incluindo

tubérculos como a mandioca, tornam-se inofensivas e mais nutritivas se submetidas ao calor. Outros

4 Que se locomove sobre “duas pernas”.

As espécies humanas se caracterizavam pelo

bipedismo, fabricação de ferramentas e pela

alimentação onívora – comiam de tudo, inclusive carne.

Essas espécies também apresentavam um cérebro

maior que os demais primatas.

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alimentos são purificados no cozimento pelo fogo, que queima bactérias e parasitas; ele também retarda a

deterioração da carne. Cozinhar melhora tanto a textura como o sabor, deixando alguns alimentos mais

tenros, outros mais doces ou menos amargos.

E Yuval Noah Harari completa:

O advento do hábito de cozinhar possibilitou aos humanos comer mais tipos de comida, dedicar

menos tempo à alimentação e se virar com dentes menores e intestino mais curto. Alguns estudiosos

acreditam que existe uma relação direta entre o advento do hábito de cozinhar, o encurtamento do trato

intestinal e o crescimento do cérebro humano. Considerando que tanto um intestino longo quanto um

cérebro grande consomem muita energia, é difícil ter os dois ao mesmo tempo. Ao encurtar o intestino e

reduzir seu consumo de energia, o hábito de cozinhar inadvertidamente abriu caminho para o cérebro

enorme dos neandertais e dos sapiens.

Perceba, portanto que os rumos genéticos de nossa evolução também foram influenciados por hábitos

culturais e que foram exatamente estes que aprimoraram nosso cérebro e nosso intelecto. O fato da gente

cozinhar criou elo social forte, tanto é que até hoje grandes celebrações tem que ter aquele banquete. Não é à

toa que todas as religiões carregam uma espiritualidade dos alimentos – sacrifícios, manjares, jejuns pra depois

“cair matando”.5

Fofoqueiros

A partir de um determinado momento da nossa história passamos a desenvolver uma linguagem

complexa. Isso não quer dizer que outros animais não possuam linguagem, basta só você ver seus gatos

“namorando” no telhado pra lembrar. Porém os seres humanos são os únicos que possuem a capacidade de

codificar a realidade e significa-la. Falei difícil, não é? Vou lhe dar um exemplo: Um leão não chegaria pra

leoa dizendo “teu andado gracioso e teu rugido feroz, são o motivo para que eu desperte todas as manhãs”.

Muito menos faria uma declaração de amor. E o que é o amor, hein? Para os animais a reprodução é algo

meramente instintivo, e o sexo também; no máximo é uma demonstração de poder do macho alfa que acasala

com todas as fêmeas para fortalecer o bando. Já nós acreditamos no amor, vemos as relações de afeto para

além do “fazer um baby”, inclusive dizemos que há outros tipos de amor [os gregos acreditavam em quatro].6

Resumindo, se o seu gato ou cachorro falasse ele diria coisas como: “Comida, passear, me acaricie”, mas não

saberia dizer “Fome, diversão, amor”. Esse tipo de linguagem que enuncia coisas que não existem, de fato, no

mundo material é algo exclusivamente nosso.

E por que isso foi importante?

5Mas pro, o que isso tem a ver com o ENEM? Se a banca te perguntar sobre a importância da Cultura na sociedade, falar sobre

Cozinhar pode ser um bom caminho. Nesse assunto você envolve antropologia, bioquímica e sociologia... olha aí!!! 6Gente, é claro que há muito instinto dentro da gente ainda, Freud já demonstrou bem isso, mas uma das características nossas como

animais culturais é que nós podemos, pelo menos assim esperamos, domar esses instintos.

Com o domínio do fogo, os

seres humanos descobriram a

habilidade de cozinhar. E esse

ato é visto por muitos

antropólogos como a

passagem do estado natural

para o estado cultural.

Cozinhar nos humanizou e nos

separou cada vez mais dos

outros animais, além de

solidificar nossos vínculos

sociais.

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Porque nos permitiu transmitir hábitos, informações, costumes e técnicas. O ser humano pode ser um

bicho sabido, mas nasce sem saber que sabe. Essas coisas ele vai aprendendo ao longo da vida e aprende

através da linguagem. E é exatamente ela que permite que formemos bandos muito maiores do que qualquer

espécie por livre e espontânea vontade e que cooperemos com outros bandos – guerreemos com eles. Para

além das formigas e abelhas, os bandos nos mamíferos não passam de 50 indivíduos, ao passo que os Chineses

são um bilhão de habitantes que se sentem chineses porque compartilham de uma identidade comum. O leão

pode ser o rei da Savana, mas ele não tem família real. Quem acredita nisso é a gente e é por causa de a gente

acreditar nisso juntos que nos agrupamos e nos defendemos. Nas sociedades pré-históricas o elo de ligação

poderia ser um espírito-guardião, um antepassado heroico.

