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A navegação consulta e descarregamento dos títulos inseridos nas Bibliotecas Digitais UC Digitalis, UC Pombalina e UC Impactum, pressupõem a aceitação plena e sem reservas dos Termos e Condições de Uso destas Bibliotecas Digitais, disponíveis em https://digitalis.uc.pt/pt-pt/termos. Conforme exposto nos referidos Termos e Condições de Uso, o descarregamento de títulos de acesso restrito requer uma licença válida de autorização devendo o utilizador aceder ao(s) documento(s) a partir de um endereço de IP da instituição detentora da supramencionada licença. Ao utilizador é apenas permitido o descarregamento para uso pessoal, pelo que o emprego do(s) título(s) descarregado(s) para outro fim, designadamente comercial, carece de autorização do respetivo autor ou editor da obra. Na medida em que todas as obras da UC Digitalis se encontram protegidas pelo Código do Direito de Autor e Direitos Conexos e demais legislação aplicável, toda a cópia, parcial ou total, deste documento, nos casos em que é legalmente admitida, deverá conter ou fazer-se acompanhar por este aviso. Capital, juro e lucro Autor(es): Laranjeiro, Carlos Publicado por: Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra URL persistente: URI:http://hdl.handle.net/10316.2/26100 Accessed : 11-May-2020 13:08:37 digitalis.uc.pt impactum.uc.pt

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A navegação consulta e descarregamento dos títulos inseridos nas Bibliotecas Digitais UC Digitalis,

UC Pombalina e UC Impactum, pressupõem a aceitação plena e sem reservas dos Termos e

Condições de Uso destas Bibliotecas Digitais, disponíveis em https://digitalis.uc.pt/pt-pt/termos.

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de Autor e Direitos Conexos e demais legislação aplicável, toda a cópia, parcial ou total, deste

documento, nos casos em que é legalmente admitida, deverá conter ou fazer-se acompanhar por

este aviso.

Capital, juro e lucro

Autor(es): Laranjeiro, Carlos

Publicado por: Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra

URLpersistente: URI:http://hdl.handle.net/10316.2/26100

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BOLETIM DE CIÊNCIAS ECONÓMICAS SUPLEMENTO AO BOLE TIM DA FACULDA DB DE DIRE ITO DE COIMBRA

VOL ME XXX

Capital , Juro e Lucro *

JEAN BAPTISTE SA Y

Da análise da obra de Ricardo podemos extrair um conjunto de conclusões que servem de ponto de referência, relativamente à perspectivação das questões aqui abordadas, que a Teoria económica posterior a Ricardo veio a desen­volver.

Assim, o conceito de capital é analisado, fundamental­mente, enquanto adiantamente produtivo, i. é, como agente directo da produção. No interior do sistema produtivo o capital influencia directamente uma das variáveis da repar­tição - o lucro - que detém um papel fulcral no âmbito do desenvolvimento equilibrado do sistema. Para a deter­minação de uma taxa de acumulação compatível, somos conduzidos ao problema da variação dos preços relativos e deste ao valor do capital. A procura de uma medida invariável do valor insere-se neste conjunto de questões, já que com ela seria possível quantificar o capital homo­geneamente e com total independência das variáveis distri­butivas. As teses neo-ricardianas pIetendem demonstrar que tal objectivo pode, com hipóteses muito especiais, ser parcialmente alcançado. Mas, em qualquer caso, revela-se impossível falar do capital como uma quantidade dada independentemente dos preços de todo o sistema. (CE Sraffa, cit., 9).

* Continuação do número anterior.

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A resolução tentada por Ricardo bas<.!ia- c n:\ hip6t se duro cumprir efic zmente a funçã medidora. Daqui re ulta que a c crência da análi e d si tema pr dutivo rcal acaba p r er assegurada pelo sistema m netári . Com efcit , sendo uro padrã monetári, a reduçã h mogcnei­zante d capital técnic é fectuada em term ~ d vaI r fmanceiro. I t não ignifica, porém, quc o activ finan-ceitos possam SCl identificados com reai~ nem que respectivos rendimentos ejam qualitativamente iguais . (Confronte-se a derivação paralela das taxa de juro e lucro, feita por Pasinetti). A igualdade obtida no mercado financeiro upõe condições de concorrência perfeita que nã são idênticas à dos outros mercados. A c nclusão ricardiana baseia-se na hip6tese de uma praticamentc ilimitada capa­cidade de endividamento mpre arial s6 p ssíve1 pela consi­deração do capitais pr6prios (nã sujeitos a empréstimo), ou que é mesm, de prezando a figura te6rica do

empresário puro. A prop6sito da obra de Say analisaremo a trans­

formação do posicionamento do capital - e rendimentos a ele ligados -, rticulando-o com a figura do empresário.

1. O «Traité»: Continuidade e ruptura relativamente a A. Smith

J. B. Say coloca-se explicitamente com continuador da obra de Smith. Abundam os elogios e reverências ao grande mestre de Glasgow (1). Porém, na sua opinião,

(I) Say admira sobretudo a inovação metodológica que atribui a Smith: aplicou «à economia política o novo modo de tratar as ciências> (Traité D' Éco/lol/lie Politique, 7. ' cd., Guillaumin et Comp.·, Paris, 1861, 19).

Será curioso notar que Say nunca deixa de ser encomiástico para com Smith mesmo quando directamente se lhe opõe. Para além dos

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mith terá pecado p r fazer uma exposlçao demasiado confu a e sistematicamente desordenada (2). Daí que o seu

bjectivo não fosse além da clarificação e desenvolvimento das «ideias justas) de Smith (3). No entanto, o que, delibe­radamente ou nã ,acaba por acontecer é o desvirtuamento total dos pressuposto básicos e das preocupações funda­mentais de Smith. Deste m do Say será o iniciador de uma das linhas de abordagem da economia que tem Smith como precursor (4). Tentar-se-á de seguida expôr a forma como Say, habilmente, explorou as contradições existentes na obra de Smith e, desenvolvendo sempre uma dos termos da antinomias, constroi um sistema no seu conjunto con­trário à visão smithiana (5).

2. A utilidade

Logo no início do «Traité D'Économie Politique~ Say introduz um elemento que distancia o seu modo de encarar a economia do de Smith: a utilidade.

A distinção introduzida por Smith entre valor de uso e de troca é inteiramente ignorada por Say. A razão de

méritos inquestionáveis do sistema smithiano, Say tem urna razão suple­mentar, de carácter subjectivo, para adITÚrar SITÚth. Com efeito Say era um simples empregado de uma companlúa de seguros sem qualquer contacto com o mundo da economia teórica. Foi após a leitura de uma obra, recomendada pelo seu patrão, que Say se veio a interessar pela economia política. Essa obra foi cA Riqueza das Nações> (Cf. M. A. CLBMENT, Prefdcio ao Traité, cit., IX).

(2) Cf. Traité, cit., 6. (3) Idem, 36. (4) A outra é, obviamente, a ricardiana. (5) A opinião de Marx é bem mais destruidora. Não só rejeitou

por completo as interpretações e teorias próprias de Say como denegriu as suas capacidades analíticas: cSay procura disfarçar a sua falta de profundidade enunciando em termos absolutos tudo o que há de falso e de incompleto em A. Smith. (MARx, Teoria das Mais- Valias, cit. , VII, 214)

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tal facto deve procurar-se na diversa «pré-vi ão» de cada um dos aut res relativamente à ec nomia.

Como vimos upra, valor de uso era, para A. Smith, a «expressão da utilidade proporei nada por um objecto determinado» (6), enquanto o valor de tr ca era entendido como «o poder de adquirir outros ben , que a posse desse objecto po sibilita» (7). Ap6s rejeitar a utilidade como ba e do valor, recorrendo ao famos paradoxo da água e dos diamantes (), Smith põe a primeira questã relevante: «qual a medida real do valor de troca?» (9).

O problema da medida transforma-se em objecto de indagação para que seja compreensível, sob o ponto de vista te6rico, a relação de troca entre s bens. Dilucidado esse ponto tornar-se-ia possível estabelecer a regra que preside à circulação dos bens e avaliar deste modo os desvios que eventualmente existam. A substância do valor é já em Smith (muito mais o será com Ricardo ou Marx) a verda­deira pedra filosofal para a transmutação do emaranhado complexo econ6mico num !>istema claro e transparente. S6 assiro, ap6s um processo de conhecimento racional e científico, a economia podia constituir um guia para a acção humana (10) .

(6) Wealth of Natiol/s, cit., 19. (') Ibidem . (8) Paradoxo que Say também não resolve. Deste modo o argu­

mento lógico invocado por Smith para afastar a utilidade como funda­mento do valor não chega a ser rebatido por Say.

(9) Wealth of Nations, cit., 19. (tO) Acima de tudo um guia para a acção politica. Recorde-se

que Smith escreveu cOl/tra o intervencionismo mercantilista e a favor do liberalismo. O seu posicionamento decorre do perfeccionismo de funcionamento da economia sob a égide da tmão invisíve'\'. Mas tal perfeição só pode ser conhecida e reconhecida como verdadeira depois de uma análise científica e sistemática. Daí a necessidade da descoberta das leis de funcionamento e a enunciação dos princípios de causa-efeito.

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Com tambémjá foi acentuado esse desiderato smithiano é prosseguido perspectivando o problema econ6mico na base de um sistema de relações sociais que organizam e enquadram a produção. O problema do valor centra-se, deste modo, ao nível da pr6pria produção. Sendo o acto valorativo inicialmente individual e subjectivo (11) logo acaba por se objectivar no momento da produção. Em Ricardo esse tipo de abordagem toma-se perfeitamente claro. O con­ceito de valor, ligado por uma perspectiva ftlos6fica bem referenciada ao trabalho (12), emerge na relação homens/ /natureza. Constitui-se um modelo da representação eco­n6mica em que o momento produtivo se coloca como pritH metodol6gico do desenvolvimento te6rico do sistema (13). Por isso, nos autores da Escola Clássica Inglesa, toda a parte referente ao valor de uso e à utilidade individual é tratada de uma forma ráp ida e logo liminarmente afastada para a categoria dos pressupostos da pr6pria existência do problema econ6mico.

A este tipo de modelo, a que chamamos produtivo, contrapõe-se a visão de J. B. Say:

«O valor de cada coisa é arbitrário e vago enquanto não for reconhecido. O possuidor poderá considerá-lo muito elevado sem que com isso seja mais rico. Mas a partir do momento em que outras pessoas aceitem dar em troca, para o adquirir, outras coisas, também elas por seu lado providas de valor, a quantidade destas últimas que se aceita dar em troca é a medida do valor da pri­meira» (14).

(II) Ver supra. p. 72. (12) Ver supra . (13) Confrontar PASINBTTI. StmeturaI Change ... • cit., 7 e DOBB.

Teorias do Valor ...• cit .• 40. (14) Traité. cit .• 54.

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prinClpl da determinaça prévia d valor para chegar, num segund momento, à regra da troca, de aparece por c mplet. problema d val r reduz-se exclusiva­mente ao mom nt da tr ca. A pesquisa bre essa categ ria fundamental d si tema ricardian que era vaI r absoluto, deixa de fazer cntid no am.bit da ab rdagem de Say (15).

O pre up t s fil óficos com que Say ab rda a eco­nomia são radicalm nt diversos dos de Smith ou Ricardo.

(15) Declara mesmo que um tal problema .é a quadratura do círculo. (Traité, p. 275). Uma boa ilustração da diferente atitude de ay relativamente a mith e tá na utilização do trigo como padrão de medida intertemporal.

No âmbito da teoria dedutiva Sm.ith considera o valor como resultante da quantidade de ctoi! and troublet gasto na produção de um bem. E fá-lo porque admite a invariância do esforço físico em qual­quer tempo e lugar. Mas tal invariância não impede a flutuação histó­rica do custo do trabalho, i. e., do salário. Ora na versão aditiva tem de conhecer-se o salário para determinar o valor. Por isso Smith precisa de um instrumento que possibilite o cálculo dos níveis salariais ao longo da história. Para tal recorre ao trigo, argumentando que o salário há-de er proporcional ao preço do bem subsistência (Cf. W. of

atiolls, p. 16). Neste contexto o trigo cumpre a função de indiciador eliminando assim as dificuldades do conhecimento directo do salário.

Say põe de lado as considerações smithianas ligadas à versão dedutiva e centra a sua atenção no procedimento alternativo. Porém em vez de tentar, como mith, obter os preços relativos comparativa­mente com o trigo, elege um padrão absoluto de valor pretensamente invariável ao longo do tempo. Afrrma então que sendo o trigo a base da alimentação isso implica que a «população dos Estados teve, por conse­quência de se adaptar à sua raridade ou abundância.. (Traité, p. 278). Está aqui presente uma concepção radical d.., lei da população de Malthus. Cr. Traité, p. 417. Devido a tal adaptação «a procura desse bem (o trigo), relativamente à ua oferta, deve em todos os tempos, ter sido quase idênticat (p. 278). Conclui então triunfalmente que «o valor de uma certa quantidade de trigo deve ter sido quase a mesma na antiguidade, na idade média e no nosso tempo. (idem).

Quer dizer, ay, que acusou Smith de falta de sistematização, baralha por completo todos os dados. Primeiro rejeita a noção de valor absoluto; depois quando procura uma medida invariável (independente da moeda) elege como padrão uma mercadoria que supõe ter um valor constante.

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o utuitarismo de Condillac e Bentham integram-se numa tradição da economia continental de que Say se constitui c ntinuador. Já Turgot havia desenvolvido uma perspectiva de~te tipo em que o conceito subjectivo de utilidade aparecia c mo elemento chave do estudo da economia. É esse mesmo c nceito que Say irá explicitar, permenecendo hoje de resto, tão actual como então: o que Importa à econonúa é a utili­dade de facto atribuída subjectivamente a um qualquer bem (1 6). O carácter individualista e subjectivo marcará d ravante a ideia de valor: «O valor é a medida da utilidade que atribuímos (às coisas)) (17).

3. O modelo de troca

A invelsão do modelo pode agora consumar-se. Sendo a primeira interrogação económica referida ao lado indi­vidual e subjectivo e nele permanecendo, o percurso da aná­lise deve necessariamente alterar-se. Assim como Keynes inverteu a relação teórico-causal entre poupança e investi­mento, também em Say se detecta um procedimento similar embora bem mais profundo. O princíplO da utili­dade erigido em pedra basilar da análise impõe que a teoria parta do consumo para a produção ao me~mo tempo que o valor se forma na troca e se transfere depois para o acto produtivo (18). Ao defender-se da acusação que lhe foi dirigida, de não entrar em linha de conta com as

(16) Traité, p. 55. (17) !deI/I, 54. (18) Um dos corolários mais importaI.tes desta perspectiva é a

própria defmição de produção como criação de utilidades. Através de r. Fisher ela generalizou-se e é hoje largamente dominante.

