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Marlon Damasceno

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A Impenhorabilidade do bem da Família

Ellen Christina Almeida Alves Fábio Melo Valverde Marlon Damasceno dos Santos

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Sumário

Situando ..................................................................................................................... 04 Significado Prático ...................................................................................................... 04 Conceito, Natureza Jurídica e Classificação do Bem de Família .............................. 05 Em defesa da impenhorabilidade do Bem da Família ............................................... 06 Exceções á impenhorabilidade .................................................................................. 12 Considerações Finais ................................................................................................. 13 Bibliografia .................................................................................................................. 14 Sites Visitados ............................................................................................................ 15

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SITUANDO...

A lei n° 8009 de 29 de março de 1990 – que dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família - é uma

conversão da Medida Provisória n° 43 de 1990, conforme verificamos no próprio preâmbulo da referida lei:

"Faço saber que o PRESIDENTE DA REPÚBLICA adotou a Medida Provisória nº 143, de 1990, que o

Congresso Nacional aprovou, e eu, NELSON CARNEIRO, Presidente do Senado Federal, para os efeitos

do disposto no parágrafo único do art. 62 da Constituição Federal, promulgo a seguinte lei...”.

SIGNIFICADO PRÁTICO.

Vejamos o que significou a Lei 8009/90 para a maior parte da população. Aqueles cujo imóvel seja

residencial próprio do casal ou da entidade familiar. Um problema médico provoca necessidade imediata

de R$ 2.000 para uma cirurgia de urgência. Antes da Lei 8.009 qualquer vizinho ou parente que tivesse

poupança, dólares ou qualquer tipo de investimento com liquidez, podia emprestar a quantia necessária.

Documentado o empréstimo, o inadimplemento resultaria na possibilidade ao credor de, mediante

execução judicial, forçar o pagamento.

Após a Lei 8.009/90, inexiste maneira de cobrar um devedor que possua apenas a residência onde

mora e os bens que a guarnecem, em detrimento do disposto no art.591, do CPC, que assegura: "O

devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações, com todos os seus bens presentes e

futuros...". A Lei 8.009 retirou dos credores não elencados no seu artigo 3°, qualquer possibilidade de obter

a satisfação do crédito pela via jurisdicional.

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CONCEITO, NATUREZA JURÍDICA E CLASSIFICAÇÃO DO BEM DE FAMÍLIA.

Transcrevemos aqui na íntegra, a definição do que vem a ser o “Bem da Família” o qual o

legislador buscou proteger ao normatizar na forma da lei em comento, nas palavras de Pablo Stolze:

"[...] podemos compreender o bem de família como o bem jurídico cuja titularidade se protege em

benefício do devedor — por si ou como integrante de um núcleo existencial —, visando à preservação do

mínimo patrimonial para uma vida digna".

Segundo a ilustre doutrinadora Maria Helena Diniz, “o bem de família convencional ou voluntário é

um prédio ou parcela do patrimônio que os cônjuges, ou conviventes (entidade familiar), destinam para

abrigo e domicílio desta, com a cláusula de ficar isento da execução por dívidas futuras. Esse instituto visa

a assegurar um lar à família, pondo-a ao abrigo de penhoras por débitos posteriores à instituição, salvo os

que provierem de impostos relativos ao prédio".

Álvaro Vilaça Azevedo conceitua bem de família como sendo “um meio de garantir um asilo à família,

tornando-se o imóvel onde a mesma se instala domicílio impenhorável e inalienável, enquanto forem vivos

os cônjuges e até que os filhos completem sua maioridade”.

Quanto à natureza jurídica, AZEVEDO afirma que no direito brasileiro, o bem de família “é um patrimônio

especial, que se institui por ato jurídico de natureza especial, pelo qual o proprietário de determinado

imóvel, nos termos da lei, cria um benefício de natureza econômica, com escopo de garantir a

sobrevivência da família, em seu mínimo existencial, como célula indispensável à realização da justiça

social’’.

Definida a impenhorabilidade pela Lei nº 8.009/90 e ressalvadas as exceções nela contida, a expropriação

do bem de família não existe, ocorrendo a impossibilidade de transmissão de domínio. Isto faz com que o

bem de família seja um patrimônio com destinação específica.