Sem falar que a principal função da nossa linguagem é: FALAR MAL DA VIDA DOS OUTROS.

Honorável estudante, a gente só elege lideranças, só esculhamba político, só xinga torcida rival porque a gente

fofoca. A Revolução francesa começou quando alguém chamou Luis XVI de “fi dua égua” e espalhou pra

geral. Nós só estabelecemos relações de confiança porque existem as “falcianes” que a gente quer evitar. É

isso que junta e é isso que espalha. E isso só é possível graças a linguagem complexa desenvolvida pelos

nossos antepassados.

E é exatamente aí que a história humana passa a ser estudada não mais pelas mudanças no nosso DNA,

mas pela sua historicidade. Ou seja, nosso DNA é igualzinho ao dos “homens das cavernas”. As mudanças

que há, existem porque em algum momento, as sociedades mudaram e mudaram porque de repente começaram

a acreditar em outras coisas e deixaram de crer em outras. E isso não é DNA, é História.

Resumo do que foi visto até aqui.

• O período paleolítico é o maior período da história humana e o menos documentado

• As sociedades eram caçadoras e coletoras.

• Nesse período vimos as mudanças evolutivas e culturais que possibilitaram nosso sucesso.

• A Evolução humana não diz que o homem “veio do macaco”

• Os seres humanos atuais são uma, e a única, de muitas linhas evolutivas dos hominídeos.

• Somos animais sociais

• Somos animais que cozinham

• Somos animais que falam e que contam histórias e isso possibilitou uma maior cooperação

entre os indivíduos.

• A pré-história não se resume a só ser caçadores e coletores.

O feiticeiro. Pintura Rupestre

de aproximadamente 13 mil

anos. Nela vemos um ser com

pernas e mãos humanas, mas

com a cabeça de animal.

Provavelmente um xamã ou

espírito guardião.

Quando os seres humanos

passam a contar histórias,

mitos, fábulas, lembranças,

eles estão superando o

genoma, estão dizendo: Eu

não sou apenas algo, eu sou

alguém. A consciência mítica

foi a nossa primeira forma de

nos localizarmos no cosmos.

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b) Neolítico

Também conhecido como Idade da pedra nova. É o período marcado pelo surgimento da agricultura,

pecuária, da cerâmica e dos primeiros ajuntamentos urbanos, culminando, também na idade dos metais. É a

época que marca a transição da pré-história para a história.

• A revolução agrícola

Revolução é um conceito bastante questionável, porque ele pressupõe uma transformação rápida e

repentina da sociedade a partir de um acontecimento marcante. Em resumo, podemos chamar revolução aquele

marco histórico pelo qual, a partir dele, a sociedade começou a mudar. No caso das sociedades pré-históricas

existe, de fato, uma mudança lenta e gradual de caçadoras e coletoras para sociedades agrícolas ou

agropecuárias. E isso se deu em torno de 10 mil anos atrás. As evidências arqueológicas começaram a perceber

assentamentos mais duradouros e um maior número de sepultamentos, o que claramente indicou uma fixação

das pessoas naquele lugar. E a pergunta é: Por que eles se demoraram mais nos locais onde estavam? Uma das

respostas é por possuírem uma oferta maior de alimentos que lhes permitisse permanecer ali. Alimentos que

eles plantavam e animais que criavam. É claro que essa forma de obter alimentos acarretou mudanças que

vieram determinar os rumos da nossa espécie e a forma de percepção do mundo. Analisemos um pouco mais.

Domesticação de animais e plantas

O que a gente chama de revolução agrícola é, em grande parte, um bem-sucedido experimento de

engenharia genética. É claro que os nossos antepassados não possuíam laboratórios ou mapeavam genomas,

mas eles simplesmente iam escolhendo dentre aqueles espécimes de animais ou plantas aqueles que melhor

se adaptavam às suas necessidades, principalmente alimentícias. Com o cruzamento e intercruzamento de

espécimes ao longo de muitas gerações, conseguimos fazer com que os grãos e os animais produzissem mais

alimento, fossem mais dóceis e se apegassem à gente. Observe bem a imagem abaixo:

