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A GESTÃO DOS REPAROS DE SOBRESSALENTES COMO ELEMENTO-CHAVE PARA A ACURACIDADE DOS ESTOQUES - UM ESTUDO DE CASO NO SETOR PETROLÍFERO OFFSHORE Jose Flavio Rangel de Arruda (UFF ) [email protected] Rogerio Atem de Carvalho (UFF ) [email protected] O presente estudo analisa o processo de reparo de sobressalentes inerente a contratos de operação e manutenção (O&M) de turbomáquinas instaladas em unidades offshore na Bacia de Campos (UO-BC), buscando compreender como eventuais falhas em sua gestão podem comprometer a acuracidade de todo o inventário e, em última análise, a eficiência operacional da empresa como um todo. Através de um estudo de caso representativo do setor, responsável por parcelas significativas dos processos inerentes à exploração e produção de petróleo e gás natural, concluiu-se que a gestão dos sobressalentes para reparo em regime de comodato, das subpartes demandadas e do seu respectivo processo de revenda, legalmente exigido, mostram-se como principais desafios para os gestores de materiais e de manutenção neste contexto. Palavras-chaves: Gestão da Manutenção, Sobressalentes, Acuracidade XXXIV ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Engenharia de Produção, Infraestrutura e Desenvolvimento Sustentável: a Agenda Brasil+10 Curitiba, PR, Brasil, 07 a 10 de outubro de 2014.

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A GESTÃO DOS REPAROS DE

SOBRESSALENTES COMO ELEMENTO-CHAVE

PARA A ACURACIDADE DOS ESTOQUES - UM

ESTUDO DE CASO NO SETOR PETROLÍFERO

OFFSHORE

Jose Flavio Rangel de Arruda (UFF )

[email protected]

Rogerio Atem de Carvalho (UFF )

[email protected]

O presente estudo analisa o processo de reparo de sobressalentes inerente a

contratos de operação e manutenção (O&M) de turbomáquinas instaladas

em unidades offshore na Bacia de Campos (UO-BC), buscando compreender

como eventuais falhas em sua gestão podem comprometer a acuracidade de

todo o inventário e, em última análise, a eficiência operacional da empresa

como um todo. Através de um estudo de caso representativo do setor,

responsável por parcelas significativas dos processos inerentes à exploração

e produção de petróleo e gás natural, concluiu-se que a gestão dos

sobressalentes para reparo em regime de comodato, das subpartes

demandadas e do seu respectivo processo de revenda, legalmente exigido,

mostram-se como principais desafios para os gestores de materiais e de

manutenção neste contexto.

Palavras-chaves: Gestão da Manutenção, Sobressalentes, Acuracidade

XXXIV ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO

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1 Introdução

As áreas de investigação relevantes sobre a gestão de estoques somada à gestão

estratégica da manutenção, em termos gerais, incluem uma grande diversidade de tópicos,

especialmente associados ao aprimoramento de indicadores de eficiência baseados nas

variáveis tempo, custo e escopo.

Em complemento a estes estudos, de grande relevância neste processo de melhoria

contínua, novas abordagens foram desenvolvidas buscando entender a influência da gestão da

cadeia de suprimentos na gestão da manutenção, ampliando os horizontes de pesquisa e

enaltecendo a informação como um elemento-chave para o seu funcionamento (ARRUDA,

2013).

Nesta perspectiva, o presente estudo se propõe a analisar a operacionalidade do

processo de reparo de sobressalentes (especialmente junto a fornecedores externos) e a sua

influência na precisão dos estoques (acuracidade), através de um estudo de caso

representativo no setor petrolífero offshore de turbomáquinas, responsável por parcelas

significativas da produção de petróleo e gás natural.

A empresa objeto do estudo (contratada) responde pela operação e manutenção da

turbomáquina (turbina acionando um compressor centrífugo) em plataformas de petróleo

offshore de propriedade de uma grande empresa do setor. O pacote de serviços contratados

inclui o fornecimento dos materiais eventualmente necessários, novos ou reparados.

