a marca diálogo (2)

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1 A Marca no Grau de Mestre de Marca, sob a visão de dois mestres de marca Elaborado pelos IIr.∙. Jorge Eduardo de Lima Siqueira e Marcus Vinícius Neves Gomes Verão de 2012/2013 MVM Queridos CComp.∙., foi enviado por dois obreiros, através do M.∙. Sup.∙. que os assistia nas pedreiras do Rei Salomão, pedra que “não é oblonga, nem está no esquadro”, necessitando portanto ser analisada em seu comprimento, largura e circunferência, para a que a construção do Templo se complete com a perfeição exigida por nosso “Querido M.∙.”. Após as meditações que o descanso nos consagrou peço sua ajuda para que façamos as devidas conferências. Ir. 1° Sup., o que significa “marca”? 1° Sup. MVM, uma marca pode ser visualizada sobre aspectos distintos. Pode ser vista como sinal (exotérica) ou como signo/símbolo (esotérica). Como sinal serve para que se reconheça uma coisa, forma de distinção entre coisas, ou seja, um traço distintivo. Como símbolo serve para como uma representação concreta de algo ausente ou abstrato. Nesse aspecto a “marca” numa visão exotérica é um “sinal que faz parte do mundo físico do ser e a relação dos sinais com a realidade é meramente artificial ou convencional” já numa visão esotérica a “marca” como um símbolo “está na melhor forma de formulação possível, sendo um campo intermediário entre o espírito e a matéria”. Faz-nos “transcender a posição do sujeito e objeto, a livre espontaneidade da mente e a passividade dos sentidos, colocando-nos, agora, de uma forma recíproca e com uma correlação entre as coisas do mundo e o espírito1 . De modo especial, signo é aquilo que tem valor evocativo, místico ou iniciático. MVM Como a marca foi utilizada no curso da história, Ir. 2° Sup.? 2° Sup. No processo de evolução histórica as marcas foram utilizadas em diversos momentos. No tempo dos Césares os escravos eram marcados como se fossem gado 2 . Na idade média, criminosos eram mutilados, marcados com sinais e tatuados, a fim de que, fossem identificados 1 Moura, Marinaide Ramos. O Simbólico Em Cassirer. <Disponível em: http://www.uefs.br/nef/marinaide5.pdf> 2 Hans, Marcos. Qual É Sua Marca? <Disponível em: http://www.realarco.org.br/joomla/index.php?option= com_content&view=article&id=35&Itemid=30>

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Page 1: A marca   diálogo (2)

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A Marca no Grau de Mestre de Marca, sob a visão de dois mestres de marca

Elaborado pelos IIr.∙. Jorge Eduardo de Lima Siqueira e Marcus Vinícius Neves Gomes

Verão de 2012/2013

MVM – Queridos CComp.∙., foi enviado por dois obreiros, através do M.∙. Sup.∙. que os assistia

nas pedreiras do Rei Salomão, pedra que “não é oblonga, nem está no esquadro”, necessitando

portanto ser analisada em seu comprimento, largura e circunferência, para a que a construção do

Templo se complete com a perfeição exigida por nosso “Querido M.∙.”. Após as meditações que

o descanso nos consagrou peço sua ajuda para que façamos as devidas conferências.

Ir. 1° Sup., o que significa “marca”?

1° Sup. – MVM, uma marca pode ser visualizada sobre aspectos distintos. Pode ser vista como

sinal (exotérica) ou como signo/símbolo (esotérica). Como sinal serve para que se reconheça

uma coisa, forma de distinção entre coisas, ou seja, um traço distintivo. Como símbolo serve

para como uma representação concreta de algo ausente ou abstrato. Nesse aspecto a “marca”

numa visão exotérica é um “sinal que faz parte do mundo físico do ser e a relação dos sinais

com a realidade é meramente artificial ou convencional” já numa visão esotérica a “marca”

como um símbolo “está na melhor forma de formulação possível, sendo um campo

intermediário entre o espírito e a matéria”. Faz-nos “transcender a posição do sujeito e objeto,

a livre espontaneidade da mente e a passividade dos sentidos, colocando-nos, agora, de uma

forma recíproca e com uma correlação entre as coisas do mundo e o espírito” 1

. De modo

especial, signo é aquilo que tem valor evocativo, místico ou iniciático.

MVM – Como a marca foi utilizada no curso da história, Ir. 2° Sup.?

2° Sup. – No processo de evolução histórica as marcas foram utilizadas em diversos momentos.

