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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO A GUARDA COMPARTILHADA: UMA EXPECTATIVA DE PRESERVAR A RELAÇÃO DOS PAIS COM OS FILHOS TIAGO AZEVEDO DECLARAÇÃO “DECLARO QUE A MONOGRAFIA ESTÁ APTA PARA DEFESA EM BANCA PUBLICA EXAMINADORA”. ITAJAÍ, (SC), novembro de 2010 _____________________________________________ Professora Orientadora: MSc. Maria Inês França Ardigó UNIVALI Campus Itajaí SC.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS

CURSO DE DIREITO

A GUARDA COMPARTILHADA: UMA EXPECTATIVA DE

PRESERVAR A RELAÇÃO DOS PAIS COM OS FILHOS

TIAGO AZEVEDO

DECLARAÇÃO

“DECLARO QUE A MONOGRAFIA ESTÁ APTA PARA DEFESA EM BANCA PUBLICA EXAMINADORA”.

ITAJAÍ, (SC), novembro de 2010

_____________________________________________ Professora Orientadora: MSc. Maria Inês França Ardigó

UNIVALI – Campus Itajaí – SC.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS

CURSO DE DIREITO

A GUARDA COMPARTILHADA: UMA EXPECTATIVA DE

PRESERVAR A RELAÇÃO DOS PAIS COM OS FILHOS

TIAGO AZEVEDO

Monografia submetida à Universidade do

Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito

parcial à obtenção do grau de Bacharel

em Direito.

Orientadora: Professora MS Maria Inês França Ardigó

Itajaí, Novembro de 2010

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AGRADECIMENTO

Agradeço a Deus por todas as bênçãos colocadas

em meu caminho, tendo fé em sua presença durante

o período de graduação e em toda minha vida.

Em especial a minha família por acreditar sem

questionar na minha capacidade, aos meus queridos

pais, que fui agraciado com dois pais e duas mães,

que sempre estiveram na caminhada. Sou um ser

humano muito grato por toda a minha família.

Não posso esquecer-me de agradecer minha

orientadora, Maria Inês França Ardigó, pelas

orientações, e todo estimulo e incentivo para que eu

não esmorecesse na jornada árdua que foi a

conclusão do curso.

Igualmente e sem menor valor aos meus amigos,

que sempre estiveram ao meu lado, tantos os da

graduação quanto aos que convivem comigo em

minha vida fora da universidade.

E por fim, mas sem desmerecer em nada a minha

namorada que sempre esteve me cobrando pra que

não desistisse em muitas horas ela foi crucial para

que eu concluísse a presente monografia.

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DEDICATÓRIA

Dedico essa monografia, a todos as pessoas que

acreditaram no meu potencial, e também aos meus

esforços para concluir a jornada de cinco anos, aos

meus pais pela compreensão, e dedicação na minha

educação e formação de caráter.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do

Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de

toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí, Novembro de 2010

Tiago Azevedo

Graduando

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do

Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Tiago Azevedo, sob o título “A Guarda

Compartilhada: uma expectativa de preservar a relação dos pais com os filhos”

foi submetida em Novembro de 2010 à banca examinadora composta pelos

seguintes professores: [Nome dos Professores] ([Função]), e aprovada com a nota

[Nota] ([nota Extenso]).

Itajaí, Novembro de 2010

Professora MS Maria Inês França Ardigó

Orientadora e Presidente da Banca

Prof. MS. Antônio Augusto Lapa

Coordenação da Monografia

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ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CC/1916 Código Civil Brasileiro de 1916

CC/2002 Código Civil Brasileiro de 2002

CRFB Constituição da República Federativa do Brasil

ECA Estatuto da Criança e do Adolescente

Art. Artigo

CP Código Penal

ed. Edição

org. Organizador

p. Página

v. Volume

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ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que o autor considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

Afeto

É o elemento constitutivo dos vínculos familiares. A busca da felicidade, a

supremacia do amor, a solidariedade social ensejam o reconhecimento do afeto

como o modo mais plausível para a definição de família1.

Criança

“[...] Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de

idade incompletos, [...]”2.

Direito de Família

Como esse ramo do Direito disciplina a organização da família, conceitua-se o

direito de família com o próprio objeto a definir3. “[...] regula não só as relações entre

pais e filhos, mas também entre cônjuges e conviventes, ou seja, a relação das

pessoas ligadas por um vínculo de consangüinidade, afinidade ou afetividade”4.

Família

A família é um grupo natural que através dos tempos tem desenvolvido padrões de

interação. Esses padrões constituem a estrutura familiar, que por sua vez governa o

funcionamento dos membros da família, delineia sua gama de comportamento e

facilita sua interação5.

1 CALHEIRA, Luana Silva. Os princípios do direito de família na Constituição Federal de 1988 e a importância aplicada do afeto: O afeto é juridicizado através dos princípios? Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 5, nº 229.

2 BRASIL. Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente. Art. 2º, p.03.

3 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil, 36. ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p.8.

4 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5. ed. São Paulo: RT, 2009, p.34.

5 MINUCHIN, Salvador; FISCHMAN, H. Charles. Técnicas de Terapia familiar. Porto Alegre: Artmed, 2003.

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Filhos

“Os filhos, qualquer que seja a natureza da filiação, estão sujeitos ao poder familiar,

enquanto menores (CC. art. 1.630), ou seja, até 18 (dezoito) anos”6.

Guarda

"Um direito-dever natural e originário dos pais, que consiste na convivência com

seus filhos, previsto no art. 384, II, do CC e é o pressuposto que possibilita o

exercício de todas as funções paternas.7"

Guarda Alternada

[ ... ] cada genitor detém a guarda do filho segundo um esquema pré-estabelecido.

Os papéis se invertem, de acordo com a inversão da guarda, ficando o menor ora

com um ora com outro dos pais, o qual em seu período assume todos os atributos

próprios da guarda8.

Guarda Compartilhada

A possibilidade de que os filhos de pais separados, continuem assistidos por ambos

os pais, após a separação, devendo ter efetiva e equivalente autoridade legal, para

tomarem decisões importantes quanto ao bem estar de seus filhos, e

frequentemente, ter uma paridade maior no cuidado a eles9.

Pais

“Será que o conceito de pai se esgota no ato da geração biológica, ou o ato se

estende a toda a vida do novo ser gerado, compreendendo na geração, a

responsabilidade que dela advém?”.10 “[...] adultos que mantêm, amam e

6 RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil: direito de família. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p.359.

7 GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda Compartilhada. Um novo modelo de responsabilidade. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2000, p. 47.

8 GRISARD FILHO, Waldir. Guarda Compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental,

p.16.

9 CARCERERI, Pedro Augusto Lemos. Aspectos destacados da guarda de filhos no Brasil. Disponível em: < hptt/www.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=56>jusnavegandi. Acesso em 07.1. 2010.

10 COMEL, Nelsina Elizena Damo. Paternidade responsável: o papel do pai na sociedade brasileira e na educação familiar. Curitiba: Juruá, 2000, p.96.

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determinam a forma de inserção da criança na sociedade, inclusive pelo uso do

nome de família [...]”11.

Poder Familiar

Ramo do Direito Civil atinente às relações entre pessoas unidas pelo matrimônio,

pela união estável ou pelo parentesco e aos ramos complementares do direito

protetivo e assistencial, pois tanto a curatela como a tutela embora não se originem

das relações familiares, por sua finalidade, possuem conexão com o Direito de

Família12.

11

COMEL, Nelsina Elizena Damo. Paternidade responsável: o papel do pai na sociedade brasileira e na educação familiar, p.96.

12 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 7.

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SUMÁRIO

RESUMO

INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 12

CAPÍTULO 1:

A FAMÍLIA – A CRIANÇA E A SEPARAÇÃO CONJUGAL .................................... 14

1.1 A FORMAÇÃO DA FAMÍLIA NA ANTIGUIDADE ............................................... 14 1.2 A FAMÍLIA E O CONTEXTO DAS CONSTITUIÇÕES ........................................ 17 1.3 A CONCEPÇÃO DA FAMÍLIA NA ATUALIDADE ............................................... 22 1.3.1 A família advinda do casamento ................................................................... 23 1.3.2 A família advinda da união estável ............................................................... 25 1.3.3 A família monoparental: uma realidade do século xxi ................................ 26 1.4 SEPARAÇÃO E A DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE CONJUGAL ..................... 29

CAPÍTULO 2:

O PODER FAMILIAR ............................................................................................... 33

2.1 DO PÁTRIO PODER AO PODER FAMILIAR ..................................................... 33 2.2 CONCEITO E CARACTERÍSTICAS DO PODER FAMILIAR ............................. 35 2.3 O PODER FAMILIAR NO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO DE 2002 E NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE ................................................... 37 2.4 O PODER FAMILIAR E SEU EXERCÍCIO .......................................................... 38 2.5 EXTINÇÃO, SUSPENSÃO E PERDA DO PODER FAMILIAR ........................... 39

CAPÍTULO 3

GUARDA COMPARTILHADA: UMA NOVA OPÇÃO PARA PAIS E FILHOS .......... 42

3.1 GUARDA ............................................................................................................. 42 3.1.1 Definição de guarda ....................................................................................... 42 3.1.2 Espécies de guarda ........................................................................................ 45 3.2 A GUARDA COMPARTILHADA ......................................................................... 48 3.2.1 Conceito e evolução de guarda compartilhada ........................................... 49 3.2.2 Possibilidade do deferimento da guarda compartilhada no ordenamento jurídico brasileiro .................................................................................................... 52 3.2.3 Guarda compartilhada e a convivência familiar .......................................... 55 3.2.4 Conveniência da opção pela guarda compartilhada: Literatura, doutrina e jurisprudência ..............................................................................................................

CONSIDERAÇÕES ................................................................................................... 62

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS................................................................... 63

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RESUMO

A presente monografia tem como objetivo, trazer as melhores

considerações do desenvolvimento das relações dos pais com os filhos frente ao

instituto da Guarda Compartilhada. Assim, fez-se necessário uma abordagem sobre

a origem e evolução da família, que passa por constante processo de

transformação, visualizando-se coerência e respostas legais aos fatos decorrentes

da Guarda Compartilhada. A família é a base da sociedade, tendo como papel a

interatividade dos relacionamentos entre as pessoas, observando suas principais

necessidades. Enfatizou-se o Poder Familiar, o qual deixou de ser só do pai, e

passou a ser um poder-dever de ambos os pais, para exercer a função do cuidado

do filho. Dever este praticado em conjunto para atender primordialmente as

necessidades do filho. Assim, desenvolveu-se uma pesquisa bibliográfica utilizando-

se do método indutivo, propiciando respostas às hipóteses levantadas, onde se

verifica a importância da convivência harmoniosa entre os pais separados para a

assistência mútua aos filhos.

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INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto analisar através de

doutrinas e legislação o papel da Guarda Compartilhada numa expectativa de

preservar as relações dos pais com os filhos.

O seu objetivo institucional é a obtenção do título de bacharel

em Direito – Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI; tendo como objetivo geral,

pesquisar sobre as relações dos filhos com os pais e a possibilidade do instituto da

Guarda Compartilhada favorecer essa relação filial. Como objetivo especifico,

investigar sobre a evolução e a natureza jurídica da família.Verificar na legislação

brasileira e doutrina a viabilidade da substituição da Guarda Uniparental pela Guarda

Compartilhada em termos de favorecimento da relação de pais e filhos, uma

possibilidade de reaproximação dos entes familiares.

Para tanto, principia-se no Capítulo 1, abordando a família na

antiguidade, os contextos constitucionais, a família na atualidade com ramificações

da família advinda do casamento, da união estável e a família monoparental. Por

último, a dissolução da sociedade conjugal.

No capítulo 2, trata-se do poder familiar, sua evolução do pátrio

poder a poder familiar, verificando conceitos e características, bem como a sua

inserção no Estatuto da Criança e Adolescente e no Código Civil de 2002. Ainda,

uma alusão ao exercício, extinção, suspensão e perda do poder familiar.

No capítulo 3, trata-se da Guarda, Tutela e Curatela, definições

e modalidades. Apresentou-se a evolução e conceito da Guarda Compartilhada,

visualizando-se a possibilidade de deferimento do instituto em prol da convivência

familiar. Foram levantas as seguintes hipóteses:

1ª Hipótese: A Guarda Compartilhada defende os interesses

dos filhos, que após a separação dos pais preserva a relação filial.

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2ª Hipótese: A viabilidade do exercício da Guarda

Compartilhada, depende da harmonia entre os genitores. Quanto á metodologia empregada registra-se que, na Fase de

Investigação foi utilizado o Método Indutivo13, na Fase de Tratamento de Dados o

Método Cartesiano14, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente

Monografia é composto na base lógica Indutiva.

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas do

Referente15, da Categoria16, do Conceito Operacional17 e da Pesquisa Bibliográfica.

13

Segundo Pasold (2002, p110) o referido método trata de “pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral”.

14 O referido método pode ser resumido em quatro preceitos que são: 1. “... nunca aceitar, por verdadeira, cousa nenhuma que não conhecesse como evidente (...)” ; 2. ... “dividir cada uma das dificuldades que examinasse em tantas parcelas quantas pudessem ser e fossem exigidas para melhor compreendê-las”; 3. “... conduzir por ordem os meus pensamentos, começando pelos objetos mais simples e mais fáceis de serem conhecidos, para subir, pouco a pouco, como por degraus, até o conhecimento dos mais compostos, e supondo mesmo certa ordem entre os que não se precedem naturalmente uns aos outros”; 4. “... fazer sempre enumerações tão completas e revisões tão gerais, que ficasse certo de nada omitir” (grifo no original). In: PASOLD, César Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 106-107.

15 “REFERENTE é a explicação prévia do motivo, objetivo e produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para uma atividade intelectual. Especialmente para uma pesquisa.” In: PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, p. 62.

16 “Categoria é a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma idéia” In: PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, p. 31.

17 “Conceito operacional (=cop) é uma definição para uma palavra e expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos” In: PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, p. 56.

