a imprensa do século xix

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uM RELATO SOBRE A IMPRENSA NO NORTE DE MINAS

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Page 1: A imprensa do século XIX

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Capa

Page 2: A imprensa do século XIX

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Contra capa

Page 3: A imprensa do século XIX

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EPIGRAFE

Page 4: A imprensa do século XIX

4

AGRADECIMENTOS

Page 5: A imprensa do século XIX

5

RESUMO

O presente trabalho propõe analisar as formas de linguagens do primeiro jornal da região do

Norte de Minas Gereis o Correio do Norte, no final do século XIX. Para isso identifiquei as

caracterizações feitas sobre a região, no que diz respeito ao povo, a suas práticas sociais e o

uso da terra. Desta forma percebi uma qualificação no que diz respeito à natureza da região,

mas uma subalternização das pessoas. Compreendo que neste período estudado havia uma

ideologia de “civilidade” que dominava vários pontos da sociedade, sendo que a educação e

principalmente a comunicação utilizaram destas questões para justificarem uma imposição de

novos modos de vida em substituição com a tradição da época. Utilizei da imprensa enquanto

fonte e objeto, já que as linguagens jornalísticas me interessaram para pensar essas questões.

Portanto a pesquisa concentrou nas edições do periódico dessa época, identificando o modo

de fazer o jornal, as pessoas que estavam a frente desse jornal e a sua relação com a política

do período

Palavras-chave: Imprensa, Civilização, Modernidade, Norte de Minas Gerais.

Page 6: A imprensa do século XIX

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ABSTRACT

This study aims to analyze the forms of languages the first newspaper in North Mine Gereis

the North Post area in the late nineteenth century. For that identified the characterizations

made about the region, with regard to people, their social practices and land use. Thus

realized a qualification with regard to the nature of the region, but a subordination of people. I

understand that this study period had an ideology of "civility" that dominated various parts of

society, and education and communication mainly used these issues to justify the imposition

of new lifestyles in place with the tradition of the time. I used the press as a source and object,

since the journalistic language newspaper interested me to think about these issues. So the

search focused on the periodic issues of that period, identifying how to make the newspaper,

people who were ahead of this newspaper and its relation to the period of the policy.

Key words: Press, Civilization, Modernity, North of Minas Gerais.

Page 7: A imprensa do século XIX

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SUMÁRIO

SumárioIntrodução 1

Capítulo 1: O jornal e sua identidade política 4

Redes de comunicação 5

Digite o título do capítulo (nível 3)6

Page 8: A imprensa do século XIX

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INTRODUÇÃO

Durante as comemorações do aniversário da cidade de Montes Claros, em junho de

2015, a rede de televisão afiliada da Rede Globo, Inter TV1, veiculou em um de seus

telejornais uma série de reportagens contando a história da cidade por meio das memórias do

jornalismo. Nestas reportagens, foram relatados como surgiu os primeiros jornais que

existiram no Norte de Minas, e o aumento deles que culminaram na criação da mídia e da

TV. A partir disso, a palavra memória é fortemente utilizada ao longo de toda a série de

reportagens sobre esta história. Sendo que pode perceber nas reportagens, uma exaltação de

supostos grandes “heróis” para o povo. Heróis que de fato não tem relação com as vivências

e experiências de vida do povo da cidade e da região.

Compreendo que para o Telejornal, isso foi fundamental para exaltar o seu nome e

demonstrar para seus telespectadores a importância que teve e ainda exerce sobre a região.

Mas a partir disto ele relata as qualidades que a imprensa exerce sobre o povo e sobre o local

destacando como foi importante para a população o telejornal. Sendo que para caracterizar

os benefícios da imprensa para a região, o telejornal desqualifica esse local mostrando que a

imprensa surge principalmente como a resolução dos problemas dos nortes mineiros. Desta

forma, procurei entender a origem destas qualificações e memórias que esta imprensa

regional produziu. Então, cheguei ao primeiro exemplar de imprensa que o Norte de Minas

recebeu, o Jornal O correio do Norte, que circulou no final do século XIX.

O correio do Norte começa sua atividade na região do norte de minas no ano de 1884

e se expande até 1890. Ele fez parte do cotidiano dessa região, relatando as notícias de

caráter regional bem como os acontecimentos no Brasil e no mundo desse período. Como

primeira imprensa do local, ele é o ponto referência para pensar os periódicos da região.

Teve como criador o advogado e político Antônio Augusto Veloso, que utilizou do periódico

para executar seus desejos, ideologias e desavenças políticas.

A partir destas questões, a minha problemática de pesquisa está vinculada as

construções da realidade que o Jornal “O correio do Norte” fez sobre as pessoas, espaços e

região. Isto está diretamente ligado ao meu contato primeiramente com os meios de

comunicação do presente, que é o caso da Inter TV que levaram a identificar e analisar o

surgimento da Imprensa. Desta forma propôs no presente trabalho problematizar a

linguagem do “O correio do Norte”, que vinculou nas suas discussões atitudes de agir,

produzir e qualificar questões relativas ao povo e as terras deste local.

1A Inter TV Grande Minas é a atual empresa de telecomunicação na região do Norte de Minas.

Page 9: A imprensa do século XIX

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Consigo perceber isso a partir da obra de Rejane Meireles Amaral Rodrigues, que em

seu texto, “Memórias em Disputa, Transformando Modos de Vida no sertão e na Cidade”,

procurou identificar questões relativas a uma construção de realidades e memórias sobre a

população do Norte de Minas, nos jornais que circulavam na região na década de 1910 do

século XX, que não são de fato a realidade vivida por estas pessoas. São memórias que

tendem a modernizar e civilizar esse povo, construindo outra ideia de cidade e sertão que

não era vivida pelo povo. Segundo ela, a “história da cidade vai sendo construída de forma

apropriada pela imprensa, ora com um passado glorioso dos grandes feitos de homens

considerados heróis, ora com um passado pessimista, sem grandes perspectivas”

(RODRIGUES,2013 p. 28).

Outro autor que utilizei neste trabalho foi Fabiano Cordeiro César (2013), que

pesquisou em seu texto as qualificações sobre a terra e agricultura da região acerca do ponto

de vista do O correio do Norte. Este trabalho foi fundamental para pensar inúmeras questões

relativas ao periódico, mas a partir das análises que fiz dos jornais, consigo descrever outras

relações que acredito que não foi o interesse de Fabiano Cezar no seu trabalho. Desta forma,

ele descreve uma instituição de saberes e processo de civilização através do discurso e usos de

representações do Jornal, mas eu procuro identificar construções de memórias tal como

Rodrigues (2013) fez no seu trabalho.

As fontes que foram utilizadas se apresentam ao mesmo tempo como fonte e objeto de

pesquisa, isso implica em entender que o jornal pesquisado foi pensado como “ [...] mero

veículo de informações, mas como agente social que produz ações, intervenções, é um

ingrediente do acontecimento, é parte dele”, o que implica segundo Marta Emisia Jacinto

Barbosa, em uma busca em que desvende “relações sociais, o sentido político da

materialidade dos meios, indagar sobre a organização de linguagens” (2006, p. 269).

Com isso, a imprensa acaba se tornando minha fonte e objeto de pesquisa, pois se

busco saber como determinada notícia ganhou significado dentro do contexto, é preciso

problematizar a própria imprensa dentro do movimento histórico do qual ela fazia parte. Para

compreender os significados das notícias, para buscar pistas de como o leitor leu, é preciso

saber para quem o jornal escreveu e o que ele intencionava ao produzir determinadas

memórias. Desta forma, objetivo identificar as linguagens que este jornal retratou em suas

páginas.

Trabalhar com Imprensa dentro da história é uma proposta que esteve durante muito

tempo como algo questionável dentro das perspectivas historiográficas. Sobre estes fatores,

segundo André Mazini (2012) a partir da década de 1970 o jornal passou a ser concebido

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como um possível objeto da pesquisa histórica e deixa de ser utilizado, tão somente, apenas

“como fonte confirmadora de análises apoiadas em outros tipos de documentação” (2012. p.

6). Como um dos marcos dessa mudança é indicado por ele o trabalho de Maria Helena

Capelato e Maria Lidia Prado2. Na “contramão das pesquisas históricas realizadas em sua

época, e até mesmo enfrentando possíveis preconceitos quanto à investigação da história a

partir de periódicos, a dupla de pesquisadoras elegeu como fonte única de investigação e

análise crítica dos jornais” (2012. p. 5).

Nas décadas que se seguiram, ainda segundo Mazini (2012) ocorreu uma maior

abertura do campo historiográfico no que diz respeito à apreensão de diferentes objetos, sendo

notadamente crescente o número de estudiosos que analisaram a história a partir das lentes da

imprensa. Esse panorama fica ainda mais evidente nos campos das histórias culturais e

políticas, em pesquisas com recorte temporal a partir do século XIX, período em que os

jornais apresentavam suas leituras sobre os acontecimentos sociais, “evidentemente com

diferentes níveis de comprometimento político, econômico e ideológico” (2012.p. 6).

Apesar de grande reconhecimento como objeto da história, ela sempre foi vista com

desconfiança. Essa desconfiança é traduzida, de acordo com Mazini (2012), utilizando João

Honório Rodrigues (1968) que, mesmo considerando o jornal como “umas das principais

fontes de informação histórica”, alertava, com razão, que “nem sempre a independência e

exatidão dominam o conteúdo editorial”. Conteúdo este, caracterizado pelo autor como

“mistura do imparcial e do tendencioso, do certo e do falso” (2012, p. 6).

Se por um lado é justificada, nos estudos históricos, a desconfiança a respeito do

conteúdo presente nas páginas dos periódicos, por outro, de acordo com Luca, é perceptível

que, comprometidos ou não, os jornais são pautados por aquilo que se julga relevante para a

sociedade de sua época imediata. Dessa forma, o pesquisador dos periódicos, segundo Luca

(2010), trabalha com o que se tornou notícia, o que por si só, segundo ela, “já abarca um

espectro de questões, pois será preciso dar conta das motivações que levaram à decisão de dar

publicidade a alguma coisa” (2010, p.140).

Compreendo então, que para um estudo de imprensa, busquei primeiramente uma

relativa aproximação com os meios que estiveram interligados na produção do jornal

pesquisado. Isso ocorreu através das pesquisas relativas aos donos do jornal e as famílias

políticas que estavam na convivência com os editores. Houve também a necessidade de

procurar uma visão estendida da origem social do local onde foi pesquisado, que no caso é a

2Para tal, ver CAPELATO, Maria Helena e PRADO, Maria Ligia. O Bravo Matutino, imprensa e ideologia no jornal O Estado de S. Paulo, SP, Alfa e Omega, 1980

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região do Norte de Minas Gerais. Para isso utilizei uma metodologia condizente com esse

meio.

Tenho, assim, como principal ponto teórico-metodológico do trabalho, a linha

historiográfica relativa aos estudos ingleses marxistas. Essa linha é caracterizada por um

conjunto de trabalhos produzidos por um grupo de historiadores e de teóricos de várias áreas

formados na década de 60, que adotou um posicionamento de pesquisa da história a partir da

obra de Marx, porém em contraposição a perspectiva dogmática do marxismo, chamada de

“marxismo vulgar” por Eric Hobsbawm (2000). Então, percebo que a proposta desse grupo

busca construir uma análise da sociedade como uma totalidade em movimento, na qual a

experiência humana não se encontra submissa a qualquer forma de determinismo mecânico.

Mais do que isso, as abordagens socioeconômicas relativas ao interesse sobre os processos

estruturais de desenvolvimento do capitalismo.

Desta forma um autor que se mostrou fundamental para o propósito foi E.P.

Thompson, que em sua obra “A miséria da teoria” propõe um “método lógico de

investigação”. E com a teste de hipótese e eliminação de procedimentos auto confirmadores a

história que oferece “evidências de causas necessárias”, que produzem um diálogo com a

fonte. Nesse sentido, resta-nos, enquanto historiadores, pensar os conceitos como elementos

em construção e não como rótulos, já taxados por outro, e capazes de “caber em nossos

trabalhos”.

Nesta perspectiva, compreendo que serão trabalhadas as análises das linguagens feitas

pelo O correio do Norte. A partir disso, a comunicação produzida por esse meio, deve ser

pensada como algo permeável e passível de mudanças, não como um ponto único e coeso ao

longo do tempo. Sobre a linguagem que foi produzida, temos em Raymond Williams que:

Nem é essa linguagem um simples ‘reflexo’ ou ‘expressão’ da ‘realidade material’. O que temos é, antes, uma compreensão dessa realidade através da linguagem, que como consciência prática está saturada por toda atividade social, e a satura, inclusive a atividade produtiva. E, como essa compreensão é social e contínua (...) ela ocorre dentro de uma sociedade ativa e em transformação. A linguagem fala dessa experiência (...) a linguagem é a articulação dessa experiência ativa e em transformação; uma presença social e dinâmica no mundo (WILLIAMS, 1979, p.43).

Então, por meio disso compreendo que a sociedade enquanto uma instituição em

movimento delimita a comunicação para um processo em atividade que está em constante

transformação. Não obstante, utilizo o pensamento de Williams, pois acredito em uma

linguagem em constante movimentação e que leva as experiências dos jornalistas para o seio

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das suas discussões e produções. Desta forma percebo que a comunicação, produz uma

linguagem de prática social, que tem como intuito instituir para os interlocutores questões de

mudança sobre algum ponto que o produtor acredita ser importante.

O processo de elaboração do presente trabalho produziu a cada nova etapa de

pesquisas problemáticas que estavam relativas principalmente as linguagens utilizadas pelos

jornais pesquisados. Desta forma, meu questionamento surgiu a partir das leituras feitas do

periódico para depois pensar outros pontos externos ao jornal. Então, por meio disto, a divisão

de capítulos do trabalho é por temáticas com relação à pesquisa, e não respeitam uma ordem

cronológica.

As temáticas utilizadas foram divididas por meio dos capítulos. Iniciando a discussão

do trabalho, utilizei um breve apontamento da identidade política do Jornal no período. Para

isso, identifiquei a realidade política da época e a relação das famílias que detinham o poder

na cidade de Montes Claros com os redatores do periódico

Temos na segunda parte do trabalho dedicado às linguagens, que instituem práticas

para o povo da região. As caracterizações da população dessa época no periódico foi o meu

interesse de pesquisa neste momento. Utilizo principalmente os códigos de conduta que foram

publicados nesse jornal bem como os noticiários e editoriais que desqualificaram as práticas

desta época.

