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A ORDEM PÚBLICA COMO JUSTIFICATIVA AO ENCARCERAMENTO PROVISÓRIO DE TRABALHADORES LIGADOS AOS MOVIMENTOS SOCIAIS NO BRASIL: do inimigo da filosofia política ao inimigo no processo penal. Daniela Felix Teixeira 1 Patrick Mariano Gomes 2 Resumo: O presente artigo tem como finalidade situar as contradições do Poder Público, seja pela via do Poder Executivo, quanto do Poder Judiciário, no uso excessivo das prisões cautelares, por meio do indefinido conceito de Ordem Pública, em face dos membros e ativistas políticos da luta pela terra e sua ocupação legítima, com base na função social da propriedade. Para tanto, necessário se fez situar as principais lutas históricas e quais os conceitos de ordem que estão em jogo no nosso modelo de sociedade moderna capitalista, bem como o que se pretende com as prisões cautelares de representantes, no caso, do Movimentos dos Trabalhadores sem Terra (MST). Resumen: El actual artículo tiene como propósito de precisar las contradicciones de una fuerza pública, cualquiera para la manera del ejecutivo, cuánto de la poder judicial, en el uso extremo de la acción para un remedio provisional arresta, por medio del concepto indefinido de la orden pública, en la cara de los miembros y de los políticos de los activistas de la lucha para la tierra y su ocupación legítima, en base de la función social de la característica. Para, en tal manera necesario si hizo para precisar las luchas históricas principales y que los conceptos de la orden que están en juego en nuestro modelo de la sociedad moderna del capitalista, así como qué se piensa con la acción para las detenciones provisionales de un remedio de representantes, en el caso, de los Movimientos de los Trabajadores Sin Tierra (MST). Palavras-chave: criminologia crítica – ordem pública – movimentos sociais - Movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem Terra Palabra-llave: criminologia critica – orden pública - movimientos sociales - movimientos de los trabajadores agrícolas sin la tierra 1. Introdução O presente artigo tem a intenção de levantar algumas considerações sobre o uso político da prisão preventiva e de instrumentos legais repressivos contra movimentos sociais no Brasil. Para tanto é necessário se situar qual o conceito de ordem pública e de inimigo da filosofia política, bem como analisar a prisão preventiva como elemento principal de um direito penal que busca segregar e tornar inócuos sujeitos seletivamente escolhidos. Diante destes elementos, concentraremos nossas análises nos movimentos sociais de luta pela reforma agrária que, segundo dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT), 1 A Autora é Graduada em Direito pela UNIVALI/SC (2000), Mestre em Direito pelo CPGD/UFSC (2009), Advogada da OAB/SC, Vice-Presidente da Advogados Sem Fronteiras (ASF-Brasil), Pesquisadora do Grupo de Pesquisa e Extensão Universidade Sem Muros (UFSC/CNPq) e Professora universitária. Currículo Lattes/CNPq: http://lattes.cnpq.br/8302153504234332 . e-mail: [email protected] . 2 O Autor tem graduação em Direito pela Faculdade de Direito de Presidente Prudente (2002). Pós-graduação latu sensu em Estudos Latinoamericanos pela Universidade Federal de Juiz de Fora/MG. Advogado pela OAB/SP, desde abril de 2002. E-mail: [email protected] .

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A ORDEM PÚBLICA COMO JUSTIFICATIVA AO ENCARCERAMENTO PROVISÓRIO DE TRABALHADORES LIGADOS AOS MOVIMENTOS SOCIAIS NO BRASIL: do inimigo da filosofia política ao inimigo no processo penal. Daniela Felix TeixeiraPatrick Mariano GomesResumo:O presente artigo tem como finalidade situar as contradições do Poder Público, seja pela via do Poder Executivo, quanto do Poder Judiciário, no uso excessivo das prisões cautelares, por meio do indefinido conceito de Ordem Pública, em face dos membros e ativistas políticos da luta pela terra e sua ocupação legítima, com base na função social da propriedade. Para tanto, necessário se fez situar as principais lutas históricas e quais os conceitos de ordem que estão em jogo no nosso modelo de sociedade moderna capitalista, bem como o que se pretende com as prisões cautelares de representantes, no caso, do Movimentos dos Trabalhadores sem Terra (MST).

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Page 1: A ORDEM PÚBLICA COMO JUSTIFICATIVA AO ENCARCERAMENTO PROVISÓRIO DE TRABALHADORES LIGADOS AOS MOVIMENTOS SOCIAIS NO BRASIL

A ORDEM PÚBLICA COMO JUSTIFICATIVA AO ENCARCERAMENT O

PROVISÓRIO DE TRABALHADORES LIGADOS AOS MOVIMENTOS SOCIAIS

NO BRASIL: do inimigo da filosofia política ao inimigo no processo penal.

Daniela Felix Teixeira1

Patrick Mariano Gomes2

Resumo: O presente artigo tem como finalidade situar as contradições do Poder Público, seja pela via do Poder Executivo, quanto do Poder Judiciário, no uso excessivo das prisões cautelares, por meio do indefinido conceito de Ordem Pública, em face dos membros e ativistas políticos da luta pela terra e sua ocupação legítima, com base na função social da propriedade. Para tanto, necessário se fez situar as principais lutas históricas e quais os conceitos de ordem que estão em jogo no nosso modelo de sociedade moderna capitalista, bem como o que se pretende com as prisões cautelares de representantes, no caso, do Movimentos dos Trabalhadores sem Terra (MST). Resumen: El actual artículo tiene como propósito de precisar las contradicciones de una fuerza pública, cualquiera para la manera del ejecutivo, cuánto de la poder judicial, en el uso extremo de la acción para un remedio provisional arresta, por medio del concepto indefinido de la orden pública, en la cara de los miembros y de los políticos de los activistas de la lucha para la tierra y su ocupación legítima, en base de la función social de la característica. Para, en tal manera necesario si hizo para precisar las luchas históricas principales y que los conceptos de la orden que están en juego en nuestro modelo de la sociedad moderna del capitalista, así como qué se piensa con la acción para las detenciones provisionales de un remedio de representantes, en el caso, de los Movimientos de los Trabajadores Sin Tierra (MST).

Palavras-chave: criminologia crítica – ordem pública – movimentos sociais - Movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem Terra Palabra-llave: criminologia critica – orden pública - movimientos sociales - movimientos de los trabajadores agrícolas sin la tierra

1. Introdução

O presente artigo tem a intenção de levantar algumas considerações sobre o uso

político da prisão preventiva e de instrumentos legais repressivos contra movimentos sociais

no Brasil. Para tanto é necessário se situar qual o conceito de ordem pública e de inimigo da

filosofia política, bem como analisar a prisão preventiva como elemento principal de um

direito penal que busca segregar e tornar inócuos sujeitos seletivamente escolhidos.

Diante destes elementos, concentraremos nossas análises nos movimentos sociais de

luta pela reforma agrária que, segundo dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT),

1 A Autora é Graduada em Direito pela UNIVALI/SC (2000), Mestre em Direito pelo CPGD/UFSC (2009),

Advogada da OAB/SC, Vice-Presidente da Advogados Sem Fronteiras (ASF-Brasil), Pesquisadora do Grupo de Pesquisa e Extensão Universidade Sem Muros (UFSC/CNPq) e Professora universitária. Currículo Lattes/CNPq: http://lattes.cnpq.br/8302153504234332. e-mail: [email protected]. 2 O Autor tem graduação em Direito pela Faculdade de Direito de Presidente Prudente (2002). Pós-graduação latu sensu em Estudos Latinoamericanos pela Universidade Federal de Juiz de Fora/MG. Advogado pela OAB/SP, desde abril de 2002. E-mail: [email protected].

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constataram 204 (duzentos e quatro) prisões de trabalhadores rurais no ano de 20093. Muito

embora o relatório da Comissão não traga a fundamentação destas prisões (se foram flagrantes

ou decretadas preventivamente pelo Poder Judiciário), consideramos um parâmetro

importante para dimensionarmos o uso (ou abuso) das prisões contra estes ativistas destes

movimentos, lembrando que as pautas de reivindicação deles são universais e justas, qual

seja, direito à terra, ao trabalho, à dignidade, à justiça social e à inclusão.

Todas as lutas sociais pela terra e pela igualdade na sua distribuição, enquanto

instrumento de trabalho e sobrevivência, perpassam vários momentos históricos do nosso

País, porém infelizmente continuam no rol das promessas não solucionados do pacto da

modernidade.

