a participação do enfermeiro no trabalho educativo em saude coletiva
TRANSCRIPT
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RICA GOMES PEREIRA
A PARTICIPAO DA ENFERMAGEM NO
TRABALHO EDUCATIVO EM SADE COLETIVA: UM
ESTUDO DOS RELATOS DE EXPERINCIA
PRODUZIDOS POR ENFERMEIROS BRASILEIROS NO
PERODO 1988-2003
So Paulo
2005
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UNIVERSIDADE DE SO PAULO
ESCOLA DE ENFERMAGEM
A PARTICIPAO DA ENFERMAGEM NO
TRABALHO EDUCATIVO EM SADE COLETIVA: UM
ESTUDO DOS RELATOS DE EXPERINCIA
PRODUZIDOS POR ENFERMEIROS BRASILEIROS NO
PERODO 1988-2003
rica Gomes Pereira
Dissertao apresentada Escola de
Enfermagem da Universidade de So Paulo,
para obteno do ttulo Mestre em
Enfermagem.
rea de concentrao: Enfermagem em Sade
Coletiva.
Orientadora: Prof Dr Cssia Baldini Soares
So Paulo
2005
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Catalogao na publicao (CIP)
Biblioteca Wanda de Aguiar Horta da EEUSP
Pereira, rica Gomes A participao da enfermagem no trabalho educativo em sade coletiva: um estudo dos relatos de experincia produzidos por enfermeiros brasileiros no perodo 1988-2003 / rica Gomes Pereira. - So Paulo: E. G. Pereira; 2005. 122 p. Dissertao (Mestrado) - Escola de Enfermagem da Universidade de So Paulo.
Orientadora: Profa. Dra. Cssia Baldini Soares
1. Educao em sade 2. Trabalho 3. Enfermagem em sade pblica I. Ttulo.
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i
Dedicatria
Aos agentes e sujeitos dos processos educativos
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ii
Agradecimento Especial
Para a professora doutora Cssia Baldini Soares, orientadora desta pesquisa, que
apoiou com grande pacincia, perspiccia e empenho o desenvolvimento das minhas
potencialidades me fazendo acreditar que o equilbrio entre teoria e prtica pode ser
possvel.
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iii
Agradecimentos
Aos Professores Doutores Antonio Chizzotti, Anna Maria Chiesa, Eliete Maria
Silva e Marina Peduzzi pela valiosa contribuio na banca examinadora.
s Professoras Doutoras Clia Maria Sivalli Campos e Maria Josefina (Susy)
Leuba Salum, pelos ensinamentos na fase de elaborao da dissertao.
A chefia da Professora Doutora Renata Ferreira Takahashi
e a todos os trabalhadores do Departamento de Enfermagem em Sade Coletiva da
Escola de Enfermagem da Universidade de So Paulo
Aos professores, estudantes de graduao, ps-graduao, trabalhadores da rede
bsica de servios de sade e as populaes das reas adscritas das unidades
bsicas de sade pelo desafio reflexo diria acerca do processo de trabalho
educativo em sade.
Carla Andrea Trap, por tudo.
Aos meus pais, Jairo e Balbina, e minha irm, Elen, pelo apoio irrestrito em todos
os momentos da minha vida.
E a todas as pessoas que, direta ou indiretamente, contriburam para a realizao
deste trabalho.
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iv
Pereira EG. A participao da enfermagem no trabalho educativo em sade coletiva:
um estudo dos relatos de experincia produzidos por enfermeiros brasileiros no
perodo 1988-2003. So Paulo, 2005. 122p. Dissertao (Mestrado) Escola de
Enfermagem. Universidade de So Paulo.
RESUMO: O presente trabalho constituiu-se como um estudo exploratrio, valendo-se dos relatos de experincia educativa, de enfermeiros brasileiros,
publicados entre 1988 e 2003. A partir das concepes nucleares do campo da sade
coletiva e da educao equacionou um mtodo de identificao dos elementos
constituintes do processo de trabalho educativo em sade. Utilizou como parmetros
na seleo das publicaes: trabalhos escritos por enfermeiros, docentes ou no; a
descrio de prticas educativas voltadas para uma dada populao, realizadas em
unidades bsicas de sade ou em instituies sociais do territrio adscrito. O material
foi identificado a partir dos bancos de dados LILACS e PERIENF. Os resultados
mostraram que a produo foi assinada especialmente por docentes, do eixo sul-
sudeste, com a identificao do contexto dos sujeitos fragilmente caracterizada. A
responsabilidade pelo saber fazer ficou a cargo do docente e dos alunos de ps-
graduao e na maioria das vezes o saber operante foi assumido pelo aluno de
graduao, de ps-graduao ou pelos trabalhadores da rede bsica de servios de
sade. Muitas vezes, as publicaes explicitaram as concepes de educao e os
instrumentos utilizados no trabalho educativo, mas no os articularam concepo
de sade norteadora de sua prtica social. No entanto, os saberes instrumentais que
conformam a concepo de educao em sade esto na dependncia do que os
mltiplos agentes do processo de trabalho educativo reconhecem como objeto das
prticas sociais em sade. Assim, imprescindvel empreender esforos para o
aprimoramento do processo de elaborao dos relatos identificando o contexto
instaurador das necessidades educativas e os elementos terico-metodolgicos que
fundamentam as prticas educativas em sade. Para que o processo de trabalho
educativo em sade instrumentalize as classes/grupos sociais no processo de
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v
transformao do objeto da sade coletiva, os perfis epidemiolgicos, necessrio
mais que clareza e habilidade no uso de recursos pedaggicos. preciso que a
enfermagem como uma das distintas prticas sociais em sade domine a concepo
de sade e de educao que objetualiza o recorte do objeto do processo de trabalho
educativo e a concepo de educao em sade que aprimora o saber instrumental
para a transformao desse mesmo objeto.
Palavras chave: Educao em sade; Trabalho; Enfermagem em sade pblica.
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vi
Pereira EG. The participation of the nursing in the work of the collective health
education: A study of the experience reports produced by brazilian nurses in the
period 1988-2003. So Paulo, 2005. 122p. Dissertation (Masters) - School of
Nursing. University of So Paulo.
SUMMARY: The present work is constituted as an exploratory study, using itself
the stories of the educative experience, of the Brazilian nurses, published between
1988 and 2003. From the nuclear conceptions of the field of collective health and the
education a method of identification of the constituent elements of the process of
educative work in health was developed. The parameters used in the selection of
publications were: works written by nurses, educators or not; the description of the
educative practices overturned for a certain population, made in basic units of health
or social institutions of the assigned territory. The material was identified from the
data banks LILACS and PERIENF. The results show that the production was signed
specially by educators, of the axis south-Southeast, with the identification of the
context of the subjects fragilely characterized. The responsibility by the "knowledge
to do" was responsibility of the professor and of the students of post-graduation and
in most of the times the "operating knowledge" was assumed by undergraduate and
post-graduation students or by the workers of the basic network of health service.
Often, the publications specified the conceptions of education and the instruments
used in the educative work, but they did not articulate them to the conception of
health that orients its social practice. however, the instrumental knowledge that
conform the conception of education in health depends on what the multiple agents
of the process of educative work recognize like the object of the social practices in
health. Thus, it is essential to undertake efforts for the improvement of the process of
elaboration of the reports, identifying the constitutive context of the educative
necessities and the theoretical-methodological elements that serve as basis for the
educative practices on health. In order to the process of educative work in health
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vii
instrumentalize the classes/social groups in the process of transformation of the
object of the collective health, the epidemiologic profiles, it is necessary more than
clarity and ability in the use of pedagogical resources. It is necessary that the nursing
as one of the distinct social practices in health dominates the conception of health
and education that it has as an object crosses the object of the process of educative
work and the conception of education in health that perfects the instrumental
knowledge for the transformation of that same object.
Keywords: Education in health; Work; Nursing in public health.
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viii
Pereira EG. La participacin de la enfermera en el trabajo de la salud colectiva: Un
estudio de los relatos de las experiencias producidas por enfermeros brasileros en el
perodo 1988-2003. So Paulo, 2005. 122p. Disertacin (Maestra) Escuela de
Enfermera Universidad de So Paulo.
RESUMEN: El presente trabajo se constituye como un estudio exploratorio,
valindose de los relatos de la experiencia educativa, de los enfermeros brasileros,
publicados entre 1988 y 2003. A partir de las concepciones nucleares del campo de la
salud colectiva y de la educacin se desarrollo un mtodo de identificacin de los
elementos constituyentes del proceso de trabajo educativo en salud. Se utiliz como
parmetros en la seleccin de las publicaciones: trabajos escritos por enfermeros,
docentes o no; la descripcin de las prcticas educativas volcadas para una dada
poblacin, realizadas en unidades bsicas de salud o en instituciones sociales del
territorio adscrito. El material fue identificado a partir de los bancos de datos
LILACS e PERIENF. Los resultados mostraron que la produccin fue firmada
especialmente por docentes, del eje sur-sudeste, con la identificacin del contexto de
los sujetos frgilmente caracterizada. La responsabilidad por el saber hacer quedo
a cargo del docente y de los alumnos de pos-graduacin y en la mayora de las veces
el saber operante fue asumido por el alumno de pregrado, de pos-graduacin o
por los trabajadores de la red bsica de servicios de salud. Muchas veces, las
publicaciones explicitaron las concepciones de educacin y los instrumentos
utilizados en el trabajo educativo, pero no los articularon a la concepcin de salud
que norteaba su prctica social. Aunque, los conocimientos instrumentales que
conforman la concepcin de educacin en salud dependen de lo que los mltiples
agentes del proceso de trabajo educativo reconocen como objeto de las prcticas
sociales en salud. As, es imprescindible emprender esfuerzos para el mejoramiento
del proceso de elaboracin de los relatos identificando el contexto instaurador de las
necesidades educativas y de los elementos terico-metodolgicos que fundamentan
las prcticas educativas en salud. Para que el proceso de trabajo educativo en salud
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ix
instrumentalice las clases / grupos sociales en el proceso de transformacin del
objeto de la salud colectiva y los perfiles epidemiolgicos, es necesario mas que
claridad y habilidad en el uso de recursos pedaggicos. Es necesario que la
enfermera como una de las distintas prcticas sociales en salud domine la
concepcin de salud y de educacin que tiene como objeto el recorte del objeto del
proceso de trabajo educativo y la concepcin de educacin en salud que perfecciona
el saber instrumental para la transformacin de ese mismo objeto.