No terceiro capítulo, analisei as qualificações sobre a agricultura da região. A partir

das análises iniciais das fontes, percebi uma abundância de informações para utilização de

técnicas “modernas” para a época sobre questões relativas ao modo de produzir neste período.

Acontece que aparece nas páginas do Jornal várias qualificações das terras da região, desta

forma problematizei essas dualidades entre as terras e a agricultura feita pelo povo desta

época.

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Capítulo 1

O jornal e sua identidade política

Continuaremos, igualmente, a chamar a atenção dos poderes competentes para as necessidades políticas cuja satisfação imediata parecer possível, e a indicar as medidas que, no interesse das populações, ou para produzirem um benefício ou para evitarem e removerem um mal, devam ter pronta execução (O CORREIO DO NORTE, 1889, N° 272)

Durante o final do século XIX, há um avanço cada vez maior na criação de novos

jornais no Brasil. Destaca-se o surgimento de uma imprensa regional que começa a se

concretizar neste período, é assim que aparece dentro deste contexto o Jornal, O correio do

Norte, que acaba sendo o primeiro jornal do Norte de Minas Gerais. A principal característica

do Jornal é um notório posicionamento político definido.

A partir disto, o periódico utiliza de uma linguagem educativa, que demostrava uma

intensa cobrança com vários meios públicos do período. Consigo visualizar isto por meio da

citação inicial que demostra uma posição do jornal com relação aos pedidos necessários para

melhorias na região. Sendo assim, ele passa a ser palco das reinvindicações que justificam

determinadas ações relacionadas à política.

Sobre estes fatos, pretendo buscar neste capítulo os ideais políticos contidos no O

correio do Norte. Vale ressaltar que o período em que o Jornal foi estudado estava

acontecendo o fervor das ideias republicanas no país, e consequentemente um constante

aumento de discussões políticas. Então é impossível pensar imprensa, sem desvincular a

política em suas páginas. Sendo que, a história do Norte de Minas está inteiramente ligada às

amarras da política, que é representada por grandes famílias no poder mantendo uma relação

muito conturbada e até mesmo de violência entre os grupos familiares (PORTO, 2002). Por

meio disso, o jornal O correio do Norte, foi utilizado muitas vezes para fortalecer certos

grupos políticos e construir grandes nomes que deveriam perpetuar na história política da

região. Há também uma forte ligação do jornal como meio de apontar problemas da região

para o poder público da época, como foi o caso das estradas que seriam vias de comunicação,

meio importantes para o aumento da influência do Jornal na região.

Desta forma, o jornalismo desse periódico representava uma ligação forte com a

política que era caracterizada pelo modo de fazer Jornal no País desse período. Esse formato

que se constituiu no Brasil foi um importante indicador da identidade política dos jornalistas,

pois mostra como historicamente o jornalismo sempre esteve submetido ao poder político.

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Sendo assim, o próprio editor, Antônio Augusto Veloso do O correio do Norte é um exemplo

desta questão. Já que o mesmo era pertencente de uma família que detinha poderes nessa

época, onde foi chefe da câmera e um dos intendentes de província. Discutiremos isto ao

longo do capítulo.

A partir disto, compreendo que é importante refletir acerca da ligação em que a

Imprensa do Brasil fez com a política. Para tanto Sodré (1999) nos diz que a história da

imprensa se confunde com a própria história do capitalismo. É da pressão em privatizar a

imprensa de acordo com os valores do capital que surge o princípio da liberdade de imprensa,

inicialmente na Revolução Francesa e na Revolução Americana, também surgiu o conceito de

propaganda como sinal da conexão entre a imprensa e o modo de produção de mercadorias.

Assim, especialmente pelas suas técnicas de produção e circulação, a imprensa acaba por

gerar a padronização de comportamentos.

No período colonial a imprensa e também a universidade não tiveram espaço de

desenvolvimento no Brasil. Mas o surgimento das duas atividades a partir da cultura externa e

garantir o domínio realizado pela metrópole. Então, em 24 de junho de 1808 foi composta

uma junta para administrar a Impressão Régia no Brasil, que tinha como tarefa gerenciar,

imprensa já surgia no Brasil sob julgo da censura, tendo como seu marco inicial a Gazeta do

Rio de Janeiro um jornal oficial lançado em setembro de 1808; e o Correio Brasiliense,

publicado em Londres por Hipólito da Costa (SODRÉ, 1999).

Os dois primeiros jornais a circular no Brasil, entretanto, não merecem atribuição

importante na história da imprensa no país, já que o primeiro era um exemplo muito

rudimentar do jornal que conhecemos hoje, e o segundo era caracterizada como doutrinário.

Foi somente no período da independência mais especificamente após o retorno da corte para

Portugal, ameaçando a volta ao regime de monopólio, que as condições políticas começaram a

apontar. (SODRÉ, 1999, p 23) A ameaça de retorno a uma situação indesejada implicava a

mobilização que só é alcançada com a formação de opinião possibilitada pela imprensa.

Então, o movimento pela independência de 1820 foi favorável para o desenvolvimento da

imprensa. Em 1º de junho de 1821 começa a circular o primeiro jornal informativo do Brasil,

o Diário do Rio de Janeiro, que foi precursor no jornalismo de informação, mas que não se

distanciou da fase anterior. Foi o Diário Constitucional de 4 de agosto de 1821, o primeiro

jornal com a intenção de travar a luta política. Pouco tempo depois, em 15 de setembro de

1821, surgiu no Rio de Janeiro o Revérbero Constitucional Fluminense que Sodré (1999)

caracteriza como o órgão doutrinário da independência do Brasil, e que inicia os esforços,

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especialmente de luta contra a direita conservadora, para a convocação da Assembleia Geral

Constituinte.

Entretanto, com a Independência em 1822, surge o problema da estruturação do

Estado, os grupos politicamente divergentes começam a disputa pelo poder, e a liberdade de

imprensa é mais uma vez anulada pelas forças dominantes, liquidando os que se preocupavam

agora não mais com a luta pela independência, mas com a luta pela liberdade. Os periódicos

surgidos entre o período da dissolução da Constituinte e da abdicação, são “de circunstância,

de combate, de linguagem virulentas, em que a historiografia oficial tem visto apenas os

aspectos negativos, sem sentir neles o fecundo exemplo de sentido libertário e de avanço no

esclarecimento da opinião” (SODRÉ, 1999, p. 82).

É o chamado Pasquim, imprensa planfetária que caracteriza o jornalismo da fase

conturbada vivida nesse período em que a censura predominava, tendo sido abolida somente

anos depois com o decreto de 28 de agosto de 1827. O Pasquim era caracterizado pela

violência de linguagem, pela falta de periodicidade, por “vozes desconexas e desarmonizadas

combatendo desatinadamente pelo poder que lhes assegurasse condições de existência

compatíveis ou com a tradição ou com a necessidade, para a vala comum da injúria, da

difamação, do insulto repetido” (SODRÉ, 1999, p. 157).

Em 1826 foi instalado a Assembleia Geral do Senado e a Câmara, criando condições

para o aparecimento da imprensa como se conhece hoje. Neste período os jornais que

defendiam interesse de algumas autoridades ou algum grupo, comprovando que a imprensa

sempre se desenvolveu em estreita ligação com a atividade política, acompanhando a união

existente entre direita conservadora “representada pelos jornais áulicos ou imprensa

absolutista”, direita liberal “que pregava a monarquia constitucional” e esquerda liberal

“representada pelos pasquins” (SODRÉ, 1999, p. 159). A luta política travada pelos

periódicos tinha de um lado a frente formada pelos liberais, de direita e de esquerda, que

alcançou a vitória com a abdicação de D. Pedro I em sete de abril de 1831. Com a morte de D.

Pedro I, porém, os liberais de esquerda se dedicaram às rebeliões das províncias, o que

permitiu que os liberais de direita e os conservadores, que faziam parte do outro lado da luta

política, buscassem a retomada do poder, que culminou com o golpe da Maioridade. Nesse

meio tempo, o período da Regência, o Brasil viveu um período com ampla liberdade de

imprensa, o que fez com que a imprensa, apesar de tecnicamente ter se mantido muito

semelhante, passasse por um grande desenvolvimento político. Sodré (1999) caracteriza a

imprensa existente no Brasil entre os anos de 1830 e 1850, marcada pelos pasquins, como “o

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grande momento da imprensa brasileira”, pois, apesar de artesanal, com distribuição restrita e

pouca técnica, exerceu grande influência no espaço político (1999, p. 170).

Nessa fase, auge do poder imperial foi raro às vezes em que a imprensa tratou de

problemas objetivos, porém, na fase seguinte, a luta política volta a se intensificar e a

imprensa voltou a participar dela. Entre 1870 e 1872 surgiram mais de vinte jornais

republicanos no país, entre eles, A República, órgão do Partido Republicano Brasileiro,

fazendo com que a ideia republicana se ampliasse e alcançasse os estudantes e intelectuais.

Era dentro deste contexto que O correio do Norte se constitui enquanto um periódico.

Com uma vinculação própria com questões relativas com a política que estiveram relação

direta com o posicionamento de seus donos. Isso é sentido quando em sua primeira edição,

que confirma a sua identidade política conservadora, como foi descrito no próximo capítulo

do trabalho.

Contudo, esta relação do Jornal com a política, pois existia na região uma

formação política específica de coronéis e famílias que controlavam o poder. Para

compreender essas questões, a história da região confirma que existia uma política forte e bem

estruturada. Sendo que a vinculação entre parentela e os cargos políticos é a principal

característica dessas relações neste período. Para Victor Fonseca Figueiredo (2010) esses

termos tão diferentes estiveram, “por longo tempo, intimamente associados, presentes e

atuantes na esfera pública brasileira, principalmente, durante o Império e a Primeira

República”. Sobre esta perspectiva, ele relata que a realidade política da região, na virada do

século XIX para o XX, é caracterizada pelo domínio de grupos de famílias ricas.

No que diz respeito a Montes Claros, a cidade tem um histórico de vinculo forte entre

grandes famílias e envolvimento com o poder. Esta configuração é citada por Figueiredo

(2010) onde desde o ano de 1831, no Império, ainda sobre o nome de vila de Montes Claros

das formigas “duas facções antagônicas começaram a se formar” (2010, p.30). Inicialmente,

os dois grupos se constituíram pela divisão política entre conservadores e liberais. Entretanto,

essa configuração não seguia essa distinção ideológica. Já que os cidadãos dividiam

politicamente por causa dos “laços pessoais e não de lealdades partidárias ou considerações

ideológicas” (2010, p 30).

No âmbito desse seio familiar, outro fator preponderante para esse monopólio são as

guardas nacionais instituídas durante o império Brasileiro. Sobre estas questões, César

Henrique Porto (2002) reforça a ideia que sempre existiram mandões ligados a essas famílias

na política local, e que após a criação das guardas nacionais verificou-se um reforço desse

poder. Desta forma a Guarda Nacional era a porta-voz do estado uma instituição com poder

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de nomeação que sancionou e fixou as hierarquias entre os agentes sociais. Sendo assim,

segundo Porto a instituição da Guarda Nacional foi um aumento do poder de mando dos

chefes locais, principalmente tendo em vista o prestígio social que gozava aquele que detinha

e ocupava o mais alto posto, ou seja, o coronel (2002, p. 30).

Então, a partir disso percebo que a figura do Coronel enquanto um indivíduo que

detinha grande prestigio entre a população desta região, bem como sua família e as pessoas

que faziam parte de seu círculo social. Estas famílias que estavam no poder eram de certa

forma para esta população a única detentora de poder ou credibilidade para com o povo, por

conta da sua força política “legitimada pelo estado.

Neste sentido, segundo Figueiredo (2010) o campo político desta região e

principalmente da cidade de Montes Claros se estruturou fora de qualquer ordenamento

ideológico. Foram às lealdades pessoais e familiares os principais fatores que pensaram na

constituição de uma elite política fragmentada em dois grupos rivais. Assim, o partido liberal

é exercido pelo grupo das famílias “Chaves, Prates e Sá” e o conservador pelos “Versiani e

Veloso”. Sobre esta realidade, Figueiredo (2010) ainda aponta que os grupos familiares mais

influentes foram dirigidos por grandes fazendeiros, advogados médicos e comerciantes que

empenhavam nas disputas pela supremacia, mobilizando seus parentes, amigos e

correligionários espalhados pela região.

Ainda sobre esta perspectiva é possível notar uma ligação muito forte entre os

bacharéis e a política. Já que o conhecimento esteve diretamente ligado à cultura política da

época. Com relação a esse fato, Porto (2002) procura relatar essa condição que o Norte de

Minas vivia uma “praga do bacharelismo” sendo que isto advém desde os períodos bem

remotos da colônia brasileira e que a origem da sedução exercida pelas carreiras liberais

vincula-se estreitamente ao apego quase exclusivo aos valores da personalidade.

Para ilustrar a presença de profissionais liberais na política local, Porto traz uma lista

de homens vinculados aos mais altos cargos da política e suas profissões, destacando-se a

participação de Carlos Versiani, Médico e presidente da câmera municipal entre 1853-1864 e

1869;Antonio Gonçalves Chaves Junior, Advogado e Dep. Provincial/Presidente da

Província; Justino de Andrade Câmara, Advogado e Presidente da Câmara/Deputado

Providencial; Antônio Augusto Veloso, Advogado e Deputado Provincial eleito em 1886,

Camilo Prates, Professor e Deputado Provincial eleito em 1886;Antonio Gonçalves Chaves,

padre e Presidente da Câmara/Deputado Provincial.(PORTO, 2002, p. 102)

Todos os políticos listados têm uma relação direta com carreiras de bacharéis, sendo

que a política da região é representada por uma realidade forte com o conhecimento e

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educação, em um ambiente que a maioria da população era analfabeta e com pouca

participação no ambiente político. Sendo assim os poucos bacharéis formados eram das

famílias dominantes e acabavam por participar desta política.

Destaco Antônio Augusto Veloso, teve a função de Advogado, esteve inserido nesta

política da época e também foi o criador e fundador do Jornal O correio do Norte. Então é

possível traçar essa ligação do jornal enquanto um noticiário com características políticas

marcantes pelo fato de o próprio dono desse veículo pertencer à política da época.

