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CENTRO UNIVERSITÁRIO UNIVATES CURSO DE DIREITO A (IN)APLICABILIDADE DA LEGISLAÇÃO ANTIRRACISTA Raissa Rossi Trentini Lajeado, novembro de 2014

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CENTRO UNIVERSITÁRIO UNIVATES

CURSO DE DIREITO

A (IN)APLICABILIDADE DA LEGISLAÇÃO ANTIRRACISTA

Raissa Rossi Trentini

Lajeado, novembro de 2014

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Raissa Rossi Trentini

A (IN)APLICABILIDADE DA LEGISLAÇÃO ANTIRRACISTA

Monografia apresentada na disciplina de

Trabalho de Curso II – Monografia, do Curso

de Direito, do Centro Universitário

UNIVATES, como parte da exigência para

obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Profa. Ma. Elisabete Cristina

Barreto Müller

Lajeado, novembro de 2014

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Raissa Rossi Trentini

A (IN)APLICABILIDADE DA LEGISLAÇÃO ANTIRRACISTA

A Banca examinadora abaixo aprova a Monografia apresentada na disciplina de

Trabalho de Curso II – Monografia, do curso de graduação em Direito, do Centro

Universitário UNIVATES, como parte da exigência para a obtenção do grau de

Bacharel em Direito:

Profa. Ma. Elisabete Cristina Barreto Müller – Orientadora Centro Universitário UNIVATES _________________________ Centro Universitário UNIVATES _________________________ Centro Universitário UNIVATES

Lajeado, 05 de novembro de 2014

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“Lutar pela igualdade sempre que as diferenças nos discriminem. Lutar pelas

diferenças sempre que a igualdade nos descaracterize”.

Souza apud Goulart (2012, texto digital).

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente, gostaria de agradecer à minha mãe, Claudia Rossi, pelo apoio

recebido nos momentos de maiores dificuldades, bem como o carinho e

compreensão. Também, o afeto e as palavras de conforto nos períodos de

ansiedade. Te amo querida mãe!

Ainda, o meu eterno agradecimento à minha avó Edela Rossi, a quem recorria

nos momentos de cansaço. Agradeço pela paciência e dedicação que teve comigo.

Pois, o carinho de uma vó sempre é bem vindo.

À minha querida orientadora, Elisabete Cristina Barreto Müller, pelo carinho e

motivação para a realização do presente trabalho. Por todas, as orientações

recebidas e auxílios que necessitei durante as buscas de pesquisas. Além disso, a

paciência e o consolo que dedicou a mim quando mais precisei.

Por fim, ao meu namorado Lucas Mallmann, o qual acompanhou a minha

trajetória acadêmica e, me incentivou à realização do meu Trabalho de Conclusão.

Sou extremamente grata.

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RESUMO

A presente monografia tem por objetivo geral analisar a (in)aplicabilidade da lei antirracista no país, distinguindo o crime de injúria racial, previsto no artigo 140, § 3º, do Código Penal Brasileiro, do crime de racismo, previsto no artigo 20 da Lei nº 7.716/1989. Para isso, este trabalho tem por base a pesquisa qualitativa e quantitativa, realizada por método dedutivo e de procedimento técnico bibliográfico, documental e de coleta de dados. O estudo inicia trazendo as definições de preconceito, discriminação e racismo, situando-os no mundo, no Brasil e, por fim, no Rio Grande do Sul; em seguida, traz outros conceitos correlatos. Após, é realizada uma abordagem jurídica a respeito do crime de racismo, bem como o de injúria qualificada. Finalmente, são abordadas algumas decisões jurisprudenciais efetuadas no Supremo Tribunal Federal, no Superior Tribunal de Justiça e no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Também destacam-se os levantamentos de dados realizados pela Secretaria de Segurança a respeito dos crimes em pauta. Ao final, apresenta-se um estudo de caso da 19ª Região Policial da Polícia Civil, com sede em Lajeado, a respeito do crime de racismo, o qual trará uma visibilidade maior dos casos ocorridos na atualidade. Nesse sentido, conclui-se que, diante das pesquisas coletadas, no Brasil, há a aplicabilidade acentuada do crime de injúria preconceituosa prevista no Código Penal; em contrapartida, não foram obtidos casos de aplicação do art. 20 da lei, em relação ao crime de racismo referente à “cor”, confirmando parcialmente a hipótese inicial desta monografia. Palavras-chave: Racismo. Art. 140 § 3º Código Penal. Lei nº 7.716/1989. (In)aplicabilidade.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CF- Constituição Federal

Art.- Artigo

CP- Código Penal

CPB- Código Penal Brasileiro

KKK- Ku Klux Klan

NAACP- Associação Nacional para o Progresso das Pessoas de Cor

STF- Superior Tribunal Federal

STJ- Superior Tribunal de Justiça

TJ/RS- Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

Nº- Número

SSP- Secretaria de Segurança Pública

AJG- Assistência Jurídica Gratuita

RP- Região Policial

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Soma da quantia dos crimes de preconceito de raça, injúria

discriminatória, bem como a injúria qualificada ......................................................... 72

Gráfico 2 – Ocorrências de crime Injúria Qualificada – Raça, Cor, Etnia, Religião ou

Origem ..................................................................................................................... 73

Gráfico 3 – Ocorrências de crime Preconceito de Raça, Cor, Origem, Etnia ou

Nacionalidade ............................................................................................................ 74

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Ocorrências de crime de racismo no Rio Grande do Sul ......................... 70

Tabela 2 – Relação maior e menor de índice de ocorrências de crime de Injúria ..... 71

Tabela 3 – Relação maior e menor de índice de ocorrências de crime de Preconceito

de raça, Cor, Origem, Etnia ou Nacionalidade .......................................................... 71

Tabela 4 – Relação maior e menor de índice de ocorrências de crime de Injúria

Discriminatória ........................................................................................................... 71

Tabela 5 – Relação maior e menor de índice de ocorrências de crime de Injúria

qualificada - Raça, Cor, Etnia, Religião ou Origem ................................................... 72

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 11 2 PRECONCEITO, DISCRIMINAÇÃO, RACISMO E OUTROS TERMOS CORRELATOS ......................................................................................................... 15

2.1 Conceitos fundamentais: preconceito racial, discriminação racial, racismo, raça, cor e etnia ....................................................................................................... 16

2.1.1 Preconceito racial .......................................................................................... 16 2.1.2 Discriminação racial....................................................................................... 17 2.1.3 Racismo .......................................................................................................... 18

2.1.4 Raça ................................................................................................................. 20 2.1.5 Cor ................................................................................................................... 21

2.1.6 Etnia................................................................................................................. 22

2.2 A questão no mundo ......................................................................................... 24

2.3 A questão no Brasil ........................................................................................... 27 2.3.1 O movimento negro organizado no Brasil ................................................... 31 2.3.2 O negro na sociedade escravocrata do Rio Grande do Sul ....................... 31 3 ABORDAGEM JURÍDICA SOBRE CRIMES DE RACISMO ................................. 35 3.1 O Direito como perpetuador do racismo institucional ................................... 36 3.2 A questão da discriminação na Constituição Federal de 05 de outubro de 1988 .......................................................................................................................... 40 3.2.1 A criminalização da prática do racismo ....................................................... 41

3.2.2 Imprescritibilidade .......................................................................................... 43 3.2.3 Inafiançabilidade ............................................................................................ 45 3.3 A Lei nº 7.716 de 05 de janeiro 1989 ................................................................ 46

3.3.1 O Artigo 20 da Lei nº 7.716/1989 ................................................................... 49 3.3.2 O Art. 140, § 3º, do Código Penal .................................................................. 51 3.3.3 Injúria qualificada pelo preconceito - art. 140 § 3º X art. 20 da Lei nº 7.716/1989 ................................................................................................................ 52

4 (IN)APLICABILIDADE DA LEI ANTIRRACISTA NO BRASIL .............................. 55 4.1 Análise jurisprudencial acerca da (in)aplicabilidade da lei antirracista no Brasil ........................................................................................................................ 56

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4.1.1 Pesquisas Jurisprudencial realizadas nos Tribunais Superiores acerca do art. 140, § 3º do Código Penal ................................................................................ 57

4.1.2 Pesquisas Jurisprudencial realizadas no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul acerca do art. 140, § 3º do Código Penal ..................................... 61 4.1.3 Pesquisas Jurisprudencial realizadas nos Tribunais Superiores acerca do art. 20 da Lei nº 7.716/1989 ..................................................................................... 65 4.1.4 Pesquisas Jurisprudencial realizadas no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul acerca do art. 20 da Lei nº 7.716/1989 .......................................... 65 4.2 Levantamentos de dados dos crimes de racismo em decorrência da cor ... 68 4.3 Estudo de caso .................................................................................................. 75 5 CONCLUSÃO ........................................................................................................ 78

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 81

ANEXOS ................................................................................................................... 87 ANEXO A – Declaração de responsabilidade pela manutenção do sigilo.......... 88 ANEXO B – Municípios da 19ª Região Policial ..................................................... 89

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1 INTRODUÇÃO

O Brasil, no período imperial, escravizou a população negra e a submeteu a

um drástico sistema que não reconhecia qualquer identidade e que tratava os

negros como seres inferiores. Tal sistema continuou na República, com uma política

intervencionista do Estado conhecida como política de “embranquecimento”, que,

cada vez mais, acentuou a desigualdade nas relações raciais em nosso país.

Sabe-se que foi no ano de 1888 em que se pôs o fim da escravidão no Brasil.

Porém, a situação imposta aos negros alastrou-se até os dias de hoje, havendo

ainda muitos ranços numa hierarquia social que os “julga” por sua cor. Existem

preconceitos muito sutis e que, na maioria das vezes, são acompanhados de

atitudes graves de discriminação racial, podendo gerar fatos de violência física ou,

ainda mais grave, o genocídio, isso se não forem controladas ou fiscalizadas a

tempo pelos poderes competentes.

Sem dúvida, há leis que rechaçam o racismo, a começar pela própria

Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, XLII, que passou a considerar a prática

do racismo como crime inafiançável e imprescritível. Todavia, diariamente nos

deparamos com notícias a respeito da prática de racismo. Em síntese, há previsão

desses crimes na Lei nº 7.716/1989, mais especificamente no artigo 20, e no Código

Penal, em seu art. 140, §3º, consistindo em injúria racial. Ambos os crimes

condenam o racismo no que toca a “cor negra”, porém existem algumas diferenças

entre os dois delitos.

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A injúria preconceituosa é conceituada pela doutrina como sendo um crime

contra a honra, ocasionado em relação a uma pessoa específica, embora valendo-

se de instrumentos relacionados a um grupo de pessoas; diferente é o crime de

racismo, o qual é direcionado à ofensa de um grupo de pessoas e não somente a

um indivíduo.

Assim, o presente trabalho justifica-se pela importância do tema nos dias

atuais, uma vez que, diante da prática dos crimes de racismo, é imprescindível

discutir a respeito da (in)aplicabilidade da lei antirracista; ou seja, se, além das

notícias da imprensa, a legislação está sendo utilizada para enquadrar esses crimes

referentes à “cor” nas instâncias jurídicas.

Nesse sentido, a presente monografia pretende, como objetivo geral, analisar

se a legislação antirracista é aplicável ou não nos casos de racismo. Como cerne

desse estudo, a característica principal e exclusiva será a “cor”. O estudo discute

como problema: qual é a possibilidade de ser (in)aplicável a legislação antirracista?

Como hipótese para tal questionamento, entende-se que a legislação antirracista

com enfoque em matéria criminal no país é aplicável, uma vez que existem vários

meios de se fazer valer. A legislação penal abrange artigos que protegem o cidadão

e a conduta que contrariar a norma será punida na forma dessa lei, tanto a do artigo

20 da Lei nº 7.716/1989 quanto ao do artigo 140, § 3°, do Código Penal. Outro

aspecto positivo são as leis específicas de racismo que foram mudando durante o

passar do tempo, aperfeiçoando-se cada vez mais para a proteção de quem sofre

esse tipo de preconceito. A lei que deu surgimento às demais foi a Constituição

Federal em seu artigo 5°, inciso XLI; em consequência, se deu a Lei nº 7.716/1989,

alterada pela Lei nº 9.459/1997, que deu um suporte melhor ao cidadão que sofrer

esse tipo de preconceito.

A pesquisa, quanto à abordagem, será qualitativa, pois conforme Mezzaroba

e Monteiro (2009) trata-se do aprofundamento no contexto estudado, tendo em vista

que investigará o crime de racismo, bem como o de injúria racial, por meio da

percepção de autores que tratam o assunto. Também será quantitativa, pois o

trabalho apresentará pesquisas realizadas pelos Tribunais Superiores, assim como

pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Ainda, será utilizado o método

dedutivo, pois este estudo propõe que as informações partam de um pressuposto

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geral para um particular, que resultam na dedução de determinadas conclusões.

Nessa pesquisa, também parte-se de um relato histórico sobre a evolução do crime

de racismo, indo para uma análise jurídica, diferenciando o crime de racismo do

crime de injúria racial e, por fim, a análise da (in)aplicabilidade dos crimes em

questão, referentes à “cor”.

Já os instrumentos técnicos utilizados serão o bibliográfico, baseando-se em

estudo de autores que relatam sobre o tema. Inclui-se, ainda, na revisão teórica,

livros, artigos científicos, sites especializados e outras publicações a respeito do

crime de racismo previsto na lei e no Código Penal. Salienta-se, também, haver,

como instrumental técnico, a realização de um estudo de caso, disponibilizado pela

Delegacia Regional da Polícia Civil, situada na cidade de Lajeado. Além disso, junta-

se uma pesquisa baseada em levantamento de dados coletados no STF, STJ e no

TJ/RS sobre os crimes de racismo e de injúria preconceituosa prevista no art. 140, §

3º do CP, também dados coletados pela Secretaria de Segurança Pública a respeito

dos crimes em destaque.

Dessa forma, o primeiro capítulo abordará uma análise histórica do crime de

racismo. Primeiramente, serão descritos os conceitos fundamentais de preconceito

racial, discriminação racial, racismo, raça, cor e etnia. Consequentemente, serão

relatados fatos de discriminação e preconceito racial ocasionados no mundo, em

seguida no Brasil, juntamente com suas revoltas e, por fim, uma breve passagem

histórica do negro na sociedade escravocrata no Estado do Rio Grande do Sul.

No segundo capítulo, será feita uma análise jurídica sobre os crimes de

racismo. Assim, para compreender a importância da legislação acerca do estudo,

far-se-á, primeiramente, uma ideia do direito como perpetuador do racismo

institucional, em seguida a questão da discriminação na Constituição Federal, de 05

de outubro de 1988 até chegar à criminalização da prática do racismo. Será ainda

realizada uma análise da Lei nº 7.716 de 05 de janeiro 1989, ponderando a diferença

do crime de racismo previsto no art. 20 da lei com o art. 140, § 3º do Código Penal

brasileiro.

Por fim, o terceiro capítulo abordará o tema principal do trabalho em questão,

ou seja, a (in)aplicabilidade da legislação antirracista. Desse modo, serão

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apresentadas análises jurisprudenciais acerca do tema, pesquisadas nos Tribunais

Superiores e no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul acerca do crime previsto

no art. 20 da Lei nº 7.716/1989 e do art. 140, § 3º do CP, analisando qual tipo penal

é mais aplicável. Em seguida, mostrar-se-ão alguns levantamentos de dados

policiais dos crimes em referência, realizados e fornecidos pela Secretaria de

Segurança Pública do Estado do Rio Grande do Sul e, por derradeiro, far-se-á um

estudo de caso.

Assim, por se tratar de um assunto de grande relevância social, pretende-se,

com a elaboração do presente trabalho, contribuir para um melhor conhecimento do

assunto, visando atingir a comunidade em geral e a acadêmica, expondo a

importância dos aspectos descritos.

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2 PRECONCEITO, DISCRIMINAÇÃO, RACISMO E OUTROS TERMOS

CORRELATOS

Foi no ano de 1888 que se pôs o fim à escravidão no Brasil. Porém, desde lá,

a situação imposta aos negros não mudou de forma tão positiva em nosso país,

ficando eles ainda subordinados a um tipo de hierarquia social que os “julga”

inferiores por sua cor.

Sem dúvida, o racismo é uma das questões mais sérias que permeia a

sociedade Brasileira. Apesar de nessas últimas décadas terem ocorrido grandes

conquistas do povo negro, este ainda enfrenta discriminação e preconceito. Por isso,

o racismo é considerado por diversos estudiosos como um problema ao século XXI.

Assim, verifica-se desde a existência de atitudes preconceituosas e

discriminatórias muito sutis, até aquelas que são acompanhados de atitudes graves

de discriminação racial, podendo gerar fatos de violência física.

O tema ganha maior destaque quando esses fatos ocorrem corriqueiramente,

resultando em crimes de racismo, que é o cerne deste estudo.

Dessa forma, antes de se chegar ao aspecto jurídico dos delitos racistas, o

objetivo do presente capítulo será apresentar conceitos relacionados ao assunto,

explicitando as suas diferenças, a saber: discriminação, preconceito, racismo, da

raça, cor e etnia. Alguns desses termos já foram utilizados nestes primeiros

parágrafos, sem rigor acadêmico, com o objetivo de demonstrar como eles são

usados no cotidiano.

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Além disso, também haverá uma análise interdisciplinar do preconceito, da

discriminação e da desigualdade racial, com abordagem das questões ocorridas no

Brasil, com enfoque no Estado do Rio Grande do Sul, no período escravocrata e, no

mundo, relatando os movimentos contra e a favor do negro.

2.1 Conceitos fundamentais: preconceito racial, discriminação racial, racismo,

raça, cor e etnia

Incumbência fundamental para o estudo do tema é a definição dos termos

preconceito racial, discriminação racial, racismo, raça, cor e etnia, visto as diversas

confusões em torno desses conceitos, pois muitas pessoas não sabem o significado

e fazem o uso inadequado. Também cabe esclarecer que os conceitos não são

unânimes, existindo várias opiniões, sendo que apenas alguns desses serão

abordados no capítulo presente.

2.1.1 Preconceito racial

O preconceito, de qualquer tipo, é sempre uma atitude negativa e antecipada

em relação a alguém ou a algo. Essa atitude pode ser tomada em relação a um

indivíduo, a um grupo ou, até mesmo, a uma ideia. Nessa primeira possibilidade, a

pessoa-alvo sofre uma atitude injusta por parte do preconceituoso (SANTOS, 2001).

Nessa esfera, Santos (2010) afirma que:

[...] o preconceito é a formulação de ideia ou ideias (que por sua vez alicerçaram atitudes concretas), calçadas em concepções prévias que não foram objeto de uma reflexão devida ou que foram elaboradas a partir de ideias deturpadas. É, em suma, um “pré-conceito”, algo intelectualmente não maturado ou objeto de falsa racionalização (SANTOS, 2010, p. 43).

É importante salientar que o preconceito pode se manifestar de diversas

formas: por representações gestuais, pela exteriorização das ideias preconceituosas

oralmente expressas ou por escrito (SANTOS, 2010).

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Em conformidade com o significado de preconceito, Bernd acredita que:

[...] preconceito é o conceito ou opinião formados antecipadamente, sem maior ponderação ou conhecimento dos fatos; julgamento ou opinião formada sem levar em conta os fatos que o contestam. Trata-se de um prejulgamento, isto é, algo já previamente julgado (BERND apud SILVA, 2001, p.100).

No mesmo sentido, é extremamente relevante comentar que o preconceito

pode se dar de forma racial, ou seja, quando uma pessoa, ou mesmo um grupo,

sofre uma atitude negativa por parte de alguém que tem como padrão de referência

o próprio grupo racial (SANTOS, 2001).

Ainda sobre o assunto, Carneiro (1983) relata que o preconceito racial foi uma

realidade brasileira, durante os três séculos em que foi colônia de Portugal.

Principalmente os negros sofreram com isso, pois eram considerados inaptos para

participar da sociedade colonial.

Porém, pode-se perceber que o preconceito racial continua presente na

sociedade brasileira, uma vez que grande parte desta sempre se dispõe a julgar o

cidadão negro a partir de sua opinião, ou até, da má informação que tenha obtido a

respeito da raça em questão.