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CAPITULO 1

A FAMÍLIA – A CRIANÇA E A SEPARAÇÃO CONJUGAL

1.1 A FORMAÇÃO DA FAMÍLIA NA ANTIGUIDADE

É necessária que se faça uma análise histórica da formação da

família, para que se possam entender os fenômenos que ocorrem hoje no cotidiano

diário de cada um.

Durante o período primitivo, os seres humanos viviam em

promiscuidade sexual: várias mulheres se relacionavam com vários homens e vice-

versa. Existia desse modo a presença da poligamia e da poliandria.

Informa Venosa que conforme a descrição feita por Friedrich

Engels,

[...] no estado primitivo das civilizações o grupo familiar não se assentava em relações individuais. As relações sexuais ocorriam entre todos os membros que integravam a tribo. Disso decorria que sempre a mãe era conhecida, mas se desconhecia o pai, o que permite afirmar que a família teve de inicio um caráter matriarcal, porque a criança ficava junto à mãe, que a alimentava e a educava. [...]18

Assim, pode-se dizer que outro fator importante observado era

o da predominância do poder maternal. Isso porque como as mulheres se

relacionavam com vários homens, era incerta a paternidade dos filhos nascidos

dessas relações.

Percebe-se discordância entre alguns estudiosos, com relação

a essa promiscuidade sexual citada por Friedrich Engels (1986), em sua obra “A

Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado”. Essa linha de pensamento

defende a idéia de que entre os povos primitivos havia relacionamentos mais

flexíveis, mas que nunca chegaram à tamanha liberdade sexual. Como por exemplo,

18

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. 8 ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 3

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15

Venosa aponta que essa posição antropológica que sustenta a promiscuidade não é

isenta de dúvidas, entendendo ser pouco provável que essa estrutura fosse

homogênea em todos os povos19.

Posteriormente à vida primitiva, as guerras, a carência de

mulheres e talvez uma inclinação natural, levaram os homens a buscar relações com

mulheres de outras tribos, antes do que em seu próprio grupo.20

Assim, pode-se mencionar segundo o autor supracitado que a

família romana era vista como uma unidade jurídica, econômica e religiosa, sendo

lideradas pelo pater famílias, que representava a autoridade absoluta no seio

familiar, tendo o poder sobre a vida e a morte de sua esposa e descendentes, poder

sobre os bens móveis e imóveis que lhes pertenciam, além de figurar como

sacerdote. Assim o pater famílias era visto como o chefe e senhor de toda a família

que o rodeava, estando evidente o patriarcalismo.

Venosa leciona ainda, que na Roma o poder do pater, era

quase absoluto, no que diz respeito à mulher, escravo e filhos, a família instituição

que tinha objetivo de perpetuar o culto da família. Isso quer dizer que a família era

um grupo sobre o mesmo teto que cultuavam os mesmos antepassados. A mulher

quando se casava, introduzida no seio familiar do marido cultuava os antepassados

do mesmo.21

Em conseqüência da ascensão do cristianismo em Roma, a

família passou a ser centrada no matrimônio, que seria realizado por um ato

religioso. Com isso, seguindo os ditames da igreja, a formação da família deveria se

pautar pela procriação e pelo casamento indissolúvel.

Posteriormente, ao lado do casamento religioso, ato formador

de uma família segundo a igreja católica, surgiu o casamento civil através da

reforma protestante liderada por Lutero, já que para ele não só a celebração

religiosa era capaz de iniciar uma família.

19

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família, p. 3.

20 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família, p. 3.

21 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família, p. 4.

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Orlando Gomes pré leciona que:

A estrutura unitária da família fundada na autoridade do chefe perdurou, em princípio, até os tempos modernos. No sistema feudal, preponderou o elemento político no estrato mais alto da sociedade, apresentando-se a família, do ponto de vista econômico, como organismo compacto com interesses e despesas comuns, na dependência de uma vontade soberana.22

Portanto, ao longo do tempo as relações familiares estiveram

completamente comprometidas com as relações de propriedade, determinando,

assim, a coisificação da mulher. Isso ocorria porque o casamento estava configurado

como uma relação social de dominação patriarcal monogâmica, baseada na

preocupação em se garantir a legitimidade dos filhos, pois, na qualidade de

herdeiros diretos, deveriam entrar na posse do patrimônio paterno. Para a ideologia

burguesa, a família (tradicional ocidental) se constitui como a base da sociedade e

do Estado, a partir disso, a relação homem/mulher fica regulada por este, através do

casamento civil (contrato de casamento), protegido pelo Código Civil, e é definido

pela Igreja como sagrado e indissolúvel23.

Sobreveio então a Revolução Industrial, que acabou abolindo o

sistema patriarcal, já que mulheres e crianças começaram a contribuir na economia

doméstica, ganhando lugar dentro da família.

Entretanto, com a crescente demanda por mão-de-obra,

causada pela industrialização, a mulher das classes populares começou a entrar no

mercado de trabalho, em meados do século XIX, na Europa Ocidental, como

assalariadas nas indústrias e nas oficinas. Dessa forma, o processo de

modernização e o movimento feminista provocaram mudanças na família e o modelo

patriarcal, vigente até então, passava a ser questionado.

Destarte, conforme Engels:

22

GOMES, Orlando. Direito de família. 14. ed. Rio de Janeiro, forense, 2002, p. 41.

23 RODEMBUSCH, Claudine Freire. A implementação de políticas públicas a partir do poder local em direção à prevenção e ao combate da violência intrafamiliar de que são vítimas as crianças e os adolescentes no município de Rio Pardo. 2008. Dissertação (mestrado em Direito). Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC. Programa de Pós-Graduação em Direito – Mestrado Área De Concentração em Direitos Sociais e Políticas Públicas. Santa Cruz do Sul, novembro de 2008.

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A única coisa que se pode responder é que a família deve progredir na medida em que progrida a sociedade, que deva modificar-se na medida em que a sociedade se modifique como se sucedeu até agora. A família é produto do sistema social e refletirá o estado de cultura desse sistema24.

Segundo Bossert, com a industrialização, a família perdeu sua

característica de produção, adotando uma postura voltada para o lado espiritual,

desenvolvendo os valores morais, afetivos, espirituais e a assistência mutua entre os

seus membros.25

1.2 A FAMÍLIA E O CONTEXTO DAS CONSTITUIÇÕES

Leciona Venosa que, os códigos elaborados a partir do século

XIX decidiram normas sobre a família. Naquela época, a sociedade era

eminentemente rural e patriarcal, guardando traços profundos da família da

Antiguidade. A mulher dedicava-se aos afazeres domésticos e a lei não lhe conferia

os mesmos direitos do homem. O marido era considerado o chefe, o administrador e

o representante da sociedade conjugal.26

As duas primeiras Constituições do Brasil não reconheceram o

instituto “família”, não regulamentando a sua origem, a sua proteção e dissolução.

A primeira denominada Constituição Política do Império do

Brasil, de 25 de março de 1824 nenhuma referência fez à família, nada dispondo

sobre esse assunto. A explicação plausível para essa omissão é que o Estado

naquela época era liberalista, ou seja, tinha um posicionamento não intervencionista,

já que era a Igreja Católica quem gerenciava os assuntos referentes a nascimentos,

óbitos e casamento27.

A promulgação da Constituição da República dos Estados

24

ENGELS, F. A origem da família, da propriedade privada e do estado. Trad. Ruth M. Klaus. São Paulo: Centauro, 2002, p. 98.

25 BOSSERT, Zannoni (apud VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direito de família, p. 3).

26 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p.28.

27 RODEMBUSCH, Claudine Freire. A implementação de políticas públicas a partir do poder local em direção à prevenção e ao combate da violência intrafamiliar de que são vítimas as crianças e os adolescentes no município de Rio Pardo. 2008.

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Unidos do Brasil, em 24 de fevereiro de 1891, pode-se dizer que houve um pequeno

avanço, já que em seu artigo 72, parágrafo quarto, reconheceu-se o casamento civil

cuja celebração seria gratuita.

Oliveira reafirma o aludido apontando como falha de

legisladores:

O assunto família no Brasil praticamente passou por despercebido pelos responsáveis pela elaboração das duas primeiras Constituições nacionais, a primeira, de 1824, nenhuma referência fazia a reconhecer à família em particular e a segunda apenas passou a reconhecer o casamento como único ato jurídico capaz de constituir a família, determinado que sua celebração fosse gratuita. Nada mais disse sobre a constituição da família.28

Afirma Oliveira que após as duas primeiras constituições que

não mencionavam a família, o legislador passou a olhar as mudanças sociais e

econômicas mundiais e nacionais, deparou-se com uma nova ordem, clamada pelo

povo, onde o modelo adotado anteriormente não tinha nenhuma eficácia. E que na

terceira Constituição Federal, se deu os primeiros passos para a introdução da

família no texto constitucional, mas regulada pela lei civil.29

Concorda Rodembusch, afirmando que somente com a

Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, promulgada em 16 de julho

de 1934, foram declaradas normas referentes aos direitos sociais dentre os quais se

encontram assuntos como a cultura, a educação e a família. Tais disposições

tiveram tanta importância que foram acomodadas em título próprio, sendo

compostas de dois capítulos30.

Segundo essa autora, a regulamentação do instituto “família”

está contida no Título V, Capítulo I “Da Família”, seguindo os artigos 144, 145, 146 e

147. O primeiro artigo faz menção à constituição da família, que acontece através do

casamento indissolúvel e tem proteção do Estado, uma inovação de extrema

28

OLIVEIRA, José Sebastião de. Fundamentos Constitucionais do Direito de Família. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 25.

29 OLIVEIRA, José Sebastião de. Fundamentos Constitucionais do Direito de Família. p. 39-50.

30 RODEMBUSCH, Claudine Freire. A implementação de políticas públicas a partir do poder local em direção à prevenção e ao combate da violência intrafamiliar de que são vítimas as crianças e os adolescentes no município de Rio Pardo. 2008.

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importância dentro do direito brasileiro, uma vez que é garantida à entidade familiar

uma proteção estatal especial31.

Na Constituição de 1937, pode-se destacar a colaboração do

Estado na educação da prole, de forma principal ou subsidiaria a igualdade dos

filhos naturais em relação aos legítimos no que diz respeito na incumbência dos pais

e ainda a garantia de cuidados especiais a infância e juventude com o objetivo que

fosse assegurado uma vida digna.32

Logo, a Constituição Federal promulgada em 18 de setembro

de 1946 seguia as linhas de um pensamento, agora, democrático, atendia aos

interesses da coletividade e também aos interesses individuais, garantindo direitos

sociais aos cidadãos. No que se refere ao instituto da “família”, este foi

regulamentado no mesmo raciocínio da Carta Magna anterior, atribuindo a sua

constituição ao casamento com vínculo indissolúvel e com proteção estatal.

Com disposição em capítulo próprio nos artigos 163, 164 e

165, a família somente seria reconhecida e receberia a efetiva proteção do Estado

se fosse formada através do casamento civil ou religioso, desde que neste último

caso fossem observadas as prescrições legais e os impedimentos, havendo

requerimento do celebrante ou de qualquer interessado.

Com isso nota-se que o casamento religioso foi igualado ao

casamento civil, sendo ambos passíveis de constituir família.

Exceto essa inovação, nenhuma outra mudança significativa

ocorreu em relação à Constituição Federal de 1946 e a anterior, de 1937.

Anota, complementando o tema, Oliveira:

Como se vê também nesse novo texto constitucional em nada se alterou a forma pela qual se admitia a constituição da família brasileira, de tal sorte que a família merecedora de proteção jurídica continuava somente aquela constituída pelo casamento celebrado de

31

RODEMBUSCH, Claudine Freire. A implementação de políticas públicas a partir do poder local em direção à prevenção e ao combate da violência intrafamiliar de que são vítimas as crianças e os adolescentes no município de Rio Pardo. 2008.

32 OLIVEIRA, José Sebastião de. Fundamentos Constitucionais do Direito de Família. p.53.

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acordo com a lei, e ainda indissolúvel, ou seja, a legitima, como também ainda não se conceituava o que era uma família.33

A Constituição Federal de 1967 condensou em apenas um

único artigo todas as disposições a respeito do instituto da família.

No artigo 167 e seus quatro parágrafos ficou disposto que a

família seria constituída pelo casamento, suprimindo a palavra “indissolúvel”, tendo

ainda proteção dos Poderes Públicos. Essa foi a única alteração, sofrida no corpo da

Magna Carta no que se refere à família34.

Sendo assim, sobre as constituições anteriores à de 1988,

Oliveira ainda revela que:

[...] a regulamentação da Emenda nº 09/77, por intermédio da Lei 6.515/77, que passou a permitir o divórcio a vínculo, que dissolve o vínculo matrimonial e permite um novo casamento, admitindo o divórcio-conversão no art. 35 e o divórcio direto art. 40 da supracitada lei ordinária federal, permitindo esta ainda a normatização dos casos de dissolução da sociedade conjugal e do casamento, seus efeitos e respectivos processos, e deu ainda outras providências [...]35.

Diante das inúmeras mudanças da família, o legislador teve

que tomar uma posição mais ampla, com a Constituição Federal de 1988, o

legislador determinou posições para um novo conceito de família.

A nova Carta Magna, promulgada em 5 de outubro de 1988

inovou ao tratar do assunto “família” em seus dispositivos, uma vez que se adequou

à realidade brasileira.

O instituto familiar foi reconhecido como a base da sociedade,

prevalecendo a sua proteção por parte do Estado como nas Constituições

anteriores.

Uma grande novidade abrangida pela Carta Magna de 1988 foi

33

OLIVEIRA, José Sebastião de. Fundamentos Constitucionais do Direito de Família. p. 66.

34 RODEMBUSCH, Claudine Freire. A implementação de políticas públicas a partir do poder local em direção à prevenção e ao combate da violência intrafamiliar de que são vítimas as crianças e os adolescentes no município de Rio Pardo. 2008.