O processo de reparo destes sobressalentes mostra-se crítico para a acuracidade na

cadeia de suprimentos, e consequentemente para a manutenção, em virtude de suas três

vertentes intrínsecas de gestão: o item a ser reparado (1), a execução do reparo (incluindo os

consumíveis e subitens demandados) (2) e o item após o seu reparo (3), com a sua

consequente reinserção no estoque. Eventuais falhas em cada um destes sub processos podem

comprometer a acuracidade de todo o inventário e, em última análise, a eficiência operacional

da empresa como um todo.

Ao abordar a temática da acuracidade dos registros de estoque, cabe ressaltar que

trata-se de um fator chave para a eficiência operacional das empresas (HUSCHKA, 2009;

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DEHORATIUS; RAMAN, 2008; WALLER, NACHTMANN e HUNTER, 2006).

Comumente definida como o índice de precisão dos registros de estoque, correspondendo a

uma medida de conformidade do saldo de um item verificado em mãos comparado à

quantidade registrada no sistema de informação (SHELDON, 2004), ou ainda ao nível de

precisão incorrido durante determinadas operações (CSCMP, 2012), geralmente expresso em

porcentagem, a acuracidade pode ser facilmente relacionada ao registro correto, preciso e

completo de todas as transações dos itens em estoque, desde o planejamento da sua aquisição

a sua destinação final, tanto nos processos físicos quanto nos administrativos.

Ainda no que se refere aos fatores críticos para a eficiência operacional, a manutenção,

em grande parte responsável pela garantia do nível de serviço ao cliente, se utiliza de

programações muitas vezes condicionadas às peças sobressalentes, para as quais busca-se

constantemente a disponibilidade no tempo, quantidade e especificações adequadas, ou seja,

uma expectativa e uma demanda por dados acurados.

Garantir a precisão dos registros destes itens, cujos estoques são geralmente

caracterizados por uma grande diversidade quantitativa, qualitativa e geográfica,

especialmente no setor industrial, torna-se, assim, uma questão fundamental para a gestão

estratégica do negócio.

1.1 Organização do estudo

O presente estudo está organizado da seguinte forma: Introdução (1) – Apresenta os

principais elementos motivadores da pesquisa e o seu objetivo; Considerações Metodológicas

(2); Estoques de Peças Sobressalentes e Gestão da Manutenção (3); Processo de Reparo de

Sobressalentes na Cadeia em Estudo (4); Conclusão (5); Referências Bibliográficas (6).

2 Considerações Metodológicas

Para atingir o objetivo proposto por este estudo, foi adotado o método indutivo, através de

uma pesquisa qualitativa-descritiva de caráter exploratório, assumindo o formato de um

estudo de caso, o qual envolve a análise profunda e exaustiva de fenômenos, de modo a

permitir o amplo e detalhado conhecimento (GIL, 2002).

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No âmbito desta pesquisa, inicialmente foram observadas as rotinas dos processos

logísticos inerentes ao processo de reparo na cadeia de fornecimento objeto do estudo, tendo

em vista compreender e descrever o seu funcionamento, bem como tomar nota das diferentes

decisões que devem ser tomadas por seus agentes para a sua continuidade operacional, além

da manutenção do nível de atendimento ao cliente, de acordo com a conjuntura diária.

Um outro recurso de grande valia nesta pesquisa foi a análise de uma grande variedade de

documentos, tanto da empresa objeto do estudo quanto de fontes externas relacionadas. Por

fim, foram utilizadas entrevistas não estruturadas (MARCONI e LAKATUS, 2003) com os

principais agentes envolvidos nos processos ligados ao problema central da pesquisa.

Como consequência natural da seleção de diferentes instrumentos de coleta de dados nesta

pesquisa, procurou-se aplicar o conceito de triangulação, o qual constitui-se “num fundamento

lógico para se utilizar várias fontes de evidências” (YIN, 2001, p.120), ou seja, uma estratégia

de combinação de diferentes métodos, fontes de dados, perspectivas teóricas, dentre outros,

no tratamento de um problema de pesquisa.

