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Ano 1 (2015), n 2, 773-810
A MANUTENO DA BASE OBJETIVA DO
CONTRATO NA ONEROSIDADE EXCESSIVA
NO BRASIL
Gilberto Fachetti Silvestre*
Guilherme Fernandes de Oliveira**
Resumo: Distingue onerosidade excessiva e impossibilidade de
cumprimento da prestao, destacando que apenas a primeira
hiptese permite a reviso do contrato a partir da alterao da
base objetiva do negcio jurdico, definio bem desenvolvida
por Karl Larenz na doutrina alem. Muitas demandas apresen-
tadas ao Judicirio brasileiro pedem a reviso do contrato com
base em problemas individuais da esfera particular do contra-
tante, no se tratando de hiptese, portanto, de reviso do con-
trato. Assim, apresenta quando a alterao da base do negcio
ensejar a onerosidade excessiva das prestaes que prejudica
o equilbrio contratual e, dessa maneira, autoriza que o juiz
altere as condies do contrato. Para tanto, o trabalho passa por
conceitos fundamentais compreenso do tema, tais como fun-
o social do contrato, boa-f objetiva e a equidade.
Palavras-Chave: Contratos onerosidade excessiva base
objetiva reviso contratual.
MANTENIMIENTO DE LA BASE OBJETIVA DEL CON-
TRATO EN LA ONEROSIDAD EXCESIVA EM BRASIL.
* Professor da Universidade Federal do Esprito Santo (UFES); Doutorando em
Direito Civil pela Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo (PUC/SP); Mestre
em Direito pela UFES; Advogado. E-mail: [email protected] ** Mestrando em Direito Processual Civil pela Universidade Federal do Esprito
Santo (UFES); Assessor do Tribunal de Justia do Esprito Santo. E-mail:
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Resumen: Distingue onerosidad excesiva y el incumplimiento
de la prestacin, sealando que slo la primera hiptesis con-
templa la revisin del contrato de la modificacin de la base
objetiva del negocio jurdico, definicin bien desarrollada por
Karl Larenz en la doctrina alemna. Muchas demandas presen-
tadas a la Justicia brasilea que soliciten la revisin del contra-
to sobre la base de los problemas individuales de la esfera par-
ticular del contratista, no son una hiptesis de la revisin del
contrato. As, se presenta cuando el negocio implica la carga
excesiva de los beneficios que afectan el equilibrio contractual
y, por lo tanto, autoriza al juez a modificar las condiciones del
contrato. En el trabajo es fundamental para la comprensin de
la materia, conceptos tales como la funcin social del contrato,
el de buena fe y equidad.
Palabras Clave: Contratos onerosidad excesiva base objeti-
va revisin contractual.
1. INTRODUO.
om o advento da Revoluo Francesa instaurou-
se o Estado Liberal, notadamente marcado pela
no interveno estatal nas relaes negociais,
caracterstica responsvel pela irradiao de
inmeros reflexos nos domnios do Direito
(SANTOS: 2009, p. 110).
Nesse contexto, o contrato, indispensvel satisfao
dos interesses econmicos e, por conseguinte, instrumento de
circulao de riquezas, passa por um processo de blindagem
que o torna praticamente insuscetvel s alteraes posteriores
e, muito menos, ao seu desfazimento, face ao dogma da au-
tonomia da vontade, princpio elevado a patamar de valor su-
premo do sistema contratual poca, em conjunto ao da intan-
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gibilidade dos contratos. Trata-se, em verdade, da consagrao
do pacta sunt servanda, verdadeiro corolrio do Direito contra-
tual do Estado Liberal.
Nada obstante, em virtude dos desequilbrios calamito-
sos que a estrita observncia ao rigorismo do pacta sunt ser-
vanda ocasionaram, surgiram, ao longo do sculo XIX1,2,3
,
inmeras teorias que buscaram tolher o exacerbado poder de
obrigatoriedade e imutabilidade inerentes aos contratos vigen-
1 Acerca da mudana de paradigma ocorrida com a passagem do Estado Liberal para
o Estado Social, Theodoro Jnior (2004, pp. 02-03) resume brilhantemente que: O
Estado social imps-se, progressivamente, a partir dos fins do sculo XIX e princ-
pios do sculo XX, provocando o enfraquecimento das concepes liberais sobre a
autonomia da vontade no intercmbio negocial, e afastando o neutralismo jurdico
diante do mundo e da economia. A consequncia foi o desenvolvimento dos meca-
nismos de interveno estatal no processo econmico, em graus que tm variado,
com o tempo e com as regies geogrficas, revelando extremos de uma planificao
global da economia em moldes das idias marxistas; ou atuando com moderao
segundo um dirigismo, apoiado em modelo em que o controle econmico compre-
ende uma atuao mais sistemtica e com objetivos determinados; ou, ainda, elegen-
do uma terceira atitude de intervencionismo assistemtico, caracterizado pela adoo
de medidas espordicas de controle econmico, para fins especficos. Superado o
modelo de Estado liberal puro, alheio por completo aos problemas econmicos, pois
no h mais Estado que se abdique da atuao reguladora da economia, o que variam
so os nveis internos e externos dessa atividade controladora. Essa nova postura
institucional no poderia deixar de refletir sobre a teoria do contrato, visto que por
meio dele que o mercado implementa suas operaes de circulao das riquezas.
[...]. 2 Dissertando acerca da evoluo dos princpios liberais aos princpios sociais, Fab-
ola Meira de Almeida Santos (2009, p. 110) anota que at a primeira metade do
sculo XIX prevalecia de forma robusta o denominado e conhecido pacta sunt
servanda, de carter austero e obrigatrio, prevalecente nas contrataes e que no
admitia excees. No entanto, inicia-se uma fase onde o Estado busca um modelo de
sociedade politicamente organizada, com carter intervencionista e protetivo. Com
isso a principiologia regente aos contratos alterada, passando-se de um modelo
liberal e ilimitado para um modelo de contrato social, originrio da figura do Estado
intervencionista. Certo que conceitos antes tidos como absolutos, so mitigados
pela nova ordem contratual, onde os princpios liberais comeam a obrigatoriamente
se render aos princpios sociais [...]. 3 Sobre o tema, anota ainda Caio Mrio da Silva Pereira (2009, p. 137) que Passada
a fase do esplendor individualista, que foi o sculo XIX, convenceu-se o jurista de
que a economia do contrato no pode ser confiada ao puro jogo das competies
particulares.
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tes quele tempo, dentre as quais se destaca a teoria da base do
negcio jurdico, a qual ora passaremos a tratar.
A teoria da base do negcio surgiu como um meio de
equacionar situaes em que vislumbrada a quebra do sina-
lagma contratual, assim entendido como um fato que torna de-
sequilibrado o contrato. Nesse sentido os apontamentos trazi-
dos por Gabriella Fregni (2009, p. 170): A teoria da base do negcio nasceu como uma forma de
equacionar situaes em que, nas relaes contratuais de trato
sucessivo e execuo diferida, em razo da ocorrncia de fa-
tos extraordinrios e imprevisveis, h a quebra do sinalgma
contratual, tornando desequilibrado o contrato.
Tem-se como precursor da teoria da base do negcio ju-
rdico os estudos empreendidos por Bernard Windscheid ainda
nos idos de 1850, os quais culminaram com a criao da teoria
da pressuposio, de acordo com a qual o ajuste contratual se
estabelece a partir de fatos pressupostos por uma das partes e
claramente cognoscveis pela outra (FREGNI: 2009, p. 171).
Referidos fatos, para o autor da teoria, no estariam necessari-
amente delineados no contrato, mas representaria a real inten-
o do agente contratante, sendo que a alterao de circunstn-
cias ensejaria, pois, a abertura da via modificativa do acordo
originariamente entabulado. Nesse sentido, imprescindvel a
transcrio do entendimento de Larenz (2002, p. 18) acerca da
referida teoria: Windscheid entenda por presuposicin una limitacin de la
voluntad, exteriorizada en el supuesto de hecho de la declara-
cin negocial, de tal naturaleza que la voluntad negocial tenga
validez slo para el caso, que el declarante considera cierto y,
por tanto, no puso como condicin (en sentido tcnico-
jurdico), de que exista, aparezca o persista una determinada
circunstancia. Si esta presuposicin no se realiza, las conse-
cuencias jurdicas correspondern a la voluntad efectiva, pero
no a la verdadera. La presuposicin es, por conseguiente, una
condicin no desenvuelta y, al igual que la condicin tpica,
una autolimitacin de la voluntad, no de la voluntad efecti-
va, consciente, sino de la voluntad verdadera.
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Ocorre que a referida teoria fora alvo de inmeras crti-
cas pela doutrina, em virtude da extrema subjetividade por ela
veiculada, observada a partir da relao entre os fatos pressu-
postos e os motivos do contrato, no encontrando, assim, aga-
salho nas codificaes poca empreendidas.4
Observou-se, nesse momento histrico, uma mudana
na forma de se encarar o vnculo advindo da relao contratual,
vislumbrando-se o contratante como parte responsvel ao qual
incumbem deveres secundrios oriundos da observncia do
princpio da socialidade e da boa-f, circunstncia que concor-
reu para que a relao negocial passasse gradativamente a ter
um tratamento objetivo (FREGNI: 2009, p. 171).
