a importÂncia de estudos teÓricos sobre o brincar … · criança; a importância da mediação...

20

Upload: doduong

Post on 08-Nov-2018

215 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: A IMPORTÂNCIA DE ESTUDOS TEÓRICOS SOBRE O BRINCAR … · criança; a importância da mediação do educador no uso de brincadeiras no processo de ensino; e a influência do brincar
Page 2: A IMPORTÂNCIA DE ESTUDOS TEÓRICOS SOBRE O BRINCAR … · criança; a importância da mediação do educador no uso de brincadeiras no processo de ensino; e a influência do brincar

A IMPORTÂNCIA DE ESTUDOS TEÓRICOS SOBRE O BRINCAR NA EDUCAÇÃO INFANTIL NA FORMAÇÃO DOCENTE

Autora: Margareth Aparecida Cauneto1 Orientadora: Professora Drª. Augusta Padilha2

Resumo: O lúdico no contexto escolar está desaparecendo, e percebemos que os jogos e brincadeiras são ignorados com frequência pelas instituições escolares. O momento exige que paremos para refletir sobre a importância desse componente na formação dos futuros professores. Este trabalho é resultado de uma pesquisa escolar aplicada que teve como objetivos propiciar aos alunos e professores do Curso de Formação de Docentes, na disciplina de Prática de Formação, a compreensão sobre a função do lúdico na formação humana; reconhecer a brincadeira como instrumento pedagógico importante no desenvolvimento cognitivo da criança; ter a oportunidade de identificar os componentes da essência humana; relacionar aprendizagem e desenvolvimento intelectual; analisar a importância do brincar no processo de ensino-aprendizagem; reconhecer a função mediadora do docente na Educação Infantil; evidenciar o papel da brincadeira na aprendizagem nos Centros de Educação Infantil, uma vez que pouco se usam as brincadeiras para formar/ensinar crianças e, quando usadas, têm um foco diferente. Palavras-chave: Lúdico. Processo de ensino-aprendizagem. Formação docente.

INTRODUÇÃO

O texto que segue é produto da experiência da sistematização das ações

desenvolvidas no âmbito do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) e

seu desdobramento no Projeto de Intervenção Pedagógica intitulado “O Brincar, a

Criança e a Educação Escolar: Análise sobre o Ensino nos Centros de Educação

Infantil”, que partiu da experiência com os alunos do Curso de Formação na

disciplina de Prática de Formação, quando realizavam seus estágios nos Centros de

Educação Infantil.

O que motivou a realização deste trabalho foram as observações dos

professores da disciplina de Prática de Formação durante os estágios nos Centros

de Educação Infantil, pois se trata, a nosso ver, de uma disciplina relevante no Curso

de Formação de Docentes. Durante esses estágios, percebemos que pouco se

utilizam as brincadeiras para ensinar às crianças e, quando utilizadas pelos

educadores, são encaradas como forma de relaxamento, descarga de energia ou

premiação aos que foram bem sucedidos em suas atividades em sala de aula.

1

Professora da Rede Estadual de Educação do Paraná. 2 Professora do Departamento de Teoria e Prática da Educação da Universidade Estadual de Maringá.

Page 3: A IMPORTÂNCIA DE ESTUDOS TEÓRICOS SOBRE O BRINCAR … · criança; a importância da mediação do educador no uso de brincadeiras no processo de ensino; e a influência do brincar

Nossos alunos do Curso de Formação, durante os estágios, também tiveram

a mesma percepção, pois acreditam que as crianças precisam de atividades lúdicas

assim como a certeza de que aprender brincando desenvolve melhor a

aprendizagem, uma vez que as brincadeiras proporcionam às crianças maior relação

com o mundo, com as pessoas e com objetos que as cercam.

Sabemos que as crianças têm necessidade do brincar, mas observamos que

os futuros professores não estão sendo preparados para ensinar, na Educação

Infantil, mediante o lúdico das brincadeiras. O foco deste trabalho, por conseguinte,

gira em torno da problemática de estudar com os alunos do Curso de Formação de

Docentes sobre o brincar, a criança e a educação escolar, considerando que

estudiosos e pesquisadores comprovaram a importância do brincar na educação

pré-escolar, que é o período da vida em que o mundo da realidade humana que

cerca a criança abre-se cada vez mais para ela.

Quando perguntamos quais são os direitos, interesses e necessidades da

criança nessa faixa etária, as respostas aparecem permeadas dos temas

brinquedos, brincadeiras, ou seja, o brincar é direito, é interesse e necessidade da

criança. No entanto, também verificamos que, no cotidiano dos Centros de

Educação Infantil, as crianças estão brincando cada vez menos, e isso ficou

evidente durante nossas observações. Constatamos o distanciamento entre o que é

de direito e o que é de fato realizado pelos educadores na prática com seus alunos.

Esse distanciamento, entendido como dificuldade docente, estaria relacionado à

ausência de conhecimentos sobre a criança e o ensino desta nessa faixa etária? O

que os futuros docentes precisam saber para a aplicabilidade do brincar na

Educação Infantil?

A caminhada de investigação se iniciou com aprofundamento teórico na

perspectiva de pensar sobre a importância do brincar para o desenvolvimento

intelectual e sua coincidência com uma formação humana. Realizamos estudos para

a elaboração do Projeto de Intervenção e para a Produção Didático-Pedagógica, que

foi suporte para a atividade de implementação pedagógica realizada no Colégio

Estadual de Paranavaí – Ensino Fundamental, Médio, Normal e Profissional. Com o

objetivo de fundamentar alunos e professores do Curso de Formação de Docentes,

seguimos a Proposta Pedagógica Curricular do Curso de Formação de Docentes da

Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental, em Nível Médio, na

Modalidade Normal, no que diz respeito à ementa da terceira série que aborda

Page 4: A IMPORTÂNCIA DE ESTUDOS TEÓRICOS SOBRE O BRINCAR … · criança; a importância da mediação do educador no uso de brincadeiras no processo de ensino; e a influência do brincar

“Artes, brinquedos, crianças e a educação nas diferentes instituições”, cujo intuito

visava pensar os fundamentos sócio-psicológicos e as funções no desenvolvimento

infantil (PARANÁ, 2006).

O desenvolvimento da Unidade Didática ocorreu em oito encontros que

envolveram 18 alunas do 3º ano e quatro docentes das disciplinas específicas do

Curso de Formação de Docentes do Colégio Estadual de Paranavaí E.F.M.P.N.