Conforme já mencionado acima, a Lei de Impenhorabilidade do Bem de Família é norma de ordem

pública, sendo, portanto, imperativa ou impositiva, não havendo, uma vez instituído o bem de família,

possibilidade de sua disposição pelas partes. Quanto à sua classificação, o bem de família divide-se em

bem de família facultativo e em bem de família legal. A Lei 8.009/90 dispõe sobre o bem de família legal e

o Novo Código Civil, nos artigos 1.711 a 1.722, regula o bem de família facultativo.

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EM DEFESA DA IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA

Presentemente, vislumbram-se inúmeras discussões em torno da possibilidade de renúncia à regra

da impenhorabilidade do bem de família, mormente ante o fato de que alguns devedores oferecerem o

bem de família em garantia de dívidas, no processo executório, seja no ato da penhora, seja em transação

homologada em juízo.

Alguns tribunais pátrios defendem a tese de que, uma vez renunciado o direito outorgado pela Lei

8009/90, perde o devedor a possibilidade de arguir este diploma legal em sua defesa, sendo plenamente

eficaz a expropriação do bem de família.

Em que pesem as mais respeitáveis opiniões nesse sentido, entendemos não ser possível a

renúncia ao direito de impenhorabilidade do bem de família, por se tratar de norma de ordem pública e,

portanto, por afigurar-se, na hipótese, a indisponibilidade do direito.

Nessa seara, defendemos a nulidade do ato pelo qual o devedor oferece o bem imóvel destinado à

residência permanente da família em garantia de uma dívida, no momento da penhora ou em qualquer ato

que implique transação.

Isto se dá, porque o ato não encontra respaldo legal, se apresentando com objeto ilícito, o que,

possivelmente, acarretará sua nulidade absoluta.

Para embasar a tese a qual nos filiamos traremos, a seguir, a opinião dos mais ilustres

doutrinadores e tribunais brasileiros.

O Ilustre doutrinador César Fiúza determina quatro requisitos para que um ato jurídico seja válido,

quais sejam: o sujeito deve ser capaz, o objeto possível, o motivo lícito e a forma deve ser prescrita ou não

defesa em lei. Nessa discussão, objeto possível seria aquele realizável tanto material quanto

juridicamente.

Para Caio Mário da Silva Pereira, a validade do ato, além de outras hipóteses, reclama condição

objetiva válida, ou seja, "o objeto há de ser lícito. Se é fundamental na sua caracterização a conformidade

com o ordenamento da lei, a liceidade do objeto ostenta-se como elemento substancial, essencial à sua

validade e confina com a possibilidade jurídica, já que são correlatas as ideias que se expõem ao dizer do

ato que é possível frente à lei, ou que é lícito”.

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Desta forma, subsume-se a renúncia à regra da impenhorabilidade do bem de família à

hipótese de impossibilidade jurídica/ilicitude do objeto, tendo em vista que o objeto de transação judicial foi

bem imóvel destinado à habitação residencial.

A impossibilidade jurídica ou ilicitude do objeto se apresenta, claramente, na matéria em análise,

posto que a penhorabilidade do bem de família não é acolhida pelo ordenamento jurídico em que casos

que não se enquadrem nas hipóteses previstas para que a penhorabilidade do bem de família possa

ocorrer.

Assim, conforme determina a Lei 8009/90, em seu artigo 1º, "o imóvel residencial próprio do casal,

ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial,

fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam

seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei”.

Considera-se, para tanto, como imóvel residencial, aquele que seja a única propriedade utilizada

pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente (artigo 5º, Lei 8009/90). Dispõe o parágrafo

único do artigo 5º da Lei de Impenhorabilidade do Bem de Família que: “Na hipótese de o casal, ou

entidade familiar, ser possuidor de vários imóveis utilizados como residência, a impenhorabilidade recairá

sobre o de menor valor, salvo se outro tiver sido registrado, para esse fim, no Registro de Imóveis e na

forma do artigo 70 do Código Civil” [atual artigo 1.711 do Novo Código Civil].

O artigo citado permite ao devedor possuir mais de um imóvel utilizado como residência com a proteção

contra a penhorabilidade, entretanto, exige a lei que a impenhorabilidade recaia sobre o bem de menor

valor.