Nesse contexto, Paul Oertmann, em 1921, implemen-
tando estudos em torno da teoria da base do negcio jurdico5,
desenvolve a noo de base subjetiva do negcio cuja caracte-
4 La critica de LENEL tuvo por resultado que la comisin para la segunda discu-
sin del proyecto del Cdigo civil abandonase la doctrina de WINDSCHEID, debido
a que, segn se afirmaba, existia el convencimiento de que esta doctrina atentaba
contra la seguridad del trfico y, por consiguiente, el Cdigo no podia basarse em la
misma. Su inclusin em la ley llevara consigo el peligro de que se borrase para el
juicio la diferencia entre presuposicin y motivo y la prctica pudiese llegar, equivo-
cadamente, a tener en cuenta el influjo de un motivo situado fuera del contrato
(LARENZ: 2002, p. 19). 5 Ensina Daniele de Lima Oliveira (2009, pp. 53-54) que essa teoria surgiu na
Alemanha, em 1921, criada por Paul Oertmann, formulada na representao mental
das circunstancias em que a vontade negocial se assentou. Oertmann chamou essa
representao mental de base negocial, a qual poder ser causa para a reviso ou
resoluo contratual diante de sua anormal alterao. Essa teoria se diferencia da de
Windscheid no que tange sua independncia. A teoria da pressuposio est con-
substanciada numa declarao independente do negcio realizado, ao passo que a
teoria da base do negcio jurdico tem relao direta com o negcio a ser realizado
como um todo, com essncia no equilbrio entre prestao e contraprestao, fixada
de forma subjetiva pelas partes. Oertmann criticou a base subjetiva e desconhecida
por Windscheid, apresentando, em substituio, um fato do conhecimento das par-
tes, certo e determinado. A base do negcio seria o reconhecimento da existncia de
circunstncias essenciais presentes na concluso do pacto, aceitas pelas partes como
circundantes do acordo contratual. Quando, em circunstncias supervenientes
concluso do contrato, a base negocial desaparecesse, causando desequilbrio de
prestaes, o pacto no corresponderia mais vontade das partes, o que geraria a
interveno judicial para readapt-lo ao interesse real das partes.
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rizao se daria por meio da representao mental de uma das
partes no negcio, conhecida e acolhida pela outra parte, ou
pela comum representao de ambas as partes sobre circuns-
tncias negociais (FREGNI: 2009, p. 172). Referindo-se ex-
pressamente teoria de Oertmann, Larenz (2002, p. 20) pontua
que: [...] La distincin entre la presuposicin em el sentido de
WINDSCHEID y la por l denominada base del negocio, la
estabeleca OERTMANN de la siguiente manera: la presupo-
sicin, tal como WINDSCHEID haba desarrollado este con-
cepto, es base o parte integrante de uma declaracin aislada,
no del acto negocial bilateral; la base del negocio, en cam-
bio, se refiere no a la declaracin aislada, sino al negocio
como un todo. De este modo, la base del negocio es, repi-
tiendo la conocida definicin, la representacin mental de
una de las partes en el momento de la conclusin del negocio
jurdico, conocida en su totalidad y no rechazada por la otra
parte, o la comn representacin de las diversas partes sobre
la existencia o aparicin de ciertas circunstancias, en las que
se basa la voluntad negocial.
A despeito de ter incorporado a noo de bilateralidade
na representao mental, tornando-a comum a ambas as partes,
mais uma vez, as crticas formuladas teoria de Oertmann re-
portavam-se sua subjetividade, assinalando os crticos a iden-
tidade / semelhana teoria elaborada por Windscheid, uma
vez que a representao mental, nas condies descritas por
Oertmann, no deixa de ser o motivo interno, ainda que conhe-
cido pela outra parte (DAZ: 2004, p. 199).
Depreende-se do exposto que a teoria desenvolvida por
Oertmann peca por se preocupar em excesso com o critrio
subjetivo da representao, olvidando-se em analisar as situa-
es objetivas inerentes ao negcio jurdico.
So essas as razes que levaram Karl Larenz a lanar-se
aos estudos em torno da teoria da base do negcio jurdico, a
qual experimentou grande progresso em suas mos, culminan-
do com a superao das antigas objees, passando-se a vis-
lumbrar a distino entre a base subjetiva e a base objetiva.
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2. A BASE OBJETIVA DO NEGCIO JURDICO APLICA-
DA AOS CONTRATOS CIVIS.
Conforme assinalado anteriormente, Karl Larenz foi
responsvel pela criao de uma tese ecltica acerca da teoria
da base do negcio, veiculada por meio de sua obra Base del
negocio jurdico y cumplimiento de los contratos, na qual ela-
borou distines entre a base objetiva e subjetiva do negcio
jurdico, a teor do que se observa do seguinte excerto de sua
obra (2002, pp. 34 e 37): La expresin base del negocio puede ser entendida, y as lo
ha sido, en un doble sentido. En primer lugar, como la base
subjetiva de la determinacin de la voluntad de una o am-
bas partes, como una representacin mental existente al con-
cluir el negocio que ha influido grandemente en la formacin
de los motivos. En segundo lugar, como la base objetiva del
contrato (en cuanto complejo de sentido inteligible), o sea,
como conjunto de circunstancias cuya existencia o persisten-
cia presupone debidamente el contrato spanlo o no los con-
tratantes -, ya que, de non ser as, no se lograra el fin del con-
trato, el propsito de las partes contratantes y la subsistencia
del contrato no tendra sentido, fin u objeto. [...] La repre-
sentacin tiene que haber inducido a concluir el contrato no a
una sino a ambas partes.
Observa-se, pois, que Larenz enfrentou o tema a partir
de um espectro objetivista, inserindo a base do negcio jur-
dico ao contedo do contrato, desviando-a dos motivos que
conduziram formao do negcio, sem, contudo, negar e / ou
expurgar o seu aspecto subjetivo.
Fabiana Rodrigues Barletta (2002, p. 14) ensina que por
base subjetiva do negcio jurdico, entende-se a representao
comum dos pactuantes apta a influenciar a deciso de ambos e
que levou-os a concluir o contrato daquela determinada manei-
ra. Esta representao diz respeito a uma circunstncia existen-
te ou supervenientemente esperada. Deve se tratar, contudo, de
uma determinada representao ou esperana, no lhe fazendo
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as vezes a simples falta de expectativa de uma variao poste-
rior das circunstncias existentes por ocasio da concluso do
contrato. A representao deve ser, outrossim, relevante o bas-
tante para levar as partes a contratarem daquela determinada
maneira. Acerca do tema, Larenz (2002, p. 210) assim assina-
lou: Por base del negocio subjetiva ha de entenderse una represen-
tacin mental o esperanza de ambos contratantes por la que
ambos se han dejado guiar al concluir el contrato. No es sufi-
ciente que la representacin o esperanza haya determinado de
modo decisivo la voluntad de una de las partes, aun cuando la
otra parte hubiese tenido noticia de ello. El no esperar una fu-
tura transformacin de las circunstancias no equivale a la po-
sitiva esperanza en la persistensia de determinada circunstan-
cias.
A seu turno, o vis objetivo deve ser entendido como
um conjunto de circunstncias a partir das quais pressupor-se-
a existncia do prprio contrato que se relaciona ao fim e obje-
tivo do acordo de vontades entabulado sem que, necessaria-
mente, as partes tenham conhecimento. Assim, nas palavras do
prprio autor da teoria (LARENZ: 2002, p. 211): Por base del negocio objetiva ha de entenderse el conjunto de
circunstancias y estado general de cosas cuja existencia o
subsistencia es objetivamente necesaria para que el contrato,
segn el significado de las intenciones de ambos os contratan-
tes pueda subsistir como regulacin dotada de sentido.
Em outras palavras, pontua Luiz Gasto Paes de Barros
Lees (2005, p. 25) que: Procurando suprir a falha dessas teorias, Karl Larenz desen-
volveu a teoria da base objetiva do negcio (Geschftsgrund-
lage), segundo a qual, a par da anlise do pressuposto subjeti-
vo, cumpriria examinar a base objetiva do negcio, de tal sor-
te que a manuteno das condies gerais no curso do contra-
to, semelhante s que prevaleciam no momento da concluso,
constituiria pressuposto objetivo da vontade declarada pelas
partes, tenham estas tidos ou no conscincia de sua imann-
cia na conveno.
Neste tocante, conclui-se, lastreado na lio preconiza-
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da por Samir Jos Caetano Martins (2007, p. 263), que a base
objetiva abrange o conjunto das circunstncias cuja existncia
ou manuteno, com ou sem conscincia das partes, necess-
ria para a manuteno do sentido contratual e do seu escopo.
A relevncia do conceito elaborado por Larenz fica evi-
denciada quando confrontada s consideraes tecidas por Jos
de Oliveira Ascenso (2008, pp. 7-8), para quem: Toda a situao jurdica assenta sobre uma realidade histri-
ca, que dela passa a ser constituinte. Assim acontece tambm
com os negcios que se celebram: esto historicamente situa-
dos, de maneira que a realidade histrica que explica o ne-
gcio deste modo constitutiva da vinculatividade do neg-
cio. No contedo do negcio [...]. Mas um pressuposto de
se contratar.
Sendo assim, conclui-se na esteira de raciocnio desen-
volvida por Otavio Luiz Rodrigues Junior (2002, p. 81) que a
base subjetiva deve ser analisada luz da teoria do erro e dos
vcios consensuais. A base do negcio objetiva, porm, deve
cifrar-se possibilidade de ser atingido o fim do contrato e
inteno conjunta das partes contraentes.
