a ilustração (1884-1892)- algumas questões teórico-metodológicas
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Importante trabalho historiográfico que busca apresentar novas contribuições para os estudos históricos. O autor colabora para a memória da imprensa do Brasil, contribuindo para os estudos sobre a imprensa e seus caráteres.TRANSCRIPT
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A Ilustração (1884-1892): algumas questões teórico-metodológicas Tania Regina de Luca UNESP/CNPq
Esse texto tem por objetivo colocar alguns problemas de ordem teórico-
metodológica a respeito da revista Ilustração, quinzenário que somou 184 números,
publicados entre maio de 1884, data do seu lançamento, e fevereiro de 1892, último
exemplar editado. A seguir apresentam-se informações básicas sobre o periódico, essenciais
para a discussão de sua trajetória.
Tabela I - Ilustração: sistematização das informações essenciais
Período Título e subtítulo Responsável Redação Impressor
05 a 12/1884 A Ilustração: revista quinzenal para Portugal e o Brasil
Mariano Pina (diretor)
Maio/Junho 7, Rue de Parme, Paris
Julho/Dezembro 6, Rue de Saint-
Pétersbourg, Paris
Imprimerie P. Mouillot 13, Quai
Voltaire, Paris
01 a 11/1885 12/1885
A Ilustração: revista universal impressa em Paris ou sem subtítulo A Ilustração: revista de Portugal e do Brasil
Mariano Pina (diretor)
Mariano Pina (proprietário)
Janeiro/Novembro 6, Rue de Saint-
Pétersbourg. Paris Dezembro
13, Quai Voltaire, Paris
Imprimerie P. Mouillot 13, Quai
Voltaire, Paris
01 a 12/1886 A Ilustração: revista de Portugal e do Brasil
Mariano Pina (proprietário)
13, Quai Voltaire, Paris Imprimerie P. Mouillot 13, Quai
Voltaire, Paris 01 a 07/1887 08 a 12/1887
A Ilustração: revista de Portugal e do Brasil A Ilustração
Mariano Pina (proprietário)
13, Quai Voltaire, Paris Imprimerie P. Mouillot 13, Quai
Voltaire, Paris
01 a 12/1888 A Ilustração Mariano Pina (proprietário)
13, Quai Voltaire, Paris Imprimerie P. Mouillot 13, Quai
Voltaire, Paris 01 a 12/1889 A Ilustração Mariano Pina
(proprietário) 13, Quai Voltaire, Paris Imprimerie P.
Mouillot 13, Quai Voltaire, Paris
01 a 12/1890 A Ilustração Mariano Pina (proprietário)
13, Quai Voltaire, Paris Tipografia da Cia Nacional Editora, Largo do Conde
Barão, 50, Lisboa 01 a 12/1891 A Ilustração Mariano Pina
(proprietário) 13, Quai Voltaire, Paris Tipografia da Cia
Nacional Editora, Largo do Conde
Barão, 50, Lisboa 01 a 02/1892 A Ilustração Mariano Pina
(proprietário) 13, Quai Voltaire, Paris Tipografia da Cia
Nacional Editora, Largo do Conde
Barão, 50, Lisboa
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Algumas questões se impõem de imediato: por que lançar em Paris uma revista
destinada à circular em Portugal e no Brasil? Que condições permitiram a realização da
empreitada? Quais as características e objetivos do quinzenário? Que peculiaridades o
mesmo apresentava frente aos congêneres existentes nos países de destino? Como explicar
a longevidade do empreendimento? Pelo menos parte dessas indagações pode ser
respondida a partir da análise sistemática dos números publicados, que permitem discernir
responsáveis, principais colaboradores, temáticas, estruturação do conteúdo, formas de
utilização e lugar reservado à imagem, anunciantes, além de informar sobre a localização
da redação, impressores, distribuidores, representantes, preço, enfim uma miríade de dados
que remete tanto para as condições técnicas disponíveis no momento de circulação quanto
para demandas de ordem social. O mergulho nos exemplares, que nada tem de simples,
requer a construção de instrumentos analíticos capazes de quantificar, ordenar e discernir as
modificações que ocorreram ao longo de quase oito anos de circulação. A indexação não
tem sentido em si mesma e constitui-se no passo inicial, indispensável para apreender
permanências e mudanças.