Porém há outra linha de pensamento que diz que foram as plantas que nos domesticaram. Quem já

plantou horta em casa sabe que coentro, cebolinha, chuchu são plantas gulosas. Elas pedem muita água, pedem

muito adubo, qualquer inseto já deixa elas doentes, e é preciso que a gente esteja lá pra cuidar. Agora, imagina

uma plantação de trigo milho pra abastecer uma família inteira! Estudos comprovam que as sociedades

agrícolas trabalham em média 4 horas a mais que as sociedades caçadoras e coletoras, exatamente porque

essas plantas que a gente plantou exigem muito da gente. E é esse trabalho que nos obrigou a construir casas

junto às plantações, fazer cerca, construir canal... E pra o vegetal, isso foi ótimo! Se o sucesso genético se dá

por causa do maior número de cópias do DNA, então o trigo, o milho etc não só foram bem sucedidos, como

deveriam dar palestras de coaching “Como domar humanos para atingir seus sonhos”. Pros animais o negócio

Aqui ao lado temos espécimes

de Milho selvagem ao lado do

milho domesticado. A

principal diferença, é claro é o

tamanho da espiga: Muito

maior, muito mais bonita e

com mais grãos. Para obter

esse resultado foram

necessários muitos

cruzamentos de maneira a se

adaptar às necessidades

humanas. Foi bom pra gente,

mas foi bom pro milho? O

mesmo se deu com os animais,

o boi é quem sofre.

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foi mais ou menos. Tá, temos mais galinhas que gente, mas não podemos dizer que isso seja lá muito favorável

pra elas, pois a indústria alimentícia praticamente as condenou a servirem só e somente pra nossas panelas, o

mesmo se passa com os demais animais domesticados. Tudo isso pra que a gente tenha uma alimentação

melhor, não é mesmo?

Bem, há controvérsias. Hoje a base da nossa alimentação se limita a pouquíssimas espécies vegetais e

animais, que são basicamente as mesmas há 9.000 anos. Ora, os caçadores e coletores tinham, e tem ainda,

uma dieta bem mais variada que lhes permite uma gama muito maior de nutrientes, ao passo que nas

sociedades agrícolas a gente fica preso a basicamente um tipo de base alimentas (milho, feijão, arroz), o que

precisa ser complementado com outras coisas. Fora as zoonoses (doenças de origem animal que passaram

pra gente) que se multiplicaram entre os povos agrícolas – e com a mania que os seres humanos têm de

desmatar a flora nativa pra dar de comer a boi, aí é que elas se multiplicam mesmo. Outro problema advindo

da agricultura foi que o crescimento populacional atrelado à dependência de uma colheita acelerou a

mortalidade infantil e se um desastre natural comprometesse a lavoura, populações inteiras podiam ser

dizimadas em um piscar de olhos. As grandes fomes da história demonstram muito bem isso.

Ou seja, a domesticação trouxe suas vantagens, mas teve um preço alto, principalmente na nossa

relação com o meio-ambiente. Mas isso a gente conversa no final.

Onde surgiu?

Os pesquisadores apontam que a agricultura não surgiu apenas em um local específico, mas surgiu em

muitos lugares e em tempos diferentes, com exceção da Austrália. O que podemos dizer é que em torno do

ano 8000 a.C ela era praticada na África Oriental, na Turquia, México, Peru e Oriente médio. Cada lugar com

um tipo específico de domesticação. Sabemos que os bodes e os cães foram os primeiros animais domesticados

e que o trigo, o milho e o arroz foram as primeiras espécies de plantas. Muito provavelmente a agricultura

tenha sido “inventada” pelas mulheres, visto que os homens eram responsáveis pela caça e pela guerra. As

evidências pra isso estão nos mitos agrícolas, em geral as divindades da colheita e da terra são femininas:

Ceres, Gaia, Asera, o que pode ser um indício da importância feminina na agricultura. Fora que em sociedades

seminômades como as tupi-guarani, a agricultura era praticada por mulheres. Por que depois se tornou uma

atividade “masculina”? Talvez tenha mais a ver com as novas configurações de poder que essas sociedades

construíram.

A Idade dos Metais

E chegamos à última etapa da pré-história, honorável aprendiz! Com a fixação de certos grupos em

assentamentos permanentes e a necessidade de desenvolver novas tecnologias para a agricultura e defesa, os

seres humanos acabaram por desenvolver a Metalurgia, respectivamente o Cobre, o Bronze e o Ferro. Os

domínios desses metais permitiram o aperfeiçoamento de ferramentas como a Enxada, a Pá e o arado, além

de forjar armas mais mortíferas como a espada e a lança. Com isso as sociedades aprofundaram seu processo

de estratificação [camadas sociais], onde claramente existiam pessoas que detinham o poder e que podia

impô-lo aos demais. O que certamente aumentou as disputas por territórios e, por consequência, os conflitos

entre os bandos. Esses detentores de poder começaram a administrar os excedentes da produção e a se

privilegiar por isso... E uma das formas de controlar esse excedente foi através da invenção da escrita. Como

disse o Professor Harari:

Até o fim da era moderna, mais de 90% dos humanos eram camponeses que se levantavam todas as

manhãs para trabalhar a terra com o suor da fronte. Os excedentes que produziam alimentavam a ínfima

minoria das elites – reis, oficiais do governo, soldados, padres, artistas e pensadores –, que enchem os livros

de história. A história é o que algumas poucas pessoas fizeram enquanto todas as outras estavam arando campos

e carregando baldes de água.

