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A NOVA POLÍTICA DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO E O PROGRAMA CIÊNCIA
SEM FRONTEIRAS NA UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DA AMAZÔNIA
Luma Barbalho Pontes1 José Augusto Ewerton de Sousa2
Resumo Este artigo objetiva analisar o Programa Ciência sem Fronteira (CsF) na modalidade graduação-sanduíche da Universidade Federal Rural da Amazônia. Partindo da hipótese de que o Programa não atinge a meta de produzir conhecimento inovador nesta universidade, faz-se uma revisão bibliográfica e documental para apreciar as novas configurações econômico-sociais brasileiras e a Política de Ciência, Tecnologia e Inovação (C,T&I), apresentando análise quantitativa inicial de dados obtidos dos Currículos Lattes dos alunos CsF/UFRA. Resultados obtidos indicam que ex-bolsistas apresentam pouca produção, portanto, é indicativo de que o Programa não cumpriu a proposta de promover consolidação de C,T&I na modalidade analisada.
Palavras-chave: Ciência sem Fronteiras; Política de C,T&I; Internacionalização da Educação Superior; UFRA.
Abstract This paper aims to analyze the Program Science without Borders (SwB) in the undergraduate-sandwich modality at Federal Rural University of Amazonia (UFRA). Based on hypothesis that the Program does not reach the goal of producing innovative knowledge, a bibliographical and documentary review is done to evaluate new Brazilian socio-economic configurations and Science, Technology and Innovation (S,T&I) Policy, presenting an initial quantitative analysis of data obtained from Lattes Curricula of SwB students. Results obtained indicate that students have little academic production, therefore, this is indicative that the Program didn’t comply with proposal to promote consolidation of S,T&I in the analyzed modality.
Keywords: Science without Borders; Policy of S,T&I; Internationalization of Higher Education; UFRA
1 Aluna de Mestrado em Educação. Universidade Federal do Pará – UFPA. E-mail: [email protected] 2 Aluno de Mestrado em Educação. Universidade Federal do Pará – UFPA. E-mail: [email protected]
I. INTRODUÇÃO
O Programa Ciência sem Fronteiras (CsF), objeto de estudo deste trabalho, é
uma política pública que conjuga aspectos das políticas de educação e políticas de ciência,
tecnologia e inovação. O CsF foi originado pelo decreto Nº 7.642 de 2011, instituído pela
presidenta Dilma Rousseff em 13 de dezembro de 2011, e teve por objetivo incrementar a
internacionalização da ciência e tecnologia brasileiras, mediante a formação de recursos
humanos altamente qualificados, utilizando a ferramenta do intercâmbio internacional com
universidades renomadas, bem como fomentar a competitividade das empresas brasileiras e
o desenvolvimento de Ciência, Tecnologia e Inovação.
O presente artigo apresenta resultados preliminares da pesquisa de mestrado
em curso, a qual visa estabelecer nexos entre a nova política de Ciência, Tecnologia e
Inovação no Brasil, o Programa Ciência sem Fronteiras, e os resultado obtidos por ex-
bolsistas do Programa na Universidade Federal Rural da Amazônia, no período de 2011 a
2015, buscando analisar a produção de C,T&I desses alunos. Esta pesquisa está baseada
na análise documental das leis e decretos que estabelecem o programa e as informações
contidas no portal oficial do mesmo, assim como na revisão bibliográfica que dá
embasamento à compreensão do Estado e as racionalidades desta Política Pública.
A temática do Programa Ciência sem Fronteiras ainda não foi totalmente
explorada na sua análise como política pública de educação e de C,T&I e sobretudo sobre
os resultados obtidos pela mesma. Justifica-se, então, a investigação proposta no presente
trabalho, isto principalmente se levarmos em consideração o montante investido pelo
governo federal no programa, o qual em apenas uma das agências executoras, a CAPES,
foi na ordem de 7 bilhões de reais, entre 2012 e 2016 (CAPES, 2017) na realização do CsF
O presente artigo está composto por cinco partes: “A crise do capitalismo e suas
repercussões”; “A nova Política C,T&I e o programa Ciência sem Fronteiras”; “Ciência sem
Fronteiras e seu modelo de Internacionalização”; “A Graduação Sanduíche no Exterior (CsF)
na Universidade Federal Rural da Amazônia”; e “Conclusões”.
