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A FORMAÇÃO POLITÉCNICA NA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL EM NÍVEL

MÉDIO NO ESTADO DO PARANÁ.

Joice Estacheki1

Resumo O presente trabalho compõe o projeto de pesquisa, a qual se encontra em andamento, pelo Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade Estadual de Ponta Grossa, em nível de mestrado acadêmico, na Linha de Pesquisa de História e Políticas Educacionais, tendo como objeto a proposta curricular de educação profissional do Estado do Paraná. Por meio da pesquisa pretende-se analisar criticamente a referida proposta, de forma a desvelar seu real papel face à atual organização social, por meio da investigação dos pressupostos teóricos que a fundamentam, contrapondo-a à posição teórico-filosófica teórica proposta pelos escritos de Gramsci com relação a esta modalidade de ensino, apontando sua contribuição sobre o mundo do trabalho. A pesquisa justifica-se em função da necessidade de análise da proposta, uma vez que o citado Estado propõe nas Diretrizes Curriculares da Educação Profissional a formação para o “mundo do trabalho”, compreendendo o trabalho como “princípio educativo” em uma perspectiva “politécnica”. Percebe-se certa ousadia por parte do Estado do Paraná com relação a esta modalidade, tendo em vista a história do ensino profissionalizante no contexto educacional brasileiro, o qual sempre esteve formatado para a mera formação de mão de obra e com o simples objetivo de atender aos anseios da sociedade capitalista em expansão. Tendo em vista a intencionalidade da pesquisa, o seu objeto de estudo e o problema em questão, situar-se-á o trabalho dentro da perspectiva materialista histórico dialética, pois se tem a clara compreensão de que as contradições na relação capital x trabalho são evidentes na conjectura estabelecida pela história da sociedade humana. Sendo a pesquisa de cunho bibliográfico, serão estudados os autores que desenvolvem trabalhos científicos voltados à compreensão do tema aqui proposto, ou seja, pesquisadores que se debruçam ao estudo e discussão da educação profissional e da formação para o trabalho, assim como pesquisadores das obras de Karl Marx e Antonio Gramsci, buscando-se ainda o aprofundamento teórico das produções de ambos os autores, os quais fundamentam a proposta em questão.

Palavras-chave: educação profissional; educação e trabalho; escola unitária. INTRODUÇÃO

Tendo em vista as muitas discussões dos caminhos e descaminhos da educação

brasileira em todos os níveis de ensino, na tentativa de definirem-se políticas públicas que

venham a atender suas necessidades sociais, históricas e culturais e que visam, portanto, a

superação de práticas até então cristalizadas, e que, realmente, suprem as precárias condições 1 Mestranda do Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade Estadual de Ponta Grossa. [email protected]

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de vida maioria da população, percebe-se a necessidade de voltar-se um olhar crítico à

educação profissional em nível médio, proposta pela Secretaria de Educação do Estado do

Paraná.

Tal necessidade reside no fato de que o citado Estado propõe nas Diretrizes

Curriculares da Educação Profissional a formação para o “mundo do trabalho”

compreendendo-se ainda o trabalho como “princípio educativo”. Percebe-se certa ousadia por

parte do Estado do Paraná com relação a esta modalidade de ensino, tendo em vista a história

do ensino profissionalizante no contexto educacional brasileiro, o qual sempre esteve

formatado para a mera formação de mão de obra e com o simples objetivo de atender à

sociedade capitalista em expansão.

A Secretaria de Educação do Estado do Paraná, possivelmente seja aquela que enfrentou o desafio de construir o ensino médio integrado em escolas de sua rede, por meio de um processo sistemático de elaboração coletiva de princípios e diretrizes ético-políticas e pedagógicas sólidas, garantindo, simultaneamente, as condições objetivas necessárias para sua realização. (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005, p. 1092)

Embora a Secretaria de Estado de Educação do Paraná tenha canalizado esforços para

a superação da visão mercadológica de educação profissional, o questionamento que se faz é:

o corpo docente e discente dos cursos de educação profissional tem clareza quanto à

finalidade definida em nível de Estado para tal formação? Ou seja, como vem, na prática,

concretizando-se esta proposta inovadora de educação profissional? O corpo docente está

ciente de que sua função é ampliar a visão de mundo, homem e sociedade de seus alunos em

função de inseri-los, não no mercado de trabalho capitalista e dissimulado, mas sim no

“mundo do trabalho” a fim de conscientizá-los da necessidade de transformação da atual

realidade social? Existe, por parte do Estado o real compromisso de efetivação desta proposta

e quais os procedimentos adotados para tal? Uma proposta desta natureza, que se diz calcada

nos princípios gramscianos, tem garantido o desenvolvimento íntegro destes princípios,

estabelecendo propósitos em prol de uma sociedade igualitária?

