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A INSTRUÇÃO PÚBLICA SECUNDÁRIA E AS NARRATIVAS DAS AUSÊNCIAS NA CIDADE DE GOIÁS: UMA POSSIBILIDADE DE ABORDAGEM DAS FONTES E DA HISTORIOGRAFIA (1854-1872) Wellington Coelho Moreira 97 Programa de Pós-Graduação em História Universidade Federal de Goiás Resumo: O século XIX no Brasil e em Goiás, apesar de suas contradições, foi o século da instrução pública dada à quantidade de leis, propostas, debates, relatórios, além de uma vasta diversidade de documentos produzidos sobre a educação. No entanto, cristalizou-se na historiografia que o Período Imperial, no que tange à educação, foi um período de “trevas”, marcado pela ineficiência da instrução pública. Tal visão contribuiu para que a história da educação do século XIX fosse completamente descaracterizada. Todavia, a análise pormenorizada dos relatórios dos presidentes da Província de Goiás, com as fontes colhidas no Arquivo Histórico Estadual, no Instituto de Pesquisa e Estudos do Brasil Central (IPEH- BC) e na Biblioteca Nacional, revela que a educação sempre esteve entre as principais preocupações destes governantes, e quando não, recebia manifestações de cobrança por parte da população goiana. Na atualidade, vários pesquisadores contribuíram com projetos de pesquisas que valorizam as fontes guardadas nos arquivos históricos. Em Goiás, destacam-se os trabalhos de Genesco Bretas e Nancy Ribeiro de Araújo e Silva. Frutos de uma época e das ferramentas de pesquisa que dispunham eles reproduziram as assertivas do atraso de salários, da desqualificação dos professores primários e secundários, do desinteresse dos pais em instruir seus filhos por ignorância ou por problemas financeiros, entre outras afirmações. Em síntese, destacaram o “discurso da falta”. Deseja-se debater o processo da Instrução Pública Secundária para além de suas ausências, tentando perceber por detrás destes discursos outras dimensões deste projeto em curso do século XIX. Por detrás das narrativas das ausências, ver- se-á um dinâmico e paulatino processo em curso da Instrução Pública em Goiás. PALAVRAS-CHAVE: Instrução Pública Secundária, Documentos/Fontes, Historiografia, Discursos/Narrativas da Falta. 97 Mestre em História Universidade Federal de Goiás (UFG) e doutorando em História pela mesma instituição de ensino superior. [email protected]. 206 III EHECO – CatalãoGO, Agosto de 2015

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A INSTRUÇÃO PÚBLICA SECUNDÁRIA E AS NARRATIVAS DASAUSÊNCIAS NA CIDADE DE GOIÁS: UMA POSSIBILIDADE DE

ABORDAGEM DAS FONTES E DA HISTORIOGRAFIA (1854-1872)

Wellington Coelho Moreira97

Programa de Pós-Graduação em HistóriaUniversidade Federal de Goiás

Resumo: O século XIX no Brasil e em Goiás, apesar de suas contradições, foi o século dainstrução pública dada à quantidade de leis, propostas, debates, relatórios, além de uma vastadiversidade de documentos produzidos sobre a educação. No entanto, cristalizou-se nahistoriografia que o Período Imperial, no que tange à educação, foi um período de “trevas”,marcado pela ineficiência da instrução pública. Tal visão contribuiu para que a história daeducação do século XIX fosse completamente descaracterizada. Todavia, a análisepormenorizada dos relatórios dos presidentes da Província de Goiás, com as fontes colhidasno Arquivo Histórico Estadual, no Instituto de Pesquisa e Estudos do Brasil Central (IPEH-BC) e na Biblioteca Nacional, revela que a educação sempre esteve entre as principaispreocupações destes governantes, e quando não, recebia manifestações de cobrança por parteda população goiana. Na atualidade, vários pesquisadores contribuíram com projetos depesquisas que valorizam as fontes guardadas nos arquivos históricos. Em Goiás, destacam-seos trabalhos de Genesco Bretas e Nancy Ribeiro de Araújo e Silva. Frutos de uma época e dasferramentas de pesquisa que dispunham eles reproduziram as assertivas do atraso de salários,da desqualificação dos professores primários e secundários, do desinteresse dos pais eminstruir seus filhos por ignorância ou por problemas financeiros, entre outras afirmações. Emsíntese, destacaram o “discurso da falta”. Deseja-se debater o processo da Instrução PúblicaSecundária para além de suas ausências, tentando perceber por detrás destes discursos outrasdimensões deste projeto em curso do século XIX. Por detrás das narrativas das ausências, ver-se-á um dinâmico e paulatino processo em curso da Instrução Pública em Goiás.

PALAVRAS-CHAVE: Instrução Pública Secundária, Documentos/Fontes, Historiografia,Discursos/Narrativas da Falta.

97 Mestre em História Universidade Federal de Goiás (UFG) e doutorando em História pela mesma instituição de ensino superior. [email protected].

