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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
CAMILA DABROWSKI DE ARAÚJO MENDONÇA
A MONARQUIA ARAGONESA E OS INIMIGOS DA CRISTANDADE: DUAS IMAGENS DA ATUAÇÃO DE PEDRO II DE ARAGÃO NAS CRÔNICAS
MEDIEVAIS
CURITIBA 2011
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CAMILA DABROWSKI DE ARAÚJO MENDONÇA
A MONARQUIA ARAGONESA E OS INIMIGOS DA CRISTANDADE: DUAS IMAGENS DA ATUAÇÃO DE PEDRO II DE ARAGÃO NAS CRÔNICAS
MEDIEVAIS
Monografia apresentada à disciplina de Estágio Supervisionado em Pesquisa Histórica como requisito parcial à conclusão do Curso de História, Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Paraná.
Orientadora: Prof.ª Dra. Fátima Regina Fernandes
CURITIBA 2011
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AGRADECIMENTOS
Agradeço à Professora Fátima, que conduziu minha curiosidade do
Languedoc dos cátaros ao Aragão de Pedro, e que sempre me incentivou a ir mais
longe - chegando até Portugal - para compreender melhor a amplitude da nossa
pesquisa. Agradeço também ao Professor Renan pelas conversas inspiradoras.
Agradeço aos amigos do NEMED, sempre presentes ao longo de toda essa
empreitada, seja no desespero de fins de semestre, seja nas festinhas de
aniversário ou de fim de ano.
Agradeço à minha família, em especial aos meus pais, cujo incentivo e apoio
constantes foram fundamentais para que eu chegasse até aqui.
Agradeço também ao Diego, cuja calma e paciência foram fundamentais nos
momentos finais e angustiantes dessa jornada.
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"A mente que se abre a uma nova idéia
jamais voltará ao seu tamanho original"
Albert Einstein
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RESUMO
A batalha das Navas de Tolosa (1212) foi uma importante vitória cristã no processo de Reconquista Cristã na Península Ibérica, sendo comentada por diversos cronistas medievais. Três reis ibéricos tomaram parte nessa batalha, Afonso VIII de Castela (1158 – 1214), Sancho VII de Navarra (1194 – 1234) e Pedro II de Aragão (1196 – 1213). A imagem de cada rei, bem como a importância de suas ações para a vitória cristã, são apresentadas de formas distintas em cada fonte. Nosso objetivo é, portanto, analisar a construção da imagem do rei aragonês, Pedro II, que recebe o epíteto de “o Católico”. Em paralelo, percebemos a existência de ligações vassálicas entre Pedro II e nobres occitanos, caracterizando o projeto expansionista defendido pelo monarca aragonês. No espaço além dos Pirineus estava ocorrendo a Cruzada Albigense contra os hereges cátaros, mas os cruzados acabaram ameaçando os domínios dos vassalos de Pedro II, que parte com suas hostes em defesa dos nobres occitanos. O monarca aragonês tem sua imagem de “bom rei cristão” afetada, passando a ser visto como um defensor de hereges. O segundo objetivo de nossa pesquisa é demonstrar de que forma essa mudança aparece nas fontes. Para tanto, se faz necessária uma discussão sobre os conceitos de infiel e herege no imaginário medieval, já que o inimigo combatido nas Navas de Tolosa eram os muçulmanos, mas os vassalos do Midi francês foram associados à heresia cátara. Corroborando a perspectiva de diversos historiadores ibéricos, percebemos que a imagem do rei Pedro II de Aragão foi distorcida a partir de uma perspectiva religiosa para justificar interesses políticos advindos tanto do Papado, na figura do Papa Inocêncio III, quanto da Monarquia Francesa, na figura do cruzado Simon de Monfort. Palavras-chave: Monarquia Aragonesa; Reconquista Cristã; Cruzada Albigense
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ABSTRACT
The battle of Las Navas de Tolosa (1212) was an important Christian achievement in the process of the Reconquista in the Iberian Peninsula. It was commented by several medieval chroniclers. Three Iberian king took part in this battle, Afonso VII of Castile (1158-1214), Sancho VII of Navarre (1194-1234) and Peter II of Aragon (1196-1213). The image of each king, as well as the importance of their actions to the Christian victory are presented in distinct ways in each source. Our objective was, therefore, analyze the construction of the king Peter II's image, who receives the epithet "the Catholic". We also realized the existence of vassalic relations between Peter II and the Occitan nobility, characterizing the expansionist project defended by the aragonese monarch. In the territory beyond the Pyrenees the Albigensian Cruzade was taking place against the heretic cathars, but the crusades menaced the domains of Peter II's vassals. The Aragon king gathers his forces and marches to defend his vassals. This action is negatively interpreted, and his image as a good Christian is replaced by the image of a heretics defender. The second objective of our research was to demonstrate the way that this change appears in the historical sources. A discussion about the concepts of infidel and heretic in the medieval imaginary is needed to better comprehend the enemies fought in each battle. Corroborating several Iberian historian's perspectives, it was possible to realize that king Peter's image was distorted by a religious perspective to justify political interests, of both the Papacy and the French monarchy, represented by Innocent III and Simon of Montfort, respectively. Key-words: Aragonese monarchy; Iberian Reconquista; Albigensian Crusade.
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LISTA DE MAPAS
MAPA 1 - A Península Ibérica e a Reconquista ....................................................... 17
MAPA 2 - O Reino de Aragão e a região do Languedoc ......................................... 22
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SUMÁRIO
RESUMO .................................................................................................................... 5 ABSTRACT ................................................................................................................ 6 LISTA DE MAPAS ..................................................................................................... 7 1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 9 2 ARAGÃO E A DINASTIA DOS CONDE-REIS: O REINADO DE PEDRO II ........ 12 2.1 DENTRO DO REINO: AS TRAMAS PESSOAIS DO REI .................................. 13 2.2 UM REI GUERREIRO ........................................................................................ 15 2.2.1 A Reconquista Ibérica e a batalha das Navas de Tolosa (1212) .................... 16 2.2.2 A Cruzada Albigense e a batalha de Muret (1213) ......................................... 19 3 OS ESCRITOS SOBRE ARAGÃO E PEDRO II ................................................... 26 3.1 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ............................................................................... 26 3.2 FONTES HISTÓRICAS ...................................................................................... 29 3.2.1 Historia Albigensis ........................................................................................... 29 3.2.2 Livro dos Feitos do Rei D. Jaime I ................................................................... 30 3.2.3 Crónica del Rey en Pere e dels seus antecessors passats ............................ 31 4 AS CONSTRUÇÕES IMAGÉTICAS SOBRE PEDRO II DE ARAGÃO ............... 33 4.1 HISTORIA ALBIGENSIS .................................................................................... 33 4.2 LIVRO DOS FEITOS DO REI D. JAIME ............................................................ 38 4.3 CRÓNICA DEL REY EN PERE E DELS SEUS ANTECESSORS PASSATS ... 42 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 48 REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 52 ANEXOS .................................................................................................................. 55
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1 INTRODUÇÃO
Percebemos que no mundo todo há um importante debate sobre as Guerras
Santas ou Jihads promovidas pelos mais diversos grupos no passado e no presente,
inclusive fazendo um uso do passado, conscientemente construído, para legitimar
ações no presente. O presente trabalho se insere em tal debate, pois visa discutir de
que forma, no século XIII, esse pensamento foi utilizado religiosa e politicamente
contra inimigos internos e externos da Cristandade Ocidental.
Outra discussão relevante atualmente diz respeito a criação da União
Européia e de que forma a Idade Média tem sido revisitada em busca de elementos
que legitimem uma escolha política que privilegia algumas características
selecionadas no presente. Nesse sentido, tem-se buscado criar um passado
histórico comum à Europa caracterizado pelas dimensões cristã e franco-germânica,
evidenciando uma escolha política do presente, e que acaba por distorcer o
passado. Ao propormos uma visão distanciada, mas consciente, deste debate,
podemos contribuir para seu desenvolvimento. Ao relativizar questões políticas e
religiosas, de acordo com seu contexto específico, mantemos a cientificidade da
produção historiográfica.
De forma similar, ao buscarmos embasamento bibliográfico para o
desenvolvimento da pesquisa, nos deparamos, sobretudo na bibliografia espanhola
atual, com algumas questões que merecem destaque. A história política recente da
Espanha demonstra que a região da Catalunha, parte constituinte do reino de
Aragão no século XIII, sofreu com a ditadura franquista, sendo considerada uma
região autonomista. Essa percepção perpassa a bibliografia produzida sobre a
Espanha, inclusive sobre o período medieval, daí a necessidade de uma análise
consciente do risco de parcialidade desta bibliografia e relativizá-la ao utilizá-la em
nossa pesquisa.
Apesar de ser crescente o volume de estudos sobre história medieval no
Brasil, ainda há um vazio historiográfico sobre o reino de Aragão e sobre a Cruzada
Albigense. Propomos este trabalho como uma contribuição para a reflexão nacional
sobre a Idade Média européia, da qual também somos herdeiros. Estando
consciente dos debates historiográficos e das dificuldades encontradas na
bibliografia é possível realizar uma pesquisa que contribua para o debate.
10
Este trabalho foi realizado junto ao Núcleo de Estudos Mediterrânicos
(NEMED), que vem se consolidando como um importante centro de pesquisa e
discussão de História Antiga e Medieval no Brasil. Através de eventos e pesquisas, o
NEMED vem colaborando para a expansão de forma academicamente significativa
das reflexões brasileiras sobre a sociedade medieval européia.
O objeto de pesquisa é a Monarquia aragonesa, com foco no reinado de
Pedro II (1196-1213)1. Propomos a discussão da aparente contradição da imagem
de Pedro II que, seguindo seu projeto de hegemonia, atua tanto na Reconquista
Cristã quanto na Cruzada Albigense. A discussão dos conceitos de infiel e herético é
fundamental para entender essa dupla atuação de Pedro II em conflitos com
diferentes inimigos da Cristandade.
O rei Pedro II, após expressiva atuação na Batalha das Navas de Tolosa
(1212), recebe o epíteto de “o Católico”, tornando-se um exemplo de bom cristão por
ter auxiliado na luta contra os mouros na Reconquista Ibérica, que lhe era
diretamente relevante, pois envolvia o território de seu reino. Posteriormente, Pedro
II se envolve na Cruzada Albigense ao atuar na defesa dos direitos de seus vassalos
occitanos, atuação essa que resulta em sua morte em 1213 na batalha de Muret.
Para melhor entender o contexto no qual a Cruzada Albigense se insere,
utilizamos a proposta de Ribas para definir o conceito de Languedoc. Nesse sentido,
concordamos que o Languedoc pode ser entendido
menos como um território definido por critérios políticos e territoriais – mais especificamente, a região colocada sob a influência dos condes de Toulouse – e mais como uma parte integrante da complexa entidade cultural à qual podemos chamar de Occitânia, Midi ou simplesmente sul da França. Compreendendo outros domínios nobiliárquicos autônomos ou semi-autônomos, como o condado de Foix, e estabelecendo laços estreitos com o Mediterrâneo e com territórios ibéricos, especialmente Aragão e a Catalunha
2
Destacamos, portanto, o caráter sócio-cultural para definir esse espaço geográfico
que foi o palco da Cruzada Albigense.
1 Devido às diferenças de linhagem, na historiografia aragonesa esse monarca é conhecido como
Pedro II, enquanto a historiografia catalã se refere a ele como Pere I. Para evitar confusões, ao longo deste trabalho sempre utilizaremos o referencial aragonês, portanto, nos referindo a este monarca como Pedro II;. 2 RIBAS, André Akamine. Os Pobres e os Perfeitos: Dominicanos e Albigenses no Languedoc, 1206 –
1217. 65 p. Monografia (Graduação em História) – Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2003. p. 12.
11
Nosso objetivo principal foi discutir a aparente contradição entre duas
imagens criadas sobre o rei Pedro II, uma deles como defensor de vassalos
heréticos nos espaços transpirenáicos, e a outra como o rei cristão que luta com
sucesso e projeção político-militar contra os infiéis nos espaços peninsulares. A
partir dessa discussão, pudemos também perceber a mudança de eixo dos projetos
expansionistas aragoneses, que com Pedro II visavam à ampliação transpirenáica e,
posteriormente, com Jaime I se volta para a Península Ibérica e para ilhas
mediterrânicas.
* * *
No capítulo intitulado "Aragão e a dinastia dos conde-reis: o reinado de Pedro
II", apresentamos as origens dessa dinastia, desde a unificação do Reino de Aragão
com o Condado de Barcelona, com o foco voltado para o reinado de Pedro II e a
atuação do monarca dentro e fora de seu reino.
Em "Os escritos sobre Aragão e Pedro II", apresentamos um panorama geral
da bibliografia consultada para a realização deste trabalho, destacando a utilização
de obras nacionais e as dificuldades do trabalho com Aragão e a Cruzada Albigense
no Brasil. Também apresentamos as fontes utilizadas, inserindo-as em seu contexto
de produção.
Por fim, no capítulo "As construções imagéticas sobre Pedro II de Aragão"
realizamos a análise das fontes, indicando os elementos utilizados para caracterizar
o monarca aragonês. Ressaltamos algumas questões ligadas ao contexto de
produção da fonte como influentes para a sua redação, bem como as aproximações
e distanciamentos apresentadas pelas obras, de acordo com seus objetivos.
12
2 ARAGÃO E A DINASTIA DOS CONDE-REIS: O REINADO DE PEDRO II
A dinastia dos conde-reis, assim chamada em decorrência da união do
Condado de Barcelona com a Coroa de Aragão, teve seu início após o reinado de
Ramiro II, o Monge (1134 - 1137), monarca caracterizado por Aguado Bleye como
"inepto para el gobierno y para la guerra"3. Buscando proteção contra os avanços de
Afonso VII de Castela, o monarca aragonês dá sua filha Petronila em casamento a
Ramón Berenguer IV, conde de Barcelona.