Verifica-se que o preconceito se exterioriza “por atos de cunho discriminatório,

o que faz da discriminação espécie do gênero preconceito, que antecede”

(SANTOS, 2010, p. 44), conforme será visto a seguir.

2.1.2 Discriminação racial

A discriminação é uma expressão totalmente distinta de preconceito, como

também, de racismo, pois discriminação é uma palavra derivada de discriminar, ou

seja, diferenciar algo (SANTOS, 2010).

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Ainda, partindo dessas premissas, a discriminação racial não pode ser

confundida com preconceito racial e nem com o racismo, pois os dois últimos são

atitudes, ou seja, modos de ver certas pessoas ou grupos raciais. Já a discriminação

ocorre quando:

[...] uma ação, uma manifestação, um comportamento de forma a prejudicar alguém é que se diz que houve discriminação. Enfim, quando o racista ou o preconceituoso externaliza sua atitude, agora transformada em manifestação, ocorre à discriminação (SANTOS, 2001, p. 110).

Por seu turno, a discriminação é mais abrangente que o racismo, pois, além

de problemas raciais, há também os de ordem sexual, social, econômica, religiosa,

entre outros tipos, ou seja, a discriminação abrange todas as ações destinadas a

manter as características de um grupo, bem como sua posição privilegiada, às

custas, de certo modo, dos participantes do grupo de comparação (SILVA, 2001).

Contudo, a discriminação, assim como o preconceito, também se enquadra

na questão racial, ou seja, existe a discriminação racial, uma vez que essa acontece

quando ocorre uma ação, uma manifestação, um comportamento de forma que irá

prejudicar alguém ou um grupo (SANTOS, 2001).

Portanto, consoante o estudioso, a discriminação racial acontece quando o

racista ou o preconceituoso externaliza sua atitude, transformando-a em

manifestação (SANTOS, 2001).

2.1.3 Racismo

O termo e o conceito de racismo, segundo Paraf (1967, p. 7) fazem parte

integrante da linguagem dos povos, pois, “o combate entre o racismo e o

antirracismo tornou-se um elemento importante na política internacional”.

O pensamento racial, para Martin Luther King, nada mais é do que “[...] a

capacidade de tornar inumanos aqueles que são seus beneficiários no momento

mesmo em que priva suas vítimas de sua humanidade” (KING apud GILROY, 2007,

p. 34).

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Para a UNESCO, racismo é “[...] a expressão de um sistema de pensamento

fundamentalmente antirracional e constitui um desafio à tradição de humanismo que

nossa civilização reclama para si” (UNESCO apud SANTOS, 2010, p. 47).

Nessa mesma esfera, sem dúvida, o racismo é mais amplo que o preconceito

racial e diferente da discriminação racial, pois ocorre quando se atribui a um grupo

certos aspectos negativos em razão de suas características físicas ou culturais

(SANTOS, 2001).

No mesmo sentido, a respeito do significado do racismo, Carneiro acredita

que:

Muito mais que apenas discriminação ou preconceito racial, é uma doutrina que afirma haver relação entre características raciais e culturais e que algumas raças são, por natureza, superiores a outras. As principais noções teóricas do racismo moderno derivam das ideias desenvolvidas por Arthur Gobineau. O racismo deforma o sentido científico do conceito de raça, utilizando-o para caracterizar diferenças religiosas, linguísticas e culturais (CARNEIRO apud SANTOS, 2010, p. 47).

Também para Santos (2001, p. 109), “o racismo enaltece as características

do grupo racial considerado superior e rebaixa ou reduz a importância das do outro,

a fim de se justificar”.

O autor ainda salienta que existem três classificações básicas de racismo,

que são: o racismo individual ou pessoal, o racismo institucional e o racismo cultural.

O primeiro é semelhante ao preconceito racial, pois ocorre quando uma pessoa se

acha superior à outra em função de sua raça. Já o racismo institucional é referente

às instituições, Estados ou governos, os quais entendem que certo grupo racial deve

ter primazia em relação aos demais grupos. Por último, o racismo cultural, que

ocorre quando um determinado grupo racial entende que a sua herança cultural

ressalta em importância à de outros grupos (SANTOS, 2001).

Dessa forma, pode-se perceber a diversificação dos tipos básicos de racismo,

visto que todos estão presentes na sociedade brasileira, mas é com clareza que no

século XXI predomina o racismo individual ou pessoal, em decorrência de fatos

ocasionados no país, os quais são, como por exemplo, os crimes de injúria racial,

em decorrência de preconceito envolvendo a “cor”.

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Porém, a essa concepção, Silva (2001) afirma que os estudos referentes a

esses modelos de racismo confirmam que nos últimos vinte anos a perspectiva

estava voltada para o racismo individual, mas, com a massificação e globalização

das pessoas, as atenções dos especialistas estão voltadas nas formas de racismo

institucional e cultural.

Para complementar o estudo que abordou o preconceito e a discriminação

racial, bem como o racismo, cabe trazer as definições de raça, bem como cor e

etnia, conceitos que, muitas vezes, não são bem entendidos e podem gerar

problemas em suas interpretações. Tais esclarecimentos trarão um melhor

entendimento do próximo capítulo.

2.1.4 Raça

O conceito de raça, para Carvalho e Costa (1992, p. 17), é de que “[...] raças

são apenas subdivisões de uma mesma espécie [...]”. Acreditam que todos os seres

humanos têm antepassados comuns, mas alguns grupos desenvolveram

características de pele e outros aspectos físicos, que lhes fazem pessoas

semelhantes entre si, porém, diferentes de outros grupos.

O Brasil, em finais do século XX, era apontado como um caso único e

exclusivo de extremada miscigenação racial, pois se caracterizava como uma

sociedade de raças cruzadas, por grande diversidade de indivíduos de

características peculiares (SCHWARCZ, 2001).

Nesse mesmo sentido, Santos (2010) acredita ser possível estabelecer

inúmeros grupos ou raças de seres humanos, conforme suas características físicas,

ou seja, seus fenótipos. Por existirem critérios diferentes, surgiram várias

classificações de raças.

Ainda sobre o conceito de raça o Dicionário Aurélio descreve em sentido

simplista que:

[...] conjunto de indivíduos cujos caracteres somáticos, tais como cor de pele, a conformação do crânio e do rosto, o tipo de cabelo etc., são

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semelhantes e se transmitem por hereditariedade, embora variam de indivíduo para indivíduo (AURÉLIO apud NUCCI, 2013, p. 254).

Nessa mesma esfera, raça é caracterizada por Munanga (1998), como sendo:

Como a maioria dos conceitos, o de raça tem seu campo semântico e uma dimensão temporal e especial. No latim medieval, o conceito de raça passou a designar a descendência, a linhagem, ou seja, um grupo de pessoa que têm um ancestral comum e que, ipso facto, possuem algumas características físicas em comum [...]. Alguns biólogos anti-racistas chegaram até sugerir que o conceito de raça fosse banido dos dicionários e dos textos científicos. No entanto, o conceito persiste tanto no uso popular como em trabalhos e estudos produzidos na área das ciências sociais. Estes, embora concordem com as conclusões da atual Biologia Humana sobre a inexistência científica da raça e a inoperacionalidade do próprio conceito, eles justificam o uso do conceito como realidade social e política, considerando a raça como uma construção sociológica e uma categoria social de dominação e de exclusão (texto digital).

No Brasil, existem algumas classificações básicas de raças, as quais são:

[...] branca, preta e vermelha e os frutos da miscigenação, denominados mulatos (mistura de raças “branca” e “preta”), cafuzos (mistura de “pretos” e “vermelhos”) e mamelucos (produto do cruzamento entre componentes de raças “vermelha” e “branca”) (SANTOS, 2010, p. 52).

Como se pode notar, existem diversas classificações de raça, umas

considerando os aspectos físicos, nesse caso os fenótipos do ser humano e outras,

os caracteres genéticos, ou seja, os genótipos. Essas classificações são de suma

importância, visto o conhecimento da existência de raças humanas.

2.1.5 Cor

É evidente que existem diferentes conceitos entre preconceito racial,

discriminação racial, racismo, raça e cor. Porém todos estão interligados de forma

indireta ou até mesmo direta, como o caso da cor, pois essa pode ter relação com

todos os conceitos mencionados.

Para Santos (2010), o conceito de cor nada mais é do que:

[...] um fenômeno físico e o termo é melhor utilizado para a definição cromática de qualquer matéria, do que propriamente para distinção de pessoas, embora seja empregado para definição de pigmentação epidérmica dos seres humanos [...] (SANTOS, 2010, p. 57).

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Diante do exposto, pode-se perceber que a palavra cor é mais utilizada para

caracterizar algo ou definir algum objeto, o oposto da caracterização dos indivíduos,

ou seja, pouco se utiliza a palavra cor para referir-se a uma pessoa.

Sobre o assunto, Santos (2010) menciona que, bastantes vezes, a palavra cor

é utilizada em nossa língua como sinônimo de raça, ou até como forma de

eufemismo. Isso ocorre porque as cores das pessoas, no sentido e preconceito de

cor, acabam sendo objeto idêntico de classificação racial.

O autor ainda relata que existem classificações de pessoas em três grupos

distintos, os quais são: “[...] brancos, pretos e amarelos [...]” (SANTOS, 2010, p. 58).

Nesse mesmo pensamento, Munanga (1998), relata a respeito dos grupos

existentes que:

[...] os indivíduos da raça “branca”, foram decretados coletivamente superiores aos da raça “negra” e “amarela”, em função de suas características físicas hereditárias, tais como a cor clara da pele, o formato do crânio (dolicocefalia), a forma dos lábios, do nariz, do queixo, etc. que segundo pensavam, os tornam mais bonitos, mais inteligentes, mais honestos, mais inventivos, etc. e conseqüentemente mais aptos para dirigir e dominar as outras raças, principalmente a negra mais escura de todas e conseqüentemente considerada como a mais estúpida, mais emocional, menos honesta, menos inteligente e, portanto a mais sujeita à escravidão e a todas as formas de dominação (texto digital).

A cor está, portanto, relacionada com a pigmentação da pele, ou seja, branca,

preta e amarela. Já raça, está vinculada com características semelhantes que cada

povo possui.

Assim, pode-se perceber que o povo pardo esta dentro de um grupo o qual

está vinculado à cor negra (PERTUCCELLI, 2013).

2.1.6 Etnia

O conceito de etnia para Nucci (2013, p. 261) nada mais é do que um “[...]

grupo de pessoas que apresenta homogeneidade cultural ou linguística”, ou seja,

pessoas com certos caracteres iguais ou semelhantes a um determinado grupo.

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Nesse mesmo pensamento o Dicionário Aurélio (2010, p. 325) conceitua etnia

como “população ou grupo social que apresenta homogeneidade cultural,

compartilhando história e origem comum”.

Segundo esse pensamento, pode-se dizer que etnia também pertence a um

grupo, nesse caso:

[...] Ao utilizar a expressão “grupo étnico” para descrever brancos, negros, indígenas, asiáticos, pardos (todos os mestiços, inclusive os morenos de cabelos lisos e origem negro/indígena), não estamos descrevendo grupos “biológicos e culturalmente homogêneos” e sim, grupos cujo discurso faz vínculo social, na defesa de interesses próprios e levando necessariamente em conta suas características raciais predominantes (TEODORO apud SANTOS, 2010, p. 59).

Diante do exposto, é importante acrescentar que os povos se dividem em

diversas etnias, incluso no mesmo país, pois normalmente a nacionalidade não

coincide com a etnia. Mas isso pode ocorrer em alguns países onde há

homogeneidade cultural ou outro aspecto relevante, como, por exemplo, a questão

linguística (SANTOS, 2010).

Concluindo os conceitos fundamentais, é importante destacar que assim

como o termo raça, a expressão etnia também pode ser considerada ambígua e

contraditória. Porém, para efeitos da Lei nº 7.716/1989, ela pode ser entendida como

“[...] comunidade unida por alguns laços de identidade biológica, linguística, cultural

e de costumes biológicos, não necessariamente concentrada numa mesma

localidade, nem possuindo a mesma nacionalidade” (SANTOS, 2010, p. 60).

Portanto, analisando os conceitos apresentados de preconceito racial,

discriminação racial, racismo, raça, cor e etnia, verificam-se as peculiaridades de

cada palavra, juntamente com o seu significado. Isso nos faz concluir o quão é

importante é a caracterização dessas para uma melhor compreensão perante o

trabalho apresentado, visto que, de certa forma, essas palavras estão interligadas,

mas cada uma com seu sentido particular.

Esses conceitos se fazem presentes de forma direta ou indireta em aspectos

históricos relacionados a fatos ocorridos no mundo, como também no Brasil e no

Estado do Rio Grande do Sul.

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2.2 A questão no mundo

Na Antiguidade, ocorria a intolerância por diferenças religiosas, pois como

forma exemplificativa, os mulçumanos opunham-se aos que professavam outras

crenças, mas eram totalmente indiferentes quanto à cor ou origem. Também, a

intolerância poderia ocorrer por forma sociocultural, como, por exemplo, a diferente

forma de tratamento e de desprezo relevados pela própria definição dos demais

habitantes do mundo, ou seja, os bárbaros, nesse caso, por parte dos gregos e

romanos. Raramente essa intolerância dava-se pela distinção de características

físicas, embora haja registros de desprezo por parte dos egípcios para com os

negros por suas características pessoais, os lábios grossos, pelos líbios de olhos

azuis e cabelos carapinhas do sul (SANTOS, 2010).

Assim, é relevante o estudo sobre os acontecimentos ocorridos nos

primórdios da raça humana, conforme a ideia de Santos:

As lutas pela sobrevivência e as próprias características de alguns grupos, tribos e povos provocaram invasões de territórios, guerras sangrentas e, consequentemente, fizeram nascer rivalidades e ódios, aguçando os sentimentos de discriminação e de preconceito transmitidos pelos que vivenciaram as batalhas através das gerações. Além disso, após a difusão do cristianismo na Europa, a discriminação dos adeptos de outras crenças foi crescente, principalmente a partir da baixa Idade Média, sendo certo que os judeus foram exemplo significativo de implacável perseguição (SANTOS, 2010, p. 28).

Evidencia-se, portanto, que, na Antiguidade, os povos existentes não

distinguiam os grupos por origem ou cor, mas, sim, por religião e aspectos

socioculturais. Porém, foram esses aspectos que acarretaram lutas e guerras,

gerando sentimentos de discriminação e preconceito, pois um aspecto de suma

relevância foi a religião que ocasionou forte discriminação ao povo judeu.

Conforme Santos (2010), o grande crescimento e desenvolvimento do

capitalismo acentuou a intolerância, principalmente a decorrente da raça, já que

objetivavam lucro e novas formas de exploração, o que obrigava o emprego de

extensa mão de obra. Os brancos europeus eram considerados os maiores

detentores da força, uma vez que subjugavam os habitantes de outros continentes,

destacando-se por escravizar índios americanos e negros africanos.

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Quanto aos últimos, segundo Santos (2010, p. 28), “[...] aproximadamente

cem milhões foram escravizados e mortos para atender o sistema escravocrata das

Américas”.

A forma de escravidão sofrida pelo povo africano foi de grande crueldade,

uma vez que:

A África Negra foi condenada à estagnação demográfica e econômica, seus homens, mulheres e crianças foram escravizados, mortos, torturados, violentados culturalmente para que os portugueses, espanhóis e ingleses pudessem produzir riqueza nas suas colônias. Não houve um genocídio maior na história da humanidade, nem em número nem brutalidade, do que o cometido contra os negros africanos (SANTOS, 2010, p. 28).

Com esse mesmo pensamento, Santos (2001) relata que na visão dos

escravagistas, os negros não possuíam alma, ou seja, eram desprovidos de

inteligência e não possuíam ordem moral, o que deixa evidente aspectos de

superioridade do grupo escravocrata em relação aos negros.

Naturalmente, com os acontecimentos ocorridos no decorrer do período, o

povo negro sentiu-se inferior ao branco, tanto no aspecto econômico quanto no

moral, pois passaram por grandes dificuldades e humilhação.

Nessa esfera, o estudioso Munanga (1988), relata haver classificações a

respeito da raça branca e negra, as quais os tornam diferentes, existindo uma

hierarquização entre ambos os conceitos:

Se os naturalistas dos séculos XVIII-XIX tivessem limitado seus trabalhos somente à classificação dos grupos humanos em função das características físicas, eles não teriam certamente causado nenhum problema à humanidade. Suas classificações teriam sido mantidas ou rejeitadas como sempre aconteceu na história do conhecimento científico. Infelizmente, desde o início, eles se deram o direito de hierarquizar, isto é, de estabelecer uma escala de valores entre as chamadas raças. O fizeram erigindo uma relação intrínseca entre o biológico (cor da pele, traços morfológicos) e as qualidades psicológicas, morais, intelectuais e culturais (MUNGA, 1988, texto digital).

De acordo com Santos (2010), após a ocorrência desses fatos, mais

precisamente a discriminação, emerge o sentimento de superioridade do branco no

centro econômico do planeta. Também, verifica-se que com o florescimento das

ciências, contrariando o princípio do iluminismo que refletiria na igualdade dos

homens, e apropriando-se da ideia de Charles Darwin, começaram as teorias

científicas justificadoras da ascendência branca.

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Verifica-se, assim, que a desigualdade racial foi aparecendo conforme as

situações de discriminação e preconceito foram surgindo, pois o fato de os negros

terem sido escravizados brutalmente gerou grande poder aos senhores feudais, que,

por sua vez, eram brancos, poderosos e obtiveram grandes lucros com esse

trabalho.

Salienta-se, também, que a segregação racial continuou a existir de forma

feroz nos Estados Unidos da América. Apesar de consolidar de fato os “direitos

civis”, que tornou conhecidos os líderes como Martin Luther King e Malcolm X,

ambos assassinados, por defenderem os direitos dos negros na sociedade

mantiveram-se sérios problemas no quesito de combate ao preconceito e a

discriminação; estes continuam fortemente arraigados em significativa parte na

sociedade (SANTOS, 2010).

Segundo Kaufmann (2007), foram criadas algumas organizações contrárias

aos negros no continente norte-americano, dentre as quais pode-se destacar, pela

relevância e pela quantidade de membros, o Conselho de Cidadãos Brancos e a Ku

Klux Klan – KKK. Esta tinha como sua característica principal a agressividade

violenta no combate à integração do negro na sociedade, além de possuir uma

rígida hierarquia na distribuição dos cargos entre seus membros. Inicialmente, a

KKK visava à proteção dos fracos, inocentes e indefesos contra as indignidades, e,

nesse período, a organização não tinha como objetivo disseminar violência ou ódio

contra os negros. Porém, na década de XX, o grupo já se caracterizava pelo

emprego de violência gratuita, moral e física contra os negros. Em seguida, surgiu

outra instituição, com representantes da organização anterior, contra os negros, ou

seja, o Conselho dos Cidadãos Brancos, que objetivava o impedimento da

integração do negro à sociedade.

Ainda, se de um lado foram fortes as organizações contrárias aos negros, de

outro houve entidades criadas com o objetivo de proteger os negros norte-

americanos:

[...] inicialmente houve grande destaque da criação da Liga Afro-Americana, no ano de 1890, que obteve mais de 140 representantes de 21 Estados norte-americanos. A partir dessa criação, ocorreu o surgimento da Associação Nacional para o Progresso das Pessoas de Cor – NAACP, sendo uma organização constituída no maior movimento nacional a favor dos negros, preponderando, especialmente, iguais oportunidades de

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emprego e de educação, além da efetivação do direito ao voto. A NAACP operou com rígido sistema hierárquico e organizacional, distribuindo suas atividades entre vários departamentos, como a Secretaria Executiva, o Departamento de Relações Públicas, de Pesquisas Especiais, de Afiliadas, Religioso, além do Departamento Legal, este setor tendo significativo sucesso nas causas perante a Corte (KAUFMANN, 2007, p. 152).