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INTRODUÇÃO

O século XIX no Brasil e em Goiás, apesar de suas contradições, foi o século da

instrução pública dada à quantidade de leis, propostas, debates, relatórios, além de uma vasta

diversidade de documentos produzidos sobre a educação. No entanto, cristalizou-se durante o

Período Republicano que o período que o antecedeu, Período Imperial, no que tange à

educação, foi um período de “trevas”, isto é, relacionado à inoperância e a ineficiência da

instrução pública. Tal visão contribuiu para que a história da educação do século XIX fosse

completamente descaracterizada. Segundo Gondra, “até recentemente, o século XIX se via

representado na historiografia como um tempo negativo, no qual pouco ou nada se fizera em

termos de matéria educacional, pois os investimentos importantes estariam associados ao

regime republicano, o tempo positivo” (2011, pg. 13).

Para Wolmir Amado, o século XIX foi um tempo de grandes mudanças e eventos

históricos, porém, pouco pesquisado, embora possua inúmeras fontes disponíveis para

pesquisa. Sobre ele produziu-se uma enorme lacuna, principalmente, as relacionadas às

histórias regionais do passado imperial goiano (1997, p. 9).

No entanto, quando se analisa os vários relatórios dos presidentes da Província de

Goiás, entrecruzamento estas fontes com outros documentos recolhidos nos arquivos de Goiás

do Arquivo Histórico Estadual (AHE) e da Biblioteca Nacional (BN), ver-se-á que a educação

sempre esteve entre as principais preocupações dos representantes provinciais de Goiás, dado

ao extenso debate produzido pelos personagens históricos deste período. Por detrás de

“simples” letras impressas ou manuscritas, esconde-se toda uma riqueza de sentidos temporais

e espaciais sobre a instrução pública secundária goiana. A análise historiográfica deve permitir

que o pesquisador possa transcender as narrativas de um documento, sublevando-as, para que

assim ele possa perceber no invólucro destes documentos “políticos e administradores que

não eram frios burocratas” e, deste modo, “teremos a surpresa de descobrir paixão na

burocracia” (BERTAZZO, 1998, p. 11). Afinal, a história é feita de homens que buscaram dar

respostas aos desafios de sua época.

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Neste sentido, apresenta-se como objeto de pesquisa desta análise a Instrução

Pública Secundária, particularmente, o Liceu, situado na Cidade de Goiás, entre o período de

1854 a 1872, e a proposta de reforma da Instrução Pública, apresentada à Assembléia

Legislativa Provincial pelos vários presidentes e vice-presidentes desta província, os quais

pretendiam suprimir o Liceu logo que o Seminário Episcopal fosse inaugurado. Segundo os

relatórios, o Liceu seria extinto e as cadeiras (aulas/disciplinas) que não pertenciam ao quadro

de aulas proposto pelo regimento do Seminário seriam anexadas/transferidas para este

instituto religioso (BRETAS, pg. 260- 278; FREITAS, 1999, pg. 10-11; RELATÓRIO, 1861,

pg. 5; RIBEIRO, 2014, pg. 45-46; SILVA, 2006, pg. 216-218). O cerne que justificou esta

proposta de reforma descrita pelas autoridades provinciais era sempre o atraso de pagamentos

de funcionários públicos, a falta de recursos financeiros, a ausência de professores

qualificados, o quadro deficitário e evasivo de alunos do Liceu, entre outras justificativas.

Pela análise qualitativa dos documentos empíricos à luz da teoria relacionada a

esta temática pretende-se analisar brevemente, como a historiografia contribuiu para uma

visão deficitária da educação secundária, reproduzindo em determinados momentos a visão

descontextualizada dos relatórios dos presidentes da Província de Goiás e de outras fontes

utilizadas nestas pesquisas, especificamente, nas obras de Nancy Ribeiro de Araújo e Silva

(1975) e de Genesco Bretas (1991), entre outros historiadores da educação goiana. Muitos

destes pesquisadores acabaram por dar voz às fontes sem, contudo, perceber outros dados por

detrás destes documentos. Todavia, os historiadores estão limitados há um tempo histórico

específico e às ferramentas de pesquisas de sua época. Tais pesquisam representam um grande

avanço para a época e servem de referencial teórico na atualidade.

Por fim, deseja-se destacar que ao contrário de várias análises documentais e

historiográficas que afirmam que no Império brasileiro não havia preocupação alguma com a

Instrução Pública Secundária e que esta era totalmente desorganizada, afirmar que existiram

nesta época limitações sociais e políticas relacionadas à educação e, concomitantemente, um

rico e vasto processo de constituição da educação brasileira/goiana.

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A HISTORIOGRAFIA E AS FONTES EDUCACIONAIS

No tocante a Instrução Pública Secundária brasileira e goiana, é quase que

unânime na historiografia referir-se ao Período Imperial como um tempo marcado pelo déficit

financeiro, cujo discurso oficial foi pautado pela diretriz da falta de recursos que subsidiassem

a educação. Oriundo desta leitura descontextualizada, vários pesquisadores descaracterizaram

profundamente a educação oitocentista, não reconhecendo no decurso desta história um

processo educacional em construção, pois segundo eles, a educação no século XIX nada mais

foi do que um fracasso geral. Nada se enxergou além de faltas, ausências e irregularidades.

