a parceria entre as escolas e universidade no estÁgio

13
1166 A PARCERIA ENTRE AS ESCOLAS E UNIVERSIDADE NO ESTÁGIO SUPERVISIONADO DE EDUCAÇÃO FÍSICA Profa. Dra. Larissa Cerignoni Benites Universidada Estadual Paulista- Campus Rio Claro [email protected] Prof. Dr. Samuel de Souza Neto Universidada Estadual Paulista- Campus Rio Claro Profa. Dra. Cecília Borges Université de Montréal Relato de Pesquisa- Eixo 01 - Formação inicial de professores de educação básica 1. INTRODUÇÃO Os estudos realizados sobre Estágio Curricular Supervisionado- ECS vem ganhado força e destaque nos últimos anos (PIMENTA; LIMA, 2011) e a legislação brasileira tem acompanhado esse processo definindo diretrizes que visam o desenvolvimento de acordos entre as instâncias envolvidas, dando ao estágio um lugar de destaque na formação dos futuros professores (BRASIL, 2002; 2008). Trata-se de um processo histórico, que aos poucos se consolida, mas não é isento de conflitos e embates que proporcionam a reflexão e discussão do estágio, de suas lacunas, dos papéis dos envolvidos (professor-colaborador i -PC, supervisores, pessoal escolar, etc.), enfim, das parcerias entre as Universidades e as escolas (BENITES, 2013). Sobre as parcerias e a participação das escolas na formação de futuros docentes, observa-se que a Universidade tem hegemonia nas decisões que afetam os ECS. A escola por sua vez, acolhe os estagiários e dispõe de um professor, o qual, ultrapassando sua missão primária de ensinar alunos, passa a acompanhar os estudantes durante esta etapa da formação profissional (BENITES, 2012). As duas instituições não gozam do mesmo estatuto e possuem uma relação que por vezes é conflituosa, sendo que a concretização da parceria, como como um processo de negociação que tem como finalidade atingir objetivos comuns, mantendo as especificidades de cada parceiro e sendo um espaço flexível aos imprevistos e reajustes durante seu desenvolvimento (CARRILHO, 2008) é algo difícil de ser conquistado. Nas orientações legais como na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, na Constituição Federal e mesmo na última Lei do estágio, esse termo ‘parceria’ é inexistente, aparecendo, em contrapartida, a noção de colaboração (BRASIL, 1988; 1996; 2008) que

Upload: others

Post on 16-Oct-2021

0 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

1166

A PARCERIA ENTRE AS ESCOLAS E UNIVERSIDADE NO ESTÁGIO SUPERVISIONADODE EDUCAÇÃO FÍSICA

Profa. Dra. Larissa Cerignoni BenitesUniversidada Estadual Paulista- Campus Rio Claro

[email protected]

Prof. Dr. Samuel de Souza NetoUniversidada Estadual Paulista- Campus Rio Claro

Profa. Dra. Cecília BorgesUniversité de Montréal

Relato de Pesquisa- Eixo 01 - Formação inicial de professores de educação básica

1. INTRODUÇÃO

Os estudos realizados sobre Estágio Curricular Supervisionado- ECS vem ganhado

força e destaque nos últimos anos (PIMENTA; LIMA, 2011) e a legislação brasileira tem

acompanhado esse processo definindo diretrizes que visam o desenvolvimento de acordos

entre as instâncias envolvidas, dando ao estágio um lugar de destaque na formação dos

futuros professores (BRASIL, 2002; 2008).

Trata-se de um processo histórico, que aos poucos se consolida, mas não é isento de

conflitos e embates que proporcionam a reflexão e discussão do estágio, de suas lacunas,

dos papéis dos envolvidos (professor-colaboradori-PC, supervisores, pessoal escolar, etc.),

enfim, das parcerias entre as Universidades e as escolas (BENITES, 2013).

Sobre as parcerias e a participação das escolas na formação de futuros docentes,

observa-se que a Universidade tem hegemonia nas decisões que afetam os ECS. A escola

por sua vez, acolhe os estagiários e dispõe de um professor, o qual, ultrapassando sua

missão primária de ensinar alunos, passa a acompanhar os estudantes durante esta etapa

da formação profissional (BENITES, 2012).