II. A CRISE DO CAPITALISMO E SUAS REPERCUSÕES
Para decifrar o contexto político e econômico do surgimento do Programa
Ciência sem Fronteiras, faremos inicialmente uma breve contextualização da crise estrutural
do capital (MÉSZAROS, 2011), as relações entre Estado e desenvolvimento econômico no
Brasil, com foco principalmente nas consequências desta relação na nova Política de
Ciência, Tecnologia e Inovação, compreendendo que “políticas públicas são aqui entendidas
como o “Estado em ação” [...] é o Estado implantando um projeto de governo, através de
programas, de ações voltadas para setores específicos da sociedade” (HOFLING, 2001, p.
31), faz-se, então, necessário analisar o Estado para assim conceber suas políticas.
Harvey (2011, p. 14) indica que o mundo passou por centenas de crises
financeiras desde 1973, cita exemplos do embargo árabe sobre petróleo, crash do mercado
imobiliário global, o boom japonês, a crise nórdica, crises de crédito e poupança nos
Estados Unidos, isto para dizer que não há nada de novo na atual crise do modelo
especulativo do sistema capitalista neoliberal. Segundo HARVEY (2011, p. 18)
As crises financeiras servem para racionalizar as irracionalidades do capitalismo.
Geralmente levam a reconfigurações, novos modelos de desenvolvimento, novos
campos de investimento e novas formas de poder de classe.
Na análise de Harvey (2011) o colapso atual do sistema neoliberal de livre
mercado não teria levado ao fim desse sistema, segundo o autor, este projeto tem sido bem
sucedido na sua centralização de riqueza e poder, o mesmo não demonstra nenhum indício
de que esteja morto, ao contrário o princípio continua sendo o mesmo de privatizar os lucros
e socializar os riscos.
Seguindo este raciocínio, se a pesar da crise financeira mundial desencadeada
em Wall Street em 2008, o modelo neoliberal se mantém vigente no mundo capitalista, faz-
se imperativo compreender o papel desempenhado pelo Brasil nesta configuração
econômica mundial.
Historicamente, de acordo com Paulani (2010, p. 119), “o discurso neoliberal no
Brasil começou a se firmar e a fincar raízes nas eleições presidenciais de 1989”, desde a
eleição de Collor, à continuação com Fernando Henrique Cardoso que se elegeu com a
promessa de modernizar o país, e mais adiante, com o discurso do estado de emergência
no governo Lula.
O Neoliberalismo, aquele inaugurado com Friedrich Hayek e Milton Friedman,
assume feições específicas no Brasil, de dependência dos países da economia central,
Paulani (2010) define os rounds da dependência periférica do Brasil, desde o primeiro round
com as matérias primas com o pau-brasil; o segundo round como parte na relação entre
Metrópole e Colônia; o terceiro, já no século XX, como novo mercado em tempos de
superacumulação; o quarto, no início do capitalismo rentista, como absorvedor de
poupanças; até o atual quinto round com, conforme define Paulani (2010, p. 133)
a securitização da dívida externa, internacionalização do mercado brasileiro de
títulos públicos e a abertura dos fluxos internacionais de capital fizeram do Brasil, a
partir dos anos iniciais da década de 1990, emergente plataforma de valorização
financeira internacional, capaz de proporcionar aos rentistas nacionais e
estrangeiros impensáveis ganhos em moeda forte.
Além desse perfil de plataforma de valorização financeira internacional, Paulani
(2008) aponta também outra característica da economia brasileira, a seu processo de
desindustrialização, cuja porcentagem de emprego industrial chega à casa de 3,1%.
Corroborando com a tese proposta por Paulani (2008), as análises de Kato (2013) apontam
que essa opção de desenvolvimento financeiro adotado desde a época FHC, em detrimento
de uma política industrial, vem encolhendo a capacidade brasileira de acumular riquezas e
controlar o aumento da miséria social.
Neste aspecto Kato (2013) demonstra que o governo Lula opta pela
implementação de uma nova política industrial, a fim de gerar crescimento produtivo, com
promoção de emprego, infraestrutura básica e em C,T&I, com objetivo de lastrear a riqueza
financeira, mantendo a agenda da financeirização da economia brasileira.