Dessa forma, muitas vezes o periódico foi utilizado como um veículo que era local de

fala das famílias que detinham o poder da região. Por meio disso seu noticiário e nas

linguagens dentro do próprio jornal foram descritas questões que tinham relação direta com

essas famílias. Isso acontece a partir vários relatos que procuravam descrever e noticiar a vida

dessas pessoas.

Ao longo de todas as edições analisados, observo uma construção física do jornal que

não obedecia a uma ordem mais complexa e estruturada. Tal como será relatado no terceiro

capítulo, ao longo das páginas apareciam noticiários diversos sobre vários assuntos. Eram

recorrentes os códigos de posturas3 ou notícias com questionamentos acerca das práticas do

povo. Outro ponto que passou a ser muito frequente eram as notícias sobre a agricultura e o

uso da terra. Esses pontos serão retratados no segundo e terceiro capítulos. A questão que diz

respeito ao presente capítulo são as construções de nomes e das famílias, que eram

representadas no jornal através dos noticiários sobre a cotidiana das pessoas ricas da cidade e

consequentemente dos feitos dessas pessoas.

Uma exemplificação dessa questão pode ser vista na edição do dia 14 de abril de 1885,

da segunda página onde é retratada a formatura do estudante de medicina de um dos membros

da família Veloso no Rio de Janeiro. Isso era muito comum em todo o Jornal (O CORREIO

DO NORTE, 1885, n° 139). Sobre este fato podemos compreender que geralmente essas

notificações eram mais recorrentes dentro das famílias Veloso e Versiani, que como foi dito,

pertenciam ao grupo conservador da cidade.

Percebo assim, que para além dos noticiários da vida dos membros das famílias

dominantes, O correio do Norte utilizou de recursos discursivos para construções de imagens

de pessoas ilustres ou grandiosas para a população. Isso pode ser percebido nas figuras de

heróis da política do município. Essas construções estavam ligadas basicamente a manutenção

das famílias no poder e principalmente colocá-las em destaque na realidade da época.

3 Leis formuladas pela câmara municipal e publicadas no jornal o Correio do Norte. Para tal, ver próximo capitulo.

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19

Justifico isto por meio da edição de número 273, no dia 27 de outubro de 1889. Neste dia

aconteceu a morte de um dos filhos de um importante político pertencente à família Versiani

da região neste período. Sobre isto ele retrata que;

A morte é um tributo fatal imposto à humanidade; é uma lei inexorável, que pesa sobre o homem. Mas nada tão cruel, tão doloroso, come chegar assim ao termo de existência, na flor da mocidade, na aurora da juventude, quando se sente o coração cheio de esperanças , a sonhar um futuro risonho e feliz!

Já não existe o Doutor Pedro Augusto Catta Petra Versiani! Deixou de palpitar esse coração magnânimo; não se expande mais em atividade esse espirito fecundos em idéas as mais generosas e puras. Indioso amigo! Quantas paginas em branco deixaste ainda no livro da vida.

Bem pouco pudesse gozar dos ephêmeros prazeres mudanos, e bastantes foram os teus sofrimentos nesses curtes dias. Findou, porém, a tua peregrinação uestevallede misérias, e tua alma grande e piedosa, despindo o involucro material, e volou, para a etheramasão dos justos.....

Perda tão sensível, golpe tão profundo alterou consideravelmente a saúde do débil moço. A pezar de tudo continuaou a estudar, e conseguiu,tinalmente, forma-se. (CORREIO DO NORTE, 1889, nº 273).

Dessa forma, esta edição foi especialmente para retratar a morte do Doutor Pedro A.

C. Versiani, que segundo o próprio jornal era um recém-formado médico da cidade. Como ele

pertencia à família Versiani, a edição deste dia do Correio do Norte foi dedicada

exclusivamente para noticiar sua Morte. Com a página inicial estampando um desenho de

grande cruz com uma imensa mensagem da morte deste médico. É notória uma escrita triste e

com bastante referência à sua “morte prematura” e como a cidade e a região estavam abaladas

com a notícia da sua “grande perda” (CORREIO DO NORTE, 1889, nº 273). Ao longo das

páginas seguintes percebemos várias mensagens que seriam de apoio a família bem como

poesias do povo para o médico.

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FIGURA 1: Edição do correio do Norte no dia no dia 27 de outubro de 1889, data da

morte de Pedro Versiani

Contudo, toda essa exclusividade que o jornal fez a partir da notícia da Morte de Pedro

Versiani foi de fato um acontecimento que justifica essa construção de sentimentos e

memórias para população acerca das pessoas dominantes nesta época. Percebo isso, pois foi

somente nesse acontecimento que é colocado uma figura na primeira parte do Jornal, esta

figura que era um crucifixo, mostra algo muito grandioso e forte, um símbolo muito

impactante. Aparentemente percebo um interesse do editor de colocar este símbolo em

destaque, pois ele pretendia fazer dessa perda um marco, uma comoção na população que

gerasse memória para o povo.

Outra questão marcante, é que sempre no jornal eram noticiados assassinatos, e outras

questões vinculadas à morte e violência, mas que não ganharam muito notoriedade como foi

no caso de Pedro Versiani, que apenas teve uma morte por tuberculose muito novo. Vinculo

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21

assim, o acontecimento a questões relativas ao âmbito da política já que foi necessário

demonstrar para a população a tristeza que a família e todo o povo estiveram com esse

acontecimento.

Isso demonstra que o cotidiano que foi noticiado no O correio do Norte foi apenas às

questões que tinham por interesse o próprio editor e chefe do Jornal. Pois Antônio Augusto

Veloso enquanto político da época e amigo filiado ao grupo conservador utilizou da perda de

um ente da família vinculado da família, os Versiani, para lamentar a morte de uma pessoa

que fazia parte do grupo familiar. Desta forma, nesta edição percebo uma valorização muito

grande na figura do Jovem medico, onde é descrito como um “homem de coração bom”,

“generoso” e preocupado com a saúde dos povos mais “pobres e com pouca condição”

(CORREIO DO NORTE, 1889, nº 273).

Um outro ponto que justifica a ligação com a política no corpo do jornal foram as já

comentadas reinvindicações e cobranças para o estado da época. Junto com isso, aparece no

jornal reportagens educativas que demostram como funciona o processo político A cerca

disto, caracterizo por meio desse trecho;

Se é verdade que os partidos constitudm uma necessidade inherente à própria organização dos Estados, que se regem pela forma de governo constitucional representativo, não o é menos que desmerece o partido que, para triumphar, se aproveita de recontros, empregando em vez de combater leal a querra de escaramuças e encurções.

Um talsystema, bem longe de demostrar a força ou prestigio da opinião, somente servirá para desvirtual-o, aniquilamento, a elevação de visitas, que deve presidirá toda entativa de victoria dos partidos.

Como individuo, a particulidade, que tem consciência do predomínio das ideas que representa, não evita luta em campo aberto, nem se retre a censuras, na certeza de que as desfará em successo e, por ventura, a maior brilho de gloria.

A confiança, na legitimidade da causa da assas força. Não há poder como o da convicção, já alguma o observem.

Em Roma antiga, quanto mais a pena de nova e a proscriapção puniam em mais leves censuras

A idéia, que se impõe pela forç moral, não recria ser supplantada pela preconisação de princípios eppostos. A intolerância e a negação da verdade, em toda e qualquer doutrina. O homem público, a autoridde, o funcionamento o cidadão que arrisca o juízo da opinião a pronunciar-se sobre os actos, e o não teme que acompanha-o a tranqüilidade de espírito,

Page 22: A imprensa do século XIX

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que vão gerar o comprimento do dever e que não se torna a analizar. ” (CORREIO DO NORTE, 1889, nº 273)

Esse testo foi retirado de um editorial do Correio do Norte. Ao longo do texto percebo

uma explicação ou caracterização das formas como os partidos políticos são organizados. Por

meio disto o editor, procura justificar as diferenças de partidos e como acontecem as

oposições dentro desse meio. Então, percebo que o Jornal, no seu discurso escreve

diretamente para os seus leitores, desqualificando a oposição, caracterizando-a como algo que

impediria o bom andamento da sociedade.

Com relação a isto, discuti ao longo do trabalho a preocupação do Jornal, em educar as

pessoas, por meio de um discurso de prática social ele demostra para a população a sua

capacidade de fazer parte da política, no âmbito das cobranças sobre as instituições e até

mesmo sobre as pessoas os políticos. Entendo com prática social os postulados de Raymond

Willians, que diz que;

Nem é essa linguagem um simples ‘reflexo’ ou ‘expressão’ da ‘realidade material’. O que temos é, antes, uma compreensão dessa realidade através da linguagem, que como consciência prática está saturada por toda atividade social, e a satura, inclusive a atividade produtiva. E, como essa compreensão é social e contínua (...) ela ocorre dentro de uma sociedade ativa e em transformação. A linguagem fala dessa experiência (...) a linguagem é a articulação dessa experiência ativa e em transformação; uma presença social e dinâmica no mundo (WILLIAMS, 1979, p.43)

Como força ativa da história, o jornal deu aos seus leitores opiniões e visões de

mundo, e ainda defendeu projetos que objetivavam o “melhoramento da província do Norte”.

Desta forma uma educação política determinava isto.

Segundo Fabiano Coerdeiro César (2013) uma das características do Correio do Norte

era a publicação de leis, tanto no intuito de cobrar a fiscalização delas, quanto no objetivo de

alcançar realizações materiais para o norte de Minas. Acredito que essa característica tem

forte influência de seu proprietário Antônio Augusto Veloso, pois ele era formado em Direito,

atuando, inclusive em Montes Claros como advogado.

Algumas das leis publicadas por ele, que Fabiano Cordeiro César (2013) aponta, foram

as leis orçamentárias, às vezes publicadas como “Quotas”, ou “Lei de Orçamento Provincial”.

Essas publicações faziam referências às quantias que as cidades iriam receber para obras

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públicas o que, consequentemente, possibilitou perceber a intenção de abrangência do Correio

do Norte, que noticiava as quotas orçamentárias de diversas cidades, freguesias e vilas do

Norte de Minas. Elas permitem ainda perceber algumas das reivindicações políticas dos Norte

Mineiros sendo atendidas, ou pelo menos sendo debatidas no âmbito de governo Provincial.

Permitem também compreender o papel de mediação que o jornal teve, pois muitas das verbas

liberadas ou incluídas no orçamento provincial, segundo Fabiano Cordeiro César, eram de

obras públicas que o Correio do Norte reclamava junto ao governo provincial desde 1884,

através de suas folhas.

No jornal publicado em 20 de outubro de 1889, número 272, o jornal lista cada

localidade e o orçamento destinado a ela, ressaltando o uso de tal verba.

A lei 3.714, de 13 de Agosto desseanno, - lei de orçamento provincial para o futuro exercício de 1890 consigna, entre outras, as seguintes quantias para obras públicas:

1:500$000 para canalisação d´agua potavel no arraial de Coração de Jesus deste municipio; 1:000$000 para as obras da matriz desta cidade; 500$000 para as da igreja de S. Joao da Ponte neste municipio; 250$000 como auxilio a camara municipal desta cidade para acquisição de um regulador publico: 500$000 para as obras da matriz de Jeguitahy; 300$000 para auxiliar a camara municipal dessa mesma cidade na construcção de uma ponte sobre o rio vieira, no logar denominado passagem do Mello; 200$000 para a construcção de uma ponte sobre o riacho Ribeirão, na paróquia de Montes Claros e logar denominado Ponte Alta; 1:500$000 para a construcção de uma ponte sobre o riacho pau branco, na estrada que vai de Montes Claros a Brejo das Almas e a abertura de uma estrada da ponte do rio Verde ao referido arraial: 1:000$000 para reparos da ponte sobre o rio Paguy na entrada de Montes Claros para Coração de Jesus, e logar denominado ponte de Taboas; 600$000 para a construcção de torres na matriz de Coração de Jesus no mesmo município; 100$000 para alfaias da matriz de Montes Claros; 800$000 para reparos na matriz de Bom Fim de Montes Claros; 100$000 para obras da capella de S. João da Vereda (...) 100$000 para as obras da capella de Santa Cruz de Morrinhos (...) 200$000 para as obras da matriz de Sant´Anna de Olhos D´agua no município de Jeguitahy(CORREIO DO NORTE, 1889, Nº272).

As reclamações que o jornal veiculava em âmbito local demonstram por onde

caminhava essa mediação. A intenção de abrangência do Correio do Norte possibilitou

analisar essas mediações e, concomitantemente, ver que caminho os jornais estavam

buscando. Desta forma, o Periódico deixava claro para a população a necessidade de cobrança

Page 24: A imprensa do século XIX

24

no âmbito do poder público desta época. Sobre estas reclamações noto uma quantidade maior

delas quando se diz respeito às obras relacionadas às estradas que ligavam os munícipios.

As notícias em torno das estradas eram relacionadas para Fabiano Cordeiro César

(2013) as “vias de comunicação”, que segundo ele seriam os locais que eram utilizados para

facilitar os meios de comunicação e de divulgação dos periódicos da época. Uma

exemplificação disto era quando o Jornal cita a relação entre as vias de Montes Claros a

Diamantina; a cobrança do atraso das obras da ponte do Rio Vieira; a demora dos correios

para as cidades de Montes Claros, Januária e São Francisco; ea implantação de rede fluvial no

Rio São Francisco, são questões que apontam os discursos de cobrança realizados no Correio

do Norte tanto em o nível local, quanto regional, pois diziam aos seus leitores que a

responsabilidade para construção e manutenção dos meios de comunicação .

Percebo que a publicação da lei orçamentária que utilizei anteriormente permite

perceber certa resposta do Governo provincial aos pedidos que vinham sendo feitos desde

1884 pelo Correio do Norte. A necessidade de melhoramentos nos meios de comunicação,

como pauta política dos Norte Mineiros, revela os locais de passagem, os lugares de trocas

comerciais e experiências sociais. Demonstra ainda uma rede de comunicação interna que

encontrava no periódico um local discursivo de cobranças e pressões que exigia

melhoramentos, ou até mesmo, a criação de novos canais de comunicação.

Desta forma, o Jornal contribui para outros vários aspectos relacionados à sua

identidade política, desde notícias que relatavam questões relativas à vida privada e pública

das famílias detentoras do poder, até as cobranças para o governo da época. Isso revela que o

periódico era o local propício para seus redatores e principalmente o seu chefe e criador,

Antônio Augusto Veloso de manter uma relação com a população local que tiveram por traz

os seus interesses.