No tempo dos Césares os escravos eram marcados como se fossem gado2. Na idade média,

criminosos eram mutilados, marcados com sinais e tatuados, a fim de que, fossem identificados

1 Moura, Marinaide Ramos. O Simbólico Em Cassirer. <Disponível em: http://www.uefs.br/nef/marinaide5.pdf>

2 Hans, Marcos. Qual É Sua Marca? <Disponível em: http://www.realarco.org.br/joomla/index.php?option=

com_content&view=article&id=35&Itemid=30>

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como criminosos pelos demais cidadãos aquele ou de outro feudo. Portanto, naquela época as

marcas já eram utilizadas para mostrar qualidade e caráter.

Sobre a utilização de marcas na maçonaria operativa e na idade média, o Ir. M.∙. Sup.∙. terá

certamente maiores informações.

MVM – Ir. Mar. tenha a bondade de nos relatar como as marcas são utilizadas atualmente

em nosso cotidiano?

Ir. Mar. – Companhias, organizações, países, grupos usam suas marcas, logos, bandeiras para

identificar-se. Muitos reconhecem um país, produto ou organização não por uma sentença ou

palavra escrita, mas uma marca (sinais/símbolos). Nas olimpíadas, reconhecem-se os atletas por

suas bandeiras3. Os militares, por exemplo, têm orgulho de seus distintivos, que são marcas

(sinais/símbolos). Também conhecemos determinadas pessoas pelas suas marcas, como por

exemplo, Elvis Presley que até hoje é conhecido pelo seu topete e Sílvio Santos pelo bordão

“Quem quer dinheiro?!”.

E não somente como sinais distintivos as “marcas” são utilizadas em nosso cotidiano. Continuam

vivas as marcas como transmissoras dos significados mais profundos, por exemplo, a balança

utilizada pelo Judiciário, que transmite a ideia de justiça, e a cruz, elemento religioso da

cristandade, que representa a expiação dos pecados feita por Cristo em favor dos seus adeptos.

MVM – Ir. M. Sup., tenho notícias de que sabes narrar porque eram utilizadas marcas

para identificar maçons operativos. Se és portador desse conhecimento, pode nos

transmitir?

Ir. M. Sup. – MVM, me alegro em compartilhar com os companheiros de trabalho e inspeção

essas informações. Antes de qualquer coisa é preciso estabelecer o contexto em que se inseria a

Maçonaria e a sociedade à época em que o grau de marca se desenvolvia. Naquele tempo a

Maçonaria, assim como toda a sociedade, era impregnada pela cultura verbal. Isso ocorria por

uma questão muito simples, a maioria da população não sabia ler ou escrever. Neste contexto,

3

Santos, Geraldo Mendes dos. Simbolismo. <Disponível em: http://www.samauma.biz/site/ samauma/gs1106simbolismo.html>

Page 3: A marca   diálogo (2)

3

era necessário estabelecer alguma forma de identificação do trabalho desenvolvido por cada

maçom, a fim de que cada um recebesse na justa medida em que produzisse.

A forma encontrada por nossos irmãos foi a criação de uma marca para cada operário. Confesso

que tal processo apesar de simplório foi muito criativo e engenhoso, pois uma solução simples

possibilitou a resolução de um grande problema, já que cada obreiro passou a ser identificado

por alguns simples traços, facilitando sem sombra de dúvidas nossos trabalhos de supervisão e

do 1º Vig..

A utilização da marca como um processo distintivo foi tão bom, que naquela época se utilizava

outras duas marcas além da aposta pelo obreiro. Era comum ainda encontrar “a marca de

aprovação” 4

, que significava que a peça havia sido aceita pelo M. Sup. para aquela construção

(facilmente visualizada no momento da passagem ao Grau de MdM) e a marca indicativa de

onde exatamente cada pedra entalhada ou aprovada deveria ser colocada na ordem de pedras a

serem assentadas, especialmente no caso de pilares, arestas ou arcos, sendo que tais marcas eram

apostas pelo M.∙. M.∙., pois já estava de posse da planta de toda a estrutura.

MVM – Ir. Cap., na Maçonaria contemporânea a marca pode trazer algum ensinamento

esotérico?

Cap. – Certamente MVM! Dentre as diversas interpretações que possa vir a nos suscitar, uma

em especial me chama a atenção: a de que a Maçonaria nos ensina que cada indivíduo tem uma

marca.

Como assim? Os companheiros me perguntariam... Simples: nossos atos, escolhas, atitudes

acabam por criar uma marca, ou seja, revelam nossa identidade e exteriorizam a forma pelo qual

as pessoas te reconhecem, além é claro de demonstrar seus valores internos. Digam-me se não é

verdade que algumas vezes essa marca é mais lembrada do que o próprio nome da pessoa? Quem

aqui nunca viu uma pessoa ser lembrada por seus atos ou atitudes e em não pelo nome, como por

exemplo: “lá vem aquele enrolado”?

