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A ORGANIZAÇÃO SOCIOESPACIAL E A INSERÇÃO DAS CADEIAS PRODUTIVAS DA FRUTICULTURA E DA SILVICULTURA NA CAMPANHA
GAÚCHA/RS/BRASIL
Ana Luiza Pinto Alves
Universidade Federal de Santa Maria/NERA [email protected]
Meri Lourdes Bezzi
Universidade Federal de Santa Maria /CCNE/NERA [email protected]
Resumo O trabalho apresenta como tema central a inserção da fruticultura e da silvicultura na Campanha Gaúcha/RS a qual vem sendo dinamizada através desses novos atores econômicos. Os objetivos da pesquisa centram-se em verificar como e onde os novos atores econômicos estão se inserindo gradativamente neste recorte espacial e analisar as potencialidades locais/regionais. Metodologicamente a investigação foi estruturada em etapas. Inicialmente, revisitaram-se as matrizes teóricas, posteriormente, foi realizado o trabalho de campo. Por fim, analisou-se e interpretaram-se as informações e os dados coletados. Como considerações destaca-se que a economia está concentrada no setor primário, onde se faz necessário, políticas públicas voltadas para essas novas potencialidades visando estimular o seu crescimento econômico. Palavras-chave: Organização espacial. Fruticultura. Silvicultura.
Introdução
A Campanha Gaúcha situa-se na Mesorregião Sudoeste Rio-grandense, na qual se
podem perceber os gêneros de vida mais típicos do Brasil, simbolizado pelo gaúcho, o
qual é responsável por códigos culturais e uma economia singular neste recorte espacial
do estado gaúcho. Denomina-se de Campanha Gaúcha as regiões fronteiriças e centrais
do Estado do Rio Grande do Sul, popularmente conhecida como “fronteira”. Uma de
suas principais características é a topografia ondulada do pampa, de suaves colinas e,
também, das coxilhas, com vegetação de gramíneas, quase uniforme, as quais
completam o quadro natural, atribuindo grande importância para a economia da região
por fornecer uma das melhores pastagens naturais do país, o que justifica a consolidação
da pecuária como principal atividade econômica deste recorte regional.
Conforme o IBGE, esta Mesorregião é composta pelas Microrregiões Geográficas da
Campanha Ocidental (MRG 029), Central (MRG 030) e Meridional (MRG 031),
constituindo uma região que alia, sob a ótica da cultura, a política com a formação de
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lideranças regionais que se perpetuam no poder e na economia através da coexistência
da pecuária extensiva tradicional e da inserção de novos atores econômicos, que
marcam a influência do capital na Mesorregião como um agente que “tenta” romper as
barreiras impostas por tradições seculares. (Mapa 1).
Mapa 1: Mapa de localização da Mesorregião Sudoeste Rio-grandense/RS.
Fonte: Elaboração a partir do software Spring 4.3.3. Org.: ALVES, Ana Luíza Pinto; RIFFEL, Eduardo Samuel, 2011.
Nesse sentido, pretende-se verificar as implicações das novas cadeias produtivas,
considerando as perspectivas de dinamização socioeconômica que se atrela à inserção
de novos atores que surgem como resposta local aos processos capitalistas.
Essa releitura do espaço geográfico da Campanha Gaúcha visa identificar as
potencialidades e/ou desequilíbrios socioeconômicos e culturais a serem explorados,
atrelados aos aspectos físico-naturais, como pressupostos para a proposição de
alternativas de desenvolvimento para este recorte espacial procurando tornar suas
unidades territoriais competitivas, inserindo-as nos padrões de desenvolvimento
local/regional.
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Desenvolvimento
A organização socioespacial da Campanha Gaúcha
Na atualidade a Mesorregião Sudoeste Rio-grandense mantém sua identidade cultural,
desenvolvendo atividades econômicas características do Estado sul rio-grandense,
baseada inicialmente na pecuária, a qual se vincula à presença do gaúcho típico e à
atividade pecuarista. Posteriormente, com a inserção da agricultura comercial do arroz e
da soja e a consolidação do trinômio arroz-pecuária-soja, o setor primário mantém o
caráter concentrador da terra através dos grandes latifundiários.
Para compreender a atual organização socioespacial desta região, faz-se necessário o
resgate histórico de como estas atividades foram inseridas, ou seja, como as mesmas
passaram a ser realizadas e a influência delas no recorte espacial em estudo.