No mesmo dispositivo, o legislador põe a salvo a hipótese de o devedor já ter previamente instituído um de

seus imóveis como bem de família. Ocorrendo esta hipótese, o imóvel registrado no Registro de Imóveis

estará resguardado pela impenhorabilidade, independentemente de ser ou não o de maior valor. Se o

devedor possuir vários imóveis utilizados como residência e nenhum deles estiver registrado nos moldes

do Código Civil, avalia-se qual o de menor valor, estando este e os bens móveis que o guarnecem

tutelados pela impenhorabilidade.

Têm-se, pois, que as exceções à regra da impenhorabilidade, contidas no estatuto legal acima, tratam-

se de hipóteses taxativamente descritas no artigo 3º e seus incisos, e uma vez que a dívida não se imiscua

nestas hipóteses não será lícita à expropriação do bem de família.

Cumpre esclarecer, então, que o ato ou negócio que não preencha os requisitos de validade,

trazidos pelo ordenamento jurídico, acha-se eivado de defeito grave, o que acarreta, consequentemente, o

comprometimento de sua eficácia e reconhecimento. Trata-se, pois, o negócio contaminado de grave

defeito, de negócio jurídico absolutamente nulo.

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O Artigo 166 do Novel Código Civil é expresso ao determinar que:

"É nulo o negócio jurídico quando:

II – for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;

VII – a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção”.

Nota-se que a Lei 8009/90 veda expressamente a penhora de bem de família, portanto, o negócio

jurídico, em debate, viola expressa disposição legal, subsumindo-se a hipótese do inciso II do artigo

supracitado, posto que teve como fundamento objeto ilícito, ou seja, contrário à lei, e, ainda, o inciso VII, já

que há expressa proibição da prática da penhora do bem de família.

Na visão de Caio Mário da Silva Pereira, "se o negócio for ilícito, descamba para o terreno

daqueles fatos humanos insuscetíveis de criar direitos para o agente, sujeitando-o, porém, conforme a

profundidade do ilícito, a ver apenas desfeito o negócio, ou ainda a reparar o dano que venha a atingir a

esfera jurídica alheia. Quer isto dizer que a iliceidade do objeto ora conduz à invalidade do negócio, ora vai

além, e impõe ao agente uma penalidade maior.” Sabe-se, portanto, que é nulo o ato jurídico, quando em

razão do defeito grave que o atinge, não pode produzir o efeito almejado. A nulidade se apresenta,

portanto, como sanção para a ofensa à predeterminação legal.

A nulidade, neste caso, será insuprível pelo juiz, seja de ofício, seja a requerimento do interessado,

não poderá, também, ser o ato ratificado, posto que jamais convalescerá.

Determinam os artigos 168, parágrafo único, e 169 do Código Civil, respectivamente, que:

Art. 168, parágrafo único: "As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do

negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que

a requerimento das partes”.

Art. 169: "O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso

do tempo”.

Nessa linha de raciocínio, cumpre-nos analisar os efeitos da declaração de nulidade do negócio

jurídico. Para Rodolfo Pamplona Filho, "por se tratar de sentença proferida no bojo de ação declaratória

de nulidade, salvo norma especial em sentido contrário, os seus efeitos retroagem até a data de realização

do ato, invalidando-o ab initio (efeitos ex tunc). Declarado nulo o ato, as partes restituir-se-ão ao estado

em que antes dele se achavam, e, não sendo possível restituí-las, serão indenizadas com o equivalente”.

De acordo com a norma contida no artigo 182 do Código Civil:

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"Anulado o negócio jurídico, restituir-se-ão as partes ao estado em que antes dele se achavam, e,

não sendo possível restituí-las, serão indenizadas com o equivalente."

Ainda segundo Pamplona, "o bem de família é impenhorável, sendo excluído da execução por

dívidas posteriores à sua instituição, ressalvadas as que provierem de tributos ou despesas condominiais

relativas ao mesmo prédio”.

Em nosso socorro aproveita-se a lição de Theotônio Negrão:

"A alegação de que determinado bem é absolutamente impenhorável pode ser feita a todo tempo,

mediante simples petição e independentemente de apresentação de embargos à execução, mas o

devedor responde pelas custas de retardamento”.