As duas instituições não gozam do mesmo estatuto e possuem uma relação que por

vezes é conflituosa, sendo que a concretização da parceria, como como um processo de

negociação que tem como finalidade atingir objetivos comuns, mantendo as especificidades

de cada parceiro e sendo um espaço flexível aos imprevistos e reajustes durante seu

desenvolvimento (CARRILHO, 2008) é algo difícil de ser conquistado.

Nas orientações legais como na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, na

Constituição Federal e mesmo na última Lei do estágio, esse termo ‘parceria’ é inexistente,

aparecendo, em contrapartida, a noção de colaboração (BRASIL, 1988; 1996; 2008) que

1167

comporta a ideia de cumprimento dos acordos, tais como celebrar o termo de compromisso

do estágio, ofertar instalações, indicar um PC, acompanhar o progresso das atividades,

confeccionar relatórios. Não se fazendo menção ao item “estabelecer objetivos comuns”.

Considerando esse contexto, é possível pensar no estabelecimento de parceria entre a

Universidade-Escola no âmbito do ECS? Este questionamento é central em nossa reflexão,

que tem como objetivo apontar pistas sobre a participação da escola durante o ECS,

segundo a visão dos próprios sujeitos escolares implicados nos estágios.

2. ESTÁGIOS E FORMAÇÃO INICIAL

O ECS se apresenta como uma experiência ímpar e significativa na formação do

futuro professor sendo marcante pela duração e intensidade (TARDIF; LESSARD, 1999) e

capaz de alterar profundamente a percepção do estudante em relação à carreira docente.

Todavia, bem que exista uma convergência quanto à contribuição do estágio na

formação do futuro professor, a ausência de condições favoráveis para a realização do

mesmo é por vezes evocada como uma das causas de seu baixo impacto na formação do

futuro professor, fazendo com que não se registre experiências proveitosas para os

estagiários (DESBIEN; SPALLANZANI; BORGES, 2012).

Nesse sentido, às condições de preparo para a realização dos ECS se tornam

fundamentais afim de garantir uma formação inicial de qualidade em meio escolar. No Brasil,

essa preocupação é recente e procura alterar a relação dicotômica entre a Universidade e a

escola, na qual a primeira é considerada o lugar da teoria e a segundo como o lugar da

prática (FRANCO, 2008).

Essa dicotomia, na verdade é o resultado do modelo da academização presente no

cenário brasileiro na formação docente, no qual o processo de formação é conduzido pela

lógica da ação tradicional do ensino superior e fragilizado do ponto de vista da lógica

inerente a prática profissional (FORMOSINHO, 2009).

Em síntese, esse é o contexto no qual o ECS se insere e vem sendo formalizado. E,

ainda que se observe nos últimos anos, na literatura e na legislação educacional, um esforço

significativo para a sua melhoria, forçosamente constatamos que ambas instituições, escola

e Universidade, manifestam um certo descompasso em relação a visão ou projeto de

formação de futuros docentes. Urgindo uma mudança afim de criar relações mais profundas

entre as instituições de ensino para dar aos estágios uma nova reinterpretação que aproxime

a Universidade do mundo do trabalho docente e inclua a escola como partícipe do processo

de formação de seus futuros professores.

1168

2.1- Sobre as parcerias no ECS

Em âmbito internacional existem experiências de ECS amparados por modelos de

formação distintos dos que ocorrem no Brasil, colocando em evidência, de maneira mais

formal a prática profissional e os vínculos entre a Universidade e a escola.

A exemplo disso encontram-se, na realidade norte-americana (EUA e Canadá),

cursos de formação de professores que, aderindo o modelo reflexivo de Schön (1992), que

após transformações profundas, passaram a privilegiar o papel da experiência de campo na

formação de professores (COCHRAN-SMITH; LYTLE, 2009), bem como a rejeição da

dualidade teoria e a prática, relacionando os conhecimentos de maneira menos hierárquica e

buscando parceriasii entre os diferentes espaços de formação (ZEICHNER, 2010).