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dificuldades de produção na determinaçao do valor, Say expressa com toda a clareza o seu entendimento da questão:

«É evidente que preç c rrente de um produto não poderia, de uma maneira pr longada, descer abaixo d s custos de pr duçã (1 9) ( ... ); mas nã sã os custos de pro­dução que determinam preço que o consumidor consente em pagar: é meramente a ua utilidade» (20).

A utilidade é ag ra o fundamento do valor; os custos de produção o seu mer pressuposto. O modelo decorrente desta forma de entender o problema económico é forçosa­mente um model de troca. Quer dizer, a teorização das relações económicas torna como prius metodológico as trocas inter-individuais e delas parte para :t construção do sistema (21).

Não tem qualquer sentido útil contrapor a abordagem dos clássicos ingleses à de Say, em tetmos de verdade ou falsidade. O que imp rta realçar é o diferente posiciona­mento do economista face à economia. Tanto Smith como Ricardo partem da ptemissa fundamental de que o desen­volvimento material das sociedades é condicionado pelo processo constante de transformação da natureza pelo homem. O quadro geral do raciocúuo econónuco fica assim balizado pela ideia de que, sendo os bens resultado da actividade humana, a maior ou menor quantidade dela neces­sária para produzir há-de ter expressão no acto valorativo. Se a sociedade, globalmente considerada, fizer mais gastos

(19) Say refere-se à teoria aditiva de Smith e à teoria dos custos de produção (= a valor) que atribuía a Ricardo. Como demonstrou Sraffa (ver Prefácio às Works) não era essa a concepção ricardiana.

(20) Traité, 55, nota 2. (21) Também Smith assim procede. Mas, graças à posição espe­

cífica do conceito de trabalho, o processo é mediatizado pelo próprio acto produtivo.

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de energias na obtenção de um bem, este deve ser qualIta­

tivamente superior a um outro. É claro que em qualquer

ca o a utilidade está sempre pressuposta. Assim, se um par de

sapatos é mais caro do que um par de calças essa diferença

surge basicamente em fWlção dos custos e não da utilidade.

Só na mcdida em que utilidade dos bens se revela na procura

o seu valor relativo poderá alterar-se. Ma esta última

questã nã constitui nenhum problema específic para a economia ricardiana ou mesmo de Smith.

Na teorização de J. B. Say a ponderação p icoJógica individual deixa de ser a simples ordem que revela a

necessidade social de U111 bem, mas cujo valor seria aferido

pelo dispêndio social; ao invés, o valor de uso assume papel

de primeira grandez c os custos de produção, em termos

sociais, são relegados para segundo plano. Fica a berto o cami­

nho para as «grandes robinsonadas» - como lhe chamou Marx - e nas quais a atomicidade individual substitui as condições de produção histórico-institucionalmente con­diconadas.

4. A produção como concurso de «factores»

Uma vez deslocado o eixo da análise o problema económico reduz-se à determinação dos preços, o que é mesmo que dizeI, às condições de equilíbrio entrc produção e consumo. A lei da oferta e da procura resolverá p r inteiro essa que~tão . Haverá apmas que sa ber quais as determinantes da oferta e da procura . Esta última será, obviamente, resultante da utilidade atribuída 2 um bem; a oferta dependerá dos custos necessários à pro­duçã .

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Durante pr ces frida pel o cu al r.

pr dutlv a uce siva modifica­aum.elltand a ua utilidade (22),

Ma e criam cntã a utilidade ? Resp nde Say qu é pel (oIICI//'SO d trabalh (indu trie) (23), d capi-tal (24) e d agent naturai (25).

Tend c III c nc it ba c a utilidade e defmind a produção c m ria ã de utilidade, a afa ta de imediato t da a pr bl lllática d lllith e Ricardo relativa a carác­ter nã pr duti o d capital u d agcnte natmai.

III efeit tal qu tã ó p-c n ambito de uma te ria que c ntemple a n ça de vaI r ab olut c mo algo de independente da vici itud do mercad Sendo a tónica c locada na utilidade o clement produtivo pa am a e tar rig r sam nte em pi no de igualdade já que t do ele ão fact r de acréscim dc valor de uso. T ma-se a im muit im.ple inv car mith e extrair dele a parte da ua teoria que genericamente é conformávd com a posição de Say. A teoria aditiva cumpre eficazmente e sa função. Apr veitando a vertente da obra de Smith em que ele c nsidera o valor c mo criaçã dos três elemento produtivo, ay consegue dar a aparência de desen olver Smith quando, devido à invelsão de perspec­tiva que referi, não faz mais do que subverter a sua abordagem. É toda esta linha da teoria económica que e transformará na corrente dominante, enquanto a outra,

(22) Cf. Trai/é, C1t., 585. (23) Defmido como ta acção das forças físicas e morais do homem

aplicadas à produção •. (Trai/é, 577) . (24) Entendido como oma de valores empregues para efectuar

adiantamentos à produção.. (Idel/l ). (25) Sobre o modo como c realiza o concur o de factore ver

Traltl\ cap. IIl.

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através de R..tcardo, marca a teona marxIsta c os m dcrnos neoricardiano post- raft:l.

A perfeita adequação da te ria aditiva de mith a bjectivo de Say impede-o sequer de VCl abjecção

ricardiana. Como já tive a portunidade de refer ir a esco­lha de Ricardo pela v(;r ão dedutiva evita a inelutável circularidade que a teoria aditiva comporta. Say não considera sequer es a hipóte c visto apenas estar interessado nos preços relativos. No entanto cairá numa circularidade do tipo da de Turgot. Vejam s, porém, como c nstroi

sistema.

A representação d sistema cconónúco tem como dado inicial a formação do vaI r do produtos no mercado, determinado pela utilidade. Tomando de empréstimo a noção smithiana scgund a qual o vaior se decompõe em salários, rendas e lucros, Sa y vai indagar das con­dições em que a produção se equilibra com os dados do mercad. Os bens serão produzidos quando custo necessários forem no máJcimo iguais ao valor. Porém, como

a sua noção de produção impõe uma identidade de estatuto aos elementos produtivos, é preciso, previamente, refor­mular a própria conceptologia. É então que introduz a distinção fimdamcntal entre fundo produtivo e serviço produtivo (26). Pelo primeiro deve entender-se tudo aquilo

(26) Esta distinção é essencial e deriva da própria abordagem utilitari ta. Com efeito a utilidade é, por definição, apenas aferível individual e subjectivamente. O conceito de serviço produtivo serve de mediador entre a valoração subjectiva e o fundo abstracto de onde dimana a criação de utilidades. A terra, o trabalho ou o capital só adqui­rem valor na medida em que os seus .produtos. são úteis, quando subjec­tivamente avaliados. O processo teórico-valorativo, que vai do consumo à produção, faz-se por graus suce sivos cada um dos quais retira a sua valoração do anterior.

Menger, Jevom, Walras e Fischer glosaram e desenvolveram e te tip de procedimento. O e calonamento mengeriano em .hen de ordem

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que é u c ptívcl de er aplicado na criação de utilidades; erviço pr duti as vantagcll c llcretas que

fWld produtiv dá a s u detent r. F rma-se uma trilogia de factores ou fWld pr dutivo c n tituída pelo trabalho (industrie) (27), pelo capital (2) e pel agente

naturais (29). emprc guiad pela ideia de utilidade J. B. ay é

f; rçad a eguir uma met d I gia que terá como resultad a ubver ã termin l' gica d s conceit d:\ Escola Clássica

Ingle a. primeiro c nccit a er di torcido é o de tra­

balh (30). ay dcsign u a aplicação concreta d s fundos

utlerioro e «bens de ordem superior» (Cf. K. MBNGBR, Prilldpios Fllllda­melltais de Eco/lomia, trad. italiana .. lmola, 1909, Cap. lU, § 3.°, p. 107 ss.). é uma apurada versão chs noçõe de Say.

(27) a utiliza a palavra «industrie. para designar o trabalho em entido estrito. Como veremo de seguida, u a igualmente um conceito

vasto para que reserva a palavra «travait.. (2) O capital, que por vezes defme como llalor, é aqui identifl-

cado com bens capltai . (29) A caracterização dos agentes naturais como .fundos produ­

tivos» é feita por Say de um modo algo estranho: os «agents naturels qui son susceptibles d'etre possédés deviennent fOl/(ls productifs de valetlrs, parce qu' ils ue cedent pas leur concours sans retribution ...• (Traité, 72. O ublinhado é de ay).

esta passagem Say aproxima-se da tese smithiana segundo a qual o rendimento dos agentes naturaIs deriva exclusivamente da propriedade privada. Da citação precedente se poderia inferir que sem apropriação os agentes naturais não serianl fonte de valor (o que é diferente de fonte de rendimento). Ora tal conclusão s6 é aceitável no âmbito de uma teoria do valor-trabalho.

(JO) O que não sucede por mero acaso. A ligação entre o valor e o trabalho provém da corrente ftlos6fica que influenciou Smith e Ricardo, e assumiu particular importância na questão relativa à legitimidade da propriedade (v. supra p. 64) . A diferente teoria do valor, defendida por Say, implicaria, por isso, uma crítica a essa linha ftlos6flca. Em vez disso, porém, enveredou pela utilização de uma idêntica termino­logia., sem a pôr em causa, desvirtuando assim o eu entido original. Ver texto.

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produtivos por trabalh . Tínham s, assim,

indústria humana, o trabalho do capital,

agentes naturais (31).

o trabalho da

tra balho dos

A utilização do termo «trabalho» no sentido apontado

penas se pode explicar por razões de oportunismo ideoló­

gico. Tendo os clássicos ingleses colocado o acento tónico

no trabalho como fonte de valor, Say anula o peso espe­

cífico deste conceit banalizando-o, isto é reduzindo- a

uma expressão genérica. Da mesma forma procederá rela­

tivamente ao mais importante conceito ricardian : o lucr .

Em vez de partir da situação institucional da socie­dade, Say atomiza os seus vário componentes e conside­ra-os isoladatnente. Enquanto para Ricardo o trabalho é sempre entendido como trabalho assalariado - porque é

esse o dado institucional da sociedade capitalista -, para

J. B . Say ele não passa de uma abstracta aplicação de potencialidades produtivas (sejam humanas ou não) . Por outro lado o lrabalho humano (32) tepresenta uma fonte de

benefícios para quem o executa na medida em que

obtém um acréscimo de utilidade através dos bens que pro­duziu. O mesmo se diz do proprietário do capital e dos

agentes naturais. Para referenciar essas vantagens advindas aos possuidores dos frnldos produtivos, Say utiliza sempre

o termo: «profit» . Assim o trabalho isolado de R . Crusoe

é para ele fonte de «profit» tal coniO o detentor de capital

obtém um «profit» com a sua utilização. A aplicação dos

(31) .Le travai! ou les services prodJlctifs de la nature, le travail ou les services prodllctifs des capital/X> (Traité, 82. O sublinhado é de Say) .

(32) O cálculo utilitarista prazer-dor tem aplicação privilegiada quando se refere ao trabalho humano: . Ie travai I, ... , est une peinet, mas em compensação o seu resultado é cun proht» (Traité, 82).

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tr" fund pr dutiv rrc p ndem p rt nt «pr fit d'indu tri , «pr fit du capital», «pr fit territ ri. mo) (J3).

Tal m para c nceit «trabalh» a palavra lucr (pr fit) fica reduzid. a seu ignificad p pular e corrente, de benefício, antagem, mpen açã. ei a de ser um

nc it ignificante n interi r de um determinado si tema teOrl para c tran f; rmar numa simple paI. vra.

A mut<tç-e de sentid ap nt das tã I nge de er uma imple qu tão t rmin lógica de intere e meramente cxegétic . R ultam da p tura de J. B. ay perante a econ mia. e bem atent'1.rm a destruiçã do conceito de trabalh e de lucr , relativam.ente a Smith e Ricardo, é c n equência d própri mét d utilizado. Antes de c truturar a repre entação do i tema ec nómic como um conjunto articuIad , a confronta «factore produtivos» c m de próprio. A at mizaçã d elementos impõe que process de análise se inicie con iderando cada um deles independentemente da relaçõe que estabelecem. Como exempl fri ante pode rec rdar-se tratamento dado por Ricard a conceito de trabalho. ay, ao invés, começa pOI per pectivá-l enquant actividade instituci -naImente nã condicionada. Como consequência, ao con -truir i tema de representação temos já pré-definido um conjunt de Iloçõe que nece sariamente condicionam a

estrutura de e me mo istema. «trabalho» isolado dos fundos produtivo é fonte

de benefício (pr fit) para os seus proprietários e utiliza­dore . Porém estas vantagens só são susceptíveis de ser medi­da em termo de utilidade individual e não podem ser entendidas como remuneraçõe em sentido próprio­a menos que e queira recorrer ao artificiosismo de defini-las

(33) Cf. Traité, 589.

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C m rC111uneraç-e que cada um faz a si me mo. Ma estud de uma actividade cm socicdade implica o rela­

cionamento técnico c social dos vários elementos. É ne te momento do proccsso te6rico que surge a necessidade 16gica dc um outr personagem: o «entrepeneur».

4.1. O empresário

Enquam categoria fLmcional «entreprencun> nã dispõe de nenhum elemento produtivo. Nessa medida é estranho ao proccss material da produção. Por outras palavras, não fi rnece um «trabalh » equiparável a d s fundos produtivos. O eu papel esgota-se no aluguer de «factores» que cOI~uga segundo regras técnicas. A produção cm ciedade c nfigura-se agora como a junção dos «trabalhos» do Robinson Crusoes que dão pelo nome de indústria humana, capital e natureza. Cada elemento passa a ter uma dupla relação: primeiro a que se estabelece entre o proprietário do «factor» e o cmpresário e quc é uma relação social; segundo, a relação dos «t:'lctores» com todos os outros e que é uma relação técnica.

A relação social concretiza-se no pacto jurídic de aluguer dos fundos produtivos. Tratando-se de um contrato sinalagmático a contra prestação remunera o proprietário do «factor» sob a forma de salário, renda e juro, conforme se trate da aquisição dos serviços produtivos do trabalho, da natureza e do capital.