Das lies acima exaradas, possvel se afirmar, assim,
que o negcio jurdico celebrado sobre uma base negocial,
que contm aspectos objetivos e subjetivos, base essa que deve
manter-se at a execuo plena do contrato, bem como at que
sejam extintos todos os efeitos decorrentes do contrato (ps-
eficcia) (FREGNI: 2009, p. 173).
De acordo com as lies proclamadas por Larenz (2002,
p. 211), so duas as circunstncias em que ocorre o desapare-
cimento da base do negcio jurdico: I) cuando la relacin de equivalencia entre prestacin y con-
traprestacin presupuesta en el contrato se h destruido en tal
medida que no puede habalarse racionalmente de uma con-
traprestacin (destruccin de la relacin de equivalencia); II)
cuando la comn finalidad objetiva del contrato, expresada en
su contenido, haya resultado definitivamente inalcanable, aun
cuando la prestacin del deudor sea todavia posible (frustra-
cin de la finalidad).
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bem de ver, portanto, que ocorrida a destruio da re-
lao de equivalncia ou a frustrao da finalidade do contrato,
situaes elencadas por Larenz nas quais se vislumbra o abalo
da base do negcio jurdico, desaquacionado, por consequn-
cia, torna-se o pacto.
Couto e Silva (1990, p. 10) em parecer sobre o tema
anota com preciso que o objetivo precpuo da teoria desenvol-
vida por Larenz permitir a adaptao do contrato realidade
subjacente. Nas palavras do renomado civilista: [...] A base objetiva do negcio jurdico decorre de uma
tenso ou polaridade entre os aspectos voluntaristas do
contrato aspecto subjetivo e o seu meio econmico as-
pecto institucional o que relativisa [sic], nas situaes mais
dramticas, a aludida vontade, para permitir a adaptao do
contrato realidade subjacente.
Do exposto, pois, se extrai o escopo que originou a cri-
ao e o desenvolvimento das teorias acerca da base do neg-
cio jurdico, vale dizer, o equacionamento daqueles contratos
que por um determinado motivo (deflagrador da aplicao da
teoria) tornou-se desequilibrado.
Busca-se, assim, um reequilbrio entre prestao e con-
traprestao assumidas pelos contratantes, visando restabelecer
ou, ao menos reaproximar, sempre que possvel, a equao
econmica inicialmente querida e originria da vinculatividade
das partes.
Couto e Silva (1990, p. 9) ensina, outrossim, que a teo-
ria ora sob anlise cuida de regular os riscos no contrato, anali-
sando-se, para isso, se a finalidade real do negcio coaduna-se
efetivao da inteno geral dos contratantes, em face dos
acontecimentos sobrevindos que implicaram na quebra da base
objetiva do negcio jurdico.
Interessante notar que, ainda que a aplicao da teoria
redunde na resoluo do negcio jurdico, e no em sua reviso
como prefervel, o escopo que lhe inerente ser atingido, na
medida em que restituir-se-o as partes ao estado anterior (sta-
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tus quo ante) avena encetada, restabelecendo-se ou, como
dito anteriormente, aproximando-se, mesmo que por via trans-
versa, o equilbrio.
Vale dizer, para fins de esclarecimento, que o reequil-
brio a que aqui se reporta, por bvio no o reequilbrio con-
tratual, afinal, este somente pode ser atingido se mantido, pela
reviso, o negcio jurdico.
O reequilbrio ora referido diz respeito, portanto, ao sta-
tus econmico dos contratantes, o qual deixar de ser assolado
por um acordo deveras desvantajoso que estava a corromper a
situao financeira de uma das partes.
Constata-se, assim, que as consequncias jurdicas ad-
vindas da quebra da base negocial evidencia o cerne desta teo-
ria, na medida em que reverbera diretamente em seu plano fti-
co, sendo recomendvel que tais repercusses sejam interpreta-
das levando-se em conta o sentido que orienta a consecuo do
contrato a fim de propiciar a sua integrao.
Uma vez analisado o escopo a que visa tutelar a teoria
estudada, cumpre, na sequncia lgica at agora desenvolvida,
perquirir os fundamentos em que se assenta e, por conseguinte,
que justificam a sua aplicao.
Malgrado exista divergncia doutrinria acerca do tema,
possvel, no entanto, eleger alguns substratos comuns dentre
os estudiosos do assunto.
Destarte, pode-se elencar, sem medo de errar, como os
principais alicerces da teoria da base objetiva do negcio jur-
dico a boa-f, a equidade, a funo social dos contratos e da
equivalncia contratual, aos quais passa-se, agora, a uma anli-
se detida com o propsito de demonstrar a relao de pertinn-
cia ora suscitada.
A boa-f uma regra de comportamento tico que diri-
ge a relao jurdica estabelecida entre as partes contratantes,
impondo determinados deveres de lealdade, honestidade, soli-
dariedade, correio, probidade e confiana, de maneira que o
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acordo de vontades e a execuo e interpretao do negcio
jurdico ocorram de forma tica. Trata-se de um arqutipo de
conduta jurdico-social pelo qual as partes devero se compor-
tar com lealdade e correo. Alis, Bianca considera boa-f
(buona fede) e correio (correttezza) como sinonmias.6 En-
to, simplificadamente, a boa-f traduz a ideia de que o com-
portamento das partes deve ser desenvolvido com considerao
mtua e honestidade, a partir de critrios ticos e objetivos.
O princpio da boa-f encontra trs mbitos de aplicabi-
lidade na relao negocial: formao, interpretao e execuo
do negcio (AMARAL: 2005, p. 139). A residem suas trs
funes bsicas: interpretativa, em que a exegese do contrato
feita de acordo com os deveres de lealdade que as partes devem
guardar para consigo; integrativa, pela qual as omisses das
partes so supridas com os padres impostos pelo princpio; e
controle da autonomia da vontade, ou seja, o poder de auto-
regulamentao das partes est condicionado aos ideais de le-
aldade, solidariedade e lisura (SENS DOS SANTOS: 2003, p.
107). Neste sentido so as lies de Francisco Amaral (2008,
pp. 83-84), o qual aduz que: Seu contedo compe-se de um dever de lealdade, que impe-
de comportamentos desleais (sentido negativo) e de um dever
de cooperao entre os contratantes (sentido positivo). Esse
dever de lealdade remonta ao princpio romano da fides, im-
pondo a absteno de todo o comportamento que possa tomar
a execuo do contrato mais difcil ou onerosa. [...] Quanto ao
mbito de atuao, aplica-se, principalmente, no campo con-
tratual [...] , portanto, no campo das obrigaes que tem par-
ticular incidncia.
Nada obstante, Jos de Oliveira Ascenso (2008, p. 16)
no concorda com a indicao de que o princpio da boa-f 6 Cesare Massimo Bianca (1990, p. 510-511) ensina que "La prevalenza del princi-
pio di buona fede sulle determinazioni contrattuali consegue al suo carattere di
ordine pubblico. La buona fede rappresenta infatti uno dei principi portanti del
nostro ordinamento, e il fondamento etico che le viene riconosciuto trova risponden-
za nell'idea di una morale sociale attiva o soclidade, che si pone al di l dei tradizio-
nali confini del buon costume".
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revela-se verdadeiro fundamento da teoria ora estudada, con-
signando que o recurso este princpio foi um mero artifcio do
qual os estudiosos germnicos lanaram mo face a inexistn-
cia de substrato legal. Assevera o autor, amparado nas lies de
Flume, que nada se ganha ao recorrer-se boa-f, in verbis: Os intrpretes alemes que desenvolveram este instituto pro-
curaram fundament-lo no princpio geral da boa f, dada a
falta de apoio legal. [...] O recurso boa f foi um expediente
dos intrpretes germnicos, na ausncia de base legal. Mas
em rigor o expediente no era fundado. Como nota Flume
(1992), no se ganha nada com o recurso boa f.
Ora, em que pese o brilhantismo e notrio conhecimen-
to do renomado autor, no se afigura correto elidir a boa-f
como fundamento da presente teoria, exatamente por o referido
princpio importar, como consignado anteriormente, em um
arqutipo de conduta jurdico-social (padro de conduta) cuja
finalidade seja desautorizar / expurgar, dentre outros, compor-
tamentos no mbito contratual que culminem com um extremo
prejuzo (para as partes) advindo da alterao das circunstn-
cias em que se fundou a deciso de contratar.
Ademais, apesar de assim considerar, o prprio Ascen-
so registra que ainda hoje, em ordens jurdicas que elevaram
a alterao das circunstncias a instituto legal, se continua a
referir como fundamento a boa f (ASCENSO: 2008, p. 16),
o que contribui, em que possam pesar posicionamentos desto-
antes, para demonstrar a fragilidade dos argumentos expendi-
dos pelo professor da Faculdade de Direito de Lisboa.
E isso porque, ao menos em um primeiro momento, a
despeito de ocorrer uma positivao posterior, toda teoria pro-
pagada no mbito do direito at tornar-se, ou no, um institu-
to jurdico -, lastreia-se em algo maior, v.g., um princpio. Des-
tarte, na medida em que a boa-f impe um padro de conduta
aos contratantes, torna-se inconcebvel desp-la do seu status
de fundamento da teoria da base do negcio jurdico.