2. Antecedentes históricos

Vários são os Movimentos de Lutas pela Terra no Brasil e na América Latina, da

mesma forma que são variadas as suas bandeiras de lutas e de realizações. No Brasil, os

parâmetros históricos são inúmeros, motivo pelo qual se faz um breve apontamento sobre os

principais fatos históricos que pautam a nossa análise neste trabalho.

Demarca-se, num primeiro momento, o surgimento das ligas camponesas no

Nordeste4, em 1954, dada a partir da exigência pelos trabalhadores rurais de garantia, pela

Prefeitura de Vitória de Santo Antão/PE, ao direito de sepultar seus mortos em caixões

individuais, pois até então, os enterros de camponeses pobres eram realizados em caixões

coletivos e reutilizáveis, demonstrando a completa negligência pelo Estado do direito à

memória.

Tanta era a precariedade das condições de trabalho no meio rural do nosso País, que

fez com que esta luta dos trabalhadores do Engenho Galiléia por caixões, se tornasse uma

centelha que despertasse uma grande organização social pela reforma agrária.

Nos anos que se seguiram ao episódio de Vitória de Santo Antão/PE, as ligas

camponesas conquistaram uma dimensão política nacional e internacional, que somente

cessou com o estado de exceção que se iniciou em 1964.

3 CANUTO, Antonio; LUZ, Cássia Regina da Silva;WICHINIESKI, Isolete (Coord.). Conflitos no Campo Brasil 2009. São Paulo:CPT/Expressão Popular, 2010. 200 p. Disponível em <http://www.cptnac.com.br/pub/publicacoes/33404e4d06be2a90a8dd008d60b0fe6d.pdf >. Acesso em 23.ago de 2010. 4 MONTENEGRO, Antonio Torres. As Ligas Camponesas e a Construção do Golpe De 1964. Disponível em <http://www.fundaj.gov.br/licitacao/observa_pernambuco_02.pdf> Acesso: em 23 ago de 2010.

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Seu principal líder, Francisco Julião, acabou preso preventivamente por um ano com

base na Lei nº 1.802, de 5 de Janeiro de 1953, editada pelo Presidente Getúlio Vargas. Segue

trecho da denúncia5:

Assim, vitorioso o Movimento Armado de 31 de Março do ano passado, as chamadas Classes Conservadoras de Pernambuco e alguns militares do Exercito entraram a classificar o Movimento Social organizado e promovido pelo Paciente como constituindo o crime do art. 2º, III, da lei nº 1.802, de 5 de Janeiro de 1953, que diz: “Tentar: ‘III – Mudar a ordem política ou social estabelecida na Constituição, mediante ajuda ou subsidio de Estado estrangeiro ou de organização estrangeira ou de caráter internacional

Para justificar esta classificação diz a denúncia:

a) ‘sobre o que tem sido a atuação deste denunciado no Estado, desnecessário seria fazer um retrospecto, pois, é sabida a desenvoltura com que agitou sempre a zona rural, não só de Pernambuco como dos Estados Unidos vizinhos, tudo no sentido de, fiel aos seus princípios marxistas-leninistas do desvio chinês e extremamente ligado a Cuba e ao seu ditador Fidel Castro, fazer a mudança do regime democrático instalado neste País, uma Republica Socialista à sua feição ou gosto’; b) ‘disputava com o sr. Miguel Arraes de Alencar a liderança no Estado, tudo praticando para estar em evidencia, e com a maior soma de forças sob seu controle’; c) ‘as suas Ligas Camponesas são organizações auxiliares do Partido Comunista e as contradições existentes são, exclusivamente, quanto aos métodos seguidos para chegar ao Poder político; os objetivos são exatamente os mesmos: marxismo-leninismo;” d) ‘tudo em Francisco Julião reflete agitação popular, exclusivamente agitação. Nenhum programa de recuperação ou ajuda. O lema é: tanto pior, melhor’; e) “nesse modo Julião fermentava o ódio e a discórdia e o fazia, evidentemente, ligado ao Partido Comunista que é internacional e subvencionado por potencias estrangeiras, em particular, no seu caso, Cuba, conforme os registros de Prestes’ f) ‘por tudo isto a sua ação foi altamente criminosa, a sua posição foi de Chefe, não só no Nordeste, porém, em todo Brasil, conforme é do conhecimento público. Ele é justamente o Chefe do desvio cubano, no Brasil, como muito precisamente acentuou o ilustre Encarregado do IPM às fls. 6.111, do volume XXVIII’; g) ‘suas

5 GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Direito e história. Francisco Julião, as ligas camponesas e o Supremo Tribunal Federal. Um estudo de caso. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1557, 6 out. 2007. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10475>. Acesso em: 28 ago. 2010.

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viagens aos paises comunistas era com o fito de recebendo instruções, ajuda o material próprio, de retorno à Pátria que vilipendiou, cavar-lhe a ruína, mudando seu regime político, a sua estrutura social’(...)

A inicial acusatória, datada de 1964, é recheada do contexto político da Guerra Fria e

foi o que justificou sua custódia cautelar que durou mais de um ano.

Não é nossa intenção discorrermos sobre a história das Ligas Camponesas no

Nordeste Brasileiro, mas sim sobre o uso das prisões cautelares, que são utilizadas contra

movimentos que reivindicam mudanças sociais.

A prisão cautelar de Francisco Julião é um exemplo paradigmático da discussão que

queremos realizar. O advogado permaneceu preso sem culpa formada por mais de um ano(!).

Nem mesmo sua notoriedade, nem seu cargo, então Deputado Federal, foi óbice para a

ilegalidade de seu cárcere.

Se o tratamento penal ao representante mais notório das Ligas Camponeses foi o

banimento, por meio da prisão cautelar, o que diremos dos trabalhadores e trabalhadoras

rurais que não detinham nem notoriedade, nem cargo político relevante(?).

O regime político de exceção impôs às ligas camponesas um completo banimento.

Centenas de camponeses foram presos, torturados e mortos.

O estado de exceção que o Brasil viveu após 1964 se manifestou em matéria legal de

maneira mais evidente por meio dos chamados Atos Normativos que cercearam direitos

fundamentais como o habeas corpus e a organização política.

O mais notório deles foi do AI 56 que fechou o Congresso Nacional e suspendeu os

direitos políticos de votar e ser votado.

Chama-nos especial atenção a parte dedicada à justificativa do Ato Normativo:

CONSIDERANDO que, assim, se torna imperiosa a adoção de medidas que impeçam sejam frustrados os ideais superiores da Revolução, preservando a ordem, a segurança, a tranqüilidade, o desenvolvimento econômico e cultural e a harmonia política e social do País comprometidos por processos subversivos e de guerra revolucionária; CONSIDERANDO que todos esses fatos perturbadores da ordem são contrários aos ideais e à consolidação do Movimento de março de 1964, obrigando os que por ele se

6 BRASIL. Senado Federal. Ato Institucional n° 5. Disponível em <http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=194620 >. Acesso em: 19 ago de 2010.

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responsabilizaram e juraram defendê-lo, a adotarem as providências necessárias, que evitem sua destruição (...) (sem grifo no original).

Se os atos normativos foram o substrato político que possibilitou ao Estado de

Exceção brasileiro combater o inimigo ou os que perturbavam a ordem pública, havia já,

entretanto, desde 1941 uma permissão legal que possibilitava o encarceramento de

perturbadores da ordem pública.

O artigo 312 do Código de Processo Penal Brasileiro vigente autoriza a prisão

cautelar (sem culpa formada) de qualquer investigado ou processado cuja liberdade cause

abalo à ordem pública.

Uma vez reconhecida a ordem pública como justificativa da contenção cautelar,

passamos, a um segundo momento, que é a sua conceituação e compreensão dentro do

ordenamento jurídico brasileiro.

3. A aplicação da Ordem Pública no campo internacional: Estados de Exceção

O conceito de ordem pública tem sua origem histórica no estado de exceção e está

intimamente ligada ao exercício da política.

Em 1919, na Alemanha, durante o conturbado período do entre guerras,

estabeleceu, no art. 48 da Constituição de Weimar7, que no caso de perturbação ou “(...)

ameaça grave a segurança e ordem pública na República compete ao Presidente decretar as

medidas necessárias ao restabelecimento da ordem e da segurança, mesmo com o recurso a

forca armada.” E continua: “Para este fim, pode suspender, total ou parcialmente, os direitos

fundamentais dos artigos (...)”.