A criação de parcerias entre a Universidade e a escola na perspectiva norte-

americana tem sido a bandeira de luta de muitos estudiosos que defendem uma nova ordem

para os ECS. Entre outros, tem-se como objetivo a aproximação das instituições escolares e

universitária, o aumento das horas de estágio e a promoção da melhoria da formação dos

envolvidos.

Nesse sentindo, destacamos algumas experiências de parceria, como por exemplo, a

de Morin (2004) que salientou a melhora na comunicação e do estreitamento dos vínculos

Universidade-Escola como ponto fundamental do processo de acompanhamento de

estagiários, destacando a necessidade de tempo e amadurecimento para que se estabeleça

um ambiente de parceria.

Já Banville (2006), também ressalta que as vivências de parcerias formais, a longo

prazo, aproximam o estagiário e o PC e trazem uma contribuição significativa para

estagiários quanto ao processo de formação à docência. Sofo e Curtner-Smith (2010),

Kulinna et al. (2010) e Christenson e Barney (2011) em suas investigações chegaram a

constatações similares. Segundo estes autores, para a parceria funcionar é necessário o

envolvimento da escola para alterar as crenças dos estagiários. Além disso, eles verificaram

que os PC afetam o comportamento do estagiário, ressaltando que a colaboração bem

sucedida é aquela na qual ambos os parceiros, reconhecendo seus papéis e

potencialidades, se esforçam para que o estágio aconteça.

Por fim, cabe mencionar o estudo de Gervais e Desrosiers (2005) que teve como

objetivo analisar se a escola pode ser um lugar de formação docente no momento do ECS.

Este estudo chamou nossa atenção em relação ao seu desenho metodológico, ao modelo de

parceria (alternância entre a Universidade e a escola) que vem sendo preconizado na

1169

Província do Quebec e sobre a existência de uma formação específica para os PC,

tornando-se um estudo-referência para a proposta desse estudo que realizamos.

3. METODOLOGIA

A pesquisa aqui apresentada é do tipo qualitativa interpretativa e buscou apontar

pistas sobre a participação da escola durante o ECS, segundo a visão dos próprios sujeitos

escolares implicados nos estágios.

A pesquisa foi realizada no Município de Rio Claro-SP, na UNESP/RCiii e em seis

escolas que recebem os estagiários do curso de Licenciatura em Educação Física. Em cada

uma dessas unidades participaram os Diretores (D, n=6), os Coordenadores Pedagógicos

(CP, n=5) e os PC’s (PC, n=6), totalizando 17 participantes.

Como instrumento utilizou-se um questionário com questões abertas inspirado na

obra de Gervais e Desrosiers (2005)iv. Foram construídos três questionários, um para cada

tipo de sujeito com quatro blocos de perguntas, estabelecidos de acordo com a função dos

respondentes. Os participantes o receberam em seus locais de trabalho e tiveram um prazo

para devolutiva. Os questionários foram transcritos constituindo, assim, o corpus de dados

para a análise.

A análise dos dados foi baseada na abordagem temática interpretativa (PAILLÉ;

MUCCHIELLI, 2012) que tem como objetivo tematizar os dados utilizando o corpus da

pesquisa, ou seja os materiais coletados e transformados em documentos textuais; no nosso

caso os questionários. Ao final da análise, os temas passaram por um processo de

aglutinação chegando-se a três eixos temáticos que serão apresentados a seguir.

4. PRINCIPAIS RESULTADOS

Nas subseções seguintes apresentamos os principais resultados com base nos três

eixos temáticos supracitados e aproveitamos para interpretar e discutir os apontamentos à

luz da literatura sobre os ECS.

4.1 O contexto do estágio na escola

As escolas participantes são instituições que atendem diferentes públicos indo da

Educação Infantil ao Ensino Médio. Os Diretores e Coordenadores evidenciaram que a

escola onde atuam está aberta e disponível ao estágio, compreendendo o mesmo como um

momento fundamental para a formação, pois este permite aos estagiários conhecer a

realidade educacional.

1170

Essa prática permite ao aluno conhecer a realidade da sua profissão erefletir sobre seus desafios. É um momento de aprendizagem para quechegue melhor preparado para lidar com o cotidiano escolar (C1).