Parece perfeitamente lgico e condizente que, a partir
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do momento em que se vislumbra o desequilbrio contratual
relevante, a boa-f age assinalando que aquele acordo origina-
riamente entabulado e supervenientemente alterado por deter-
minadas circunstncias no mais exigvel, tendo em vista no
ser a conduta querida pelo ordenamento jurdico, posto no
caracterizar um comportamento leal decorrente de uma relao
de confiana que deve viger. Gabriella Fregni (2009, p. 176),
ao enfrentar a discusso a este respeito, lembra que [...] a que-
bra da base objetiva significa o claro desequilbrio do contrato
de modo a torn-lo inexigvel conforme os parmetros de boa-
f, diante da ocorrncia de fatos e situaes extraordinrias.
Esses parmetros, por sua vez, so habilmente traados
e exemplificados por Fabola Meira Almeida dos Santos (2009,
p. 110), cujas palavras faz-se imperiosa a reproduo: Para que o princpio da boa-f [...] se considere cumprido, no
basta que a parte no prejudique o outro plo da relao, mas
sim que exera uma atividade positiva, de cooperao, tanto
na fase pr-contratual como durante o exaurimento do contra-
to e no momento ps-contratual, ou seja, ps-eficcia das
obrigaes.
Releva anotar que a posio adotada por Ascenso nesta
temtica minoritria, entendendo a doutrina majoritria7 que
a boa-f sim fundamento da base do negcio jurdico. Verifi-
ca-se assim, na medida em que a boa-f [...] Implica tambm
em deveres acessrios de cuidado e segurana, aviso e esclare-
cimento, informao e colaborao, segredo, proteo e cuida-
do com a pessoa e o patrimnio da outra parte (AMARAL:
2005, p. 139), no haver como dissoci-la do substrato sob a
qual ergue-se e sustenta-se a teoria da base objetiva, mormente
7 Por todos Couto e Silva e Nelson Nery e Rosa Maria de Andrade Nery para os
quais, respectivamente, [...] A sua fundamentao sistemtica est no princpio da
boa-f, podendo o juiz, no caso de rompimento da base objetiva do contrato, adapt-
lo s novas realidades [...] (COUTO E SILVA: 1990, p. 10). 25. Base do negcio
jurdico. Origem. A doutrina da base do negcio jurdico, criada por Oertmann
(Geschftsgrundlage) est fundada na clusula geral de boa-f [...] (NERY JU-
NIOR e NERY: 2009, p. 539).
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porque este princpio sugere que na interpretao contratual
deve ser investigada a inteno comum afeta s partes para
fazer cessar a obrigao quando sobrevinda profunda alterao
da situao econmica originria (NERY JUNIOR e NERY:
2009, p. 581).
A equidade um princpio tico que traduz um modelo
ideal de justia balizador da magistral igualdade material, cons-
tituindo-se, verdadeiramente, em um arqutipo axiolgico ori-
entador da aplicao do direito tendente a evitar as desigualda-
des e / ou injustias que emanam do rigorismo de uma deter-
minada frmula legal. Acerca do tema, Francisco Amaral
(2008, p. 90) pontua que: O princpio da equidade um critrio intermediador no pro-
cesso de realizao do direito, um critrio interpretativo, que
permite adequar a norma ao caso concreto e chegar soluo
justa. um modelo ideal de justia, um princpio inspirador
do direito que visa a realizao da igualdade material. , antes
e acima de tudo, um critrio de deciso que leva em conta a
singularidade de cada caso, apresentando-se sob a forma de
clusula geral, no sentido de enunciado de contedo varivel,
a precisar em cada caso.
Tecidas essas consideraes acerca do que seria equi-
dade, parece invivel dissoci-la do substrato sob o qual se
assenta a teoria da base do negcio jurdico, tendo em vista
que, ocorrida uma anormal perturbao das circunstncias ori-
ginrias do pacto de vontades celebrado, a soluo h de ser
encontrada exatamente a partir de uma anlise circunstanciada
do caso concreto.
Malgrado tenha vacilado ao elidir a boa-f como valor
fundante da teoria ora em apreo, Ascenso (2008, p. 17) redi-
me-se brilhantemente ao apontar a equidade como recurso que
serve de lastro base do negcio jurdico, ao aduzir que: Pensamos que o recurso equidade efectivamente foroso.
Se o que desencadeia o processo uma alterao anormal das
circunstncias, h que examinar o circunstancialismo como
condicionante de qualquer soluo. Ora a deciso baseada na
considerao das circunstncias do caso, mais que em padres
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genricos de conduta, a soluo pela equidade. A equidade
, na definio clssica nunca superada, a justia do caso con-
creto. S a anlise das circunstncias do caso concreto permi-
te chegar soluo justa.
Denota-se, portanto, a estrita correlao entre a teoria
ora estudada e a equidade, a levar em considerao tratar-se o
princpio em destaque de recurso favorecedor da igualdade
material a ser perseguida uma vez vislumbrada a ruptura da
base objetiva do negcio originariamente ajustado, buscando-
se, com isso, o reequilbrio contratual.
O princpio da funo social do contrato verdadeiro
consectrio do princpio da socialidade, significando um com-
promisso do contrato com a coletividade, de maneira a propici-
ar justia e desenvolvimento sociais. Assim, com razo Theo-
doro Jnior (2004, p. 13) ao ensinar que: O princpio da funo social [...] no se volta para o relacio-
namento entre as partes contratantes, mas para os reflexos do
negcio jurdico perante terceiros (isto , no meio social). o
que se deduz do prprio nome com que o princpio se identi-
fica. Com efeito, funo quer dizer papel a desempenhar,
obrigao a cumprir, pelo indivduo ou por uma instituio.
E social qualifica o que concernente sociedade, relati-
vo comunidade, ao conjunto dos cidados de um pas. Lo-
go s se pode pensar em funo social do contrato, quando es-
te instituto jurdico interfere no domnio exterior aos contra-
tantes, isto , no meio social em que estes realizam o negcio
de seu interesse privado.
Reale destaca, a propsito, que "se no houve a vitria
do socialismo, houve o triunfo da 'socialidade', fazendo preva-
lecer os valores coletivos sobre os individuais, sem perda, po-
rm, do valor fundante da pessoa humana" (REALE: 2002, p.
15). Assim, pelo princpio da socialidade, os vnculos intersub-
jetivos passam a interessar a toda a ordem social, o que justifi-
ca, segundo Mazzei (2005, p. CXVI), a interveno estatal em
determinadas hipteses legais.
As relaes privadas ganham, assim, enfoque ultrassub-
jetivo em decorrncia da importncia que elas tm para a soci-
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RJLB, Ano 1 (2015), n 2 | 789
edade, pois a autonomia privada repercute no mbito social j
que permite a criao de normas de Direito que em muito po-
dem influenciar os demais sujeitos em seus atos da vida priva-
da. Por essas razes, no significa a socialidade uma reduo
da importncia do indivduo na esfera privatstica, porque o
princpio consequncia exatamente de uma importncia do
sujeito - enquanto parte de uma relao jurdica criadora de
normas - para toda a sociedade. Esses so os ensinamentos de
Theodoro Jnior (2004, p. 31-32), para quem: A funo social do contrato consiste em abordar a liberdade
contratual em seus reflexos sobre a sociedade (terceiros) e
no apenas no campo das relaes entre as partes que o esti-
pulam (contratantes). [...] Nessa tica, sem serem partes do
contrato, terceiros tm de respeitar seus efeitos no meio soci-
al, porque tal modalidade de negcio jurdico tem relevante
papel na ordem econmica indispensvel ao desenvolvimento
e aprimoramento da sociedade. Tm tambm os terceiros di-
reito de evitar reflexos danosos e injustos que o contrato, des-
viado de sua natural funo econmica e jurdica, passa ter na
esfera de quem no participou de sua pactuao.
Denota-se, pois, que a teoria da base negocial encontra
razes tambm na funo social do contrato, na medida em que
este princpio dispe que o acordo de vontades celebrado no
tem por objetivo, to-somente, o interesse econmico individu-
al, revelando-se verdadeiro instrumento de desenvolvimento
social, o qual obviamente no ser atingido a partir do momen-
to em que o pacto desequilibrado implica no assolamento de
um dos indivduos. Neste sentido, os apontamentos traados
por Fabola Meira de Almeida Santos (2009, p. 116): [...] pode-se afirmar que o contrato cumpre sua funo social
quando respeita a dignidade dos contratantes e no viola os
interesse [sic] da coletividade, posto que no se revela como
instrumento de dominao, de escravizao (como leciona a
Profa. Rosa Maria de Andrade Nery) ou enriquecimento in-
justo, mas um meio pelo qual as partes se valem para atingir
seus objetivos, devendo, portanto, ser socialmente til e no um meio de opresso.
Em outras palavras, significa dizer que a funo social
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dos contratos somente ser alcanada a partir da implementa-
o de seu duplo aspecto, a satisfao da finalidade econmica
das partes (interesses econmicos individuais) sem que os re-
flexos advindos da relao contratual (efeitos externos do con-
trato) repercutam negativamente na esfera jurdica de terceiros
ou, em ltima anlise, em todo o seio da sociedade.
Malgrado as consideraes acima traadas acerca da
funo social do contrato, cumpre ressalvar, contudo, lastreado
nas lies de Theodoro Jnior (2004, pp. 13-14) que: Diante do reconhecimento da moderna funo atribuda ao
contrato, a autonomia privada no desaparece e continua sen-
do a base de sustentao do instituto jurdico. Limitado, po-
rm o poder individual que dela agora deflui, pela agrega-
o das idias de justia e solidariedade social, que passam a
figurar tambm como princpios a se observar no campo do
direito do contrato.