Quem determinava, portanto, se a ordem pública estava ameaçada era o chefe do

poder político.

Para Agamben8, “não é possível compreender a ascensão de Hitler ao poder sem

uma análise preliminar dos usos e abusos desse artigo nos anos que vão de 1919 a 1933”. O

uso político do art. 48 da Constituição de Weimar possibilitou prisões em massa de milhares

de militantes comunistas, judeus ou daqueles assim considerados como “inimigos do estado”.

7 MIRANDA, Jorge. Textos históricos do Direito Constitucional. Lisboa: Editora Imprensa nacional-casa da moeda, 1990, p. 277. 8 AGAMBEN, Giorgio. Estado de Exceção. 2. ed. São Paulo: Editora Boitempo, 2004, pags. 28 e 29.

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Foi com reforma nacional-socialista de 19359 que o processo penal alemão

incorporou a permissão para se determinar o encarceramento provisório com fundamento na

excitação da opinião publica que o delito provocou.

Há, portanto, uma ligação histórica entre o conceito de “inimigo” da filosofia política

de Carl Schimitt e do artigo 48 da carta Constitucional de Weimar e seu uso posterior para o

processo penal. Gunther Jackobs, com seu livro “Direito Penal do Inimigo”, publicado em

1985, se fundamenta na filosofia política de Schmitt para justificar o uso do Direito Penal

contra “inimigos”.

O contexto histórico do período entre guerras e a situação da Alemanha (que vinha

de derrota da 1ª das grandes guerras mundiais), exigia que se elegessem os culpados dessa

derrota e do infortúnio do povo Alemão e, que sobre estes caísse a segregação, o isolamento e

o banimento que só as prisões são capazes de possibilitar.

As reformas legislativas que se sucederam na Alemanha após a II Guerra retiraram

do ordenamento legal a possibilidade de se determinar a prisão para garantia da ordem

pública.

4. O conceito de Ordem Pública no Brasil

A palavra ordem, em seu sentido dicionário, no que compete a este estudo, pode ser

compreendida de três formas: ordem jurídica, ordem política e ordem pública propriamente

dita. Assim, por ordem pública temos

(...) O complexo das instituições, dispositivos e regras que visam a manter o bom funcionamento do serviço público, a segurança e a moralidade nas relações entre indivíduos e instituições, em princípio não substituíveis por acordos ou convenções.10

9 BAROSIO, Vittorio. Il processo penale tedesco: dopo la riforma de 1965. Milano: Dott. A. Guiffrè Editore, 1967, p. 16: “La riforma nacionalsocialista del 1935 aveva aggiunto altri due motivi, consistenti, rispettivamente, nel pericolo che <<l’imputato approfittasse della libertà per cometere nuovi reati>> (e.d. Wierderholungsgefahr), e nella circonstanza che, <<per la gravità dell’azione commessa e per l’eccitazione dell’opinione pubblica da essa provocata, non fosse tollerabile lasciare l’imputato in libertà>> (Erregubg der Öffentlichkeit) (4).Nelle 1945 venne eliminato il secondo motivi e, con la legge di unificazione de 1950, anche il primo (5).” 10 AULETE, Caldas. Dicionário digital contemporâneo da Língua Portuguesa.

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Embora na leitura pura e simples do caput do art. 144, da Constituição da República

do Brasil, de 1988 (CRFB/88), a compreensão leve a se pensar que o antônimo de ordem11

seja tão somente o significado de desordem, mas a etimologia estabelece a ordem e a

desordem, no ponto de vista administrativo e institucional, como uma forma de regulação

entre os indivíduos e suas as relações, além, os indivíduos em relação com as instituições

públicas12.

Destaca-se, entretanto, que entender o conceito de ordem tendo como oposição a

desordem, é reduzi-la à lógica conflitual, o que torna preponderante a importância dos órgãos

policiais na solução dos conflitos entre o Estado e a Sociedade, seja ela a sociedade civil,

militar, jurídica, etc.

Assim, busca-se em Norberto Bobbio outra definição para ordem pública, que a

compreende sob dois aspectos distintos e igualmente relevantes, a ordem pública material e a

ordem pública constitucional. A primeira, dada pela circunstância fática tendo como

finalidade do ordenamento político e de Estado, estipulada, assim, nas disciplinas de direito

público e de organização estatal, “(...) como sinônimo de convivência ordenada, segura,

pacífica e equilibrada, isto é, normal e conveniente aos princípios gerais de ordem desejados

pelas opções de base que disciplinam a dinâmica de um ordenamento”13. Explicando que

(...) constitui objeto de regulamentação pública para fins de tutela preventiva, contextual e sucessiva ou repressiva, enquanto que a jurisprudência tende a ampliar o conceito "material" de Ordem pública até fazer incluir nele a execução normal das funções públicas ou o normal funcionamento das instituições como a propriedade, de importância publicitária (ordem legal constituída).

Nesta perspectiva assinala o Autor que um dado sistema normativo que tem a ordem

pública material como fundamento pode ser modificado conforme “(...) a variação da

inspiração ideológica e dos princípios orientadores (democráticos ou autocráticos, por

exemplo), cada ordenamento dará uma disciplina própria (ampla ou restrita) das hipóteses

de intervenção normativa e de administração direta tendentes a salvaguardar a Ordem

11 AULETE, Caldas: Ordem “(...) 2 Disposição, colocação, arranjo metódico de coisas baseados em certas relações entre elas ou em certos critérios de qualidade, conveniência, utilidade etc. (Antôn.: desordem.)” 12 cf. LAZZARINI. Estudos de direito administrativo, p. 53. 13 BOBBIO, Dicionário de Política, p. 851.

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pública. é importante sob o perfil das possíveis repercussões conseqüentes sobre a esfera

jurídica dos vários sujeitos de um ordenamento”14.

O outro aspecto é a Ordem Pública Constitucional, enquanto

(...) limite ao exercício de direitos e assume particular importância quando referida aos direitos de liberdade assegurados pela constituição: neste caso se indica que não é possível questionar um limite de caráter geral ligado à chamada Ordem pública constitucional — que parece fazerem coincidir com o conjunto dos princípios fundamentais de um ordenamento — porquanto dos princípios gerais não se poderiam originar limites situados além dos já previstos no âmbito da disciplina constitucional de cada um aos direitos. 15

Assim, conclui que em ambos os modelos de Estados, sejam de ordem pública

material ou constitucional, têm se estabelecido “(...) uma noção elástica de Ordem pública

que trouxe consigo a ampliação dos limites e permite uma maior redução dos direitos de

liberdade. Contudo, se bem que por motivos diferentes, observou-se sempre uma elasticidade

semelhante nos ordenamentos primeiramente lembrados” 16, ou seja, é um conceito variável

que concorre entre regimes ditatoriais aos democráticos e que em termos práticos ele pode

ampliar as garantias ou restringi-las, bastando o interesse ideológico em jogo.

Dadas estas noções, visualizamos claramente as possibilidades de manuseio

conceitual, conforme o modelo de Estado que se institui, mesmo nos moldes mais

democráticos, pode-se incorrer no uso e supressão de direitos individuais e sociais, tendo-se

como finalidade uma noção de ordem autoritária e, até mesmo, arbitrária.

Diferentemente do que sustenta Álvaro Lazzarini, que diz ser “vaga a noção de

ordem pública”17, compreende-se que o Poder Constituinte brasileiro tratou de estabelecer, no

próprio art. 144, da CRFB/88, a forma administrativa que tutora esta ordem, ou seja, a via

legislativa infraconstitucional e executiva, definindo, assim, a ordem pública e sua

materialidade, diferentemente do modelo de ordem pública constitucional conceituado por

Norberto Bobbio, que se pauta tão somente em seus princípios constitucionais como garantia

de uma possível “paz social”.

14 BOBBIO, Norberto Bobbio; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política. trad. Carmen C, Varriale et al. Brasília: Editora UnB, 1998. v. 1, p. 851-852. 15 Ibid., p. 851. 16 Ibid., p 851-852. 17 LAZZARINI, Álvaro. Estudos de Direito Administrativo. 2. ed. São Paulo: RT, 1990, p. 53.