Através deste matrimônio, a independência de Aragão frente à Castela é
assegurada. Após o casamento, em 1137, Ramiro II abdica do trono em favor de sua
filha, que passa a utilizar o título de rainha de Aragão. Seu marido, contudo, não
assume o título de rei, utilizando apenas o de príncipe de Aragão4. Desse
matrimônio nasce Afonso II, que, após a morte de seu pai, assume o trono de
Aragão com o título de rei de Aragão e conde de Barcelona, se consolidando como o
primeiro conde-rei.
O reinado de Afonso II se estendeu de 1162 a 1196, período no qual realizou
a anexação de dois territórios transpirenáicos, assumindo, além dos títulos que já
possuía, os de conde de Rosselion e marquês de Provença5. Visando estreitar o
relacionamento com o reino de Castela, Afonso II se casa com Sancha de Castela,
filha de Afonso VII. Desse matrimônio nasce Pedro II, que assume a Coroa de
Aragão e o Condado de Barcelona após a morte de seu pai. Os demais senhorios
conquistados por Afonso II são distribuídos entre seus outros filhos6.
O reinado de Pedro II foi marcado tanto por questões internas do reino de
Aragão, como seu casamento e o simbolismo em torno de sua coroação, quanto por
eventos externos ao reino, ligados ao processo de Reconquista Ibérica e à Cruzada
Albigense, nos quais o monarca aragonês se envolveu. Esses eventos delinearam
por um lado, a relação com a nobreza catalano-aragonesa, e por outro, a inserção
de Aragão no contexto da Cristandade Ocidental, bem como da construção da
imagem de Pedro II nos contextos ibéricos e occitanos.
3 AGUADO BLEYE, Pedro. Manual de Historia de España. Madrid: Espasa – Calpe, 195-. v. 1. p. 660.
4 Idem. Op. cit. p. 662.
5 Idem. Op. cit. p. 666.
6 Idem. Op. cit. p. 667.
13
2.1 DENTRO DO REINO: TRAMAS PESSOAIS DO REI
Uma das grandes questões levantadas em torno da figura de Pedro II de
Aragão diz respeito ao seu casamento com Maria de Montpellier, filha do conde
Guilherme de Montepellier e Eudóxia, filha do Imperador bizantino. É interessante
ressaltar que Eudóxia havia sido trazida de Constantinopla para casar-se com
Afonso II de Aragão, porém ao ser apresentada ao monarca, este já havia se casado
com Sancha de Castela. Estando a princesa bizantina hospedada na cidade de
Montpellier, o conde Guilherme insiste em casar-se com ela. Dessa união, nasceu
Maria, que em 1204 passou a ser rainha de Aragão através do matrimônio com
Pedro II7. Desta forma, o monarca aragonês assegurou o domínio sobre Montpellier.
Cabe ressaltar que esse domínio sobre Montpellier aumentava a influência
aragonesa no Languedoc. Além dos domínios herdados pelos outros filhos de
Afonso II, a Coroa Aragonesa tinha outros laços de parentesco com nobres da
região. A consolidação desses laços se deu, principalmente, pela via matrimonial.
Nesse sentido, o casamento de Pedro II com Maria de Montpellier pode ser inserido
nessa estratégia matrimonial utilizada por Aragão para aumentar sua influência no
Languedoc8.
Contudo, após o casamento, o monarca aragonês não passou a viver a vida
conjugal como era esperado, afastando-se de sua esposa e se relacionando com
outras mulheres. Esse comportamento do rei preocupou a nobreza de Aragão, já
que impedia a concepção de um herdeiro legítimo para o trono. Tanto Aguado
Bleye9 quanto LaFuente10 atribuem a Guillem de Alcalá, nobre aragonês, a iniciativa
de enganar o rei e fazê-lo encontrar-se com sua esposa.
O estratagema empregado visava aproveitar os encontros do rei com uma de
suas amantes. Quando o monarca se dirige aos seus aposentos para encontrá-la,
quem o estava esperando era a rainha, que não foi reconhecida por Pedro II. Mesmo
7 LAFUENTE, Modesto et al. Historia general de Espana: desde los tiempos primitivos hasta la muerte
de Fernando VII. Barcelona: Montaner y Simon, 1932. v. 3. p. 353. 8 ALVIRA CABRER, Martin. Guerra e ideología en la España medieval: Cultura y actitudes históricas
ante el giro de principios del siglos XIII -Batallas de Las Navas de Tolosa (1212) y Muret (1213). 1483 p. Tese (Doutorado em História) - Universidad Complutense de Madrid, Madrid, 2000. p. 705. 9 AGUADO BLEYE, P. Op. cit. p. 673.
10 LAFUENTE, M. Op. cit. p. 353.
14
não tendo resultado em uma aproximação definitiva do casal, naquela noite se deu a
concepção do herdeiro do trono, Jaime I, nascido em 120711.
Pedro II pleiteava junto ao Papa o divórcio, alegando que, uma vez que o
primeiro marido de sua esposa ainda vivia, seu casamento com ela não poderia ser
validado. Mesmo com o nascimento de seu herdeiro, o monarca aragonês não
abandonou seu pleito, decidido em favor de sua esposa após sua morte, em 121312.
Outra questão que também teve seu início em 1204, referente ao reinado de
Pedro II é a sua coroação em Roma. Nenhum de seus antecessores havia assumido
o trono com essa cerimônia13. Após ter realizado a viagem à Roma, Pedro II foi
coroado pelas mãos do próprio Papa. Diversos autores discutem a importância e o
simbolismo envolvidos nesse ato. Para Alvira Cabrer, "este momento es, sin duda,
uno de los más relevantes del reinado de Pedro el Católico por su importancia
simbólica y su trascendencia política"14. Nesse sentido, o autor indica uma ampla
gama de elementos que estariam ligados ao desejo do monarca de ser coroado em
Roma, " la sacralización del poder real para fortalecer la autoridad frente a vasallos y
enemigos externos; el visto bueno a la posesión catalano-aragonesa de Montpellier,
señorío vasallo de Roma; el apoyo papal a la conquista de Mallorca"15, mas destaca
que o principal interesse de Pedro II estava diretamente relacionado a situação
política do Languedoc. A interpretação apresentada por Aguado Bleye vai no mesmo
sentido16.
Devido aos interesses aragoneses e aos laços de parentesco com os nobres
da região, era importante para o monarca de Aragão assegurar sua influência, seja
ela político-vassálica, através dos matrimônios, ou através do elemento religioso,
com o apoio papal ao monarca. A coroação de Pedro II em Roma incluiu a
submissão do monarca como vassalo papal, o que significou, por um lado, colocar-
se a serviço do Papado, mas, por outro lado, colocar-se também sob sua proteção.
Desta forma, Pedro II garantiu, por exemplo, que somente poderia ser submetido à
pena de excomunhão pela autoridade papal17.
11
AGUADO BLEYE, P. Op. cit. p. 673; LAFUENTE, M. Op. cit. p. 353. 12
Segundo LaFuente, Maria de Montpellier havia sido casada com o conde de Cominges. LAFUENTE, M. Op. cit. p. 353-354. 13
LAFUENTE, M. Op. cit. p. 350. 14
ALVIRA CABRER, M. Op. cit. p. 736. 15
Idem. Loc. cit. 16
AGUADO BLEYE, P. Op. cit. p. 669-670. 17
Idem. Op. cit. p. 737.
15
A submissão vassálica ao Papa convergia com os interesses aragoneses de
"convertirse en el agente de la política antiherética de Roma en territorio occitano"18,
visando manter o controle sobre as ações bélicas que tomariam forma na região. Em
paralelo, o Papado, além de "ganar otro aliado en la cuestión imperial y
mediterránea, de consolidar su autoridad 'teocrática feudal' y de proseguir la política
de fortalecimiento de los reinos ibéricos" também tinha como "máximo interés
comprometer a la Corona de Aragón, primera fuerza político-militar 'occítana', en la
lucha contra la herejía"19. Nesse sentido, pode-se perceber uma convergência dos
interesses da monarquia aragonesa com os do Papado, já que ambas as instituições
se beneficiaram com essa aliança.
Além da submissão vassálica do monarca aragonês ao Papa, a coroação
envolveu também um alto custo para Aragão, uma vez que a viagem à Roma
demandou recursos e foi prometido o pagamento de um tributo ao Papado. Para
cobrir os custos da viagem, Pedro II instituiu um novo imposto, gerando a
insatisfação da nobreza do reino, que interpretou as ações no monarca como
arbitrárias, já que foram decisões tomadas sem a consulta ou o consentimento da
nobreza. Conforme o costume do reino, a nobreza entendia que o rei não tinha o
direito de dispor do reino daquela maneira; os nobres deveriam ser consultados a
respeito deste tipo de decisão. Segundo LaFuente, as pressões dos nobres de
Aragão fizeram com que o tributo ao Papado nunca fosse pago20.
2.2 UM REI GUERREIRO
As ações mais destacadas de Pedro II, durante seu reinado, se deram no
plano externo de seu reino. Sua importante participação na vitória cristã nas Navas
de Tolosa, aqui entendida como um episódio específico do grande processo de
Reconquista Ibérica, e sua fatídica participação na Cruzada Albigense, que o levou a
morte em Muret, são os grandes exemplos dessa atuação do monarca em territórios
além de seu próprio reino.
18
Idem. Op. cit. p. 736. 19
ALVIRA CABRER, M. Op. cit. p. 737. 20
LAFUENTE, M. Op. cit. p. 352.
16
2.2.1 A Reconquista Ibérica e a batalha das Navas de Tolosa (1212)
De acordo com Alvira Cabrer,
la gran batalla campal de 1212 forma parte del contexto de guerra continua en el que vivian las dos civilizaciones que ocupaban la Península Ibérica desde el siglo VIII. Es esta realidad de lucha constante entre la Cristiandad hispana y el Islam de Occidente -lo que llamamos comúnmente 'Reconquista'- la que conduce a Las Navas de Tolosa, un episodio más, aunque de primera magnitud, integrado en este enfrentamiento secular
21.
A Reconquista Ibérica, conduzida pelos reinos cristãos que se mantiveram na
porção mais ao Norte do território da Península, foi, portanto, um processo de luta
contra os muçulmanos que se estabeleceram nos territórios do Sul após a invasão
do século VII, decorrente da expansão dos muçulmanos a partir de seus domínios
no Norte da África.
No século XII ocorrem importantes mudanças nos domínios islâmicos. As
disputas entre os "imperios bereberes norteafricanos, almorávide y almohade,
detentadores del dominio político de al-Andalus desde la desintegración del Califato
cordobés"22, resultam na vitória da dinastia dos almôadas. Nesse sentido,
al declive almorávide en la Península sucede un breve resurgir de los llamados 'Segundos Reinos Taifas', rápidamente abortado desde mediados del siglo XII por los almohades, nuevos señores del Magreb. Ampliando la herencia política y territorial almorávide, los almohades reunificaron al-Andalus desde su llegada a la Península en 1146 y lo incorporaron a su gran imperio magrebí, convirtiéndolo en el escenario de una exaltada Yihad o guerra santa islámica contra los cristianos
23.
Assim, sob a nova dinastia dos almôadas, ocorre uma intensificação dos conflitos
com os reinos cristãos24.
Um marco que representa o aumento dos conflitos entre as forças
protagonistas da Reconquista ocorre em 1195: a batalha de Alarcos25. Essa batalha
resultou na derrota das hostes de Afonso VIII de Castela. Buscando vingança pela
21
ALVIRA CABRER, M. Op. cit. p. 103-104. 22
Idem. Op. cit. p. 104. 23
Idem. Loc. cit. 24
COSTA, Ricardo da. “Amor e Crime, Castigo e Redenção na Glória da Cruzada de Reconquista: Afonso VIII de Castela nas batalhas de Alarcos (1195) e Las Navas de Tolosa (1212)”. Disponível em: http://www.ricardocosta.com/pub/amor_crime.htm. Consulta em: 13 de Fevereiro de 2009. 25
Idem. Op. cit. p. 3.
17
derrota, o monarca castelhano reorganiza suas forças e passa a buscar apoio para a
realização de uma investida contra os domínios muçulmanos26. Uma das formas
encontradas pelo rei de Castela para reunir mais cristãos para sua vingança é o
pedido ao Papa para que este considere a Reconquista como uma Cruzada. Desta
forma, cavaleiros cristãos de outros reinos se juntariam às suas hostes visando obter
os benefícios oferecidos aos cruzados27. Assim sendo, os cruzados que realizassem
seus 40 dias de serviço sob a Cruz
obteriam a remissão plena dos pecados por meio da concessão da 'indulgência de Cruzada'; o estatuto de cruzado', mediante o qual todos os seus bens e suas famílias permaneceriam sob proteção apostólica durante a realização do voto; receberiam auxílio financeiro para a expedição e suspensão temporária de suas dívidas nas terras de origem
28.
MAPA 1 - A Península Ibérica e a Reconquista FONTE: http://www.apellidosygenealogia.com/apellidos_migrac2.htm. Consulta em: 18 de Outubro de 2009.
26
ALVIRA CABRER, M. Op. cit. p. 112. 27
COSTA, R. Op. cit.; LAFUENTE, M. Op. cit. p. 360; VARA THORBECK, Carlos. "Las Navas de Tolosa una batalla decidiva en la Historia de España". In: Anuario. Real Academia de Bellas Artes de San Telmo, Nº. 5, 2005, p. 70. 28
MACEDO, José Rivair. Heresias, Cruzada e Inquisição na França Medieval. Porto Alegre:
EDIPUCRS, 2000. p. 23.
18
Nesse sentido, Alvira Cabrer destaca que "la 'africanización' de al-Andalus, es
decir, la radicalización de la intolerancia religiosa hacia los no musulmanes por parte
de almorávides y, sobre todo, de almohades, ayudará a la penetración de esta idea
de Cruzada en la ideología de guerra tradicional -de Reconquista- de los hispano-
cristianos"29. Buscando se organizar frente à ameaça muçulmana, o ideal de
Cruzada passa a ser fortemente vinculado ao processo de Reconquista Ibérica.