No sentido de que o bem de família não poderá ser objeto de penhora e nem ao menos de

transação, por se tratar de matéria regida por norma de caráter público e, por isso, insuscetível de

disposição, João Roberto Parizzato estatui que:

"A penhora realizada sobre um bem de família é um ato ineficaz, por sua flagrante nulidade. Não

pode o bem em questão ser oferecido à penhora pelo devedor. Trata-se de regra de caráter público,

insuscetível, pois, de ser alterada pela pessoa que tenha instituído tal benefício".

Nessa seara, é válido acrescentar a lição do mestre Pontes de Miranda:

"Os bens inalienáveis não podem ser penhorados, porque toda penhora implica tomada de eficácia

do poder de dispor (abusus), e o devedor, dono desses bens não o tem".

Na arguta opinião de César Fiúza:

"O objetivo do legislador foi o de garantir a cada indivíduo um teto onde morar, mesmo que em

detrimento dos credores. Em outras palavras, ninguém tem o direito de ‘jogar quem quer que seja na rua’

para satisfazer um crédito. Por isso o imóvel residencial foi considerado impenhorável. Trata-se, aqui, do

princípio da dignidade da pessoa humana. O valor ‘personalidade’ tem preeminência neste caso, devendo

prevalecer em face de um direito de crédito inadimplido".

Cumpre ressaltar a importância que o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana assume no

ordenamento jurídico, devendo-se entendê-lo não como forma supletiva das lacunas da lei, mas sim como

fonte normativa, apta a exercer sua imperatividade e cogência nas relações jurídicas.

Com fincas à proteção da Pessoa Humana, a Carta Magna dispõe que:

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Artigo 1º: "A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e

Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como

fundamentos...

III – a dignidade da pessoa humana”.

Artigo 5º, caput: "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se

aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à

igualdade, à segurança e à propriedade privada (...)”.

Na emérita lição da ilustre professora Maria de Fátima Freire de Sá, "não podemos olvidar,

portanto, que valores como liberdade, igualdade e dignidade foram erigidos à categoria de princípios

constitucionais e referidos princípios incorporam as exigências de justiça, salvaguardando valores

fundamentais".

Nesta seara, seria interessante citar a opinião do autor Gustavo Tepedino ao afirmar que pretendeu

o constituinte, ao fixar cláusula geral e "mediante o estabelecimento de princípios fundamentais

introdutórios, definir uma nova ordem pública, da qual não se podem excluir as relações jurídicas privadas,

que eleva ao ápice do ordenamento a tutela da pessoa humana, funcionalizando a atividade econômica

privada aos valores existenciais e sociais ali definidos".

Humberto Theodoro Júnior, ao descrever os princípios informativos do processo de execução,

elucida de maneira brilhante a matéria:

"É aceito pela melhor doutrina e prevalece na jurisprudência o entendimento de que ‘a execução

não deve levar o executado a uma situação incompatível com a dignidade humana.’ Não pode a execução

ser utilizada como instrumento para causar a ruína, a fome e o desabrigo do devedor e sua família,

gerando situações incompatíveis com a dignidade da pessoa humana. Nesse sentido, institui o código a

impenhorabilidade de certos bens como provisões de alimentos, salários, instrumentos de trabalho,

pensões, seguros de vida etc.”.

"(...) a execução deve ser útil ao credor, e, por isso, não se permite sua transformação em

instrumento de simples castigo ou sacrifício do devedor”.

Ainda segundo Gustavo Tepedino, "a proteção dos direitos humanos, nos dias de hoje, reclama

análise interdisciplinar, concita o intérprete a harmonizar fontes nacionais e supranacionais, reformula, em

definitivo, o conceito de ordem pública, que se expande para os domínios da atividade econômica

privada”.