Destarte, a educação imperial foi descrita sempre pela história do “não houve” ou do que “não

existiu”.

Fernando de Azevedo foi um dos pensadores centrais da história da educação

brasileira que associou o Período Imperial às idéias de atraso, de pouco investimento

financeiro e de improvisação do ensino, contribuindo deste modo, para a efetivação de uma

leitura depreciativa da Instrução Pública deste período. Segundo ele, entre a expulsão dos

jesuítas até a chegada da família real no Brasil em 1808, ocorreu um “largo hiatus”, um lapso

educacional foi implantado neste período. Em sua visão, o Ato Adicional de 1834, que

promoveu a descentralização do ensino no império, agravou ainda mais a situação da

educação, dada a falta de uma orientação geral e coletiva para a instrução pública deste

período. Por conseguinte, “a educação teria de arrastar-se, através de todo o século XIX,

inorganizada, anárquica, incessantemente desagregada” (AZEVEDO, 1958, p. 76). Para

Azevedo, não existiu um plano geral de organização de educação no Período Imperial. Este

apenas efetivar-se-ia com o advento da República.

O ensino público estava condenado a não ter organização, quebradas como foram assuas articulações e paralisado o centro diretor nacional, donde se deveria propagar àsinstituições escolares dos vários graus uma política de educação, e a que competiacoordenar, num sistema as fôrças e instituições civilizadoras, esparsas pelo territórionacional. Nem as províncias, sob cuja alçada ficaram apenas o ensino primário e osecundário, podiam completar os seus sistemas e erguê-los ao nível das escolassuperiores, nem o governo imperial podia levantar, sobre uma base sólida, do ensinoelementar e médio, um sistema nacional de educação. (IDEM, 1958, pg. 75)

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Sua obra, A Cultura Brasileira, apresentou ainda outros argumentos negativos

sobre a Instrução Pública durante o império: ensino superior dominado pelo caráter utilitário e

profissional, a fragmentação do ensino público pelo Ato Adicional de 1834, a dualidade dos

sistemas educacionais, a ausência de uma educação popular que contribuiu para o aumento do

analfabetismo brasileiro, a falta de recursos financeiros e o número escasso de alunos, a

valorização do ensino particular-religioso, entre outros. Tais justificativas tinham por intenção

mostrar a decadência da educação no Período Imperial (IDEM, 1958, p.61-114). A instrução

pública do período oitocentista, aplicada à visão azevediana, é de uma escola situada fora de

seu tempo, de uma “escola sem lugar”.

A clássica obra de Fernando de Azevedo é utilizada como referência obrigatória

por parte dos pesquisadores da educação brasileira. O problema reside em usar suas

afirmações como verdades históricas sem correlacioná-las com outras fontes e documentos.

Deve-se ainda levar em conta que cada pesquisador é fruto de seu tempo e utiliza as

ferramentas que dispõe para efetuar o seu discurso histórico. Segundo André Paulo Castanha,

Não se pode esquecer de levar em conta o tempo e o espaço no qual Azevedoproduziu o seu discurso histórico. Ele está localizado no auge do Estado Novo ecomo um agente daquele Estado em construção releu a história da educaçãobrasileira a partir da óptica de seu tempo, ou seja, pela perspectiva dos renovadores,da centralização posta em prática pelos estadonovistas. Seu objetivo era mostrar oprogresso da cultura, enfatizando que as proposições defendidas pelo seu grupoeram as melhores para o país, naquele momento. (2006, p. 176)

Em Goiás, muitas idéias e princípios sobre a história da instrução pública

indicados por Fernando de Azevedo, se fizeram presentes em textos e documentos produzidos

por historiadores da educação. Destacam-se as pesquisas da Professora Nancy Ribeiro de

Araújo e Silva (1975) e do Professor Genesco Ferreira Bretas (1991). Tais estudos

constituem-se como referência obrigatória para o conhecimento da história da educação

goiana, pois foram eles os primeiros a tratarem de modo sistematizado a temática da educação

correlacionando-a com uma variedade de fontes de pesquisa.

Nancy dividiu a história da educação goiana em dois momentos. O primeiro

refere-se ao Período Imperial, denominado por ela por tradição. Por sua vez, o segundo,

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Período Republicano, foi chamado de renovação. Longe de ser uma simples nomenclatura,

Goiás foi analisado pela esfera do atraso e do isolamento, pela falta de comunicação com

outras províncias e pela decadência econômica em relação à capital do império. Segundo

Nancy,

O desenvolvimento educacional, por sua vez, vinculou-se, por inerente, à oscilanteeconomia regional, condicionada à desfavorável localização geográfica – ambos àmercê de injunções políticas e de manifestações da capacidade administrativa dosgovernantes. Dentre outros fatores, estes foram causa de um status cultural e socialmenos expressivos. (SILVA, 1975, p. 23)