Sempre que Políticas Públicas são implantadas, evidenciam-se determinadas

concepções filosóficas, ou seja, como se concebe o homem, o mundo e a sociedade.

Teoricamente torna-se claro qual é a vertente filosófica adotada pelo Estado do Paraná quanto

à educação profissional em nível Médio, porém, consequentemente, emerge a necessidade de

analisar-se em que nível de concretude se encontra tal política.

A inquietação frente ao objeto de estudo, surgiu a partir do momento em que,

enquanto sujeito pertencente ao quadro próprio do magistério estadual, atuando em um dos

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cursos de formação profissional e procurando compreender os objetivos desta modalidade de

ensino, diante da evidência de sua fundamentação teórico-filosófica, buscou-se seu

aprofundamento, ou seja, a tentativa de articular a proposta gramsciana de educação

profissional, às fontes que lhe deram origem. Desta forma estabeleceu-se a necessidade de

maior compreensão da escola unitária definida por Gramsci para, aí sim, conceber a proposta

de educação profissional do Estado do Paraná como inovadora e disposta a superar a

sociedade capitalista.

Entende-se que é um trabalho de pesquisa qualitativa extremamente relevante, tendo

em vista as condições sócio-históricas em que se estabeleceu a educação profissional no

Brasil. O objetivo nesse sentido é, também, colaborar com as discussões acadêmicas e

institucionais que estabeleçam como ponto passível a necessidade de se organizar uma

educação que vislumbre a emancipação humana, ainda que em uma sociedade organizada a

serviço do capital.

Neste sentido, o presente projeto é direcionado com vistas a analisar criticamente a

proposta curricular da educação profissional em nível médio do Estado do Paraná, de forma a

desvelar seu real papel na atual organização social. Para tanto, compreende-se que é de

fundamental importância investigar-se a efetivação dos pressupostos teóricos que

fundamentam a educação profissional em nível médio, no Estado do Paraná e sua

contribuição sobre o mundo do trabalho, de forma a contrapô-la à posição filosófico-teórica

proposta pelos escritos de gramscianos.

PRIMEIRAS INQUIETAÇÕES

Partindo do pressuposto apontado por Marx e Engels (1999, p. 27), o que define a

existência humana, o que caracteriza a realidade humana é o trabalho, através do qual o

homem produz seus próprios meios de vida transformando a natureza a partir de suas

necessidades. Nesta concepção, portanto, nos diferenciamos dos animais, que têm sua

natureza garantida pela natureza e se adaptam a ela sem objetivos pré definidos. O homem, ao

contrário, antes da efetivação de sua ação possui o resultado mentalmente. Sobre isso, Saviani

(2003, p. 133), menciona o quinto capítulo de “O Capital” de Marx (1968), sobre a

comparação que o mesmo estabelece entre o processo de trabalho entre o pior dos arquitetos e

a mais hábil abelha.

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Historicamente, a sociedade humana produziu diferentes formas de trabalho, ou seja,

produziu sua existência através de diferentes modos, assim apontados por Saviani (2003, p.

133) o comunitário; o comunismo primitivo, o modo de produção asiático, o modo de

produção antigo, ou escravista; o modo de produção feudal, e o modo de produção capitalista.

Se entendermos que o trabalho é, portanto atividade exclusivamente humana, a qual

garante a existência do homem nos aspectos biológicos, históricos, culturais e sociais não se

pode desconsiderá-lo do processo de educação institucionalizada e formal, ou seja, a

formação para o trabalho.