Estes participantes mencionam que as escolas possuem interesse em receber

estagiários para “atender a legislação vigente” (D6) e “desenvolver parcerias com a

Universidade e socializar experiências...” (C5).

Na maioria das respostas ao questionário, a visão sobre o ECS é a de uma prática

instituída, onde a escola realiza uma contribuição social ao receber os estagiários e por

assim dizer, também se nutre dessa relação. Em alguns casos, o discurso dos respondentes

evoca uma obrigação em atender aos pedidos da Universidade, como se nota nos

comentários de D2, mencionando que nos atuais moldes do estágio a “escola não se

beneficia com a presença de estagiários por serem muitos, o que não permite um contato

individual e a troca de informações”.

Esse comentário reflete a condição de todas as escolas investigadas que se deparam

com o fato de receberem estagiários de várias Universidades/Faculdades e de domínios

diferentes, ultrapassando o seu limite, mas atendendo as prerrogativas administrativas, da

Secretaria de Educação e das próprias Universidades.

São várias as Universidades/Faculdades que encaminham estagiários(UNESP, Claretianas, Asser, COC, Anhanguera, etc) e ultimamente temosrecebido também alunos que fazem graduação e pós-graduação à distância.(C4).

Com esse contingente grande e crescente, o problema mais imediato torna-se

encontrar um PC que possa acolher os estagiários e em algumas escolas o mesmo é

“indicado pela direção” (D1, D3, D4), “escolhido pela necessidade do estagiário” (D2) ou pela

“disponibilidade de horário” (D5, D6) do PC e do estagiário, mas cabendo ao PC a palavra

final sobre o aceite ou não em receber os estagiários.

Apesar desse contexto, essas escolas estudadas abrem as suas portas para a

Universidade e compreendem a importância do estágio principalmente no que diz respeito ao

contato proporcionado com a realidade do exercício profissional. Por outro lado, o estágio

também é visto como uma atividade sem regulamentação em termos de e prescrições

específicas no interior das escolas. Esse tema poucas vezes é debatido entre diretores,

coordenadores e professores e o que se assume nos dizeres dos participantes é que o

estágio é uma prática que há alguns anos vem sendo executada da seguinte maneira:

aceitar estagiários e encontrar/designar um PC como responsável pelo estagiário.

1171

Porém, é justamente nessa prática bem instalada (de receber os estagiários e colocá-

los em contato com o cotidiano) que se apoia o discurso da parceria e da contribuição da

escola para a formação docente.

A escola não só entende a necessidade do estágio, como procuraestabelecer uma parceria de forma que garanta que essa formação ocorrada melhor forma (C1).

No trecho acima evidenciado, bem como, como no conjunto das respostas dos

participantes nota-se que a visão da escola como um parceiro, mas um parceiro

administrativo (CARRILHO, 2008), que cumpre um acordo proposto, no caso, pela

Universidade e a Secretaria de Educação e se mantém aberta para o diálogo e a troca de

experiências.

Esse contexto, traz à tona a ideia de parceria defendida por Goeris (1992), que

aponta a existência de parceria quando existe o estabelecimento de ‘algo comum’ e

parceiros que ocupam posições diferentes mas mantém o respeito mútuo e ambos intervêm

no processo. Nesse caso, pode-se pressupor que a realização do estágio seja meta comum

partilhada pelas duas instituições, Universidade-Escola, embora historicamente o controle

deste processo esteja nas mãos da Universidade, cabendo a escola a tarefa de acolhimento.

4.2. A dinâmica do estágio

Como mencionamos no início de nossa reflexão, o ECS apresenta especificidade

com relação ao seu desenvolvimento tanto na Universidade quanto na escola. Se na

primeira o mesmo apresenta uma dinâmica vinculada aos moldes disciplinares

universitários que definem a sua estrutura e organização, na segunda a prerrogativa se

dá em torno de uma atividade marcada pelos contornos escolares alicerçada no ato de

colocar à docência em prática. Dessa forma, a dinâmica do ECS no interior da escola é

influenciada pela tradição universitária e escolar, além das expectativas e crenças de

seus envolvidos, como por exemplo os estagiários e PC.

