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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO UFMT INSTITUTO DE EDUCAÇÃO IE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO PPGE SIMONE MARQUES LIMA A FORMAÇÃO DO PEDAGOGO E O ENSINO DA MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL CUIABÁ - MT 2011

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1

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO – UFMT INSTITUTO DE EDUCAÇÃO – IE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO – PPGE

SIMONE MARQUES LIMA

A FORMAÇÃO DO PEDAGOGO E O ENSINO DA MATEMÁTICA

NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

CUIABÁ - MT 2011

2

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO – UFMT INSTITUTO DE EDUCAÇÃO – IE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO – PPGE

SIMONE MARQUES LIMA

A FORMAÇÃO DO PEDAGOGO E O ENSINO DA MATEMÁTICA

NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação, Instituto de Educação, Universidade Federal de Mato Grosso, na Linha de Pesquisa Organização Escolar, Formação e Práticas Pedagógicas, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Educação. Orientador: Prof. Dr. Ademar de Lima Carvalho.

CUIABÁ - MT

2011

3

Dados Internacionais de Catalogação na Fonte

L732f Lima, Simone Marques.

A formação do pedagogo e o ensino da matemática nos anos iniciais do ensino fundamental / Simone Marques Lima. -- 2011.

212 f. ; 30 cm. Orientador: Ademar de Lima Carvalho. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Mato

Grosso, Instituto de Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação, Cuiabá, 2011.

Inclui bibliografia. 1. Formação de professores – Pedagogia. 2. Pedagogia –

Mato Grosso. 3. Matemática – Ensino. 4. Matemática – Ensino fundamental. I. Título.

CDU 371.13.026:51(817.2)

Ficha Catalográfica elaborada pelo Bibliotecário Jordan Antonio de Souza - CRB1/2099

Permitida a reprodução parcial ou total desde que citada a fonte

4

CUIABÁ – MT 2011

5

DEDICATÓRIA

À Deus, autor da vida, eterno, imortal, fonte de toda inspiração e sabedoria.

Aos meus pais, Argeu e Vera Lúcia,

que, como ministros fervorosos do evangelho de Cristo e incansáveis trabalhadores na Sua obra, com suas vidas

ensinaram aos filhos o valor da fé, do amor e do respeito a Deus, da dedicação da vida ao Senhor Jesus Cristo apresentando-nos o amigo inseparável: O

Espírito Santo

Ao meu esposo Gilberto, pelo o amor, incentivo e compreensão nesta longa e desafiante caminhada.

Aos meus filhos amados Deborah e Davi fonte de esperança para dias

melhores.

.

.

6

AGRADECIMENTOS

À Deus, meu maior amor. Aos meus familiares, especialmente, aos meus irmãos Mizael, Sara e Samuel, que sempre me apoiaram na vontade de estudar, sobretudo, durante o mestrado. Aos irmãos em Cristo que sempre me acompanharam e subsidiaram meus estudos por meio de oração e súplicas ao Senhor Deus, tendo a fé de que Aquele que começou a boa obra é poderoso para completá-la. Ao professor Dr. Ademar de Lima Carvalho, que apostou na importância deste estudo para a melhoria da qualidade da educação. Que nas suas orientações ampliou minhas compreensões sobre a educação, a formação de professores e o ensino da Matemática. Pela amizade, confiança e estímulo na elaboração, execução, dando-me segurança para superar os desafios desta pesquisa. À professora Dra. Laurizete Ferraguti Passos que muito contribuiu no enriquecimento desta versão de Defesa, pelas observações e sugestões valiosas por ocasião do exame de Qualificação. Ao professor Dr. Adelmo Carvalho da Silva que se colocou a disposição para dialogar sobre o ensino da Matemática. Ao professor Dr. José Eduardo Roma, que aceitou participar da banca examinadora enriquecendo esta pesquisa com suas valorosas contribuições. À professora Dra. Filomena Maria de Arruda Monteiro que, participando da banca de avaliação, contribuiu com excelência dando sugestões da maior qualidade. À professora Dra. Cecília Fukiko K. Kimura que tem contribuído de maneira indubitável na minha formação matemática e, como educadora dedicada, sempre me encoraja a buscar a compreensão do ensino desta área do conhecimento. Às queridas amigas e colaboradoras Luzinete, Regina, Sandra e Neide, pelo socorro a qualquer hora, pelo convívio e risos necessários. Obrigada! À professora Margarida, que foi leitora cuidadosa desta obra, dialogando, encorajando, corrigindo e ajudando a construir um texto fluido. Aos sujeitos da pesquisa, que são minhas companheiras de trabalho. Obrigada, por terem confiado a mim suas vivências e compreensões, teorizando sobre suas práticas educativas.

7

Quando tenho medo de fracassar Quando tenho medo de não vencer [...]

Quando tenho medo de não tentar

Quando tenho medo de não romper Quando tenho medo de ser

O verdadeiro amor lança fora todo medo [...]

O verdadeiro amor que vem de Deus Me ensina a não temer

Ludmila Ferber – Verdadeiro amor.

8

RESUMO

O presente trabalho é resultante de pesquisa de mestrado em Educação desenvolvida no Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso. Partindo da temática de pesquisa “A formação do pedagogo e o ensino da Matemática”, tem como proposta de discussão a formação deste profissional e os desafios e problemas por ele enfrentados para o ensino da Matemática na 1ª e 2ª fases do II Ciclo nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental. O problema que se apresenta a partir do objeto de investigação é: O professor graduado em Pedagogia, para ensinar a Matemática nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, enfrenta que desafios? Compreender e identificar como esses docentes mobilizam os conhecimentos matemáticos apropriados no curso de Pedagogia é o objetivo central deste trabalho. Busca-se entender que concepção de ensino da Matemática embasa a prática pedagógica do professor e o que ele pensa sobre a sua formação; procura-se as dificuldades e os desafios que esse professor enfrenta para ensinar a Matemática. Para refletir sobre a problemática da pesquisa, elege-se como cenário de investigação a rede pública municipal de Rondonópolis - MT. Foram convidadas a colaborar com o estudo, oito professoras que atuam com o ensino da Matemática nas fases delimitadas pelo mesmo. São analisadas também as matrizes curriculares e as ementas das disciplinas destinadas a formação matemática do pedagogo de cinco cursos de Pedagogia de Mato Grosso. Tomando como referencial metodológico as abordagens qualitativas interpretativas, utilizou-se para a coleta de dados o questionário, a entrevista semiestruturada e a análise de documentos. Como subsídio à reflexão acerca da organização do curso de Pedagogia recorre-se, à Bissolli da Silva, (2006), Brzezinski (1996), Libâneo (1998), Pimenta (1996), Franco (2008), Sheibe (2009), Gatti e Nunes (2008). Para auxiliar na discussão do ensino da Matemática, apoia-se em Skovsmose (2001), Fiorentini (1995), Piaget (1990, 1988), Curi (2004). Por fim, nos aspectos relacionados à formação de professores: Freire (1987, 1999), Veiga (2009); Kincheloe (1997), Contreras (2002), Peter Mclaren (1997), Giroux (1997), Gadotti (1995); Saviani (1991); Carvalho (2005); Nóvoa (1992, 2009), Paro (2008), Pinto (2000); Tardif (2002) e Shulman (1986; 1987 apud Montalvão e Mizukami, 2002). Os resultados da pesquisa revelaram que a maioria dos professores que atuam com a Matemática na 1ª e 2ª fases do II Ciclo nesta rede de ensino não são pedagogos, porém este estudo busca os que são pedagogos. Apontaram ainda, para a existência de lacunas nos programas de formação inicial dos pedagogos, em especial na área da Matemática. A concepção das professoras sobre o ensino-aprendizagem da Matemática aparece, majoritariamente, na perspectiva da construção que dá maior valor ao processo do que ao produto da produção do conhecimento matemático. Os desafios enfrentados para ensinar a Matemática nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental se inserem em questões centradas, na formação do professor e na organização da escola, e têm, primordialmente, natureza pedagógica: a apropriação insuficiente dos conteúdos matemáticos a serem ensinados, a avaliação e a estratégia de ensino a serem adotadas no trabalho com classes bastante heterogêneas nos níveis de aprendizagem e o problema do déficit de aprendizagem dos alunos.

Palavras-chave: Formação de Professores. Pedagogia. Ensino da Matemática.

9

ABSTRACT

The present dissertation is the result of a master‟s research in Education, developed

through the Postgraduate Program in Education of Federal University of Mato Grosso

(UFMT). Starting from the research theme “The teacher training and the teaching of

Mathematics” the proposal is to discuss the formation of that professional, and also the

challenges and problems faced by him/her when it comes to teaching Mathematics to

the 1st and 2nd grades of Elementary School. The problem presented from the

investigation object is: What are the challenges faced by the professional

graduated in Pedagogy when teaching Mathematics to the initial grades of the

Elementary School. The main objective of the following dissertation is to understand

and identify how those professionals mobilize appropriate mathematical knowledge in

the Pedagogy course. It seeks to understand which Math teaching conception serves

as basis for the teacher pedagogical practice and what he/she thinks about his/her

formation; it seeks the difficulties and challenges which that teacher faces to teach

Mathematics. The chosen investigation scenario is the municipal public education

system of Rondonopolis-MT. Eight teachers responsible for teaching Mathematics to

the mentioned grades were invited to collaborate with the study. The curriculum and

menus of disciplines related to the Math formation of the teacher of five Pedagogy

courses of Mato Grosso were analyzed. Interpretative qualitative approaches were

used as methodology framework, and also data collection, questionnaire, semi-

structured interview and documents analysis. As an aid to the reflection about the

organization of the Pedagogy course we have Bissoli da Silva (2006), Libâneo (1998),

Pimenta (1996), Franco (2008), Sheibe (2009), Gatti e Nunes (2008). When it comes to

Math teaching we have as an aid to our discussions Skovmose (2001), Fiorentini

(1995), Piaget (1990, 1988), Curi (2004). Finally, referring to teachers formation: Freire

(1987, 1999), Veiga (2009), Kincheloe (1997), Contreras (2002), Peter Mclaren (1997),

Giroux (1997), Gadotti (1995), Saviani (1991), Carvalho (2005), Nóvoa (1992, 2009),

Paro (2008), Pinto (2000), Tardif (2002) e Shulman (1986, 1987 apud Montalvão e

Mizukami 2002). The results of the research revealed the Mathematics teachers of the

1st and 2nd grades of Elementary School in this municipal public education system are

not educators, even though the study seeks for educators. It also showed some gaps in

the programs of initial formation of educators, especially in Mathematics. The teachers‟

conception about the teaching-learning process of Mathematics is, in the majority,

according to the perspective of construction which gives more value to the process

than to the product of math knowledge production. The faced challenges when

teaching math to the first grades of Elementary School are related to the teacher

formation and to the organization of school, and it essentially has a pedagogic nature:

the insufficient appropriation of math contents to be taught, evaluation and teaching

strategy to be chosen for teaching heterogeneous classes due to learning levels, and

the problem of students learning deficit.

Key-words: Teachers Formation; Pedagogy; Mathematics Teaching.

10

LISTA DE QUADROS

Página

Quadro 1 Comparativo dos ementários 65

Quadro 2 Comparativo dos teóricos utilizados nas disciplinas dos

cursos selecionados

67

Quadro 3 Disciplinas 69

Quadro 4 Carga Horária 69

Quadro 5 O saber plural dos professores 80

Quadro 6 Síntese das características das professoras

colaboradoras

130

Quadro 7 Eixos de análise 131

Quadro 8 Concepções das professoras sobre a Matemática e

seu ensino

141

11

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 13

1 OPÇÃO METODOLÓGICA .................................................................................... 18

2 A PEDAGOGIA E A FORMAÇÃO DO PROFESSOR ............................................ 22

2.1 Perspectiva Histórica do Curso de Pedagogia: Fundamentos Legais e

Atribuições do Pedagogo ........................................................................................ 22

2.2 As Diretrizes Curriculares para o Curso de Pedagogia ...................................... 34

2.3 A Questão da Identidade da Pedagogia ............................................................ 40

2.4 Um Estudo sobre os Cursos de Pedagogia no Brasil ........................................ 48

2.5 Os Cursos de Pedagogia e a Formação Matemática do Professor.................... 50

2.5.1 O curso de Pedagogia da UFMT/IE - Campus de Cuiabá - MT ................... 51

2.5.2 O curso de Pedagogia da UFMT/CUR - Campus de Rondonópolis- MT ..... 55

2.5.3 O curso de Pedagogia da UNEMAT - Cáceres – MT .................................. 59

2.5.4 O curso de Pedagogia da Universidade de Cuiabá – UNIC - Campus de

Cuiabá – MT ........................................................................................................ 60

2.5.5 O curso de Pedagogia da UNIVAG - Centro Universitário de Várzea Grande

– MT .................................................................................................................... 63

2.6 Algumas Reflexões Teóricas sobre os Saberes e Conhecimentos Docentes

755

3 FORMAÇÃO DE PROFESSORES: PRESSUSPOSTOS TEÓRICOS .................... 84

3.1 A Formação do Professor na Perspectiva Critica da Educação ......................... 85

3.2 Formação de Professores para o Ensino da Matemática nos Anos Iniciais do

Ensino Fundamental ............................................................................................. 100

3.2.1 Perspectiva crítica da Matemática e seu ensino........................................ 101

3.2.2 Algumas contribuições de um estudo sobre a formação inicial de professores

e o ensino da Matemática nos Anos iniciais do Ensino Fundamental ................ 107

3.2.3 As concepções que permeiam a construção do conhecimento matemático

.......................................................................................................................... 108

3.2.3.1 O conhecimento matemático na perspectiva tradicional................. 109

3.2.3.2 O conhecimento matemático na perspectiva construtivista.............112

3.2.4 O estudo de Fiorentini acerca de alguns modos de ver e conceber o ensino

da Matemática no Brasil...................................................................................... 114

12

4 O PEDAGOGO E O DESAFIO DE ENSINAR MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS

DO ENSINO FUNDAMENTAL ................................................................................. 124

4.1 Os Sujeitos da Pesquisa: Preparando o Diálogo ............................................. 125

4.2 A Formação do Pedagogo ............................................................................... 131

4.3 O Processo Ensino-Aprendizagem .................................................................. 141

4.4 A atuação do Pedagogo no Ensino da Matemática nos Anos Iniciais do Ensino

Fundamental: Desafios e Problemas Enfrentados ................................................. 151

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 189

REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 201

ANEXOS .................................................................................................................. 206

Anexo 1 - Roteiro das entrevistas .......................................................................... 206

Anexo 2 - Questionário: Caracterização do professor . Erro! Indicador não definido.

Anexo 3 - Proposta curricular para Matemática e suas Tecnologias - 1ª fase do II

Ciclo ....................................................................................................................... 209

Anexo 4 - Proposta curricular para Matemática e suas Tecnologias - 2ª fase do II

Ciclo ........................................................................................................................211

13

INTRODUÇÃO

O presente trabalho situa-se no cenário educacional. Insere-se

nas reflexões sobre a formação de professores na dimensão crítica da

educação. Especificamente, preocupa-se com a formação do pedagogo e os

desafios por ele enfrentados para ensinar a Matemática na 1ª e 2ª fases do II

Ciclo do Ensino Fundamental.

Para refletir sobre a temática da pesquisa no campo da

educação, elegeu-se como locus de investigação a realidade da rede pública

municipal de Rondonópolis - MT. Esta rede de ensino, desde o ano 2000,

aderiu à Organização em Ciclos de Formação Humana conforme Normativa

16/20001 que dispõe:

Artigo 2º - A Escola Organizada em Ciclos de Formação Humana é

uma organização que promove a readequação dos tempos, espaços

e práticas escolares comprometendo-se profundamente com a

inclusão, com a participação de todos, democratizando os processos

culturais vigentes, garantindo a todos o acesso, a progressão

continuada com aprendizagem, conforme reza o Artigo Nº 22 da LDB,

desdobrando esta finalidade nos incisos I, II, III e IV do Artigo Nº 32 e

dos preceitos veiculados no compromisso da “Educação para Todos”

e, ainda, da Resolução Nº 262/ 2002 – CEE/ MT, Artigos 2º, 3º e 4º.

A escola organizada em Ciclos de Formação Humana foi

pensada para resolver os problemas da evasão e da repetência e trazer uma

reestruturação do Ensino Fundamental que respeitasse os diferentes ritmos de

aprendizagem de cada criança, seu conhecimento prévio, seus modos de

aprender, a fim de dar respostas satisfatórias aos problemas colocados hoje

pela sociedade e pelos alunos. Com a finalidade de melhorar a qualidade da

educação, a Normativa acima citada, nos Incisos I ao VI do artigo 4º, orienta

que o Projeto Educativo de cada escola da rede de ensino em foco deve estar

comprometido com

1 RONDONÓPOLIS, MT. Secretaria Municipal de Educação. Instrução Normativa Nº. 16/ 01

que normatiza e orienta a operacionalização da implantação e implementação gradativa do

Sistema de Ciclos de Formação Humana no Ensino Fundamental nas escolas da Rede

Municipal de Ensino de Rondonópolis.

14

I. O desenvolvimento cognitivo, bio-emocional e cultural de todos os

alunos, respeitando a diversidade de experiências e conhecimentos

culturais que possuem e os que circulam nos ambientes próximos e

amplos, atuando de forma intencional e sistemática, avançando na

aquisição e (re) construção de conhecimentos mais amplos e

perenes, sistematizados nas diferentes ciências enquanto

instrumentos a serem utilizados de forma eficaz e eficiente no

conhecimento da realidade física e social;

II. A promoção da vivência cotidiana de processos democráticos, em

todos os espaços de atuação da escola;

III. A promoção de espaços de articulação entre a escola e a

comunidade;

IV. A ampliação do tempo de aprendizagem em tempo regular, com

ampliação obrigatória no contra-turno letivo;

V. A realização coletiva, participativa de estudos, planejamentos,

avaliações, com desenvolvimento de uma cultura coletiva de trabalho,

objetivando a garantia da melhoria da qualidade do ensino municipal

e informados por diagnósticos locais capazes de produzir

informações que orientarão as diferentes ações nas escolas;

VI. A inclusão e atendimento adequado de todos os alunos

portadores de necessidades educacionais especiais, propiciando

condições e recursos para serviços especializados necessários,

conforme dispõem os artigos 58 e 59 da LDB e atendendo

prioritariamente a necessidade dos alunos matriculados.

No que diz respeito aos processos de enturmação, na escola

organizada por Ciclos de Formação Humana os critérios adotados são as

idades aproximadas e as fases do desenvolvimento humano. Assim sendo, na

Rede Municipal de Ensino de Rondonópolis-MT as turmas são assim

organizadas: 1º Ciclo – Infância, de 06 a 09 anos e com 03 fases anuais; 2º

Ciclo – Pré-adolescência, de 09 a 12 anos e com 03 fases anuais e 3º Ciclo –

Adolescência, de 12 a 15 anos e com 03 fases anuais. Recorde-se que este

estudo foca o ensino da Matemática na 1ª e 2ª fases do II Ciclo.

Entretanto, é necessário ressaltar que essa mudança de

paradigma com o abandono da lógica classificatória exige a busca de

alternativas efetivas para garantir o avanço do discente no que se refere à

progressão com aprendizagem. Nesta perspectiva, considerando os tempos e

espaços, a ação educativa deve se dar na dimensão do trabalho coletivo que

deve envolver toda a equipe escolar com vistas ao atendimento das

necessidades individuais de cada aluno.

Esta empreitada se apresenta para o docente como um grande

desafio, visto que, situado no núcleo desta questão, cabe a ele não apenas a

tarefa de transmitir conhecimentos, mas de ensinar os alunos a aprender a

15

aprender. Trata-se, portanto, de complexo trabalho que requer um repensar do

processo pedagógico-didático do professor. Desse modo, os olhares se voltam

forçosamente para a relação professor-aluno.

O estudo tem como questão de pesquisa: O professor graduado

em Pedagogia, para ensinar a Matemática nos Anos Iniciais do Ensino

Fundamental, enfrenta que desafios? Compreender e identificar como os

professores dos anos iniciais mobilizam os conhecimentos matemáticos

apropriados no curso de Pedagogia é o objetivo central deste trabalho. São

tomados, ainda, os seguintes objetivos específicos: dialogar com um

determinado referencial teórico que possibilite a compreensão e interpretação

dos dados da pesquisa; buscar entender que concepção de ensino da

Matemática embasa a prática pedagógica do professor; analisar o que pensa o

professor dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental sobre a sua formação;

procurar identificar os problemas, as dificuldades e desafios que professores

dos Anos Iniciais enfrentam para ensinar os conteúdos matemáticos aos alunos

da 1ª e 2ª fases do II Ciclo. Para a realização da investigação foram

convidadas a colaborar como sujeitos oito professoras que atuam no ensino da

Matemática, nas fases delimitadas por este estudo, todas em atividade na rede

de ensino focalizada.

O foco do presente estudo está em mostrar a importância da

formação no curso de Pedagogia para o ensino da Matemática. A justificativa

para a relevância acadêmica e social desta investigação encontra-se na ideia

de que os resultados das avaliações nacionais e internacionais acerca da

qualidade do ensino básico no Brasil têm dado destaque aos baixos índices

obtidos com muita frequência em relação à aprendizagem dessa área do

conhecimento. Nesta problemática, a formação docente tem sido apontada

como um dos principais fatores de tais resultados. Atualmente, no país a

responsabilidade pela formação do professor que ensina nos Anos Iniciais está

centrada nos cursos de Pedagogia. Pesquisas como, por exemplo, a

desenvolvida por Curi (2004), têm mostrado a existência de problemas na

formação destes professores no que se refere ao trabalho de ensino do

conhecimento matemático.

Para explicar a escolha e o interesse desta pesquisa, impõe-se

ainda reportar à nossa trajetória pessoal. Nos estudos vivenciados como

16

acadêmica do curso de Licenciatura Plena em Pedagogia da Universidade

Federal de Mato Grosso - Campus Universitário de Rondonópolis, cuja luta foi

marcada pelo desejo de apropriação do conhecimento no que diz respeito à

formação de professores dos Anos Iniciais, foi possível perceber a resistência

de estudantes quanto aos saberes matemáticos, já que muitos daqueles

futuros professores dos Anos Iniciais declaravam informalmente que não

gostavam da Matemática. Nosso particular interesse por esta investigação se

prende ao fato de constatar, como graduada em Pedagogia e professora da

rede municipal no interior do estado, no cotidiano do trabalho em sala de aula,

a importância de a criança se apropriar da compreensão dos conceitos

matemáticos, pois é nos primeiros anos de escolaridade que se concentram os

rudimentos dos conceitos que os alunos precisam dominar em profundidade.

A pesquisa, de abordagem qualitativa/interpretativa, toma como

aporte teórico-metodológico da investigação autores como Bogdan & Biklen

(1994), Lüdke e André (1986), Triviños (2006). Para subsidiar a reflexão acerca

da organização do curso de Pedagogia – sua história, identidade e

especificidade – recorre-se a Bissolli da Silva (2006), Brzezinski (1996),

Libâneo (1998), Pimenta (1996), Franco (2008), Sheibe (2009), Gatti e Nunes

(2008). Para auxiliar na discussão a respeito do ensino da Matemática o estudo

apoia-se em autores como Fiorentini (1995), Skovsmose (2001), Piaget (1990,

1988), Kamii (1987), Curi (2004).

Para compreender os aspectos relacionados à formação de

professores tem-se como autores basilares: Freire (1987, 1999), Veiga (2009),

Kincheloe (1997), Contreras (2002), Peter Mclaren (1997), Giroux (1997),

Gadotti (1995), Saviani (1991), Carvalho (2005), Nóvoa (1992, 2009), Paro

(2008), Pinto (2000), Tardif (2002), Montalvão e Mizukami (2002).

O trabalho foi organizado a partir de quatro capítulos, como se

descreve a seguir. No primeiro capítulo, são discutidas e justificadas as opções

teórico-metodológicas; apresenta-se o cenário de investigação, os caminhos e

os instrumentos de coleta de dados, bem como os sujeitos colaboradores da

pesquisa.

No segundo capítulo, é feita a construção das bases teóricas da

pesquisa no que diz respeito ao curso de Pedagogia, trazendo um panorama

histórico deste curso. O caminho trilhado parte dos aspectos históricos das

17

políticas públicas e dos debates daí decorrentes, passa por um estudo dos

cursos de Pedagogia no Brasil desenvolvido por Gatti e Nunes (2008) e chega

até a contextualização da política de formação do pedagogo para o ensino da

Matemática organizada por cinco instituições formadoras estabelecidas no

estado de Mato Grosso.

O terceiro capítulo traz considerações teóricas acerca da

formação de professores, na perspectiva crítica de educação, à luz de autores

que compreendem a ação docente como compromisso histórico, político e ético

de transformação da realidade social opressora e injusta. Dentro desta

concepção de educação, mostra as ideias defendidas pela Educação

Matemática Crítica na ótica de Ole Skovsmose (2001). Apresenta, ainda, outros

elementos teóricos a fim de contextualizar a formação de professores para o

ensino da Matemática nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, quais sejam:

um estudo sobre a formação docente para o ensino da Matemática nos Anos

Iniciais do Ensino Fundamental; as concepções que permeiam a construção do

conhecimento matemático; alguns modos de ver e conceber o ensino da

Matemática no Brasil.

As discussões realizadas no quarto capítulo giram em torno da

análise das informações recolhidas durante o período de coleta de dados. As

análises estão dispostas em três eixos de discussão. O primeiro eixo: A

formação do pedagogo enfoca que suporte o curso de Pedagogia oferece

para o trabalho do professor com o ensino da Matemática. O segundo eixo: O

processo ensino-aprendizagem tem como foco as concepções de ensino

desta área do conhecimento. No terceiro e último eixo: A atuação do

pedagogo no ensino da Matemática nos Anos Iniciais do Ensino

Fundamental: Desafios e problemas enfrentados apresentam-se os

desafios que o pedagogo encontra para ensinar a Matemática. Toda a

discussão neste capítulo está permeada pelo diálogo em torno de limites,

desafios e possibilidades, relacionados à formação do pedagogo e ao ensino

da Matemática, que emergiram ao longo do estudo e, principalmente, dos

dados da pesquisa.

18

1 OPÇÃO METODOLÓGICA

No intuito de compreender os desafios vividos pelo pedagogo no

ensino da Matemática nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, a pesquisa foi

realizada mediante abordagem qualitativa/interpretativa. Explicite-se que

Utilizamos a expressão investigação qualitativa como um termo

genérico que agrupa diversas estratégias de investigação que

partilham de determinadas características. Os dados recolhidos são

designados por qualitativos, o que significa ricos em pormenores

descritivos relativamente a pessoas, locais e conversas e de

complexo tratamento estatístico. As questões a investigar [...] são

formuladas com o objetivo de investigar os fenômenos em toda a sua

complexidade e em contexto natural. (BOGDAN E BIKLEN, 1994,

p.16, grifo do autor)

A investigação que ora é apresentada caracteriza-se por

mapeamento bibliográfico, aplicação de questionários, entrevista com os

professores, transcrição dos dados, elaboração de categorias (eixos), análise

dos dados e por fim a redação da dissertação.

Já nos primeiros momentos realizou-se um estudo teórico que, de

maneira sucinta, procurou a compreensão da formação do professor. Para

buscar entender a formação do pedagogo optou-se por um estudo que trouxe

um breve esboço histórico sobre o curso de Pedagogia no Brasil, os

fundamentos legais e as atribuições do pedagogo e os debates que envolvem a

questão da identidade do referido curso.

Como a pesquisa almejava compreender aspectos relacionados à

formação do pedagogo no que concerne ao ensino de Matemática, buscaram-

se fundamentos teóricos que tratam da formação de professor na perspectiva

da Educação Matemática Crítica. Enfatizou-se o conhecimento matemático nas

perspectivas tradicional e construtivista. Precisamente, realizou-se um estudo

acerca das concepções teóricas de ensino da Matemática baseadas em

Fiorentini (1995) para que se pudessem subsidiar as análises.

A fim de identificar que desafios o professor graduado em

Pedagogia enfrenta para ensinar Matemática nos Anos Iniciais do Ensino

Fundamental, recorreu-se a três instrumentos de coleta de dados: a análise de

documentos, especificamente a matriz curricular e as ementas das disciplinas

19

que tratam da formação matemática do pedagogo; o questionário, no qual se

indagou a respeito de dados pessoais de todos os professores que atuam com

a Matemática nas fases delimitadas por este estudo na rede municipal, locus

da investigação; por fim a entrevista semiestruturada buscou, nos depoimentos

das professoras selecionadas para o estudo, elementos que serviram de

subsídios à compreensão do que é subentendido nesta questão de pesquisa.

A análise documental se constitui numa técnica valiosa de

abordagem de dados qualitativos. Para Ludke e André (1986),

Embora pouco explorada não só na área da educação como em

outras áreas de ação social, a análise documental pode se constituir

numa técnica valiosa de abordagem de dados qualitativos, seja

complementando as informações obtidas por outras técnicas, seja

desvelando aspectos novos de um tema ou problema [...] Os

documentos [...] não são apenas uma fonte de informação

contextualizada, mas surgem num determinado contexto e fornecem

informações sobre esse mesmo contexto. (p. 38-39)

Utilizou-se, portanto, este instrumento para obter informações a

respeito da rede municipal de ensino e realizar um mapeamento das propostas

curriculares de cinco (05) cursos de Pedagogia de Instituições de Ensino

Superior – IES – quais sejam: UFMT/Cuiabá; UFMT/Rondonópolis;

UNEMAT/Cáceres; UNIC e UNIVAG, ambas estabelecidas em Cuiabá-MT,

sendo as três primeiras públicas e as duas últimas privadas. Salienta-se que

não interessa a este estudo realizar a comparação entre o ensino público e o

ensino privado.

Estas instituições foram escolhidas pela relevância que têm

ocupado na formação de professores no estado de Mato Grosso. O critério

para a escolha dos cursos é que se tratasse de Licenciatura em Pedagogia

que estivesse organizada na modalidade de ensino presencial e fosse ofertada

por Instituições de Ensino Superior situadas nesse estado. Tratou-se, tão

somente, de contextualizar de que forma estas instituições organizam a

formação matemática dos futuros professores dos Anos Iniciais, os pedagogos,

para então contribuir como fonte de informações para a triangulação dos

dados.

Recorreu-se às matrizes curriculares e às ementas das disciplinas

voltadas à formação matemática do pedagogo nos cursos de licenciatura em

20

Pedagogia destas instituições. O interesse era conhecer as disciplinas, a carga

horária e os conteúdos destinados à formação matemática do pedagogo – sem,

contudo, ter a pretensão de considerar todas as facetas do currículo – visando

a traçar algumas considerações sobre suas possíveis implicações na prática

educativa dos professores dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, no

tocante ao ensino da Matemática.

A coleta dos dados da proposta curricular foi possível pela

colaboração direta das Instituições de Ensino Superior (enviando e-mail,

esclarecendo via telefone ou presencialmente algumas dúvidas desta

pesquisadora no tocante à organização dos cursos investigados), sendo que

outros dados foram obtidos mediante pesquisa da matriz curricular e ementa

desses cursos, disponíveis na Internet.

Foi utilizado o questionário para identificar os professores que

atuam com a Matemática na 1ª e 2ª fases do II Ciclo do Ensino Fundamental

na rede municipal, como já se sabe, o locus do estudo, e a partir daí, ficaram

definidos os sujeitos, dando-se início aos contatos com os professores que

atenderam aos critérios de seleção dos sujeitos da pesquisa. Tais critérios

foram: ser professor da Rede Municipal de Rondonópolis, ser licenciado em

Pedagogia, atuar com o ensino de Matemática na 1ª e 2ª fases do II Ciclo,

demonstrar desejo de participar da pesquisa. Assim, de 53 professores, 08

atenderam a esses critérios e foram convidados para participarem e

colaborarem com a pesquisa.

A entrevista semiestruturada foi realizada com as professoras e

gravada em áudio e posteriormente transcrita pela pesquisadora. Com o

emprego deste instrumento objetivou-se compreender que concepção de

ensino de Matemática orienta a prática educativa dos professores, sujeitos

desta pesquisa, e os desafios que a eles se apresentam ao ensinar a

Matemática nas fases recortadas por este estudo.

Levou-se em conta o fato de que

Parece-nos claro que o tipo de entrevista mais adequado para o

trabalho de pesquisa em educação aproxima-se mais dos esquemas

mais livres, menos estruturados.[...] especialmente nas entrevistas

não totalmente estruturadas, onde não há a imposição de uma ordem

rígida de questões, o entrevistado discorre sobre o tema proposto

com base nas informações que ele detém e que no fundo são a

21

verdadeira razão da entrevista. Na medida em que houver um clima

de estímulo e de aceitação mútua, as informações fluirão de maneira

notável e autêntica.

A grande vantagem da entrevista sobre outras técnicas é que

ela permite a captação imediata e corrente da informação desejada,

praticamente com qualquer tipo de informante e sobre os mais

variados tópicos. (LÜDKE, ANDRÉ, 1986, p.33-34)

Aplicaram-se as entrevistas individualmente, em ambiente e

horário previamente combinados com as colaboradoras do estudo. Algumas

preferiram falar em suas residências, outras na escola em que trabalham. Com

isso, buscou-se respeitar cada entrevistada dando-lhe a oportunidade de

escolher o local em que se sentiria mais à vontade. Seguiu-se um roteiro pré-

organizado, para todos os sujeitos, no entanto, permitiu-se a flexibilização nos

momentos em que o pesquisador pôde fazer perguntas adicionais para melhor

compreender o contexto.

Por meio deste instrumento pretendeu-se adentrar os significados

que as mencionadas professoras construíram e estão construindo em seu fazer

social, pois este estudo concorda com Franco (2008) no sentido de que os

professores “possuem teorias que embasam suas práticas e práticas que

referendam suas teorias, constituindo-se essa dinâmica numa riqueza que não

pode ser desprezada por qualquer pesquisador da educação” (p. 97).

22

2 A PEDAGOGIA E A FORMAÇÃO DO PROFESSOR

Neste capítulo é apresentado um panorama histórico do curso de

Pedagogia no Brasil, inspirado nos conteúdos e intenções dos textos legais.

Mostram-se, no plano das políticas públicas, as idas e vindas da formação do

professor pedagogo e os debates que vêm sendo travados a respeito da

especificidade e identidade do referido curso. Ao apontar a trajetória

percorrida, da criação do curso de Pedagogia até a aprovação das atuais

diretrizes para o mesmo, deseja-se contextualizar a formação do professor que

ensina a Matemática nos Anos Inicias do Ensino Fundamental.

Dos aspectos históricos das políticas públicas chega-se até a

política de formação do pedagogo para tal ensino que vem sendo organizada

por cinco instituições formadoras, responsáveis pela formação deste

profissional e estabelecida no Estado de Mato Grosso.

2.1 Perspectiva Histórica do Curso de Pedagogia: Fundamentos Legais e Atribuições do Pedagogo

Para compreender como se dá a formação do pedagogo2 é

necessário fazer um breve esboço histórico sobre o curso de Pedagogia no

país. Os estudos de Bissolli da Silva (2006), Brzezinski (1996) e Libâneo

(1998) mostram que este curso ao longo de sua existência tem sido

questionado em relação à especificidade de seu conteúdo, à identidade do

curso e do profissional nele formado e suas reais funções, bem como às

regulamentações sofridas na sua trajetória.

No intuito de, precisamente, estudar a busca de identidade do

curso de Pedagogia, Bissolli da Silva (2006) aborda historicamente a trajetória

deste curso no Brasil, com base nas regulamentações e propostas de estrutura

curricular. Assim, busca nos conteúdos e intenções dos textos legais (decretos-

lei, pareceres e indicações) reconstruir a história do curso de Pedagogia.

2 Segundo Brzezinski (1996, p.181) “A profissão pedagogo não consta na Classificação

internacional Uniforme das Ocupações (ISCO), editada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT). Desse modo, legalmente ela não é reconhecida como profissão. Por analogia, a ocupação de pedagogo enquadra-se no Grupo Unitário Código Isco: 0-6 – Professores (Ministério do Trabalho 1971, p.99)”.

23

Relata que o curso de Pedagogia no Brasil já revela, na sua própria gênese,

muitos problemas que o acompanharão ao longo do tempo e mostra que sua

história pode ser considerada como uma história de busca de afirmação da

identidade, haja vista que seu desenvolvimento foi acompanhado pelo

questionamento de sua identidade.

Para tornar essa problemática mais clara, a autora dividiu a

história desse curso didaticamente em períodos, de acordo com a análise

sobre a identidade da Pedagogia no Brasil ao longo da história, quais sejam:

período das regulamentações, período das indicações e período das propostas.

Seguiremos neste texto esta organização acrescentando algumas

contribuições de outros autores.

O período entre 1939 e 1972 foi denominado período das

regulamentações, por concentrar uma etapa de organização e reorganização

do curso, de acordo com a legislação fixada – o Decreto-Lei nº 1.190/39, o

Parecer do CFE 251/62 e o Parecer do CFE 252/69.

O curso de Pedagogia foi regulamentado em nosso país por

ocasião da organização da Faculdade Nacional de Filosofia, da Universidade

do Brasil, através do Decreto-Lei 1.190 de 04 de abril de 1939 e tinha a dupla

função de formar bacharéis e licenciados para várias áreas, num esquema que

passou a ser conhecido como 3+1, segundo o qual o bacharel era formado em

três anos, sendo reconhecido como técnico em educação, e adicionando-se

mais um ano de curso de Didática formava-se o licenciado, sendo habilitado

para o magistério nas antigas Escolas Normais. Neste Decreto-Lei foi mantida

a formação do professor primário na Escola Normal.

Brzezinski (1996), em seu estudo sobre a formação de

profissionais da educação, afirma que neste tempo a Pedagogia “não tratava

de sua especificidade – a teoria da educação e da didática –, mas se

aprofundava em generalidades sobre as ciências auxiliares da educação” (p.

216). Estudava-se, portanto, “generalidades como conteúdo de base e

superpunha-se o específico num curso à parte – o de didática da Pedagogia”

(BRZEZINSKI, 1996, p. 44).

Seus estudos mostram que essa configuração curricular, marcada

pela inexistência de conteúdo específico, introduziu distorções no curso de

Pedagogia que resultaram em uma pseudo-identidade, a qual levou o curso a

24

ocupar lugar de pouca importância no contexto das demais licenciaturas. O que

prevaleceu foi o “arranjo” beneficiando os pedagogos, que, na época,

adquiriram o direito de lecionar disciplinas sem preparo exigido para que se

tornassem professores. E, ainda, a adoção da premissa “quem pode o mais

pode o menos”, isto é, quem prepara o professor primário tem condições

também de ser professor primário.

O esquema 3+1 permaneceu até 1961 e acabou sendo reforçado

pelo parecer 251/62. Segundo Brzenzinki (1996), por meio da homologação da

Lei de Diretrizes e Bases de 1961 (4.024/61), o Conselho Federal de

Educação, com suas atribuições, buscou colocar em prática a fixação de um

currículo mínimo de formação de professores nos cursos superiores. O curso

de Pedagogia, então, teve sua regulamentação definida pelos Pareceres do

CFE nº 251/62 e 252/69.

O Parecer 251/62 instituiu para o curso de Pedagogia a

incumbência de formar professores para os cursos Normais e profissionais

destinados às funções não-docentes do setor educacional, os “técnicos de

educação” ou “especialistas de educação”. No entanto, já no início deste

Parecer, o seu autor, professor Valnir Chagas, anunciava a ideia de que, no

futuro, a formação do professor primário se desse em nível superior e a de

técnico em educação em pós-graduação. Para Bissolli da Silva (2006), Chagas

ao abordar essas questões que implicavam na manutenção ou extinção do

curso de Pedagogia, já evidenciava a fragilidade e provisoriedade deste curso.

A ideia da extinção é explicada pelo legislador como tendo sua origem na

acusação de que faltava ao curso conteúdo próprio.

Este Parecer tratava de fixar currículos mínimos e tentar eliminar

o esquema 3+1 modificando o tempo de duração do bacharelado e da

licenciatura em Pedagogia de três para quatro anos. O currículo mínimo do

curso de Pedagogia consistia em sete matérias para o bacharelado, sendo

cinco obrigatórias, quais sejam: Psicologia da Educação, Sociologia (geral e da

educação), História da Educação, Filosofia da Educação, Administração

Escolar e mais duas matérias opcionais. Já para a licenciatura, foi incorporado

o Parecer 292/62 que fixava, além das matérias que deviam ser cursadas

concomitantemente ao bacharelado, as matérias pedagógicas dos cursos de

licenciatura para o magistério em escolas de nível médio (ginasial e colegial), a

25

saber: Didática e Prática de Ensino. Desta legislação o que resultou foi, na

prática, a separação entre bacharelado e licenciatura, já que o bacharelado

formava o técnico, e a licenciatura, o professor para a Escola Normal.

(BRZENZINSKI, 1996).

Neste quadro, Bissolli da Silva (2006) destaca a inexistência de

campo de trabalho para o técnico em educação, que era um profissional

destinado a funções não-docentes, já que o Parecer 251/62 não faz nenhuma

referência ao campo de trabalho deste profissional. A autora acrescenta que

“os legisladores [...] fixaram um currículo mínimo visando à formação de um

profissional ao qual se referem vagamente e sem considerar a existência ou

não de um campo de trabalho que o demandasse” (p.17).

Para os licenciados em Pedagogia a situação também estava

complicada devido à invasão de seu mercado de trabalho por outros

profissionais, tais como médicos, dentistas, engenheiros, advogados,

psicólogos, cientistas sociais e também por professores primários. A questão

do campo de trabalho do pedagogo, na época, apontava para a falta de

regulamentação da profissão de pedagogo, e a imprecisão do currículo já

evidenciava problemas no curso de Pedagogia.