A associação NAACP foi de suma importância para o desenvolvimento do

negro na sociedade, dando mais oportunidades de igualdade, tanto social quanto

cultural.

Santos (2010) destaca o regime Apartheid que vigorou até os anos 1996, e

somente foi abolido por intensa pressão econômica internacional. Caso contrário,

poderia estar até hoje em vigor.

O mesmo autor comenta que, na Europa atual, permanece a cisão, ou seja,

há uma maioria da população contrária à discriminação, havendo uma parcela

pequena simpática a partidos políticos de seus respectivos países. De outra forma,

na França, na Alemanha e no Reino Unido, ainda existem grupos “neonazistas” que

são contra os negros, judeus e imigrantes (SANTOS, 2010).

Sem dúvida, pode-se afirmar que uma das maiores lideranças pacíficas em

favor da causa negra foi a de Martin Luther King, cuja atuação teve início a partir de

um episódio de discriminação legal (KAUFMANN, 2007).

King é lembrado até hoje pelo mundo inteiro e é visto também como um herói

ao povo negro, o qual defendeu, enfrentando a repressão popular do povo “branco”,

realizando marchas e passeatas.

2.3 A questão no Brasil

Da mesma forma como a discriminação, o preconceito e o racismo estão se

alastrando em todo o mundo, não seria diferente a sua situação no Brasil, onde se

verificam diariamente situações com as quais o povo brasileiro se depara.

Assim, o assunto merece uma reflexão histórica, uma vez que se torna

fundamental o estudo de fatos ocorridos no passado para obtermos conclusões de

situações que ocorrem na atualidade.

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Primeiramente, cabe mencionar que bastante se fala em cordialidade racial e

democracia racial, porém, tende-se a admitir a inexistência das discriminações e dos

preconceitos, ou “minorar suas consequências, atribuindo os atos deles decorrentes

à obra de pequenos grupos, ou entendendo as ocorrências como casos isolados”

(SANTOS, 2010, p. 32).

Santos (2010) também relata que:

No Brasil, aplica-se o que se disse sobre o ocorrido no mundo, salientando-se que ficamos marcados pelos reflexos da manutenção da relação de absoluta dominação, representada pelo escravismo, que fomentou o racismo de forma mais acentuada (SANTOS, 2010, p. 32).

Kaufmann (2007) afirma que o surgimento da escravatura no Brasil deu-se no

início do período colonial, com a chegada dos portugueses, que trouxeram consigo

os primeiros africanos negros, residentes na Nigéria e Angola. Também, observava-

se, pela captura de negros jovens, que ocupariam menos espaço no navio e

cresceriam no país. Foram trazidos com o intuito de serem escravos nos engenhos

de cana-de-açúcar, para substituírem os índios que, no início da colonização,

serviram de mão de obra para o plantio da cana. Todavia, as condições de vida dos

negros na senzala eram muito precárias, uma vez que recebiam severos castigos:

argola de ferro nos pés; mordaça de flandres na boca e chicotadas.

Contrário aos castigos, conforme a doutrinadora, foi criada a Carta Régia de

20 de março de 1688, que determinava que os senhores do engenho não poderiam

mais castigar os negros de forma cruel, apenas moderadamente. Em seguida, foram

criadas outras cartas que determinavam que os governadores deveriam penalizar os

senhores do engenho, caso eles punissem os escravos com crueldade

(KAUFMANN, 2007).

Em relação aos acontecimentos ocorridos no período colonial, podem-se

destacar os severos castigos que os senhores feudais aplicavam aos escravos,

negros, visto que esses tinham menos direitos e piores condições de vida. Quem

também sofria eram suas famílias, que viviam em situação miserável.

Segundo Kaufmann (2007), a abolição da escravatura brasileira foi um

processo lento, que passou por várias etapas antes de sua concretização. Criaram-

se leis, destacando-se inicialmente a Lei Diogo Feijó, que determinou ilegal o tráfico

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de escravos e previu que os que fossem apreendidos nas embarcações seriam

reexportados para a África.

Conforme Skidmore (2012), a Lei Áurea pôs fim à escravatura em maio de

1888, com a assinatura da Princesa Isabel, sem indenizações para os senhores

feudais. Em contrapartida, Santos (2010) comenta que o Brasil foi o último país a

abolir oficialmente a escravidão.

Na visão de Santos (2001), a Lei Áurea de 13/05/1888 não aboliu a

escravatura, apenas declarou a escravidão extinta e, consequentemente, propagou-

se o preconceito racial no país. A partir do momento em que os escravos foram

libertados, enfrentaram discriminação racial no trabalho, dificuldades para obter

renda com o seu trabalho e, sem condições para investir em melhores ocupações,

foram condenados a terem escolaridade inferior, acarretando maiores dificuldades

para a conquista de vagas de emprego.

Nesse mesmo sentido, Santos (2010) afirma que, com a abolição da

escravatura, aumentou ainda mais o problema do negro no mercado de trabalho,

visto que o país teve gradativamente crescimento, principalmente no surgimento de

grandes indústrias e estradas de ferro. Porém, a mão de obra tornou-se importada e,

como consequência, afastou os negros do trabalho livre, restando-lhes apenas um

papel secundário, ou seja, o de mão de obra reserva.

Consequentemente, a desigualdade racial se fez presente na sociedade

brasileira, tanto após como durante a escravidão, uma vez que o povo negro teve

poucas oportunidades de emprego e, quando teve, os imigrantes tomaram o seu

lugar, deixando-os de lado. Conforme Santos (2010, p. 33), “[...] os escravos já não

eram a mais importante força de trabalho nos principais centros produtores [...]”.

Ainda, sobre a desigualdade racial, Fernandes (2008) menciona que:

[...] o paralelismo entre “cor” e “condição social” depende só pode ser rompido a partir do momento em que o negro e o mulato alcancem condições de equiparação econômica, social e política diante do branco [...] (FERNANDES, 2008, p. 419).

Analisando toda a história da abolição da escravatura, percebe-se que muito

já foi feito para melhorar as condições dos negros, tanto no sistema social quanto no

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aspecto moral. Importante à consideração feita por Cardoso (1997), no sentido de

que o preconceito se fez presente nessa trajetória, uma vez que apareceu no novo

contexto como uma técnica de ajustamento entre os grupos étnicos, a partir do

conhecimento necessário e prévio da existência de desigualdades sociais. Ainda

cabe salientar que grande parte dos negros ratificou essa situação, ou seja, pela

aceitação do ideal do branqueamento.

O Brasil vem tratando o problema de discriminação, de preconceito étnico

racial de maneira mais contundente, porém não pode deixar de salientar que “[...]

isto não representou uma melhoria significativa na qualidade de vida da população

negra. Existe, ainda, uma lacuna que dividem brancos e negros na sociedade, nos

mais diversos setores da sociedade brasileira [...]” (NUNES apud SANGER, 2006, p.

237).

Da mesma forma, Amaro (1997) relata que é extremamente complicado

explicar a desigualdade social entre negros e brancos, pois essa questão tende a se

transformar em um círculo vicioso, visto que os negros são excluídos dos pontos de

direção porque não conseguem ter oportunidades de acesso à educação e não têm

recursos.

No mesmo pensamento, Cavalleiro (2001) acredita que esses fatos foram

ocasionados, também, em consequência de o Brasil ter sido a última nação a abolir

a escravatura, pois adiou ao máximo o dever de libertar os africanos e seus

descendentes escravizados.

Sobre o assunto, no país, pode-se perceber que houve uma certa

insuficiência de políticas públicas por parte do governo com relação ao povo

escravista, pois, essas poderiam reverter tal quadro, trazendo-lhes melhores

condições de vida, assim como também a conquista de um trabalho digno, visto que

lutaram para conseguir seus direitos, ou seja, serem libertados. Todavia, ocorreram

algumas mudanças ocasionadas em decorrência de movimentos feitos pelo povo

negro, os quais visavam melhores condições de vida e inclusão à sociedade.

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2.3.1 O movimento negro organizado no Brasil

Muitos foram os movimentos populares que forneceram subsídios essenciais

para o reconhecimento dos distúrbios que a prática discriminatória causava no meio

social, entre eles os dos negros (SILVA, 2001).

Nessa esfera, ao mesmo tempo em que reagia à pressão integracionista da

sociedade inclusiva, havia o protesto coletivo do negro, através dos movimentos

reivindicatórios, os quais tiveram sua importância na história brasileira.

Uma das organizações dos negros foi a revolta malês, que ocorreu na Bahia,

em 1835, como uma das primeiras modalidades. Apesar de ter tido um período curto

de duração, foi considerada a mais séria manifestação realizada por escravos

urbanos na América. Outro movimento que teve grande destaque foi:

[...] a Frente Negra Brasileira – FNB, que objetivava promover a integração do negro na sociedade e conscientizá-lo sobre exercícios de seus direitos. A Frente conseguiu uma enorme mobilização no país a favor dos negros. Essa se transformou em partido político (KAUFMANN, 2007, p. 87).

Nesse crescente, segundo a mesma estudiosa, outra significativa forma de

organização foi através da criação do Teatro Experimental do Negro – TEN, cujo

objetivo era alertar a população para a discriminação racial no país, pois uma das

questões em debate era a presença da raça negra no Brasil (KAUFFMANN, 2007).

Atualmente, conforme exposto pela autora, pode-se confirmar que o

movimento negro brasileiro encontra-se mais forte, sucinto e organizado, uma vez

que, com o passar dos anos, novas entidades estão surgindo e alcançando maior

camada nacional (KAUFFMANN, 2007).

2.3.2 O negro na sociedade escravocrata do Rio Grande do Sul

No Brasil, assim como no Rio Grande do Sul, a escravidão foi abolida

juntamente com a exaustão do regime no ano de 1888, porém houve um processo

de constituição e desagregação da sociedade escravocrata rio-grandense, a partir

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da situação social que o negro nela assumia, em decorrência de reflexões existentes

no Estado.

Primeiramente, cabe mencionar alguns aspectos históricos para melhor

compreensão, referentes ao sistema escravocrata no Rio Grande do Sul, bem como

apontar a forma que estes eram tratados pelos senhores feudais.

Sobre a história do escravo no Rio Grande do Sul, Cardoso relata que:

A economia rio-grandense era subsidiária da economia propriamente colonial (exportar produtos tropicais) do Brasil. Por isso, a escravidão não chegou, em regra, a desenvolver-se no Rio Grande do Sul com a mesma intensidade que naquelas regiões, cuja produção, sendo mais lucrativa, compensava amplas inversões de capital na compra de escravos. Não se beneficiou tampouco a economia escravocrata sulina das mesmas conjunturas favoráveis que caracterizaram a economia exportadora brasileira: nunca houve no Sul um produto tipicamente tropical e colonial capaz de proporcionar os grandes lucros que a situação de quase-monopólio daqueles produtos permitia (CARDOSO, 1977, p. 271).

Essas informações foram analisadas diante de uma perspectiva que

considera dialeticamente as relações entre o particular e o geral, pois, de certa

forma, permitem a compreensão de algumas características importantes da

escravidão brasileira que se manifestaram mais claramente no Estado gaúcho

(CARDOSO, 1977).

Cardoso (1977) destaca que foi a indústria de charque que tornou a

exploração do escravo regular e intensa no Rio Grande do Sul, desde o momento

em que desenvolveu a produção mercantil para exportação.

Em contrapartida, os grupos sociais que não eram beneficiados pelos

escravos se rebelaram contra os que eram, pois foi a partir desse momento que

começou a haver o declínio da escravidão no Brasil, advindo da cessão do tráfico, a

desagregação do regime escravocrata também ocorreu no Rio Grande do Sul. Isso

provocou o reajustamento dos grupos e camadas da estrutura social (CARDOSO,

1997).

Cardoso (1997, p. 275) comenta que “[...] o processo de reintegração de

ordem social foi o tipo de ajustamento que os negros tiveram de desenvolver para

participar da sociedade de classes em formação [...]”.

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Nesse sentido, os negros não tiveram chances econômicas, visto o

aparecimento da desigualdade racial, para assumir o status de cidadão que a

abolição formalmente os considera. Também não puderam se manifestar com

relação à posição que os brancos lhes impuseram na sociedade de classe.

Esses fatos geraram algumas consequências, por exemplo, as revoltas

ocasionadas a favor da maça escravocrata, pois essa foi uma das maneiras para

conseguir espaço no sistema social imposto pelo povo branco.

Conforme Cardoso (1997), outro aspecto que merece destaque foi a presença

de dois grupos básicos e polares de ajustamento dos negros à nova ordem de

classes advinda depois da abolição no Rio Grande do Sul. A primeira foi à massa

dos ex-escravos, que eram despreparados social e culturalmente para o exercício

das possibilidades de atuação social inerentes às qualidades de cidadãos que os

negros haviam adquirido. Nesse grupo, os brancos procuraram redefinir as

representações que mantinham sobre os escravos. Já a segunda forma de

ajustamento foi à tentativa de uma reação crítica contra a espoliação social imposta

pelos brancos aos negros. Essa foi uma reação que partiu de ex-escravos, pois isso

poderia acarretar melhores condições morais e materiais aos negros.

Portanto, analisando todos esses fatos históricos ocorridos no período

colonial, pode-se perceber que o cidadão negro passou por grandes obstáculos para

obter a sua colocação na sociedade perante aos brancos que, por sua vez,

acreditavam serem superiores à classe escravista. Conforme Cardoso (1997, p.

125), “[...] a consciência do escravo apenas registrava e espalhava, passivamente,

os significados sociais que lhe eram impostos [...]”.

Nesse sentido, Santos (2010) salienta que:

Trata-se, na realidade, de uma forma do Apartheid à brasileira, contra a qual é urgente reagir se realmente desejamos integrar a sociedade brasileira de modo que, num futuro próximo, ser negro no Brasil, seja, também, ser plenamente brasileiro (SANTOS apud SANTOS, 2010, p. 40).

Assim, torna-se evidente que o assunto ainda causa questionamentos nos

tempos atuais, pois, em pleno século XXI, ainda existem sérios problemas de

discriminação, preconceito e desigualdade racial, ocasionados a partir de fatos

ocorridos em períodos passados.

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Cabe ressaltar que há leis específicas sobre racismo, como também há a

previsão da Constituição Federal Brasileira de 1988; elas visam à proteção às

pessoas que sofrem qualquer tipo de preconceito ou discriminação racial. Para

melhor compreensão do trabalho, o próximo capítulo abordará a questão jurídica a

respeito dos crimes racistas, desde a CF/1988, englobando os princípios da

imprescritibilidade e inafiançabilidade, até a Lei nº 7.716/1989, juntamente com o art.

140, § 3º, do Código Penal Brasileiro.

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3 ABORDAGEM JURÍDICA SOBRE CRIMES DE RACISMO

O presente capítulo tem como objetivo analisar juridicamente os crimes de

racismo, ou seja, o embasamento legal atual, mas com um rápido resgate histórico,

e o posicionamento doutrinário que cerca esse assunto, o qual está cada vez mais

presente na sociedade brasileira. Ele está interligado com o preconceito, pois o

racismo é uma espécie deste, uma ideia pré-concebida e pejorativa a respeito de

uma etnia, uma raça ou um povo em particular. Também, está relacionado com a

“cor”, característica que eleva os índices de discriminação. Nesses últimos tempos, o

tema deste trabalho tomou grande proporção na mídia e na sociedade com o caso

da torcedora gremista, flagrada pela televisão chamando o goleiro Aranha, do

Santos Futebol Clube, de “macaco”, em partida pela Copa do Brasil, no final do mês

de agosto de 2014. Com certeza, isso serviu para aprofundar uma reflexão sobre o

racismo no país.

É importante ressaltar que a situação do negro atualmente, no Brasil, é

bastante diferente daquela de cem anos atrás. Porém, grande parte da população

negra continua segregada, deixada às ocupações menos prestigiosas e aos estratos

mais baixos da sociedade, vivendo uma discriminação, de fato, silenciosa. Em

contrapartida, na luta contra a discriminação racial há uma legislação que embasa a

proteção dos negros ao preconceito e cria crimes para quem fere seus direitos, o

que será explorado neste capítulo. No próximo, será visto como o assunto está

sendo julgado nos tribunais e tratado nas Delegacias da 19ª Região Policial da

Polícia Civil, com sede em Lajeado.

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Sobre o assunto são importantes as contribuições de Bertúlio (2003, p. 124),

o qual acredita que “[...] o valor do crime de discriminação racial está cristalizado

pelo processo de formação histórico-cultural racista do Brasil [...]”.

Dessa forma, nota-se que a discriminação racial está presente desde a

existência da escravidão, causando reflexos nos tempos hodiernos; ocasionando, no

decorrer do período, a tipificação dos crimes raciais, pois, anteriormente, era visto

como uma contravenção penal e, antes, como fatos atípicos no âmbito penal.

O capítulo também irá identificar o Direito como perpetuador do racismo

institucional. Será abordado ainda como os crimes são recepcionados, no âmbito

jurídico brasileiro, tanto no sistema constitucional, como também no penal,

demonstrando evolução dessas leis com relação à proteção às pessoas que sofrem

o crime de racismo.

3.1 O Direito como perpetuador do racismo institucional

O Direito, enquanto formador e ordenador de valores sociais, tem adquirido

papel importante na manutenção de estereótipos e méritos no Estado brasileiro

(BERTÚLIO, 2003).

De acordo com esse papel desempenhado pelo Direito, Bertúlio (2003, p. 99)

acredita que:

Tal papel perpetua preconceitos e discriminações contra grupos específicos de indivíduos, estabelecendo, no contraponto, privilégios/prejuízos intrínsecos à natureza de ser dos indivíduos. Nesse caminhar, o sistema jurídico produz e reproduz desigualdades de toda ordem, sem entretanto, permitir a apreensão de sua realidade, acobertado que está, esse mesmo direito, pela legalidade e legitimidade da falsa verdade jurídica.

Castro (2007) diz que, desde a proclamação da independência, em setembro

de 1822, entendia-se a necessidade de mudanças dos diversos aspectos da

sociedade nacional. A primeira providência foi manter as leis portuguesas, sendo

aplicadas pela Assembleia Constituinte.

Foi no ano de 1830 que o Código Criminal do Império decretou, juntamente

com a garantia constitucional, não poder mais haver penas com os açoites, a tortura,

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a marca de ferro quente e todas as demais penas cruéis. Porém, essa lei era válida

para todos, menos aos escravos, que eram considerados coisas por um lado e

pessoas no caso de delito (CASTRO, 2007).

Nesse sentido, o autor descreve o artigo decretado pela Constituição

Outorgada, o qual era aplicado aos negros escravos:

Art. 60. Se o réo fôr escravo, e incorrer em pena que não seja a capital ou de galés será condemnado à de açoutes, e, depois de os soffrer, será entregue a seu senhor, que se obrigará a trazel-o com um ferro pelo tempo e maneira que o juiz o designar. O número de açoutes será fixado na sentença; e não poderá levar por dia mais de cincoenta (CASTRO, 2007, p. 376).

Bertúlio (2003) acredita que os fatos de preconceitos e discriminação deram-

se a partir do período escravocrata, ou seja, desde a metade do século XIX. Apesar

de haver o surgimento da Lei Áurea, que pôs fim à produção escravista, ainda

ocorria muitas mortes, atrocidades “[...] e uma legislação escravista que não

considerava o escravo pessoa, mas bem patrimonial e de produção [...]”

(BERTÚLIO, 2003, p. 107).

No ano de 1888, ocorreu a promulgação da Lei Áurea, decretada pela

Princesa Isabel, regente de D. Pedro II, que aboliu a escravidão no país:

A princesa Imperial Regente, em nome de sua Majestade, o Imperador Senhor D. Pedro II, faz saber a todos os seus súditos do Império que a Assembleia Geral Decretou e Ela sancionou a Lei seguinte: Art. 1º. É declarada extinta desde a data desta Lei a escravidão no Brasil Art. 2º. Revogam-se as disposições em contrário. Manda portanto a todas as autoridades que o conhecimento e execução da referida Lei pertencer que a cumpram e façam cumprir e guardar tão inteiramente como nela se contem [...] (CARDOSO, 2007, p. 406).