Esse olhar microscópico, que esquadrinha e tenta decifrar o objeto a partir de
indícios presentes em suas páginas, combina-se com outro que introduz questões
relacionadas à temporalidade. Em primeiro lugar, o tempo longo da diacronia, que convida
a precisar o lugar ocupado pela publicação na história da imprensa e das técnicas de
impressão, sem perder de vista os meios de transporte e de difusão da informação
disponíveis num momento particular, esforço que se desdobra em abordagem que tenta
apreender a historicidade do periódico. É à luz dessa localização espaço-temporal precisa
que os dados provenientes da análise interna podem ganhar novos sentidos, não
perceptíveis caso o questionamento se detivesse no âmbito estrito do conteúdo e sua forma
de apresentação que – não custa lembrar – também estão submetidos às possibilidades e
solicitações de sua época.
Contudo, jornais e revistas são, na maioria das vezes, projetos coletivos, “ponto de
encontro de itinerários individuais unidos em torno de um credo comum”,1 e podem ser
1 L. Plet-Despatin, “Une contribution a l’histoire des intellectuels:les revues”. In: N. Racine & M. Trebitsch (dir.), Cahiers de l’Institut d’Histoire du Temps Present. Sociabilites intellectuelles. Lieux, milieux, réseaux, Paris, n. 20, p. 126, mars 1992.
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encarados como espaços agregadores de indivíduos que compartilham leituras de passado e
de futuro. Mesmo que distantes dos embates do mundo da política no sentido estrito, os
periódicos sempre remetem aos dilemas do seu tempo e dialogam com outros impressos
que lhes são contemporâneos e com os quais compartilham o espaço público. A diacronia,
outra dimensão da temporalidade, remete para a reconstrução do quadro no qual a
publicação se inseria, o que colabora para compreender as tarefas assumidas pelos
propugnadores, também expressas na escolha do título, nas declarações dos textos
programáticos, nos editoriais ou escritos que cumprem tal função.
O projeto que particulariza a revista e lhe confere identidade é produzido, portanto,
no confronto com outras propostas, leituras e interpretações elaboradas por grupos com os
quais guarda relações de proximidade e afeto ou de distanciamento e ruptura, não raro
motivadas por fatores de ordem circunstancial, mas que não se dissociam das características
vigentes no campo intelectual. Daí a importância estratégica das correspondências,
memórias, depoimentos e arquivos relativos ao impresso e/ou seus responsáveis, que
ajudam a esclarecer aspectos nem sempre explícitos nas páginas da publicação.
Esta forma de abordagem, que conjuga a análise verticalizada dos exemplares e de
outros materiais disponíveis com as dimensões diacrônica e sincrônica, implica em tomar o
título, a um só tempo, como fonte e objeto da pesquisa. Tais os procedimentos que balizam
a análise da Ilustração.
Ilustração: potencialidades analíticas.
A Ilustração começou a circular em maio de 1884, momento em que o processo de
produção dos periódicos na França já deixara para trás o “antigo regime tipográfico”,
designação utilizada por Roger Chartier para caracterizar as práticas de impressão correntes
até as primeiras décadas dos oitocentos. Daí em diante, as transformações aceleram-se
graças às sucessivas gerações de prensas mecânicas e às alterações, bem mais tardias, na
composição, devidas à linotipia.2 De outra parte, à medida que se avança na centúria,
espaços comuns de trocas e de circulação ganharam densidade, graças ao sistema de
2 Para uma análise da questão, consultar: Gilles Feyel, “Les transformations technologiques de la presse au XIXe siècle”, In: Dominique Kalifa (dir), La civilisation du journal. Histoire culturelle et littéraire de la presse française au XIXe siècle, Paris, Nouveau Monde Éditions, 2011, pp. 97-139.
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ferrovias e à navegação a vapor. Nas palavras de Hobsbawm, “os trens alcançavam o centro
das grandes cidades (...) e as mais remotas áreas da zona rural, onde não penetrava nenhum
outro vestígio de civilização do século XIX”, sendo que em 1882, “quase dois bilhões de
pessoas viajavam por ano pelas ferrovias”, enquanto mais de 22 mil navios cruzaram mares
e oceanos. O historiador bem destacou que o mundo “estava se tornando demograficamente
maior e geograficamente menor e mais global – um planeta ligado cada vez mais
estreitamente pelos laços dos deslocamentos de bens e pessoas, de capital e comunicações,
de produtos materiais e ideias”3.
Ideias que viajavam em diferentes gêneros de impressos – livros, revistas, jornais,
folhetos, estampas, panoramas, propagandas ou cartazes – produzidos em escala industrial,
isto é, cada vez mais baratos e atraentes, graças à incorporação da imagem, novidades de
grande alcance e que propiciava inéditas experiências de visualidade. É bom ter presente
que, entre nós, as atividades ligadas à impressão datam da transferência da Família Real
portuguesa, em 1808. Tal situação, aliada ao escravismo, escassa urbanização e diminuto
público leitor, permite compreender porque o mundo das tipografias, com suas prensas,
prelos, artistas do traço em suas diversas modalidades (xilogravura, talho doce, litografia)
era um território dominado, em grande parte, por estrangeiros, observação igualmente
válida para editores e livreiros.