Também foi ofertado, aos profissionais da educação do Estado do Paraná, o curso a

distância GTR, com a participação efetiva de 11 professores, sendo dez do Curso de

Formação de Docentes e um do Curso Técnico em Informática.

Durante os encontros, abordamos a realização de pesquisas e estudos sobre

o brincar, a criança e a educação escolar com a finalidade de incidir na

formação/ação dos envolvidos acima citados. Buscamos a fundamentação teórica

nos estudiosos L. S. Vigotski e A. N. Leontiev, pois acreditamos que, por meio das

pesquisas desses autores teríamos mais compreensão sobre a relação

aprendizagem e desenvolvimento intelectual dos alunos na modalidade Educação

Infantil; as leituras e estudos pertinentes à Teoria Histórico-Cultural nos forneceram

subsídios para a formação/ação desses alunos e professores de forma que

pudessem participar do debate sobre os componentes da essência humana; a

função do lúdico na relação entre aprendizagem e desenvolvimento intelectual da

criança; a importância da mediação do educador no uso de brincadeiras no processo

de ensino; e a influência do brincar para a formação humana dos alunos.

A IMPORTÂNCIA DO BRINCAR PARA O DESENVOLVIMENTO INFANTIL

Em nossos estudos durante a implementação, destacamos que o brincar, há

muito tempo, é motivo de preocupação, pois na Declaração dos Direitos Humanos

de 1959 já constava essa prerrogativa: “a criança terá ampla oportunidade para

brincar e divertir-se, visando aos propósitos mesmos da sua educação; a sociedade

e as autoridades públicas empenhar-se-ão em promover o gozo deste direito”

(BRASIL, 1959); e a Constituição do Brasil, no Artigo 227, assegura o direito “[...] à

educação, ao lazer [...]” (BRASIL, 1988). No Estatuto da Criança e do Adolescente

(ECA), o Artigo 4º estabelece que

É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer,

Page 5: A IMPORTÂNCIA DE ESTUDOS TEÓRICOS SOBRE O BRINCAR … · criança; a importância da mediação do educador no uso de brincadeiras no processo de ensino; e a influência do brincar

à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária (BRASIL, 1990).

Esses documentos evidenciam a preocupação de diversos segmentos sociais

no tocante à importância do brincar como fonte de aprendizagem. Espaços como

brinquedotecas agora fazem parte do acervo dos Cursos de Formação, porque

entendemos que a educação, desde a infância, precisa estar centrada na formação

do homem omnilateral, do homem completo. É necessário conceber o indivíduo no

conjunto de suas relações sociais e, quando se trata de formação humana, as

brincadeiras e os jogos estão inseridos nesse contexto desde as antigas civilizações.

Para Klein (2010), a educação é uma prática muito importante para a sociedade, é

alvo de reflexões metódicas, científicas e críticas, e deve ser intencional no tocante

ao sujeito que se deseja formar em determinado contexto escolar.

Pensando nesse sujeito, é preciso deixar evidente que, seja qual for o nível

de escolaridade e as estratégias de ensino, o educador não pode depreciar ou

desvalorizar o conhecimento historicamente acumulado pela humanidade, cuja

apropriação é direito de todo ser humano. Isto porque, acreditamos que a educação

dos homens varia de acordo com os modelos que são apresentados em diferentes

épocas e sociedades, haja vista que a formação de cada homem não ocorre

espontanea ou naturalmente, mas conforme as peculiaridades da sua experiência

pessoal. Sendo, pois, o homem um ser histórico e social, todos os momentos de sua

vida são imprescindíveis para contatos e aprendizagens com recursos materiais e

intelectuais que lhe oferecem condições de existência humana, de desenvolvimento

no processo de experiência pessoal no tempo mais variado de sua escolarização,

por exemplo.

Como a Educação Infantil se encontra nesse contexto, os futuros educadores

precisam perceber que, para atuar nesse segmento, são necessários estudos

teóricos, antes do exercício do brincar com as crianças, e entendam que, para que

todos tenham as mesmas condições de educação, é importante que haja caráter de

transformação nas atividades organizadas para as crianças, que ofereça modelos

que orientem ações educativas que exijam de todas a aprendizagem da leitura, da

escrita, das operações matemáticas, enfim, dos fundamentos da ciência.

Aprendizagens que concorrerão na eliminação das diferenças e desigualdades

sociais e individuais a medida que todos os alunos consigam os mesmos graus de

conhecimento.

Page 6: A IMPORTÂNCIA DE ESTUDOS TEÓRICOS SOBRE O BRINCAR … · criança; a importância da mediação do educador no uso de brincadeiras no processo de ensino; e a influência do brincar

Vivemos sob a dominância da ordem social burguesa e do modo capitalista

de produção, e isso tem levado as instituições educacionais a desenvolver um

modelo de educação padronizado, em que as atividades lúdicas, mesmo

espontâneas, têm espaço tão limitado que não surtem efeito. Crianças com uma

rotina de adultos, apresentam-se precocemente como adultos em miniaturas. A

aluna D.R., durante a implementação, citou um exemplo, muito assustada:

“Professora, eu tenho uma aluninha de três anos, do maternal, que vai maquiada

para a escola, maquiada mesmo, professora, ela usa rímel, lápis, batom e é assim

todos os dias”. Podemos dizer que nessa tendência social, as crianças estão sendo

privadas de um de seus direitos básicos, que é brincar, até mesmo em seus

ambientes familiares, “quintais”, etc. Esse brincar compreendia, inclusive, as

chamadas brincadeiras tradicionais infantis que encantavam as crianças e que

desapareceram em virtude da televisão, da Internet, dos jogos eletrônicos, das

mudanças nas zonas urbanas, enfim. Tais brincadeiras são muito importantes na

educação e sociabilidade da criança, pois brincando e jogando a criança, conforme

explica a Teoria Histórico Cultura, está sempre além da sua conduta diária, pois em

processo com essas fontes de desenvolvimento. Ainda, estabelece vínculos sociais,

regras traçadas pelo grupo como também propõe suas modificações e aprende os

mecanismos como a ganhar e a perder.

É notório, na conduta humana, que o mundo da criança contém encanto,

fantasia, faz de conta, sonho, curiosidades, descobertas. Também é por meio da

espontaneidade do brincar que a criança poderá expressar as diferentes

experiências vivenciadas em seu contexto familiar e social.