35 OLIVEIRA, José Sebastião de. Fundamentos Constitucionais do Direito de Família. p. 67.

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o reconhecimento da união estável como entidade familiar, já que não era plausível

que em pleno século XX, com todas as modernizações da sociedade e de suas

relações afetivas, somente o casamento indissolúvel fosse a fonte constitutiva de

uma entidade familiar, sendo pelo Estado protegida.

Era de extrema importância que também a união estável entre

homem e mulher passasse a dar origem ao instituto da família para que seus

membros pudessem desfrutar dos direitos previstos para esse instituto.

Porém não foi somente essa a novidade trazida pela

Constituição Federal de 1988. Em um de seus dispositivos ficou também

reconhecida como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e

seus descendentes. Dessa forma, o pai, somente, e seus filhos seriam vistos como

uma família no âmbito jurídico. Assim como a convivência entre a mãe, sem a

presença do pai, e seus filhos seria considerada uma entidade familiar36.

Essa inovação trazida pela ordem constitucional de 1988, segundo

Oliveira e Hironaka37, possibilitou que não só a triangularização existente na convivência

entre pai, mãe e filhos fosse capaz de formar uma família na esfera jurídica, mas também,

adequando-se à nova forma de vida da população, a relação entre somente o pai e os

filhos ou somente a mãe e os filhos recebessem a tutela do Estado por serem uma

família.

A Constituição Federal de 1988, além de criar novos meios de

formação do instituto familiar, também elencou alguns deveres a serem observados

por essa entidade, pelo Estado e pela sociedade em geral, quais sejam assegurar à

criança e ao adolescente o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao

lazer, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, à convivência familiar e

comunitária e à profissionalização. Ressalvada ainda a necessidade de se evitar

qualquer tipo de negligência, discriminação, violência, exploração, crueldade e

36

RODEMBUSCH, Claudine Freire. A implementação de políticas públicas a partir do poder local em direção à prevenção e ao combate da violência intrafamiliar de que são vítimas as crianças e os adolescentes no município de Rio Pardo. 2008.

37 OLIVEIRA, Euclides de; HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Direito de Família e o Novo Código Civil (Coord. Maria Berenice Dias e Rodrigo da Cunha Pereira). 4. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2005.

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opressão38.

Desse modo verifica-se que a nova ordem constitucional não

vê o casamento como indissolúvel, como nas Constituições anteriores,

permanecendo o caráter familiar em caso de desconstituição do vínculo matrimonial.

Com o disposto na CF/1988, os artigos do antigo Código Civil

que se baseavam na desigualdade conjugal e na superioridade do marido, perderam

a eficácia, ficou abolida a figura do chefe da sociedade conjugal. Não mais se

concede ao marido qualquer privilégio e as decisões que interessam à família

deverão ser tomadas por ambos os cônjuges (art. 226, § 5º, da CF)39.

1.3 A CONCEPÇÃO DA FAMÍLIA NA ATUALIDADE

Neste, se faz uma revisão teórica sobre o modelo de família na

atualidade.

Como aduz Osório:

A família é e continuará sendo, a par de seu papel na preservação da espécie, um laboratório de relações humanas onde se testam e aprimoram os modelos de convivência que ensejem o melhor aproveitamento dos potenciais humanos para a criação de uma sociedade mais harmônica e promotora de bem-estar coletivo40.

Em sua análise sobre a família atual, o autor também ensina

que:

A família está em crise, sim, para dar origem a novas formas de configurações familiares como as que se esboçam neste limiar século XXI, adequando-se às demandas desse novo giro na espiral ascendente de evolução humana. E, com a tendência à universalização dos hábitos e costumes através da miscigenação cultural propiciada pelo avanço extraordinário dos meios de comunicação, pela primeira vez na história da civilização humana podemos cogitar da emergência de um mesmo modelo familiar prevalente em todos os recantos da aldeia global, paradigma da

38

BRASIL. Constituição Federal do Brasil de 1988.

39 BRASIL. Constituição Federal do Brasil de 1988.

40 OSORIO, Luiz Carlos. Família hoje. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996. p. 47.

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sociedade do futuro no planeta que habitamos.41

Prosseguindo, o autor diz que se verifica assim, a importância

da família para a experiência de novos modelos de convivência. E talvez, uma

universalização do modelo de família.

Sobre este assunto anota Venosa, “a célula básica da família,

formada por pais e filhos, não se alterou, muito com a sociedade urbana. A família

atual, contudo, difere das formas antigas no que concerne a suas finalidades,

composição e papel de pais e mães”.42

1.3.1 A família advinda do casamento

Dias leciona em sua obra que o casamento é uma das formas

em que a família se constitui.

Quando da edição do Código Civil de 1916, era tal ordem a sacralização da família, que havia um único modo de se construir: pelo casamento. A família tinha viés patriarcal, e as regras legais refletiam esta realidade. Somente era reconhecida a família ungida pelos sagrados laços do matrimônio. Não havia outra modalidade de convívio aceitável. O casamento era indissolúvel. A resistência do Estado em admitir relacionamentos outros era de tal ordem que há única possibilidade de romper com o casamento era o desquite, que não dissolvia o vinculo matrimonial e impedia novo casamento.43

Dentre os autores brasileiros, a acepção do termo casamento é

diversa, já que envolve questões de constante modificação social e cultural.

Para Bevilaqua o matrimônio representa:

Um contrato bilateral e solene, pelo qual um homem e uma mulher se unem indissoluvelmente, legitimando por ele suas relações sexuais, estabelecendo a mais estreita comunhão de vida e de interesses, e comprometendo-se a criar e educar a prole que de ambos nascer44.

41

OSORIO, Luiz Carlos. Família hoje. p. 47.

42 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família, p. 5.

43 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 127.

44 BEVILAQUA, C. (1954 apud DINIZ, M. H. Curso de direito civil brasileiro. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. v. 5. p. 40.

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A legislação brasileira sempre priorizou a idéia de considerar

apenas o casamento como forma legítima de constituição de família, tendo

prevalecido tal pensamento por muitos anos, até uma modificação na sociedade e

conseqüentemente nas disposições legais.

De fato, a figura do casamento sempre teve grande importância

dentro da sociedade, uma vez que somente através dela é que duas pessoas de

sexos opostos poderiam se unir e dar continuidade à sua geração. Não se admitiam

outras formas de união no passado, sendo chamadas de concubinato, não havendo,

porém, nenhuma proteção legal.

Diniz, numa concepção mais moderna, define o casamento,

como “o vínculo jurídico entre o homem e a mulher que visa o auxílio mútuo material

e espiritual, de modo que haja uma integração fisiopsíquica e a construção de uma

família”45.

Com a evolução do homem e da sua vida social, a união entre

duas pessoas deixou de ser puramente realizada através do casamento, sendo

atualmente reconhecidas outras formas capazes de constituir uma família

legitimamente.

Neste sentido, Dias menciona:

[...] mas nova realidade se impôs, acabando por produzir profunda revolução na própria estrutura social. Tornou-se tão saliente o novo perfil da sociedade, que a Constituição de 1988 alargou o conceito de família para além do casamento. Passou a considerar como entidade familiar relacionamentos outros. Foi assegurada especial proteção tanto aos vínculos monoparentais – formados por um dos pais com seus filhos – como à união estável – relação de um homem e uma mulher não sacralizada pelo matrimônio (CF 226 § 3.º). Com isso deixou de ser o casamento o único marco a identificar a existência de uma família46.

Por fim, segundo Oliveira47, uma das espécies de família

admitidas pela Constituição Federal é a constituída pelo casamento. Não obstante

45

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família, 2002, p.39.

46 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 2006. p. 127e 128.

47 OLIVEIRA, Euclides de; HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Direito de Família e o Novo Código Civil (Coord. Maria Berenice Dias e Rodrigo da Cunha Pereira), 2005.

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tenha o constituinte ampliado as espécies de família, é inegável, como bem

constatou o professor Eduardo Leite, a precedência e excelência desta forma legal

de união (art. 226, § 3.º) em relação às demais entidades familiares.

A leitura do art. 226, § 3.º, da Constituição Federal

incentivadora da conversão de uniões estáveis em casamento “[...] Para efeito da

proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como

entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento [...]”, é prova

maior disso.

1.3.2 A família advinda da união estável

Se teve outra forma de união entre um homem e uma mulher,

cujo tipo de relação foi durante muitos anos denominada de concubinato, situação

em que o casal tinha uma relação extramatrimonial que não era reconhecida como

entidade familiar.

Conforme se manifesta Dias:

Até 1977, não existia divórcio. A única modalidade de separação que havia era o desquite, que não dissolvia a sociedade conjugal e impedia novo casamento. Tantas reprovações, contudo, não lograram coibir o surgimento de relações destituídas de amparo legal. As uniões, sugeridas sem o selo do matrimônio, eram identificadas com o nome de concubinato. Quando de seu rompimento, pela separação ou morte de um dos companheiros, demandas começaram a bater às portas do judiciário. Os primeiros julgados, que impulsionaram a construção de uma doutrina concubinária, são da década de 60 [...].48

Constata-se a falta de amparo legal no que diz respeito há

união estável nessa época e também a família por ela constituída.

Neste mesmo seara leciona Dias que:

[...], ou seja, os companheiros eram considerados sócios, precedendo-se a divisão dos “lucros” a fim de evitar que o acervo adquirido durante a vigência da “sociedade” ficasse somente com um

48

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 2006. p. 144.

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dos “sócios”, e detrimento, normalmente, da mulher [...].49

Para demonstrar a caracterização da união estável como

sendo uma sociedade, destaca-se a súmula 380 do Supremo Tribunal Federal,

“comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua

dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum”.50

Com a evolução dos costumes, as uniões extramatrimoniais acabaram merecendo a aceitação da sociedade, levando a Constituição a dar nova dimensão à concepção de família e introduzir em termo generalizante: entidade familiar. Alargou o conceito de família, passando a proteger relacionamentos outros além dos constituídos pelo casamento. Emprestou juridicamente aos enlaces extramatrimoniais até então marginalizados pela lei. Assim, o concubinato foi colocado sob regime de absoluta legalidade. As uniões de fato entre um homem e uma mulher foram reconhecidas como entidade familiar com o nome de união estável. Também foi estendida a proteção estatal aos vínculos monoparentais, formados por um dos pais com seus filhos.51

Observa-se que anteriormente a Carta Magna de 1988, a

família constituída por laços afetivos ou sociedade de fato, estava desamparada

legalmente.

Logo, considerada pela Constituição como um instituto capaz

de constituir uma família, a união estável que não se confunde com o casamento é

protegida pelo Estado, sendo os seus integrantes rodeados pelos deveres de

lealdade, respeito e assistência mútuos, além dos deveres de guarda, sustento e

educação dos filhos que surgirem.

1.3.3 A família monoparental: uma realidade do século XXI

Segundo Leite52, uma família é definida como monoparental

quando a pessoa considerada (homem ou mulher) encontra-se sem cônjuge, ou

49

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 2006. p. 145.

50 SÚMULA 380 do Supremo Tribunal Federal. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=380.NUME.%20NAO%20S.FLSV.&base=baseSumulas>: Acesso dia 22 de junho de 2010.

51 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 2006. p. 145.

52 LEITE, Eduardo de Oliveira. Famílias Monoparentais: A situação jurídica de pais e mães separados e dos filhos na ruptura da vida conjugal. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.

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companheiro e vive com uma ou várias crianças.

Maria Berenice Dias destaca:

A monoparentalidade tem origem quando da morte de um dos genitores, ou pela separação ou pelo divórcio dos pais. A adoção por pessoa solteira também faz surgir um vínculo monoparental. A inseminação artificial por mulher solteira ou a fecundação homóloga após a morte do marido são outros exemplos. A entidade familiar chefiada por algum parente que não um dos genitores, igualmente, constitui vínculo monoparental. Mesmo as estruturas de convívio constituídas por quem não seja parente, mas que tenha crianças ou adolescentes sob guarda, podem receber a mesma denominação. Basta haver diferença de gerações entre um de seus membros com os demais e que não haja relacionamento de ordem sexual entre eles para se ter configurada uma família monoparental.53

Diante da citação acima, percebe-se alguns tipos de famílias

monoparentais:

Por divórcio e separação:

[...] a separação gera uma família monoparental, por exemplo, a mãe fica com o filho. Num terceiro momento, essa mãe constitui nova família biparental, ou por um segundo casamento, ou através de união estável. Com a nova união, forma-se a chamada família reconstituída, infeliz expressão para nominar novo vínculo afetivo. Mas essa estrutura familiar, ainda que formada por um casal e o filho de um deles, persiste sendo uma família monoparental [...].54

De acordo com Leite55 a monoparentalidade “[...] se impôs

como fenômeno social nas três últimas décadas, mas, com maior intensidade, nos

últimos vinte anos, ou seja, no período em que se constata o maior número de

divórcios”. Tal fato pode-se dizer, passa a comprovar a importância do divórcio como

fator determinante da monoparentalidade.

Por adoção:

É reconhecida como família natural (ECA) a comunidade formada pelos pais ou qualquer deles e seus descendentes. A adoção por solteiro constitui uma alternativa justa, quebrando-se as discriminações que

53

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 2006. p. 184.

54 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 2006. p. 185.

55 LEITE, Eduardo de Oliveira. Famílias Monoparentais: A situação jurídica de pais e mães

separados e dos filhos na ruptura da vida conjugal, 2003, p. 21.