Isto posto, podemos identificar as novas feições do capitalismo financeiro no
contexto mundial e no Brasil. Apreendemos que apesar das crises o modelo neoliberal não
foi exaurido, pelo contrário, assumiu novas formas de dominação, nessa reconfiguração o
Brasil assume papel de plataforma de valorização financeira (PAULANI, 2010), o que
provoca a desindustrialização da economia no país, mais adiante, para combater a mazelas
produzidas por esse fenômeno, o governo Lula inaugura uma nova política de Ciência,
Tecnologia e Inovação, que tem como objetivo investir nas áreas produtivas a fim de mitigar
as mazelas sociais, mas ainda mantendo a posição do Brasil no mercado financeiro.
III. A NOVA POLÍTICA C, T & I E O PROGRAMA CIÊNCIA SEM FRONTEIRAS
Todo contexto político-econômico brasileiro descrito até o momento condicionou
uma alteração nas estruturas institucionais da sociedade brasileira, sobretudo no âmbito das
políticas de C,T&I que assumiram novo papel, estratégico, para o desenvolvimento
econômico do país, inclusive a Universidade encontra-se no bojo dessas alterações
ocorridas.
Kato comprova mediante suas pesquisas que o fundo público, a riqueza social
brasileira, vem sendo utilizado para fomentar pesquisas e produção do conhecimento em
áreas estratégicas, que tem como objetivo promover o desenvolvimento industrial do Brasil,
ou seja “o fundo público passa a ser naturalizado pelo capital por meio da indução à
produção do conhecimento, orientado pelas demandas de natureza econômica” (KATO,
2013, p. 21).
Segundo Kato (2013), esse novo modelo de financiamento público das
pesquisas, na modalidade induzida, já era praticada no Brasil desde a década de 1990. Com
a chegada de Lula à presidência da República, foi lançada a nova Política Industrial,
Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE) que apresenta objetivos de fortalecer e
expandir a base industrial do Brasil, a fim de oferecer condições competitivas para a
indústria brasileira no mercado mundial.
Na mesma linha de raciocínio as universidades públicas também são incluídas
nessa nova política e portanto consideradas como estrutura importante na produção de
ciência e tecnologia, e ainda de desenvolver um papel relevante na formação de recursos
humanos altamente qualificados (KATO, 2013). Esses atributos vão ao encontro das
características, objetivos e metas do Programa Ciência sem Fronteiras.
O Programa Ciência sem Fronteiras, “busca promover a consolidação, expansão
e internacionalização da ciência e tecnologia, da inovação e da competitividade brasileira
por meio do intercâmbio e da mobilidade internacional” (BRASIL, 2017a). O Programa foi
criado por iniciativa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) junto ao
Ministério da Educação (MEC), e executado por suas agências de fomento, o Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
De acordo com o site oficial do Programa, o CsF teve por objetivo desenvolver a
sociedade do conhecimento no Brasil mediante a formação de pessoal altamente
qualificado. Também teve como objetivo inserir o Brasil no contexto da pesquisa e
desenvolvimento internacionais, fomentar a indústria tecnológica e atrair talentos científicos
para o país (BRASIL, 2017a).
A meta do projeto era atingir a implementação de 101 mil bolsas para alunos de
graduação e pós-graduação e pesquisadores em quatro anos (encerrando em 2015), sendo
que cerca de 75 mil das bolsas deveriam ser financiadas pelo governo brasileiro e 26 mil
financiadas por empresas privadas, segundo informações contidas no portal do programa
(BRASIL, 2017a). O propósito do programa seria enviar estudantes e pesquisadores
brasileiros para as mais conceituadas instituições de ensino e pesquisa do globo.
O Programa Ciência sem Fronteiras não ofertou oportunidades para todas as
áreas do conhecimento, pelo contrário, desde a sua origem o programa, alinhado com seu
objetivo de desenvolvimento industrial, determinou seus objetivos de promover a ciência,
tecnologia e inovação a fim de aumentar a competitividade da indústria nacional, e para isto
foram determinadas áreas prioritárias, mediante Portaria Interministerial nº 1, de 9 de janeiro
de 2013, que pudessem alavancar o processo de modernização. Claramente as áreas
apontadas estão relacionadas com o desenvolvimento industrial e produção de inovação
tecnológica, e excluídas as ciências humanas, sociais e sociais aplicadas.