A Lei do Ventre Livre também foi um marco importante na história do negro,

pois determinava que “[...] os filhos da mulher escrava, que nascerem no Império

desde a data desta lei, serão considerados de condição livre” (BERTÚLIO, 2003, p.

107). Todavia, a ideia de liberdade da lei não tem conformidade com o texto integral.

Assim, a Lei nº 2.040, de 8 de setembro de 1871, apresentada por Bertúlio

(2003, p. 108), mostra que:

§ 1º. Os ditos filhos menores ficarão em poder e sob a autoridade dos senhores de suas mães, os quais terão a obrigação de criá-los e tratá-los até a idade de oito anos completos.

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Chegando o filho da escrava a essa idade, o senhor da mãe terá a opção, ou de receber do Estado a indenização de 6000$000, ou de utilizar-se dos serviços do menor até a idade de 21 anos completos.

Dessa forma, a Lei e o Direito, ao mesmo tempo em que informam a liberdade

por um ângulo, por outro, através do mesmo mecanismo de formação de ideias e,

aprimorando o mesmo valor de verdade e legitimidade à sociedade, demonstra o

significado de liberdade para a população negra (BERTÚLIO, 2003).

Sobre o artigo imposto na Lei nº 2.040/1871, Bertúlio (2003, p. 108) afirma

que:

[...] estabelece no inconsciente coletivo, de brancos e de negros, na apreensão da sociedade civil e do Estado, o limite de cidadania e de direitos das pessoas, de acordo com o seu pertencimento racial. No mesmo parágrafo, continua o texto dizendo que quando o senhor de escravo optava pela indenização, devia entregar o menos ao Governo, que lhe dará destino, em conformidade do presente lei [...].

Essa estudiosa resume as leis do Império, as quais tratavam da escravidão e

da abolição da escravatura, como sendo uma reorganização dos conceitos jurídicos

de igualdade, liberdade e direitos fundamentais. (BERTÚLIO, 2003).

Com o passar das décadas, foram surgindo outros momentos que

apresentam subsídios para reflexão sobre o racismo acoplado ao escravismo e

externado no sistema jurídico brasileiro.

Desse modo, o fato dos escravos terem sidos libertados não lhes concedia a

cidadania, consequentemente, a razão para o tratamento desigual deslocava-se,

então, para a raça em vez da condição de escravo, “[...] e a discriminação ou

qualquer tratamento segregador, que devido ao modelo escravista fosse permitido

ao escravo, passando a aplicar a todo negro [...]” (BERTÚLIO, 2003, p. 109).

A autora salienta, também, a respeito dos reflexos da escravidão e da

abolição perante as discussões sobre a nacionalidade, que a proclamação da

República trouxe à tona, ensejando várias outras construções sociais de

significância na formação do inconsciente coletivo da nação relativamente à raça e

ao racismo, alguns fatos:

Um aparato de valores raciais racistas é produzido e reproduzido, com base nas teorias e ideologias racistas europeias para dar suporte ao projeto ideológico da elite brasileira para formação do povo brasileiro: uma nação

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branca, ou mais uma nação branca no continente americano. O continente da população negra recém-libertada que igualmente era o contingente majoritário da população da jovem nação, igual perante a lei, conforme a Carta Constitucional da República [...] (BERTÚLIO, 2003, p. 110).

A estudiosa crê que, embora a legislação e a sociedade brasileira tenham

passado por diversas modificações, quase não existiram discussões sobre o racismo

e sua maneira de se proteger, visto que:

A realidade é que em nenhum momento da discussão dos problemas políticos e sociais brasileiros entraram em pauta nem o acirramento dos racismos, em razão dos regimes de exceção que culminaram com a restrição e muitas vezes supressão dos direitos fundamentais, nem as péssimas condições de vida da população negra, que, confinada inteiramente entre as camadas pobres e miseráveis da população, também era vítima preferencial da repressão “comum” [...] (BERTÚLIO, 2003, p. 113).

Nesse contexto, Silva (2001) relata que ainda que tenha sido abolida a

escravidão, prevendo a igualdade para todos os brasileiros, não houve, no Código

Penal de 1890, qualquer determinação contra a prática do racismo e da

discriminação.

No mesmo sentido, Estefam (2010) caracteriza o Código Penal de 1890 como

tendo um surgimento afoitado, consequentemente repleto de defeitos e alvo de

diversas críticas. Esse passou por diversas modificações ocorridas nos anos de

1940 e 1984.

A filosofia que se buscou demonstrar com essas mudanças do Direito Penal,

por meio de reforma, pode ser resumida por Toledo descrevendo que “[...] a

comunidade não tem apenas o direito de castigar, mas até o dever de realizar o

castigo de tal maneira que não impeça uma ressocialização” (TOLEDO apud

ESTEFAM, 2010, p. 67).

Importante salientar que, apesar de esta ser a verdade sobre a escravidão

ocorrida no Brasil e os tempos serem outros, ainda permanece a ideia de

preconceito e discriminação na sociedade atual.

Assim, consequentemente, foram criadas proteções jurídicas ao cidadão que

sofre o crime de preconceito racial, cuja previsão está no sistema Constitucional

como, também, em lei específica.

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Devido à relevância do tema, primeiramente, torna-se fundamental designar o

embasamento constitucional para, posteriormente, referenciar-se as leis específicas

dos crimes de discriminação racial.

3.2 A questão da discriminação na Constituição Federal de 05 de outubro de

1988

A Constituição Federal de 1988 prevê, no seu artigo 5º XLII, a proteção às

pessoas que sofrerem qualquer tipo de discriminação com relação à cor, entre

outros aspectos considerados preconceituosos pelo legislador, visando ao amparo

jurídico e à penalidade ao fato em questão.

Conforme Silva (2001, p. 49), “a leitura atenta dos artigos da Constituição

Federal de 1988 já evidencia a força marcante com que a igualdade surge neste

período da história do Brasil”.

A igualdade formal, desde as primeiras Cartas Magnas, está presente nos

textos constitucionais brasileiros, porém, na Constituição Federal de 1988, existe

uma visibilidade maior na igualdade material, pois, conforme Bonavides:

[...] de todos os direitos fundamentais, a igualdade é aquela que mais tem subido de importância no Direito Constitucional de nossos dias, sendo, como não poderia deixar de ser, o direito chave, o direito de guardiã do Estado social brasileiro (BONAVIDES apud SILVA, 2001, p. 50).

A importância atribuída aos temas de igualdade e, logo, do combate à

discriminação, é percebida com clareza pelos constituintes que a incluem, no

Preâmbulo da Constituição, como uma das metas do Estado Democrático “[...]

assegurar uma sociedade pluralista e sem preconceitos [...]” (SILVA, 2001, p. 51).

Nesse sentido, Santos (2005, p. 69) salienta que:

No artigo 1º da nossa Constituição, afirma-se que o Brasil é um Estado democrático de direito, o que mostra ser nossa premissa primeira querer buscar as diretrizes e os princípios orientadores de nosso ordenamento jurídico. Assim, urge conceituar e resgatar as ideias que formam a noção de Estado democrático de direito. Ou seja, garantidor de direitos e de igualdade formal.

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O estudioso, ao analisar a Constituição Federal, acredita que deverá existir

uma hermenêutica aberta, por se tratar de um Estado democrático de direito, ou

seja:

[...] adequada a uma sociedade complexa e pluralista, que tenha como intérpretes legítimos da Constituição os cidadãos e os movimentos sociais organizados. Assim, tendo a questão racial atingido um respaldo social alto, tanto em seu poder de mobilizar como na aceitação de uma necessidade estatal de intervenção nas relações raciais, urge uma hermenêutica constitucional aberta, que incorpore em seu juízo sobre o conteúdo constitucional a pluralidade e os movimentos democráticos que se formam como grupos de pressão legítimos na sociedade brasileira (SANTOS, 2005, p. 34).

Mas, de todos esses artigos inseridos na Constituição Federal de 1988,

considerando-se o direcionamento do presente trabalho e as reflexões ocasionados

diretamente na área Penal, será abordado o inciso XLII do artigo 5°dessa

Constituição, conforme exposto a seguir.

3.2.1 A criminalização da prática do racismo

É essencial para uma melhor compreensão deste trabalho e para saber se

uma atitude racista é criminosa, ter bem claro, antes, quais as definições da palavra

crime. A doutrina costuma citar três conceitos desse vocábulo, a saber: formal,

material (ou substancial) e analítico.

Acerca do conceito de crime formal, Fragoso acredita ser “[...] uma conduta

(ação ou omissão) contrária ao Direito, a que a lei atribui uma pena” (FRAGOSO

apud FABRINI; MIRABETE, 2013, p. 79).

Nesse mesmo sentido, Carmignani dispõe que “crime é o fato humano

contrário à lei” (CARMIGNANI apud FABRINI; MIRABETE, 2013, p. 79).

Essas definições descrevem apenas um dos caracteres do fenômeno

criminal, nesse caso:

[...] o mais aparente, que é a contribuição do fato a uma norma de direito, ou seja, sua ilegalidade como fato contrário à norma penal. Não penetram, contudo, em sua essência, em seu conteúdo, em sua “matéria” (FABRINI; MIRABETE, 2013, p. 79).

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Por outro lado, existem os conceitos materiais a respeito do crime, um dos

quais Noronha caracteriza como sendo crime “[...] a conduta humana que lesa ou

expõe a perigo um bem jurídico protegido pela lei” (NORONHA apud FABRINI;

MIRABETE, 2013, p. 80), bem como:

[...] crime é ação ou omissão que, a juízo do legislador, contrasta violentamente com valores ou interesses do corpo social, de modo a exigir que seja proibida sob ameaça de pena, ou que se considere afastável somente através da sanção pena (NORONHA apud FABRINI; MIRABETE, 2013, p. 80).

Na mesma visão, Asua caracteriza o conceito material de crime como:

[...] a conduta considerada pelo legislador como contrária a uma norma de cultura reconhecida pelo Estado e lesiva de bens juridicamente protegidos, procedentes de um homem imputável que manifesta com sua agressão perigosidade social (ASUA apud FABRINI; MIRABETE, 2013, p. 80).

De acordo com Bitencourt (2008, p. 210), “os conceitos formal e material são

insuficientes para permitir à dogmática penal a realização de uma análise dos

elementos estruturais do conceito de crime”.

Assim, criou-se, ao longo do tempo, como conceito analítico de crime “[...]

predominantes à ação típica, antijurídica e culpável”. Porém, no Estado brasileiro a

culpabilidade é aceita como mero desígnio de pena (TAVARES apud BITENCOURT,

2008, p. 210).

A legislação brasileira considera crime, através do seguinte disposto no

Código Penal:

Considera-se crime a infração penal que a lei comina a pena de reclusão ou detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração que a lei comina, isoladamente pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente (Decreto-lei nº 3.914/41 apud BITENCOURT, 2013, p. 211).

Nessa esteira, conforme Silva (2001), a prática do racismo foi considerada

crime pelo legislador constituinte, e este preceito normativo, incluindo entre as

cláusulas pétreas da Constituição Federal de 1988, o artigo 5°, inciso XLII:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...]

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XLII – a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei.

A Constituição de 1988, no artigo anterior, segundo essa autora, ocasionou

uma distinção profunda entre as demais discriminações que são praticadas no

âmbito social, pois, a partir desse momento, os direitos de quem sofresse esse tipo

de crime seriam assegurados, com poder baseado no âmbito jurídico (SILVA, 2001).

Porém, anteriormente à Constituição Federal, havia dúvidas quanto à

inconstitucionalidade da Lei n° 7.437, de 1985, ou seja, a Lei Maior que considerava

a discriminação racial uma contravenção penal, e não crime. Mas, para que esse

preceito mudasse, ocorreu grande vigília do movimento negro perante essa lei, para

que tornasse crime, ou seja, ganhasse status penal correspondente à gravidade da

perturbação causada na sociedade (SILVA, 2001).

De acordo com Santos (2001), o Brasil não é um país isento de problemas

raciais ou no qual ocorram poucas e raras condutas discriminatórias. Por isso, a

Constituição representou um aspecto importante nessa questão, sendo

reconhecidos pelo próprio legislador brasileiro os sérios problemas causados por

esse aspecto.

Assim, pode-se destacar que a Constituição Federal de 1988 consagrou os

“[...] esforços e a luta dos movimentos negros brasileiros ao reconhecer a prática do

racismo em nossa sociedade e instituído como um crime inafiançável e imprescritível

[...]” (SILVA, 2001, p. 2). Essas características do crime de racismo serão

apresentadas em sequência.

3.2.2 Imprescritibilidade

A Constituição, em seu artigo 5°, inciso XLII, determina a prática do crime de

racismo inafiançável e imprescritível.

Caldeira (2009, p. 2) acredita que a imprescritibilidade, diferentemente da

prescritibilidade, significa:

[...] ao permitir que o Estado, a qualquer momento, exerça o seu direito decorrente do valor constitucional da liberdade pela promoção de acentuado

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grau da sensação de insegurança pública e desestabilização social; num ambiente de pós-modernidade, marcada pela juridicidade e pela ampla liberdade pública, além da afirmação e do reconhecimento das garantias e liberdades constitucionalmente reconhecidas, é completamente ilegítimo que a própria ordem jurídica, constitucional e legal, fomente a incompetência do Governo e a ineficiência do Estado em detrimento dos direitos e das garantias fundamentais dos indivíduos, especialmente quando há referência aos direitos substancialmente mais caros, como é o direito decorrente do valor constitucional da liberdade.

Assim, o Poder Constituinte Originário, instituiu a imprescritibilidade no crime

de racismo, previsto na Constituição Federal.

Para Nucci (2013), imprescritível não passa de uma demagogia prevista na

Constituição, pois a maior parte das condenações não terá como impor a pena

privativa de liberdade em regime fechado, o que demostra a sua pouca importância

às vistas da lei.

Na mesma visão, Shecaira acredita que:

[...] a imprescritibilidade é um verdadeiro insulto à moderna concepção de justiça e incompatível com o princípio de respeito à dignidade dos seres humanos insculpidos na Constituição Federal. Ademais, fere os princípios da proporcionalidade e da humanização das penas (SHECAIRA apud NUCCI, 2013, p. 253).

Nessa esfera, Falcão também acredita que esse sistema é demagógico, visto

que “[...] vai de encontro com a nossa sistemática legal” (FALCÃO apud SIVLA,

2001, p. 58).

Silva (2001, p. 59) salienta que a Constituição, ao prever a imprescritibilidade

para o crime de racismo, fez com que o legislador constituinte contrapusesse o

princípio da proporcionalidade, uma vez que “[...] para crimes tão ou mais graves

continuarão sendo aplicadas as regras do instituto da prescrição”.

A estudiosa salienta o sentido da imprescritibilidade imposta na Constituição

Federal de 1988 que:

Com efeito, a pena, sendo aplicada muito tempo depois da ocorrência do delito, não teria justificativa alguma. Com o passar do tempo, dilui-se o clamor público, a indignação, o sentimento de insegurança, etc., que o crime poderia causar e, diante dessa nova realidade, o Estado “não tem mais razões para aplicar ao fato o Direito Penal objetivo, extinguindo-se a exigência de punição” (SILVA, 2001, p. 59).

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Dessa forma, a prescrição nada mais é do que “[...] a perda do direito de punir

do Estado, pelo decurso de tempo, em razão do seu exercício, dentro do prazo

previamente fixado” (BITENCOURT apud SANTOS, 2010, p. 154). Já diferentemente

da imprescritibilidade, que é a ausência de prescrição.

Assim, pode-se concluir que este dispositivo constitucional está em

desconformidade com o preceito inicial da Carta Magna, representando um

retrocesso ao sistema penal pátrio.

3.2.3 Inafiançabilidade

A fiança descrita na Constituição Federal em seu artigo 5°, inciso XLII, é

tratada por Marques como “[...] um ônus imposto ao réu ou ao indiciado em quase

todos os casos de liberdade provisória, para que, assim, ele possa defender-se solto

em processo condenatório” (MARQUES apud SILVA, 2001, p. 59).

Ainda, Silva (2001, p. 60) a caracteriza “[...] em um depósito, em dinheiro ou

valores, realizado pelo acusado ou em seu nome para que responda o processo em

liberdade [...]”.

Desse modo, percebe-se que, apesar de o legislador pretender ser mais

rigoroso com os acusados que respondessem processos por crimes de racismo,

paradoxalmente, acabou por beneficiá-los, pois, de certo ponto de vista, os réus

dificilmente deixarão de receber a liberdade provisória sem pagar fiança (SILVA,

2001).

Nesse contexto, Santos (2010, p. 166) salienta que:

[...] pode-se afirmar que, muito embora tidas como formalmente válidas as normas de inafiançabilidade, a questão em si possui importância apenas relativa, e seu valor reside mais no campo da intimidação simbólica do que, propriamente, na realidade concreta do direito.

Logo após entrar em vigor a Constituição Federal, o legislador cumpriu o

dispositivo que determinava a criminalização da prática do racismo e, em sequência,

surgiram outras leis que tipificaram esse crime, presente na sociedade brasileira.

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Consequentemente, houve o surgimento da Lei nº 7.716/1989, que penaliza a

prática de discriminação e o preconceito racial.

3.3 A Lei nº 7.716 de 05 de janeiro 1989

A constituição Federal de 1988 foi uma grande conquista na matéria

relacionada à discriminação, pois impôs ao crime de prática de racismo a

imprescritibilidade e inafiançabilidade, em que pesem as críticas doutrinárias já

expostas.

No entanto, conforme Silva (2001), o constituinte, ao criminalizar a prática do

racismo, não definiu o que entende por racismo. Por isso, foram promulgadas leis

penais sobre o assunto.

A estudiosa relata que após três meses da promulgação da Carta Magna de

1988, o legislador ordinário elaborou uma lei antidiscriminatória definindo os crimes

resultantes de raça ou de cor. O autor dessa lei foi o Deputado Carlos Alberto Caó,

sendo ele quem apresentou o projeto de Lei n° 668/1988 na Câmara dos Deputados

e que, consequentemente, foi transformado na Lei nº 7.716/1989 (SILVA, 2001).

O artigo 1º da Lei nº 7.716/1989 preceitua que:

Art. 1º. Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. (Redação dada pela Lei nº 9.459, de 15/05/97).

A lei referida é composta por 21 artigos, visto que o 1° faz uma previsão

genérica no sentido de serem punidos, na forma da lei, os crimes resultantes de

preconceito de raça ou de cor. Já os artigos 20 e 21 tratam da data em que a lei

passa a vigorar e que ficam revogadas as disposições em contrário. Os artigos 2°,

15, 17 e 19 foram vetados e, por fim, os artigos 16 e 18 preveem efeitos possíveis

em caso de condenação. Restando, assim, doze artigos penais (SILVA, 2001).

Os artigos vetados, pelo então Presidente da República José Sarney, tiveram

como justificativas os seguintes critérios:

O artigo 2° previa que o racismo seria imprescritível e insuscetível de suspensão condicional da pena. Como o SURSIS é um direito que a própria

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Constituição garante a todos os condenados, esse artigo era inconstitucional, pois não pode o legislador ordinário fazer uma restrição que está expressamente disposta na Carta Magna;

O artigo 15 dispunha que discriminar alguém por razões econômicas, sociais, políticas ou religiosas, em local de trabalho, em público ou reuniões sociais seria considerado delito. O veto foi proferido com a justificativa de ser a tipificação muito abrangente e de difícil comprovação. No entanto, é sabido que muitas discriminações também ocorrem em função de situação social e econômica da vítima [...]. Em face disto, o veto foi considerado indevido por muitos juristas;

Os outros dois vetos, do artigo 17, que previa pena acessória, e o do artigo 19, que determinava o rito sumário para o processo, foram corretos, uma vez que, com a reforma do Código Penal – parte geral, ficaram abolidas as penas acessórias e o rito previsto era incompatível para os delitos punidos com pena de reclusão (SANTOS, 2001, p. 62-63).

Assim, sob esse ponto de vista jurídico, pode-se dizer que a lei teve grandes

mudanças, aperfeiçoando-se na tipificação dos crimes, pois os artigos vetados

ocasionaram significativas reformas.