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Álvaro Lazzarini de forma lacônica e maniqueísta define, ainda, que a ordem pública

“é efeito de causa segurança pública (...) efeito da causa tranqüilidade pública ou, ainda,

efeito da causa salubridade pública (...) cada um tem por objeto assegurar a ordem

pública”18.

A carência de percepções políticas e ideológicas que estão inseridas nesta noção de

ordem acaba por produzir a maleabilidade conceitual e leva a segurança pública a um variado

rol de discursos e práticas institucionais. É dentro deste contexto que o Brasil está inserido,

principalmente quando se verifica a ambiguidade do modelo de Estado estabelecido e a

pluralidade de discursos em favor do estabelecimento desta dita ordem pública.

Depreende-se, como já aludido, que nossa Constituição estabelece por ordem pública

a forma material, deixando a cargo das disciplinas de Direito Público sua definição e

organicidade, ou seja, compete ao Direito Administrativo, Direito Penal e Direito Processual,

bem como outras legislações especiais e leis orgânicas institucionais que se fizerem

necessárias as formas e a condução da ordem e, por consequência, os caminhos da segurança

pública.

Com isso, o constituinte deixou a possibilidade da modificação conceitual, que foi

moldada na medida da adoção de políticas públicas direcionadas entre os modelos neoliberal e

social democrata.

Atualmente o que verificamos é um “nó” paradigmático e metodológico, uma vez

que nossa constituição está assentada num modelo que pressupõe o bem-estar social, por via

de direitos e garantias pétreas, e a política econômica galga a passos largos rumo ao modelo

de Estado liberal.

No Brasil, embora o Código de Processo Penal de 1837 já trouxesse19 o “clamor

publico” como fundamento para a prisão antes da culpa formada, ela estava ligada a prisão em

flagrante, ou ao chamado quase-flagrante, sendo que foi somente no CPP de 1941, na Era

Vargas20, que a ordem pública ficou atrelada a prisão preventiva.

18 Ibid., p. 53. 19 “Art. 131. Qualquer pessoa do povo póde, e os Officiaes de Justiça são obrigados a prender, e levar á presença do Juiz de Paz do Districto, a qualquer que fôr encontrado commettendo algum delicto, ou emquanto foge perseguido pelo clamor publico. Os que assim forem presos entender-se-hão presos em flagrante delicto”. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LIM/LIM-29-11-1832.htm>. Acesso em: 13 ago de 2010. 20 CRUZ, Rogério Schietti Machado. Prisão cautelar: dramas, princípios e alternativas, p. 37: “Chegamos então, ao Código de Processo Penal de 1941, elaborado na ambivalência autoritária que caracterizou o Estado Novo de Getúlio Vargas, influenciado pela matriz facista italiana de Mussolini, e, consequentemente, pelos códigos elaborados nesse regime de cariz totalitário”.

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Não existe na jurisprudência, uma definição do que seja ordem pública. Na maioria

dos casos o conceito vem atrelado à suposta periculosidade do agente, que por sua vez

também é outro termo vago.

A única definição legal para o conceito de ordem pública vem do artigo 2º da Lei

Federal 88.777/83, que regulamenta as Polícias Militares e do Corpo de Bombeiros, aprovada

pelo então Presidente João Figueiredo:

14) Grave Perturbação ou Subversão da Ordem - Corresponde a todos os tipos de ação, inclusive as decorrentes de calamidade pública, que por sua, natureza, origem, amplitude, potencial e vulto: a) superem a capacidade de condução das medidas preventivas e repressivas tomadas pelos Governos Estaduais; b) sejam de natureza tal que, a critério do Governo Federal, possam vir a comprometer a integridade nacional, o livre funcionamento de poderes constituídos, a lei, a ordem e a prática das instituições; (...) 19) Manutenção da Ordem Pública - É o exercício dinâmico do poder de polícia, no campo da segurança pública, manifestado por atuações predominantemente ostensivas, visando a prevenir, dissuadir, coibir ou reprimir eventos que violem a ordem pública. (...) 21) Ordem Pública -.Conjunto de regras formais, que emanam do ordenamento jurídico da Nação, tendo por escopo regular as relações sociais de todos os níveis, do interesse público, estabelecendo um clima de convivência harmoniosa e pacífica, fiscalizado pelo poder de polícia, e constituindo uma situação ou condição que conduza ao bem comum. (...) 25) Perturbação da Ordem - Abrange todos os tipos de ação, inclusive as decorrentes de calamidade pública que, por sua natureza, origem, amplitude e potencial possam vir a comprometer, na esfera estadual, o exercício dos poderes constituídos, o cumprimento das leis e a manutenção da ordem pública, ameaçando a população e propriedades públicas e privadas.

Há que se recordar as considerações sobre a manipulação conceitual de ordem

pública, explicitado anteriormente, vez que as definições legais embora claras, partem de uma

lei exarada por uma instituição predominantemente repressiva em uma época que precede a

Carta Constitucional democrática de 1988, e que não passou por reformas estruturais e

ideológicas desde que se constituiu – base sustentada no regime ditatorial do Estado

brasileiro.

Outra ponderação é sobre a tênue linha divisória entre ordem e disciplina, mesmo

imperando no senso comum que o antônimo de ordem é a desordem, que, por sua vez,

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ensejaria a sinonímia com disciplina, típica das relações militares, a ordem que deve estar

presente conceitualmente é aquela que diz respeito às relações dos indivíduos com as

instituições públicas, por via das suas prestações jurisdicionais na esfera administrativa e nas

prestações de serviços públicos estabelecidos constitucionalmente, não, tão somente, por via

das agências de segurança pública.

A própria definição do conceito remete a outros conceitos vagos como “convivência

harmoniosa e pacífica”, “bem comum”, etc. O ideal de sociedade pacificada e harmoniosa

guarda relação com a ausência de conflitos e isto só é possível numa sociedade utópica em

que todas as necessidades humanas estejam satisfeitas ou, em regimes totalitários, que o

conflito é esmagado pela força da repressão.

A Lei de Segurança Nacional, também de 1983, foi o que fundamentou o ingresso,

em 11 de março de 2008, por parte do Ministério público Federal de Carazinho/RS ação

criminal contra oito trabalhadores rurais ligados ao MST. Segundo a denúncia21, nos anos de

2004, 2005, e 2006, os grupamentos dos quais faziam parte os acusados “constituíram um

‘Estado Paralelo’, com organização e leis próprias”, teriam resistido ao cumprimento de

ordens judiciais “ignoraram a legitimidade da Brigada Militar” , teriam utilizado táticas de

“guerrilha rural”, com o apoio de organizações estrangeiras , tais como Via Campesina e

FARC.

Há um sem número de leis ainda vigentes que poderiam ser chamadas de entulho

autoritário, pois pensadas e aprovadas por regimes de exceção.

5. Fundamentos da Pena Privativa de Liberdade

Inicialmente, relembramos o que dizem os dois Tratados mais notórios do século

XX, aos quais o Brasil é signatário, sobre a limitação da acusação criminal e da liberdade

individual.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, diz no art. 11 que “Toda a

pessoa acusada de um ato delituoso presume-se inocente até que a sua culpabilidade fique

legalmente provada no decurso de um processo público em que todas as garantias

necessárias de defesa lhe sejam asseguradas”22.

E a Convenção Americana de Direitos Humanos, denominada também de Pacto de

São José da Costa Rica, de 1969, estabelece no art. 7° o Direito à Liberdade pessoal:

21 SCALABRIN, Leandro. Criminalização dos protestos e movimentos sociais. Publicação da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos e Instituto Rosa Luxemburg Stiftung. São Paulo, 2008, p. 247. 22 NAÇÕES UNIDAS. Declaração Universal de Direitos do Homem. Resolução 217ª (III).

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1. Toda pessoa tem direto à liberdade e à segurança pessoal. 2. Ninguém pode ser privado de sua liberdade física, salvo pelas causas e pelas condições fixadas de antemão pelas Constituições Políticas dos Estados Partes ou pelas leis ditadas conforme elas. 3. Ninguém pode ser submetido à detenção ou encarceramento arbitrários. 4. Toda pessoa detida ou retida deve ser informada das razões de sua detenção e notificada, sem demora, da acusação ou acusações formuladas contra ela. 5. Toda pessoa detida o retida deve ser levada, sem demora, a um juiz ou outro funcionário autorizado pela lei para exercer funções judiciais e terá direto a ser julgada dentro de um prazo razoável ou ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade poderá estar condicionada a garantias que assegurem seu comparecimento em juízo. 6. Toda pessoa privada da liberdade tem direito a recorrer a um juiz ou tribunal competente, a fim de que este decida, sem demora, sobre a legalidade de sua prisão ou detenção e ordene sua liberdade se sua prisão ou detenção forem ilegais (...) 7. Ninguém será detido por dúvidas (...).23

Ambas as declarações internacionais sustentam o rol de princípios dos pactos

republicanos dos Estados Ocidentais do século XX, da mesma forma, presentes no nosso

ordenamento jurídico, como de base do modelo republicano-federativo-democrático,

consubstanciados pela Constituição de 1988.