A brincadeira se apresenta como uma importante fonte de desenvolvimento

intelectual pois com ela a criança atua com a imaginação, a criatividade, o raciocínio,

a atenção, funções intelectuais essenciais para a aprendizagem e apropriação de

conhecimentos; pode fazer parte do cotidiano de qualquer criança, independente do

local onde vivam, dos recursos disponíveis, do grupo social e da cultura da qual

fazem parte.

Leontiev (2001, p. 120), quando escreve sobre o significado da brincadeira no

estágio de desenvolvimento infantil, deixa claro que a brincadeira infantil, na

perspectiva histórico-cultural, consiste em uma atividade tipicamente humana: “[...] a

brincadeira para a criança não é instintiva, mas precisamente humana, atividade

objetiva, que, por constituir a base da percepção que a criança tem do mundo dos

objetos humanos, determina o conteúdo de suas brincadeiras”. Para esse autor, as

Page 7: A IMPORTÂNCIA DE ESTUDOS TEÓRICOS SOBRE O BRINCAR … · criança; a importância da mediação do educador no uso de brincadeiras no processo de ensino; e a influência do brincar

primeiras ações lúdicas surgem com base na necessidade crescente da criança de

dominar o mundo dos objetos humanos, por isso, a nosso ver, no processo de

ensino, as brincadeiras e jogos precisam de organização e cuidado com a

administração, uma vez que incidem, inclusive, nos sentimentos de prazer ou

frustração.

Segundo Vigotski (1998ª, p. 112),

[...] A imaginação é um processo psicológico novo para a criança; representa uma forma especificamente humana de atividade consciente, não está presente na consciência de crianças pequenas e está totalmente ausente em animais. Como todas as funções da consciência, ela surge originalmente da ação.

De acordo com Leontiev3 (1988 apud PADILHA; BARROS; SANTOS, 2010),

reiteramos que a criança pré-escolar brinca porque sente a necessidade de dominar

o mundo humano e os objetos humanos que se expandem através do tempo em que

ela se desenvolve. Esses são objetos que ela pode operar, mas há aqueles com que

ela não pode fazê-lo por incapacidade física e psíquica. Nessa fase de

desenvolvimento, ela recorre a atividades lúdicas, as quais se tornam a atividade

principal, mas não a predominante.

[...] O que é, em geral, a atividade principal? Designamos por esta expressão não apenas a atividade freqüentemente encontrada em dado nível do desenvolvimento de uma criança. O brinquedo, por exemplo, não ocupa, de modo algum, a maior parte do tempo de uma criança. A criança pré-escolar não brinca mais do que três ou quatro horas por dia. Assim, a questão não é a quantidade de tempo que o processo ocupa. Chamamos de atividade principal aquela em conexão com o qual ocorrem as mais importantes mudanças no desenvolvimento psíquico da criança e dentro da qual se desenvolvem processos psíquicos que preparam o caminho da transição da criança para um novo e mais elevado nível de desenvolvimento (LEONTIEV, 2001, p.122).

Entendemos que a atividade principal na infância pré-escolar é o brincar

explícito no jogo, no brinquedo, na brincadeira e em outras formas lúdicas

vivenciadas pela criança nessa idade. Para compreendermos que a infância é um

período importante na direção do desenvolvimento do ser humano, é necessário que

entendamos a aprendizagem e o desenvolvimento intelectual como fenômenos

intencionalmente organizados com o planejamento das situações educativas. O jogo

e a brincadeira são atividades principais na educação infantil, e a experiência com

essas atividades oportuniza às crianças conhecer histórias passadas e o mundo

3 LEONTIEV, A. N. Os princípios psicológicos da brincadeira pré-escolar. In: VIGOTSII, L. S.; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, Desenvolvimento e Aprendizagem, São Paulo: Ícone, 1988.

Page 8: A IMPORTÂNCIA DE ESTUDOS TEÓRICOS SOBRE O BRINCAR … · criança; a importância da mediação do educador no uso de brincadeiras no processo de ensino; e a influência do brincar

atual além das normas, valores, funções sociais, que movimentam nossa sociedade.

Morais (2008) cita que Vigotsky (2000) realizou estudos comparativos sobre

as abordagens psicológicas do desenvolvimento e da aprendizagem relevantes para

que pudesse lançar seus pressupostos teóricos de forma que superassem as teorias

vigentes sobre a concepção de aprendizagem e desenvolvimento. Vigotsky4 (2000

apud MORAIS, 2008) concluiu que há uma unidade entre esses dois processos e

não apenas uma identidade ou coincidência, concebendo, então, que a

aprendizagem e o desenvolvimento são diferentes, porém, articulados entre si, em

uma relação dialética. De acordo com essa perspectiva, o indivíduo é compreendido

como ser histórico, e a mediação do professor tem papel importante no processo de

humanização. Vigotski (2001, p. 115) afirma:

[...] a aprendizagem não é, em si mesma, desenvolvimento, mas uma correta organização da aprendizagem da criança [que] conduz ao desenvolvimento mental, ativa todo um grupo de processos de desenvolvimento, e esta avaliação não poderia produzir-se sem a aprendizagem. Por isso, a aprendizagem é um momento intrinsecamente necessário e universal para que se desenvolvam na criança essas características humanas não naturais, mas formadas historicamente.

Entendemos, segundo Vigotski (2001), que a aprendizagem não pode ir atrás

do desenvolvimento, nem ocorre simultânea a este, mas pode promover o

desenvolvimento, proporcionando novas formações.

Na realidade a criança não é apenas um objeto, mas também o sujeito do desenvolvimento. Educação e ambiente não influem automaticamente sobre o desenvolvimento psíquico; tais fatores atuam de maneira diferente segundo as suas relações com o ambiente, as metas da sua atividade, etc. É preciso ter domínio da relação entre aprendizado e desenvolvimento (BOGOYAVLENSKY; MENCHINSKAYA, 1991, p.38).