Os dados obtidos foram tratados de acordo com as diretrizes de Miles e Huberman (1984)

através de: Redução dos dados (1); Apresentação dos dados (2); Delineamento e verificação

da conclusão (3). A pesquisa também valeu-se da estratégia geral “Baseando-se em

Proposições Teóricas”, bem como dos métodos “Adequação ao Padrão” e “Construção da

Explanação”, conforme proposição de Yin (2001).

3 Estoques de Peças Sobressalentes e Gestão da Manutenção

3.1 Sobressalentes – Características e Finalidades

A definição de estoques de sobressalentes, de maneira geral, confunde-se com sua própria

finalidade no processo logístico e gerencial. Um objetivo primário do estoque é garantir a

disponibilidade de produtos, na quantidade e no tempo adequados (BALLOU, 2004), os quais

se voltam à operacionalidade e/ou a manutenibilidade dos equipamentos.

Segundo Wang e Syntetos (2011), as peças sobressalentes são ubíquas na sociedade

moderna. Desta forma, a partir de uma extensa revisão de literatura, foi possível elencar os

aspectos mais relevantes destes materiais e da sua gestão:

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Finalidades e Clientes (1): Voltam-se especificamente para os departamentos de manutenção

(especialmente preventiva e corretiva) e produção (KENNEDY et al., 2002; GASNIER et al.,

2007; WANG, 2012);

Finanças (2): Apresentam elevada diversidade de itens com alto valor agregado,

incrementando significativamente o capital de giro de investimento em estoques (GASNIER

et al., 2007; REGO; MESQUITA, 2011; HUISKONEN, 2001; WILLEMAIN; SMART;

SCHWARZ, 2004; GOMES; WANKE, 2008; BOTTER; FORTUIN, 2000; VAUGHAN,

2005; NEVES; DIALLO; LUSTOSA, 2008);

Rotatividade (3): Demanda intermitente e ocasional (consumos irregulares e com baixa

frequência) ou extraordinária (consumo elevado e pontual), a chamada demanda “lumpy” ou

ainda “slow moving” (GASNIER et al., 2007; WANG, 2012; REGO; MESQUITA, 2011;

HUISKONEN, 2001; WILLEMAIN; SMART; SCHWARZ, 2004; GOMES; WANKE, 2008;

VAUGHAN, 2005; NEVES; DIALLO; LUSTOSA, 2008; ROMEIJNDERS, TEUNTER;

JAARSVELD, 2012);

Sensibilidade (4): Apresentam elevada sensibilidade nos controles de reposição, podendo

haver demora para os índices de cobertura alcançarem os níveis desejados nos casos de itens

com utilização baixa ou extremamente reduzida (GASNIER et al., 2007);

Reparabilidade (5): Possibilidade de reparo de itens, demandando especial atenção do gestor

na logística reversa envolvida e nos controles de reposição automática do estoque, evitando

compras desnecessárias de componentes que se encontram em processo de reparo (GASNIER

et al., 2007; REGO; MESQUITA, 2011; KIM; HUR; SHIN, 1998; WANG; SYNTETOS,

2011);

Priorização (6): Presença no estoque condicionada ao seu valor agregado potencial,

fundamentado na frequência de demanda e na criticidade para o equipamento ou sistema ao

qual pertencem, uma vez que é inviável economicamente manter em estoque todas as partes e

itens de cada equipamento existente (GASNIER et al., 2007; KENNEDY et al., 2002;

VAUGHAN, 2005);

Criticidade (7): A falta de um componente essencial para o funcionamento de uma máquina

tem potencial para prejudicar o funcionamento de toda a cadeia produtiva na qual ela está

inserida (EPAMINONDAS; SIQUEIRA, 2010);