Esta base de formulação de princípios de direitos e de garantias, refletem-se

diretamente em todo o arcabouço legislativo pátrio e, de igual forma, às legislações penais e

processuais penais.

Embora estes códigos, especificamente o código penal e processual penal, datem dos

anos de 1940 e 1941, respectivamente, o legislador24 foi ao longo do tempo fazendo as

alterações, pelas vias reformistas – consubstanciadas em leis ordinárias, decretos, medidas

provisórias, portarias, etc., afim de adaptar o ordenamento ao pacto democrático da

modernidade, ao direito internacional e às relações exteriores.

23 BRASIL. Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969. Decreto nº 678, de 06 nov. 1992. 24 Cumpre salientar que a distinção entre legislador e legislativo. Ao primeiro é todo o sujeito competente de emitir atos com características de leis, ao segundo, termo também utilizado para Poder Legislativo.

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Dito isto, pois, o Brasil por meio de suas opções políticas e ideológicas sempre

cumpriu formalmente as obrigações internacionais, todavia, como delineado anteriormente a

condição de país em desenvolvimento, sob a perspectiva definida por Boaventura de Sousa

Santos de modernismo de oposição25, deixou um grande deficit no campo prático das políticas

sociais, aos quais estão as políticas criminais e penitenciárias.

As prisões, destinadas às penas restritivas de liberdade, desempenham historicamente

a função de seleção dos diferentes e dos socialmente menos “aptos” a galgar a pirâmide

social26.

Como aludido por Odete Maria de Oliveira, a reclusão enquanto confinamento

celular data do século V, o qual a Igreja, em alternativa à penal capital, aplicando a penitência

com o intuinto de resgate do arrependimento pela dor, tendo no século XVIII a sua aplicação

substituída pela pena de morte. Salienta, ainda, a aplicação de outros meios cruéis juntamente

às privações de liberdade, como privações à comida, uso de objetos de torturas, etc.27

Michel Foucault, abordando a importância do processo de humanização das penas,

diz que “A prisão, peça essencial no conjunto das punições, marca certamente um momento

importante na história da justiça penal: seu acesso à ‘humanidade’. Mas também um

momento importante na história desses mecanismos disciplinares que o novo poder de classe

estava desenvolvendo: o momento em que aqueles colonizam a instituição judiciária”.28

Demarcamos aqui a colonização das relações sociais pelo Contrato Social, o qual o

poder judiciário e o poder de punir, já atribuído ao Estado, passam a definir quais são as

condutas consideradas como crime na forma positivada, legitimando a pena privativa de

liberdade como retribuição disciplinar igualitária àqueles infratores das normas penais, sob o

manto do positivismo jurídico.29

“Pode-se compreender o caráter de obviedade que a prisão-castigo muito cedo

assumiu. Desde os primeiros anos do século XIX, ter-se-á ainda consciência de sua novidade;

e entretanto ela surgiu tão ligada, e em profundidade, com o próprio funcionamento da

sociedade, que relegou ao esquecimento todas as outras punições que os reformadores do

25 Menciona-se cf. SANTOS, Boaventura de Sousa. A gramática do tempo: constatando-se a condição do Brasil como país latino-americano colonizado e em desenvolvimento. 26 Cf. RUSCHE, Georg; KIRCHHEIMER, Otto. Pena e estrutura social. 2. ed. Rio de Janeiro: Revan/ICC, 2004, p. 124-136. 27 Cf. OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. 3. ed. Florianópolis: UFSC, 2003, p. 47-51. 28 FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: história da violência nas prisões. Trad. Raquel Ramalhete. Petrópolis, Vozes, 1987, p. 195. 29 Cf. Ibid., p. 195.

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século XVIII haviam imaginado. Pareceu sem alternativa, e levada pelo próprio movimento

da historia”30.

Assim se afirma e se firma o caráter utilitarista da pena.

Esse duplo fundamento - jurídico-ecônomico por um lado, técnico-disciplinar por outro - fez a prisão aparecer como a forma mais imediata e mais civilizada de todas as penas. E foi esse duplo funcionamento que lhe deu imediata solidez. Uma coisa, com efeito, e clara: a prisão não foi primeiro uma privação de liberdade a que se teria dado em seguida uma função técnica de correção; ela foi desde o início uma "detenção legal" encarregada de um suplemento corretivo, ou ainda uma empresa de modificação dos indivíduos que a privação de liberdade permite fazer funcionar no sistema legal. Em suma, o encarceramento penal, desde o inicio do século XIX, recobriu ao mesmo tempo a privação de liberdade e a transformação técnica dos indivíduos.31

Importa destacar que “as alterações da forma de punição revelam a subordinação

da pena às condições econômicas exigidas pela socidade. A trajetória do sistema punitivo

evidenciou esta subordinação (...)”32

No transcurso do processo, o utilitarismo dá espaço ao idealismo, que reveste à pena

um caráter científico retibucionista, pautando-se na filosofia de Hegel e Kant, o qual perpetua-

se até hoje, consubstanciando-se na “formulação de parâmetros precisos e calculáveis de

conduta” plenamente sustentado na legalidade, tendo como obejtivo único a retribuição.33

Assim, como consideram Rusche e Kirchheimer, “O cárcere tornou-se a principal

forma de punição no mundo ocidental no exato momento em que o fundamento econômico da

casa de correção foi destruído pelas mudanças industriais” 34

O que se verifica concretamente é que a pena privativa de liberdade desde a sua

concepção teve como único fim a contenção das massas improdutivas ou aquelas à margem

do sistema econômico, servindo à continuidade da exploração do homem pelo homem.

30 Ibid., p. 195. 31 Ibid., p. 196-197. 32 KATO, Maria Ignes Lanzellotti Baldez. A (des)razão da prisão provisória. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 21. 33 Cf. RUSCHE, KIRCHHEIMER. Op. Cit., p. 143-144. 34 Cf. Ibid., p. 146.

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Modificou-se as estruturas de trabalho, mas as relações de exploração perpetuaram-se e se

perpetuam até nossos dias.

O modelo capitalista e liberal, aboliu o escravismo, tornando todos os cidadãos livres

formalmente, todavia, a liberdade encontrou o seu limite na renda e no trabalho, ou seja, as

bases ideológicas segregacionistas e excludentes continuaram intrínsecas as relações

humanas.

Nilo Batista assevera que se deve “Entender que a prisão moderna é inventada aqui,

dentro de um sistema sobre o qual o pensamento marxista ortodoxo fala. Um artigo definiu

essa economia como uma praça onde você tem de um lado uma prisão e do outro uma

fábrica. A similaridade arquitetônica entre as fábricas e as prisões não é por acaso. No meio

você tem a mão–de-obra reserva”35

Por outro lado, E. Raúl Zaffaroni lança ao debate uma questão muito importante, que

é a forma com que esta concepção européia foi recepcionada na América Latina, e diz que

“ (...) en el Brasil, el proceso tiene ribetes más complicados, pues la estructura colonial quedó

vinculada a la producción esclavista, que sólo termino en vísperas de la proclamación de la

República, aunque no és posible negar el peso de una minoria criolla en el Imperio y de la

ideologia liberal (...)”.36

Ainda, como agravante, Camila Prando afirma que “Houve a adoção praticamente

literal das legislações dos Países Centrais, que se apresentavam de modo quase inadaptável

à realidade marginal. O Código Penal Brasileiro de 1830, por exemplo, combinou em sua

redação matrizes disciplinaristas e contratualistas, e produziu contraditoriedades,

especialmente quanto à regulação de conflitos em que os escravos eram parte” 37.