4 CRYER, Rev. Neville Narker. Conte-Me Mais Sobre O Grau Da Marca. São Paulo. Madras, 2009. P.28

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Meus irmãos, a Maçonaria nos convida a refletir sobre os nossos atos, escolhas, atitudes... Sobre

como nos colocamos na sociedade, em nossas famílias, em nossas Lojas e Capítulos.

Reflitamos...

Será que nossos atos são condizentes com aquilo que dizemos? Ou será que nossa marca não

reflete a nossa fala? Será que nossas atitudes exteriorizam nossos valores? Ou nossos valores

estão dissociados de nossas atitudes? Será que executamos nossos trabalhos com o máximo

empenho que se espera de alguém que é reconhecido nas escrituras como imagem e semelhança

de seu Perfeito Criador? Ou o fazemos de qualquer maneira?

Eis a necessária meditação de um MdM...

A expressão “Mark Well” denota a importância do objeto que carrega sua marca. E as marcas

lançadas sobre nosso peito em nosso adiantamento faz alusão também à necessidade de que

devemos nos importar com a maneira com que exercemos nossos atos, escolhas, ou como nos

comportamos a fim de que estes também reflitam nossos valores internos e nossa marca seja apta

a ser reconhecida por nossos irmãos Supervisores como “trabalho bom, trabalho fiel...”.

MVM – Existem alusões às marcas nas Sagradas Escrituras, 1° D.?

1° D. – Como profundo conhecedor das palavras do Supremo Supervisor, devo esclarecer

inicialmente que, nas versões traduzidas para o português não encontramos a nossa tão

conhecida expressão “marca bem” – mark well, mas somente na versão americana (American

Standard Version e King James Version - Ezequiel 44: 5), sendo que nas nossas extraímos

apenas as palavras “nota bem” e “presta bem atenção”5. Todas, obviamente, dando a mesma

ênfase de que a palavra do Pai deve ser bem guardada, marcada, como algo que não pode ser

esquecido. Como bem nos ensinou o Ir. Cap., se o MdM deixa sua marca para o reconhecimento

de que aquela boa obra é de sua autoria, os ensinamentos Divinos devem ser marcas

exteriorizadas pelo MdM em cada um de seus atos. Esse é um dos sentidos das pancadas do

5 Ezequiel 44: 5 – Versão Católica.

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5

cinzel lançadas sobre nosso peito, no dia do adiantamento, devendo ser muito bem marcados os

mandamentos Divinos, para que a marca de cada obreiro seja o da Divindade refletida.

2° D. – MVM, permita-me complementar as palavras do querido Ir. 1° D.?

MVM – Tenha a bondade, Ir. 2° D.

2° D. – O profeta Ezequiel, ouviu e viu Deus dando ordens a um anjo, para que imprimisse uma

marca na testa dos fiéis de Jerusalém, pois os que não tivessem a Marca Divina seriam

sentenciados com a morte. Dizem as Sagradas Escrituras: “…e lhe disse: Passa pelo meio da cidade,

pelo meio de Jerusalém, e marca com um sinal a testa dos homens que suspiram e gemem por causa de

todas as abominações que se cometem no meio dela. E aos outros disse ele, ouvindo eu: Passai pela

cidade após ele, e feri; não poupe o vosso olho, nem vos compadeçais.” (Ezequiel 9:4-5). Meus

amados irmãos, não sendo a nossa marca a demonstração de que aquela pedra trabalhada é

produto de um verdadeiro MdM, não teremos igualmente outro resultado que não seja a morte:

da virtude e da alegria de uma vida em plenitude.

MVM – Ir. 1° V., por que o primeiro grau do Real Arco se chama MdM?

1° V. – MVM, inegavelmente o grau de MdM remonta à Maçonaria Operativa, onde o

verdadeiro M.M. era aquele profundo conhecedor da geometria, da arte de construir em pedra, de

erigir catedrais e outros monumentos dos mais belos, como a Catedral de Notre Dame, por

exemplo, construída de 1163 a 1345.6 Aliás, bem sabemos que qualquer construção deve

começar pelos construtores e o sucesso da empreitada dependerá de: sabedoria (que cria), força

(que sustenta) e beleza (que adorna), verdadeiros sustentáculos da Arte Real.

O grau de MdM, como primeiro capitular, convida-nos a ser obreiros úteis e dedicados, como

artífices que, ultrapassando o Mestrado, não se contentam apenas em levantar o Templo, mas de

nele também imprimir a marca indicativa de que o Templo (interior) e somente o construtor que

busca trabalhar na Arte Real poderá completar o Santo Arco com a pedra angular (cume).

MVM – Ir. Sec., a marca que escolhemos como nossa tem alguma utilidade?