Nesse sentido, salienta-se que a pecuária caracteriza-se como a primeira cadeia
produtiva da Campanha Gaúcha, a qual tem suas origens nos aspectos históricos de
ocupação e povoamento do Estado gaúcho. A criação de gado via estâncias garantiram a
posse da terra, através do rebanho bovino disperso nos campos, deixados pelos padres
jesuítas, os quais desenvolviam a atividade pastoril. As potencialidades naturais
forneceram condições para a expansão desta atividade.
Deve-se ressaltar que, esta atividade representa a maior parcela do rebanho bovino sul
rio-grandense, com grande expressividade nacional. Assim, a pecuária consolidou-se
mediante o desenvolvimento de latifúndios pastoris, na sua maior parte extensivos, os
quais dinamizaram esta Mesorregião.
Desta forma, a pecuária ainda se constitui em uma das principais atividades econômicas,
concentrando a maior parcela do rebanho bovino de corte com significativa expressão
nacional. Tal fato justifica a relevância da pecuária, pois este setor é muito expressivo
para a economia regional, mesmo diante das crises que este segmento produtivo tem
enfrentado no decorrer do tempo. (Fotografia, 1).
Paralelamente à atividade pecuarista, a partir da década de 1920, estruturou-se, nessa
região uma nova configuração espacial, através da inserção da lavoura orizícola. Além
da dicotomia produtiva, tem-se uma sociedade dual, composta por pecuaristas e
agricultores (FEE, 1978).
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Fotografia 1: Pecuária extensiva no Município de Bagé/RS.
Fonte: Trabalho de Campo, 2012. Org.: ALVES, Ana Luíza Pinto, 2012.
A cultura do arroz teve a sua inserção no Estado gaúcho, a partir do século XX, marcada
pelo processo de despecuarização espacial, ou seja, a cessão de terras por parte do
latifúndio pastoril à agricultura. Esta dinâmica só foi possível através da inserção da
lavoura empresarial altamente mecanizada e competitiva no mercado interno e externo,
imprescindível para que se viabilizasse seu desenvolvimento, uma vez que, na maioria
das vezes, as lavouras são realizadas via arrendamento de terras destinadas
anteriormente à pecuária. Dessa forma, o arroz caracteriza-se como a primeira lavoura
capitalista no Estado gaúcho, apresentando, no decorrer do tempo, crescimento
expressivo tanto em área como em produtividade. (FEE, 1978; BEZZI, 1986).
Pode-se dizer, então, que a rizicultura se desenvolveu no Rio Grande do Sul em virtude
da presença de mercados favoráveis e de incentivos através de políticas governamentais.
Essa atividade econômica era basicamente voltada para o mercado interno, pois ao
contrário dos demais estados brasileiros, o território sul rio-grandense inseriu-se no
cenário econômico nacional através da produção de alimentos. Esta atividade teve
impulso através do crescimento do mercado consumidor de alimentos nos centros
urbanos e, também, devido ao desenvolvimento de uma política tarifária sobre as
implantações do arroz estrangeiro, estabelecendo uma proteção econômica à rizicultura
gaúcha. (Fotografia, 2).
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Fotografia 2: Lavoura de Arroz no Município de São Gabriel/RS.
Fonte: Trabalho de Campo, 2012. Org.: ALVES, Ana Luíza Pinto, 2012.
Enfatiza-se que o desenvolvimento da lavoura orizícola não encontrou resistência, por
parte dos grandes proprietários, pelo contrário, o arrendamento da terra tornava os seus
campos produtivos e rentáveis, uma vez que, o lucro advinha do arrendamento das
mesmas, independentemente de fatores físico-naturais, como estiagens, enchentes, entre
outros fenômenos que podem comprometer sua renda (BEZZI, 1986).
A cadeia produtiva do arroz sofreu algumas crises, principalmente, aquelas ligadas à
questão de financiamento, às potencialidades naturais e à concorrência com importação
do arroz, principalmente da Argentina. Entretanto, a área produtiva destinada a esta
lavoura apresentou crescimento no decorrer da escala temporal analisada neste trabalho.
Essa expansão gradativa deve-se, entre outros fatores, aos investimentos em tecnologias
os quais procuram aumentar o rendimento médio do arroz visando proporcionar
melhores resultados a cada safra e, consequentemente, obter lucro com a produção.