O outro Parecer, o 252/69, foi elaborado durante o governo militar,

no contexto da aprovação da Reforma Universitária. Privilegiou o modelo

tecnicista de formação de professores e de especialistas, proporcionando a

fragmentação do trabalho pedagógico e contribuindo para dividir a formação do

pedagogo em habilitações técnicas na graduação.

Instituiu que o curso de Pedagogia formasse profissionais para o

setor da educação: de um lado, professores para o ensino Normal e, de outro,

os especialistas – orientador educacional, supervisor escolar, administrador

escolar, inspetor escolar e planejador educacional. Também garantia o direito

do licenciado em Pedagogia exercer o magistério nas séries iniciais. Interessa

a este estudo realçar que o trabalho do professor nestas séries se daria dentro

da habilitação para o ensino Normal, sem se prever, contudo, uma habilitação

específica para se lecionar nas séries iniciais (BISSOLLI DA SILVA, 2006;

BRZEZINSKI, 1996).

Segundo Bissolli da Silva (2006) este instrumento legal fixava um

currículo mínimo e a duração para o curso de Pedagogia. A duração mínima

26

era 2.200 horas para a Licenciatura Plena e 1.100 horas para a Licenciatura

Curta, a serem desenvolvidas de 3 a 7 e de 1,5 a 4 anos, respectivamente. Os

cursos de curta duração formavam profissionais que podiam atuar apenas em

escolas de 1º grau; já os profissionais que cursavam duração plena adquiriam

o direito de atuar em escolas de 1º e 2º graus, podendo, portanto, lecionar no

curso Normal as disciplinas correspondentes tanto à parte comum do curso

quanto às suas habilitações específicas.

A formação do pedagogo seria organizada em duas partes: uma

comum (base comum), composta pelas matérias básicas para a formação de

qualquer profissional da área da educação: Sociologia Geral, Sociologia da

Educação, Psicologia da Educação, História da Educação, Filosofia da

Educação e Didática; e outra diversificada, em função da habilitação específica

escolhida pelo aluno. Cabe lembrar que o Parecer fixou, para cada habilitação,

as matérias que compunham a parte diversificada.

Esta parte do currículo de Pedagogia ficava composta pelas

seguintes especialidades pedagógicas: o magistério dos cursos Normais e as

atividades de orientação, administração, supervisão e inspeção, sendo prevista

para essas áreas as seguintes habilitações: ensino das disciplinas e atividades

práticas dos cursos normais, orientação educacional, administração escolar,

supervisão escolar e inspeção escolar. Estas três últimas poderiam ser

oferecidas tanto em regime de curta duração como de duração plena

(BISSOLLI DA SILVA, 2006). Vale lembrar que, além dessas habilitações já

previstas legalmente, o Parecer faculta ao Conselho Federal de Educação e às

IES criar novas habilitações.

O curso de Pedagogia, apesar de conter as mais diversas

habilitações, passou a diplomar seus egressos como “licenciados”. Brzenzinki

(1996) comenta que, embora já existisse a intenção de Valnir Chagas em

“assegurar a docência como base comum de formação do especialista” (p.75),

na prática, em “diversas instituições de ensino superior, a habilitação

magistério deixou de constituir prioridade no curso de pedagogia, sendo

substituída pelas habilitações de especialistas.” (p.76). Deste modo, a

formação do professor passou a ocupar um segundo plano em muitas destas

instituições.

27

Na verdade, com a reformulação da estrutura curricular e a

criação das habilitações técnicas a serem realizadas na graduação, os

legisladores pretendiam atender às necessidades do mercado de trabalho e,

ainda, melhor caracterizar o destino profissional dos egressos do curso de

Pedagogia. No entanto, esta decisão, baseada na adoção do modelo tecnicista

de formação de professores e especialistas, resultou na fragmentação da

formação do pedagogo, aprofundando, ainda mais, a indefinição da identidade

deste curso.

A partir desta formulação, o pedagogo, além de ficar com sua

formação comprometida pela forma fragmentada da organização curricular

proposta, ainda continuou a encontrar problemas quanto a sua colocação

profissional, ainda que este Parecer seja identificado como o mais fértil em

suas potencialidades quanto à definição do mercado de trabalho (BISSOLLI DA

SILVA, 2006).

Os vários pontos vulneráreis do Parecer 252/69 são mostrados

por Bissolli da Silva (2006). Ela afirma que as aspirações excessivamente

ambiciosas dos legisladores sob a alegação das exigências do mercado de

trabalho provocaram a antecipação de inúmeras especializações do curso de

Pedagogia, o que trouxe como consequência o "inchaço" do currículo

provocando duas ordens de dificuldades. Primeira, a de atender às

necessidades de formação de docentes e não-docentes; segunda, a de dar as

condições de oferta de grande número de disciplinas para as várias

habilitações e as múltiplas práticas de ensino. O agravamento da situação se

deu, continua a autora, quando, além da formação do professor para o ensino

Normal e dos especialistas, o Parecer assegurou ainda o direito ao magistério

nas séries iniciais do 1º grau, dentro da habilitação para o ensino Normal.

"Adicionar às demais incumbências do curso de pedagogia a formação,

também, desses profissionais, é superestimar as possibilidades do curso e/ou

desconhecer as necessidades de formação desses docentes", afirma Bissolli

da Silva (2006, p. 45). Conclui a autora que um "inchaço" de tais proporções

leva inevitavelmente à desqualificação de qualquer curso.

Como se pode perceber, o caminho percorrido de estruturação

curricular e regulamentação do curso de Pedagogia pelos diferentes Pareceres

revela a continuidade da indefinição quanto à especificidade dos estudos

28

pedagógicos e à identidade do curso, e, por conseguinte, à identidade do

profissional ali formado.

Enfim, o período em foco caracteriza-se pela preocupação em

atender às necessidades do mercado de trabalho e pela adoção da dimensão

técnica do trabalho do pedagogo. A partir daí, este profissional passou a ser

formado como técnico da educação e identificado, depois, como pedagogo

generalista. Neste período o curso teve sua identidade questionada (BISSOLLI

DA SILVA, 2002). Cabe ressaltar que estes aspectos legais nortearam a

organização do curso de Pedagogia por muito tempo, sendo descartados por

ocasião da aprovação da nova LDB – Lei Federal nº. 9.394/96.

De 1973 a 1978 ocorreu o segundo período estabelecido por

Bissolli da Silva (2006), denominado período das indicações, em que o curso

de Pedagogia teve sua identidade projetada. Este período representou o tempo

de encaminhamentos do conselheiro Valnir Chagas ao Conselho Federal de

Educação (CFE), com o objetivo de reestruturação dos cursos superiores de

formação de professores. Suas indicações são assim resumidas por Brzezinski

(1996, p. 124):

A formação do especialista deveria ser feita em qualquer licenciatura;

A formação do especialista seria feita no professor;

A formação do especialista seria precedida da exigência de experiência de magistério e poderia ser feita em habilitação polivalente, na qual se englobam a administração escolar, a orientação educacional e a supervisão escolar;

A formação do especialista poderia ser feita, também, em nível de pós-graduação;

A formação do professor para as séries iniciais de escolarização seria feita em nível superior;

As habilitações fundamentais (orientação educacional, supervisão escolar, inspeção escolar e planejamento educacional) preconizadas pela Lei 5.692/1971 deveriam permanecer;

As habilitações poderiam se diversificar, ampliando-se o leque de ofertas pelas instituições e instâncias formadoras, em consonância à Lei 5.692/1971;

A médio e longo prazos deveria ser extinta a habilitação magistério.

É fundamental esclarecer que, naquele período, as questões

referentes ao destino do curso de pedagogia encontravam-se inseridas num

conjunto de preocupações mais amplas a respeito da revisão dos cursos

superiores de formação do educador. Anteriormente a estas indicações, era

29

função do curso de Pedagogia formar docentes para o magistério do 2º grau

(antiga escola Normal) e formar especialistas não docentes para a escola de 1º

e 2º graus. Entretanto, essa organização apresentava pontos críticos que

justificavam as reformulações sugeridas nas indicações. Brzezinski (1996)

relata que tais propostas tinham origem,

[...] por um lado, na indefinição dos conteúdos básicos do currículo,

portanto, na falta de especificidade deste curso, dado ser a

pedagogia campo de aplicação de outras ciências e, por outro, no

reducionismo simplista da tendência legal (a partir de 1969) de

“treinar” pedagogos para desempenharem algumas tarefas não-

docentes na escola. (p.82)

Bissolli da Silva (2006) assevera que as indicações do relator

remetiam a mudanças no curso de Pedagogia quando informavam que a

formação do especialista em educação seria “[...] feita como habilitações

acrescentadas a cursos de licenciatura, permitindo-se ainda, em caráter

transitório, que seja feita como curso aberto a docentes que tenham preparo de

2º. Grau” (p.59). Com isto, o relator pretendia concretizar a ideia de formar o

especialista no professor.

A expropriação do curso de Pedagogia fica evidente na medida

em que estes textos legais deixam de tratar da formação de docentes para

disciplinas pedagógicas do 2º grau, visto que a formação de professores para

as séries iniciais da escolarização passa a se alocar, como regra geral, no

curso superior e não através do curso de Pedagogia, como o conselheiro havia

tratado anteriormente, nem, tampouco, na escola Normal.

O fato é que esse conjunto de documentos legais nem sequer

fazia alusão ao curso de Pedagogia, o que não passou despercebido pelos

educadores, os quais reconheceram a arbitrariedade das indicações do poder

instituído. Essas mudanças propostas pretendiam, à medida que fossem

reforçadas as licenciaturas, a extinção do curso de Pedagogia e a

descaracterização da profissão do pedagogo, que, progressivamente, deixaria

de existir. Brzezinski (1996) conclui que o curso de Pedagogia, de forma

gradativa, seria reduzido a uma licenciatura para formar o professor das séries

iniciais.

30

Os prenúncios de extinção do curso de Pedagogia estimularam os

educadores a se organizarem, em nível nacional, para fazer frente àqueles que

detinham o poder de legislar a respeito da formação de educadores no Brasil,

principalmente ao Conselho Federal de Educação. As indicações sugeridas

contribuíram para desencadear a busca por redefinição dos cursos de

formação de educadores no país a partir de propostas fomentadas no interior

dos movimentos. Brzezinski (1996) comenta que a procura da identidade do

curso de Pedagogia estaria sendo realizada pelos integrantes destes

movimentos.

Nesta trilha, entre 1979 e 1998 aconteceu o terceiro período da

história do curso de Pedagogia, que Bissolli da Silva (2006) denomina de

período das propostas, pois o curso teve sua identidade em discussão. Essa

época marcou também a organização de professores e universitários na

perspectiva de intervir na reformulação dos cursos de formação em nível

nacional. Os registros das discussões deste início de mobilização constituíram-

se em importantes documentos a respeito do curso de Pedagogia e da

identidade do pedagogo.

Ainda em 1978, o I Seminário de Educação Brasileira, realizado

na Universidade de Campinas, oportunizou a reflexão sobre os estudos

pedagógicos em nível superior. Em 1980 aconteceu a I Conferência Brasileira

de Educação, em São Paulo, abrindo debate nacional sobre o curso de

Pedagogia e os cursos de licenciatura. Neste evento foi criado o Comitê

Nacional Pró-formação do Educador.

O diálogo ocorreu em torno da defesa da superação das

habilitações e especializações no espaço escolar e da valorização do

pedagogo. Segundo Libâneo e Pimenta (1999), este movimento se destacou

pela intensidade das discussões e pelo êxito na mobilização dos educadores,

entretanto obteve-se pouco efeito prático, já que não foi possível chegar a um

resultado satisfatório para os problemas da formação dos educadores.

Em 1983, após vários debates e muitos conflitos entre

representantes do governo e lideranças de professores e estudantes, bem

como embates dentro dos grupos dos próprios participantes, surgiu no

Encontro Nacional para a Reformulação dos Cursos de Preparação de

Recursos Humanos para a Educação, realizado em Belo Horizonte, uma

31

proposta de reformulação dos cursos de Pedagogia e licenciatura. Embora

tenha havido dissensos em relação às propostas, foram reafirmados alguns

princípios para a reformulação dos cursos: docência como a base da formação

dos profissionais da educação; teoria e prática como núcleo integrador da

formação do educador e como par indissociável; articulação com o contexto

social brasileiro. Neste evento, portanto, consolidou-se a docência como a base

da identidade profissional de todo educador e recomendou-se a questão da

“base comum nacional” dos cursos de formação de educadores (BISSOLLI DA

SILVA, 2006). Tal base se insurgia contra a formação do pedagogo apenas

como especialista sem que se formasse professor.

Para Bissolli da Silva (2006, p.94) o estudo dos movimentos

organizados pelos profissionais e estudantes a respeito da formação do

educador possibilita a observação de dois importantes princípios:

[...] a) todo professor deve ser considerado educador e, portanto, sua

formação deve sempre supor uma base de estudos de forma a

conduzir a compreensão da problemática educacional brasileira. b) o

de que a docência deve se constituir na base da formação

profissional de todo educador.

De acordo com Brzezinski (1996), o curso de Pedagogia, nesse

período, firmou-se em todo o país formando, prioritariamente, o pedagogo para

atuar na escola como professor e não como especialista, adotando, portanto, a

docência como base da identidade de formação deste profissional.

Neste contexto, em 1996, foi aprovada a Lei de Diretrizes e Bases

da Educação Nacional (LDBEN) n° 9394/96. Sua promulgação intensificou as

discussões e polêmicas não só em relação à identidade do pedagogo, como

também às incertezas quanto à própria sobrevivência do curso de Pedagogia.

Para Bissolli da Silva (2006), esta Lei causou grandes embaraços, porque

passou a prever, em seu artigo 62, que a formação de professores para o

magistério na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental

fosse realizada nos cursos denominados Normal Superior, no interior dos

Institutos Superiores de Educação. Além disso, o artigo 64 abriu a possibilidade

para que a formação dos especialistas ocorresse também em nível de pós-

graduação. Ambas as formações eram tradicionalmente oferecidas pelo curso

de Pedagogia.

32

Assim, a nova LDB, nos artigos 62 e 63, trouxe a figura dos

Institutos Superiores de Educação para, junto com as universidades, serem

responsáveis pela formação de professores para atuar na educação básica. Ao

lado disto, no art. 64, expropriou, ainda mais, a função do curso de Pedagogia,

ao estabelecer duas alternativas voltadas à formação para profissionais de

educação e para a administração, planejamento, inspeção, supervisão e

orientação educacional: a graduação em Pedagogia ou o nível de pós-

graduação, retirando do pedagogo a exclusividade de sua função (BISSOLLI

DA SILVA, 2006).

Franco (2003) denuncia que esta legislação se traduz em mais

uma tentativa ou armadilha que, passo a passo, pretendia efetivar a extinção

dos cursos de Pedagogia no sentido de demonstrar a sua inutilidade. A

investida contra o curso de Pedagogia teve, segundo a autora, o sentido

ideológico de desvalorizar o único espaço nas universidades, no nível de

graduação, que se propõe, junto com as demais áreas do conhecimento,

quando ocupadas do estudo da educação, a fazer, intencionalmente, a análise

crítica da educação praticada na sociedade.

A situação se agravou mais ainda mais quando, em 1999, o

Parecer CES/CNE nº. 970/99 expropriava a função de magistério do curso de

Pedagogia, ao retirar dele a possibilidade de formar docentes para os Anos

Iniciais do Ensino Fundamental e para a Educação Infantil. As decisões

expressas nesse documento resultaram em manifestações contrárias, entre

elas a discordância demonstrada pelo conselheiro Jacques Velloso, o pedido

de revisão pela Comissão de Especialistas de Ensino do Curso de Pedagogia e

intensas mostras de indignação por parte das universidades e demais

entidades acadêmicas ligadas ao assunto.

No entanto, o governo reagiu autoritariamente a tais

manifestações por meio do Decreto Presidencial nº 3.276, de 6 de dezembro

de 1999, que determinava que a formação destinada ao magistério na

Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental far-se-ia

exclusivamente em cursos Normais Superiores. Com este Decreto, segundo

Bissolli da Silva (2006), inaugura-se o período dos decretos, por representar a

tomada de decisões no âmbito do poder executivo, no qual o curso de

Pedagogia teve sua identidade outorgada. Os documentos que constituem este

33

período abordam a formação do professor para a educação básica e

prescrevem limites às funções do curso de Pedagogia.

Contudo, a comunidade acadêmica e o Fórum em Defesa da

Formação de Professores3 ofereceram resistência ao ato executivo nº 3.276.

Isto resultou no Decreto-Presidencial nº 3.554/2000 que substituiu o termo

exclusivamente por preferencialmente, restituindo ao curso de Pedagogia sua

função enquanto licenciatura.

Enfim, a história e a análise dos documentos legais, realizadas

pela professora Bissolli da Silvia (2006) a respeito do curso de Pedagogia no

Brasil e expostas até aqui permitem compreender que

[...] não há como negar a fragilidade que reveste o curso de

pedagogia e, também, a pedagogia enquanto campo de

conhecimento. Não se pode negar, também, que esse campo vem se

afirmando no que se refere ao reconhecimento de sua especificidade

e que avanços significativos vêm sendo empreendidos quanto à

definição de seu estatuto teórico. (p.89)

Segundo Sheibe (2007), o período a partir da LDBEN 9394/1996

foi marcado por embates e discussões sobre a formação e atuação do

pedagogo. Em 2002 foram apresentadas pelo CNE, na Resolução CNE/CP 1

de 18.02.2002, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de

Professores, as quais propõe que as instituições formadoras organizem seus

projetos pedagógicos considerando as competências necessárias para o

exercício da docência.

Neste contexto, o Conselho Nacional de Educação, no uso de

suas atribuições, formula e publica no Diário Oficial da União, em 16 de maio

de 2006, a Resolução CNE/CP nº. 1 de maio de 2006, a qual Institui Diretrizes

Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia, licenciatura.

3 O Fórum em Defesa da Formação de Professores foi composto, inicialmente, por 11

entidades: ANDES/SN, ANFOPE, ANPEd, ANPAE, ABT, CEDES, Comissão de Especialistas de Ensino de Pedagogia, Fórum de Diretores das Faculdades/Centros de Educação das Universidades Públicas Brasileiras, Fórum Paulista de Educação Infantil, Fórum Paulista de Pedagogia e Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública.

34

2.2 As Diretrizes Curriculares para o Curso de Pedagogia

O documento CNE/CP n. 1/20064 baliza um novo momento,

assinalando para novos debates no campo da formação do profissional da

educação no curso de Pedagogia, no sentido de assegurar a docência como

função precípua deste curso e a superação da dicotomia entre licenciatura e

bacharelado no seu interior. O debate, portanto, se faz em torno da identidade

do curso e da sua finalidade profissionalizante, agora instituída como

licenciatura, visto que as habilitações são extintas.

De acordo com estudos de Aguiar et al. (2006), a Resolução n.

1/2006 fixa que o curso de Pedagogia é exclusivamente uma licenciatura com a

formação em docência; consolida-se, portanto, a docência como base para a

formação do pedagogo. Esta Resolução, em seu art. 4º define que

O curso de Licenciatura em Pedagogia destina-se à formação de

professores para exercer funções de magistério na Educação Infantil

e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino

Médio, na modalidade Normal, de Educação Profissional na área de

serviços e apoio escolar e em outras áreas nas quais sejam previstos

conhecimentos pedagógicos.

Assim sendo, o curso de Pedagogia, a partir desta legislação, fica

limitado a formar docentes, e a Pedagogia fica subsumida à docência. Porém,

ainda que a docência seja a função principal da formação do curso de

Pedagogia, esta Resolução abre amplo horizonte para a formação e atuação

profissional dos pedagogos. O egresso do curso de Pedagogia deverá estar

apto a:

a) atuar com ética e compromisso com vistas à construção de uma

sociedade justa, equânime, igualitária;

b) compreender, cuidar e educar crianças de zero a cinco anos, de

forma a contribuir, para o seu desenvolvimento nas dimensões, entre

outras, física, psicológica, intelectual e social;

c) fortalecer o desenvolvimento e as aprendizagens de crianças do

Ensino Fundamental, assim como daqueles que não tiveram

oportunidade de escolarização na idade própria;

d) trabalhar, em espaços escolares e não-escolares, na promoção da

4 CNE. Resolução CNE/CP 1/2006. Diário Oficial da União, Brasília, 16 de maio de 2006,

Seção 1, p. 11.

35

aprendizagem de sujeitos em diferentes fases do desenvolvimento

humano, em diversos níveis e modalidades do processo educativo;

e) reconhecer e respeitar as manifestações e necessidades físicas,

cognitivas, emocionais, afetivas dos educandos nas suas relações

individuais e coletivas;

f) ensinar Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História,

Geografia, Artes, Educação Física, de forma interdisciplinar e

adequada às diferentes fases do desenvolvimento humano;

g) relacionar as linguagens dos meios de comunicação à educação,

nos processos didático-pedagógicos, demonstrando domínio das

tecnologias de informação e comunicação adequadas ao

desenvolvimento de aprendizagens significativas;

h) promover e facilitar relações de cooperação entre a instituição

educativa, a família e a comunidade;

i) identificar problemas socioculturais e educacionais com postura

investigativa, integrativa e propositiva em face de realidades

complexas, com vistas a contribuir para superação de exclusões

sociais, étnico-raciais, econômicas, culturais, religiosas, políticas e

outras;

j) demonstrar consciência da diversidade, respeitando as diferenças

de natureza ambiental-ecológica, étnico-racial, de gêneros, faixas

geracionais, classes sociais, religiões, necessidades especiais,

escolhas sexuais, entre outras;

l) desenvolver trabalho em equipe, estabelecendo diálogo entre a

área educacional e as demais áreas do conhecimento;

m) participar da gestão das instituições contribuindo para elaboração,

implementação, coordenação, acompanhamento e avaliação do

projeto pedagógico;

n) participar da gestão das instituições planejando, executando,

acompanhando e avaliando projetos e programas educacionais, em

ambientes escolares e não-escolares;

o) realizar pesquisas que proporcionem conhecimentos, entre outros:

sobre alunos e alunas e a realidade sociocultural em que estes

desenvolvem suas experiências não escolares; sobre processos de

ensinar e de aprender, em diferentes meios ambiental-ecológicos;

sobre propostas curriculares; e sobre organização do trabalho

educativo e práticas pedagógicas;

p) utilizar, com propriedade, instrumentos próprios para construção de

conhecimentos pedagógicos e científicos;

q) estudar, aplicar criticamente as diretrizes curriculares e outras

determinações legais que lhe caiba implantar, executar, avaliar e

encaminhar o resultado de sua avaliação às instâncias competentes,

e

r) compreender a escola como organização complexa que tem a

função de promover a educação para e na cidadania.

É necessário ter bem claro que as Diretrizes Curriculares

Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia, licenciatura, trazem

elementos propostos pela ANFOPE – Associação Nacional pela Formação do

Educador e por entidades apoiadoras, que têm defendido a tese de que a base

36

da identidade dos profissionais da educação deve ser a docência e que, por

conseguinte, a base de formação do pedagogo é a docência, sendo o

pedagogo o profissional da educação que seria antes de tudo um professor. A

ANFOPE (2005) considera, todavia, que a concepção da docência como base

da formação dos profissionais da educação não restringe o curso de Pedagogia

a uma licenciatura; permite sim, a superação da fragmentação entre a

formação do licenciado e do bacharel, não dicotomizando a formação do

professor da formação dos especialistas.

Libâneo e Pimenta polemizam com essa posição, argumentando

que as DCNs firmam ao curso de Pedagogia valor igual ao de um curso de

licenciatura. Estes autores sustentam que o campo teórico e epistemológico da

Pedagogia não se limita à docência, ainda que a inclua.

Para Libâneo (2006), o que se percebe nessas Diretrizes, no

parágrafo 1º do artigo 2º, é que a docência é compreendida como ação

educativa e processo pedagógico metódico e intencional, construído em

relações sociais, étnico-raciais e produtivas, as quais influenciam conceitos e

objetivos da Pedagogia. Neste sentido, a docência não é vista só do ponto de

vista do processo ensino-aprendizagem que constitui o trabalho educativo na

relação professor-aluno na sala de aula, mas também da gestão da escola e de

atividades que ultrapassam a escola, como fica evidenciado no parágrafo do

art. 4º deste documento:

Parágrafo único. As atividades docentes também compreendem

participação na organização e gestão de sistemas e instituições de

ensino, englobando:

I - planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e

avaliação de tarefas próprias do setor da Educação;

II - planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e

avaliação de projetos e experiências educativas não-escolares;

III - produção e difusão do conhecimento científico-tecnológico do

campo educacional, em contextos escolares e não-escolares.

Isto permite compreender que o conceito de docência proposto

nas DCNs não está sendo relacionado unicamente com ser professor. A

perspectiva de docência ali explicitada ultrapassa o ato de ensinar e extrapola

os limites da sala de aula. Constata-se que as Diretrizes ampliam o conceito de

docência atribuindo ao curso de Pedagogia a tarefa de formação do professor,

do gestor e do pesquisador.

37

Este documento dá ênfase a um currículo embasado nos

conhecimentos da prática, tendo como foco principal a formação de professor,

e, depois, a formação do pedagogo. O fato é que a organização atual do curso

de Pedagogia tem como conceitos mobilizadores a docência, a gestão e o

conhecimento, sendo a docência a base da formação, porém, entendida numa

nova concepção de docência, a da docência alargada.

Embora não seja foco do presente estudo discutir profundamente

a ideia da docência em sentido alargado e suas interpretações, interessa dizer

que, neste caso, o problema, segundo Libâneo (2006a), é que quando à

docência são adicionadas atividades de gestão e de produção de

conhecimento é possível gerar uma “imprecisão conceitual” que pode levar a

inúmeras interpretações do que precisamente deverá ser a base do curso de

Pedagogia. Para este autor,

A imprecisão conceitual que salta aos olhos é o entendimento de que

quaisquer atividades profissionais realizadas no campo da Educação,

ligadas à escola ou extra-escolares, são atividades docentes. Ou

seja, o planejador da educação, o especialista em avaliação, o

animador cultural, o pesquisador, o editor de livros, todos eles

estariam nessas atividades exercendo docência (são docentes). Em

suma, é patente a confusão que o texto provoca ao não diferenciar

campos científicos, setores profissionais, áreas de atuação, ou seja,

uma mínima divisão técnica do trabalho necessária em qualquer

âmbito científico ou profissional sem o que a prática profissional pode

tornar-se inconsistente e sem qualidade. (LIBÂNEO, 2006a, p. 222).

Na visão deste estudioso seria impossível um só curso dar conta

de uma formação de qualidade com um perfil tão alargado, que prevê a

formação de um profissional para atuar nas diversas áreas da docência, na

gestão e na produção de conhecimento. Sua posição a este respeito é a de

que

[...] para se atingir níveis mínimos desejáveis de qualidade da

formação, ou se forma um bom professor, ou se forma um bom gestor

ou coordenador pedagógico ou um bom pesquisador ou um bom

profissional para outra atividade. Não é possível formar todos esses

profissionais num só curso, nem essa solução é aceitável

epistemologicamente falando. A se manter um só currículo, com o

mesmo número de horas, teremos um arremedo de formação

profissional, uma formação aligeirada, dentro de um curso inchado.

(LIBÂNEO, 2002, p. 84)

38

Como se vê, apesar da adesão pelo CNE às propostas da

ANFOPE, o tema da Pedagogia e da formação de pedagogos, que vem sendo

objeto de debate desde os finais dos anos setenta, não cessa na aprovação

dessas Diretrizes, mas permanece em pauta, haja vista a existência de

educadores que se posicionam diferentemente da tese da ANFOPE. Isto ficou

claro quando intelectuais, em torno de 120 educadores, entre eles José Carlos

Libâneo, Selma Garrido Pimenta e Maria Amélia Santoro Franco, assinaram o

Manifesto dos Educadores Brasileiros (2005). Esta proposta compreende o

curso como bacharelado, no qual deve ser garantida a pesquisa, conforme se

explicita a seguir.

O curso de Pedagogia constitui-se num curso de graduação cuja

especificidade é a análise crítica e contextualizada da educação e do

ensino enquanto práxis social, formando o bacharel pedagogo, com

vistas ao aprofundamento na teoria pedagógica, na pesquisa

educacional e no exercício de atividades pedagógicas em diversos

campos da sociedade5.

Neste entendimento, o curso seria ofertado pelas

Faculdades/Centros/Departamentos de Educação com duração de quatro anos

e carga horária de 3200 horas. O interesse é, também, entre outras atribuições

do curso, formar o gestor. Desse modo, o pedagogo atuaria

[...] na formulação e gestão de políticas educacionais; avaliação e

formulação de currículos e de políticas curriculares; organização e

gestão de sistemas e de unidades escolares; coordenação,

planejamento, execução e avaliação de programas e projetos

educacionais, para diferentes faixas etárias (criança, jovens, adultos,

terceira idade); coordenação pedagógica e assessoria didática a

professores e alunos em situações de ensino e aprendizagem;

coordenação de atividades de estágios, produção e difusão de

conhecimento científico e tecnológico do campo educacional; formulação

e coordenação de programas e processos de formação contínua e

desenvolvimento profissional de professores em ambientes escolares e

não-escolares; produção e otimização de projetos destinados à

educação a distância, programas televisivos, vídeos educativos;

desenvolvimento cultural e artístico para várias faixas etárias. (Manifesto

dos Educadores Brasileiros, 2005)

5Manifesto dos Educadores Brasileiros. São Paulo, 2005. Disponível em

www.ced.ufsc.br/.../ManifestoEducadoresBrasileiros2005, acesso em 21/09/2010.

39

A formação docente se daria em cursos específicos de

licenciaturas, podendo ser oferecida no mesmo espaço do curso de Pedagogia.

Por meio deste documento, os educadores em pauta buscaram

tornar clara a oposição à proposta de Diretrizes para o curso de Pedagogia

lançada pelo CNE apresentando sua proposta. Especificamente, mostraram

que não concordam que o curso de Pedagogia fique restrito a formar docentes

e a Pedagogia fique subsumida à docência, pois entendem que a base

curricular do curso de Pedagogia precisa estar assentada na ação pedagógica

e não na ação docente. Constatam que as DCNs consolidam equivalência do

curso de Pedagogia a um curso de licenciatura para formação de professores

de Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental, institucionalizando

o título de pedagogo ao profissional formado neste curso.

É importante lembrar que Pimenta (1996), Libâneo (1998) e

Franco (2008) apresentam propostas em suas obras contrapondo-se a

qualquer redução da formação do pedagogo à docência, pois acreditam que

restringir a ação pedagógica à docência é causar um reducionismo conceitual,

um estreitamento do conceito de Pedagogia. Seus estudos compreendem o

curso de Pedagogia como campo científico e investigativo que se constitui,

primeiramente, como uma ciência e, portanto, como um curso que pode

proporcionar ao pedagogo, enquanto profissional da educação, conhecimentos

mais vastos que não se limitem aos docentes.

A exposição destas idéias corrobora a assertiva de que, com a

aprovação das Diretrizes, não se extinguem as polêmicas que acompanham as

discussões a respeito do curso de Pedagogia. Este fato, por um lado, evidencia

o caráter inconcluso e histórico que reveste a formação do pedagogo no Brasil

e, por outro, que existem muitos caminhos a serem percorridos.

Franco (2003, 2008) conclui, a este respeito, observando que as

reflexões em torno desta temática persistem centralizadas nos

posicionamentos: qual é a base identitária do pedagogo? Ser ou não ser a

docência sua base identitária? O curso de Pedagogia deve formar o pedagogo,

propriamente dito, ou o professor? Pedagogo e Professor são conceitos

sinônimos? As funções desempenhadas pelo professor são as mesmas

destinadas ao pedagogo? Historicamente, pedagogo e professor foram

profissões idênticas? Formar alguém para ser professor requer as mesmas

40

capacitações, as mesmas condições curriculares que formar um pedagogo?

Todo professor é pedagogo? Todo pedagogo é professor?

Por conseguinte, o debate ainda não se finalizou por se tratar de

assunto diretamente ligado a vários grupos de interesse. Dadas as questões e

controvertidas interpretações quanto à natureza da Pedagogia, do curso de

Pedagogia, bem como do campo de atuação do pedagogo, há que se prever

que estes embates continuarão como centro das atenções por muito tempo.

Não é pretensão deste estudo abarcar com profundidade todos

estes questionamentos, mas se analisa, no próximo tópico, a questão da

identidade da Pedagogia como ciência da educação, na intenção de buscar

compreender as bases desta ciência e a especificidade de seu objeto. Assim

se estará adentrando por caminhos que discutem, mais especificamente, se a

base identitária desta formação deverá ser a docência ou os estudos

pedagógicos.

2.3 A Questão da Identidade da Pedagogia

Dada a complexidade que envolve a Pedagogia e os cursos de

Pedagogia, esta unidade apresenta as ideias de autores que trazem ao debate

educacional a questão da identidade da Pedagogia. O que se pretende é

contextualizar essas discussões e mostrar sua natureza. Bissolli da Silva

(2006) faz menção da importância dos estudos desenvolvidos por Saviani

(1976), Mazotti (1996), Pimenta (1996, 1997) e Libâneo (1996, 1997) para

esses debates.

Aponta que os estudos de Saviani (1976) mostram que, ao longo

do tempo, a Pedagogia foi conceituada como ciência da educação, arte de

educar, técnica de educar, filosofia da educação, história da educação, teologia

da educação e teoria da educação; ele, porém, a define como “teoria geral da

educação”. Já na década de 90, Mazotti, Libâneo e Pimenta, inteirados das

discussões ocorridas especialmente na França, Espanha e Portugal, passaram

a fundamentar uma concepção de Pedagogia enquanto “ciência da prática

educativa” (BISSOLLI DA SILVA, 2006).

41

No entendimento de Libâneo (1998), a Pedagogia abrange um

campo de conhecimento que possui objeto, problemáticas e métodos próprios

de investigação, o que a caracteriza como “ciência da educação”. Ele considera

que

[...] a pedagogia ocupa-se, de fato, dos processos educativos,

métodos, maneiras de ensinar, mas antes disso ela tem um

significado bem mais amplo, bem mais globalizado. Ela é um campo

de conhecimentos sobre a problemática educativa na sua totalidade e

historicidade e, ao mesmo tempo, uma diretriz orientadora da ação

educativa. (LIBÂNEO, 1998, p.22)

A Pedagogia, portanto, tem um olhar sobre o fenômeno educativo

que lhe é peculiar, visto que seu objeto de estudo é a prática educativa, que se

dá não somente no âmbito escolar, mas compreende os processos formativos

que ocorrem numa variedade de instituições e atividades nas quais os

indivíduos estão envolvidos socialmente (LIBÂNEO, 1998, p. 90). Por

conseguinte, o autor define a Pedagogia como “teoria e prática da educação” e

aponta a prática educativa como objeto de estudo da ciência pedagógica que

estuda o fenômeno educativo na sua globalidade. Assim, ratifica que

[...] a base de um curso de Pedagogia não pode ser a docência. A base de um curso de Pedagogia é o estudo do fenômeno educativo, em sua complexidade, em sua amplitude. Então, podemos dizer: todo trabalho docente é trabalho pedagógico, mas nem todo trabalho pedagógico é trabalho docente. A docência é uma modalidade de atividade pedagógica, de modo que o fundamento, o suporte, a base, da docência é a formação pedagógica, não o inverso. Ou seja, a abrangência da Pedagogia é maior do que a da docência. Um professor é um pedagogo, mas nem todo pedagogo precisa ser professor. (2006a, p. 220)

Pimenta (1996) defende a Pedagogia como ciência da prática da

educação que tem a prática como o seu ponto de partida e de chegada, sendo

que o sujeito do conhecimento e o objeto do conhecimento se imbricam e se

constituem mutuamente. A educadora parte do entendimento de que a

educação enquanto prática social é um objeto inconcluso, histórico, cujo

movimento deve ser captado na sua dialeticidade. Daí que a pedagogia é a

ciência que se propõe captar o real pedagógico no seu movimento, na sua

práxis. Tem caráter articulador entre os vários discursos das ciências da

educação na medida em que assume a tarefa de significá-los no confronto com

42

a prática da educação e frente aos problemas colocados pela prática social da

educação.

A autora ora em pauta deixa claro que o psicólogo ao estudar o

fenômeno educativo não faz Pedagogia, pois tem seu foco nos conceitos e

métodos de sua ciência e não no pedagógico. Daí o caráter específico da

Pedagogia, o qual a distingue das outras ciências da educação. Assim sendo,

defende que a Pedagogia é um campo de conhecimento específico da práxis

educativa que ocorre na sociedade, diferente das demais ciências que não têm

a educação como objeto específico de análise, mas que a ela podem se voltar.

Assim sendo, explicita e defende, em suas produções sobre o tema, que a

Pedagogia é uma ciência da educação e que uma das modalidades de

inserção profissional do pedagogo é a docência. Propugna, assim, que a

Pedagogia é a base da formação e da atuação profissional do professor, e não

o contrário, como propõe a posição da ANFOPE.

Nessa mesma esteira de pensamento, Franco (2003, 2008), ao

fazer uma reflexão sobre o espaço científico da Pedagogia, no âmbito

epistemológico, aponta a Pedagogia como a necessária e possível ciência da

educação. Mostra, contudo, que historicamente a Pedagogia foi perdendo,

passo a passo, as possibilidades de se fazer científica, principalmente, por

adotar os pressupostos da ciência moderna positivista, na configuração

técnico-científica, que, inadequados à sua epistemologia, provocaram sua

perda de “sentido”, de “identidade”, da “razão de ser”. A autora explicita que,

À medida que a pedagogia foi sendo vista como organizadora do

fazer docente, dos manuais, dos planos articulados, feitos com uma

intencionalidade não explícita, ela foi se distanciando de sua

identidade epistemológica, qual seja, de ser a articuladora de um

projeto de sociedade. (p.71)

O que se percebe é que, gradativamente, a Pedagogia foi

abdicando de ser a ciência da educação e permitindo que outras ciências que

não priorizavam o pedagógico se constituíssem mediadoras interpretativas da

práxis. As diversas perspectivas de ciência, colonizando a Pedagogia,

estiveram teorizando uma variedade de abordagens conceituais que resultaram

num emaranhado epistemológico no que diz respeito à construção do

conhecimento pedagógico.

43

O fato é que a descaracterização da Pedagogia como

conhecimento científico veio a colaborar na consolidação de práticas

educativas fortemente conservadoras, dissociadas do contexto sócio-histórico,

tanto de seus atores como do próprio conhecimento que transmite. Este

processo resultou num abismo entre a teoria e a prática e, ainda, na escassez

de teorias pedagógicas sólidas que pudessem dar suporte à concretização de

ações transformadoras no âmbito da prática escolar.

A autora defende que, portanto, é necessário reconduzir a

Pedagogia como ciência da prática da educação. Todavia, esclarece que isto

requer que a Pedagogia passe da racionalidade técnica à racionalidade prática,

reflexiva, formativa e emancipatória, propondo-se formar sujeitos na e pela

práxis e, neste sentido, necessariamente, que se ofereça como um instrumento

político que se posicione a favor da humanização do homem, com vistas a sua

emancipação e libertação. Ela será, então, “uma ciência que não apenas pensa

e teoriza as questões educativas, mas que organiza ações estruturais, que

produzam novas condições de exercício pedagógico, compatíveis com a

expectativa de emancipação da sociedade” (FRANCO, 2008, p.73).

A partir do entendimento de que a educação é um fenômeno

global e plural que permeia toda sociedade humana, a autora delimita como

objeto de estudo da ciência pedagógica a práxis educativa. Cabe, portanto, à

Pedagogia, enquanto ciência da educação, a compreensão e transformação

dessa práxis, devendo esta última ser considerada em uma dimensão de

intencionalidade e reflexividade da prática.

E, mais, neste estudo, Franco reconhece a atividade teórico-

prática da ciência pedagógica sobre o seu objeto, que é a práxis educativa,

como práxis pedagógica. Dito de outra maneira, o exercício do fazer científico

da Pedagogia sobre a prática educativa deve ser entendido como práxis

pedagógica, evidenciando que a Pedagogia, como ciência da educação, deve

ter por objetivo o esclarecimento reflexivo e transformador da práxis educativa.

Explica que a práxis deve ser vista como instrumento de

transformação coletiva, que pressupõe ter como sujeito tanto os pesquisadores

da ciência da educação, portanto, os pedagogos, quanto os professores,

entendidos aqui como aqueles formalmente constituídos no exercício da prática

44

educativa ou aqueles que assumem este papel. A práxis funcionará, deste

modo, como um instrumento de produção de autonomia.

Isto implica a organização de pressupostos metodológicos que,

por meio da análise dialética do real, permitam produzir sujeitos que falam, a

fim de adentrar os significados que estes construíram e estão construindo em

seu fazer social. Assim, a Pedagogia como ciência da educação deve recorrer

a um aporte teórico-metodológico que proporcione condições de

reinterpretação desse real, para que as práticas de tais sujeitos possam ir se

transformando e se adequando às novas condições que vão sendo

construídas, com vistas a uma ação cada vez mais emancipatória.

É preciso também ter clareza de que não caberá a esta ciência

buscar novas teorias para “consertar” a prática; pretende-se, isto sim, ações

científicas sobre a práxis, a partir da análise crítica dos fundamentos e

resultados que envolvem a prática educativa do professor, visando à

reconstrução de novas ações. Assim sendo, é função da Pedagogia, enquanto

ciência, lançando mão do olhar pedagógico e dos saberes “explicativos” de

outras ciências, “organizar fundamentos, métodos e ações para retirar da

práxis a teoria implícita e cientificá-la, a posteriori, juntamente com seus

protagonistas, dentro de uma ação crítica, pautada na responsabilidade social

de uma prática pedagógica” (FRANCO, 2008, p.87).