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Saliente-se, além da vasta opinião dos mais abalizados doutrinadores, acima transcritas, as

decisões de eméritos tribunais pátrios no que concerne a vedação da prática da penhora do bem de

família. Nesse sentido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO – BEM DE FAMÍLIA – RENÚNCIA – BEM

OFERECIDO A PENHORA PELO DEVEDOR – IMPENHORABILIDADE – DIREITO À MORADIA E

PROTEÇÃO DA FAMÍLIA – DIREITO CONSTITUCIONAL – NORMA DE ORDEM PÚBLICA – NULIDADE

DA PENHORA DECRETADA – PROVIDO – O direito à impenhorabilidade do bem de família é

irrenunciável, ainda que o devedor ofereça esse bem à penhora. A moradia e a proteção à família são

direitos assegurados constitucionalmente e constituem normas de ordem pública, cogentes e

irrenunciáveis, devendo ser declarada nula a penhora incidente sobre esses bens. (TJMS – AG

2002.009947-3 – 4ª T.Cív. – Rel. Des. Rêmolo Letteriello – J. 03.12.2002)

BEM DE FAMÍLIA – IMPENHORABILIDADE – LEI FEDERAL Nº 8009/90 – PROTEÇÃO À FAMÍLIA

DO DEVEDOR E MEIO DE EVITAR SITUAÇÕES CONSTRANGEDORAS – Por ser de ordem pública, a

impenhorabilidade do bem de família é norma inderrogável, oponível em processo de execução civil,

previdenciária, trabalhista ou de qualquer outra natureza, e não se inclui entre as exceções a que se refere

o art. 3º, inciso I a VII, da Lei Federal nº 8009/90. Esta, ao proteger a família do devedor, tem o condão de

evitar que ela (família) não só se coloque numa situação de penúria decorrente da dívida, mas também

numa posição constrangedora, ou seja, a de perder o seu único imóvel e ficar sem onde morar. (TJMG –

AC 000.236.277-0/00 – 4ª C.Cív. – Rel. Des. Hyparco Immesi – J. 19.09.2002).

LEI Nº 8.009/90 – MATÉRIA ARGUIDA EM EMBARGOS À EXECUÇÃO REJEITADOS, COM

TRÂNSITO EM JULGADO – PRECEDENTES DA CORTE – 1. Posto que a proteção do bem de família

prevista na Lei nº 8.009/90 não pode ser objeto de renúncia, o fato é que arguida a matéria em embargos

à execução, que foram rejeitados, transitando em julgado a sentença, não pode ser novamente apreciada

quando da realização da praça. Ademais, no caso, é insuficiente a fundamentação do especial para

desarmar o Acórdão recorrido quanto ao art. 471 do Código de Processo Civil. 2. Recurso Especial não

conhecido. (STJ – RESP 451204 – SP – Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito – DJU 25.08.2003 – p.

00298)

AGRAVO DE INSTRUMENTO – PRELIMINAR – NÃO ATENDIMENTO AO DISPOSTO NO ART.

526 DO CPC – RECURSO CONHECIDO – PRELIMINAR REJEITADA – MÉRITO – PENHORA – BEM DE

FAMÍLIA – MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA – PRECLUSÃO – NÃO INCIDÊNCIA – RECURSO PROVIDO

– 1. Consoante entendimento consolidado de nossa jurisprudência, o descumprimento do disposto no

artigo 526, do CPC, não constitui causa para o não conhecimento do agravo. 2. Tratando de matéria de

ordem pública, a impenhorabilidade do bem de família pode ser alegada em qualquer tempo e grau de

jurisdição, não se submetendo à preclusão. (TJRR – AI 0010.03.000297-5 – T.Cív. – Rel. p/o Ac. Des.

Cristóvão Suter – DJRR 29.05.2003 – p. 05).

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RECURSO ESPECIAL – AÇÃO RESCISÓRIA – SENTENÇA QUE JULGOU IMPROCEDENTE –

Embargos à arrematação. Não demonstração de que o imóvel penhorado trata-se de bem de família.

Nulidade da citação. Inocorrência. Alegada violação ao art. 135, III, do CTN. Ausência de pré-

questionamento. Súmula nº 07/STJ. Este Superior Tribunal de Justiça diverge acerca do cabimento de

embargos à arrematação para apontar impenhorabilidade de bem de família, havendo tanto julgados que

entendem se tratar de impenhorabilidade absoluta, matéria de ordem pública não sujeita à preclusão, (...).