Assim, conclui que

(...) especialmente no século XIX, com o processo de urbanização brasileiro, que se deu a passagem do controle punitivo privado senhorial enquanto modelo exclusivo, para o controle punitivo público

35

BATISTA, Nilo. Criminalidade não existe. Afasta de mim este cale-se. Disponível em: <http://www.uff.br/calese/entre_vista.htm>. Acesso em: 14 nov. 2009. 36A tradução da fala de Zaffaroni, diz: “(...) no Brasil, o processo tem maiores complicações, pois a estrutura colonial estava vinculada á produção escravista, que só terminou véspera à proclamação da República, não sendo possível negar o peso de uma minoria mestiça ao Império e à ideologia liberal (...)” (tradução livre dos autores) – ZAFFARONI, E. Raúl. Criminologia: aproximación desde un margen. v. 1. Bogotá: Themis, 1988, p. 124. 37 Cf. PRANDO, C. C. M. A contribuição do discurso criminológico latino-americano para a compreensão do controle punitivo moderno: controle penal na América Latina. Veredas do Direito. Belo Horizonte, v. 3, p. 77-94, 2007.

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(...) ocorreu não uma simples transferência do controle privado ao público, ou antes, uma simples especialização e publicização do controle punitivo, mas sim uma relação de complementariedade entre essas duas formas de controle. Sob essa formação histórica do controle penal brasileiro, tudo leva a concluir que em sua organização, o alto grau de violência e, bem, a presença de um controle subterrâneo em consonância ao controle oficial é antes uma formação endêmica própria da estruturação marginal econômica e política e de suas contraditoriedades. 38

Não diferente foi a concepção do Estado Democrático de Direito brasileiro pactuado

em 1988, que adaptou-se à legislação penal e processual penal emanadas de governos

historicamente autoritários e antidemocráticos, desenvolvendo-se, assim, em meio as

ambiguidades jurídicas e sociológicas que são estabelecidas, mesmo tendo como fundamento

os princípios liberais da modernidade, o que Alessandro Baratta denomina de “mito do

Direito Penal como direito igualitário”39.

É neste contexto atual que se enquadram os princípios garantidores de limitações às

penas privativas de liberdade, dentre eles o princípio da presunção de inocência (art. 5° inc.

LVII, da CRFB/1988), em que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado

de sentença penal condenatória”.

Ainda, são estabelecidos outros princípios, também no art. 5°, conexos à preservação

da liberdade, da integridade e do devido processo legal, o qual sustetam o ordenamento penal

e processual penal40.

Todavia há de se pontuar as significativas diferenças entre as penas privativas de

liberdade e as prisões cautelares, dentre tantas, é a formação da culpa – comprovada autoria e

materialidade do delito –, por meio de uma sentença penal condenatória transitada em julgado

que justifique o aprisionamento.

6. A relação entre o conceito relativo de ordem pública e uso arbitrário das prisões

cautelares aos Membros de Movimento Sociais

38 Cf. IBID. 39 BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do Direito Penal. 3. ed. Rio de Janeiro: Revan/ICC, 2002, p. 162. 40 Ver incisos: III, XXXIX, XL, XLV, XLVI, XLVII, XIX , XLVIII, XLIX, L, LIII, LIV, LV, LVI.

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As leis como a que permite o encarceramento provisório com base no abalo à ordem

pública, a de segurança nacional, entre outras, representam o legado de regimes de exceção

pelos quais passamos.

Contraditoriamente é possível, dentro de um Estado Democrático e de Direito, que

tal aparato legislativo seja manejado contra movimentos reivindicatórios de políticas públicas

Constitucionalmente estabelecidas como a reforma agrária.

José Eduardo Faria41 usa o termo “armadilha” para designar essa situação do

legislador que ao se valer de “recursos retóricos” como o da “ordem pública” com vistas a

“superar a rigidez tipificadora da dogmática jurídica” não conseguiu evitar, “a ruptura dos

padrões de unidade e hierarquia inerentes aos princípios da constitucionalidade, da

legalidade e da certeza jurídica.”

Na Espanha, a utilização da ordem pública para prisão preventiva, foi declarada

inconstitucional pelo Tribunal Constitucional, ficando consignado no voto de Manuel Jiménez

de Parga que a utilização deste conceito indeterminado por parte dos Juízes e Tribunais leva a

que “seguramente um desconhecido ‘navajero’ produza mais alarma social em um pequeno

povoado que um famoso ladrão de colarinho branco em uma grande cidade”. 42

Essa permissão legal para se prender e segregar do convívio social sem o devido

processo legal e sem a culpa formada, ou seja, sem as garantias liberais Democráticas está

presente em nossas leis, desde os regimes de exceção até os Democráticos como o atual.

Dados do Departamento Penitenciário (DEPEN) apontam que 39,3 % da população

carcerária do Brasil são de presos provisórios sendo que em onze43 estados brasileiros a

proporção de custodiados cautelarmente é maior que o de condenados por sentença penal com

trânsito em julgado. O Piauí é o estado em que esta proporção é maior: 76,1 %.

41 FARIA, José Eduardo. Eficácia jurídica e violência simbólica: o direito como instrumento de transformação social. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo/USP, 1988. Ref. Biblioteca de Direito da USP, p. 22. 42 SANGUINE, Odone. A inconstitucionalidade do clamor público como fundamento da prisão preventiva. Estudos criminais em homenagem a Evandro Lins e Silva, Sérgio Salomão Schecaira (Org.). São Paulo: Método, 2001, p. 286. Ver habeas corpus nº 84.498/BA, julgado em 14.12.2004, sendo relator o ministro JOAQUIM BARBOSA. 43 BRASIL. Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN. Relatório de 2008/2009, “Sistema Penitenciário no Brasil, Dados Consolidados”. Nos estados de PE, MA, AM, CE, PI, MT, PA, AL, MG, SE, RR o número de presos custodiados cautelarmente é maior que o de condenados com trânsito em julgado. Com destaque para os estados do Piauí (76,1%), Alagoas (70,9%), Sergipe (68,4%), Amazonas (65,2%) e Pernambuco (64,9%). Com relação a 2008, houve um aumento de 13863 novos presos provisórios. Documento encontrado no link: <http://portal.mj.gov.br/depen/data/Pages/MJC4D50EDBPTBRNN.htm> acesso em 11.08.2010.

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Na América Latina, segundo dados do Instituto Latino-Americano das Nações

Unidas (ILANUD)44o país cujo fenômeno do encarceramento provisório se revela mais grave

é a Bolívia, com 79 % de presos do sistema penal sendo provisórios. No contexto latino-

americano oito países apresentam estatísticas piores que por a aqui encontrada45.

Ao analisar o fenômeno do aprisionamento cautelar em nosso continente, E. Raúl

Zaffaroni46 pondera que uma vez posto em marcha essa prática punitiva “todos passam a ser

tratados como inimigos, através de puros confinamentos de contenção, prolongados ou

indefinidos.” Assim, o processo penal acaba legitimando uma prática descontrolada do

exercício do poder punitivo estatal quando deveria servir para garantir direitos do acusado ou

indiciado frente a este poder.

Se o uso da medida cautelar é difundido como forma de prevenção geral e controle

social sobre determinados tipos de crime e grupos sociais, é ao tráfico de drogas que o uso do

conceito de ordem pública é mais utilizado na atualidade.

Como forma de barrar a atuação política de movimentos sociais que cobram políticas

públicas constitucionalmente estabelecidas, o Poder Executivo, por via do aparelho repressivo

do Estado, legitimado pelo Poder Judiciário brasileiro se valem das prisões preventivas com

fundamento na ordem pública para arrefecer a luta pela reforma agrária.

O Juiz de Pilar/PB47, ao determinar a prisão cautelar de trabalhadores rurais ligados

ao Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) assim se justifica:

Além do mais é público e notório nesta jurisdição, que os mesmos são os líderes das invasões promovidas pelo Movimento dos Sem Terra, e constantemente vêem desobedecendo as determinações de reintegração de Posse emanadas do Juizado da 1º Vara de Conflitos Agrários e do Meio Ambiente. O caso já descamba para a baderna, para subversão da ordem pública e para o desrespeito a decisão judicial, cabendo a este Magistrado como guardião na aplicação da lei, adotar medidas coercitivas para conter as investidas criminosas do supra mencionado movimento. Assim, ante o justo do pleito do Douto Representante do Ministério Público e sendo os réus portadores de péssimos antecedentes criminais, conforme acima delineado, torna-se imprescindível as PRISÕES PREVENTIVAS de

44 CARRANZA, Elías (coord.). Cárcere e Justiça Penal na América Latina e Caribe. Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para a prevenção do delito e tratamento do delinqüente, publicação no Brasil realizada pela Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça, 2010, p. 68. 45 Segundo dados do ILANUD: Uruguai, República Dominicana, Peru, Honduras, Bolívia, Panamá, e Paraguai possuem em seu sistema carcerário mais presos provisórios do que condenados definitivamente. 46 Zaffaroni, E. Raúl, O inimigo no direito penal. Rio de Janeiro: Ed. Revan, 2007, p. 109. 47 Ver TJPB, Processo nº 028.2000.000.249-9, decisão de 4 de outubro de 2000.