Essa aproximação dos dois conceitos pode ser interpretada como um instrumento
utilizado por Afonso VIII de Castela para aumentar suas forças para a realização de
uma batalha contra os islâmicos.
Outra questão importante referente aos preparativos elaborados pelo rei de
Castela para a campanha contra o domínio almôada diz respeito aos reinos cristãos.
Nesse sentido Aguado Bleye destaca que "Afonso VII comenzó em 1206 a preparar
la gran campaña que pusiera término de tan grave amenaza [a expansão almôada].
Comenzó por poner-se em paz con los reyes cristianos peninsulares, para después
atraérselos y unir sus fuerzas a las castellanas en una empresa que interesaba por
igual a todos"30. Desta forma, o monarca castelhano buscou unir-se com todas as
forças da Cristandade para realizar sua investida e vingar-se da derrota em Alarcos.
Esses arranjos resultam na batalha das Navas de Tolosa, em 1212, também
chamada de batalha de Ubeda. Para Vara Thorbeck, "la batalla de las Navas de
Tolosa es, sin duda, una de las más importantes de la Reconquista"31. Essa
relevância se deve ao fato de ter sido uma grande vitória cristã sobre o "mayor
ejército que habían podido congregar jamás los orgullosos sectarios del Profeta"32.
Ainda que não tenha resultado na morte de Miramolim, como era chamado o líder
das forças islâmicas33, a vitória cristã nas Navas "sirvió para acelerar la disgregación
del imperio norteafricano e hizo possibles los avances de castellanos, leoneses y
portugueses hacia el Sur"34.
Abulafia destaca que as novas conquistas cristãs, posteriores a batalha das
Navas de Tolosa, foram possíveis graças ao enfraquecimento do poder central do
29
ALVIRA CABRER, M. Op. cit. p. 109-110. 30
AGUADO BLEYE, P. Op. cit. p. 643. 31
VARA THORBECK, C. Op. cit. p. 66. 32
LAFUENTE, M. Op. cit. p. 372. 33
COSTA, R. Op. cit. 34
MARTÍN, José-Luis. Historia de la Corona de Aragón. Madrid: Universidad Nacional de Educacíon a Distancia, 2002. p. 61
19
império dos almôadas. Nesse sentido, afima que "as Almohad power disintegrated in
Spain, where the movement had never struck very deep roots, autonomous Muslim
warlords carved out for themselves petty statelets, a new generation of taifa
kingdoms, loosely under Almohad lordship, but a far weaker challenge to Christian
Spain than the unitary empire based in Morocco had been"35.
Os principais personagens que tomaram parte na batalha foram os reis de
Castela, Afonso VIII, de Aragão, Pedro II e de Navarra, Sancho VII36. O'Shea
ressalta o destaque dado à participação de Pedro II na batalha, considerada como
decisiva na vitória cristã37. Além de ser uma importante vitória contra as forças
muçulmanas que pressionavam e ameaçavam a fronteira aragonesa, a vitória cristã
nas Navas significou a criação de uma reputação positiva para o monarca aragonês.
Para Abulafia, "in Spain his reputation stood high, and his joint stand with the
Castilians against the fundamentalist Almohads, at the battle of Las Navas de Tolosa
(1212) endeared him to the papacy"38. Pedro II, após as Navas de Tolosa, "brillaba
con el esplendor de paladín victorioso en la causa de Cristo"39, tornando-se um
modelo de bom cristão da Cristandade Ocidental.
2.2.2 A Cruzada Albigense e a batalha de Muret (1213)
A Cruzada Albigense foi uma luta contra a heresia cátara na região do
Languedoc, atualmente região Sul da França40. Foi conclamada e legitimada pelo
Papa Inocêncio III e realizada pelo rei Filipe Augusto e seus nobres vindos do que
constituía até então o reino da França. Ocorre oficialmente entre os anos de 1209 e
1229, porém, antes de seu início oficial já havia uma luta contra a heresia. Da
mesma forma, após seu final oficial, ainda há perseguições contra os heréticos na
região. Apesar da questão religiosa, pode-se observar que também existiam
interesses políticos, como a conquista de novos territórios.
35
ABULAFIA, David. “The rise of Aragon-Catalonia”. In: ABULAFIA, David (ed.). The new Cambridge Medieval History. Cambridge: Cambridge University Press, 1999. v. 5. p. 645. 36
COSTA, R. Op. cit. 37
O'SHEA, Stephen. A Heresia Perfeita: a vida e morte revolucionária dos cátaros na Idade Média. Rio de Janeiro: Record, 2005. p. 158. 38
ABULAFIA, D. Op. cit. p. 645. 39
WEISS, Juan Bta. Historia Universal. Barcelona: La Educacion, 1929-33. v. 6. p. 145. 40
Ver a definição adotada neste trabalho na Introdução.
20
A região do Languedoc apresenta características sócio-culturais muito
diferentes da região ao Norte, que era o reino da França41. Era uma região mais
urbanizada, mais comercial e mais rica42. A heresia perdurou na região por mais de
100 anos. A consolidação da fé cátara no Languedoc se deu em grande parte pela
necessidade do povo de um clero mais próximo. Os Perfeitos cátaros e seus hábitos
ascéticos (que os aproximavam da vida apostólica) pregavam justamente para essa
população, preenchendo as suas necessidades espirituais.
A utilização da denominação "albigense" tem recebido diversas críticas, uma
vez que esse termo indica tanto a generalização de toda a população da região
como herética43, mas também incluí diversas heresias em um mesmo conceito44. O
principal foco da Cruzada, contudo, foi a luta contra a heresia cátara. Sua doutrina
dualista é muito semelhante a de outros grupos heréticos. Pregavam um rígido
ascetismo, incluindo não comer carne e total abstinência sexual, já que entendiam
que o corpo é uma prisão material e má para o espírito, que é bom45. Alguns autores
chegam a afirmar que devido ao tipo de crença que defendia, o catarismo pode ser
considerada mais do que uma heresia, ele constituiria uma nova religião dentro da
Cristandade46.
Segundo a interpretação cátara das Escrituras o juramente era proibido. Para
Macedo, isso representava que "sua doutrina era abertamente contrária ao próprio
modus vivendi da sociedade na qual estiveram inseridos"47. Nesse mesmo sentido,
O 'Shea indica que, em uma sociedade baseada nos vínculos feudais, estabelecidos
através do juramento, uma doutrina como a cátara não poderia ser aceita 48.
As primeiras tentativas de combate às heresias que afloravam na região,
sendo o catarismo a principal delas, foram chamadas de "Cruzada Espiritual", pois
envolveu o envio de religiosos para, através do diálogo, tentar reconverter os
heréticos49. A pompa empregada pelos primeiros religiosos enviados era exatamente
41
Ver RIBAS, A. A. Op. cit. p. 12-13. 42
O’SHEA, S. Op. cit. p. 35-36. 43
ALVIRA CABRER, Martin. "Sobre la denominación albigenses en las fuentes hispanas del siglo XIII". Imago Temporis. Medium Aevum, 3, p. 438 - 449, 2009. 44
MACEDO, José Rivair. Heresias, Cruzada e Inquisição na França Medieval. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2000. p. 24-25. 45
MACEDO, J. R. Op. cit. p. 31; WEISS, J. B. Op. cit. p. 120-121; FALBEL, Nachman. Heresias Medievais. São Paulo: Perspectiva, 1976, p. 36-69. 46
MACEDO, J. R. Op. cit. p. 28-29. 47
Idem. Op. cit. p. 31. 48
O'SHEA. S. Op. cit. p. 47. 49
MACEDO, J. R. Op. cit. p, 32-33.
21
o que o povo via como negativo no clero e na religião oficial, tornando infrutífera sua
missão. Em um segundo momento da "Cruzada Espiritual", pregadores como Diego
e Domingos de Gusmão, passam a adotar a mesma estratégia dos Perfeitos para se
aproximar da população e pregar o catolicismo ortodoxo, defendido pelo Papado:
adotaram a pobreza apostólica. Francisco de Assis e Santo Antônio fizeram o
mesmo tipo de pregação. Domingos e Francisco serão os fundadores,
respectivamente, das Ordens Mendicantes dos Dominicanos e dos Franciscanos,
que concorreram com os Perfeitos na pregação para as camadas mais populares50.
Após a aproximação dos pregadores com a população, os enviados papais
retomam suas funções e Pedro de Castelnau vai para junto do conde Raimundo de
Toulouse. Após um desentendimento entre os dois, Pedro retorna para Roma,
porém, é assassinado no caminho. A culpa recai sobre o conde, que alega sua
inocência51. Como as conversações não deram resultado, o Papa convoca uma
Cruzada contra a região, mas os reis e o imperador não atendem. Filipe Augusto
apenas permite que alguns de seus barões fossem guerrear no Sul, mantendo suas
forças concentradas na porção mais ao Norte de seu território, onde travava uma
luta contra a Inglaterra52.
Essa apropriação do conceito de Cruzada, que até então era entendida como
a luta contra o infiel, permite que a Cruzada no Languedoc oferecesse todas as
vantagens de uma Cruzada realizada no Oriente, sem a desvantagem da longa
viagem53. Além disso, Macedo indica que os cruzados "teriam o direito de posse
sobre eventuais bens confiscados dos 'hereges'"54.
Em 1209, com o ataque das hostes cruzadas à cidade de Béziers, dá-se o
início oficial da Cruzada Albigense. Uma famosa frase é atribuída a Arnold Amaury,
líder dos cruzados neste momento, “matem todos. Deus saberá quem são os seus”.
Os cruzados cumpriram a ordem. Em uma manhã mataram toda a população da
cidade, estimada entre 15 e 20 mil pessoas, incluindo heréticos e católicos, sem
50
WEISS, J. B. Op. cit. p. 130-131. Para uma análise mais detalhada da atuação dos pregadores cristãos no Languedoc, ver RIBAS, A. A. Op. cit. p. 51-59. 51
O'SHEA. S. Op. cit. p. 85; HAMILTON, Bernard. “The Albigensian Crusade and heresy”. In: ABULAFIA, David (ed.). The new Cambridge Medieval History. Cambridge: Cambridge University Press, 1999. v. 5. p.165. 52
WEISS, J. B. Op. cit. p. 135. 53
Para mais detalhes sobre os benefícios concedidos aos cruzados, ver p. 17 do presente trabalho. 54
MACEDO, J. R. Op. cit. p. 23.
22
distinção. O massacre de Béziers permanece na memória da população do
Languedoc por muito tempo, aterrorizando heréticos e católicos durante anos55.
No desenvolvimento da Cruzada, o nobre Simon de Montfort começa a se
destacar como líder dos cruzados56. Apesar das atrocidades que cometeu, Montfort
é descrito por diversos cronistas da época como o cristão perfeito, possuidor de
todas as qualidades e virtudes desejadas em um homem na Idade Média. Era
religioso, fiel a sua mulher, corajoso, obediente, possuidor de boa composição física
e lutava contra a heresia que infestava o Ocidente57.
A medida que aumentava seus domínios, Simon de Montfort aumentava
também seu poder. Em 1212, decretou o fim da legislação sulista e a adoção das
práticas feudais do Norte, assim como estabeleceu que as filhas da nobreza do Sul
somente poderiam se casar com nobres do Norte, extinguindo, portanto, a
possibilidade de herdeiros sulistas e criando laços cada vez mais fortes com a
nobreza do Norte, através do controle da posse das terras58. Desta forma, começa a
se delinear o interesse não mais somente religioso de extinguir a heresia, mas
também político, de conquista de territórios.
MAPA 2 - O Reino de Aragão e a região do Languedoc FONTE: http://aveev.org/aveevwiki/ciaeewiki/index.php?title=El_Valle_de_Ar%C3%A1n_durante_la_Edad_Media_(I). Consulta em: 22 de Outubro de 2010.
55
WEISS, J. B. Op. cit. p. 137; MACEDO, J. R. Op. cit. p, 22; O'SHEA. S. Op. cit. p. 104-105. 56
WEISS, J. B. Op. cit. p. 137. 57
MEDEIROS, E. L. Op. cit. Cap. 4 "Simon de Montfort". 58
O'SHEA, S. Op. cit. p. 162.
23
Buscando a legitimação do domínio sobre os territórios conquistados, Simon
de Montfort oferece sua vassalagem ao Reino de Aragão, que após diversas
recusas, finalmente aceita a homenagem. Desta forma, juntamente com a
homenagem vassálica prestada por Montfort ao rei aragonês, o monarca concordou
em entregar seu filho e herdeiro, Jaime I, para ser criado pelo cruzado, bem como
ficou acordado o casamento entre Jaime e a filha de Montfort59.
Conforme o que foi dito anteriormente, Pedro II tinha laços vassálicos e
familiares com nobres occitanos. Além disso, desde o reinado de seu pai, uma
estratégia de consolidação da hegemonia aragonesa nos territórios transpirenáicos
foi delineada. Esse projeto de expansão pode ser entendido como decorrente da
"proximidad geográfica, su común pertenencia histórica a la Francia occidentalis
carolingia, una misma lejanía de la monarquía franca-francesa y la común prédica de
la convenientía como relación feudal, del Derecho Romano y de los dialectos de
Oc"60 existentes entre o Reino de Aragão e aquela região. Observados esses
elementos, o Languedoc era visto como um "espacio 'natural' de expansión"61.
Assim sendo, era do interesse de Pedro II manter-se como principal autoridade
feudal na região.