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existiam contra as famílias monoparentais. Pode adotar aquele que tem condições de oferecer sustento, educação e afeto a uma criança. O seu bem-estar e o seu interesse significam os elos fundamentais da filiação adotiva.56

Por solteiros:

[...] De modo bastante frequente, mulheres sozinha que desejam engravidar fazem uso da inseminação artificial. A família monoparental proveniente de inseminação em mulheres solteiras, pelo fato de a criança já nascer sem pai, tem gerado opiniões controversas. É no mínimo preconceituosa a postura doutrinária que sustenta que a mulher solteira não deve fazer uso do método reprodutivo assexual, por se prestar a interesses egoísticos [...].57

Por inseminação artificial:

Há, verdadeiramente, uma grande vacatio legis em relação á possibilidade de se constituir família por meio da reprodução assistida. A única normatização existente é o Conselho Federal de Medicina, que não impõe qualquer limitação à mulher solteira. Se ela é casada ou vive em união estável, é necessário a concordância do cônjuge ou do companheiro para submeter-se a procedimento reprodutivo. Aliás, a própria lei (CC 1.597) autoriza a formação de monoparentalidade ao permitir a utilização do esperma do marido pré-morto na fecundação post mortem.58

Por irmãos, tios e avós:

Dentro da nova realidade familiar, não apenas um dos pais e seus descendentes se caracteriza como família monoparental. A família construída somente pelos irmãos forma o que se chama de família anaparental, pois existe diferença de graus de parentesco entre seus membros. Tanto são prestigiadas tais relações de parentesco que s ascendentes e os parentes colaterais têm preferência párea serem nomeados tutores (1.731). Quando um tio assume a responsabilidade por seus sobrinhos, ou um dos avós passa a conviver com os netos, caracteriza-se, também, uma família monoparental.59

Por proteção estatal:

[...] As famílias monoparentais têm estrutura mais frágil. Quem vive sozinho com a prole acaba com encargos redobrados. Além dos cuidados com o lar e com os filhos, também necessita buscar meios

56

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 2006. p. 185.

57 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 2006. p. 186.

58 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 2006. p. 187.

59 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 2006. p. 188.

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de prover o sustento da família. Assim, imperioso que o Estado atenda a tais peculiaridades e dispense proteção especial a esses núcleos familiares [...].60

Em síntese, a família monoparental teve origem no surgimento da

família moderna, ocasião em que não existia a renúncia em viver maritalmente e ter

filhos, mas sim, o retardamento em oficializar esta união. Conforme Eduardo Oliveira

Leite61 “a sociedade brasileira também sofreu a influência deste novo modelo de

passagem em massa, da família legal à família de fato”. Devido, exatamente, a

expressividade destas mudanças, constatáveis na maioria dos países ocidentais, é que o

constituinte de 1988 reconheceu a existência da monoparentalidade familiar.

Entretanto, mesmo legalizando a existência deste tipo de

entidade familiar, a Constituição Federal não a colocou no mesmo patamar da

família oriunda do matrimônio civil. O que ocorreu foi à disposição ampla, no caput

do artigo 226 de que “a família, base da sociedade, tem especial proteção do

Estado”. De modo que a afirmação contida neste dispositivo pudesse abranger todas

as espécies de família.

Verifica-se pela doutrina apresentada que o legislador deixou

uma lacuna na lei, no que tange aos tipos de famílias monoparentais permitidas,

mas não há duvida que a modalidade de família monoparental esteja protegida pela

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

1.4 SEPARAÇÃO E A DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE CONJUGAL

A Constituição Federal de 1988, após um intenso processo de

constitucionalização formal e material das regras de Direito de Família, fez menção

expressa ao divórcio e à separação judicial em seu art. 226, § 6º, quando afirmou:

"O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial

por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato

por mais de dois anos".

Antes, porém, de se abordar examinar as duas principais

60

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 2006. p. 188.

61 LEITE, Eduardo de Oliveira. Famílias Monoparentais: A situação jurídica de pais e mães separados e dos filhos na ruptura da vida conjugal, 2003, p. 17.

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hipóteses de extinção da sociedade conjugal e do casamento, a saber, a separação

e o divórcio, é conveniente dissertar, mesmo que de forma sumária, sobre a

separação de fato.

Esta, de acordo com Nader62, pode ser definida como um fato

jurídico eficaz, caracterizado pela interrupção efetiva e estável da convivência

conjugal não declarada judicialmente.

Conforme o autor63, a separação de fato apresenta três

caracteres dignos de apreciação:

a) Sua ocorrência não se confunde com situações episódicas (viagens, ausências temporárias para tratamento de saúde ou de interesses profissionais) ou temporárias, ainda que dilatadas no tempo, ao estilo de serviço militar ou civil no exterior.

b) A separação pode-se dar por mútuo consentimento dos cônjuges, o que não gera qualquer eficácia negativa, ao exemplo do art. 1.573, inciso IV, CCB/2002, que considera como causa de impossibilidade da comunhão de vida a ocorrência de "abandono voluntário do lar conjugal, durante um ano contínuo".

c) Se unilateral e durável por mais de um ano, como já exposto, pode servir de fundamento para qualificar a impossibilidade de comunhão de vida (art. 1.573, inciso IV, CCB/2002). Como conseqüência, poderá o cônjuge requerer a separação judicial, com fundamento no § 1º do art. 1.572, CCB/200264.

Rigorosamente, a separação de fato não extingue a sociedade

conjugal e, com isso, em tese, permanecem válidas as regras atinentes ao regime

de bens. O Código Civil, no entanto, abre algumas exceções. Por exemplo, o

indivíduo separado de fato pode constituir união estável, nos termos do art. 1.723, §

1º, CCB/2002. Dito de outro modo, a circunstância de se encontrar casado, mas

faticamente separado, não é mais considerada como impedimento jurídico ao

reconhecimento da validade e da eficácia da união estável65.

Logo, a separação judicial, antigo desquite, poderia ocorrer de

62

NADER, Paulo. Curso de direito civil: Direito de família. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008. v. 5, p. 199.

63 NADER, Paulo. Curso de direito civil: Direito de família. p. 199.

64 "A separação judicial pode também ser pedida se um dos cônjuges provar ruptura da vida em

comum há mais de um ano e a impossibilidade de sua reconstituição."

65 NADER, Paulo. Curso de direito civil: Direito de família. p. 209.

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modo consensual ou litigioso.

Após o advento da Lei n. 11.441, de 4 de janeiro de 2007,

criou-se a possibilidade de realizar a separação consensual sem o recurso ao Poder

Judiciário. Com isso, faz-se necessário estabelecer o tertius em relação à antiga

dicotomia separação judicial-consensual e separação judicial-litigiosa. Agora, existe

a separação extrajudicial-consensual66.

A separação judicial por mútuo consentimento, dita consensual,

é o modo de extinção da sociedade conjugal, admitido para cônjuges casados por

mais de 1 ano, que requerem ao juiz a homologação de seu acordo de vontades

orientado a dissolver os laços. O papel do magistrado é o de apor um requisito de

eficácia a um negócio jurídico privado, que os cônjuges celebraram previamente,

estabelecendo como será extinta a sociedade que os prendia. Caberá ao juiz

examinar os aspectos formais. No entanto, admite-se que avance sobre a vontade

manifestada quando "se apurar que a convenção não preserva suficientemente os

interesses dos filhos ou de um dos cônjuges" (art. 1.574, parágrafo único,

CCB/2002)67.

A separação é personalíssima. Admite-se, porém, que o

cônjuge incapaz seja representado pelo curador, pelo ascendente ou pelo irmão68.

Orlando Gomes em sua obra leciona sobre dissolução da

sociedade conjugal que:

O casamento válido dissolve-se com a morte de um dos cônjuges ou pelo divórcio. Sobrevivem, entretanto, alguns efeitos, como, por exemplo, o direito da mulher, no primeiro caso, de continuar a usar o nome do marido e herdar seus bens, não havendo descendentes ou ascendentes, e, no segundo, direito de receber pensão alimentícia. A dissolução do vínculo implica a da sociedade conjugal.69

A Lei n. 11.441, de 04.01.2007, alterou o Código de Processo

Civil e permitiu a realização de inventário, partilha, separação consensual e divórcio

66

MARTINS, Humberto Eustáquio Soares. Dissolução da Sociedade Conjugal no Código Civil de 2002: separação consensual judicial e extrajudicial. [s.d.]. Disponível em: < bdjur.stj.gov.br/.../Dissolução_Sociedade_Conjugal.doc.pdf?...>. Acesso em: Nov. 2010.

67 MARTINS, Humberto Eustáquio Soares. Dissolução da Sociedade Conjugal no Código Civil de 2002: separação consensual judicial e extrajudicial, [s.d.], p.9.

68 Art. 1.576, parágrafo único, CCB/2002.

69 GOMES, Orlando. Direito de família, p. 207.

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consensual por via administrativa. Inspirada no direito português, essa norma retirou

dos negócios jurídicos privados que dissolviam a sociedade conjugal ou o

casamento, bem assim arrolavam bens para partição entre herdeiros ou cônjuges, a

necessidade de um fato eficacial – a sentença do juiz70.

No entanto, o Congresso Nacional promulgou a Lei de Divórcio

direto no dia 13 de julho de 2010, tornando-se o divórcio IMEDIATO e passando a

valer a partir da publicação no Diário Oficial.

A emenda constitucional 66/2010, muito clara, acaba de vez

com a possibilidade de separação judicial, onde será feita a partilha dos bens,

regulamentação de visitas, alimentos, ou seja, tudo que se deve discutir no montante

da dissolução do casal, a qual deve ser clara e descrita na peça inaugural do

divórcio71. Ou seja, a emenda em sua integra diz o seguinte:

Dá nova redação ao § 6º do art. 226 da Constituição Federal,

que dispõe sobre a dissolubilidade do casamento civil pelo divórcio, suprimindo o

requisito de prévia separação judicial por mais de 1 (um) ano ou de comprovada

separação de fato por mais de 2 (dois) anos.

Sendo assim, não mais existindo a separação judicial, ou de

fato, o pré-requisito para o divórcio é ESTAR CASADO, pois a nova emenda

eliminou quaisquer pré-requisitos ou requisitos estabelecidos anteriormente72.

70

MARTINS, Humberto Eustáquio Soares. Dissolução da Sociedade Conjugal no Código Civil de 2002: separação consensual judicial e extrajudicial, [s.d.], p.13.

71 MELLO, Maria Angélica de. A nova lei do divórcio. Ago. 2010. Disponível em: < www.adufscar.org.br/caixa.../lei_nova_de_divorcio_direito_ref1472.pdf>. Acesso em: Nov. 2010.

72 MELLO, Maria Angélica de. A nova lei do divórcio. Ago. 2010.

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33

CAPÍTULO 2

O PODER FAMILIAR

2.1 DO PÁTRIO PODER AO PODER FAMILIAR

Na literatura pertinente se encontram várias definições acerca

da expressão pátrio poder.

Diniz informa em sua obra o seguinte entendimento sobre tal

expressão:

Conjunto de direitos e obrigações, quanto à pessoa e bens do filho menor não emancipado, exercido, em igualdade de condições, por ambos os pais, para que possam desempenhar os encargos que a norma jurídica lhes impõe, tendo em vista o interesse e a proteção do filho73.

Para Monteiro, o instituto é considerado como o "conjunto de

obrigações, a cargo dos pais, no tocante à pessoa e bens dos filhos menores"74.

Logo, Santiago Júnior possui o entendimento sobre o instituto

como sendo um "conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais, no tocante à

pessoa e aos bens dos filhos menores"75.

Em suma, o pátrio poder surgiu em épocas muito remotas,

ultrapassando as fronteiras culturais e sociais, chegando ao ponto que seu

surgimento se dá a partir do momento em que os homens passaram a conviver em

grupos, clãs, e outros tipos de sociedade, surgindo assim “a necessidade da

existência de um poder familiar para conseguir garantir a paz social, ou seja, a

73

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 372.

74 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. Parte geral. Direito Civil: Direito de Família. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 277.

75 CAMPOS JUNIOR, Aluisio Santiago. Direito de Família. O novo direito de família. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 317.

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harmonia da sociedade”76.

É importante se destacar que a terminologia pátrio poder, a

partir de 11/01/03 foi substituída por poder familiar, bem como, com o término da

expressão pátrio poder, também se extinguiu aquele resquício da pátria potestas

romana, o qual a figura do pai (pátrio) obtinha mais ênfase em relação a figura

materna.

Dias, sobre o assunto alude o seguinte:

[...] A expressão “poder familiar” é nova. Correspondente ao antigo pátrio poder, termo que retoma ao direito romano: pater potestas – direito absoluto e ilimitado conferido ao chefe da organização familiar sobre a pessoa dos filhos. A conotação machista do vocábulo pátrio poder flagrante, pois só menciona o poder do pai com relação dos filhos. Como se trata de um termo que guarda resquícios de uma sociedade patriarcal, o movimento feminista reagiu daí o novo termo: poder familiar [...].77

Nesse mesmo sentido Silvio de Salvo Venosa, rege o seguinte:

Em várias oportunidades, [...] referimo-nos ao pátrio poder, que o atual Código, cioso da igualdade constitucional entre o homem e a mulher, preferiu denominar poder familiar. O projeto do Estatuto das famílias prefere denominar “autoridade parental”, fugindo a idéia de poder que não deve existir no seio da família. Trata-se de instituto que se alterou bastante no curso da história, acompanhando, em síntese, trajetória da história da própria família. No Direito Romano, a pátria potestas representava um poder incontrastável do chefe de família.78

Ainda quanto o pátrio poder Venosa anota:

[...] Em Roma, o pátrio poder tem uma conotação eminentemente religiosa: o pater famílias é o condutor da religião doméstica, o que explica seu aparente excesso de rigor. O pai romano não apenas conduzia a religião, como todo grupo familiar, que podia ser numeroso, com muitos agregados e escravos [...].79

Percebe-se diante dos textos supracitados, que o pátrio poder

76

PERES, Luiz Felipe Lyrio. Guarda compartilhada. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3533>. Acesso em: 20 jun. 2010.

77 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 2006. p. 343.

78 Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família, p. 293.

79 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família, 2008, p. 295.

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exercido sempre pelo sexo masculino, detinha a autoridade máxima sobre todos os

assuntos inerentes a todo o grupo familiar.