De maneira bem explícita,

Apostar na pedagogia como ciência da educação significa pressupor

a necessária intercomunicação entre pesquisa e transformação, entre

teoria e prática, entre consciência e intencionalidade. Significa

acreditar que todo processo de investigação deverá se transformar

em processo de aprendizagem que criará à prática novas

possibilidades de superar dificuldades, de se recriar constantemente,

de se auto avaliar e assim modificar e aprofundar seu próprio objeto

de estudo. (FRANCO, 2008, p.78)

Nesta perspectiva, caberá ao pedagogo nortear o trabalho de

capacitar professores para irem se fazendo pesquisadores da própria prática,

incentivando o desenvolvimento de uma postura reflexiva a partir da

investigação dessa mesma prática de modo a equipá-los para refletirem sobre

suas concepções teóricas, identificando as intencionalidades, a concepção de

45

homem, de sociedade, de fins que embasam suas ações cotidianas, tornando-

se, então, simultaneamente professores e pesquisadores.

As reflexões desta autora acerca da Pedagogia contribuem para a

compreensão de que a formação do pedagogo deve considerar o aspecto

crítico-reflexivo, que compreenda a complexidade inerente ao objeto de estudo

em questão, qual seja, a educação, sabendo que esta se configura, se

estabelece, se estrutura em diversas dimensões. Portanto, a análise da ciência

pedagógica deverá abranger os mais diversos ambientes de nossa sociedade

onde a prática pedagógica se realizar.

Por conseguinte, este profissional deve ter claro que apesar de a

escola ser o espaço privilegiado da ação educativa, esta tarefa ultrapassa os

muros escolares, visto que outros espaços produzem influências formativas

sobre os sujeitos, produzindo saberes, propondo comportamentos e valores,

estimulando ações e pensamentos. Ainda mais, deve entender que nem

sempre estes processos têm intencionalidades explícitas, funcionando, muitas

vezes, como instrumentos de desumanização, de opressão e de alienação.

Embora pedagogizar a sociedade seja tarefa de toda a sociedade,

caberá especificamente ao pedagogo, profissional formado na dimensão da

compreensão e transformação da práxis educativa, referenciar e mediar um

processo de aprendizagem no sentido de estender a prática pedagógica a toda

a prática educativa, nas diferentes instâncias educacionais6 da sociedade.

Compete a ele, também, redirecionar a ação educacional transformando-a em

possibilidades educativas, visando à formação integral de sujeitos, numa

dimensão ética, para realmente educar e formar cidadãos. Assim, o campo de

trabalho do pedagogo, educador por excelência, será a escola, as salas de

aulas e as diversas instâncias educativas sociais.

A autora em pauta deixa claro que para se introduzir nessas

diferentes atuações é fundamental que a Pedagogia seja concebida como

elemento de identidade para a prática docente e, não, a prática docente como

sendo elemento identificador da Pedagogia. Neste sentido, quanto à questão já

6 Por exemplo: a mídia, as atividades de recreação e lazer, as diferentes instituições culturais,

os cursos e atividades via internet, entre as múltiplas formas de trânsito da educação na

sociedade contemporânea.

46

mencionada neste texto: Ser ou não ser a docência a base identitária do

pedagogo? propugna que a base identitária do curso de Pedagogia seja a

investigação dos estudos pedagógicos que fundamentam as práxis educativas

de uma sociedade;

Se, no entanto, afirmarmos que a base identitária da formação do

pedagogo será a docência, estaremos, inadequadamente, invertendo

a lógica desta epistemologia, pois estaremos partindo, para identificar

um campo conceitual, não de sua matriz conceitual, mas de uma de

suas decorrentes práticas, no caso, a docência. (p.115)

Logo, segundo a mesma autora, é a docência que se faz pela

Pedagogia e, não, a Pedagogia que se faz pela docência, isto é, “a docência

deve se fundamentar pela pedagogia, não sendo correto afirmar que a

pedagogia se faz pela docência.” (p.117) Deste modo, ela inverte a

epistemologia que tem fundamentado a maioria dos discursos sobre a

Pedagogia.

Em seus comentários no fórum de Educação, ocorrido em Belo

Horizonte em 2003, por meio do texto “A pedagogia para além dos confrontos”,

ela explica que há discrepâncias entre a formação do pedagogo, enquanto um

sujeito que promove, organiza e pesquisa a formação docente, e a formação

profissional para ser docente, ainda que isso não signifique valorizar a

formação do pedagogo enquanto cientista educacional em detrimento do

pedagogo docente ou vice-versa, nem tampouco desconsiderar a possibilidade

de concomitância desses papéis.

Defende que se faz necessário compreender que a formação

docente não pode se dar de maneira superficial, mas deve estar fortemente

ligada a uma intencionalidade, a uma política, a uma epistemologia, a

pesquisas aprofundadas dos conhecimentos pedagógicos. A formação do

pedagogo docente é considerada pela autora tarefa árdua e complexa que

certamente exigirá um curso todo, com pelo menos 3.200 horas e quatro anos

de integralização, em que diferentes espaços e atividades pedagógicas se

cruzem num movimento de contínua e permanente autoformação. Assim,

defende a criação de Faculdade de Pedagogia que seja constituída de

diferentes cursos: Docência; Pedagogo stricto-sensu, Administração, Gestão

escolar e outros.

47

O fato é que não se pode perder de vista que,

epistemologicamente, existem diferenças qualitativas entre a formação de

pedagogo e a de professor que não podem ser pensadas em termos de

acréscimos de conteúdos sobre uma formação básica, o que poderia resultar

numa formação pautada na abordagem superficial de conceitos basilares a

estes campos. Assim, a autora vai deixando claro que a Pedagogia, enquanto

ciência, possui saberes e especificidades que definem um território de

conhecimentos e metodologias que são distintos dos exigidos ao profissional

docente.

Para Franco (2008), a Pedagogia, como a ciência que organiza

ações, reflexões e pesquisas, deve ter em vista a

qualificação da formação de docentes como um projeto político emancipatório;

organização do campo de conhecimento sobre a educação, na ótica do pedagógico;

articulação científica da teoria educacional com a prática educativa;

transformação dos espaços potenciais educacionais em espaços educativos/formadores;

qualificação do exercício da prática educativa na intencionalidade de diminuir práticas alienantes, injustas e excludentes, encaminhando a sociedade para processos humanizatórios, formativos e emancipatórios. (p.117)

Não se poderia deixar de acrescentar que Franco (2008) reitera o

posicionamento explicitado no documento Manifesto dos Educadores (2005), já

citado anteriormente, a respeito do curso de Pedagogia:

Para nós, portanto, o curso de Pedagogia constitui-se no único curso

de graduação onde se realiza a análise crítica e contextualizada da

educação e do ensino enquanto práxis social, formando o pedagogo,

com formação teórica, científica, ética e técnica com vistas ao

aprofundamento na teoria pedagógica, na pesquisa educacional e no

exercício de atividades pedagógicas específicas. (p.149)

Por certo, o que se pretendeu com a discussão realizada até aqui

foi buscar esclarecer aspectos do debate que se tem travado na área

educacional a respeito da problemática da Pedagogia, suas divergências e

controvérsias. Considera-se que procurar compreender, aprofundar e

interpretar a complexidade que envolve a formação do pedagogo poderá ser

um início de caminho cuja direção seja o encontro de respostas mais

48

adequadas a muitas inquietações e desafios que permeiam o ambiente de

formação e atuação deste profissional.

2.4 Um Estudo sobre os Cursos de Pedagogia no Brasil

O objetivo deste tópico é apontar alguns elementos evidenciados

em pesquisa7 desenvolvida recentemente, em 2008, a pedido da Fundação

Victor Civita (FVC), intitulada “Formação de Professores para o Ensino

Fundamental: instituições formadoras e seus currículos” e coordenada pelas

professoras Bernadete A. Gatti e Marina Muniz Rossa Nunes.

Ao recorrer a tal estudo, não se pretende abarcá-lo em

profundidade, mas, simplesmente, contextualizar a formação do pedagogo em

nível nacional a fim de identificar alguns aspectos que possam auxiliar na

análise dos cursos de Pedagogia do estado de Mato Grosso.

A referida pesquisa é considerada relevante porque analisou a

matriz curricular e a ementa de 71 cursos de Pedagogia situados nas cinco

regiões do país, abrangendo os anos 2001, 2004 e 2006. Pretende-se

estabelecer uma possível articulação entre o que revela o estudo sobre o curso

de Pedagogia no Brasil e o que as instituições de Mato Grosso estão propondo.

O estudo em foco buscou analisar, entre outros, o que se propõe

como disciplinas formadoras nas Instituições de Ensino Superior responsáveis

por cursos presenciais de Pedagogia que respondem pela formação de

professores do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental e da Educação Infantil.

Relacionado a esta questão, convém destacar o fato de que o baixo

desempenho obtido pelos estudantes do Ensino Fundamental nas avaliações

nacionais e internacionais tem suscitado importantes debates a respeito dos

elementos que envolvem a melhoria da qualidade da Educação Básica no

Brasil, e, entre estes, situa-se a formação do docente8. Considerando, ainda,

7 Fonte: Jornal da Educação. Pesquisa revela que cursos de Pedagogia não ensinam a pratica

para a sala de aula. Disponível em http://www.jornaldaeducacao.inf.br, acesso em julho/2010. Revista Nova Escola. Formação Inicial. A origem do sucesso (e do fracasso) escolar. Edição 216. 2008. Disponível em http://revistaescola.abril.com.br. Acesso em julho/2010. 8 Os dados do último Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) de Pedagogia,

de 2008, apontam para um número preocupante: 160 cursos (14% do total) apresentaram desempenho insuficiente, e apenas 3% foram considerados excelentes (BIBIANO, Bianca.

49

que a formação do professor para ensinar na Educação Básica deve se

realizar, predominantemente, em nível superior, conforme indicam as

legislações atuais9, vários estudos têm buscado examinar como vem sendo

implementada a atual formação deste docente.

Os resultados do estudo encomendado pela FGV assinalaram a

existência de um descompasso entre o que as faculdades de Pedagogia

oferecem aos futuros professores e a realidade encontrada por eles nas

escolas. As Instituições de Ensino Superior (IES) não oferecem aos futuros

docentes os elementos necessários para se dar uma boa aula, e estes

profissionais saem da faculdade sem saber o quê e como ensinar. Esses

cursos restringem-se a preparar teoricamente o acadêmico por meio de

conceitos de Filosofia, Sociologia, Psicologia e outros campos, dedicando para

este fim 40% das disciplinas.

Há um destaque enorme nas questões estruturais e históricas da

Educação, com pouco espaço para os conteúdos específicos das disciplinas e

para os aspectos didáticos do trabalho docente. O problema é que o curso não

consegue articular teoria e prática, pois, no momento de dar ao aluno uma

visão prática do que é ensinar, utilizando as outras disciplinas que são para

este fim, não se mostra capaz de aproximar os futuros professores da realidade

do ensino na sala de aula. Na opinião das pesquisadoras, as universidades

parecem não se interessar pela realidade das escolas, principalmente as

públicas, nem entendem ser necessário que seus próprios alunos se preparem

para atuar nesse espaço.

Quanto à análise dos currículos, ficou evidenciado que o conteúdo

da educação básica (Alfabetização, Português, Matemática, História,

Geografia, Ciências, Educação Física) é pouco explorado nos cursos de

Pedagogia. É apenas abordado, superficialmente, nas disciplinas de

metodologia e práticas de ensino. Ademais, as grades curriculares, dada sua

constituição fragmentária, inviabilizam a aproximação entre um curso e outro, o

que atrapalha a avaliação real do que é comum na proposta de ensino das

diversas instituições. Só nas grades curriculares dos 71 cursos escolhidos para

Hora de profissionalizar: Repensar as graduações, estruturar planos de carreira, elevar salários continuam sendo desafios. NOVA ESCOLA: Abril. Ano 26, n. 239, jan./fev., 2011). 9 LDBEN 9496/96 e Diretrizes Curriculares Nacionais (2006)

50

o estudo, há 3.107 disciplinas, o que dá uma ideia da diversidade entre os

cursos e da fragmentação do conhecimento.

Isso vem ratificar a necessidade, para o presente estudo, de se

dedicar a olhar atentamente para a formação que tem sido oferecida pelos

cursos de Pedagogia do estado de Mato Grosso, no que diz respeito à

Matemática, visto que se interessa em compreender a formação do pedagogo

e suas implicações para o ensino desta área do conhecimento. É nesta

intencionalidade que é apresentada a próxima seção.

2.5 Os Cursos de Pedagogia e a Formação Matemática do Professor

Esta unidade traz reflexões sobre a realidade dos currículos de

cinco cursos de Licenciatura Plena em Pedagogia, presenciais, organizados

por Instituições de Ensino Superior e responsáveis pela formação inicial do

pedagogo no estado de Mato Grosso, quais sejam: UFMT/Cuiabá;

UFMT/Rondonópolis; UNEMAT/Cáceres; UNIC e UNIVAG, ambas

estabelecidas em Cuiabá - MT.

Aqui são apresentadas algumas características gerais destes

cursos, mas em função das finalidades desta investigação concentra-se o olhar

nas matrizes curriculares dos mesmos e nas ementas de cursos referentes às

disciplinas da área de Matemática. A preocupação principal está, sobretudo,

em compreender de que forma estas instituições têm organizado a formação

matemática dos futuros professores dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental.

Assim, identificando os caminhos percorridos para a formação

inicial do pedagogo em Mato Grosso, especificamente, no que se refere à

formação para o ensino da Matemática destaca-se o momento do curso em

que esta disciplina é trabalhada, sua ementa e a carga horária destinada à

formação do professor pedagogo para atuar no ensino da mesma.

Com a concretização da reforma das políticas educacionais, na

segunda metade da década de 1990, por meio da promulgação da LDBEN

9496/96, em seu art. 53 Inciso II, ficou atribuída às universidades a autonomia

de fixar os currículos dos seus cursos e programas desde que observadas as

Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos, – neste caso, o curso de

51

Licenciatura Plena em Pedagogia – desenhadas pelo MEC/SESu, que foram

elaboradas com o objetivo de nortear as Instituições de Ensino Superior – IES

para que fossem capazes de proporcionar aos futuros educadores uma

formação profissional de acordo com as atuais exigências da sociedade.

A Resolução CNE/CP nº 01, no Art. 6 Incisos I, II e III, prevê que a

organização curricular seja estruturada de modo a contemplar três núcleos:

núcleo de estudos básicos; núcleo de aprofundamento e diversificação de

estudos; núcleo de estudos integradores. A decodificação e utilização de

códigos de diferentes linguagens utilizadas por crianças, além do trabalho

didático com conteúdos, pertinentes aos primeiros anos de escolarização e

relativos à Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História e Geografia,

Artes, Educação Física fazem parte do núcleo de estudos básicos.

É esclarecedor dizer que a presente unidade mostra um

mapeamento das propostas curriculares destes cursos, não tendo a pretensão

de considerar todas as facetas do currículo, mas sim, as disciplinas, carga

horária e conteúdos voltados à formação matemática do pedagogo

considerando suas ementas. Neste percurso, busca-se traçar algumas

considerações sobre as possíveis implicações destes na prática educativa dos

professores dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, no que diz respeito ao

ensino da Matemática.

2.5.1 O curso de Pedagogia da UFMT/IE10 - Campus de Cuiabá - MT

O Projeto Político Pedagógico do Curso de Pedagogia da

UFMT/IE relata que a história do curso de Pedagogia em Mato Grosso

coincide, em boa extensão, com a história da Universidade Federal de Mato

Grosso. Na sua criação, em 1966, conforme Lei Estadual 2.629 de 26/07/66, o

curso caracterizava-se como licenciatura plena e oferecia a habilitação para

Administração Escolar de 1º e 2º Graus e Magistério das Disciplinas

Pedagógicas do Ensino de 2º Grau.

10

A UFMT foi criada pela Lei 5.647, de 10 de dezembro de 1970.

52

Atualmente, para atender às mudanças ocorridas no cenário

educacional brasileiro, principalmente como necessidade de adequação às

normas instituídas pelas Diretrizes Curriculares Nacionais – DCN – conforme

Resolução CNE/CP 01/2006, articulada à LDBEN de 1996 e com outros textos

legais que regulamentam a reforma da Educação Superior, o curso em tela

assume a docência como a base da formação do pedagogo e a concebe para

além da sala de aula entendendo-a como prática pedagógica ampliada.

Assim, o curso de Licenciatura Plena em Pedagogia: Magistério das Séries

Iniciais do Ensino Fundamental oferecido pela Universidade Federal de Mato

Grosso – Campus de Cuiabá se propõe

formar docentes que tenham compreensão das complexas relações

entre a educação e a sociedade, que assumam a docência como uma

atividade articulada ao trabalho pedagógico da instituição educativa,

com vistas à adoção de políticas de inclusão social, de

democratização, enfim, na transformação da realidade social. (PPP,

p.24)

É importante esclarecer que o referido curso encontra-se

organizado na modalidade de ensino presencial, em regime

anual/seriado/modular, com carga horária de 3.545 horas e é ofertado nos

períodos matutino e vespertino, devendo ser integralizado no mínimo em 04

(quatro) anos e no máximo em 07 (sete) anos. Em 2009, foi autorizado a

oferecer 90 vagas/ano (45 por turno).

Seus princípios educativos levam em consideração as mudanças

que se veem no processo da dinâmica movimentação social, produzida pelo

avanço tecnológico e pelas novas frentes de trabalho para o pedagogo, como

educação infantil, educação hospitalar, educação no campo, educação

indígena, educação para jovens e adultos, educação em empresas públicas e

privadas. Entende-se que é importante priorizar e assegurar, no curso de

Pedagogia, uma sólida formação dos profissionais que atuarão, em especial,

no magistério da Educação Infantil e dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental.

Assim, o Projeto Político Pedagógico do referido curso indica que o pedagogo

formado no mesmo

[...] seja preparado para atuar no campo teórico-investigativo da

educação e no do trabalho pedagógico, de forma a contribuir com a

humanização das pessoas. Além da docência nos segmentos que a

53

ele compete, o profissional deverá estar preparado para atuar

também em outros campos educativos da sociedade contemporânea

que demandem o trabalho pedagógico, em especial na gestão de

ambientes escolares, integrando a escola a outras instituições

educacionais. Deverá ainda fazer uso das intervenções educativas

dos meios de comunicação, dos movimentos sociais e das

instituições sócio-culturais. (PPP p.20)

Com esta posição, tendo-se em vista a formação do profissional

que seja preparado para atender a estas exigências, organiza-se a formação

do professor que ensinará a Matemática dentro do Núcleo de Estudos

Específicos da Formação Profissional, que tem por objetivo possibilitar o

aprofundamento nos estudos sobre a prática docente na Educação Infantil e

nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, tanto no âmbito da faixa etária

regular para as crianças que chegam às instituições educativas quanto na

educação de jovens e adultos.

Assim sendo, neste curso a formação matemática dos futuros

professores é organizada por meio das disciplinas Fundamentos e Metodologia

do Ensino da Matemática I e Fundamentos e Metodologia do Ensino da

Matemática II, que são ministradas na segunda e terceira séries/anos

respectivamente, com carga horária de 75 horas cada uma, totalizando 150

horas, o que representa 4,23% da carga horária total do curso. Destas, 120

horas são dedicadas ao conhecimento teórico dos conteúdos e 30 horas às

atividades práticas.

A ementa da disciplina Fundamentos e Metodologia do Ensino da

Matemática I indica que nesta deverão ser abordados os conteúdos

relacionados aos Fundamentos da Educação Matemática; à gênese e à

historicidade da ciência matemática; Educação Matemática: tendências e

abordagens; Concepções de ensino na Matemática; O processo de construção

do pensamento matemático; O ensino da Matemática no Brasil; A Educação

Matemática na Educação Infantil; Resolução de Problemas; Tratamento da

Informação; Proposição teórico-metodológica no ensino da Matemática na

Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental, com vistas à

construção dos conceitos: de número, sistema de numeração decimal, as

operações fundamentais de adição, subtração; Potenciação de números

naturais. Tem em Brasil (2000); Becker (1993); Ifrah (1992); Kamii (1988);

54

Miorim (1998) seus teóricos basilares e em Brizuela (2006); Caraça (1998);

Danyluk (1998) seus interlocutores complementares.

A ementa da disciplina Fundamentos e Metodologia do Ensino da

Matemática II prevê o estudo dos conteúdos relacionados à Matemática do

cotidiano e matemática escolar; Etnomatemática; O lúdico nas aulas de

Matemática; Proposição teórico-metodológica no ensino da matemática na

Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental, com vistas à

construção dos conceitos: multiplicação e divisão; Números racionais: frações e

números decimais: ideia, representação, operações fundamentais,

porcentagem, potenciação, radiciação. Elege Centurión (1994); Coll &

Teberosky (2002); Cuberes (1997); D´Ambrósio (2001) como autores

principais para direcionar os estudos e D´Ambrósio (1993); Brougère (1998);

Nunes (2005) para leituras complementares.

Além dos componentes curriculares obrigatórios, os alunos de

Pedagogia deverão integralizar, no decorrer do curso, uma carga horária

mínima de 180 horas de disciplinas optativas, dentre as ofertadas anualmente,

pelo curso e de acordo com a livre escolha do estudante. São oferecidas 28

disciplinas optativas, totalizando 1695 horas. Dentro desta totalidade, a

formação matemática é contemplada pelo oferecimento da disciplina Jogos

Matemáticos (60 horas), o que equivale a 3,54% do total de horas destinadas

às disciplinas optativas.

A proposta da disciplina optativa Jogos Matemáticos, segundo a

sua ementa, é trabalhar com conteúdos relacionados ao desenvolvimento de

jogos que favoreçam a criatividade na elaboração de estratégias de resolução

e na busca de soluções, visto que as atividades de jogos permitem ao

professor analisar os seguintes aspectos: compreensão, possibilidade de

descrição, estratégia utilizada, desenvolvimento de estudos e atividades

envolvendo jogos para a aquisição de noções matemáticas, construção e

análise de situações-problema tendo por objetivo o ensino e o aprendizado de

conceitos matemáticos por alunos na Educação Infantil e Anos Inicias do

Ensino Fundamental. Tem como aporte teórico Alves (2001); Aranão (2002);

Bicudo (1985); Dante (2003); Deguire (1997); Emerique (2003); Lins (1997);

Onuchic (2003); Onuchic & Botta (1998); Ponte (2003); Schneider & Saunders

(1997); Santos (2001); Tahan (1987).

55

2.5.2 O curso de Pedagogia da UFMT/CUR11 - Campus de Rondonópolis- MT

A Universidade Federal de Mato Grosso - Campus Universitário

de Rondonópolis localiza-se no referido município, localizado a 220 quilômetros

da capital Cuiabá. O curso de Pedagogia deste campus foi criado pela

Resolução CD nº. 012/81, de 27 de janeiro de 1981, autorizado pela Resolução

CONSEPE nº. 008/81, em 10 de março de 1981 e reconhecido pela

Portaria/MEC nº. 146, de 21 de fevereiro de 1986, publicada no D.O.U. em 24

de fevereiro de 1986. O primeiro vestibular deste curso, que na época oferecia

habilitações em Magistério das Matérias Pedagógicas do Segundo Grau e

Supervisão Escolar, foi realizado em março de 1981.

Este curso tem se dedicado, prioritariamente, à formação do

pedagogo professor, do pedagogo docente, tendo, portanto, uma opção

histórica pela docência. No período de 1984 a 2002 formou 846 pedagogos.

A fim de conciliar as exigências das Diretrizes Nacionais para a

Formação de Professores da Educação Básica e as recomendações da atual

LDBEN, o curso de Pedagogia deste campus passou por nova reestruturação

curricular no ano de 2005 que, legalizada por meio da Resolução CONSEPE

nº. 110, de 21 de dezembro de 2005, criou a habilitação Magistério para a

Educação Infantil, a ser ofertada concomitantemente com a habilitação

Magistério para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Essa Resolução

passou a ser implementada a partir de 2006, definindo que a função deste

curso seria formar profissionais para a docência na Educação Infantil e nos

Anos Iniciais do Ensino Fundamental.

O curso de Pedagogia passou a ter 2.865 horas, em regime

seriado, oferecendo 46 vagas anuais nos turnos matutino e vespertino em anos

alternados, definindo a integralização curricular de no mínimo quatro anos e no

máximo 7 anos. Nesta organização do curso, a formação matemática do

professor é oferecida no terceiro ano, junto à formação para o ensino de

Ciências, por meio da disciplina Matemática e Ciências Naturais e suas

Tecnologias: Conteúdo e Metodologia, com carga horária de 128 horas, o que

11

Até 1975, os cursos de graduação eram oferecidos apenas em Cuiabá, capital do estado. A partir de

então, a UFMT expandiu suas ações pelo interior. Neste contexto, a criação do CUR – Centro

Universitário de Rondonópolis se deu em 1980.

56

equivale a 4,46% do total da carga horária do curso. De acordo com a ementa

da disciplina, seu objetivo no que se refere à Matemática é

[...] fomentar a reflexão dos futuros professores sobre o ensino e

aprendizagem da Matemática nas classes de educação infantil e dos

anos iniciais do ensino fundamental de modo a contribuir para que

eles desenvolvam perspectivas de ação no contexto de sala de aula

flexíveis bem fundamentadas teórica e metodologicamente.

(Resolução CONSEPE 110/2005, p. 185)

Nesta proposta a atividade de ensino é concebida como pesquisa

permanente, que, considerando a relação aluno/ professor/ conhecimento, tem

como ponto de partida

a investigação sobre as dificuldades de aprendizagem dos conteúdos

específicos apresentadas pelos alunos e suas relações com o ensino

que vem sendo oferecido e que tem por trás de si certas concepções

sobre a matemática, sua aprendizagem e seu papel na formação do

indivíduo. (Resolução CONSEPE 110/2005, p.185)

Com isso deseja-se que o futuro professor seja capaz de

compreender as abordagens metodológicas e identificar as implicações que

cada uma delas traz para o planejamento de ensino e as concepções de

professor, aluno e conhecimento que ela introduz, assim como as possíveis

interrelações entre os conhecimentos matemáticos e os de outros

componentes curriculares como as Ciências Naturais.

As reflexões conduzidas ao longo do desenvolvimento desta

disciplina abordam conteúdos relacionados à formação para o ensino da

Matemática e para o ensino de Ciências. Em se tratando da formação para

ensino de Matemática, propõe-se estudar:

1- Caracterização dos condicionantes do ensino de Matemática: a) a

natureza do conhecimento lógico-matemático; b) aprender e ensinar

Matemática: significado e sentido; 2- A Matemática na educação

infantil: a exploração do lúdico e o desenvolvimento de habilidades; 3-

Estudo dos conteúdos usuais dos anos iniciais do Ensino

Fundamental; 4- Análise de propostas metodológicas e de seus

fundamentos teóricos; 5- Planejamento de atividades de ensino:

elaboração e avaliação; 6- Material didático: análise, produção e

avaliação. (p. 185-186)

57

O plano de curso da disciplina em pauta para o ano letivo de 2010

dispõe que ao final do curso o aluno seja capaz de:

- Analisar e discutir problemas relativos aos condicionantes do ensino

de Matemática e as tendências do ensino na Matemática e de

Ciências naturais;

- Compreender o sentido e significado do processo de Letramento e

Alfabetização matemática – Educação Infantil e Ensino Fundamental;

- Planejar atividades de ensino (atividades didático-metodológicas)

envolvendo operações básicas, medidas, comprimento;

- Descrever e analisar conceitos e procedimentos matemáticos e de

Ciências naturais e os modos pelos quais se relacionam entre si;

- Analisar e avaliar propostas metodológicas e seus fundamentos

teóricos/metodológicos;

- Organizar atividades práticas sobre: números, operações, medidas

e geometria;

- Planejar atividades de ensino, considerando:

a) A perspectiva epistemológica de Piaget (empirismo, racionalismo e

relativismo piagetiano);

b) As fontes do conhecimento e suas interações – perspectiva

Piagetiana e Vygosktiana);

c) O conhecimento físico e jogos em grupo. (Plano de Curso, 2010,

p.2)

Para subsidiar essas reflexões, Duarte (1997); Faraco (1997);

Imenes (1996); Kamii (1996, 1991,1998); Piaget (1988); (1987); Smole (2004)

são aportes teóricos basilares.

Com a instituição das Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso

de Graduação em Pedagogia, Licenciatura, no ano de 2006, a exigência passa

a ser uma nova reestruturação do curso. Diante da nova legislação, o

Departamento de Educação deste campus entendeu que o professor

necessário para atender à realidade social em que está inserido este curso é o

pedagogo docente que atue na Educação Básica, especificamente, na

Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, tendo,

simultaneamente, conhecimentos da docência nessas modalidades, da gestão

em seus diferentes âmbitos, e da pesquisa. Ele deve ser também entendido

como um profissional da educação que possa atuar com competência nos

cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, e em cursos de Educação

Profissional na área de serviços e apoio escolar, bem como em outras áreas

nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos.

58

A Resolução do CONSEPE nº 78, de 27 de abril de 2009, define a

nova reestruturação curricular. Em seu artigo 1º, amplia a carga horária para

3.220h e aumenta do número de vagas para 51 vagas anuais, sendo um ano

no período matutino e em outro no período vespertino (alternadamente);

Regime Acadêmico: seriado anual.

Já o Projeto Pedagógico do Curso (2009) aponta como objetivo

geral do Curso de Graduação em Pedagogia da UFMT/CUR é

garantir a formação de pedagogos, visando o desenvolvimento de

competências profissionais relativas aos cuidados, educação, ensino,

pesquisa e gestão formando, para tanto, o professor reflexivo,

autônomo, criativo, flexível e consciente da necessidade de continuar

a investir na sua formação. (p. 27)

A atual grade curricular do curso de Pedagogia com habilitação

para a docência na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino

Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, na

Educação Profissional, na área de serviços e apoio escolar e em outras áreas

nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos, organiza a formação

matemática dos alunos por meio da disciplina Matemática e suas Metodologias,

que deve ser cursada no terceiro ano do curso, com carga horária de 128

horas, o que representa 4% da carga horária total do curso. Esta disciplina será

ofertada a partir de 2011. Pode-se dizer que, em termos percentuais, houve

uma redução da carga horária voltada à formação matemática, visto que se

aumentou a carga horária total do curso e se mantiveram as 128 horas,

anteriormente estabelecidas.

Quanto aos conteúdos programados, a referida disciplina

contemplará para a formação matemática do futuro professor o Estudo dos

condicionantes do ensino de Matemática; A natureza do conhecimento lógico-

matemático; Aprender e ensinar Matemática: significado e sentido; A

Matemática na Educação Infantil: a exploração do lúdico e o desenvolvimento

de habilidades; Estudo dos conteúdos usuais dos Anos Iniciais do Ensino

fundamental; Análise de propostas metodológicas e de seus fundamentos

teóricos; Planejamento de atividades de ensino; Material didático: análise,

produção e avaliação.

59

2.5.3 O curso de Pedagogia da UNEMAT - Cáceres – MT

O curso de Pedagogia que ora se aborda desenvolve-se na

Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEMAT, Campus Universitário

Jane Vanini, no município de Cáceres - MT, cidade distante 205 quilômetros de

Cuiabá, capital do estado. Esta instituição, apesar de ter uma história recente,

tem conquistado espaços no ensino, na pesquisa e na extensão desde 1978,

oportunizando diferentes formações profissionais em várias regiões do Mato

Grosso.

O Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia oferecido pela

Unemat/Cáceres, em conformidade com a Resolução CNE/CP nº 01/06,

habilita seu egresso para exercer a docência na Educação Infantil, nos Anos

Iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade

Normal, na Educação Profissional na área de serviços e apoio escolar e em

outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos.

Visa a preparar profissionais para participarem na organização e

gestão de sistemas e instituições educacionais; promover a aquisição de

conhecimentos teórico-metodológicos necessários ao ensino nas áreas de

Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História, Geografia, Artes e

Educação Física, para a atuação no magistério na Educação Infantil e Anos

Iniciais do Ensino Fundamental; desenvolver a prática da pesquisa como forma

de construção de conhecimentos e promover a prática da interdisciplinaridade

no processo de formação docente, a fim de superar a fragmentação do

conhecimento, sendo a docência a base da formação oferecida.

No que se refere ao perfil do licenciado, entende que este deverá

estar apto inclusive a ensinar as disciplinas supracitadas, de forma

interdisciplinar e adequada às diferentes fases do desenvolvimento humano,

sendo compreendido como um profissional que tem a responsabilidade social

de educar nas dimensões intelectual, tecnológica e humana.

Para cumprir esta proposta o referido curso organiza-se em um

conjunto de disciplinas, seminários e atividades complementares que são

distribuídos em 3.325 horas/aula com a intencionalidade de proporcionar

embasamento teórico-prático na área de atuação profissional do futuro

licenciado em Pedagogia. Organiza-se em regime acadêmico semestral que

60

perfaz um total de oito semestres e estabelece que o aluno conclua o curso

em, no mínimo, quatro anos (oito semestres) e, no máximo, em sete anos

(quatorze semestres). Oferta, anualmente, 80 vagas, que são dispostas em

duas turmas de 40 (quarenta) alunos.

A formação do professor pedagogo para a Educação Matemática

é organizada por meio das disciplinas Conteúdos e Metodologia da Matemática

I e Conteúdos e Metodologia da Matemática II, que são oferecidas no 5º e 6º

semestres, respectivamente, com carga horária de 75 horas cada uma

totalizando portanto 150 horas dedicadas especificamente à formação do

professor para o ensino da Matemática, compreendendo que representa 4,47%

da carga horária total do curso.

A ementa da disciplina Conteúdos e Metodologia da Matemática I

recomenda o estudo: dos fundamentos epistemológicos, psicopedagógicos e

socioantropológicos da Educação Matemática; das tendências do ensino da

Matemática: resolução de problemas, modelagem matemática,

Etnomatemática, história da Matemática, o uso de computadores e jogos

matemáticos; das crenças e concepções do ensino da Matemática; e, ainda, a

produção do conhecimento matemático: reflexões teóricas.

Na disciplina Conteúdos e Metodologia da Matemática II é

previsto o estudo da Matemática: organização do currículo e a educação

matemática nas séries iniciais; a ação e o processo que a criança realiza na

construção e compreensão dos conceitos matemáticos; sistema de numeração,

operações fundamentais, números fracionários e decimais; noções de

porcentagem e geometria, sistemas de medidas e monetário; resolução de

problemas; elaboração de plano de aula. Para o trabalho nestas disciplinas são

eleitos os mesmos interlocutores quais sejam, D‟Ambrósio (2003); Imenes

(1994); Kamii (1992, 1996); Nunes (1997); Schliemann (1998); Brasil (1997).

2.5.4 O curso de Pedagogia da Universidade de Cuiabá – UNIC - Campus de Cuiabá – MT

O curso de Pedagogia da Faculdade de Educação – FAED/UNIC,

instituição privada, denomina-se Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia e

61

forma licenciados em Pedagogia. Autorizado por meio do Parecer nº. 312 de 13

de dezembro de 1995, teve seu reconhecimento em 29 de dezembro de 2004,

conforme Portaria nº 4.373. É um curso de organização semestral, com

duração de 08 semestres, oferece 60 vagas/ período e funciona nos períodos

matutino e vespertino, em regime de matrícula modular. Deve ser integralizado

no prazo mínimo de quatro anos (8 semestres) e no máximo de cinco anos ( 10

semestres), e sua a carga horária total é de 3.300 horas/aula (teóricas e

práticas).

Concebe o pedagogo como um profissional que exerce atividades

na sala de aula e para além dela e da própria escola. A partir do entendimento

de que as atividades educativas devem revestir-se de um caráter transformador

que contribua para a instrumentalização científica e cultural de um novo

profissional que seja capaz de responder aos desafios que a sociedade está a

exigir para a educação, entende que deve dialogar com a realidade inserindo-

se nela como sujeito criativo para formar o sujeito histórico apto a repensar a

sua formação e prática pedagógica por meio do movimento dialético ação-

reflexão-ação. Deste modo tem como objetivo principal

Formar o educador proporcionando conhecimentos aprofundados nas

áreas de ensino, compreendendo a docência na educação infantil e

nas séries iniciais do ensino fundamental, na organização de

sistemas, unidades, projetos e experiências educacionais escolares e

não-escolares na perspectiva do desenvolvimento de recursos

humanos em instituições empresariais e educacionais. (PPC

Pedagogia, 2010, p. 19)

Deste modo, o curso de Pedagogia da Universidade de Cuiabá

tem como perfil a formação do profissional habilitado a atuar no ensino, na

organização e gestão de sistemas, unidades e projetos educacionais e na

produção e difusão do conhecimento em diversas áreas da educação, com

visão histórica e crítica das ciências da educação, capaz de estabelecer

relações com outras áreas do conhecimento e compreender o mundo que o

cerca, instrumentalizado-o para a análise dos problemas educacionais.

O profissional egresso do referido curso pode atuar na docência

da Educação Infantil, na docência nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental e

na Educação de Jovens e Adultos e atuar na Gestão Educacional como gestor

62

na elaboração, implementação, coordenação, acompanhamento e avaliação de

programas e projetos educacionais em espaços escolares e não escolares.

Para cumprir esta proposta sua matriz curricular encontra-se

organizada em Aulas Teóricas (2.140h); Aulas Práticas (660h); Estágios

Supervisionados (320h); Estudos Independentes (60h); Atividades

Complementares – Estudo Dirigido – ED (120h), totalizando 3.300 horas.

A formação matemática do pedagogo neste curso é proposta por

meio das disciplinas Estudos da Matemática na Educação Infantil e Princípios

Teórico-Metodológicos do Ensino da Matemática, que são oferecidas no 5º e 6º

semestres, respectivamente, com carga horária de 80h cada uma. Esse total

de 160 horas permite afirmar que 4,84% de toda a carga horária do curso são

destinados à formação matemática deste profissional.

A ementa da disciplina Estudos da Matemática na Educação

Infantil aponta como conteúdos a serem abordados:

Concepções da Matemática. Análise reflexiva das etapas de

construção das noções matemáticas. O papel da Matemática na

construção da cidadania. Conteúdos, metodologia e avaliação no

ensino de Matemática na Educação Infantil. Planejamento, execução

de jogos e atividades pedagógicas que possibilitem o

desenvolvimento do pensamento lógico-matemático. Formação

matemática do professor. (PPC – Projeto Pedagógico do Curso de

Pedagogia, 2010, p. 44-45)

Carraher e Schliemann (2006); D‟Ambrósio (1989); Kamii (1990)

são os interlocutores fundamentais, enquanto Brasil (1998); Kamii e Devries

(1991); Panizza (2006); Piaget e Inhelder (2006); Smole (2007) são indicados

como bibliografia complementar.

Quanto à ementa da disciplina Princípios Teórico-Metodológicos

do Ensino da Matemática, evidencia que esta se propõe:

Analisar metodologicamente o ensino da matemática em nível de

ensino fundamental focando nos aspectos sociocultural, histórico e

pedagógico; discussão e análise da organização e dos procedimentos

do processo ensino/aprendizagem da matemática, focalizando,

sobretudo os objetivos de ensino, os conteúdos, os métodos e os

recursos de ensino e as formas e critérios de avaliação. (PPC –

Projeto Pedagógico do Curso de Pedagogia, 2010, p. 47)

Para subsidiar essas reflexões, Brasil (1997); Carvalho (2001);

D‟Ambrósio (2003) constituem a bibliografia básica; já Alves (2003); Dante

63

(1998); Monteiro e Pompeu Jr. (2001); Paes (2001) são indicados para

complementar as leituras.

2.5.5 O curso de Pedagogia da UNIVAG - Centro Universitário de Várzea Grande – MT

De acordo com Projeto Pedagógico da UNIVAG – Centro

Universitário de Várzea Grande, esta instituição educacional, de caráter

privado, teve seu nascimento em 1989. O curso de Pedagogia12 ofertado pela

instituição foi autorizado em dezembro de 1998 segundo Portaria 1.454 e

obteve seu reconhecimento em novembro de 2003, conforme Portaria 3.293.

Tendo natureza de licenciatura, habilita para Educação Infantil e Séries Iniciais

do Ensino Fundamental – Empresa. Funciona em regime seriado/semestral,

com a duração de 3 anos e meio, equivalentes a 7 semestres, e a carga horária

total de 3.260 horas, sendo oferecido nos turnos diurno (Modular) e noturno

(Regular). O número de vagas disponibilizadas é, periodicamente, revisado.

O curso de Pedagogia na UNIVAG toma o cotidiano escolar e sua

educação formal como foco importante, porém não como o único espaço

educativo, e a formação profissional do professor se constitui seu eixo

estrutural. Em se tratando do perfil do licenciado, o profissional ali formado será

docente; gestor de processos educativos escolares e não-escolares e

elaborador e divulgador do conhecimento científico e tecnológico do campo

educacional. Assim sendo, vê-se que se trata de um curso de licenciatura em

Pedagogia com um campo de atuação voltado para escolas, empresas e outros

espaços educativos.

A formação matemática do futuro professor é construída dentro

do núcleo de estudos Educação e Avanço do Conhecimento e da Tecnologia,

por meio da disciplina Teoria e Prática das Ciências Naturais - Matemática,

com a duração de 60 horas, o que representa 1,84% de toda a carga horária

que integra o curso. Segundo o Projeto Político do Curso de Pedagogia (2007),

esta disciplina deverá enfocar, de maneira geral e globalizada, a área de

12

Informações coletadas no Projeto Político do Curso Pedagogia (UNIVAG, 2007) e no site www.univag.edu.br

64

conhecimento das Ciências Naturais, envolvendo Ciências, Física, Química e

Biologia e sua função no currículo da Educação Básica. E, de maneira

específica e integrada, abordará a concepção histórica e filosófica da

Matemática enquanto ciência e atividade humana; a função da Matemática

formal; desmitificação dos conteúdos básicos das etapas iniciais da

escolarização, com vistas à construção dos conceitos de fração, das operações

com frações, do número fracionário e a notação decimal, das operações com

números decimais, unidades de medidas e noções topológicas e geométricas.