No contexto estudado, essa dinâmica apresenta seu ponto de partida com a

necessidade da Universidade enviar os estagiários para a escola, tendo na assinatura do

termo de compromisso a instauração do estágio em terreno escolar. Os Diretores e

Coordenadores mencionam que aceitar os estagiários é algo corriqueiro e não existe um

preparo específico para o acontecimento do ECS havendo apenas um informe sobre a

chegada dos estagiários.

Não há uma preparação específica, porém, os professores são orientadospela Direção/ Coordenação a serem cordiais e receptivos (D3).

1172

Essa compreensão também é incorporada pelo PC quando registram não haver um

preparo formal para a chegada dos estagiários e que com relação aos alunos, apenas os

informam sobre a presença dos estagiários e a necessidade dos alunos cumprirem as regras

da escola para o acontecimento da aula.

Porém, esse acontecimento gera um impacto na escola, que transita por diferentes

perspectivas, como de “levar o professor a uma reflexão da ação pedagógica” (D1), “de

estranheza sobre quem é a pessoa (estagiário) ” (C4), do fato dos alunos gostarem da

presença dos estagiários e “se identificarem e se interessarem por eles” (PC6) e de gerar no

PC “um sentimento de compromisso com o futuro colega de profissão” (PC3).

Sendo assim, percebemos que a dinâmica do ECS apresenta elementos mediadores

advindo das relações afetivas estabelecidas e que acabam por ser responsável pelo

estabelecimento (ou não) da harmonia entre o estagiário e o PC.

Quando se registra a harmonia, os PC mencionam que se colocam ao lado do

estagiário deixando que o mesmo se sinta professor, auxiliando-o nas visitas dos

professores-supervisores ou quando os alunos apresentam comportamentos ruins que

interferem significativamente no encaminhamento das aulas.

Deixo com que eles (estagiários) tenham a liberdade de escolher a melhormaneira para as aulas, dentro do planejamento, e ajudo no que for preciso,quando pedem a minha opinião ou quando vejo que eles estão emdificuldade” (PC4).

Os PC dissertam que normalmente não intervém nas aulas dos estagiários, mas

conversam com os mesmos sobre o que se sucedeu. Eles notam, por meio da observação,

que as maiores inquietudes dos estagiários giram em torno do sentimento de

responsabilidade em dar aula (PC1, PC3) e da sensação de frustração (PC5, PC2).

Adicionando, ainda, que percebem se seu acompanhamento é positivo nos momentos que

conversam com o estagiário (PC1, PC3, PC4) ou quando são solicitados (PC6).

Registra-se assim, a presença de uma dinâmica por parte do PC que se dá por meio

de práticas observacionais e do ato de deixar que o estagiário se lance ao ‘como fazer’.

Essas características mencionadas pelos participantes, também é recorrente na literatura

(LIMA, 2008) e causa discussão a respeito de sua abordagem, pois ora pode trazer

elementos significativos como autonomia e desenvolvimento pessoal-profissional do

estagiário, mas ora camufla alguns conflitos como a ausência de orientações específicas

sobre o que fazer durante os estágios, a não ressignificação das crenças (tanto dos

1173

professores quanto dos estagiários) e a ideia do ECS como um fardo para a escola (GATTI;

BARRETO, 2009).

A escola brasileira atualmente é marcada pelas condições de saturação de trabalho,

ambientes desagradáveis, excesso de alunos, etc. e nesse contexto, a escola se submete a

um processo de tentar sobreviver as altas demandas, como projetos e tarefas que todos os

dias adentram por suas portas como cobranças por parte do sistema educacional, além das

dificuldades locais como a não valorização da educação pela sociedade em geral e aceitam

o estágio.

Sendo assim, os professores assumem um maior número de tarefas, sendo que o

ECS passa a ser uma delas; uma situação percebida e destacada por D2 ao mencionar que

o ECS causa uma “quebra da rotina da sala de aula” e os professores “ganham aumento de

trabalho”.

O aparecimento desses argumentos conflitantes aponta para uma problemática, que

nos parece estar na base da dificuldade de relacionamento mais próximo entre a

Universidade e a escola, ou seja, a compreensão de suas diferentes sistemática de trabalho

e a ausência de políticas públicas adequadas para o estabelecimento de parceria.