Se, por um lado, esta presença evidencia as limitações do meio e a falta de mão de
obra especializada, aspectos tão bem explorados pela bibliografia especializada, por outro
convida a pensar sobre as experiências de deslocamentos de indivíduos que, por motivos os
mais diversos, decidiram exercitar seus talentos e habilidades além-mar, com desfechos
variáveis – permanência no país, constantes idas e vindas, retorno definitivo ao lugar de
origem, com experiência, capital e/ou material que asseguravam novas oportunidades de
reinserção. Circulação facilitada e mesmo banalizada pelos meios de transportes, mas que
imprimiu suas marcas e deixou rastros nas modalidades de diálogo e apropriação da escrita,
da imagem, das referências e, de forma mais ampla, na cultura urbana. Deste lado do
Atlântico, insiste-se no exemplo paradigmático de Araujo Porto-Alegre (1806-1879), cuja
3 Eric J. Hobsbawm, A era dos impérios (1875-1914), Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1988, pp. 48 e 31, respectivamente.
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estadia em Paris foi tão significativa para as atividades que empreendeu,4 mas igualmente
caberia acompanhar os desdobramentos que a estadia nos trópicos trouxe, por exemplo,
para a trajetória de Rafael Bordalo Pinheiro, para ficar somente num exemplo.
As noções de recepção passiva e influência, as metáforas associadas ao espelho e ao
reflexo e mesmo o ideário dos modelos parecem incapazes de dar conta de interações que
configuravam estradas de mão dupla. E se é fato que o tráfego foi muito mais intenso num
dado sentido, isso não deve impedir a percepção de outras trajetórias, mais modestas, ainda
que não menos significativas. Nesse sentido, são inspiradoras as análises de Sergio Miceli a
respeito das concessões feitas pelo pintor Fernand Léger ao gosto de seus potenciais
clientes, entre os quais estava Paulo Prado.5 A própria existência de uma publicação
impressa e com redação em Paris, capitaneada por um português, que lá se encontrava a
serviço de um jornal brasileiro, e que tinha em mira, sobretudo, leitores em Lisboa e no Rio
de Janeiro, remete para o grau de internacionalização alcançado pela imprensa e convida a
pensar em termos de trocas e intercâmbios, em diferentes direções e sentidos.
O nome de Mariano Pina (1860-1899) sempre esteve ligado à Ilustração e, como se
vê na Tabela I, ele passou de diretor a proprietário do empreendimento a partir de dezembro
de 1885. Sua presença em Paris expressava as novas demandas das empresas jornalísticas
nas décadas finais do século XIX, assim como as possibilidades descortinadas para
indivíduos que, já desfrutando de reconhecimento e sucesso no mundo letrado – ou
ambicionando alcançá-los –, fossem capazes de responder às necessidades da indústria da
informação.
A ligação telegráfica entre Brasil e Europa por cabo submarino em 1874 logo tornou
obsoleta a fórmula “soube-se, pelo último paquete...”, substituída pelas ágeis notas
telegráficas provenientes de agencias especializadas. Em 1877, o Jornal do Comércio (RJ)
publicou os primeiros informes desta natureza, distribuídos pela Reuter-Havas: “Londres,
30 de julho às 2 horas da manhã – Faleceu ontem...”.6 Entretanto, um jornal que se queria
moderno, como a Gazeta de Notícias, fundada no Rio de Janeiro em 1875 por Ferreira
4 Sobre o impacto da vivência europeia de Porto Alegre, consultar a instigante pesquisa de Heliana Angotti Salgueiro, A comédia humana: de Daumier a Porto-Alegre, São Paulo, MAB FAAP, 2003. 5 Sergio Miceli, Nacional estrangeiro. História social e cultural do modernismo artístico em São Paulo, São Paulo, Companhia das Letras, 2003, especialmente pp. 9-16. 6 Nelson Werneck Sodré, História da imprensa no Brasil, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1966, p. 247.
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Araújo, Henrique Chaves, Manoel Carneiro e Elísio Mendes, precisava ir além e contar
com testemunhas oculares. Assim, no início dos anos 1880, o matutino remunerava nomes
destacado da literatura portuguesa para atuarem como correspondentes na Europa: Eça de
Queirós (Inglaterra), Ramalho Ortigão (Portugal), e Guilherme de Azevedo (França)
remetiam textos para o diário carioca.