Em suma, o pátrio poder surgiu em épocas muito remotas,

ultrapassando as fronteiras culturais e sociais, chegando ao ponto que seu

surgimento se dá a partir do momento em que os homens passaram a conviver em

grupos, clãs, e outros tipos de sociedade, surgindo assim “a necessidade da

existência de um poder familiar para conseguir garantir a paz social, ou seja, a

harmonia da sociedade”80.

2.2 CONCEITO E CARACTERÍSTICAS DO PODER FAMILIAR

A denominação „poder familiar‟ trata do instituto que, no

anterior Código, vinha com o nome de „pátrio poder‟.

Leciona a doutrinadora Diniz que o Poder familiar é:

É o conjunto de direitos e obrigações, quanto à pessoa e bens do filho menor não emancipado, exercido pelos pais, para que possam desempenhar os encargos que a norma jurídica lhes impõe, tendo em vista o interesse e a proteção do filho.81

O autor Rizzard, ensina em sua obra que o poder familiar tem

como definição:

[...] pode-se ir além e dizer que se trata de uma conduta dos pais relativamente aos filhos, de um acompanhamento para conseguir a abertura dos mesmos, que se processará progressivamente, à medida que evoluem na idade e no desenvolvimento físico e mental, de modos a dirigi-los a alcançarem sua própria capacidade para se dirigirem e administrarem seus bens.[...]82

Dias descreve seu conceito no que tange ao poder familiar:

80

PERES, Luiz Felipe Lyrio. Guarda compartilhada. 2002.

81 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, v.5: direito de família. 19. ed.São Paulo: Saraiva, 2004, p. 492.

82 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: lei 10406, de 10.01.2002, Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 601.

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De objeto de direito, o filho passou a sujeito de direito. Essa inversão ensejou a modificação do conteúdo do poder familiar, em face do interesse social que envolve. Não se trata do exercício de uma autoridade, mas de um encargo imposto por lei aos pais. O poder familiar é sempre trazido como exemplo da noção de direito poder-função ou direito-dever, consagradora da teoria funcionalista das normas de direito das famílias: poder que é exercido pelos genitores, mas que serve ao interesse do filho.83

Observa-se que mudou o conceito que hora foi atribuído ao

poder familiar, antes este mesmo instituto tratava a prole como objeto que o genitor

detinha o poder sobre sua vida, agora com a evolução do ordenamento jurídico e da

sociedade se deu mais valor afetivo ao filho, dando aos pais a obrigação de

resguardar a pessoa do filho e seus bens.

Quanto a características do poder familiar anota Diniz o

seguinte:

[...] constitui um manus público, isto é, uma espécie de função correspondente a um cargo privado, sendo o poder familiar um direito-função e um poder-dever, que estaria numa posição intermediária entre poder e o direito subjetivo. É irrenunciável, pois os pais não podem abrir mão dele. É inalienável ou indisponível, no sentido de que não pode ser transferido pelos pais a outrem, a título gratuito ou oneroso; a única exceção a essa regra, que foi permitida em nosso ordenamento jurídico, era a delegação do poder familiar, desejada pelos pais ou responsáveis, para prevenir a ocorrência de situação irregular do menor. É imprescritível, já que dele não decaem os genitores pelo simples fato de deixarem de exercê-lo; somente poderão perdê-lo nos casos previsto em lei. É incompatível com a tutela, não se pode, portanto, nomear tutor a menor, cujo pai ou mãe não foi suspenso ou destituído do poder familiar. Conserva, ainda, a natureza de uma relação de autoridade, por haver um vínculo de subordinação entre pais e filhos, pois os genitores têm o poder de mando e a prole, o dever de obediência.84

Conclui-se que diante de algumas características do poder

familiar, os pais e os filhos têm funções que se tornam indispensáveis pra um

convívio harmônico, tanto no dever dos pais em cuidar e impor responsabilidades

como também nas funções dos filhos em obedecê-los.

83

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 344.

84 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 476.

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2.3 O PODER FAMILIAR NO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO DE 2002 E NO

ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Quanto o que está redigido na legislação brasileira sobre o

poder familiar, anota a doutrinadora Dias o seguinte:

Não só a lei civil (CC 1.630 a 1.638), mas também o ECA trata do poder familiar, quando fala do direito à convivência familiar e comunitária (ECA 21 a 24) e da perda e suspensão do poder familiar (ECA 155 a 163).85

Ainda Dias, leciona quanto ao poder familiar:

O poder familiar é exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil (ECA 21). A referência à lei civil mera superfetação. Ainda que o estatuto menorista ressalte os deveres dos pais, o Código Civil limita-se a afirmar que os filhos estão sujeitos ao poder familiar, enquanto menores (CC 1.630). O filho não reconhecido pelo pai fica sob autoridade da mãe (CC 1.633). Regra aliás, de todo inútil, pois, desconhecido o pai, é evidente que ele não pode concorrer no exercício do poder familiar. Se a mãe também for desconhecida, o menor ficará sob autoridade de tutor. O ECA é mais abrangente, admitindo a colocação do menor em família substituta, mediante guarda, em tutela ou adoção (ECA 28).86

Sobre este mesmo assunto, Rizzardo, compreende nestes

termos, que o artigo 1.634 do Código Civil elenca uma série de obrigações, mas a

título de exemplo, embora sejam da ciência natural das pessoas os encargos da

paternidade. Não são necessárias maiores explicações, dada a facilidade de sua

compreensão:

Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores:

I – dirigir-lhes a criação e educação; II – tê-los em sua companhia e guarda; III – conceder-lhes, ou negar-lhes consentimento para casarem; IV – nomear-lhes tutor, por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais lhe não sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar; V – representá-los, até aos 16 anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;

85

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 2006, p. 346.

86 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 2006, p. 346.

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VI – reclamá-los de quem igualmente os detenha; VII – exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.”87

O Estatuto da Criança e do Adolescente e o Código Civil

ressaltam o dever que os pais têm de prover todos os meios para que os filhos

possam estudar ter saúde e, enfim, uma vida com dignidade.

2.4 O PODER FAMILIAR E SEU EXERCÍCIO

Quanto ao exercício do poder familiar, pode-se apontar o

ressaltado pela doutrinadora Dias:

O elenco dos deveres inerentes ao poder familiar também não faz referência expressa aos deveres impostos aos pais pela Constituição (CF 227 e 229) e pelo estatuto menorista (ECA 22). Assim, aos poderes assegurados pela lei civil somam-se todos os outros que também são inerentes ao poder familiar. Como o ensino é reconhecido como um direito subjetivo público, é dever do Estado e da família promovê-lo e incentivá-lo (CF 205 e 208 § 1º), dilatando-se o poder de familiar. Portanto, mais um dever é atribuído aos pais, qual seja o de manter os filhos na escola. Aliás, no dever de alimentos, modo expresso está imposto o de garantir às necessidades de educação (CC 1.694). A omissão dos genitores, deixando de garantir a sobrevivência dos filhos, como, por exemplo, deixando imotivadamente de pagar os alimentos, configura o delito de abandono material (CP 244). O inadimplemento da obrigação de prover a educação dos filhos, além do delito de abandono intelectual (CP 246), também constitui infração administrativa (ECA 249).88

Ainda sobre o exercício do poder familiar Dias anota:

Pelos atos praticados pelos filhos, enquanto menores são responsáveis aos pais (CC 932 I). Trata-se de responsabilidade civil objetiva por ato de terceiro. Ainda que a referência legal seja aos pais que estiverem com os filhos em sua companhia, descabido não responsabilizar também o genitor que não detém a guarda do filho. Mesmo que não esteja em sua companhia, está sob sua autoridade. Ambos os pais exercem o poder familiar. Ao depois, cuida-se de responsabilidade objetiva (CC 933), o que confere plena atuação aos princípios da paternidade responsável e do melhor interesse da criança e do adolescente, deixando clara a importância do papel que os pais devem desempenhar no processo de educação e de

87

RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: lei 10406, de 10.01.2002, p. 606.

88 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 2006, p. 349.

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desenvolvimento da personalidade dos menores.89

Dias elenca ainda: “Assim, em vez de punir o genitor, é dever

de o Estado intervir de forma mais efetiva, disponibilizando acompanhamento

psicológico a quem se nega a estudar.90

Entende-se que o exercício do poder familiar está não só

condicionado aos pais, mas também ao Estado, onde em determinados casos deve

intervir para o bem maior em favor do menor.

2.5 EXTINÇÃO, SUSPENSÃO E PERDA DO PODER FAMILIAR

O Código Civil regula a extinção, a suspensão e a perda do

poder familiar.

O poder familiar é um dever dos pais a ser exercido no interesse do filho. O Estado moderno sente-se legitimado a entrar no recesso da família, a fim de defender os menores que aí vivem. Assim reserva-se o direito de fiscalizar o adimplemento de tal encargo, podendo suspender e ate excluir o poder familiar. Quando um ou ambos os genitores deixam de cumprir com os deveres decorrentes do poder familiar, mantendo comportamento que possa vir em prejuízo do filho, o Estado deve intervir. É prioritário preservar a integridade física e psíquica de crianças e adolescentes, nem que para isso tenha o Poder Público de afastá-los do convívio dos seus pais.91

Ensina Dias que:

Representa a suspensão do poder familiar medida menos grave, tanto que se sujeita a revisão. Superadas as causas que a provocam, pode ser cancelada sempre que a convivência familiar atender ao interesse dos filhos. A suspensão é facultativa, podendo o juiz deixar de aplicá-la. Tanto pode ser decretada com a referência a um único filho e não a toda prole, como pode abranger apenas algumas prerrogativas do poder familiar. Em caso de má gestão dos bens dos menores, possível é somente afastar o genitor da sua administração, permanecendo ele com os demais encargos inerentes ao poder familiar.92

89

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 2006, p. 350.

90 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 2006, p. 349.

91 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 2006, p. 352.

92 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 2006, p. 353.

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Diniz também traz com grande maestria o seu ensinamento

sobre o instituto da suspensão do poder familiar.

As causas determinantes da suspensão do poder familiar estão arroladas, genericamente, no Código Civil, art. 1.637 (abuso do poder do pai ou mãe: falta aos deveres paternos – se deixam o filho em estado habitual de vadiagem, libertinagem, criminalidade; se o privam de alimentos, pondo em perigo a sua saúde ou de o maltratam; e dilapidação dos bens do filho), para que o juiz, a requerimento de algum parente ou do Ministério Público, possa adotar medida que lhe pareça mais convincente à segurança do menor e seus deveres, suspendendo, até quando convenha, o poder familiar. Também a Lei n. 8.069/90, arts. 24 e 129, X, estatui que a autoridade judiciária poderá decretar a suspensão do poder familiar do pai ou da mãe que der causa a situação irregular do menor. Suspende-se, igualmente, o exercício do poder familiar, se o pai ou a mãe sofrer condenação por sentença irrecorrível, por te cometido crime cuja pena exceda de 2 anos de prisão (CC, art. 1.637, parágrafo único)93.

Observa-se que tanto o código menorista como também o

código civil regula as causas de suspensão do poder familiar, a suspensão poderá

ser revista e igualmente terá o direito de reintegração do exercício do poder familiar

quem ora foi destituído se ficar comprovado a regularização da causa que provocou

a suspensão.

Já quanto à perda e extinção do poder familiar, será de

natureza mais grave, a irregularidade praticada por quem detém o exercício do

poder familiar.

Dias anota sobre o tema o seguinte “a perda do poder familiar

é sanção de maior alcance e correspondente à infringência de um dever mais

relevante, sendo medida imperativa, e não facultativa”.

Ainda sobre a perda do poder familiar, Dias leciona:

A perda do poder familiar é sanção de maior alcance e correspondente à infringência de um dever mais relevante, sendo medida imperativa, e não facultativa. Extingui-se o poder familiar (CC 1.635): I – pela morte dos pais ou do filho; II – pela emancipação; III – pela maioridade; IV – pela adoção do filho por terceiros; e V – em virtude de decisão judicial. Judicialmente, extingui-se o poder familiar quando comprovada a ocorrência de (CC 1.638): I – castigo

93

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. 2004, p. 486.

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41

imoderado; II – abandono; III – prática de atos contrários à moral e aos bons costumes; e IV – reiteração de falta aos deveres inerentes ao poder familiar. Há, ainda, outra hipótese: cometido crime doloso contra o filho, punido com pena de reclusão, a perda do poder familiar é efeito anexo a condenação (CP 92).94

Prossegue Dias com a anotação de que:

[...] A perda do poder familiar não deve implicar a extinção no sentido de afastamento definitivo ou impossibilidade permanente. De qualquer forma, como o principio da proteção integral dos interesses da criança deve ser, por imperativo constitucional, o norte, parece que a regra de se ter por extinto o poder familiar em toda e qualquer hipótese de perda não é a que melhor atende aos interesses do menor [...].95

Diante do exposto pode-se concluir que o poder familiar pode

ser extinto, diante das prerrogativas do código civil brasileiro, assim, demonstra-se

de suma importância para o desenvolvimento da prole a presença de alguém que

exerça de forma digna o poder familiar.

Logo, no capítulo 3 abordar-se-á a Guarda Compartilhada,

objeto primordial do presente estudo.

94

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 2006, p. 354.

95 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, 2006, p. 355.

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CAPÍTULO 3

GUARDA COMPARTILHADA:

UMA NOVA OPÇÃO PARA PAIS E FILHOS

3.1 GUARDA

Quanto ao tema ora proposto Maria Helena Diniz assevera que

pela Lei n. 8.069/90, art. 28, constitui a guarda um meio de colocar menor em família

substituta ou em associação, independentemente de sua situação jurídica (arts. 165

a 170), até que se resolva, definitivamente, o destino do menor. A destinar-se-á à

prestação de assistência material, moral e educacional ao menor, sob pena de

incorrer no art. 249, dando ao seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive

aos pais (art. 33), regularizando assim a posse de fato. Visa atender a criança que

está em estado de abandono ou tenha sofrido abuso dos pais, não importando

prévia suspensão ou destituição do poder familiar. Trata-se de guarda legal

concedida judicialmente.96

3.1.1 Definição de Guarda

A concessão da guarda do menor é de extrema importância já

que a partir do momento em que ficar definida para uma das partes, a que a obter

terá uma maior responsabilidade, pois será responsável pela sua formação, já que

conviverá mais com este menor.