Visando conter os abusos dos cruzados e defender os interesses de seus
vassalos, Pedro II se utiliza de seu prestígio junto ao Papa e de sua reputação,
decorrente da vitória nas Navas de Tolosa, para interceder em favor dos nobres do
Languedoc62. Segundo Hamilton,
Peter II of Aragon was alarmed by Simon’s attacks on his Pyrenean vassals. On 16 July he had played a major role in a notable victory over the Moors at Las Navas de Tolosa, and he therefore stood high in the pope’s favour. Thus when he complained to Innocent III that de Montfort was using the crusade to forward his own interests at the expense of the crown of Aragon, the pope suspended recruitment during the winter of 1212–13
63.
Essa intervenção tinha como objetivo proteger os direitos a posse das terras dos
nobres occitanos, que estavam sendo espoliados pelos cruzados. Apesar da
59
WEISS, J. B. Op. cit. p. 142. 60
ALVIRA CABRER, M. Guerra e ideología en la España medieval... p. 704. 61
ALVIRA CABRER, M. Loc. cit. 62
O'SHEA, S. Op. cit. p. 159. 63
HAMILTON, B. Op. cit. 168.
24
suspensão da Cruzada, esta é retomada na seqüência, tornando ineficaz a tentativa
aragonesa de impedir as ações dos cruzados no Languedoc.
Nesse mesmo sentido, Abulafia afirma que
the arrival of northern crusaders under Simon de Montfort, charged to suppress heretics and their supporters, left Peter with an obligation, as he understood it, to defend those of his vassals who had been dispossessed; in intervening, his aim was not to support the Cathar heresy, which he detested, still less to challenge Pope Innocent III, who had crowned him king of Aragon in person in 1204
64.
Percebe-se, então, que Pedro II de Aragão, seguindo sua obrigação de senhor, se
coloca na defesa de seus vassalos. Após o insucesso da intervenção junto ao Papa,
o monarca reúne suas hostes catalano-aragonesas e, junto às forças tolosanas,
marcha contra os cruzados, em 1213.
Diante dessa ameaça, Simon de Montfort reúne as hostes cruzadas. Nas
proximidades de Muret ocorreu, então, a batalha que levou o mesmo nome. Apesar
da superioridade numérica dos cavaleiros occitanos, catalães e aragoneses, os
cruzados conseguiram uma grande vitória devido a sua melhor estratégia e
organização militar. A maior conquista da batalha foi a morte do rei Pedro II de
Aragão, o maior obstáculo à ação dos cruzados no Languedoc65.
Pode-se perceber que a batalha de Muret teve um profundo impacto nos
interesses e projetos aragoneses na região do Languedoc. Para Martín, "la derrota y
muerte de Pedro el Católico de Aragón en Muret (1213) obligó a los catalanes y
aragoneses a renunciar a su presencia en Occitania y buscar la expansión por los
dominios islámicos"66. Ainda que tenha mantido certa influência na região, a
presença aragonesa foi bastante reduzida depois de Muret.
Após a morte de Simon de Montfort, em 1218, seu filho, Amaury de Montfort,
herda seus domínios. Este, incapaz de lidar com suas posses, as passa para a
monarquia francesa, que legitimamente passa a dominar grande parte do
Languedoc67.
64
ABULAFIA, D. Op. cit. p. 645. 65
O'SHEA, S. Op. cit. p. 167-176; WEISS, J. B. Op. cit. p. 145-147; ALVIRA CABRER, M. Guerra e ideología en la España medieval... p. 683-1465. 66
MARTÍN, J. L. Op. cit. p. 61. 67
HAMILTON, B. Op. cit. 169-170.
25
Em 1229, é assinado o tratado de Paris, entre Raimundo VII de Toulouse e o
rei francês Luís IX, determinando o fim oficial da Cruzada68. Apesar do final da
Cruzada militar, a perseguição contra os heréticos cátaros continuou através do
trabalho da Inquisição. Nessa época, ocorrem muitas fogueiras, além do surgimento
de manuais de inquisitores, que descreviam como deveriam ocorrer os
interrogatórios para que a heresia fosse descoberta. A ação dos inquisitores,
diferentemente da Cruzada, se dava junto à população, que acabava encontrando
na traição de amigos, vizinhos e familiares, o único modo de salvação contra a ação
inquisitorial69.
68
HAMILTON, B. Op. cit. 170; MACEDO, J. R. Op. cit. p. 35. 69
O'SHEA, S. Op. cit. p. 221-280; HAMILTON, B. Op. cit. 174-175.
26
3 OS ESCRITOS SOBRE ARAGÃO E PEDRO II
3.1 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Para o desenvolvimento deste trabalho foi utilizada uma bibliografia ampla,
visando suprir necessidades distintas. Obras clássicas como as de LaFuente70 e
Weiss71 oferecem elementos para a construção dos contextos históricos do reino de
Aragão e da Península Ibérica de forma geral no século XIII. Aguado Bleye72
contribui nesse ponto, explorando especificamente o contexto do Reino de Aragão,
inclusive as fontes históricas que possibilitam o estudo dessa época. De acordo
como a perspectiva historiográfica vigente na época em que foram escritas, essas
obras apresentam os principais acontecimentos relativos aos reinos ibéricos
medievais, identificando, em grande parte, os monarcas e seus feitos. Foi possível
verificar que essas obras apresentam divisões de capítulos relativas a cada reino,
possibilitando leituras direcionadas ao reino de Aragão.
Além dos elementos presentes nas obras citadas anteriormente, para a
análise da Reconquista Cristã, o texto de Garcia Fitz73 foi fundamental. O autor
apresenta uma análise da historiografia a respeito desse movimento ibérico contra
os muçulmanos, indicando as principais interpretações e os autores que as
defendem.
Algumas análises mais recentes sobre a Monarquia Aragonesa são propostas
por Abulafia74, que analisa a expansão da coroa aragonesa no Mediterrâneo nos
reinados de Pedro II e de Jaime I, indicando as diferenças entre os expansionismos
de cada monarca: enquanto Pedro II voltou seus interesses para os territórios
transpirenáicos, Jaime I abandonou os planos de seu pai e se dedicou à conquista
das ilhas mediterrânicas, dominadas pelos muçulmanos. Consultamos também o
70
LAFUENTE, Modesto et al. Historia general de Espana: desde los tiempos primitivos hasta la muerte de Fernando VII. Barcelona: Montaner y Simon, 1932. v. 3 e 4. 71
WEISS, Juan Bta. Historia universal. Barcelona: La Educacion, 1929-33. v. 6. 72
AGUADO BLEYE, Pedro. Manual de Historia de España. Madrid: Espasa – Calpe, 195-. v. 1. 73
GARCÍA FITZ, Francisco. “La Reconquista: un estado de la cuestión”. Clio & Crimen, Revista del Centro de Historia del Crimen de Durango, n. 6, 2009. p. 142 – 215 74
ABULAFIA, David. “The rise of Aragon-Catalonia”. In: ABULAFIA, David (ed.). The new Cambridge Medieval History. Cambridge: Cambridge University Press, 1999. v. 5. p. 644 – 667.
27
artigo de Cingolani75, no qual são apresentadas algumas construções ideológicas,
com base na análise de fontes históricas, demonstrando a crescente consciência
dinástica dos condes de Barcelona. Nesse sentido são destacadas as preocupações
morais dos monarcas, bem como suas referências aos ancestrais.
As obras de Hamilton76, Campi77 e O’Shea78, oferecem o contexto específico
da Cruzada Albigense. O primeiro apresenta uma narrativa sucinta desde a
identificação da heresia cátara na região do Languedoc, passando pelos principais
acontecimentos da Cruzada até a participação da Inquisição na luta contra a
heresia. Campi, por sua vez, dedica sua obra à heresia cátara e à Cruzada,
realizando uma importante contribuição ao apresentar um grande número de mapas
que mostram tanto o deslocamento do movimento herético quanto as principais
movimentações dos cruzados e o desenvolvimento dos cercos e batalhas. O'Shea
apresenta uma narrativa mais extensa que abrange o mesmo período de Hamilton,
porém com maior detalhamento; sua análise inclui uma breve reflexão sobre as
interpretações ligadas ao catarismo na atualidade.
Apesar da escassa bibliografia nacional sobre o tema, algumas obras foram
fundamentais para a pesquisa, entre elas a de Hilário Franco Jr.79, na qual o tema
aparece de forma pouco desenvolvida, porém é relevante que a Cruzada Albigense
seja citada em uma obra sobre as Cruzadas, já que muitas vezes é desconsiderada
como parte desse movimento por se tratar de uma investida feita no Ocidente, não
no Oriente, ao qual comumente o termo é associado. Outra contribuição nacional ao
tema é a de Macedo80, bastante emblemática por se tratar de um dos poucos
trabalhos nacionais específicos sobre a temática da Cruzada Albigense. Nesta obra,
o autor apresenta um levantamento das principais correntes interpretativas
identificadas na historiografia francesa, bem como das principais fontes utilizadas na
pesquisa sobre a Cruzada Albigense. Macedo aponta as maiores dificuldades para o
pesquisador brasileiro trabalhar com esse tema, principalmente o difícil acesso a
75
CINGOLANI, Stefano Maria. “Seguir les vestíges dels antecessors”. Llinatge, reialesa i historiografia a Catalunya des de Ramon Berenger IV a Pere II (1131 – 1285). Anuario de Estudios Medievales, v.36, n.1, p. 201 – 240, enero/junio. 2006. 76
HAMILTON, Bernard. “The Albigensian Crusade and heresy”. In: ABULAFIA, David (ed.). The new Cambridge Medieval History. Cambridge: Cambridge University Press, 1999. v. 5. p. 164 – 181. 77
CAMPI, Jesús Mestre. Atlas de los Cátaros. Barcelona: Ediciones Península, 1997. 78
O’SHEA, Stephen. A Heresia Perfeita: a vida e morte revolucionária dos cátaros na Idade Média. Rio de Janeiro: Record, 2005. 79
FRANCO JÚNIOR, Hilário. As Cruzadas. São Paulo: Brasiliense, 1984. 80
MACEDO, José Rivair. Heresias, Cruzada e Inquisição na França Medieval. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2000.
28
essas fontes, porém, indica também as importantes contribuições que podem ser
feitas por historiadores estrangeiros. O foco principal da obra de Macedo é sua
análise sobre o movimento denominado faiditismo, cuja análise depende mais de
elementos jurídicos e políticos do que religiosos, indicando outras possibilidades de
análise de diversos elementos ligados à Cruzada sem natureza religiosa.
Outros trabalhos nacionais consultados foram desenvolvidos no âmbito do
NEMED/UFPR. Os trabalhos de conclusão de curso de Ribas81 e Medeiros82 foram
fundamentais para complementar o estudo sobre a Cruzada Albigense, oferecendo
análises mais atuais e apresentando uma visão distanciada da européia. O primeiro
apresenta uma perspectiva da situação anterior a Cruzada propriamente dita, isto é,
analisa a chamada Cruzada Espiritual, período no qual pregadores católicos, como
Domingos de Gusmão, foram ao Languedoc para tentar vencer a heresia cátara
através da palavra. Já o trabalho de Medeiros apresenta uma análise da Historia
Albigensis, uma das principais fontes utilizadas para o estudo da Cruzada,
destacando a construção feita pelo cronista da figura do cruzado Simon de Montfort.
Esse trabalho oferece também fundamentos para a discussão conceitual a respeito
de herético e infiel nas fontes históricas. Nesse sentido é interessante destacar a
consulta à obra de Falbel83, fundamental para a compreensão da heresia cátara e
suas principais características dogmáticas.
Um dos autores contemporâneos que mais tem desenvolvido pesquisas sobre
Pedro II de Aragão e sua importante atuação é Martin Alvira Cabrer. Dentre suas
obras, consultamos sua tese de doutorado84, a qual apresenta uma análise profunda
sobre as batalhas das Navas de Tolosa (1212) e de Muret (1213), oferecendo
inúmeras informações específicas tanto sobre as batalhas em si quanto sobre suas
motivações e personagens, bem como análises sobre a mentalidade do “homem
medieval”, de que maneira a guerra era vista na época e de que forma foi retratada
nas fontes. Consultamos também um artigo85 no qual o autor apresenta uma revisão
81
RIBAS, André Akamine. Os Pobres e os Perfeitos: Dominicanos e Albigenses no Languedoc, 1206 – 1217. 65 p. Monografia (Graduação em História) – Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2003. 82
MEDEIROS, Eduardo Luiz de. Simon de Montfort e a figura do Vassalo Perfeito na obra Historia Albigeoise, de Pierre des Vaux de Cernay. 51 p. Monografia (Graduação em História) – Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2006. 83
FALBEL, Nachman. Heresias Medievais. São Paulo: Perspectiva, 1976. 84
ALVIRA CABRER, Martin. Guerra e ideología en la España medieval: Cultura y actitudes históricas ante el giro de principios del siglos XIII -Batallas de Las Navas de Tolosa (1212) y Muret (1213). 1483 p. Tese (Doutorado em História) - Universidad Complutense de Madrid, Madrid, 2000. 85
ALVIRA CABRER, Martin. “La Cruzada contra los Albigenses: historia, historiografía y memoria”. Clio & Crimen, Revista del Centro de Historia del Crimen de Durango, n. 6, p. 110 – 141, 2009.
29
da historiografia a respeito da Cruzada Albigense, indicando as principais diferenças
na interpretação ibérica e francesa a respeito da atuação dos personagens
envolvidos. O terceiro texto86 de Alvira Cabrer que consultamos trata da utilização do
termo "albigenses" nas fontes ibéricas, verificando que a aproximação histórica e
cultural entre as populações catalano-aragonesas e occitanas se reflete nas
diferentes percepções expressas nas fontes.
3.2 FONTES HISTÓRICAS
3.2.1 Historia Albigensis
A Historia Albigensis87, uma das principais fontes utilizadas para o estudo da
Cruzada Albigense, foi escrita entre 1213 e 1218, pelo religioso francês Pierre des
Vaux-de-Cernay, testemunha ocular da Cruzada Albigense, já que acompanhou as
hostes francesas. A crônica, originalmente escrita em latim, é constituída de três
partes, sendo as duas primeiras dedicadas aos eventos ocorridos antes do início da
Cruzada, e a última parte – dividida em doze capítulos – dedicada aos eventos
relativos à Cruzada e seus desdobramentos finais. A edição utilizada foi a tradução
francesa de Pascal Guébin e Henri Maisonneuve, publicada em Paris em 1951.