Por fim, consigne-se que, no obstante tratar-se de prin-
cpio distinto, a socialidade guarda estreita relao com as dire-
trizes que emanam da funo social, aproximando-se, inclusi-
ve, da boa-f, na medida em que assenta ser o equilbrio
econmico contratual a base tica do direito obrigacional.
Por derradeiro, levando em conta o panorama atual, po-
de-se dizer que a teoria da base do negcio jurdico encontra,
hoje, tambm suas razes no princpio da equivalncia contra-
tual. E isso porque, conforme consigna Theodoro Jnior (2004,
p. 05), de fato, busca-se nas novas concepes do contrato a
introduo no sistema de melhores instrumentos para realizar a
justia comutativa, como o que se faz por meio dos princpios
do equilbrio, da proporcionalidade e da repulsa ao abuso.
Emana do referido princpio a orientao de que do vn-
culo jurdico advindo da relao contratual deve manter-se um
constante equilbrio entre os ocupantes dos respectivos plos.
Vale dizer que o equilbrio a ser mantido na relao ju-
rdica no diz respeito to-somente s prestaes e contrapres-
taes, sendo relevante, outrossim, a prpria estabilidade da
relao negocial. Inolvidveis, nesse sentido, os apontamentos
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feitos por Fabola Meira de Almeida Santos (2009, p. 112),
para quem: A equivalncia contratual traduz a necessidade dos partici-
pantes daquela relao estarem em equilbrio constante, ou
seja, desde a pr-contratao at o exaurimento daquele as
obrigaes das partes (direitos e deveres) devem seguir para a
finalidade pretendida, sem surpresas ou atos que importem
em vantagem incomensurvel a uma das partes, salvo o lucro
legal e constitucionalmente permitido. Essa equivalncia tra-
duz a necessidade de manuteno do equilbrio no s de
prestaes pecunirias, por exemplo, mas como a estabiliza-
o efetiva da prpria relao contratual, pois se assim no
for estar fadada ao insucesso, uma vez que o ordenamento
jurdico no mais aceita o direito obrigacional como meio de
retaliao do outro contratante em vistas aos prprios interes-
ses.
Nesse contexto, releva notar que a partir do momento
em que a igualdade jurdico-formal, caracterstica sobejamente
cultuada no auge do Estado Liberal, revelou-se insuficiente
tutelar o equilbrio contratual, emergiu o princpio em voga
visando harmonizar o interesse das partes envolvidas na rela-
o negocial, a fim de manter o equilbrio real em todo o pro-
cesso obrigacional, abandonando-se com isso, a ideia de que a
igualdade formal apta a fomentar a justia contratual.
Interessante registrar que, neste tocante, o princpio em
voga alm de revelar-se atual fundamento da teoria da base do
negcio jurdico, acaba por se confundir, outrossim, com o
escopo a que visa a teoria, qual seja, a manuteno e / ou resta-
belecimento do equilbrio contratual, sendo, portanto, imposs-
vel no conceb-lo, juntamente com os outros j elencados,
como seu substrato.
3. A ONEROSIDADE EXCESSIVA DAS PRESTAES
CONTRATUAIS.
A onerosidade excessiva uma matria que gera muitas
polmicas, a ponto de alguns doutrinadores chegarem at
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mesmo a afirmar que o Cdigo Civil de 2002 adota, em verda-
de, a Teoria da Onerosidade Excessiva em detrimento da Teo-
ria da Impreviso. Por todos que comungam desta posio,
confira-se Joo Hora Neto (2003, 149): O instituto da resoluo por onerosidade excessiva, sem cor-
respondncia no Cdigo Civil de 1916, tem sido apresentado,
at ento, como uma grande inovao no novo Cdigo Civil,
sendo para uns digna de aplauso ou apologia, mas que, se-
gundo outros doutrinadores, seu aparecimento pouco inova-
dor, entendendo-o como um grave retrocesso.
A onerosidade excessiva reporta-se grave, substancial
e custosa exasperao do montante da prestao, cujo adim-
plemento aflui para a imposio de sacrifcio exagerado parte
prejudicada a corroer a viabilidade econmica do acordo ence-
tado (HORA NETO: 2003, p. 150).
Em outras palavras, h de ser compreendida como uma
alterao substancial na prestao quando levado em conside-
rao o momento da celebrao do contrato e o de sua efetiva
execuo, a partir da qual vislumbrar-se- o desequilbrio do
pacto quando confrontados o objeto da prestao e o da contra-
prestao. Assim que, segundo Julio Alberto Daz (2004, p.
207): [...] A expresso reflete a idia de uma intensidade ou gravi-
dade, de tal magnitude, a ponto de provocar a desnaturaliza-
o do carter comutativo do contrato. [...] A excessiva one-
rosidade no um instrumento para se arrepender dos maus
negcios, mas um corretivo necessrio da injustia gerada pe-
las circunstncias.
Cumpre anotar que a excessiva onerosidade verificada
tanto quando h o desmesurado aumento da prestao, como
ocorre tambm quando h aviltamento da contraprestao. Nes-
te sentido, malgrado reportando-se lies de doutrinador ita-
liano acerca do instituto delineado no Cdigo Civil italiano,
inolvidveis os apontamentos trazidos por Samir Jos Caetano
Martins (2007, p. 272), posto que plenamente aplicvel reali-
dade brasileira. Confira-se: Paolo Tartaglia, tambm a propsito do art. 1.467 do
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RJLB, Ano 1 (2015), n 2 | 793
CC/italiano, observa que a onerosidade excessiva que se
configura tanto no aumento da prestao quanto na degrada-
o da contraprestao deve ser aferida pelo cotejo da rela-
o entre prestao e contraprestao no momento da conclu-
so do contrato e no momento de execuo da prestao, sen-
do este critrio aplicvel para contratos bilaterais e unilaterais
onerosos (como o mtuo feneratcio).
A este respeito anota ainda com preciso Julio Alberto
Daz (2004, p. 208), para quem a desproporo, nesse sentido,
pode proceder de duas vertentes: a) por ter aumentado o valor
da prestao que eu devo cumprir, tendo permanecido igual o
valor da que devo receber; b) por ter diminudo o valor da que
eu devo receber, tendo permanecido igual a que eu devo pres-
tar.
Anote-se, contudo, que no existe uma frmula mate-
mtica para se determinar quando se est diante de uma presta-
o maculada por onerosidade excessiva superveniente, tendo o
legislador ptrio deixado ao alvitre do magistrado, ante o caso
concreto, a avaliao da intensidade do agravamento da presta-
o. Nesse sentido, Julio Alberto Daz (2004, p. 207), que
questiona: quando se poder dizer que a onerosidade tornou-
se excessiva? No h um quantum determinado, e a Reforma
preferiu deixar ao critrio do juiz, no caso concreto, a avaliao
da intensidade do agravamento do sacrifcio exigido do deve-
dor.
Assim tambm Samir Jos Caetano Martins (2007, p.
271): No existe uma definio pronta e acabada do que seria
uma prestao excessivamente onerosa, ficando a cargo do
juiz, no exame do caso concreto, investigar o prejuzo que ex-
cede a lea normal do contrato.
A despeito do ora afirmado, de no existir um critrio
matemtico para aferio da onerosidade excessiva, possvel,
segundo Julio Alberto Daz, prover algumas diretrizes que au-
xiliem o magistrado na apreciao do grau de onerosidade so-
frida pela prestao.
Aduz o referido autor que ordinariamente a expresso
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onerosidade remonta ao sacrifcio natural assumido pelo con-
tratante devedor da prestao. Destarte, a partir do momento
em que a normalidade do sacrifcio afetada por evento extra-
ordinrio e imprevisvel, vislumbrado o predicativo excessi-
vo. In verbis: No seu sentido tradicional, a onerosidade represente o sacrif-
cio assumido pelo devedor da prestao. Quando esse sacrif-
cio, considerado normal em toda prestao, transforma-se em
excessivo por causa do evento extraordinrio e imprevisvel,
significa que foram alcanadas as condies exigidas pelo co-
dificador para tornar resolvel o contrato (DAZ: 2004, p.
207).
Ato contnuo, anota ainda que houve at autores que
pretenderam estabelecer critrios matemticos para a avaliao
da onerosidade excessiva, como o fez Candil ao traar o par-
metro de 30% de desequilbrio nos contratos cveis e 50% nos
acordos de natureza comercial. Nada obstante, parece ter agido
com acerto o legislador ptrio em no faz-lo, na medida em
que prescrever coeficiente denota arbitrariedade, alm de soar
extremamente desarrazoado (DAZ: 2004, p. 207).
Deve-se pontuar, contudo, que a expresso onerosidade
excessiva no se trata, outrossim, de frmula absolutamente
vaga a ser preenchida ao arbtrio judicial. inerente aos con-
tratos um risco provvel e tolervel aceitado pelas partes expl-
cita ou implicitamente (DAZ: 2004, p. 207).