O desenvolvimento humano é caracterizado pelas relações interpessoais

recíprocas que se estabelecem entre os indivíduos e destes com o meio que os

cerca, e essas interações constroem, também na criança, capacidades cada vez

mais complexas, conforme a natureza do gênero humano, propondo-se a alcançar

objetivos cada vez mais elevados. Nesses termos,

As crianças podem imitar uma variedade de ações que vão muito além dos limites de suas próprias capacidades. Numa atividade coletiva ou sob a orientação de adultos, usando a imitação, as crianças são capazes de fazer muito mais coisas. Esse fato, que parece ter pouco significado em si mesmo, é de fundamental importância na medida em que demanda uma

4 VIGOTSKI, L. S. A construção do pensamento e a da linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

Page 9: A IMPORTÂNCIA DE ESTUDOS TEÓRICOS SOBRE O BRINCAR … · criança; a importância da mediação do educador no uso de brincadeiras no processo de ensino; e a influência do brincar

alteração radical de toda a doutrina que trata da relação e desenvolvimento em crianças. Uma conseqüência direta é a mudança nas conclusões que podem ser tiradas dos testes diagnósticos do desenvolvimento (VIGOTSKY, 1998a, p.115).

As funções psicológicas são desenvolvidas na coletividade e dependem da

mediação, em especial, dos adultos, para que sejam movimentadas. Entendemos, a

partir disso, a importância da escola e da atividade pedagógica direcionada,

mediada pelo professor, e das relações com o conhecimento sócio-histórico como

propulsoras do desenvolvimento. Isso nos leva a pressupor que as atividades

lúdicas aplicadas na educação infantil precisam envolver percepção, memória,

linguagem e pensamento, abstração, atenção e imaginação, entre outros, os quais

são próprios ao homem e são desenvolvidos por meio da utilização de instrumentos

adquiridos culturalmente. Assim,

“[...] o processo de aprendizado não pode, nunca, ser reduzido simplesmente à formação de habilidades, mas incorpora uma ordem intelectual que torna possível a transferência de princípios gerais descobertos durante a solução de uma tarefa para várias tarefas” (VIGOTSKY, 1998a, p.109).

Compreendemos que a infância pré-escolar é um período especialmente

importante no curso do desenvolvimento do indivíduo. É nessa fase que o mundo da

realidade humana torna-se um convite à exploração e elaboração do conhecimento,

mediadas pela atividade do ser humano, sobretudo em seu brincar que, nesse

estágio específico, não fica só na manipulação dos objetos. A criança age sobre

esses objetos, descobrindo todas as suas possibilidades, pois o modo de pensar

envolve o que foi elaborado socialmente pela humanidade histórica e por atividades

externas e internas que são ferramentas que têm a função de atuar como

mediadores na formação do homem cultural. As atividades externas e internas estão

em direções diferentes, mas se complementam.

A atividade que se destaca na infância, por sua importância e freqüência, é o jogo. Brincar é uma atividade séria para a criança na medida em que ela mobiliza possibilidades intelectuais e afetivas para sua realização. Na brincadeira, o motivo está no próprio processo, ou seja, o que motiva a criança é a atividade em si. Através dos jogos e brincadeiras, a criança aprende a conhecer a si própria, as pessoas que a cercam, as relações entre as pessoas e os papéis que elas assumem. Ela aprende sobre natureza, os eventos sociais, a estrutura e a dinâmica interna de seu grupo. É através deles, também, que ela explora as características dos objetos físicos que a rodeiam e chega a compreender seu funcionamento. Os jogos se classificam em jogos com predomínio da fantasia infantil e jogos com

Page 10: A IMPORTÂNCIA DE ESTUDOS TEÓRICOS SOBRE O BRINCAR … · criança; a importância da mediação do educador no uso de brincadeiras no processo de ensino; e a influência do brincar

predomínio de regras. Os primeiros jogos da criança pertencem à primeira categoria e são estes que vamos encontrar com maior freqüência no caso da criança pré-escolar. Os jogos com predominância de regras envolvem conteúdos e ações pré-estabelecidas que regularão a atividade da criança e são encontrados progressivamente à medida que a criança vai crescendo (LIMA, 2003, p.19).

A brincadeira criadora é uma atividade principal, que ocupa lugar especial no

cotidiano das crianças em idade pré-escolar. Toda criança gosta de brincar, e essa

atividade proporciona grande prazer, embora isso não seja uma regra geral da

brincadeira. Na pré-escola, pelo seu caráter prazeroso, o brinquedo infantil é

bastante utilizado pelo educador como forma de socialização. As crianças

reproduzem o que observam nos adultos, desenvolvendo habilidades importantes

para a vida presente e a futura. Os conhecimentos científicos são estimulados por

meio do educador na utilização dos brinquedos e estes, por sua vez, favorecem o

desenvolvimento das capacidades de comparar, analisar, abstrair e generalizar,

fundamentais no processo escolar. Para que os indivíduos se desenvolvam

intelectualmente, o meio precisa ser favorável, em termos de acessibilidade aos

instrumentos e objetos que se caracterizam como ciência e riqueza material e

intelectual, historicamente acumulada como patrimônio da humanidade.

A ciência está no cotidiano do aluno de qualquer idade, criança ou adulto, de qualquer classe social, pois está na cultura, na tecnologia, nos modos de pensar da sociedade de nossos dias. Toda criança detém, então, um conhecimento que está contido na teoria científica e que deve ser necessariamente articulado com o conceito científico que se lhe pretende ensinar. Este conhecimento é um conhecimento fragmentado e o aluno deverá ser levado, pela ação do professor, a superar essa visão fragmentada para chegar à compreensão do conhecimento formal. O ponto de partida é este saber que o aluno constrói em seu cotidiano através da observação e das informações diversas. A criança lança hipóteses sobre o fato ou fenômeno e são estas hipóteses que deverão ser transformadas em conhecimento formal através da ação pedagógica (LIMA, 2003, p.21).

O brincar na escola não é a mesma coisa que o brincar em casa ou em um

parque, pois este está vinculado, especialmente, a atividades físicas. No caso da

escola, consideramos o espaço em que a criança se apropria de algumas

habilidades específicas, bem como da apropriação de conhecimentos produzidos

historicamente.

A aprendizagem da criança não pode ser entendida simplesmente como aprendizagem de conhecimento formal, pois, além de aprender as coisas que lhe são ensinadas na creche, na pré-escola e na escola, aprende também a desempenhar papéis, a se relacionar afetivamente com as outras pessoas da família e da comunidade e a agir como elemento integrante do

Page 11: A IMPORTÂNCIA DE ESTUDOS TEÓRICOS SOBRE O BRINCAR … · criança; a importância da mediação do educador no uso de brincadeiras no processo de ensino; e a influência do brincar

grupo. Desta forma, o aspecto afetivo do desenvolvimento é tão importante quanto o cognitivo (LIMA, 2003, p.18).