Dessa forma, podemos pensar que o ECS possui uma dinâmica oscilatória no interior

da escola, um constante movimento de ajuste/desajuste, que é balizado pelas relações que

são estabelecidas via estagiário-PC ou mesmo via professor-supervisor e embora os

envolvidos passem por momentos burocráticos e vivenciem diferentes pressões, quando

tudo se finda, leva-se a uma acomodação e decantação das experiências, fazendo com que

os estagiários reflitam sobre a situação e professores-colaboradores se coloquem a

disposição para mais um ano.

4.3. O professor-colaborador no estágio

Quando um professor passa a ser colaborador acrescenta-se ao seu rol de atividades

a tarefa de auxiliar futuros professores em suas experiências didático-pedagógicas no

momento do ECS, devendo assim tomar decisões, organizar a classe e dirigir o aprendizado

tanto dos alunos quanto dos estagiários (PAQUAY; WAGNER, 2001).

Porém na realidade brasileira, ser um PC, não necessariamente significa possuir um

papel definido, formação específica, ou qualquer tipo de adaptação à função. Essa

incorporação se dá em torno de relações casuais e pessoais, na qual num determinado dia,

o professor se predispôs a ser um colaborador.

1174

Os PC desse estudo destacam que os fatores que os levaram a começar receber

estagiários vincula-se a ideia de uma possível “formação em serviço”, pois os estagiários

seriam a fonte de inovação, de experiências recém adquiridas na universidade, da

aproximação com o universo acadêmico, além do fato de se sentirem satisfeitos em poder

colaborar com as vivências de um futuro colega de profissão.

O que mais me motiva em receber estagiários é o que eles podem trazer denovo, alguma coisa diferente que possa ser passado nas aulas (PC4).

Colaborar com o processo de formação, participar de grupos de estudosvoltados a formação profissional (na Universidade) (PC6).

De acordo com os PC, essa visão de estágio, de certa forma, os acompanham desde

a sua formação inicial quando ainda eram estagiários e ouviam de seus professores que

estagiários trazem novidades para a escola ou ainda, os PC querem oferecer algo diferente

do que lhes foi ofertado, como por exemplo a falta de estágios de regência em seus

processos formativos.

Porém, os PC registram que de fato “percebem que fazem parte do processo” (PC6)

do estágio e que o mesmo se torna uma fonte de estímulo, satisfação e reflexão (PC2, PC1)

no convívio com o estagiário e nas trocas estabelecidas. Essas percepções que começam a

emergir do PC são importantes, pois apontam para um processo de reflexão sobre o

contexto do estágio e sobretudo sobre a posição ocupada pelo professor.

Contudo, nota-se uma diferença na representação do PC posta pela literatura,

considerando-o como formador profissional dos estagiários (GERVAIS; DESROSIERS, 2005)

e a visão dos PC, aqui estudados, onde se descrevem como disponíveis, acessíveis, não

mencionando o fato de poder ser um formador, não esclarecendo sua função e/ou

competências e dando uma ideia limpa, na qual o processo de ECS se desenvolve sem

maiores pormenores.

Talvez caiba ao dueto Universidade-Escola propor meios e possibilidades de

promover “a invenção de novas maneiras” e auxiliar os PC “na reinvenção de si próprios”

(SARTI, 2008, p.63).

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa teve como propósito apontar pistas sobre a participação da escola nos

ECS, tendo como recorte a ideia de parceria que pode ser desenvolvida entre a

Universidade e a escola, sob o olhar dos Diretores, Coordenadores Pedagógicos e

Professores-Colaboradores.

1175

Durante a explanação dos três eixos que subsidiaram os resultados da pesquisa,

pudemos constatar que o contexto do ECS estudado evidência os aspectos culturais e que

promove a confluência das expectativas universitárias frente as demandas escolares.

Os acordos que são estabelecidos apresentam aspectos formais como os

consentimentos da Secretaria de Educação e o atendimento a legislação, mas também laços

informais como as relações travadas, a camaradagem, como por exemplo a relação PC e

professor-supervisor.