Deverá, também, fazer a abordagem dos estudos das

metodologias e recursos auxiliares do ensino, planejamento e avaliação de

atividades experimentais; relação com as demais áreas do conhecimento;

estudo crítico dos conteúdos e metodologias direcionados ao ensino de

Matemática nos Anos Iniciais e Educação Infantil. O trabalho desenvolvido

nesta disciplina tem como teóricos básicos, Centurion (2002); Duhalde (2000);

Machado (2000); Carvalho (2001), complementados por Danyluk (2002); Patilla

(1999, 1995); Ramos (2000).

O Plano de Ensino desta disciplina, elaborado em 24 de julho de

2009 e que vigorou para o semestre letivo 2009/2, compreende que o objetivo

geral da mesma é proporcionar aos acadêmicos as condições teóricas, práticas

e metodológicas para a construção de conhecimentos matemáticos aplicados

na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Aponta como

objetivo específico a implantação de um trabalho que permita ao aluno

conhecer os currículos e as diferentes propostas de ensino da Matemática nos

Anos Iniciais do Ensino Fundamental; conhecer conteúdos, métodos de ensino

e avaliação adequados às condições da realidade escolar e dos alunos;

conhecer e elaborar recursos e materiais didáticos para a aplicação na escola.

Este Plano de Ensino registra como referências teóricas basilares

Centurión (1994); Cuberes (1997); Duhalde e Cuberes (1998); Ledur (1989);

Machado (1993). Segundo indicação da ementa, devem-se trabalhar os

seguintes conteúdos:

A construção e significado da Matemática na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Seleção e estruturação dos blocos de conteúdos de Matemática para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental, tendo em vista aspectos fisiológicos e metodológicos da Matemática. A construção da Matemática através do lúdico e do

65

cotidiano dos grupos sociais. A importância das novas tecnologias aplicadas à Educação Matemática. Propostas alternativas para o ensino-aprendizagem da Matemática no Ensino Fundamental. Programas de ensino, materiais e procedimentos didáticos, bem como sistemáticas de avaliação do ensino-aprendizagem que contribuam para a redescoberta dos conhecimentos matemáticos. Blocos de conteúdos: Sistema de numeração, Conceitos das quatro operações fundamentais, Numeração decimal, Números fracionários, Porcentagem, Geometria, Sistema de medidas, Resolução de problemas. (Plano de Ensino da Disciplina Teoria e Prática das Ciências Naturais – Matemática, 2009/2)

A seguir apresentam-se quadros comparativos das ementas e das

bibliografias abordadas acima, para melhor visualização e compreensão de

cada uma delas e das diferenças e semelhanças entre as mesmas, o que

reflete convergências e/ou divergências nas concepções da formação docente

para o ensino da Matemática entre os vários cursos de Pedagogia e

instituições de Ensino Superior responsáveis por eles.

Contudo, não se apresenta uma análise aprofundada dos

conteúdos destes quadros, porque o estudo concentra-se em focalizar os

desafios e problemas enfrentados pelo professor graduado em Pedagogia para

ensinar a Matemática, o que é realizado no capítulo 4 deste estudo.

Quadro 1 - Comparativo dos ementários

Instituição Disciplina Ementa

UFMT/Cuiabá Fundamentos e

Metodologia do

Ensino da

Matemática I

Conteúdos relacionados aos Fundamentos da Educação Matemática; A gênese e a historicidade da ciência matemática; Educação Matemática: tendências e abordagens; Concepções de ensino na Matemática; O processo de construção do pensamento matemático; O ensino da Matemática no Brasil; A Educação Matemática na Educação Infantil; Resolução de problemas; Tratamento da Informação; Proposição teórico-metodológica no ensino da Matemática na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental, com vistas à construção dos conceitos: de número, sistema de numeração decimal, as operações fundamentais de adição, subtração; Potenciação de números naturais.

UFMT/Cuiabá Fundamentos e Metodologia do Ensino da Matemática II

Conteúdos relacionados à Matemática do cotidiano e Matemática escolar; Etnomatemática; O lúdico nas aulas de Matemática; Proposição teórico-metodológica no ensino da Matemática na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental, com vistas à construção dos conceitos: multiplicação e divisão; números racionais: frações e números decimais: idéia, representação, operações fundamentais, porcentagem, potenciação, radiciação.

UFMT/CUR Matemática e Ciências Naturais e suas Tecnologias: Conteúdo e Metodologia

13

1- Caracterização dos condicionantes do ensino de Matemática: a) a natureza do conhecimento lógico-matemático; b) aprender e ensinar Matemática: significado e sentido; 2– A Matemática na Educação infantil: a exploração do lúdico e o desenvolvimento de habilidades; 3- Estudo dos conteúdos usuais dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental; 4– Análise de propostas metodológicas e de seus fundamentos teóricos; 5- Planejamento de atividades de ensino: elaboração e avaliação; 6- Material didático: análise, produção e avaliação.

UNEMAT Conteúdos e Metodologia da Matemática I

Fundamentos epistemológicos, psico-pedagógicos e sócio-antropológicos da Educação Matemática. Tendências do ensino da Matemática: resolução de problemas, modelagem matemática, Etnomatemática, história da Matemática, o uso de computadores e jogos matemáticos. Crenças e concepções do ensino da

13

Esta disciplina trata da formação para o ensino da Matemática e Ciências. Neste quadro é apresentada parte da ementa que se refere à formação para o ensino da Matemática.

66

Matemática. A produção do conhecimento matemático. Reflexões teóricas.

UNEMAT Conteúdos e Metodologia da Matemática II

Matemática: organização do currículo e a Educação Matemática nas séries iniciais. A ação e o processo que a criança realiza na construção e compreensão dos conceitos matemáticos. Sistema de numeração, operações fundamentais, números fracionários e decimais. Noções de porcentagem e geometria, sistemas de medidas e monetário. Resolução de problemas. Elaboração de plano de aula.

UNIC/Cuiabá Estudos da Matemática na Educação Infantil

Concepções da Matemática. Análise reflexiva das etapas de construção das noções matemáticas. O papel da Matemática na construção da cidadania. Conteúdos, metodologia e avaliação no ensino de Matemática na Educação Infantil. Planejamento, execução de jogos e atividades pedagógicas que possibilitem o desenvolvimento do pensamento lógico-matemático. Formação matemática do professor.

UNIC/Cuiabá Princípios Teórico-Metodológicos do Ensino da Matemática

Analisar metodologicamente o ensino da Matemática em nível de Ensino Fundamental focando nos aspectos sociocultural, histórico e pedagógico; discussão e análise da organização e dos procedimentos do processo ensino/aprendizagem da Matemática, focalizando, sobretudo os objetivos de ensino, os conteúdos, os métodos e os recursos de ensino e as formas e critérios de avaliação.

UNIVAG Teoria e Prática das Ciências Naturais- Matemática

14

A disciplina enfocará, de maneira geral e globalizada a Área de Conhecimento das Ciências Naturais envolvendo: Ciências, Física, Química e Biologia e sua função no currículo da Educação Básica. E, de maneira específica e integrada, abordará a concepção histórica e filosófica da Matemática enquanto ciência e atividade humana, função da matemática formal: desmistificação dos conteúdos básicos às etapas iniciais da escolarização, com vistas à construção dos conceitos de fração, das operações com frações, do número fracionário e a notação decimal, das operações com números decimais, unidades de medidas e noções topológicas e geométricas. Estudo das metodologias e recursos auxiliares do ensino, planejamento e avaliação de atividades experimentais. Relação com as demais áreas do conhecimento; estudo crítico dos conteúdos e metodologias direcionadas ao ensino de Matemática nos Anos Iniciais e Educação Infantil.

Fonte: Ementários dos cursos pesquisados.

Uma breve análise do quadro das ementas permite perceber os

temas mais recorrentes. Quanto ao conhecimento dos conteúdos a serem

ensinados nos Anos Iniciais do Ensino, aparecem majoritariamente trabalhados

numa proposta teórico-metodológica. Ainda que se perceba que de forma

geral tais conteúdos sejam assim desenvolvidos, vê-se que nas ementas das

disciplinas Fundamentos e Metodologia do Ensino da Matemática II e

Conteúdos e Metodologia da Matemática II a abordagem teórica do conteúdo

aparece com mais intensidade.

Outro aspecto percebido nos ementários é a ênfase dada aos

fundamentos históricos da Matemática, bem como ao conhecimento

epistemológico desta área, este último no sentido de favorecer o estudo da

natureza do conhecimento matemático com vistas a evidenciar o

desenvolvimento do conhecimento lógico-matemático na criança e a

construção de conceitos. O enfoque epistemológico aparece com mais força na

disciplina Matemática e Ciências Naturais e suas Tecnologias: Conteúdo e

Metodologia, porém, associado à questão da metodológica.

14

Embora a ementa oriente a abordagem geral e globalizada da área de conhecimento das Ciências Naturais envolvendo Ciências, Física, Química e Biologia e sua função no currículo da Educação Básica, as bibliografias básica e complementares sugeridas ficam restrita à obras que tratam da área da Matemática.

67

A ementa da disciplina Estudos da Matemática na Educação

Infantil, apesar de também se concentrar nos fundamentos históricos e

epistemológicos e na metodologia, não traz uma abordagem ao conteúdo da

Matemática em si.

Já no ementário da disciplina Teoria e Prática das Ciências

Naturais - Matemática15 observa-se um estudo do ensino de Ciências e

Matemática e o enfoque metodológico dos conteúdos desta área na Educação

Infantil e Anos Iniciais, embora de maneira geral e globalizada

Constata-se também nas ementas em foco nesta investigação

uma preocupação com os processos de planejamento, elaboração e avaliação

de atividades desta área.

Por fim, observa-se que, em semelhança ao exposto no estudo de

Curi (2004), as ementas ora focalizadas mostram que pouca atenção é dada

aos conteúdos de geometria, medidas e tratamento da informação. Outro fato

interessante é que em nenhuma das ementas, tanto observadas pela autora

quanto na presente investigação, se evidencia o aspecto da pesquisa no que

se refere ao ensino e aprendizagem da Matemática na Educação Infantil e nos

Anos Iniciais do Ensino Fundamental.

Tecidas estas considerações, o quadro abaixo mostra os teóricos

basilares e complementares sugeridos nas ementas mencionadas para a

efetivação do que nelas se propõe.

Quadro 2 - Comparativo dos teóricos16 utilizados nas disciplinas dos

cursos selecionados

UFMT/Cuiabá UFMT/CUR UNEMAT UNIC/Cuiabá UNIVAG

Brasil (2000); Becker (1993); Ifrah (1992); Kamii (1988); Miorim (1998) Centurión (1994); Coll e Teberosky (2002);

Duarte (1997); Faraco (1997); Imenes (1996); Kamii (1996, 1991,1998); Piaget (1988); Smole (2004)

D’Ambrósio (2003); Imenes (1994); Kamii (1992, 1996); Nunes (1997); Schliemann (1998);

Carraher &

Schliemann

(2006),

D’Ambrósio

(1989);

Kamii (1990);

Brasil (1997);

Centurion (2002); Duhalde (2000); Machado (2000); Carvalho (2001);

15

Embora a ementa oriente a abordagem geral e globalizada da área de conhecimento das Ciências Naturais envolvendo Ciências, Física, Química e Biologia e sua função no currículo da Educação Básica, a bibliografia básica e complementar sugerida fica restrita às obras que tratam da área da Matemática. 16

A bibliografia básica está em negrito. Os demais autores que não estão em negrito são sugeridos como bibliografia complementar.

68

Cuberes (1997); D´Ambrósio (2001) D´Ambrósio (1993); Brougère (1998); Nunes (2005); Brizuela, (2006); Caraça, (1998); Danyluk (1998)

Brasil (1997).

Carvalho (2001);

D’Ambrósio

(2003)

Brasil (1998);

Kamii e

Devries(1991);

Panizza (2006);

Piaget e Inhelder

(2006);

Smole (2007)

Alves (2003);

Dante (1998);

Monteiro e

Pompeu Jr.

(2001);

Paes (2001)

Danyluk (2002); Patilla (1999, 1995); Ramos (2000)

Fonte: Ementas dos cursos focalizados

Em termos da bibliografia utilizada, observa-se neste quadro uma

variedade de autores. São teóricos que, na sua maioria, desenvolveram

pesquisas que têm contribuído significativamente para o ensino da Matemática.

Kamii e D‟Ambrósio são os teóricos mais recorrentes e discutem o

conhecimento matemático na perspectiva da construção dos conceitos. Kamii

entende a Matemática na visão piagetiana, e D‟Ambrósio faz uma reflexão

sobre a educação e Matemática e, ainda, inspirado nas ideias de Paulo Freire,

defende que a Matemática deve ser trabalhada a partir da realidade do aluno

objetivando a libertação de situações opressoras por ele vivenciadas. Ao lado

desses aparecem outros autores que realizam estudos numa perspectiva

teórico-metodológica de uma Matemática voltada para o cotidiano e o trabalho,

a saber: Nunes, Schliemann, Carraher & Schliemann e alguns que abordam

questões relacionadas à linguagem matemática como, por exemplo, Danyluk e

Smole.

No tocante ao mapeamento da matriz curricular dos cinco cursos

de Pedagogia em Mato Grosso que foram eleitos para subsidiar a reflexão a

respeito do desafio da formação do pedagogo para ensinar a Matemática nos

Anos Iniciais do Ensino Fundamental, foi possível perceber que existe uma

diversidade de nomenclaturas dadas às disciplinas que tratam desta área do

conhecimento. Veja-se o quadro a seguir.

69

Quadro 3 – Disciplinas

INSTITUIÇÃO Disciplina CH

UFMT/Cuiabá

Fundamentos e Metodologia do Ensino da Matemática I (75h)

Fundamentos e Metodologia do Ensino da Matemática II (75h)

150 h

UFMT/CUR Matemática e Ciências Naturais e suas Tecnologias: Conteúdo e Metodologia

128 h

UNEMAT Conteúdos e Metodologia da Matemática I (75h)

Conteúdos e Metodologia da Matemática II (75h)

150 h

UNIC

Estudos da Matemática na Educação Infantil (80h)

Princípios Teórico-Metodológicos do Ensino da Matemática (80h)

160 h

UNIVAG Teoria e Prática das Ciências Naturais - Matemática 60 h

Fonte: Matrizes curriculares dos cursos pesquisados

Os dados convergem com os resultados obtidos por Gatti e Nunes

(2008) que mostram, entre outros aspectos, a partir da análise da matriz

curricular de 71 cursos de Pedagogia, a existência de uma grande variedade

de nomenclaturas encontrada em cada curso e entre os cursos de uma

instituição para outra. Para as estudiosas, isto “sinaliza que o projeto de cada

instituição procura sua vocação em diferentes aspectos do conhecimento, com

enfoque próprio, o que se reflete na denominação das disciplinas” (p.67).

Contudo, é possível afirmar que, apesar das várias denominações

dadas, esses cursos têm em comum a eleição das questões relacionadas à

metodologia como essenciais para a formação do pedagogo.

Outro aspecto relevante diz respeito à carga horária que as

instituições pesquisadas destinam à formação do pedagogo para a área da

Matemática. Esses cursos dedicam em média 4,5% da sua totalidade para as

disciplinas que preparam o aluno para trabalhar com a Matemática, com

exceção da instituição UNIVAG, com 1,84%, como pode ser observado no

quadro que se segue.

Quadro 4 - Carga Horária

INSTITUIÇÃO CH TOTAL

DO CURSO

CH PARA A

MATEMÁTICA

Percentual

UFMT/Cuiabá 3.545 h. 150 h. 4,23%

UFMT/CUR 2.865 h. 128 h. 4,46%

UNEMAT 3.325 h 150 h. 4,47%

70

UNIC 3.300 h. 160 h. 4,84%

UNIVAG 3.260 h. 60 h. 1,84%

Fonte: Grades curriculares dos cursos pesquisados

Além disso, em duas destas instituições (UFMT/CUR e UNIVAG)

não se propõe tal carga horária exclusivamente à formação para o ensino da

Matemática, sendo destinada também à formação para o ensino de Ciências.

Isto concorre para que o tempo dedicado à formação matemática dos

professores nestas instituições seja ainda mais encurtado.

A partir da leitura desses dados é possível inferir que a forma

como estas instituições têm organizado a formação matemática dos futuros

professores dos Anos Iniciais, os pedagogos, no que tange à carga horária,

parece insuficiente. Isso nos remete ao estudo desenvolvido por Gatti e Nunes

(2008), que aponta:

Os conteúdos das disciplinas a serem ensinadas na Educação Básica

(Alfabetização, Língua Portuguesa, Matemática, História, Geografia,

Ciências, Educação Física) comparecem apenas esporadicamente

nos cursos de formação. (p. 67-69)

A constatação é ratificada trabalho de Curi (2004), que pesquisou

e analisou 36 cursos de Pedagogia, focando, inclusive, a matriz curricular. A

autora chama a atenção para a carga horária destinada à formação para a área

da Matemática, a qual, em seu estudo, corresponde a um percentual de 4% a

5% da totalidade do curso. Assim, ela observa que

[...] os futuros professores concluem cursos de formação sem

conhecimentos de conteúdos matemáticos com os quais irão

trabalhar, tanto no que concerne a conceitos quanto a procedimentos,

como também da própria linguagem matemática que utilizarão em

sua prática docente. (CURI, 2004, p. 76-77)

Do exposto até aqui, no que se refere às ementas e matrizes

curriculares dos cursos de Pedagogia do estado de Mato Grosso, focalizados

nesta pesquisa, pode-se inferir que a efetivação do aprofundamento dos

aspectos históricos e epistemológicos, bem como, de conteúdo e metodologias,

essencial para a formação matemática do pedagogo, passa necessariamente

pela ampliação da carga horária destinada às disciplinas que tratam desta área

71

do conhecimento. Alerta-se, contudo, que simplesmente ampliar a carga

horária pode não significar garantia deste aprofundamento, porque esse

trabalho depende da formação do professor que atua no Ensino Superior nesta

área, que deve ter o domínio dos fundamentos históricos e epistemológicos e

dos conceitos teórico-metodológicos, de modo a preparar o pedagogo para “o

quê” ensinar e “como” ensinar a Matemática (CURI, 2004).

Concorda-se que este tempo de estudos específicos para

Matemática é insuficiente. Entende-se, além disso, que a situação se agrava,

ainda mais, tendo que vista que o curso de Pedagogia tem a tarefa de

credenciar um profissional para atuar em contextos tão diversos – espaços

escolares e não escolares. Tal exigência incide, direta ou indiretamente, sobre

a organização dos currículos nas instituições formadoras, dificultando que se

pense num alargamento da carga horária para a formação matemática do

discente.

O fato é que as IES se veem diante da necessidade de orientar a

formação do acadêmico considerando a complexidade das questões peculiares

ao curso de Pedagogia e da identidade profissional do pedagogo, nas DCNs

entendido como um professor que também deve ser um gestor educacional e,

ao mesmo tempo, produtor e difusor de conhecimento científico e tecnológico

do campo educacional.

Na verdade, parece razoável entender que esta legislação define

que o perfil do pedagogo se alicerça no tripé docência, gestão e pesquisa. Não

obstante as dificuldades daí resultantes, pode-se considerar um avanço pensar

o pedagogo como produtor e difusor do conhecimento no campo educacional;

trata-se, assim, de concebê-lo, ao mesmo tempo, como professor e

pesquisador. É um modo de ultrapassar a dicotomia entre aquele que pensa e

produz, o pesquisador, e aquele que difunde e reproduz, o professor.

Esta formação é aprofundada quando a ela se acrescenta a

figura do gestor ao se pensar o pedagogo como um professor que tenha

também a capacidade de avistar o fenômeno educativo que se estende para

além da escola. Aquele que seja capaz de explicitar, planejar, coordenar e

avaliar processos educativos dentro e fora do espaço escolar. A confluência

destas três atividades no processo formativo – docência, gestão e pesquisa –

pode constituir uma contribuição para a definição da identidade do curso. Não

72

se pode desconsiderar, contudo, que isso traz consequências desafiadoras

para a formação deste profissional.

O debate persiste: Seria possível formar todos esses profissionais

num só curso, mantendo um só currículo, com o mesmo número de horas,

conseguindo-se evitar um arremedo de formação profissional, uma formação

aligeirada, dentro de um curso inchado? Não se podem ignorar as

especificidades de cada uma destas formações. A propósito, Libâneo (2002)

afirma que para se atingir níveis mínimos desejáveis de qualidade da formação,

ou se forma um bom professor, ou se forma um bom gestor ou coordenador

pedagógico ou um bom pesquisador ou um bom profissional para outra

atividade.

No âmbito destas discussões, é fundamental considerar que, de

acordo com as DCNs, o curso de Pedagogia tem como núcleo básico a

formação do professor da Educação Infantil e dos Anos Iniciais do Ensino

Fundamental, o que implica uma reformulação dos atuais projetos

pedagógicos, no sentido de adequá-Ios a essa necessidade. Seus egressos

têm como uma de suas competências legalmente estabelecidas a formação de

crianças da faixa etária de zero a dez anos e, assim, evidencia-se a exigência

de que o curso os prepare, efetivamente, para essa tarefa, abordando questões

relacionadas ao ensino da Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História,

Geografia, Artes, Educação Física, que têm sido pouco privilegiadas nos

atuais currículos de Pedagogia.

É preciso que os cursos de Pedagogia considerem

cuidadosamente que é essencial formar um professor que, além de exercer

atividades educativas em outros espaços sociais, seja capaz de dominar os

referenciais teóricos relativos à escola, ensino e educação e lecionar para os

anos iniciais da escolarização.

Trata-se de compreender que o trabalho do pedagogo demanda

que ele esteja preparado para contribuir significativamente no desenvolvimento

da criança nos aspectos cognitivo, afetivo, emocional e educacional. Neste

bojo, a Matemática, disciplina presente no currículo escolar, é uma das

disciplinas fundamentais para o desenvolvimento cognitivo do ser humano.

Cabe, portanto, ao pedagogo a tarefa de promover a construção das bases

para a formação matemática do aluno.

73

É imprescindível que os projetos de formação considerem o

papel da docência nesta fase da escolaridade levando em conta as

peculiaridades a ela inerentes. Um fator que diferencia a ação docente exercida

nos anos iniciais e as outras fases da escolaridade é que a Pedagogia trata da

base, do começo de todo o processo de aprendizado escolar de qualquer

indivíduo, da inserção do sujeito na vida de estudante. É nesta fase que o

prazer pelo estudo, que não se constitui uma atividade que surge naturalmente

nas crianças, deve ser despertado. Devem ser consideradas as especificidades

próprias do ensino-aprendizagem da Matemática pelas crianças, visto que é

nos primeiros anos de escolaridade, isto é, na Educação Infantil e nos Anos

Iniciais do Ensino Fundamental, que se concentram os rudimentos dos

conceitos matemáticos que os alunos precisam dominar em profundidade.

O já referido desafio de formar o pedagogo como preconizam as

DCNs, com atribuições tão diversificadas, em apenas em um curso de 3.220

horas, é agravado na medida em que a experiência no magistério não é exigida

para ingresso no curso de Pedagogia. Este vem sendo procurado, inclusive,

por profissionais de outras áreas, que nunca atuaram em uma sala de aula

como docentes.

No bojo dessas preocupações, vê-se que o estudo desenvolvido

por Castro e Alves (2010)17 aponta para o fato de que o corpo discente dos

cursos de Pedagogia tem sido composto por pessoas que ocupam postos

socialmente desvalorizados e com parcíssimos conhecimentos na área de

educação. Trata-se de estudantes oriundas de classes sociais pouco

favorecidas e que apresentam fraco desempenho acadêmico. Como um curso

socialmente desvalorizado, devido aos baixos salários e às precárias condições

de trabalho do professor, a Pedagogia é considerada satisfatória por alunos

que provêm de profissões ainda mais desvalorizadas, tais como as atividades

domésticas e aquelas relacionadas ao comércio e a serviços gerais, afirmam

as autoras. Essa mudança de perfil trouxe implicações para os cursos de

licenciatura em Pedagogia que estão tendo que lidar com um novo background

cultural dos estudantes.

17

CASTRO Magali de; ALVES Geane M. G. Que fazer com esse curso? Estudo com alunas de

pedagogia sem experiência na área de educação. In: Anais VII Colóquio de Pesquisa em

Educação – Qual conhecimento? Qual Educação?: UFSJ. Belo Horizonte, 2010.

74

Um estudo18 encomendado pela Fundação Lemann e pelo

Instituto Futuro Brasil constata que apenas 5% dos melhores alunos que se

formam no Ensino Médio desejam trabalhar como docentes da Educação

Básica. Baixo retorno financeiro e desprestígio social da carreira docente são

citados entre os principais fatores para perfil identificado no levantamento. Ao

contrário de outros países com sucesso educacional, o Brasil atrai para o

magistério os profissionais que possuem mais dificuldades acadêmicas e

sociais aponta um estudo inédito, que utilizou banco de dados oficiais.

Assim, é importantíssimo que na elaboração dos projetos

pedagógicos dos cursos de Pedagogia sejam considerados os estudantes que

vêm destas outras áreas ou de uma formação anterior de baixa qualidade e

que irão se formar para professores da escola básica, no sentido de oferecer

subsídios para o melhor atendimento desses acadêmicos.

É bem verdade que a aprovação das DCNs contribuiu para

afastar a possibilidade da extinção do curso de Pedagogia e cooperou para a

definição da identidade do profissional nele formado, que havia sido

obscurecida desde a criação do curso e, mais ainda, prejudicada após o

redimensionamento proposto pelo Parecer nº 252/1969, que fragmentava a

identidade do pedagogo por meio das inúmeras habilitações. Todavia, apesar

destes avanços, não se pode negar que os conteúdos e espaços de atuação

do pedagogo definidos nesse documento são imprecisos e que o curso de

Pedagogia enfrenta ainda hoje desafios de cunho legal e organizacional que

tornam evidente o seu desprestígio no espaço acadêmico.

Com efeito, esse curso vive em terreno contraditório: situa-se

entre os discursos sobre a valorização do magistério, da educação básica e,

principalmente, da infância, os quais têm sido mais frequentes nos últimos

tempos e se manifestado na retórica de inúmeros governos, e sua

desvalorização devida a questões históricas e fundamentais, como o

aviltamento salarial e as precárias condições de trabalho do professor da

escola básica.

O que foi exposto neste capítulo revela que a formação

18

Quem quer ser professor? Atratividade, seleção e formação docente no Brasil (2010). Disponível em http://www.fcc.org.br/pesquisa/publicacoes/eae/arquivos/1608/1608.pdf acesso em abril/2011

75

desenvolvida nos cursos de Pedagogia já traz em si implicações que

concorrem para a existência de fragilidade na formação do pedagogo. Este fato

resulta em desafios para que esse profissional atue na realidade concreta que

constitui seu campo de trabalho, sendo a sala de aula o locus principal definido

pela legislação atual.

Contudo, se, por um lado, é do curso de Pedagogia a

incumbência de promover uma formação que possibilite ao professor dos Anos

Iniciais do Ensino Fundamental desenvolver conhecimentos sólidos e eficazes,

aptos a garantir aprendizagens suficientes quanto ao ensino da Matemática,

por outro lado, é importante dizer que esses conhecimentos não são

apropriados tão somente na formação inicial oferecida durante o curso de

graduação.

Assim considerando, a unidade seguinte se ocupa em situar os

processos de elaboração e reelaboração da base de conhecimentos e saberes

necessários para o exercício da docência e os contextos formativos em que

ocorrem. Com isso, pretende-se fornecer elementos para compreender as

declarações dos sujeitos da pesquisa e pensar a formação inicial dada nos

cursos de Pedagogia no que se refere ao ensino da Matemática.

2.6 Algumas Reflexões Teóricas sobre os Saberes e Conhecimentos Docentes

Esta unidade se preocupa em compreender a formação do

professor, incluindo os saberes e conhecimentos necessários ao

desenvolvimento da profissão docente, como suporte teórico para a

compreensão de como o pedagogo ensina a Matemática nos Anos Iniciais do

Ensino Fundamental. Esta abordagem se justifica porque as novas exigências

postas à escola requerem que a formação do professor seja vista como um

continuum, ou seja, como um processo permanente de construção de

conhecimento que ocorre ao longo da vida.

Isso obriga a pensar e compreender a formação inicial dentro

deste processo contínuo, em conexão com a formação continuada e as

76

experiências vividas pelo professor no decorrer da vida profissional docente.

Para Tardif (2002) isso inclui levar em consideração que os saberes do

professor são construídos, também, em sua trajetória pré-profissional, uma vez

que ele passa muitos anos de sua vida na escola, ambiente do seu, então,

futuro trabalho.

Os docentes mobilizam saberes e conhecimentos profissionais

que são construídos e reconstruídos em diferentes contextos e tempos e

constituem a base de seu trabalho. Segundo Montalvão e Mizukami (2002),

existem muitos estudos que procuram investigar os processos de construção

de conhecimentos ou de saberes de professores e que estão intimamente

relacionados ao debate atual em torno do ensino e da formação docente.

Pelo fato de este estudo tratar da formação do pedagogo e do

ensino da Matemática, num primeiro momento recorre-se a Nóvoa (1992),

visando a tecer considerações sobre a formação de professores numa

perspectiva crítico-reflexiva; depois inclui-se Tardif (2002), que traz reflexões

sobre a constituição dos saberes docentes e, por fim, busca-se a contribuição

das teorias de Shulman (1986; 1987 apud Montalvão e Mizukami, 2002) acerca

da base de conhecimentos para a docência.

Segundo Nóvoa (1992) “a formação deve estimular uma

perspectiva crítico-reflexiva, que forneça aos professores os meios de um

pensamento autônomo e que facilite as dinâmicas de autoformação

participada” (p.25). O que se propõe é que o professor, por meio da reflexão da

sua prática e considerando a escola e a sociedade em que vive, seja

estimulado a lançar mão de um pensamento que seja autônomo. Esta proposta

considera fundamentais três processos na formação do docente: produzir a

vida do professor (desenvolvimento pessoal), produzir a profissão docente

(desenvolvimento profissional) e produzir a escola (desenvolvimento

organizacional).

Produzir a vida do professor, na dimensão do desenvolvimento

pessoal, implica proporcionar aos educadores espaços de interação entre as

dimensões pessoais e profissionais valorizando como conteúdos de sua

formação seu trabalho crítico-reflexivo sobre as práticas que realiza e sobre

suas experiências compartilhadas. Assim, o processo envolve a pessoa, suas

interações e suas experiências, estas últimas entendidas como lugar de

77

produção do saber e de aprendizagem. Esse mesmo processo coloca o

educador na condição de sujeito que, de forma permanente e ativa, ao longo

da vida constrói saberes, que não são únicos, nem tampouco acabados, dada

a complexidade que envolve o trabalho docente, pois sua prática é fortemente

constituída pelo enfrentamento de situações problemáticas, singulares e

complexas que surgem no ambiente escolar.

Produzir a profissão docente, na perspectiva do desenvolvimento

profissional, tem como pressuposto que o aprender da profissão é um processo

contínuo que engloba a formação inicial e a continuada. Trata-se de entender

que a formação deve preparar o docente crítico reflexivo que seja capaz de

assumir seu próprio desenvolvimento profissional a partir de seu envolvimento

pessoal e profissional num processo constante de autoformação e formação

nas instituições escolares onde atua. Deste modo, em processo continuado de

formação, cada professor vai construindo sua maneira de ser e estar na

profissão docente.

Por isso é importante produzir a escola, ou seja, concebê-la como

um espaço de formação e atuação, o que significa compreender a formação

como um processo permanente, integrado no dia-a-dia dos professores e da

escola.

Nesta perspectiva, o conceito de formação identifica-se com a

ideia de percurso, processo, trajetória de vida pessoal e profissional, como

formação “inconclusa” e por isso permanente, com vistas à formação de

professores autônomos, que sejam sujeitos capazes e livres para construir e

reconstruir constantemente os saberes que realizam em sua prática.

No entanto, autonomia não é uma dádiva, mas sim uma

construção contínua, individual e coletiva. É uma conquista, fruto de um

processo educativo que passa necessariamente pela consciência do ser

inacabado, segundo a qual o sujeito, percebendo-se inconcluso, compreende-

se em contínuo aprendizado e em permanente formação. Como afirma Freire

(1999), “a autonomia, enquanto amadurecimento do ser para si, é processo, é

vir a ser. Não ocorre em data marcada” (p.121), ela vai se constituindo na

experiência de várias, inúmeras decisões, que vão sendo tomadas. Por isso, “é

na inconclusão do ser, que se sabe como tal, que se funda a educação como

processo permanente” (p.64).

78

Ainda para Freire (1999), é necessário que o professor,

consciente do seu inacabamento, entenda que “faz parte da natureza da

prática docente a indagação, a busca, a pesquisa" e que, portanto, “Não há

ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino” (p.32). Assim, é essencial que,

“em sua formação permanente, o professor se perceba e se assuma, porque

professor, como pesquisador” (p.32).

Nesta esteira de pensamento, formar é muito mais que treinar. O

professor é formando e formador ao mesmo tempo, pois, como assegura o

autor em pauta, não há docência sem discência. Compreende-se, pois, que “a

profissão docente exige formação e autoformação que passa pela aquisição de

uma atitude científica que leva a interrogar e a problematizar o real e a pôr-se a

si próprio em questão, enquanto elemento desse real” (ESTRELA, 1992, p. 119

apud CARVALHO, 2005, p. 205).

Neste sentido, Carvalho (2005) afirma que a formação deve ser

centrada na concepção de aprender, pois ser professor implica “preparação

rigorosa e engajamento decidido no processo de autoformação permanente”

(p.187). Ainda mais, trata-se de responsabilidade ética, política e profissional

que o professor, assumindo-se como estudioso permanente, embrenhe-se no

processo de estudar num que fazer crítico, criador e recriador a partir da

reflexão de sua prática. Considerando-se ainda que

O professor ideal é alguém que deve conhecer sua matéria, sua

disciplina e seu programa, além de possuir certos conhecimentos

relativos às ciências da educação e à pedagogia e desenvolver um

saber prático baseado em sua experiência cotidiana com os alunos.

(TARDIF, 2001, p. 39),

chega-se à constatação de que a prática docente integra diferentes saberes.

Para Tardif (2002) o saber docente é um saber plural, formado por saberes

oriundos da formação profissional, dos saberes das disciplinas, dos currículos e

da experiência, conforme se explicita a seguir.

1) Os saberes da formação profissional são aqueles transmitidos pelas

instituições de formação de professores em que os docentes e o ensino são

tomados como objetos de saber para as ciências humanas e da educação.

Busca-se a articulação entre estas ciências e a prática docente por meio da

formação inicial ou continuada. Neste entendimento, a prática docente mobiliza

79

diversos saberes nomeados de pedagógicos, provenientes de reflexões sobre

a prática educativa.

2) Os saberes das disciplinas emergem da tradição cultural e dos grupos

sociais produtores de saberes. São conhecimentos definidos e selecionados

pela instituição universitária e oferecidos sob a forma de disciplinas.

Correspondem aos diversos campos do conhecimento como, por exemplo, a

Matemática, a Histórica, a Literatura, etc.

3) Os saberes curriculares apresentam-se na forma de programas escolares

(objetivos, conteúdos, métodos) que os professores devem aprender a aplicar.

4) Os saberes experienciais são aqueles desenvolvidos pelos próprios

educadores na prática, baseados em seu trabalho cotidiano e no conhecimento

de seu meio. Esses saberes são práticos, oriundos da experiência e por ela

validados. “Eles incorporam-se à experiência individual e coletiva sob a forma

de habitus e de habilidades de saber-fazer e de saber-ser” (TARDIF, 2002, p.

39).

Na visão de Tardif (2002), o saber docente é, essencialmente,

heterogêneo, sendo marcado por relações de exterioridade e de interioridade

com a prática. Seu texto explica que, na relação dos professores com os seus

próprios saberes, os saberes da formação profissional, os saberes disciplinares

e os saberes curriculares têm caráter de exterioridade e, por isso, são

desvalorizados pelos docentes, já que não são por eles controlados, mas sim,

definidos pela escola e pela universidade.

Contudo, o corpo docente, na impossibilidade de controlar esses

saberes, busca dar-lhes caráter de interioridade produzindo saberes que

denominam de práticos ou experienciais. O autor em pauta explica que “os

saberes experienciais não são saberes como os demais, são, ao contrário,

formados de todos os demais, mas retraduzidos, „polidos‟ e submetidos às

certezas construídas na prática e na experiência” (p. 54). É por meio destes

que o professor compreende e domina sua prática.

Num esforço de identificar e classificar os saberes dos

professores este autor esboça um quadro no qual busca mostrar o pluralismo

do saber docente relacionando-o com os lugares onde esses profissionais

atuam, suas fontes sociais de aquisição e seus modos de integração no

trabalho docente.

80

Quadro 5 – O saber plural dos professores

Saberes dos professores Fontes sociais de aquisição Modos de integração no

trabalho docente

Saberes pessoais dos

professores

A família, o ambiente de vida, a

educação no sentido lato, etc.

Pela história de vida e pela

socialização primária

Saberes provenientes da

formação escolar anterior

A escola primária e secundária,

os estudos pós-secundários não

especializados, etc.

Pela formação e pela

socialização pré-profissionais

Saberes provenientes da

formação profissional para o

magistério

Os estabelecimentos de

formação de professores, os

estágios, os cursos de

reciclagem, etc.

Pela formação e pela

socialização profissionais nas

instituições de formação de

professores

Saberes provenientes dos

programas e livros didáticos

usados no trabalho

A utilização das “ferramentas”

dos professores: programas.

Livros didáticos, cadernos de

exercícios, fichas, etc.

Pela utilização das “ferramentas”

de trabalho, sua adaptação às

tarefas

Saberes provenientes de sua

própria experiência na profissão,

na sala de aula e na escola

A prática do ofício na escola e na

sala de aula, a experiência dos

pares, etc.

Pela prática do trabalho e pela

socialização profissional

Fonte: Tardif, 2002.

Este quadro não trata de mostrar que os saberes da docência são

construídos de maneira estanque, mas, sim, de evidenciar que os saberes

mobilizados e empregados na prática cotidiana resultam de “um saber plural,

formado pelo amálgama, mais ou menos coerente” (TARDIF, 2002, p. 36), de

saberes oriundos de várias fontes de aquisição.

Buscando também compreender os conhecimentos docentes,

Shulman (1986; 1987, apud Montalvão e Mizukami, 2002) mostra que, nas

tomadas de decisões em seu dia-a-dia acerca do trabalho docente, os

professores recorrem a muitos tipos de conhecimentos. Em seus estudos o

autor apresenta o que denomina de base do conhecimento para a docência.

Para ele os vários tipos de conhecimentos são os seguintes:

a) Conhecimento dos conteúdos das disciplinas curriculares –

conhecimento da matéria

Implica o domínio, por parte do professor, dos conceitos

fundamentais de uma determinada área do conhecimento e da

história da construção de tais conceitos. O domínio de tal tipo de

conhecimento é imprescindível para que o professor possa, de fato,

constituir-se em mediador entre os conhecimentos historicamente

produzidos e os conhecimentos escolares de um determinado nível

de modalidade de ensino, de forma a oferecer condições para que os

alunos possam se apropriar deles. Para o autor, trata-se de conteúdo

imprescindível para a docência. Trata-se igualmente de condição

81

necessária, mas não suficiente, para a garantia de um processo de

ensino e aprendizagem eficiente. (MONTALVÃO E MIZUKAMI, 2002,

p. 105)

b) Conhecimento pedagógico geral

Trata-se de conhecimento sobre os processos de ensino e

aprendizagem, procedimentos didáticos, motivação, propostas e

teorias de desenvolvimento, estilos de aprendizagem etc.,

necessários à transformação do conteúdo a ser ensinado em

conteúdo a ser aprendido. Tais conhecimentos contemplam princípios

e estratégias de manejo de classe e de organização que transcendem

o conteúdo da matéria em si. ( Idem, p. 105)

c) Conhecimento curricular

Refere-se ao conhecimento das disciplinas que compõem o currículo

de um determinado nível/modalidade de ensino, com ênfase no

domínio conceitual da disciplina específica pela qual é responsável.

Implica considerar, pois, tanto o currículo específico das disciplinas

que ensina quanto compreender a relação da(s) mesma(s) com a

organização e estruturação dos conhecimentos escolares.

Compreende, principalmente, os materiais e programas que servem

como ferramentas de trabalho para os professores. (Idem, p. 105)

d) Conhecimento dos fins e metas da educação e dos conteúdos

educacionais

Consiste em conhecimentos dos fins educacionais, propósitos e

valores e suas bases históricas. Envolve conhecimentos sobre

contextos educacionais, sobre os trabalhos do grupo ou da classe,

sobre gestão e financiamento da educação/do ensino, sobre as

características e especificidades das comunidades e culturas, sobre

políticas públicas educacionais, dentre outros. (Idem, p. 106)

e) Conhecimento dos alunos.

Aqui, trata-se de “Conhecimentos de processos/estilos de

aprendizagem específicos de seus alunos. Envolve conhecimento dos alunos

em suas dimensões cognitiva, emocional, motora, social e interacional” (Idem,

p.106).