O rendimento típico do capital que para mith e Ricardo era o lucro - porque enquanto rendimento origi­nário ligado à produção pressupunha já as relações técnicas e sociais - transforma-se, na análise de Say no juro. Não apenas no sentido de os capitais emprestados serem fonte daquele tipo de rendimento; acima de tudo é da

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própria e ência d apitaI, c m do outr «factore »,

que ele eja empre cad. No esquema d s «factores» paralel e is lad s6 a intervenção de um personagem fWlci nalmente independente permite pa sar à produção ocial. A tran içã da anális at mi ta à c njunta impõe

e a figura. De te m do, enquant rendiment resultante da actividade económica, o juro é um rendimento originá­rio e não derivad . A ubstituiçã do lucro pel juro, que será uma constante de toda a teoria neoclássica, resulta desta radical separação entre capitalista e empresário. Adiante voltarei a e te ponto. Para já vejamos mais de pert as várias implicações da intr dução do empresário no esquema da representação econ6mica.

J. B. Say dá-no duas versões d estatuto do empresário que tanto podem ser contraditórias como complementares.

A função empresarial, com actividade distinta do «trabalho dos fundos produtivos», deve ela própria ser remunerada. O problema está na determinação da origem

desse rendimento. A primeira e mais óbvia explicação avançada por Say

é a de que o empresário fornece uma forma particular de trabalho mas que se integra na categoria geral de qual­quer outro trabalho. POl isso mesmo, o trabalho empre­sarial, como qualquer outro, considerado individualmente dá origem a um «profit» (34). Pretendendo depois seguir o mesmo método que para o trabalho em geral declara que «o preço do seu trabalho é regulado pela relação entre a quantidade procurada desse género de trabalho ( ... ) e a quantidade oferecida» (35). Nesta hip6tese teríamos de admitir um mercado específico de serviços empresariais e

(34) cf. Trairé, 363. (35) Idem .

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a ua remuneração mais não seria que um mero salário de direcção. Mas tal hipótese implicaria que os ofertantes daqueles serviços fossem confrontados com potenciais adqui­rentes. Ora, os únicos que, com alguma verosimilhança, estariam nesta posição seriam os detentores de capital. O empresário seria assim um assalariado dos capitalistas, ou seja, de um dos detentores de «factores produtivos». A consequência lógica deste entendimento acabaria por ser a própria destruição do mercado do capital. Com efeito, enquanto simples assalariados, os «entrepreneu[» nunca poderiam integrar o sector da procura nesse mercado. Estaríamos caídos num constante e permanente negócio consigo mesmo levado a cabo pelos capitalistas (36).

Numa segunda versão, que Say desenvolve duas pági­nas adiante, o empresário vem deftnido como «um interme­diário entre todas as classes de produtores, e entre estes e os consumidores» (37). Aqui a autonomia relativamente aos detentores de fundos produtivos é inteiramente garantida. O «administrador da obra da produção» (38) é a entidade que nos mercados dos fWldos produtivos constitui a procura. Mas sendo assim os rendimentos da função empresarial ftcam de novo por explicar. J. B. Say ensaia então o dilucidar do problema da seguinte forma: « ... ele (o empre­sário) é o centro de múltiplas relações; ele tira proveito daquilo que os outros sabem e do que ignoram, bem como

(36) A contradição seria ultrapassada se se admitisse que o empresário fornecia um outro factor produtivo. É o que faz Marshall com a introdução de um quarto factor produtivo. A remuneração empresarial deriva da inclusão nos custos de uma parcela de valor em tudo idêntica às que se destinam ao pagamento dos salários ou dos lucros. Ao fornecer o factor organização o empresário retira a sua respectiva quota. (Vçr MARSHALL, PrincipIes of Economiçs, 9.' ed., MacrnilJan, London, 1920, Cap. VIII, L. IV). Ver infra.

(37) Traité, 365. (38) Idem.

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de todas a antag n acidentais da pr duçã . É também nesta clas e de produtores, ( ... ), que se D rmam qua e todas as gra.nde fê rtunas» (39).

A citação precedente merece uma análise mais cuidad visto que abre múltipla vias que pen ament econó-mico posterior irá apr veitar.

A acentuaçao d carácter autón m do empre ári coloca-o na posição de demandante de serviço pr dutivos e consequentemente pagador de remuneraçõe . O valor do produto que vende terá , de te mod , de e gotar-se no pagamento dos vários «factores». A remuneração empre­sarial consistirá apenas na retribuição do trabalh efectuad , não a titulo de alário , dada a inexistência de mercado de trabalho neste ca o, ma em montante idêntico à retri­buição salarial de um empregado administrador.

Este modo de perspectivar a função empresarial, e que em Sa nâo é patente, supoe a noção básica de equillbrio. O empresário é neste contexto um agente do equilíbrio económico e é em função desse equilíbrio atingido que a sua remuneração se confina aos termos apontados. A noção walrasiana de empresário filia-se justamente numa

leitura deste tipo. Um segund modo de desenvolvimento da ideia de

«entrepreneur» de Say, parte de um ponto de vista oposto. Embora entendido ainda como centro autónomo da vida económica deixa de colocar-se a tónica na sua função niveladora e equilibradora para se situar na dinâmica do desequilíbrio . A tipica acção empresarial é geradora de desequilíbrios em vez de uniformizante. J. Schumpeter dá-nos o mais claro exemplo desta forma de perspectivar a questão. De resto o autor da Teoria do Desenvolvi-

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mento Económico vai buscar directamente a Say algumas das ideias chave da sua teoria (40) .

A terceira reflexão diz respeito à função acumuladora. Todos os autores que escreveram sob a influência da

realidade capitalista revelam um especial interesse pelo pro­blema da acumulação. Mesmo quando as leis que elaboram são pretensamente válidas para todos os tempos e lugares, como é o caso de Say, está sempre presente como ponto de referência o modelo capitalista. É que só nele o problema da acumulação é economicamente autonomizável na medida em que se ultrapassa a simples colecção de valores de uso para se lidar agora com valores de troca.

Para os clássicos ingleses o desenvolvimento económico pressupunha o acto acumulador entendido como mola propulsora do processo produtivo. Essa função, objectiva a abstractamente necessária, corporizava-se ao nível econó­mico e institucional numa dada classe: a capitalista. Os seus membros não eram apenas vistos como os meros deten­tores do «instrumento» essencial ao funcionamento do

(40) Assim, por exemplo, na página 341 do Traité, Say traça claramente o conceito de inovação tal como ele virá a ser definido por Schumpeter. .Quand j'economise sur mes frais de production, et que je trouve le moyen, par exemple, de faire venir sur un arpent ce qui en exigeait deux, de terminer en deux jours ce qu' on ne pouvait exécuter qu'en quatre, etc., dês ces momcnt le revenue de la société est accru de tout ce que j' epargne. Mais a profit de qui cet accroissement de revenue tourne-t-il? A mon profit aussi longtemps que je réussis à tenir mes procédés secrets; au proflt du consommateur, lorsque la publicité des procédés me force, par la concurrence qu' elle établi, à baisser mon prix au niveau des frais de productio1l».

Todos os elementos caracterizadores do cerne da teoria de Schumpeter estão aqui presentes: A inovação, neste caso de tipo tecnoló­gico; o lucro como rendimento empresarial directamente imputável à inovação; a sua transitoriedade, i. e., como um tipo particular de mono­pólio que a concorrência eliminará.

cf. SCHUMPETBR, Teoria do Desenvolvimento Econ6mico, cit., cpa. IV. Ver in[ra.

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si tema - capital - ma tam.bém mo centr vitai em t rn d quem gira a a actividade e n mi a e cial. a capitali ta it centi ta não pr enche a ua função c m a po se de capital; ela é tã ó condiçã do de cmpenh da tarefas de chefia, que activamente leva a ab ,d proce s econ6mic . Ne t termo, enquant detent r c agente do capital- «funci nári d capital», cham u-lhe Marx­é ele o p 1 para nde converge o excedente. a «capita­li ta activo» era, assim, agente da acumulaçã porque possuid r e empregador de capital.

J. B. Sa marca iníci de uma grande viragem. A luzes da ribalta concentram- e n empre ário, verdadeiro encenador d drama económico. É a el que cabe organizar a produção mas nã lhe compete fWlCionalmente papel acumulador; são ainda s capitalistas que fornecem os

alores acumulado que o cmpre ári utiliza. A separação te6rica entre mpre ário c capitalista tem a imediata vanta­gem de chamar a atenção para o papel e sencial do organi­zador da pr dução, daquele que sabe como (know-how) transpor uma ideia para a prática. Ma o inegável refina­mento de análise esconde uma profunda alteração da avalia­ção socio16gica dos agentes econ6mico.

Sob o ponto de vista empírico, a ligação entre o acto empresarial e a posse de capital (ou olvência equivalente) estão igualmente presente em Smith ou Ricardo como cm Say (41). A grande diferença está na caracterização ocioló­gica, se assim se pode dizer, que enforma a pré-visão dos vários autores. Para os ingelses a «ela se capitalista» é acima de tudo o conjunto dos que «fazem valer o seu capital», como diz Smith. A regra é o capitalista activo, a excepção

(41) . Un entrepen.eur possede conunmIément en propre un capital, tom au moins mIe portion du capital qui sert à ses avancest (Traité, 346).

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o capitalista passivo. Ora U111 tal entendimento está inti­mamente relacionado com a dinâmica da burguesia inglesa do éculos XVIII e princípios do XIX. Na França de Say a burguesia post-rcvolucionária rapidamente se atistocra­tiz u e 1 eproduziu, à ua maneira, posicionamento econó­mico da nobreza de tronada. A detenção de riqueza c nduz mais rapidamcnte à ociosidade rentista do que à activa partlclpaçã cc nómica (41 ,). A vitalidade da bur­guesia inglesa que maravilhava Srnith e não deixava de espantar Marx (42), não tem correspondência no restante c ntinente europeu. Aqui possuir riqueza acumulada não é, em regra, ser economicamentc activ . A figura do empre­sário corre ponde por isso à vaI rização dos atributos es enciais dos «chefes» da economia - para usar uma expressão cara a Schumpeter e Knight - e em contrapar­tida à redução dos capitalista a meros perceptores de ren­das ou seja os juros (43).

(41_ .) O que Say, aliás, faz notar com certa amargura. Veja-se, por exemplo, a comparação que estabelece entre a França e a Holanda, onde mão existem preconceitos que afastam os capitais das empresas comerciais. (Traité, 394) .

(42) É pensando sobretudo na burguesia inglesa que Marx escre­veu: .Foi ela quem, pela primeira vez, mostrou aquilo de que a actividade humana é capaz. Ela operou maravilhas que ultrapassam de longe as pirâmides do Egipto, os aquedutos romanos, as catedrais góticas ... > .

• A burguesia, no dewrso do seu domínio de classe, com menos de um éculo, criou forças produtivas mais amplas e colossais do que o tinham feito no passado todas as gerações tomadas em conjunto' (Manifesto do Partido Comullista, trad. port., Centelha, Coimbra, 1974, 27-29).

(43) O conceito de- «espera>, introduzido por Senior e desenvol­vido por Marshall pretende dar suporte a uma visão deste tipo.

egundo Celso Furtado a justificação teórica do juro tentada pela ideia de esper(/ redunda numa mera justificação moral dos rendimentos da propriedade. (Cf. Teoria e Po[(tica do Desenvolvimellto Ecollómico, D . Quixote, Lisboa, 1976, 74).

Também J. Robinson, particularmente avessa à noção de absti-

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De igual m d a dinâmica acumuladora do capital deixa, paradoxalment , de centrar-se no capitali~tas. Tal como Say reconhece é entre os empresários «que se formam quase todas as grandes fortwlas» (44). Deverá, assim, admi­tir-se que a acumulação produtiva é dominantemente realizada pelo empresário, ou melhor, se efectiva ao nível da empresa. A teorização de Say é fortemente individua­lista e subjectiva. Por isso a referência ao empresário se centra num elemento pessoal. Mas quando a noção se objectivar, teremos em vez dele um conjunto organiza­cional que se pode designar por empresa (o que aliás veio a acontecer especialmente na literatura económica deste século). Torna-se então mais directamente com­preensível o afastamento dos capitalistas, enquanto tais, como agentes por excelência da acumulação. O que verdadeiramente se passa, a nível do reconhecimento empírico, é a fusão entre empresário e capitalista, o que não é mais que a noção dos clássicos ingleses de «captalista activo» (45).

nência, conclui pela total inutilidade analítica deste conceito (fÚtil para propaganda, não para uma análise 16gica.) e como consequência «a great part, or more than the whole, of what the owners of wealth receive for the service of «waüillg. is apure economic renb (The Rale of IlIlerest, Macrnillan, London, 1952, 156).

O pr6prio Marshall ao propor a ideia de «quasi-renb ligada aos bens capitais, acaba por dar cobertura à posição de Senior segundo a qual a mera posse de riqueza não é abstinência (V. SENlOR, AlI Olltlillf of the Scimee of Politicai Economie, Allen and Unwin, London, 1938, 90). Assim à quasi-renda emergente ao nível do processo produtivo, contra­punha-se uma renda pura e simples representada pelo juro, moralmente justificada ou não pela «abstinência •.

Para urna análise mais desenvolvida ver i"fra. (44) Trait!, 365. (45) O que não quer dizer que sejam alvo do mesmo tratamento

teórico. Uma coisa é afirmar-se que a função empresarial, em princípio, s6 se pode exercer quando simultaneamente se é também capitalista; outra, é a não distinção ftmcional das duas categorias.

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A reconstrução do modelo teórico acaba por conduzir Say a conclusões não muito diversas das de Smith ou Ricardo, no que respeita ao apontar dos agentes verdadei­ramente dinâmicos do sistema. Porém o ponto de par­tida e o próprio processo dessa reconstrução vão implicar alterações profundas na articulação dos conceitos. É nomea­damente o caso do juro e do lucro.

5. Capital e juro

A defInição de capital dada por Say não difere sensivelmente da de Smith ou Ricardo: é «uma soma de valores empregues como adiantamentos na produção» (46) . Porém e não obstante esta identidade, vai levantar-se pela primeira vez, uma questão que permanece até aos nossos dias: a da produtividade do capital.

5.1. A Iloção de produtividade do capital

A teoria do valor-trabalho, por um lado, afastava liminarmente qualquer hipótese produtivista do capital e por outro implicava o reconhecimento, implícito ou explícito, do carácter expoliativo dos rendimentos do capi­tal . Com Say o problema põe-se em novos moldes. Rejeitada aquela teoria (47) torna-se necessária uma outra explicação. Ao tentá-la Say é inteiramente inconcludente. Em passa­gens dispersas ao longo da sua obra defende, por vezes, teses que se podem considerar embrionárias daquilo que virá a ser a Teoria do Uso; noutros passos pretende

(46) Traité, 56l. (47) C( Traité, 13.

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demonstrar a capacidade autónoma da produção de valor do capital (48).