Ainda segundo ela, nem mesmo as sucessivas reformas que ocorreram, as

melhorias relacionadas ao regulamento da Instrução Pública, além da criação em Goiás de três

institutos de ensino, o Liceu, o Seminário Episcopal e a Escola Normal, durante o século XIX,

foram capazes de consolidar as mudanças necessárias para o desenvolvimento destas terras

sertanejas. Tais mudanças se efetivariam com a República, tida como solo fértil em que estas

sementes finalmente desenvolveram e produziram frutos (IDEM, 1975, pg. 47). Na visão de

Nancy, Goiás permaneceu parado entre a/o colônia/império até a República, tempo em que

ocorreram, segundo ela, mudanças significativas na economia brasileira e, conseqüentemente,

na educação. “Do nada”, segundo a autora, este novo advento político e administrativo trouxe

para Goiás mudanças estruturais: Correios, meios de transporte (linha férrea), mudanças na

economia e na educação (IDEM, 1975, p. 30-31). Utilizando-se dos relatos dos presidentes da

Província de Goiás e textos produzidos pelos vários memoralistas estrangeiros, além de fontes

impressas e manuscritas, Nancy acabou por dar voz aos documentos por ela utilizados.

Genesco Ferreira Bretas, professor de História da Educação, da Faculdade de

Educação da UFG, produziu um livro denominado, A História da Instrução Pública em

Goiás. Esta obra apresenta uma riqueza de detalhes e documentos sobre o passado

educacional goiano, deste os tempos da colonização portuguesa até o período republicano. O

trabalho empreendido por Genesco é sem sombra de dúvidas um avanço fantástico em termos

de pesquisa empírica, de acervo de documentos extraídos de vários arquivos nas cidades de

Goiânia, Cidade de Goiás, Rio de Janeiro, entre outras localidades.

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Contudo, Genesco, a semelhança de Fernando de Azevedo, reproduziu em parte as

informações coletadas nas fontes documentais por ele utilizadas. Ao relatar a história do

Liceu, no século XIX, Genesco enfatizou a história deste instituto educacional pela narrativa e

pela cronologia extraída quase que única e exclusivamente dos relatórios provinciais. Dados

relacionados ao baixo salário docente, o atraso de pagamentos dos salários, à busca de outras

profissões por parte dos professores para complementar a renda, o baixo número de alunos

que freqüentam as aulas do Liceu, a falta de um lugar adequado para este instituto, a rotulação

de “letra morta” em relação às leis educacionais produzidas no período imperial, dentre outros

temas, foram negativas extraídas dos relatórios dos presidentes da Província de Goiás

(BRETAS, 1991, p. 228-303). O discurso da falta impregnou o trabalho pomposo deste

historiador goiano.

Todavia, Genesco nunca deixou de reconhecer e valorizar a relevância e a

importância da instrução pública durante o Período Imperial. Segundo ele, a educação deste

período, apesar de seus limites, teve um papel de destaque e de atenção por parte dos

governos provinciais de Goiás.

Não houve no Brasil outro período em que se discutissem tanto os problemas dainstrução pública quanto o período imperial. Desde a Constituinte de 1824 até o anode 1888, a instrução ocupou as atenções dos representantes dos poderes legislativo eexecutivo, como se quisessem dizer, em linguagem administrativa de hoje,prioritário, “esse importante ramo dos serviços públicos, frase que invariavelmenteos presidentes abriam o assunto em suas mensagens anuais à AssembléiaLegislativa. (1991, p. 416)

Para Mirian Bianca Amaral Ribeiro, tanto Genesco Bretas quanto Nancy Ribeiro

de Araújo e Silva,

Concordam que a instrução pública não foi objeto de uma intervenção que aconsiderasse, efetivamente, uma tarefa prioritária do Estado. Isto não quer dizer quenão houvesse uma política pública para a educação em Goiás, muito menos que nãose discutisse esta questão nesse momento. Ao longo do século XIX, observou-se umdebate acalorado sobre o significado, a organização e as atribuições da escola, entãodenominada instrução pública. (2014, p. 22)

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Em 1976, a Irmã Áurea Cordeiro Meneses, produziu uma dissertação de mestrado,

defendida na Universidade Federal de Goiás (UFG), tendo por tema de pesquisa, O Colégio

Santa Clara e sua influência educacional em Goiás. Após fazer um balanço histórico da

situação econômica e de relacioná-la com realidade educacional de Goiás, Meneses

apresentou a seguinte situação escolar no Estado: “As escolas oficiais, além de se

constituírem em número bastante reduzido, instalavam-se, em geral, em casas ou prédios

cedidos pela comunidade, não oferecendo assim, adequação aos objetivos escolares” (1977, p.

7). Segundo ela, os religiosos ligados a educação confessional, contribuíram para a melhoria

do ensino em Goiás em várias localidades deste Estado, assim como, a presença de várias

escolas particulares no campo e na cidade. Em geral, estas instituições de ensino foram

mantidas por grupos de famílias interessadas em educar os seus filhos, sendo parte delas

subsidiadas pelo Estado (1977, p. 7-10). A situação do ensino público era caótica e teria o seu

apogeu somente nos anos subseqüentes à instalação da República (1997, p. 162-165). Na

visão de Meneses, entre a fase de transição do regime imperial para o republicano a educação

goiana estava respaldada pela Igreja e por educadores particulares. Seria, portanto, quase que

inócua a atuação do poder público no campo da educação.