Além desses, faz parte do conhecimento dos professores o

conhecimento pedagógico do conteúdo. Para Shulman, trata-se de um novo

tipo de conhecimento, específico da docência, desenvolvido pelos professores

82

no exercício da profissão a partir de situações concretas de ensino e

aprendizagem. Esse conhecimento engloba os outros já elencados pelo autor e

“representa uma elaboração pessoal do professor ao confrontar-se com o

processo de transformar em ensino o conteúdo aprendido durante o seu

percurso formativo” (GARCIA, 1992, p. 57 apud MONTALVÃO E MIZUKAMI,

2002, p. 106). Para Richert, Shulman and Wilson (1987 apud Mizukami

2002)19,

Em adição ao conhecimento pedagógico geral e de conteúdo

específico, nosso modelo inclui conhecimento pedagógico do

conteúdo. Esse conhecimento inclui uma compreensão do que

significa ensinar um tópico particular, assim como conhecimento dos

princípios e técnicas requeridas para tal. Contextualizados por uma

conceituação de conteúdo específico do ensino, professores têm

conhecimento sobre como ensinar a matéria, como os alunos

aprendem a matéria (quais são as dificuldades de aprendizagem

relativas especificamente à matéria, quais são as capacidades

desenvolvimentais dos estudantes para adquirir conceitos

particulares, quais são as concepções errôneas mais comuns), como

matérias curriculares são organizadas na área e como tópicos

particulares são incluídos nos currículos. Influenciado tanto pelo

conteúdo específico da disciplina quanto pelo conteúdo pedagógico, o

conhecimento de conteúdo pedagógico emerge e cresce quando os

professores transformam seu conhecimento de conteúdo específico

tendo em vista os propósitos de ensino. Como essas espécies de

conhecimento se relacionam umas às outras permanece um mistério

para nós. (p. 155)

Portanto, os conhecimentos e saberes dos professores não são

estáticos, nem tampouco estagnados, mas encontram-se em constantes

modificações, dadas as exigências específicas das situações concretas do seu

cotidiano profissional. Esta observação torna possível considerar que, para

ensinar a Matemática nos anos iniciais, os professores não se apoiam

exclusivamente nos conhecimentos adquiridos no curso de Pedagogia, mas

utilizam esses conhecimentos em conjunto com outros construídos em sua

trajetória pré-profissional e profissional.

A construção dos conhecimentos para o ensino desta disciplina

exige do educador um trabalho de reflexão crítica sobre sua prática, que

19

MIZUKAMI. M. G. N. Formadores de professores, conhecimentos da docência e casos de ensino. In: REALI, A.M.M.R. e MIZUKAMI, M. G. N. Formação de professores, práticas pedagógicas e escola. São Carlos: EdUFSCAR, 2002.

83

envolve outros tipos de conhecimentos – do aluno, do currículo, de conteúdos,

dos contextos educacionais (ambiente de trabalho, região e características

culturais da comunidade), etc. – sendo tal ensino por eles constantemente

enriquecido porque, em interação, fundem-se em um novo conhecimento da

área específica, que é pessoal. Nesta ótica, os esforços para a formação do

professor que ensina a Matemática nos anos iniciais de escolarização devem

concentrar-se em formar um sujeito histórico, crítico e criativo que seja capaz

de criar, recriar e reinventar sua própria prática docente e competente para

desenvolver sua autonomia no pensar e agir pedagógico a fim de intervir na

transformação da qualidade do ensino da Matemática.

Esta finalidade exige que tal seja pensado numa perspectiva

crítica que compreenda a educação como uma prática social e um processo

lógico de emancipação. No intuito de subsidiar esse debate, o capítulo seguinte

se ocupa em apresentar as ideias que referendam a formação de professores

no aspecto da educação matemática crítica. Também traz outros elementos

teóricos para contribuir na análise dos dados desta pesquisa no que se refere à

formação matemática do professor.

84

3 FORMAÇÃO DE PROFESSORES: PRESSUSPOSTOS TEÓRICOS

A apropriação do conhecimento matemático por parte do

estudante, para muitos, processo longo e difícil, envolve professor, aluno e

conhecimento matemático. Neste tripé, o sucesso nas aprendizagens do aluno

depende, necessariamente, da inquestionável importância do trabalho do

educador.

Como a pesquisa trata da formação do pedagogo e,

especificamente, preocupa-se em como este profissional ensina a Matemática,

a proposta deste capítulo é tecer algumas considerações teóricas acerca do

tema, necessárias para a melhor compreensão do nosso objeto de estudo.

Num primeiro momento o capítulo institui uma breve discussão

sobre a formação de professores na perspectiva crítica de educação, à luz de

autores que compreendem a ação docente como compromisso histórico,

político e ético de transformação da realidade social opressora e injusta, quais

sejam: Freire, 1987, 1999; Veiga, 2009; Kincheloe, 1997; Contreras, 2002,

Peter Mclaren, 1997; Giroux, 1997; Gadotti, 1995; Saviani, 1991; Carvalho,

2005; Nóvoa, 1992, 2009, com a finalidade de ajudar na compreensão de

alguns elementos da proposta da Educação Matemática Crítica que são

delineados na seqüência.

Já neste segundo momento, são apresentadas, mais

especificamente, considerações teóricas a respeito da formação de docentes

para o ensino da Matemática nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Trata-

se de, inicialmente, delinear a proposta da Educação Matemática Crítica no

sentido de Ole Skovsmose (2001), que, em linhas gerais, tem preocupações

com a formação para a democracia e cidadania na educação matemática.

Depois, de trazer alguns aspectos evidenciados em uma investigação (CURI,

2004) sobre a formação do pedagogo para o ensino da Matemática. Por fim,

de considerar as concepções que permeiam o conhecimento matemático para

situar o estudo a respeito das tendências para o ensino da matemática no

Brasil desenvolvido por Fiorentini (1995). O interesse específico deste capítulo

é, pois, subsidiar teoricamente a análise dos dados recolhidos ao longo da

pesquisa.

85

3.1 A Formação do Professor na Perspectiva Critica da Educação

A intenção desta unidade é compreender o que defendem alguns

autores acerca da educação, da escola, do trabalho do professor e da

formação docente para pensar a formação do professor numa perspectiva

crítica da educação. Esta abordagem se faz necessária porque toda proposta

de formação de professores é baseada em uma concepção de educação que

traz implícito, em si mesma, um conceito de homem, de sociedade e de

conhecimento, ou seja, um posicionamento teórico, filosófico, antropológico,

sociológico, epistemológico e ético em relação a que tipo de homem se

pretende formar e para que tipo de sociedade.

Veiga (2009) ao analisar a formação de professores no Brasil

aponta duas perspectivas de formação que têm ocupado lugar de destaque: a

formação do professor como tecnólogo do ensino e a formação do professor

como agente social.

O professor na perspectiva do tecnólogo do ensino tem sua

identidade expressa na atual legislação educacional20 de nosso país, a qual,

inspirada nas políticas neoliberais que buscam adequar a formação de

professores às demandas do mercado globalizado, compreende que a

formação do professor deve centrar-se no desenvolvimento de competências;

no saber fazer; na prescrição; na aprendizagem por competência. Para a

autora,

Essa perspectiva de formação centrada nas competências é restrita e

prepara, na realidade, o prático, o tecnólogo, isto é, aquele que faz

mas não conhece os fundamentos do fazer, restringindo-se ao

microuniverso escolar e esquecendo-se da relação com a realidade

social mais ampla, que, em última instância, influencia a escola e por

ela é influenciada. (p.17)

Este tipo de formação, tendo sua origem no poder constituído,

resulta num tipo de formação fragmentada, pragmatista, simplista, prescritiva e

de característica aligeirada, cujos conhecimentos se dão desvinculados do

contexto. Trata-se de um modelo de formação que tem se mostrado frágil e

20

Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena (CNE 2001), decorrentes da LDBEN nº. 9.394/96.

86

insuficiente frente às exigências advindas das transformações do mundo

contemporâneo.

Com efeito, as questões da diversidade e das novas tecnologias

têm desafiado a sociedade e, por consequência, a escola, a redefinirem suas

práticas com vistas à inclusão social e à integração escolar. A escola que está

posta vem recebendo críticas, principalmente em relação à sua incapacidade

para promover aprendizagens que sejam capazes de responder aos desafios

da sociedade do conhecimento. (NÓVOA, 2009, p. 78). No século XXI, essas

condições têm sido desencadeadoras para o reaparecimento no cenário

educativo do professor como elemento substancial para a melhoria da

qualidade das aprendizagens, como agente social.

Freire também pensa ser necessária uma mudança na escola, no

seu dizer, na “cara da escola”. A escola, na concepção de Paulo Freire (1991),

deve ser “competente, democrática, séria e alegre” (p. 35). “Sonhamos com

uma escola, que sendo séria, jamais vire sisuda. Quanto mais leve é a

seriedade, mais eficaz e convincente é ela” (p.37). Para ele a escola deve ser

democratizada, comprometida com os oprimidos, com as minorias e

comprometida com a democratização da sociedade. Com isto, propugna uma

escola de qualidade que seja do povo e para o povo.

Entende-se que,

A qualidade dessa escola deverá ser medida não apenas pela

quantidade de conteúdos transmitidos e assimilados, mas igualmente

pela solidariedade de classe que tiver construído, pela possibilidade

que todos os usuários da escola – incluindo pais e comunidade –

tiverem de utilizá-la como um espaço para elaboração de sua cultura.

(GADOTTI e TORRES, 1991, p. 15-16)

O que se propõe é que os indivíduos atuando como sujeitos que

fazem parte dessa escola tenham também poder de decisão sobre ela,

participando como sujeitos desse processo.

Nóvoa (2009) aponta que é preciso redefinir a missão da escola

no sentido de libertá-la de uma visão regeneradora da sociedade, a qual, ao

longo dos tempos, permitiu que progressivamente, a sociedade lhe atribuísse

um volume excessivo de missões, o que resultou num transbordamento de

atribuições e numa pobreza teórica e prática. Em defesa do retraimento da

87

escola, o autor em pauta, propugna que a escola seja percebida como uma

entre as mais diversas instituições da sociedade que promovem a educação,

porém, valorizando aquilo que é especificamente escolar.

Para o estudioso, a escola capaz de contribuir para a melhoria da

qualidade da educação é aquela que, evitando o transbordamento de

atribuições que lhe foi imposto, seja mais orientada para as aprendizagens21;

que em vez, de apresentar a homogeneização característica da escola do

século XX seja aberta à diferença, ao diálogo e à comunicação, de modo que a

organização do trabalho educativo considere a “aplicação de uma pedagogia

diferenciada em função das necessidades de cada aluno” (p.87). Nesta trilha,

sugere que a escola que promove a cidadania dos educandos é aquela que

trabalhe a favor de mais aprendizagem, mais sociedade, mais comunicação.

Assim sendo, defende que

[...] não há cidadania se os alunos não aprenderem, se não formos

capazes de integrar todos numa escola com regras claras e

democráticas de funcionamento, se a escola não comunicar com o

exterior e não prestar contas do seu trabalho à sociedade. (NÓVOA,

2009, p. 68)

Efetivamente, trata-se de uma proposta que deseja abrir novas

perspectivas para a formação de professores, que coloca a aprendizagem, em

toda a sua riqueza no cerne das preocupações dos envolvidos com a

educação. Indubitavelmente esses debates fazem aflorar a centralidade do

papel do docente enquanto sujeito fundamental, que se constitui elemento

insubstituível na promoção das aprendizagens e na construção dos processos

de inclusão.

Também ao mostrar que ser professor é tarefa mais complexa do

que no passado, Nóvoa (2009), evidencia que a formação do professor está em

xeque, devendo, necessariamente, ser analisada na teia do tecido social, uma

vez que a educação se relaciona dialeticamente com a sociedade.

Esta perspectiva insere-se na visão de que, o mundo das relações

é um todo dialético, em que os fenômenos não se desenvolvem isoladamente,

21

Dar primazia à aprendizagem como missão da escola não significa deixar de cumprir algumas missões sociais e assistenciais; significa, sim, não defini-las como missões primordiais da escola. (NÓVOA, 2009, p. 88).

88

mas em ligação com outros fenômenos que não são iguais. Segundo Gadotti

(1995), o papel social da educação não pode ser pensado sem levar em conta

que sua realização expressa a tensão da contradição própria da realidade; a

educação enquanto momento partícipe da prática social global é contraditória

porque a sociedade em que se situa é contraditória.

Entende-se a sociedade capitalista como constituída de relações

de exploração e opressão. No seio destas relações sociais o saber produzido

socialmente é uma força produtiva, é um meio de produção que se funcionaliza

a serviço do capital. Na visão de Saviani (1991), neste modelo de sociedade,

“O saber dos trabalhadores é desapropriado e apropriado pelos setores

dominantes, elaborado e devolvido de forma parcelada” (p. 81).

Contudo, devido à natureza do capitalismo, os trabalhadores não

podem ser desapropriados totalmente do saber, então se providencia para que

o trabalhador adquira algum tipo de saber, sem o que ele não poderia produzir.

Aí reside a contradição, que se revela no papel motor da luta de classes na

transformação social. É através desta luta de classes que a sociedade avança.

Para Saviani (1991), o saber é produzido socialmente e elaborado

institucionalmente. A produção do saber exige o domínio dos instrumentos de

elaboração e sistematização. A importância da escola está em permitir o

acesso a esses instrumentos, sem os quais “os trabalhadores ficam

bloqueados e impedidos de ascenderem ao nível da elaboração do saber,

embora continuem, pela sua atividade prática, a contribuir para a produção do

saber” (p. 82).

Nesta compreensão, o saber não democratizado passa a ser

propriedade privada, tendendo, desta forma, a reproduzir indefinidamente as

relações sociais básicas, justas ou injustas, inerentes ao sistema. A educação

é utilizada, então, como um meio de encobrir contradições, como um

instrumento de persuasão dissimulador e alienante da realidade, produzindo

uma ideia ilusória de normalidade.

A educação enquanto possibilitadora da disseminação de um

saber mais abrangente, contudo, entra em contradição com a sociedade

capitalista. A ação pedagógica, na medida em que explicita aquelas condições

que determinam o caráter da dominação contribui para que o saber seja

89

apropriado – elaborado – pelas classes subalternas, concorrendo, assim, para

o encaminhamento da modificação das condições sociais.

Para empreender as discussões em torno do conceito de

educação é importante recorrer ao posicionamento de Vieira Pinto (2000),

Freire (1987), Paro (2008). Estes autores concebem a educação como um

fenômeno social de caráter histórico-antropológico, constituindo-se ao mesmo

tempo em um processo individual e social.

Segundo Vieira Pinto (2000), a educação é sempre existencial,

uma possibilidade humana de ordem consciente, dialógica, relacional, um

fenômeno cultural e social, é teleológica e intencional, é uma modalidade do

trabalho social. Apresenta-se como um processo exponencial, concreto por

excelência e contraditório por natureza. Sua característica fundamental é que

ela se efetua como uma mediação necessária no processo de produção da

natureza humana.

Este autor entende que “a educação é o processo pelo qual a

sociedade forma seus membros à sua imagem e em função de seus

interesses” (p.29). Preconiza que a educação sempre terá um caráter

intencional, pois não se pode aspirar a formar um sujeito sem um prévio

conceito ideal de homem. Este modelo de homem que se pretende formar

pertence à consciência de alguém que está num dado tempo, num espaço, em

determinada posição social. Para o mesmo autor a forma de consciência pode

ser ingênua ou crítica. De acordo com a posição, o interesse, os fins da

consciência de quem dirige o processo educacional tem-se um tipo social de

educação.

Na concepção ingênua de educação, que emana de uma

consciência ingênua, é papel do grupo dominante definir as normas do

processo educativo porque acredita que o educando é um ser que não possui

ainda consciência e por isso necessita recebê-la pela educação; esta é

considerada como o procedimento de transformação do não-homem em

homem. Considera o educando como “ignorante”; como puro “objeto” da

educação e a educação como transferência de um conhecimento finito, como

dever moral da fração adulta, educada e dirigente da sociedade.

90

Por outro lado, a concepção crítica da educação procede de uma

consciência crítica que ao considerar as categorias do pensar crítico –

objetividade, concreticidade e totalidade, historicidade e totalidade –, torna-se

[...] verdadeiramente autoconsciência não pelo simples fato de

chegar a ser objeto para si e sim pelo fato de perceber seu conteúdo

acompanhado da representação de seus determinantes objetivos.

Estes pertencem ao mundo real, material, histórico, social, nacional

no qual se encontra. (VIEIRA PINTO, 2000, p. 60).

Na concepção, ora focalizada, o educando é considerado como

sabedor e desconhecedor, e aquilo que ele desconhece é o que até agora não

teve necessidade de aprender. Assim, o educando é o “sujeito” da educação –

nunca o objeto dela –, pois “a sociedade como um todo se desenvolve, se

educa, se constrói, pela interação de todos os indivíduos” (idem, p.64). A

educação é, portanto, um diálogo amistoso entre dois sujeitos, de fato, entre

dois educadores.

Neste sentido, Paulo Freire preconiza que a educação libertadora

é uma atividade em que os sujeitos, educadores e educandos, mediatizados

pelo mundo, educam-se em comunhão. Para o autor a educação libertadora é

um esforço de superação da relação vertical estabelecendo-se a relação

dialógica.

Este entendimento de educação – o da educação libertadora

defendida por Paulo Freire – é embutido numa concepção de mundo e de

homem em que a ideia primordial consiste em compreender que tudo está em

permanente transformação e interação. Freire dizia, numa frase famosa, que "o

mundo não é, o mundo está sendo", e, por isso, não há futuro a priori. Esse

ponto de vista implica conceber o ser humano como "histórico e inacabado" e,

consequentemente, sempre pronto a aprender. Fato fundamental é que o

homem é considerado um ser-no-mundo, mas também ser-com-os-outros,

assim, o homem existe no e com o mundo. Daí o diálogo ser inerente ao

processo de humanização dos homens e, por consequência, a educação ser

dialógica.

Na condição de um ser de relações o homem constitui-se sujeito

do processo histórico da cultura, sendo ao mesmo tempo admirador e

transformador desse mundo, da natureza, de sua própria pessoa e da história.

91

O Mundo é o lugar de encontro de cada um consigo mesmo e com os outros.

Nesta direçao, Paro (2008) entende que considerar o homem como ser

histórico implica necessariamente considerá-lo como ser social e político. Isto

requer, necessariamente, que as relações de produção da convivência entre

pessoas e grupos não se dêem pela dominação, mas, sim, pelo diálogo, tendo

como horizonte a sociedade democrática.

Para ele, a educação não pode ser é reduzida à passagem de

conhecimento na qual o importante é sempre o conteúdo, o educador apenas é

um provedor de conhecimentos e informações, e o educando mero receptáculo

desse conteúdo, na qual se desconsidera a subjetividade do educador e do

educando atentando-se apenas ao conteúdo. Antes, a educação consiste na

apropriação da cultura, pois esta é a condição para a formação do homem na

integralidade de sua condição histórica. A função da educação nesta

perspectiva é possibilitar ao homem a assimilação da cultura historicamente

construída:

A necessidade da educação se dá precisamente porque, embora

autor da história pela produção da cultura, o homem ao nascer

encontra-se inteiramente desprovido de qualquer traço cultural.

Nascido natureza pura, para fazer-se homem à altura de sua história

ele precisa apropriar-se da cultura historicamente produzida. (PARO,

2008, p.24)

Isso requer clareza da especificidade histórica do homem,

decorrente de sua condição de sujeito – homem que faz história. Por meio de

seu caráter ético o homem cria valores, por meio do trabalho humano ele

transforma a natureza e, ao criar suas próprias condições de existência

histórica, cria a si mesmo. O homem se faz humano-histórico desenvolvendo

suas potencialidades e se apropriando de elementos culturais.

Neste contexto, assumir o homem histórico como o objetivo da

educação implica considerar a própria cultura humana em sua inteireza (os

valores da convivência democrática) como conteúdo da educação, tendo como

fim, quanto ao educando, “formá-lo como cidadão, afirmando-o em sua

condição de sujeito e preparando-o para atuar democraticamente em

sociedade” (PARO, 2008, p.27).

92

Neste processo a educação tem a missão de orientar no mundo.

Neste sentido, para Freire, o objetivo maior da educação é conscientizar o

aluno. Trata-se de aprender a realizar a leitura do mundo – “ler o mundo”, ler a

realidade, conhecê-la, para em seguida ser capaz de reescrever essa

realidade, isto é, transformá-la. Isto significa, em relação às parcelas

desfavorecidas da sociedade, levá-las a entender sua situação de oprimidas e

a agir em favor da própria libertação. A visão de mundo, portanto, dá-se a partir

da perspectiva do oprimido, pois o autor acredita que a pedagogia do oprimido

é

[...] aquela que tem que ser forjada com ele e não para ele, enquanto

homens ou povos, na luta incessante de recuperação da sua

humanidade. Pedagogia que faça da opressão e de suas causas

objeto da reflexão dos oprimidos, de que resultará o seu engajamento

necessário na luta por sua libertação, em que esta pedagogia se fará

e refará [...]. (FREIRE, 1987, p.17)

A educação tem, desta forma, caráter libertador. Num processo a

que Freire chamou de conscientização, os educandos podem conhecer

criticamente a própria realidade concreta; não apenas conhecer, mas, a partir

do conhecimento da realidade vivida, real, engajar-se num esforço de

transformação desta realidade.

A educação problematizadora e dialógica permite aos

desfavorecidos romper o que este educador denominou "cultura do silêncio" e

transformar a realidade, como sujeitos da própria história. Esta concepção de

educação é uma alternativa política para a “educação bancária” 22, pois

A educação que se impõe aos que verdadeiramente se

comprometem com a libertação não pode fundar-se numa

compreensão dos homens como seres “vazios” a quem o mundo

“encha” de conteúdos; não pode basear-se numa consciência

especializada, mecanicistamente compartimentada, mas nos homens

como “corpos conscientes” e na consciência como consciência

intencionada ao mundo. Não pode ser a do depósito de conteúdos,

mas a da problematização dos homens em suas relações com o

mundo. (p.38)

22

Na concepção bancária de educação, o professor age como quem deposita conhecimento num aluno apenas receptivo, dócil, ou seja, o saber é entendido como uma doação dos que se julgam seus detentores.

93

Compreende-se, portanto, de acordo com Vieira Pinto (2000), que

a tarefa precípua do educador que tem consciência crítica é continuamente

combater a todas as formas de alienação que afetam a sociedade,

principalmente aquelas que prevalecem no campo da educação.

Assim, como propõe Veiga (2009), é importante conceber a

formação do professor como agente social. É nesta ótica que se considera a

formação de professores sujeitos da sua ação docente, historicamente situados

e comprometidos com a realidade social em que se inserem.

Nesta direção, as reflexões de Gadotti (1995) e Giroux (1997)

fornecem elementos fundamentais que mostram a partir do pensamento

gramsciano, o qual propõe o educador como intelectual orgânico – um

educador comprometido com a construção de uma sociedade de relações mais

justas.

Na perspectiva gramsciana constitui um erro metodológico o

critério de se distinguir o trabalho nas modalidades manuais e intelectuais. O

saber, que nasce do fazer, provém de fazeres diferentes e contraditórios. É,

pois, necessário “reconciliar a atividade manual e intelectual no seio de um

mesmo indivíduo” (GRAMSCI, 1968, apud GADOTTI, 1995, p. 141).

Gadotti (1995) mostra que, para Gramsci, todos os homens são

intelectuais, e, se todos os homens podem ser considerados intelectuais, nem

todos exercem a função de intelectual. O intelectual se define pelo lugar e

função que ocupa no conjunto das relações sociais. É a classe que gera seus

intelectuais, e, por conseguinte, cabe ao intelectual um papel importante na

direção, organização e difusão de uma nova consciência.

No entanto, a conquista da consciência de classe não se dá por

si mesma, “ [...] a tomada de consciência não é espontânea, isto é, a formação

da consciência do indivíduo não é inata, exige esforço e atuação de elementos

externos e internos ao indivíduo” (GADOTTI, 1995, p. 139). Por isso a

necessidade de uma educação que seja eminentemente politizada.

Uma educação política supõe uma interpretação teórica das

necessidades das classes subalternas na qual o mesmo clima cultural entre

intelectual e massa abra espaço para uma unidade do sentir-saber-

compreender. Gramsci acredita, portanto, que a revolução a ser feita é uma

94

revolução intelectual e moral que se dará com o consentimento da sociedade

civil.

Giroux (1997), por seu turno, baseado no conceito de intelectual

orgânico de Gramsci, procura inseri-lo na questão da educação. Inspirado

nestas ideias gramscianas sobre o papel dos intelectuais na produção e

reprodução da vida social, rejeitando a tentativa de redução dos professores a

meros técnicos e contrapondo-se às ideias reprodutivistas, propõe o "professor

intelectual".

Para o autor , isto implica conceber o trabalho do professor como

tarefa intelectual crítica transformadora que esteja relacionada com os

problemas e experiências da vida diária, no sentido não só de compreensão

das condições do seu próprio trabalho, mas também de desenvolver

possibilidades para a crítica e a transformação das práticas sociais que se

constituem em torno da escola.

Ele afirma que o professor como intelectual transformador é

alguém não somente capaz de analisar e denunciar os vários interesses e

contradições na sociedade, mas um profissional apto para, também, articular

as possibilidades emancipatórias com vistas a sua efetivação. Neste modelo

de formação, a ação docente não é constituída apenas pela reflexão, mas pela

reflexão-ação, que envolve, necessariamente, o pensar e o agir.

Isto indica que o docente deve ser concebido não meramente

como um executor de tarefas técnicas ou instrumentais, comprometido com a

transmissão de um saber crítico, porém, como um profissional eminentemente

intelectual com potencial para produzir sua própria transformação social e

também a de seus alunos, considerando, sobretudo, a relação escola-

comunidade.

Neste contexto, as escolas devem ser vistas como “esferas

públicas democráticas”, ou seja, como espaço de luta e engajamento, onde

alunos e professores pelejem coletivamente buscando alterar as bases sobre

as quais se vive a vida, onde os docentes como “intelectuais transformadores”,

contribuam para a construção de uma sociedade mais democrática e mais

justa, educando a seu alunado como cidadãos críticos, ativos e comprometidos

na construção de uma vida individual e pública digna de ser vivida, guiados

pelos princípios de solidariedade e de esperança (CONTRERAS, 2002).

95

Acrescenta-se que, Giroux (1997) e McLaren (1997) entendem a

escola como esfera pública de fortalecimento do indivíduo em suas dimensões

individual e social, permeada por dinâmicas de engajamento popular e de

política democrática.

Conceber as escolas como “esferas públicas democráticas”, para

McLaren (1997) consiste em vê-las como espaços dedicados a formas de

conferir poder ao self e ao social, nos quais seja favorável aos alunos a

aprendizagem dos conhecimentos e das habilidades indispensáveis para a vida

em uma democracia de fato. Para que isto se realize é fundamental que o

docente compreenda que os fatores sociais e institucionais que condicionam

sua prática educativa, bem como a emancipação quanto às formas de

dominação que afetam seu pensamento e sua ação, não constituem processos

espontâneos, que se produzem naturalmente.

É imprescindível , pelo contrário, que o educador, a partir da

compreensão de seu papel, de sua função no âmbito da escola e da

sociedade, seja capaz, como expressa Giroux (1997), de unir a linguagem da

crítica com a linguagem da possibilidade para manifestar-se contra as injustiças

econômicas, políticas e sociais dentro e fora das escolas, opondo-se também a

grande parte dos discursos, das relações e das formas de organização do

sistema escolar.

A formação do professor como agente social deve se desenvolver

tendo por base a compreensão da totalidade, considerando as condições

concretas que abarcam a construção da sua profissionalidade, desde a

formação inicial e continuada até as condições de trabalho, salário, carreira e

organização da categoria.

A perspectiva de formação docente que ora se apresenta tem sua

lógica orientada na concepção crítica de educação. Segundo Kincheloe (1997),

esta visão é baseada num reconhecimento da opressão, e prova para a razão

que as forças desta opressão devem ser identificadas. Entretanto, Giroux

(1997) alerta que os professores podem não ser conscientes da natureza da

sua própria alienação.

Por este motivo é necessário que as propostas de formação de

professores criem condições para que estes compreendam a situação em que

se encontram. Sem este reconhecimento crítico da dominação e opressão, os

96

professores consideraram o local da escola como um valor neutro e entendem

o seu papel como o de educadores que, além de desvalorizar o domínio da

teoria, ainda evitam questões de pressupostos ideológicos, psicológicos e

pedagógicos que subjazem às suas práticas.

No entanto, o professor precisa compreender, como afirma

Carvalho (2005, p; 198),

[...] que a escola se configura como espaço de contradições, ao

mesmo tempo que se revela como instrumento eficaz na reprodução

das desigualdades sociais. Compreender que a escola se revela

ainda como espaço de desmascaramento das desigualdades [...].

Para Veiga (2009), portanto, pensar a formação do professor

nesta concepção supõe compreender que a preparação para o magistério deve

ser vista como uma tarefa complexa e inerentemente política.

No bojo destas idéias, Paro (2008) enfatiza que o educador

precisa “ter consciência política de sua função e do que ela representa na

construção de seres democráticos para uma sociedade democrática” (p.31-32).

Em outras palavras, o professor em sua condição de sujeito envolvido na

construção de personalidades humano-históricas, não pode permitir que seu

papel no processo ensino-aprendizagem se reduza ao de mero repetidor de

“conteúdos” para seus alunos. Ele tem a função de, como sujeito, propiciar

condições para que seus alunos se façam sujeitos. Por isso, além da utilização

de metodologia adequada e dos conhecimentos técnicos sobre a educação, ele

deve estar comprometido com o trabalho que realiza, ele precisa querer

ensinar para conseguir fazê-lo, tendo em vista a formação da personalidade do

educando.

Neste ponto, é importante assinalar que o pensamento político,

educativo e pedagógico de Paulo Freire (1988, 1999) tem se constituído como

um referencial fundamental para pensar a formação de educadores. Seus

estudos têm mostrado que não existe educação neutra, porque a educação

forma cidadãos para uma determinada sociedade, um determinado sistema

social, assumindo seus valores. Deste modo, ela, condiciona e,

simultaneamente, é condicionada pela sociedade em que está inserida; revela

e, ao mesmo tempo, é revelada pela política que assume. Ademais, a

97

educação é sempre intencional e diretiva, e é na sua diretividade que reside a

sua politicidade (FREIRE, 1999); Este educador esclarece que “a raiz mais

profunda da politicidade da educação se acha na educabilidade mesma do ser

humano, que se funda na sua natureza inacabada e da qual se tornou

consciente“ (p.124).

Por ser impossível que haja neutralidade na educação, o trabalho

do professor é inerentemente um ato político, pois ou se educa para o silêncio,

para a submissão, ou com a finalidade de dar a palavra, de não deixar calar as

angústias e a necessidade daqueles que se encontram nas esferas escolares.

É, pois, fundamental que o docente, sabendo o valor que tem para a

modificação da realidade, considere ,em seu processo formativo, como

princípio basilar a politicidade que envolve o seu trabalho, sendo consciente de

que, “se a educação não pode tudo, alguma coisa fundamental a educação

pode” (p.126) (grifo do autor).

Na visão freireana, a tarefa do professor como ato político implica

operar uma prática escolar humanizadora pautada em um fazer dialético e

problematizador no qual, por meio do diálogo construtivo, na relação

educador/educando se exercite o refletir e o agir, um educando o outro,

problematizando a realidade como processo, como devir, para a transformação

contínua dessa realidade, para a permanente humanização dos homens. A

ação educativa, sendo dialógica, deve ser baseada também nos

conhecimentos e na práxis dos educandos profundamente arraigada nos

contextos culturais destes, sendo a práxis aqui entendida como reflexão e ação

dos homens.

Nesta compreensão o autor propõe aos educadores assumirem

uma postura libertadora como opção para a superação da postura bancária

domesticadora que se realiza por um repasse automático de conhecimentos de

educador para educando.

Considerando, assim, que a dinâmica do trabalho educativo

precisa mudar, sugere que a prática educador/educando, como um ato

radicalmente político, realize como que entre fissuras, um movimento de

desvelamento da realidade com vistas à aproximação crítica desta realidade

para, então, promover a transformação social.

98

Também apontando o caráter político da educação, Contreras

(2002) menciona três dimensões básicas da profissão docente como

qualidades necessárias ao próprio trabalho de ensinar: a) a obrigação moral; b)

o compromisso com a comunidade; c) a competência profissional.

A primeira indica que o ensino supõe um compromisso de caráter

moral. Para o autor, acima das conquistas acadêmicas, o professor

compromete-se com os estudantes em seu desenvolvimento como pessoa e,

ao buscar o progresso na aprendizagem, exerce nos alunos e alunas influência

acerca de valores; “esta consciência moral sobre seu trabalho traz

emparelhada a autonomia como valor profissional” (p. 78).

A segunda dimensão dada à profissionalidade docente tem a ver

com a comunidade social em que os professores efetivam a realização de sua

prática profissional. No desenvolvimento do trabalho do educador, o autor leva

em consideração que as práticas sociais devem ser compartilhadas, pois “a

educação não é um problema da vida privada dos professores, mas uma

ocupação socialmente encomendada e responsabilizada publicamente”

(CONTRERAS, 2002, p. 79).

Com efeito, o professor deve reconhecer que está num jogo

político, pois,

Se a educação for entendida como um assunto que não se reduz

apenas às salas de aula, mas que tem uma clara dimensão social e

política, a profissionalidade pode significar uma análise e uma forma

de intervir nos problemas sociopolíticos que competem ao trabalho de

ensinar. Na medida em que a prática escolar pode estar

desempenhando algum papel na educação das pessoas, que tenha

algum efeito sobre suas vidas futuras, estamos falando de problemas

nos quais a pretensão da justiça e da igualdade social pode ter um

significado intrínseco à própria definição do trabalho docente.

(CONTRERAS, 2002, p. 81)

Por fim, o autor afirma que a obrigação moral e o compromisso

com a comunidade requerem uma competência profissional – a terceira

dimensão da profissão docente – que seja compatível com ambos. Ao fazer

menção à competência profissional, ressalta que ela deve ultrapassar os limites

puramente técnicos do recurso didático, e, assim, destaca as “competências

profissionais complexas que combinam habilidades, princípios e consciência do

99

sentido e das conseqüências das práticas pedagógicas” (CONTRERAS, 2002,

p. 83).

Ele contextualiza o ensino ponderando que

A atuação docente não é um assunto de decisão unilateral do

professor ou professora, tão-somente, não se pode entender o ensino

atendendo apenas os fatores visíveis em sala de aula. O ensino é um

jogo de “práticas aninhadas”, onde fatores históricos, culturais,

sociais, institucionais e trabalhistas tomam parte, junto com os

individuais. Deste ponto de vista, os docentes são simultaneamente

veículo através dos quais se concretizam os influxos que geram todos

estes fatores, e criadores de respostas mais ou menos adaptativas ou

críticas a esses mesmos fatores. (CONTRERAS, 2002, p. 75)

O exposto conduz a verificação de que é importante, sobretudo,

que a formação do educador seja permeada por condições que lhe possibilitem

confrontar-se com sua própria realidade concreta, não somente com o que ele

vê, mas por que ele vê e o que vê. É o que esclarece Kincheloe (1997, p. 192)

ao dizer que, “Quando aprendemos por que vemos o que vemos, nós estamos

pensando sobre o pensar, analisando as forças que moldam nossa

consciência, colocando o que nós percebemos num contexto significativo”

Embora no atual cenário educacional a Pedagogia tenha sido, a

despeito das considerações aqui tecidas, descaracterizada como ciência da

educação, excluída enquanto campo científico em relação às ciências sociais,

o pedagogo tem muito a fazer. Para que possa desempenhar o papel

emancipatório tão significativo no seu campo de trabalho é necessário a ele

acreditar e ousar para desvelar os condicionantes e determinantes de sua

prática, vislumbrando o papel e as possibilidades da educação frente às

exigências da sociedade contemporânea.

Cabe sublinhar que o pedagogo, como educador por excelência,

deve ser preparado para refletir sobre a realidade social, que é permeada por

contradições, para que, a partir destas, seja capaz de buscar ações com vistas

à formação integral de sujeitos, numa dimensão ética, para realmente educar e

formar cidadãos. Seu campo de trabalho são as salas de aula, a escola, e as

diversas instâncias educativas sociais e é aí, atuando como educador, que

poderá possibilitar reais transformações sociais, culturais, políticas e

econômicas.

100

Ora, pelo que já se expôs acima,vê se que a escola tem o papel

fundamental de propiciar aos seus alunos uma educação crítica. Neste

contexto, vale relembrar que é na Educação Infantil e nos primeiros anos do

Ensino Fundamental, locus de trabalho do pedagogo, que se inicia o processo

de aprendizagem em seu aspecto formal e sistematizado, e, no caso específico

do presente estudo, convém recordar que é onde são construídas as bases

para a formação Matemática dos alunos. Dando prosseguimento à linha de

raciocínio, importa enfatizar que, é necessário dar uma dimensão crítica à

educação matemática, recusando a neutralidade de seu ensino. Pelo contrário,

este deve ser considerado essencial para que os educandos desenvolvam

competências matemáticas que contribuam para a sua formação pessoal e

social.

Promover a formação de sujeitos emancipados passa pelo

enfrentamento das questões relacionadas ao ensino desta área do

conhecimento com vistas à superação do fracasso escolar da Matemática que

a escola tem produzido em seu seio. Na próxima unidade, portanto,

apresentam-se algumas contribuições de Ole Skovsmose (2001), que

protagonizou o movimento conhecido como Educação Matemática Crítica.

Considerando que o papel da Matemática é essencialmente crítico, o autor

acredita que a educação matemática, se promovida numa perspectiva crítica,

pode ajudar a desenvolver competências democráticas nos estudantes.

3.2 Formação de Professores para o Ensino da Matemática nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental

Neste tópico, numa primeira etapa, são apreciadas algumas

contribuições da perspectiva crítica da Matemática e seu ensino para melhor se

entender o papel deste último. Na segunda etapa, recorre-se aos estudos de

Edda Curi (2004) com o objetivo de estabelecer ligação entre esses resultados

e os dados desta pesquisa. Na sequência é apresentado o conhecimento

matemático23 na perspectiva tradicional e na perspectiva construtivista,

mostrando, de maneira sucinta, como o empirismo, o racionalismo e o

23

A formação do pedagogo na dimensão dos fundamentos da educação possibilita uma

compreensão razoável sobre as perspectivas tradicional e construtivista de educação.

101

interacionismo têm influenciado diretamente o processo educativo. O que se

pretende é situar as concepções sobre o conhecimento matemático e as

tendências do ensino da Matemática no Brasil.

3.2.1 Perspectiva crítica da Matemática e seu ensino

Na unidade anterior ficaram evidenciados os principais pontos da

Educação Crítica. Aqui se pretende mostrar suas consequências para a

Educação Matemática. Nos anos de 1980 surge no interior desta área um

movimento de cunho metodológico-filosófico denominado Educação

Matemática Crítica. Não se trata de um novo ramo de estudo da Educação

Matemática, mas sim de uma reflexão sobre os caminhos que podem ser

percorridos por ela,desde que haja uma preocupação critica com relação aos

pressupostos que envolvem o processo ensino-aprendizagem da Matemática.

As teorias da Educação Matemática de décadas anteriores

haviam negligenciado os aspectos de uma educação crítica e (vice-versa) e

serviam para uma “domesticação” dos estudantes, tendo em vista sua

adequação à sociedade tecnológica. Marcelo C. Borba, prefaciando a obra

“Educação Matemática Crítica: a questão da democracia” de Ole Skovsmose

(2001), relata que este movimento estabeleceu uma necessária ligação entre

a Educação Matemática e a Educação Crítica. Para Skovsmose (2001),

protagonista deste movimento, “é importante para a EC24 interagir com as

ciências técnicas e com a Matemática, para prevenir que a EC desapareça

como teoria educacional sem importância e acrítica” (p.35).

O movimento, inspirado nas ideias de Paulo Freire e da

Pedagogia Crítica traz as discussões a respeito dos aspectos políticos,

democráticos e tecnológicos para as aulas de Matemática. Elegendo como

foco principal os aspectos políticos da Educação Matemática, os debates

enfatizam as relações de poder implicadas na Matemática escolar, a partir das

seguintes questões:

24

EC – Educação Crítica.

102

[...] a quem interessa que a educação matemática seja organizada

dessa maneira? Para quem a educação matemática deve estar

voltada?

Como evitar preconceitos nos processos analisados pela educação

matemática que sejam nefastos para grupos oprimidos como

trabalhadores, negros, “índios” e mulheres? (BORBA, M. In:

SKOVSMOSE, 2001, pg. 7)

Por meio dessas perguntas analisam-se interesses sociais que

estão subentendido no currículo matemático e assuntos relacionados ao poder.

Por acreditar que os princípios fundamentais de estruturação do currículo são

derivados das relações de poder dominantes na sociedade e estão de acordo

com elas e, também, por entender que a Matemática está mais ligada às

questões sociais do que frequentemente se pensa, a EMC25 se propõe

desmascarar e extrapolar o currículo formal matemático.

Assim, preocupa-se com que as aulas de Matemática sejam

construídas considerando a vinculação desta ciência à realidade social do

estudante, seus contextos, seus anseios e interesses, pois acredita que o

conhecimento matemático é contextualizado, crítico e emancipador, sendo

subjacente às questões sociopolíticas, econômicas, culturais dos alunos e

comunidade.

A EMC tem, portanto, uma preocupação com as dimensões

políticas, sociais e culturais da educação. Os estudos de Ole Skovsmose

(2001), tendo como foco a democracia, evidenciam a presença dessas

dimensões na Educação Matemática Critica. A dimensão cultural é explicada

pelo autor recorrendo aos estudos da Etnomatemática desenvolvidos por

D‟Ambrósio (1984a). Esta tendência propaga que é possível identificar uma

competência matemática em diferentes ambientes culturais e que essas

competências se manifestam de diferentes formas: “Temos de aprender a

linguagem deles, sua lógica, sua história e sua evolução, sua ciência e sua

tecnologia a fim de estar a par de seus motivos e suas metas finais”

(D‟AMBRÓSIO, 1984, p. 32 apud SKOVSMOSE, 2001, p. 49).

Nesta perspectiva, a Matemática nas escolas deverá considerar

não somente os aspectos políticos e sociais, mas também os aspectos

culturais em que os estudantes estão inseridos, facilitando-lhes o

25

EMC – Educação Matemática Crítica.