Toda a questão se articula com papel distributiv do empresário. Sendo ele quem procede à organização técnica da produçã deve distribuir valor d produto pelo~ proprietários dos fWldos produtivos. O direito do capital a parte do valor do pr duto é legitimado pela já referida analogia funcional entre o trabalho e o capital (49). Mas este tipo de raciocínio acaba por impôr a Say a dife­rença essencial entre ambos. Com efeito o capital é ele próprio um produto do sistema e como tal resultado da interacção de outros factores. Por isso ao atacar a teoria do valor-trabalho de Smith tenta ir mais Jonge na explicação da produtividade do capital: «Si un capital n' avait pas en 1ui-même Wle faculté productive indépendente de celle du travail qui l'a créé, comment se pourrait-il faire qu' un capital put foumir un revenue à perpétuité, indépendament du profit de l'industrie qui l'emploi?» (50). E mais adiante afirma que «o juro que o capitalista obtém dum capital emprestado é ... a pIova de que se tira um lucro do capital emprestado» (SI).

É óbvio que Say se limita a fazer uma constatação e não a fornecer uma base explicatlva, como pretende (52).

(48) Bohm-Bawerk considera-o iniciador daquilo que designa por cTeorias simplistas da produtividade.. Esta versão da teoria da produtividade caracteriza-se essencialmente pela confusão entre produti­vidade física e de valor. pretendendo assimiJar a segunda à primeira sem aduzir qualquer argumentação.

Na Europa continental esta teoira expandiu-se rapidamente tor-nando-se muna verdadeira moda (Cf. BOHM-BAWERK. Kapital ...• cit .• 152)

(49) A este propósito veja-se também BOHM-BAWBRK. ide/ll. 142. (50) Trai/é. 72. (S!) Idem. 391. (52) A falta de lógica é evidente. O capital seria produtivo por­

que permite ao seu proprietário a obtenção de um rendimento;

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Mas embora a produtividade do capital não fique nunima­mente demonstrada será essa uma das vias de saída para o problema da imputação que Say implicitamente coloca (53).

A função distributiva do empresário, supra referida, efectiva-se quando fica determinada a quota do valor do produto atribuível a um determinado serviço pr dutivo. Mas como bter esse valor?

5.2. O capital dispofl(flel

A resposta à pergunta anterior é-nos dada pelo mercado de capitais. Cada factor produtivo é transaccionad no respectivo mercado e o preço dessa troca fixado pelas relações entre oferta e procura. O juro representa, por isso , a raridade relativa do factor capital (54), e simultaneamente a sua remwleração. Mas, e este é o ponto nevrálgico, apenas o «capital disponível» participa nesta fixação. Quando o capital, como valor abstracto, se corporiza em bens, deixa de fazer parte do mercado, é retirado da circulação (:'5). Desta forma o capital pode ser visto como uma grandeza perfeitamente homogénea sem necessidade de atender às

e a prova de que assim é está no pagamento do juro! A pergunta que Say deveria fazer é esta: porque razão o capital gera um rendimento liquido? Obtida a resposta poderia então explicar o juro. Em caso algum a inversão das questões será uma solução.

(53) Sempre que se admita mais de um .-factor produtivo. o problema da imputação põe-se de imediato. Tem, por qualquer pro­cesso, de calcular-se a parcela de valor cuja criação resulte da coope­ração do factor considerado. Se assim não for, a teroia perde todo o valor explicativo e destroi as bases da teoria distributiva. Se atendermos à permanente necessidade de justificação de uma certa ordem social que os economistas liberais sempre tentam, compreende-se o drama implí­cito nesta questão. Ver iuira.

(54) Cf. Traité, 384. (55) Idem, 385.

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formas matenal que ai a sumindo (56). A remillleraçã d capital (ta. a de jur) ena úlúca e facilmente deter­

minada. Infelizmente a questã na é tã simple quanto Sa

pretende. Em. prim.eir lugar p rque nã dispondo de uma teoria marginalista é imp ssível, sequer, tentar i alar a participaçã pr dutiva de cada fact r (57). Depois porqu

bens m que capital e aplica c n tituem eles mesmo «fund pr dutiv d capitais» (58). Ora seu vaI r

depende, egund n diz Sa ,«d val r d produt que

(56) A noção de capital disponível foi particularmente enfatizada por Jevons e veio a dar origem à função de produção neoclássica. Jevons considera capital como sendo um stock de bens que permite a sub istência de uma dada população enquanto e produzem as mercadorias. Ao capital disponível contrapõe-se o «capital fixado» no bens de produção (Cf. W. . JEVONS, The T/'eory of Politicai Eco/lol/ly, trad. francesa, Giard &: Briere, Paris, 1909, 331-2). Ao acentuar a importância do conceito de capital disponível, Jevons pretende acima de tudo demonstrar a perfeita mobiüdade do capital: «Um dos principios mais importantes desta matéria é que o capital üvre pode ser empregue indiferentemente em qualquer ramo ou tipo de indústria­(Idem. 333). O capital livre fica deste modo aparentemente desligado das formas heterogéneas que assume ao «fixar-se. nos bens de produção.

O modelo proposto por J. B. Clark vulgarizou a ideia de que o capital é algo de distinto dos bens capitais e mensurável autonoma­mente. Wicksell, embora alertando para a errónea simplificação de Jevons (cf. Lectllres (l/I PoliticaI Eco/lol/ly. Routledge & Kegan. 1934. 145). recorreu a um idêntico procedimento. A função de produção por ele elaborada apenas tinha vaüdade no âmbito de uma hipótese muito restritiva. Porém a divulgação simplificadora de Cobb-Douglas trans­formou a fWlção de produção em algo de validade absoluta. O capital seria uma grandeza não só mensurável autonomamente como de uma maleabilidade perfeita. O «capital geleia» seria infmitamente modifl­d vel. ou. para dizer com J. Robinson. um elemento de «jogos de arman.

As diftculdades da teoria do capital neoclássica serão anaüsadas i/lfra. De momento assinale-se apenas a importância que o conceito de capital disponível. introduzido por Say. veio a assumir no desenrolar da teoria do capital.

(57) CC SCHUMPETER. History ... . cit .• 417. (5) Traité. 65 .

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dele podemos tirar» (59). Daí que, abstraindo da primeira dificuldade, continuaríamos mesmo assim num irremediá­vel impasse. A procura de capitais depende dd taxa de rendimento do fundo produtivo e esta depende do valor do capital. Como a última relação é circular seria indetermi­nável a procura de capitais que fixa a taxa de juro.

Abandonemos este tipo de problemática, que será aprofundada mais adiante, e vejamos como Say articula o Juro e lucro.

6. A não identidade entre juro t! lucro

A ligação privilegiada que se estabelece entre o capital e o juro põe, pela primeira vez, a questão do lucro como rendimento não imputável ao capital. O empresário ao alugar os fundos produtivos adquire o direito de apropria­ção directa dos benefícios (profit) que a sua utilização con­cede. A totalidade do valor que, pela venda dos produtos, reflui às mãos do empresário é distribuída pelos participantes da produção (60). Assim a parte do «profit» imputável ao capital é integralmente devolvida sob a forma de juro, tal como as quotas do trabalho e da terra são representadas pelo salário e renda. Em princípio, portanto, todo o valor se esgota na remuneração dos factores. A única ressalva seria a consideração do rendimento do trabalho do própro empresário que, por não ser assalariado, se designaria por «profib> em vez de salário (61). Segundo esta leitura a taxa

(59) CC Traité, 338. (60) Idem, 347. (61) A subversão terminológica, tendo como referente a Escola

Clássica, é neste contexto particularmente perigosa. Aquilo que Say designa por eprofitll não tem rigorosamente nada a ver com o . lucro. de Smith ou Ricardo.

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de lucro (n entido do clássicos ingle es, i. é, a relaçã cntre o alor do capital técnic e eu rendiment ) identifica- e e é absorivda pela taxa de jur .

A c ncepçã d minante em ay é, p rém, ligeiramente diferente de ta. Com vimos upra (62) o rendiment empresarial mai relevante (aquele que permite a «for maçã de quase todas as grande fortwla ») baseia-se num element aleatóri definid entre a certeza d sustos e a incerteza do rendimento. A erdadeira especificidade da sua fU11-çã e tá em «criar produt que valham tant ou mais que

custo de produção» (63). O lucro empresarial, numa lcitura schumpeterima, seria sustentado pela acção inova­d ra do cmpre ário (64) .

A distinção entre jur e lucro é não só quantitativa com qualitativa. e considerarmos a taxa de lucro pro­dutivo como relação entre o capital e o valor remanescente apá o pagamento de salário e rendas, verificamos que ela e compõe de uma fracção atribuível ao capital e outra à acção empre arial. Uma vez descontado o juro perma­nece um fundo residual que constitui o lucro de empresa.

e bem notarmos e te lucro empresarial lião é expressável em termos de taxa. O valor que representa foi conseguido pela habilidade empresarial que se concretiza no facto de os fundos produtivo terem gerado conjuntamente um valor superior à sua própria remuneração. Deste modo é impossí­vel determinar um qualquer valor relacionável com o mOIT­tante do lucro empresariaL Assim, há lucro empresarial mas lião há taxa de lucro empresarial (643).

(62) p. 175. (63) Trai/é, 572. (64) Ver nota 40. Cf. igualmente Traité, 362. (64.) Com efeito não faz sentido relacionar o montante do lucro

apenas com o capital quando é certo que a sua emergência não é dele resultante.

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Esta conclusão, aparentemente estranha, deriva da excessiva acentuação, n mode! de J. B. Say, do posi­cionamento neutral do empresário. É certo que se afirma que «uma parte do capital pertence-lhe (ao empre ário) quase sempre» (65) Mas dad s os pressupostos do modelo e o modo como ele se constrQi - que supra analisámos-~ todo esquema de representação de baseia num elemento ficcional: o empresári «empresta-se» capital. Para a defi­nição e determinação do lucro empresarial é irrelevante a posse de capitais próprios. Funcionalmente todos são capitais alheios.

O maior esclarecimento teórico que a autonomização da figura do empresário permite, pode tornar-se fonte de erro quando se leva ao e ' tremo essa mesma autonomia. Foi justamente o que veio a acontecer. A teoria econó­mica que tem a sua matriz na obra de Say inverteu a polaridade do modelo clássico. Da formação do valor com base nos custos passou-se à valoração utilitária, quer dizer, tlansformou-se o elemento desprezado por Ricardo­a procura - no pont nodal do sistema (66). Do mesmo

Encontra-se uma conclusão semelhante em J. Schumpeter (Cf. Teo­ria do Desenvolvimellto Econ6mico, cit., 158). A noção de taxa de lucro ó tem sentido quando se estabelece um relacionamento do valor residual

[mal com um outro pertença da própria empresa. Ver infra. (65) Valerá a pena citar integralmente esta passagem: «Comme ii est impossible de conduire une entreprise industrielle

sans y employer un capital, les profits qu'y fait l'entrepreneur compren­nent ordinairement les profits de son industrie et ceux du capital. Une portioll de cc capital lui appartient presque toujours en propre; une outre portion est fort souvent empruntée; dans tout les cas, que Je capital soit empruntée ou non, le profit qui resulte du service qu' on eu retire, est gagné par l' entrepelleur, puisqu'il a pris à son compte toutes Ies chances, bonnes et mauvaises, de la productiom t Traité, 362).

(66) A obra de Marshall representa acima de tudo uma tentativa de superação deste tipo de extremismo. A «espera.» de Marshall é a noção chave para a conciliação de um «modelo produtivot com o «modelo de trocat.

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m d a qua e ab luta de valoriz çã d papel c pecifica­mente empresarial deu lugar a extremi mo oposto.

Vejamo, cntã ,com c desenv lve a linha teóric fundada em Say c que, de certo mod , representa uma opo ição dialéctica a m dei clássico. Só depois disso a tentativa de síntese será possível.

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AP~NDICE

EMPRESARIO E LUCRO EMPRESARIAL

A te ria do capital veio a t mar-se a questão básica da análise econ6mica ap6s J. B. Say.

Desde Turgot o capital é um conceito chave da econo­mia política que, no entanto, revela uma dificilmente supe­rável antinomia entre objecto concreto, técnica mente indi­vidualizável, e puro valor, abstracto e genérico. A. Smith introduz a distinção entre capital privado e social. O pri­meiro adquire essa qualidade pela posição subjectiva do seu detentor; o segundo pela transformação em bens tecnica­ment adequados. Em qualquer caso a representação valorativa faz-se pelo referente financeiro ou monetário e não chega a c.olocar a questão da variabilidade do valor do ca pitaI.

Ricardo vai bem mai longe. Preocupado com as condições necessárias e suficientes para o desenvolvimento do sistema, depara com o problema da determinação da taxa de excedente produtivo - identificada com taxa de lucro . Os bens que cumprem função de capital são afec­tados no seu valor relativo, tal como todas as outras mercadorias, pelas alterações distributivas. Deste modo a determinação da quantidade de capital supõe uma medida invariável de valor. (Veja-se o já citado Prefácio de Sraffa às «Works», xlix) .

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A problemáti a ricardiana de env Iv'- à v !ta da sua te ria d vaI r-trabalh pelo que qualquer medição sem­pre eria feita em tcrm fíSlco, i. é, reduzindo o capital a termo de trabaIh . Porém, quand J. B. ay lllverte p nt d partida da ab rdagem econ6mica, a temática de Ricardo p Ide aparentemente entid . A noçã de preç recobre integralml!nte a de valor, daí que valor do capital se identifique com preço de mercado d pr6prio dinheiro. O capital li re, que não é mais do que dinheiro empres­tivel, determinaria em equívoco o rendimento do capital,

através d jog de mercado. eguindo utra vias, Say acaba ,P I reeditar, ~em

resolver, apre cupaçã de Ricard . E que o valor dos fundos produtivos depende do respectiv valor do output. As im send ,o capital financeiro não p de ervir de deter­

minante do valor pléllio do capital. Leon Walras, embora seguind um esquema muito

par cido com o de Sa)' - a distinção entre capital e rendi­mento é uma forma apurada da classificação de Say (fun­dos produtivos; serviços produtivos) -, evita a generali­zação homogeneizante da noção de capital (capital propria­mente dito). Nas suas famosas «equações da produção» encontram.os qUa/ltidades dadas de capitais da espécie x,y,z;etc. De igual modo são dados os rendimentos dos vários capitais, pelo que teríamos um sistema em equilíbrio estático com diversas taxas de remuneração. (Cf a 1úpótese ricardiana construída por Pasinetti (supra p. 152 ss.). Só na «(Teoria da capitalização» Warlas ensaia a determinação do valor dos capitais com base numa idêntica taxa de rendimento, com recurso à identiflcação poupança = total de capitais novo. (Cf Élémellts D' Économie Politique, Secção IV e V).