A extensão e a dinâmica espacial da Campanha Gaúcha demonstram uma diversidade
econômica que ora originam setores econômicos, ora apenas agregam atividades
complementares e mesmo temporárias. Portanto, na busca da compreensão da
organização de seu espaço produtivo, deve-se considerar todas as atividades que se
desenvolvem sobre a sua base espacial, a fim de se obter a dimensão e a complexidade
dessa estrutura no que diz respeito aos aspectos físicos, socioeconômicos e culturais do
Estado gaúcho.
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Atrelada às transformações que marcaram o cenário nacional, a partir da década de
70/80, pode-se dizer que a presença significativa da lavoura de soja, nessa porção do
território rio-grandense, foi responsável por novos arranjos produtivos no seu setor
primário. Esses são decorrentes da dinâmica socioeconômica sobre o espaço e também
para atender as demandas de mercado mediante o processo de modernização da
agricultura. Assim, a inserção da cultura da soja, com características de lavoura
empresarial desenvolvida mediante políticas de financiamento reorganizaram sua matriz
produtiva. (Fotografia, 3).
Fotografia 3: Lavoura de Soja no Município de Dom Pedrito/RS.
Fonte: Trabalho de Campo, 2012. Org.: ALVES, Ana Luíza Pinto, 2012.
As extensas áreas disponíveis, que caracterizam os latifúndios da Campanha Gaúcha,
demonstraram-se favoráveis à incorporação da lavoura de soja via arrendamento. Essa
expansão ocorreu de forma mais significativa em algumas unidades territoriais, nos
quais as potencialidades naturais permitiam a introdução dessa cultura via tecnologia,
inserindo-se na tradicional matriz produtiva da pecuária e do arroz.
A viabilidade de políticas de créditos e financiamentos foi um dos fatores
predominantes da presença da agricultura empresarial, em áreas tradicionais da
pecuária. Essas foram direcionadas, ao setor primário, através de órgão de fomento, via
políticas públicas, estabelecidas pelo governo Estadual e Federal. A lavoura de soja e a
do arroz mantém a concentração da terra na Campanha Gaúcha, pois sua inserção
viabilizou-se, através do arrendamento.
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Dessa forma, a soja coexiste com a matriz produtiva tradicional, constituindo-se em
uma atividade dinamizadora da economia das unidades territoriais pertencentes à
Mesorregião.
Novos atores econômicos: fruticultura e silvicultura
A estruturação do espaço produtivo da Campanha Gaúcha está alicerçada em cadeias
produtivas tradicionais da pecuária e do arroz e, mais recentemente, da soja. Na
atualidade apresenta a inserção, de novos investimentos à dinamização desse espaço
produtivo. Nesse sentido, destaca-se a fruticultura, como uma alternativa produtiva e de
geração de renda, que se encontra em expansão gradativa. Tal atividade está baseada,
principalmente, na produção de cítricos, como a laranja, a bergamota e a tangerina e em
outras frutas como a melancia, a uva, o pêssego e o figo. (Fotografia, 4).
Fotografia 4: Colheita de melancia no Assentamento Guajuviras – São Gabriel/RS.
Fonte: www.emater.tche.br.
A cadeia produtiva da uva está presente principalmente nos municípios de Santana do
Livramento, Quarai, Uruguaiana, Itaqui e Rosário do Sul, com uma área plantada de
856 hectares. Entretanto, nos municípios de Bagé, Dom Pedrito, Hulha Negra e Lavras
do Sul, essa inserção é maior abrangendo uma área de 1,89 mil hectares (EMBRAPA,
2005). Ressalta-se que se mantido esse crescimento, essa área poderá consolidar-se
como um pólo de produção da uva, voltada para a fabricação de vinhos, sucos e para o
consumo in natura. (Fotografia, 5).
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Fotografia 5: Vinícola da Cooperativa Nova Aliança - Santana do Livramento/RS.
Fonte: www.ecooperativa.coop.br.
Essa tendência à vitivinicultura acompanha o processo de expansão da produção da uva,
tanto no Rio Grande do Sul quanto em outros estados brasileiros. Há que se considerar
também, que a presença da vitivinicultura, em áreas de pecuária tradicional, demonstra
a inserção de um cultivo “sem a tradição colonial” como a que ocorreu na Serra Gaúcha.
A produção nessas novas áreas ocorre mediante o uso de tecnologias avançadas, manejo
e matéria prima, buscando reestruturar o perfil de produção dessa região. Assim, são
desenvolvidas novas estratégias econômicas em busca de alternativas de
desenvolvimento em uma área com desigualdades e desequilíbrios populacionais
decorrentes de potencialidades naturais restritivas.