Outro religioso e escritor dominicano em Goiás, Frei José Maria Audrin, que

habitou e atuou no norte deste Estado, hoje Estado do Tocantins, em plena República, definiu

como precária e preocupante a situação da instrução pública a qual a população goiana estava

submetida. Segundo ele, a instrução religiosa era praticamente o único meio de acesso ao

conhecimento desta parcela dos moradores nortistas do Estado. O analfabetismo acometia a

maioria destes povoados. Contudo, Audrin ressalta que havia entre estes sertanejos o desejo

de terem acesso à instrução pública.

Vejamos, agora, o fato da existência da instrução entre os sertanejos, quais osesforços para alcançá-la. A maioria do povo, não há dúvida, é analfabeta, e todavia égeral o desejo de instrução. Um indício é a presença habitual, em todo arraial ousítio, de um “letrado”, capaz ao menos de decifrar ou rabiscar uma carta, de fazer ascoisas mais simples. Outro indício é o gôsto e mesmo certa avidez dessa gente pelasleituras. É costume reunirem-se em tôrno de um leitor, em dias e horas de descanso.(AUDRIN, 1963, pg. 164)

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Audrin retratou ainda a existência de “escolas da roça” mantidas pelos pais dos

sertanejos ansiosos em educar seus filhos, dado semelhante à pesquisa de Meneses. Sobre o

método de ensino, narrou este religioso que os “mestres” aplicavam e exigiam a apreensão

dos diversos conteúdos ministrados em salas de aula, pela escrita e repetição soletrada do que

foi apreendido no desenrolar das aulas. As aulas aconteciam ao ar livre, em geral, situavam-se

nas residências dos “docentes” ou em algum lugar cedido pela população. Havia por parte dos

“mestres escolares” a presença de castigos corporais, via palmatória e varas (1963, p. 165-

167). Mesmo que este recorte histórico e se refira a Instrução Primária, dentro do Período

Republicano, é possível perceber nesta narrativa a permanência do discurso deficitário da

educação goiana no período em questão.

Contrariamente as narrativas que afirmam a falta de interesse dos pais em educar

seus filhos (BRETAS, 1991, p. 205, 233; RELATÓRIO, 1855, 24-25; 1862, 54), Audrin

descreveu a preocupação dos sertanejos goianos na educação de sua prole, embora sua

referência fosse a Instrução Pública no início do século XX. Nancy Ribeiro ao relatar a

experiência das escolas da roça no século XIX, destacou o desejo e a preocupação dos pais de

famílias presentes no sertão de Goiás em dar uma educação, ainda que razoável, para os seus

filhos (SILVA, 1975, p. 49-55). Dois ofícios encaminhados à Presidência da Província de

Goiás, através da secretaria da Instrução pública, no ano de 1871, por dois párocos, das

freguesias de Campinas e Jataí, contrariam a tese da falta de interesse da população goiana em

relação à educação de seus filhos.

No ofício de nº 45, endereçado em 29/03/1871, o padre da Freguesia de

Campinas, Antônio Carlos da Anunciação, solicitou em nome da população local, a criação de

uma escola de ensino primário para o sexo masculino, devido à enorme distância da escola

mais próxima a esta localidade e o número suficiente de alunos com idade suficiente para o

ingresso (REGISTRO DE CORRESPONDÊNCIAS, 1871-1873, pg. 7). O segundo ofício, de

nº 72, remetido em 19/06/1871, pelo padre e inspetor da Instrução Pública de Jataí, fez a

solicitação de criação de duas escolas de ensino primário para o sexo masculino, devido à

necessidade da mocidade local desta freguesia em ter acesso à Instrução Pública, e possuir

número suficiente de alunos, fato que o levou a pedir a criação de mais duas escolas (IDEM,

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1871-1873, pg. 13v-14). Diante das necessidades relacionadas à Instrução pública a

população ou os seus representantes cobraram das autoridades maiores a fundação de escolas

ou melhorias para o ensino público.

Comumente, ao se descrever a situação dos professores, ou ainda, a situação da

instrução pública em Goiás, os documentos históricos e parte dos historiadores da educação

apresentam-na pelo aspecto da decadência, dos problemas financeiros, cujo orçamento da

província não possibilitou investimentos resultando, por conseguinte, no atraso contínuo de

pagamentos de funcionários e nos baixos salários do professorado. Outro aspecto ressaltado é

a má formação dos profissionais da educação. Muitos relatos qualificaram os professores

como pessoas despreparadas, desqualificadas e sem condições de seguirem a carreira do

magistério.

É necessário enxergar a Instrução Pública Secundária para além das ausências

(discurso da falta) e tentar perceber por detrás destes discursos “outras dimensões

amalgamadas neste projeto, no curso do século XIX”, sendo este um “exercício que ajuda a

delinear com maior precisão, os contornos do projeto educacional da província de Goiás”

(BARRA, 2007, p. 5). Deste modo reconhecer-se-á um processo educacional rico e válido por

detrás das narrativas que descreveram estas ausências.