Quanto a Marshall, a teoria do capital é algo confusa.

Por um lado, aproveitando a sugestão de SeIÚor, identi-

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fica-o com o trabalho e «waiting» e expressa-o nos meios financeiros. Mas por outro lado, uma vez empregue o capital livre em bens de produção o seu valor determi­na-se pela capitalização das «quasi-rent». Ao distinguir as situações de curto e longo prazo, Marshall pôde propor que, idealmente, as duas taxas de rendimento se confim­diriam no período longo. Porém, como assinala J. Robin­son, «o que é que determina a taxa de lucro ?». E ainda ela responde: «É evidente que Marshall esperava que os seus leitores não reparassem no facto de que ele nunca o diz» (Heresias, cit., 40). O pr6prio Marshall declara que para o cálculo da taxa de lucro tem de aferir-se o valor do capital, o que «involve great difficulties» (PrincipIes, cit., II, IV; § 2, 74).

Também Bohm-Bawerk se socorre frequentemente das teses de Senior. Desde logo a definição do capital como «conjunto de produtos intermediários» é idêntica em ambos os autores. E quando considera que a poupança não está «ao lado» mas «atrás» da terra e do trabalho, reedita uma ideia do autor de «An Outline of the Science of PoliticaI Economy». Nessa linha, recusa o capital como factor de produção equiparável à terra ou ao trabalho. Os produtos intermediários cumprem a simples fimção de armazenar as potencialidades plOdutivas das fOlças originais (trabalho e natureza). Por tal facto o capital opera uma transfe­rência de recursos do passado para o presente e do presente para o futuro. O tempo é um elemento intrinsecamente ligado ao capital.

Na mais pura 16gica da Escola Austríaca, Bohm­-Bawerk pretende valorar os produtos intermediátios pelo valor dos produtos finais deles resultantes. E neste processo de novo o tempo se revela fundamental. A compa­ração entre um bem presente (produto intermediário)

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e um bem futur ( pr dut fmal) não pode ser feita em termos de pura identidade valorativa. P r razõe de ordem

técnica e psic l6gica s bens pr sentes são mais valorad s que s futuros . Como consequência o valor actual d

bens intermcdiári s na iguala val r d s produtos deles resultantes quand efectivam nte estiverem di ponívei . Desta diferença nasce <~ uro po ltlV ». Ao nível da pro­dução seria determinável conjuntamente, salário, o período de produção e o juro, desde que D ss dado valor do «fund de sub istência». (CE Teoria positiv(j ... , cit., 388)

S6 que a crítica que Bohm-Bawcrk dirige à teoria tradi­ei nal do fund de salários (circularidade de raciocínio), é revertível contra si pr6prio (ver GAREGNANI, O capital ... , cit., 132).

Consideremos, finalmente, a teses de J. Schumpeter, expressas na sua «Te ria do Desenv lviment Económico».

Admitindo um estado de equilíbrio estático (plóximo do model walrasiano) ma temporalmente recorrente

(corrente circular), valor de t dos os bens, incluindo os de produção, seria integralmente imputável aos elementos

originais - terra e trabalho . Supond agora um acto inovador, ele há-de implicar a afectação dos elementos

produtivos à sua nova utilização. E aqui entra o conceito

de capital: por efeito da propriedade privada, a mobilização

dos bens e serviços necessários à produção só pode sei feita através dos meios de pagamento, que funcionam como

meio aquisitivo geral. Quando esses meios são utilizados

por um agente inovador (empresário) com vista à produção, transformam-se em capital.

Contrariamente aos autores que vimos referindo,

Schumpeter perspectiva o capital como algo de totalmente desligado dos bens concretos. Não representa qualquer tipo

de produtos individualizáveis, sendo antes uma pura relação.

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Daqui decorre a impossibilidade l6gica de referência ao «valor do capital». Todo o processo de imputação valora­tiva se esgota nos elementos originários da produção. O excedente gerado dutante o processo de desenvolvimento (lucro), não resulta de qualquer comparação entre valor do capital e o seu produto, mas sim do diferencial entre custos de factores, definidos pelas aplicações conhecidas, e resul­tados mais vantajosos obtidos pelo processo inovador.

O capital pode então identificar-se com os mcios de pagamento na posse do empresário. O mercado do capital é o mercado monetário. (Cf. SCHUMPETER, T.D.E. cit., 131) e este é o «estado maior do sistema capitalista» (Idem, 133).

Esta muito breve diglessão por algumas das teses sobre o capital, defendidas por autores marcantes na evolução da análise econ6mica, será retomada na segunda parte deste trabalho. Mas deste já se verifica que em todas elas somos sempre conduzidos ao mercado monetário jfInan­cciro. Entendida como véu (Say) ou como núcleo (Schum­peter), a forma monetária e o mercado onde se expressa, situa-se sempre no caminho da investigação. Mas se tal é verdadeiro para o problema do capital, é-o também para a segunda grande questão que vimos referenciando: a dis­tinção qualitativa e quantitativa entre juro e lucro. É o que passaremos a desenvolver.

O EMPRESÁRIO E O CAPITAL

Pelo menos a partir de A. Smith a distinção conceptual entre juro e' lucro é, em princípio, fácil de explicar. O juro referencia o rendimento do dinheiro emprestado; o lucro é o rendimento obtido pelo capital produtivo (geralmente de carácter comp6sito). A estreita ligação

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entre capital de empréstimo c bcn qu repre enta (1) conduz à n ça de juro ngman u p itiv, c mo D i designado p r B hm-Bawerk. A obrep siçã teórica entre dinheiro e ben implica, na lógica de mercad ,a tendencial igualdade entre jur e lucr .

Já vim c mo A. mith e tabclecia um diferencial de equilíbri entre montante de jur lucr. Mas o «toil and trouble» r~velava-se incapaz, ó p r si, de dar conta do fenómen (2).

Inequi camente c 1 cad numa perspectiva de muit long praz, Ricard acab u por identificar ambas de taxa. Porém tanto Smith com Ricard assimilaram, em regra, a funçã empre arial à de capitalista, ou, nas palavras de Marx, «o capitalista é funcionário do capital».

A partir de J. B. Say algo muda radicalmente. Coro­lário lógico da visão utilitari ta, paradigm.a de repre­sentação económica pas a a integrar, bem. no centro, a figura do empre ário independente. Mesmo contra os dados empíricos, ele é sempre desprovido de factores. Por definição, aluga serviços cujos rendimentos aparecem na sua própria mão (3). Verdadeira placa giratória de rendi­mentos o empresário paga os serviços do capital (como dos outros factores), e guarda para si o lucro. Agora o juro representa integralmente o rendimento do capital e o lucro

(I) cc supra p. 88 a evolução do conceito de capital. (2) CC supra. (3) A distinção económica (que não a jurídica) entre empresa e

empresário não chega a ser feita. Mesmo quando se admite, como dado empírico, a posse de capital por parte do empresário, sempre se ficciona o aluguer de serviços a um terceiro (o capitalista) que circuns­tancialmente é ele próprio. A empresa, como complexo organizacional que detém e controla os elementos produtivos, não faz parte do objecto da análise. Veremos infrn como Marshall dá um primeiro passo nessa direcção.

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desliga-se dele. Integrar o lucro empresarial na 16gica do modelo é a tarefa que de imediato tem de encetar-se.

U ma das linhas tem como referente máximo o modelo de Equilíbrio Econ6mico Geral de L. Walras.

Depois de, na «Teoria da Troca», ter determinado a regra a que deve obedecer a permuta de bens (4), ensaia a «Teoria da Produção».

Tal C01110 Say, também Walras destaca o trabalho como ponto de referência da produção. Mas logo adverte: «o trabalho é serviçc, fornecido pelas faculdades pessoais, pelas pessoas» (5). E sendo assim ao seu lado não pode colocar-se a terra e o capital mas a renda (rente) c o lucro (profit) (6). A divisão, introduzida por ay, entre fundos e serviços produtivos sofre uma mutação

terminológica: capital contrapõe-se a rendimento e vice­-versa.

Ca pital pessoal/trabalho, capital fundiário Irenda, capi­tal propria mente dito Ilucro, eis os bin6mios fundamen­tais (7). Para concluir a estrutura do edifício basta agora

(4) A Teoria da troca de Walras tem por premissas fundamentais a quantidade dada de bens a permutar e a comparabilidade inter-subjec­tiva. No entanto todo o raciocinio, de base utilitarista, que Walras desenvolve, se fuuda na lIIera ficção de que é possível estabelecer as comparações entre os vários sujeitos. Como ele próprio aflIma tudo parte de uma suposição que pretende legitimar pela coerência do resultado (Cf. Élements D'Economie Poljtique Pure, Parjs, 1926, 74).

(5) W ALM , op. cit.,176. (6) Ibidelll. (7) Compare-se com a conhecida solução marxiana para diferen­

ciar o trabalho dos «serviços do trabalho •. Quanto à generalização do conceito de capital, que Irving Fisher

aproveitará, diga-se, mutatis mutandis, o mesmo que de Say. Este último «difundiu» o conceito de lucro por todos os elementos produti­vos; Walras faz o mesmo com o capital.

Devido a tais procedimentos Sraffa, no seu «velho testamento da economia política do futuro. (suprema homenagem de Aníbal Almeida

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introduzir o empresário como mediador entre factores e bens finai. Como contraprestação da compra de trabalho paga salári s; da compra de lucro paga juros e fmalmente da compra de renda (rente) paga «fermage» (8). Todos os rendimentos que di tribui são a expressão em numerátio do preço dos resp ctivos serviços.

A estilizaçã é perfeita e elegante. A pr6pria noção de equilíbrio acaba por ser uma exigência estética. O empre­sário, como um fiel de balança (9), equilibra as operações nos vários mercados. O sistema s6 é estável quando a totalidade dos pagamentos feitos pelos consumidores iguala os r ndimentos distribuídos pelo empresário (10). O lucro empresarial (11) não cabe, pOl iss , no modelo de referên­cia (12). As variações em sentido inverso da oferta e da

a Sraffa) , prefere evitar a noção de capital que não passa de um ccircuml6quiot. (SRAFFA. ProJuction .. .• cit .• 9) .

Sobre a mesma questão acusa J. Robinson: cThe unconscious preoc­cupation behind the neo-classical system was chiefly to rise profits to the sarne level of moral respectability as wagest (Econol/lic Philosophy, cit.. 58).

(8) Op cit .• 192. (9) A imagem da balança aplicada ao sistema walrasiano parece

particularmente apropriada. tanto mais que a ideia de equilíbrio terá sido sugerida a WaJras por um engenheiro (Cf. ROBINSON & EATWBLL, cit .• 164).

(10) E esta igualdade satisfaz também as condições de manutenção do nível de pleno-emprego.

(11) Lucro empresarial positivo (benefice) ou negativo (perte), que não se confunde com os serviços do capital (profit) e cuja expressão mercantil é o juro.

(12) Por modelo de referência quer-se significar o conjunto arti­culado e estruturado de elementos. já teoricamente crivados e elaborados. e que serve de representação dos processos reais.

A ausência de espaço para o lucro empresarial não resulta. obvia­mente. da impossibilidade de o integrar no modelo. pelo contrário ele está lá e cumpre uma função essencial. S6 não tem cabimento na medida em que todos os componentes do sistema estão ordenados e articulados de modo a apenas conduzirem às soluções equilibrantes. ou seja, aquelas em que o lucro de empresa desaparece. As relações econ6-

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procura nos mercados dos bens e dos factores, conduzirá empresário individual (e o sistema no seu conjunto)

para uma posição em que não existe (mi. benefice m perte».

Sendo o lucro (profit) o serviço dos capitais propria­mente dit s e o juro a sua expres ão de mercado, o segundo é, por defmição, correspondente ao pagamento integral do primeilo. Um eventual excedente que o em.presário pude~~e arrecadar significaria um acréscimo de valor dos serviços que o mercado se apressaria a exprimir.

Numa análise mais cuidada, esta conclusão apoia-se no «Teorema das produtividade marginais» (13). Adnútindo variações infmitamente pequenas, as quantidades usadas de cada serviço produtivo dependem do seu preço e este da interacção oferta I procura.

Não curando por ora das objecções que a esta teoria ~c podem fazer, conclui-se, com Walras que «o preço dos serviços são proporcionais ... às produtividades mar­ginais» (1 4).

Fica assim plenamente justificada a situação de lucro empresarial zero.

Mas como será possível aceitar a total evanescência do lucro de empresa e do próprio empresário? (15).

micas são representadas como uma enorme engrenagem que permanen­temente procura o seu centro de gravidade. Por tal razão as causaS dos desequilíbrios reais (que W alras não nega que existam) não são analisadas, de um modo integrado, no modelo.

Seguindo o caminho oposto, Schumpeter construiu um outro sis­tema através do qual pretendeu pôr em destaque os mecanismos que geram o tal desequilíbrio.

arial. É neste sentido que o referente walrasiano anula o lucro empre-

(13) Cf. W MRA , op. cit., 371 55 ..

(14) Idell/ , 375. (15) Cf. idell/ , 195.

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Walras resolve a contradição entre o modelo teórico e a exigência empírica de duas formas:

1. Em primeir lugar alerta para o facto de o estado de equilíbrio ser meramente ideal e nã real (16). Neste caso a imp{'rfeição das condições reais, quando aferidas pela pureza d model, explicaria a existência concreta do empresário e do respectivo lucro (benefice). Mas a hipótese walrasiana peca por nunca ser explicitada a própria condição do desequilíbri . Quer dizer, a forma como as relações económicas são a presentadas impede a visualização de qualquer tipo de força responsáveis pela ruptura do equilíbrio. D ste modo a distância entre a teoria e a reali­dade teorizada não chega a ser percorrida. Como diz J. Robinson, «o c nceito de equilíbrio é essencial ... mas não serve como hipótese que se confr nte com os factos» (17).

2. Em segundo lugar, Walras considera que em equilíbrio os empre árias não subsistem como tal, mas antes como detentores de factores (18). A função empresarial, que continuam a executar, resulta directamente da necessi­dade de pôr em movimento a riqueza que detêm.

A interrogação que surge é agora a seguinte: indepen­dentemente da validade analítica de um esquema como o do Equilíbrio Económico Geral, será vantajoso tomá-lo como explicação, mesmo aproximada, do real? Ou, letomalldo a citação de J. Robinson, será possível confrontá-lo com os factos?

Neste caso particular, mais do que em qualquer outro, creio que não.