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Canibalismo (8): As demandas de peças sobressalentes, em algumas conjunturas, são

atendidas mediante o “canibalismo” de outras partes, unidades ou kits, gerando implicações

financeiras, legais e ambientais (KENNEDY et al., 2002);

Expectativas Intrínsecas (9): Itens estreitamente ligados às expectativas dos clientes no que

diz respeito à qualidade dos produtos e serviços associados, uma vez que a ocorrência de falha

dos equipamentos já é uma preocupação existente e atrasos no seu reparo (operacionalização)

em virtude da ausência de sobressalentes suscita uma percepção negativa pelo cliente (REGO;

MESQUITA, 2011; GOMES; WANKE, 2008; BOTTER; FORTUIN, 2000);

Obsolescência (10): O aumento na complexidade dos produtos e equipamentos, somada à

redução do seu ciclo de vida, eleva significativamente o risco de obsolescência no estoque,

especialmente quando se tratam de dispositivos eletroeletrônicos, gerando um desafio

adicional ligado às decisões de reposição ou disposição destes materiais. A esta característica

soma-se à possibilidade de aumento do número de códigos ativos (KENNEDY et al., 2002)

(REGO; MESQUITA, 2011; FAVARETTO; DROHOMERETSKI, 2011);

Políticas (11): Decisões relativas à composição ou reposição dos estoques de sobressalentes

são ditadas, em grande parte, pelas políticas de manutenção, independentemente se a decisão

for substituir um item danificado ou repará-lo (KENNEDY et al., 2002);

Descentralização (12): Estoques de peças sobressalentes podem se localizar em diferentes

espaços, geralmente distantes uns dos outros, em virtude da conveniência logística ou da

estratégia de otimização do tempo de reparo (operacionalização) dos equipamentos ou

sistemas (HUISKONEN, 2001; KENNEDY et al., 2002; WANG; SYNTETOS, 2011).

3.2 Disponibilidade de Sobressalentes e Manutenção

Segundo Wang (2012), Molenaers et al. (2012) e Wang e Syntetos (2011), as peças

sobressalentes geralmente são demandadas mediante a necessidade de manutenção ou na

substituição de itens de plantas operacionais. Esta condição, segundo Neves, Diallo e Lustosa

(2008), tem potencial para tornar a logística deste material extremamente complexa, o que é

agravado pelo distanciamento geográfico dos estoques e pela existência dos itens reparáveis.

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Kennedy et al. (2002) e Wang e Syntetos (2011) esclarecem a existência de dois tipos

fundamentais de manutenção, a saber: Programada ou Preventiva (MP) (1), cuja demanda por

sobressalentes é previsível, facilitando a sua compra sob a filosofia JIT (Just in Time); Não

programada (2), cuja ausência de sobressalentes normalmente implica em perdas financeiras e

de produção, exigindo, desta forma, alguma política de estoques.

Wang e Syntetos (2011) ressaltam esta última afirmativa, destacando que a maioria dos

estudos trata a manutenção como uma área de pesquisa nela mesma, desconsiderando o

impacto da disponibilidade das peças sobressalentes no tempo de parada dos equipamentos e

nos custos envolvidos.

Wang (2012) aprofunda este discurso em outra pesquisa, afirmando que o custo de

eventuais penalidades decorrentes da indisponibilidade das peças sobressalentes consiste,

geralmente, no custo de oportunidade associado à inatividade do equipamento, assim como

nos custos das expedições emergenciais para a aquisição dos materiais, quando necessário.

Por outro lado, o planejamento adequado da manutenção, bem como o seu atendimento,

pode reduzir o número de falhas destes equipamentos e os seus custos associados. Todavia o

desempenho desta manutenção planejada também dependerá da disponibilidade das peças de

reposição (WANG, 2012).

4 Processo de Reparo de Sobressalentes na Cadeia em Estudo

Este item abordará umas das principais etapas do processo logístico inerente à

operação da cadeia de sobressalentes em estudo, relacionada ao reparo dos sobressalentes

oriundos das plataformas offshore.