Com respeito a esta questão podemos situar a educação da Grécia antiga, cuja

sociedade organizava-se do trabalho escravo, sendo a escola o lugar do ócio, do lazer e as

funções intelectuais restringiam-se a uma pequena parcela da sociedade. Já na Idade Média,

tinha-se o trabalho servil como sustentáculo junto ao cultivo da terra que se desenvolvia por

técnicas simples, ignorava-se qualquer espécie de conhecimento sistematizado e os

conhecimentos profissionais situavam-se fora dos espaços institucionais. A partir do advento

da revolução industrial elucida-se a revolução educacional, pois a máquina passou a ser o

centro do processo produtivo e a escola o espaço para a transmissão dos conhecimentos

técnico e científicos como ressalta Manacorda (1994, p. 246), “fábrica e escola nascem juntas,

em um movimento que implica também a passagem definitiva da instrução das igrejas para os

Estados”. A cultura técnico-científica não encontrou espaço nas escolas, surgindo assim

outras instituições como academias, escolas técnicas e profissionais até mesmo porque, nas

palavras de Locke, citado por Mèszáros, afirma que

Os filhos das pessoas trabalhadoras são um corriqueiro fardo para a paróquia, e normalmente são mantidas na ociosidade, de forma que geralmente também se perde o que produziriam para a população até eles completarem doze ou catorze anos de idade. Para esse problema, a solução mais eficaz que somos capazes de conceber, e que, portanto humildemente propomos, [...] é que se criem escolas profissionalizantes em todas as paróquias, as quais os filhos de todos, na medida das necessidades da paróquia, entre quatro e treze anos de idade...devem ser obrigados a freqüentar. (2005, p. 41)

Essa será a primeira concepção de educação profissional na nascente sociedade

capitalista: escolas profissionalizantes para os filhos da classe operária, concepção esta que

evidenciar-se-á nos primórdios da educação profissional brasileira, pois a aprendizagem

profissional era destinada aos órfãos desvalidos caracterizando-se como ação de caridade.

Posteriormente o ensino profissional é incluído no conjunto geral da instrução, porém não

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deixou de apresentar-se sob um caráter deprimente e desmoralizante, que nos parece

merecedor de rápida análise.

Podemos considerar a década de 30 como marco do processo de industrialização

brasileira, consequentemente exigia-se a formação adequada para seu pleno desenvolvimento.

Assim as escolas passaram a formar técnicos capazes de desempenhar qualquer função na

indústria. O processo de industrialização se expande e na década de 40 através das leis

orgânicas da educação nacional, amparadas pela Constituição de 1937, que aponta a formação

vocacional como dever do Estado em colaboração com as empresas, cria-se as entidades

especializadas e conhecidas como “entidades do sistema S”. O sistema público delega,

portanto, a educação profissional à iniciativa privada e aos interesses capitalistas onde se

evidencia a formação do “homo faber” (GRAMSCI, 2001, p. 53), sendo que somente a partir

da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 4.024/61 se estabelece

a equivalência entre o curso secundário e os cursos técnicos quanto ao ingresso ao ensino

superior. Após o golpe militar em 1964 estabelecem-se novas necessidades educacionais a

partir do acordo MEC-USAID sendo, portanto, necessário reformular o ensino brasileiro,

promulgando-se a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 5.692/71 a qual

estabeleceu a profissionalização como objetivo único do ensino de 2º grau e impondo a

obrigatoriedade de habilitações profissionais. Tal obrigatoriedade deixou de existir em 1982

com a promulgação da Lei 7.044. A educação profissional não apresentou novidades no

decorrer da década de 80, embora estivesse cerceada por discussões naquele período de

redemocratização que se instalav

A década de 90 é marcada pelo desinteresse nesta área, embora a Lei de Diretrizes e

Bases da Educação Nacional nº 9.394/96 apresente um capítulo específico à educação

profissional, sendo posteriormente regulamentado pelo Decreto nº 2.208/97 do Governo

Federal que a especifica em três níveis: básico, técnico e tecnológico e proíbe o Ensino

Integrado ao Ensino Médio. Desta forma, as discussões que se fizeram no decorrer da década

de 80, sobre a necessidade de estabelecerem-se políticas públicas para educação profissional

que visasse a articulação entre ciência, cultura e trabalho, inspiradas nos trabalhos de

Gramsci, perdem o destaque em função das políticas neoliberais que se estabelecem neste

período, retomando-se a visão dualista do ensino e do sistema educacional.