Primeiramente, o problema do déficit financeiro não é um problema exclusivo de

Goiás. Outras províncias do Brasil, para não dizer todas, passavam pela mesma situação.

Mesmo na capital do Império, Rio de Janeiro, a situação dos cofres da Corte não era muito

animadora. Fatores como a Guerra do Paraguai e a seca que assolou o Brasil em meados do

século XIX, entre outras situações, trouxeram o agravamento das finanças da Corte e das

províncias brasileiras (FALLAS DO TRONO, 1977, pg. 295, 299-300, 311, 315-316, 321-

323, 328-330, 354, 358-359, 402-404). Falando à Assembléia Nacional, no início da

legislatura do ano de 1866, Dom Pedro II fez o seguinte relato sobre as finanças da Corte: “O

estado de nossas finanças é embaraçoso; para este objeto chamo primeiramente a vossa

atenção. Recomendo-vos pois com o maior empenho o melhoramento do meio circulante, a

firmeza do nosso crédito, e o equilíbrio da despesa com a receita” (IDEM, 1866, pg. 364).

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Vê-se que o agravamento da crise no Brasil, no século XIX, atingiu tanto a capital

do Império quanto às províncias brasileiras. Portanto, o atraso de pagamentos não era uma

situação específica da educação, muito menos um problema regional. Infelizmente esta

situação assolava todo o funcionalismo público da Província de Goiás e de outras províncias

brasileiras, que recebiam seus proventos com atrasos superiores há um ano, segundo os

relatórios provinciais (BERTRAN, 1996, p. 12; RELATÓRIO, 1850, p. 63, 1853, p. 266-267).

Contrariando em parte esta a narrativa do atraso de pagamentos, três livros de

folhas de pagamentos dos funcionários da Instrução Pública de Goiás, entre o período de 1868

a 1872, atestam que os professores do Liceu e os professores da Instrução Primária da capital

e de algumas cidades próximas, além de outras consideradas importantes geográfica e

financeiramente, recebiam os seus proventos regularmente em dia, mês a mês, sem atrasos.

Opostamente a esta situação, inúmeras outras folhas deste documento descrevem a realidade

de atrasos de pagamentos de professores da Instrução Primária de vários pontos da Província

de Goiás aos moldes dos relatórios dos presidentes da Província de Goiás (LIVROS DE

PAGAMENTOS DA INSTUÇÃO PÚBLICA, 1868, 1869-1870, 1871-1872).

Segunda informação. Os recebimentos pecuniários dos professores goianos eram

extremamente baixos ao ponto de proporcionar inúmeras vacâncias de cadeiras docentes da

instrução pública goiana (GOMES, 1998, pg. 10). Seriam de fato somente os salários dos

professores baixos ou esta seria uma situação geral da província de Goiás? Um recorte

extraído do jornal “Correio Official de Goyaz”, em 22 de setembro de1852, traz uma

informação sugestiva sobre esta temática. Segundo ele, os professores que exercem cargos

públicos de vereadores deveriam abdicar do mandato ou então exercê-lo, tendo neste caso

suspenso os seus salários como docentes, pois não poderiam acumular duas funções públicas.

- Ao delegado de Instrucção Primaria de Natividade. Declarando que os professoresde Instrucção Publica não podem simultaneamente exercer as funções deVereadores; e que em consequencia o Professor de que trata seo officio de 28 deFevereiro deve pedir dispensa do cargo de Vereador, e que, quando não o peça, deveconstar de seos attestados quanto tempo se empregou nos trabalhos da CamaraMunicipal, para lhe ser descontado em os seos vencimentos. (CORREIO OFFICIALDE GOYAZ, 22/09/1852, pg. 2)

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Qual motivo teve este professor de Natividade em acumular duas funções

públicas, sabendo que a lei não o permitia fazê-lo? Não seria também o salário de um

vereador neste período baixo, ao ponto dele buscar o complemento subsidiário no cargo de

professor? Em 1858, o então presidente da Província de Goiás, o Dr. Francisco Januário da

Gama Cerqueira, descreveu em seu relatório para a Assembléia Legislativa os seguintes fatos

sobre os valores pecuniários dos professores e dos padres goianos.

Em geral, teem esses empregados o ordenado annual de 300$ réis se vitalicos, e de210$ réis quando interinos, excepto os d’esta capital, que no primeiro caso vencera500$ réis, e no segundo 400$ rs, e mais alguns poucos que recebiam esta quantiaannualmente. Vencimentos taes n’uma epoca como a actual, e n’uma província, aonde certosgeneros de primeira necessidade, e principalmente os conduzidos dos portosmaritimos teem preços exorbitantes, não podem convidar para os empregados, a quesão inherentes aquelles, que não tiverem de todo outros recursos, e estes nuncafaltão inteiramente, sinão aos que são, tambem de todo, incapazes de exercerqualquer profissão industrial. Assim esses impregos serão a partilha da incapacidade,ou daquelles, que somente os procurão com intenção de usufrui-los como sinecuras. Actualmente, os parochos vencem, alem de emolumentos, beneses, etc, uma congruade 600$ rs, que, ainda assim, não é sufficiente para a decente subsistencia d’essesfuncionarios. (RELATÓRIO, 1858, p. 193)

Segundo este relatório, o salário de um professor, seja na capital da província ou

no interior, com cargo vitalício ou interino, era menor do que o salário de um padre (côngrua).

