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A IMPORTÂNCIA DO USO DE JOGOS ADAPTADOS PARA A
APRENDIZAGEM DA LEITURA E ESCRITA DE CRIANÇAS COM
DEFICIÊNCIA FÍSICA
Clotilde Maria Sartori1 Andreia Nakamura Bondezan2
RESUMO: Este artigo apresenta os resultados de implementação do projeto de PDE que teve como temática a produção de material adaptado para o ensino da criança com Deficiência Física. O objetivo principal do projeto foi compreender como o uso de jogos adaptados pode contribuir com a aprendizagem da leitura e da escrita de crianças com deficiência física. Tal projeto se justificou em função de os alunos com deficiência física neuromotora (DFN) apresentarem dificuldades na aprendizagem da leitura e da escrita, pois necessitam de recursos diferenciados para este processo. Desta forma, foi preciso um trabalho em que se adaptou o material pedagógico às necessidades educacionais especiais (NEE) dos alunos. O referencial teórico centra-se na abordagem Histórico-Cultural, valendo-se de Vigotski (1997;1998;2007), Bondezan (2012), Schirmer et. al. (2007), Góes (2002) e Kishimoto; Formosinho (2013), entre outros. O estudo se baseou também em pesquisas sobre as possibilidades de produção de materiais alternativos, análise dos aspectos a serem adaptados; leitura e análise do material referente à fundamentação teórica; construção de recursos alternativos para auxiliar na disciplina de Língua Portuguesa. O texto em questão apresenta algumas das ações desenvolvidas na implementação do Projeto e atividades de formação de professores no Grupo de Trabalho em Rede. Os resultados da implementação apontaram para a importância da ludicidade no trabalho pedagógico com crianças que apresentam Deficiência física, também ao fato de que é importante a mudança de metodologia pedagógica na vida desses alunos, fora e dentro da escola.
Palavras-chave: Educação Especial. Jogos e brinquedos. Leitura e escrita.
1 Introdução
No trabalho com crianças que apresentam deficiência física
neuromotora, identifica-se que grande parte demonstra dificuldade na
aprendizagem da leitura e da escrita, uma vez que necessitam de recursos
1 Especialista em Educação Especial - Letras - Português- UNIOESTE-Foz do Iguaçu-PR
2 Doutora em Educação pela Universidade Estadual de Maringá.
diferenciados para este processo. O professor enfrenta um grande desafio no
ensino dos alunos com deficiência física, pois necessita adaptar materiais e
organizar diferentes estratégias para atender às suas necessidades
educacionais especiais.
Observa-se nas escolas, a escassez de suporte para o ensino dos
alunos com deficiência física. Os materiais disponíveis, geralmente oriundos de
órgãos federais, são insuficientes, e o professor regente precisa criar diferentes
metodologias e materiais alternativos.
Com o intuito de fornecer subsídios para os professores e auxiliar o
ensino da leitura e escrita para alunos com deficiência física, desenvolveu-se
diferentes jogos que, por meio de um projeto de intervenção, possibilitou
analisar como o uso desses jogos adaptados pode contribuir nesse processo.
A escola tem a grande incumbência de fomentar e possibilitar o acesso
à inclusão para crianças com deficiência. Contudo, o desafio da inclusão
escolar é oferecer as mesmas oportunidades a todos, mas em condições
diferenciadas. O professor desenvolve um papel fundamental para que a
inclusão escolar ocorra, pois suas ações de mediação influenciarão na
aprendizagem desses educandos. Vigotski (1997) salienta que o professor
deve partir das capacidades existentes e possibilitar novos níveis de
desenvolvimento, portanto, é necessário superar a antiga noção de que há
limites estabelecidos no desenvolvimento das pessoas com deficiência.
Este artigo aborda as atividades realizadas no Programa de
Desenvolvimento Educacional-PDE do estado do Paraná-PR que tem como
objetivo contribuir na aprendizagem de educandos com deficiência física.
Assim, apresenta-se os jogos como ferramentas valiosas para o ensino da
pessoa com deficiência física, em seguida aborda a implementação do Projeto
em uma turma da primeira etapa do primeiro ciclo do Ensino Fundamental, com
destaque aos jogos adaptados construídos e utilizados e, finaliza com as
atividades de formação de professores no Grupo de Trabalho em Rede (GTR).