(16) Cf. idem, 194. (17) Economic Plzilosophy, cit., 81. (18) Cf. WALRAS, op. cit., 195.

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A velha noção de capitalista-empresário, da Escola Clássica, tem de considerar-se ultrapassada. A mera posse do capital não é suficiente para deternúuar o complexo de funções exercidas pelos «chefes de indústria». Há, sem dúvida, um conjunto de elementos objectivos e subjectivos que condicionam e clarificam a acção empresarial. Mas será correcto cair no extremo oposto? Isto é, apenas considerar a função abstracta sem os condicionantes reais? Mesmo ao nível de uma análise «pura» como a de Walras tal não sucede. Repare-se como ele próprio acaba pOl rein­troduzir os dados empíricos para justificar o empresário de equilíbrio. Ao fim e ao cabo a realidade infiltra-se sempre mesmo nas hipóteses mais isotéricas. Mas, na eco­nomia do modelo, tal facto é escamoteado.

Temos assim definido como a partir de J. B. Say e fundamentalmente pela mão de W alras, a noção de lucro se desliga totalmente do capital e do outro rendimento a ele associado: o juro.

Este esquema essencial será reproduzido mesmo por autores que, à partida, rejeitam a teoria dos três facto­res (19), como é o caso de Bohm-Bawerk.

(19) A «Teoria dos três factores. é uma expressão consagrada que s6 por si indicia o tipo de análise que está em causa. Deve, no entanto notar-se, que Walras não é o representante típico dessa analítica. O padrão encontra-se, fundamentalmete, em J. B. Clark e nas várias divulgações que têm origem em Marshall (Ver J. ROBINSON,

«Qu' est-ce que le capital., Revue D ' Économie Politique, 1966). A «factorizaçãot supõe a agregação de elementos heterogéneos

(vários tipos de traballio, de terra e de capital) sob unu noção comum. É a partir daqui que o modelo se constroi e fornece instrumentos como a célebre função de produção. Encontramo-la sob várias formas ('m Jevons, Wicksell ou, paradigmaticamente, na simplificação de Cobb­-Douglas.

No sistema wlarasiano não existe ulI/a função de produção visto que não se procede à agregação. O modelo comporta lima infi-

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A sua «Teoria do Ági »pretende basicamente demons­trar a existência de um princípi económico uruc que se expressa, sob fi rmas varIadas, em diversos tipos de mer­cado. «o ági - diz Bohm-Bawerk - é-n s dado direc­tament no mercado de emprést1l110 sob a forma de juro, enquanto n mercado de tra balho aparece s b a forma de um preço do trabalho inferior a val r do seu produto futuro» (20).

Recordemo a noção bawerkiana de capital. Sepa­rando-se da concepção de Smith, Bohm-Bawerk distingue radicalmente capital privado e social. O primeiro funciona como «W11 magnet que atrai riqueza) (21) enquanto o segun­do deve ser entendido como instrumento de produção que colabora na criação de riqueza. Daqui resulta que o juro não é a compen ação que o capital recebe pelos seus serviços pr dutiv s (22) tal como não é um factor equipa­rável à terra u a trabalho. O que é então? Tal como em Senior o capital vem definido como (Qnstrumen­tos intermediários de produção) mas, adicionalmente, ganha relevo o elemento temporal. Produzir é malúpular a natu­reza pelo que se compreende a essenciaJidade do trabalho

nidade de tipos de trabalho, de terra e de capital, tratados separa­damente.

Embora a solução de Walras tenha os seus inconvenientes, evita o pântano teórico que é a função agregada de produção. Paradoxalmente o seu uso acaba por aproximar os economistas neo-neoclássicos do proce­dimento marxiano de agregação dos tipos de trabalho (CC M. MORJ­SHIMA, Warx's Economics, CUP, 1979, 194).

(20) BOHM-BAWERK, The Positive Theory of Capit(/l, trad. inglesa de W. Smart, G. E. Stechert & CO, New York, s.d., 336.

Na apreciação da Teoria do Ágio, Schumpeter vai mesmo ao ponto de aproximar Bohm-Bawerk de Marx: .Com uma apropriada ideologia e terminologia (a teoria do ágio) teria podido ser apresentada como uma nova teoria da exploração. (SCHUMPETER, History ... , cit., 440) .

(21) BOHM-BAWERX, op. cit., 1. (22) Idem, 2.

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e da própria natureza. Só que tal manipulação, que visa obter bens para a satisfação de necessidades ubjectivas, pode processar-se de vários modos. Ou o trabalho age sobre a natureza c a transforma rapidamente em formas utilizáveis, ou esse processo se alonga criando produtos intermediátios que por sua vez serão utilizados na obtenção de bens finais. A dimensão temporal do processo fica, assim, colocada na primeira linha da inve~tigação (23).

A comparação valorativa dos bens deve integrar os diferentes momentos em que estão disponíveis.

Três motiv s concorrem para a maior valoração dos bens presentes relativamente aos futuros:

- Um motivo psic0lógico, ínsito na própria natureza humana, e segundo o qual sentimos com maior premência as neccssidades actuais do que as futuras;

- Um motivo económico que explica a preferência temporal pela relação lccursosjnecessidadcs. Os que têm actualmcnte cal ência de bens mas esperam vir a melhorar a sua situação no futuro, terão uma preferência temporal positiva; no caso inverso os bens presentes são tão valorados como os futuros e, para uma pequena minoria os bens futuros têm mais valor do que os presentes (24).

- Finalmente, um motivo técnico. Admitindo que os pr ocessos longos (rounbabout methods) são fisicamente mais produtivos - embora a uma taxa decrescente - os

t23) Com clara influência de Menger (cf. Pritlcipii Fondalllentali di

Ecofloll/ia. trad. italiana. Imola. 1909. especialmente págs. 19 e 111) e também de Jevons (cf. Theory oi Politicai Economy. trad. francesa de Barrault/Alfassa. Paris. 1909. especialmente págs. 311 e ss.).

Sobre a possível influência de Jevons. ver SCHUMPETER. History ...• cit .• 404.

(24) Cf. BOHM-BAWBRK. op. cit.. 252.

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bens presentes adquirem mais valor subjectivo por­que imediatamente integráveis n pr cesso de pro­dução (25) .

Bohm-Ba erk afirma quc cada um d s motivos é indep ndente dos restantes e justificam por si 6 a plefe­rência temporal (26). N entanto, algumas páginas adiante, Bohm-Bawerk vê;.. e na nccessidade de intl duzir uma prévia e já defmida preferência temporal para justificar a uperioridad técnica d s bens presentes (27).

Estamos ag ra em c ndiçõe de a bordar ponto

que mais no imp rta. Sendo certo que a produção envolve um espaço tcm­

poral, há que aber por que motivo existem agentes dispos­tos a uportar a espera, aí implícita.

Ei com Bohm-Bawerk responde à pergunta formu­lada: « •. • os trabalhadores não podem esperar até que o proces o de pr dução se c nclua pondo ao seu dispor os bens prontos para COnSlllTlo» (28). Por isso os trabalhadores «se tornam economicamente dependentes dos capitalistas, os quais já possuem aqui! a que temo chamado produtos

(25) cf. Cap. IV da Positive Theory. (26) Cf. op. cit., 252. A total independência dos três motivos é acentuada pelo facto do

motivo psicológico ser cumulativo com o económico e o motivo técnico alternativo dos dois restantes (cf. 273-274). No entanto a demons­tração da preferência temporal com base no motivo técnico só pode ser feita na pré-suposição dessa mesma preferência (Ver P. LHAu, cit., 44). Aliás é o próprio B. Bawerk que assim procede quando elabora a tábua da pág. 266.

A crítica de Landry como a de r. Fisher detem-se particularmente neste ponto. O motivo técnico só tem sentido de for admitida a «intpaciênciv como lhe chamon Fisher (cf. LANDRY, L'Intérêt du Capital, Giard & Briere, Paris, 1904, 85 e 217 e r. FISHER, La Théorie de L'Intérêt, ed. Costes, M. Giard, Paris, 1933, 65).

(27) Cf. op. cit., 266-267. (28) Idem, 83.

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intermediári s» (29). P r utra palavras, os trabalhadores porque desprovido de riqueza «não têm outra alternativa que não seja a de vender seu trabalho» (30). No polo

post d mercado encontram-se os detentores de riqueza (capitalistas) disp stos a trocar um bem presente por um futuro. Ma só o fazem porque, ao contrário dos res­rantes agentes económicos, Hão têm preJerétlcia temporal positiva. Dad o montante de recursos ao seu dispôr o motivo económico determina que «para os capitalistas o valor subjectivo dos bens presentes não é maior que dos futuros» (31).

Bohm-Bawcrk mais não fàz que reintroduzir na análise económica o enquadram.ento institucional e sociológico real que era um dos atributos da Escola Clássica. O motivo económico, que conduz a uma preferência temporal nega­tiva por parte dos capitalistas, é o verdadeiro motor do sistema e gerador de excedente (32).

Também no sistema walrasiano está subentendida uma determinada forma de distribuição de riqueza, mas o fun­cionamento do modelo é totalmente independente da configuração distributiva.

Temos assim sucintamente definidas as condições que permitem afirmar que os capitalistas-empresários (capi-

(29) Ibidem . Esta relação de dependência que, como vimos supra, é utilizada por Smith para expücar os salários e os lucros, deixou de ter relevo na grande maioria das análises. A liberdade jurídica que subjaz aos contratos supera a relação real de dependência económica. Por isso as teorias da oferta de trabalho se deslocaram para a mera comparação entre penosidade e recompensa. Veja-se «o rapaz das amoras» de Marshall ou a exposição de Jevons da «Teoria do trabalho» (op . cit., 254-258).

(30) BOHM-BAWERK, op. cit., 314. (31) Idem, 330. Ver igualmente p. 315. (32) Sem que, portanto, esteja presente qualquer ideia de absti­

nência. Bem ao contrário. C( 315. Pela mesma razão Smith nunca caiu na noção de abstinência.

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tali t undertaking) btêm um ganho aproximadamente pr porcional a montante de capital inve tido» (33).

B hm-Bawerk c nsiderJ que o bens intermediários apenas transmitem as p tencialidades produtivas neles previamente encerradas e por isso o capital não é produtivo, n sentid walr sian (34). Pela m.esma razão o juro não pode entendcr- e como um rendimento líquido directa­ment imputável ao capital.

Como se articula entã ,o juro e o lucro empresarial? Dada a recusa da teoria dos três factores, Bohm­

-Bawerk utiliza a longo de toda a sua obra a clássica divisão capitalistas, trabllhadores e proprietários fundiá­rios (3S). Como, por outro lado, pretendeu demonstrar a unicidade do princípio que preside à formação dos rendi­mentos, ficariam defmidos os mercados onde se transaccio­navam bens presentes por futuros, que não eram mais do que parcelas do illlercado geral de subsistência». Teríamos então o mercado de trabalho e o salário; o mercado da terra e a renda. O lucro ou (<surplus value» era a exacta contrapartida da não coincidência do salário e da renda com o valor futuro dos bens a que davam origem. Finalmente o juro seria a expressão geral, sob a forma de moeda, do mesmo princípio de circulação temporal de bens.

Porém, mesmo ao terminar a «Teoria Positiva», Bohm­-Bawerk reintlOduz a figura do empresário nos moldes

de Say-Walras. No sistema walrasiano, por exemplo, o empresário

é essencial porque constitui um dos polos do mercado dos

(33) Idem. 299. (34) Cf. 92,.93. Segundo Schumpeter a teoria de Bohm-Bawerk seria mesmo oposta

à de waJras (Cf. History ...• cit .• 439) . (35) Cf. Positive Theory. cit .• 320. nota 1).

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factores, capital incluído. Mas no esquema de Bohm-Bawerk não existe um mercad de capital do mesmo tipo. Dado o entendimento do fund de subsistência, quem procura capital são, fundamentalmente, os pr6prios trabalhadores(36). Daí que o empresário «puro» figue deslocado num tipo de análise como a de Bohm-Bawerk pois não desempenha nenhuma função específica no âmbito do esquema apresentado.

O resultado é tão s6 o de reencontrarmos uma solução pr6xima da do equilíbrio econ6mico geral: o aluguer de bens intermediários origina o pagamento de um juro aos capitalistas e o desaparecimento do lucro de empresa. Mais uma vez, este último, ::tpenas subsiste por efeito da imperfeição do mercado ou «fricção» no funcionamento do sistema (37).

A inadequação da figura do empresário puro foi muito justamente posta em destaque por Landry. A crítica que dirige a Bohm-Bawerk aplica-se, por maioria de razão, ao sistema walrasiano e de um modo geral a todos os modelos que têm no seu centro o empresário «puro». Diz Landry que a acção empresarial não tem sentido a menos que também ele seja capitalista ou recorra ao empréstimo de capitais para «receber ele pr6prio um rendimento suplementar, que esse capital torna possível, uma renda, por exem­plo» (38). Daqui conolui que o empresário enquanto tal deve ser eliminado, exactamente como Bohm-Bawerk procede ao longo da «Teoria Positiva».

O facto de o empresário ser detentor de um qualquer elemento produtivo constitui, nesta perspectiva, justifica­ção bastante para a sua pr6pria função. Mas continua a não

(36) O que tem implicações na teoria do capital. Ver parte II. (37) C( op. cit., 424. (38) LANDRY, op. cit., 220.

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ser explorada a p sibilidade de relacionar esse dado com o funcionament concret dos mercados em que intervém,

l11.aX1me n d capital. A. Marshall erá o primeir a atribuir algum relt vo

ao elemento que temos vind a evidenciar. A clara definiçã da análises de curto e longo prazo

obvia a c nstante obse~ã d equilíbri temporalmente indeterminad . Para se chegar ao long prazo tem neces­sariamente d(' passar- e pelo curto prazo, e daí que o modelo de Marshall contemple a apreciação das tendências de rup­tura. Ma mesm quando a tónica é o equilíbrio as conclusõe são bem diversas das de Walras .

Numa análi e de muito longo prazo (39) a oferta (produção) ajusta-se à procura, sendo os preços resultantes definido como normais e praticados pela «firma represen­tatiVa». O preço normal re ulta dos custos de produção que incluem o pagamento do tlabalho, da natureza, da

«espera» e da «organização». É este último elemento - um verdadeiro quarto fac­

tor produtivo - que, em prindpio, se associa ao lucro

empresarial. A crescente complexidade produtiva determina uma

igualmente crescente complexidade social. A divisão do trabalho gera uma diferenciação mas, dialecticamente, conduz à necessidade de integração (40). A gestão empresa­rial cumpre a função básica de ordenar da forma mais eficaz o processo produtivo. O seu elemento central con­siste na «business ability in command of capital». O sucesso da empresa depende largamente do modo como os

{39) Ver MARsHALL, PrincipIes af Econamics, 9.' ed., Macm.illan, London, 1920, 338.