Os doze artigos penais restantes que formam esta lei, também conhecida

com Lei Caó, preveem “[...] sanções que vão de um a cinco anos de reclusão, com a

possibilidade de ser agravada em 1/3 (um terço) da pena, quando o crime previsto

no artigo 6° for praticado contra menor [...]” (SILVA, 2001, p. 63). A autora ainda

acrescenta que todos estes delitos admitem tanto tentativa como coautoria, devendo

utilizar-se das regras gerais cabíveis, previstas no Código Penal.

Desse modo, é de suma importância ressaltar o mérito atribuído à Lei nº

7.716/1989, visto que transformou o ato ilícito resultante de preconceito de raça e de

cor em crime.

Porém, Silva (2001) relata que as críticas começaram a surgir logo após a

vigência da Lei Caó, visto que essa tinha seu teor jurídico baseado na Lei Afonso

Arinos, existente antes da Constituição de 1988. Mas, para melhorar essa situação,

começaram a surgir outras leis, algumas de matérias diversas que estipulavam, em

seus textos, tipos penais para um melhor auxílio no combate à discriminação.

Com a finalidade de preencher essas lacunas, o legislador ordinário

promulgou a Lei n° 8.081/1990, em que acrescentou à lei anterior os artigos 20 e 21.

Com o artigo 20 uma maior diversidade de discriminações foi tipificada; porém, esse

texto legal apenas servia para prática de discriminação relacionada aos meios de

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comunicação, como, por exemplo, os crimes ocasionados no círculo de rádio,

televisão e jornais (SILVA, 2001).

O tipo penal do artigo 20 trouxe três tipos de verbos bastante amplos, os

quais são: praticar, induzir e instigar. O primeiro está relacionado com qualquer ato,

mas desde que idôneo a produzir a discriminação prevista no tipo penal. Já o

segundo pressupõe a iniciativa na formação de vontade da parte e, por fim, instigar

“[...] procura afastar a possibilidade de uma desistência” (SILVA, 2001, p. 72).

É importante também salientar que o acréscimo desses artigos deu-se de

forma limitada, uma vez que a prática de discriminação dera-se apenas nos meios

de comunicação, porém, houve abrangência no quesito de tipificação. Mas, para que

a Lei nº 7.716/1989 fosse mais abrangente, foi criada mais uma lei para o

melhoramento de seus artigos (SILVA, 2001).

Segundo Silva (2001), a Lei nº 8.882 foi criada com o intuito de modificar a

redação do § 1° do artigo 20, introduzido pela Lei nº 8.081/1990, e renumerar os

artigos §§ 1° e 2°, que passaram a ser §§ 2° e 3°, respectivamente. Todavia, em

face do texto legal ser extremamente falha do presente parágrafo substituído,

dificilmente ele será aplicado em prática efetivamente.

Apesar de diversas mudanças ocorridas na redação da Lei nº 7.716/1989, o

legislador continuou a inserir dispositivos penais, em leis esparsas, contra a prática

discriminatória.

Nesse mesmo sentido, criou-se a Lei nº 9.459/1997, a qual alterou novamente

os artigos 1° e 20, da Lei Caó e, consequentemente, acrescentou um parágrafo ao

artigo 140, do Código Penal (SILVA, 2001).

Com esse idêntico pensamento, o estudioso Szklarowsky (1997) faz as

mesmas ponderações a respeito da importância da Lei nº 9.459/1997:

A Lei nº 9.459, de 13 de maio de 1997, alargou significativamente o alcance do diploma vigente, como já o fazia a lei que define o genocídio, de sorte que, não só o crime resultante de preconceito de raça ou de cor, mas também a discriminação é aqui abrangida, expressamente, acrescendo-se ainda os crimes resultantes de preconceito ou discriminação de etnia, religião ou procedência nacional. Corrigiu a Lei nº 7.716, de 15 de janeiro de 1989, modificando os arts. 1º e 20; revogou o art. 1º da Lei nº 8.08127; a Lei

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nº 8.88228; e acrescentou um parágrafo, o 3º, ao art. 140 do Código Penal (SZKLAROWSKY, 1997, texto digital).

Silva (2001) relata que as modificações feitas no artigo 1° determinaram a

inclusão de todos os tipos penais, ou seja, das discriminações ou preconceitos

relacionados com etnia, religião e procedência nacional, além das quais já eram

previstas, no caso, raça e cor.

Assim, Filho (2014, p. 2) acredita que o artigo 1º é “[...] imperativo ao estipular

que o preconceito racial é intolerável e, portanto, punido de forma rígida”.

Apesar da existência de vários artigos na Lei nº 7.716/1989 que contemplam

o preconceito e a discriminação, escolheu-se para este estudo tratar de forma

específica apenas o artigo 20 em seu “caput” e não fazer alusão aos seus

parágrafos, eis que não são referentes à “cor”. Além desse dispositivo, o outro crime

racista que se optou abordar foi o de injúria qualificada do artigo 140, § 3º, do

Código Penal. Mesmo que seja de outro Diploma Legal, por uma questão de fio

condutor de leitura, a injúria qualificada será tratada ainda dentro deste item.

Cabe ressaltar, a seguir, a diferença existente entre os dois crimes, bem

como sua aplicabilidade, suas características e sua punição.

3.3.1 O Artigo 20 da Lei nº 7.716/1989

Sobre o artigo 20, o legislador apenas renumerou os incisos, reproduzindo as

mesmas disposições legais. Já o caput desse artigo caracterizou crime, punido com

reclusão de um a três anos e multa a quem:

Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional (NUCCI, 2013, p. 280).

Ainda, Nucci (2013) acredita que ao mencionar os verbos induzir ou incitar,

têm-se, na realidade, modalidades “de participação moral em crimes de

discriminação racial. Por isso, do modo como é colocada à discrição ou

discriminação típica, no artigo 20, ofende-se, sem dúvida, a taxatividade do Direito

Penal” (NUCCI, 2013, p. 281).

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São importantes, também, as considerações de Filho (2014, p. 2), o qual

descreve o art. 20 da Lei nº 7.716/1989 como sendo:

Esse artigo verbaliza a prática generalizada do preconceito, considerando ainda o induzimento ou a incitação desta prática tão condenável em nossa sociedade. É notório que esse dispositivo foi elaborado para focar todos os tipos de preconceito e discriminação que não foram tipificados nos outros artigos citados, ampliando assim a eficácia da Lei Antidiscriminatória.

O autor acredita que “[...] o artigo 20 da Lei nº 7.716/1989 é um tipo penal

aberto, pois estabelece a oportunidade de o operador do direito analisar

determinadas condutas que não foram expressas pelos artigos anteriores” (FILHO,

2014, p. 2).

Dessa forma, o autor menciona que:

[...] a prática desse delito é caracterizada por qualquer ato que sinalize preconceito ou discriminação penalmente punível, ou seja, por meio de gestos, sinais, expressões, palavras faladas ou escritas ou atos físicos, e não apenas contra um indivíduo, e sim ao grupo ao qual ele pertence (FILHO, 2014, p. 2).

Silva (2001, p. 79) destaca que, com a criação desse tipo aberto, os artigos

5°, 8°, 9°, 10, 11 e 12 da Lei nº 7.716/1989, que descrevem condutas

discriminatórias expressas, ou seja, maneiras de praticar a discriminação, podem ser

consideradas “[...] formas de discriminações privilegiadas, uma vez que previstas à

mesma pena de reclusão do novo artigo 20, mas não consta a pena de multa”.

Contudo, os artigos 3°, 4°, 6°, 7°, 13 e 14 passam a discriminações qualificadas, por

terem penas privativas de liberdade mais longas do que as do artigo 20.

Santos (2010) também relata que o elemento subjetivo do tipo elencado na

Lei nº 7.716/1989, como idêntico para todos os crimes, é o dolo, ou seja, o agente

deve ter “[...] vontade livre e consciente de se praticar as condutas descritas nos

tipos penais [...]” (p. 94).

Fabrini e Mirabete (2011, p. 130) mencionam que o “[...] dolo existe quando o

agente quer ou consente na realização da figura típica ou, nos termos da lei, quando

quer ou consente no resultado, não importando que esse tipo (ou evento) seja de

dano ou de perigo”.

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3.3.2 O Art. 140, § 3º, do Código Penal

Outra significativa inovação da Lei nº 9.459/1997 (posterior, portanto, à Lei nº

7.716/89) citada por Silva (2001), foi a introdução pelo artigo 2°, que acrescentou um

parágrafo no artigo 140 do Código Penal brasileiro, o qual descreve o tipo penal de

injúria, nos seguintes termos:

Art. 140. Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: [...] § 3°. Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes à raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência.

Conforme Silva (2001, p. 90), isso ocorreu porque havia muitas ocorrências

policiais feitas pelas vítimas, e “[...] cerca de 80% eram relacionados a fatos de

injúria racial”. Assim, para dar uma solução a esse problema, o legislador criou a

injúria qualificada, ou injúria racial.

Assim, verifica-se, segundo Prado (2006, p. 287), que a injúria preconceituosa

é aquela em que “[...] o agente busca ofender a dignidade ou decoro da vítima

utilizando-se de referências à raça, cor, etnia, religião, origem [...]”.

Nessa mesma esfera, Mirabete (2005, p. 169) salienta ser a injúria qualificada

como “[...] palavras racistas e pejorativas, deixando-se patenteada a pretensão de,

em razão da cor da pele, por exemplo, se sobrepor à pessoa de raça diferente [...]”.

Em relação à Lei nº 7.716/1989, percebe-se que os artigos sofreram diversas

modificações, incluindo acréscimos como também exclusões, durante o período de

sua vigência, ocasionados em virtude de dúvidas ou de críticas à sua efetividade.

Nesse contexto, no que tange a sua efetividade, é importante a seguinte

informação:

Embora a Lei nº 7.716/1989 seja instrumento de à Constituição e, mais que isso, o único instrumento jurídico antidiscriminatório no sistema legal brasileiro, sua efetividade está fortemente comprometida. A rede institucional e cultural do racismo, garantida pelo sistema legal e implantada pelo Judiciário, trabalha diretamente no sistema de perpetuar o não reconhecimento da contribuição da população negra no desenvolvimento social, político e econômico do País, excluindo-a da garantia de direitos e, por conseguinte, da cidadania (BERTÚLIO, 2003, p. 125-126).

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Diante do exposto, torna-se importante a exposição dos efeitos ocasionados

pela Lei nº 7.716/1989, bem como sua efetividade perante o sistema Jurídico.

Júnior (2009) reflete sobre a ampliação da lei, ao relatar que:

[...] embora tenha o legislador ampliado as categorias protegidas pela Lei nº 7.716/89, acrescentando a esta a etnia, religião e procedência nacional, entendemos que foi intenção do legislador constitucional impor imprescritibilidade apenas ao crime de racismo, e por este entendemos como aqueles relativos somente à raça e cor. Não obstante nossa posição, há autores que defendem ainda a inclusão da etnia no rol dos crimes imprescritíveis, por entenderem que a etnia está ligada intrinsecamente ao conceito de raça (texto digital).

Nessa mesma linha, o autor relata que se deve distinguir o crime de racismo

bem como o de injúria racial:

[...] muito ainda se confunde o crime de racismo com a injúria qualificada do art. 140, parágrafo terceiro, do Código Penal. No crime definido na Lei nº 7.716/89, a ofensa é dirigida a toda uma raça, a qual é caracterizada por um fato pejorativo, por sua vez, na injúria qualificada do parágrafo terceiro do Código Penal, a ofensa é direcionada à honra subjetiva do indivíduo, ofensa esta que é agregada à raça, cor, etnia, religião ou origem (JÚNIOR, 2009, texto digital).

Assim, para uma melhor compreensão dessa distinção, cabe pontuar as

principais diferenças existentes entre os crimes.

3.3.3 Injúria qualificada pelo preconceito - art. 140, § 3º X art. 20 da Lei nº

7.716/1989

O termo injúria qualificada ou, injúria racial, foi criado através de modificações

ocorridas na Lei nº 7.716/1989. Mas não se deve confundir essa com o artigo 140 §

3° do Código Penal e com o artigo 20 da Lei nº 7.716/1989. Nucci (2013, p. 281)

ressalta que a lei:

[...] diz respeito à ofensa a um grupo de pessoas e não somente a um indivíduo, enquanto que o art. 140 parágrafo 3°, do Código Penal, ao contrário, refere-se a uma pessoa, embora valendo-se de instrumentos relacionados a um grupo de pessoas. Não é tarefa fácil diferenciar uma conduta e outra, porém, deve-se buscar, como horizonte, o elemento subjetivo do tipo específico. Se o agente pretender ofender o indivíduo, valendo-se de caracteres raciais, aplica-se o art. 140 parágrafo 3°, do Código Penal. No entanto, se o seu real intento for discriminar uma pessoa, embora ofendendo-a, para que, de algum modo, fique segregada, o tipo penal aplicável é o do art. 20.

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Sobre este assunto, Greco (2014) acredita que não se deve ter uma

interpretação desordenada acerca da injúria preconceituosa e dos crimes resultantes

de preconceitos de raça ou de cor, presentes na Lei nº 7.716/1989, pois “o crime de

injúria preconceituosa pune o agente que, na prática do delito, usa elementos

ligados à raça, cor, etnia etc.” (p. 468).

O autor ainda relata que os agentes buscam como finalidade “[...] atingir a

honra subjetiva da vítima, bem juridicamente protegido pelo delito em questão”

(GRECO, 2014, p. 468).

Diante do exposto, Prado (2011, p. 142) define injúria qualificada pelo

elemento racial, e não de racismo, visto que “[...] comete o crime de injúria pelo

preconceito, àquele que se utilizar de palavras depreciativas à raça e à cor, com o

intuito de ofender a honra de outra pessoa”.

Posteriormente, Santos (2010) caracteriza injúria como sendo delito, ou seja,

ofensa à honra subjetiva de outrem, com base em elementos preconceituosos,

diferentemente de crime, de preconceito ou de discriminação, tratados por muitos

como racismo. Pois, [...] embora haja nítida demonstração de racismo ou outra forma

de preconceito por parte do autor do delito, o crime em si não é classificado como

delito de “racismo”, por não fazer parte da Lei (p. 143).

O estudioso descreve o elemento subjetivo da injúria da seguinte maneira:

O elemento subjetivo é o dolo de injuriar, ou seja, a vontade livre e consciente de ofender a vítima, em virtude de ela pertencer à determinada raça, cor, etnia, religião ou por conta de sua origem ou ainda por sua condição de idoso ou portadora de deficiência (SANTOS, 2010, p. 143).

Assim, a injúria qualificada deverá ser analisada no caso concreto, ou seja, se

a pessoa ofender a dignidade de outrem lhe chamando de, por exemplo; “nego sujo,

macaco”, deverá ser aplicado o artigo 140, § 3º do Código Penal, mas pelo elemento

racial. Se for uma conduta racista genérica, não abrangida pelo artigo 140 do CPB e

tampouco pelos demais artigos da Lei nº 7.716/1989, pode-se enquadrar no artigo

20, “caput”, desta legislação e não do Código Penal.

Dessa forma, com o intuito de esclarecer os casos de injúria racial

preconceituosa em relação à “cor” negra, bem como os casos previstos no art. 20 da

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Lei nº 7.716/1989, serão feitas pesquisas jurisprudenciais a respeito dos crimes em

pauta, bem como serão apresentadas estatísticas policiais desses crimes e um

estudo de caso da 19ª Região Policial da Polícia Civil, com sede em Lajeado.

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4 (IN)APLICABILIDADE DA LEI ANTIRRACISTA NO BRASIL

Na primeira parte deste estudo, foi realizada uma análise interdisciplinar do

preconceito, da discriminação, do racismo e de conceitos correlatos, ocasionados no

mundo, no Brasil e no Rio Grande do Sul, com um breve resgate histórico do

racismo, envolvendo o movimento negro. Além disso, apresentou-se a abordagem

jurídica sobre os crimes de racismo, vendo o direito como perpetuador do racismo

institucional e descrevendo a questão da discriminação na Constituição Federal, de

05 de outubro de 1988; também foi comentada a Lei nº 7.716 de 05 de janeiro 1989

e a injúria qualificada pelo preconceito, prevista no Código Penal. Nesse contexto,

torna-se de suma importância enfocar a questão da (in)aplicabilidade da lei

antirracista no Brasil.

É notório que estão ocorrendo, na atualidade brasileira, diversos casos de

injúria qualificada, prevista no artigo 140, § 3º do CP, bem como o crime de racismo,

previsto no artigo 20 da Lei nº 7.716/1989. Porém, ainda existem dúvidas quanto ao

conceito de cada crime e se eles estão sendo enquadrados nas instâncias jurídicas,

principalmente nos casos que se optou por abordar: os que envolvem a cor negra.

Deve-se enfatizar que a Lei nº 7.716/1989, em seu art. 20, visa à punição de

quem praticar o crime de discriminação racial em relação a um grupo de pessoas.

Diferentes são os casos do art. 140, § 3º do CP, tipo penal que é dirigido a um

indivíduo, ou seja, a uma pessoa específica “embora valendo-se de instrumentos

relacionados a um grupo de pessoas” (NUCCI, 2013, p. 281).

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Dessa forma, as considerações apresentadas são essenciais para a

compreensão do presente trabalho, pois, conforme descrito anteriormente, pretende-

se neste capítulo examinar, através de pesquisas jurisprudencial no Superior

Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça e no Tribunal de Justiça do Estado do

Rio Grande do Sul, os casos aos quais se aplica a Lei especial ou o artigo 140 do

CP, em concordância com o entendimento da Legislação Penal Brasileira. Também

serão apresentadas estatísticas obtidas na Secretaria de Segurança de nosso

estado sobre os crimes em pauta, bem como um estudo de caso da 19ª Região

Policial da Polícia Civil, com sede em Lajeado.

4.1 Análise jurisprudencial acerca da (in)aplicabilidade da lei antirracista no

Brasil

O cerne deste estudo é a comprovação da inaplicabilidade ou aplicabilidade

do crime de racismo previsto em lei, bem como o crime de injúria racial exposto no

Código Penal, juntamente com a diferença de cada crime a ser aplicado no caso

concreto.

Dessa forma, como já anunciado, será feita uma análise jurisprudencial

acerca do assunto. Todavia, deve-se esclarecer que a pesquisa foi direcionada

apenas ao crime de injúria racial e ao do racismo do artigo 20 da Lei Especial, com

enfoque absolutamente e principalmente na discriminação e no preconceito à “cor

negra”.

Cumpre adiantar que houve imensa dificuldade para encontrar casos de

condenação, julgados pelos tribunais, previstos ao crime de racismo, embasado no

art. 20 da lei em relação à “cor negra”. Quanto ao artigo 140, § 3º, do CPB, houve

mais facilidade em encontrar decisões.

A seguir, serão comentadas e correlacionadas as jurisprudências que foram

encontradas em nossa pesquisa.

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4.1.1 Pesquisas Jurisprudencial realizadas nos Tribunais Superiores acerca do

art. 140, § 3º do Código Penal

O art. 140, § 3º, do CP, trata do crime de injúria racial. Assim, será

enquadrado nesse artigo quem:

Art. 140 injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: [...] § 3º. Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência: Pena - reclusão de um a três anos e multa.

Diante do exposto, passar-se-á a analisar, primeiramente, o entendimento

dos Tribunais sobre a definição de racismo para, em seguida, abordar a

(in)aplicabilidade do art. 140, §3º, do Código Penal Brasileiro no crime de

preconceito de cor racial.