2 A importância dos jogos educativos no ensino aprendizagem da pessoa
com deficiência física
Para compreender como os jogos podem auxiliar o ensino da pessoa
com deficiência física, primeiramente é preciso compreender suas
especificidades. A deficiência física é entendida por qualquer comprometimento
do aparelho locomotor que atinja os sistemas esquelético, articular, muscular e
nervoso, causando dificuldades físicas de graus e gravidade variáveis. A
deficiência física pode ser visualizada como uma mudança no organismo como
um todo ou parcial, que incide limitações na movimentação do ser humano e os
dificulta de participarem da vida de maneira autônoma.
De acordo as considerações de Schirmer et al (2007, p.22), a dificuldade
da função física pode ocorrer quando há a ausência de um membro
(amputação), má-formação ou deformação (alterações) que acometem o
sistema muscular e esquelético. Os autores consideram que a deficiência física
também se dá pelas alterações funcionais motoras advindas de lesões do
sistema nervoso, que implicarão principalmente no tônus muscular (hipertonia,
hipotonia, atividades tônicas reflexivas, movimentos involuntários e
incoordenados).
O decreto n º 3.298/99 da legislação brasileira define deficiência física
da seguinte forma:
Art 4º - Deficiência física – alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, paralisia cerebral, ostomia, nanismo, amputação ou ausência de membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzem dificuldades para o desempenho das funções (BRASIL, 1999, p. 22).
As adaptações feitas para que aluno com deficiência possa aprender já
se constituem em “pontes” para a acessibilidade ao ensino, tendo como
mediador o professor, que tem papel fundamental nesse processo. O educador
é o mediador das ações que viabilizarão um novo olhar sobre o ensino e suas
estratégias metodológicas, ele exerce papel fundamental e essencial, ainda
que colaborativo.
Nesse sentido, a percepção do professor frente às especificidades dos
alunos e quais instrumentos e jogos poderão ser usados em favor do
desenvolvimento dos mesmos é um aspecto fundamental, pois contribuirá no
ensino e na aprendizagem. Ao inverter a velha expressão, tem-se o real
sentido do brinquedo, pois é ele quem provocará a imaginação,
desempenhando novas ações, criando novos sentidos para as situações
vivenciadas.
O jogo também é outro aspecto muito relevante, pois as crianças
gostam do jogo de papéis, ou a brincadeira de “faz- de- conta”, como por
exemplo, brincar de polícia e ladrão, de médico, de vendinha, etc. As crianças
são capazes de representar simbolicamente e se envolvem numa situação
imaginária. Nessa fase ocorre uma diferenciação entre os campos de
significado e de visão. O pensamento que antes era determinado pelos objetos
do exterior passa a ser regido pelas ideias.
Não se deve interromper o pensamento da criança, atrapalhando na
simbolização que está realizando. Todo o brinquedo, mesmo que imaginário
contém regras, como um jogo. Como define Vigotski (2007, p. 112):
Da mesma forma que uma situação imaginária tem de conter regras de comportamento, todo jogo com regras contém uma situação imaginária. Jogar xadrez, por exemplo, cria uma situação imaginária. [...] O mais simples jogo com regras transforma-se imediatamente numa situação imaginária, no sentido de que, assim que o jogo é regulamentado por outras regras, várias possibilidades de ação são eliminadas.
O ato de brincar é que revela o conteúdo do brinquedo, isto é, o brincar
permite o estabelecimento de relações entre os objetos, tornando-se uma
atividade livre e espontânea, responsável pelo desenvolvimento físico, moral,
cognitivo, os brinquedos como objetos que norteiam as atividades infantis.
Devido às especificidades da criança com deficiência física, os jogos
precisam ser adaptados, pois conforme suas limitações, nem sempre o mesmo
conteúdo servirá ou será assimilado por todos. Assim, as adaptações também
são criações que favorecem o aprendizado, permitindo ao educando se
apropriar também dos conteúdos. No ambiente escolar encontram-se alunos
com diferentes diagnósticos, por isso, é importante que os docentes busquem
informações sobre quadros progressivos ou estáveis, mudanças ou não na
sensibilidade tátil, térmica ou dolorosa. Também é preciso saber se ocorrem
outras implicações relacionadas como problemas de saúde que necessitem de
atenção, cuidados e uso de medicamentos.