O que muitas vezes se observa no desenrolar das separações conjugais é que normalmente a criança é tratada como um objeto a transferir ou a manter consigo, sem considerações maiores pela sua pessoa, pelo sujeito de Direito. O que assistimos é que, muitas vezes, ela é submetida a sofrimentos enormes com conseqüências dramáticas para seu desenvolvimento psicológico saudável97.

96

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 535.

97 MOTTA, Maria Antonieta Pisano. Guarda Compartilhada: uma solução possível. Revista Literária de Direito, 1996, p. 197.

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Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a

guarda é definida através dos elementos que lhe asseguram, conforme os artigos:

Art. 21:

O pátrio poder será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência.

Deve-se ressaltar aqui que caso ocorra desavenças entre o

exercício do Poder familiar, se fará necessário recorrer ao poder judiciário, ao qual

será incumbido de examinar a situação de fato, recusando-se este a homologar

qualquer proposta que lhe pareça não preservar o interesse do menor.

Segundo o art. 22 do ECA, “Aos pais incumbe o dever de

sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhe ainda, no interesse

destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais”, Diniz

leciona que:

A norma jurídica fala que é de competência dos pais a criação e educação dos filhos, todavia, nada se fala em como devem ser essa criação e educação. Leva-se em conta os laços familiares, pois a vida íntima desenvolve-se por si só. Porém cabe ainda dirigir espiritual e moralmente os filhos98.

Porém, prossegue a autora ressaltando que; “[...] perderão o

poder familiar os pais que deixarem de cumprir o dever legal e moral de criar e

educar os filhos e sofrerão as sanções previstas no Código Penal para o crime de

abandono material dos menores99.

Diante do exposto, Carvalho alude que, é, pois, “[...] a guarda o

dever de proteção que se caracteriza pela companhia dos pais junto ao menor”100.

Logo, observando-se o art. 33 da mesma legislação, tem-se

que “A guarda obriga à prestação de assistência material, moral e educacional à

98

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, p 451.

99 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, p 452.

100 CARVALHO, João Andrades. Tutela, Curatela, Guarda, Visita e Pátrio Poder. Rio de Janeiro: AIDE, 1995, p. 145.

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criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros,

inclusive aos pais”.

Assim então, Diniz101 considera que a guarda, “visa prestar

assistência material, moral e educacional ao menor, regularizando-se assim, a posse

de fato”.

Constata-se que há uma certa dificuldade em se discernir a

expressão guarda.

Para Grisard Filho a Guarda é um “direito-dever natural” que

tem sua origem nos pais e na sua convivência com os filhos, é a partir desse

instituto que pode haver o exercício das prerrogativas de proteção ao menor.102

Ou ainda, “a guarda é definida como "um direito-dever natural e

originário dos pais, que consiste na convivência com seus filhos, previsto no art. 384,

II, do CC e é o pressuposto que possibilita o exercício de todas as funções

paternas."103

Segundo a definição de Santos Neto104, a guarda trata-se de

um direito consistente na posse de menor oponível a terceiros e que acarreta

deveres de vigilância em relação a este.

Em sua obra Pelegrini destaca sobre guarda o seguinte

conceito:

A guarda se caracteriza como uma forma de acolhimento jurídico do menor em uma família. Aquele que obteve a guarda assumirá muitos deveres e responsabilidade para seus filhos, como a educação, saúde, assistência integral, lazer, moradia, vida digna, dentre tantos outros. Aquele indivíduo que adquire a guarda exerce o poder familiar sobre o seu lar e sobre o menor, sendo responsável para sua

101

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, p 502.

102 GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental, p. 50.

103 GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. p. 157.

104 SANTOS NETO. José de Paula. Do pátrio poder. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993.

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proteção perante a sociedade.105

Portanto, a guarda integra o conjunto de deveres que o

ordenamento jurídico impõe aos pais em relação às pessoas e bens dos filhos.

A doutrina ainda faz uma distinção entre a guarda jurídica e a

guarda física. A primeira refere-se às relações de caráter pessoal que surgem do

poder familiar, como o sustento, educação, respeito e honra, enquanto a segunda

caracteriza-se pela idéia de posse, custódia.

3.1.2 Espécies de guarda

Divide-se os meios de exercício de guarda em quatro espécies

diferentes, quais sejam: A Guarda Alternada; Aninhamento ou Nidação; Guarda

Dividida, Guarda Única ou Guarda Exclusiva e, Guarda Compartilhada ou Conjunta.

Segundo Bonfim106, a "guarda alternada" não tem sido vista

com bons olhos pelo Poder Judiciário, além de ser manifestamente repudiada por

renomados profissionais no âmbito da psicologia.

Leciona Grisard Filho107 que na Guarda alternada, "Não há

constância de moradia, a formação dos hábitos deixa a desejar, porque eles não

sabem que orientação seguir, se do meio familiar paterno ou materno”.

A guarda alternada, permanecendo o filho uma semana com cada um dos pais não é aconselhável pois as repetidas quebras na continuidade das relações e ambiência afetiva, o elevado número de separações e reaproximações provocam no menor instabilidade emocional e psíquica, prejudicando seu normal desenvolvimento, por vezes retrocessos irrecuperáveis, a não recomendar o modelo alternado, uma caricata divisão pela metade em que os pais são obrigados por lei a dividir pela metade o tempo passado com os

105

PELEGRINI, Nadson Chaves. Guarda compartilhada. Disponível em: <HTTP://www.atigonal.com/legislacao-artigos/a-importancia-da-guradacompartilhada-421753.html>. Acesso em 05 de outubro de 2010.

106 BONFIM, Paulo Andreatto. Guarda compartilhada x guarda alternada: delineamentos teóricos e práticos. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 815, 26 set. 2005. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/7335>. Acesso em: 8 nov. 2010.

107 GRISARD FILHO, Waldir. Guarda Compartilhada. Revista dos Tribunais, 2. ed., 2002, p. 190.

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filhos108.

Em suma, a Guarda Alternada caracteriza-se pela

probabilidade de cada um dos pais ter a guarda do filho alternadamente, segundo

determinado tempo.

Para melhor discernimento,

[...] cada genitor detém a guarda do filho segundo um esquema pré-estabelecido. Os papéis se invertem, de acordo com a inversão da guarda, ficando o menor ora com um ora com outro dos pais, o qual em seu período assume todos os atributos próprios da guarda109.

Através da guarda alternada os genitores ficarão por período

de tempo pré-estabelecido, geralmente de forma equânime e exclusiva, com a

criança ou adolescente, exercendo a totalidade dos poderes - deveres que integram

o poder familiar.

Por fim, segundo Grisard Filho110, “A guarda alternada, embora

descontínua, não deixa de ser única”.

Referente ao Aninhamento ou Nidação, pode-se destacar

conforme Silva, que a palavra nidação vem da palavra ninho. O aninhamento

consiste em um tipo de guarda raro que não existe no Brasil, mas sim nos EUA,

onde os pais se revezam mudando-se para a casa onde vivem as crianças.

A esse respeito, dispõe Brandão111: "[...] consiste na

permanência da criança ou adolescente numa casa, cabendo a cada um dos pais,

por períodos alternados, a mudança para lá a fim de atender e conviver com os

filhos".

Ou seja, há uma residência fixa onde a criança mora, o menor,

108

TJSC - Agravo de instrumento n. 00.000236-4, da Capital, Rel. Des. Alcides Aguiar, j. 26.06.2000.

109 SCHWERTNER, Vera Maria. Guarda Compartilhada, [on line]. Disponível em http://www.RJ.apase.org.br> Acesso em: Nov. 2010, p 06.

110 GRISARD FILHO, Waldir. Guarda Compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 106.

111 BRANDÃO, Débora. Guarda compartilhada, [on line]. Disponível em http://www.mundojurídico.adv.br/html/artigos/documentos/texto436.htm. Acesso em: Nov. 2010, p. 04.

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não sai da sua casa, são os pais é que deixam seu lar e permanecem determinados

períodos de tempo na residência do menor.

Logo, sobre a Guarda Dividida, Guarda Única ou Guarda

Exclusiva, concorda-se que é o modelo mais comum, mais utilizado sendo que um

dos pais tem a convivência diária com o filho e o outro apenas visitas.

Conforme Grisard Filho112,

Essa modalidade apresenta-se mais favorável ao menor, enquanto viver em um lar fixo, determinado, recebendo a visita periódica do genitor que não tem a guarda. A sistemática atribuição da guarda à mãe gerou distorções no sistema, levando os juristas a procurar outro meio, mais justo, de exercício da parentalidade. A ausência sistemática do filho pela periodicidade forçada desestimulou o exercício da guarda, levando os pais, que se viram negligenciados pela sociedade, a se afastarem do convívio com os filhos.

Ou seja, esta é a espécie em que a autoridade parental

exercida anteriormente pelo pai e pela mãe em igualdade de condições, passa a ser

exercida apenas por um deles.

No entanto, ainda ressalta-se que quanto a modalidades

adotadas na maioria das vezes pelo ordenamento jurídico brasileiro, Akel113 salienta

que dentro do longo processo de modificação nas relações familiares, o conceito de

família biparental, ou seja, aquela formada por ambos os genitores, pai e mãe, deu

origem a uma nova forma de organização familiar.

Contudo, de acordo com Levy, é importante salientar que

[...] o exercício de alguns atributos do poder familiar permanece em conjunto, como, por exemplo, nos casos do consentimento para o casamento, da emancipação e da adoção, justamente por implicarem a extinção do próprio poder familiar, e outras específicas, como no caso de autorização para viagem do filho para o exterior.114

112

GRISARD FILHO, Waldir. Guarda Compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental, p. 108.

113 AKEL, Ana Carolina Silveira. Guarda compartilhada: um avanço para família, 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 103.

114 LEVY, Fernanda Rocha Lourenço. Guarda de filhos: os conflitos no exercício do poder familiar. São Paulo: Atlas, 2008. p. 54.

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Sobre este tema a autora Akel ainda menciona:

A guarda pode ser exercida de maneira exclusiva por um dos genitores, em decorrência de titularidade exclusiva do poder familiar, como, por exemplo, na falta de reconhecimento da paternidade, nas hipóteses de perda ou suspensão do poder familiar, ou no caso de co-titularidade do poder familiar e fracionamento do exercício do poder familiar, em razão da ausência ou ruptura do relacionamento conjugal dos genitores, por meio de acordo ou decisão judicial atribuidor de exercício da guarda a somente um dos genitores.115

Quanto à preferência dada ao modelo de guarda monoparental,

Levy assevera:

O modelo de guarda exclusiva ou unilateral é o mais utilizado no Brasil. Em análise realizada pelo IBGE, levando em conta a proporção de divórcios concedidos, por responsabilidade pela guarda dos filhos menores, segundo as Grandes Regiões e Unidades da Federação – 2005, verificou-se a hegemonia das mulheres na guarda dos filhos menores. Em 89,5% dos divórcios concedidos no Brasil, a responsabilidade pelos filhos foi concedida às mulheres.116

E a autora conclui:

[...] Tal constatação demonstra a grande preferência de nossa sociedade pela atribuição da guarda dos filhos à mulher, o que vem levando a um movimento no sentido de atribuição da guarda compartilhada a ambos os pais, por melhor atender ao princípio do melhor interesse da criança[...].117

Verifica-se que o ordenamento jurídico e a sociedade brasileira

tinham/tem preferência pela criação do menor pela genitora, mas com a Guarda

Compartilhada pode-se dar uma nova alternativa para o menor, que muito melhor

será assistido se for por ambos os genitores.

3.2 A GUARDA COMPARTILHADA

Observa-se que, a modalidade compartilhada atribuída á

115

LEVY, Fernanda Rocha Lourenço. Guarda de filhos: os conflitos no exercício do poder familiar. p. 53-54.

116 LEVY, Fernanda Rocha Lourenço. Guarda de filhos: os conflitos no exercício do poder familiar. p. 54.

117 LEVY, Fernanda Rocha Lourenço. Guarda de filhos: os conflitos no exercício do poder familiar. p. 54.

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guarda dá nova conotação ao instituto do poder de família, já que tem por finalidade

romper com a idéia de poder e veicula a perspectiva da responsabilidade, do

cuidado ás crianças e do convívio familiar.118

A concepção de Guarda Compartilhada surgiu da necessidade

de se reequilibrar os papeis parentais, diante da perniciosa Guarda Uniparental

concedida sistematicamente à mãe, e de garantir o interesse do menor.119

Assim assevera Ramos em sua obra:

O termo guarda compartilhada ou guarda conjunta de menores refere-se á possibilidade dos filhos de pais separados serem assistidos por ambos os pais. Nela, os pais têm equivalente autoridade legal, não só para tomar decisões importantes quanto ao bem - estar de seus filhos como também de conviver com esses filhos em igualdade de condições.120

Acrescenta a autora acima que, com a vigência da Constituição

Federal de 1988, a tutela da dignidade, e o princípio que garante a integral proteção

às crianças e adolescentes ganharam especial destaque.121

Verifica-se que a Guarda Compartilhada vem para o

ordenamento jurídico, no intuito de disponibilizar aos genitores separados, uma

melhor forma de acompanhar a evolução dos filhos, tomando decisões em conjunto

e participando ativamente da vida diária do mesmo.

3.2.1 Conceito e evolução de guarda compartilhada

No tocante a evolução da Guarda Compartilhada Grisard Filho

leciona nos seguintes termos:

A guarda compartilhada surgiu “na Inglaterra e de lá traslando-se

118

LEVY, Fernanda Rocha Lourenço. Guarda de filhos: os conflitos no exercício do poder familiar. p. 67.