O Superior Tribunal Federal define o crime de racismo como sendo:

[...] concluiu que é necessário, por meio da interpretação teleológica e sistêmica da Constituição, conjugar fatores e circunstâncias históricas, políticas e sociais que regeram a sua formação e aplicação. Apenas desta maneira é possível obter o real sentido e alcance da norma, que deve compatibilizar os conceitos etimológicos, etnológicos, sociológicos, antropológicos e biológicos. Asseverou-se que a discriminação contra os judeus, que resulta do fundamento do núcleo do pensamento do nacional-socialismo de que os judeus e os arianos formam raças distintas, é inconciliável com os padrões éticos e morais definidos na Constituição do Brasil e no mundo contemporâneo, sob os quais se ergue e se harmoniza o Estado Democrático de Direito. Assim, consignou-se que o crime de racismo é evidenciado pela simples utilização desses estigmas, o que atenta contra os princípios nos quais se erige e se organiza a sociedade humana, baseada na respeitabilidade e dignidade do ser humano e de sua pacífica convivência no meio social. Reconheceu-se, portanto, que a edição e publicação de obras escritas veiculando ideias antissemitas, que buscam resgatar e dar credibilidade à concepção racial definida pelo regime nazista, negadoras e subversoras de fatos históricos incontroversos como o holocausto, consubstanciadas na pretensa inferioridade e desqualificação do povo judeu, equivalem à incitação ao discrímen com acentuado conteúdo racista, reforçadas pelas consequências históricas dos atos em que se baseiam (texto digital).

Esse parecer do STF deu-se através do Habeas Corpus nº 82.424/RS, o qual

dispõe o seguinte fato:

A construção da definição jurídico-constitucional do termo “racismo” requer a conjugação de fatores e circunstâncias históricas, políticas e sociais que regeram a sua formação e aplicação. O crime de racismo constitui um atentado contra os princípios nos quais se erige e se organiza a sociedade

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humana, baseada na respeitabilidade e dignidade do ser humano e de sua pacífica convivência.

Assim, percebe-se que o conceito de racismo para o Superior Tribunal

Federal se deu de forma muito ampla, ou seja, além do que está previsto no Código

Penal e na Lei nº 7.716/1989.

Já o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entende como racismo o seguinte

aspecto:

Racismo é o conjunto de teorias e crenças que estabelecem uma hierarquia entre as raças e etnias. É uma doutrina ou sistema político fundado sobre o direito de uma raça (considerada pura ou superior) de dominar as outras. Por fim, é um preconceito extremado contra indivíduos pertencentes a uma raça ou etnia diferente, considerada inferior. Seguindo esse entendimento do dicionário Houaiss, percebe-se que, apesar de toda a modernidade, ainda é comum encontrarmos casos de discriminação e preconceito por causa de diferenças étnicas. As leis e a sociedade mostram que o racismo é uma atitude que deve ser abolida por completo, mas, ainda hoje, muita gente não se deu conta disso. Os preconceitos e as discriminações continuam. E vale lembrar que, pela Constituição Brasileira, racismo é crime imprescritível e inafiançável. Chamado constantemente a proteger valores como a igualdade, a dignidade e a honra dos cidadãos brasileiros [...] (texto digital).

Ao analisar ambos os conceitos dispostos pelos Tribunais Superiores, pode-

se destacar a seguinte percepção: o primeiro conceito menciona algo mais amplo,

ou seja, que vai além do crime de racismo, de forma mais abrangente.

Diferentemente do conceito exposto pelo STJ, que descreve o racismo como sendo

um crime que embasa o preconceito, bem como a discriminação. Também,

caracteriza o racismo como sendo “um conjunto de teorias e crenças que

estabelecem uma hierarquia entre raças e etnia”.

O Superior Tribunal Federal proferiu acórdão no Habeas Corpus nº 109676,

relatado pelo Excelentíssimo Ministro Luiz Fux, o qual alegou ter ocorrido o crime de

injúria qualificada pelo preconceito, prevista no art. 140 §3º do CP, denegando,

diante dos fatos expostos, o Habeas Corpus (RIO DE JANEIRO, 2013):

EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL. PROCESSUAL PENAL. DIREITO CONSTITUCIONAL. CRIME DE INJÚRIA QUALIFICADA. ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA PENA PREVISTA NO TIPO, POR OFENSA AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE, E PRETENSÃO DE VER ESTABELECIDO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NOVO PARÂMETRO PARA A SANÇÃO. CRIAÇÃO DE TERCEIRA LEI. IMPOSSIBILIDADE. SUPOSTA ATIPICIDADE DA CONDUTA E PLEITO DE DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO PARA INJÚRIA SIMPLES. REVOLVIMENTO DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA NA VIA DO WRIT.

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IMPOSSIBILIDADE. HABEAS CORPUS DENEGADO. 1. A Lei nº 9.459/97 acrescentou o § 3º ao artigo 140 do Código Penal, dispondo sobre o tipo qualificado de injúria, que tem como escopo a proteção do indivíduo contra a exposição a ofensas ou humilhações, pois não seria possível acolher a liberdade que fira direito alheio, mormente a honra subjetiva. 2. O legislador ordinário atentou para a necessidade de assegurar a prevalência dos princípios da igualdade, da inviolabilidade da honra e da imagem das pessoas para, considerados os limites da liberdade de expressão, coibir qualquer manifestação preconceituosa e discriminatória que atinja valores da sociedade brasileira, como o da harmonia inter-racial, com repúdio ao discurso de ódio. 3. O writ veicula a arguição de inconstitucionalidade do § 3º do artigo 140 do Código Penal, que disciplina o crime de injúria qualificada, sob o argumento de que a sanção penal nele prevista – pena de um a três anos de reclusão – afronta o princípio da proporcionalidade, assentando-se a sugestão de ser estabelecida para o tipo sanção penal não superior a um ano de reclusão, considerando-se a distinção entre injúria qualificada e a prática de racismo a que se refere o artigo 5º, inciso XLII, da Constituição Federal. 3.1. O impetrante alega inconstitucional a criminalização da conduta, porém sem demonstrar a inadequação ou a excessiva proibição do direito de liberdade de expressão e manifestação de pensamento em face da garantia de proteção à honra e de repulsa à prática de atos discriminatórios. 4. A pretensão de ser alterada por meio de provimento desta Corte a sanção penal prevista em lei para o tipo de injúria qualificada implicaria a formação de uma terceira lei, o que, via de regra, é vedado ao Judiciário. Precedentes: RE nº196. 590/AL, relator Ministro Moreira Alves, DJ de 14.11.96; ADI 1822/DF, relator Ministro Moreira Alves, DJ de 10.12.99; AI (Agr) 360.461/MG, relator Ministro Celso de Mello, DJe de 06.12.2005; RE (Agr) 493.234/RS, relator Ricardo Lewandowski, julgado em 27 de novembro de 2007. 5. O pleito de reconhecimento da atipicidade ou de desclassificação da conduta, do tipo de injúria qualificada para o de injúria simples, igualmente não pode ser acolhido, por implicar revolvimento de matéria fático-probatória, não admissível na via do writ. 6. In casu, o paciente foi condenado à pena de um ano e quatro meses de reclusão, substituída por uma pena restritiva de direito consistente em prestação de serviço à comunidade, e à prestação pecuniária de 16 (dezesseis) cestas básicas, de valor não inferior a R$ 100,00 (cem reais), em virtude de infração do disposto no artigo 140, § 3º, do Código Penal, a saber, injúria qualificada pelo preconceito. 7. Ordem de habeas corpus denegada.

Ainda, o referido Tribunal proferiu acórdão no Habeas Corpus nº 86452,

relatado pelo Eminente Ministro Joaquim Barbosa, o qual indeferiu o pedido de

Habeas, referente ao crime de injúria qualificada por racismo. A 2ª Turma,

preliminarmente, rejeitou, por unanimidade, a questão prejudicial pertinente à

declaração de extinção da punibilidade e, quanto ao mérito, denegou a ordem,

também por votação unânime, nos termos do voto do Relator (RIO GRANDE DO

SUL, 2006):

EMENTA: HABEAS CORPUS. CRIME DE INJÚRIA QUALIFICADA POR RACISMO. PRESCRIÇÃO. NÃO-OCORRÊNCIA. CÔMPUTO DA PENA EM ABSTRATO COM CAUSA DE ACRÉSCIMO PARA CONCESSÃO DE SURSIS. INFRAÇÕES DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO E PENA MÍNIMA PARA CONCESSÃO DE SURSIS. ORDEM INDEFERIDA. O réu responde aos fatos que lhe são imputados, não à eventual capitulação destes. Não-acolhimento do parecer da Procuradoria-Geral da República, a qual, omitindo-se acerca do conteúdo racial da injúria explicitamente

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apontado na queixa-crime, opina pelo reconhecimento da prescrição. Na espécie, a queixa-crime abrange o crime de injúria qualificada por racismo (art. 140, § 3º, do Código Penal). Prazo prescricional de oito anos. As causas de acréscimo devem ser consideradas em adição à pena em abstrato, para efeito de concessão de suspensão condicional do processo. Precedentes. A Lei dos Juizados Especiais Federais, ao estipular que são infrações de menor potencial ofensivo aquelas cuja pena máxima não seja superior a dois anos, não produziu o efeito de ampliar o limite, de um para dois anos, para o fim da suspensão condicional do processo. Ordem de habeas corpus indeferida.

Nesse mesmo norte, o Superior Tribunal de Justiça proferiu acórdão, no

Recurso Ordinário em Habeas Corpus nº 18620, a seguinte decisão referente ao

crime de injúria racial, sendo caracterizada por palavra pejorativa referente à raça

(PARANÁ):

EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. CRIME DE RACISMO. 1. DENÚNCIA QUE IMPUTA A UTILIZAÇÃO DE PALAVRAS PEJORATIVAS REFERENTES À RAÇA DO OFENDIDO. IMPUTAÇÃO. CRIME DE RACISMO. INADEQUAÇÃO. CONDUTA QUE SE AMOLDA AO TIPO DE INJÚRIA QUALIFICADA PELO USO DE ELEMENTO RACIAL. DESCLASSIFICAÇÃO. 2. ANULAÇÃO DA DENÚNCIA. DECADÊNCIA DO DIREITO DE QUEIXA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. RECONHECIMENTO. 3. RECURSO PROVIDO.

Ainda sobre o enquadramento do crime previsto no CP, o STJ proferiu o

acórdão de Habeas Corpus de nº 243983 (DISTRITO FEDERAL, 2012):

EMENTA: HABEAS CORPUS. INJÚRIA QUALIFICADA POR ELEMENTOS RACIAIS COMETIDA CONTRA POLICIAL CIVIL EM RAZÃO DA SUA FUNÇÃO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA DESACATO. EXAME DE ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO. ANÁLISE APROFUNDADA DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE NA VIA ESTREITA DO WRIT. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA À REPRESENTAÇÃO. SÚMULA 714/STF. ART. 145, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CP. ALTERAÇÃO PROMOVIDA PELA LEI N. 12.033/2009. IRRELEVÂNCIA.

Ao analisar as decisões jurisprudenciais do STF e do STJ, pode-se concluir

que são poucos os casos de injúria qualificada, expostos no artigo 140, § 3º, do

Código Penal, encontrados pela pesquisadora.

A pesquisa prossegue, como se vê a seguir, com buscas em nosso Tribunal

Estadual.

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4.1.2 Pesquisas Jurisprudencial realizadas no Tribunal de Justiça do Rio

Grande do Sul acerca do art. 140, § 3º do Código Penal

O Tribunal de Justiça (TJ) deste estado traz a seguinte decisão a respeito do

crime de injúria preconceituosa em relação à cor:

EMENTA: APELAÇÃO CRIME. APELO MINISTERIAL. INJÚRIA RACIAL. A autoria e a materialidade restaram comprovadas pela prova oral colhida. Os testemunhos foram convergentes no sentido de que o réu proferiu ofensas de cunho racial. Tal versão foi corroborada pelos depoimentos em sede policial, que, embora isoladamente, não sustentem uma condenação, combinados a outros elementos de prova, a teor do art. 155 do CPP, reforçam a tese acusatória. A negativa de autoria do réu restou isolada nos autos. Configurado o delito de injúria qualificada e impositiva a consequente condenação. PENA. Circunstâncias judiciais favoráveis. Pena privativa de liberdade fixada no mínimo legal. Fixado o regime aberto. Multa aplicada. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. Nos termos do artigo 44 do Código Penal, a pena privativa de liberdade restou substituída por uma restritiva de direitos consistente em prestação pecuniária. RECURSO PROVIDO. (Apelação Crime Nº 70059741355, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jayme Weingartner Neto, Julgado em 17/09/2014).

O TJ/RS analisa o caso em pauta, enquadrando o autor no crime de injúria

racial qualificada, visto que ofendeu a dignidade da vítima, consistindo na utilização

de elementos referentes à sua raça e cor, nesse caso, chamando-a de “negro sujo”.

Na ocasião do fato, existiam testemunhas que confirmaram o crime.

No mesmo sentido, o tribunal acima julgou o provimento da seguinte apelação

criminal:

EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 140, § 3º, DO CP. INJÚRIA RACIAL. RETORSÃO. AUSÊNCIA DE PROPORCIONALIDADE ENTRE AS OFENSAS. PERDÃO JUDICIAL AFASTADO. 1. O assistente da acusação interpôs apelação contra decisão que condenou o réu às sanções previstas no art. 140, § 3º, c/c o art. 141, II e III, e concedeu-lhe perdão judicial, nos termos do art. 140, § 1º, II, com a consequente extinção da punibilidade com base no art. 107, IX, todos do CP. Postula o afastamento do perdão judicial, com a consequente individualização e aplicação da pena ao condenado. 2. A prova coligida, nos autos, comprovou não só que o denunciado injuriou a vítima, ofendendo-lhe a dignidade e utilizando-se de elementos referentes à sua cor, mas também que, em dois momentos, ocorreu retorsão, sendo proferidas, de imediato, palavras ofensivas por parte da vítima contra o réu. 3. Contudo, na hipótese, não é cabível o reconhecimento da retorsão, nos termos do art. 140, § 1º, II, do CP) diante das características diversas das ofensas. Ocorre que o fato de a vítima ter chamado o réu de guri de merda -injúria simples - é desproporcional à ofensa preconceituosa proferida pelo réu - nego sem caráter-, que se trata de injúria qualificada (§ 3º do art. 141 do CP), na qual o agente busca ofender a dignidade ou o decoro da vítima, utilizando de referências à raça, cor, etnia, religião ou origem, indicando, portanto, maior reprovabilidade da conduta, revelada inclusive pelas penas

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diversas, mas grave no caso da injúria racial. APELAÇÃO PROVIDA. (Recurso em Sentido Estrito Nº 70057881567, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Julio Cesar Finger, Julgado em 13/08/2014).

Nesse caso, a vítima também injuriou o acusado, sendo enquadrada como

injúria simples prevista no art. 140, §1º do CP; contudo, o tribunal entende ser

desproporcional à ofensa proferida pelo réu, o qual chamou a vítima de “nego sem

caráter”. Dessa forma, lhe foi proferido o enquadramento do art. 140, § 3º, do CP.

Assim, conclui-se que o segundo artigo é mais gravoso que o primeiro, diante do

fato ocorrido e julgado pelo tribunal.

Nessa mesma linha de condenações, o presente tribunal, em acórdão

julgado na 1ª Câmara Criminal, com voto proferido pelo Relator Sylvio Baptista Neto,

manteve a punição fixada no seguinte caso:

EMENTA: CRIME DE INJÚRIA. DELITO E AUTORIA COMPROVADOS. CONDENAÇÃO MANTIDA. PENA. PUNIÇÃO APLICADA DE FORMA ADEQUADA. CONFIRMADA. I - Como afirmou o Julgador, condenando o recorrente: “Assim, analisando as provas produzidas, verifico que, efetivamente, o acusado proferiu ofensas contra a vítima, ao chamá-la de escura e logo após referir que negro é bosta”. Negro não afunda porque é igual a um troço, boia”. As ofensas verbais proferidas pelo réu denotaram conteúdo racista e preconceituoso, por vincular a cor da vítima aos comentários, comparando as pessoas negras a “bosta”. Ora, tais comentários inequivocamente demonstram forte conteúdo racial e discriminatório e tipificam a conduta descrita art. 140, § 3.º, do Código Penal (injúria qualificada)... Presente, pois, o animus injuriandi." II - Diante da enorme carga de subjetivismo na aplicação da pena-base e acréscimos ou reduções face às agravantes e atenuantes, deve-se, tanto quanto possível, aceitar aquela fixada na sentença. A alteração só deve acontecer, quando se verificar grave erro na fixação da punição. Deve-se sempre ter em mente o que estipula o artigo 59 do Código Penal em seu final: “estabelecerá conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime.” Este deve ser o limite na aplicação da reprimenda, razão pela qual se mantém a punição fixada. DECISÃO: Apelos defensivos e da assistência à acusação desprovidos. Unânime. (Apelação Crime Nº 70054812482, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sylvio Baptista Neto, Julgado em 16/10/2013).

Sobre a importância da caracterização do crime previsto no art. 140, § 3º, do

Código Penal, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, na Comarca de

Palmeiras das Missões, enfatiza o seguinte caso, julgado no ano de 2013, com

vistas às palavras usadas pelo autor:

EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL. INJÚRIA RACIAL. PRESCRIÇÃO. Chamar o ofendido de "negro baderneiro", "negro bandido" e "negro quadrilheiro" não constitui crime de racismo, mas sim de injúria qualificada. Desde o recebimento da queixa-crime, em 01.04.2003, decorreu lapso temporal superior a oito anos sem o advento de qualquer dos marcos

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interruptivos da prescrição. Extinção da punibilidade pela incidência da prescrição, com base na pena em abstrato, forte no art. 107, inciso IV, c/c art. 109, inciso VI, todos do Código Penal. Exame do mérito prejudicado. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELA PRESCRIÇÃO. (Apelação Crime Nº 70026731083, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Osnilda Pisa, Julgado em 29/01/2013).

É fundamental reforçar que a testemunha é de suma importância para a

comprovação do delito, uma vez que para o autor ser enquadrado no art. 140, § 3º

do CP, deve-se ter certeza do fato cometido por ele. Assim, torna-se efetiva a

aplicação do artigo em questão, como se pode ver abaixo:

EMENTA: APELAÇÃO CRIME. INJÚRIA QUALIFICADA. OFENSA RACIAL. VIAS DE FATO. SUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. CONDENAÇÃO. Palavras da vítima e da testemunha presencial mostram-se coesas ao demonstrar a ocorrência da injúria qualificada, visto que os termos utilizados pelo acusado - nega vagabunda, nega chinelona, caloteira - denotam o intuito de ofensa à honra da ofendida, com conotação racial. Igualmente, relatos subsistentes quanto à ocorrência da contravenção penal de vias de fato. Por outro lado, relatos das testemunhas defensivas revelaram-se contraditórios entre si. Imposição de juízo condenatório. APELAÇÃO PROVIDA. (Apelação Crime Nº 70048957252, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Francesco Conti, Julgado em 26/07/2012).

Essa decisão foi julgada pelo Julgador de 1º Grau Marcos Danilo Edon

Franco, no ano de 2012. O autor foi condenado na sanção do artigo 140, § 3º, haja

vista a imputação de palavras raciais, as quais foram; “nega vagabunda, nega

chinelona”.

Ainda sobre a prova testemunhal na injúria qualificada, o Tribunal de Justiça

do Rio Grande do Sul tem o seguinte parecer:

EMENTA: CÓDIGO PENAL. ART. 140, § 3º. CRIMES CONTRA A HONRA. INJÚRIA QUALIFICADA. EXISTÊNCIA DO FATO E AUTORIA. Induvidosa a existência do fato, cujo reconhecimento decorre da análise da prova testemunhal. Certa também a autoria, e não desqualifica a prova o fato de serem, as testemunhas, conhecidas ou amigas da ofendida. As expressões utilizadas configuram a injúria qualificada, pois diz respeito à raça, cor, etnia, perfeitamente adaptada a conduta ao tipo penal. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. Fixada no mínimo legal. APELO DEFENSIVO IMPROVIDO. UNÂNIME. (Apelação Crime Nº 70048215446, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ivan Leomar Bruxel, Julgado em 04/10/2012).