O brinquedo deixa de ser lúdico quando privilegia os aspectos cognitivos e

passa a ser sério. O professor está, atualmente presente na escola, sendo

considerado um adulto que geralmente não brinca junto com a criança, ele conduz o

processo didático pedagógico e esquece que o lúdico é bem mais que uma maneira

de se aprender. O brincar envolve a criança por inteiro, vai além da atividade

cognitiva, e não importa se a criança está na escola ou em outro ambiente: ela não

brinca pela metade. Em suas brincadeiras, a criança se relaciona, descobre,

imagina, desenvolve capacidades relacionadas ao corpo, à cognição e aos aspectos

socioafetivos.

Se o brinquedo perder a função lúdica, perde o sentido, o que ocorre muitas

vezes, pois ao invés de a criança aprender brincando, o brinquedo é usado para ela

aprender; quando o brincar é apenas uma atividade didática, a criança é

desestimulada a participar e a se envolver. É importante fazer do brincar um

momento de conhecimento e interação do adulto com a criança e das crianças com

as outras crianças, valorizando-se as aprendizagens, aquilo que o indivíduo pode

realizar com a ajuda de outra pessoa mais experiente.

[...] existem jogos em que a própria atividade não é agradável, como, por exemplo, predominante no fim da idade pré-escolar, os jogos que são só dão prazer à criança se ela considera o resultado interessante. Os jogos esportivos (não somente os esportes atléticos, mas também outros jogos que podem ser ganhos ou perdidos) são, com muita freqüência, acompanhados de desprazer, quando o resultado não é favorável para a criança (VIGOTSKI, 1998b, p. 121).

O brinquedo preenche necessidades interiores da criança, sejam elas

espontâneas, que dão prazer, sejam elas com objetivos claros que envolvem regras.

Vigotski (1998b) chamou de processo de internalização aquele que explica como

nos tornamos humanos à medida que vamos, aos poucos, internalizando as formas

socioculturais produzidas pela humanidade em seu percurso histórico. As

brincadeiras são associadas e são experimentadas pelas crianças em suas relações

com o mundo e respondem a uma necessidade socialmente desejável,

transformadora e individualmente necessária.

Leontiev (2001) afirma que a interação com o outro e com o meio que o cerca

proporciona aos indivíduos a construção dos significados, do pensamento e de si

mesmos em um processo mediado pelos instrumentos socialmente disponíveis. A

Page 12: A IMPORTÂNCIA DE ESTUDOS TEÓRICOS SOBRE O BRINCAR … · criança; a importância da mediação do educador no uso de brincadeiras no processo de ensino; e a influência do brincar

mediação é um dos processos interativos que, em geral, fornece aos seres humanos

os recursos para que se apropriem ativamente das formas culturalmente

desenvolvidas de pensamento e ação, em um processo que, em princípio, é sempre

social e exterior e somente depois se torna próprio do sujeito interior.

O brinquedo, a imaginação da criança é, segundo Vigotski (1998b), uma

atividade especificamente humana e consciente, que surge da ação. É nas ações

que a criança representa situações que já foram, de alguma forma, vivenciadas por

ela em seu meio sociocultural. Um aspecto importante a ser examinado na

brincadeira infantil e sua função no desenvolvimento da criança é o conceito de zona

de desenvolvimento proximal, ou zona de desenvolvimento imediato. De acordo com

Vigotski (1998b, p.134-135),

O brinquedo cria na criança uma zona de desenvolvimento proximal, que é por ele definida como a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes.

Para o autor, o nível de desenvolvimento real refere-se a tudo aquilo que a

criança já tem apropriado em seu desempenho cotidiano e que ela é capaz de

realizar sozinha sem a interferência de um adulto ou de uma criança mais

experiente. Já a zona de desenvolvimento próximo refere-se aos processos mentais

que estão em construção na criança, ou que ainda não amadureceram. É, pois, um

domínio psicológico em constantes transformações aquilo que a criança é capaz de

fazer hoje com a ajuda de alguém e o que conseguirá fazer sozinha no futuro. É

nesse sentido que a brincadeira pode ser considerada um excelente recurso a ser

usado quando a criança chega à escola, por ser parte essencial de sua natureza.

O professor, enquanto sujeito mediador do processo de ensino-

aprendizagem, deve ter claro que o aprendizado da criança começa muito antes de

ela frequentar a escola e que há diferenças entre esses conhecimentos. Desde que

nasce, a criança está em contato com o mundo do adulto, aprendendo por modelos

que são encontrados no decorrer do seu desenvolvimento, e é nesse mundo que ela

se apropria de conhecimentos empíricos, e na escola, sob a orientação do professor,

esse conhecimento varia de criança para criança. Segundo Vigotski (1998a, p.112),

[...] a zona de desenvolvimento proximal da criança é a distância entre seu desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas e o nível de seu desenvolvimento potencial,

Page 13: A IMPORTÂNCIA DE ESTUDOS TEÓRICOS SOBRE O BRINCAR … · criança; a importância da mediação do educador no uso de brincadeiras no processo de ensino; e a influência do brincar

determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes.

A ludicidade, a nosso ver, é muito importante para a saúde mental do ser

humano, é um aspecto que merece a atenção dos adultos, pais e educadores, pois é

o momento para a expressão natural do ser, direito de toda criança para o exercício

da relação afetiva com o mundo, com as pessoas e com os objetos. Brincando, a

sua inteligência e sensibilidade são desenvolvidas e o brincar garante que suas

potencialidades e sua afetividade se harmonizem.