A escola, nesse sentido, foi vista pelos participantes como um espaço privilegiado

para a aprendizagem profissional no contexto do ECS, sendo que ao realizar a acolhida dos

estagiários a mesma está contribuindo com a formação docente. Incitando, de maneira

tímida, que esse ‘acordo’ é uma parceira, pois recebe os estagiários encaminhados pela

Universidade.

O ECS ocasiona uma dinâmica impactante no interior da escola e um ciclo que vem

sendo repetido, mas não sem promover algumas reflexões, como por exemplo, a

confrontação do PC com as inovações trazidas pelos estagiários e a sensação de satisfação

em auxiliar um futuro colega de trabalho. Arriscamos mencionar que é justamente por meio

de um conjunto de sensações que o PC começa a despertar para a importância da sua

participação e função.

A literatura internacional aponta para existência de parcerias entre os cursos de

formação em Educação Física- Universidade, com as escolas. Esses exemplos mostram a

possibilidade do reconhecimento da experiência, da existência de modelos de formação

diferenciados e que o esforço e a insistência em promover uma relação mais sólida entre as

duas instâncias de formação pode ser a chave para uma melhor organização dos ECS,

tendo como consequência experiências melhores sucedidas, levando-se, futuramente, a uma

melhor representação e condição da profissão docente.

Contudo, chamamos a atenção para aquilo que se faz necessário olhar no interior do

ECS quando se fala de parceria, como por exemplo, as características do processo de

formação, o acompanhamento das políticas públicas e a compreensão da rotinas, tarefas e

papel da Universidade e da Escola, pois é sabido de alguns limites que impossibilitam o

acontecimento de parcerias, como a falta de flexibilidade entre as instituições, baixo

reconhecimento da importância do professor, a descontinuidade do trabalho em função das

políticas públicas e a sobrecarga de trabalho dos envolvidos (SMEDLEY, 2001), sendo

importante pensar nas superações dos mesmos se a parceria for uma condição favorável

para o acontecimento do ECS.

1176

São desafios que se colocam no cenário nacional para serem vencidos. A parceria

como um processo de negociação e com relações profissionais, ainda, está distante na atual

condição dos ECS e das relações com a Universidade, mas fica o desejo de que em breve

seja recorrente no sistema educacional.

REFERÊNCIAS

BANVILLE, Dominique. Analysis of exchanges between novice and cooperating teachersduring internships using the NCATE/NASPE Standards for teacher preparation in physicaleducation as guidelines. Research Quarterly for Exercise and Sport. London, v,77, n.2,p.208-221, 2006.BENITES, Larissa Cerignoni. O professor-colaborador no estágio curricularsupervisionado em Educação Física: perfil, papel e potencialidades. 180f. Tese (Doutoradoem Ciência da Motricidade). Instituto de Biociências, Universidade Estadual Paulista, RioClaro, 2012.

BENITES, Larissa Cerignoni. Universidade e escola: contribuições no estágio curricularsupervisionado na formação de professores de educação física. Relatório de Pesquisa.Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico- CNPq. Pós DoutoradoJúnior. Processo: 150167/2013-0; 2013

BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de1988.

BRASIL. Ministério da Educação. Lei nº 9394, de 20 de dezembro de 1996. Lei de Diretrizese Bases da Educação Nacional.

BRASIL. Ministério da Educação. Resolução CNE/CP 2, de 19 de fevereiro de 2002. DiárioOficial da União, Brasília, 4 de março de 2002. Seção 1, p. 9.

BRASIL. Ministério da Educação. Lei nº. 11.788 de 25 de setembro de 2008.

CARRILHO. Tiago. O conceito de parceria: três projetos locais de promoção de emprego.Analise social, v.XLIII, n.1, p.81-107, 2008.

COCHRAN-SMITH, Marilyn.; LYTLE, Susan. Relationships of knowledge and practice:Teacher learning in communities. Review of Research in Education, 24, p. 249-306, 1999.

CHRISTENSON, Robert; BARNEY, David. Cooperating Teachers’ Expectations for studentteachers during the student teaching experience in physical education. Asian Journal ofPhysical Education and Recreation, Hong Kong, v.17, n.2, p. 6-15, 2011.