Essa política de seleção de áreas prioritárias afeta o âmbito da produção
científica no país, as universidades são tomadas pela racionalidade econômica. E ademais,
demonstra a aposta do governo brasileiro em um desenvolvimento científico descolado do
desenvolvimento social. Contribuindo mais para a produção de bens de valor para o
mercado do que a para a formação de ciência crítica dentro das universidades. O Ciência
sem Fronteiras surge então como programa de governo de um Estado neoliberal que busca
mediar as relações para a manutenção do mercado financeiro internacional.
IV. CIÊNCIA SEM FRONTEIRAS E SEU MODELO DE INTERNACIONALIZAÇÃO.
Tendo em vista que dois dos objetivos estabelecidos por lei para o programa
Ciência sem Fronteiras foram promover a internacionalização das instituições de ensino
superior brasileiras e ampliar a mobilidade internacional dos estudantes brasileiros, faz-se
necessário investigar como se desenvolveram essas duas modalidades.
O processo de internacionalização da educação superior tomou força a partir da
década de 1990, e teve sua expansão bem relacionada com o processo de mercantilização
da educação propalada pela sociedade do conhecimento e pela regulamentação da
educação como serviço comercial pela Organização Mundial do Comércio (OMC).
Segundo Morosini (2006) o Brasil se destaca inicialmente como um consumidor
em potencial de educação de alta qualidade. Este cenário é confirmado pelo Programa
Ciência sem Fronteiras, pois os participantes do programa usufruíram dessa educação
internacional não gratuita (em alguns casos) com a conta paga pelo governo brasileiro.
Para Chaves (2014, p. 37) internacionalizar seria o “processo de integrar uma
definição internacional, intercultural e ou global nos objetivos, funções (ensino/
aprendizagem, investigação, serviços) e distribuição do ensino superior.” Ainda segundo a
autora, as motivações para a promoção da internacionalização de instituições de ensino
superior podem ser acadêmicas, econômicas, políticas ou religiosas. Mediante análise sobre
conjuntura político-econômica do Brasil no contexto do surgimento da nova política de
C,T&I, pode-se denotar que o programa CsF teve fortes motivações econômicas.
Morosini (2011) define dois modelos de cooperação internacional. O primeiro é o
modelo de Cooperação Internacional Tradicional (CIT), o qual é “caracterizado por relações
de competitividade entre as instituições de educação superior (IES) na captação de sujeitos
e de consumidores” (Morosini, 2011, p. 95); e o segundo modelo é denominado Cooperação
Internacional Horizontal (CIH), o qual é baseado na solidariedade e na troca igualitária. A
cooperação internacional tradicional tem suas relações mais marcadas pela lógica do
mercado, e predominantemente se dá nas relações Norte-Sul (ou centro-periferia), no qual o
Sul (periferia) busca qualificação no Norte (centro), enquanto que a cooperação
internacional horizontal pode verificar-se em relações Sul-Sul, entre semelhantes.
Sobre a relação entre esses dois modelos de cooperação Azevedo e Catani
(2013, p. 285) depreendem uma contradição entre a “solidariedade internacional e a
concorrência em um mercado global de educação e conhecimento”. E no contexto da
internacionalização da educação superior brasileira, afirmam os autores, que o modelo
“periférico, desigual e subordinado está de acordo com o modelo de desenvolvimento
adotado pelo país, o qual preza pelos interesses do capital financeiro.”
O Ciência sem Fronteiras apresentou características de internacionalização por
meio de Cooperação Internacional Tradicional, pois os países escolhidos foram
preferencialmente aqueles de economia central, excluindo a troca solidária entre similares.
Compreendemos também que o programa teve forte motivação econômica, tendo em vista
as áreas prioritárias que claramente fazem parte na nova política de C,T&I que visa o
desenvolvimento da indústria brasileira.