Assim que o parmetro mais indicado para a avaliao
da excessiva onerosidade , como anteriormente j revelado, a
confrontao entre o valor da prestao ao tempo da celebrao
do contrato e aquele que fora objeto de modificao pelo even-
to extraordinrio e imprevisvel, uma vez que, conforme anota
Orlando Gomes (2008, p. 217), a onerosidade excessiva se con-
figura quando uma prestao de obrigao contratual se torna,
no momento da execuo, notavelmente mais gravosa do que
era no momento em que surgiu. A este respeito, anota Daz
(2004, p. 207): [...] No existe um limite preciso entre a simples onerosidade
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RJLB, Ano 1 (2015), n 2 | 795
e a excessiva onerosidade. Em cada contrato existe uma lea
normal que as partes aceitam, explcita ou implicitamente,
como um risco provvel e tolervel. Tambm no se trata de
uma frmula absolutamente vaga e imprecisa que o puro arb-
trio judicial dever preencher. A maneira mais natural de de-
terminar a existncia ou no da excessiva onerosidade com-
parando a onerosidade da prestao no momento da celebra-
o do contrato, ou seja, antes do acontecimento extraordin-
rio e imprevisvel, com a onerosidade existente no momento
de sua execuo, isto , depois da alterao das circunstncias
provocadas pelo evento.
Na esteira das lies preconizadas pelo autor em desta-
que, existem duas maneiras de realizar a referida confrontao.
A primeira consistiria no estabelecimento da relao de equiva-
lncia da prestao e contraprestao antes da sobrevinda do
acontecimento para posterior comparao relao acometida
pelo evento extraordinrio e imprevisvel.
O segundo mtodo, por sua vez, reporta-se anlise do
sacrifcio que a execuo da prestao naquele primeiro mo-
mento representaria ao devedor em comparao com aquele
que seria experimentado posteriormente aos acometimentos.
Obtempera o autor, no entanto, que o segundo mtodo
no se revela condizente com um sistema que se prope a des-
considerar as circunstncias de ndole subjetiva para fins de
aplicabilidade do instituto, tema que iremos tratar no prximo
tpico. Confira-se: [...] existem duas formas de realizar a comparao. A primei-
ra, defendida por Pino, afirma que o mtodo mais eficaz es-
tabelecer a relao existente entre a prestao e a contrapres-
tao no primeiro momento, e compar-lo com a mesma rela-
o no segundo momento. A segunda, prope avaliar o sacri-
fcio que iria representar para o devedor executar a prestao
no momento da celebrao do contrato, e compar-lo com
aquele que iria representar a sua execuo nas circunstncias
existentes aps o acontecimento provocador do desequilbrio
contratual. A convenincia da objetividade do primeiro siste-
ma aparece como mais compatvel com um sistema inclinado
a considerar irrelevantes, para a relao contratual, qualquer
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796 | RJLB, Ano 1 (2015), n 2
mudana subjetiva das partes, ou modificao individual de
suas respectivas capacidades econmicas. Nesse sentido, tem-
se defendido a idia de que o nico trmino comparativo acei-tvel para analisar a prestao o da contraprestao (no sen-
tido de proporo entre a relao originria e a relao no
momento da execuo da prestao j transformada em ex-
cessivamente onerosa) (DAZ: 2004, pp. 207-208).
Destarte, inobstante no se verifique um critrio mate-
mtico para se concluir pela onerosidade das prestaes, bem
de ver, no entanto, e no se deve esquecer, que a excessiva
onerosidade denota sempre uma relao, a qual deve servir de
norte ao magistrado para a aferio do desequilbrio experi-
mentado pelo acordo originariamente entabulado.
Por derradeiro, conforme denota-se do exposto, no se
pode perder de vista que a referida anlise se d circunstancia-
damente pelo prudente arbtrio do magistrado ante o caso con-
creto levado sua apreciao.8
Malgrado tenha restado assente inexistir frmula mate-
mtica para verificao da onerosidade excessiva, certo que o
nosso sistema no tolera que a referida anlise seja procedida
levando-se em considerao circunstncias de ndole subjetiva.
Quer isso significar que deve restar desconsiderada a condio
econmica do contratante para se verificar se as prestaes
tornaram-se exageradas, sendo totalmente despicienda meras
8 Neste sentido, julgado do Superior Tribunal de Justia (REsp 1034702/ES, Rel.
Ministro JOO OTVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em
15/04/2008, DJe 05/05/2008, REPDJe 19/05/2008): CIVIL. CDIGO DE DEFE-
SA DO CONSUMIDOR. ONEROSIDADE EXCESSIVA. CLUSULAS ABUSI-
VAS. ILEGALIDADE DA CLUSULA PENAL. SMULAS NS. 5 E 7 DO STJ.
CUMULAO DE PEDIDOS. INDENIZAO E MULTA DA CLUSULA
PENAL. SMULA N. 211 DO STJ. VIOLAO DO ART. 410 DO CC NO
CARACTERIZADA. SMULA N. 284 DO STF. REDUO DO QUANTUM DA
MULTA COMPENSATRIA. SMULA N. 7 DO STJ. ART. 460 DO CC. S-
MULA N. 211 DO STJ. 1. Os requisitos para caracterizao da onerosidade exces-
siva so: o contrato de execuo continuada ou diferida, vantagem extrema de outra
parte e acontecimento extraordinrio e imprevisvel, cabendo ao juiz, nas instncias
ordinrias, e diante do caso concreto, a averiguao da existncia de prejuzo que
exceda a lea normal do contrato, [...].
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RJLB, Ano 1 (2015), n 2 | 797
dificuldades por ele enfrentadas ou ligeiro agravamento da
obrigao. Neste sentido, as lies outrora j colacionadas,
porm, indispensveis, de Orlando Gomes (2008, p. 214), se-
no vejamos: A onerosidade excessiva da prestao apenas obstculo ao
cumprimento da obrigao. No se trata, portanto, de inexe-
cuo por impossibilidade, mas de extrema dificuldade. Con-
tudo, no se pode dizer que voluntria a inexecuo por mo-
tivo de excessiva onerosidade. Mas, precisamente porque no
h impossibilidade, a resoluo se realiza por motivo diverso.
[...] A onerosidade h de ser objetivamente excessiva, isto , a
prestao no deve ser excessivamente onerosa apenas em re-
lao ao devedor, mas a toda e qualquer pessoa que se encon-
trasse em sua posio.
Tambm neste sentido os apontamentos tecidos por
Samir Jos Caetano Martins (2007, p. 273): A doutrina costuma destacar que o acontecimento extraordi-
nrio e imprevisvel que enseja a resoluo por onerosidade
excessiva no o que afete apenas o devedor, sendo necess-
rio que afete toda uma categoria de devedores. Vale dizer:
no basta a dificuldade de adimplemento, situando-se a ex-
cessiva onerosidade a meio caminho entre a dificuldade e a
impossibilidade de executar a prestao. No importa para a
caracterizao da onerosidade excessiva, que a execuo da
prestao possa levar o devedor runa, ao contrrio do que
afirma alguns estudiosos brasileiros que recentemente se de-
bruaram sobre o tema.
Ao tratar acerca do tema, esclarece com preciso Fabr-
cio Zamprogno Matiello (2008, p. 153) que: Fatores pertinentes situao pessoal das partes no ensejam
a resoluo por onerosidade excessiva, pois apenas os que fo-
rem exgenos podero ser acolhidos como argumento capaz de liberar o devedor. Por isso, aspectos como a repentina per-
da da capacidade econmica, dificuldades na obteno de um
crdito dado como certo e outros acontecimentos relacionados
condio financeira especfica dos contraentes no autoriza
a resoluo da avena [...].
A ilustrar o ora asseverado colaciona-se julgado oriun-
do do Superior Tribunal de Justia. Confira-se:
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798 | RJLB, Ano 1 (2015), n 2
TEORIA DA IMPREVISO. Aplicabilidade, mesmo a mn-
gua de texto expresso, posto que exigncia da equidade. Ne-
cessidade, entretanto, de que se apresentem todos seus pres-
supostos. Entre eles, o de que os fatores imprevisveis alterem
a equivalncia das prestaes, tal como avaliadas pelas partes,
dai resultando empobrecimento sensvel para uma delas com
enriquecimento indevido da outra. Inexiste razo para invocar
essa doutrina quando, em contrato de mutuo, tenha o mutu-
rio dificuldade em cumprir aquilo a que se obrigou, em virtu-
de de prejuzos que sofreu. No h falar em desequilbrio das
prestaes nem em enriquecimento injustificvel do mutuan-
te.9
Destarte, diante das consideraes tecidas, afigura-se
correta a concluso exarada por Ricardo Pereira Lira (apud
MARTINS: 2007, p. 273), segundo a qual A excessiva onero-
sidade subsiste mesmo quando o contratante, desfavorecido no
confronto de sua prestao com a contraprestao do outro
contratante, disponha de recursos para o adimplemento, e assim
possa, querendo, suportar a perda do desequilbrio patrimonial
do contrato.
4. ONEROSIDADE VERSUS IMPOSSIBILIDADE DE
CUMPRIMENTO DA PRESTAO.
Consignou-se at o momento que a expresso onerosi-
dade excessiva reporta-se ideia de uma gravidade de magni-
tude a assolar o equilbrio contratual, sendo que meras dificul-
dades de adimplemento ou agravamento da obrigao no auto-
rizam a reviso ou resoluo contratual com base na Teoria da
Impreviso. Confira-se, neste sentido, as lies aduzidas por
Paulo Roque Khouri (2006, p. 157), para quem: O regime da onerosidade excessiva superveniente no pode
ser acionado diante de uma simples oscilao econmica para
mais ou para menos do valor da prestao. Essa oscilao en-
contra-se coberta pelos riscos prprios da contratao com-
9 STJ, REsp 5723/MG, Rel. Ministro EDUARDO RIBEIRO, TERCEIRA TURMA,
julgado em 25/06/1991, DJ 19/08/1991, p. 10991.