Na mesma linha, tem-se a seguinte decisão:

EMENTA: APELAÇÃO CRIME. INJÚRIA QUALIFICADA. OFENSA RACIAL. VIAS DE FATO. SUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. CONDENAÇÃO. Palavras da vítima e da testemunha presencial mostram-se coesas ao demonstrar a ocorrência da injúria qualificada, visto que os termos utilizados pelo acusado - nega vagabunda, nega chinelona, caloteira - denotam o intuito de ofensa à

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honra da ofendida, com conotação racial. Igualmente, relatos subsistentes quanto à ocorrência da contravenção penal de vias de fato. Por outro lado, relatos das testemunhas defensivas revelaram-se contraditórios entre si. Imposição de juízo condenatório. APELAÇÃO PROVIDA. (Apelação Crime Nº 70048957252, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Francesco Conti, Julgado em 26/07/2012).

Na primeira apelação criminal julgada, a condenação teve o mesmo resultado

lógico da prova produzida. Assim, a pena foi fixada em 1 (um) ano de reclusão, haja

vista a inexistência de agravantes. Também, a atenuante da menoridade não tem a

virtude de levar a pena abaixo do mínimo cominado, e também não existem causas

de aumento da diminuição a serem consideradas.

Em contrapartida, a querelada apelou, alegando ausência de prova capaz

para viabilizar a condenação e desqualificando as testemunhas, pois eram

conhecidas e amigas da vítima, e que não restaram esclarecidas as circunstâncias

em que ocorreram os fatos. Porém, a decisão não desqualificou as testemunhas,

pelo simples fato de serem conhecidas, ou até mesmo amigas da ofendida, pois

nem todas as condutas contrárias ao direito ocorrem diante de testemunhas que

guardam igual distância entre ofendido e ofensor, sendo ainda de todos sabido que

é difícil identificar e encontrar testemunhas desconhecidas. Portanto, houve a ofensa

racista.

Nessa mesma esfera, a segunda decisão condenou o autor em 1 (um) ano de

reclusão. Nesse caso, tem-se que houve utilização de termos pejorativos referentes

à raça da ofendida - nega vagabunda, nega chinelona, caloteira -, com o nítido

intuito de lesão à honra desta, não havendo dúvidas de que o acusado agiu

dolosamente ao proferir ofensas à vítima, injuriando-a especialmente por sua raça

negra, o que reclama especial e mais rigoroso tratamento penal, o que importa no

crime de injúria qualificada pelo uso de elemento racial (art. 140, § 3º, do CP).

No próximo item, será apresentada a pesquisa do crime de racismo referente

à cor, previsto na Lei nº 7.716/1989, haja vista a importância da diferenciação com o

crime de injúria racista.

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4.1.3 Pesquisas Jurisprudencial realizadas nos Tribunais Superiores acerca do

art. 20 da Lei nº 7.716/1989

Está exposto no artigo 20 da Lei nº 7.716/1989, o seguinte preceito:

Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Pena: reclusão de um a três anos e multa (texto digital).

Para melhor percepção, junta-se a seguinte decisão do Superior Tribunal

Federal que relata, especificamente, o enquadramento do tipo penal do crime de

racismo previsto no art. 20 da Lei nº 7.716/1989, tendo como relator o Ministro

Marco Aurélio:

EMENTA: TIPO PENAL – DISCRIMINAÇÃO OU PRECONCEITO – ARTIGO 20 DA LEI Nº 7.716/89 – ALCANCE. O disposto no artigo 20 da Lei nº 7.716/89 tipifica o crime de discriminação ou preconceito considerada a raça, a cor, a etnia, a religião ou a procedência nacional, não alcançando a decorrente de opção sexual.

Através das pesquisas colhidas no STF, bem como o STJ, não foi possível à

identificação de casos que envolvam característica de cor referentes ao crime do art.

20 da Lei nº 7.716/1989. Analisando-se todas as jurisprudências encontradas,

concluiu-se que existem algumas decisões a respeito da raça, etnia, religião e

procedência nacional, mas nenhuma especificamente relacionada à cor negra, que é

o cerne de estudo do presente trabalho.

4.1.4 Pesquisas Jurisprudencial realizadas no Tribunal de Justiça do Rio

Grande do Sul acerca do art. 20 da Lei nº 7.716/1989

Pesquisou-se, também, no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, no qual

aparecem algumas decisões a respeito do assunto estudado.

EMENTA: APELAÇÃO CRIME. DISCRIMINAÇÃO E PRECONCEITO RACIAL. LEI Nº 7.716/89. MEDIDA DE SEGURANÇA CONVERTIDA EM TRATAMENTO AMBULATORIAL. Acusada portadora de esquizofrenia paranoide, incapaz de reconhecer o caráter ilícito de sua conduta. Decisão absolutória imprópria, determinando medida de internação por, no mínimo, um ano. Apelo para conversão da medida em tratamento ambulatorial, medida com a qual está de acordo o Ministério Público nos dois graus de jurisdição. Periculosidade inexiste. Ré interdita, sob curadoria da irmã.

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Tratamento ambulatorial em andamento desde antes da data dos fatos. Desnecessidade da medida de internação. Conversão em tratamento ambulatorial. APELO PROVIDO. (Apelação Crime Nº 70036420081, Sexta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Cláudio Baldino Maciel, Julgado em 10/06/2010).

A presente Apelação Crime, julgada no dia 10 do mês junho do ano de 2010,

por Cláudio Baldino Maciel, manifestou-se pela absolvição da ré, por ser isenta de

pena, lhe sendo aplicado tratamento ambulatorial, visto que é incapaz que

reconhecer o caráter ilícito ocasionado por sua conduta.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, na Apelação Crime de nº

70018104547, expõe o fato de que, primeiramente, o delito foi enquadrado como

crime de racismo previsto no art. 20 da Lei nº 7.716/1989, mas, posteriormente,

caracteriza-o como sendo pena prevista no art. 140, § 3º, do CP. Conforme os fatos

relatados, a autora teria proferido expressões verbais de cunho racista, com o intuito

de ferir a honra subjetiva da vítima. Cabe colocar a ementa na íntegra para que os

detalhes da decisão não sejam perdidos:

EMENTA: APELAÇÃO-CRIME. CRIME DE RACISMO. ART. 20 DA LEI N.º 7.716/89. NÃO-CONFIGURAÇÃO. APELANTES QUE PROFERIRAM EXPRESSÕES VERBAIS, COM CONTEÚDO DISCRIMINATÓRIO, CONTRA SUA VIZINHA, FERINDO A SUA HONRA SUBJETIVA. CONDUTA QUE SE SUBSUME NO DISPOSTO NO ART. 140, § 3.º, DO CÓDIGO PENAL. INJÚRIA QUALIFICADA OU RACIAL. PROVIMENTO. Diante da análise do conjunto probatório, percebe-se que, efetivamente, os recorrentes proferiram expressões verbais com conteúdo discriminatório. Não obstante, não o fizeram para menosprezar a raça negra como um todo, mas unicamente para ferir a honra subjetiva de sua vizinha, bem como com o fito de evitar que seu filho brincasse com o filho desta última. Ora, expressões como “nega suja”, “nega do cabelo duro”, “macaca”, “cala boca vira lata”, dentre outras proferidas pelos apelantes, inequivocamente demonstram forte conteúdo racial e discriminatório, porém não tipificam a conduta descrita no art. 20 da Lei nº 7.716/89 (discriminação racial), mas sim a prevista no art. 140, § 3.º, do Código Penal (injúria qualificada ou racial), porque não se voltam, indistintamente, contra toda uma coletividade, um agrupamento ou raça que se queira diferenciar. DECLARAÇÃO DE NULIDADE DO PROCESSO DESDE O INÍCIO. CRIME DE AÇÃO PENAL PRIVADA. ILEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA A PROPOSITURA DA AÇÃO PENAL. INTELIGÊNCIA DO DISPOSTO NO ART. 564, INCISO II, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. Não há como se manter a condenação, mesmo diante da comprovação da ocorrência dos fatos pelo conjunto probatório, pois o crime de injúria qualificada somente se procede mediante ação penal privada, conforme inteligência do art. 145, caput, do Código Penal. Logo, no caso concreto, operada a desclassificação delitiva, percebe-se que há de ser decretada a nulidade do processo ab initio por ilegitimidade ativa do Ministério Público, segundo preconiza o art. 564, inciso II, do Código de Processo Penal, já que caberia tão-somente à vítima a propositura da ação penal. DECRETAÇÃO DA EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. DECADÊNCIA. EXTRAPOLAÇÃO DO LAPSO TEMPORAL DE SEIS MESES PARA O EXERCÍCIO DO DIREITO DE QUEIXA POR

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PARTE DA VÍTIMA. INTELIGÊNCIA DO ART. 38, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL. Por fim, ainda é de sumo relevo se fazer a ressalva de que o prazo decadencial de seis meses para a propositura da queixa-crime por parte da vítima restou adimplido, já que conhecia os autores do crime desde a data de sua perpetração, operando-se o fenômeno da decadência, segundo se denota diante do disposto no art. 38, caput, do Código de Processo Penal. Em face disso, também se mostra imprescindível, in casu, a declaração da extinção da punibilidade dos recorrentes pela decadência do direito de queixa, conforme preconiza o art. 107, inciso IV, do Código Penal. Apelo provido. Declaração de nulidade processual desde o início. Decretação de extinção da punibilidade pela decadência. (Apelação Crime Nº 70018104547, Oitava Câmara Criminal, Trib Ribeiro de Oliveira, Julgado em 02/05/2007).

Nesse mesmo sentido, o Tribunal em questão traz a seguinte decisão a

respeito da desclassificação do crime do art. 20 da Lei para o art. 140, § 3º previsto

no CP:

EMENTA: IMPUTAÇÕES OFENSIVAS PESSOAIS. CRIME CONTRA A HONRA (ART. 140, § 3º, CP) E NÃO DE RACISMO (ART. 20, LEI7716/89). ILEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. NULIDADE. Palavras depreciativas referentes à raça e à cor, com a intenção de ofender a honra subjetiva da vítima, caracterizam, em tese, o crime de injúria qualificada (art. 140, § 3º, do CP) e não daquele previsto no art. 20 da Lei nº 7.716/89. Deste modo, a ação penal é privada, cabendo a iniciativa da mesma à ofendida. Na hipótese, porque a ação foi promovida pelo Ministério Público, o processo está nulo desde seu início por ilegitimidade ativa. Aplicação do art. 564, II, do Código de Processo Penal. DECISÃO: Apelo defensivo provido. Unânime. (Apelação Crime Nº 70011779816, Sétima Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sylvio Baptista Neto, Julgado em 04/08/2005).

Nesse mesmo pensamento, segue a seguinte decisão jurisprudencial:

EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL. Palavras depreciativas referentes à raça e à cor com a intenção de ofender a honra subjetiva da vítima. Conduta a caracterizar, em tese, o crime de injúria qualificada (art. 140, § 3º, do CP). Inaplicabilidade do art. 20 da Lei nº 7.716/89. Ação penal proposta pelo Ministério Público. Inadmissibilidade. Feito de iniciativa da ofendida. Decretada a nulidade do processo, ab initio, por ilegitimidade de parte ativa, na forma do art. 564, II, do CPP. Decretada a nulidade do processo. (Apelação Crime Nº 70006891774, Sétima Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Alfredo Foerster, Julgado em 02/12/2004).

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, sobre caso ocorrido na comarca

de Encruzilhada do Sul, julgou improvida a apelação crime de nº 70006208839, a

qual teve como Relator Excelentíssimo Marco Antônio Ribeiro de Oliveira, com a

seguinte ementa:

RACISMO – ART. 9º, LEI Nº 7.716/89. ABSOLVIÇÃO. PROVA INSUFICIENTE PARA A CONDENAÇÃO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DE QUE A COR DA VÍTIMA TENHA IMPEDIDO SEU INGRESSO NO RECINTO SOCIAL, HAVENDO REFERÊNCIA DE QUE OUTRAS PESSOAS DA MESMA COR ALI SE ENCONTRAVAM. O delito de racismo se caracteriza

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quando o acesso a lugar público for impedido ou recusado, mesmo havendo a devida habilitação, seja através de convite, cortesia ou ingresso adquirido. A interpelação para apresentação de ingresso, situação expressada pelas testemunhas, torna a prova insuficiente para a condenação. Apelo improvido. (Apelação Crime Nº 70006208839, Oitava Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Antônio Ribeiro de Oliveira, Julgado em 03/09/2003).

Essa decisão ocorreu por falta de provas, visto que inexistem, nos autos,

elementos suficientes, especialmente de ordem testemunhal, que pudessem levar à

condenação dos réus. Consta que a vítima foi impedida de entrar no salão, local

onde ocorria um baile, em decorrência de sua cor negra. Entretanto, não foram

obtidas provas suficientes para o embasamento da sentença condenatória. Assim,

desclassificando a punição do crime previsto na Lei nº 7.716/1989.

Conclui-se, assim, a possibilidade de haver mais facilmente a aplicabilidade

do art. 140, § 3º do CP, nos crimes referentes à injúria qualificada preconceituosa,

devido às diversas decisões jurisprudenciais pesquisadas no Superior Tribunal

Federal, Superior Tribunal de Justiça, bem como no Tribunal de Justiça do Rio

Grande do Sul.

Em contrapartida, não se pode identificar nenhum caso previsto no art. 20 da

Lei nº 7.716/1989, com relação ao crime de cor, no STF e no STJ; todavia, em

ambos os tribunais, constam crimes dessa lei que envolvem os aspectos de raça,

etnia, religião e procedência nacional.

No item seguinte, proceder-se-á a um levantamento de dados a respeito dos

crimes de racismo em decorrência da “cor”, realizado pela Secretaria de Segurança

Pública do Estado do Rio Grande do Sul.

4.2 Levantamentos de dados dos crimes de racismo em decorrência da cor

Para complementar nossa pesquisa sobre a (in)aplicabilidade dos crimes

racistas, optou-se por buscar também os dados policiais existentes no estado do Rio

Grande do Sul e, especificamente, no Vale do Taquari, local de domicílio da

pesquisadora. Dessa forma, as estatísticas foram solicitadas junto à Delegacia

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Regional de Polícia de Lajeado, sede da 19ª Região da Polícia Civil, que conseguiu

as mesmas em sua respectiva Secretaria de Estado.

Convém esclarecer que os fatos são registrados como crime de injúria racista

ou de preconceito da Lei nº 7.716/1989 a partir da interpretação do policial

plantonista. Isso não quer dizer que a autoridade policial fará o mesmo

enquadramento e que haverá a ação penal correspondente.

Uma das pesquisas realizadas entre os anos de 2000 a 2014 pela Secretaria

de Segurança Pública, no dia 3 de agosto de 2014, a respeito do crime de racismo,

traz as seguintes informações sobre as ocorrências no Rio Grande do Sul:

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Tabela 1 – Ocorrências de crime de racismo no Rio Grande do Sul

Qtd Participante Tipo:

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014* - Data

do fato -

INJÚRIA 11.599 13.712 15.231 17.888 20.253 24.113 24.509 26.072 27.562 29.818 32.767 36.735 41.833 40.722 22.259 385.073

PRECONCEITO DE RACA, COR, ORIGEM, ETNIA OU NACIONALIDADE

466 491 240 352 388 453 574 616 486 408 396 443 382 239 146 6.080

INJÚRIA DISCRIMINATÓRIA

0 0 0 0 0 0 0 3 0 0 0 0 28 773 423 1.227

INJÚRIA QUALIFICADA - RACA, COR, ETNIA, RELIGIÃO OU ORIGEM

0 0 1 1 4 199 591 783 719 957 1.293 1.597 1.980 1.458 917 10.500

* Cubo atualizado: 03/08/2014 03:36:26

Total 466 491 241 353 392 652 1.165 1.402 1.205 1.365 1.689 2.040 2.390 2.470 1.486 17.807

Fonte: Secretaria de Segurança Pública (2014).

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Pode-se perceber que, no ano de 2000, o crime de injúria previsto no artigo

140 do Código Penal, teve o menor índice; porém, em 2012, foi o ano de maior grau

de ocorrências previstas no período de 2000 a 2014. Esse último ano teve

praticamente a metade do ano de 2012, como visualizado na tabela abaixo:

Tabela 2 – Relação maior e menor de índice de ocorrências de crime de Injúria

INJÚRIA

Menor número de registros Maior número de registro Atual

Ano Ocorrências Ano Ocorrências Ano Ocorrências

2000 11.599 2013 40.722 2014 22.259

Fonte: SSP - extração em 03/09/2014.

Quanto ao crime de preconceito, raça, cor, etnia e nacionalidade, previsto na

Lei nº 7.716/1989, o ano 2007 foi o de maior número de casos ocorridos; em

contrapartida, foi no ano de 2014 que houve o mais baixo grau de relatos, como

demonstra a tabela:

Tabela 3 – Relação maior e menor de índice de ocorrências de crime de Preconceito

de raça, Cor, Origem, Etnia ou Nacionalidade

PRECONCEITO DE RACA, COR, ORIGEM, ETNIA OU NACIONALIDADE

Menor número de registros Maior número de registro Atual

Ano Ocorrências Ano Ocorrências Ano Ocorrências

2002 240 2007 616 2014 146

Fonte: SSP - extração em 03/09/2014.

Já o crime de injúria discriminatória, previsto no Código Penal, relata que

durante os anos 2000 a 2011, não houve nenhum caso, porém, em 2013, o índice

ficou elevadíssimo, como apresentado pela tabela:

Tabela 4 – Relação maior e menor de índice de ocorrências de crime de Injúria

Discriminatória

INJÚRIA DISCRIMINATORIA

Menor número de registros Maior número de registro Atual

Ano Ocorrências Ano Ocorrências Ano Ocorrências

2007 3 2013 773 2014 423

Fonte: SSP - extração em 03/09/2014.

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Por fim, o crime de injúria qualificada, previsto no artigo 140 §3º do Código

Penal, teve ocorrência nos anos de 2000 a 2004, mas os casos foram apenas seis.

Entretanto, foi no ano de 2013 que houve um disparo nos índices, de fato

comprovado pela pesquisa:

Tabela 5 – Relação maior e menor de índice de ocorrências de crime de Injúria

qualificada - Raça, Cor, Etnia, Religião ou Origem

INJÚRIA QUALIFICADA - RACA, COR, ETNIA, RELIGIÃO OU ORIGEM

Menor número de registros Maior número de registro Atual

Ano Ocorrências Ano Ocorrências Ano Ocorrências

2002 1 2012 1.980 2014 917

Fonte: SSP - extração em 03/09/2014.

O Gráfico 1, ainda em termos estaduais, apresenta a soma da quantia dos

crimes de preconceito de raça, injúria discriminatória, bem como a injúria qualificada.

Dessa forma, pode-se destacar o ano de 2013 como aquele que apresentou o maior

grau de registro dos crimes, sendo o total de 2.470 (dois mil quatrocentos e setenta).

Gráfico 1 – Soma da quantia dos crimes de preconceito de raça, injúria

discriminatória, bem como a injúria qualificada

Fonte: Secretaria de Segurança Pública (2014).

Nessa mesma linha de estudos, foram realizados alguns levantamentos de

dados, também pela Secretaria de Segurança Pública, a respeito de crimes com

466 491

241 353 392

652

1.165

1.402 1.205

1.365

1.689

2.040

2.390 2.470

1.486

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014*

RS = Soma de Preconceito de raça + Injúria discriminatória + Injúria qualificada

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relação à raça, ocorridos na 19ª Região Policial da Polícia Civil, correspondendo a

quase todo o Vale do Taquari (são trinta e dois municípios, cuja listagem consta no

documento da Delegacia Regional anexado a esta monografia). Foram feitos os

seguintes levantamentos a respeito do crime de injúria discriminatória:

Gráfico 2 – Ocorrências de crime Injúria Qualificada – Raça, Cor, Etnia, Religião ou

Origem

Fonte: SSP - extração em 03/09/2014

Por fim, o levantamento de dados pesquisados a respeito do crime de

preconceito, o qual envolve raça, cor, origem, etnia ou nacionalidade, obteve o

seguinte:

1

3

10

12

4

11

13

18

25

21

0

5

10

15

20

25

30

2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013

Qu

an

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ad

e d

e O

co

rrên

cia

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INJÚRIA QUALIFICADA - RACA, COR, ETNIA, RELIGIÃO OU ORIGEM

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Gráfico 3 – Ocorrências de crime Preconceito de Raça, Cor, Origem, Etnia ou

Nacionalidade

Fonte: SSP - extração em 03/09/2014

Percebe-se que ano de 2008 apresentou o maior índice de ocorrências na 19ª

Delegacia Regional de Lajeado, sendo nove casos do crime e, sucessivamente, oito

casos no ano seguinte. Porém, como aspecto positivo, o ano de 2013 não registrou

nenhum caso de preconceito.