V. A GRADUAÇÃO SANDUÍCHE NO EXTERIOR (CSF) NA UNIVERSIDADE FEDERAL
RURAL DA AMAZÔNIA
A Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA) é uma Instituição de Ensino
superior que foi criada em 2002 a partir da Faculdade de Ciências Agrárias do Pará (FCAP),
tem sua tradição marcada pelos cursos das ciências agrárias e áreas relativas, porém com a
política de expansão da Universidade começaram a ser criados outros cursos das áreas
tecnológicas, ciências sociais aplicadas e licenciaturas. A UFRA tem sede em Belém – Pará,
e conta com cinco campi no interior do estado: Paragominas, Parauapebas, Capitão Poço,
Capanema e Tomé-Açu (UFRA, 2017a).
O processo de internacionalização da UFRA encontra-se em estágio inicial, a
estrutura da Assessoria de Cooperação Interinstitucional e Internacional (ACII) da
Universidade conta apenas com um gestor, uma secretária e um estagiário, e a Instituição
conta apenas com dez acordos de cooperação internacional vigentes, de acordo com dados
contidos no site da ACII (UFRA, 2017a). As primeiras saídas de alunos para intercâmbio do
Ciência sem Fronteiras datam de setembro de 2012, e as últimas de setembro de 2015.
A distribuição das bolsas implementadas na Universidade Federal Rural da
Amazônia se deu da seguinte forma: foram implementadas um total de 112 bolsas, sendo
109 de graduação sanduíche, 02 de doutorado sanduíche e 01 de doutorado pleno. A área
prioritária contemplada com maior número de bolsistas foi “Produção Agrícola Sustentável”,
com 36 bolsistas, seguida de “Engenharias e demais áreas tecnológicas”, com 17 bolsistas,
e “Computação e Tecnologias da Informação” e “Energias Renováveis” com 14 bolsistas
cada (tabela 01).
Tabela 01 - Bolsas Implementadas na UFRA por Área Prioritária
O país de destino que mais recebeu alunos da UFRA foi Estados Unidos, com
37% dos bolsistas, seguido de Canadá com 15% e França com 12,5%, outros países como
Austrália, Espanha, Hungria, Irlanda, Itália, Portugal, China, Reino Unido, Alemanha,
Holanda e Noruega, também receberam bolsistas da UFRA (BRASIL, 2017a) conforme
aponta Tabela 02.
O objeto deste trabalho serão apenas os bolsistas da modalidade graduação
sanduíche. A amostra de análise é composta de 96 alunos da UFRA que receberam bolsa
do Programa Ciência sem Fronteiras, ficam excluídos desta análise os alunos contemplados
com bolsas do Programa Brafagri3, por motivos de falta de dados deste programa. Foram
utilizadas como ferramentas de pesquisa a Plataforma Lattes e o Sistema Integrado de
Gestão Acadêmica utilizado na UFRA para o levantamento de dados dos ex-bolsistas. A
distribuição de bolsas por curso de graduação de origem se deu conforme Tabela 03 Todos
os bolsistas da UFRA já retornaram para o Brasil na presente data, as últimas bolsistas
tiveram o retorno marcado para agosto de 2016.
Tabela 02 - Bolsas Implementadas na UFRA por País de Destino
Tabela 03 – Curso de Origem dos bolsistas
Até a dada da pesquisa (fevereiro de 2017), apenas 15 ex-bolsistas do CsF
haviam concluído seu curso de graduação na UFRA, aproximadamente 15% da amostra,
dos quais apenas 06 ingressaram em curso de Mestrado, e 01 ingressou em curso de
Doutorado. Dois ex-bolsistas tiveram seu vínculo cancelado com a UFRA sem conclusão de
curso.
3 BRAFAGRI: Programa ‘Brasil França Agricultura’ da CAPES, este programa é anterior ao Programa Ciência sem Fronteiras mas teve seus os números, a partir de 2012, incorporados ao CsF, porém manteve sua independência no processo de seleção de bolsistas.
A pesquisa sobre a produção acadêmica/científica dos ex-bolsistas, destacamos
que 22% dos alunos pesquisados não atualizam o seu currículo Lattes desde a o período de
intercâmbio pelo CsF; 15% dos alunos tiveram pelo menos um trabalho completo publicado;
30% tiveram até cinco trabalhos apresentados, 9% tiveram mais de cinco trabalhos; 52%
não tiveram nenhum resumo publicado, seja expandido ou não; três ex-bolsistas tiveram
coautoria em capítulo de livro; 79% não tiveram nenhum artigo publicado; 77% não
estiveram ou estão vinculados a algum Projeto de Pesquisa cadastrado. Para finalizar, 36%
dos ex-bolsistas do Programa CsF na UFRA não tiveram nenhum tipo de produção
registradas no seu currículo Lattes, sendo que dois destes alunos já concluíram sua
graduação.