Neste contexto, (1995- 2002, governo Jaime Lerner), o Paraná também respondia às

políticas neoliberais e os cursos de educação profissional foram suspensos gradativamente e

retomados no governo posterior (2003 ao atual - Roberto Requião/ Orlando Pessuti) a partir

do fortalecimento da educação profissional pela revogação do Decreto nº 2.208/97, conforme

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afirmam Ramos, Frigotto, Ciavatta (2005, p. 1089) “[...] restabelecendo-se a possibilidade de

integração curricular dos ensinos médio e técnico, de acordo com o que dispõe o artigo n. 36

da LDB.”

Amparado legalmente pelo Decreto 5.154/2004, a Secretaria de Estado da Educação

do Paraná passa então a reorganizar a educação profissional através das Diretrizes

Curriculares da Educação Básica e das Diretrizes da Educação Profissional na qual se

estabelece: [...] a partir de 2003, a política estabelecida para a Rede Estadual iniciou não somente a retomada da oferta pública e gratuita da formação para o trabalho mas, também, passou a assumir a concepção de ensino e currículo em que o trabalho, a cultura, a ciência e a tecnologia constituem fundamentos sobre os quais os conhecimentos escolares devem ser trabalhados e assegurados, na perspectiva da escola unitária e de educação politécnica. (2006, p. 15)

Nesta perspectiva

[...] a SEED assumiu o compromisso com uma política de Educação Profissional que tem o trabalho como princípio educativo, princípio este que considera o homem em sua totalidade histórica, e a articulação entre trabalho manual e intelectual a partir do processo produtivo contemporâneo, com todas as contradições daí decorrentes para os processos de formação humana e para o trabalho. (2006, p.19)

Torna-se claro que o objetivo da educação profissional é a formação do ser humano

emancipado (FRIGOTTO; CIAVATTA, p. 45) evidenciados pelos termos utilizados, o que

subentende a superação do discurso polivalente, pois uma educação que se fundamente nesse

propósito precisa ser politécnica, ou seja, que ao propiciar acesso aos conhecimentos e à

cultura, propicie a realização de escolhas e a construção de caminhos para a produção da vida

(RAMOS, 2007, p. 02). A autora salienta que este caminho é o trabalho, como produção

humana e como práxis econômica. Daí a necessidade de estabelecer-se uma escola unitária

como nos propõe Gramsci [...] deveria assumir a tarefa de inserir os jovens na atividade

social, depois de tê-los elevado a um certo grau de maturidade e capacidade para a criação

intelectual e prática e uma certa autonomia na orientação e na iniciativa. (2001, p.36).

Nas palavras de Saviani (2007, p. 159), “a escola unitária para Gramsci corresponderia

à Educação Básica brasileira na atualidade, especificamente nos níveis fundamental e

médio”, sendo que, segundo o autor, a este nível de ensino compete “explicitar como o

conhecimento, isto é como a ciência, potência espiritual, se converte em potência material no

processo de produção” (ibdem, p. 160). Desta forma o autor destaca que

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O Ensino Médio envolverá, pois, o recurso às oficinas nas quais os alunos manipulam os processos práticos básicos da produção; mas não se trata de reduzir na escola a especialização que ocorre no processo produtivo. O horizonte que deve nortear a organização do Ensino Médio é o de propiciar aos alunos o domínio dos fundamentos das técnicas diversificadas utilizadas na produção, e não o mero adestramento de técnicas produtivas. Não a formação de técnicos especializados, mas a formação de politécnicos. (SAVIANI, 2007, p. 161)

É nesta reflexão que reside nosso interesse com relação ao resultado das Políticas

Públicas para a Educação Profissional em Nível Médio implantadas no sistema de ensino do

Estado do Paraná: é uma prática que propõe realmente a efetivação da escola unitária ou é

mais uma “ideologia política de conciliação conservadora”? (NOSELLA, p. 21). Nestes

termos, concorda-se com o autor quando defende

A consideração de que o Ensino Médio deve priorizar a preparação (imediata ou remota) para o mercado, é admitir a legitimidade da profissionalização precoce. A atual apologia ao ensino profissionalizante e a ampliação desse sistema escolar é uma declaração à falência e do abandono do ensino médio humanista, “culturalmente desinteressado”, preparado para formar dirigentes. (2009, p.01)

Gramsci já argumentava que “a multiplicação de tipos de escola profissional, [...]

tende a eternizar as diferenças tradicionais; mas, dado que tende nestas diferenças, a criar

estratificações internas, faz nascer a impressão de ter uma tendência democrática” (2001,

p.49).