UM NOVO OLHAR PARA O BRINCAR NA ESCOLA

Para que o brincar na escola se torne significativo e prazeroso, as atividades

pedagógicas precisam ter um novo olhar, um novo sentido, é preciso que haja, por

parte do educador da educação infantil, mais reflexões e observações nas

interações das crianças com os objetos e entre si, o que dá às intervenções

pedagógicas um novo sentido como atividade principal. Mas não podemos esquecer

que

A relação da criança com o adulto na escola é uma relação específica, porque o professor não é simplesmente mais um adulto com quem a criança interage – ele é um adulto com uma tarefa específica. A instituição escolar foi constituída na história da humanidade como espaço de transmissão do conhecimento formal historicamente construído. Não se trata, portanto, da reprodução do cotidiano que o educando vive fora da instituição. O processo de educação formal propõe, na verdade, a transformação do conhecimento que a criança traz de sua experiência no dia a dia. A vinda da criança para a instituição tem um objetivo claro e determinado: aprender determinados conhecimentos e, para tanto, dominar instrumentos específicos que lhe possibilitem esta aprendizagem. A relação da criança com o adulto, na escola, é mediada, então, pelo conhecimento formal. O professor detém o conhecimento formal que o educando deverá adquirir e a interação entre ambos deve ser tal que permita e promova a aprendizagem deste conhecimento. Desta forma, podemos dizer que a ação do professor é uma ação específica e apresenta, portanto, características que a distinguem da ação dos outros adultos com quem a criança convive (LIMA, 2003, p. 21).

A criança organiza a brincadeira de forma espontânea e autônoma, e ao

professor cabe organizar ambientes com brinquedos de maneira que possa

estimular a criança a brincar, fornecendo informações, ajudando, incentivando,

mesmo quando as crianças não lhe peçam. O educador precisa ser mediador entre

o brinquedo e a criança, tendo cuidado ao propor brincadeiras, pois determinados

alunos simplesmente ficam de fora, alguns são agressivos e atrapalham o brinquedo

enquanto outros que são apáticos e ficam sentados, olhando. As crianças não

Page 14: A IMPORTÂNCIA DE ESTUDOS TEÓRICOS SOBRE O BRINCAR … · criança; a importância da mediação do educador no uso de brincadeiras no processo de ensino; e a influência do brincar

podem ser forçadas a participar, senão a atividade perde seu objetivo, elas precisam

do apoio do professor para que, por exemplo, fiquem sentadas juntas, sendo

necessário que se diversifique o tema das brincadeiras, com a finalidade de atrair a

atenção de todos. A brincadeira é uma atividade informal, que se desenvolve sem

que haja investimento de objetivos pedagógicos. Nos jogos didáticos, a brincadeira é

dirigida.

Os encaminhamentos pedagógicos mais usados nos jogos e brincadeiras são

orais e práticos; ao realizar as atividades oralmente, de forma lúdica, a professora

entra em contato com as crianças, e as orientações ocorrem por meio de perguntas

que devem prender a atenção das crianças e levá-las a pensar. Também ela pode

dar sugestões para garantir que a brincadeira flua, lembrando sempre que esse

procedimento não pode podar a imaginação da criança. Os educadores exercem

papel importante como mediadores no desenvolvimento e na aprendizagem da

criança.

A criança precisa de oportunidades para desenvolver suas potencialidades e

aprendizagens e quem deve garantir isso são os adultos, oferecendo os mais

diversos tipos de jogos e brincadeiras.

As situações-problema usadas na manipulação dos jogos e brincadeiras

fazem a criança crescer ao tentar encontrar soluções e alternativas, desenvolver a

concentração, a atenção, o engajamento e a imaginação. Para que o brinquedo seja

significativo para a criança, é preciso que ele tenha relação com a sua realidade

infantil e faixa etária, pois por meio da observação e do desempenho das crianças

com seus brinquedos podemos avaliar seu nível de desenvolvimento motor e

cognitivo. No processo lúdico, manifestam-se as potencialidades da criança e, ao

observá-las, podemos enriquecer sua aprendizagem, fornecendo, por meio dos

brinquedos, os benefícios que favorecem o seu desenvolvimento.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os alunos do Curso de Formação de Docentes, mediante estudos realizados

durante a implementação, constataram que precisam ter clareza da importância de

dominar os conhecimentos/conteúdos curriculares, bem como o conhecimento

didático-curricular (SAVIANI, 1997). A aluna L.M. relatou:

[...] bom, eu considero a fundamentação teórica essencial pois só

Page 15: A IMPORTÂNCIA DE ESTUDOS TEÓRICOS SOBRE O BRINCAR … · criança; a importância da mediação do educador no uso de brincadeiras no processo de ensino; e a influência do brincar

conseguimos explicar ou desenvolver um conteúdo, mesmo sendo ele o de brincadeiras, necessitamos de um aprofundamento no tema, para que possamos passar aos alunos algo de forma ampla, o curso me acrescentou muito em meus conhecimentos tais que me ajudaram nas aplicações dos jogos em minha ação docente!

Os alunos também afirmaram, durante os estudos, que brincar na Educação

Infantil é muito importante e que durante as brincadeiras é preciso ter intenções

claras da ação praticada para que ocorra a ação do brincar na educação infantil;

sublinharam ainda que é necessário fundamentação sobre a importância do brincar

no processo de ensino-aprendizagem, por meio dos estudos de Vigotski (1998b).

Consideramos que o educador atual precisa compreender que o homem

desvinculado da História é um homem somente pertencente à espécie humana, não

é representante do gênero humano. O homem social, isto é, humano, é diferente dos

animais, a sua natureza humana é histórica e cultural. O docente, nesse sentido,

precisa ver em seus alunos o homem a partir de suas relações e práticas concretas

com outros homens e de suas preocupações, não somente com a sobrevivência,

mas, sobretudo, com seus projetos. O entendimento dos homens, a partir de suas

características peculiares a cada fase do desenvolvimento da humanidade, nos

possibilita avaliá-los como sujeitos que fazem a História e produzem conhecimento.

Conforme Arruda (2005) pontua, o professor tem papel importante como

agente mediador do processo de aprendizagem quando leva em considerações as

diferenças individuais e proporciona atividades diversificadas e motivadoras, que

fazem do ensino e da aprendizagem grandes aventuras. Assim, conhecer as fases

do desenvolvimento biopsicossocial da criança e suas implicações para a educação

favorece maior sucesso no trabalho com as crianças, o que precisa ser iniciado por

meio de aulas que despertem o interesse para a atividade física e para o desporto.

Se a finalidade do ensino é possibilitar aos educandos a realização de ações

mentais, uma vez que ampliam a capacidade de interação entre os sujeitos com a

realidade objetiva para além da experiência imediata ou a resolução de um problema

concreto e prático, trata-se de uma prática pedagógica voltada para o

desenvolvimento das funções complexas do pensamento. Podemos afirmar, dessa

maneira, que o objeto principal do ensino-aprendizagem é o processo de

humanização pela apropriação dos conhecimentos elaborados.