(40) Idem, 241.

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«bllsiness mam> orientam a utilização do capital ao dispor da empresa. O centro nevrálgico da actividade da empresa fica assim dependente de dois elementos essenciais: o capital, cujo preço de oferta é o juro (41); a capacidade individual para orientar o uso dos recur~os da forma mais eficiente (business ability), a que corresponderia o lucro líquido de administração. Mas o estatuto teórico da «organização» - que consiste no processo efectivo de relacionamento da capacidade empresarial e do capital- é diverso do daqueles dois elementos. O capital livre existe por si próprio, inde­pendentemente de qualquer acção produtiva; a «business ability» é uma mela capacidade individual que pode ou não estar a ser exercida. São por isso átomos simples no sistl ma teórico. A «organização», pelo contrário, só é detectável no âmbito de uma empresa concreta, i. é, está indissociavel­mente ligada ao processo real da produção. Ora sendo as empresas as unidades que em economia capitalista têm a seu cargo o controlo do processo produtivo, a análise teórica deve relevar esse elemento essencial. Na abordagem marshalliana a «olganização» é a molécula chave do sistema teórico.

Quando Marshall no L. VI, cap. VII, analisa os lucros e a capacidade empresarial, só ilustrativamente (ver a pri­meira frase do § 6.°) compara os «eanings of management» aos salários recebidos pelos «managers» das empresas por

(41) Juro do capital porque está pressuposto um hipotético equilí­brio de longo prazo que na verdade é inverificável. Com efeito os valores de longo prazo «são um valor médio que as forças de mercado gerariam se as condições gerais da vida fossem estacionárias durante um período muito longo. (PrincipIes, cit., 347). Só nesta hipótese a quasi­-renda se assimilaria ao juro (Cf. PrincipIes, 424) .

No curto prazo as constantes flutuações das quasi-rendas (admi­tindo ultrapassadas as dificuldades de determinação) dão origem a um lucro 011 perda suplementar.

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acções. O ]ucr brut, para utilizar a ]i~tag m feita p r Schumpeter, é um <1ricassé de cisas tai c ln : salário de direcção de todos os géneros pos íveis ... ; lucros de empresas bafejada pela sorte incluindo risco e incerteza ... ; lucros do tipo renda pel c ntrolo de fact re específic s ... ; lucros casuais ... ; e, entre utra coi as, lucros que se acumulam numa empre a à medida que ele cresce, ou antes, porque cresceu, relativamente aos seus c ncorrentes ... ; um elemento de monopólio que intervém, implícita ou explicitamente,

sempre que é necessário» (42). Neste quadro melhor se compreende que em todo

citado capítulo, como em outras passagens onde se refere ao assunto, a análise de Marshall seja fundamentalmente marcada pela ideia de empresa (onde a organização se mani­festa) e não pela de empresário desprovido de factores e individualmente considerado, com se enc ntra em Say ou Walras. Por ser assim, quando Marshall trata do ajustamento entre a «business ability» e o capital que ela controla (L. IV, cap. XII, esp. § 12. °) não foca a sua atenção no modo como um indivíduo eventualmente talen­toso pode vir a controlar o capital necessário para um empreendim nto . O que analisa é o modo como um «busi­ness mau» consegue ou não o crescimento da sua empresa. Concluiu, de forma optimista, que regra geral a maior capa­cidade empreendedora resultará no <<alargamento do negó­cio» a que corresponde o controlo de um maior volume de

capital. A conclusão a que chega conduz Marshall a uma refle­

x;ão sobre as condições da democracia económica. E isto porque os «homens de negócios» constituem uma espécie de casta, embora não tão fechada como as de tipo sócio-

(42) SCHUMPBTER, History ... , cit., 583.

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-institucional (43). Entre os factores que condicionam a constituição real de empresas está a prévia posse de capi­tal (44). Sobre este princípio empírico é que vai elaborar-se a representação te6rica fundamental da economia.

Assim deixamos de encontrar o empresário puro que aluga factores aos seus proprietários. O que nos é apresen­tado é o «business man» detentor de algum capital, que, com esse ponto de partida, funda uma empresa (45). A dife­rença entre as várias empresas que se confrontam no mercado encontra-se, fundamentalmente na estrutura do capital. O lucro de empresa é fortemente afectado pelo facto de «o homem de neg6cios trabalhar principalmente com capitais pr6prios ou... principalmente com capitais alheios» (46) .

A importância deste elemento revela-se quando Mar­shall enuncia o modo de determinação da taxa de lucro empresarial: «a relação dos lucros anuais com o montante do seu capital é a taxa de lucro» (47).

Será o aprofundamento do tipo de análise de Marshall que tornará possível uma concepção de lucro de empresa directamente resultante das condições de funcionamento do mercado do capital financeiro (48).

(43) Cf. Principies, 299 e ss.. Compare-se com a imagem dada por Schumpeter segundo a qual «as classes superiores da sociedade são como os hotéis, sempre cheios de gente, mas de gente que, no entanto, muda continuamentet (Teoria do Desenvolvimento Económico, trad. espanhola, Fondo de Cultura, México, 1963, 161).

(44) Cf. Principies, 299. (45) Cf. idem, 308. (46) Idem, 602. ~47) Idem , 74. (48) Deliberadamente não foi referido o lucro de inovação, que

MalShall também considera, (ver Pri"ciples, 597) por ser cumulativo com a parcela de lucro que pretendemos determinar.

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Simultaneamente c nvergent c divergente é a tese

central de J. Schumpeter . Na esteira metodol6gic de Menger, chumpeter

procede a imputaç-es uces~ivas de valor até atingir que designa por «element s últimos da pr duçã » (49). A ficção da corrente circular pré-determina de imediato valor «previsível» (50) e reduz o produtos d sistem.a aos recursos

originários. Paralelamente ao circuit real deve existir um fluxo

monetário, que se movimenta na direcção inver~a, prefi­gurando em ab.oluto a condições da Lei de Say e o papel de «véu» desempenhado pela moeda (51).

Neste quadro, afastando fact res externos, a ruptura da corrente circular s6 é possível em face de uma aoção inovadora. O seu agente é o empresário.

O problema que fica evidenciado com uma abordagem deste tipo respeita à concretizaçã da acção inovadora, i. é, ao mecanismo econ6mic que a viabiliza.

Com efeito, por definição , todos os recursos disponíveis estão afectados ao processo produtivo «rotineiro», pelo que há necessidade de explicar como se cria o espaço para a

inovação. Nas sociedades capitalistas o controlo sobre os meios

que conduzem à produção supõe a propriedade. Deste modo, a existência de empresário fica condicionada aos modos como podem aceder ao controlo dos bens, ou, o que é o mesmo, ao poder de compra.

Ainda em termos ideais, a inovação <<inicial» apenas pode ser gerada pelo sistema com base na criação ad hoc

(49) SCHUMPETliR. Teoria do Desenvolvi/llellto &onó/IIico. cit .• 30. (50) A ideia de valor previsível tem pela primeira vez um trata­

mento sistemático com K. Menger (Ver Pri/lcipii ... • cit .• 108). (51) SCHUMPETBR, op. cit., 26.

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de meios de pagamento (52). Concretizada, com sucesso, a inovação, daí resultará um valor global nas mãos do empresário que o mecanismo da imputação não absorve na totalidade. É o lucro (53).

Nesta acepção o capital identifica-se com o meio geral de pagamentos quando na posse dos empresários. E como genérico poder de compra que é não se identifica nem é subs­tituído por qualquer tipo de bens. Bem ao invés, ele confron­ta-se com s bens (54), dissolve-se em rendimento (55). Daqui deriva que o rendimento que aflui ao emprc:sário nada tem a ver com as propriedades do capital, enquanto meio produtivo que não é. A sua função esgota-se na mediação entre empresários e bens de que carecem para produzir. Mas, p r isto mesmo, a valoração dos meios de paga­mento presentes, por parte dos empresários, é superior à valoração futura (56) . Esta apetência justificará o pagamento de umjuro.

Antes de passar ao outro lado da questão, abandonemos a ficção do momento (Qnicial» do desenvolvimento.

Se forem dados os resultados de um de~envolvimento anterior, as condições de concretização das inovações são ligeiramente alteradas. Sob o ponto de vista da procura de poder aguisitivo tudo se mantém inalterado. Mas a oferta de capital não tem já de ser feita apenas por criação

(52) Assim tem de ser dada a inexistência de aforro. (53) A análise do processo que conduz à formação do lucro

será abordada com mais detalhe na parte II. De momento basta a ideia em termos gerais.

(54) Op. cit ., 125. (55) cf. op. cit., 126. A separação entre capital e bens capitais está

na linha das obras de Marshall e J. B. Clark. No caso de Marshall essa separação expressa-se conceitualmente ao nível dos respectivos rendimen­tos: juro e quasi-renda. Cf. Principies, II, IV, 52, 73, 74.

(56) Cf. op. cir., 194. Compare-se com a posição de Bohm­-Bawerk.

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ad hoc. Há agora acumulações resultantes dos processos inovadores que foram difwldidas pelo tecido social. Os bancos centralizam a oferta dos meios de pagamento fun­cionando como intermediálio e produ.tores de uma merca­doria específica (57). Nesta medida «o mercado monetário é sempre o estado maior do sistema capitalista» (58).

Retomemos então a questão do juro. Assente a hip6tese de, através de acções empresariais,

o poder de compra ser multiplicado, difunde-se por todo o sistema o pagamento de juro. As constantes inovações, ou a sua mera possibilidade, geram lucros ou extpectativas que resultam num prémio efectivamente pago pelo controlo de meios de pagamento. Mas na sua raiz, ele é um «imposto sobre o lucro do empresário» (59).

A inovação como fonte de rendimentos empresariais é tratada desde A. Smith. Encontramo-la em Say como em Marshall. O grande mérito de Schumpeter foi integrar a sua análise num quadro te6rico especificamente a ela diri­gida. A unanimidade, que até inclui Marx (60), dispensa

(57) Idem, 197 e § 12, § 13. (58) Idem, 133. (59) Idem, 212. No que Schumpeter coincide inteiramente com

A. Smith. (60) A propósito de Marx cabe aqui referir a proximidade de

Schumpeter relativamente ao marxismo. Embora usando instrumentos de análise que nada têm a ver com Marx (o que nem sempre sucede), Schumpeter dá a sensação ao leitor - particularmente da Teoria do Desenvolvimento Econ6mico - de deslocar-se permanentemente na borda de um abismo (o marxismo).

No caso concreto do lucro inovação, Marx vai até mais longe do que Schumpeter ao considerar a instabilidade e a mudança como vital para o sistema. Lembrem-se estas duas conhecidas passagens do Mani­festo: cA burguesia não pode existir sem revolucionar constantemente os instrumentos de produção .... co que distingue a época burguesa de todas as antecedentes é a alteração incessante da produção ... a permanência da instabilidade e do movimento •.

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a crítica a esta visão. O que tem de questionar-se é antes a unicidade da fonte do lucro empresarial.

Segundo Schumpeter o lucro-inovação é por sua natu­reza flutuante e transitório. Uma vez difundido o processo inovador o mecanismo concorrencial eliminaria esse rendi­mento (61). Mas se o mecanismo concorrencial não funcio­nar de um modo perfeito, o que era lucro transforma-se cm pura renda (62).

Uma vez mais a existência de um lucro empresarial - dedução feita das despesas com todos os elementos pro­dutivos, juro incluído - vem explicada pela deficiente acção do mercado.

Repare-se, no entanto, que embora Schumpeter atri­bua uma importância essencial ao mercado monetário,

trata de um modo pouco rigoroso. Em consequência da sua tese central, Schumpeter

declara que «só pode transformar-se cm empresário quem se coloque primeiramente na posição de devedor». « ... (0 empresário) é o devedor típico da sociedade capita­lista» (63). Esse débito será rernido, juntamente com o juro, por uma parte do lucro. Mas no caso do empresário mar­gim] nada restará (64). Quer dizer o juro absorve todo o lucro c só assim não é para todos os outros dada a diversidade dos lucros (65) e enquanto a concorrência não se abater sobre eles.

Cabe agora pelguntar até que ponte uma tal análise é realista.

(61) Daí o elemento de monopólio inerente ao lucro. (62) Cf. Teoria do Desenvolvimento Económico, cit., 156-157. (63) Idem , 111 . (64) Cf. 196. (65) Como é evidentt', não há nesta concepção uma uniformidade

de taxas de lucro.

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Toda a teoria de Schumpeter se baseia numa apreciação individualista da figura do empresário. São as qualidades pessoais dos «chefes de indústria» que permanentemente põe em destaque. No entanto essas qualidades só podem exercer-se mediante certas condições de carácter económico. Como vimos supra, era essa uma das preocupações de Marshall.

Pois bem, Schumpeter ao debruçar-se sobre o papel insubstituível do empresário acabou por esquecer a empresa, no sentido de «Organização» de Marshall.

Como é então possível obter o controlo dos bens da sociedade sem adequada garantia? (66). Mais concretamente, como podem os bancos - a que Schumpeter dá tanta importância - transferir o poder aquisitivo sem risco de colapsar o sistema? A questão é tanto mais premente quanto se sabe que não é o empresário que corre os riscos (67).

O problema é abordado de passagem, pelo próprio Schumpeter, porque tem assestadas todas as baterias teóricas na pessoa do empresário. No entanto quando refere a «vantagem» da posse de riqueza por parte do empresário, situa-se muito mais próximo da realidade (68). Mas o alvo

(66) Tanto mais que Schumpeter qualifica os empresários como devedores da própria sociedade: ceIe recebe bens da corrente social- em princípio - antes de ter contribuído para ela seja de que maneira for. Neste sentido é um devedor da sociedade». Op. dt. , 111, nota 9.

(61) Cf. 163. (68) Ate'lte-se na caracterização da função empresarial como uma

liderança de tipo específico e nomeadamente a referência às relações financeiras. Ao empresário caberia «convencer ou impressionar o ban­queiro que o deve ftnanciar» (p. 98). A este respeito, nas primeiras páginas do cap. m, Schumpeter trata das condições de acesso ao crédito por parte dos empresários. Refere então o problema da garantia que normalmente vai de par com o empréstimo. Porém, logo de seguida afuma que a «função do empresário não está relacionada,

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não deveria ser, neste caso, o empresári~ individualmente

considerado, mas sim a própria empresa como unidade económica fundamental.

É neste último sentido que vão as propostas de F. Knigkt e M. Kalecki.