A democratização social será conquistada na medida em que se estabeleça a proposta

de escola unitária e politécnica pensando-a “para além do capital” (MÈSZÁROS, 2005) para

tanto, devemos defender a Educação Profissional no contexto do Ensino Médio que forneça

aos indivíduos subsídios científicos qualitativos para que se insiram no mundo do trabalho.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A pesquisa científica deve definir-se por um método apropriado que lhe favoreça na

busca pelas respostas ao problema de pesquisa que se pretende investigar. Segundo Gamboa

Investigação vem do verbo latino Vestígio, significa “seguir as pisadas”. Investigação significa a busca de algo a partir de vestígios. Como a investigação constitui um processo metódico, é importante assinalar que o método ou modo, ou caminho de se chegar ao objeto, o tipo de processo para chegar a ele é dado pelo tipo de objeto e não o contrário [...] (2008, p. 25)

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Ao estabelecer-se o problema a ser investigado e, tratando-se da educação enquanto

ciência social, torna-se imprescindível o desenvolvimento da pesquisa qualitativa, uma vez

que [...] a pesquisa qualitativa usa o texto como material empírico (em vez de números, parte da noção de construção social das realidades em estudo, está interessada na perspectiva dos participantes, em suas práticas do dia a dia e em seu conhecimento cotidiano relativo à questão em estudo. (FLICK, 2009, p. 16)

Tendo em vista a intencionalidade da pesquisa, o seu objeto de estudo e o problema

em questão, situar-se-á o trabalho dentro da perspectiva materialista-dialética, pois se tem a

clara compreensão de que as contradições na relação capital x trabalho são evidentes na

conjectura estabelecida pela história da sociedade humana., e no caso da presente pesquisa,

visará “captar todas as contradições e todas as mediações” (FRIGOTTO, 2004, in FAZENDA,

p. 81) do objeto a ser investigado.

Não há como negar a necessidade em compreendermos tal processo diante das

“múltiplas determinações” que permeiam a história da educação brasileira e as ações político-

ideológicas que as definem, em nosso caso a educação profissional.

Ilustrando esta questão, em recente pesquisa (SALDANHA, 2010, p. 96), há o

posicionamento da então chefe do departamento de Educação e Trabalho da Secretaria de

Estado da Educação do Paraná, afirmando que

[...] nós temos assumido a partir de 2004 a integração. Ela tem sido no Paraná uma questão importante, mas que nunca se pretendeu universalizá-la. A proposta é trabalhar com a integração, é formar professores e gradativamente a gente pode fazer a expansão [...] Não queremos que o ensino médio seja todo técnico, mas que o jovem tenha esta possibilidade.

A possibilidade ideológica evidenciada no presente discurso é a de que, caberia aos

jovens da classe popular definir prematuramente sua profissão, afinal a quem mais a escola

pública deve direcionar seu olhar e sua atenção senão aos sujeitos que nela encontram quase

que exclusivamente o único espaço possível para a apropriação do saber e que, no entanto,

lhes é negado?

Marx (1983), na Contribuição à crítica da economia política afirma que O concreto é concreto por ser a síntese de múltiplas determinações, logo, unidade da diversidade. É por isso que ele é para o pensamento, um processo de síntese, um resultado, e não um ponto de partida, apesar de ser o verdadeiro ponto de partida e portanto igualmente o ponto de partida da observação imediata e da representação.

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Nesta perspectiva, o trabalho como princípio educativo será o aspecto norteador para o

seu desenvolvimento da pesquisa, contando com a pesquisa bibliográfica e documental,

prevendo, em caso de necessidade para a pesquisa, o levantamento e análise dos dados

coletados em campo, obtidos através de entrevistas com o corpo docente e questionários com

o corpo discente dos Cursos de Educação Profissional em nível médio.