Os alunos, a nosso ver, precisam ser preparados para integrar a vida da

sociedade na igualdade de grau de desenvolvimento intelectual, sem

Page 16: A IMPORTÂNCIA DE ESTUDOS TEÓRICOS SOBRE O BRINCAR … · criança; a importância da mediação do educador no uso de brincadeiras no processo de ensino; e a influência do brincar

empobrecimento dos conteúdos que para tanto são considerados essenciais. É

importante que os educadores compreendam que não se aprendem conceitos

científicos como se aprendem conceitos espontâneos, ou seja, apenas interagindo

em situações práticas com outras pessoas, objetos e fenômenos. Os conceitos

científicos não podem ser apenas um acessório, pois necessitam de mediação

intencionalmente organizada.

O jogo e a brincadeira são fontes de aprendizagem e desenvolvimento

intelectual, por meio dos quais os docentes, sendo mediadores, podem atuar junto

às capacidades ou potencialidades da criança. Para que isso ocorra, os futuros

professores necessitam de fundamentação sólida dos valores e propósitos para

defender que na Educação Infantil as atividades de jogo e brincadeiras são

necessárias e importantes.

Destacamos, enfim, que o Projeto nos possibilitou o entendimento de que o

brincar oferece à criança possibilidades de descobertas e encaminha a

aprendizagem, inclusive, porque o professor, ao observar a crianças brincando, as

compreende em seu processo de desenvolvimento.

Em nossas discussões no GTR (Grupo de Trabalho em Rede) e durante a

implementação do Projeto na escola, ficou clara a preocupação de professores do

Curso de Formação de Docentes em oferecer brincadeiras com encaminhamentos

metodológicos bem definidos, criando espaço para situações lúdicas e manifestando

que o brincar na Educação Infantil deve ser planejado, organizado pelo educador,

com objetivos definidos, sendo a atividade principal visando à formação um homem

omnilateral.

Diante das discussões, foram unânimes as ponderações quanto à dificuldade

que professores do Curso de Formação têm em trabalhar com os alunos as

fundamentações teóricas sobre o lúdico, pois os acadêmicos, quando se deparam

com esse assunto, só o relacionam com o brincar sem propósitos pedagógicos e

acaba ficando o brincar pelo brincar.

Esse fato foi comprovado ao aplicarmos o Projeto com as alunas do 3º ano do

Curso de Formação de Docentes. Entretanto, ao se depararem com as leituras e

discussões sobre estudos de Vigotski e Leontiev, concluíram algo diferente. Vejamos

um exemplo de depoimento:

[...] os professores são preparados através de sua formação inicial e continuada oferecida pelos Municípios, porém só o preparo não é suficiente,

Page 17: A IMPORTÂNCIA DE ESTUDOS TEÓRICOS SOBRE O BRINCAR … · criança; a importância da mediação do educador no uso de brincadeiras no processo de ensino; e a influência do brincar

o professor precisa ter vontade de trabalhar e consciência da importância do brincar. Durante as observações dos nossos alunos na Ed. Infantil e também como mãe, pois tenho dois filhos que freqüentam a Ed. Infantil, percebo que alguns dos professores da Educação Infantil (nem todos, não podemos generalizar) se acomodam e acabam por usar mais as brincadeiras livres, sem intervir, sem mediar os momentos de brincadeiras das crianças, e estas acabam por perder a motivação, e não tendo o desenvolvimento esperado e necessário para esta fase. Há por parte de alguns professores um descaso quanto a esta fase, pois acreditam que os estabelecimentos de Ed. Infantil são espaços apenas de cuidado, não de aprendizagem, pois não há uma cobrança concreta quanto ao desenvolvimento da criança, não há avaliações como provinha Brasil, entre outros. Creio que isto venha a colaborar para este descaso (Professor GRT) [sic].

De acordo com a professora do GTR,

[...] alguns fatores [que] dificultam sim a aplicabilidade no dia a dia dentro dos centros de Educação Infantil as atividades lúdicas. Um destes fatores é falta de conhecimento da importância do lúdico para o desenvolvimento psicológico nestas crianças, pasme! Sim, ainda temos este fator dentro dos nossos centros. O descaso é pior ainda, pois mesmo conhecendo ainda as vezes não se é dado a devida e real importância que se torna ainda pior. Segundo fator é falta de investimento na Educação. Sendo assim a falta tempo para criar e organizar/direcionar todas estas brincadeiras e jogos, de acordo como deve ser feito/trabalhado, pois não se investe em educação, portanto não se tem materiais suficiente, e então o profissional da educação precisa comprar, ou criar quase tudo, e conseqüentemente não se tem tempo para isso. Penso que estes dois pontos são os mais graves [sic].

Diante das falas dos professores, fica evidente que os alunos do Curso de

Formação de Docentes precisam ser mais bem preparados a respeito do

desenvolvimento do psiquismo humano e da relação entre aprendizagem e

desenvolvimento intelectual, também sobre os pressupostos teóricos da atividade

brincar, conforme os estudos de Vigotski e Leontiev, resgatando conceitos da

brincadeira infantil e da formação humana.

Por meio das discussões durante a implementação e no GTR (Grupo de

Trabalho em Rede), notamos que o brinquedo é considerado a essência da infância

e sua principal atividade, mas que as instituições não estão desenvolvendo práticas

que tomem esse pressuposto como orientador da organização de suas aulas.

Todos que têm contato com instituições escolares percebem que há um

despreparo, por parte dos educadores, relativo ao conhecimento das necessidades

básicas das crianças pequenas e, principalmente, em relação ao brincar, um

desconhecimento de sua função como linguagem e principal forma de interação com

o mundo. Não há compreensão de que por meio da brincadeira, a criança expressa

sua forma de representação da realidade, cria situações imaginárias em que se

comporta como se estivesse agindo no mundo do adulto e amplia seu conhecimento

sobre o mundo; que no ato de brincar, os sinais, os gestos, os objetos e os espaços

Page 18: A IMPORTÂNCIA DE ESTUDOS TEÓRICOS SOBRE O BRINCAR … · criança; a importância da mediação do educador no uso de brincadeiras no processo de ensino; e a influência do brincar

valem e significam outra coisa daquilo que apresentam ser. E que ao brincar, a

criança recria e repensa os acontecimentos que lhes deram origem. É necessário

que os educadores conheçam os comportamentos das crianças conforme suas

etapas de desenvolvimento, uma vez que elas, principalmente nas creches, passam

a maior parte de seu tempo. Saibam que as crianças utilizam-se de várias formas de

representação, como o desenho, a linguagem, a imitação, o jogo de faz de conta, e

esses elementos vão se constituindo em recursos de socialização e, historicamente,

conforme o ambiente cultural, vão produzindo os saberes infantis sobre o mundo.