119 GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental, p. 112.

120 RAMOS, Patrícia Pimentel de Oliveira Chambers. O poder familiar e a guarda compartilhada sob o enfoque dos novos paradigmas do direito de família. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p 64.

121 RAMOS, Patrícia Pimentel de Oliveira Chambers. O poder familiar e a guarda compartilhada sob o enfoque dos novos paradigmas do direito de família. p 65.

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para a Europa continental, desenvolvendo-se na França. Depois atravessou o Atlântico, encontrando eco no Canadá e nos Estados Unidos. Presentemente desenvolveu-se na Argentina e no Uruguai.122

Silva demonstra um relevante fator no surgimento da Guarda

Compartilhada e sua necessidade:

[...] o tempo em que a mulher se dedicava apenas aos filhos e a casa e o homem ao trabalho, privado da convivência familiar, não existe mais. A visão social em relação a criação dos filhos hoje em dia propaga que os mesmos devem ter seus idéias identificados, tanto com a mãe como com o pai, com possibilidade maior de vivencia salutar, física e mental, para se tomarem cidadãos responsáveis na sociedade de qual farão parte.123

Akel leciona o seguinte:

[...] a guarda compartilhada surgiu da necessidade de se encontrar uma maneira que fosse capaz de fazer com que pais, que não mais convivem, e seus filhos, mantivessem os vínculos afetivos latentes, mesmo após o rompimento.124

Continuando o embasamento em Akel, a qual, em seu estudo

menciona Caetano Neto que define a guarda conjunta, como “fruto de uma

atribuição biliteral do hoje denominado, poder parental, revelando-se perfeitamente

viável no casamento civil, na separação ou no divórcio”.125

A Constituição Federal de 1988 frisa as transformações sociais,

no que concerne ao papel dos genitores na vida de seus filhos, o art. 5º, iguala

homens e mulheres “sem distinção de qualquer natureza”, e por último, o art. 229

impõe como dever dos pais, ou seja, ambos os genitores, “assistir, criar e educar os

filhos menores”. Além dos deveres contidos neste preceito vale lembrar o direito que

pai e mãe têm relativo a seus filhos.126

122

GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental, p. 122-123.

123 SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada posicionamento judicial. São Paulo: Direito, 2006. p. 73.

124 AKEL, Ana Carolina Silveira. Guarda compartilhada: um avanço para família, p. 103.

125 AKEL, Ana Carolina Silveira. Guarda compartilhada: um avanço para família, p. 103.

126 BRASIL, Constituição (1988). Constituição da Republica Federativa do Brasil, DF: Senado, 1988.

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Conforme Diniz, “guarda é o instituto que visa prestar

assistência material, moral e educacional ao menor, regularizando posse de fato.”127

Destaca ainda a autora supracitada, sobre a guarda dos filhos,

no ordenamento jurídico brasileiro, que esta pode ser abordada por duas situações

diferentes e sujeitos a diferentes disciplinas jurídicas: “a guarda de menores em

decorrência da separação de fato ou de direito entre pais e a guarda de menores de

que trata o Estatuto da Criança e do Adolescente.128

Neste seara, Ramos leciona que:

A guarda compartilhada, assim, pode significar um respeito ao tempo da criação, na medida em que possibilita o convívio permanente dos pais com os filhos, evitando traumas na criança pela ausência de um deles durante o período de seu crescimento e formação.129

Levy se posiciona diante do objetivo da Guarda Compartilhada

aludindo que:

A guarda compartilhada tem por fim precípuo minimizar os danos sofridos pelos filhos em razão da quebra ou mesmo da inexistência prévia de relacionamento conjugal. Busca prescrever os laços paterno-filiais em condições de igualdade entre os genitores.130

No entanto, para Ramos:

[...] o mero reconhecimento da guarda jurídica compartilhada é ainda pouco satisfatório para o pleno exercício do poder parental, e, notadamente, do direito fundamental do menor á convivência familiar com ambos os pais, eis que, não garante, por si só, o convívio paterno-materno-filial, sendo necessária a expressa precisão legal da guarda material compartilhada, em arranjos definidos no caso concreto e a criação de mecanismos de apoio para as famílias.131

127

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. São Paulo: Saraiva. 2005. p. 420.

128 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 2005. p. 420.

129 RAMOS, Patrícia Pimentel de Oliveira Chambers. O poder familiar e a guarda compartilhada sob o enfoque dos novos paradigmas do direito de família. p 67.

130 LEVY, Fernanda Rocha Lourenço. Guarda de filhos: os conflitos no exercício do poder familiar. p. 54.

131 RAMOS, Patrícia Pimentel de Oliveira Chambers. O poder familiar e a guarda compartilhada sob o enfoque dos novos paradigmas do direito de família. p 76.

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Por outro prisma, Motta132 menciona que:

A guarda compartilhada refere-se aos aspectos mais concretos da guarda e das visitas. Implica a divisão do tempo passado com a criança entre os dois genitores. Aproxima-se da guarda alternada no sentido de que a criança terá moradias diferentes em períodos de tempo alternados, porém diferencia-se daquela, pois a guarda legal conjunta implica em que os guardiões legais ambos os pais.

Na intenção de abrandar o sofrimento dos filhos, mediante a

Guarda Compartilhada, percebe-se que esta pode propiciar aos genitores a opção

de, em comum acordo, decidir e estar com os filhos todos os dias, minimizando o

impacto sofrido por eles na hora da separação.

3.2.2 Possibilidade do deferimento da guarda compartilhada no ordenamento

jurídico brasileiro

Havendo acordo entre os pais, em benefício dos filhos, a

disposição acerca da guarda conjunta é juridicamente possível, face ao permissivo

constante no artigo 9º da Lei 6.515/77.

E, para estes casos, muitos são os defensores da medida,

como Waldyr Grisard Filho, que expôs seu pensamento:

Embora inexista norma expressa nem seja usual na prática forense, a guarda compartilhada mostra-se lícita e possível em nosso Direito, como o único meio de assegurar uma estrita igualdade entre os genitores na condução dos filhos, aumentando a disponibilidade do relacionamento com o pai ou a mãe que deixa de morar com a família133.

Mas ressalva:

Pais em conflito constante, não cooperativos, sem diálogo, insatisfeitos, que agem em paralelo e sabotam um ao outro, contaminam o tipo de educação que proporcionam a seus filhos, e, nesses casos, os arranjos da guarda compartilhada podem ser muito

132

MOTTA, Maria Antonieta Pisano. Guarda compartilhada, 2003. p. 85.

133 CARCERERI, Pedro Augusto Lemos. Aspectos destacados da guarda de filhos no Brasil. Revista Jus Vigilantibus, 30 de dezembro de 2002, p. 12. Disponível em: < www.ambito-juridico.com.br/.../index.php?... >. Acesso em: Out. 2010.

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lesivos aos filhos134.

Com respeito à Guarda Compartilhada, uma contribuição é

dada por Vilela:

Se a intenção é somente que os dois genitores dividam os direitos e deveres em relação aos filhos, basta que se inclua expressamente no texto legal a possibilidade do poder familiar conjunta após a separação, ou mesmo, dando plena interpretação á regra contida no artigo 1632 do Código Civil, que determina que “a separação judicial, o divórcio e a dissolução da união estável não alteram as relações entre pais e filhos senão quanto ao direito, que aos princípios cabe, de terem em sua companhia os segundos.135

Assim, tem-se que o artigo 1632 do Código Civil já deixa

expresso que os direitos e deveres dos pais em relação aos filhos permanecerão

intactos após a separação, o que na prática não é observado, uma vez que o genitor

sem a guarda da criança tem completamente esvaziado o conteúdo do poder de

família.136

Pimentel na sua interpretação da legislação brasileira,

fundamenta na Carta Magna o direito de deferimento da Guarda Compartilhada, o

direito à convivência familiar é um direito fundamental e constitucionalmente

assegurado e vem previsto no art. 227 da Carta Magna que consiste no direito de

ser criado e educado no âmbito da própria família.137

Compartilhando ainda com Pimentel, Ramos138 leciona:

Considerando ser a família o lugar natural onde o ser humano em desenvolvimento se sente protegido e aprende os conceitos básicos para a vida, não se pode concebê-la sob um aspecto meramente unilateral quando ocorre a separação dos pais.

134

(Guarda Compartilhada: Um Novo Modelo de Responsabilidade Parental. RT. 2000, p. 140/174.In: CARCERERI, Pedro Augusto Lemos. Aspectos destacados da guarda de filhos no Brasil. Revista Jus Vigilantibus, 30 de dezembro de 2002, p. 12.

135 VILELA, Sandra Regina. Título. Revista de psicologia jurídica. Edição Especial, nº 5. São Paulo. 2007. p. 25.

136 VILELA, Sandra Regina. Título. Revista de psicologia jurídica. Edição Especial, nº. 5. São Paulo. 2007. p. 25-26.

137 RAMOS, Patrícia Pimentel de Oliveira Chambers. O poder familiar e a guarda compartilhada sob o enfoque dos novos paradigmas do direito de família. p 78.

138 RAMOS, Patrícia Pimentel de Oliveira Chambers. O poder familiar e a guarda compartilhada sob o enfoque dos novos paradigmas do direito de família. p 79.

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Na visão de Akel, a guarda dos filhos diante da separação dos

pais representa para a criança um de seus direitos, pois conforme seus

ensinamentos, deve-se entender que:

A atribuição de guarda após a separação é um ato de importância incalculável na vida da criança, a qual deve ser considerada como sujeito de Direito, tanto quanto os adultos que se separaram. Seus interesses devem ser primordialmente considerados em toda e qualquer decisão legal que a envolva.139

Dantas anota em sua obra os seguintes termos:

[...] para que se vislumbre a possível aplicação da guarda compartilhada, deve ser analisado o caso concreto, pois, em determinadas situações pode não atender o melhor interesse do menor, pois mais do que direito, a convivência com ambos os genitores é um fator fundamental no desenvolvimento social e psicológico, tendo em vista que é através de nossas famílias de origem, representadas por nossos pais, que nos inserimos na estrutura social, bem como é primordialmente através da relações com ambos, pai e mãe, que construímos nossa subjetividade.140

Pimentel visualiza a Guarda Compartilhada dentro dos ditames

legais como um direito da criança respeitando sua dignidade, visto que aduz:

Não há nenhuma vedação legal à aplicação imediata da guarda compartilhada em nosso país. Pelo contrário, em razão dos dispositivos legais e constitucionais existentes e já mencionados, é um modelo que melhor atende aos ditames constitucionais e legais de igualdade jurídica entre pais e o direito da criança à convivência familiar e respeito à sua dignidade. Na hipótese de ambos os pais, querendo e tendo possibilidades para o exercício da guarda, e sendo este o anseio do filho, há de lhes ser deferido o exercício da guarda conjunta ou compartilhada.141

Neste mesmo seara, visualizando o interesse da criança,

Grisard Filho leciona:

[...] a guarda compartilhada assume uma importância extraordinária, na medida em que valoriza o convívio da menor com seus dois pais,

139

AKEL, Ana Carolina Silveira. Guarda compartilhada: um avanço para família. p. 127.

140 DANTAS, Priscilla C. Ramos. A guarda compartilhada como possível solução para os conflitos decorrentes da separação dos pais. Disponível em http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=1355. Acesso: 26 de outubro de 2010.

141 RAMOS, Patrícia Pimentel de Oliveira Chambers. O poder familiar e a guarda compartilhada sob o enfoque dos novos paradigmas do direito de família. p 84.

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pois mantém, apesar da ruptura, o exercício em comum da autoridade parental e reserva, a cada um dos pais, o direito de participar das decisões importantes que se referem à criança. Seguindo a trilha aberta pelos diplomas internacionais e pela legislação alienígena mais avançada, o Direito brasileiro igualmente elegeu o interesse do menor como fundamental para reduzir os efeitos patológicos que o impacto negativo das situações familiares conflitivas provoca na formação da criança.142

Observado o que foi dito pelos autores ora citados, verifica-se

que o ordenamento jurídico não veda o deferimento da Guarda Compartilhada, até

mesmo defendem-na como a modalidade mais adequada para o desenvolvimento

da criança.

3.2.3 Guarda compartilhada e a convivência familiar

Sobre este tema da convivência familiar e a Guarda

Compartilhada, Akel aduz que:

O prejuízo que o distanciamento familiar traz aos filhos do casal desunido vem sendo causa de preocupação, fazendo surgir outras modalidades de exercício de guarda, dentre elas a guarda conjunta ou compartilhada recém-inserida no ordenamento jurídico e tão discutida pelos profissionais da área.143

Prosseguindo com Akel, esta acata como correta a origem e

objetivo da Guarda Compartilhada em prol dos filhos, pois segundo esta a Guarda

Compartilhada,

[...] surgiu da necessidade de se encontrar uma maneira que fosse capaz de fazer com que pais, que não mais convivem, e seus filhos mantivessem os vínculos afetivos latentes, mesmo após o rompimento.144

Ressalta-se também no presente trabalho o que diz Pimentel

acerca do assunto, “a separação dos pais não pode significar para a criança uma

restrição ao seu direito à convivência familiar. O contato com ambos os pais é

142

GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. p. 138.