(STJ – RESP 497739 – PR – 2ª T. – Rel. Min. Franciulli Netto – DJU 28.10.2003 – p. 00270) JCTN. 135

JCTN. 135. III

EXCEÇÕES À IMPENHORABILIDADE

A morada da família e determinados móveis e equipamentos que a guarnecem são impenhoráveis de

acordo com os preceitos ditados pela Lei 8.009/90. Entretanto, mesmo tutelando a entidade familiar ao

salvaguardar seus móveis e imóveis, a mesma lei estabeleceu também regras de exceção, relacionadas

nos incisos I a VII, de seu artigo 3º.

Sobre o assunto, AZEVEDO explica que:

A lei brasileira exclui da impenhorabilidade os veículos de transporte, as obras de arte e os adornos

suntuosos. Por essa mesma lei, os bens do devedor sem os benefícios do bem de família, podem ser

penhorados em razão de:

a) crédito de trabalhadores (empregados domésticos e trabalhadores, em geral, que prestam serviços na

residência, instituída em bem de família); b) crédito para construção ou aquisição do imóvel; c) crédito de

alimentos; d) créditos tributários, contribuições e obrigações propter em (é passível de execução, assim, o

bem de família, em razão de débitos derivados de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições,

sobre esse imóvel incidentes, bem como despesas geradas por esse imóvel, tais as de condomínio e as

de construção de muro divisório); e) crédito hipotecário (quando o imóvel é oferecido em garantia); f)

aquisição criminosa (do bem de família); g) crédito de fiança locatícia (quando o proprietário do bem é

fiador, em contrato de locação, dando o imóvel em garantia, criando-se, com isso, verdadeiro direito real).

É importante afirmar que tais exceções são elencadas em numerus clausus, ou seja, são delineados de

forma taxativa e restrita, não admitindo ampliação ou interpretação extensiva. Não cabe ainda qualquer

modificação ou alteração do elenco legal. A interpretação das exceções deve ser feita sempre de forma

restritiva. Há ainda, a previsão legal do artigo 4º, “caput”, dispondo que “não se beneficiará do disposto

nesta lei aquele que, sabendo-se insolvente, adquire de má-fé imóvel mais valioso Este artigo contempla o

caso do devedor que, sabendo ser insolvente, age de má-fé, transferindo a sua residência de menor valor

para outro imóvel mais valioso, justamente com o intuito de resguardá-lo da responsabilização perante

seus credores. Ocorrendo esta hipótese, Marcione Pereira dos Santos afirma que “o aspecto ético-moral

não pode ser ignorado, e deve-se atentar para as finalidade precípuas da lei, à moral e aos bons

costumes”.

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Considerações Finais.

Resta-nos concluir, portanto, que o processo de execução não deve servir como instrumento de

flagelo do devedor, posto que lhe devem ser assegurados os direitos básicos outorgados por lei, como o

direito a ter moradia e, principalmente, o direito a ter uma vida digna, o que se restabelecerá, no caso

presente, desconstituindo-se o ato pelo qual foi transacionado um bem de família, na medida em que se

afigura direito indisponível, insuscetível de renúncia por parte de seu titular.

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BIBLIOGRAFIA:

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PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Rio de Janeiro: 19ª Edição.Vol I. Ed.

Forense, 1998, p.310.

PLAMPLONA FILHO, Rodolfo et al. Novo Curso de Direito Civil. São Paulo: 4ª Edição.Vol I. Ed.

Saraiva, 2003, p.404

THEOTÔNIO NEGRÃO, Código de Processo Civil, 26ª Ed., p.490.

PARIZZATO, João Roberto. Da Penhora e da Impenhorabilidade de Bens. Ed. de Direito, p. 20.

MIRANDA, Pontes, Comentários ao CPC, Tomo XIII, Forense, 1973, p.284.

SÁ, Maria de Fátima Freire.A Dignidade do Ser Humano e Os Direitos de Personalidade: Uma

Perspectiva Civil-Constitucional. In: Biodireito. Belo Horizonte: Del Rey, 2002, p.92.

TEPEDINO, Gustavo. Direitos humanos e relações jurídicas privadas. In: Temas de Direito Civil.

Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p.67.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Processo de Execução e

Processo Cautelar. Rio de Janeiro: 28ª Edição. Forense, 2000, p.12/13)

STOLZE, Pablo. Novo Curso de Direito Civil. Direito Civil da Família.2ª Edição. Saraiva. 2012,

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