Palabras clave: Educacin en salud; Trabajo; Enfermera en salud pblica.
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x
LISTA DE FIGURAS
Figura I Categorias empricas e indicadores que compem a descrio geral dos
relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros ....................................47
Figura II Componentes da categoria analtica do processo de trabalho, categorias
empricas e indicadores para captura do processo de trabalho educativo em sade ...48
Figura III Agentes da rede bsica de servios de sade ou relacionadas educao
bsica que participaram do planejamento dos temas e/ou da execuo do trabalho
educativo em sade ..................................................................................................58
Figura IV Agentes das universidades que participaram do planejamento dos temas
e/ou da execuo do trabalho educativo em sade ....................................................59
Figura V Adolescentes, pais e professores: temas e mbito de atuao grupal .......63
Figura VI Pais, alunos, professores e funcionrios: temas e mbito de atuao
grupal ......................................................................................................................64
Figura VII Crianas, familiares e comunidade escolar: temas e mbito de atuao
grupal ......................................................................................................................64
Figura VIII Mulheres e mes: temas e mbito de atuao grupal ...........................65
Figura IX Adultos: temas e mbito de atuao grupal............................................65
Figura X Populao em geral, transeuntes e ouvintes de rdio: temas e mbito de
atuao grupal..........................................................................................................65
Figura XI Trabalhadores: temas e mbito de atuao grupal..................................67
Figura XII Elementos constituintes do objeto do processo de trabalho educativo em
sade .......................................................................................................................85
Figura XIII Elementos constituintes dos meios/instrumentos do processo de
trabalho educativo em sade ....................................................................................89
Figura XIV Elementos constituintes da finalidade do processo de trabalho
educativo em sade ..................................................................................................93
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xi
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros, no perodo
1988-2003 ...............................................................................................................52
Tabela 2 Relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros quanto
regio de procedncia da atividade educativa, segundo o perodo 1988-2003 ..........53
Tabela 3 Relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros quanto
informao sobre o municpio em que ocorreu a atividade educativa, segundo o
perodo 1988-2003 ..................................................................................................53
Tabela 4 Relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros quanto
informao sobre o bairro em que ocorreu a atividade educativa, segundo o perodo
1988-2003 ...............................................................................................................54
Tabela 5 Relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros quanto
informao sobre a comunidade em que se dirigiu a atividade educativa, segundo o
perodo 1988-2003 ..................................................................................................54
Tabela 6 Relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros quanto ao
tipo de revista em que foi publicada a atividade educativa, segundo o perodo 1988-
2003.........................................................................................................................55
Tabela 7 Relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros quanto ao
local de vnculo e participao dos autores nas publicaes, segundo o perodo 1988-
2003.........................................................................................................................56
Tabela 8 Relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros quanto ao
carter da instituio vinculada aos autores das publicaes, segundo o perodo 1988-
2003 ........................................................................................................................57
Tabela 9 Relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros quanto as
necessidades geradoras do trabalho educativo, segundo o perodo 1988-2003 .........60
Tabela 10 Relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros quanto a
presena das concepes de educao e de sade constituintes do saber fazer do
trabalho educativo, segundo o perodo 1988-2003 ...................................................60
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xii
Tabela 11 Relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros quanto a
participao dos sujeitos no planejamento dos temas dos trabalhos educativos,
segundo o perodo 1988-2003 .................................................................................62
Tabela 12 Relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros quanto a
identificao do espao fsico em que foi realizado o trabalho educativo, segundo o
perodo 1988-2003 ..................................................................................................68
Tabela 13 Relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros quanto ao
carter do local em que foi realizado o trabalho educativo, segundo o perodo 1988-
2003.........................................................................................................................68
Tabela 14 Relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros quanto a
freqncia dos encontros do trabalho educativo, segundo o perodo 1988-2003 .......69
Tabela 15 Relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros quanto a
presena da concepo de educao em sade constituinte do saber operante dos
trabalhos educativos, segundo o perodo 1988-2003 ................................................69
Tabela 16 Relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros quanto ao
tipo de recursos didticos utilizados nos trabalhos educativos, segundo o perodo
1988-2003 ...............................................................................................................70
Tabela 17 Relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros quanto a
freqncia dos encontros do trabalho educativo, segundo o perodo 1988-2003 .......70
Tabela 18 Relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros quanto a
meta a ser alcanada nos trabalhos educativos, segundo o perodo 1988-2003 .........71
Tabela 19 Relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros quanto a
presena da articulao entre as concepes constituintes do saber fazer e do
saber operante dos trabalhos educativos, segundo o perodo 1988-2003 ...............72
Tabela 20 Relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros quanto a
identificao dos avaliados dos trabalhos educativos, segundo o perodo 1988-2003
...............................................................................................................................72
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SUMRIO
Dedicatria .................................................................................................................i
Agradecimento Especial............................................................................................ ii
Agradecimentos ....................................................................................................... iii
Resumo.....................................................................................................................iv
Abstract ....................................................................................................................vi
Resumen ................................................................................................................ viii
Lista de figuras ..........................................................................................................x
Lista de tabelas .........................................................................................................xi
1 INTRODUO: O OBJETO E O PROBLEMA DE ESTUDO.............................15
2 OBJETIVOS.........................................................................................................20
2.1. Objetivo geral ...................................................................................................20
2.2. Objetivos especficos.........................................................................................20
3 CONSIDERAES TERICAS..........................................................................21
3.1 A categoria trabalho ...........................................................................................21
3.2 O processo de trabalho em sade........................................................................27
3.3 O trabalho da enfermagem em sade coletiva.....................................................31
3.4 O processo de trabalho educativo em sade........................................................34
3.4.1 O objeto do processo de trabalho educativo em sade .............................................................. 38
3.4.2 Os meios e instrumentos do processo de trabalho educativo em sade ...................................... 41
3.4.3 A finalidade do processo de trabalho educativo em sade......................................................... 42
4 PROCEDIMENTOS METODOLGICOS...........................................................45
4.1 O instrumento de coleta de dados e as categorias empricas................................46
5 RESULTADOS E ANLISE................................................................................52
5.1 Caracterizao dos relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros
na rede bsica de servios de sade ..........................................................................52
5.2 Descrio dos elementos constituintes do trabalho educativo em sade a partir
dos relatos de experincia educativa dos enfermeiros brasileiros na rede bsica de
servios em sade ....................................................................................................57
5.2.1 O objeto do trabalho educativo em sade................................................................................. 57
-
5.2.2 Os meios e instrumentos do trabalho educativo em sade......................................................... 67
5.2.3 A finalidade do trabalho educativo em sade ........................................................................... 70
6 DISCUSSO........................................................................................................73
6.1 Caracterizao geral dos relatos de experincia educativa dos enfermeiros
brasileiros no perodo 1988-2003 .............................................................................73
6.2 Elementos constituintes do processo de trabalho educativo em sade .................74
7 CONSIDERAES FINAIS ................................................................................96
8 REFERNCIAS ...................................................................................................98
ANEXOS...............................................................................................................106
Anexo I. Material emprico ....................................................................................106
Anexo II. Instrumento de coleta de dados...............................................................112
Anexo III. Objeto, sujeito, tema, mbito de atuao grupal e meta a ser
alcanada/finalidade dos relatos de experincia educativa produzidos por enfermeiros
brasileiros no perodo 1988-2003 ...........................................................................114
Anexo IV. Meta a ser alcanada/finalidade apreendida a partir do material emprico
..............................................................................................................................121
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1 INTRODUO: O OBJETO E O PROBLEMA DE ESTUDO
O objeto de estudo deste trabalho o processo educativo em sade
conformado como uma das atividades inscritas na prtica social da enfermagem ao
integrar o processo de trabalho em sade.
As pesquisas que tomam como objeto a educao em sade tm
predominantemente procurado compreender a tarefa educativa como parte da
superestrutura jurdico-poltica e ideolgica que sustenta o trabalho em sade, mas
poucos (Gonzaga, 1992a; Gonzaga, 1992b; Silva, Gonzaga e Verdi, 1992)
relacionam trabalho em sade e processo de trabalho educativo em sade.
Quando a tarefa educativa tomada como um processo especfico do trabalho
em sade, a partir da prtica social da enfermagem, de acordo com Gonzaga (1992a),
necessria a incorporao de elementos que constituiro o objeto, os instrumentos,
as necessidades geradoras para o trabalho e as finalidades de trabalho.
A autora salienta que, no cotidiano das prticas educativas em sade, se
explicita um objeto que tomado sob o olhar da clnica ou da epidemiologia.