Conclui-se que os casos de injúria qualificada foram os casos mais

registrados na 19ª Região Policial, diferentemente do crime de racismo previsto no

art. 20 da Lei nº 7.716/1989. Assim, mais uma vez foram as situações de injúria

racial que tiveram maior número de relatos, coincidindo com a pesquisa apresentada

por jurisprudências do Superior Tribunal Federal, no Superior Tribunal de Justiça e

no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.

Como a intenção desta pesquisadora é fazer estudo de caso de um dos

inquéritos de crime racial no Vale do Taquari, solicitou-se à Delegacia Regional que

indicasse uma situação do artigo 20 previsto na Lei nº 7.716/1989 e outro do art. 140

§3º. O resultado apresentado foi no sentido de que, apesar de terem sido registrados

como crime da Lei nº 7.716/1989, todos os casos existentes na 19ª RP foram, na

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PRECONCEITO DE RACA, COR, ORIGEM, ETNIA OU NACIONALIDADE

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verdade, de injúria qualificada e, assim, foram instaurados pelas autoridades

policiais titulares das respectivas delegacias; ou seja, houve um equívoco de

interpretação do policial plantonista, o que foi sanado pelo delegado responsável por

analisar cada fato.

Dessa forma, dentre todas as ocorrências, foi escolhido um dos casos

acontecidos em Lajeado, dentre os mais recentes, para analisar, o que será

apresentado na sequência.

4.3 Estudo de caso

Para aprimorar o assunto em evidência, apresenta-se um fato real, mas

mantendo-se o sigilo obrigatório, em que serão tomados os cuidados necessários a

respeito da identidade das partes envolvidas. Por isso, junta-se nos anexos deste

trabalho o termo de responsabilidade de tal segredo, exigido pela autoridade policial

que autorizou o acesso ao inquérito para consulta e análise.

O registro de ocorrência realizado na 19ª Delegacia de Polícia, situada na

cidade de Lajeado, trata o caso como sendo injúria discriminatória consumada,

ocorrida no dia 27 do mês de maio do ano de 2014. Conforme o relato da vítima, que

é um jogador de futebol, no intervalo do jogo, esse válido pela última rodada do

campeonato municipal, estava aquecendo para voltar a jogar no segundo tempo de

partida, quando a bola bateu em uma cerca onde se localizavam algumas casas,

sendo que uma delas foi o alvo da bola. A vítima aproximou-se da cerca para pegar

a bola, e a autora, não identificada, gritou para o jogador as seguintes palavras;

“macaco, paninho de guarda-chuva e galo de macumba”, visto que sua pele era de

cor negra. Naquele momento, não havia Policiais Militares no capo de futebol.

Porém, a vítima falou para o árbitro; este disse não ter escutado as ofensas feitas

pela mulher, por isso, não iria colocar na Súmula. Contudo, o presidente do clube,

bem como outras três testemunhas ali presentes, puderam ouvir as palavras de

ofensas realizadas diretamente ao jogador de futebol e o auxiliaram a fazer um

registro policial.

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A vítima obteve Assistência Jurídica Gratuita (AJG), visto não ter condições

financeiras de seguir com a causa. Assim, foi realizada uma Ação de Indenização

por Dano Moral em face da investigada.

Conforme os fatos relatados acima, também juntou-se o relato dos policiais,

os quais identificaram a autora dos xingamentos como sendo a acusada. Também,

um dos fatos apresentados foi de que a comissão de organização ficou contra o

jogador de futebol, visto que não poderiam apoiar o atleta para não manchar a honra

da Liga dos clubes envolvidos.

O caso foi divulgado em um dos maiores meios de comunicação do Vale do

Taquari, situação que auxiliou a vítima a buscar as vias judiciais para solucionar tal

fato.

A partir dos fatos descritos, em âmbito civil, foi expedido um mandado de

citação ordinária realizado pelo juiz, no qual a investigada terá que se apresentar

dentro do prazo de 15 dias, caso contrário serão presumidos como verdadeiros os

fatos apresentados na petição inicial pela vítima. O despacho requer a presença das

partes para que digam quais as provas que pretendem produzir, especificando-as

sob pena de julgamento do feito no estado em que se encontra.

Ao ser questionada sobre o fato em questão, a investigada relatou não ter

mencionado nenhuma das palavras de racismo contra jogador de futebol, afirmando

não ter sido ela.

Em face dos fatos narrados, a autoridade policial instaurou um Inquérito

Policial, houve investigação do episódio descrito pela vítima e pelas testemunhas e,

como desfecho, o relatório.

Por fim, no relatório, conforme a prova de materialidade e indícios de autoria,

a autora foi indiciada pela autoria do crime, incurso nas sanções do artigo 140, § 3º,

do Código Penal.

Perante o caso disponibilizado pela Delegacia Regional, pode-se concluir que

o fato foi enquadrado de forma acertada.

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Diante dos estudos obtidos a respeito do crime de injúria racial, previsto no

artigo 140, § 3º, do Código Penal brasileiro, o caso analisado era um típico delito

contra a honra; ou seja, previsto no Código e não na Lei Especial.

O episódio estudado e analisado não tem compatibilidade com o crime

disposto no artigo 20 da Lei nº 7.716/1989, visto que as palavras de preconceito

utilizadas pela autora que foram “macaco, paninho de guarda chuva e galo de

macumba”. O artigo da lei, ao contrário da injúria racial, “diz respeito à ofensa a um

grupo de pessoas e não somente a um indivíduo” (NUCCI, 2013, p. 281). Portanto,

diferente do crime relatado, pois a indiciada ofendeu “apenas” o jogador e não um

grupo todo.

Destarte, o caso estudado serviu para que fossem aplicados os

conhecimentos adquiridos nesta monografia, sendo de extrema valia.

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5 CONCLUSÃO

No decorrer do ano de 2014, muitos foram os fatos noticiados pela mídia

relacionados ao preconceito e à discriminação relativos à “cor”, especificamente,

envolvendo vários jogadores de futebol. Esses fatos foram uma das razões que

motivaram esta monografista à realização do presente trabalho, pois estavam, e

ainda estão, constantemente presentes nos noticiários de todo o Brasil e instigam

um aprofundamento no tema.

Porém, no exato momento em que se passou a estudar o assunto, foi

constatado que o crime de injúria racial, bem como o de racismo, são condutas que

acarretam diversidade de pensamento e opiniões na sociedade em que vivemos.

Isso ocorre porque grande parte da população brasileira não sabe diferenciar um

crime do outro.

Diante das controvérsias levantadas, observou-se a necessidade de fazer um

breve levantamento histórico acerca do assunto em questão, visto que, com base

nos fatos ocorridos no passado, podem-se obter conclusões de episódios

ocasionados no presente.

Dessa forma, no primeiro capítulo, foram apresentados os conceitos

fundamentais acerca de preconceito, discriminação, racismo, raça, cor e etnia,

salientando as diferenças entre eles. Após, foi realizado um levantamento histórico a

respeito do preconceito, da discriminação e do racismo existentes no mundo, no

Brasil e no Rio Grande do Sul.

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Ainda neste estudo, após um exame histórico, realizou-se uma análise

jurídica sobre o crime de racismo, descrevendo a visão do direito como perpetuador

do racismo inconstitucional; em seguida, fez-se um relato a respeito da Constituição

Federal de 1988 com enfoque no crime de racismo, bem como a previsão de

imprescritibilidade e inafiançabilidade para quem cometer o delito em pauta.

Também foi abordada a Lei nº 7.716/1989, distinguindo o art. 20 dessa do art. 140, §

3º, previsto no Código Penal.

No quarto e último capítulo do desenvolvimento, foram efetuadas algumas

pesquisas jurisprudenciais alcançadas nos Tribunais Superiores e no TJ/RS a

respeito do crime de racismo previsto na lei e da injúria racial, disposto no CP,

obtendo como foco principal a discriminação e/ou preconceito referente à “cor

negra”. Após, foi apresentado um levantamento de dados, fornecidos pela Secretaria

de Segurança Pública do Estado, sobre as ocorrências policiais pertinentes aos

crimes racistas. Ainda, para um melhor entendimento a respeito do tema foi efetuado

um estudo de caso, disponibilizado pela Delegacia Regional da Polícia Civil da

cidade de Lajeado, acerca do crime de injúria racial previsto no art. 140, §3º do

Código Penal.

Conforme já citado nas páginas iniciais, este trabalho teve como objetivo geral

analisar a (in)aplicabilidade da legislação antirracista. Dessa forma, o capítulo final

demonstrou, através de pesquisa jurisprudencial, a aplicabilidade mais acentuada do

crime de injúria preconceituosa em decorrência da “cor”, previsto no art. 140, § 3º,

do CP e pouco, ou quase nada, do art. 20 da Lei nº 7.716/1989. Além disso, através

das pesquisas realizadas pela Secretaria de Segurança Pública, constatou-se que

os casos registrados de racismo previstos na lei, no Vale do Taquari, foram, na

verdade, enquadrados no art. 140 do CP, visto que não se tratavam do crime racial,

mas, sim, de injúria racial; ou seja, era um crime contra a honra.

Perante a análise do problema proposto – qual é (in)aplicabilidade da

legislação antirracista? –, pode-se concluir que a hipótese inicial foi parcialmente

confirmada. De um lado, evidenciou-se que a legislação penal abrange em seu teor

artigos que protegem o cidadão, ou seja, à conduta que contrariar a norma aplica-se

o tipo penal definido em lei: o artigo 140, § 3°, do Código Penal brasileiro ou o artigo

20 da Lei nº 7.716/89. Outro aspecto positivo são as leis específicas de racismo que

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foram mudando com o passar do tempo, aperfeiçoando-se cada vez mais para a

proteção de quem sofre esse tipo de preconceito. A lei que deu surgimento às

demais foi a Constituição Federal em seu artigo 5°, inciso XLI; em consequência, se

deu a Lei nº 7.716/1989, alterada pela Lei nº 9.459/1997, que ofereceu um suporte

maior ao cidadão que sofrer esse tipo de preconceito. Por outro lado, ficou bem claro

que a aplicação da lei é muito mais para os casos de injúria racial do que para casos

de racismo da lei especial. Portanto, a aplicabilidade é discutível e nos faz

questionar se essas situações não existem na vida cotidiana ou se é uma cifra oculta

na sociedade, sem registros de ocorrências.

Além disso, frisa-se que as pesquisas foram realizadas nos Tribunais

Superiores, no TJ/RS, bem como foi efetuada uma análise de dados,

disponibilizados pela Secretaria de Segurança Publica, os quais relatam diversos

crimes de injúria, porém, nenhum delito referente à Lei nº 7.716/1989. Numa

amostragem em outros tribunais estaduais, talvez o resultado fosse outro; assim

também se a pesquisa fosse com os demais artigos da lei em referência e não

apenas com relação ao artigo 20. Por isso, a partir desta monografia, não fica

descartada a possibilidade de expandir a pesquisa em estudo de pós-graduação.

Portanto, através do estudo realizado a respeito da (in)aplicabilidade da

legislação antirracista, concluiu-se que existem diferenças cruciais entre o crime

previsto na lei especial (o comentado artigo 20) e o delito enquadrado no Código

Penal a respeito da discriminação racial em decorrência da “cor negra”(art. 140, §

3º). Além disso, que os registros policiais e da Justiça são idênticos em apresentar

números elevados do delito de injúria racista e raros em relação ao artigo 20 da Lei

nº 7.716/1989. Assim, almeja-se que nossa pesquisa possa contribuir com a

comunidade em geral, e em especial a acadêmica, para o cuidado com os termos

utilizados e para o conhecimento da distinção entre os crimes racistas, com o intuito

de saber denunciá-los.

Por fim, esta pesquisa também serviu para desvendar que, apesar dos

avanços em termos de proteção às vítimas de racismo, ainda há muito a se fazer

para combater o preconceito contra o negro em nosso país e a lei é apenas um dos

instrumentos.

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RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Crime nº 70048215446, da 3ª Câmara Criminal. Apelante: A.L.F.F. Apelado: M.P. Relator: Ivan Leomar Bruxel. Porto Alegre, 4 out. 2012. Disponível em:<http://www1.tjrs.jus.br/site_php/consulta /consulta_processo.php?nome_comarca=Tribunal+de+Justi>. Acesso em: 28 set. 2014. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Crime nº 70048957252, da 3ª Câmara Criminal. Apelante: M.P. Apelado: V.P.D.F. Relator: Francesco Conti. Porto Alegre, 26 jul. 2012. Disponível em: <http://www1.tjrs.jus.br/site_php/consulta /consulta_processo.php?nome_comarca=Tribunal+de+Justi>. Acesso em: 28 set. 2014. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Crime nº 70059741355, da 1ª Câmara Criminal. Apelante: M.P. Apelado: R.O.D.S. Relator: Jayme Weingartner Neto. Santa Maria, 17 set. 2014. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/busca /search?q=inj%C3%BAria+qualificada&proxystylesheet=tjrs_index&client=tjrs_index&filter=0&getfields=*&aba=juris&oe=UTF-8&ie=UTF-8&ud=1&lr=lang_pt&sort=date% 3AD%3AS%3Ad1&as_qj=&site=ementario&as_epq=&as_oq=&as_eq=&as_q=+#main_res_juris>. Acesso em: 7 out. 2014. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Crime nº 70057881567, da 1ª Câmara Criminal. Apelante: H.A.D.N. Apelado: R.P.S. Relator: Julio Cesar Finge. Bento Gonçalves, 13 ago. 2014. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/busca /search?q=inj%C3%BAria+qualificada&proxystylesheet=tjrs_index&client=tjrs_index&filter=0&getfields=*&aba=juris&oe=UTF-8&ie=UTF-8&ud=1&lr=lang_pt&sort=date% 3AD%3AS%3Ad1&as_qj=&site=ementario&as_epq=&as_oq=&as_eq=&as_q=+#main_res_juris>. Acesso em: 7 out. 2014. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Crime nº 70026731083, da 2ª Câmara Criminal. Apelante: D.T.F. Apelado: D.K. Relator: Osnilda Pisa. Palmeira das Missões, 29 jan. 2013. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/busca/ search?q=inj%C3%BAria+qualificada&proxystylesheet=tjrs_index&getfields=*&oe=UTF-8&ie=UTF-8&ud=1&lr=lang_pt&sort=date:D:S:d1&as_qj=&as_epq=&as_oq =&as_eq=&as_q=+&ulang=pt-BR&ip=179.190.82.226,10.202.24.73&access =p&entqr=3&entqrm=0&client=tjrs_index&filter=0&start=10&aba=juris&site=ementario#main_res_juris>. Acesso em: 7 out. 2014. RIO GRANDE DO SUL.Tribunal de Justiça. Apelação Crime nº 70048957252, da 3ª Câmara Criminal. Apelante: M.P. Apelado: V.P.D.F. Relator: Francesco Conti. Bagé, 26 jul. 2012. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/busca/search?q=inj%C3%BAria +qualificada&proxystylesheet=tjrs_index&getfields=*&oe=UTF-8&ie=UTF-8&ud=1&lr =lang_pt&sort=date:D:S:d1&as_qj=&as_epq=&as_oq=&as_eq=&as_q=+&ulang=pt-BR&ip=179.190.82.226,10.202.24.73&access=p&entqr=3&entqrm=0&client=tjrs_index&filter=0&start=10&aba=juris&site=ementario#main_res_juris >. Acesso em: 7 out. 2014. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Crime nº 70036420081, da 6ª Câmara Criminal. Apelante: L.D. Apelado: M.P. Relator: Cláudio Baldino Maciel. Porto Alegre, 10 jun. 2010. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/busca/search ?q=lei+7.716%2F89&proxystylesheet=tjrs_index&client=tjrs_index&filter=0&getfields

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SILVA, Katia Elenise O. O papel do Direito Penal no enfrentamento da discriminação. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. SKIDMORE, Thomas E. Preto no Branco: raça e racionalidade no pensamento brasileiro. São Paulo: Companhia das letras, 2012. SZKLAROWSKY, Leon Frejda. Crimes de racismo no Direito brasileiro. 1997. Disponível em: < http://daleth.cjf.jus.br/revista/numero11/Artigo2.htm>. 14 de mai. 1997, seção I. Acesso em: 13 out. 2014, 23:30.

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ANEXOS

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ANEXO A – Declaração de responsabilidade pela manutenção do sigilo

TRABALHO DE CURSO II – MONOGRAFIA

DECLARAÇÃO PÚBLICA DE RESPONSABILIDADE PELA

MANUTENÇÃO DO SIGILO

Eu RAISSA ROSSI TRENTINI, residente à Rua Otelo Rosa, 599, Bairro Alto

do Parque, na cidade de Lajeado, DECLARO assumir a responsabilidade do sigilo

exigido em lei quanto às informações obtidas pela feitura do trabalho de monografia,

em especial para o estudo de caso. DECLARO, também, que os dados obtidos

foram devidamente autorizados pela autoridade competente, Delegada de Polícia

Regional da 19ª RP, Elisabete Cristina Barreto Müller.

Lajeado/RS, 28 de outubro de 2014.

RAISSA ROSSI TRENTINI

ELISABETE CRISTINA BARRETO MÜLLER

DELEGADA

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ANEXO B – Municípios da 19ª Região Policial

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

POLÍCIA CIVIL 19ª REGIÃO POLICIAL

DELEGACIA DE POLÍCIA REGIONAL DE LAJEADO

MUNICÍPIOS DA 19ª REGIÃO POLICIAL ÓRGÃO MUNICÍPIOS

CIRCUNSCRITOS1

POPULAÇÃO DO MUNICÍPIO

2

POPULAÇÃO ATENDIDA PELO ÓRGÃO

3

DPPA-LAJEADO DM-LAJEADO DP-LAJEADO

LAJEADO CANUDOS DO VALE FORQUETINHA MARQUES DE SOUZA SANTA CLARA DO SUL SÉRIO

71.445 1.807 2.479 4.068 5.697 2.281

87.777

DP-ARROIO DO MEIO ARROIO DO MEIO CAPITÃO TRAVESSEIRO

18.783 2.636 2.314

23.733

DP-BOM RETIRO DO SUL BOM RETIRO DO SUL 11.472 11.472

DP-CRUZEIRO DO SUL CRUZEIRO DO SUL 12.320 12.320

DP-ENCANTADO ENCANTADO DOUTOR RICARDO RELVADO

20.510 2.030 2.155

24.695

DP-ESTRELA ESTRELA COLINAS IMIGRANTE

30.619 2.420 3.023

36.062

DP-FAZENDA VILANOVA FAZENDA VILANOVA 3.697 3.697

DP-MUÇUM MUÇUM VESPASIANO CORREA

4.791 1.974

6.765

DP-NOVA BRÉSCIA NOVA BRÉSCIA COQUEIRO BAIXO

3.184 1.528

4.712

DP-PAVERAMA PAVERAMA 8.044 8.044

DP-POUSO NOVO POUSO NOVO 1.875 1.875

DP-PROGRESSO PROGRESSO 6.163 6.163

DP-ROCA SALES ROCA SALES 10.284 10.284

DP-TAQUARI TAQUARI 26.092 26.092

DP-TABAÍ TABAÍ 4.131 4.131

DP-TEUTÔNIA TEUTÔNIA WESTPHALIA

27.272 2.793

30.065

Total 297.887

DPR-LAJEADO Todos os Municípios acima 297.887

1 Municípios cuja circunscrição pertence à Delegacia de Polícia Instalada.

2 Dados obtidos no site da FEE-Fundação de Economia e Estatística/RS- Estimativa da população

por município e situação de domicílio Rio Grande do Sul – 2010. 3 Total de habitantes residentes em municípios atendidos pela Delegacia de Polícia.