O procedimento de pesquisa adotado será, portanto, a pesquisa bibliográfica,

compreendido a partir do conceito elaborado por Marconi e Lakatos, assim definida como

Levantamento de toda bibliografia já publicada, em forma de livros, revistas, publicações avulsas e imprensas escritas. Sua finalidade é colocar o pesquisador em contato direto com tudo aquilo que foi escrito sobre determinado assunto. (1992, p. 43)

As referidas autoras (1992, p.44) citam ainda Trujillo (1974, p. 230) para afirmar que

“esses documentos permitem ao cientista o reforço paralelo na análise de suas pesquisas ou na

manipulação de suas informações”. O pesquisador utiliza-se, portanto, da produção já

existente para ampliar o conhecimento de domínio científico. Neste sentido, concordamos

com Lima e Mioto

[...] reafirma-se a pesquisa bibliográfica como um procedimento metodológico importante na produção do conhecimento científico, capaz de gerar, especialmente em temas pouco explorados, a postulação de hipóteses ou interpretações que servirão de ponto de partida para outras pesquisas. (2007, p. 43)

Como base para a pesquisa bibliográfica, serão estudados os autores que desenvolvem

trabalhos científicos voltados à compreensão do tema aqui proposto, tais como os

professores/pesquisadores: Dermeval Saviani, Gaudêncio Frigotto, Maria Ciavatta, Marise

Ramos, Acácia Kuenzer, Mário A. Manacorda, Paolo Nosella, bem como aprofundamento

teórico através das produções de Karl Marx e Antônio Gramsci, os quais contribuem para a

discussão no campo científico específico do objeto de estudo em questão, colaborando para

com a compreensão do mesmo.

[...] um amplo alcance de informações, além de permitir a utilização de dados dispersos em inúmeras publicações, auxiliando também na construção, ou na melhor definição do quadro conceitual que envolve o objeto de estudo proposto. (LIMA; MIOTO, 2007, p. 40)

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CONSIDERAÇÕES

Embora o projeto esteja em desenvolvimento, pretende-se contribuir para as

discussões no âmbito das políticas educacionais no que diz respeito à educação profissional,

uma vez que, os fundamentos do trabalho são aqui entendidos como característica inerente ao

homem e por meio do qual este efetiva a práxis transformadora. Neste sentido, tem-se a clara

compreensão de que a partir da concepção de trabalho e educação posta pelo Estado à classe

trabalhadora é que se definem tais políticas.

No entanto, não se acredita que a superação da visão distorcida de trabalho imposta

pelo atual sistema dê-se de forma não conflituosa e a partir do consenso. Ao contrário,

idealizar a educação para os trabalhadores e seus filhos requer que se pense e se planeje tal

educação a partir do princípio da contradição na qual a luta de classes é uma constante. Desta

forma, cabe à classe trabalhadora organizar esforços e, ainda que dentro de uma estrutura

voltada aos interesses majoritariamente capitalistas, estruture uma escola média fundada nos

princípios humanistas capazes de transformar a sociedade com vistas à emancipação humana.

Não se compreende que uma educação emancipatória seja organizada com base nos

princípios da divisão social do trabalho alienante, em uma proposta de educação profissional

preocupada meramente com o desenvolvimento econômico regional e que se utiliza de forma

inescrupulosa e indébita dos ideais socialistas.

Refletir sobre estas questões é uma tentativa de desmascarar o poder ideológico das

políticas dualistas tão presentes na história da educação brasileira, as quais deflagram o poder

de reprodução do Estado por meio de um viés “democrático”. Neste aspecto, concorda-se com

Gramsci (2001), quando este afirma que a verdadeira escola democrática é aquela capaz de

tornar todo cidadão dirigente ou capaz de fazê-los controlar quem os dirige.

Construir, portanto, uma escola emancipadora é garantir a todos e, principalmente, à

classe popular, o acesso à cultura, ao conhecimento e, consequentemente, à condição de

exercício pleno da vida política e social que estruturam e fundamentam a sociedade humana.

REFERÊNCIAS

FLICK, Uwe. Desenho da pequisa qualitativa. Porto Alegre: Artmed, 2009.

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