Em oito de abril de 1882, em Paris, faleceu Azevedo e foi exatamente nesse mesmo
dia que Henrique Chaves enviou, do Rio de Janeiro, carta a Mariano Pina, na qual se lê: “A
tua proposta foi aceita com prazer. Estás nomeado correspondente da Gazeta de Notícias
em Paris. Não deves essa nomeação senão ao teu trabalho e talento. A mim nada tens que
me agradecer”.7 O excerto, além de sugerir que Guilherme já se afastara de suas atividades,
quiçá por motivo de doença, deixa patente que coube a Pina tomar a iniciativa de se
apresentar para o cargo. E aqui se abre um aspecto importante da pesquisa: quais as
credenciais, no âmbito jornalístico e literário, e que trunfos, em termos de redes de
sociabilidade, Pina, então nos seus vinte e poucos anos, mobilizou para preencher o posto
de representante em Paris de um periódico impresso na capital do Império do Brasil? Não
cabe ensaiar aqui a resposta, mas tão somente apontar um caminho promissor de
investigação, uma vez que permite articular, em âmbito transnacional, escritores
portugueses e a atividade jornalística carioca, bem como acompanhar a resposta de autores
locais, que não deixaram de questionar o fato de o cargo de correspondente não ser ocupado
por brasileiros, isso num momento em que começava a se delinear entre nós, de forma
ainda tímida, um campo intelectual autônomo.
Na carta citada também se estipulavam as obrigações do contratado e detalhavam-se
as dimensões dos textos, seus diferentes gêneros, os que deveriam conter assinatura,
periodicidade e formas de remessa. Cartas posteriores trazem instruções detidas sobre o que
escrever e como fazê-lo, revelando que nem sempre as expectativas do contratante estavam
em harmonia com as nutridas pelo escritor. E parece razoável supor que esses embates
pesaram na decisão de demiti-lo, em março de 1886, depois de quase quatro anos de
7 Algumas das cartas do espólio de Pina, sobretudo as relativas às suas atividades na Gazeta de Notícias e na Ilustração, foram reproduzidas em Elza Miné, “Mariano Pina, a Gazeta de Notícias e A Ilustração: histórias de bastidores contadas por seu espólio”, Revista da Biblioteca Nacional, Lisboa, v. 7, n. 2, p. 23-61, jul/dez. 1992. Texto republicado em Elza Miné, Páginas flutuantes. Eça de Queirós e o jornalismo no século XIX, São Paulo, Ateliê Editorial, 2000, pp. 195-242.
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colaboração. O rompimento deu-se por carta lacônica de Elísio de Carvalho e os
desdobramentos do fato ajudam a compor o círculo de amizades de Pina que, ao que tudo
indica, atuou tanto por ocasião de sua entrada nos quadros da Gazeta de Notícias quanto
após a sua saída.
As relações entre a Gazeta de Notícias e A Ilustração demandam especial atenção.
A julgar pelos dados constantes na revista, o matutino era o seu representante no Brasil,
tarefa desempenhada até dezembro de 1885, quando foi assumida pela filial carioca da Casa
David Corazzi, empresa que já fazia a distribuição da Ilustração em Portugal. Chama
atenção a proximidade entre a demissão de Pina da Gazeta (março de 1886), o fato dele se
tornar proprietário da publicação (dezembro de 1885) e a mudança do distribuidor no Brasil
(janeiro de 1886). A questão toma rumos mais complexos quando se analisa a
correspondência trocada entre Pina e Elísio Mendes que, conforme destacou Elza Miné,
portava-se como se fosse o dono da revista, emitindo ordens que Pina deveria cumprir.
Somente a consulta ao conjunto do espólio de Mariano Pina, depositado na Biblioteca
Nacional em Lisboa, poderá ajudar a esclarecer o processo de fundação e a trajetória da
publicação, assim como as possibilidades de ganho financeiro vislumbradas pelos
envolvidos e as motivações para não tornar público os interesses da Gazeta no quinzenário.
Já a pesquisa no matutino carioca entre abril de 1882 e março de 1886, período no
qual Pina manteve-se vinculado ao mesmo, é essencial e deverá responder algumas
questões, além de colocar várias outras. Espera-se que aspectos relativos à recepção no
Brasil, ausentes na historiografia sobre a história da imprensa, possam ser contemplados,
sobretudo quando se tem em vista que a necessidade de abrasileirar a revista foi tema da
correspondência entre Pina e Elísio.