Faz-se necessário entender e diferenciar lesões neurológicas não
evolutivas, como a paralisia cerebral ou trauma medular de outras situações
progressivas como distrofias musculares, ou tumores que agridem o sistema
nervoso. Em muitas situações a deficiência física não ocorre isolada, pode
haver implicações sensoriais: visuais e auditivas, deficiência intelectual,
transtorno do espectro do autismo e outras. Assim, o aluno necessita de outros
para descobrir respostas, contrapondo a ideia de que aprendizagem é um
processo individual, assim,
[...] se um aluno realizar algo com a ajuda de um colega ou mesmo do professor, tempos depois estará realizando sozinho, pois terá amadurecido este processo, realizando-o de forma independente, autônoma (VIGOTSKI, 1998, p.62).
Por intermédio da mediação intencional do professor, com o uso de
instrumentos físicos e da linguagem é possível que aconteça aprendizagem e o
desenvolvimento dos alunos que apresentam alguma deficiência. Logo, é
preciso que se repense as metodologias de ensino, favorecendo a inserção
desses alunos nos contextos escolares.
De acordo com Bondezan (2012), para que a escola promova o
desenvolvimento e a aprendizagem dos alunos, com deficiência ou não, além
dos conhecimentos elencados, é preciso que haja modificações profundas em
vários aspectos: formação de professores, estrutura física, organização do
sistema de ensino e de políticas públicas. As propostas educativas precisam
ser voltadas para a realidade do educando, assim pode-se adequar às
situações em que se necessita de adaptações e ajustes, fazendo com que o
aprendizado aconteça. Conforme Góes, ancorada na abordagem histórico-
cultural observa que:
O desenvolvimento da criança com deficiência é, ao mesmo tempo, igual e diferente ao da criança normal. As leis de desenvolvimento são as mesmas, assim como as metas educacionais. Por outro lado, para se desenvolver e se educar, ela precisa de certas condições peculiares [...] Logo, caminhos alternativos e recursos especiais não são peças conceituais secundárias na compreensão desse desenvolvimento (GÓES, 2002, p.105-6).
As condições para que a inclusão aconteça são inúmeras, mas o papel
do professor como mediador é de extrema importância, viabilizando a
realização de ações educativas, adaptando um conjunto de aparatos que
servirão de acordo com a necessidade específica de cada aluno. Esse papel do
professor também é expresso por Bondezan (2012, p.68):
O professor, juntamente com a equipe pedagógica, também pode fazer adaptações para que todos os alunos venham a realizar as atividades com o mesmo objetivo como, por exemplo, passar tinta em relevo em mapas, para que os alunos cegos possam senti-los, colocar guizos em bolas para atividades lúdicas.
É de grande relevância que a equipe pedagógica atue juntamente com o
professor no atendimento dos alunos com necessidades educacionais
especiais, fornecendo alguns suportes para que ocorra o pleno
desenvolvimento do trabalho. Também integrando todas as partes relacionadas
no processo, envolvendo a família, a classe, os docentes e a comunidade
escolar. Essa mediação é de extrema relevância, pois poderá levar os
educandos a atingir diferentes níveis de conhecimento.
3 Análise dos resultados da implementação
A implementação do projeto se deu na Escola Cristian Eduardo Rack
Cardozo, Educação Infantil, Ensino Fundamental Anos Iniciais na Modalidade
Educação Especial, que tem como mantenedora a Associação Cristã de
Deficientes Físicos (ACDD).
A Escola fornece atendimento educacional especializado a alunos com
comprometimento motor acentuado, com especificidades e limitações, que
variam de acordo com o grau, a intensidade e a extensão da área neuromotora
lesada. Grande parte dos alunos apresenta sequelas de paralisia cerebral,
contudo, há educandos com outras patologias que comprometem os
movimentos como: Hidrocefalia, Microcefalia, Mielomeningocele, distrofia
muscular progressiva, síndromes, etc. Com isso, exige-se do professor
especializado um atendimento pedagógico diferenciado (PPP, 2015-2016).
O Projeto de Intervenção Pedagógica na Escola contou com a
participação de três alunos, que são identificados no texto por: Aluno 1, Aluno 2
e Aluno 3. Vale ressaltar que a quantidade de alunos é uma característica da
escola por atender alunos com deficiência física neuromotora, associada às
múltiplas deficiências e também porque as salas de aula são pequenas.
Conforme as informações das documentações escolares contidas na pasta de
cada aluno, bem como as observações realizadas durante a implementação do
projeto, organizou-se um quadro com as características dos alunos (Quadro 1).
Quadro 1- Características dos alunos participantes
ALUNO DIAGNÓSTICO CARACTERÍSTICAS
1 Paralisia Cerebral Faz uso de cadeira de rodas para se locomover; no chão se locomove, arrastando-se; comunica-se por meio de gestos, expressões faciais, sons com significado; não tem linguagem verbal oral e escrita. Identifica as vogais e letras do seu nome; não tem controle de esfíncteres.