Desta forma, esse investimento é resultante da união de forças do poder público com a
iniciativa privada com intuito de dinamizar a Metade Sul do Estado. A fruticultura foi
viabilizada também devido aos recursos financeiros disponibilizados através do
Programa Estadual de Fruticultura (PROFRUTA/RS), o qual visa incentivar o
desenvolvimento da fruticultura no Estado, diversificando a produção econômica. Tem-
se como uma das metas do PROFRUTA reverter o processo de importação de frutas,
principalmente cítricos e a recuperação produtiva, através de novos pólos com destaque
a Metade Sul do Estado.
No que se refere à citricultura, destaca-se a produção de laranja, tangerina e bergamota.
A laranja predomina em área plantada em todas as unidades territoriais desse recorte
espacial. Já a tangerina e a bergamota aparecem associadas a essa, porém com menores
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áreas destinadas à sua produção. Destacam-se como grandes produtores de laranja os
municípios de Alegrete, São Gabriel e Rosário do Sul. No que se refere à tangerina, as
principais unidades territoriais produtivas são: Quarai, São Francisco de Assis, Alegrete
e Lavras do Sul (IBGE 2008). (Fotografia, 6).
Fotografia 6: Cultivo de Bergamotas – Rosário do Sul/RS.
Fonte: http://wp.clicrbs.com.br/avarejo/2010/05/24/
Os projetos de incentivo a fruticultura na Metade Sul do Estado podem ser considerados
como alternativas para o desenvolvimento local/regional. Ressalta-se que a fruticultura
é desenvolvida em pequenas e médias unidades produtivas, representando uma
possibilidade e/ou alternativa para o desenvolvimento econômico dessa região.
Portanto, não concorre com as grandes propriedades que mantém o caráter concentrador
da terra, através da pecuária extensiva e da agricultura empresarial (arroz e soja). No
máximo, a fruticultura se associa a essas cadeias produtivas mais tradicionais
(PROADE, 2006).
Desta forma, essa atividade gera renda e estimula emprego no campo, diversificando as
perspectivas para os trabalhadores rurais, na medida em que origina novas frentes de
trabalho, além daquelas já existentes com o arroz, a soja e a pecuária. Procura, também,
amenizar um dos problemas sociais expressivos dessa região que é a oferta de emprego
e, consequentemente, os processos excludentes, os quais têm seus reflexos na
minimização da migração rural-urbana, proporcionando novas alternativas de renda ao
produtor rural.
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A quantidade de frutas produzidas na Campanha Gaúcha está aumentando
gradativamente, visando atingir o volume necessário para exportação. No entanto, para
que esta cadeia se estruture e se dinamize é necessária a melhora na infra-estrutura, pois
um dos principais problemas relativos à fruticultura é a deficiência na malha viária,
fator essencial para o escoamento da produção. Dessa forma, fazem-se necessários
investimentos no setor de transportes, através da recuperação das estradas que
interligam os municípios produtores aos centros de comercialização. Entretanto, apesar
das dificuldades a fruticultura já se constitui como uma realidade para a Campanha
Gaúcha, proporcionando novas frentes de trabalho e geração de renda para o produtor
rural, distinta daquela oriunda da sua matriz tradicional.
Paralelamente a fruticultura, novas atividades econômicas estão sendo, gradativamente,
inseridas na Campanha Gaúcha, transformando a paisagem produtiva e as relações de
trabalho local/regional. Nesse sentido, destaca-se o florestamento, o qual se configura
como outra cadeia produtiva que visa dinamizar as atividades econômicas existentes
nessa região, uma vez que se constitui em uma estratégia econômica que vem se
consolidando através do plantio de pinus e eucaliptos. O plantio tem financiamento de
grandes grupos ligados à produção de celulose, como o Grupo Votorantin Celulose e
Papel, Aracruz e Stora-Enso (indústria sueco-finlandesa de papel). (Fotografia, 7).
Fotografia 7: Eucaliptos recém plantados – Rosário do Sul/RS.
Fonte: Trabalho de Campo, 2012. Org.: ALVES, Ana Luíza Pinto, 2012.