Valendo-se de saberes e instrumentos reproduzidos e incorporados atividade de
modo alienado, ou seja, desintegrados da reflexo sobre sua potencialidade para a
transformao do objeto. Caminhando nessa direo, a aplicao do instrumento se
torna a finalidade do trabalho e o trabalhador se torna um mero aplicador do mtodo;
este, por sua vez tem uma existncia per si, sem que sejam explicitadas as vises de
mundo que esto embutidas no objeto (Gonzaga, 1992a).
Na avaliao de Lobo (1987), que ao relatar uma experincia educativa
comunitria, chama a ateno para prticas de pesquisa que se instituem sob o manto
de uma concepo que serve ao propsito de bloquear a participao popular nas
decises fundamentais da sociedade, ainda que tal ao viesse escondida sob a forma
de temor do povo, fazer pelo povo que ainda no est preparado para dirigir-se por
si mesmo. Na esfera educativa, do mesmo modo, vem acontecendo diante dessa
prtica instaurada a partir do modelo biomdico hegemnico que a populao tem
corrido o risco de ficar apenas na constatao dos problemas e os trabalhadores da
sade tm se limitado a uma pedagogia de doao de si mesmos e de seu tempo
disponvel, omitindo-se da interveno e troca de conhecimento. Por exemplo, no
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h incentivo s aes dos moradores em busca de solues para seus problemas.
Dessa forma, fica-se apenas na aparncia, no ocorrendo incurso s causas e, sem
que se procure, portanto sua essncia.
E assim que Queiroz e Salum (2000:27), consideram que a enfermagem tem
servido majoritariamente ao projeto de
educao para a sade, [que no discurso se diz] (...) potencialmente
transformador da realidade de sade, mas que na verdade percorre
um trajeto em que, sob uma tica, veicula um receiturio universal
para se adquirir sade; sob outra tica transfere um saber tcnico, a
ttulo de compartilha, mas que de fato responsabiliza o usurio dos
servios pelo auto-cuidado e, simultaneamente, desresponsabiliza o
servio de sade pela sade de quem educado.
E pelo que at aqui foi considerado, reafirma-se a concepo de que a
Enfermagem, bem como as outras prticas sociais em sade com que estabelece
relaes, evidencia sua subordinao ao projeto poltico que suporta o modo de
produo vigente na constituio de seus trabalhadores, nos contedos tcnico-
cientficos, nos processos de trabalho que realiza e, particularmente, no objeto para o
qual se dirige (Salum, Bertolozzi e Oliveira, 1999).
Neste trabalho, parte-se do entendimento ento de que, sendo o processo
educativo em sade um dos instrumentos da prtica social da enfermagem, a
fundamentao terica da assistncia de enfermagem que recupera a articulao
educao-cidadania deveria incluir os conceitos de homem, sociedade, processo
sade-doena, sistemas de sade, enfermagem, educao, participao, prxis e
cidadania (Silva et al, 1992). Nesse sentido, a mediao, a redescoberta do sujeito e o
resgate da prxis como objeto e finalidade das aes educativas tornam-se
fundamentais para a construo de um referencial que supere seus esteretipos e suas
contradies (Gonzaga, 1992b).
Os passos para a implementao do processo educativo em sade a fim de
potencializar a conquista da cidadania dos grupos sociais, compreendero (Gonzaga,
1992b):
1) O conhecimento da realidade concreta que traz em si a prxis cotidiana da
comunidade,
-
2) O planejamento grupal das aes educativas sem a centralidade de poder
decisrio do educativa e com a participao da populao,
3) A ao no plano imediato, seja individual, familiar, grupal ou coletivo,
articulado a um processo crtico de percepo da realidade para a
mobilizao da ao,
4) O questionamento crtico da realidade acerca dos seus determinantes e das
estratgias para sua superao,
5) A sntese dos conhecimentos e experincias vivenciadas para uma prxis
crtica e criativa que supera a viso fragmentria da realidade.
Dada a complexidade do objeto ao qual se dirige o processo educativo em
sade preciso reconhecer que
a Enfermagem s se defrontou com a noo de coletivo no incio do
sculo XX, quando a prtica mdica tomou para si o discurso da
promoo e da recuperao da sade, configurado no modelo de
educao sanitria. Isso decorreu da necessidade de ampliar as
margens de consenso entre as classes frente s presses dos
movimentos reivindicatrios dos trabalhadores, conseqncia das
crises geradas pela Primeira Grande Guerra (Salum, Bertolozzi e
Oliveira, 1999:108)
Foi somente, porm, com o movimento da Reforma Sanitria dos anos 70 e
com a constituio do campo da Sade Coletiva, que a Educao em Sade passou a
sofrer influncia de autores, como Paulo Freire, que preconizaram o carter
emancipatrio da educao. De fato, as experincias na sade em geral (Merhy,
1987) e na enfermagem em particular (Germano, 1983; Melo, 1986; Silva, 1986)
testemunham o desenvolvimento de prticas educativas populares consideradas
progressistas e potencialmente transformadoras da situao de sade.
Nesse sentido, UIPES1 (1998), ao relatar o contedo discutido num seminrio
nacional sobre a formao de recursos humanos para a rea da educao em sade,
1 A Unio Internacional de Promoo da Sade e Educao Para a Sade uma associao criada em 1951 que congrega uma rede mundial de pessoas e instituies para promover o avano do conhecimento e melhorar a efetividade da Promoo da Sade e da Educao para a Sade em estreita cooperao com a OMS, UNESCO e UNICEF. A Representao da Sub-regio Brasil constituda em 1993, esfora-se para se tornar um plo receptor e irradiador da Promoo da Sade/Educao em
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chama a ateno para aquilo que o Conselho Nacional de Sade (CNS), em sua
resoluo n 41 de 03/03/93 reafirma
deve ser a educao para a sade considerada estratgia
imprescindvel para a promoo da sade, preveno das doenas e
para a consolidao do SUS, nos nveis federal, estadual e municipal.
Esta resoluo do CNS referendada pelo Ministrio da Sade, no
Documento Final da Proposta de Reforma Administrativa (Grupo
Executivo para a Reforma Administrativa GERAS, 1993), que
considera a Educao em Sade como um dos espaos de interveno
estratgica para a poltica de sade. ainda, considerada como rea
que perpassa toda a estrutura organizacional dos servios,
articulando-se com a informao, a comunicao, e a epidemiologia,
corroborando-se em estratgia bsica para a consolidao do
sistema.
O pressuposto deste trabalho o de que, aps a promulgao da Constituio
Federal que legitimou a sade como direito de todos e dever do Estado, - com a
conseqente regulamentao do Sistema nico de Sade (SUS), das mudanas nos
modelos assistenciais e a recente constituio do campo da Sade Coletiva -, a
educao em sade tenha se transformado, sob a influncia dos marcos terico-
metodolgicos e operacionais que fundamentaram a constituio do SUS, passando
pelas bases da rede bsica de servios de sade e do campo da Sade Coletiva. Ou
seja, a suposio a de que a ao educativa caminhou rumo a uma transformao
do olhar sobre o objeto, valendo-se de instrumentos que possibilitaram o
redimensionamento de sua finalidade, a partir de perspectivas terico-metodolgicas
que promoveram rupturas com aquelas que sustentavam as prticas at ento
reiterativas do modelo mdico hegemnico.
O conjunto problematizador deste estudo pode ser sintetizado atravs das
seguintes perguntas: A enfermagem est realizando prticas educativas na rede
bsica de servios em sade? Quais os processos de trabalho do processo de
Sade no Brasil e na Amrica Latina. So membros latino-americanos do Conselho de Administrao da UIPES: Mrcia Faria Westphal (Brasil), Helena Restrepo (Colmbia), Dora Cardaci (Mxico), Juan Manuel Castro (Mxico) e Hiran Arroyo Acezedo (Puerto Rico).
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produo de servios de sade, cujos agentes envolvem a enfermagem, que utilizam
o instrumento educativo? O SUS estaria alicerando o desenvolvimento de prticas
em educao em sade? Quais so as caractersticas dos elementos do processo
educativo na rede bsica de servios em sade? Quais so as implicaes para o
campo da Sade Coletiva?
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2 OBJETIVOS
2.1 Objetivo geral
Investigar a produo cientfica expressa nos relatos de experincia da
enfermagem sobre a prtica de educao em sade na rede bsica de servios em
sade.
2.2 Objetivos especficos
Caracterizar a contribuio da produo cientfica expressa nos relatos de
experincia educativa da enfermagem na rede bsica de servios em sade para a
consolidao da prtica de educao em sade no SUS;
Reconhecer na produo cientfica expressa nos relatos de experincia educativa
da enfermagem os elementos do processo de trabalho educativo realizado na rede
bsica de servios em sade;
Identificar na produo cientfica expressa nos relatos de experincia educativa
da enfermagem o tipo de saber implicado na educao em sade praticada na
rede bsica de servios em sade.
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3 CONSIDERAES TERICAS
3.1 A categoria trabalho
O desenvolvimento da vida social, poltica e intelectual condicionado pelo
modo de produo da vida material (Marx, 1977). Nesse sentido, a compreenso da
prtica social da enfermagem enquanto trabalho tende a possibilitar a proposio de
estudos e aes de interveno na utilizao de ferramentas que potencializam o
trabalho vivo em ato, a fim de propiciar satisfao, autonomia e emancipao dos
trabalhadores e dos usurios para uma assistncia qualificada de sade (Almeida,
Mishima e Peduzzi, 1999).
Como profisso, de acordo com Castellanos (1988), a enfermagem responde a
especficos valores sociais e sua capacidade de intervir na situao de assistncia
sade estar na dependncia direta do grau de conhecimento que ela tem desta
situao, a par de sua competncia tcnico-cientfica.