Os dados obtidos pela consulta ao currículo Lattes dos alunos da UFRA que
foram contemplados com bolsa de graduação sanduíche no exterior indicam que talvez não
tenha sido cumprido o objetivo de fomentar ciência, tecnologia e inovação com essa
modalidade de intercâmbio nesta Instituição de Ensino Superior, o trabalho de Azevedo e
Catani (2013) sobre a internacionalização da Educação Superior apontam razões para
insucessos com mobilidade estudantil.
Uma dessas motivações apontadas no trabalho mencionado vem pela
explicação de Bourdieu, segundo o qual “os intercâmbios internacionais estão sujeitos a
uma série de fatores estruturais que geram mal-entendidos. O primeiro fator: o fato de que
os textos circulam sem seu contexto” (Apud Azevedo e Catani, 2013, p.277).
Azevedo e Catani (2013) chamam a atenção para o fato de que políticas de
mobilidade estudantil de países periféricos, quando não são bem planejadas, seja com
preparação prévia dos alunos intercambistas, com formulação de plano de trabalho a ser
executado, e no retorno uma garantia das condições da continuação do trabalho iniciado no
exterior, pode não significar uma troca solidária ou pode não se reverter em ganhos para o
país que investiu na mobilidade, ao contrário pode se constituir apenas de uma relação
mercantil, na qual o país periférico – neste caso Brasil – está pagando a conta da compra de
serviços educacionais que colaboram para a manutenção da hegemonia dos países
centrais.
Semelhante alerta faz também Santos Júnior (2012, p. 346), “o Brasil pode estar
promovendo um amplo processo de transferência unilateral para o exterior de boa parte de
sua mais alta capacidade cientifica nacional”, visto que muitos das pessoas contempladas
com bolsas de mobilidade internacional acabam não querendo ficar no Brasil depois dessa
experiência.
VI. CONCLUSÃO
Conforme exposto ao longo do artigo, pode-se perceber que o Programa Ciência
sem Fronteiras fez parte da nova política de Ciência, Tecnologia e Inovação instaurada no
Brasil pelo governo Lula, a fim de gerar riqueza real para lastrear o modelo de
desenvolvimento econômico baseado na valorização financeira (PAULANI, 2008). O
Programa CsF apresentou diversas características que se alinham a essa nova política,
como por exemplo a definição de áreas prioritárias com exclusividade nas das ciências
exatas, biológicas, engenharias e demais que podem produzir conhecimento no âmbito na
inovação tecnológica; os países parceiros escolhidos também denotam uma relação norte-
sul, com ênfase em países desenvolvidos, com a exclusão de continentes como a África e a
América do Sul.
Não obstante esse alinhamento do Ciência sem Fronteiras com a política de
C,T&I que visa a produção de valor real para a economia brasileira, mediante a análise do
currículo Lattes do ex-bolsistas CsF da UFRA, tem-se um indício de que este investimento
feito na formação desses jovens, na modalidade de graduação-sanduíche no exterior da
UFRA, não esteja sendo traduzido como produção de conhecimento inovador nas suas
áreas de formação. Reconhecemos a limitação dos dados quantitativos apresentados para
definir a contribuição do Programa Ciência sem Fronteiras para o país na produção de
C,T&I, não obstante, consideramos reveladores os dados apresentados, isto não apenas
para a UFRA, mas para trazer à luz as possíveis falhas de um programa nacional, as quais
podem apresentar desdobramentos relevantes para a avaliação desta política pública.
Os dados levantados por este trabalho corroboram a ideia já apontada de que o
Programa Ciência sem Fronteiras não atinge seu objetivo de alavancar a Ciência,
Tecnologia e Inovação no Brasil. Não sem propósito a CAPES já está em processo de
lançamento de um novo programa de internacionalização para a educação superior,
chamado ainda provisoriamente de “Mais Ciência, Mais Desenvolvimento” com foco na
internacionalização via pós-graduação.
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