Quando relato a relação do Jornal com as mediações e cobranças por parte das vias de

comunicação, consigo identificar um desejo do seu chefe em modernizar as estradas e vias

para facilitar esse processo comunicativo, que iria facilitar o advento do seu jornal. Outra

questão é que esse Jornal, muitas das vezes servem de referência para noticiar assuntos

relativos a política da época, sendo reproduzido assim das famílias do poder na época. Sendo

assim o jornal teve o papel fundamental na produção de memórias que justificavam a

permanecia dessas pessoas no poder da região e continuassem nessa relação que tinham para

com a população.

Redes de comunicação

Page 25: A imprensa do século XIX

25

No meu intuito ampliar o pensamento em torno das experiências geradas e divulgadas

pela imprensa, percebi por meio da bibliografia utilizada questionamento com relação às redes

de comunicação que foram produzidas pelo Jornal o correio do Norte. Compreendo isso a

partir do contato com a obra de Marta Emisia Jacinto Barbosa e do historiador Jorge Luiz

Ferreira Lima (2008) em História, Imprensa e Redes de Comunicação.

Após a leitura desse texto consegui analisar um percurso historiográfico posto por

esses autores no intuito de desvendar a constituição das redes de comunicação, colocando em

evidência a materialidade destas, bem como procurando dar visibilidade aos agentes sociais

que possibilitaram essas redes e as experiências que constituíram esse percurso no Norte de

Minas. Acerca da constituição de redes de comunicação os autores mostram que;

A investigação a respeito da constituição de redes de comunicação na região norte do Ceará propõe desvendar a materialidade destas, dar visibilidade aos sujeitos sociais e as experiências que as constituem. O trabalho explora percursos de produção e difusão de materiais impressos, pequenos fragmentos que, reunidos, possibilitam pensar em sistemas de troca de informações, constituição de relações sociais na organização da instrução, no aprendizado da leitura e da escrita, bem como na definição do que é importante conhecer, aprender, nas pequenas cidades do sertão. (BARBOSA, LIMA, 2008, p. 37)

Dentro das possibilidades apontadas pelos historiadores seleciono os percursos de

produção e difusão de materiais impressos no Norte de Minas para pensar a constituição das

redes de comunicação. Esses dois itens podem ser visualizados por meio dos próprios

periódicos. Primeiro, a partir da própria tipografia4 que é tomada como ponto principal da

distribuição, o que engloba pensar os redatores e os homens que faziam a prensa rodar;

segundo, e o mais importante, a análise das cartas que essa tipografia recebia e publicava.

É fundamental compreender que essas correspondências enviadas aos jornais fazem

parte da produção jornalística, são textos que ao serem publicados se tornam parte da

linguagem do periódico, mesmo que tenham formas diferentes. Para Fabiano Cordeiro César

“ao mesmo tempo em que é uma informação que diz respeito à difusão desses periódicos,

4 O Correio do Norte foi um jornal que surgiu em momento de expansão da técnica, entretanto foi um periódico com características artesanais, logo com raízes políticas claras. Segundo Cordeiro César (2013) o jornal foi artesanal na relação com seus correspondentes, que ocupavam espaços significativos nas folhas mesmo sem um alinhamento com o programa editorial dos jornais. Portanto, entendo que a linguagem jornalística tinha uma estrutura que ganhava várias formas, um exemplo disso foi a correspondência publicada no Correio do Norte exaltando o Barranqueiro e a sua relação com a natureza no intento de retirar seus suprimentos alimentares, relação está constantemente depreciada pelo programa editorial dos jornais.

Page 26: A imprensa do século XIX

26

essas cartas nos dizem até onde os jornais foram enviados” (2013, p. 106), desse modo, elas

mostram um circuito de comunicação que aceita em sua produção “agentes internos e

externos” (2013, p. 107) em cada estágio da produção.

Entendo que é possível articular essas correspondências como estágios externos dentro

do processo de produção dos periódicos, assim como os viajantes que ao chegarem à região

publicavam notas de chegadas nos jornais, ou informavam aos redatores sobre fatos que

estavam acontecendo em outras cidades, como podemos perceber nesta citação; “Consta, por

pessoas recentemente chegadas a esta cidade, que no baixo S. Francisco tem havido espantosa

mortandade de gado” (CORREIO DO NORTE, 1884, nº 4).

O processo de produção jornalística se alimentava da rede de comunicação e foi dessa

maneira que diversas notícias foram enviadas para serem publicadas pelos chamados

correspondentes. Fabiano Cordeiro César, citando Darton demonstra que as redes eram

composta de artérias, veias e capilares e que leva em conta todos os estágios do processo de

produção e distribuição” (DARTON in CÉSAR, 2013, p. 105).

Sendo assim, Fabiano Cordeiro César propõe uma série de informações que confirmam essa

circulação e distribuição dos Jornais. Isso acontecia no âmbito de toda a região do Norte de

Minas, como é o caso das localidades de Bocaiuva, Contendas, Coroa do Fraude, Bate Couro,

Barra do Rio das Velhas e Coração de Jesus.

As localidades internas, conforme Fabiano Cordeiro (2013) listada são valiosas porque

são uma possibilidade de verificar como os jornais alcançaram determinadas localidades. Elas

apontam a difusão dos jornais e sua abrangência real. As localidades internas listadas

demonstram o circuito de produção da comunicação, são informações que permitem obter

uma dimensão da difusão dos jornais. Essas informações revelam que essas correspondências

noticiadas no corpo do Jornal, eram dedicadas a leitores e assim, consequentemente assinantes

do Jornal em outras partes da região, que não estavam concentrados apenas na cidade de

Montes Claros.

Essas informações são importantes, pois entendo que evidenciam a existência de

fragmentos de leitura e leitores no norte de Minas do final do século XIX, inclusive as

localidades que não eram do Norte Minas, pois elas permitem visualizar uma troca de

informações.

Dessa maneira, as informações de acordo com Fabiano Cordeiro César (2013),

permitem pensar em leitores, “na concretude de um circuito de comunicação, uma vez que

confirmamos para onde os jornais poderiam estar indo” (2013, p. 107). Da mesma forma os

movimentos dos viajantes publicados pelos jornais, com notas de chegadas e saídas, ou

Page 27: A imprensa do século XIX

27

informando acontecimentos de outras localidades, demonstram os jornais se utilizando da

rede de comunicação para publicar informações de outras localidades.

Compreendo assim que existiu uma forte movimentação desse periódico por toda a região.

Portanto vários grupos de pessoas tiveram a oportunidade de ter acesso as diversas

questões ideológicas trabalhadas neste capítulo. Assim, o correio do Norte pode demonstrar

uma dominação no que diz respeito a comunicação para esse povo. O jornal o Correio do

Norte, utilizou muitas das questões relativas à interiorização do povo, de suas práticas e de

seus costumes. Ao mesmo tempo ele cria em suas linguagens uma imagem positiva das terras

desta região. Assim ele demonstra para outras localidades, uma qualificação dessa região. É

sobre esta questão, de instituição, caracterização e qualificação dos espaços e das pessoas que

irei tratar no próximo capítulo.

Page 28: A imprensa do século XIX

28

Capítulo 2

Civilização e Modernidade para o povo- A linguagem como prática

social no Correio do Norte

Com o aparecimento de este Jornal pretendemos advogar a prosperidade moral e material do extremo norte de Minas, attender uma intuitiva exigência publica na populosa e vasta zona, que de mais perto, se destina a servir, pugnar pelos meios tendentes á satisfação das múltiplas necessidades locaes, que, directamente os affectam (...) (CORREIO DO NORTE, 1884, p.1)

Na primeira edição do jornal Correio do Norte em Montes Claros, no dia 24 de

fevereiro de 1884, foi descrito o então novo jornal como um “grande ganho” para a população

do Norte de Minas Gerais, sendo que várias frases motivadoras deste texto inicial chamam

atenção para termos, que foram muito recorrentes em todas as edições do Jornal, como

moderno e civilizador. A partir disso foi descrito que o surgimento desse jornal “terá,

igualmente por objetivo, ligeiras noções sobre conhecimento uteis ou outro qualquer

atividade” e ainda citando processos de agricultura como; “Compreenderá além disso, a

descrição de processos agrícolas, tendentes a melhorar a lavoura e aplicáveis as culturas

usáveis, ou que possam ser introduzidas, com sucesso e vantagens" e o mais surpreendente é a

postura diante o papel do jornal que " o aparecimento de mais ainda modesto e cooperador

desses obreiros do progresso, é um facto digno de estímulo, por parte de quem pensa o futuro

da pátria e não recusa contingente a prosperidade dela" (O CORREIO DO NORTE,1884

p.1).

É com muita clareza que o jornal se situa enquanto produtor do progresso e do

conhecimento, mas porque desta clareza, ou como esse processo de modernização e progresso

que o periódico retrata no seu início é tão importante. Talvez haja um ligamento preciso sobre

este jornal com outras imprensas feitas na época? Sobre esta perspectiva venho problematizar

essas questões de civilização e modernização que foi frequente no próprio jornal. Sendo assim

o presente capítulo, objetiva em retratar essa construção de ideias e sentidos para o povo do

Norte de Minas. Repensando como essas ideias de civilização e modernização dos costumes,

progresso foram importantes nas páginas deste jornal.

Consigo visualizar isso por meio da obra de Rejane Meireles Amaral Rodrigues, que

após a análise da imprensa Montes Clarence do início do século XX, aponta diversos meios

em que o jornal irá produzir memória sobre a cidade e o campo, transformando essa região em

atrasada ou moderna de acordo como momento que convém. Foram analisados por ela modos

Page 29: A imprensa do século XIX

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de vida e práticas antigas que a imprensa indica com atraso tentando criar novas memórias

para os moradores da cidade. Para identificar essa concepção dualista entre as relações de

campo e cidade, Rodrigues (2013) aponta diversos pontos que contribuíram para pensar e

propor a modernidade, como é o caso de obras públicas, a ferrovia, por exemplo, que

ocasionaram em uma construção ideológica de que a cidade de Montes Claros era moderna e

até mesmo Industrializada.

Outra obra fundamental para este estudo foi a dissertação de Fabiano Cordeiro César

(2013) que analisa no mesmo período de minha pesquisa o “Correio do Norte” e também o

jornal “Montes Claros”. Ele descreve informações que são bem pertinentes para se pensar

modernidade e Imprensa. Um exemplo dessas passagens é quando ele retratou várias práticas

datadas atrasadas pelo Correio do Norte, sendo um trecho na edição 49 do ano de 1884, que

os meninos das cidades percorriam nus pelas ruas encontrando cachorros doentes para

sacrifícios. Estas passagens são fundamentais para perceber as produções do jornal que iria

construir ideias de civilidade, já que no Jornal desta edição sugere para que os cães devessem

ser mortos por "bolas envenenadas" e não por crianças naquele estado. Portanto, percebo que

a Imprensa de Montes Claros, ou Norte Mineira, retém em sua produção um grande ideal de

progresso e modernização, algo destinado a formar e construir novas memórias para as

populações dessa região.

Ainda, pensando a produção de Fabiano Cordeiro César (2013), foi com uma maior

intervenção do estado na vida privada das pessoas que a imprensa suscitara tal ideologia de

civilidade. Ele exemplifica por meio de vários acontecimentos desse período, como a revolta

da vacina que é a resistências da população urbana há meios de intervenção do estado através

de práticas higienista e de limpeza para com o povo. Nas suas análises de notícia, ele constrói

a ideia de que havia códigos de postura e que eram repassados para a sociedade do Norte de

Minas novos costumes em detrimento com os antigos, que passaram a ser vistos como

atrasados e incomuns.

A linguagem que o Jornal utiliza proporcionará para Fabiano Cordeiro César, uma

construção simbólica de atraso e desorganização por parte da sociedade da época. O conceito

de civilização é equivalente ao de desenvolvido no século XX, sendo possível compreender as

ideias e indumentárias que a imprensa traz para justificar essa civilidade. Acontece que é

nesse discurso de civilidade que o Estado e a camada intelectual da época produzem ações

concretas que divulgaram esse ideal, sendo a Imprensa um grande exemplo disso. Para ele no

momento que os Jornais Norte Mineiro trazem essas questões em seus noticiários produzem

símbolos e ideias de sociedade para transformação de seu espaço, tanto o urbano como o

Page 30: A imprensa do século XIX

30

rural. É possível perceber que o Correio do Norte delimitou e construiu uma ideia de território

nesta região, sendo ele próprio o formulador de lugares mostrando que seria o Sertão do Norte

de Minas e como os habitantes dessa região deviam se portar.

Há um diálogo muito intenso entre os projetos de civilidade por parte da Imprensa do

País e também do governo, com os jornais analisados por ele. No momento ele cita a revolta

da vacina, comenta sobre as práticas e projetos do Estado para a limpeza, higiene e saúde da

população, sendo que a revolta aconteceu durante a primeira fase da república brasileira ou

República Velha, mas o seu período de Estudos é do final do século XIX. É correto afirmar

que as práticas higienizadoras na população do Brasil começaram ainda no Império5, mas o

processo de higienização intenso com participação de pessoas voltadas para áreas da saúde e

afins é superior a esse período. Ou seja, compreendo as ideologias em que o Correio do Norte

trouxe, sobre outra perspectiva que não retratada somente ao processo civilizador, com o teor

higienista, mas sim uma produção de novos costumes que estão ligados diretamente ao âmbito

da política.

Sendo assim, é perceptível uma grande desvinculação com a grande imprensa feita na

época. Como se o Jornal do sertão do Norte de Minas não dependesse diretamente de algum

órgão específico ou que segue esse, como é o caso do Governo. Ressalto que essa imprensa

nascente dessa região praticava em seus escritos certas ideias de civilidade e modernização

que estavam mais envolvidas no campo ideológico do que na prática, já que a interferência do

estado nesta época não era tão efetiva como posteriormente com a República.

Nesse período não identifico uma participação efetiva do Estado na vida do cidadão.

Pois as relações desses cidadãos para com a algum órgão do governo era intermediada por um

grupo que estava no poder, que no caso específico estavam nas famílias que se inseriam na

política, sendo o personagem principal disso, a figura do Coronel da Guarda Nacional.