Os distintos processos de trabalho em sade subordinam-se ao processo de
produo dos servios de sade. A especificidade da enfermagem, enquanto prtica
social na rea da sade d-se, portanto, pelos saberes e tecnologias que lhe so
prprios (Queiroz e Salum, 1996).
No h como negar a qualificao das prticas sociais em sade, e
especificamente a de enfermagem, como trabalho. Desde a publicao do ensaio
pioneiro de Garca (1983), passando pela contribuio inegvel de Mendes
Gonalves (1979, 1992, 1994), um conjunto de pesquisadores em enfermagem
ocupou-se de examin-la sob a perspectiva marxista, fosse analisando o cuidado
como sua especificidade (Nakamae 1987; Almeida e Rocha 1997), fosse buscando
reconhecer os elementos fundamentais do processo de trabalho na prtica do
enfermeiro e dos demais trabalhadores que compem a fora de trabalho na
enfermagem (Castellanos, 1989; Queiroz e Salum, 1997; entre outros).
Assim sendo, o presente estudo considera o trabalho como a categoria central
de anlise para a compreenso das relaes sociais de produo contraditrias e, ao
mesmo tempo potencialmente transformadoras, ocorridas, especificamente, no
desenvolvimento dos processos de trabalho educativos em sade.
-
Nessa perspectiva, o trabalho entendido como uma relao entre o
homem e a natureza,
em que o ser humano com sua prpria ao, impulsiona, regula e
controla seu intercmbio material. Pe em movimento as foras
naturais de seu corpo, braos e pernas, cabea e mos, a fim de
apropriar-se dos recursos da natureza, imprimindo-lhes forma til
vida humana. Atuando assim sobre a natureza externa e modificando-
a, ao mesmo tempo modifica sua prpria natureza. Desenvolve as
potencialidades nela adormecidas e submete ao seu domnio o jogo
das foras naturais (Marx, 1968:202).
Dessa maneira, quando o homem esquadrinha na sua mente a transformao
de um ponto especfico da natureza para satisfazer suas necessidades, o faz por meio
de um processo de objetivao, a transposio para o mundo concreto de uma idia
previamente estabelecida subjetiva - sobre o que espera transformar na prpria
natureza a fim de satisfazer essas necessidades (Mendes Gonalves, 1992; Lessa,
1996).
Por isso, o processo de objetivao do homem em relao com a natureza
transforma a prvia ideao, isto , a finalidade previamente construda na
conscincia do homem, em um produto objetivo, concreto. A partir da ontologia
lukacsiana se reitera a mxima marxista de que, ao transformar a natureza, o ser
humano tambm se transforma porque desenvolve novas habilidades e, para poder
vencer a resistncia que se ope sua transformao em objetos construdos pelos
homens, torna-se necessrio o conhecimento dos nexos causais e das determinaes
do setor da natureza que deseja transformar. Assim, sempre resultar em novos
conhecimentos e habilidades e, portanto, ao transformar a natureza o indivduo
tambm se transforma (Lessa, 1996).
O fato que se parte do pressuposto de que o trabalho uma caracterstica
essencialmente humana e que marca sua distino com as demais espcies. A
alegoria de Marx traduz essa concepo quando o autor considera que:
o que distingue o pior arquiteto da melhor abelha que ele figura na
mente sua construo antes de transform-la em realidade. No fim do
-
processo do trabalho aparece um resultado que j existia antes
idealmente na imaginao do trabalhador. Ele no transforma apenas
o material sobre o qual opera; ele imprime ao material o projeto que
tinha conscientemente em mira, o qual constitui a lei determinante do
seu modo de operar e ao qual tem de subordinar sua vontade. E essa
subordinao no um ato fortuito. Alm do esforo dos rgos que
trabalham, mister a vontade adequada que se manifesta atravs da
ateno durante todo o curso do trabalho Marx (1968:202).
Ao tomar a teoria marxista como ponto de partida, Althusser (1999:45),
relaciona como elemento constitutivo do trabalho humano:
uma seqncia de operaes sistematicamente reguladas, efetuadas
pelos agentes do processo de trabalho que trabalham um objeto de
trabalho (matria bruta, matria prima, animais domsticos, etc),
empregando para tal fim instrumentos de trabalho (ferramentas mais
ou menos elaboradas, em seguida, mquinas, etc) de maneira a
transformar o objeto de trabalho, por um lado, em produtos
prprios a satisfazerem as necessidades humanas diretas
(alimentao, vesturio, moradia, etc) e, por outro, em instrumentos
de trabalho destinados a garantir a prossecuo ulterior do processo
de trabalho.
As consideraes de Althusser traduzem aquilo que se reconhece como
mediaes de primeira ordem na relao homem-natureza e que, segundo Antunes
(2000), fundamentado na estruturao terica de Istvn Mszros, dota o trabalho da
finalidade de preservar as funes vitais da reproduo individual e social na
satisfao das necessidades humanas.
Para Marx (1968), a mercadoria, isoladamente considerada, a clula
elementar da riqueza nas sociedades regidas pelo modo de produo capitalista e o
objeto externo o que satisfar as necessidades humanas, seja como meio de
subsistncia ou, meio de produo.
-
Ainda para o autor, qualquer coisa til pode ser caracterizada sob duplo
aspecto, conforme sua qualidade e quantidade. Por exemplo, a utilidade da borracha
faz dela um valor de uso. Ao ser considerado valor de uso, sempre implicar uma
quantidade definida, por exemplo, dez borrachas, cem borrachas, etc. O valor de uso
da borracha s se realizar com o seu consumo e/ou utilizao.
O valor de troca passar a existir na relao entre valores-de-uso de espcies
diferentes, na proporo em que se trocam e mudam constantemente no tempo e no
espao. As mercadorias, como valores de uso so heterogneas na
qualidade/utilidade, mas como valores-de-troca s podem diferir na quantidade
(Marx, 1968).
Por exemplo, a borracha se troca por outras mercadorias, nas mais diversas
propores, dez borrachas por um lpis, ou por trs apontadores ou por uma caneta,
etc. Todavia, como cada uma das mercadorias separadamente o valor de troca das
dez borrachas, devem X lpis, Y apontadores ou W canetas serem permutveis e
iguais entre si. Por isso, os valores de troca de uma mesma mercadoria expressam
todos uma conformao igualitria e a maneira como se expressam revela um
contedo que por meio deles se pode distinguir (Marx, 1968).
Ao trocar a borracha por outra mercadoria de qualidade/utilidade diferente,
como por exemplo, a caneta, ficam de lado seus valores de uso quando esto na
proporo adequada para a troca; prescindindo seu valor de uso s lhes restar uma
propriedade, a de serem produtos do trabalho. Ao prescindir do carter til dos
produtos do trabalho, tambm desaparecer o carter til dos trabalhos neles
corporificados e as diferentes formas de trabalho concreto sero reduzidas a uma
nica espcie de trabalho, o trabalho humano abstrato (Marx, 1968:44).
Dessa maneira, o valor de uma mercadoria s pode ser quantificado por meio
da quantidade da substncia criadora de valor que o trabalho humano abstrato, o
que faz com que a grandeza do valor seja determinada pela quantidade de trabalho
socialmente necessrio para a produo de um valor de uso. Assim, por exemplo, o
ar pode ser valor de uso sem ser valor porque sua utilidade para o ser humano no
decorre de um trabalho. Uma coisa para se tornar mercadoria precisa no apenas
produzir um valor de uso, mas produzir valor de uso para outros dando origem ao
valor de uso social que variar na razo direta da quantidade e na inversa da
produtividade do trabalho aplicado (Marx, 1968).
-
Segundo Rubin (1987), o valor uma relao homem-homem que assume
uma forma material - a mercadoria - e est relacionado ao processo de produo -
tempo de trabalho socialmente necessrio para produzir o produto.
Para o autor, na teoria de Marx sobre o valor, a transformao do trabalho
privado em trabalho social s pode realizar-se por meio da transformao do trabalho
concreto em trabalho abstrato. Para tanto, essa transformao no uma categoria
fisiolgica, mas uma categoria social e histrica. A expresso terica desse fato
social, qual seja, a igualao social das diferentes formas de trabalho - e no sua
igualdade fisiolgica - que constitui a categoria trabalho abstrato.
Os economistas clssicos, de acordo com Rubin (1987), ao sustentarem que o
trabalho a medida real do valor de troca de todas as classes de bens, esto
afirmando que o trabalho , na verdade, o contedo natural das relaes sociais
fundadas na troca. Marx, ao contrrio dos clssicos, no toma o valor como a
essncia da naturalidade da sociedade, mas sim como a expresso de uma sociedade
em que o indivduo s existe enquanto produtor de valor de troca, o que implica a
negao absoluta de sua existncia natural. Assim, a produo de valor de troca j
inclui em si um ato coercitivo. A atividade particular de cada produtor s adquire
sentido quando sancionada pela forma geral do valor de troca, isto , pelo dinheiro. A
mercadoria s se confirma como valor no momento em que se transforma em
mercadoria geral, em dinheiro, e o trabalho concreto (tcnico-material) de cada ser
humano s validado como trabalho social quando seu produto acolhido pelo
dinheiro como representante do trabalho em geral.
Por isso, Antunes (2000) afirma que a completa subordinao das
necessidades humanas reproduo do valor de troca no interesse da auto-
realizao expansiva do capital constituiu a emergncia de mediaes de segunda
ordem com a natureza. Uma vez que, para converter a produo do capital em
propsito da humanidade, ocorreu a separao entre seu valor de uso e valor de troca,
subordinando o primeiro ao segundo, a relao do homem com a natureza ficou
subordinada relao homem-homem para a satisfao das necessidades humanas.