103

conhecimento, o entendimento, a incorporação e a compatibilização da prática

popular conhecida e corrente dentro do currículo. Portanto,

A Educação Matemática Crítica preocupa-se com a maneira como a

Matemática em geral influencia nosso ambiente cultural, tecnológico e

político, e com as finalidades para as quais a competência

matemática deve servir. Por essa razão, ela não visa somente a

identificar como os alunos de forma mais eficiente, vêm a saber e a

entender os conceitos, [...]. A Educação Matemática Crítica está

também preocupada com questões como “de que forma a

aprendizagem da matemática pode apoiar o desenvolvimento da

cidadania” e „”como o indivíduo pode ser empowered através da

matemática”. (ALRO e SKOVSMOSE, 2006, p. 18)

Para Skovsmose (2001), a educação crítica é caracterizada pelos

termos-chave: competência crítica, distância crítica e engajamento crítico. O

conceito de competência crítica ressalta que os estudantes devem estar

envolvidos no controle do processo educacional. Alunos e professor devem

estabelecer uma distância crítica do conteúdo da educação: os princípios

aparentemente objetivos e neutros para a estruturação do currículo devem ser

investigados e avaliados. A educação deve ser orientada para problemas, isto

é, conduzida em direção a uma situação “fora” da sala de aula, e essa

orientação sugere a necessidade do engajamento crítico na educação.

Nesta perspectiva o ensino da Matemática não pode ficar restrito

à transmissão de conhecimentos matemáticos em que os alunos são

informados pelo professor, conforme o modelo de educação matemática

tradicional. Ao contrário, preocupando-se, sobretudo, com os aspectos políticos

da educação matemática, seu ensino deve se dar numa dimensão crítica que

possibilite aos estudantes reconhecer os modelos matemáticos presentes nos

fenômenos sociais, devendo auxiliá-los a apropriarem-se de ferramentas que

lhes ajudem a desocultar, analisar, compreender, criticar e até reformular esses

modelos.

Skovsmose (2001) considera a alfabetização matemática um

tema importante para a formação da competência democrática. Ele afirma que

a sociedade em que vivemos é altamente tecnológica e fortemente

matematizada e, neste contexto, a educação matemática deve ser

compreendida como parte integrante da tecnologia. Para o estudioso, a

104

Matemática faz, cada vez mais, parte do desenvolvimento social: “Se

„subtrairmos‟ a competência matemática da nossa sociedade altamente

tecnológica, o que fica? O resto não poderia ter muito em comum com a nossa

sociedade atual”, reflete ele, e acrescenta: “Isso significa que a matemática

tornou-se parte da nossa cultura” (SKOVSMOSE, 2001, p. 99). Afirmar que a

Matemática como parte de um desenvolvimento tecnológico está “fazendo

algo” pela sociedade implica dizer que ela tem poder de formatação e está

formatando a sociedade.

O que se pretende com a EMC é que os alunos aprendam como a

Matemática é utilizada socialmente para “formatar” a própria sociedade,

conhecendo os modelos e os pressupostos utilizados para essa construção

com a finalidade de desenvolver uma atitude crítica em relação a tais modelos.

Deste modo, “a alfabetização matemática, como constructo radical, tem de

estar enraizada em um espírito de crítica e em um projeto de possibilidades

que habilite pessoas a participarem no entendimento e na transformação de

sua sociedade” (SKOVSMOSE, 2001, p. 95). A questão salientada pelo autor é

que é possível conectar empowerment26 e educação matemática a fim de

ajudar a esclarecer o papel de “formatação” dos métodos formais na

sociedade.

Assim sendo, para ele “a competência matemática parece

constituir uma parte central da competência democrática” (p.58). Neste

entendimento, o ensino da Matemática pode propiciar aos alunos a formação

da competência democrática, desenvolvendo competências que lhes permitam

lidar com situações e problemas que envolvem formas de pensamento e de

resolução de problemas, tendo em vista a sua formação pessoal e social.

Para Skovsmose (2001) a alfabetização matemática pressupõe

três tipos de conhecimento: conhecimento matemático; conhecimento

tecnológico; conhecimento reflexivo.

26

O empowerment está relacionado ao entendimento de como a matemática e aplicada e

usada.Em virtude da riqueza de significados da palavra empowerment (dar poder a, ativar a

potencialidade criativa; desenvolver a potencialidade criativa do sujeito; dinamizar a

potencialidade do sujeito) o autor em seus textos mantém a palavra no original e em itálico.

(SKOVSMOSE, 2001, p. 66)

105

O conhecimento matemático é constituído por conhecimentos de

técnicas de cálculo e desenvolvimentos dedutivos em demonstrações de

teoremas. Prende-se, portanto, às habilidades matemáticas e está

marcadamente presente na educação matemática tradicional. São de

competências para reproduzir raciocínios matemáticos, teoremas e

demonstrações, bem como dominar uma variedade de algoritmos.

O conhecimento tecnológico, por sua vez, não pode ser reduzido

ao conhecimento matemático. Trata-se da habilidade de aplicar a Matemática à

construção de modelos, ou seja, do conhecimento sobre como constituir e usar

um modelo matemático. Este conhecimento objetiva a resolução de um

problema. É necessário para desenvolver e usar tecnologia e, não sendo inato,

deve ser aprendido na escola, por meio de atividade de aplicação da

Matemática em situações-problema. Este conhecimento nasce míope, não

sendo capaz de dirigir-se à autocrítica e, portanto, por si só, não é suficiente

para avaliar seus próprios resultados. Para ser possível aplicar a Matemática,

devem-se ter conhecimentos de Matemática e de sua aplicação. Mas esses

dois conhecimentos não satisfazem, é necessário também o conhecimento

reflexivo.

Por fim, o conhecimento reflexivo tem como objeto o uso da

Matemática. Assim sendo, tem a competência de refletir e avaliar tal uso. É

este conhecimento que dá a dimensão crítica à alfabetização matemática,

discutindo normas e valores. Ele não é de natureza técnica e, portanto, não é

redutível aos aspectos tecnológicos, e tem natureza dialógica.

O conhecer tecnológico e o reflexivo constituem dois tipos

diferentes de conhecimento, mas não independentes. Parece ser necessário

dominar algum conhecimento tecnológico que dê suporte às reflexões, contudo

é o desenvolvimento do conhecimento reflexivo que dá à alfabetização

matemática uma dimensão crítica.

Em relação à alfabetização matemática, é esta a ideia que o autor

tenta tornar significativa

Se a alfabetização matemática tem um papel a desempenhar na

educação – similar, mas não idêntico, ao papel da alfabetização –, na

tentativa de desenvolver uma competência democrática, então a

alfabetização matemática deve ser vista como composta por

106

diferentes competências: matemática, tecnológica e reflexiva. E,

acima de tudo, o conhecimento reflexivo tem de ser desenvolvido

para conferir à alfabetização matemática um poder radicalizado.

(SKOVSMOSE, 2001, p. 87-88, grifo do autor)

Assim sendo, a Educação Matemática pode desempenhar um

papel crítico ligado à natureza das formatações da sociedade de hoje: a

alfabetização matemática pode vir a ser um poder crítico, podendo ser usada

para o propósito de “libertação”, porque “pode ter o significado de organizar e

reorganizar interpretações de instituições sociais, tradições e propostas para

reformas políticas” (SKOVSMOSE, 2001, p.124).

De tudo o que foi exposto, fica claro que o ensino da Matemática

deve ser organizado para apoiar ideais democráticos. Por conseguinte, a sala

de aula deve tornar-se lugar de aplicação dos valores democráticos. Isso exige

repensar a relação professor-aluno, bem como examinar a natureza do

processo ensino-aprendizagem desta área do conhecimento.

Considerando que a aprendizagem deve colaborar para o

desenvolvimento da cidadania, o processo ensino-aprendizagem deve ter o

diálogo como elemento fundamental para o desenvolvimento da matemacia

27(crítica). “Para Alrø e Skovsmose (2006), „„Ensino e aprendizagem dialógicos

são importantes para a prática de sala de aula que apoia uma Educação

Matemática para a democracia” (p.142, grifo do autor). Aqui, a qualidade da

aprendizagem da Matemática é entendida como diretamente relacionada à

qualidade do diálogo em sala de aula. Portanto, o ensino da Matemática deve

ocorrer de maneira dialógica e desenvolvendo materiais de ensino-

aprendizagem libertadores 28. Esses materiais devem ser capazes de promover

um insight sobre as hipóteses integradas ao modelo (matemático) e, assim,

desenvolver um entendimento dos processos (por exemplo, processos de

decisão) na sociedade (SKOVSMOSE, 2001, p. 44).

27

A matemacia é apresentada por ALRØ e SKOVSMOSE (2006) e tem um significado paralelo ao da “literacia” (na interpretação de Paulo Freire) “Matemacia vem a ser mais do que um entendimento de números, gráficos, é também uma habilidade para aplicar números e gráficos a uma série de situações. Ela inclui também a competência para refletir e reconsiderar sobre a confiabilidade das aplicações.” (p.143) 28

As palavras “libertação” e “libertadores” são entendidas no sentido freiriano.

107

3.2.2 Algumas contribuições de um estudo sobre a formação inicial de professores e o ensino da Matemática nos Anos iniciais do Ensino Fundamental

De início é importante esclarecer que se têm visto muitos

trabalhos relacionados à formação de professores, contudo, Fiorentini et al.

(2003), mostram que ainda é pequeno o número de investigações efetivas por

educadores matemáticos brasileiros que envolvem a formação inicial de

professores para ensinar Matemática nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental.

Segundo o estudo até fevereiro de 2002 havia 112 teses e dissertações

defendidas nos programas de pós-graduação em Educação Matemática ou

Educação, mas apenas 10 referiam-se a formação inicial de professores

polivalentes e destas apenas um estudo deu destaque ao curso de pedagogia.

Considerando a temática trabalhada nesta dissertação, recorreu-

se a tese de doutoramento de Edda Curi, concluída em 2004, dada à natureza

do seu estudo. Intitulada “Formação de professores polivalentes: Uma análise

de conhecimentos para ensinar Matemática e de crenças e atitudes que

interferem na constituição desses conhecimentos”, a pesquisa analisou a

ementa de 36 cursos de pedagogia focando a grade curricular, os temas

tratados nas disciplinas de Matemática e as bibliografias recomendadas. Com

isso, o estudo em foco pretendeu refletir sobre o conhecimento e os saberes

desenvolvidos nestes cursos para o ensino da Matemática.

Alguns elementos delineados no estudo em pauta apontaram que

a maneira como o conhecimento matemático é abordado durante a formação

inicial nos cursos de Pedagogia, pouco tem contribuído para que os futuros

professores aprendam a conhecer a matemática e como ensiná-la e de que

modo o aluno aprende. A autora chama a atenção para a carga horária

destinada à formação para a área da Matemática, em média de 36 a 72

horas29, o que corresponde de 4% a 5% da totalidade da carga horária dos

cursos estudados.

No âmbito deste estudo ficou evidenciado que, aproximadamente,

90% dos cursos diagnosticados têm a preocupação situada na metodologia de

29

Nos currículos dos Cursos de Pedagogia das IES de Mato Grosso investigadas neste estudo a carga horária destinada a formação matemática do pedagogo é em média 4,5% da totalidade do curso, com exceção do UNIVAG que destina 1,84%.

108

ensino, elegendo, portanto, as questões metodológicas como essenciais à

formação do professor polivalente e, que pouca importância se é dada aos

conteúdos matemáticos e suas didáticas nos cursos focalizados. Assim sendo,

segundo a estudiosa

É possível considerar que os futuros professores concluem cursos de

formação sem conhecimentos de conteúdos matemáticos com os

quais irão trabalhar, tanto no que concerne a conceitos quanto a

procedimentos, como também da própria linguagem matemática que

utilizarão em sua prática docente. Em outras palavras, parece haver

uma concepção de que o professor polivalente não precisa “saber

Matemática” e que basta saber como ensiná-la.

(p. 76-77)

Os elementos analisados na investigação ora abordada

apontaram para a seriedade de se ter um olhar cauteloso para o modo como se

está propondo a formação inicial dos futuros professores no que se refere ao

ensino da Matemática para os Anos iniciais do Ensino Fundamental. É preciso

pondera, ainda, que as pesquisas têm mostrado a fragilidade do conhecimento

matemático dos docentes, seja este construído ao longo da escolarização do

professor ou na formação inicial propiciada nos cursos de Pedagogia.

A unidade seguinte mostra que o conhecimento matemático é

permeado de concepções que, de maneira significativa, incidem sobre a prática

docente no ensino desta área do conhecimento. Nas subunidades a seguir

esse conhecimento é abordado na perspectiva tradicional e na perspectiva

construtivista.

3.2.3 As concepções que permeiam a construção do conhecimento matemático

O modelo de ciência que prevalece num certo momento histórico

influencia as questões epistemológicas e as teorias de aprendizagem das quais

derivam a mediação pedagógica e suas práticas e reflete diretamente na ação

pedagógica do professor em sala de aula.

Para analisar e compreender a formação do professor [pedagogo]

que ensina a Matemática para os Anos Iniciais do Ensino fundamental faz-se

109

necessário distinguir as concepções de conhecimento matemático que ora se

apresentam mais próximas ao que é chamado de modelo tradicional de ensino,

ora ao modelo construtivista. Contribuíram para esta construção os teóricos

Hessen (1987), Piaget (1988, 1990); Kamii (1987); Fiorentini (1995).

3.2.3.1 O conhecimento matemático na perspectiva tradicional

Podemos caracterizar o modelo tradicional como integrado pelas

vertentes empirista e racionalista. O empirismo consiste no entendimento de

que o conhecimento vem do objeto (dado externo, experiência), da informação

sensorial, do exterior do indivíduo para o interior pelos sentidos. Tem suas

raízes em Locke (séc. XVIII), cuja visão era de que “todo o conteúdo mental

resultaria da experiência. A mente seria uma folha em branco, uma „tábua

rasa‟. Todas as idéias proviriam da experiência. Daí ser a educação um

processo de fora para dentro” (SILVA, 1989, p. 6 apud FIORENTINI, 1995, p.

10).

Nesta perspectiva o conhecimento matemático é visto como

externo ao sujeito: o seu ensino ocorre por transmissão dos conteúdos

centrados no objeto e a aprendizagem acontece por cansativos treinamentos

que geram a retenção de informações. O professor tem o papel ímpar de

detentor e transmissor do conhecimento, e o aluno, por sua vez, é tratado

como sujeito passivo, receptor e reprodutor de informações.

Já na corrente racionalista, o objeto de conhecimento não é algo

concreto, mas trata-se de um objeto do pensamento, cuja construção teórica

efetua-se pela razão. Nesta concepção o conhecimento matemático é

entendido como se estruturado internamente ao sujeito, que, pela intuição e

reminiscência, pode descobrir as ideias matemáticas que preexistem em um

mundo ideal e que estão adormecidas em sua mente (os conhecimentos são

inatos). O ensino, portanto, caracteriza-se pela transmissão dos conteúdos

centrados no sujeito.

Fiorentini (1995) enfatiza que a influência dessas ideias no

processo de ensino e aprendizagem da Matemática resultou na concepção

platônica da matemática que faz dicotomização entre o mundo das idéias e o

110

mundo das coisas. Esta concepção se caracteriza por uma visão mecânica,

estática, a-histórica e dogmática das idéias matemáticas, como se elas

existissem independentemente dos seres humanos. O ponto central desta

concepção está na ideia que só alguns aprendem, só alguns tem o dom para

aprender a Matemática.

Essas duas correntes – empirista e racionalista – influenciaram

intensamente a prática dos docentes. Neste modelo, todo o processo ensino-

aprendizagem está centrado no professor, que, sendo o detentor do saber e o

dono da verdade dentro de uma sala de aula, dirige a aprendizagem do aluno,

o qual que se reduz a mero receptor de informações que devem ser

armazenadas na memória para depois serem devolvidas nas provas da mesma

forma como foram ensinadas.

Piaget (1988, p. 163) afirma que nesta visão de educação a

criança foi sempre tratada como um pequeno adulto que raciocina e pensa

como nós, entretanto desprovido de conhecimentos e de experiência.

Sendo a criança, assim, apenas um adulto ignorante, a tarefa do

educador não era tanto a de formar o pensamento, mas sim de

equipá-lo; as matérias fornecidas de fora eram consideradas

suficientes ao exercício.

O professor que cabe nesta perspectiva tradicional de ensino é

aquele profissional cuja noção de conhecimento consiste no acúmulo de fatos e

informações isoladas. A ênfase do seu trabalho está nas respostas certas, que

devem ser a repetição perfeita e integral dos livros, onde há uma resposta

correta para cada questão ou problema.

Assim sendo, na visão tradicional de ensino cabe ao docente a

função de apenas transmitir conhecimentos que já se encontram estruturados,

prontos e acabados. A prática consiste em ir depositando conhecimentos em

um aluno do qual se espera ser um ouvinte dócil, num processo que Paulo

Freire (1987) atribui à concepção “bancária” da educação. O professor, com a

finalidade de responder e encontrar as respostas certas, porque precisa

demonstrar sua sabedoria e impor seus conhecimentos, impede que o

educando elabore seu próprio conhecimento.

111

Então, para discutirmos a formação do professor que ensina a

Matemática para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental é imperioso

compreender que o ensino desta área do conhecimento num modelo tradicional

de ensino trata o conhecimento como informações, coisas e fatos a serem

transmitidos ao aluno e que esta é concebida como ciência pronta e acabada.

O que se exige, principalmente, é que as informações sejam apenas

decoradas, ou seja, memorizadas.

Neste sentido, Kamii (1987), em seus estudos que tratam de

assuntos ligados à natureza do número e à aplicação destes conhecimentos à

prática pedagógica de professores de crianças, aponta que, no modelo

tradicional de educação, a Matemática tem sido ensinada sem que se leve em

consideração seu processo de construção.

O problema, segundo a autora, é que, nesse modo de ensinar, a

criança deixa de ser encorajada a pensar ativa e autonomamente em todas as

situações. Com efeito, quando as escolas ensinam tradicionalmente, elas

coíbem o desenvolvimento da autonomia das crianças reforçando sua

heteronomia e, assim procedendo, impõem grandes limites ao essencial

desenvolvimento do pensamento crítico do aluno.

Ora, Piaget esclarece que “a finalidade da educação deve ser a

de desenvolver a autonomia da criança, que é, indissociavelmente, social,

moral e intelectual” (PIAGET, 1948 apud KAMII, 1987, p. 33). O educador

Paulo Freire (1999) em suas reflexões acerca dos saberes necessários à

prática educativa reforça este entendimento ao dizer que é absolutamente

necessário que autonomia seja entendida como parte da própria natureza

educativa sendo que as relações entre educador e educando devem ser

permeadas pela reinvenção do ser humano no aprendizado de sua autonomia.

Assim, propugna que “o respeito à autonomia e à dignidade de cada um é um

imperativo ético e não um favor que podemos ou não conceder uns aos outros”

(p.66).

O que ele evidencia é que todo educador deve ter claro que

ensinar extrapola o conceito de transferir conhecimentos, ensinar os

conteúdos. Implica, sim, criar possibilidades para a produção ou construção

destes com vistas a formar cidadãos conscientes, críticos que sejam capazes

de transformar a realidade em que vivem.

112

Posto isto, é importante assinalar que, em oposição ao modelo

tradicional de ensino pautado nas ideias do empirismo e do racionalismo,

temos o interacionismo. Kant tentou resolver a divergência entre empirismo e

racionalismo por meio da filosofia da interação, sendo o primeiro teórico do

interacionismo. Nesta concepção, a origem do conhecimento não é encontrada

nem no sujeito nem no objeto, mas na relação entre ambos.

Jean Piaget, um dos principais representantes do interacionismo,

não apresenta oposição radical às teorias racionalista e empirista. Para ele os

dois modelos epistemológicos, ao buscar o conhecimento da verdade, cada

qual por seu meio, têm razão em determinados fatos. É justamente a partir

dessas razões que ele dá o chamado “salto de qualidade”: o entendimento de

que o conhecimento se constrói na interação da experiência e da razão,

passando, portanto, pelos dois processos.

Conforme estas posições, Piaget propôs um tertium, por meio da

epistemologia genética (construtiva), tornando-se o criador do construtivismo,

que pode ser considerado hoje como a reformulação do interacionismo de

Kant. Na sequência desenvolve-se um breve comentário sobre o conhecimento

matemático na perspectiva do modelo construtivista.

3.2.3.2 O conhecimento matemático na perspectiva construtivista

O construtivismo pode ser entendido como uma teoria situada no

campo da epistemologia genética que enfatiza as estruturas cognitivas do

sujeito na apreensão do objeto do conhecimento. Segundo Piaget (1990), a

fonte do conhecimento é tanto externa (conhecimento físico) como interna

(conhecimento lógico-matemático), daí que o conhecimento é construído pelo

sujeito que age sobre o objeto percebido interagindo com ele, sendo as trocas

sociais condições necessárias para o desenvolvimento do pensamento. Assim

sendo, sob a influência do meio o sujeito responde aos estímulos

externos agindo sobre eles para construir e organizar o seu próprio

conhecimento, de forma cada vez mais elaborada.

Na perspectiva piagetiana, o ser humano vai aprendendo,

sabendo, construindo sua inteligência por meio da assimilação e acomodação.

113

Estes dois processos buscam reestabelecer um equilíbrio mental perturbado

pelo contato com um dado incompatível com aquilo que se conhece até então

(princípio de equilibração). Parte-se do pressuposto de que a atividade criadora

se dá no pensamento e é construída e reconstruída a todo instante.

Nesta concepção os conhecimentos presentes no indivíduo

devem ser levados em consideração, pois o sujeito não é visto como tabula

rasa, desprovido de conhecimentos prévios. O aluno não é um recipiente, no

qual o professor deposita conceitos, como no modelo tradicional; ele é

considerado não mais como um ser passivo, mas como protagonista da

construção de sua aprendizagem, devendo estar constantemente mobilizado

para pensar e construir o seu próprio conhecimento pelas conexões que

estabelece com seu conhecimento prévio num contexto de resolução de

problemas.

A implementação da ação educativa em sala de aula que se firme

na perspectiva construtivista requer uma mudança de atitude e postura do

professor, pois, à medida que se redefine o papel do aluno perante o saber, é

preciso redimensionar também o papel do professor, inclusive, do que ensina a

Matemática no Ensino Fundamental. Neste sentido, a abordagem do

conhecimento matemático requer, principalmente, que o professor considere a

relação existente entre experiência e reflexão, pois é na ação do sujeito sobre o

objeto, por meio da abstração reflexiva que ocorre o desenvolvimento da

aprendizagem.

Segundo esta visão, o papel do educador passa a ser o de

organizador, consultor, mediador, controlador e incentivador das

aprendizagens, cabendo a ele, neste processo, propiciar ao educando a ajuda

necessária para que os conhecimentos matemáticos sejam significativos para

este. Isso implica uma reflexão crítica da percepção do professor visto que,

tendo sido educado de modo a conceber a Matemática como coisa pronta, ele

tem dificuldade para vê-la como coisa em construção.

Expostos, de maneira sucinta, os princípios basilares do

conhecimento matemático nas perspectivas tradicional e construtivista, a seguir

são abordados alguns modos de ver e conceber o ensino da Matemática a

partir do estudo das concepções que permeiam o ensino desta área do

conhecimento em nosso país.

114

3.2.4 O estudo de Fiorentini acerca de alguns modos de ver e conceber o

ensino da Matemática no Brasil

A docência é uma profissão aprendida ao longo da vida. É preciso

considerar que o aluno, futuro professor, ao iniciar o curso de Pedagogia e o

estudo de cada disciplina do mesmo, já apresenta concepções, crenças,

valores muito arraigados sobre a profissão, o papel do professor e da escola, o

que é ensinar e como se ensina e o que é aprender. Tais crenças, valores e

concepções, que definem fortemente as decisões pedagógicas, podem passar

intactas pelo curso; podem ser reforçadas; ou, o que seria desejável, podem

ser objeto de análise e reflexão que propiciem o seu reconhecimento.

As concepções apropriadas pelos professores ao longo da sua

formação influenciam profundamente seu trabalho educativo, de modo que

cada professor constrói seu ideário pedagógico de maneira idiossincrática a

partir de pressupostos teóricos; de sua experiência enquanto estudante; e,

ainda, de sua reflexão sobre a prática. Esta construção, portanto, tem fortes

implicações no modo como ele entende e pratica o ensino.

Com foco principalmente no contexto histórico brasileiro, Fiorentini

(1995) em seus estudos do estado da arte, sem ter a pretensão de dar conta

da diversidade de tendências presentes na práxis pedagógica do ensino da

Matemática, aponta várias tendências em Educação Matemática mostrando,

assim, alguns modos de ver e conceber o ensino da Matemática no Brasil.

O autor identifica seis tendências, quais sejam: a formalista

clássica; a empírico-ativista; a formalista moderna; a tecnicista e suas

variações; a construtivista e a socioetnoculturalista e assinala mais outras duas

consideradas emergentes: a histórico-crítica e a sociointeracionista-semântica.

A tendência formalista clássica, pautada nas ideias e formas da

Matemática clássica, segue o modelo euclidiano, caracterizado pela

sistematização lógica do conhecimento matemático, que se manifesta por meio

de teoremas e corolários deduzidos de axiomas, postulados e definições. Traz

também aspectos da concepção platônica de Matemática, que, como já

referido neste texto, revela-se através de uma visão estática, a-histórica e

dogmática das ideias matemáticas.

115

Sendo uma concepção inatista, defende que “a Matemática não é

inventada ou construída pelo homem” (p.6). Este pode, pela intuindo e

recordando, descobrir as ideias que já existem no mundo ideal e que se

encontram adormecidas em sua mente. Consequentemente, o ensino, nesta

tendência, é fortemente livresco e centrado no professor como transmissor e

expositor de conteúdo por meio de preleções ou desenvolvimentos teóricos na

lousa.

A aprendizagem do aluno é considerada passiva e baseada na

memorização e na reprodução (imitação/repetição) exata dos raciocínios e

procedimentos prescritos pelo professor e pelos livros. Daí, a função do

professor consiste em passar ou dar aos alunos os conteúdos prontos e

acabados, que já haviam sido descobertos, e se apresentam sistematizados

nos livros didáticos, bastando-lhe apenas o conhecimento da matéria que irá

ensinar, enquanto que ao discente cabe a tarefa de copiar, repetir, reter e

devolver nas avaliações tal qual recebeu.

Quanto ao foco sóciopolítico, Fiorentini (1995) ressalta, num breve

histórico, que nesta tendência a aprendizagem da Matemática era considerada

privilégio de poucos “bem dotados” intelectual e economicamente. O que

existia era um dualismo curricular no ensino ciência, ou seja, para a classe

dominante, que compreendia a elite dirigente e clerical, o ensino era mais

racional e rigoroso, garantido pela geometria euclidiana e, para as classes

menos favorecidas – especialmente alunos das escolas técnicas – ensinava-

se, preferencialmente, o cálculo e a abordagem mais mecânica e pragmática.

Esta tendência perdurou no Brasil até o final da década de 50.

Em oposição à escola clássica tradicional, surgiu no país, a partir

da década de 20, a tendência Empírico-Ativista, no seio do movimento

escolanovista. Segundo Fiorentini (1995)

Essa tendência atribui como finalidade da educação o

desenvolvimento da criatividade e das potencialidades e interesses

individuais de modo a contribuir para a constituição de uma

sociedade cujos membros se aceitem mutuamente e se respeitem na

sua individualidade. (p.11)

Assim sendo, defende que as experiências de ensino devem

corresponder aos interesses dos alunos e às exigências da sociedade. O aluno

116

passa a ser um sujeito ativo considerado o centro das aprendizagens, e o

docente assume a função de orientador e facilitador destas aprendizagens. O

currículo passa a ser organizado com base no interesse do aluno a fim de

atender ao seu desenvolvimento psicológico e biológico.

Inspirada na corrente empirista, que tem a crença de que o

conhecimento provém de fontes externas ao indivíduo e na pedagogia ativa,

que considera importante não apenas aprender, mas aprender a aprender,

acredita que as ideias matemáticas são obtidas por descoberta. Nisto ela não

rompe com a concepção idealista de conhecimento, contudo se diferencia por

acreditar que as ideias preexistem não num mundo ideal, mas no próprio

mundo natural e material em que vivemos. Portanto, para os empírico-ativistas,

“o conhecimento matemático emerge do mundo físico e é extraído pelo homem

através dos sentidos” (FIORENTINI, 1995, p.9). O conhecimento matemático,

pois, emergiria do mundo sensível por meio da ação, da manipulação ou

experimentação pelos alunos.

Prioriza-se como prática de ensino o método associacionista30 e o

método da descoberta31, que sugerem o desenvolvimento de atividades em

pequenos grupos utilizando como ferramenta pedagógica os jogos, muitos

materiais manipulativos (visuais e táteis) e outras atividades lúdicas e/ou

experimentais com o intuito de possibilitar aos alunos a descoberta e

redescoberta dos conceitos matemáticos por meio de situações vivenciadas.

Portanto, é característica desta tendência, entre outras, acreditar

que o aluno „aprende fazendo‟. Por isso, didaticamente, irá valorizar, no

processo de ensino, a pesquisa, a descoberta, os estudos do meio, a resolução

de problemas e as atividades experimentais” (p.11); foi retomada, no Brasil, a

partir da década de 70, no bojo do movimento tecnicista, que se verá logo.

Ainda, de acordo com Fiorentini (1995), outra tendência que

influenciou a prática pedagógica foi a formalista moderna. Irrompeu no Brasil

no início da década de 60, sob influência do Movimento da Matemática

Moderna (MMM), o qual buscava reformular e modernizar o currículo escolar

30

“Para o associacionismo, a criança „abstrai‟ ou „aprende‟, por exemplo, o número 5, a partir da associação de seu sinal „5‟ com „5 objetos‟ (pedras, carrinhos, canetas, bolinhas de gude...) e com a palavra falada „cinco‟” (FIORENTINI, 1995, p.9). 31

Um exemplo deste método “é a atividade onde o aluno redescobriria que a soma dos ângulos internos de um triângulo é 180º, a partir do recorte e da reunião dos vértices de um ou mais triângulos” (FIORENTINI, 1995, p.10).

117

vigente. Entre outros propósitos, o MMM pretendia dar mais ênfase aos

aspectos estruturais e lógicos da Matemática destacando “o uso preciso da

linguagem matemática, o rigor e as justificativas das transformações algébricas

através das propriedades estruturais” (p.14). Esta tendência representou um

retorno ao formalismo matemático.

Tendo como foco a formação do especialista e não a formação do

cidadão em si, ela não resultou em grandes mudanças na relação professor-

aluno nem tampouco no processo ensino-aprendizagem, já que o ensino

prosseguiu centrado no professor e o aluno continuou sendo considerado

passivo.

Uma outra tendência identificada pelo autor é a tecnicista (p.15-

18), que surgiu, no Brasil, no contexto do regime militar a partir de 1964 e

entendia ser necessário introduzir a escola nos modelos de racionalização do

sistema de produção capitalista a fim de torná-la “eficiente” e “funcional”.

Influenciada pela concepção funcionalista, que propugnava que a sociedade

deveria ser um sistema organizado e funcional e fundamentada no

behaviorismo, para o qual a aprendizagem consiste em mudanças

comportamentais através de estímulos, apontava como solução para os

problemas do ensino e da aprendizagem da Matemática o emprego de técnicas

especiais de ensino e de administração escolar (controle/organização do

trabalho escolar).

Nela, a aprendizagem da Matemática consiste, basicamente, no

desenvolvimento de habilidades e atitudes, na fixação de conceitos ou

princípios, o que pode ser feito por meio de jogos e outras atividades

estimulantes que facilitem a memorização e o exercício operante para o

referido desenvolvimento.

A finalidade do ensino da Matemática está em desenvolver

habilidades e atitudes computacionais e manipulativas que preparem recursos

humanos tecnicamente “competentes”. O ensino é centrado nos objetivos

instrucionais e nos recursos (materiais instrucionais, calculadoras etc.) e

técnicas de ensino, restando ao professor e ao aluno posição secundária de

meros executores de um processo cuja concepção, planejamento,

coordenação e controle ficam a cargo de especialistas.

118

Os conteúdos são encarados como informações, regras, macetes,

disponíveis nos livros didáticos e outros materiais (módulos de ensino, jogos

pedagógicos, kits de ensino, dispositivos audiovisuais, programas

computacionais...). A preocupação gira em torno de memorização de princípios

e fórmulas; habilidades de manipulação de algoritmos ou de expressões

algébricas e habilidades na resolução de problemas-tipo, sendo raras as

atividades que exigem do aluno explicações, ilustrações, construção de

modelos matemáticos que descrevam situações-problema, análises,

justificações ou deduções.

Nestas situações, a Matemática se torna um treinamento de

técnicas e procedimentos, com os alunos buscando, sempre, um modo mais

rápido para chegar às respostas de questões padronizadas, não existe

preocupação em desenvolver de fato a aprendizagem por meio do exercício da

criatividade do estudante, pois não é intenção desta visão tecnicista de ensino

formar o indivíduo não-alienado, crítico e criativo, que saiba situar-se

historicamente no mundo.

Já, a tendência construtivista, cuja base está na epistemologia

genética de Jean Piaget, defende que

o conhecimento matemático não resulta nem diretamente do mundo

físico, como afirmava o empirismo, nem de mentes humanas isoladas

do mundo, como apregoava o racionalismo, mas sim da ação

interativa/reflexiva do homem com o meio ambiente e/ou atividades

(FIORENTINI, 1995, p.20).

Fiorentini (1995) afirma que, no Brasil, o construtivismo apareceu

a partir das décadas de 60 e 70, alcançando crescimento significativo a partir

dos anos 80. Nesta concepção a Matemática é vista como uma construção

humana composta por estruturas e relações abstratas entre formas e

grandezas.

Para melhor entendimento, é bom salientar que na perspectiva

piagetiana o conhecimento matemático deve ser organizado em torno das

estruturas lógico-aritmética e espaço-temporal, construídas pela criança por

meio de abstração reflexiva (equilibração) e tais estruturas, agrupadas,

resultam na estrutura lógico-matemática.

119

Assim, os conceitos matemáticos são apreendidos por meio da

abstração reflexiva feita interativamente/operativamente pela mente à medida

que a criança constrói relações entre objetos, ações ou ideias já construídas.

Portanto, nesta concepção “A Matemática é vista como um constructo que

resulta da interação dinâmica do homem com o meio que o circunda”

(FIORENTINI, 1995, p.20).

Tendo em vista a possibilidade de tal conhecimento matemático

estar, sempre, sendo criado, prioriza mais o processo que o produto do

conhecimento. Assim sendo, parte do pressuposto de que a atividade criadora

se dá no pensamento e é construída e reconstruída a todo instante, desde as

mais simples até chegar às mais complexas elaborações alcançadas em busca

de resoluções para problemas desafiantes.

Segundo o autor, esta concepção considera que mais importante

do que aprender isto ou aquilo é aprender a aprender e desenvolver o

pensamento lógico-formal. Nesta compreensão a finalidade precípua do ensino

da Matemática é de caráter formativo, com os conteúdos passando a

desempenhar papel de recursos utilizáveis, porém não indispensáveis, para a

construção e desenvolvimento das estruturas básicas da inteligência.

Observe-se, também, que o construtivismo passou por

transformações e, ampliando seus pressupostos, experimentou novas

abordagens e novas reinterpretações que apresentam uma configuração

menos estruturalista. Nesta trilha, Fiorentini (1995) menciona Crusius (1994) e

exemplifica o que este define como sendo uma prática pedagógica

“construtivista-interacionista”.

Nesta visão o aluno, sendo considerado sujeito do processo de

construção dos conceitos matemáticos e não mero receptor destes, é levado a

observar e manipular o que vê para produzir significados, representar imagens,

fazer comparações entre o imaginado e o objeto real, errar e descobrir no erro

a possibilidade de construção do conceito que estudou, o que permite levantar

hipóteses, testá-las e, assim, poder voltar atrás e refazer a trajetória.

O erro passa a ser visto não como alguma coisa negativa, ruim,

mas como um reflexo do pensamento da criança, uma revelação positiva de

grande valor pedagógico a partir da qual o professor pode, investigando as

estratégias utilizadas na resolução, propor a intervenção necessária.

120

Cabe ao professor, deste modo, buscar conhecer o processo e

entender o momento da ocorrência do erro e, principalmente, o motivo, a razão

e a lógica que o gerou para, então, com diálogos e atividades que

proporcionem o desequilibrar e a acomodação de novas estruturas, procurar

favorecer a descoberta dos caminhos certos e a construção do conhecimento

de forma prazerosa e significativa.

A contestação em torno desta perspectiva se refere ao seu viés

psicologizante, que entende ser a Psicologia o núcleo central da orientação

pedagógica; segundo Fiorentini (1995, p. 23)

Há que se considerar, todavia, que a Psicologia não é uma

Pedagogia, nem uma teoria educacional. A Psicologia, ao pesquisar

como o indivíduo aprende, fornece subsídios valiosos à Pedagogia.

Isso não implica, porém, que devamos tomá-la como única fonte de

orientação para a prática pedagógica.

Face a estudos desta natureza, as tendências pedagógicas para o

ensino da Matemática fundamentadas no construtivismo têm sofrido um

deslocamento do foco, qual seja: de um construtivismo preocupado com o

desenvolvimento de estruturas mentais para um mais relacionado à construção

ou formação de conceitos, que contempla outras dimensões, como por

exemplo as sociais, as culturais e políticas na elaboração do conhecimento

matemático.

Outra tendência para o ensino da Matemática apontada pelo

estudioso é a tendência socioetnocultural. Sua finalidade consiste em

desmistificar e compreender a realidade, valorizando o saber popular trazido

pelo aluno a fim de encorajá-lo a produzir saberes sobre a realidade concreta.

Seu embasamento basilar, no âmbito da Educação Matemática, é o Programa

Etnomatemática, que tem em Ubiratan D‟Ambrósio o principal idealizador e

representante, e é definido por este como “uma arte ou técnica de explicar, de

conhecer, de entender nos diversos contextos sociais” (D‟AMBRÓSIO, 1990, p.

81 apud FIORENTINI, 1995, p. 25)

Fiorentini (1995) destaca que

O grande mérito da Etnomatemática foi trazer uma visão de

Matemática e Educação Matemática de feição antropológica, social e

121

política, que passam a ser vistas como atividades humanas

determinadas socioculturalmente pelo contexto em que são

realizadas. (p.25)

Apoia-se também nas ideias libertadoras de Paulo Freire,

fundadas na ética, no respeito à dignidade e à própria autonomia do educando.

Inspirados neste ideário, vários educadores matemáticos passaram a aplicar

seus conceitos ao ensino da Matemática concebendo-o como ferramenta para

a compreensão e transformação da realidade e a libertação dos oprimidos ou

marginalizados socioculturalmente (FIORENTINI, 1995).

Este modo cultural-antropológico de ver e conceber o ensino da

Matemática valoriza os contextos socioeconômicos, culturais e políticos. Assim

sendo, como enfatiza Fiorentini (1995, p. 26)

O conhecimento matemático deixa de ser visto, como faziam as

tendências formalistas, como um conhecimento pronto, acabado e

isolado do mundo. Ao contrário, passa a ser visto como um saber

prático, relativo, não-universal e dinâmico, produzido histórico-

culturalmente nas diferentes práticas sociais, podendo aparecer

sistematizado ou não.

Deste modo, a prática pedagógica neste ideário toma como ponto

de partida do processo ensino-aprendizagem dos saberes matemáticos a

identificação dos problemas da realidade. Considera que os conhecimentos

dos alunos sejam respeitados e aplicados aos conteúdos ensinados,

mostrando que a realidade concreta do educando deve estar dentro do

aprendizado. A sala de aula é, neste entendimento, concebida com espaço

para a formação crítica em relação ao mundo que o aluno conhece.

Essa tarefa tem o diálogo como fonte geradora de reflexão, o

que, nesta perspectiva, exige um envolvimento conjunto do professor e do

aluno, numa relação dialógica. Cabe ao professor ser o mediador pedagógico

que funciona como facilitador das relações e problematizador das situações na

sala de aula. O seu trabalho deve instigar o aluno a desafiar e a pensar

criticamente, o que implica converter a sala de aula em uma comunidade de

investigação. Assim, o ensino da Matemática deve estar relacionado ao

cotidiano, à cultura do educando, a fim de possibilitar a compreensão e a razão

122

de ser de alguns dos saberes socialmente construídos na prática comunitária

em relação ao ensino dos conteúdos.

O ato educativo, por meio da problematização desta realidade e

do mundo, deve ter por intencionalidade encorajar o educando a pensar sobre

seus próprios pensamentos, para que seja levado a reconhecer sua própria

condição humana de um ser-no-mundo e também como um ser-com-os-outros.

Nesta visão, compete ao educador não só ensinar a matéria, mas,

por meio dos saberes matemáticos, demonstrar a realidade do mundo em que

o educando está inserido para que seja cidadão consciente, comprometido com

a transformação da sociedade, uma pessoa capaz de construir conhecimento,

um sujeito crítico e não acomodado.

Fiorentini (1995) aponta, ainda, mais duas tendências emergentes

na década de 90, a tendência histórico-crítica e a tendência sociointeracionista-

semântica.

A primeira se caracteriza por uma postura crítica e reflexiva diante

do saber escolar, do processo ensino-aprendizagem e do papel sóciopolítico da

educação escolarizada. Entende a Matemática como um saber vivo, dinâmico

que, historicamente, vem sendo construído, nas e pelas relações sociais, com

o objetivo de atender às necessidades concretas dos homens e culturas, mas

que, distanciando-se daqueles conteúdos dos quais se originou, resultou em tal

nível de abstração e formalização que se tornou de difícil acesso e passou a

ser visto como privilégio de poucos. Assim sendo, propõe que para ensinar a

Matemática é necessário contextualizar o conhecimento tecido historicamente

a fim de que o aluno seja capaz de atribuir sentido e significados às ideias

matemáticas podendo pensar, estabelecer relações, justificar, analisar, discutir

e criar sobre estas idéias. (FIORENTINI, 1995)

A outra, a tendência sociointeracionista-semântica, é

fundamentada em Vygotsky, que entende a linguagem como elemento que

constitui o pensamento. Tendo a questão da produção de significados como

ideia central, considera que o ensino da Matemática deve levar o estudante a

aprender significar, isto é, a “estabelecer relações possíveis entre fatos/ideias e

suas representações (signos)” (p.33). Nesta visão, portanto, aprender é

significar. O professor é visto como alguém mais capaz do que o aluno de

processar e estabelecer relações. Seu papel é mediar as relações que o aluno

123

estabelece com o conhecimento matemático planejando atividades ricas em

significados.