Em relação à História da Imprensa utilizou pensamento de Nelson Werneck Sodré

para um entendimento geral acerca da Imprensa Brasileira desta época. Sobre a Imprensa do

século XIX, ele enxerga que “quem controla a comunicação social controla ideologicamente a

sociedade, ou seja, quem controla a mercadoria que é a informação controla o poder.” Para,

além disso, ele ainda afirma que:

A ligação dialética é facilmente perceptível pela constatação da influência que a difusão impressa exerce sobre o comportamento das massas e dos indivíduos. O traço consiste na tendência à unidade e à uniformidade, à (...)universalização de valores éticos e culturais (...) [e à] padronização do comportamento. As inovações técnicas influem na tendência à uniformidade. (SODRÉ, 1999, p. 1-2)

5Para tal ver; CHAlHOUB, Sidney CIDADE FEBRIL - Cortiços e epidemias na corte imperial

Page 31: A imprensa do século XIX

31

Este foi um ponto fundamental do trabalho, já que é a partir desta influencia e

dominação dos indivíduos pelo jornal, foi a principal questão trabalhada aqui. A partir disto

percebo que a dominação e influencia que Sodré diz é o ponto ideal que sigo na concepção da

pesquisa. É importante ressaltar que o período retrato na pesquisa condiz com uma de

importante estabilidade política no Brasil. O processo ideológico da República6 é cada vez

maior no âmbito nacional. Sendo que nos anos de 1880 é o final do Império no País e

particularmente durante o período imperial a Imprensa teve um comportamento próprio desta

época, com várias especificidades próprias características deste período.

Sendo assim Sodré particulariza a imprensa do Império como uma fase que marcou a

forma como os Jornais se constituíram, no país, como foi a sua estruturação e consolidação

enquanto grande rede de comunicação. Essa estrutura de fazer jornalismo dava prioridades

para os grandes latifundiários e escravistas da época, não sendo de um teor fortemente

político, mas com certa inserção destes valores. Ao longo do tempo e principalmente com o

passar do segundo reinado a Imprensa aumentou o caráter políticos de suas páginas, e com um

aumento mais considerável de panfletos e pequenos Jornais de oposição ao estado

monarquista e ou outras práticas políticas, como é o caso do republicanismo (SODRÉ,1999, p.

5).

O século XIX foi o período da História de maior importância para a imprensa devido a

fatores como a evolução dos sistemas econômicos e político, os avanços tecnológicos,

transformações sociais e o reconhecimento da liberdade em rumo à democracia. Conforme

Traquina (2005) o jornalismo se expandiu transformando-se em um negócio lucrativo e

rentável conseguiu também sua independência econômica em relação aos subsídios políticos

que dominava a imprensa em seus primórdios. Assim, no final do século XIX o jornalismo se

tornou cada vez mais vital como veículo para a publicidade (2005, p. 36).

De acordo com Traquina (2005), muitos fatores sociais colaboraram para a expansão

do jornalismo, sobretudo a escolarização da sociedade e o processo de urbanização,

intensificando o crescimento de futuras metrópoles. Seria principalmente nas últimas décadas

do século XIX, surpreendida pela turbulência das transformações sociais, que a cultura letrada

e a imprensa começariam decididamente a avançar para além das elites tradicionais. Nessa

época, em ritmo acelerado, no compasso de um modo de vida que exportam capitais e invade

rapidamente inúmeros espaços do planeta, a história da formação das metrópoles brasileiras

multiplica o tempo e a experiência social.6 Para tal, ver; CARVALHO, José Murilo de. A formação das almas.

Page 32: A imprensa do século XIX

32

A expansão da imprensa ainda foi impulsionada pela liberdade através dos

conquistados direitos fundamentais e da democracia como nova forma de governo. Os jornais

passaram a ser reconhecidos como um meio de denunciar as mazelas e injustiças sociais. O

jornalismo passou a ser um aliado da democracia e a partir de então ficou considerado como o

Quarto Poder7(SODRÉ,1999).Sem deixar de vez a discussão do discurso político, o

jornalismo passou a incorporar outros gêneros como notas, reportagens, entrevistas e crônicas.

Surgiram então as editorias especializadas em temas e abordagens específicas como esportes,

lazer, vida social e cultural, crítica literária, notícias policiais, regionais, nacionais,

internacionais e etc.

Com a ascensão do jornalismo, os meios de comunicação passaram a obrigatoriamente

ter de descobrir e produzir notícias em escala cada vez maior para atender a demanda. Assim,

a empresa jornalística cresceu, ofertando mais oportunidades de emprego. A atividade de

repórter também ganhou maior destaque, responsabilidade e reputação.

Ainda em relação a imprensa no século XIX, Marta Emisia Jacinto BarbosaE Jorge

Luiz Ferreira Lima (2008), relatam sobre o aumento do número de tipografias, no interior do

Brasil nessa época. Eles conceituam esse tipo de jornalismo como “sertanejo” e exemplificam

isso citando os jornais de Fortaleza mostrando o grande crescimento de tipografia nessa

cidade desse período. Segundo eles, em Fortaleza o número de tipografias ligadas às

atividades jornalísticas crescia, ao passo que muitas não sobreviviam às dificuldades

financeiras, outras permaneciam imprimindo para distintos grupos chegando a imprimir para

mais de um jornal. Esse período significou um momento muito importante de definição com o

surgimento de jornais de cunho mais informativo começando a expor várias dificuldades de

vida da população (2008, p.5).

Os periódicos do século XIX possuíam como uma de suas principais características uma

posição política definida. Diversos jornais nasciam vinculados a uma linha política,

conservadora, liberal ou republicana. No final do século XIX, essa tendência se acentua no

cenário nacional, principalmente com o surgimento de novos partidos políticos e devido à

queda da monarquia e o surgimento da República. De acordo com Fabiano Cordeiro César

(2013), as experiências políticas eram noticiadas ao calor da hora, onde possibilitou ao

pesquisador analisar uma nova relação no cenário nacional com o político. Quando

ampliamos o entendimento dos movimentos políticos do final do século XIX, como a Revolta

7 “Quarto poder” é uma expressão criada para qualificar, de modo livre, o poder das mídias em alusão aos outros três poderes típicos do Estado democrático: Legislativo, Executivo e Judiciário. Esta expressão refere-se ao poder dos meios de comunicação quanto à sua capacidade de manejar a opinião pública, a ponto de ditar regras de comportamento, influenciar as escolhas dos indivíduos e da própria sociedade.

Page 33: A imprensa do século XIX

33

Armada, a Guerra do Contestado e a Revolta de Canudos, é possível verificar uma

sensibilidade política de seus agentes históricos (2013, p. 34).

Dessa forma, o Jornal “O correio do Norte” surge com características semelhantes a esses

jornais. Não era pretensão dos donos de utilizar o periódico como um produto, ou algo ligado

ao mercado. O jornal surge como um local de fala de grupos políticos e de famílias ligadas ao

poder, justificando os domínios desse grupo bem como exaltando várias figuras de pessoas

que se tornaram importantes no contexto da região nesta época.

Na primeira página de lançamento do Correio do Norte, em 24 de fevereiro de 1884, os

editores, Antônio Augusto Veloso e Antônio Pereira dos Anjos, assumem suas posições

partidárias. Ainda nessa primeira folha de inauguração do Correio do Norte um discurso

antecede a apresentação do programa do jornal, informando que o jornal iria “advogar a

prosperidade moral e material do extremo norte de Minas” (CORREIO DO NORTE, 1884,

p.1). Segundo o periódico, eles iriam defender os preceitos do partido conservador na região.

O programa do jornal voltou para ações que intencionam mudanças na região, ou seja, busca

aparentemente intervenções na região e população e propôs criar atividades que gerem

alterações em certos itens que compõem esse programa.

Desta forma, houve uma nova visão sobre a região a partir de outros olhares já que

com a criação de um jornal próprio as relações de consciência social mudaram também.

Começou a existir uma Imprensa própria “que fala desta gente para esta gente” e que de certa

forma, era uma nova representatividade do local, já que o jornal surgiu enquanto algo material

que desse legitimidade a essa região.

A seguir vemos a imagem da primeira edição do periódico. Nota-se o caráter

rudimentar, pois a imprensa ainda neste período, era segundo Sodré (1999) artesanal.

Page 34: A imprensa do século XIX

34

FIGURA 2: Primeira página do Jornal, no dia 24 de fevereiro de 1884.

Sendo assim, visualizo uma intenção dos redatores e jornalistas em manter a cidade e

região informada sobre acontecimentos nacionais e até internacionais do período. Percebo isto

através do próprio nome do Jornal, Correio do Norte, que objetivava essa interação na

comunicação. O periódico tornou assim palco para a visibilidade da região no âmbito

nacional. Acontece que essa legitimação, não foi feita a partir dos pensamentos dos próprios

sertanejos e moradores da região. O que se ver nas pagina do Correio do Norte é uma

produção de memória e costumes para esta gente, que não correspondia aos padrões de

civilização da época.

. Destacando a inovação na sociedade que o Jornal trouxe para este período, Fabiano

Cordeiro César(2013) citando Judy Bieber, diz que “existem fortes indícios para se acreditar

que a imprensa agiu como o motor da vida política no sertão”. Esse motor, ainda segundo

césar, funcionou dando mais velocidade as notícias. Não que o sistema de transportes tenha

mudado, a notícia continuava a chegar por meio dos animais de carga, não foi essa velocidade

que se alterou, mas sim, a velocidade de se conhecer o funcionamento do jogo político em

outros cenários, conhecer outros modos de vida, e conhecer a “civilização” alimentando o

motor das discussões políticas e sócias internamente. Dessa maneira o Correio do Norte

atendeu uma exigência pública, pois a partir de sua inauguração o Norte de Minas passou a ter

sua própria imprensa, o que caracterizava um novo local de disputas políticas e ideológicas.

Page 35: A imprensa do século XIX

35

Esse primeiro exemplar, é muito rico em todas essas questões que estão ligados a

modernização e civilização dessa região. A linguagem utilizada caminha nestas questões

expondo as necessidades que a região detém em se industrializar e estar aberta a novas formas

de agriculturas existentes. Sendo assim, o periódico propõe uma modernização por meio da

comunicação jornalística da época. Esta comunicação pretendia insinuar novas práticas e

intervenções para agir localmente. Cabe destacar que quando essa linguagem impressa buscou

criar intervenções e ações nas práticas sociais, ela se utilizou de um discurso que já detinha no

cenário nacional uma legitimidade, ou seja, a “civilização”.

Sobre esse discurso visualizo, com base nas ponderações de Raymond Willians

(1979), a linguagem enquanto atividade, desvendando os processos e as práticas sociais que

articulam sua constituição e instituição em um momento histórico determinado. Sendo assim a

linguagem jornalística foi vista por um meio vinculado à prática e ao confronto social de dois

pontos divergentes. Enquanto a Imprensa que produz sentidos e memória para o povo e as

realidades vividas da população da região nesse período.

Ainda analisando a folha de abertura do primeiro exemplar do jornal O Correio do Norte,

outra questão demonstra a intenção do periódico de estabelecer uma forma de comunicação em

atividade. Essa questão seria uma suposta necessidade que o jornal viria solucionar, a de divulgar

o discurso político, de socializar projetos tornando-os agradáveis ao julgamento do leitor. Essa

intenção pode ser visualizada em três momentos; o Correio seria um “poderoso motor de

civilização” para o norte de Minas, ele concorreria “para a educação do povo” e para os “deveres

sociais” (CORREIO DO NORTE, 1884, p.1). O jornal propunha cumprir essas funções na região,

o que possibilita compreender a existência de uma linguagem que aparentemente tinha como

objetivo criar intervenções no cenário Norte mineiro, e para isso foi produzido uma imagem

positiva do Norte de Minas em torno, principalmente, da indústria e de exaltação das terras como

sendo produtivas. Essas questões, juntamente com os processos civilizacionais e educativos eram

de muita força já que “civilização” e “educação” são palavras carregadas de significação no

século XIX.

Um dos meios mais eficazes de difundir a luz da instrução, por entre o povo, é a criação de bibliotecas publicas, e gabinetes de leitura, em que todas as clases possam encontrar, nas horas de lazer,-livros, jornaes, revistas, que ofereçam uma leitura útil, si é que este qualificativo e deva aplicar a alguma leitura.

Com efeito, nenhuma reflexão encerra um maior fundo de verdade que a do escritor português, no dizer que de toda pagina impressa colhe o leitor alguma utilidade. Nas grandes cidades, além de bibliotecas publicas, há os

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36

jornaes diários, vendidos por ínfimos preços, os livros usados à venda, os livros de aluguel.

No sul desta província, algumas povoações teem compreendido a influencia que exercem as bibliotecas e gabinetes de leituras, sobre o progresso; e simples arraiaes, pelos louváveis esforços de seus habitantes, são dotados de um tal melhoramento. (CORREIO DO NORTE, 1884, nº 10).

Outro ponto nas páginas do jornal que salienta a construção de uma linguagem que

pretendeu criar intervenções e práticas sociais está em torno das diversas notícias que

“impulsão a indústria” (CORREIO DO NORTE, 1884, p.1). Nos discursos do Correio do

Norte a palavra “indústria” não estava ligada, exclusivamente, ao setor da fábrica, mas

também ao setor da agricultura. Aqui, especialmente, é possível descobrir as intenções

discursivas dos redatores, aparentemente no intuito de transformar seus discursos em

atividades industriais. Identifiquei várias notícias incentivando a plantação de cacau, algodão,

anil e trigo, dentre outros cultivos, apontam para a vontade desses homens das letras de ter

uma plantação para a exportação no Norte de Minas.

Nenhum território, nesta província, oferece, talvez, ao emprego da atividade do homem laborioso, mais variados objetivos, que o deste município.

Mattos de cultura de uberdade prodiginosa que, mediante diminuito esforço, foranecemas mais copiosos colheitas; campos e pastagens provavelmente, pros rios para o desenvolvimento da indústria pastoril, em alta escala:- grandes florestas, ricas em toda sorte de madeira de construção, e de marcenaria; arvores e arbustos numerosos, que produzem substancias uteis a diversos misteres,- a par de outras tantas riquezas naturaes, no reino mineral- poderiam constituir um vasto manancial de rendas, se por ventura, fossem convententimente exploradas

De parte as produções agrícolas, de que não nos ocupamos neste rápido esboço de um mais detido escripto sobre o assumpto. (CORREIO DO NORTE, 1884, nº 8).