Na sociedade mercantil-capitalista,
o capitalista, o trabalhador assalariado e o proprietrio de terra so
possuidores de mercadorias, formalmente independentes um do outro.
O capitalista tem de comprar do trabalhador o direito de utilizar sua
-
fora de trabalho, e, do proprietrio de terra, o direito de utilizar sua
terra. Para faz-lo, tem de possuir capital suficiente (Rubin, 1987).
Nesse sentido, a subsuno formal existir na medida em que a forma social
determinante na produo da vida material/concreta a venda pelo trabalhador da
propriedade de sua capacidade e/ou fora para o trabalho a fim de comprar os meios
necessrios para a subsistncia. Assim, a propriedade da fora de trabalho passar a
pertencer ao capitalista - proprietrio dos meios de produo que a consumir,
fazendo o vendedor dela trabalhar. O trabalhador ir incorporar trabalho humano ao
transformar a matria, objeto do seu trabalho, e valor alm do necessrio para sua
reproduo social. O produto do seu trabalho ser, portanto, alienado porque no
pertencer ao trabalhador, mas sim ao capitalista que prolongar o tempo de trabalho
para produzir valor alm do necessrio, a fim de extrair a mais valia (Marx, 1968;
Rubin, 1987).
O desenvolvimento da tecnologia no decorrer do sculo XX possibilitou a
diviso pormenorizada do trabalho, ou seja, o trabalhador tornou-se especialista
numa pequena parte do seu processo de trabalho e nesse momento que aparece a
subsuno real (Antunes, 2000).
O trabalhador, detentor do trabalho vivo - que acrescenta valor
mercadoria -, se torna mediador da tecnologia do trabalho morto - que j possui
armazenado em si mesmo o trabalho humano. As relaes de produo se coisificam
j que a relao homem-homem estabelecida na mediao de segunda ordem
subordina a relao ontolgica com a natureza para a satisfao de suas necessidades.
Assim, s h relao entre os produtores de mercadorias para sua troca material e as
mercadorias, por sua vez, se personificam tomando emprestadas caractersticas
humanas j que se trocam mutuamente e a relao homem-homem contida no valor
de troca fica subsumida nesse processo de fetichizao (Marx, 1968; Rubin, 1987).
Nesse sentido, o trabalhador, que diretamente produzir mais valia, gerar por
meio da venda do seu trabalho produtivo a valorizao do processo capitalista de
produo. Para Marx (1978:75),
o que constitui o valor de uso especfico [do trabalho produtivo] para
o capital no seu carter til determinado, como tampouco as
-
qualidades teis peculiares ao produto no qual se objetiva, mas seu
carter de elemento criador de valor de troca (mais-valia).
Por isso, um trabalho de contedo semelhante pode ser produtivo ou
improdutivo e a diferena estar no fato de o trabalho trocar-se por dinheiro como
dinheiro ou por dinheiro como capital (Marx, 1978).
3.2 O processo de trabalho em sade
O trabalho em sade se localiza no setor tercirio da produo capitalista o
campo do trabalho em servios e se diferencia da produo material industrial e do
trabalho no setor primrio da economia, desde a emergncia do modo de produo
capitalista (Pires, 1998).
Sob a anlise marxista, o trabalho em sade se define como um conjunto de
prticas sociais e saberes especficos que se realizam em sua relao com a totalidade
social e com cada uma das instncias que a integram e que consistem em uma infra-
estrutura econmica composta de foras produtivas e relaes de produo, e uma
superestrutura que compreende as instncias jurdicas, polticas e ideolgicas
(Garca, 1983).
Os elementos constitutivos do processo de trabalho em sade foram
inicialmente apontados por Mendes Gonalves (1979, 1992, 1994), que se valeu da
produo terica de Marx para decodificar os elementos do processo de trabalho em
sade, estudando primeiramente o trabalho mdico em sua dissertao de mestrado e,
em seguida, quando apresentou sua tese de doutoramento sobre a avaliao da
organizao tecnolgica das prticas sociais em sade.
Segundo Mendes Gonalves (1992), na sociedade comunitria primitiva o
principal agente do processo de trabalho em sade era o xam. Sua concepo de
doena e, conseqentemente, seu objeto de trabalho uma entidade que se apossa
de um indivduo, ou que se agrega a ele, fazendo-o sofrer seriam responsveis pela
realizao de rituais religiosos com a finalidade de atingir e expulsar a entidade-
doena. Assim, boa parte dos seus instrumentos de trabalho teriam qualidades
imediatamente rituais; porm, ao se valer de uma planta como parte de seu trabalho,
no seria de se supor que estaria fazendo uso das propriedades farmacolgicas da
-
mesma. Perceba-se que das propriedades rituais de que ele teria se valido, pois so
as nicas que fazem sentido. Eventualmente, uma importncia apenas secundria
seria atribuda ao fato de que esse doente se curasse, conforme os padres
contemporneos de julgamento sobre o que curar-se.
Na avaliao do autor, durante toda a histria das sociedades ocidentais, at
h cerca de dois sculos, os objetos dos processos de trabalho em sade sempre
foram ento representados por entidades. Um nico perodo importante constituiu-
se exceo, e por isso, quando a medicina moderna se descortinou como prtica
social, a partir do fim do sculo XVIII, tendeu a buscar na Grcia clssica seus
smbolos (Mendes Gonalves, 1992).
Assim, foi que a medicina hipocrtica empreendeu uma classificao, pela
observao do rol de alteraes naturais que fazem o homem sofrer, chamando a esse
processo clnica. A finalidade do trabalho mdico passou a ser o de imitar e
favorecer a natureza a encontrar o caminho do esforo bem sucedido, ou mesmo,
evitar seus fracassos, transformando um esforo mal-sucedido em seu oposto. O ato
de reconhecer o tipo de desequilbrio presente passou a chamar-se diagnstico e o
de saber para onde o conjunto de processos de reequilbrio se encaminhava designou-
se como prognstico (Mendes Gonalves, 1992).
Essa estrutura, assim reconhecida, legitimou da por diante o trabalho mdico
e, por conseguinte, a produo de servios de sade, nele centralizada. Tomando
como foco a doena e a doena do indivduo preencheu a literatura especializada e,
por conseqncia, as prticas de interveno em sade.
Recuperando os autores que se confrontaram com essa concepo Laurell e
Noriega (1989) trazem baila a articulao entre o processo social e o processo de
sade e doena que, para os autores, assume caractersticas heterogneas conforme o
modo como cada grupo social se insere na produo da vida material e se relaciona
com os outros grupos sociais constitutivos da sociedade.
Desse modo, o carter social do processo sade-doena advogado pela
medicina social se manifestar empiricamente com mais clareza na coletividade do
que no indivduo. Assim, ao reconhecer o processo sade-doena coletivo interessa
saber como o processo biolgico ocorre socialmente readquirindo ento a unidade
entre a doena e a sade, dicotomizada no pensamento mdico clnico. Isso
ocorre porque, visto como processo da coletividade, o preponderante o modo
-
biolgico de viver em sociedade, que expressar, por sua vez, os transtornos
biolgicos caractersticos, isto , a doena que no aparecer separada daquele:
ambos ocorrem como momentos de um mesmo processo, porm, diferenciveis
(Laurell, 1983).
A unidade bsica de sade, de acordo com Schraiber e Mendes Gonalves
(2000), destinada para uma estratificao especial de usurios, isto , para as
pessoas que se dirigem aos servios pela primeira vez. No se trata de uma primeira
vez na vida pessoal, mas na ocorrncia mrbida por algum tipo de sofrimento. Por
isso, os autores definem como uma ateno primeira e bsica, simultaneamente, j
que por ser o primeiro atendimento, servir obrigatoriamente como porta de entrada
para o sistema de assistncia sade. No sistema, desencadear um nvel especfico
de atendimento que resolver uma srie de necessidades que extrapolam a
interveno curativa individual.
Nesse sentido, de acordo com os autores, caber educao em sade a
transformao das necessidades no sentidas, definidas como necessidades
potenciais na linguagem sistmica dos sistemas de sade, em necessidades
reconhecidas como pertinentes a um cuidado bsico e inicial, isto , necessidades
sentidas pela populao e tecnologicamente apropriadas para uma ateno
primria.
Na Amrica Latina, a reforma do setor sade, empreendida a partir do incio
da dcada de 1980, tenta incorporar na rede bsica de servios de sade, as
conquistas democrticas alcanadas pelos povos latino-americanos e caribenhos
como resposta crise da sade pblica tradicional provocada pela centralidade do
trabalho mdico na produo de servios de sade, todavia como muitas das
reformas so apoiadas por organismos financeiros internacionais, h muita
divergncia em relao aos projetos originais da reforma sanitria. E assim que, a
democratizao da rede bsica de servios de sade ainda no proporciona a
publicizao (isto : controle pblico das polticas e prticas institucionais dos
respectivos Estados) dos seus aparelhos e mesmo de suas burocracias (Paim e
Almeida Filho, 1998:306).
Para Breilh (1995:29),
la salud pblica convencional conceptualiza la salud-enfermedad
empricamente, reducindola al plano fenomnico e individualizado
-
de la causalidad etiolgica, la salud colectiva plante ala
determinacin histrica del proceso colectivo de produccin de
estados de salud-enfermedad. Mientras la salud pblica acoge los
mtodos emprico-analtico (estructural funcionalista), popperiano o
fenomenolgico, la salud colectiva incorpora el mtodo materialista
dialctico. Mientras la salud pblica centra su accin desde la ptica
del Estado com los intereses que este representa em la sociedades
capitalistas, la salud colectiva se enfoca como recurso de la lucha
popular y la crtica-renovacin estratgica del quehacer estatal.