2 Mielomeningocele Possui locomoção independente; linguagem oral; reconhece as letras do alfabeto; escreve e lê palavras simples; não tem controle de esfíncteres.
3 Paralisia Cerebral Apresenta locomoção independente; possui linguagem oral; reconhece algumas vogais e não tem controle de esfíncteres.
Fonte: Organizado pelas autoras (2017)
Conforme o exposto (Quadro 1), observou-se que os três alunos
participantes apresentam necessidades educacionais especiais que nortearam
o trabalho pedagógico e inspiraram as adaptações e produção de jogos. Foram
necessárias observações ao longo da implementação que serviram de base
para análise do trabalho pedagógico, conforme as ações programadas. Na
sequência, apresenta-se um demonstrativo das histórias e jogos aplicados
neste projeto (Quadro 2).
Quadro 2- Contação de histórias e jogos aplicados na implementação
CONTEÚDO ENCONTRO HISTÓRIA JOGOS
-Leitura e interpretação/ texto; -Regras do jogo; -Alfabeto.
1º ENCONTRO
A GALINHA RUIVA Forma de contação: Teatro
Jogo-01 Sequência da história; Jogo-02- Trilha do alfabeto.
-Leitura e interpretação /texto; -Conto de fada; -Fonema e grafema; -Letra inicial/nomes
2º ENCONTRO
CHAPEUZINHO VERMELHO Forma de contação: Tapete
Jogo-01- Jogo da memória em madeira; Jogo-02 Jogo da letra inicial.
-Ampliação do vocabulário; -Relato de vivências; -Adivinhas; -Leitura e escrita.
3º ENCONTRO
MACACO DANADO Forma de contação:
Jogo-01 Adivinhas; Jogo-02 Dominó de chão.
Objetos
Leitura/interpretação/texto/texto; -Fonologia/rima; -Número de letras; -Leitura de palavras.
4º ENCONTRO
O POTE DE MELADO Forma de contação: Livro
Jogo-01 Jogo de cartas; Jogo-02 Jogo de tabuleiro.
-Leitura/interpretação; -Coordenação motora; -Convenções gráficas da escrita; -Escrita: Palavras/frases; -Vogais e consoantes.
5º ENCONTRO
A BOTA DO BODE Forma de contação: Slides
Jogo-01 Quebra- cabeça; Jogo-02 Jogo de caixa de fósforos.
-Ouvir e interpretar a história; -Leitura/escrita de palavras; -Expressão oral.
6º ENCONTRO
OS TRÊS PORQUINHOS Forma de contação: Avental
Jogo-01 Boliche; Jogo-02 Roleta.
-Oralidade/Relato; -Diálogos; -Formação de nomes.
7º ENCONTRO
SE AS COISAS FOSSEM MÃES Forma de contação: Prancha
Jogo-01 Bingo das palavras; Jogo-02 Pescaria silábica.
-Apreciação de histórias.; -Interpretação da história; -Produção de frase oral; -Alfabeto e ordem alfabética; -Relação leitura/escrita.
8º ENCONTRO
JOÃO E MARIA Forma de contação: Fantoches e casa de doces
Jogo-01 Roleta da leitura; Jogo-02 Dado ilustrado.
Fonte: Organizado pelas autoras (2017)
Conforme o quadro acima foram oito encontros para a implementação,
com a utilização dos materiais produzidos, estratégias de contação das
histórias e os jogos. A contação de histórias trouxe estímulo para os alunos,
pois demonstravam alegria ao ver os materiais e a forma diferenciada de narrar
o texto, também a compreensão ficou mais evidente, uma vez que conseguiam
tocar os personagens. Este trabalho aconteceu por meio de diferentes
estratégias, como mostra no resumo (Quadro 3).
Quadro 3- Demonstração das atividades de contação de histórias
Fig. (a) Forma de contação: Teatro
Fig.(b) Forma de contação: Tapete
Fig.(c) Forma de contação: Objetos
Fig.(d) Forma de contação: Livro
Fig.(e) Forma de contação: Slide
Fig.(f) Forma de
contação: Avental
Fig.(g) Forma de Contação: Prancha
Fig.(h) Forma de contação: Fantoches e casa de doces
Fonte: organizado pelas autoras (2017)
As estratégias lúdicas de contação de histórias refletiram no
desempenho das ações seguintes com os jogos. Assim, no teatro os alunos
apresentaram bom desempenho na interação com os colegas, ouviram
atentamente a história (Fig.a). Na estratégia com o tapete (Fig.b) os alunos
manusearam as personagens, comentaram o que estavam percebendo neles.