Para tal, será utilizada como referência preliminar a Figura 1, e em seguida a Figura 2,

as quais apresentam o fluxograma logístico básico desta cadeia, desde o recebimento dos

materiais oriundos de fornecedores de origem nacional ou estrangeira, até a sua chegada aos

estoques das plataformas, bem como o seu eventual retorno para o almoxarifado principal.

Figura 1 – Fluxograma básico da cadeia logística estudada.

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Fonte: Elaboração própria.

Uma das formas mais frequentes de entrada no estoque analisado consiste no

recebimento de peças ou equipamentos removidos das plataformas cujo reparo se faz

necessário (válvulas, atuadores, chaves, dispositivos eletromecânicos, etc.). Os mesmos

pertencem à contratante, tendo em vista terem sido removidos de equipamentos de sua

propriedade, todavia permanecem no estoque da contratada por questões estratégicas.

O processo de desembarque destes itens se inicia mediante a emissão de uma nota

fiscal pela contratante, de modo amparar fiscalmente tanto a operação de transporte do bem

quanto a sua permanência no estoque da contratada. A validade deste documento,

normalmente, não ultrapassa 12 meses (natureza fiscal conhecida como “remessa para reparo”

ou “comodato”). Após este período, o item deve ser devolvido para a contratante ou o

respectivo documento fiscal de cobertura deve ser atualizado, após a sua devida devolução

fiscal pela contratada.

Estes itens, uma vez desembarcados e destinados para o estoque da contratada

(conforme previsto contratualmente), recebem uma identificação específica e permanecem

segregados dos demais em estoque até a finalização do seu reparo, o qual pode ser interno ou

externo (fornecedores). Um cadastro para cada item no ERP adotado pela empresa, no

respectivo módulo de materiais, se faz necessário.

Uma vez direcionados para o fornecedor externo, condição mais comum no caso

estudado, e depois de resolvidas algumas questões administrativas de rotina, os equipamentos

sofrem o processo de reparo, o qual normalmente demanda a utilização de subpartes

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específicas e/ou consumíveis. Estes materiais, em conformidade com a legislação vigente,

devem ser vendidos separadamente pelo prestador de serviços para a contratante do serviço, o

que presume a existência de um pedido de compra específico emitido por esta.

Tal pedido de compra demanda o cadastro detalhado dos subitens no ERP, a sua

alocação na respectiva ordem de compra, além do seu recebimento logístico e do seu posterior

registro de consumo, independentemente deste material ter ou não adentrado fisicamente o

estoque da contratante do serviço. A compra destes itens também implica no carregamento do

inventário contábil da companhia, referência oficial para o indicador de acuracidade dos

estoques.

Cabe ressaltar que o registro de consumo destas subpartes e/ou consumíveis está

condicionado à conclusão de um processo de venda complementar, feito pela contratante do

serviço de reparo para a contratante do serviço de operação e manutenção, um processo

conhecido como “revenda”, motivado por benefícios fiscais comuns. Isto porque as

mercadorias adquiridas para revenda tem previsão do crédito de PIS e COFINS, conforme

determinam o inciso I, artigo 3º, Lei. 10.833 e o inciso I, artigo 3º, Lei 10.637.

Desta forma, neste contexto contratual, os valores a serem pagos mensalmente pela

contratante à contratada consistem na quantia referente à prestação dos serviços somada

àquela referente à revenda das peças eventualmente utilizadas. Todavia, como o valor total a

ser recebido mensalmente pela contratada é pré-estabelecido contratualmente, a quantia

referente à revenda dos itens consumidos gera uma dedução no valor devido da prestação de

serviços naquele mês, ou seja, em última análise, a revenda não implica em aumento ou

redução de receita para a contratada; muito embora controles específicos se façam necessários

pelos gestores financeiros.