Mientras la salud pblica assume la actitud posibilista del logro de
mejoras puntuales y graduales, la salud colectiva plante ala
necesidad de uma accin para el cambio radical.
Do mesmo modo, o modelo da determinao social do processo sade doena
para Victora, Facchini, Barros e Lombardi (1990:303),
prope que, dado um determinado modo de produo, situa-se um
processo de reproduo social que se concretiza em uma dada
formao social. Essa formao determina a existncia de uma
estrutura de classes sociais e suas relaes. A dinmica de classe
implica em uma relao unitria entre produo e consumo; nesta
dialtica, a produo no ocorre na ausncia do consumo, e o
consumo depende da produo. A determinao do processo
biopsicossocial coletivo nas diferentes classes sociais mediado,
assim, pelos processos de produo e de consumo. No tocante
produo, a insero dos agentes sociais em processos concretos de
trabalho determina no somente sua prpria exposio a riscos
ocupacionais especficos como tambm seu acesso riqueza ali
produzida, atravs de seus rendimentos. Esses rendimentos, por sua
vez, determinam os nveis de consumo e, portanto, o acesso a bens
materiais de vida que incluem, entre outros, alimentao, moradia,
saneamento, assistncia mdica, escolaridade, etc. Assim, atravs da
dialtica produo-consumo, possvel entender os diferenciais de
sade entre os grupos sociais e dentro de cada grupo.
-
Assim sendo, o marco conceitual da sade coletiva permite uma delimitao
compreensivelmente provisria desse campo cientfico, enquanto campo de
conhecimento e mbito de prticas (Paim e Almeida Filho,1998:309).
Para Paim e Almeida Filho (1998:309), como campo de conhecimento a
sade coletiva prope
o estudo do fenmeno sade/doena em populaes enquanto
processo social; investiga a produo e a distribuio das doenas na
sociedade como processos de produo e reproduo social; analisa
as prticas de sade (processo de trabalho) na sua articulao com
as demais prticas sociais; procura compreender, enfim, as formas
com que a sociedade identifica suas necessidades e problemas de
sade, busca sua explicao e se organiza para enfrent-los.
E ainda como mbito de prticas, a sade coletiva
envolve determinadas prticas que tomam como objeto as
necessidades sociais de sade, como instrumentos de trabalho
distintos saberes, disciplinas, tecnologias materiais e no materiais, e
como atividades intervenes centradas nos grupos sociais e no
ambiente, independentemente do tipo de profissional e do modelo de
institucionalizao (Paim e Almeida Filho, 1998:309).
3.3 O trabalho da enfermagem em sade coletiva
Peduzzi (2001), ao sintetizar as diferentes abordagens sobre o trabalho da
enfermagem, aponta a existncia de duas correntes distintas: uma que percebe os
processos de trabalho da enfermagem como referidos ao processo de produo em
sade, tendo portanto a enfermagem o mesmo objeto das outras prticas sociais em
sade e instrumentos especficos; e outra que considera as especificidades dos
elementos que compem o processo de trabalho de enfermagem, tendo, portanto, no
s instrumentos prprios, mas tambm objeto e finalidade especficos.
-
A anlise macro-estrutural das determinaes sociais de produo ressaltada
na vertente terica do materialismo histrico e na matriz metodolgica da dialtica.
Os estudos acerca do processo de produo em sade e do trabalho da enfermagem
proporcionaram micro-anlises da enfermagem na formao social capitalista,
particularmente de sua constituio e evoluo histrica na sociedade brasileira,
delineando uma compreenso dessa prtica na sua dimenso histrica e social
(Almeida, Mishima e Peduzzi, 1999).
Ainda segundo as autoras, a produo da enfermagem nessa vertente
representada por estudos iniciais desenvolvidos entre a segunda metade de 1970 e a
primeira metade de 1980, quais sejam: Contribuio ao estudo da prtica de
enfermagem Brasil (Almeida et al, 1981), Educao e ideologia da enfermagem no
Brasil (Germano, 1983), Introduo anlise das transformaes da prtica de
enfermagem no Brasil no perodo de 1920-1978 (Silva et al, 1984) e Enfermagem
profissional: anlise crtica (Silva, 1986).
Segundo Almeida e Rocha (1997) a organizao tecnolgica da prtica de
enfermagem pode ser apreendida na sua relao com os outros trabalhos da sade na
sociedade capitalista e, nessa articulao, reconhecida a complementaridade desse
trabalho com os outros, bem como o espao institucional e social em que se realiza.
Ao analisar os processos de trabalho em sade e, mais especificamente, os processos
de trabalho da Enfermagem, possvel a apreenso das contradies e das dinmicas
da prtica como parte do conjunto de estratgias de mudana da realidade.
Este trabalho toma ento como referncia a abordagem de Queiroz e Salum
(1996, 2000), para quem o coletivo em sua dupla face corpo individual e coletivo
no o objeto especfico da Enfermagem, mas , por excelncia, objeto do processo
de produo dos servios de sade2. Os trabalhadores coletivos da rea da sade, por
sua vez, so os executores da poltica social pblica de sade, quer na estrutura
central, regional ou local.
Para as autoras, esse processo de produo agrega distintos processos de
trabalho - assistncia, gerncia, ensino e pesquisa nos quais se integram as prticas
sociais que a ele se subordinam. A prtica social da Enfermagem, portanto, ser
apenas um dos instrumentos da engrenagem que sustenta o processo de produo dos 2 Para Queiroz e Salum (1996), fundamentadas na produo de Breilh e Granda (1986), os perfis de reproduo social e de sade-doena dos grupos sociais homogneos compem perfis epidemiolgicos que constituem o objeto do processo de produo de servios de sade agregando potenciais de desgaste e de fortalecimento nas diferentes formas de trabalhar e de viver.
-
servios de sade. Nessa perspectiva, os trabalhadores de sade em geral, e os da
enfermagem, em particular, so os sujeitos sociais que desempenham o trabalho em
si nos distintos processos de trabalho das suas prticas sociais no cotidiano do
servio.
O processo de trabalho da assistncia tem por objeto os perfis de reproduo
social e de sade-doena do indivduo/famlia, grupos ou classes sociais e a
totalidade, como finalidade a transformao desses perfis, visando o aperfeioamento
dos processos sade-doena do coletivo, agregando para meios e instrumentos os
recursos materiais, os trabalhadores em sade e saberes como a epidemiologia, a
clnica, a educao em sade entre outros (Queiroz e Salum, 1996).
Para a prtica social da Enfermagem so especficos os meios e instrumentos
de trabalho do processo de trabalho da assistncia como, por exemplo, na dimenso
indivduo/famlia a consulta de enfermagem, a visita domiciliria e a prescrio de
enfermagem e, na dimenso dos grupos ou classes sociais, por meio da articulao
com as instituies do territrio podem-se realizar atividades que a realidade
epidemiolgica e sanitria exige como, por exemplo, a vacinao, as atividades
educativas, entre outras (Queiroz e Salum, 1996).
J
o objeto do processo de trabalho de gerenciamento da produo da
assistncia no recorte da enfermagem a dinmica de como se
processa a assistncia de enfermagem privilegiando aes sobre os
perfis epidemiolgicos do coletivo (que integra as metodologias de
assistncia sob a perspectiva da complementaridade da prtica de
enfermagem com as demais prticas sociais) e a finalidade especfica
a de compatibilizar essa dinmica s necessidades de transformao
dos perfis epidemiolgicos. Dentre os instrumentos de trabalho,
podemos destacar, entre outros, os modelos e os mtodos gerenciais, o
processo de educao continuada; o trabalho em si se d sob a
orientao do plano diretor para a sade do municpio e pelo plano
diretor para a assistncia de enfermagem a ele subordinado (Queiroz,
Salum, 2000).
-
Por sua vez, o processo de trabalho do ensino tem por objeto o conhecimento
prvio do aluno acerca do trabalho em sade e como finalidade o aprimoramento da
sua capacidade para o trabalho em sade em consonncia com a finalidade do
trabalho que o aperfeioamento dos perfis epidemiolgicos. Para que ocorra de fato
a transformao dos perfis, faz-se necessrio que os alunos dominem seu processo de
trabalho e os instrumentos utilizados para seu aprimoramento so os mtodos
pedaggicos (Queiroz e Salum, 1996).
Neste caso, a Enfermagem agregar especificamente o treinamento, avaliao
e aprimoramento dos trabalhadores de enfermagem, a participao em bancas
examinadoras para provimento de cargos da enfermagem e as atualizaes do
trabalho da enfermagem (Queiroz e Salum, 1996).
Finalmente, o processo de trabalho da pesquisa tem por objeto o estado da
arte que caracteriza o saber/saber fazer da enfermagem. A finalidade diz respeito ao
aperfeioamento desse saber, aproximando-se do objeto e da finalidade do processo
de produo de servios de sade. Os instrumentos se referem aos referenciais
terico-metodolgicos e ao conjunto de mtodos e tcnicas necessrios
investigao cientfica (Queiroz e Salum, 2000).
Nos diferentes processos de trabalho - da assistncia, gerncia, ensino e
pesquisa das prticas sociais em sade que so os instrumentos da produo de
servios de sade, os trabalhadores em sade e, particularmente, os trabalhadores da
enfermagem, so os instrumentos que realizam o prprio trabalho ou o trabalho em si
(Queiroz e Salum, 1996).