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Enfatiza-se que através de estudos realizados pela empresa Stora-Enso na América
Latina, o Rio Grande do Sul apresentou as condições competitivas ideais como: área
disponível, qualidade do solo, logística, disponibilidade de mão de obra e possibilidades
para o plantio de eucalipto ou pinus, que originam, respectivamente, a celulose de fibra
curta e longa.
Os investimentos desses grupos ocorrem a partir da aquisição de extensas áreas,
desmembradas de grandes propriedades. Pode-se inferir que tal situação contribuirá para
o rompimento das bases tradicionais de posse da terra, assentadas no monopólio
latifundiário nas mãos de grandes proprietários voltados a atividades pecuárias e
agrícolas (arroz e soja). Assim, as extensas dimensões de terras estarão sob domínio de
grandes grupos empresariais. Nenhuma das novas estratégias econômicas, nesse recorte
espacial, ameaçou a concentração da terra, na medida em que coexistia a pecuária
extensiva realizada em grandes propriedades com o arroz e a soja, ou a fruticultura em
pequenas propriedades. (BEZZI; CASTANHO, 2007).
Entretanto, a iniciativa florestal tem despertado a reação da comunidade ambientalista,
que adverte para os riscos ambientais que a plantação monocultora de pinus e eucaliptos
podem trazer para a região. A advertência assenta-se no fato de que a plantação de
espécies exóticas e de grande porte poderá ser responsável por prejuízos ambientais às
reservas hídricas, ao solo, ao clima e a fauna e flora. Tais advertências baseiam-se em
discussões de cunho ecológico que afirmam que o eucalipto necessita de água
abundante para o seu desenvolvimento, além de bloquear o crescimento da vegetação
rasteira nativa do Pampa. Assim, se faz necessário um período de tempo maior para que
se possam avaliar os impactos sociais, culturais e econômicos desta nova cadeia
produtiva na Campanha Gaúcha.
O debate inclui também, questões identitárias referentes à cultura gaúcha e a sua
preservação na Campanha Gaúcha, considerada uma das regiões de preservação dos
costumes e tradições rio-grandense.
Considerando as informações referentes a esta nova cadeia produtiva, pode-se destacar
que a silvicultura não pretende realizar a reconversão da Metade Sul em uma área de
florestas, mas aperfeiçoar as propriedades rurais com sistemas agrosilvopastoris.
Além das áreas que foram adquiridas pelas empresas para o plantio de árvores voltadas
a produção de celulose há, também, proprietários rurais que destinaram parte de suas
terras para a silvicultura. Trata-se de uma alternativa de diversificar a produção e os
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rendimentos oriundos da propriedade rural, uma vez que, o produto final tem a garantia
de compra pelas empresas de celulose e papel. (Fotografia, 8).
Há que se destacar a criação de áreas de preservação na Metade Sul. Essas áreas
consistem em espaços destinados ao plantio de espécies nativas em contrapartida às
áreas destinadas ao florestamento.
Fotografia 8: Eucaliptos já em processo de corte – Bagé/RS.
Fonte: Trabalho de Campo, 2012. Org.: ALVES, Ana Luíza Pinto, 2012.
Neste contexto, pode-se dizer que o espaço produtivo deste recorte espacial tem passado
por diversas transformações no que se refere à inserção de outras atividades, distintas da
pecuária tradicional que caracteriza, ainda, essa região. Tal fato demonstra que a
dinâmica do capital acarreta mudanças constantes na relação sociedade-natureza,
mesmo em porções do espaço onde essa relação organizacional apresenta importante
relação com a cultura e, consequentemente distingue-se dos demais pela expressividade
do regionalismo rio-grandense.
Conclusões
Mediante a realização da pesquisa, verificou-se que a Campanha Gaúcha estrutura-se
economicamente através da agropecuária, demonstrando a manutenção desta atividade
que é considerada gênese da sua cultura. Desse modo, este recorte espacial apresenta
uma realidade local alicerçada no setor primário, o qual carece de maiores incentivos, a
fim de dinamizar a economia local/regional.
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Salienta-se que a pecuária ainda apresenta áreas de forma extensiva, ou seja, a mesma
estrutura latifundiária que originou a cultura gaúcha. Neste contexto, verifica-se que as
condições de vida da população local resultam da concentração de terra nas mãos de
grandes latifundiários, onde a mesma não possui grande produtividade, restando a
sociedade dedicar-se ao setor terciário e, até mesmo, migrarem para outras regiões do
Rio Grande do Sul, ou para outros Estados, ou então, ofertando parte de suas terras para
a agricultura através do arrendamento ou da venda.