Os padres, pelo regime do Padroado, eram considerados funcionários públicos e, portanto,

recebiam subsídios mensais (salários) dos presidentes da Província de Goiás. Ambos os

salários, não custeavam as necessidades básicas dos professores, muito menos dos padres que

possuíam um vencimento maior, devido aos altos custos dos gêneros alimentícios da época.

Segundo as narrativas dos presidentes de província e dos historiadores acima

mencionados, os professores tinham que conviver com a falta de materiais didáticos, livros e

outros materiais de primeira necessidade escolar (BRETAS, 1991, p. 188). Todavia, os

professores não ficaram inertes diante desta situação. Segundo Diane Valdez, existem diversas

possibilidades de investigação da instrução pública em Goiás, que podem indicar que os

professores zelavam pelo bom funcionamento de suas aulas. Constantemente estes faziam

listas de pedidos de materiais didáticos, cadernos, mesas e utensílios, dentre outros objetos

para o presidente da província. Quando não atendidos expunham suas queixas e217

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desaprovavam o não fornecimento do material solicitado (2011, p. 116-119). É comum

principalmente o pedido de livros específicos para um determinado programa de aulas do

Liceu (CORREIO OFFICIAL de GOYAZ, 21/01/1871, p. 2; 28/01/1871, p. 3; 14/03/1874, p.

2).

Por fim, a má qualificação dos professores da Instrução Pública Secundária de

Goiás não possui respaldo histórico, pois se for analisado quem foram os professores do Liceu

ver-se-á ali médicos, padres, contadores, músicos, doutores em direito formados na Corte (Rio

de Janeiro) ou em Coimbra, entre outros. Muitos destes homens eram reconhecidos pela sua

atuação no campo político, sendo representantes goianos na Assembléia Provincial. Há casos

de professores que mesmo afastados do exercício da docência em virtude de um mandato

político davam aulas aos seus alunos gratuitamente, no Liceu, como é o caso de Antonio Felix

de Bulhões Jardim, professor de história, geografia e francês.

Annuncio. Aula de historia. O bacharel Antonio Felix de Bulhões Jardim, professorpublico de historia universal e geografia no lycêo desta capital, estando inibido paraexercer esse cargo durante dous mezes de sessão da assembleia provincial, na qualtem assento, continua á dar lições particular e gratuitamente á seos discípulos, nosalão do lycêo, das 7 ás 8 horas da noite. Junho 1, 1871. (CORREIO OFFICIAL deGOYAZ, 03/06/1971, pg. 4)

Opostamente às narrativas e documentos que reduziram importância da Instrução

Publica Secundária goiana, especificamente representado pelo Liceu, vê-se atores históricos

(professores) que diante dos limites impostos pela conjuntura social e política do século XIX,

subverteram o “discurso da falta”, propondo ações e respostas na condução de um projeto de

educação em curso, ainda que primariamente. Tais professores buscaram “luzes” em meio às

“trevas” e, assim, à margem do discurso oficial, deram existência ao ideário educacional

oitocentista.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O passado da Instrução Pública, no Brasil e em Goiás, referente ao século XIX,

foi constantemente desqualificado e (re)produzido sob a esfera do atraso, engendrado pela

ótica republicana e liberal. Fernando de Azevedo contribuiu negativamente com a construção

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histórica da tradição escolar colonial e imperial. Para ele, a ocorrência da instrução pública

nestes dois períodos históricos foi quase nula. Em sua visão, a escola pública oitocentista era

sinônimo de atraso e de ineficiência.

Na atualidade, vários pesquisadores têm contribuído com projetos de pesquisas

que valorizam as fontes históricas guardadas nos arquivos. Em Goiás, destacam-se os

trabalhos de Genesco Bretas e Nancy Ribeiro de Araújo e Silva. Apesar do número

significativo de fontes utilizadas por estes dois historiadores, eles deram voz às fontes e

repetiram as mesmas informações prestadas por pesquisadores anteriores. As duas pesquisas,

porém, representam um avanço quantitativo e qualitativo em estudos da história da educação

de Goiás. O trabalho proposto por ambos, os dados e as fontes coletadas, são de suma

importância para a pesquisa da Instrução pública Secundária e Primária goiana.

Os historiadores ao se debruçarem sobre os relatórios dos presidentes da Província

de Goiás engendraram e/ou repetiram as assertivas do atraso de salários, da desqualificação

dos professores primários e secundários, do desinteresse dos pais em instruir seus filhos por

ignorância ou por problemas financeiros, entre outras afirmações, sem contudo buscar outros

elementos (fontes) que afirmassem ou não este “discurso da falta”.