Assim, sucessivamente, com o uso de objetos (Fig.c); o livro (Fig.d); e os
slides (Fig.e) os alunos acompanharam visualmente demonstrando interesse e
se expressando pela linguagem corporal, facial, gestos, palavras e outros. Com
as estratégias de usar o avental (Fig.f), a prancha (Fig.g), fantoches e casa de
doces (Fig.h) trouxeram momentos mais descontraídos e saborosos.
Com contação das histórias, as crianças alcançaram avanços na
aquisição da leitura, interpretação textual e preparo para escrita imediata e
possivelmente futura. As histórias contribuíram para que demonstrassem o que
já sabiam, possibilitando o desenvolvimento da sua imaginação, atenção,
concentração, entusiasmo, entre outros. A produção de jogos educativos com
base nas histórias trabalhadas proporcionou aos alunos uma sequência de
atividades, uma vez que se relacionavam aos conteúdos previstos na área de
língua portuguesa.
No jogo a “Sequência da história”, os alunos visualizaram e observaram
as telas pintadas com os animais (personagens) envolvidos nas cenas:
primeiro brincaram, depois montaram a sequência da história. O Aluno 1
desenvolve a atividade colocando as telas na sequência dos acontecimentos,
necessitando de ajuda parcial (Figura 1).
Figura 1- Jogo 1 Sequência da história ( A galinha ruiva) Fonte: foto das autoras (2017)
Nesse jogo (Figura 1) os alunos realizaram com muita naturalidade,
devido ao conhecimento prévio da narrativa da história e pondo na sequência
do contexto, dessa maneira, esse aspecto reitera a importância do brinquedo.
A criança brinca pela necessidade de agir em relação ao mundo mais amplo
dos adultos, não apenas no universo dos objetos que tem acesso. Dessa
maneira, a criança deve explorar livremente o brinquedo, mesmo que não seja
da forma que se espera.
No jogo 2 “Trilha do alfabeto”, os alunos, juntamente com a professora
organizaram o material do jogo: trilha, 26 fichas com figuras e nomes
relacionadas com o alfabeto, marcadores de copinhos com os amigos da
Galinha ruiva, dado de números (Figura 2).
Figura 2- Jogo 2 Trilha do alfabeto (A galinha ruiva) Fonte: foto das autoras (2017)
Um aspecto observado que foi muito relevante antes de se iniciar as
jogadas foi a explicação sobre o funcionamento e regras do jogo. Para
Kishimoto e Formosinho (2013) a expressão de brincadeiras de faz de conta,
com regras implícitas, parece criar espaço para a emergência do letramento.
Com isso, para que aconteça, é necessário recursos materiais, sendo que os
cenários, artefatos e outros elementos contribuirão para o ingresso no
imaginário, possibilitando a expressão da brincadeira. Assim, os alunos
perceberam que era necessário o controle das jogadas por meio das regras,
evitando desrespeito, infrações e supostas “injustiças”. Eles acompanharam
atentamente as jogadas, permitindo assim o acesso de todos ao jogo, o
interesse em participar também foi satisfatório, eles não apresentam
resistência, ou má vontade, o que denotam pontos positivos e importantes
para o processo de ensino e aprendizagem.
Desde muito cedo, as crianças se apropriam de brincadeiras em
diversas esferas da vida social, contudo, também é na escola que elas podem
influenciar na aprendizagem. Para que isso ocorra, são necessárias mediações
que envolvem o professor e outros meios do ambiente escolar, como destacam
Kishimoto e Formosinho (2013, p. 28) que podem ser feitas “por relações
sociais estabelecidas por sujeitos (crianças e adultos), ações sobre objetos
(jogos e materiais) artefatos culturais, como os signos e a linguagem que
mobilizam o pensamento e geram a representação simbólica” (Figura 3).
Figura 3- Jogo 1 Adivinhas (Macaco danado)
Fonte: foto das autoras (2017)
No jogo “Dominó de chão” os alunos manusearam, espontaneamente as
peças, expressaram-se sobre ele lendo as figuras e palavras com autonomia e
ajuda. No decorrer das jogadas o Aluno 1 identificou parcialmente as figuras,
leu as palavras com auxílio. O Aluno 2 identificou todas as figuras, leu as
palavras simples, já as complexas leu por dedução e com ajuda da professora.