A Mesorregião enfrenta o desafio de atrair e reter empreendimentos que se motivem
mutuamente e sejam dependentes de atributos locacionais específicos da Campanha
Gaúcha. Em razão da gravidade, diversidade e complexidade dos problemas enfrentados
pela Mesorregião, é importante observar que a reversão da atual situação depende de um
conjunto de ações interdependentes.
Neste sentido, aponta-se que inicialmente, é necessário investimentos no setor primário,
o qual, pode ser obtido através de incentivos governamentais e empresariais aos
produtores da Mesorregião para aumentar a criação de gado de corte intensivo e
aprimoramento genético, a fim de maximizar a mesma, otimizando a produção da carne
bovina, almejando o mercado externo. Para tanto, há a necessidade de melhorar a
inspeção sanitária, por parte do Estado, a fim de competir com outros mercados,
principalmente o internacional, uma vez que o mesmo faz fronteira com o Uruguai e a
Argentina e estes possuem um mercado bastante desenvolvido neste setor, o que torna a
competitividade maior.
Destaca-se que a estrutura fundiária deste recorte espacial permanece, ainda, baseada
em grandes propriedades, como resquícios do passado estancieiro e charqueador,
embora as pressões exercidas pelos movimentos sociais de luta pela terra pressionem
esta concentração.
O incentivo também deverá ocorrer na produção de arroz, o qual possui elevado índice
de especialização na produção de grãos. A indústria de beneficiamento merece atenção
pela sua dependência de fatores naturais, pois, se estes não forem favoráveis, poderá
acarretar sérios problemas e comprometer o desenvolvimento local/regional.
A presença de novas cadeias produtivas como a fruticultura e a silvicultura deverá ser
incentivada, contribuindo para o incremento local/regional. No que diz respeito a
fruticultura tem destaque a produção de cítricos e uva principalmente. Ressalta-se, que
esta iniciativa tem apoio dos pequenos produtores rurais que, apostam na fruticultura
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como uma alternativa para dinamizar a Metade Sul do Estado e minimizar os problemas
sociais.
Desse modo, novos polos produtores da cadeia produtiva da fruticultura, tem surgido no
Estado, localizando-se principalmente, no extremo oeste e no centro-sul da Campanha
Gaúcha. Ressalta-se que a fruticultura surgiu para associar-se às cadeias produtivas
tradicionais (pecuária e arroz), uma vez que, não altera o caráter concentrador da terra,
pois se desenvolve em pequenas propriedades.
No que se refere ao florestamento, os investimentos tem se concentrado na porção oeste
da Campanha Gaúcha. Esta atividade econômica caracteriza-se pelo investimento de
grandes grupos ligados a produção de celulose, como o grupo Votorantin-Celulose e
Papel (nacional) e a Stora-Enso (Sueco-finlandesa), os quais alicerçam sua produção no
plantio de pinus e eucalipto em grandes áreas.
Como a economia dessa Mesorregião está concentrada no setor primário, é nesse que as
políticas públicas deverão ser estimuladas visando o crescimento. Assim, cabe aos
governantes locais/estadual, a função de trazer novas indústrias para instalar-se na
Mesorregião, através da redução de impostos e incentivos fiscais, fornecendo a infra-
estrutura necessária para o crescimento deste setor, aumentando o número de empregos
locais, minimizando as desigualdades sociais presentes na Campanha Gaúcha, e que no
decorrer do tempo estão sendo agravadas.
Sugere-se também a instalação de indústrias dos ramos frigoríficos, vinícolas e
indústrias de suco e derivados, a fim de aproveitar a matéria prima presente e, desta
forma, dinamizar a região. Pode-se assim, fabricar produtos de diversos ramos,
utilizando a mão de obra local e agregando valor as unidades produtivas.
Contudo, a presente pesquisa, visa a melhoria da qualidade de vida da população, para
que não precise buscar melhores condições e oportunidades em outros locais. Desta
forma, sistematizou-se e disponibilizaram-se essas informações aos órgãos gestores com
intuito de fornecer subsídios a este recorte regional gaúcho, juntamente com seus
administradores para que os mesmos tenham acesso ao conhecimento da realidade local,
ou seja, os principais entraves ao desenvolvimento, e que de posse dessas informações
busquem o desenvolvimento sustentável que venha minimizar os desequilíbrios
econômicos e sociais da Mesorregião da Campanha Gaúcha.
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