143 AKEL, Ana Carolina Silveira. Guarda compartilhada: um avanço para família, p. 103.

144 AKEL, Ana Carolina Silveira. Guarda compartilhada: um avanço para família, p. 103.

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extremamente benéfico para seu desenvolvimento”.145

Retornando com Akel, esta aduz que:

Embora o exercício conjunto permita total flexibilização da guarda, possibilitando o convívio efetivo dos pais com os filhos, é preciso atentar para um detalhe importante, evitando problemas ulteriores, isto é, após um certo tempo de utilização desse modelo de guarda, é possível que surjam desentendimentos que acarretem uma degradação natural da relação que, até então, existia e era amistosa.146

Frente aos desentendimentos dos genitores, com a decisão no

acato à Guarda Compartilhada, leciona Akel que:

Caberá ao magistrado analisar a gravidade do fato, verificando a possibilidade da mantença da guarda compartilhada ou, simplesmente, reconsiderar o sistema escolhido pelas partes, decidindo pela guarda uniparental. Assim, diante de um desentendimento pontual, poderá ser desconsiderada a guarda conjunta e, na hipótese de uma desavença mais profunda e de difícil solução, o exercício conjunto da autoridade parental tornar-se-á dificilmente concebível, sendo necessária a utilização do sistema usual.147

Retornando-se ao objetivo da Guarda Compartilhada, Deirdre

vem complementar o já mencionado, enfatizando que:

A guarda compartilhada almeja assegurar o interesse do menor, com o fim de protegê-lo, e permitir o seu desenvolvimento e a sua estabilidade emocional, tornando-o apto à formação equilibrada de sua personalidade. Busca-se diversificar as influências que atuam amiúde na criança, ampliando o seu espectro de desenvolvimento físico e moral, a qualidade de suas relações afetivas e a sua inserção no grupo social. Busca-se, com efeito, a completa e a eficiente formação sócio-psicológica, ambiental, afetiva, espiritual e educacional do menor cuja guarda se compartilha.148

No entanto, Akel ressalta que a guarda conjunta ou

compartilhada,

145

RAMOS, Patrícia Pimentel de Oliveira Chambers. O poder familiar e a guarda compartilhada sob o enfoque dos novos paradigmas do direito de família. p. 79.

146 AKEL, Ana Carolina Silveira. Guarda compartilhada: um avanço para família, p. 106.

147 AKEL, Ana Carolina Silveira. Guarda compartilhada: um avanço para família, p. 106.

148 DEIRDRE Neiva. Guarda Compartilhada. <http://jus.uol.com.br/revista/texto/4352/consideracoes-sobre-a-guarda-compartilhada>. Acesso em 03 de novembro de 2010.

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[...] não impõe as filhos a escolha por um dos genitores como guardião, o que é causa, normalmente, de muita angústia e desgaste emocional em virtude do medo de magoar o genitor preterido, possibilitando o exercício isonômico dos direitos e deveres inerentes ao casamento e à união estável, a saber, a guarda, o sustendo e a educação da prole.149

Prossegue Akel em sua analise sobre o modelo de Guarda

Compartilhada com a seguinte consideração:

A guarda compartilhada privilegia e envolve, de forma igualitária, ambos os pais nas funções formativa e educativa dos filhos menores, buscando reorganizar as relações entre os genitores e os filhos no interior da família desunida, conferindo àqueles maiores responsabilidades e garantido a ambos em relacionamento melhor do que o oferecimento pela guarda uniparental.150

E, ainda enfatiza em sua obra sobre os temores dos filhos com

a separação dos pais, de que “a certeza de que os vínculos com os pais serão

mantidos, ainda que estes não mais compartilhem o mesmo lar, é de suma

importância para que os filhos percebam que ainda há lugar para eles na vida do pai

e da mãe, mesmo após o divórcio, eliminando o medo de perder os pais.151

Sustenta Akel:

A co-educação e o desenvolvimento da criança exigem sensibilidade e flexibilidade e, quando os pais são capazes de discriminar seus conflitos conjugais do adequado exercício da paternidade, a complexa situação dos filhos instaurada pelo divórcio encontra resposta na guarda conjunta, ressaltando, mais uma vez, que a guarda compartilhada como deve funcionar quando se estabelece a harmonia entre genitores.152

Concordando com a autora acima, Grisard analisando as

vantagens da Guarda Compartilhada, aduz que:

Com efeito, a guarda conjunta é uma abordagem nova e benéfica que somente se realiza na cooperação entre os genitores, isto é, os pais devem isolar os filhos de seus conflitos pessoais, não sendo viável seu estabelecimento numa relação em que pai e mãe vivam

149

AKEL, Ana Carolina Silveira. Guarda compartilhada: um avanço para família, p. 107.

150 AKEL, Ana Carolina Silveira. Guarda compartilhada: um avanço para família, p. 107.

151 AKEL, Ana Carolina Silveira. Guarda compartilhada: um avanço para família, p. 109.

152 AKEL, Ana Carolina Silveira. Guarda compartilhada: um avanço para família, p. 109.

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em constantes discussões, conforme corriqueiramente se observa.153

O autor Grisard alerta para as desavenças entre os pais, e

neste caso, se posiciona como favorável à manutenção do modelo clássico de

Guarda Uniparental.

Assim, nas famílias em que predominam desavenças e desrespeito, que inviabilizam qualquer tipo de convivência entre genitores, deve-se optar pela guarda única, modelo tradicional, deferindo-a ao genitor que melhor tem condições de guardar os filhos menores, conferindo, ao outro, direito amplo de visitas.154

Diante do exposto observa-se a necessidade da dedicação

especial entre os genitores, cuidando para que seus conflitos pessoais não interfiram

no relacionamento que terão com os filhos, visto que esse novo modelo de guarda

exige isso ao máximo. Considera-se primordial, portanto, que para o bom

andamento desse novo instituto, os pais atentem à observância da supremacia do

principio do bem estar do menor.

3.2.4 Conveniência da opção pela guarda compartilhada: Literatura, doutrina e

jurisprudência.

A corrente majoritária na literatura não recomenda a guarda

compartilhada em nenhuma hipótese.

Sobre o tema, opina Rinaldo de Lamare155: “A prática de

passar 6 (seis) meses com um e 6 (seis) meses com outro é péssima. O melhor é o

ano escolar com um e férias, ou então fins de semana com outro”.

Ana Gracinda Queluz e Ana Maria Cordeiro156 recomendam a

manutenção do status da criança, em contraponto com a guarda compartilhada:

153

GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. p. 173-174.

154 GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. p. 174.

155 DE LAMARE, Rinaldo. A Vida Dos Nossos Filhos. 13. ed. São Paulo, Block. In: CARCERERI, Pedro Augusto Lemos. Aspectos destacados da guarda de filhos no Brasil. Revista Jus Vigilantibus, 30 de dezembro de 2002, p. 15.

156 QUELUZ, Ana Gracinda; CORDEIRO, Ana Maria. Tempo de Ser Criança. v. IV da coleção

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Mudar de ambiente significa romper os laços com um espaço conhecido, íntimo, que tem muito haver conosco. Embora a criança não participe muito da arrumação da casa, ela levou algum tempo até conquistar esse espaço, entendê-lo, ganhar intimidade. De repente, sente que deve começar tudo de novo, e isso a perturba. Para algumas pequenas pode parecer ameaçador.

Eliane Michelini Marraccini e Maria Antonieta Pisano Motta157

publicaram artigo abordando o tema, e defenderam que:

Dado o litígio entre os pais, é importante que, uma vez decidida a custódia, os filhos possam permanecer em companhia permanente e contínua de um só genitor, aquele que for mais adequado às suas necessidades, segundo uma orientação educacional e assistencial uniforme e estável.

Quanto à preferência na determinação da guarda, os autores

recomendam que a criança deve permanecer com a mãe, principalmente quando em

tenra idade. Assim entende Edgard de Moura Bittencourt158:

[...] os laços maternos são indispensáveis ao desenvolvimento psicológico da criança, tanto que a ruptura desses arrasta conseqüências desastrosas, oscilando entre a simples timidez e dissimulação, até os casos mais graves, de agressividade, de furto, mentiras [...] e problemas de ordem sexual.

Ana Gracinda Queluz e Ana Maria Cordeiro159 atribuem à mãe

a ponte para a vida do filho:

O que é ser ponte para o mundo? É, possivelmente, o papel mais importante da mãe em relação ao filho. Se o bebê precisa mamar no peito durante seis meses para ter boa saúde e estar protegido contra várias doenças; se depende da mãe para trocar as fraldas, tomar banho, resolver seus desconfortos; se não tem autonomia, só se movimentando com sua ajuda, dela necessitando fisicamente (ou de alguém que a substitua), mostra ainda uma outra dependência: ele

"Primeiro Mundo". In: CARCERERI, Pedro Augusto Lemos. Aspectos destacados da guarda de filhos no Brasil. Revista Jus Vigilantibus, 30 de dezembro de 2002, p. 15.

157 MARRACCINI, Eliane Michelini; MOTTA, Maria Antonieta Pisano. Guarda de Filhos, Revista dos Tribunais nº 716, 1981. p. 346. In: CARCERERI, Pedro Augusto Lemos. Aspectos destacados da guarda de filhos no Brasil. Revista Jus Vigilantibus, 30 de dezembro de 2002, p. 16.

158 BITTENCOURT, Edgard de Moura. Guarda de Filhos, Revista dos Tribunais nº 716, 1981. p. 346. In: CARCERERI, Pedro Augusto Lemos. Aspectos destacados da guarda de filhos no Brasil. Revista Jus Vigilantibus, 30 de dezembro de 2002, p. 17.

159 QUELUZ, Ana Gracinda; CORDEIRO, Ana Maria. Tempo de Ser Criança. v. IV da coleção "Primeiro Mundo". In: CARCERERI, Pedro Augusto Lemos. Aspectos destacados da guarda de filhos no Brasil. Revista Jus Vigilantibus, 30 de dezembro de 2002, p. 17.

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só conhece do mundo aquilo o que a mãe lhe permite conhecer; só experimenta aquilo o que a mãe o deixa experimentar; só recebe os estímulos que a mãe lhe oferece.

Winnicott160 vai mais além:

O amor de mãe é algo semelhante à uma força primitiva. Nele se configuram o instinto de posse, o apetite e até certo ponto elemento de contrariedade, em momento de exasperado humor, e há nele generosidade, energia e humildade também.

Aliás, amor, só de mãe, como constatou Drauzio Varella161:

As famílias madrugam na porta, mulheres na imensa maioria. São namoradas, esposas, irmãs, tias e a inseparável mãe, difícil de abandonar o filho preso, por mais crápula que ele seja. Em dez anos na cadeia, assisti a tais demonstrações de amor materno que, confesso, encontrei sabedoria no dito: amor, só de mãe.

Os Tribunais respaldam o entendimento doutrinário. Neste

sentido:

A chamada custódia conjunta, importando o revezamento semanal do ambiente familiar, é prejudicial à consolidação dos hábitos, valores, padrões e idéias na mente do menor; conseqüentemente, à formação da responsabilidade do mesmo162.

[...] manter a guarda dos filhos menores com a mãe, naturalmente mais predisposta a tanto; na medida razoável, é manter a situação existente, sendo de considerar que as mudanças no regime sempre podem trazer problemas de ordem emocional nas crianças163.

Também neste sentido: RT 238/264; 516/213; 523/123;

627/126 e 733/333; e RJTJRS 113/428.

A divergência existe. A corrente majoritária, tanto na literatura

especializada como na jurisprudência, defendem que a guarda compartilhada é

160

WINNICOTT, D. W. In: CARCERERI, Pedro Augusto Lemos. Aspectos destacados da guarda de filhos no Brasil. Revista Jus Vigilantibus, 30 de dezembro de 2002, p. 17.

161 VARELLA, Dráuzio. Estação Carandirú. 1999, p. 51. In: CARCERERI, Pedro Augusto Lemos. Aspectos destacados da guarda de filhos no Brasil. Revista Jus Vigilantibus, 30 de dezembro de 2002, p. 17.

162 RT 573/207. In: CARCERERI, Pedro Augusto Lemos. Aspectos destacados da guarda de filhos no

Brasil. Revista Jus Vigilantibus, 30 de dezembro de 2002, p. 18.

163 RJP, 59/42. In: CARCERERI, Pedro Augusto Lemos. Aspectos destacados da guarda de filhos no Brasil. Revista Jus Vigilantibus, 30 de dezembro de 2002, p. 17.

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prejudicial ao bem estar psico-emocional dos filhos, devendo, por esta razão, ser

evitada. Autores como Edward Teyber e Sérgio Eduardo Nick (já citados)

recomendam a medida, dentro de alguns critérios.

Entrementes, falta ainda, na literatura, estudo realmente isento

e abrangente sobre a questão, levando em consideração os aspectos sociais,

culturais e econômicos brasileiros164.

164

CARCERERI, Pedro Augusto Lemos. Aspectos destacados da guarda de filhos no Brasil. Revista Jus Vigilantibus, 30 de dezembro de 2002, p. 20.

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CONSIDERAÇÕES

Encerra-se o presente estudo, após ter discorrido no primeiro

capítulo, sobre a família na antiguidade e suas diversas transformações ao longo

dos anos.

No capítulo 2, observou-se a evolução do pátrio poder onde o

pai tinha plenos poderes sobre os filhos e demais membros da família até o poder

familiar onde se deu a divisão dos encargos dos deveres de criação dos filhos.

Por derradeiro, no capítulo 3, dissertou-se sobre a Guarda, a

Curatela, a Tutela e por fim, sobre a Guarda Compartilhada, sua definição, sua

evolução histórica e viabilidade da sua aplicação como possível estreitamento das

relações entre pais e filhos.

Finalmente, sobre as hipóteses levantadas, conclui-se:

1ª Hipótese: “A Guarda Compartilhada defende os interesses

dos filhos, que após a separação dos pais preserva a relação filial”.

Hipótese confirmada, visto que quando os pais se separam

devem continuar em harmonia defendendo os interesses dos filhos, compartilhando

cuidados e decisões para o bem estar dos mesmos.

2ª Hipótese: “A viabilidade do exercício da Guarda

Compartilhada depende da harmonia entre os genitores”.

Igualmente comprovada esta segunda hipótese, pois essa

modalidade de guarda só será viável se persistir entre os pais uma convivência

pacífica e harmoniosa a bem dos filhos.

Enfim, um avanço para o direito de família, priorizando o melhor

interesse da criança e do adolescente. Uma forma eficaz de minimizar os traumas e

demais conseqüências negativas que a separação possa provocar nos filhos. A

possibilidade de melhores condições de decisão dos pais, diante das deliberações

importantes que devem tomar quanto ao bem estar, educação e criação dos filhos.

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