Bem, mas isso é outra história.

E as Américas?

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Bem, a principal teoria que temos é que o Continente americano foi povoado por volta de 15 anos atrás

por ondas migratórias vindas da Eurásia através do estreito de Bering. A teoria diz que nessa época, devido à

uma era glacial, existia uma ponte de gelo ligando os territórios da Rússia e do Alasca o que permitiu que

grupos de caçadores e coletores se locomovessem até aqui e se fixassem. Com o tempo eles foram se

espalhando pelo continente e se adaptando aos ecossistemas locais. Esses grupos, é claro, não eram

culturalmente homogêneos, porém a origem eurasiana pode explicar porque a maioria dos povos indígenas

tem traços semelhantes aos asiáticos.

Por outro lado, existem registros arqueológicos aqui na América do Sul, como em Monte verde no

Chile e Serra da Capivara, no Brasil que apontam presença humana há cerca 58mil anos e com traços negros.

O que pode apontar um povoamento paralelo ao do continente australiano por via marítima. O que ajudaria a

explicar, por exemplo, a variedade linguística das Américas. Essa teoria, porém, sofre resistência de certos

grupos de pesquisadores, principalmente nos EUA [hegemonia política?]. Aqui no Brasil o fóssil mais famoso

é o de Luzia, datado em 13mil anos e que quase se perdeu no incêndio do museu nacional.

Conclusão

Durante a pesquisa para elaboração desse material duas perspectivas me foram muito evidentes para

mim: É preciso ir além de pensar que a pré-história era só e somente sobre indivíduos que viviam em cavernas

de modo nômade e que depois produziram agricultura. Por outro lado, também era necessário colocar em

evidência que a Cultura também é parte da nossa genética. Ser cultural não é só um domínio sobre o genoma,

é parte de nós. Porém esse tipo de visão é pouco passada nas escolas e mesmo no ensino superior [eu mesmo

tive muita dificuldade para aprender pré-história na universidade]. Entender os mecanismos culturais e

genéticos que possibilitaram que a gente chegasse onde chegou é um excelente exercício de ver como nós

estamos inseridos no meio natural e como a nossa relação com ele pode determinar a nossa sobrevivência ou

não.

Infelizmente, o sociedade ocidental e pós-industrial se acostumou a ver a natureza como algo a ser

dominado para servir aos nossos interesses. Desmatamos florestas porque queremos mais carne. Extinguimos

animais porque eles atacam nosso gado. Queimamos carvão pra que as indústrias não parem. E basta a gente

pisar em um território que espécies são extintas, até mesmo as humanas, como os neandertais. E isso tem seu

preço. Talvez se a gente se incluísse como membros da fauna e da flora, fôssemos mais respeitosos com o

meio-ambiente. Porém, a nossa pecha de predadores número 1 ainda está longe de ser exorcizada.

E por último: entender que os seres humanos, ao significar o mundo ao seu redor, podem tanto unir e

avançar para sociedades mais justas e igualitárias, ou podem legitimar injustiças milenares contra outros

grupos, e que o problema disso é acharmos que, por ser há tanto tempo assim, é porque tem que ser desse

jeito. Mas não é a cultura que nos faz, somos nós que fazemos cultura. E nós podemos mudar. E, olhando

bem, nós mudamos o tempo todo. Bem, mas a História não é um “eterno progresso”. Fazemos muita burrada,

e é só ver o ano em que estamos para comprovar... que isso fique como provocação.

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BIBLIOGRAFIA

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BLAYNEY, Georfrey. Uma breve história do Mundo – São Paulo, SP: Editora fundamento

educacional

PINSKY, Bassanezi (org). Novos temas nas aulas de História; São Paulo, SP: Contexto.

TUTTLE, Howard Russel. Human Evolution in Encyclopedia Britannica. Link:

https://www.britannica.com/science/human-evolution. Acesso: 06 de maio.

CARDOSO, Ciro Flamarion S. América pré-colombiana. São Paulo, SP, Brasiliense.

POLLAN, Michael. Cozinhar: uma história natural de transformação. Rio de Janeiro. RJ. Instrínseca.

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