Em termos práticos, o processo de revenda se inicia com a submissão, para a

contratante, de um dossiê contendo a relação dos itens consumidos no período de medição,

bem como de algumas evidências da sua utilização, tais como as ordens de serviço, as notas

fiscais (simples remessa) e as requisições de transporte. Uma vez aprovado este dossiê, a

contratante emite um pedido de compra para a contratada, a qual deve providenciar uma nota

fiscal fatura correspondente.

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Todavia, antes da emissão desta fatura, o responsável pelo departamento de logística

efetua uma conferência final de toda a documentação do processo, tendo em vista verificar,

principalmente, se o item a ser revendido possui saldo no inventário contábil, de modo a não

gerar uma discrepância. Não sendo verificadas inconsistências, a nota fiscal fatura

correspondente é emitida e o saldo do item é deduzido do inventário contábil, concluindo o

processo de registro de consumo no inventário.

Figura 2 – Sequência básica do processo de reparo.

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Fonte: Elaboração própria.

Ademais, assim que recebido o sobressalente reparado do fornecedor externo, o seu

respectivo saldo é ajustado manualmente no ERP no estoque correspondente aos itens

reparados (aptos para uso) de propriedade do cliente. Havendo demanda destes itens nas

plataformas offshore, se fará necessária a emissão de uma nota fiscal de devolução para a

contratante, referenciando o documento de cobertura emitido por esta.

Ressalta-se que uma eventual falha em qualquer destas etapas, desde o pedido de

compra das subpartes/consumíveis até a sua revenda para a contratante, além do retorno do

item reparado para a plataforma, implicará em elevado risco de perda de acuracidade do

inventário de sobressalentes.

5 Conclusão

O mapeamento do processo de reparo na cadeia de suprimentos analisada permitiu

identificar importantes ameaças à acuracidade dos estoques, normalmente ocultadas ou

negligenciadas pelas rotinas burocráticas inerentes aos processos logísticos, especialmente no

setor offshore, marcado pelo longo distanciamento geográfico das partes envolvidas.

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Nesta perspectiva, podemos destacar três momentos críticos deste processo logístico,

no que se refere à gestão da acuracidade dos estoques: Pré-Reparo (1) – A precisão das

informações se mostra relevante desde a emissão do documento fiscal de entrada do item a ser

reparado, incluindo o adequado registro e identificação do mesmo como uma propriedade da

contratante no estoque; Reparo (2) – O registro e processamento dos dados relativos às

subpartes e consumíveis utilizados, incluindo as etapas de compra (2.1), recebimento (2.2),

consumo (2.3) e revenda (2.4), esta última exigida legalmente, devem transcorrer de forma

sincronizada e precisa, tanto no ERP quanto no setor de contabilidade, apesar de não haver

movimentação física no estoque da contratada; Pós-Reparo (3) – Uma vez reparado o

sobressalente, é fundamental o correto registro de seu saldo no estoque, garantindo a sua

disponibilidade e a sua devida segregação dos itens novos. Também é salientada a

necessidade de atendimento às exigências administrativas associadas à devolução fiscal do

item para a contratante, quando do vencimento do respectivo documento fiscal ou do seu

encaminhamento para a plataforma offshore.

Cabe ressaltar ainda que o processo de reparo interfere na política de reposição do

estoque, tendo em vista que as quantidades em processo de recondicionamento devem ser

deduzidas das quantidades a serem ressupridas no futuro, evitando compras desnecessárias

(KIM; HUR; SHIN, 1998; GASNIER et al., 2007; REGO; MESQUITA, 2011; KIM; HUR;

SHIN, 1998; WANG; SYNTETOS, 2011).

Por fim, mediante a análise do processo logístico objeto do estudo, pode-se concluir

que a acuracidade dos estoques se mostra relevante em uma amplitude muito superior ao

estabelecido pela sua definição conceitual, abrangendo e enaltecendo, desta forma, a precisão

e a qualidade da informação, em todos os processos físicos e administrativos inerentes à

manutenção na cadeia de suprimentos analisada, como elementos-chave indispensáveis à

eficiência operacional das empresas envolvidas.

6- Referências Bibliográficas

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