É provável que a decisão de editar a revista em Paris fosse uma estratégia para
assegurar um produto com qualidade de impressão sem similar no Brasil e em Portugal e
com custos de produção suficientemente modestos para compensar aqueles envolvidos no
transporte até Lisboa e o Rio de Janeiro. A republicação de material iconográfico já
estampado em periódicos franceses propiciava considerável economia, como revelam
contratos selado com a P. Mouillot, conservados no espólio de Pina. A decisão de imprimir
a revista em Lisboa, tomada nos seus momentos finais, ou seja, entre janeiro de 1891 e
fevereiro de 1892, ainda demanda explicações.
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Em Portugal, a Ilustração era representada pela casa David Corazzi. Não foi
possível precisar se a editora encarregava-se apenas da distribuição ou, tal como parece ter
sido o caso da Gazeta, também investiu na publicação. O fato é que Corazzi foi um editor
muito importante e sua famosa Biblioteca do Povo e das Escolas, iniciada em 1881,
também era vendida no Brasil, onde ele montou uma filial, situada na Rua da Quitanda, n.
38, Rio de Janeiro, que se encarregou de responder pelos interesses da Ilustração depois
que o jornal de Elísio deixou de fazê-lo (janeiro de 1886). Em 1889, a partir da fusão da
Casa Corazzi e da Editora Justino Guedes, surgiu a Companhia Nacional Editora, que
continuou a prestar serviços para Pina e sua Ilustração, com filial na mesma Rua da
Quitanda, agora no número 40.8
A análise da revista em si, com suas dezesseis páginas, sete ou oito das quais
ocupadas por imagens, está em curso e tem revelado que o seu conteúdo foi se tornando
mais complexo à medida que se caminha por nos volumes. No primeiro ano, destaca-se a
ausência de publicidade, o que parece significar que a manutenção do empreendimento
estava ancorada tão somente na venda aos leitores, situação que se alterou a partir de 1885.
Foi também neste ano que novas seções textuais surgiram, ainda que o espaço reservado à
iconografia tenha permanecido inalterado. As relações entre imagem e texto merecem
especial atenção, sendo de se destacar a presença da seção Nossas gravuras, que
explicitavam a parte iconográfica e guiavam o olhar do leitor. O rol de colaboradores
diversificou-se, mas é sintomático que as temáticas ligadas à França continuassem a
sobrepujar as relativas a Portugal e ao Brasil.
Em síntese, a sistematização do conteúdo textual (seções, temáticas, gêneros dos
textos, colaboradores) e imagética (temas, autores) adentra o terceiro ano de circulação e
em breve terá início a consulta sistemática ao acervo de Mariano Pina e aos exemplares da
Gazeta de Notícias (1882-1886), novas fontes a partir das quais se espera tornar mais densa
“a reflexão”.
8 Sobre Corazzi e sua coleção, ver: Manuela D. Domingos, Estudos de sociologia da cultura. Livros e leitores do século XIX, Lisboa, Centro de Estudos de História e Cultura Portuguesa, 1985.
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Bibliografia
DOMINGOS, Manuela D. Estudos de sociologia da cultura. Livros e leitores do século
XIX. Lisboa: Centro de Estudos de História e Cultura Portuguesa, 1985.
FEYEL, Gilles. "Les transformations technologiques de la presse au XIXe siècle”. In:
KAFIFA, Domonique (dir). La civilisation du journal. Histoire culturelle et littéraire de la
presse française au XIXe siècle. Paris, Nouveau Monde Éditions, 2011, pp. 97-139.
HOBSBAWM, Eric J. A era dos impérios (1875-1914). Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1988.
MICELI, Sergio. Nacional estrangeiro. História social e cultural do modernismo artístico
em São Paulo. São Paulo, Companhia das Letras, 2003.
MINÉ, Elza. “Mariano Pina, a Gazeta de Notícias e A Ilustração: histórias de bastidores
contadas por seu espólio”. Revista da Biblioteca Nacional. Lisboa, v. 7, n. 2, p. 23-61,
jul/dez. 1992.
MINÉ, Elza. Páginas flutuantes. Eça de Queirós e o jornalismo no século XIX. São Paulo,
Ateliê Editorial, 2000.
PLET-DESPATIN, J. “Une contribution a l’histoire des intellectuels:les revues”. In:
RACINE, N & TREBITSCH, M. (dir.). Cahiers de l’Institut d’Histoire du Temps Present.
Sociabilites intellectuelles. Lieux, milieux, réseaux. Paris, n. 20, p. 126, mars 1992.
SALGUEIRO, Heliana Angotti. A comédia humana: de Daumier a Porto-Alegre. São
Paulo, MAB FAAP, 2003.
SODRÉ, Nelson Werneck. História da imprensa no Brasil. Rio de Janeiro, Civilização
Brasileira, 1966.