Foi muito utilizado pelo jornal esse tipo de “propaganda” da região como “território

vasto” para ser explorado e com grande propensão para agricultura e indústria. Vale ressaltar

essa cultura de modernidade que era exaltada e proposta pelo Correio do Norte sobre esta

região.

Outro ponto a ser destacado são os códigos de posturas veiculados nos Jornais analisados.

Esses códigos segundo Fabiano Cordeiro César (2013) foram leis formuladas pela câmara

municipal e publicadas no Correio do Norte como forma de comunicação com a população.

Mais uma vez percebo nesses códigos orientações de caráter civilizatório e de modernização

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37

desse espaço. Entre os muitos que foram utilizados vale ressaltar a publicação de 1884

número 11, onde diz que:

Faço saber a todos os habitantes deste município que em virtude da resolução, nº 2512, de 13 de novembro de 1878, da Assembléa Legislativa Provincial, foram adoptadas, como posturas da camara deste município, as disposições seguintes, concernentes a creação de porcos fora das povoações.

Art. 6º. O que fizer quaesquer plantações a distancia menor de 2kilometros (...) de qualquer morador, que este crie porcos ou não, é obrigado (...) a fazer tapumes proprios para vedar a entrada de porcos nas mesmas plantações, sob pena de não ter direito algum à indemnisar-se do valor das destruições das mesmas Art. 7º. E permittido entre os visinhos convencionarem-se, ou em crear seus porcos soltos, ou em tel-os presos, devendo, porém, qualquer estipulações, neste sentido, ser escriptas e assignadas com testemunhas, sob pena de não valerem. (CORREIO DO NORTE, 1884, nº 11).

As orientações destinadas nesse texto de lei fazem referência ao espaço rural Norte

Mineiros, contudo essas orientações dentro das folhas dos jornais destinavam-se também à

cidade de Montes Claros que estava se formando. Esse exemplo demonstra que as ações sobre

os espaços não estavam ligadas somente à cidade, mas abrangiam também aos espaços rurais.

A lei em questão estipulava uma forma de convívio entre vizinhos e a consequente relação

entre a criação de porcos perto de plantações, ou seja, a lei buscava um controle de

determinadas ações. Nesse corpo de leis publicado nos jornais, havia preocupação com os

diversos povoados Norte Mineiros, assim, as leis intencionavam instituir uma forma de

controle das experiências rurais e urbanas no Norte de Minas.

A intenção de criar práticas sobre os espaços seja através das normas estabelecidas pelos

Códigos de Posturas, seja pelas próprias indicações que o Correio do Norte realizou, tornou as

linguagens nesses jornais agentes que produziram ações e intervenções nas práticas cotidianas

dos nortes mineiros. Portanto, visualizo assim a propostas de criações de memória e modos de

vidas que foram feitas por meio dessa linguagem própria do Jornal. É durante esse período

que compreendo uma linguagem que não se constitui apenas por questões simbólicas e de

processos civilizatórios. Essas questões estão ligadas também há uma força opressiva; que no

caso seria a elite intelectual da região, sendo representado pelo redator e chefe, Antônio

Veloso; que pretendeu propor para essa cidade e esse povo novos costumes e relações que não

estavam ligadas principalmente ao ideal civilizatório da região. Sendo assim, essas ideias,

estava vinculada a uma forte presença do critério econômico, já que um dos objetivos que

aparentemente o jornal trouxe foi uma aproximação de indústrias e melhoramento da

agricultura da região.

Page 38: A imprensa do século XIX

38

Portanto, concordo com Rejane Amaral Rodrigues, na questão da imprensa como

produtora de memória, que aparentemente contribuía para uma mudança desses modos de

vida que eram considerados pelos jornalistas da região do Norte de Minas, como

comportamentos atrasados e não correspondente como um local moderno e civilizado para a

época.

Mas, para além da questão regional, percebo que essa força de um processo civilizador e

moderno respeitava certa ideologia vigente no mundo desse período. No Brasil, em fins do

século XIX e meados do XX, uma variedade de transformações atingiu vários níveis das

relações sociais. Segundo Sevcenko (1998)foram mudanças impactantes estimuladoras,

principalmente, por um novo dinamismo no contexto da economia internacional, “as quais

alteraram a ordem e as hierarquias sociais, as noções de espaço e tempo dos indivíduos e os

modos de percepção do cotidiano”(1998, p.58).

As pessoas foram envolvidas num intenso processo de transformações de hábitos

cotidianos, de convicções e percepções, analisando no conjunto integrado, as raízes se

encontra na Revolução Industrial. Ondas de expansão econômica ao final do século XVIII

desencadearam, em alguns países, transformações amplas, complexas e profundas,

reconhecidas por alguns teóricos como revolução científico-tecnológica. Entre outras práticas,

aproximou as descobertas científicas ao cotidiano das populações e estimulou o

desenvolvimento de potenciais energéticos, originando campos de exploração industrial.

Novas áreas do conhecimento surgiram, tais como: a microbiologia, a bacteriologia e a

bioquímica, que tiveram efeitos substantivos na produção e conservação de alimentos, na

farmacologia, na medicina, na higiene e profilaxia e representaram impacto decisivo para o

prolongamento da vida humana. (SEVCENKO, 1998. p. 7)

Durante todo século XIX, um ideal de progresso circulou nas sociedades ocidentais.

As novas descobertas científicas passaram a marcar uma mudança cultural que acabou por

desenvolver certa intolerância ao antigo e ao antiquado. Assim, conforme Dupas (2006) o

termo “moderno” adquiriu conotação elogiosa, numa transformação gradual do “menos bom”

para o melhor.

Nos planos culturais e econômicos, as transformações foram significativas: rupturas

com alguns costumes coloniais, adoção de discursos científicos, abolição da escravatura,

queda da monarquia, início de uma economia urbana e industrial, Dupas (2006) além da

organização de um sistema educacional de âmbito nacional e incorporação de tecnologias

(vacinas, soros, entre outras), com impacto nas ações de saúde desenvolvidas em território

brasileiro.

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39

Hobsbawm (1995) afirmou que a maior parte do século XX foi derivada de tentativas

anteriores de sociedades em imitar um modelo ocidental, visto como “sociedades que geram

progresso, poder e cultura da riqueza, com o ‘desenvolvimento’ técnico-científico. Não havia

outro modelo operacional além da ‘ocidentalização’ ou ‘modernização’, ou o que se queira

chamá-lo ”

Na busca do progresso, os políticos e os intelectuais brasileiros estabeleceram alianças

estratégicas que produziram explicações sobre o “atraso” brasileiro, bem como apresentaram

ideias sobre as possibilidades de civilizar o território. As fórmulas propostas, importadas na

sua grande maioria da Europa, seriam capazes de mudar o descompasso em que julgava se

encontrar a nação brasileira. Modernizar costumes e introduzir tecnologias foi, para esse

grupo, um caminho capaz de romper com o passado colonial e trilhar trajetórias benfazejas

para esse “gigante territorial”. (LAROCA, 2010).

Dessa forma, a possibilidade desses intelectuais e políticos de impor essa nova cultura

foi por meio de inúmeros outros fatores como a educação e consequentemente a imprensa.

Então por meio do O correio do Norte, essas questões foram repensadas e produzidas para

essa região. O jornal se materializa enquanto porta voz de uma ideologia e modo de vida que

começa a ser concretizar no país e no mundo desse período. Ainda nesse sentido, percebo que

o jornal institui novos meio de viver e de códigos de postura para esse povo, como uma forma

de prepará-los para essa mudança, bem como certo modo de vida que surgiu enquanto a

produção de meios industriais, ou seja o capitalismo. Identifico assim que esse projeto de

civilização e modernização que aconteceu no Brasil desse período era uma anunciação do

capitalismo para o povo, conquistando assim mais população consumidora dos produtos que

iriam surgir.

O Jornal O correio do Norte, utilizou de questões relativas à interiorização do povo, de

suas práticas e de seus costumes. Ao mesmo tempo ele cria em suas linguagens uma imagem

positiva das terras desta região. Assim ele demostra para esses novos investidores que

surgiriam, uma qualificação dessa região. É sobre esta questão que irei tratar no próximo

capitulo.

Page 40: A imprensa do século XIX

40

Capitulo 3

Instituição de espaços e saberes- As qualificações sobre as terras e a Agricultura

Nenhum território, nesta província, offerece, talvez, ao emprego da actividade do homem laborioso, mais variados objectos, que o desde município. Mattos de cultura de uberdadeprodigiosa que, mediante diminuto esforço, fornecem as mais copiosas colheitas; campos e pastagens, provadamente, próprios para o desenvolvimento da industria pastoril, em alta escala:- grandes florestas, ricas em toda sorte de madeira de construcção, e de marcenaria (...).(CORREIO DO NORTE, 1884, nº 8).

Ao longo de toda analise do O Correio do Norte, percebo uma qualificação intensa das

terras e espaços sobre a região. Isso é muito evidente quando foram retratadas pelo Jornal, as

questões vinculadas à agricultura, ou seja, sempre quando aparecem noticiários relacionados a

terras há uma valorização intensa pelo periódico. Outro fato, que vai de contramão a isso, é

quando aparecem informações sobre o povo e como são utilizados os recursos da terra a partir

das práticas comuns, que a desvalorizou subalternizando e representou a população com

pouco ou sem civilidade. A partir disso o presente capítulo objetiva relatar e analisar os

materiais jornalísticos desta época que tentem a inferiorizar as práticas e costumes do Norte

Mineiros, sobretudo no que diz respeito ao uso da terra, bem como as qualificações e as novas

formas de modernização da Agricultura.

Percebo também, que o jornal imbuído de questões relativas à educação e ciência

justificou as caracterizações feitas sobre o povo e as práticas que não seriam ditas “modernas”

ou “civilizadas”. Com relação a isso há uma aparente contradição nos discursos do jornal,

pois como foi retratado na citação inicial do capítulo ele qualifica a região, mostrando todas

as condições e características para uma boa agricultura e pecuária. Acontece que no ato desta

qualificação, ele apenas utiliza esse discurso voltado para as condições naturais, mas quando é

retratado o povo essas características são inferiorizadas.

Ainda neste sentido, existe nos discursos do Jornal uma qualificação quando é

retratada a cidade, mostrando as diversas práticas que valorizaram o povo enquanto um local

moderno e de civilidade. Essa questão estar problematizada na obra de Rejane Rodrigues

(2013), onde ela retrata esse binômio cidade versus campo, que ocasionava em uma produção

de memória e inferiorizarão das práticas do povo. Para Fabiano Cordeiro César (2013), essas

questões estavam ligadas a uma produção de espaço-território, que segundo ele o jornal

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produziu “certas linguagens que objetivaram uma qualificação do espaço já existente,

transformando ou produzindo novos territórios” (2013, p. 43). Assim o conceito espaço-

território é uma estratégia utilizada por ele para conceituar esses discursos depreciativos dos

Jornais Norte Mineiros.

Sobre esta perspectiva, concordo com Rodrigues a respeito dessas questões, onde o

Correio do Norte utilizava de seus discursos para uma produção e construção de novas

memórias sobre este povo. Justifico isto, a partir dos códigos de postura e noticiários

educativos em que o Jornal produziu.

As estratégias de linguagens publicadas nos jornais que procuravam identificar o que seria

espaço e território, por meio das produções de comportamento ou através das indicações de

agriculturas úteis, representaram intenções da linguagem jornalística sobre a região, o que

permitiu pensar como essas estratégias buscou constituir práticas sobre o Norte de Minas.

Portanto, as indicações de agriculturas publicadas nos jornais, como os manuais ao agricultor,

que foram colunas dedicadas a agricultura nas edições do jornal, foi um dos caminhos que utilizei

para analisar o que os jornais estavam instituindo e constituindo como práticas sociais aceitáveis.

Então exemplifico essas questões por meio de;

Toda agricultura se faz, pelos processos primitivos, e não consta que os lavradores tenham, siquer, tentando introduzir melhoramento algum no amanho de suas terras, ou na preparação dos fructos da lavoura. Trabalha-se hoje como trabalha-se há um século passado. (CORREIO DO NORTE, 1884, Nº 5).

Visualizo esta prática do Jornal, como uma linguagem em atividade, que produz ações

e intervenções no social, compreendendo que a nomeação de saberes e práticas em torno do

uso da terra e de determinados conhecimentos do povo buscando uma mudança no território.

O Correio do Norte assim chamava a atenção pública para as questões em torno dos usos da

terra e das práticas agrícolas, que entendo que o periódico tinha pretensão em gerar mudanças.

Para exemplificar essa questão, Ana Clara Farias Brito e Ygor Barros Leal (2010)

fornece um dado fundamental acerca da imprensa nordestina do início do século XX.

Segundo eles, a imprensa trata-se das ideias de submissão de um espaço, as transformações

que o modifique e possam caracterizá-lo enquanto urbano. A análise feita por eles dos

periódicos do Jornal “o Pharol”, em Petrolina no estado da Bahia, entre os anos de 1915 a

1920, buscou evidenciar o conjunto de apontamentos e direcionamentos que fizesse da cidade

uma sociedade urbana (2010, p. 2).

Logo a compreensão é possível por meio da “ideia de andamento, que se concretizam

ao longo do tempo, na apreensão e imposição de práticas que se tornam predominantes”. A

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42

tentativa deles foi de compreender a “gestação do urbano”, o que passa a integrar, agrupar a

vida na cidade. Nos seus apontamentos compreendo uma possibilidade para a materialização

ou o concreto, o que pode vir a ser, atribuição de sentidos, instituições e práticas no meio

urbano. A cidade de Petrolina encontra no Jornal “O Pharol” um grande defensor das práticas

de modernização dos espaços e da civilidade dos hábitos e costumes da população sertaneja.

(BRITO e LEAL, 2010.p 6). Desta forma consigo ver analogias com os jornais analisados por

eles e a imprensa do Norte de Minas que se fez presente no o Correio do Norte.