6 Guilherme, João. O Nosso Lado da Escada. 1ª ed. 2012. Ed. Cop: Rio de Janeiro. P. 57.

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Sec. – Como ensina nosso querido Ir. João Guilherme “a marca pessoal, gravada na pedra,

confirmava a excelência do trabalho”7. Atualmente não pode ser diferente, o Maçom que

ingressa no Real Arco deve, ou pelo menos deveria imprimir sua marca em todo trabalho de sua

autoria, por exemplo, através de carimbos, logomarcas empresariais, cabeçalhos e/ou rodapés,

dentre outras formas de marcação.

MVM – O que é e para que serve o "chapter penny", Ir. 2° V.?

2° V. – Além de passaporte maçônico, apto a permitir a entrada do MdM em outros Capítulos,

inclusive de países estrangeiros, o “chapter penny” nos recorda o dever de solidariedade que

deve iluminar os MdM, especialmente entre si. Recebendo o “chapter penny” de um irmão

como penhor, o MdM deve envidar todos os esforços no sentido de ajudar o irmão na sua

necessidade8. É o que recorda, inclusive as antigas Corporações de Ofício, as quais cabia o

sustento dos invalidados, das viúvas, dos órfãos e dos journeyman, que viajavam em busca de

trabalho e, não encontrando trabalho no canteiro de obras, solicitava auxílio, que lhe era

concedido (um siclo) para que pudesse seguir sua jornada pelo trabalho artesanal9. Em suma, não

tendo aquela Corporação condições de atender ao pedido do companheiro que apresentou sua

marca em penhor, era-lhe a mesma devolvida com o devido preço (meio siclo judeu de prata)10

.

MVM – E essa medalha, meu Ir. Tes. tem alguma ligação com a expressão “medalha

cunhada”, utilizada em alguns ritos simbólicos?

Ir. Tes. – Diretamente pode ser que não, no entanto, o ato de circular o “tronco” para colhimento

de “medalhas cunhadas”, tem finalidade próxima de uma das formas de utilização do “chapter

penny”: a solidariedade entre irmãos.

Medalha "cunhada" vem do verbo "cunhar", que significa "imprimir cunho em"11

, ou seja,

marcar moedas ou medalhas com um desenho, uma marca12

. Portanto, medalha cunhada é o

mesmo que medalha gravada, identificada. A expressão simbólica utilizada pelo V.M. remonta

7 Guilherme, João. O Nosso Lado da Escada. 1ª ed. 2012. Ed. Cop: Rio de Janeiro. P. 64.

8 Ritual MdM. Supremo Grande Capítulo de Maçons do Real Arco do Brasil. 2001. p. 44.

9 Guilherme, João. O Nosso Lado da Escada. 1ª ed. 2012. Ed. Cop: Rio de Janeiro. P. 73.

10Ritual MdM. Supremo Grande Capítulo de Maçons do Real Arco do Brasil. 2001. ps. 44 e 45.

11 Disponível em: http://www.priberam.pt/dlpo/default.aspx?pal=cunhar. Acesso em 11/01/2013, às 12:12.

12 Disponível em: http://www.priberam.pt/dlpo/default.aspx?pal=cunho. Acesso em 11/01/2013, às 12:12.

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ao tempo em que não existiam moedas tal como as que conhecemos hoje, mas medalhas ou

peças de ouro, prata, bronze, cunhadas normalmente com a figura do detentor do poder13

.

Bem esclarece nosso Ir. Kennyo Ismail14

que o ato de circular a “tronco de solidariedade” é

resultante da influência católica nos ritos latinos, porém não se pode esquecer que ele relembra a

cada reunião o compromisso, firmado por maçons por ocasião do seu juramento iniciático, de

socorrer seus irmãos e os necessitados, promessa ratificada pelo MdM.

De toda sorte, deve-se reconhecer que o “chapter penny” não é outra coisa senão uma “medalha

cunhada”, tendo inclusive valor, pois capaz de ser entregue em “penhor”15

.

MVM – Meus Irmãos, pudemos bem avaliar essa pedra peculiar, cabendo agora, a nós

MRAs, julgando-a pagar o justo preço. Meditemos...

13

Escrituras Sagradas – Lucas 20:24, Mateus 22:20-21 e Marcos 12:16. 14

Ismail, Kennyo. A Influência Religiosa nos Ritos Maçônicos. Disponível em: http://www.noesquadro.com.br/2012/09/a-influencia-religiosa-nos-ritos-maconicos.html. Acesso em 11/01/2013, às 12:29. 15

Ritual MdM. Supremo Grande Capítulo de Maçons do Real Arco do Brasil. 2001. p. 44.