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preendida pelos riscos prprios do contrato.
Nada obstante, no se deve confundir excessiva onero-
sidade com impossibilidade de cumprimento da prestao, pos-
to que a onerosidade excessiva importa to-somente em difi-
culdade extrema de adimplemento. Neste sentido as lies de
Julio Alberto Daz (2004, p. 207): [...] no dever equiparar-se excessiva onerosidade com
impossibilidade de cumprimento. Na excessiva onerosidade, a
obrigao pode ser cumprida, mas seu adimplemento ir re-
presentar um sacrifcio de tal intensidade que poderia signifi-
car a runa do devedor.
Sendo assim, assevera Samir Jos Caetano Martins
(2007, pp. 272-273), lastreado nas lies de Orlando Gomes,
que a impossibilidade superveniente da prestao relaciona-se
ocorrncia de eventos de natureza relativa ao caso fortuito e
fora maior, de maneira que, nestes casos, o contratante eximir-
se- do contrato por circunstncias distintas onerosidade ex-
cessiva. In verbis: A excessiva onerosidade da prestao no se confunde com
sua impossibilidade. Na hiptese de impossibilidade superve-
niente da prestao, h que se perquirir sobre a configurao
de caso fortuito ou fora maior, como j observava Orlando
Gomes, muito antes da consagrao do instituto no Cdigo
Civil de 2002: Necessrio ainda que a alterao imprevisvel de fato determine a dificuldade de o contratante cumprir a
obrigao, por se ter tornado excessivamente onerosa a pres-
tao. A modificao quantitativa da prestao h de ser to
vultosa que, para satisfaz-la, o devedor se sacrificaria eco-
nomicamente. Chega-se a falar em impossibilidade. Pretende-
se, at, criar a categoria de impossibilidade econmica, ao la-
do da fsica e da jurdica, para justificar a resoluo do contra-
to, mas se a equiparao procedesse, estar-se-ia nos domnios
da fora maior, no cabendo, em conseqncia, outra constru-
o terica. A onerosidade excessiva no implica, com efeito,
impossibilidade superveniente de cumprir a obrigao, mas
apenas dificulta, embora extremamente, o adimplemento.
Porque se trata de dificuldade, e no de impossibilidade, de-
corre importante conseqncia, qual seja a da necessidade de
verificao prvia, que se dispensa nos casos de fora maior.
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800 | RJLB, Ano 1 (2015), n 2
Aliado onerosidade excessiva da prestao encontra-
se atrelado outro requisito objeto de profusa discusso doutri-
nria, qual seja, que o agravamento exagerado da prestao
concorra para a extrema vantagem da outra parte. Segundo
Joo Hora Neto (2003, p. 150), tal requisito estaria a denotar o
copioso lucro experimentado pelo contratante que no sofre as
malficas consequncias advindas da excessiva onerosidade,
representando, por conseguinte, ganho patrimonial injustific-
vel: Exagerada vantagem para a outra parte: trata-se do enri-
quecimento devido, do lucro exorbitante aproveitado pela parte
contratante que no sofre a onerosidade excessiva, e que refle-
te, de conseguinte, num considervel aumento patrimonial a
seu favor.
Muitos autores sustentam que o requisito em destaque,
por demandar dificuldade em sua apreciao / aferio, acaba
por impossibilitar a aplicao da Teoria da Impreviso, tornan-
do o instituto fadado ao desuso. o que se infere das lies
preconizadas por Otavio Luiz Rodrigues Junior (2002, p. 125): Nesse aspecto, o novo Cdigo Civil, como ser adiante expli-
citado, adotou tcnica no muito perfeita ao exigir a concomi-
tncia da prestao de uma das partes se tornar excessiva-
mente onerosa e a extrema vantagem para a outra, crian-
do pressupostos formais que em muito reduzem o mbito de
aplicao da alterao das circunstncias de fato.
Alm disso, tecem-se severas crticas ao pressuposto
sob o argumento de que a excessiva onerosidade no obrigato-
riamente ocasiona uma extrema vantagem ao outro contratante.
Confira-se, neste sentido, os apontamentos de Fabola Meira de
Almeida Santos (2009, p. 122): [...] o requisito de extrema vantagem para a outra parte aca-
ba praticamente impedindo a aplicao do artigo em tela, uma
vez que a onerosidade sofrida por uma parte no acarreta ne-
cessariamente em extrema vantagem outra, ou melhor, mui-
tas vezes tambm origina um prejuzo para o outro contratan-
te que tambm tem interesse na reviso das bases contratuais
com fulcro na manuteno do pacto.
No mesmo sentido, os apontamentos tecidos por Samir
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RJLB, Ano 1 (2015), n 2 | 801
Jos Caetano Martins (2007, p. 274), para quem a excessiva
onerosidade da prestao a cargo do devedor no implica, ne-
cessariamente, no enriquecimento do credor.
H ainda autores que sugerem que o legislador preten-
deu excluir a possibilidade de resoluo contratual quando os
malficos acometimentos oriundos do evento extraordinrio e
imprevisvel recassem sobre ambos os contratantes. Perfilhan-
do este entendimento, Julio Alberto Daz (2004, p. 208): O texto do novo Cdigo Civil foi meticuloso ao exigir que a
excessiva onerosidade para uma das partes deva significar,
necessariamente, extrema vantagem para a outra. Evidente-
mente, quis o codificador eliminar a possibilidade de resolu-
o quando os efeitos do acontecimento extraordinrio e im-
previsvel incidissem por igual em ambos contratantes, tiran-
do parte das vantagens previstas tanto do devedor quanto do credor.
Nada obstante, em que possam pesar os posicionamen-
tos destoantes, entendemos que o requisito vem ao encontro do
seu correlato a fim de evidenciar o desequilbrio sofrido pelo
acordo originariamente entabulado. Em outras palavras, acredi-
tamos que o predicativo extrema vantagem no se trata de um
requisito peremptrio por assim dizer, atuando mais como um
coadjuvante / colaborador na apurao da onerosidade excessi-
va sofrida pela prestao ou, em outro vernculo, na perda de
mutualidade entre a prestao e a contraprestao. Assim que
entendemos com razo Orlando Gomes (2008, p. 215) ao ano-
tar que a excessiva onerosidade torna-se ainda mais evidencia-
da quando se vislumbra a obteno de extrema vantagem pela
outra parte. In verbis: A lei acrescenta, em terceiro lugar, que excessiva onerosi-
dade da prestao seja correlata a extrema vantagem da ou-
tra parte. O requisito tem sido muito criticado, mas compre-
ensvel na medida em que o fundamento da reviso e resolu-
o por onerosidade excessiva justamente o desequilbrio
entre as prestaes, isto , a perda de reciprocidade entre elas.
E este desequilbrio sem dvida mais evidente quando h,
de um lado, onerosidade excessiva, e, de outro, vantagem ex-
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trema. Contudo, a apurao da extrema vantagem da parte
credora da prestao tornada excessivamente onerosa no de-
ve ser realizada com muita rigidez, sob pena de inviabilizar a
aplicao da figura em anlise.
Conforme preconiza Tartuce (2007, p. 166), a onerosi-
dade a fomentar a reviso ou resoluo contratual no necessita
da conjugao plena da extrema vantagem experimentada pela
outra parte. Tanto assim que a referida discusso fora objeto
da IV Jornada de Direito Civil do Conselho da Justia Federal,
ocasio na qual foi aprovado o Enunciado n 365, segundo o
qual: A extrema vantagem do art. 478 deve ser interpretada
como elemento acidental da alterao das circunstncias, que
comporta a incidncia da resoluo ou reviso do negcio por
onerosidade excessiva, independentemente de sua demonstra-
o plena.
Destarte, conclui-se que, malgrado seja o tema objeto
de conturbada discusso doutrinria, o aplicador do direito de-
ve ter sempre em mente os novos paradigmas que orientam a
consecuo dos contratos contemporneos, de maneira a no
empreender interpretao que resulte no desuso do moderno
instituto disponibilizado pelo legislador ptrio, ferramenta de
promoo da justia e equilbrio contratual.
5. ONEROSIDADE EXCESSIVA VERSUS LESO.
No obstante no instituto da leso se verifique a exis-
tncia de desproporo manifesta entre as prestaes pactua-
das, ressalva-se, desde j, que inexiste confuso com a onero-
sidade excessiva que consiste em um dos requisitos para a de-
flagrao da Teoria da Impreviso. A leso tem previso no art.
157 do Cdigo Civil e, segundo Gagliano e Pamplona Filho
(2009, p. 278), caracteriza-se quando, em virtude de abuso da
inexperincia, necessidade econmica ou leviandade de um dos
contratantes, ocorre prejuzo da desproporo entre as presta-
es de um determinado contrato.