Para além da escrita e linguagem do periódico, outro fator relevante para pensar essas

questões relativas a construções vistas até aqui, são a organização em que o jornal se

encontrava a metodologia das notícias e colunas que também foram capazes de articular essas

questões. Sendo assim, analisei a organização da folha do jornal, as disposições em que as

matérias e notícias são encontradas no corpo do caderno. Desta forma, o acervo jornalístico

revelou-se como uma oportunidade de problemática, desde o conteúdo das manchetes até a

disposição das páginas. Portanto quando estou indagando o Jornal, isso vai além da simples

leitura de suas páginas, ou outra informações que o compõem.

Os jornais eram compostos de quatro páginas e as notícias publicadas neles eram

colocadas em quatro grandes colunas. A única folha dos jornais que às vezes fugia desse

padrão era a última, pois era composta por uma seção de anunciantes. Os anúncios eram quase

sempre de casas comercias, denominadas de negócios de fazenda, e também divulgavam

serviços de médicos e advogados. O próprio Augusto Veloso utilizava desse espaço para

oferecer seus serviços. Nas páginas de anúncios ainda constavam, a venda de fazendas; de

editais da câmara municipal, incluindo o Código de Posturas; a venda de uma livraria na

cidade de Grão Mogol; lojas em Diamantina, que divulgavam objeto de primeira necessidade,

entre outras coisas. Serviços de pedreiro, alfaiate, ourives, cabeleireiro, açougue, pintor,

funileiro, lampadeiro, entre outros, também eram oferecidos nessa seção.

Além de demonstrar vestígios da atividade comercial no período em questão, essa

seção de anúncios mostra uma parcela da sociedade que estava usando os serviços do

periódico. Marcelo Magalhães Godoy, ao analisar anúncios em jornais mineiros do século

XIX, vê outra possibilidade nos anúncios de jornais. Segundo ele, esses anúncios atuam “na

conformação da identidade do urbano dos Oitocentos, as atividades comerciais ocupavam

posição de destaque uma vez que o caráter e a extensão da presença de estabelecimentos

comerciais nas seções de anúncios dos jornais refletiam a importância do setor”. Isso

possibilita a identificação de um meio cada vez maior para a modernização, ao

estabelecimento de uma formação econômica e social capitalista (GODOY, 2008, p. 90).

Page 43: A imprensa do século XIX

43

Concordo com o historiador quando ele afirma que os anúncios são uma possibilidade

de um processo de modernização das cidades, ou mesmo na instituição dessas, no entanto,

para perceber isso foi preciso um movimento minucioso de leitura dos jornais, desde o

editorial aos anúncios. Quando analiso os anúncios publicados no Correio do Norte, por

exemplo, percebo que eles se preocupam em atender à sociedade rural do Norte de Minas,

paralelamente a isso também atendiam ao pequeno espaço urbano que estava surgindo, mas

tinham como direcionamento o rural. Os produtos das casas comerciais eram selas, arreios,

rações, o que tudo indica que essas casas atendiam a um público mais rural que urbano. Os

anúncios que possibilitam visualizar a instituição do urbano estão dispersos no periódico. Os

anúncios de alfaiates, e de cabeleireiros, por exemplo, indicou aos leitores o que seriam

práticas civilizadas, ou urbanas. No caso do O correio do Norte e do tempo a que ele remete,

não está somente nos anúncios os discursos voltados para a constituição e instituição do

urbano, mas sim nos discursos que intencionavam criar atividades mais civilizadas.

Dentro as inúmeras divisões de colunas e seções que fazia parte do Jornal havia a

“Seção Livre”, onde existiam cartas, correspondências, notícias de falecimento,

agradecimentos, notícias de chegadas e partidas de pessoas no norte de Minas. Outra seção

importante do periódico era a “Seção Literária” formada por poesias nacionais, locais, e por

textos de estrangeiros, e foi nela também que Augusto Veloso publicou sua monografia. A

seção “Noticiário” era constituída geralmente por assuntos políticos. Dessa forma, essa

rigidez nem sempre foi obedecida, muitas vezes as seções misturavam notícias, assim o que

era comumente parte da seção noticiário acabava aparecendo também na seção literária.

Ainda sobre esta seção, percebo uma importante relação com a propagação de cultura

e educação para o povo, já que esta parte do jornal preenchia uma necessidade de

entretenimento para os leitores da época. Ao longo de todos os periódicos analisados, existe

uma riqueza de contos e histórias de outras localidades, principalmente de outros países, como

na Europa e Estados Unidos. Há ainda, a presença de informações e curiosidades que estão

presentes, não de uma forma ordenada, mas durante todo o Caderno. Estas curiosidades são

relacionadas a variados assuntos, que vão de informações de cartografia, sobre posições de

outros países e curiosidades cientificas. Então, é importante lembrar, que eram aparentemente

muito simples, e essa simplicidade identifica o caráter educador em que esse jornal foi.

A primeira página do jornal, além dessas mesmas estruturas, possuía quatro colunas

verticais onde as notícias eram publicadas com o título do jornal. Apresentava também o

editorial e esse tinha uma relação com as demais seções do jornal. Então, posso dizer segundo

Fabiano Cordeiro César (2013) “que esse projeto editorial se resume em determinadas

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44

posições, no entanto, é preciso compreender que tal projeto era dinâmico e se reformulava

diante de uma sociedade em movimento”. Por exemplo, na primeira edição do Correio do

Norte em fevereiro de 1884, visualizo o projeto editorial através do programa definido pelo

periódico. Assim, a primeira página do jornal tratava da localidade onde ele esteve inserido e,

consequentemente, o local de articulação com as outras seções do jornal. E é justamente nessa

primeira página que as indicações de agricultura começaram a aparecer.

Além de ser um dos pontos do programa do jornal, o Correio do Norte se propunha a

fazer uma “Descrição dos processos agrícolas, tendentes a melhorar a lavoura, e aplicáveis as

culturas usadas, ou que possam ser introduzidas, com sucesso e vantagem” (CORREIO DO

NORTE, 1884, nº 1). Percebo que essas indicações de agriculturas ocupavam uma posição

importante dentro do jornal.

Percebo assim como essas notícias de indicações de agricultura ideal significou no

Norte de Minas do final do século XIX. Busco relacioná-las com o contexto histórico em que

estão inseridas, para entender as qualificações sobre os espaços que elas estavam

modificando. Isto é, questionar como essas linguagens produziram novos sentidos e

consequentemente memórias. Lembro “que procuro enfatizar sobre a linguagem como uma

atividade prática, constitutiva” (WILLIAMS, 1979, p.35), afinal de contas, essas indicações

de agriculturas úteis pretendiam alterar a relação do homem Norte Mineiro com a natureza,

buscando ao mesmo tempo em que altera criar uma nova atividade.

A linguagem buscou construir ações no espaço, seja pela realização efetiva das

agriculturas úteis ou pela negação dos atos que impossibilitaram a realização dessas intenções.

Entender como a linguagem se organizou diante dessas questões é fundamental para

desvendar os sentidos das qualificações do espaço e território.

Uma das questões para explicar essas qualificações e nomeações é a monografia

publicada por Antônio Augusto Veloso. Segundo Fabiano Cordeiro César (2013), em

primeiro momento, foi publicado nas folhas do próprio Correio do Norte, dentro da “seção”

literária, e, posteriormente, na revista do Arquivo Público Mineiro (APM), mais precisamente

no fascículo III de 1897.De forma geral, o trabalho realizado por Antônio Augusto Veloso,

nesta monografia, tem como objetivo mostrar as condições do município de Montes Claros.

Ao fazer isso, Veloso possibilita uma imagem discursiva do Norte de Minas, pois nesse texto

também há uma ideia de abrangência sobre a região em torno de vários pontos sociais, tais

como a indústria, comércio, via de comunicação, orçamento municipal, instrução pública,

administração de obras públicas e administração.

Page 45: A imprensa do século XIX

45

Dentro de várias questões, o que segundo Fabiano Cordeiro César (2013) foi marcante

no texto de Augusto Veloso é a “confluência entre as imagens que o autor demonstrava

através das leituras que formaram seu campo cultural enquanto leitor do mundo, com suas

experiências sociais” (2013,p.78). Essas leituras eram predominantemente de autores

estrangeiros, juntamente com as suas experiências de sujeito Norte Mineiro. As vivências e

experiências do redator se misturavam com as suas leituras, construindo, assim, discursos que

indicam aspectos contraditórios. Isso revela não um pensamento confuso do autor, mas

representam pensamentos construídos, na sua interpretação. Desta Forma, outro ponto seria os

textos que faziam parte desse campo cultural do Augusto Veloso, e o primeiro lugar nada

mais é do que o próprio norte de Minas, os lugares de experiências, que, assim como a leitura,

formaram o campo em que o redator do Correio estava imerso.

Sendo assim, identifico uma grande aproximação de Augusto Veloso, com os

conhecimentos que não tinha relação alguma com as vivências da população da região. No

momento desta construção houve uma qualificação para esse povo e este lugar que não

condizia de fato com as vivências das pessoas. É importe ressaltar que isso acontece a partir

do contato que o então redator do jornal teve com conhecimentos relativos ao bacharelado.

Isso ocorre por meio do contato que com a universidade, já que ele era um advogado formado.

Ainda sobre esta perspectiva noto que o seu vínculo as grandes famílias que estavam no poder

esta época proporcionou estas qualificações pelo seu Jornal.

Segundo Victor Fonseca Figueiredo (2010), o Antônio Augusto pertencia ao grupo

conservador da região, que se estruturou durante o período Imperial Brasileiro. Ele estava

vinculado ao conjunto de famílias que detinha grande poder econômico e político. Sendo,

assim é fácil compreender o Jornal como porta voz de questões vinculadas ao domínio e

formação do povo, bem como perpetuar a imagem de heróis. Mas para, além disso, o Correio

do Norte também tem uma importante relevância na questão de formação intelectual e

principalmente da educação. Portanto, o caráter político desse periódico estar ligado ao

conjunto de práticas civilizacionais e de educação nesse período.

O contexto geral de educação e ciência desta época estava nas proposições do

Naturalismo, que foi preponderante para o pensamento cientifico e cultural do período. Sendo

assim, o Jornal passa a ser porta voz das questões relativas a este princípio. Transformando e

modificando o espaço no qual ele estava vinculado. Esta era a principal proposição do

Naturalismo8 que em contraste com o positivismo europeu propôs uma cientificidade para a 8Naturalismo mostra o homem como produto de forças “naturais”, desenvolve temas voltados para a análise do comportamento patológico do homem, de suas taras sexuais, de seu lado animalesco.Os naturalistas acreditavam que o indivíduo é mero produto da hereditariedade e seu comportamento é fruto do

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população deste período. Isso aconteceu de forma mais efetiva no início do século XX, com a

república, mas essas ideias já estavam efetivadas no contexto do conhecimento e de

intelectuais no Brasil nesta época.

Desta forma, penso que o Antônio Augusto Veloso, estava inserido como um desses

intelectuais que já conheciam as práticas cientifica do naturalismo do século XIX. E como

obtivera contato com isso devido a sua formação universitária que possibilitou um

conhecimento dessas estas questões. Visualizo isto a partir das leituras que ele citava na seu

Texto, Monografia de Montes Claros. Fabiano Cordeiro César (2013) enumera todas essas

obras que aparece nos textos de Veloso, dentre elas estão Descendência do Homem, de

Darwin; História Natural de Plínio, História Natural de Anstett, aparecem também textos de

viajantes e expedicionários naturalistas que escreveram sobre o Brasil, dentre eles estão Flora

Braziliense e Raça Americana de Martius, Viagem ao Brazil de Agassiz e Viagens ao Brazil

de Saint- Hilaire.Com relação à agricultura, foram listadas outras obras como Tratado da

Agricultura de Varrão, Plantas Uteis de Artur Magin, Publicações destinadas aos lavradores

do Norte de Minas(Não é informado o Título) de Dr. Miguel Argollo. Todas essas leituras

citadas em seu texto mostram que a agricultura estava no centro das preocupações sociais do

redator do Correio do Norte. Ao preocupar ler sobre estes assuntos foi produzindo, a partir do

seu olhar sobre a região, o que seriam as formas de melhorar a agricultura da região. Logo, as

apropriações estabelecidas nas suas leituras, dos diversos naturalistas que passaram pelo

Norte de Minas e também pelo Brasil, identificando flora, fauna e o que seria mais indicado

para cada terreno em questão de plantações, foi o que mais interessou ao redator.

Conforme Fabiano Cordeiro César (2013) a apropriação dos trabalhos dos naturalistas

ocorreu principalmente no que tange à compreensão sobre técnicas de determinados plantios,

visando assim, um melhoramento dos manejos em torno da agricultura dos nortes mineiros.

Com esse objetivo, o redator construiu uma imagem do sertanejo que fazia parte de um

determinado estereótipo da época, a do sertanejo preguiçoso, pouco preocupado com a

inovação e ignorante. Mesmo que essa imagem não foi um discurso preponderante no jornal,

é preciso destacar que ela esteve presente, seja como uma influência das leituras de Augusto

Veloso ou como uma forma de buscar legitimidade para as ações que o discurso jornalístico

buscava realizar.

meio em que vive e sobre o qual age. A perspectiva evolucionista de Charles Darwin inspirava os naturalistas, esses acreditavam ser a seleção natural que impulsionava a transformação das espécies.Assim, predomina nesse tipo de romance o instinto, o fisiológico e o natural, retratando a agressividade, a violência, o erotismo como elementos que compõem a personalidade humana.

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A listagem dos autores que aparecem no texto de Augusto Veloso indica a relação dos

seus discursos com a exterioridade, uma vez que essa relação aponta uma significação no

texto dele. Acredito que os naturalistas são textos de referência na construção do pensamento

de Veloso, principalmente no que tange a certas perspectivas sobre imagens do norte de

Minas e do Norte Mineiro.

Exemplificando uma de suas referências, o naturalista Saint Helaire, demostra nos

seus escritos uma breve caracterização sobre o povo desta região, bem como um fascínio com

a natureza e cultura deste lugar. Percebo isto no seu texto, que trata a população da região de

uma forma subalterna e pejorativa, sendo assim ele diz;

A população atual do sertão é quase toda ela composta de homens de cor. Não havia, por ocasião de minha viagem, senão dois homens brancos na povoação de Contendas, e não vi mais que um único durante os quatro dias que passei na de Coração de Jesus. A indolência dos habitantes do sertão é talvez, maior ainda que a dos outros mineiros. Sua fisionomia revela-lhes já a índole, e se encontra a expressão desse defeito em todos os movimentos do seu corpo. Aliás o calor do clima convida bastante os homens dessa gleba a entregarem-se à ociosidade. (...) e a má alimentação que ingerem, contribui ainda mais para tirar-lhes a energia.