Na esteira de Marshall, Knight dá particular atenção aos efeitos económico-organizativos provocados pela explo­

siva divisão do trabalho posterior à revolução industrial.

A ponderação teórica deste dado é um dos principais contri­butos do autor de «Risk, Uncertainty and Profit».

O elemento temporal que Walras ignorou e Bohm­-Bawerk hiper-valorizou reaparece com uma nova dimen­são.

A produção é um conjunto de actos que se projecta no futuro, na medida em que os seus resultados são sempre posteriores - e por vezes muito posteriores - à acção que os desencadeia. Num certo sentido, produzir é sempre um «salto no escuro» dada a imprevisibilidade do próprio futuro . Ao lado dos riscos estatisticamente contabilizados, e por isso seguráveis, tem de introduzir-se o imponderável, a incerteza sem remissão.

A divisão do traballlO, ao atomizar as funções produtivas individuais, gera, no mesmo movimento, a necessidade da centralização e do controlo da produção.

em prmClplO, com a posse de riqueza. ..• (p. 109), sendo esta uma mera «circunstância que lhe permite obter o crédito com muita maior facilidade- (idem) .

Schumpeter tem razão ao dizer que a posse de riqueza não faz parte da função empresarial apenas na medida em que esta for considerada independentemente da empresa. Como, porém, a actividade económica concreta passa necessariamente pelas empresas a análise de Schumpeter acaba por não contemplar a questão essencial que é a do capital da empresa.

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Porém a «cefalizaçã »(69) d proces pr dutivo não se esgota na mera necessidade empírica e te6rica da existência de um agente centralizad r - empresário. A funçã de rganizaçã pr dutiva implica a respons(/bi­lização, perante terceiros, da sua pr6pria actividade. O núcle do sistema são as empresas cuja função essencial e reduz a dois elementos: responsabilidade e controlo (70).

Cada «grup produtivo» é incapaz, por i s6, de efectivar a produçã e concomitantemente de assegurar rendimento de que necessita para a ua subsistência.

Os h men de neg6cios, que dirigem as empresas e tomam as decisões, são, neste sentido, os únicos produlo­produtores (71). Ao agirem enquanto tais, correm o risco inerente à incerteza e assumem, perante o «grupos pro­dutivos» que organizam, a responsabilidade da distribuição dos rendimentos que a cada um compete (72).

A inseparabilidade da função de controlo e de garan­tia (73) desvia o campo de análise da figura individual do empresarlO - com em Walras ou Schumpeter - para se centrar no complexo organizacional em que se integra: a empresa. Não quer isto dizer que eja negada a impor­tância das aptidões individuais dos empresários. Mas esses elementos s6 actuam economicamente no âmbito colectivo.

Assim, «é claro que s6 o possuidor de riqueza já produzida ou de capacidade produtiva futura, sob qualquer

(69) FRANK KNrnT, Risk, U"certai"ty a"d Profit, edição da London School of Economics, The Riverside Press Cambridge, 1935, 268-269.

(70) Op. cit., 271. (71) lbidem. (72) .This fact is responsibJe for the 1110st fundamental change

of all in the form of organization, the system under which the confidente and venturesome .assume the riskt or .insuret the doublful and timid by guranteeing to the later a specified income in return for an assignement of the actual resultst (269-270).

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forma, pode dar garantias ou efectivamente suportar a incerteza e o risco por outras pessoas» (74). A propriedade é uma condição sine qua non da actividade empresarial (7!».

Contra a concepção dominante desde Say, Knight afirma que <<na típica organização moderna dos neg6cios, o responsável (empresário) não fornece trahalho, mas apenas serviços da propriedade» (76). Ora sendo o juro um caso típico de rendimento da pr priedade, a separação precisa entre juro e lucro não deve sequer ser tentada (77).

Uma eventual tentativa para isolar o «lucro puro'> do <~uro purO» não passaria de uma comparação entre os rendimento~ recebidos pelas empresas sobre os seus investi­mentos e a taxa de juro a pagar por idêntico valor (78), sem que fosse possível desenvolver uma teoria aceitável (79). Sob o ponto de vista teórico também o lucro é incerto (80). O máximo que se poderia dizer é que o rendimento empre­sarial inclui uma renda pelo uso dos bens mais um lucro que remunera a função de responsabilidade-controlo (81).

(73) A inseparabilidade das ftmções de controlo e garantia é não s6 empírica como teórica. Cf. 278.

(14) Idem, 299. (15) Sobre as implicações sociais da diferença entre posse de capa­

cidade de trabalho e de propriedade de bens, ver páginas 354 e ss. da obra citada.

(76) Op. cit ., 309. (77) Cf. op. cit., 304. Knight considera plenamente justificada a

pouca preocupação dos autores da Escola Clássica em separar o juro do lucro. O elemento mais importante era o rendimento empresarial asso­ciado à propriedade, i. e., o lucro. Cf. 302. Por outro lado critica o excessivo peso que muitos autores acabaram por dar aos salários de direc­ção tentando explicar o lucro empresarial . Cf. 303.

(78) Comparação que nem sequer é fácil de justificar teorica­mente dada a diferença de método de cálculo e da variação do valor do capital, tal como Marshall já havia alertado. Cf. 328-330.

(19) .Pure profit is theoretically unimputabJe.. Op. cit ., 308. (80) Cf. op. cit., 310-311. (81) Idem, 329.

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. Num certo sentido a o bI'a de Knight dá conteúdõ

geral a uma simbiose entre Marshall e Schumpeter. No

primeir encontrámos embri nariamente a ligação da

propriedade à função económica de organização; no

segundo vimo-nos confrontados com a radical diferellça entre passado e futuro, motivada pela própria acção do

empresário. Knight sedimenta o facto essencial de o

núcleo da economia serem as empresas e estas, porque agem

num mund de incerteza, assumem. pela propriedade

inerente, o risco da produção. Estamos agora em condições de dar um último passo

e formular a derradeira pergunta: será que a estrutura do

capital de uma empresa não influencia o mecalúsmo de funcionamento do mercado fmanceiro c, por essa via, a for­mação do lucro empresarial?

M. Kalecki é o autor que mais profundamente faz derivar consequências teóricas da ideia de empresa que vimos expressa por Knight (82).

De certo modo detecta-se ao longo da «Theory of Econonúc Dynamics» um regresso a alguns dos principais pressupostos da Escola Clássica Inglesa. Com efeito a noção de empresário pUlO é totalmente subsituída pela de capitalista-activo. Tal como Knight também Kalecki enfatiza a importância da posse de capital: «Muitos econo­l1Ústas assumem ( ... ) um estado de democracia econÓl1Úca no qual todos os possuidores de habilidade empresarial podem obter capital para ilÚciar um negócio. Esta con­cepção das actividades do empresátio puro é, para não

(82) Embora Kalecki nllilca cite K.night. Mas tal não é de admirar visto que uma das características dos seus escritos é justamente a quase ausência de citações.

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dizer mais, irrealista. O mais importante requisito para se tornar empresário é a propriedade de capital» (83).

Como consequência teórica, o quadro gelaI da análise confina-se às rehções entre dois grupos fundamentais: capitalistas e trabalhadores. Quer dizer, estamos perante um esquema próxim do modelo ricardiano-marxista.

Igualmente resulta o pressuposto básico de que as empresas investem com recurso, essencialmente, ao capital acumulado resultante dos lucros anteriores (84). Mas o auto-financiamento do investimento não resulta apenas da acumulação no interior da empresa. Os lucros de outras unidades são c;'lnalizadas pelo sistema bancário que também ele cria possibilidades de crédito. Porém, neste ponto, Kalecki intlOduz uma importante limitação. O investi­mento ao depender dos lucros acumulados e do acesso ao mercado de capitais, fica limitado pela dimemão da empresa, mais concretamente, pelos capitais próprios (85). Deste modo, podem existir diferenças entre as firmas derivadas da diversa composição de capital próprio, acentuadas pelo facto de «empresas abaixo de uma certa dimensão não terem nenhuma espécie de acesso ao mercado de capital» (86).

Nas palavras de Arghiri Emmanuel o capital é «racio­nado» e não em venda livre (87) . Ao contrário do que sucede com os outros mercados a venda do capital não

(83) M. KALBCKI, Theory of Ecotlom;c Dynam;cs, Rinehart & Co., New York, 1954, 94-95. O sublinhado é de Kalecki.

(84) Uma das consequências é que «a taxa de juro não pode ser determinada pela procura e pela oferta de novo capital. .. t. Op. cit., 50.

(85) .There is, however, another factor which is of decisive importance in limiting the size of a flrm: the amount of the entrepre­neurial capital, i. e., the amount of capital owned by the firmt. Gp. cit., 91.

(86) Idem, 92. (87) ARGHIRI EMMANUBL, Le Profit et les Crises, Maspero, Paris,

1974, 313.

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depende apenas d eu preço. A venda de uma mercadoria u servi o e tá limitada pela plocura que por sua vez

d pende d preç de venda. Mas no mercado de capital é o seu uso que e transacciona. Por isso as duas partes permanec 111 ligada entre si dUlante um certo lapso de tempo. E sa ligaçã é essencial porque o mutuário não compr u valor d pr6pri capital e, portanto, tem de assegurar a sua re tituição. E te último elemento introduz uma condição suplementar para a entrada no mercado e que Kalecki tant acentuou. No caso concreto das empre­sas a ua capacidade de débit vai a par com o montante dos seus capitais. O raci namento consiste na distribuição do capital em fimção do capital já possufdo.

Nesta medida mercado do capital é «imperfeito» por defmição. E o corolári te6rico mais importante é a impossibilidade de uma perequação uniforme das tax;as.

Vejamos um exemplo. Na concepção tradicional do 111.ercado financeiro ou

de capitais, tudo se passa como em qualquer outro tipo de mercado. Por efeito das arbitragens os preços e as taxas tendem para a uniformidade. Assim se a taxa de rendimento do investimento (88) for superior à taxa de juro verifica-se um aumento da procura de meios de financiamento que provoca a subida da taxa de juro para um 11ível de

equilíbrio. Se tomarmos como dado a <cimperfeição» do mercado

de capitais, ou melhor dizendo, a sua especiflcidade, então tudo é diferente. O desejo de aumentar a parcela de capitais de empréstimo da empresa s6 se efectiva, ao nível do mercado, na medida em que os capitais pr6prios o per-

(S8) Não curando agora da sua determinabilidade.

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mitam. O efeito de «racionamento» impede agora a uniformidade (89).

uponhamos que n sector de produção A a relação entre capitais próprios e de empréstimo é de 2/1. Para calcular a taxa de lucro da empresa determina-se, em pri­meiro lugar, a taxa de rendimento da totalidade do capital investido (próprio e de empréstimo). Admita-se que é de 14% (90). Em seguida tem de deduzir-se do rendimento obtido com os capitais alheios a respectiva taxa de juro. Finalmente relaciona-se o montante global com os capitais próprios (91).

No sector B a relação de fundos próprios/emprés­timos é de 1/2. Neste caso, mesmo supondo uma taxa de rendimento sobre o capital total inferior, obtém-se, pelo método exposto, uma taxa de lucro empresarial maIs elevada.

Considere-se o seguinte exemplo numérico. No sector A a taxa de rendimento é de 14% .

O lucro da empre-sa vai depender da estrutura dos capitais. Sejam 2000 de capitais próprios e 1000 de empréstimo.

O lucro será: 140 (14% sobre 1000) + 280 (14% sobre 2000). Se a taxa de juro for de 8% tem de deduzir-se 80 (8% sobre 1000). O valor absoluto é de 340. A taxa de lucro é então de 17% (340 referidos aos capitais próprios).

No sector B a estrutura é de 2/1, i. é, 2000 de capitais de empréstimo e 1000 de próprios. Se a taxa global for de 12% a taxa de lucro da empresa situa-se nos 20%.

A diferente remuneração dos capitais provoca a trans­ferência do sector menos lucrativo para o mais lucrativo

(89) Cf. op. cit., 316-317. (90) O exemplo, bc.-m como os valores numéricos, são tirados de

A. Emmanuel. (91) Cf. n/pra o medo como Marshall calcula a taxa de lucro.

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forçando variações de preços que equiliblam as respectivas taxa de lucr . Assim, para uma idêntica remuneração dos capitai~, a taxa de lucro global do sector B teria de ser

de 11 CYo. Quer ist dizer que él situação de equilíbrio implica

uma diversidade de taxas de lucro global sem que se dê uma igualização com a taxa de juro (92).

Podem então concluir que o problema da articula­ção entre a taxa de juro e a taxa de lucro s6 pode ser correctamente entendido alterando alguns dos pressupostos normalmente aceites na teoria econ6mica.

De certa forma trata-se de uma recuperação do modelo clássico no qual a associação do capitalista e do empresário era de regra. Simultaneamente ultrapassa-se essa visão ao considerar «o capitalista» integrado num complexo objectivo e economicamente mais determinante: a empresa. O aban­dono da perspectiva individual e atomista acarreta a desva­lorização te6rica da figura do empresário enquanto agente desprovido de elementos produtivos.

O equilíbrio económico geral de Walras ou o esquema proposto por Bohm-Bawerk, não necessitariam de recorrer à «fricção» como forma de obviar ao desaparecimento completo do elemento motivador da produção: o lucro de empresa. O aproveitamento das pistas lançadas por Marshall, Knight e Kalecki possibilitam uma reinterpretação tanto de Smith e Ricardo como de Walras e da corrente

neoclássica. A objectivação da análise económica, que no fundo

corresponde à minimização do utilitarismo individual que já Marshall propunha, está bem patente nas correntes actuais. Os neo-ricardianos acentuam esse aspecto ao elaborarem

(92) Cf. A. EMMANUEL, cit., 316. Quanto à oferta ver 317.

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«modelos produtivos» por contraposição aos «modelos de troca». Os equilíbrios neles requeridos passam sempre pela referência às unidades produtivas como polos essenciais do sistema, quer se trate das decisões de produção quer de agentes acumuladores.

No entanto esta visão pode, também ela, ser distor­çora. Assim, um autor como Sraffa, ao concentrar-se no chamado sector real - por contraposição ao monetário -acaba por não dar atenção às relações entre ambos. É certo que tal análise não está no âmbito das suas preocupações. Porém lança a hip6tese de a taxa de lucro do sistema ser fixada externamente pela taxa de juro (93). Embora se trate de uma simplificação, o resultado conduz ao princípio da identidade entre ambas. Também aqui, portanto, está aberto um espaço de investigação que poderá contribuir para uma maior aproximação do real destes modelos.

(93) SRAFFA, Produdiono o o, cito, 33.

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