Por fim, Fiorentini (1995) esclarece o caráter dinâmico e dialético

que envolve o processo de construção de um ideário pedagógico, seja

individual ou coletivo.

[...] se estamos permanentemente refletindo sobre nossa prática

pedagógica, se discutimos com nossos pares, se pesquisamos e

buscamos continuamente novas fontes teóricas e novas alternativas

de ação em sala de aula,..., então é de se esperar que nosso ideário

também esteja em permanente mutação. (p.29)

Após essa contextualização sobre alguns pressupostos teóricos

que integram a formação de professores para o ensino da Matemática nos

Anos Iniciais do Ensino Fundamental, faz-se mister realizar a análise

sistematizada dos dados da pesquisa. O capítulo seguinte traz a apresentação

e análise dos dados coletados em entrevistas realizadas com algumas

professoras, egressas de cursos de Pedagogia, que ensinam a Matemática

para a 1ª e 2ª fases do II Ciclo do Ensino Fundamental na Rede Pública

Municipal de Rondonópolis – MT; antes, porém, apresenta e caracteriza as

docentes, colaboradoras dos debates.

124

4 O PEDAGOGO E O DESAFIO DE ENSINAR MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

Este capítulo é destinado à apresentação e análise dos dados do

presente estudo. Na intenção de buscar compreender a formação do pedagogo

para o ensino da Matemática, esta investigação, num primeiro momento,

preocupou-se em trazer um arcabouço teórico acerca da Pedagogia com o fim

retomar a figura do pedagogo. Noutro momento apresentou um embasamento

teórico sobre a formação de professores desta área do conhecimento numa

visão crítica da educação, e, ainda, as concepções que permeiam o seu

ensino. Esta análise dá destaque a essas teorias e tem como foco mostrar a

importância da formação desenvolvida no curso de Pedagogia para o ensino da

matemática.

Vale lembrar que os dados empíricos da pesquisa compreendem

a investigação realizada por intermédio de entrevista junto aos professores e

de análise do currículo de cinco cursos de licenciatura em Pedagogia, no que

se refere à formação para o ensino da Matemática.

A organização do texto neste capítulo se dará, portanto, pelo

diálogo entre três fontes: as falas das professoras, os suportes teóricos

buscados nos autores de referência para esta pesquisa e a realidade - do

contexto em que as educadoras atuam, e dos currículos dos cinco cursos

de Licenciatura Plena em Pedagogia organizados por Instituições de Ensino

Superior responsáveis pela formação inicial do pedagogo no estado de Mato

Grosso, especificamente, no que concerne à formação para o ensino da

Matemática.

Este formato de construção do texto, segundo Ludke e André

(1986), é conhecido como “triangulação”, que se define pela “checagem de um

dado obtido através de diferentes informantes, em situações variadas e em

momentos diferentes” (p.52) e que se visualiza, com os elementos específicos

desta pesquisa, na figura a seguir

125

Referencial Teórico

Falas das Professoras Cursos de Pedagogia

Figura 1 – Triangulação: Fontes de dados

Assim, no intuito de empreender as interpretações que dão corpo

aos objetivos do presente capítulo, ficou definido que a análise se dará por três

dimensões articuladas: A formação do pedagogo; O processo ensino-

aprendizagem; A atuação do pedagogo no ensino da Matemática nos Anos

Iniciais do Ensino Fundamental: desafios e problemas enfrentados.

Esses caminhos emergiram dos dados recolhidos na

investigação, após intensos esforços de leitura e interpretação dos mesmos e

têm a finalidade de responder à questão de pesquisa: O professor graduado

em Pedagogia, para ensinar a Matemática nos Anos Iniciais do Ensino

Fundamental, enfrenta que desafios?

4.1 Os Sujeitos da Pesquisa: Preparando o Diálogo

Como o locus da investigação é a Rede Pública Municipal de

Rondonópolis - MT, e os sujeitos que participam da pesquisa são docentes que

atuam nesta rede, neste item é apresentado, inicialmente, um diagnóstico dos

professores que trabalham com o ensino da Matemática na 1ª e 2ª fases do II

Ciclo, na mencionada rede. O interesse é permitir uma melhor visualização

deste quadro de profissionais trazendo informações a respeito de sua formação

acadêmica, regime de trabalho e área de concurso, com a intenção de melhor

contextualizar as informações que se seguem sobre os sujeitos da pesquisa.

A Rede Pública Municipal de Educação de Rondonópolis é

constituída por 35 escolas; destas, 25 oferecem a 1ª e 2ª fases do II Ciclo.

Visto que este estudo se interessa em conhecer os desafios e dificuldades

enfrentados pelo professor graduado em Pedagogia que atua na 1ª e 2ª fases

126

do II Ciclo do Ensino Fundamental, foi aplicado o questionário com os 53

professores que ensinam a Matemática nas fases delimitadas para o estudo.

Os dados obtidos por meio desse instrumento possibilitaram um

diagnóstico que permite visualizar informações gerais sobre os docentes

envolvidos com o ensino desta disciplina. É possível apontar que, quanto à

formação acadêmica, 41 (77,35%) professores são egressos de outras

licenciaturas; 11 (20,75%) são licenciados em Pedagogia e 01 (1,88%) não tem

curso superior.

Vale destacar que a Normativa nº 002/2009 da Secretaria

Municipal de Educação deste município permite que no II Ciclo haja essa

diversidade de formação, não se constituindo campo de trabalho exclusivo do

pedagogo. É estabelecido no art. 14 Inciso III que, ocorrendo aulas livres na 1ª

e 2ª fases do II Ciclo e havendo o professor dos anos finais remanescente, o

mesmo poderá ser lotado nestas fases, por área, embora o Inciso I estabeleça

que o professor dos anos iniciais tenha prioridade de lotação até a 2ª fase do II

Ciclo.

Dos que responderam ao questionário, 19 (35,84%) são efetivos

e 34 (64,15%) trabalham como interinos-substitutos sob condições de contrato

temporário. Dos 19 professores efetivos, 11 têm concurso em Docência do

Ensino Fundamental - Anos Iniciais e 08 são concursados em Docência do

Ensino Fundamental - Anos Finais.

Fato interessante evidenciado é que existem docentes com outras

licenciaturas que não a Pedagogia, concursados para atuar com os anos

iniciais. Isso pode ser explicado porque até a promulgação da LDB 9394/96 o

Magistério era a formação exigida legalmente para que o professor pudesse

lecionar nos anos iniciais. Os dados apontaram que, dos 11 professores que

têm concurso para trabalhar nos anos iniciais, 07 têm outra licenciatura

(Matemática, Ciências Biológicas, Letras, História, Geografia) e 04 são

licenciados em Pedagogia.

Dos 11 professores que são pedagogos, pertencentes ao

referido universo dos 53 docentes, 08 aceitaram participar do presente estudo.

No que diz respeito ao gênero, todos esses pedagogos pertencem

ao sexo feminino. Isso confirma a questão da feminização do magistério que

historicamente tem se estabelecido, indicando que no curso de Pedagogia a

127

presença das mulheres persiste preponderante. A luta pela profissionalização

do educador não pode desconsiderar o conflito de gênero existente na

sociedade.

Das 08 professoras interlocutoras nesta pesquisa 04 trabalham

como efetivas e 04 como interinas/substitutas; 04 atuam com o ensino da

Matemática na 1ª fase do II Ciclo e 04 ensinam essa área do conhecimento na

2ª fase do II Ciclo.

Há que se considerar que o ensino da Matemática na 1ª fase do II

Ciclo é constituído de algumas exigências que são diferentes das da 2ª fase

deste Ciclo. Compreendendo o currículo como processo que se efetiva no

cotidiano escolar, a Rede Pública Municipal de Ensino de Rondonópolis

elaborou em 2008 o Referencial Curricular Municipal para o Ensino

Fundamental32 definindo um currículo básico comum para os três ciclos do

Ensino Fundamental e para o Ensino de Jovens e Adultos. Este referencial

define os saberes, habilidades e conteúdos curriculares mínimos que todos os

alunos deverão aprender na escola, ainda constitui, porém, um documento

preliminar, que se encontra em processo de discussão, reflexão e

implementação pelos docentes desde 2009.

Por questões éticas convencionadas pela academia, no que diz

respeito à pesquisa científica, as educadoras colaboradoras do estudo não são

identificadas por seus nomes. São nomeadas como “professora Verde”,

“professora Azul”, “professora Rosa”, “professora Vermelho”, “professora

Lilás”, “professora Anil”, “professora Amarelo” e “professora Violeta”, porque,

certamente, deram um colorido especial a esta investigação.

A primeira educadora a ser caracterizada é a professora Verde;

natural do estado do Rio Grande do Sul, tem quarenta e três anos de idade.

Cursou Magistério em nível médio e concluiu a graduação em Pedagogia em

2003 pela UFMT/CUR33 e especialização em Psicopedagogia Clínica. Atua

32 Em anexo são apresentados quadros que mostram a proposta curricular da rede municipal de Rondonópolis para a disciplina Matemática e suas Tecnologias para a 1ª fase e 2ª fase do II Ciclo. O objetivo é mostrar que conteúdos devem ser trabalhados nessas fases da escolaridade e que habilidades se desejam que o aluno construa, a fim de permitir um melhor entendimento do que as depoentes falam quando se referem aos conteúdos a serem

ensinados. 33

A formação matemática oferecida pelo Curso de Pedagogia da UFMT/CUR – Universidade Federal de Mato Grosso, Campus de Rondonópolis tem sido abordada no capítulo 2 deste estudo

128

como docente há vinte e quatro anos, sempre no Ensino Fundamental. Na rede

locus de investigação desenvolve suas atividades com turmas da 2ª fase do II

Ciclo, na área da Matemática como professora efetiva há dez anos, com

concurso em Docência Anos Iniciais – 02/1995. Vale ressaltar que também

trabalha no ensino desta disciplina na rede estadual como professora

interina/substituta.

A professora Azul tem quarenta e um anos e nasceu no estado de

Santa Catarina. Em nível médio cursou o Magistério, graduando-se em

Pedagogia em 2004 pelo CESUR34, no estado de Mato Grosso. É professora

há vinte anos, sempre desempenhando suas atividades em escolas públicas da

Rede Municipal. Atende turmas da 2ª fase do II Ciclo do Ensino Fundamental.

Na escola pesquisada, trabalha a disciplina Matemática há quatro anos como

professora interina/substituta.

Já a terceira educadora, professora Rosa, tem trinta e seis anos,

é natural do estado de Mato Grosso onde se formou em Pedagogia em 2006

pelo CESUR e cursou especialização em Docência do Ensino Superior. Atua

há dezesseis anos no magistério, tanto na rede pública de ensino quanto na

rede privada, sendo dez anos como professora de Matemática nos anos

iniciais. Na rede, locus desta investigação, trabalha há sete anos como

interina/substituta e atualmente leciona a Matemática para alunos da 1ª fase do

II Ciclo.

A professora Vermelho tem quarenta e sete anos, tendo nascido

no estado de Mato Grosso. No Ensino Médio cursou Magistério e graduou-se

em Licenciatura em Pedagogia em 1999, pela UNOESTE em Presidente

Prudente - SP. Tem especialização em Magistério do Ensino Superior. É

docente há vinte anos e, embora sempre tenha trabalhado com os anos

iniciais, é o primeiro ano que trabalha com a Matemática, por área, na 1ª fase

do II Ciclo. Atua na rede, locus deste estudo há quinze anos, na situação de

efetiva, com concurso em Docência do Ensino Fundamental - Anos

Iniciais/1994.

A professora Lilás, que desempenha a função de docente há

dezessete anos, tem trinta e oito anos de idade e é natural do estado de Mato

34

CESUR – Centro de Ensino Superior de Rondonópolis.

129

Grosso. Cursou o Magistério em nível médio e formou-se em Pedagogia em

2003 pela UFMT/CUR, neste estado. Tem especialização em Métodos e

Técnicas de Ensino e atua com o ensino da Matemática há dezesseis anos. Na

rede em que se realiza esta pesquisa, além de trabalhar com a Educação

Infantil, atua com a 2ª fase do II Ciclo como professora efetiva, sendo

concursada em Docência Anos Iniciais – 02/1995 e também em Docência

Educação Infantil – 02/2002.

A sexta educadora é a professora Anil. É natural do estado de

São Paulo e tem sessenta anos. Atua no magistério há dezoito anos. No

Ensino Médio, como é atualmente nomeado, cursou o Magistério. Concluiu a

Licenciatura em Pedagogia em 199235 e não tem especialização. Trabalha na

rede, cenário desta investigação, na condição de interina/substituta, atendendo

turmas da 1ª fase II Ciclo há dois anos.

A professora Amarelo tem vinte e nove anos e é nascida no

estado de Mato Grosso. No Ensino Médio cursou o Propedêutico e, na

graduação, Licenciatura em Pedagogia em 2004 pela UFMT/CUR. Atua na

rede locus da pesquisa como professora interina/substituta há cinco anos e

como professora de Matemática, por área, há três anos. Atualmente atende

turmas da 2ª fase do II Ciclo.

Por fim, a professora Violeta tem quarenta e dois anos e é natural

do estado de Mato Grosso. Em nível médio cursou o Magistério graduando-se

em Pedagogia no ano de 2000 pela UNOESTE em Presidente Prudente-SP, e

tem especialização em Gestão Educacional. Atua há quinze anos como

professora e trabalha com o ensino da Matemática há doze anos. Na rede

locus de investigação trabalha como professora efetiva, com concurso em

Docência Anos Iniciais – 04/1995, atendendo turmas da 1ª fase do II Ciclo e,

diferentemente das outras interlocutoras que colaboram como presente estudo,

é professora de escola localizada na zona rural.

Assim, temos o quadro seguinte, que bem revela as

características dos sujeitos por meio dos quais se busca identificar e

compreender como os professores mobilizam os conhecimentos matemáticos

apropriados no curso de Pedagogia.

35

A professora não revelou em qual instituição cursou a Pedagogia.

130

Quadro 6 – Síntese das características das professoras colaboradoras

Nome Idade Ensino

Médio

Graduação/Ano

de conclusão/

Instituição

Especialização/Ano

de conclusão

Ciclo

em que

leciona

Tempo de

magistério

Situação

funcional

Professora

Verde

43 Mag.36

Pedagogia/2003/

UFMT-CUR

Psicopedagogia

Clínica/2005

2ª fase

II Ciclo

24 anos Concursada

Professora

Azul

41 Mag. Pedagogia/2004/

CESUR

Não possui 2ª fase

II Ciclo

20 anos Interina/substituta

Professora

Rosa

36 Mag. Pedagogia/2006/

CESUR37

Docência/2007 1ª fase

II Ciclo

16 anos Interina/substituta

Professora

Vermelho

47 Mag. Pedagogia/1999/

UNOESTE-SP

Mag. do Ensino

Superior/2002

1ª fase

II Ciclo

20 anos Concursada

Professora

Lilás

38 Mag. Pedagogia/2003/

UFMT-CUR

Métodos e Técnicas

de Ensino/2006

2ª fase

II Ciclo

17 anos Concursada

Professora

Anil

60 Mag. Pedagogia/1992/

Não informou

Não possui 1ª fase

II Ciclo

18 anos Interina/substituta

Professora

Amarelo

29 Prop38

. Pedagogia/2004/

UFMT-CUR

Não possui 2ª fase

II Ciclo

5 anos Interina/substitua

Professora

Violeta

42 Mag. Pedagogia/2000/

UNOESTE- SP

Gestão

Educacional/2002

1ª fase

II Ciclo

15 anos Concursada

Fonte: Questionário - Caracterização do professor

Apresentadas as oito professoras colaboradoras da pesquisa, é

chegada a hora do diálogo. Um diálogo que se dá entre as falas dos sujeitos –

embebidas das suas vivências, concepções e experiências – e a maneira

como vem sendo organizado a formação matemática do pedagogo nos cursos

de Pedagogia do estado de Mato Grosso, sempre conversando com teóricos,

uns que debatem o curso de pedagogia no Brasil, outros que estudam a

formação de professores numa perspectiva crítica e aqueles que teorizam

sobre os aspectos relacionados ao ensino da Matemática, todos já

apresentados nesta redação. O que se pretende com este diálogo é promover

sínteses construtivas que ajudem a elucidar quais são os desafios que o

professor graduado em Pedagogia enfrenta para ensinar Matemática nos Anos

Iniciais do Ensino Fundamental. Convém neste ponto acrescentar que a análise

dos instrumentos de pesquisa utilizados nesta investigação permitiu o

36

Abreviamos Magistério. 37

Instituição de caráter privado, na época da formação desta professora, estava estabelecida no município de Rondonópolis – MT. 38

Abreviamos Propedêutico.

131

aparecimento de alguns eixos de análise, que se apresentam a seguir e que

serão empregados para responder à questão de pesquisa.

Quadro 7 – Eixos de análise

EIXOS PRINCIPAL RELAÇÃO

A formação do pedagogo

a)Que suporte o curso de Pedagogia

oferece para o trabalho do professor com

o ensino da matemática.

b) a formação do pedagogo, porém,

alargada para – trajetórias do professor,

outras formações, experiências na

docência.

Processo ensino/aprendizagem As concepções de ensino de matemática

A atuação do pedagogo no ensino da matemática nos anos iniciais do Ensino Fundamental: Desafios e

problemas enfrentados

a) Os desafios que o pedagogo enfrenta

pra ensinar a matemática.

b) Conhecimentos para o ensino da

matemática

4.2 A Formação do Pedagogo

O interesse pela formação do pedagogo reside no fato de que a

atual legislação brasileira atribui ao curso de Pedagogia a responsabilidade

pela formação do professor que ensina nos Anos Iniciais do Ensino

Fundamental. Nesta unidade pretende-se mostrar a visão que algumas

professoras têm de sua formação para o ensino da Matemática.

Conforme se afirmou, o estudo centra-se na formação do

pedagogo, dadas as condições impostas pela mencionada legislação; todavia

esclareça-se que não se desconsidera a formação em Magistério oferecida no

Ensino Médio, visto que é trazida pelos sujeitos da pesquisa como referência

para o ensino da Matemática. Também não se trata de reduzir a formação

deste educador à sua formação inicial, mas sim, ao mesmo tempo em que se

estudam aspectos desta formação pertinentes aos propósitos desta

investigação, buscar entender que novos significados este professor tem dado

à sua formação matemática apropriada no curso de Pedagogia frente às

exigências impostas pela realidade concreta da escola.

132

Assim, de início, coletaram-se dados relacionados à formação dos

sujeitos do estudo desenvolvido no curso de Pedagogia. Quando inquiridas na

entrevista sobre a formação matemática vivenciada no curso de Pedagogia, as

depoentes demonstraram insatisfação porque consideram frágil a formação

oferecida pelo referido curso no que concerne a esta disciplina. Tal sentimento

aparece ligado a diversos fatores, entre eles a insuficiência da carga horária

destinada à formação para o ensino da Matemática; a existência de um

distanciamento entre o que é abordado no curso de Pedagogia e a realidade

concreta da escola; a presença da dicotomia entre teoria e prática como fruto

da organização curricular do curso; a não priorização para estudo dos

conteúdos que fazem parte do currículo dos anos iniciais na formação. Apesar

disso, as docentes apontaram a formação metodológica como um aspecto

positivo da formação deixando claro que pedagogo possui conhecimento

razoável do “como” ensinar, mas, infelizmente, pouca base do “que” ensinar.

A insuficiência da carga horária foi apresentada como um fator

que contribui, significativamente, para a fragilidade da formação do pedagogo

no que diz respeito à Matemática. Os depoimentos abaixo demonstram a

insatisfação das entrevistadas. Assim respondeu a professora Verde:

O curso de Pedagogia em si, ele tem uma defasagem muito grande

nesta questão de Matemática [...] não tem uma base teórica,

nenhuma base para você estar trabalhando, [...] Falta realmente um

tempo maior destinado tanto para Matemática como para outras

disciplinas. [...] Só no terceiro ano um módulo é trabalhado e aí você

tem muita coisa para ver e acaba vendo pinceladamente [...].

Um trecho da entrevista da professora Vermelho expressa o

seguinte:

[...] eu acho que no curso de Pedagogia tinha que ter uma mudança

tanto em Língua Portuguesa como em Matemática. Eu acho que foi

pouco, não lembro a carga horária, mas foi pouco e insuficiente [...]

eram coisas muito fáceis que parece que preparava a gente só

mesmo para vir para aquela alfabetização matemática que era uma

coisa muito pequena, muito fácil. A gente tinha aquelas microaulas.

Isso é confirmado pelas professoras Azul e Amarelo. A primeira

afirma: A formação da gente é um pouco precária [...] era só num semestre que

a gente teve essa disciplina, então foi pouco tempo (Professora Azul), e a outra

133

diz que o curso deveria oferecer mais tempo, uma disciplina a mais ensinando

a prática da Matemática, o ensino da Matemática (Professora Amarelo).

As outras professoras referindo-se a esse ponto explicitam a

superficialidade que reveste a formação matemática do professor no curso de

Pedagogia e assim falam: Eu não aprendi nada que faça diferença na minha

prática. [...] Eu achei a minha graduação fraca. [...] mas eu dizer para você que

a minha graduação fez diferença muito grande, eu diria que não (Professora

Rosa); Para mim o curso de Pedagogia, para a Matemática, não me ajudou em

nada. Eu nem lembro quem foi meu professor de Matemática quando eu fiz

Pedagogia (Professora Anil); [...] para o pedagogo o curso não dá formação

para você trabalhar com a Matemática (Professora Verde); No curso de

Pedagogia você recebe as noções, noções que quando você sai de lá, você

está apto para trabalhar, só que você tem que buscar (Professora Violeta).

A análise desses depoimentos não pode desconsiderar que, das

oito professoras sujeitos deste estudo, sete haviam cursado o Magistério39 em

nível médio e já exerciam a atividade docente antes de ingressarem no curso

superior. Isto pode ter concorrido para que as interlocutoras considerassem a

formação matemática desenvolvida no curso de Pedagogia igual/inferior à já

recebida no Magistério.

A este respeito, a fala da professora Verde é contundente:

O meu Magistério me deu muito mais base para trabalhar com

crianças do que a própria Pedagogia, o que eu sei hoje eu devo ao

Magistério, três anos muito bem feitos. Lá realmente eles ensinam

você como trabalhar com crianças. O curso de Pedagogia deixa muito

a desejar.

Essa percepção também se faz presente em outros depoimentos:

Eu fiz Magistério e no Magistério eu tinha pegado também a Didática

da Matemática, construía jogos e tudo mais, trabalhava todos os

conteúdos, ia para o estágio aplicava aquilo no estágio, então o

39 Até a promulgação da LDB 9394/96 o Magistério era a formação exigida legalmente para que

o professor pudesse atuar com os anos iniciais. Sete professoras, interlocutoras deste estudo,

cursaram a Licenciatura em Pedagogia, dentro do contexto da aprovação desta Lei, que, no

artigo 62, passou a exigir que os professores da Educação Básica tivessem curso superior que

deveria ser cursado até 2007, dentro da data imposta pelo Decênio da Educação do governo

FHC.

134

Magistério, eu acredito que ele me deu mais recurso porque foram

três anos. (Professora Azul)

O meu Magistério foi muito, muito bom! Eu fiz quatro anos de

Magistério no Rio Grande do Sul, mais tempo que a minha

graduação, e eu diria para você que o que eu utilizo que faz a

diferença na minha vida, eu digo com toda certeza, que eu aprendi no

Magistério. Eu achei a minha graduação fraca. (Professora Rosa)

Eu estudei Magistério em Uberaba/MG. Na Matemática eu tive uma

professora muito boa, eu lembro que eu passei a gostar da

Matemática através dessa professora. Conforme eu comecei a fazer

o Magistério, que eu comecei a assistir aula com ela, eu passei a

apaixonar pela Matemática, foi aonde eu comecei a dar aula. [...] No

Magistério a gente aprende muito a dar aula de Matemática, como

você vai utilizar aqueles objetos que você faz ali para poder dar aula.

[...] Eu lembro da Matemática mais do Magistério. Na Pedagogia eu

lembro mais de Filosofia... (Professora Anil)

Um dado importante nesta análise é que a professora Anil

concluiu o curso de Pedagogia no ano de 1992. Segundo os estudos de Bissolli

da Silva (2006), nessa época este curso formava, de um lado, professores para

o ensino Normal, e, dentro desta habilitação garantia o direito do licenciado em

Pedagogia exercer o magistério nas séries iniciais e, de outro, formava os

especialistas – orientador educacional, supervisor escolar, administrador

escolar, inspetor escolar e planejador educacional, conforme normatizava o

Parecer 252/69. Interessa a este estudo realçar que o trabalho do professor

nas séries iniciais se daria dentro da habilitação para o ensino Normal, não se

preocupando a Pedagogia, portanto, em prepará-lo para a docência nos anos

iniciais.

Assim, vê-se que nem sempre os cursos de Pedagogia foram

responsáveis pela formação do professor dos anos iniciais. Dentre as várias

possibilidades, pensa-se que este seja o motivo pelo qual esta professora não

consiga se lembrar das aulas que tratavam da formação para o ensino da

Matemática, recordando-se apenas das disciplinas referentes aos fundamentos

da educação. Pode-se também inferir que a formação proporcionada pelo

curso de Pedagogia tomou como foco a habilitação para o magistério e desta

forma a ênfase da formação recaiu nos fundamentos da educação.

Diante destes depoimentos é possível dizer que, além dos

conhecimentos apropriados no curso de Magistério, o professor no exercício da

135

docência, no cotidiano do seu trabalho, produz saberes que o capacitam a

interagir com seus alunos, na sala de aula e no contexto escolar onde atua.

Pimenta (2007)40 esclarece que

Nas práticas docentes estão contidos elementos extremamente

importantes, como a problematização, a intencionalidade para

encontrar soluções, a experimentação metodológica, o enfrentamento

de situações de ensino complexas, as tentativas mais radicais, mais

ricas e mais sugestivas de uma didática inovadora, que ainda não

está configurada teoricamente. (p.27)

Pode-se perceber pelos relatos de algumas depoentes que o

curso de Pedagogia se tornou um espaço para a revisão reflexiva do

Magistério. Isso aflorou na fala da professora Verde, que ainda diz que o curso

de Pedagogia lhe deu subsídio teórico importante, como se vê no seguinte

excerto.

[...] quando eu fiz a faculdade eu já tinha 16 anos de sala de aula,

então para mim não fez muita diferença porque isso eu já trabalhava,

só que você não tem a fundamentação que você deveria ter. (grifo

nosso)

Embora a prática do professor seja rica em possibilidades para a

construção de conhecimento, estas palavras mostram a importância da

fundamentação teórica apropriada no curso de Pedagogia para o entendimento

do professor a respeito do seu fazer. Portanto, pode-se concluir que sem tal

fundamentação teórica muitas das ações de ensino do professor se reduzem à

mera repetição do livro didático sem o entendimento do por que se ensina

aquele conteúdo daquele modo e para quê. Neste sentido, compreende-se que

as teorias estudadas nos cursos de formação inicial podem fornecer elementos

para que o professor interrogue e alimente as suas práticas vivenciadas nos

contextos escolares. Assim sendo, o docente pode reelaborar suas

experiências práticas em confronto com a teoria e vice-versa, refletindo na e

sobre a prática. É desse processo de reflexão que nasce um novo

saber/conhecimento, próprio da docência, que Tardif (2002) denomina de

40

PIMENTA. S. G. A formação de professores: identidade e saberes da docência. In: Saberes pedagógicos e atividade docente/textos de Edson Nascimento Campos... [et al.]; Selma Garrido Pimenta (organização). 5. ed. São Paulo: Cortez, 2007. (Saberes da docência).

136

saberes experienciais e Shulman (apud Montalvão e Mizukami, 2002) nomeia

de conhecimento pedagógico do conteúdo.

Portanto, quando esta professora se refere ao tempo de trabalho

em sala de aula como docente – ela informa que quando cursou a Pedagogia

já trabalhava há dezesseis anos como professora – , é possível dizer que

desse tempo para cá ela já construiu outros saberes e muito daquilo que ela

aprendeu no curso de Magistério já foi refeito e reelaborado.

Também a professora Rosa afirma: Na graduação eu relembrei

conteúdos do Magistério, não que tenha algo novo, eu não consideraria assim.

Eu considero que são conhecimentos que eu já tinha e que só os retomei [...]

(Professora Rosa). A professora Azul acrescenta que o curso de Pedagogia se

tornou, para ela, espaço de reflexão sobre a prática que já exercia em sala de

aula, explicitando:

[...] eu vi como se fosse mais um resgate daquilo que eu já tinha de

conhecimento porque eu já trabalhava (como professora) e já tinha

buscado sozinha mesmo, antes da formação, pela necessidade de eu

estar na sala de aula e ter que trabalhar a Matemática. [...] muitas

coisas que foram vistas (no curso de pedagogia) eram coisas que a

gente mesmo levava da prática da sala de aula para discutir, então

eram discussões da prática vendo o que a gente podia melhorar.

A opinião da professora Violeta ecoa como dissonância das falas

acima mencionadas. Ela entende que já no Magistério havia problemas na

formação matemática do professor dos Anos Iniciais. Declara que existe um

distanciamento entre o que é ensinado nos cursos de formação de professores

e a realidade escolar, um problema encontrado tanto no curso de Magistério

em nível médio quanto nos cursos de Pedagogia:

[...] eu considero que a minha formação para a Matemática, tanto no Magistério quanto na Pedagogia, foi igual. [...] na época do Magistério, eu penso que a Matemática tinha que ter sido trabalhada de uma forma mais direta como depois é exigida para nós trabalharmos com o aluno.

O depoimento da professora Lilás assemelha-se ao anterior. Ela

também considera que tal distanciamento persiste e enfatiza:

Aprendi muito pouco no curso de Pedagogia [...] o que eu vi foi muito

pouco [...] Ali na universidade foi muito superficial [...] Eu acho que a

137

universidade precisa vir conhecer a realidade da escola para mudar o

que eles ensinam e ampliar [...] eles deveriam vir aqui na escola

observar as aulas para saber como que é.

A esse respeito, a professora Violeta diz que A matemática, para

você trabalhar com o aluno da escola ciclada é bem diferente do que você

recebe na formação – na universidade. Também acerca do assunto a

professora Verde afirma: Os teóricos que eles ensinam, o que eles ensinam lá,

é totalmente diferente da vivência dentro de uma sala de aula, não se

misturam.

Esse distanciamento é fruto da organização curricular dos cursos

de formação de professores que, historicamente, vem desenvolvendo os

conteúdos e as atividades de estágios distanciados entre si, promovendo assim

a separação entre a teoria e a prática que, por consequência, gera professores

descontextualizados da realidade da escola.

Gatti e Nunes (2008), em estudo que abrangeu 71 cursos de

Pedagogia em várias regiões brasileiras, constataram essa problemática: os

cursos de Pedagogia não são capazes de articular teoria e prática, pois, no

momento de dar ao aluno uma visão prática do que é ensinar, usando as

outras disciplinas que são para este fim, não conseguem aproximar os futuros

professores da realidade do ensino na sala de aula. Na opinião das

pesquisadoras, as universidades parecem não se interessar pela realidade das

escolas, principalmente, das públicas.

Neste caso, a percepção das depoentes permite inferir ser

fundamental que as instituições formadoras de professores dos anos iniciais

estabeleçam relações mais dialogais e cooperativas com as escolas a fim de

organizar e desenvolver um currículo que possibilite a formação de um docente

concatenado com a realidade concreta dessas escolas, que dê conta de captar

as contradições presentes na prática social de educar a fim de alterar as

situações de fracasso escolar na área da Matemática.

Quanto à falta de articulação entre teoria e prática, Libâneo e

Pimenta (1999) subsidiam a fala destas interlocutoras sinalizando para a

importância da confluência destas duas dimensões. Estes educadores

recomendam que “[...] desde o ingresso dos alunos no curso, é preciso integrar

138

os conteúdos das disciplinas em situações da prática que coloquem problemas

aos futuros professores e lhes possibilitem experimentar soluções” (p.267).

A pesquisa vista como processo formativo pode favorecer a

relação teoria e prática no curso de formação do pedagogo. Trata-se não

somente de contribuir para que o futuro professor dos anos iniciais amplie seu

conhecimento sobre as reais condições onde e como a prática pedagógica

acontece, teorizando sobre outras práticas, mas, também, de possibilitar que,

tomando a prática como ponto de partida, seja capaz de construir-se enquanto

teórico da sua própria prática.

É importante que a formação do pedagogo seja perpassada pela

pesquisa, não restringindo apenas ao Estágio Supervisionado a possibilidade

de problematização, interpretação e compreensão da natureza, da

especificidade e das relações que se estabelecem no trabalho pedagógico.

A propósito, Franco (2008) defende que a formação docente não

pode se dar no vazio, de maneira superficial, mas deve estar fortemente ligada

a uma intencionalidade, a uma política, a uma epistemologia, a pesquisas

aprofundadas dos conhecimentos pedagógicos. A formação assim desenhada

pode propiciar que, em vez de ser apenas consumidor e transmissor de

conhecimentos acadêmicos, o pedagogo seja preparado para adotar

efetivamente uma postura investigativa diante dos problemas da prática

pedagógica e operar como produtor de conhecimentos.

Outro aspecto percebido nos depoimentos das interlocutoras

considerado relevante para a análise pretendida é que o pedagogo possui

conhecimento razoável do “como” ensinar, mas pouca base do “que” ensinar. A

professora Verde externa que O curso de Pedagogia em si, tem uma

defasagem muito grande nesta questão de Matemática [...] você não tem uma

base teórica, nenhuma base mesmo, para você estar trabalhando. Já para a

professora Azul, A questão de conteúdos foi bem básico, a gente viu como

trabalhar as quatro operações, a gente viu como trabalhar fração, como

trabalhar número decimal [...].

Essas opiniões são ratificadas pela professora Vermelho. Ela

acredita que o curso de Pedagogia dá maior ênfase à metodologia. Ao

recordar-se da formação matemática na sua graduação, diz: [...] parece assim

que preparava a gente só mesmo para vir para aquela alfabetização

139

matemática [...] Eram questões da metodologia que queriam mais, era você

trabalhar como era com quadro, como era o material que você ia utilizar [...]

Neste sentido, o depoimento da professora Amarelo é

Às vezes, o pedagogo tem dificuldade nos cálculos, nos

conhecimentos matemáticos, só que a gente tem a metodologia, que

o professor que é matemático não vai estar tão preocupado com

aquela criança que está lá com dificuldades do 1º aninho, do 2º ano,

entendeu? E o pedagogo não, o pedagogo tem uma metodologia, a

gente aprende isso lá no curso. É uma metodologia diferente, a forma

de passar o conhecimento para a criança, o pedagogo tem um jeito

especial, um carinho especial para passar aquele conhecimento para

a criança. Não que os outros não tenham, mas eu acredito que o

matemático tenha uma formação que esteja mais preocupada com o

cálculo. O pedagogo internaliza uma preocupação com a maneira de

passar o conteúdo para a criança de maneira prazerosa, que seja do

mundo dela, do universo dela. Essa é a preparação do pedagogo,

isso é o fica internalizado em cada pedagogo, esse sentimento, e eu

não sei se os matemáticos têm, não estou dizendo que eles não têm,

digo assim, eu não sei se eles têm.

Um trecho da entrevista da professora Violeta ajuda a esclarecer:

Ele (o licenciado em Matemática) tem todo o domínio (do conteúdo) e

nós temos a metodologia de como trabalhar, de como introduzir de

uma forma que o aluno passe a gostar. Nós não somos formados em

Matemática, mas o conhecimento que nós temos, junto com a

didática – de que cada aluno tem seu tempo, tem o seu período, tem

sua dificuldade – que nós recebemos na formação de Pedagogia vai

somar com a experiência que você vai tendo no dia-a-dia e você junta

esses dois ingredientes, e o que está dando certo você continua e o

que não está dando certo você vai procurar suprir aquela dificuldade

de outra forma, buscando recursos. [...] quando você faz a

Pedagogia, você não recebe os quesitos que você vai precisar para

trabalhar mesmo a Matemática com o aluno diariamente. Você

recebe noções de como trabalhar, de como introduzir, de como

elaborar, de como planejar.

Depoimentos como esses, quando denunciam a prioridade dada

ao aspecto metodológico na formação do pedagogo, em detrimento dos

conteúdos a se ensinar, se fortalecem naquilo que se destacou anteriormente,

da pesquisa de Curi (2004) – sua investigação notifica que a análise das

disciplinas que tratam da formação matemática do futuro professor dos anos

iniciais indicou que, aproximadamente, 90% dos cursos diagnosticados têm a

preocupação situada na metodologia de ensino – e também no estudo que ora

se desenvolve, o qual indica que os cursos de Pedagogia das instituições

140

matogrossenses investigadas elegem os aspectos metodológicos como

essenciais na formação do pedagogo.

Contudo, as interlocutoras acreditam que as dificuldades que este

licenciado enfrenta no domínio dos conteúdos para ensinar a Matemática são

minimizadas pela habilidade que ele tem na questão da metodologia. Deste

modo ficou demonstrado que as depoentes entendem que a formação

matemática desenvolvida nos cursos de Pedagogia, que não a metodologia,

pouco tem contribuído para que os futuros professores aprendam a trabalhar a

Matemática nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental.

É necessário esclarecer que assim como não se pode ensinar a

Matemática fora do domínio do conteúdo específico, também não se pode

considerar que o conhecimento pedagógico sozinho é suficiente para subsidiar

o trabalho do professor. Na verdade, o pedagogo para ensinar a Matemática

não se apóia somente na metodologia, como enfatiza as depoentes, mas

recorre a uma concepção anterior da Matemática e seu ensino oriundo da sua

experiência como estudante. Neste sentido, é possível dizer que o processo de

ensino e aprendizagem da Matemática vivenciados neste período influencia

profundamente seu trabalho educativo, já que os docentes se tornam

professores muito antes de fazer o Magistério.

O fato é que o conhecimento pedagógico deve estar articulado a

outros conhecimentos, principalmente o especifico, numa relação de diálogo.

Não se pode negar que para ensinar a Matemática é importante que o

professor se aproprie do conhecimento específico desta disciplina, mas para

ser professor não basta ter este conhecimento ou o pedagógico, como vem

sendo entendido pelas interlocutoras deste estudo.

Tomando como referência o pensamento de Shulman, destaco

que para ser professor hoje é essencial a apropriação de uma base de

conhecimentos que se apresentem inter-relacionados, quais sejam: 1)

conhecimento do conteúdo; 2) conhecimento pedagógico (conhecimento

didático geral); 3) conhecimento do currículum; 4) conhecimento dos alunos e

da aprendizagem; 5) conhecimento dos contextos educativos; 6) conhecimento

dos objetivos, as finalidades e os valores educativos, e de seus fundamentos

filosóficos e históricos; 7) conhecimento pedagógico do conteúdo; sabendo que

este último é construído a partir da integração ou sobreposição de três

141

componentes: conhecimento da matéria, conhecimento pedagógico e

conhecimento do contexto.

4.3 O Processo Ensino-Aprendizagem

No item anterior, os depoimentos dos sujeitos da pesquisa

permitiram inferir que as concepções apropriadas pelos professores ao longo

da sua formação influenciam profundamente seu trabalho educativo e, de certo

modo, determinam a forma de pensar e praticar a ação educativa sobre o

processo ensino-aprendizagem.

Na busca da melhor compreensão do pensamento das

interlocutoras desta investigação a respeito da matemática e seu ensino e

aprendizagem, inicialmente, é apresentado o quadro a seguir que, de maneira

sucinta, traz excertos de depoimentos que acenam para as concepções das

entrevistadas sobre a matemática e para a importância que as mesmas

atribuem ao seu ensino, e, na sequência, a análise desses dados. O propósito

é buscar reunir elementos para melhor compreender os fatos determinantes

dos desafios e problemas que essas professoras enfrentam para ensinar a

Matemática na 1ª e 2ª fases do II Ciclo do Ensino Fundamental, e que serão

contemplados na próxima unidade.

Quadro 8 – Concepções das professoras sobre a Matemática e seu

ensino41

Profª. Concepção sobre a Matemática Importância atribuída ao ensino

da Matemática

Verde [...] uma ciência exata [...], por exemplo, 2+2 são 4 e acabou, não tem como dar 5. [...] Eles têm muita dificuldade de aprender a Matemática, por ser uma ciência exata [...]

A Matemática é o dia-a-dia do aluno [...] ela tem importância fundamental na vida do aluno, no dia-a-dia, na convivência dele, nos horários.

41

A leitura da tese de doutoramento de Adelmo Carvalho da Silva (2009) intitulada Reflexão sobre a matemática e seu processo de ensino-aprendizagem: Implicações na (re)elaboração de concepções e práticas de professores desenvolvida no Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade da Paraíba contribuiu no entendimento dos dados desta unidade.

142

Azul A Matemática é ciência exata, que você vai trabalhar com as operações, com o raciocínio lógico [...] A Matemática é importante no dia-a-dia deles [...] é uma ciência que ele utiliza no cotidiano, faz parte do dia-a-dia dele.

[...] a Matemática vai influenciar no desenvolvimento do aluno nas outras disciplinas [...] Então ela está ligada com as outras áreas do conhecimento.

Rosa O dia-a-dia, tudo que nos rodeia [...] eu diria

que é tudo Matemática [...] tudo o que a gente

faz envolve a Matemática, tudo! O dia-a-dia, o

cotidiano [...] Eu penso que a Matemática está

em todo lugar.

Tem uma importância gigantesca [...] para o dia-a-dia, para convívio das crianças com a sociedade, [...] A Matemática é importante para que eles sobrevivam [...]