A indigência é a companheira ordinária da preguiça. Por isso, apesar das vantagens que apresenta sua terra, os habitantes do deserto são de uma pobreza extrema (SAINT-HILAIRE, 2000, p. 308 e 309).

Esses discursos em torno da população eram comuns na escrita dos naturalistas, sendo

a perspectiva etnocêntrica elabora uma forma de falar da alteridade que a subalterniza. Tudo

que não indicasse um padrão aceitável para esses viajantes era tomado como inferior. Ao

ilustrar o que entendiam não ser um “trabalho”, dentro de uma perspectiva europeia, isto é,

trabalho assalariado, padronizado e racional, eles concomitantemente compreendiam ter ali

“indolência”, “ociosidade” e “preguiça”. Isto é uma perspectiva forte nos textos dos

naturalistas quando as suas descrições analisam a forma o que eles viram e não como uma

tradução local.

Nessa citação de Saint-Hilaire, é perceptível a forma como ele elabora um saber sobre

a população, subalternizando-a. No entanto, quando se referem ao norte de Minas, ele afirma

que essas terras apresentam vantagens. Assim, temos duas imagens, uma que subalterniza os

habitantes do norte de Minas e outra que valoriza o local. Essa sobreposição de discursos faz

parte, também, do texto do Augusto Veloso.

Essas imagens sobre os Norte Mineiros na monografia do Augusto Veloso são postas

no sentido de que eles estariam atrasados em relação a outros lugares ou outras

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temporalidades. Entendo que esse local seja o litoral Brasileiro neste período, já que era no

Rio de Janeiro, capital do País neste período, representava a capital cultural e econômica e era

onde estavam os maiores intelectuais e pensadores neste período. As imagens sobre o Norte

Mineiros faziam parte de uma imagem que produziam sentidos, e estes foram usados pelos

redatores. No entanto, eles buscaram criar outros sentidos em torno dessa forma discursiva.

Antônio Augusto Veloso afirma que:

Entretanto, parece que não se podem applicar, em regra, a população do município, nem os demais desta zona,tão pouco, os vantajosos predicados que Quatrefages e depois Darwim, na Descendencia do Homem, attribuem ás raças cruzadas no Brazil; visto como bem longe de possuírem a energia, a coragem, o espírito emprehendedor e tenaz dos antigos bandeirantes (...) os sertanejos das classes mais numerosas são quasi todos indolentes, calmos e pouco amigos de innovações (VELOSO, 1897, p.569).

As imagens que pode verificar nesses discursos são de um sertanejo, como disse o

próprio autor, “indolente, calmo”, e o que parece seria “pouco amigo da inovação”, uma vez

que ele colocaria o Norte de Minas abandonado, caminhando “lentamente na marcha

evolutiva do tempo”. Esses discursos trouxeram ingredientes para as qualificações do espaço

e do território, pois eles deram legitimidade às ações que a linguagem da imprensa buscava

realizar, da mesma forma que a outra imagem sobreposta de um local que apresenta

vantagens.

Entretanto, tudo jaz ignorado, abandonado. Não se desperta o espírito de iniciativa individual, tao fecundo em benéficos resultados sobre tudo que se refere ao adiantamento geral de uma população. Lentamente, -na marcha evolutiva dos tempos- vão caminhando as localidades do norte de Minas, quando não estacionam, por longo espaço, ou não decaem, em conseqüência de causas diversas.

Nem uma tentativa, sequer, tem-se, até agora, feito no intuito de aproveitarem-se tantas e tão variadas fontes de lucros. As vantagens quedahi resultam são, entanto, por demais evidentes. (CORREIO DO NORTE. 13 de Abril. nº 08).

Nesta outra citação, agora do Jornal, vemos uma desvalorização dos habitantes do

Norte de Minas, apontando e qualificando esse povo como uma população pouco interessada

nas mudanças e no Novo. Isso é somado à exaltação das terras que provavelmente segundo o

Jornal, seriam “fontes de lucros” se fossem bem aproveitadas. Noto isso também em outro

ponto do texto de Augusto Veloso, onde ele aponta:

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A agricultura e a industria pastoril, que são, como se sabe, as principais fontes de riqueza de toda a zona sertaneja, estão já bastante desenvolvido no município de Montes Claros, onde se cultivam os diferentes gêneros de cereais communs no paiz (VELOSO, 1897, p.570).

É possível identificar uma contradição no texto de Veloso, sendo que antes ele

desvaloriza a população, transformando em atrasada e pouco preocupada com a inovação.

Aqui verifico uma exaltação dessas terras e do local, sendo caracterizado como um ambiente

cheio de grandes riquezas. Então, como Veloso pode afirmar que o Norte Mineiro é pouco

amigável a inovações, se ele mesmo demonstra que o município de Montes Claros é

desenvolvido na agricultura e a indústria pastoril? O que isso quer dizer? Entendo que essa era

uma estratégia de produzir uma imagem queabrangia sobre o “Norte de Minas” a partir de

Montes Claros mostrando o interesse de projetos sobre a região.

Dentro desta perspectiva, Rejane Meireles Rodrigues aponta algo semelhante acerca

da imprensa da região na década de 1910, embora ela tenha analisado os jornais “Gazeta do

Norte” e “Montes Claros”. Sobre isto ele diz que:

(...)o jornal não apresenta uniformidade em suas matérias e que possui uma linguagem abrangente e complexa, pois ele, em suas publicações, filtra a realidade e essa por si só já é complexa, minha intenção foi perceber como a imprensa montes-clarense construiu, nas páginas dos jornais, uma memória de cidade e tentou apagar a memória de sertão que estava presente nas práticas e vivencias dos habitantes desta região (RODRIGUES, 2013, p. 9)

Portanto, acerca desta questão é fácil perceber a verdadeira intenção, de modificar e

construir novas memórias diante as realidades vividas pelo povo desta época. Para confirmar

isto, compreendo que há um conflito ideológico nas páginas do jornal do Correio do Norte,

pois as qualificações da região quando é citada a cidade, ou as terras, mas quando é relatado

sobre o povo ou especificamente o campo o Periódico constrói uma caracterização

menosprezando essas questões. Para justificar isto, mais uma vez Rodrigues (2013) fornece

uma questão pertinente desta imprensa, sendo que para ela os jornais falavam de agricultura e

mencionavam o projeto de “modernização”, referiam-se às práticas utilizadas e que eram

abrangidas como atrasadas, confirmando assim que, pelo menos para os jornalistas, o norte de

Minas era um lugar atrasado que necessitava de salvação.

Ainda sobre estas questões, identifico tanto no jornal como na Monografia de Montes

Claros um processo comunicativo que propiciar essa construção de interiorização dos modos

de vida e de agricultura do povo. Ao identificar as formas dessa agricultura e as práticas que a

população usava, Veloso diz que “a agricultura no município, adstrita a rotina, se faz pelos

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processos primitivos” e que “felizmente a maravilhosa fertilidade do solo dispensa o emprego

de meios que promovam o aumento das colheitas”. Em relação “a applicação do fogo ás terras

de cultura, methodo a que os lavradores francezes denominam écobuage, é um meio

fecundante de grande vantagem já conhecido dos antigos” (VELOSO, 1897, p.572).

Então é fomentado tanto pelo seu texto como pelo próprio jornal novas práticas que

aumentassem uso da terra e que propiciava uma melhor utilização desses recursos. Dessa

forma o autor diz sobre a agricultura:

Essa reprodução constante dos Mattos é da maior importância para futuro da lavoura, porque só após muitos annos de effectivo trato das terras poder-se-há fazer uso do arado, que demanda um chão desembaraçado de tocos e de raízes profundas, como as das grandes arvores derribadas, mormente em terrenos accidentados e de forte declive (VELOSO, 1897, p.572).

Essa indicação de mudança aparece não somente pela definição do que plantar. Os

discursos afirmaram a necessidade de introdução do arado na lavoura, a partir da técnica de

aplicação de fogo que era constantemente usada. A busca pela modernização da agricultura

era um objetivo do discurso que construía uma imagem positiva das terras e negativas das

práticas dos sertanejos.

Cabe ressaltar que o processo discursivo buscava criar atividades, que tinha como foco

vários patamares, como os meios de comunicação, os costumes, a rentabilidade da agricultura,

ou no caso do Código de Posturas do Jornal. A maneira usada para tentar implantar essas

atividades era por meio da linguagem, que identificava questões em conflito como

comportamento grosseiro ou refinado, agricultura rentável ou primitiva.

Na citação inicial do capitulo, estar presente uma descrição das terras da região, onde

foi descrito que eram de “Mattos de cultura de uberdade”. Ao afirmar que as terras do

município de Montes Claros possuíam uma qualidade úbere, abundância e fartura, O correio

do Norte transmitia uma imagem positiva em relação a essas terras. A construção dessa

imagem foi ampliada para o norte de Minas, ao longo das edições. Essa atitude aparentemente

fazia parte do projeto para a melhoria da agricultura Norte Mineira, que os redatores

defendiam.

Outra questão presente nessa notícia reforça essa imagem positiva. Segundo o jornal,

mediante diminuto esforço, essas terras forneceriam grandes colheitas. Todavia, o jornal

afirma que essas terras poderiam constituir “um vasto manancial de rendas” se fossem

“convenientemente exploradas”, criando dessa maneira o sentido para o leitor de que os

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trabalhos praticados na agricultura da região seriam o impedimento para essas rendas

(CORREIO DO NORTE, 1885, n° 57).

Nesse processo discursivo existe um movimento de exaltação das terras, pois elas são

qualificadas de “Mattos de cultura de uberdade”. Dessa maneira, há uma linguagem positiva

no que se refere às terras, que é ampliada no intento de demonstrar que as terras Norte

Mineiras não se articulam, exclusivamente, com a memória de sertão que o século XIX vinha

produzindo. Porém essa nova qualificação se fazia através da crítica às práticas agrícolas dos

Norte Mineiros. Essa qualificação positiva dá legitimidade à crítica do Correio do Norte, visto

que as linguagens produzidas pelo periódico buscaram criar uma atividade que alterasse as

práticas da agricultura, e assim, as indicações úteis para essa função.

Desta forma a memória das pessoas passou a ganhar uma característica ruim no corpo

do Jornal, já que estes moradores não tinham um conhecimento adequado para a exploração

destas terras. Assim, percebo um claro conflito entre as realidades que se passavam nesta

época e com a imprensa sobre estas práticas que não estavam de acordo com os princípios que

este meio de comunicação pregava. Por fim, a ciência e educação foram utilizadas justamente

como justificativa para essa imposição e com isso inferiorizar a cultura do povo. Por meio

disso essa linguagem marcou a impressa nascente no Norte de Minas desse período.

Uma ligação concreta entre essas questões e os organizadores e donos do jornal, pode

estar na política. Já que como foi relatado ao longo do capítulo, Antônio Augusto Veloso era

político e pertencia a uma das famílias que detinha o poder na época. Então, no ato de

discursões acerca da região, vejo uma caracterização que favorecia os homens que estavam à

frente do poder nesse período, sendo que as discursões de política estavam sempre ligadas a

ideologias marcantes, como é o caso do Republicanismo. Então é necessário fazer uma

reflexão dos discursos políticos nesse jornal, já que também outro fator preponderante é a

proclamação da República que suscitou diversas discursões no corpo do periódico.

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Considerações Finais

Ao longo do texto procurei por meio do periódico Correio do Norte analisar a

linguagem jornalística no intuito de compreender como essa linguagem intencionava

proporcionar mudanças no norte de Minas. Desse modo, selecionei as questões mais visíveis

nos periódicos para, através delas, questionar que ações objetivavam realizar no espaço, na

cultura e na sociedade do Norte de Minas.

Busquei no primeiro capítulo articular as questões vinculadas ao aspecto político e

como ele influenciou nesse jornal no período estudado. Para isso compreendi que ele se

mostrou como um local de fala das famílias que detinham poder nesta época e também veio

para justificar a permanecia desta na sua condição de “chefes do local”.

Na segunda parte do trabalho focalizei nas imagens de características sobre o povo da

região, bem como uma instituição de modos de viver para o povo dito “subalterno”. A

divulgação dos Códigos de Postura e a constante cobrança para fiscalizações são indícios

dessa busca para implantar uma cidade “civilizada”.

Finalizando as analises, no último capítulo foi possível articular as concepções já

trabalhadas no primeiro, sobretudo no que diz respeito ao povo, com as qualificações feitas

das terras da região. É possível perceber então, que para o jornal foi conveniente fazer as

caracterizações que ajudavam a dar visibilidade a região, enquanto que de encontro com isso,

há uma desqualificação dos modos de vivências da população do local.

Portanto, ao buscar compreender que qualificações do espaço Norte Mineiro a

imprensa estava instituindo, verifico estratégias de linguagem criadas para legitimar projetos

para o futuro do Norte de Minas naquele passado histórico. Posto isso, acredito que ao

qualificar as terras e desvalorizar as pessoas os redatores intencionavam fazer valer suas

perspectivas para a região.

Confirmo assim a utilização do conceito de Prática Social, onde Raymond Willians

compreende que a comunicação instituiu nas suas linguagens questões de mudança direta por

conta de seus interlocutores. Desta forma, percebo que O correio do Norte utiliza de seus

textos para atingir certo público, intencionando assim uma mudança no seio das práticas das

pessoas.

Esses discursos sobre comportamento e práticas encontrados nos jornais, são parte de

processos históricos que apontam para a emergência de um discurso elaborado, desde 1884

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com o surgimento do Correio do Norte, para instituir ações no social. Os impressos foram

então, um local fundamental para a disseminação desses discursos.

Essa tentativa de implantar a civilização deu força aos impressos para se constituírem

como defensores dos interesses políticos dos Norte Mineiros, o que justifica a linguagem

construída. Portanto, entendo que os jornais ao cobrarem constantemente do governo da

Província e Estado diversas melhorias para a região se colocaram como mediadores entre

sociedade e Estado, logo, seus discursos foram intervenções. Para tanto, legitimavam suas

cobranças a partir de uma construção da região. Ao instituírem uma imagem positiva das

terras do Norte de Minas, afirmaram o que a região poderia oferecer, como grandes rendas no

ramo da agricultura.

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