Que o brinquedo e as brincadeiras são atividades culturalmente pertencentes ao ser

humano. “A criança está inserida, desde o seu nascimento, num contexto social e

seus comportamentos estão impregnados por essa imersão inevitável”

(BROUGÉRE, 2001, p. 97-98).

Por ser a escola o ambiente privilegiado de apropriação da cultura, a criança

aprende, ali, as formas como os elementos culturais são apresentados; no entanto,

observamos o desconhecimento do adulto sobre a importância do brincar das

crianças e sobre essa apropriação por meio do brinquedo.

As escolas, em sua maioria, por não se apropriarem de conhecimentos

relativos à importância do brinquedo e do brincar, não possibilitam espaços e

tempos para essa atividade, trocando-os por uma escolarização precoce e ou como

forma de relaxamento ou de descarga de energia ou, ainda, como premiação.

Portanto, nós, professores do Curso de Formação de Docentes, precisamos

dar suporte teórico para nossos alunos, acreditar e fazê-los acreditar que a

brincadeira é fonte de desenvolvimento das funções psíquicas superiores, essenciais

na aquisição de conhecimentos, que podem se realizar de forma prazerosa e

adequada à infância.

REFERÊNCIAS

ARRUDA, C. R. O desenvolvimento psicomotor. In: CAMARGO, J. S.; ROSIN, S. M. (Org.). Psicologia e educação: compartilhando saberes. Maringá: EDUEM, 2005. p. 23-34.

BOGOYYAVLENSKY, D. N.; MENCHINSKAYA, N. A. Relação entre aprendizagem e desenvolvimento psicocultural da criança em idade escolar. In: LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. L.; VYGOTSKY, L. S. et al. Psicologia e pedagogia: bases psicológicas da aprendizagem e do desenvolvimento. São Paulo: Moraes, 1991. p. 35-47.

BROUGÉRE, G. Brinquedo e cultura. São Paulo: Cortez, 2001 [Coleção: Questões

Page 19: A IMPORTÂNCIA DE ESTUDOS TEÓRICOS SOBRE O BRINCAR … · criança; a importância da mediação do educador no uso de brincadeiras no processo de ensino; e a influência do brincar

da Nossa Época, n. 43].

BRASIL. Declaração dos Direitos da Criança – 1959. São Paulo: Biblioteca Virtual de Direitos Humanos. Universidade de São Paulo – USP. Disponível em: <http://www.direitoshumanos.usp. br/index.php/Crian%C3%A7a/declaracao-dos-direitos-da-crianca.html>. Acesso em: 31 maio 2012.

BRASIL. Constituição do Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil. (Texto promulgado em 05 de outubro de 1988). Brasília, DF, 1988. Disponível em: <http://pdba.georgetown.edu/Constitutions/Brazil/brazil88.html>. Acesso em: 31 maio 2012.

______ . Estatuto da Criança e do Adolescente (1990). Estatuto da criança e do adolescente: Lei nº. 8.069, de 13 de julho de 1990, Lei n. 8.242, de 12 de outubro de 1991. 3. ed. Brasília, DF: Câmara dos Deputados, Coordenação de Publicações, 2001. Disponível em: <http://www.desenvolvimentosocial.sp. gov.br/a2sitebox/ arquivos/documentos/182.pdf>. Acesso em: 31 maio 2012.

KLEIN, L. R. Fundamentos para uma Proposta Pedagógica. 2010. Disponível em: <http://www.pedagogia.seed.pr.gov.br/arquivos/File/semanas_pedagogicas/2010/fundamentos_proposta_ped_klein.pdf>. Acesso em: 3 maio 2012.

LEONTIEV, A. N. Os princípios psicológicos da brincadeira pré-escolar. In: VIGOTSKII, L. S.; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. 9. ed. São Paulo: Ícone, 2001. p. 119-142.

LIMA, E. C. de S. Algumas questões sobre o desenvolvimento do ser humano e a aquisição de conhecimentos na escola. In: PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Currículo Básico para a Escola Pública do Estado do Paraná. Curitiba: SEED, 1990. p. 18-21.

MORAIS, S. G. de M. Concepção de desenvolvimento e aprendizagem em Vigotski e a avaliação. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2008.

PADILHA, A.; BARROS, M. S. F.; SANTOS, E. F. A importância do brincar no desenvolvimento infantil: um olhar para a criança na atualidade. In: SIMPÓSIO NACIONAL DE EDUCAÇÃO, 2.; SEMANA DE PEDAGOGIA – INFÂNCIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO, 21.; Anais... Cascavel, 2010.

PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Superintendência de Educação. Departamento de Educação e Trabalho. Fundamentos teóricos-metodológicos das disciplinas da Proposta Pedagógica Curricular do Curso de Formação de Docentes – Normal, em Nível Médio. Curitiba: SEED, 2008.

SAVIANI, D. A função do docente e a produção do conhecimento. Educação e Filosofia, Uberlândia, v. 11, n. 21 e 22, p. 127-140, jan./jun. e jul. dez. 1997. Disponível em: <http://www.seer.ufu.br/index.php/EducacaoFilosofia/article/ view/889/806>. Acesso em: 31 mar. 2012.

VYGOTSKY, L. S. Interação entre aprendizado e desenvolvimento. In: ______. A formação social da mente. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998a. p. 103-119.

Page 20: A IMPORTÂNCIA DE ESTUDOS TEÓRICOS SOBRE O BRINCAR … · criança; a importância da mediação do educador no uso de brincadeiras no processo de ensino; e a influência do brincar

______ . O papel do brinquedo no desenvolvimento. In: ______. A formação social da mente. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998b. p. 121-137.

______. Aprendizagem e desenvolvimento intelectual na idade escolar. In: VIGOTSKII, L. S.; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. 9. ed. São Paulo: Icone, 2001. p. 103-117.