O aluno 3 fez a leitura das figuras do dominó, apontava e falava nas palavras,
as letras que conhece (A,I,O,U), mesmo intercalando momentos de falta de
atenção e concentração demonstrou entusiasmo, interesse em jogar interagir
com os colegas e a professora (Figura 4).
Figura 4- Jogo 2 Dominó de chão (Macaco danado) Fonte: foto das autoras (2017)
Seguindo as atividades propostas, apresentou-se o material referente ao
jogo “Roleta da leitura” e feita a explicação de como jogar, todos os alunos
participaram com entusiasmo, atenção com entendimento das regras do jogo,
na sequência há uma amostra da atividade com os alunos (Figura 5).
Figura 5- Jogo 1 Roleta da leitura (João e Maria)
Fonte: foto das autoras (2017)
Nessa atividade observou-se que a roleta estava muito grande, trazendo
dificuldades, assim foi preciso fazer uma menor, de acordo com a estatura dos
alunos. Conforme as atividades iam acontecendo, percebia-se que o uso de
recursos na aprendizagem de crianças com deficiência física se constitui em
tentativas, mudanças de estratégias, principalmente em se tratando da
aplicação de jogos, pois, pode necessitar de adaptações conforme as
especificidades apresentadas.
No entanto, o esforço para construir o jogo adaptado é compensado,
pois é um excelente recurso para facilitar a aprendizagem. O brincar pode ser
útil para estimular seu desenvolvimento integral, no ambiente familiar, em
especial no espaço escolar. Carvalho (1992, p.28) ressalta que,
O ensino absorvido de maneira lúdica, passa a adquirir um aspecto significativo e afetivo no curso do desenvolvimento da inteligência da criança, já que ela se modifica de ato puramente transmissor a ato transformador em ludicidade, denotando-se, portanto em jogo.
As ações do jogo devem ser criadas e recriadas, para que sejam sempre
uma nova descoberta e se transformem em um novo jogo. Com relação ainda
da aplicabilidade dos jogos, outro aspecto importante e relevante, que
demonstrou resultados positivos foi o desenvolvimento deles no jogo “Dado
ilustrado” com figuras (sapo, gato, borboleta, casa, galinha, menina, macaco,
pato, bruxa, lobo, bota, doce).
Com o jogo “Dado ilustrado” notou-se que os alunos já estavam mais
soltos e livres nas tomadas de atitudes, dentro dos limites de cada um, mas
demonstrando certa autonomia de segurança ao efetuar as jogadas. Um ponto
que merece ser citado é a maneira como os alunos reagiram diante dos dados
“gigantes” ficando impressionados com as imagens. Nesse sentido, houve de
fato uma adaptação que foi possível visualizar no olhar dos alunos, era como
se eles gritassem que “aquilo”, o jogo, pertencia-lhes (Figura 6).
Figura 6- Jogo 2 Dado ilustrado (João e Maria)
Fonte: foto das autoras (2017)
Assim, com o desenvolvimento dessa atividade, foi possível perceber
que o Aluno 1 fez a leitura das imagens sem dificuldades; o Aluno 2 foi falando
o nome das histórias que pertencia tal figura: “Macaco danado”, “Os três
porquinhos”, entre outras; o Aluno 3, relatou oralmente o nome das
personagens que visualizava nos dados. Essa ação comprova o quanto o uso
de jogos auxilia na aprendizagem, na memorização dos conteúdos que são a
base da aprendizagem em língua portuguesa. O que se observou é que, em
todos os jogos, eles brincavam, exerciam as regras e não percebiam que
estavam inseridos num sistema de normas e regras de jogo, com intuito
educacional de favorecer a aprendizagem.
O brinquedo desperta a criança para um mundo ilusório e imaginário, em
que seus desejos são realizáveis. Essa é uma das características que define o
brinquedo de um modo geral. Para Vigotski (2007, p. 109):
A imaginação é um processo psicológico novo para a criança representa uma forma especificamente humana de atividade consciente, não está presente na consciência de crianças muito pequenas e está totalmente ausente em animais. Como todas as funções da consciência, ela surge originalmente da ação. O velho adágio de que o brincar da criança é imaginação em ação deve ser invertido, podemos dizer que a imaginação, nos adolescentes e nas crianças em idade pré-escolar, é o brinquedo em ação.