3.4 O processo de trabalho educativo em sade
O presente estudo enfatiza a discusso acerca da educao como parte
indissocivel das relaes de produo, j que perpassa a atividade do trabalhador
quando ele de algum modo se vale de seus conhecimentos tcnicos especficos ao
interferir no mundo, transformando a natureza e se transformando nesse processo.
A transformao da natureza teleologicamente alcanada por meio da
construo prvia da subjetividade sob a forma de uma finalidade que orientar todas
as aes que viro a seguir. A prvia ideao portadora de uma finalidade para a
-
produo do objeto de trabalho no apenas um processo de objetivao, mas
tambm a exteriorizao de um sujeito. A exteriorizao da individualidade
tambm uma exteriorizao historicamente determinada de desenvolvimento social;
por isso, ao objetivar o objeto de trabalho, o indivduo adquire novos conhecimentos,
tanto da realidade exterior, como da sua prpria individualidade (Lessa, 1996).
Conforme visto anteriormente, ainda que o trabalho em sade seja
fragmentado em mltiplos atos componentes das chamadas prticas sociais em
sade -, a produo de servios de sade e, mais especificamente, a prtica da
enfermagem em sade coletiva integra quatro grandes processos de trabalho
(Queiroz, Salum, 1996):
1- o trabalho de assistncia sade,
2- o de gerenciamento da assistncia sade,
3- o de ensino para a qualificao dos trabalhadores em sade e
4- o de investigao em sade.
Os conhecimentos advindos da epidemiologia, da clnica e da educao em
sade, por exemplo, apoiaro esses distintos processos de trabalho, constituindo-se
como instrumentos do processo de produo dos servios em sade e da prtica da
enfermagem em sade coletiva.
Embora o processo educativo possa constituir em si um processo de trabalho,
a educao aplicada sade pode ser vista pelo seu carter instrumental nos
diferentes processos de trabalho em sade. Nesse sentido, um dos instrumentos de
trabalho mais familiares prtica social da enfermagem no trabalho de assistncia e
de ensino sade so as atividades educativas (Soares, Salum, 1999).
Segundo Paro (2001), a educao, enquanto relao homem-homem, pode ser
compreendida como a apropriao do saber historicamente produzido e o recurso
de que as sociedades dispem para que a produo cultural da humanidade no se
perca, passando de gerao a gerao. Desse modo, o autor acredita que a educao
constitui a mediao pela qual os seres humanos garantem a perpetuao do seu
carter histrico. Isto , se o homem se faz histrico porque o construtor de sua
prpria humanidade, e se essa criao s se d pela mediao dos conhecimentos,
tcnicas, valores, instrumentos - tudo enfim o que consubstancia a cultura construda
pelos prprios homens - ento a educao, ao propiciar a apropriao dessa cultura,
imprescindvel para o desenvolvimento histrico.
-
Entendida a educao como a apropriao de um saber (conhecimentos,
valores, atitudes, comportamentos, etc) historicamente produzido, a considerao de
seu produto no pode restringir-se ao ato de consumo imediato e completo, sem
deixar nenhum vestgio. Nesse ato, o educando apropria-se de um saber que a ele
incorporado e se prolonga para alm do ato de produo, por toda a vida do
indivduo. H, portanto, algo que permanece para alm do ato de aprender. Nesse
sentido, o educando no se apresenta unicamente como consumidor do produto, mas
tambm como objeto de trabalho da prtica da atividade educativa. O educando o
verdadeiro objeto sobre o qual se processa o trabalho pedaggico e que com o
agente do trabalho se transforma nesse processo, permanecendo para alm dele
(Paro, 2002b).
Por conseguinte, inspirando-se nas proposies de Paro (2002a) para a rea
da educao e transportando-as para a educao em sade, pode-se afirmar que os
usurios dos servios de sade no so apenas consumidores, por exemplo, da
orientao individual ou do grupo educativo, alm disso, agem no processo educativo
em curso com vistas consecuo de um fim educativo, revelando sua dimenso de
co-produo juntamente com as outras pessoas envolvidas tambm ativamente no
processo pedaggico. Ao sustentar a dupla dimenso, como objeto de trabalho do
agente educativo e de produtor, ou seja, de realizador de sua prpria educao,
configura-se a participao dos usurios dos servios de sade na atividade educativa
no s como objeto, mas igualmente enquanto sujeito da educao.
Segundo Freire (2002), na prtica problematizadora da realidade, os sujeitos
desenvolvem o poder de captao e de compreenso do mundo que lhes aparece, em
suas relaes com ele, no mais como uma realidade esttica, mas como uma
realidade em transformao, em processo. Dessa forma, aprofundando a tomada de
conscincia da situao, os homens se apropriam dela como realidade histrica,
por isso mesmo, capaz de ser transformada por eles.
A subjetividade do indivduo, ao adquirir novas habilidades e conhecimentos,
espontaneamente os generaliza de modo que sejam teis no apenas para a
singularidade da situao em que surgiram, mas para a maior parte dos momentos
futuros, por mais diferenciados que sejam (Lessa, 1996).
Para tanto, o ponto de partida da educao para a compreenso dessa
realidade a contextualizao da prtica social que comum, tanto para o agente,
-
como para o sujeito da atividade educativa. Enquanto o agente da atividade educativa
tem uma compreenso sinttica, mas ainda precria da realidade, a compreenso dos
sujeitos inicialmente confusa e fragmentada - sincrtica (Saviani, 2003).
Segundo o autor,
a compreenso dos agentes sinttica porque implica uma certa
articulao dos conhecimentos e das experincias que detm
relativamente prtica social. Todavia precria uma vez que, por
mais articulados que sejam os conhecimentos e as experincias, a
insero de sua prpria prtica pedaggica como uma dimenso da
prtica social envolve uma antecipao do que lhe ser possvel fazer
com alunos cujos nveis de compreenso ele no pode conhecer, no
ponto de partida, seno de forma precria. Por seu lado, a
compreenso dos alunos sincrtica uma vez que, por mais
conhecimentos e experincias que detenham, sua prpria condio de
alunos implica uma impossibilidade, no ponto de partida, de
articulao da experincia pedaggica na prtica social de que
participam (Saviani, 2003:70).
O segundo passo na educao a problematizao e identificao dos temas
centrais que precisam ser resolvidos no mbito da prtica social e, em conseqncia,
a determinao de qual conhecimento necessrio dominar. Por sua vez, o terceiro
passo a instrumentalizao terica e prtica necessria aos sujeitos da atividade
educativa para a apropriao e equacionamento dos problemas detectados na prtica
social por meio das ferramentas culturais necessrias luta social para a libertao
das condies de explorao. O quarto passo ser a catarse, entendida como a
expresso elaborada da nova forma de entendimento da prtica social a que se
ascendeu na incorporao dos instrumentos culturais, transformados agora em
elementos ativos de transformao social. E, finalmente, o quinto passo ser a
prpria prtica social, compreendida no mais em termos sincrticos pelos sujeitos
(Saviani, 2003).
Partindo ento do pressuposto que o objeto da produo de servios em sade
so os perfis de reproduo social e de sade-doena evidenciados no territrio e a
finalidade a sua transformao, visando o aperfeioamento dos processos sade-
-
doena de todos os habitantes, o trabalho em si das distintas prticas sociais
corresponder aos processos de trabalho (da assistncia, gerncia, ensino e
investigao) necessrios para tal produo e a educao em sade estar inserida
como instrumento, por exemplo, do processo de trabalho da assistncia sade, a
fim de criar possibilidades concretas para que a populao participe como sujeito
histrico co-produtor ativo da transformao de seus perfis.
De acordo com Paro (2002a), Merhy (1987), Gonzaga (1992a), Alves (1993),
Cezar Vaz, Sena, Martins, Rubira, Santos, Cabreira et al (2003), entre outros autores,
a educao uma prtica social, histrica e poltica que se articula com as outras
prticas sociais, por isso, a ao educativa em sade possui uma interdependncia
com a formao acadmica de cada trabalhador, com o contexto histrico vivenciado
e com a instituio em que essa prtica se concretiza.
A ontologia lukacsiana reitera que a essncia humana historicamente
determinada pela reproduo social: so os homens que fazem a prpria histria
ainda que em circunstncias que no escolheram, portanto, no h uma essncia
humana a-histrica que no possa ser subvertida pelos atos humanos (Lessa, 1996).
3.4.1 O objeto do processo de trabalho educativo em sade
Mendes Gonalves (1992) ressalta que o objeto de trabalho no se delimita
por si mesmo, mas delimitado pelo olhar de um sujeito que antev em um certo
fragmento da natureza um certo resultado potencial esboado num projeto subjetivo.
Toda objetualidade da natureza decorre da presena de um sujeito, para o qual ela
objeto, articulando subjetividade e objetividade. Se o sujeito transformar a si prprio
enquanto se reproduz s custas da transformao da natureza, ambos se tornaro
histricos.
Nesse sentido, entre a prvia ideao e o objeto de trabalho dela resultante
reside a objetivao-exteriorizao que o construto humano ontolgico do ser
social que jamais coincidir completamente com a finalidade que est na sua origem
(Lessa, 1996).
Ainda segundo o autor, o resultado no corresponder completamente
finalidade por que (Lessa, 1996:27):
1)existe o acaso presente nas objetivaes,
-
2)o fato do novo objeto desencadear nexos causais que jamais
poderiam ser previstos em sua totalidade,
3)a individualidade que iniciou o processo de objetivao no o
mesmo daquela que o termina novas habilidades e conhecimentos
foram adquiridos enquanto o processo era efetivado e essas novas
habilidades e conhecimentos so espontaneamente incorporados
prvia ideao adaptando-se s novas circunstncias.