Devido às suas vinculações familiares, religiosas e ideológicas, o discurso
apresentado por Pierre des Vaux-de-Cernay em sua obra pode ver entendido como
unilateral, uma vez que apresenta somente a perspectiva dos cruzados. Segundo
Macedo, o monge "em nenhum momento teve contato com os occitanos ou com o
campo oposto às tropas de que fazia parte"88. Assim sendo, sua visão era parcial e
atrelada aos interesses do grupo ao qual pertencia. Alvira Cabrer complementa essa
perspectiva ao afirmar que essa crônica se tornou um "instrumento al servicio de la
justificación de los orígenes, desarrollo y objetivos de la Cruzada por la vía de la
exaltación de sus líderes"89, sobretudo de Simon de Montfort.
Por ter estado presente ao longo de grande parte dos acontecimentos ligados
à Cruzada Albigense, Pierre consegue apresentar uma grande quantidade de
86
ALVIRA CABRER, Martin. "Sobre la denominación albigenses en las fuentes hispanas del siglo XIII". Imago Temporis. Medium Aevum, 3, p. 438 - 449, 2009. 87
VAUX-DES-CERNAY, Pierre. Historia Albigensis. [1218]. Paris: Librairie Philosophique J. Vrin, 1951. Doravante, o documento será mencionado em citação de acordo com as iniciais do autor: PVC. 88
MACEDO, J. R. Op. cit. p. 67. 89
ALVIRA CABRER, M. Guerra e ideología en la España medieval... p. 771.
30
informações bastante precisas. De forma complementar, seus vínculos pessoais
facilitaram a obtenção de outras informações, tornando sua obra um importante
instrumento de estudo sobre a Cruzada90. O relato torna-se ainda mais preciso em
decorrência da inclusão de diversos documentos, como textos oficiais do Papado e
cartas91. Assim sendo, a precisão do relato de Pierre, aliada ao fato de os cruzados
terem sido os "vencedores" da Cruzada, permitiu que a Historia Albigensis se
tornasse o principal documento de consulta sobre a Cruzada, tanto no período
medieval quanto para a historiografia moderna. Nesse sentido, Alvira Cabrer indica
que esta crônica foi base para "buena parte de las crónicas y anales de la Europa
del siglo XIII que recobieron la batallha de Muret"92. De forma complementar,
Macedo afirma que "tendo sido durante muito tempo o único testemunho de peso, as
informações da Historia Albigensis influenciaram demasiadamente os historiadores
modernos, modelando uma memória histórica parcial. Muito estudiosos herdaram e
transmitiram apenas a versão clerical deixada pelo monge"93.
3.2.2 Livro dos Feitos do Rei D. Jaime I
O Livro dos Feitos do Rei D. Jaime I pode ser considerado uma autobiografia
do rei aragonês Jaime I (1213-1276), filho de Pedro II, e foi ditada pelo rei para ser
escrita aproximadamente entre 1252 e 1274. Originalmente escrita em catalão, essa
crônica é a primeira das quatro grandes crônicas catalãs. Utilizamos a tradução feita
por Luciano Vianna e Ricardo Costa para o português, que consta apenas dos 30
primeiros capítulos94. A narrativa abarca todo o período de vida de Jaime I, do
casamento de seus pais até sua morte.
Esse trecho inicial apresenta a infância de Jaime e faz poucas menções à
realidade política na qual o novo monarca se encontrava após a morte de seu pai
em Muret. Alvira Cabrer destaca que elementos como "las relaciones con Francia y
los nobles occitanos, las injerencias pontificias en la politica occitana, el fracaso en
90
ALVIRA CABRER, M. Guerra e ideología en la España medieval... p. 773. 91
MACEDO, J. R. Op. cit. p. 69. 92
ALVIRA CABRER, M. Guerra e ideología en la España medieval... p. 774. 93
MACEDO, J. R. Op. cit. p. 71. 94
JAIME I. O Livro dos Feitos do rei D. Jaime [1272-1274]. Disponível em: http://www.ricardocosta.com/. Acesso em: 23 jun. 2009. Em 2010 foi feita a publicação da tradução integral pelo Instituto Brasileiro de Filosofia e Ciência “Raimundo Lúlio” (Ramon Lull).
31
sus aspiraciones al trono de Navarra o el reparto de la Corona a la muerte del
monarca"95 foram intencionalmente omitidas do texto oficial.
Ainda que nosso foco esteja nos capítulos iniciais, é interessante apontar que
Jaime I apresenta nessa crônica os seus feitos militares, com especial destaque à
conquista das ilhas Baleares. Nesse sentido, a mudança de eixo da política
expansionista aragonesa é delimitada. Ao mesmo tempo em que indica o insucesso
de seu pai no Languedoc, demonstra ser bem sucedido na conquista das ilhas
mediterrânicas, voltando-se para a luta de reconquista contra os muçulmanos96.
3.2.3 Crónica del Rey en Pere e dels seus antecessors passats
A Crónica del Rey en Pere e dels seus antecessors passats, escrita
aproximadamente em 1283 por Bernat Desclot tem como foco o reinado de Pedro III
de Aragão (1276-1285), mas aborda acontecimentos muito anteriores. Nesse
sentido, podemos dividir a obra em três grandes partes. Na primeira, constituída de
dez capítulos, trata de alguns acontecimentos até a morte de Pedro II em 1213; na
segunda parte, em sessenta e três capítulos, trata do reinado de Jaime I; por fim,
nos setenta e cinco capítulos da terceira parte, apresenta os feitos relativos ao
reinado do rei Pedro III. A edição utilizada foi a versão digital em catalão disponível
no site do Institut Joan Lluís Vives97.
Um aspecto interessante dessa crônica é a desproporção em relação aos
capítulos, dedicando a maior parte da obra ao seu patrocinador e partes cada vez
menores aos antecessores de Pedro III. Contudo, o autor seleciona feitos
específicos dos monarcas anteriores para inserir na parte inicial de sua crônica. Para
Cingolani, essa seleção está relacionada à crescente consciência dinástica
apresentada pelos conde-reis de Aragão98. Assim sendo, ao iniciar sua crônica com
os feitos de Ramon Berenguer IV, que uniu o Condado de Barcelona à Coroa
aragonesa, Desclot estaria exaltando a continuidade dinástica.
95
ALVIRA CABRER, M. Guerra e ideología en la España medieval... p. 780. 96
Idem. p. 781. 97
DESCLOT, Bernart. Crónica del Rey en Pere e dels seus antecessors passats.[1280?]. Disponível em: http://www.lluisvives.com/servlet/SirveObras/jlv/12142747518921506765213/index.htm. Acesso em: 15 fev. 2009. Doravante, o documento será mencionado em citação de acordo com as iniciais do autor: BD. 98
CINGOLANI, S. M. Op. cit. p. 207-210.
32
Nos capítulos iniciais, Desclot apresenta, entre outros, acontecimentos
ligados à união do Condado de Barcelona com a Coroa de Aragão, que ocorre sob o
governo de Ramón Berenguer IV, e os feitos do rei Pedro II na batalha das Navas de
Tolosa, chamada nesta fonte de batalha de Ubeda. O cronista apresenta também as
circunstâncias do nascimento de Jaime I, a cujo reinado se dedica após descrever a
morte de Pedro II na batalha de Muret.
33
4 AS CONSTRUÇÕES IMAGÉTICAS SOBRE PEDRO II DE ARAGÃO
A análise de fontes históricas distintas nos permite verificar de que forma as
imagens contrastantes do monarca aragonês Pedro II são construídas por autores
com objetivos diferentes. Por um lado, verificamos nas fontes aragonesas uma
exaltação da participação de Pedro na batalha de Muret, caracterizando-o como um
rei cruzado, cuja atuação permitiu aos outros reinos ibéricos obter sucesso em uma
investida coletiva contra os muçulmanos que ocupavam o Sul da Península Ibérica;
e, por outro lado, verificamos na crônica sobre a Cruzada Albigense que Pedro II é
incluído no grupo dos inimigos da Fé, não por ser considerado herético, mas por
defendê-los.
As crônicas aqui analisadas são posteriores aos acontecimentos nelas
narrados, principalmente no que diz respeito ao reinado e à atuação de Pedro II,
portanto é importante ter em mente que cada uma dessas fontes foi escrita de
acordo com interesses próprios de sua época, sendo o passado utilizado como uma
ferramenta para a construção de uma perceptiva ideal para o presente do escritor da
fonte.
Primeiramente, vamos analisar os argumentos apresentados na Historia
Albigensis, crônica de origem francesa sobre a Cruzada Albigense, e de que forma a
imagem de Pedro II como um mau cristão é consolidada. Em seguida, analisaremos
o Livro dos Feitos do rei D. Jaime e a Crónica del Rey en Pere e dels seus
antecessors passats, ambas de origem aragonesa, verificando de que forma uma
outra imagem de Pedro II é construída com base na descrição de outra de suas
ações militares.
4.1 HISTORIA ALBIGENSIS
Nesta crônica, escrita entre 1213 e 1218, Pierre des Vaux-de-Cernay narra a
perspectiva francesa dos acontecimentos ligados à Cruzada Albigense, desde seu
início, com o envio de pregadores para tentar erradicar a heresia cátara, até seu fim,
com os arranjos políticos que deram a soberania das terras conquistadas aos
franceses do Norte.
34
No que diz respeito às referências sobre a participação de Pedro II nesses
acontecimentos, podemos identificar dois momentos bastante distintos. No primeiro,
Pierre des Vaux-de-Cernay indica o papel de suserano do rei aragonês e de que
forma seus vassalos occitanos lhe pediram auxílio contra o avanço dos cruzados,
conforme pode ser percebido nos trechos abaixo
[...] Pierre-Roger, seigneur de Cabaret, Raymond, seigneur de Termes, Aimery, seigneur de Montréal et d'autres chevaliers qui résistaient à l'Eglise et à notre comte, demandèrent au roi d"Aragon qui était dans le pays de venir avec eux. ils le reconnaîtraient comme suzerain et lui livreraient toute la région
99.
Le roi d'Aragon, n'olions pas de le dire, suzerain de la majeure partie du comté de Foix, envoya de ses propres chevaliers pour tenir le château de Foix [...]
100.
Nesses dois trechos percebe-se claramente que o autor da crônica reconhece
a suserania de Pedro II de Aragão sobre as terras atacadas pelos cruzados no
Languedoc, bem como indica que os vassalos, quando ameaçados, pedem ajuda ao
seu senhor para que este, cumprindo seu papel, venha defendê-los.
Porém, no segundo momento às referências a atuação de Pedro II são em
tom de ameaça e repreensão, condenando sua atuação. Esse segundo momento se
inicia com a transcrição de duas cartas destinadas ao monarca aragonês, a primeira
do Arcebispo de Narbonne, e a segunda do Papa Inocêncio III. Em ambas as cartas,
podemos perceber a tentativa de dar um conselho ao rei, ainda que demonstrando
certo tom de ameaça.
O Arcebispo ressalta o perigo que Pedro II corre de se expor à excomunhão
ao se aliar aos hereges, bem como a gravidade da blasfêmia que o monarca
aragonês estaria cometendo ao defender os hereges e se colocar contra os
cruzados.
Nous avons appris non sans une grande émotion et d'amers regrets que les villes de Toulouse et de Montauban et d'autres terres encore qui pour le crime d'hérésie et d'autres nombreux et horribles forfaits ont été abandonnées à Satan, retranchées de la communion de notre sainte mère l'Eglise et exposées aux croisés de par l'autorité de Dieu dont le nom y était gravement blasphémé, vous avez décidé de les prendre sous votre
99
PVC. Op. cit. p. 63. 100
Idem. Op. cit. p. 81.
35
protection et sauvegarde pour les défendre contre l'armée du Christ et de l'Eglise
101.
Nous espérons que vous aurez soin pour vous et les vôtres de ne pas vous exposer à l'excommunication em vous acoquinant avec des excommuniés, de maudits hérétiques et leurs fauteurs
102.
Já a partir desta carta, se inicia a construção do cerne da argumentação de Pierre
des Vaux-de-Cernay, segundo a qual, mesmo sendo o senhor dos condes occitanos,
Pedro de Aragão não deveria defendê-los, pois eles haviam sido condenados pela
Igreja como heréticos. Desta forma, o autor da crônica deixa subentendido que,
neste caso, a autoridade da Igreja se coloca acima da fidelidade assumida pelos
laços de vassalagem, já que o senhor não deveria socorrer vassalos condenados
por heresia.
Na carta escrita por Inocêncio III, os mesmos alertas são dados, em um tom
bastante paternal, aconselhando o rei aragonês, porém, da mesma forma que o
Arcebispo, deixando latente as ameaças do que pode ser feito contra ele caso não
cumpra o que esta sendo sugerido pelo Pontífice
[...] si tu t'avisais d'agir autrement (ce que nous ne pouvons croire), outre l'indignation divine que tu provoquerais indubitablement par ta conduite, tu t'exposerais à un sérieux et irréparable dommage. [...] Si tu t'opposais à Dieu et à l'Eglise, spécialemet en matière de foi, avec l'intention de mettre obstacle à l'achèvement de notre sainte entreprise, la grandeus du péril qui te menacerait peut t'être révélée par des exemples anciens et mêmes récents
103.
Fica bastante clara a ameaça de excomunhão feita ao rei Pedro II caso ele continue
em sua posição de defender seus vassalos condenados por heresia e já
excomungados. Inocêncio faz uma outra ameaça ao afirmar que
[...] nous accorderons de nouvelles indulgences por encourager les coisés et les autres fidéles à se dresser pour extriper cette peste avec l'appui du Seigneur et à marcher au nom du Dieu des Armées contre ces personnages, contre ceux qui les cachent et les protègent, quels qu'ils sont plus dangereux que les hérétiques eux-mêmes
104.