Foram destacados alguns jogos realizados durante a implementação do
projeto, no entanto, todos trouxeram contribuições significativas para o
aprendizado dos alunos participantes. Os estudos de Vigotski (1988) apontam
que, para que as crianças possam aprender e se desenvolver há necessidade
de intervenção de alguém mais experiente. Tendo em vista isso,
compreendem-se as atitudes dos alunos em algumas atividades que
necessitaram de auxílio.
De forma geral, houve participação intensa tanto nas histórias, como nos
jogos, em que demonstraram alegria, atenção e concentração. Mesmo com as
capacidades motoras comprometidas, realizaram os jogos com empenho,
animação, com esforço e maior autonomia que conseguiram. Em alguns
momentos houve mediação do professor, ora parcialmente, ora
frequentemente, quanto às questões motoras e de entendimento dos
conteúdos envolvidos nas histórias e jogos.
Levando-se em consideração os aspectos observados durante a
implementação e expostos nesse artigo, observou-se que as mediações
realizadas e o uso dos jogos possibilitaram aprendizagem e desenvolvimento
dos alunos com deficiência física, que certamente, sem estas adapatações
teriam mais dificuldade para alcançar os resultados deste projeto.
4 Formação do professor no GTR
O Grupo de trabalho em Rede-GTR ofertado aos profissionais da
Educação do Estado do Paraná proporciona troca de experiências pedagógicas
entre as áreas afins. A interação ocorre de forma online, assim, os educadores
e demais cursistas podem debater a temática do Projeto-PDE e também
sugerir contribuições para a melhoria da prática pedagógica. A temática “A
importância do uso de jogos adaptados para a aprendizagem da leitura e
escrita de crianças com deficiência física” interessou para a maioria dos
participantes, pois de 20 inscritos 16 concluíram o curso. Isso demonstra o
interesse pelas discussões e proposta pedagógica.
No decorrer do GTR os cursistas participaram descrevendo a realidade
escolar em que lecionam, também exemplificaram algumas ações que
desenvolvem acerca do uso da ludicidade no processo de ensino e
aprendizagem. A temática abordada no PDE forneceu subsídios para outros
professores usarem em suas práticas pedagógicas, como mostra no relato de
um professor Cursista-01 do GTR:
A temática em questão nos auxiliará com a base teórica e produção de materiais pedagógicos adaptados para esses educandos. Assim, com essas trocas de experiências, aprendemos a partilhar de nossas angústias e desafios dentro dos espaços escolares (Cursista-01)
Em outro relato, percebe-se que também nas escolas em que os
cursistas lecionam e estão distribuídas por todo o estado do Paraná, há falta de
equipamento e materiais pedagógicos direcionados ao tipo de deficiência de
cada aluno. Isso é um problema, algumas vezes, devido à falta de recursos
financeiros. Como se pode observar no relato do professor cursista-02:
Em minha escola não dispomos de materiais adaptados, falta recursos financeiros para a aquisição desses materiais pedagógicos. A Produção didática da professora acendeu uma luzinha, é possível que façamos essas adaptações, pois esperar que os recursos cheguem vão levar muito tempo. Também temos que fazer promoções para poder comprar materiais pedagógicos que viabilizem uma prática pedagógica mais direcionada. (Cursista-02)
Assim, o GTR possibilitou um espaço para colocações acerca do
trabalho pedagógico com alunos com deficiência física, o que contribui para
ouvir outros pontos de vista. Dessa forma, também verificar se houve
relevância do material didático-pedagógico produzido durante o PDE para
abordar essa temática. Os depoimentos dos colegas professores participantes
do GTR foram importantes para a implementação e para o próprio grupo, pois
as ideias fluíram e alguns citaram também exemplos de atividades lúdicas,
usando histórias contadas para trabalhar determinados conteúdos. Outro ponto
interessante é que todos interagiam nos fóruns e deixavam explícita a
preocupação em participar de formações continuadas para melhorar a prática
pedagógica.
5 Considerações finais
O projeto PDE teve como objetivo principal compreender como o uso de
jogos adaptados pode contribuir com a aprendizagem da leitura e da escrita de
crianças com deficiência física. Buscou-se também ler mais sobre a temática e
melhorar a prática pedagógica.
Vale ressaltar como os jogos adaptados podem auxiliar na
aprendizagem da leitura e escrita de crianças com deficiência física. Cada
aluno da turma se envolveu com entusiasmo nas histórias e jogos. Contudo,
necessitando sempre da mediação do professor, dos próprios colegas, dos
objetos produzidos, tudo no entorno colaborou para que fossem incentivados
por meio do “brincar”. E, consequentemente motivou a interpretação dos textos,
a leitura de imagens a observação atenta das letras, sílabas, palavras, etc.