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todos os denunciados, como garantia da ordem pública, por conveniência da instrução criminal e para assegurar a aplicação da lei.

No estado de São Paulo, na comarca de Teodoro Sampaio, o Poder Judiciário48 local

assim justificou o aprisionamento cautelar com base na ordem pública de integrantes do MST:

Até porque ainda que as mais altas esferas governamentais não queiram reconhecer, assim como se fazia até bem pouco tempo em relação ao denominado PCC, o conhecido MST, se constitui nos dias de hoje um poder de fato nesta região do Pontal do Paranapanema.

Em Curionópolis/PA49, um trabalhador e uma trabalhadora integrantes do MST,

tiveram prisão provisória decretada pelo Juiz daquela Comarca pelo fato de realizarem um

protesto em rodovia:

Aliados à materialidade do delito e aos indícios de autoria, surgem configurados elementos para a decretação da medida cautelar solicitada. A liberdade dos representados prejudica a ordem pública, pela continuidade da influência exercida sobre os acampados, que, frise-se, permanecem às margens da via, incitando novas manifestações, com possíveis obstruções da rodovia, além de fomentar sentimentos de impunidade e indignação na região. Impunidade, pela ausência de punição aos obsessores, que se misturam entre os manifestantes: já que são conhecidas as ocorrências de agressões físicas e verbais, ameaças, constrangimento ilegal e danos sofridos pelas pessoas que necessitam passar pelo bloqueio. Indignação, por não se poder exercer o direito individual de ir e vir, em via pública, lembrando que tratamos de uma importante estrada, eixo de ligação entre o sul do Pará, os Estados do Mato Grosso e Tocantins, com o norte do país. Não podemos fechar os olhos para problemas sociais e fundiários presentes, mas também não podemos admitir o cometimento de inúmeros crimes, em prol da solução destes problemas (fls. 53/54).

48 BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Segunda Câmara Criminal. Habeas Corpus nº 386.660-3/9, relator Des. Canguçu de Almeida. Acórdão de 10 de fevereiro de 2003, v.u. 49 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, processo nº 161.768, rel. ministro Napoleão Nunes Maia.

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O paradoxo é que o protesto realizado na rodovia foi justamente para exigir punição

aos responsáveis pelo episódio que ficou conhecido como massacre de Eldorado dos

Carajás50, em que 19 trabalhadores sem terra foram assassinados pela Polícia Militar do

Estado do Pará, ao reivindicarem reforma agrária.

Passados 14 anos do episódio, nenhum dos 155 policiais denunciados cumpre algum

tipo de medida privativa de liberdade ou restritiva de direito, ou tiveram algum tipo de

reprimenda administrativa por abuso de autoridade, no entanto, os trabalhadores que

realizaram protesto para exigir punição pelo fato, na mesma rodovia em que seus pares foram

assassinados, a resposta do Poder Judiciário vem em forma de prisão cautelar, ainda, prisão

cautelar por contravenções (perturbação da ordem, obstrução de via pública, desacato à

autoridade), segundo nosso ordenamento material penal.

Posteriormente o STJ cassou a decisão de primeiro grau e possibilitou aos

trabalhadores responderem em liberdade ao inquérito instaurado.

A criminalização dos movimentos sociais de luta pela terra acaba por servir para

aumentar o abismo entre as lutas das demandas sociais históricas destes movimentos e está, na

maioria das vezes, ligada ao Poder Judiciário local, visto terem STJ e STF sistematicamente

rejeitado decretação de prisões preventivas contra integrantes destes movimentos.

Em sede do Habeas Corpus de número 4399/SP, o voto do ministro Luiz Vicente

Cernicchiaro assentou que:

Não vislumbro, substancialmente – não obstante o aspecto formal respeitável despacho de prisão preventiva -, no caso concreto, demonstração de existência de crime de quadrilha ou bando, ou seja, infração penal em que se reúnem três ou mais pessoas com a finalidade de cometer crimes. (...) Há sentido, finalidade diferente. Revela sentido amplo, socialmente de maior grandeza, qual seja a implementação da reforma agrária.

Em outra oportunidade o STJ, em voto (HC nº 27856/SP) do ministro Paulo Medina

assentou:

50 MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA. Disponível em: <http://www.mst.org.br/especiais/27/destaque >. Acesso em: 12 ago. de 2010.

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(...) Registre-se, diversamente do afirmado no acórdão hostilizado, que os pacientes são obreiros rurais integrantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, que lutam e sacrificam-se por mais razoável meio de vida, onde a dignidade social somente pode ser restaurada no momento em que se fizer a verdadeira, necessária e indispensável reforma agrária no País. Enquanto campear a incerteza de seus resultados e for incerta a atuação política, encontrar-se-á a revolta justa e a insatisfação crescente dos menos favorecidos nos contextos econômico, social e político do Brasil.

O Supremo Tribunal Federal ao julgar ordem de Habeas Corpus (nº 91616/RS)

contra integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST da região de

Carazinho/RS, em processo que se determinava a prisão cautelar de 8 (oito) integrantes desta

organização política, rejeitou a argumentação de que a atuação dos trabalhadores frente ao

movimento importaria em risco à ordem pública:

1. A convivência das figuras da prisão cautelar e da presunção da não-culpabilidade pressupõe que o decreto de prisão esteja embasado em fatos que denotem a necessidade do cerceio à liberdade de locomoção. 2. Às instâncias colegiadas não é facultada a complementação do decreto de prisão, eventualmente impugnado. No caso, o fundamento da conveniência da instrução criminal foi acrescentado, pelo Tribunal de Justiça, ao decreto de prisão preventiva. Ilegalidade caracterizada. 3. A simples afirmação de que os pacientes carecem de domicílio certo e conhecido não tem a força de lastrear a segregação provisória para assegurar eventual aplicação da lei penal. 4. É ilegal a prisão preventiva para a garantia da ordem pública, baseada tão-somente na gravidade do fato, na hediondez do delito ou no clamor público. Precedentes. 5. A alteração da base empírica, existente no momento da decretação da prisão, implica a mudança dos fundamentos da custódia. 6. Ordem concedida, mediante o compromisso de comparecimento dos pacientes aos atos processuais.

Mesmo tendo o STJ e STF reiteradamente rejeitado a criminalização realizada no

processo penal contra os movimentos, ainda se aplica, – e os dados da CPT demonstram isso

– muito comumente, esse recurso contra os integrantes de movimentos sociais.

A ordem pública, conceito vago e impreciso, fruto da legislação autoritária do

período entre guerras, é o que mais cabe ao julgamento conservador dos atores do direito que

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visualizam como crime estas novas demandas sociais que se apresentam no regime

Democrático.

Entender que a ação coletiva de ocupação de terras dos movimentos sociais do meio

rural brasileiro coloca em risco a ordem pública e que, portanto, se pode indiscriminadamente

segregar cautelarmente seus integrantes é entender que na Democracia não cabe o conflito e

negar a existência de problemas sociais históricos que o capitalismo não conseguiu resolver.

Para Marilena Chauí51 aqueles que se vinculam à tradição liberal da Democracia vêm

como “o regime da lei e da ordem para a garantia das liberdades individuais”, o que

redunda na nesta tentativa de conter os conflitos sociais. Esquecem, segundo a filósofa que

“democracia, mais que respeito às leis estabelecidas, é conflito.” A Democracia é “a única

forma da política que considera o conflito legítimo.”

Com Espinosa, Chauí52 aponta que a boa política se dá quando a esperança (“uma

alegria inconstante nascida da idéia de uma coisa futura ou passada”) vence o medo (“uma

tristeza inconstante de uma coisa futura ou passada” ) e permite que a concórdia supere a

discórdia entre os homens. Mas, não qualquer concórdia, há que ser a uma concórdia

Democrática, ou seja, um regime em que os cidadãos não estejam submetidos a nenhum poder

tirânico. A paz não é a simples ausência de guerra. Uma cidade na qual a paz depende da

inércia dos súditos deve mais corretamente ser chamada de solidão que de cidade53.