101
PVC. Op. cit. p. 151. 102
Idem. Op. cit. p. 151. 103
Idem. Op. cit. p. 159-160. 104
Idem. Op. cit. p. 159.
36
Nesse sentido, percebemos nas palavras do Papa que não somente os heréticos
seriam perseguidos, mas também seus protetores, cuja ação é entendida como mais
perigosa do que a dos próprios heréticos. Analisando o documento como um todo,
pode-se entender que essas palavras se referem aos condes occitanos, já
excomungados, mas também ao monarca aragonês, que cada vez mais se coloca
como protetor de homens condenados pela Igreja. As palavras do Papa, portanto,
reforçam as outras ameaças e alertam Pedro II que sua posição política está criando
indisposição com a Santa Sé.
Ao longo das páginas em que transcreve essas cartas, Pierre des Vaux-de-
Cernay tece comentários sobre as atitudes de Pedro II, indicando que esse
monarca, além de ser "malicioso"105 e "pérfido"106, se utilizou de táticas traiçoeiras107
visando alcançar seus objetivos ímpios. O cronista, em diversos momentos,
descreve as tentativas do monarca aragonês de enfraquecer o espírito da
Cruzada108, principalmente através de pedidos para que as indulgências de Cruzada
fossem revogadas ou transferidas para a luta contra os infiéis na Península Ibérica,
como pode ser observado no trecho a seguir
[...] il importait donc au seigneur pape de révoquer l'indulgence qu'il avait accordée à ceux qui se croisaient contre les hérétiques et de transférer cette indulgence en vue de la guerre, soit contre les païens espagnols, soit pour l'aide à la terre sainte
109.
As últimas referências feitas na crônica à atuação de Pedro II de Aragão
dizem respeito, justamente, à batalha de Muret, na qual o monarca aragonês perece.
Tendo o dito monarca mantido sua posição, contrária à da Santa Sé e dos cruzados,
reúne uma hoste de aragoneses e occitanos para lutar contra os franceses vindos
no Norte. Nesse sentido"[...] le roi d'Aragon concentrait ses troupes pour envahir
orgueilleusement notre pays et en éliminer complètement les chavaliers du Christ"110
105
"[...] et, pour pallier un peu sa malice, il fit appel au Saint-Siège.", H. A., p. 151; e "Après ces réflexions sur la malice du roi [...].",PVC. Op. cit. p. 163. Grifos nosso. 106
"[...] quand le très perfide roi d'Aragon [...]", PVC. Op. cit. p. 160. Grifo nosso. 107
"[...] aussi recourut-il à une autre tactique détournée", PVC. Op. cit. p. 150; e "Aussi quand nos envoyés arrivèrent à la curie romaine, ils trouvèrent un peu de résistance de la part du seigneur pape que avait cru trop facilement aux allégations mensongères des messagers du roi d'Aragon [...]", PVC. Op. cit. p. 156. Grifos nossos. 108
"[...] le seigneur pape semblait révoquer l'indulgence qu'il avait accordé aux croisés contre les hérétiques et il fit répandre ces lettres dans la France du nord pour détourner les esprits de la croisade contre les hérétiques", PVC. Op. cit. p. 163. Grifo nosso. 109
PVC. Op. cit. p. 169 110
Idem. p. 171.
37
e "[...] nous avons entendu dire qu'il avait envoyé une grande partie de ses biens
pour solder des mercenaires afin d'aider les hérétiques et de combattre la
chrétienté"111.
Percebe-se claramente como, nesse momento, Pedro II passa a ser
considerado um inimigo da Cristandade, pois não somente incorreu no erro de
defender aqueles a quem a Igreja já havia condenado, mas marcha contra os
homens quem defendem a vontade divina.
Outro elemento começa a ser construído pelo cronista nesse momento e pode
ser percebido quando ele se utiliza da expressão "notre pays"112. Agora a terra em
questão não é mais de direito dos condes occitanos, mas sim de seus
conquistadores do Norte. Essa construção começa a ser esboçada quando o
cronista critica a ação de Pedro II de marchar contra os cruzados, já que ele
destruiria um grande progresso feito pelos cruzados depois de muitos anos de luta e
sangue derramado113, e se desenvolve na continuidade da narração.
Desta forma, ao marchar contra as hostes Cruzadas, Pedro II não só incorre
nos dois erros já citados, mas também estaria lutando por um direito que não mais
existe. Assim sendo, para Pierre des Vaux-de-Cernay, a investida de Pedro II era
com a intenção de "rendre aux hérétiques et de soumettre à sa suzeraineté toute la
terre qui avait été conquise par la grâce de Dieu et avec l'aide des croisés"114.
A construção da narrativa da Historia Albigensis leva o leitor a pensar que,
devido a persistência em vários erros graves, a morte de Pedro II na batalha de
Muret é, acima de tudo, um castigo divino, ainda que o cronista não explicite essa
afirmação.
Mesmo tendo um número superior de homens, o monarca aragonês teria
morrido porque "son grand orgueil l'avait pousée à se mettre dans cette deuxiéme
ligne, alors que les rois ont l'habitude de se mettre toujours dans la dernière"115. Em
outras palavras, a personalidade, as ações e o orgulho de Pedro II causaram a
derrota de suas hostes e também sua morte.
111
PVC. Op. cit. p. 172. 112
Idem. p. 171. 113
"Le méchant roi parlait ainsi, non qu'il fut touché des périls et des besoins de la sainte Eglise, mais parce qu'il voulait détruire et étouffer en un instant l'affaire du Christ contre les hérétiques, laquelle avait merveilleusement progressée depouis plusieurs années avec beaucoup de fatigues et de sang répandu". PVC. Op. cit. p. 169 114
PVC. Op. cit. p. 173. 115
Idem. p. 178.
38
De maneira geral, percebemos que a imagem criada por Pierre des Vaux-de-
Cernay sobre o rei Pedro II de Aragão se baseia, principalmente, na percepção de
que, nesta situação determinada, a palavra do Papa deveria prevalecer sobre os
laços de fidelidade decorrentes dos vínculos vassálicos. Ao serem excomungados,
os condes occitanos perderam seus direitos às terras e seus laços vassálicos foram
rompidos, já que eles deixaram de fazer parte da Cristandade.
Pedro II, ao desconsiderar os avisos e ameaças pontifícias e manter sua
posição de protetor e senhor desses homens, ainda reconhecendo e defendendo o
direito deles a posse das terras em questão, teria, indubitavelmente, incorrido em
grave erro. Para reforçar essa imagem negativa do monarca, o cronista demonstra
como, em diversos momentos, o rei de Aragão se portou como um homem traiçoeiro
e mentiroso, se utilizando de artimanhas para tentar alcançar seus objetivos ímpios.
Conforme o trabalho de Eduardo Medeiros116, podemos perceber claramente
que parte da construção dessa imagem negativa de Pedro II é feita também em
contraposição com a imagem positivada e santificada do conde Simon de Montfort.
Nesse sentido, ao realçar as virtudes cristãs do conde e silenciar sobre o rei, a
imagem do último se denigre ainda mais, através da omissão de informações.
4.2 LIVRO DOS FEITOS DO REI D. JAIME
Escrita aproximadamente entre 1252 e 1274, pode ser considerada uma
autobiografia do rei aragonês Jaime I (1213-1276), tendo sido ditada pelo próprio rei.
Originalmente escrita em catalão, essa crônica é a primeira das quatro grandes
crônicas catalãs.
Apesar de dedicar parte de sua crônica à descrição de sua infância, Jaime I
faz referência a seu pai em alguns poucos capítulos iniciais, dedicando-se muito
mais à exaltação da figura de sua mãe, Maria de Montpellier. É interessante
ressaltar que a linhagem que recebe maior destaque é a de sua mãe, não a de seu
pai. Pode-se entender que o monarca aragonês tenha tentado se distanciar da figura
de seu pai por questões políticas e, assim sendo, quando se refere a ele, o faz com
poucas palavras e muitas reservas.
116
MEDEIROS, E. L. Op. cit. Cap. 4 "Simon de Montfort".
39
Na primeira referência direta a Pedro II de Aragão, Jaime descreve de que
forma se deu sua concepção
Nosso pai, o rei Dom Pedro, não queria ver nossa mãe, a rainha. E sucedeu que uma vez o rei nosso pai estava em Lates, e a rainha em Miraval. Um rico-homem de nome Guilherme de Alcalá veio ao rei, e pediu-lhe tanto que o fez vir a Miraval, onde estava a rainha, nossa mãe. E aquela noite em que ambos estavam em Miraval quis Nosso Senhor que fôssemos engendrados
117.
Seu nascimento é descrito como um milagre, já que aconteceu por vontade divina.
Nesse momento, pode-se começar a perceber, ainda que sutilmente, a forma pela
qual Jaime indica que seu pai não era um perfeito cristão, nesse caso, por não
querer dormir com sua própria esposa. Mais a frente, Jaime indica que seu pai havia
sido enganado por alguns senhores, que se aproveitavam do gosto de Pedro II pelas
mulheres para conseguir benefícios junto ao rei
E como muitos sabiam que ele era um homem de mulheres, tomavam seu bom propósito e faziam-no mudar para o que eles queriam. Mas como essas novidades seriam longas de contar, não desejamos mais falar essas coisas impróprias que aconteceram
118.
Neste segundo trecho, verificamos que Jaime assume o comportamento indevido de
seu pai sem, contudo, se estender na questão.
Em contra posição, ao tecer uma descrição de Pedro II, Jaime escreve
Nosso pai, o rei Dom Pedro, foi o rei mais liberal que houve em Espanha, o mais cortês e o mais afável, pois dava tanto que suas rendas e terras cada vez valiam menos. E era um bom cavaleiro de armas, sem igual no mundo. Dos outros bons costumes que ele tinha não desejamos falar para não alongar o escrito
119.
De forma bastante semelhante, o monarca aragonês busca demonstrar que seu pai
era um homem valoroso sem se alongar em demasia na questão.
Tanto nas questões positivas quanto nas negativas, Jaime não cita exemplos
da atuação de seu pai, dando-lhe pouca importância na narrativa de sua infância. O
leitor é levado a pensar que, na infância de Jaime, Pedro teve pouca ou nenhuma
117
JAIME I. Op. cit. Cap. 5. 118
Idem. Op. cit. Cap. 8. 119
Idem. Op. cit. Cap. 6.
40
participação e que o filho criou vínculos fortes com sua mãe, já que se preocupa em
retratá-la de forma mais detida, bem como de identificar sua origem120 e alguns de
seus feitos milagrosos121.
Mantendo a forma sintética de sua narrativa sobre os primeiros anos de sua
infância, Jaime I passa a tratar dos acontecimentos ligados à Cruzada Albigense,
ainda que não faça qualquer referência direta à ela. Nesse sentido descreve como
passou a ter tutelado por Simon de Montfort
Passado o tempo de nosso nascimento, Dom Simon de Montfort, que tinha as terras de Carcassonne, de Bèziers e de Toulouse, que tinha ganhado do rei de França, quis ter o amor de nosso pai e pediu-lhe que nos entregasse a ele para que ele nos educasse. E ele confiou tanto nele e em seu amor que nos entregou a ele para nos nutrir. Quando nós estávamos em seu poder, as gentes daquelas terras que dissemos acima foram ao nosso pai e lhe disseram que ele podia ser senhor daquelas terras, se ele desejasse tomá-las ou protegê-las. E o rei Dom Pedro, nosso pai, que era liberal e piedoso, com a piedade que tomou deles disse que os ampararia. Mas eles o enganaram com belas palavras. De uma parte, lhe davam sua palavra, de outra, a negava com atos
122.
Percebemos que, intencionalmente, Jaime suprime as desavenças que existiram
entre seu pai e seu tutor, bem como a efetiva suserania de seu pai sobre as terras
em questão. Talvez visando atenuar o posicionamento de Pedro II na Cruzada
Albiegense123, Jaime constrói uma imagem bastante ingênua de seu pai.
Sem qualquer explicação sobre as causas que levaram a batalha de Muret,
Jaime indica que antes da batalha
ele [Pedro II] havia se deitado com uma senhora, a ponto de, segundo depois ouvimos dizer de seu reboster de nome Gil [...] e de outros que viram com seus próprios olhos, não poder estar de pé para ler o Evangelho, e teve que permanecer sentado em seu lugar enquanto liam para ele
124.
120
Jaime dedica os capítulos 2, 3 e 4 de sua crônica a descrição da linhagem de Maria de Montpellier e da consolidação de seus direitos como senhora de Montpellier. 121
"Da rainha Dona Maria, nossa mãe, desejamos dizer que se boa senhora havia no mundo era ela, tanto por temer e honrar a Deus quanto nos outros bons costumes que tinha. E poderíamos dizer ainda mais dela, mas diremos algo suficiente: ela é amada por todos os homens do mundo que conheceram seu comportamento. E Nosso Senhor a amou tanto e lhe deu tantas graças que ela é aclamada “rainha santa” por aqueles que estão em Roma, e “santa” por todo o mundo. Ela cura muitos doentes que bebem o vinho ou a água que brota da pedra próxima de seu túmulo. Ela jaz em Roma, na igreja de São Pedro, perto de Santa Petronila, que foi filha de São Pedro". JAIME I, Op. cit. Cap. 7. 122
JAIME I, Op. cit. Cap 8. 123
Conforme a versão "oficial", descrita na Historia Albigensis, de Pierre des Vaux-de-Cernay, discutida anteriormente. 124
JAIME I, Op. cit. Cap. 9.