De acordo com Gonzaga (1992a), o trabalho da educao em sade ter como
objeto a prxis humana, entendida como articulao pensamento-ao e possibilidade
de transposio do cotidiano a partir dele prprio.
Assim, o trabalho educativo em si, que pode ser planejado e executado
pelo conjunto de trabalhadores da sade orientados por um projeto
que articula clnica e epidemiologia, sob a perspectiva do pensamento
social em sade, na sua articulao, produzem a transformao no
objeto (Queiroz e Salum, 1996).
Para Bernardo (1991:17) a prtica a inter-relao sujeito-sujeito [...] e a
relao sujeito-objeto [...], cujos produtos so relativamente exteriorizados nessa
prtica.
Assim, pode-se empreender que o objeto do trabalho educativo da
enfermagem em sade coletiva, parte integrante do processo de construo do objeto
da produo dos servios de sade e da prpria prtica de enfermagem em sade
coletiva ser, portanto, a prxis humana, isto , a articulao entre a ao sobre a vida
material e a reflexo sobre a prtica no cotidiano do trabalho.
Para Vzquez (1986), existem diferentes nveis de prxis, que variam de
acordo com o grau de penetrao da conscincia do sujeito ativo no processo prtico
e com o grau de criao ou humanizao da matria transformada evidenciado no
produto de sua atividade prtica.
Os trabalhadores coletivos em sade e, particularmente os trabalhadores da
Enfermagem, tm na expresso do objeto do seu trabalho educativo o conhecimento
-
acerca de algum aspecto da realidade social e de sade a ser transformado que se
exterioriza nos usurios dos servios de sade.
Todavia, enquanto o objeto de trabalho material impe oposio sua
transformao passiva, a resposta do usurio de acordo com Paro (2002b:32),
se d de acordo com sua especificidade humana, que ao mesmo
tempo natural e transcendncia do natural. , pois, uma participao
ativa, enquanto ser histrico.
Por isso, conclui-se que o objeto do trabalho educativo da enfermagem em
sade coletiva somente atingir a prxis humana quando o trabalhador assumir o
usurio como objeto e co-produtor do seu trabalho, uma vez que,
num processo pedaggico legtimo, o educando no apenas est
presente, mas tambm participa das atividades que a se desenvolvem.
A prpria necessidade da participao ativa do aluno s se faz
presente porque a educao supe uma modificao na natureza do
seu objeto (Paro, 2002a:144).
A especificidade do trabalho pedaggico pressupe que o saber envolvido no
processo educativo no pode ser expropriado do agente da atividade educativa sob
pena de descaracterizar-se o prprio processo pedaggico, j que o trabalhador que
realiza o trabalho em si (Paro, 2002a).
Caso o trabalhador acredite que o usurio apenas o objeto do seu trabalho, a
atividade no potencializar sua participao ativa como sujeito co-produtor da
atividade pedaggica. Enquanto objeto, ser consumidor do produto no momento da
sua produo e como sujeito, portador de um saber matria prima do processo, que
dar substncia e contedo a prpria relao educador-educando (Paro, 2002a).
Por isso, o conhecimento do trabalhador coletivo de sade e, mais
especificamente, dos trabalhadores de enfermagem acerca do objeto de trabalho
educativo ser esquadrinhado por sua concepo de sade e de educao. Esse
-
conhecimento, que captura a partir da natureza aquilo que ser objeto de trabalho
educativo, subordina os saberes operantes/instrumentais3, por exemplo, a concepo
de educao em sade nos prximos passos constitutivos do processo de trabalho
educativo em sade.
3.4.2 Os meios e instrumentos do processo de trabalho educativo em sade
A apreenso do objeto consiste basicamente na identificao de suas
caractersticas que permitem a visualizao do produto final, antevisto nas
finalidades do trabalho (Mendes Gonalves, 1994:61-62). Como esses produtos,
enquanto expresses de necessidades so demarcados por caractersticas concretas de
historicidade - e, nesse sentido, variam, - devem tambm variar os vieses dos
procedimentos que, ao apreenderem o objeto, executam projees do produto. Porm
rigorosamente, os procedimentos em questo no apreendem o objeto, que nesse caso
deveria ser suposto como existindo enquanto tal antes de sua apreenso que
varivel; medida que no existem objetos do trabalho seno no trabalho, tais
procedimentos apreendem os objetos possveis de trabalho (Mendes Gonalves,
1994).
Para Marx (1968:205) a atividade do homem opera uma transformao,
subordinada a um determinado fim, no objeto sobre que atua por meio do
instrumental de trabalho.
Nesse sentido, os instrumentos de trabalho correspondem maneira como os
saberes operantes/instrumentais, recursos materiais e a fora de trabalho constitutivos
do trabalho concreto - que s transformar-se em trabalho abstrato por intermdio da
troca como forma social de produo - se incorporam no processo de trabalho e
sintetizam num produto um valor de uso, um material da natureza adaptado s
necessidades humanas por meio da mudana de forma (Marx, 1968:205).
J os meios de trabalho, dirigem a sntese da qualidade/utilidade do objeto e o
projeto da finalidade, no sentido de que
3 Segundo Paro (2002a) o saber fazer o conhecimento que articula todos os elementos constitutivos do trabalho pedaggico e o saber que se passa aquele que instrumentaliza a transformao do tema
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so uma coisa ou um complexo de coisas que o trabalhador insere
entre si mesmo e o objeto de trabalho e lhe serve para dirigir sua
atividade sobre esse objeto. Alm disso, medem o desenvolvimento da
fora humana de trabalho e indicam as condies sociais em que se
realiza o trabalho (Marx, 1968:203).
Ao integrar o processo de trabalho educativo, de que se vale a prtica social
da enfermagem, os instrumentos de trabalho correspondem ao trabalho morto
incorporado ao objeto para atingir a finalidade - produto do processo de trabalho. E
preciso lembrar que, desse modo, os instrumentos de trabalho, por si s no
garantiro o bom encaminhamento do processo de trabalho. A continuidade do
processo de consumo dos instrumentos para a transformao do objeto depender da
maneira como recortado esse mesmo objeto, j que ser o trabalho vivo do
trabalhador de sade dirigido ao recorte da natureza em que visualiza o objeto de
trabalho que dar as diretrizes para uso dos instrumentos de trabalho (Marx, 1968 e
Mendes Gonalves, 1992).
Segundo Mendes Gonalves (1992), algo s se tornar instrumento de
trabalho quando o sujeito dotado de um projeto o utilizar, mas apenas enquanto se
usar dele, se valer de suas qualidades, ou seja, de seu valor de uso.
Quando o trabalhador assume indiscriminadamente os instrumentos de
trabalho e apia todo seu processo de trabalho na sua reproduo sem considerar o
recorte da natureza a ser transformada - objeto de trabalho -, os instrumentos no so
utilizados em toda sua potencialidade. Como afirma Marx (1968:229), os
trabalhadores se tornaro complementos vivos de um mecanismo morto que existir
independente deles.
3.4.3 A finalidade do processo de trabalho educativo em sade
Para Mendes Gonalves (1992), a atividade do trabalho humano est
vinculada a uma finalidade sempre presente antes e durante o processo de trabalho.
para os sujeitos do processo de trabalho pedaggico.
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No fim do processo de trabalho aparece um resultado que j existia antes
subjetivamente na imaginao do trabalhador.
Ele no transforma apenas o material sobre o qual opera; ele imprime
ao material o projeto que tinha conscientemente em mira, o qual
constitui a lei determinante do seu modo de operar e ao qual tem de
subordinar sua vontade (Marx, 1968:202).
Dessa maneira, a individualidade e a prpria finalidade so transformadas ao
longo do processo de objetivao-exteriorizao. Todo processo de objetivao
resulta necessariamente num processo objetivo de generalizao dos resultados
alcanados e a cada nova objetivao, a totalidade do ambiente no qual est inserido
o indivduo tambm se altera. Os atos singulares agem sobre os outros indivduos
que esto sua volta fazendo com que todos os que vivem naquele ambiente estejam
expostos s conseqncias e respondam s novas necessidades na explorao das
novas possibilidades dispostas nas novas situaes que surgem incessantemente
(Lessa, 1996).
A finalidade do trabalho educativo da enfermagem em sade coletiva ser
determinada pela transformao do objeto co-produtor a fim de alcanar a
apropriao do que foi produzido historicamente para monitorar os perfis de
reproduo social e de sade-doena. Conseqentemente, ser a concretizao do
que foi antevisto antes de iniciado o processo educativo, ou seja, ser a
materializao da transformao do objeto co-produtor.
Para Cezar Vaz, Sena, Martins, Rubira, Santos, Cabreira et al (2003), se o que
se quer nas atividades educativas alcanar a dimenso social do usurio em suas
determinaes sociais e histricas, torna-se necessrio assumir essas determinaes
como finalidade do trabalho e apropriar-se de instrumentos para sua transformao.
Como Queiroz e Salum (1996) consideram, a finalidade do processo de
produo dos servios de sade ser a transformao dos perfis de reproduo social
e perfis sade-doena nos grupos sociais homogneos (objeto de trabalho) visando o
aperfeioamento dos processos sade-doena do coletivo.
-
Se assim , para o aperfeioamento dos perfis epidemiolgicos do coletivo
torna-se necessria a participao dos usurios no reconhecimento de suas formas de
reproduo social, dos potenciais de desgaste e fortalecimento a que esto expostos e
ainda das manifestaes de desgaste e de fortalecimento que vo se evidenciando ao
longo de suas vidas. Essa participao se dar na medida em que os trabalhos
educativos com os usurios f