Na decisão do Habeas Corpus de número 5574, o Superior Tribunal de Justiça fez

constar que movimento popular visando implantar a reforma agrária não caracteriza crime

contra o patrimônio, mas sim “configura direito coletivo, expressão da cidadania, visando a

implantar programa constante da Constituição da República. A pressão popular é própria do

Estado de Direito.”

O reconhecimento por parte do Poder Judiciário de que o conflito é inerente ao

regime Democrático, não é isolado, felizmente. Mesmo com o entulho autoritário ainda

vigente em nossa legislação, a tentativa de criminalizar as ações dos movimentos sociais não

recebe apoio de muitos setores da sociedade civil e autoridades dos três poderes da República.

A Constituição da República limita o exercício do direito de propriedade com a

necessidade de se respeitar a função social, só é propriedade, portanto, aquela que cumpre sua

função social. Em caso de não observância deste requisito ela deverá ser desapropriada para

reforma agrária. Além disto, a dignidade da pessoa humana é direito fundamental, portanto, o

51 CHAUÍ, Marilena. Chauí defende veia conflituosa da democracia. Folha de São Paulo, São Paulo, 25 ago. 2006. Ilustrada, Caderno E-4. 52 Ibid. 53

Ibid.

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contraponto legal para a luta dos trabalhadores e trabalhadoras rurais sem terra é a

Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988.

Lembramos, por fim, que Ex-Presidente da República, Dr. Fernando Henrique

Cardoso, sancionou, em junho de 2002, a Lei nº 10.469, que instituiu o dia 17 de abril, como

dia nacional de luta pela Reforma Agrária, ou seja, trata-se de uma luta legítima pelo direito à

Terra àqueles despossuídos que buscam suas subsistência.

Há de se reconhecer, contudo, que a luta pela terra acompanha toda a história da

Humanidade e é o instrumento de dominação do Homem pelo Homem.

7. Conclusões

Inicia-se esta fala utilizando-se uma afirmação de Nilo Batista, em artigo recente para

uma agência jornalística, que traduz em parte os caminhos que seguem as políticas criminais

da modernidade: “Hoje a gente vive um sistema penal esquizofrênico”54.

Esta consideração torna-se compreensível à medida que se mergulha no universo de

discussão teórica e política da segurança pública. Por um lado verifica-se toda uma linha de

raciocínio teórica sustentada na etiologia que visa a legitimação do modelo neoliberal, por

outro, o discurso com vistas à emancipação social, e realização da “cidadania”.

Insertos neste cenário estão agentes de segurança pública e sociedade civil. O

primeiro grupo quer a violência, pois arrumar a casa precisa da ordem – compreendida

enquanto disciplinamento –, o segundo, embora cansado de tanta desigualdade, espera a

justiça, porém, o mais perverso é que o dito popular tem absoluta razão, pois mesmo

acometida de sua “cegueira” usual, ela “tarda, mas não falha”.

Embora a pena não devesse ter qualquer relação com as prisões cautelares, os

indícios da sua aplicação além do aceitável55, apontou para a necessidade de situá-las no

âmbito da legislação brasileira, assim, especificou-se o estabelecido por pena restritiva de

liberdade e, no seu interior, a pena de reclusão e a de detenção.

Verifica-se que todas as políticas de segurança pública empreendidas neste período

reforçam as condutas socialmente reprováveis de etiquetando seletivo dos sujeitos, em quem

recaiu a dura mão do Estado Policial.

Assim, verifica-se, pelas análises consubstanciadas na presente pesquisa, a

predominância e perpetuação dos discursos etiológicos, codificados para o senso comum, com 54 BATISTA, Nilo. Op. Cit. 55 Não se pode esquecer que um dos pressupostos que motivaram a pesquisa foi a média de 1/3 (um terço) de presos provisórios no Brasil, cf. os relatórios Estatístisticos-Analíticos do Sistema Prisional pesquisados no ano de 2008.

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o intuito de digesto e “líquido” nos tempos de globalização, termos vagos e ideológicos, pois

têm o condão de perpetuar o status quo por meio domínio do poder político e de suas

instituições de controles formais e informais.

Neste fluxo do desenvolvimento, o poder de deturpação de conceitos e de afirmações

de preconceitos por estes mecanismos de controle social, fomenta e legitima a sedimentação

destas práticas de contenção e de extermínio, como solução para a violência rural, que reduz a

população à exclusão e impõe as prisões cautelares como o atual remédio de prevenção ao

crime, objetivando a baixa estatística da que se compreende como criminalidade e violência.

A criminalidade combatida é a criminalidade de rua, que atinge tão somente aos

mencionados etiquetados, selecionados por não terem na estrutura social o amparo nas esferas

de cidadania.

A estrutura social, rural e urbana está, em grande parte do mundo globalizado,

segmentada entre os bons e os ruins. Tal concepção maniqueísta da vida, não se restringe à

segurança pública e à definição do inimigo, ocorre em todos os estratos da vida em sociedade.

Desconsidera-se, por outro lado, que na sociedade globalizada, que possui a média

populacional de 6,5 milhões de pessoas56 que não há podium com 1ª colocação para todos os

seres, muitos, sequer, poderão se inscrever na “Competição de Acesso à Dignidade”, tantos

outros não sobreviverão para assistir ao final.

Desta forma, perpetua-se a visão de mundo bipolar, bem e o mal, sempre na esfera do

ponto de vista moral e dos bons costumes. Ocorre que esta lógica maniqueísta, que subtrai da

análise e do debate teórico-ideológico estrutural (micro e macrossociológico) de segurança

pública da construção dos conflitos penais, sustenta uma indústria57 muito rentável, mais

rentável até que a indústria das comunicações. Inclusive, os meios de comunicação passam a

ser veículos dentro deste conjunto de operações multimilionárias da economia neoliberal,

implementadas pela bandeira de solução à “segurança pública”.

O senso comum de criminologia (dominado pelo paradigma etiológico) afirma que

são necessários mais policiais nas ruas; os policiais afirmam ser necessário o aumento salarial;

o administrador público municipal diz que deve o Governo Federal municipalizar a segurança

e, assim, implementar as verbas destinadas a este fim, para pôr em prática a contenção dos

índices de criminalidade; o Administrador Penitenciário clama pela privatização do cárcere.

56 Cf. AZEVEDO, Carolina Gomma de (Brasil). ONU (Comp.). Relatório Mundial sobre Drogas 2008 do UNODC. 57 A indústria do controle do crime cf. CHRISTIE, Nils. A indústria do controle do crime: o caminho dos GULAGs em estilo ocidental. Trad. por Luis Leiria. São Paulo: Forense, 1998. 227 p.

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Os presos do sistema penitenciário até onde se limitou a pesquisa sofriam de um

surto de afonia. As mães que tiveram seus filhos mortos pela “guerra de bandidos e

mocinhos” estavam velando os corpos.

No meio do caminho foram questionados os ébrios acadêmicos sobre o poder e a

segurança pública. Alguns não se atreveram, mas houve quem dissesse que o caminho não é

esse. Precisamos mudar o tom da prosa, a fim de não vermos as próximas gerações tendo

como único limite o cárcere.

Assim, subscreve-se a metáfora utilizada por Nilo Batista sobre a esquizofrenia que

prepondera no Sistema de Justiça Criminal, afirmando-se a utopia de construção de “um

outro Mundo possível”.

Os regimes de exceção deixaram não somente um rastro histórico de prisões em

massa, desaparecimentos, torturas e mortes. Seu aparato legal continua por aí, ainda vigente

em nossos Códigos e, o que é mais grave, no pensamento de muitos atores jurídicos que ainda

insistem em aplicá-los contra os mais pobres (desorganizados e organizados), aos primeiros,

como forma de controle e gestão da miséria de Democracias que ainda não solucionaram os

principais problemas do capitalismo.

E, aos segundos, - os mais pobres que ousam se organizar através de movimentos

reivindicatórios de direitos Constitucionalmente estabelecidos - o aparato legal repressivo é

acionado como poder simbólico, para que exemplarmente seja dado recado aos outros em

mesma situação econômica: não se organizem, nem participem da política, muito menos

expressem sua cidadania.

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