41
Indica também que havia pouca organização nas hostes aragonesas ao afirmar que
"aqueles da parte do rei não souberam ordenar a batalha nem ir unidos, e cada rico-
homem feria por si e contra a natureza das armas"125. Conclui, por fim, que
[...] pelo mau ordenamento, pelo pecado que estava neles e pela falta de mercê dos que estavam dentro, eles foram vencidos na batalha. E aqui morreu nosso pai, pois assim tem ocorrido em nossa linhagem por todos os tempos, que nas batalhas que fizeram e que nós faremos se deve vencer ou morrer
126.
Jaime, desta forma, justifica a morte de seu pai tanto como um erro estratégico,
quanto um castigo divino em decorrência dos pecados por ele cometidos. Contudo,
Jaime também destaca o fato de seu pai ter morrido em batalha, indicando
novamente seu caráter guerreiro. Este é o único momento em que Jaime se
identifica com seu pai, apontando a virtude guerreira de sua linhagem.
Com a morte do rei, a nobreza de Aragão pede ao Papa Inocêncio III que
force Simon de Montfort a devolver Jaime para seu reino. Sobre essa questão,
descreve Jaime, "ele [o Papa] enviou cartas e mensageiros tão fortes ao conde
Simon que este teve que concordar em nos restituir aos nossos homens"127. Assim
sendo, Jaime retorna ao seu reino, encontrando-o com dificuldades financeiras, já
que Pedro II havia assumido muitas dívidas em nome da Coroa128.
Estas breves referências a figura paterna na crônica de Jaime são bastante
interessantes, pois sugerem que seus feitos posteriores não são em decorrência da
herança de seu pai, mas sim de seus próprios méritos. Ao se distanciar da figura de
Pedro II, Jaime pode se construir como um bom monarca e o faz sem estabelecer
uma contraposição com seu antecessor e pai, herdando somente a virtude guerreira
da dinastia aragonesa. Percebe-se que pai e filho são retratados praticamente como
estranhos e que Jaime considera que seu pai o utilizou como uma peça do jogo
político da monarquia ao entregá-lo para ser criado por Simon de Montfort.
125
JAIME I, Op. cit. Cap. 9. 126
Idem. Op. cit. Cap. 9. 127
Idem. Op. cit. Cap. 10. 128
"E toda a renda que nosso pai tinha em Aragão e em Catalunha estava penhorada, até aos judeus e sarracenos, e também as honras, que naquele tempo eram setecentas cavalarias; e nosso pai, o rei Dom Pedro, tinha dado ou vendido todas, exceto cento e trinta. Por isso, quando entramos em Monzón não tínhamos sequer do que comer para um dia, pois nossa terra estava destruída e penhorada!". JAIME I, Op. cit. Cap. 11.
42
Paralelamente, podemos inferir que, devido a proximidade temporal da escrita
da crônica com a morte de Pedro II em Muret, ainda era fundamental que Jaime se
distanciasse da figura de seu pai, retratado pela história oficial da Cruzada Albigense
como um inimigo da Cristandade. Desta forma, Jaime se distanciava também da
herança deixada por seu pai, maculada pela acusação de defensor de hereges.
Nesse sentido, ao levantar aspectos bons e ruins de Pedro II sem, contudo, se
aprofundar em nenhuma questão relativa a atuação de seu pai, Jaime reforça a idéia
de distanciamento entre pai e filho em benefício de sua própria realidade sócio-
política e de seus interesses.
4.3 CRÓNICA DEL REY EN PERE E DELS SEUS ANTECESSORS PASSATS
Das três fontes aqui analisadas, esta é a mais distante temporalmente dos
acontecimentos do reinado de Pedro II de Aragão, tendo sido escrita
aproximadamente em 1283, por Bernat Desclot. Seu objetivo principal é tratar do
reinado de Pedro III de Aragão, neto de Pedro II, e, para tal, destina uma pequena
parte de seus capítulos ao passado do Reino de Aragão. Nesse sentido, trata de
personagens como Ramón Berenguer IV e a efetiva união da Coroa de Aragão com
o Condado da Catalunha no reinado de Afonso II, pai de Pedro II. O cronista dedica
alguns capítulos especificamente a Pedro II e sua atuação na Batalha das Navas de
Tolosa bem como sua morte em Muret. A segunda parte da Crônica é dedicada ao
rei Jaime I e a terceira parte, a mais extensa de todas, ao reinado de Pedro III.
Dos três capítulos dedicados aos feitos de Pedro II, o primeiro trata
inteiramente do casamento de Pedro II com Maria de Montpellier e descreve
minuciosamente as circunstâncias da concepção de Jaime I. O segundo capítulo
trata sobre a ameaça consolidada por Miramolin, líder das forças muçulmanas, e de
que forma os reis cristãos de Castela, Aragão e Navarra formaram uma aliança
contra ele. Por fim, o terceiro capítulo trata da morte de Pedro II em Muret, sem
maiores detalhes sobre as circunstâncias que levaram à batalha.
No capítulo IV Desclot transcreve supostos diálogos entre os personagens e
atribuí à Maria de Montpellier a autoria do plano para enganar seu marido e fazê-lo
deitar-se com ela, visando a concepção de um herdeiro para o trono aragonês e
para o Condado de Montpellier.
43
Esdevench se quel rey estech lonch temps que no fo ab ella. E quant vench a cap de hun gran temps, lo rey fo en hun castell prop de Monpeller, e aqui ell amava lluna dona de gran linatge, e feu tant que la hac per amiga. E en aquell castell ell las feya venir a hun majordom seu qui era de Monpeller, lo qual era son privat de aytals coses; empero era bon hom e leal. E madona Na Maria de Monpeller sabe aço, e remes missatge a aquell majordom del rey que era son hom natural. E vench devant ella: «Amich, dix la dona, vos siats be vengut! Yo us he fet venir ara, per tal com vos sots mon natural e conech que sots hom leal e bo, e cell qui hom se pot fiar. Yom vull celar ab vos, e prech vos que, de ço que yo us dire, que vos mi ajudets. Vos sabets be quel rey es mon marit e no vol esser ab mi. Don yo son molt despagada, no per altra cosa, mas per tal com d'ell ne de mi no ha exit infant que fos hereu de Monpeller. Ara, yo se quel rey ha affer ab aytal dona, e que las fa venir en aytal castell, e vos sots ne son privat. Hon yo us prech que, quant vos la y dejats amenar, que vingats a mi privadament, e quem menets en la cambra en lloch d'ella, e yo colgarem al seu llit. E fets ho en tal guisa que no y haga llum; e digats al rey que la dona no ho vol, per tal que no sia coneguda. E yo he fe en Deu que en aquella nit concebre hun tal infant de que sera gran be e gran honor a tot son regne. -Madona, dix lo majordom, yo son aparellat de fer tot ço que vos me manets, e majorment coses que sien a honor de vos. E sapiats que, ço que vos deits ne m'havets manat, que yo ho aportare a acabament; mas he grand pahor que no vinga en ira del rey. -Amich, dix la dona, no us cal tembre; que yo ho fare en tal guisa que vos havrets mes de be e de honor que hanch no hagues null temps. -Madona, dix lo majordom, gran merces! Sapiats que yo fare tant ço que vos manets. E puix axi es, no ho tardem pus, e aparellats vos, quel rey ha empres que al vespre li amen aytal dona la qual vos sabets; e yo vendre a vos, e tot celadament amenar vos he al castell, e metre us en la cambra; e puix vos sapiats que fer. -Amich, dix la dona, bem plau ço que deits. Adonchs anats vos en, e pensats de vostre affer; e al vespre venits a mi»
129."
Nesse trecho, percebemos claramente que parte da Senhora de Montpellier a
idéia de fazer-se passar pela amante de seu marido para encontrar-se com ele.
Visando convencer um mordomo a colaborar com ela, Maria argumenta que seu
único interesse é que seja gerado um herdeiro para o senhorio de Montpellier.
Nesse sentido, a senhora afirma que esse filho será um bom homem, muito
honrado, justificando desta forma, seu ato.
Para iniciar a narração da história da concepção de Jaime, o cronista
apresenta brevemente a genealogia de Pedro II e de sua futura esposa, Maria de
Montpellier. Já na primeira referência ao monarca aragonês, o cronista o caracteriza
como "noble rey e bon cavaller e prous de armes"130 e, logo em seguida, ao
129
BD. Op. cit. Cap. IV. 130
Idem. Op. cit. Cap. IV.
44
descrever como os nobres de Montpellier escolheram o possível marido de sua
senhora, Desclot indica "que ell era hu dels pus alts reys del mon"131.
Em contrapartida ao destaque das qualidades do monarca, no parágrafo
seguinte, o cronista afirma que o rei passava pouco tempo com sua esposa e que
havia tomado como amante uma senhora, indicando sua infidelidade como um
elemento negativo da personalidade do monarca.
No capítulo V, Desclot descreve minuciosamente as ameaças e
movimentações de Miramolim, bem como as reações esboçadas pelos reis ibéricos
e, enfim, consolidadas na Batalha das Navas de Tolosa132. Neste momento,
percebemos dois elementos bastante importantes na construção da narrativa. Em
primeiro lugar, o cronista justifica sua afirmativa inicial, segundo a qual Pedro II seria
um bom cavaleiro, pois atribui a ele a elaboração da estratégia que permitiu a
grande vitória cristã contra as forças muçulmanas.
Quant lo rey d'Arago En Pere viu quel covenia esser en la reguarda, pensas en si mateix com ho poria fer que hagues la davantera e que no hagues la reguarda. E feu se venir hun honrat cavaller de Arago, e dix li tot lo que havia en cor de fer. «Vos, dix lo rey, darets civada ab jorn als vostres cavalls, e farets armar trecents cavallers e docents ballesters a cavall, e yo llivrarvos he bons adalils que saben be la terra els passos. Cavalcarets tant tota la nit tro siats pro de les tendes de Miramoli que sta en la reguarda, e aqui metets vos en aguayt, en tal manera que la ost dels Serrayns no us vegen. E quant vendra dema, que ab dos les osts seran mesclades e ajustades, e la nostra davantera ferra en la ost dels Serrayns, yo us fare hun senyal en aquell puig, e vos altres sempre exits del aguayt ab vostres senyeres esteses, e anats ferir en la reguarda molt ardidament. Els Serrayns pensar s'an que nos hagam esvaida la lur ost e que siam passats ultra tro a la reguarda; e desbaratar s'an, e fugiran. Mas guardat vos que de aquest fet no parlets ab null hom vivent, tro que siats en lo aguayt». [...] Quant la bandera quel rey d'Arago havia feta estar al puig d'amunt dit veu que les osts eren ensemps ajustades e que la batalla era gran, feu senyal als cavallers del aguayt del rey d'Arago que havia tramesos, que deguessen ferir en la reguarda. E aytantost aquells ixiren del aguayt ab llurs senyeres esteses, e anaren ferir en la reguarda de la ost dels Serrayns, hon era Miramoli. E feriren tant poderosament, que tota la squena de la reguarda hon era Miramoli romperen e amenaren a mal. Quant Miramoli e los altres Serrayns veren aço, cuydaren que aquells cavallers haguessen esvaida tota la ost, e que fossen passats per mig, e que llurs gents fossen desbaratades. E Miramoli comença de togir ab totes ses gents, e los crestians donaren al dos, encalsant e matant, tro a Ubeda, huna richa ciutat hon se recolliren los trenta milia. Mas Miramoli fogi, que nol pogueren aconseguir, car era be encavalcat. E los crestians asetiaren la
131
BD. Op. cit. Cap. IV. 132
Na fonte, a dita batalha é, posteriormente, referenciada como "Batalha de Ubeda" no título do Capítulo VI, porém, utilizamos a denominação mais comum na historiografia brasileira para nos referirmos a esta batalha.
45
ciutat e prengueren la per força; e moriren hi xixanta hun milia Serrayns, menys les fembres e les infants. E aço fo a 16 dies ans del mes de joliol, y en l'any de Nostre Senyor 1212
133.
A partir desta descrição, percebemos a importância da estratégia de Pedro II,
que ao deslocar um grupo de seus cavaleiros para realizarem um ataque pela
retaguarda das forças muçulmanas, permitiu a desarticulação das mesmas. Desta
forma foi possível que os cristãos, em menor número, vencessem as hostes de
Miramolim. Após o desfecho da batalha, os muçulmanos sobreviventes fugiram para
a cidade de Ubeda, onde foram sitiados e vencidos pelos cristãos. Miramolim
consegue escapar, porém sobre uma grande derrota, ficando bastante enfraquecido.
Desclot, se utiliza desse trecho para construir uma imagem bastante positiva
de Pedro II como grande vencedor da batalha das Navas de Tolosa. A importância
de sua participação inclusive ofusca a liderança exercida pelo rei de Castela nesta
empreitada. O cronista não faz nenhuma afirmação, porém, percebe-se uma
exaltação da figura do rei aragonês por seus feitos. Nesse sentido, apesar de
cometer algumas falhas como marido, Pedro II é caracterizado como um bom rei por
ser um bom guerreiro.
O segundo elemento que pode ser destacado nesse momento da narrativa é
a construção da Reconquista como um movimento de cunho cruzadístico. Desclot,
ao descrever a reação dos reis ibéricos frente às ameaças de Miramolin escreve
Quant lo rey de Castella els altres reys hagueren entes aquestes novelles, ajustaren se tots e hagueren llur consell, e trameteren llurs missatgers al apostoli e al rey de França e al rey de Anchlaterra, e per tota la crestiandat, com sabessen: que Miramoli de Marochs era passat en Spanya ab totes ses gents que null hom no podia saber lo nombre, e que havia manada batalla a tots los crestians del mon, e que li llivrassen la terra. Quant lo apostoli hac vistes e enteses les cartes quels missatgers li hagueren aportades, trames sos cardenals e sos legats per tota la crestiandat, que fessen assaber a les gents aquell fet, e quels fessen absolre de llurs peccats, per tal que y anassen
134.