Todo o trajeto da Instrução Pública goiana é cheio de percalços e lacunas, pois só

se tem contato com os resquícios do passado. O passado é aquilo que foi e como tal não pode

ser recuperado tal como aconteceu. Um desafio se impõe. (Re)Construir o processo educativo

do século XIX, com suas riquezas e deficiências. A inúmera documentação presente no

Arquivo Histórico de Estadual (AHE) e em outros arquivos, revela além de uma vasta

quantidade de documentos, uma preocupação em organizar e dar sentido a esta experiência

chamada educação. O contato com esta documentação possibilita a certeza que não existiu um

hiatus do passado imperial, mas atos e/ou atores que contribuíram para o processo dinâmico e

paulatino da Instrução Pública de Goiás.

Navegar neste passado educacional de Goiás é deixar-se banhar pelas dúvidas e

pelas incertezas, pelas descobertas e pelas verdades que somente a pesquisa e as fontes

históricas podem oferecer. Esta também é uma tarefa educativa para História e para os seus

seguidores.

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FONTES DOCUMENTAIS

1) Arquivo Histórico de Goiás – AHG.

Documentos Manuscritos:

LIVROS DE PAGAMENTOS DA INSTRUÇÃO PÚBLICA. 1868. nº 484.

______. 1869-1870. nº 496

______. 1871-1872. nº 521.

REGISTRO DE CORRESPONDÊNCIAS DIRIGIDAS À PRESIDÊNCIA DA PROVÍNCIAPELA SECRETARIA DA INTRUÇÃO PÚBLICA – 1871-1873. Nº 528. pg. 7, 13v-14.

2) Biblioteca Particular:

AZEVEDO, Fernando de. A cultura brasileira: introdução ao estudo da cultura no Brasil.Tomo I. São Paulo: Editora Melhoramentos, 1958.

FALLAS DO TRONO. São Paulo: Instituto Nacional do Livro/Ministério da Educação e Cultura, 1977.

3) Biblioteca Nacional

CORREIO OFFICIAL DE GOYAZ, 22/09/1852, pg. 2. http://hemerotecadigital.bn.br/.______. 21/01/1871, p. 2. http://hemerotecadigital.bn.br/.______. 28/01/1871, p. 3. http://hemerotecadigital.bn.br/.______. 03/06/1971, pg. 4. http://hemerotecadigital.bn.br/.______. 14/03/1874, p. 2. http://hemerotecadigital.bn.br/.

3) Instituto De Pesquisa e Estudos Históricos do Brasil Central (IPEH-BC)

RELATÓRIO apresentado á Assembleia Legislativa de Goyaz pelo Presidente da Província oExmo. Sr. Dr. Eduardo Olimpio Machado, no dia 21 de julho de 1850. Goyaz, TypographiaProvincial. In: INSTITUTO DE PESQUISA E ESTUDOS HISTÓRICOS DO BRASILCENTRAL. Memórias Goianas. nº 5. Goiânia: Editora da UCG, 1996, p. 63-66.

RELATÓRIO apresentado á Assembleia Legislativa de Goyaz pelo Presidente da Província oExmo. Sr. Dr. Francisco Mariani, no dia 30 de abril de 1853. Goyaz, TypographiaGoyaniense. In: INSTITUTO DE PESQUISA E ESTUDOS HISTÓRICOS DO BRASILCENTRAL. Memórias Goianas. nº 6. Goiânia: Editora da UCG, 1997, p. 227-230.

RELATÓRIO apresentado á Assembleia Legislativa de Goyaz pelo Presidente da Província oExmo. Sr. Dr. Antonio da Cruz Machado, em 1855. Goyaz, Typographia Provincial. In:INSTITUTO DE PESQUISA E ESTUDOS HISTÓRICOS DO BRASIL CENTRAL.Memórias Goianas. nº 7. Goiânia: UCG, 1997, p. 191-199.

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RELATÓRIO apresentado á Assembleia Legislativa de Goyaz pelo Presidente da Província oExmo. Sr. Dr. Francisco Januário da Gama Cerqueira, no dia 20 de março de 1858. Goyaz,Typographia Provincial. In: INSTITUTO DE PESQUISA E ESTUDOS HISTÓRICOS DOBRASIL CENTRAL. Memórias Goianas. nº 7. Goiânia: Editora da UCG, 1997, p. 191-199.

RELATÓRIO apresentado á Assembleia Legislativa de Goyaz pelo Presidente da Província oExmo. Sr. Dr. José Martins Pereira de Alencastre, no dia 22 de abril de 1861. Rio de Janeiro,Typographia Imperial, 1861. In: INSTITUTO DE PESQUISA E ESTUDOS HISTÓRICOSDO BRASIL CENTRAL. Memórias Goianas. nº 8. Goiânia: UCG, 1997, p. 123-138.

RELATÓRIO apresentado á Assembleia Legislativa de Goyaz pelo Presidente da Província oExmo. Sr. Dr. José Martins Pereira de Alencastre, no dia 01 de junho de 1862. Goyaz,Typographia Provincial. In: INSTITUTO DE PESQUISA E ESTUDOS HISTÓRICOS DOBRASIL CENTRAL. Memórias Goianas. nº 8. Goiânia: UCG, 1997, p. 105-112.

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