DESBIEN, Jean-François; SPALLANZANI, Carlo; BORGES, Cecilia. (Dir.) Quand le stageen enseignement déraille. Regards pluriels sur une réalité trop solvente occultée. Pressesde l’Université du Québec, 2012.

FORMOSINHO, João Academização da formação de professores. In: FORMOSINHO, João.(Coord.). Formação de professores: aprendizagem profissional e acção docente. Porto:Porto Editora, 2009, p.73-92.

FRANCO, Maria Amélia Santoro. Entre a lógica da formação e a lógica das práticas: amediação dos saberes pedagógicos. Educação e Pesquisa, São Paulo, v.34, n.1, p. 109-126, jan./abr. 2008.

1177

GATTI, Bernadete Angelina; BARRETTO, Elba Siqueira de Sá. Professores do Brasil:impasses e desafios. Brasília: Unesco, 2009.

GERVAIS, Colette; DESROSIERS, Pauline. L’école, lieu de formation d’enseignants:questions et repères pour l’accompagnement de stagiaires. Quebec: Presses del’Universitaire de Laval, 2005.

GEORIS, Pierre. La fonction de médiation au niveau local. Revue de l'Action sociale, Liège,n.2, p. 19-34, 1992,

KULINNA, Pamela H. et al. Preservice teachers’ belief systems toward curricular outcomesfor physical education. Research Quarterly for Exercise and Sport. London, v.81, n.2,p.189-198, 2010.

LIMA, Maria do Socorro Lucena. Reflexões sobre o estágio/prática de ensinona formação deprofessores. Revista Diálogo Educacional, Curitiba, v. 8, n. 23, p. 195-205, jan./abr. 2008.

MORIN, Francine. A self study investigation of a university school partnership approach tophysical education in teacher education. CAHPERD- The California Association for Health,Physical Education, Recreation and Dance. V.10, n.1, p.27-43, 2004.

PAILLÉ, Pierre; MUCCHIELLI, Alex. L'analyse qualitative en sciences humaines etsociales. Paris: Armand Colin, 2009.

PAQUAY, Léopold.; WAGNER, Marie-Cécile. Competências profissionais privilegiadas nosestágios e na videoformação. In: PAQUAY, Léopold et al. (Orgs.). Formando professoresprofissionais. Quais estartégias? Quais competências? Porto alegre: ARTMED, 2001.p.135-160.

PIMENTA, Selma Garrido; LIMA, Maria do Socorro Lucena. Estágio e docência. São Paulo:Cortez, 2011

SARTI, Flavia M. O Professor e as Mil Maneiras de Fazer no Cotidiano Escolar. Educação:Teoria e Prática, Rio Claro vol.18, n.30, p.47-66, 2008.

SCHON, Donald. A. Formar professores como profissionais reflexivos. In: NÓVOA, Antonio(Coord.) Os professores e sua formação. Lisboa: Don Quixote, 1992.

SMEDLEY, Lea. Impediments to partnership: a literature review of school-university links.Teachers and Teaching: Theory and Practice, v.7, n. 2, p.189-209, jun., 2001.

SOFO, Seidu.; CURTNER-SMITH, Matthew. D. Development of preservice teachers’ valueorientations during a secondary methods course and early field experience. Sport,Education and Society, London, v.15, n.3, p.347-365, 2010.

TARDID, Maurice; LESSARD, Claude. Le travail enseignant au quotidien. Presses del’Université Laval, 1999.

ZEICHNER, Ken. Repensando as conexões entre a formação na universidade e asexperiencias de campo na formação de professores em facudades e universidades. RevistaEducação. Santa Maria, v.35, n. 3, p.479-504, set-dez, 2010.

1178

i Professor-Colaborador: professor da escola de educação básica que recebe e acompanha os estagiários em situaçãooficial de estágio. ii Todos os autores citados com relação as propostas de parceria internacional norte-americana se reportam aos estágiosdos cursos de Licenciatura em Educação Física em escolas públicas.iii Pesquisa aprovada pelo Comitê de ética da UNESP/RC (Parecer 006 de 07 de fevereiro de 2013, Protocolo 8099).iv Traduções e adequações de questões para o contexto brasileiro.