Desclot indica que foi celebrada um união entre os reis ibéricos para fazer frente à
ameaça muçulmana, inclusive com a iniciativa de mandar mensageiros aos reis da
França e da Inglaterra, ao Papa e por toda a Cristandade, pedindo auxílio nesta
empreitada, entendida como um luta que deveria ser travada por todos os cristãos.
133
BD. Op. cit. Cap. V. 134
Idem. Op. cit. Cap. V.
46
Em resposta a esses pedidos, o Papa fez saber que aqueles que participassem
dessa empreitada ibérica seria agraciado com a remissão dos pecados. Nesse
momento, a Reconquista passa a se configurar como uma Cruzada dentro dos
territórios da Cristandade Ocidental135.
No último capítulo destinado ao reinado de Pedro II, Desclot descreve a morte
do monarca aragonês na batalha de Muret. Sem explicar a origem desse conflito, o
cronista indica apenas que é uma guerra entre franceses, liderados pelo conde
Simon de Montfort, e o conde de Toulouse, na qual Pedro II toma parte ao lado do
conde tolosano. Nesse momento Desclot também destaca as boas qualidades de
guerreiro do rei de Aragão. Em sua narrativa, o cronista catalão escreve
El rey era molt bon cavaller e coratjos e era molt be encavalcat; si quels altres cavallers no podien tant correr com ell; si quel rey fo molt avançat de tota sa companya; e consegui aquells que fogien, si quels fo molt prop. E aquells regiraren se e conegueren que aquest era lo rey. «Barons, dix lo comte [Simon de Montfort], aquest es lo rey quins encalsa, e es molt prop e coratjos, e nos no li podem scapar en altra guisa. Tornem a ell, que axi com axi som morts». E axi giraren se vers ell, e ell feri en ells. E el primer colp feri un cavaller frances ab la llança e abatel mort en terra. Puix veu que la llança no li valia res, tant era la presa quels Francesos li feyen; e mes ma a la spasa; e aqui fe de grans colps, si que ocis tres cavallers ab la spasa. E encara los seus cavallers no eren venguts. Sobre aço vengueren li ben deu cavallers justats; e anaren lo ferir, si quel abateren en terra, e aqui mori
136.
Assim sendo, a morte do rei de Aragão é atribuída a sua própria habilidade como
bom cavaleiro, ainda que houvesse cometido o erro de se distanciar de suas
próprias forças e acabar morrendo encurralado pelas hostes inimigas.
Algumas escolhas feitas por Desclot ao longo de sua narrativa são bastante
interessantes. Em primeiro lugar, destacamos a ênfase dada ao nascimento de
Jaime I, foco da segunda parte da Crônica, já que é o pai do Rei Pedro III, figura
central da obra. A posição desse capítulo em relação aos outros que tratam de
Pedro II coloca a vida desse monarca apenas como uma etapa necessária para que
o reinado de Jaime ocorresse. Nesse sentido, os principais feitos de Pedro II foram a
paternidade, a vitória nas Navas de Tolosa e sua morte em Muret, dando espaço
para o reinado de seu primogênito. Contudo, cabe destacar que Desclot escolhe se
135
Para mais detalhes sobre os benefícios concedidos aos cruzados, ver p. 17 do presente trabalho. 136
BD. Op. cit. Cap. VI.
47
referir a Pedro II, não dando o mesmo destaque a outros antecessores de Pedro III.
Essa escolha indica a relevância de Pedro II como um elemento fundamental para a
construção de uma identidade aragonesa e para a própria legitimação da dinastia.
Em segundo lugar, percebemos que na narrativa sobre a batalha de Muret, o
cronista, em nenhum momento, se refere as hostes francesas como "cruzados" nem
faz qualquer referência à Cruzada Albigense ou a existência de heresia. Desta
forma, o cronista não dá ao leitor qualquer informação sobre as motivações que
levaram à batalha de Muret, mantendo o distanciamento deste passado maculado
pelas acusações de defesa da heresia.
A terceira escolha feita pelo cronista catalão diz respeito à seleção dos
eventos narrados. Ao selecionar apenas as batalhas, sem inseri-las em um contexto
mais amplo, Desclot pode criar uma imagem de Pedro II como um bom e valoroso
guerreiro e, portanto, como um bom rei. Nesse sentido, não é necessário fazer
referências à heresia e à condenação a Pedro.
A distância temporal existente entre a escrita desta fonte e os acontecimentos
que o trecho em questão retrata, permite ao autor manipular o passado e construí-lo
de acordo com seus interesses. Assim, Desclot constrói uma imagem de Pedro II
como um bom rei, já que foi um bom guerreiro, vitorioso contra os muçulmanos,
defensor do espírito cruzadístico e valoroso contra os franceses, ainda que tenha
morrido na batalha. De acordo com a proposta de Cingolani137, a crônica de Desclot
se insere em um projeto de delineação de uma consciência dinástica da monarquia
aragonesa. Assim sendo, era fundamental para Pedro III, patrocinador da crônica,
reabilitar a imagem de seus antepassados, principalmente a de seu avô,
protagonista de diversos eventos de grande relevância, e cuja imagem havia sido
obscurecida pela acusação de proteção de hereges.
137
CINGOLANI, S. M. Op. cit. p. 207-210.
48
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A questão principal que pode ser identificada a partir desta pesquisa diz
respeito à construção da imagem do rei aragonês como um bom rei cristão, em
situações que dizem respeito a sua participação na batalha das Navas de Tolosa, e
como um defensor de heréticos, quando se trata de sua atuação visando defender
os interesses dos nobres occitanos contra o avanço dos cruzados franceses.
Pudemos observar que nas fontes catalano-aragonesas, os autores optam por
destacar elementos da personalidade de Pedro II e de suas habilidades como
guerreiro, enquanto na fonte francesa o destaque é para a atuação do monarca, no
sentido de defesa dos vassalos occitanos, era percebida como equivocada.
Essa atuação de Pedro II de Aragão em dois contextos diferentes, a
Reconquista Ibérica e a Cruzada Albigense, indicam a expressividade do poder e a
importância desse monarca dentro da Cristandade Ocidental. Porém, mesmo os dois
processos sendo baseados no ideal de Cruzada contra os inimigos da Cristandade,
no espaço ibérico Pedro II lutou e foi vitorioso contra o infiel e no espaço occitano o
monarca teria se aliado ao inimigo da fé cristã. Esse é o argumento defendido pelos
cronistas patrocinados pela aliança franco-papal que conduziu a Cruzada. Já do
ponto de vista aragonês, Pedro II estava agindo de acordo com as leis vassálicas:
seus vassalos occitanos estavam sendo assediados injustamente pelos cruzados e
era seu dever como senhor interceder em seu favor.
Percebemos também uma clara distinção entre os dois inimigos da
Cristandade, o herético e o infiel. Apesar de ambos os conceitos se referirem a um
problema religioso e a um inimigo que deve ser combatido, a origem do problema
que os envolve é distinta. O infiel é o mouro, que nos espaços ibéricos representa o
invasor. Nesse sentido, o infiel é um elemento externo a sociedade cristã, que deve
ser vencido já que não acredita na verdadeira fé e foi criado fora dela. Por outro
lado, o herético é um inimigo interno à Cristandade e é um problema que pode ser
considerado mais grave do que o infiel, já que é um cristão que desvirtua sua fé.
Tendo que ser combatido no seio da Cristandade, o herege deveria ser reconduzido
ao caminho de Deus, ao passo que o infiel deveria ser conduzido, isto é, convertido
ao Cristianismo. Pode-se dizer ainda que o infiel incorre em erro por desconhecer a
verdadeira fé, enquanto o do herege é pior, já que incorre em erro por questioná-la.
49
Talvez em decorrência dessa percepção, a atuação de Pedro II como um suposto
defensor de heréticos tenha sobrepujado sua imagem de modelo de rei cristão, tanto
na percepção da época, conforme observado nas fontes, quanto na historiografia
tradicional, muito influenciada pelo relato apresentado nas fontes.
É preciso deixar claro que nem Pedro II nem os nobres que eram seus
vassalos praticavam a heresia. Nas terras desses nobres havia grupos de hereges,
perseguidos pelos cruzados, mas os nobres em si não aderiram a heresia, portanto,
as ações tomadas contra eles, como a invasão e a tomada de terras, eram injustas e
infundadas. Ainda que as ações de Pedro II fossem coerentes com a lei e com sua
posição de senhor, elas confrontavam os interesses da Coroa francesa, que por sua
vez era apoiada pelo Papado. Na análise das fontes foi possível perceber que o
próprio Papado fazia, de certa forma, essa distinção, porém decidiu apoiar a
Cruzada, em detrimento do interesse aragonês.
Também pudemos observar que tanto na fonte catalano-aragonesa quanto na
francesa, os cronistas constroem um ideário cruzadístico em torno da empreitada a
qual são ligados. Ao longo de toda sua obra, Pierre des Vaux-de-Cernay indica
elementos que justificam a Cruzada Albigense enquanto uma empreitada em nome
de Deus e em conformidade com os interesses do Papado. Nesse sentido o aval do
Papa é um dos principais argumentos. O uso de palavras atribuídas a Inocêncio III
em uma carta enviada ao rei de Aragão reforça a argumentação do cronista. Nesse
sentido as palavras do Papa ao monarca advertindo-o de seu erro em lutar contra a
guerra santa evidenciam a construção do ideário de Cruzada vinculado à ação
militar francesa no Languedoc.
Paralelamente, nas fontes catalano-aragonesas uma construção parecida é
desenvolvida em relação a batalha das Navas de Tolosa e a Reconquista Ibérica,
inserindo-as no contexto das Cruzadas. Ao buscar o apoio de outros monarcas e do
próprio Papado, os monarcas ibéricos visavam legitimar sua empreitada contra os
mouros e transformá-la em uma batalha que deveria ser lutada por toda a
Cristandade. O destaque dado à figura de Pedro II nas fontes indica sua importância
na história de Aragão. Pode-se compreender que esse monarca é um dos eixos da
monarquia aragonesa, bem como da unidade da Coroa de Aragão com o condado
da Catalunha.
Apesar da utilização do termo "catalano-aragonês", que indica a existência de
diferenças entre essas duas realidades, Pedro II consegue articular essa entidade
50
monárquica, utilizando-se de ambas as forças em conjunto. Nesse sentido, a
presença de sua figura se tornou indispensável em obras que visavam construir e/ou
reforçar a legitimidade da dinastia dos conde-reis de Aragão e da Catalunha.
Nas obras clássicas a respeito do Reino de Aragão e da batalha das Navas
de Tolosa, entendida como parte do processo de Reconquista, a discussão a
respeito da construção da imagem dos reis ibéricos em suas crônicas não aparece,
indicando que essa é uma discussão mais recente. Em textos do autor espanhol
Martin Alvira Cabrer138, podemos perceber a preocupação com a necessidade de
buscar nas crônicas medievais elementos que vão além dos dados factuais. Nesse
sentido, este autor apresenta em vários de seus trabalhos, análises a respeito da
construção da imagem de Pedro II de Aragão, tanto nas fontes quanto na
historiografia. Nosso trabalho seguiu esse mesmo sentido, buscando compreender
as construções presentes nas fontes e analisá-las dentro de seu contexto próprio e
de acordo com as necessidades de sua época. Vamos no mesmo sentido de
diversos trabalhos apresentados por Alvira Cabrer, verificando, da mesma forma,
que as construções imagéticas a respeito do rei aragonês Pedro II se modificam
conforme o interesse do cronista, e principalmente de seu patrocinador.
Em um âmbito mais amplo, pensando em termos da Reconquista Ibérica de
forma geral, percebemos nas fontes um forte apelo à religiosidade, sobretudo no que
diz respeito à construção do ideal de Cruzada, mas também na presença de
elementos que indicam a ação de Deus no cotidiano do homem medieval. Se por um
lado o homem cristão deveria lutar contra o infiel – ou contra o herético -, seguindo o
ideal de Cruzada, por outro era necessário agradar a Deus através de ritos como
missas, confissões e bênçãos, para que Ele levasse Seus exércitos à vitória. Esses
elementos são discutidos por Garcia Fitz139, que analisando o processo da
Reconquista de forma geral, aponta a construção desses elementos como parte da
mentalidade ibérica medieval.
Ainda outro elemento ligado à mentalidade do homem medieval diz respeito a
proximidade entre religiosidade e política. Percebemos que muitos dos ritos
políticos, como a criação de laços de vassalagem e a própria coroação de um rei,
envolviam a participação de homens da Igreja. A percepção desse elemento
138
Ver ALVIRA CABRER, M. Guerra e ideología en la España medieval....; ALVIRA CABRER, M. “La Cruzada contra los Albigenses: historia, historiografía y memoria”... 139
GARCÍA FITZ, F. Op. cit.
51
possibilita a compreensão da relativa facilidade encontrada pelos cronistas ao criar
uma imagem religiosa negativa a partir da ação politicamente correta de Pedro II de
Aragão.
52
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55
ANEXO A - CRONOLOGIA DO REINADO DE PEDRO II
1196 - Assume como rei de Aragão e conde de Barcelona
1204 - Casamento com Maria de Montpellier
- Coroação pelo Papa, em Roma
1206 - Episódio da concepção de Jaime
1207 - Nascimento de Jaime I, herdeiro do trono
1212 - Vitória na batalha das Navas de Tolosa
1213 - Perece na batalha de Muret
56
ANEXO B - ÁRVORE GENEALÓGICA DE ARAGÃO E CASTELA
Ramon Berenger IV (1137-1162)
Petronila de
Aragão
Afonso VII de Castela
(1126-1157)
Afonso II de
Aragão (1162-1196)
Sancha de
Castela
Afonso VIII de Castela
(1157-1214)
Pedro II de
Aragão (1196-1213)
Maria de
Montpellier Leonor de Castela
Jaime I de Aragão
(1213-1276)
nome - refere-se a um membro na nobreza do reino de Aragão
nome - refere-se a um membro na nobreza do reino de Castela