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Verifica-se, assim, que para a ocorrncia / caracteriza-
o da leso em um determinado negcio jurdico, faz-se im-
prescindvel a confluncia de dois elementos: um de ordem
objetiva a desproporo das prestaes; e outro de natureza
subjetiva a inexperincia, a iminente necessidade ou a levi-
andade, o que nos leva a constatar que a leso vcio de con-
sentimento que enseja a anulao do negcio jurdico, confor-
me o art. 171, II do Cdigo Civil. Assim que so inconfund-
veis as referidas noes, pois, segundo anota com preciso Ro-
drigues Junior (2002, p. 101): [...] a leso inconfundvel com o fenmeno da impreviso:
(a) a leso contempornea ao nascimento do contrato; a im-
previso surge posteriormente, quando da sua execuo; (b) a
leso pressupe um requisito subjetivo, baseado na inexperi-
ncia ou na necessidade do contratante; a impreviso dispensa
tais requisitos, exigindo apenas a ausncia de culpa e a previ-
so de um bonus pater familias; (c) a leso qualificvel ora
como vcio de consentimento, ora como causa de resciso dos
contratos; a impreviso qualificvel como causa de resolu-
o ou reviso dos contratos; (d) a leso exige o requisito
objetivo da desproporo entre as prestaes; a impreviso
no exige a desproporo, mas o agravamento das condies
de execuo do contrato por uma das partes.
Anote-se, por oportuno, que a jurisprudncia ptria
tambm no confunde as referidas noes, conforme sobressai
do aresto abaixo colacionado, seno vejamos: CIVIL E PROCESSO CIVIL. COMPRA DE SAFRA FU-
TURA DE SOJA. CIRCUNSTNCIAS DO CASO CON-
CRETO. CONTRATO ALEGADO COMUTATIVO. RE-
CURSO ESPECIAL PROVIDO. ACRDO IMPROCE-
DENTE. [...] III Tendo o aresto recorrido determinado a re-
soluo do contrato com base na onerosidade excessiva su-
perveniente (artigo 478 do Cdigo Civil), revela-se imperti-
nente, tambm, a alegao de ofensa ao artigo 157, 1, do
Cdigo Civil, segundo o qual a desproporo entre as obriga-
es para efeito da aplicao do instituto da leso deve ser
apurada ao tempo em que celebrado o contrato. Isso porque o
Acrdo est ancorado na teoria da impreviso e no no insti-
tuto da leso. Incidncia da Smula 284 do Supremo Tribunal
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804 | RJLB, Ano 1 (2015), n 2
Federal. [...]10
Conclui-se assim que, a despeito de em um primeiro
momento at se verificar uma ligeira confuso entre o fenme-
no da excessiva onerosidade e o instituto da leso, as noes
relativas a cada um deles no se confundem em face das consi-
deraes supra externadas.
6. ONEROSIDADE EXCESSIVA VERSUS ENRIQUECI-
MENTO SEM CAUSA
No novidade que o Cdigo Civil ptrio, atento s
tendncias e aos novos paradigmas que permeiam hodierna-
mente os negcios jurdicos e as contrataes em geral, estipu-
lou vedao ao enriquecimento sem causa (artigo 884 do CC),
a fim de manter o equilbrio social. Anota James Eduardo Oli-
veira (2010, p. 781) que o enriquecimento sem causa liga-se
ideia de transferncia patrimonial sem lastro tico e jurdico e
remonta longnqua poca dos jurisconsultos de Roma. Confi-
ra-se: O instituto do enriquecimento ilcito, nascido da genialidade
dos jurisconsultos da Cidade Eterna, persevera como impor-
tante instrumento legal vocacionado invalidao de transfe-
rncias patrimoniais desprovidas de substrato tico e jurdico.
Como advertia CCERO, a morte, a misria, a dor e outros
acidentes corporais e exteriores no so tanto contra a nature-
za como tomar de algum o que lhe pertence, enriquecendo-se
s suas custas. Tal atitude s tende a arrasar qualquer socie-
dade entre os homens.
Inolvidveis, outrossim, os ensinamentos de Caio Mrio
da Silva Pereira (2009, p. 469), para quem: Toda aquisio patrimonial deve decorrer de uma causa, ain-
da que seja ela apenas um ato de apropriao por parte do
agente, ou um ato de liberalidade de uma parte em favor da
outra. Ningum enriquece do nada. O sistema jurdico no
admite, assim, que algum obtenha um proveito econmico s
10 STJ, REsp 835.498/GO, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA,
julgado em 18/05/2010, DJe 01/06/2010.
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RJLB, Ano 1 (2015), n 2 | 805
custas de outrem, sem que esse proveito decorra de uma causa
juridicamente reconhecida. A causa para todo e qualquer en-
riquecimento no s deve existir originariamente, como tam-
bm deve subsistir, j que o desaparecimento superveniente
da causa do enriquecimento de uma pessoa, s custas de ou-
tra, tambm repugna o sistema (Cdigo Civil, art. 885).
Em tempo, lembra Venosa (2010, p. 218) que por sem
causa deve ser entendido o ato jurdico completamente destitu-
do de lastro pela ordem jurdica. Ressalva o renomado autor,
outrossim, que se a causa, ainda que existente, for injusta, con-
figurar-se- o enriquecimento ilcito. Destarte, no rende maio-
res dificuldades se concluir que no enriquecimento sem causa
h estrita conexo entre a obteno de vantagem por uma das
partes e o assolamento econmico da outra. Neste sentido, as
lies preconizadas por Venosa (2010, 218): noo de enriquecimento antepe-se a noo de empobre-
cimento da outra parte. So termos que se usam em sentido
eminentemente tcnico e no vulgar, bvio. A relao de
imediatidade, o liame entre o enriquecimento e o empobreci-
mento fechar o crculo dos requisitos para a ao especfica.
Da vantagem de um patrimnio dever resultar a desvanta-
gem de outro.
Quando tratamos da caracterizao da onerosidade ex-
cessiva, observamos que, em geral, a sua configurao parte
exatamente da confrontao entre o auferimento de vantagem
por um dos contratantes em detrimento do outro, donde nos
lcito, e no nos afigura desarrazoado, concluir pela existncia
de uma ntima correlao entre onerosidade excessiva e o enri-
quecimento sem causa. Consignou-se, naquela oportunidade,
que a excessiva onerosidade das prestaes no precisa ser apta
a fomentar o enriquecimento de fato do contratante beneficia-
do, circunstncia que, a uma primeira vista, poderia ser alvo de
censura por alguns crticos quanto a efetiva existncia da corre-
lao sustentada.
No entanto, conforme aduzimos acima, o enriquecimen-
to sem causa configura-se simplesmente a partir do momento
em que uma das partes obtm ganhos patrimoniais sem uma
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806 | RJLB, Ano 1 (2015), n 2
ldima razo, sendo prescindvel que essa atribuio patrimoni-
al concorra para o seu desmesurado enriquecimento.
A corroborar a posio aqui externada quanto a correla-
o existente entre a excessiva onerosidade e o enriquecimento
ilcito, os sucintos, porm precisos apontamentos tecidos por
Samir Jos Caetano Martins (2007, p. 274): a excessiva one-
rosidade da prestao a cargo do devedor no implica, necessa-
riamente, no enriquecimento do credor. E, no sistema brasilei-
ro, optou-se por articular o reconhecimento da onerosidade
excessiva ao repdio ao enriquecimento sem causa, consagrado
em clusula geral no art. 884 do CC/02.
Neste contexto, no restam dvidas de que, no sistema
brasileiro, a noo de onerosidade excessiva, como um dos
requisitos para a deflagrao da reviso contratual, est indis-
sociavelmente atrelada ao repdio da ordem jurdica pelo enri-
quecimento sem causa conforme sustentado, motivo pelo qual
correto afirmar que, em ltima anlise, a reviso tem por es-
copo, outrossim, tutelar determinadas situaes a fim de obsta-
culizar o locupletamento ilcito.
7. CONCLUSO.
No seria correta e condizente ao atual sistema contra-
tual a manuteno de um pacto assolado por desequilbrio
econmico provocado por um evento extraordinrio e imprevi-
svel gerador de excessiva onerosidade das prestaes origina-
riamente ajustadas. Da porque, uma vez nestes termos vislum-
brada a alterao das circunstncias originrias, se justifica o
abrandamento do pacta sunt servanda, permitindo-se, a depen-
der da magnitude do assolamento sobrevindo, a manuteno do
contrato por meio de sua reviso ou, sendo esta invivel, o ree-
quilbrio do status econmico dos contratantes a partir da reso-
luo do acordo.
A compreenso do significado de base objetiva do ne-
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RJLB, Ano 1 (2015), n 2 | 807
gcio jurdico fundamental para a compreenso da reviso
contratual, uma vez que a sua noo guarda estrita correlao
s circunstncias originrias, que acrescida do predicativo alte-
rao, corresponde a um dos requisitos indispensveis confi-
gurao do ambiente propcio aplicao do instituto.
No existe uma frmula matemtica para se determinar
quando se est diante de uma prestao maculada por onerosi-
dade excessiva superveniente, tendo o legislador ptrio deixado
ao alvitre do magistrado, ante o caso concreto, a avaliao da
intensidade do agravamento da prestao.
Por uma questo de justia contratual, a reviso somen-
te se justifica naquelas hipteses em que a onerosidade resulta
de acontecimentos que atingem toda a sociedade. Esses aconte-
cimentos so chamados de extraordinrios e imprevisveis. O
mais importante ressaltar que a alterao do contrato, ou at
mesmo sua resoluo, no se dar em razo de acontecimentos
que atinjam apenas pessoa do contratante.
Dessa maneira os esclarecimentos feitos nesse trabalho
tm a finalidade de analisar muitas demandas que, fundamen-
tadas na onerosidade excessiva, no se adequam situao em
que ser possvel a reviso contratual, pois so acontecimentos
individuais da esfera privada do contratante.
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