No decorrer da implementação, percebeu-se que parte, ou alguns dos
materiais (histórias e jogos) produzidos precisaram de alterações, adaptações
quanto ao tamanho, formato, grau de dificuldade dos conteúdos para se
adequar melhor às características dos alunos e do próprio espaço da sala de
aula. Como exemplo dessas adaptações está o Jogo Trilha do alfabeto, que foi
confeccionado outro para dar certo, conforme a especificidade dos alunos. A
nova confecção ficou em tamanho menor e se ajustou bem aos educandos. O
Jogo da memória em madeira também teve que ser confeccionado outro, em
tamanho maior, com o objetivo de visualizar melhor as imagens e nomes,
podendo ser jogado também no chão, e não só em uma mesa. A mudança
também foi percebida em outros jogos que precisam de adaptações, conforme
as necessidades. Desta maneira, pode-se analisar que há inúmeras
possibilidades de continuidade deste trabalho, podendo ser transformado,
recriado, com alternativas diferenciadas para trabalhar a leitura e escrita de
forma lúdica adaptando-as para as crianças com deficiência física e suas
características.
É relevante destacar que este projeto afetou a vida de muitas pessoas:
docentes envolvidos, familiares, alunos, professores, participantes externos,
colaboradores e outros. Houve a participação de pessoas que não estão no
meio acadêmico, do campo da arte de criar artefatos, brinquedos e outros
suportes para a contação de histórias e aplicação dos jogos que foram
fundamentais para a implementação.
Desta forma, vê-se a importância da ludicidade no trabalho pedagógico.
A mudança de metodologia foi importante na vida desses alunos, fora e dentro
da escola. O projeto teve reflexos como “uma reação em cadeia”, um resultado
puxou o outro, ou seja, houve interação de fato. As pessoas que participaram
da confecção dos jogos não tinham ideia de quanto estavam contribuindo para
o desenvolvimento das crianças e da metodologia do professor.
A utilização dos jogos foi um momento novo na sala de aula, foi uma
construção para atender as especificidades dos alunos assistidos, vivenciou-se
o prazer de ensinar através de jogos e simultaneamente houve encantamento
dos alunos pelo aprender por meio do brincar, processo passível de mudanças.
Espera-se que os professores leiam o material pedagógico produzido durante o
PDE e se entusiasmem a utilizarem os jogos para o ensino de conteúdos
científicos fazendo as adaptações necessárias aos alunos que apresentam
alguma deficiência.
Referências
BRASIL. Decreto n. 3298. Regulamenta a Lei no 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá outras providências. Brasília, 1999. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3298.htm>. Acesso em: 01 nov. 2016. BONDEZAN, A. N. Educação inclusiva em região de fronteira: políticas e práticas. Tese de doutorado, UEM, Maringá, 2012. CARVALHO, A. M. C. et al. (Org.). Brincadeira e cultura: viajando pelo Brasil que brinca. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1992. GÓES, M. C. R. de. Relações entre desenvolvimento humano, deficiência e educação: contribuições da abordagem histório-cultural. In: OLIVEIRA, M. K.; SOUZA, D. T. R.; REGO, T. C. (org.). Psicologia, Educação e as temáticas da vida contemporânea. São Paulo: Moderna, 2002, p. 95 –114. KISHIMOTO, T. M.; FORMOSINHO, J. O. Em busca da pedagogia da infância perdida. Porto Alegre: Penso, 2013. PPP- Projeto Político Pedagógico da Escola Cristian Eduardo Rack Cardozo, Educação Infantil, Ensino Fundamental Anos Iniciais na Modalidade Educação Especial-Associação Cristã de Deficientes Físicos (ACDD) Disponível no NRE-Foz do Iguaçu-PR e na Secretaria da própria escola (2015-2016). SCHIRMER, C. R. et. Al. Atendimento Educacional Especializado. Brasília-DF: SEESP/SEED/MEC, 2007. VIGOTSKI, L. S. A formação social da mente. São Paulo, Martins Fontes, 2007. _____Obras escogidas: tomo cinco. Fundamentos da defectologia. Madrid: Visor, 1997. VIGOTSKI, L. S; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem e desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo: Ícone: Editora da Universidade de São Paulo, 1998.