Vermelho Matemática é tipo uma história de vida da

criança. [...] É uma interação com o meio

social, eu estou sempre relacionando com o

cotidiano de vida deles [...] tudo o que a gente

está vendo em matemática nós estamos

vendo ao nosso redor [...]

[...] eu acho que em tudo [...] Essa é uma grande importância, saber que ela vai estar presente em qualquer momento, em qualquer situação na vida deles.

Lilás A Matemática para definir é muito ampla, mas ela é indispensável na vida do ser humano. A Matemática está em todas as partes, ela é interdisciplinar [...]

[...] tenho que trabalhar a Matemática voltada para o cotidiano deles. [...] Como eles vendem picolé, salgados para ajudar em casa [...] a gente tem que preparar as crianças para a sociedade, para vida.

Anil Matemática é o que faz a gente usar muito o pensamento. [...] Você usa a Matemática para tudo na sua vida. É uma coisa que faz a gente pensar, usar a inteligência, usar o jeito que a gente tem de viver na vida, [...] hoje é tudo pela Matemática.

[...] você sem a Matemática não aprende, não tem como viver [...] é através dela que você vai viver o seu dia-a-dia.

Amarelo Matemática, assim como as outras disciplinas, eu acho que é tudo. É tudo o que está à nossa volta [...] a Matemática está ao nosso redor, faz parte da nossa vida.

[...] é muito importante para nós porque tudo que gente vai fazer envolve a Matemática (cálculos, figuras geométricas)

Violeta A Matemática é tudo. [...] é tudo na sua vida [...] então a Matemática é coisa cotidiana na vida de cada um [...].A Matemática é um número exato, mas [...] Você não precisa falar: “Hoje é matemática” como se fosse uma coisa isolada [...]

O ensino da Matemática é essencial na vida de todo cidadão. [...] a Matemática não é uma coisa fria, isolada, ela é um complemento de tudo.

Fonte: Entrevistas

Nesses fragmentos é unânime a ideia de que a Matemática faz

parte do cotidiano do aluno, sendo entendida como que ciência ligada à vida

com a finalidade de resolver problemas do dia-a-dia. Para as depoentes o

conhecimento matemático deixa de ser visto como um conhecimento pronto,

acabado e isolado do mundo tal como defende, na trilha da perspectiva

tradicional, a concepção platônica da Matemática. Não é demais relembrar que

esta concepção, segundo Fiorentini (1995), caracteriza-se por uma visão

mecânica, estática, a-histórica e dogmática das ideias matemáticas, como se

elas existissem independentes dos seres humanos.

143

Pode-se afirmar a partir das falas das professoras que as

concepções de Matemática das mesmas aproximam-se mais da tendência

socioetnocultural. Nesta visão, o ensino da disciplina em pauta aparece

relacionado ao cotidiano, à cultura do educando. A importância da Matemática

está centrada em desmistificar e compreender a realidade, valorizando o saber

popular trazido pelo aluno a fim de encorajá-lo a produzir saberes sobre a

realidade concreta.

Outro aspecto relevante a ser ponderado é que para as docentes

o conhecimento matemático é fundamental para o desenvolvimento dos

sujeitos. A professora Azul afirma que [...] a Matemática vai influenciar no

desenvolvimento do aluno nas outras disciplinas [...] e a professora Anil

pondera que [...] você sem a Matemática não aprende, não tem como viver [...].

Estas falas apontam que elas têm consciência da necessidade de, já nos

primeiros anos de escolaridade, ensinar uma Matemática útil aos estudantes.

A compreensão do papel essencial desta disciplina para a

formação das crianças implica tomadas de decisões sobre a seleção dos

conteúdos a serem ensinados e das metodologias a serem utilizadas. Requer

que os professores estejam preparados para saber o que, para que e como

ensinar. Isto, de certo modo, destoa da formação matemática que vem sendo

oferecida nos cursos de Pedagogia: conforme o estudo de Curi (2004), a

maneira como o conhecimento matemático é abordado durante a formação

inicial nos cursos de Pedagogia pouco tem contribuído para que os futuros

educadores aprendam a conhecer a Matemática e saibam como ensiná-la e

como o aluno aprende.

No quadro acima, verifica-se que as professoras Verde e Azul

afirmam que a Matemática é uma ciência exata e a professora Violeta

considera um número exato; contudo, isto se revela uma contradição, visto

que, concomitantemente, anunciam que a Matemática é utilizada nas ações do

dia-a-dia: A Matemática é o dia-a-dia do aluno (Professora Verde); [...] É uma

ciência que ele utiliza no cotidiano, faz parte do dia-a-dia dele (Professora

Azul); a Matemática é coisa cotidiana na vida de cada um” (Professora Violeta).

Considera-se nesta afirmativa o fato de que as investigações realizadas na

área da Educação Matemática e da Etnomatemática têm demonstrado que a

144

Matemática utilizada no dia-a-dia e, muitas vezes, no contexto da sala de aula,

nem sempre está impregnada de rigor absoluto e de ideias exatas42.

Desses depoimentos é possível afirmar que as educadoras

compreendem que os acontecimentos cotidianos da realidade na qual os

alunos estão inseridos devem ser tratados como fundamentais para nortear o

trabalho com a Matemática na escola.

Na sequência, destaca-se como as falas das docentes são

reveladoras das concepções de ensino-aprendizagem que permeiam seu

trabalho com a Matemática nas fases delimitadas por esta pesquisa. Quando

inquiridas a respeito do tema, o ensino aparece, majoritariamente, entendido na

perspectiva da construção, da elaboração. Não se trata de compreender o

conhecimento como um conjunto de informações, coisas e fatos prontos e

acabados a serem transmitidos ao aluno, como numa reprodução do

conhecimento, para que as informações sejam apenas decoradas, para

posteriormente serem devolvidas em forma de provas. Em contraposição, trata-

se de valorizar mais o processo do que o produto da produção do

conhecimento, de considerar que mais importante do que aprender é aprender

a aprender, num processo em que o professor atua como mediador entre o

conhecimento historicamente produzido e o aluno.

A professora Rosa diz [...] eu não sou a favor de decorar e sim

que eles construam [...] eu ensino o processo de construção [...]. Embora esta

educadora demonstre disposição em romper com o ensino tradicional da

Matemática, é preciso admitir que isso não se constitui prática fácil de se

efetivar, visto que, como já se mencionou, o professor, tendo sido educado de

modo a conceber a Matemática como algo pronto, apresenta dificuldade para

vê-la como algo em construção. Tem-se um caminho a ser percorrido que

exige constante esforço de reflexão na e sobre a ação, com a finalidade de

visualizar possibilidades de reelaboração de práticas cristalizadas.

No depoimento da professora Lilás, a questão de ensinar na

perspectiva do processo de construção do conhecimento aparece junto com a

importância de se considerar os conhecimentos prévios do aluno. Ela diz que

ensina a Matemática partindo do conhecimento prévio dele [...] insiro novos

42

A obra Na vida dez, na escola zero, (1998), de autoria de Terezinha N. Carraher, David W.Carraher e Analúcia Schliemann, representa com clareza esta afirmação.

145

conhecimentos para que eles possam desenvolver ainda mais sua

aprendizagem, [...] ensino o processo. Percebe-se que esta professora tem

buscado conceber o aluno não como uma tabula rasa, como alguém que,

desprovido de conhecimentos, é considerado objeto da educação; ao contrário,

procura considerar o discente como um sabedor e ao mesmo tempo um

desconhecedor, como preconiza a concepção crítica da educação.

As palavras da professora Violeta expressam concordância com

esta fala. Ela relata que sua intervenção pedagógica se dá a partir de um

conteúdo que é trabalhado de acordo com a realidade deles, com os dados que

eles têm conhecimento. Considerar os conhecimentos prévios do aluno como

ponto de partida da ação pedagógica implica o entendimento de que o ser

humano vai aprendendo, sabendo, vai construindo sua inteligência, por meio

da assimilação e acomodação, conforme defende a perspectiva piagetiana e

como já foi explicitado neste trabalho. Estes dois processos – assimilação e

acomodação – buscam reestabelecer um equilíbrio mental perturbado pelo

contato com um dado incompatível com aquilo que se conhece até então

(princípio de equilibração).

Nesta direção, as declarações abaixo citadas revelam que para

essas professoras o conhecimento matemático deve ser ensinado na

perspectiva da construção, de maneira lúdica, lançando mão do material

concreto como ferramenta pedagógica para a construção dos conceitos

matemáticos: [...] eu utilizo bastante material concreto com eles [...] com esse

material eu consigo melhorar a aula do que só ficar naquela aula de giz e

quadro, naquela aula expositiva (Professora Azul); É mais difícil, é trabalhoso,

mas eu acredito no lúdico [...] material dourado [...] Tangran [...] (Professora

Amarelo); [...] utilizo jogos, tabelas, material dourado. Eu procuro coisas

concretas [...] (Professora Violeta). A professora Azul acredita que o aluno

aprende Com o lúdico. [...] com a ajuda do material concreto que, é primordial

para a Matemática, e com o interesse deles. [...]. E acrescenta que é

vivenciando, é mexendo com o material, é dessa forma que ele consegue se

apropriar, ou levando aquilo para realidade.

146

O exposto pelas entrevistadas se justifica tendo em vista que, na

perspectiva piagetiana43, parte-se do pressuposto de que a atividade criadora

se dá no pensamento e é construída e reconstruída a todo instante. Nesta

visão, a criança deve ser estimulada por atividades concretas, a fim de

estruturar seu pensamento lógico-matemático e atingir a fase das abstrações,

necessárias à resolução de situações complexas. Assim sendo, o material

concreto é uma ferramenta que faz a mediação para que o sujeito possa

construir o fato matemático que se concretiza sempre como raciocínio

logicamente encadeado, abstrato e formal. Segundo esta concepção – a

construtivista – o professor desempenha o papel de mediador na construção do

conhecimento, criando situações para que a criança exercite a capacidade de

pensar e buscar soluções para os problemas apresentados. Skovsmose

(2001) vê a teoria da atividade como um grande passo em direção a uma

epistemologia dialógica, mas enfatiza que a atividade não constitui um ato

isolado “temos que fazer alguma coisa para obter conhecimento, e fazê-la num

contexto social” (p.62).

Retomando o discurso da professora Violeta, verifica-se que, para

ela, o ensino da Matemática não deve ocorrer de maneira isolada, mas sim

aliado a outras áreas do conhecimento. Ela introduz o ensino da matemática

com leituras de texto, que podem ser ligados a conteúdos de Português,

Ciências, etc., portanto, que não precisam, necessariamente, ser da

Matemática. Com isso ela acredita que o estudo da Matemática na sala de

aula se torna prazeroso, evitando assim o desinteresse por parte dos alunos. É

importante frisar que esta educadora trabalha como unidocente, enquanto as

demais atuam por área do conhecimento. Esse fator parece indicar que a

modalidade de trabalho desenvolvida por Violeta pode contribuir para a

efetivação de práticas de ensino na perspectiva da interdisciplinaridade; tais

práticas se evidenciam em seu depoimento:

é importante você trabalhar a Matemática assim, introduzindo através

de uma leitura porque eles precisam fazer a leitura, até porque você

vai instigar o aluno a ler [...] Você pode trabalhar Matemática através

43 MARQUES, S.V. KIMURA, C.F.K. Uma abordagem sobre a construção do número e o jogo

no ensino da matemática na perspectiva piagetiana. In: Seminário de Educação 2007 -

Qualidade do Ensino na Contemporaneidade: novos & velhos desafios: EdUFMT, 2007.

147

de uma aula de Ciências, você pode trabalhar a Matemática através

de uma aula de Português, colocar uma receita, ali você está

trabalhando Matemática [...] Você não precisa falar: “Hoje é

matemática” como se fosse uma coisa isolada [...]

Merece destaque, ainda, um outro aspecto: a questão da

interdisciplinaridade só foi apresentada pela professora Violeta, enquanto nos

depoimentos das demais professoras entrevistadas esta questão não aparece

como algo importante no processo de ensino da Matemática.

Parece também haver acordo entre as depoentes quanto ao

desejo de que seus alunos desenvolvam aprendizagens significativas44. As

professoras ressaltam que para aprender a Matemática é importante que o

aluno se mostre ativo, apresentando disposição e interesse para essa

aprendizagem, o que, para elas justifica o uso dessas metodologias. Essas

docentes acreditam que a aprendizagem requer que o aluno tenha motivos

relevantes que lhe permitam encontrar sentido na atividade de aprendizagem

de conceitos matemáticos. Consideram também que devem intervir para ativar

as ideias prévias do aprendiz para, então, promover a ajuda necessária. Trata-

se de ajudá-lo no esforço de atribuir significado à nova informação que lhe

chega.

Ainda que se considere que as crianças aprendem quando os

conceitos matemáticos são trabalhados de maneira prazerosa, quando há

interesse e motivação por parte das mesmas e se entenda que o material

lúdico e concreto, podem, sim, oferecer esta possibilidade, é importante

ressaltar que, para que a aprendizagem seja significativa, é essencial que no

cotidiano da sala de aula sejam construídas áreas de igualdade em que,

ambos, estudante e professor estejam envolvidos no controle do processo

ensino-aprendizagem.

Pensa-se que não é possível desenvolver uma atitude crítica na

criança melhorando apenas a capacidade de apropriação do conhecimento

matemático. Se queremos, por meio da educação matemática, construir um

projeto de possibilidades que permitam às pessoas participarem no

entendimento e na transformação de suas sociedades, precisamos avançar,

44Nesta perspectiva a aprendizagem não se dá a partir do nada, mas sim a partir das experiências, interesses e conhecimentos prévios disponibilizados pelo aluno (COLL, César (org.). O construtivismo na sala de aula. São Paulo: Ática, 2004.

148

implementando uma prática educativa dialógica e libertadora orientada a

conteúdos da realidade vivida.

Deste ponto de vista é fundamental procurar estabelecer uma

distância crítica desses conceitos, em busca de desenvolver o conhecimento

que Skovsmose (2001) denomina de conhecimento reflexivo, já que a

alfabetização matemática deve ser enraizada em um espírito de crítica,

centrada na importância de identificar e transformar as condições sociais e

ideológicas opressoras.

Já o depoimento da professora Vermelho permite identificar uma

proximidade com a tendência empírico-ativista visto que, em sua ação

pedagógica, o desenvolvimento das atividades se propõe por meio da

utilização de ferramentas pedagógicas, tais como os jogos, muitos materiais

manipulativos (visuais e táteisl) e outras atividades lúdicas e/ou experimentais,

com vistas a possibilitar aos alunos a descoberta e redescoberta dos conceitos

matemáticos por meio de situações vivenciadas. Ela completa

[...] a gente procura trabalhar dentro do contexto [...] se vamos trabalhar figuras geométricas eu tenho o costume de estar associando muito à sala de aula [...] a questão dos números também. Então é uma relação, a criança associando, fazendo esta associação [...] eles acham a Matemática prazerosa, eles gostam de fazer Matemática, a problematização da Matemática.[...] É deixar a criança fluir [...} criar, socializar

Esta tendência se caracteriza em acreditar “que o aluno aprende

fazendo”. Por isso valoriza no processo de ensino, entre outros procedimentos,

a pesquisa, a descoberta, os estudos do meio, a resolução de problemas e as

atividades experimentais. Para a professora Vermelho o aluno aprende a

Matemática

Fazendo a Matemática, trabalhando o desenvolvimento do raciocínio lógico, aí eu acredito que ele aprende. No desenvolvimento do cálculo mental [...] eu acredito que ele só aprende de fato quando consegue construir o desenvolvimento, tem domínio do que ele faz. [...] brincando eles aprendem..., jogando. [...] é uma relação, a criança associando, fazendo esta associação, eles acham a Matemática prazerosa [...].

A aceitação dessas ideias conduz à suposição de que as práticas

das professoras investigadas orientam-se por pressupostos das tendências de

149

ensino empírico ativista, construtivista, socioetnocultural, e sociointeracionista-

semântica, já apresentadas neste estudo.

Dando continuidade ao assunto, é importante salientar que as

professoras Verde e Anil concebem o ensino de Matemática como vem sendo

exposto acima, porém seus depoimentos ainda mostram vestígios de uma

visão de ensino cuja prática pedagógica está apoiada na transmissão de

informações ao aluno. A fala da professora Verde, neste sentido, é expressiva:

ela afirma que para ensinar a Matemática [...] você tem que, primeiro, gostar,

para você conseguir transmitir e ver o ponto realmente para o aluno entender

aquilo que você está transmitindo, porque é difícil [...]. Isso fica mais evidente

quando explicita que o aluno aprende prestando atenção como ouvinte,

visualizando, decorando fazendo sempre muitos exercícios. Quando inquirida

sobre como o discente aprende, responde:

Fazendo [...] Eu acho assim, só se aprende fazer fazendo e você só

aprende matemática da mesma forma que outras disciplinas em cima

ali, estudando, fazendo sempre muitos exercícios. Eu acho mesmo

que é a atenção, visualizar [...] A tabuada eu sou contra decorar, a

decoreba, mas a tabuada se você não decorar você não aprende. É

uma das atividades que você tem que realmente decorar e eu cobro

[...] Eu ainda acredito que o aluno só aprende prestando atenção,

porque ele tem que ter um momento para prestar atenção, ele pode

conversar, ele pode levantar, ele pode andar, mas no momento que

você está explicando ele tem que prestar atenção, porque eu sempre

falo assim: Você só aprende fazer uma coisa vendo e ouvindo e

prestando atenção. (Professora Verde)

É importante observar que quando a professora Vermelho e a

professora Verde asseguram que o aluno aprende “fazendo”, a primeira

entende que este fazer está ligado à ideia da descoberta dos conceitos

matemáticos que se dá por meio da associação, enquanto a segunda acredita

que o fazer ocorre por intermédio de exercícios de repetição mecanicamente

executados.

Na verdade, este depoimento da professora Verde demonstra que

há um conflito, em fase de resolução, entre desenvolver uma prática embasada

na concepção tradicional de ensino e trabalhar numa perspectiva de

construção dos conhecimentos matemáticos. Parece que a prática pedagógica

150

dessas interlocutoras se constitui numa mistura dessas concepções de ensino.

Leia-se o trecho a seguir.

[...] cada um tem uma maneira diferente de aprender. Então ou é com

material concreto, se você vê que ele não vai só com giz e quadro, aí

você parte para o concreto [...] vai muito da vontade da criança de

aprender. Tem aquelas crianças que têm facilidade com a

Matemática e tem aqueles que já têm dificuldades com a Matemática,

não gostam da Matemática e aí fica mais difícil ainda. (Professora

Verde)

Esta mescla também pode ser confirmada neste outro

depoimento: [...] nossa realidade é essa, a maior parte das aulas são

expositivas [...] eu utilizo bastante material concreto com eles [...], que assim

conclui: com esse material eu consigo melhorar a aula do que só ficar naquela

aula de giz e quadro, naquela aula expositiva (Professora Azul). Este

depoimento também explicita que o uso do material concreto tem, para esta

docente, a finalidade apenas de deixar a aula mais interessante e diferenciada.

Percebe-se que há fragilidade teórica quanto aos fundamentos epistemológicos

que subsidiam essa intervenção pedagógica.

A professora Anil considera que o ensino da Matemática deve se

dar da maneira mais simples que tem [...]. Quando indagada sobre o que vem a

ser essa simplicidade, respondeu:

É você chegar para ele e tentar fazer ele entender do modo mais simples possível, porque, às vezes, você chega ali e diz: – olha! Vocês têm que fazer essa conta aqui. (professora) – Ah, professora, mas a gente não sabe. (aluno) – Então vamos fazer desde o começo. (professora) Você começa, nem se for para você pegar desde o 1º ano e você vai

ensinando [...] tem criança que tem muito mais dificuldade do que a

outra [...] É você usando o material que você acha que é necessário

naquela hora, porque não adianta você querer vir com um monte de

coisa e às vezes ali você precisa disso aqui só para eles aprender, de

uma coisa bem simples.

De tudo o que foi exposto, não se pode desconsiderar, que

historicamente, o ensino da Matemática na perspectiva tradicional tem se

configurado presença marcante na educação brasileira. A partir destes

depoimentos é possível inferir que há permanências e transformações no

processo de construção do ideário pedagógico dessas educadoras. O que se

percebe é que existe um movimento de ação-reflexão-ação no ensino desta

151

área do conhecimento com vistas à construção de práticas pedagógicas que

considerem o processo de construção também do conhecimento matemático.

O que se deseja é que as professoras sejam preparadas para encorajar as

crianças a pensar ativa e autonomamente em todas as situações, rejeitando a

formação de sujeitos heterônomos e contribuindo para a construção da

autonomia e do desenvolvimento do pensamento crítico do aluno.

4.4 A atuação do Pedagogo no Ensino da Matemática nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: Desafios e Problemas Enfrentados

Redimensionar os olhares sobre a formação do pedagogo e o

ensino de Matemática nos Anos Iniciais perpassa a problematização dos limites

e possibilidades que se desenham no contexto das práticas educativas. Com

tal propósito, o texto que ora se apresenta traz a análise dos depoimentos das

interlocutoras deste estudo, que busca apontar quais são os desafios e

problemas que o professor graduado em Pedagogia enfrenta para ensinar a

Matemática na 1ª e 2ª fases de II Ciclo do Ensino Fundamental, interesse

principal desta investigação.

Quando perguntadas sobre esse tema, as professoras evidenciam

a anuência de que suas atuações no ensino da Matemática são marcadas por

problemas e desafios, os quais residem em situações que envolvem a

formação do professor, a organização da escola por ciclos de formação

humana, a família do aluno e o aluno.

Quanto à formação do professor, as depoentes asseguram que

enfrentam limitações para ensinar os conteúdos matemáticos. Assim, afirmam:

[...] nós não temos a formação na faculdade – a formação específica da área

de Matemática. Eles não te dão base para você trabalhar nisso (Professora

Verde); Dificuldade a gente tem porque a formação da gente é um pouco

precária com relação à aplicação mesmo dos conteúdos, confirma a professora

Azul.

Compreende-se que isto se deve à existência de fragilidades na

formação do professor dos anos iniciais no que diz respeito aos conhecimentos

específicos da disciplina em pauta, conforme mostra Curi (2004):

152

É possível considerar que os futuros professores concluem cursos de

formação sem conhecimentos de conteúdos matemáticos com os

quais irão trabalhar tanto no que concerne a conceitos, quanto a

procedimentos, como também da própria linguagem matemática que

utilizarão em sua prática docente. (p. 76-77)

Essa problemática da formação resulta para os pedagogos em

desafios para o ensino da Matemática, como bem esclarece a exposição do

depoimento da professora Amarelo. Para esta a situação desafiadora reside no

[...] jeito matemático mesmo de ensinar. Às vezes a gente coloca

lá – “Você tira isso aqui, diminui, entendeu?” Aí você tem que saber

as formas direitinho, o que é “minuendo”, o que é “subtraendo” para

passar. Isso aí eu tenho ainda alguma dificuldade, tenho dificuldade

de passar os termos matemáticos, tinha mais ainda, mas conforme

você vai lendo vai superando. Tenho dificuldade com o conteúdo

mesmo, porque na época em que aprendi armava a continha e dizia:

“esse mais esse é tanto, aí não sabia porque que vai um número, se

é centena, se é dezena” [...] eu tinha dificuldade, eu não compreendia

o processo, já ia lá calculando mas não sabia porque que o número

subia – aquilo lá era uma dezena? Era uma centena? “Sobe um, vai

um”, era assim, pelo menos no meu caso.Então eu tenho dificuldade

de passar os termos matemáticos da maneira correta para o aluno

não ficar como eu fiquei. Passar de uma forma mais clara, porque às

vezes a gente aprende e fica com a gente, mas, eu digo assim, para

passar para o aluno aquele termo. A gente fica preocupado: Será que

isso aqui é a maneira certa que eu estou falando paro aluno? Será

que esse é o termo certo já para essa fase? Por exemplo: “Sucessor”,

“antecessor”, antes, lá nas primeiras fases é “vizinho”, qual que é

maneira certa? Essa aí que é a minha dúvida.Qual é a maneira certa

que eu tenho que ensinar para os meus alunos? “vizinho”, “sucessor

e “antecessor”? Porque tudo isso vai influenciar para eles também, os

termos matemáticos. Eu tenho dificuldade nisso, por exemplo, lá no

curso,na hora de ensinar os numerais, a gente vai do zero e vai até o

dez? Ou a gente começa do um e vai até o nove e depois explica

que o dez é dezena? Eu tenho essa preocupação em saber se você

está ensinando certo ou não, se a maneira como eu aprendi é certa.

Esta fala nos remete ao posicionamento de Shulman (apud

Montalvão e Mizukami, 2002) a respeito da importância dos conhecimentos das

disciplinas curriculares – conhecimento da matéria. Para o autor trata-se de

conhecimento imprescindível para a docência. Sem o domínio dos conteúdos

matemáticos, o professor se percebe impossibilitado de mediar os

conhecimentos matemáticos construídos historicamente e os conhecimentos

escolares.

153

Em outras palavras, para ensinar o professor necessita de

saberes da disciplina (Tardif, 2002), que, neste caso, compreendem os

princípios fundamentais da Matemática. É imperioso que o docente conheça os

conceitos matemáticos, a história da Matemática e quais os caminhos que

definem a organização dos princípios fundamentais desta área do

conhecimento. No entanto, nos programas de formação do pedagogo, como já

referido anteriormente neste estudo, a dimensão do conteúdo tem sido pouco

considerada.

De fato, o estudo de Gatti e Nunes (2008) mostra que os

conteúdos da educação básica, entre outros, a Matemática, são pouco

explorados nos cursos de Pedagogia. São apenas abordados de modo

superficial nas disciplinas de metodologia e práticas de ensino. Por

consequência, os cursos de Pedagogia não têm oferecido aos futuros docentes

os elementos necessários para se dar uma boa aula, e esses profissionais

saem da faculdade sem saber o quê e como ensinar Matemática nos Anos

Iniciais do Ensino Fundamental.

O resultado desta investigação comprova tal fato, pois mostra

que as instituições matogrossenses pesquisadas destinam pequena carga

horária, em média 4,5%45, do total do curso, à preparação do pedagogo para

atuar com a Matemática. É interessante dizer que a professora Amarelo, autora

do depoimento supracitado, concluiu o curso de Pedagogia em 2004 na

UFMT/CUR, instituição pesquisada no presente estudo, o que torna possível

visualizar a sua formação pelos dados coletados nesta pesquisa. Naquela

ocasião, a formação matemática era oferecida no terceiro ano do curso, junto à

formação para o ensino de Ciências, por meio da disciplina Matemática e

Ciências Naturais e suas Tecnologias: Conteúdo e Metodologia, com carga

horária de 128 horas, o que equivale a 4,46% do total das horas do curso.

Fator agravante é que essa exígua carga horária não era exclusiva para a

formação para o ensino da Matemática, sendo destinada também à formação

para o ensino de Ciências. Isto concorreu para que o tempo dedicado à

formação matemática desta professora fosse ainda menor.

45

Neste caso o curso de Pedagogia do UNIVAG se constitui exceção, porque dedica apenas

1,84% da carga horária total para a formação matemática do pedagogo.

154

Embora seja longo esse depoimento da professora Amarelo, ele

pode melhor explicitar a dimensão deste problema: a fragilidade teórica do

pedagogo quanto aos conteúdos matemáticos. Esta interlocutora afirma que o

desafio para ensinar os conteúdos matemáticos não decorre apenas da frágil

formação recebida na graduação; antes, tem origem em dificuldades que

nasceram na educação básica. Para Tardif (2002), os saberes do professor são

construídos, também, em sua trajetória pré-profissional, uma vez que este

passa muitos anos de sua vida na escola, ambiente do seu futuro trabalho.

É verdade que, infelizmente, os desafios para ensinar os

conteúdos matemáticos não procedem apenas de fragilidades na formação

desenvolvida nos cursos de Pedagogia. O professor ao longo da sua formação

é ensinado tanto por professores que atua nos Anos Iniciais quanto, e na

maioria dos anos, por docentes licenciados em Matemática. Daí poder-se

possível dizer que o professor dos Anos Iniciais não sabe ensinar aos seus

alunos conteúdos matemáticos de que ele deveria ter se apropriado ainda na

educação básica. Por outro lado, seria possível ao curso de Pedagogia, que já

tem a tarefa de formar um profissional para atuar em múltiplos espaços –

escolares e não escolares –, dar conta de proporcionar ao discente

conhecimentos de conteúdos matemáticos que deveriam ter sido adquiridos na

Educação básica?

Este depoimento permite inferir que o problema do fracasso

escolar nos Anos Iniciais relacionado ao ensino-aprendizagem da Matemática

deve ser preocupação não só dos cursos de Pedagogia, mas também das

licenciaturas nessa área do conhecimento.

Ora, não se pode desconsiderar a complexidade que envolve a

formação de um professor. Há, sim, que se ponderar que as experiências

passadas influenciam as concepções sobre a educação, a escola, o ensino, a

aprendizagem, os alunos etc., refletindo diretamente na prática docente. Nóvoa

(2000, p.16) é incisivo ao dizer que “[...] o sucesso ou insucesso de certas

experiências „marcam‟ a nossa postura pedagógica, fazendo-nos sentir bem ou

mal com esta ou com aquela maneira de trabalhar na sala de aula.” As

dificuldades com a aprendizagem da Matemática ao longo da escolarização

podem, com efeito, produzir marcas nos estudantes. Neste sentido é

importante que o curso de Pedagogia proporcione situações didáticas que

155

contribuam para o processo de superação da visão negativa que muitos

discentes têm da Matemática.

A esse respeito, a professora Violeta diz que por muitos anos teve

resistência em assumir as aulas de Matemática. Para ela, vencer a própria

resistência contra a disciplina, aprendendo a gostar dela , é um dos desafios

que muitos pedagogos devem enfrentar, a fim de não imprimir uma visão

negativa desta área do conhecimento a seus alunos, pois

[...] a Matemática, você tem que passar a gostar porque se você não gostar dela você vai achar toda dificuldade do mundo [...] eu percebi que não tem como eu trabalhar com os meus alunos sem quebrar esse gelo que tinha entre mim e a Matemática para que meus alunos, futuramente, não tenham essa resistência que eu tive.

A fala da docente expressa que foi na prática, na relação

professor-aluno, que ela despertou e se percebeu responsável por aceitar ou

não, que sua profissão docente prosseguisse marcada por uma visão negativa

da disciplina. Para ela, uma postura negativa em nada contribui para minimizar

as dificuldades enfrentadas no seu ensino, ao contrário, piora a situação.

Percebe-se nas palavras desta professora um despertar crítico ao

confrontar-se com sua própria realidade concreta, pois “quando aprendemos

por que vemos o que vemos, nós estamos pensando sobre o pensar,

analisando as forças que moldam nossa consciência, colocando o que nós

percebemos num contexto significativo” (KINCHELOE, 1997, p.192).

De acordo com o depoimento da professora Violeta é necessário

aprender a gostar da Matemática e este processo de aprender a gostar implica

romper e superar a resistência, no dizer da depoente, na decisão de quebrar o

gelo. É possível perceber em sua fala que esta ação é pautada na busca de

estreitamento com a Matemática e tem origem no comprometimento político da

docente. Para ela, tal compromisso conduz à tomada de decisão de ir para o

enfrentamento das dificuldades a fim de construir uma identidade docente bem

relacionada com o ensino desta área do conhecimento.

Neste sentido, Veiga (2009) defende que pensar a formação do

professor exige compreender que a preparação para o magistério deve ser

entendida como uma tarefa complexa e inerentemente política. É fundamental

que o docente, sabendo o valor que tem para a modificação da realidade, em

156

seu processo formativo considere como princípio basilar a politicidade que

envolve o seu trabalho. Em Freire (1999, p. 110), vê-se também

Minha presença de professor, que não pode passar despercebida dos alunos na classe e na escola, é uma presença em si política. Enquanto presença não posso ser uma omissão, mas um sujeito de opções. Devo revelar aos alunos a minha capacidade de analisar, de comparar, de avaliar, de decidir, de optar, de romper. (p.110)

Ainda na mesma direção, Paro (2008) considera que o docente

precisa ter consciência política de sua função e de seu papel no processo

ensino-aprendizagem. Ele tem a função de propiciar condições para que seus

alunos se façam sujeitos de sua aprendizagem. Para isso o professor deve ter

compromisso com o trabalho que realiza, ele precisa querer ensinar para

conseguir fazê-lo.

Para Contreras (2002), comprometer-se com o desenvolvimento

pessoal dos estudantes e buscar o progresso de suas aprendizagens é

obrigação moral do professor, no sentido de que

O professor ou a professora tem que inevitavelmente se defrontar com sua própria decisão sobre a prática que realiza, porque ao ser ele ou ela quem pessoalmente se projeta em sua relação com os alunos e alunas, tratando de gerar uma influência, deve decidir ou assumir o grau de identificação ou de compromisso com as práticas educativas que desenvolve, seus níveis de transformação da realidade que enfrenta, etc. Essa consciência moral sobre seu trabalho traz emparelhada a autonomia como valor profissional. (CONTRERAS, 2002 p.78)

Falando, ainda, sobre o relacionamento do docente com os

conteúdos matemáticos, outros professores evidenciam que se trata de tarefa

complexa para o educador a busca pela apropriação do conhecimento dos

conteúdos que ele necessita ensinar. A professora Azul confirma que o desafio

[...] Na Matemática [...] é ter que buscar, aprender coisas que você não tem na

sua bagagem de formação [...] a gente tem dificuldade com o conteúdo, com

aquele conteúdo específico [...]. Esse movimento de busca constitui-se de

batalhas que são travadas no campo cognitivo, pois exige atitude de estudo

dos conteúdos matemáticos dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental que o

docente precisa trabalhar. Não se trata de estudar, simplesmente, o conteúdo

pelo conteúdo, mas conjuntamente exige a competência de reflexão sobre a

157

prática de ensino do mesmo no sentido de aprimoramento de sua formação

matemática.

Portanto, é necessário ao professor que ele tenha o conhecimento

científico da disciplina que irá ensinar para transformá-lo em conhecimento

pedagógico. Todavia, não se pode ignorar que, para muitos docentes, isto se

torna um processo longo e difícil porque a luta se dá também no campo

emocional, o que implica em ação perpassada pelo esforço de aquisição

técnica dos conhecimentos específicos desta área do conhecimento, visto que

exige, sobretudo, que o professor enfrente os sentimentos de fracasso

procedentes das situações de insucesso sofridas ao longo da formação.

Outro desafio apontado pelas depoentes é o problema do deficit

de aprendizagem dos alunos. Suas falas evidenciam que muitas das crianças

chegam ao II Ciclo sem, contudo, apresentar os saberes que deveriam ter sido

apropriados no I Ciclo. São defasagens de aprendizagem, sobretudo, na área

da Matemática e Português. Para as interlocutoras, isso traz implicações que

embaraçam o processo ensino-aprendizagem da Matemática, visto que

necessitam cumprir a tarefa de ensinar os conteúdos matemáticos propostos

para a fase do II Ciclo em que atuam, tendo ainda que buscar meios para sanar

as defasagens de aprendizagem observadas em cada aluno, que, segundo as

depoentes, não são poucas.

A esse respeito, quando inquiridas sobre quais os desafios que

enfrentam para ensinar a Matemática na 1ª e 2ª fases do II Ciclo, respondem,

por exemplo:

Eu acredito que são as habilidades que eles deveriam que ter

desenvolvido lá no início e não foi desenvolvido, porque tem uma

sequência, você tem uma sequência, e quando você chega, por

exemplo, numa 2ª fase do II Ciclo que o aluno tem que ter já um

mínimo de conhecimento prévio e ele não tem esses conhecimentos,

para você conseguir trabalhar todos esses conhecimentos mais

aquilo que você tem que trabalhar que é do seu currículo aí você não

consegue. [...] Tem aluno que não conhece unidade de milhar. Eu

tenho aluno aqui que não conhece centenas [...]. (Professora Verde)

O depoimento da professora Rosa vem ratificar essa visão.

Eu considero o meu maior desafio – a falta de conhecimento, [...] dos

conhecimentos prévios, que eles deveriam ter e eles não têm. Eles

158

não construíram os conhecimentos básicos que eles deveriam ter

para estar na fase que eles estão. Eles não sabem. É muito sério

porque eles não conhecem. [...]. De 15 alunos 2 ou 3 se apropriaram

dos conhecimentos da Matemática no I Ciclo.[...] eles foram passando

de uma fase para outra sem que existisse uma cobrança séria em

relação ao assunto, porque os meus alunos desse ano, eles não

sabem somar, eles não sabem multiplicar, eles não sabem dividir,

eles não sabem subtração, se tiver 500 - 479 eles não sabem porque

tem o zero. Eles dizem: – Como que eu vou tirar 9 de zero. É zero,

eles falam. Então, os meus alunos não sabem Matemática, essa é a

minha dificuldade. (Professora Rosa)

Num trecho da entrevista a professora Azul realça:

[...] nos últimos anos eu tenho trabalhado com a 1ª e 2ª fase do II

Ciclo e eu percebi que eles vêm com pouco conteúdo, com pouco

embasamento. [...] a realidade dos alunos é basicamente a mesma:

eles vêm mesmo sem conteúdo e com muita dificuldade [...] Então eu

percebo que o professor destas primeiras fases trabalha mais a

alfabetização, a preocupação deles é com a linguagem, mesmo e vai

deixando um pouco a Matemática [...]. (Professora Azul)

Embora nesse depoimento a professora Azul exponha que, a seu

ver, no I Ciclo se dá prioridade ao ensino da linguagem em detrimento da

Matemática, a professora Rosa e a professora Verde salientam que alunos

chegam ao II Ciclo apresentando defasagens relacionadas à leitura e escrita, o

que, segundo as educadoras, incide fortemente nas aprendizagens da

Matemática, agravando o quadro, porque

[...] a Matemática também envolve a linguagem e [...] eles não interpretam porque não sabem ler e não conseguem interpretar [...] a Matemática não é só aquela coisa básica, é um questão de interpretação, também [...]. Então eu diria que a falta de conhecimentos prévios, a leitura muito precária, [...] eu diria, nossa! É muito sério, é muito grave. (Professora Rosa) A Matemática, você, além de saber ler você tem que saber

interpretar, você tem que ter o raciocínio em cima daquilo que você lê

e aí, para o aluno que não lê fica difícil. Eles chegam na 2ª fase do II

Ciclo e não leem; tem aluno analfabeto, tem aluno silábico, então aí

que está o problema. [...] Então a maior dificuldade é isso: É a

defasagem mesmo de aprendizagem. É ele não ter o conhecimento –

as habilidades que deviam ter sido formadas. [...] É falta dos

conhecimentos, das habilidades que eles deveriam ter aprendido.

(Professora Verde)

159

Para as entrevistadas, o problema do deficit de aprendizagem se

explica porque os estudantes estão inseridos num sistema de ensino

organizado por Ciclos de Formação Humana, como é o caso da Rede de

Ensino locus deste estudo, em que aluno não é reprovado e tem garantia de

promoção automática para a próxima fase. Este modelo que se contrapõe a

uma cultura escolar de reprovação e classificação, resulta, segundo as

depoentes, em turmas com agrupamento de alunos com maior disparidade

quanto aos níveis de aprendizagem.

É bem verdade que a possibilidade de se manter a continuidade

do processo de aprendizagem, sem interrupções, como propõe a política de

ciclos, nem sempre é garantida. Contudo, na fala das entrevistadas, parece

que o desafio que o docente encontra para ensinar a Matemática reside

somente na criança, que, segundo elas, traz defasagens de conteúdos, não só

da Matemática, mas também da Língua Portuguesa, que deveriam ter sido

apropriados no I Ciclo; mas, neste contexto, onde fica o projeto da escola? E o

programa para esta área do conhecimento? E o planejamento do professor?

Tomando como base o estudo de Mainardes (2009) é possível

considerar que se trata de problema de natureza pedagógica que envolve

questões relacionadas ao currículo, à avaliação, às metodologias, à formação

permanente de professores. No caso desta pesquisa, é preciso que a equipe

diretiva da escola, em conjunto com os professores, busque definir os

conhecimentos matemáticos a serem privilegiados em cada ciclo

estabelecendo a articulação entre currículo, avaliação, orientações

metodológicas e formação permanente dos professores.

O que se propõe é que os processos de planejamento da escola e

dos professores sejam vivenciados, reinterpretados e reconstruídos para que a

diversidade de níveis de aprendizagem dos estudantes seja respondida com a

diversificação da pedagogia. As orientações metodológicas para o ensino da

Matemática devem ser repensadas e discutidas no ambiente escolar a fim de

que o trabalho pedagógico se dê em conformidade com o que demanda este

modelo de escolarização. Neste contexto, o processo ensino-aprendizagem

desta área do conhecimento requer, necessariamente, que o professor tenha

clareza a respeito de exigências fundamentais, tais como:

160

[...] o trabalho pedagógico com classes bastante heterogêneas [...]; o planejamento de atividades diversificadas; as possibilidades de sistematização do ensino e do planejamento de intervenções necessárias para a classe como um todo, para grupos específicos e para alunos individualmente. (MAINARDES, 2009, p.80)

Por outro lado, por mais que se compreenda a importância do

papel do professor na melhoria da qualidade do ensino da Matemática, não se

pode ignorar que a organização da escola em ciclos é “algo complexo e

desafiador, pois pressupõe uma mudança na lógica na organização escolar

como um todo” (MAINARDES, 2009, p. 72), e sua concretização qualitativa

constitui um “processo longo e não ocorre de forma isolada ou separada das

mudanças econômicas, sociais, históricas e políticas” (Idem, p.71).

Ainda a esse respeito, a professora Amarelo esclarece que o

desafio que enfrenta para ensinar a Matemática está ligado à escola

organizada por Ciclos de Formação Humana:

Um dos desafios é próprio sistema de ensino hoje, porque, às vezes, a criança chega lá na 2ª fase do II Ciclo com bastante dificuldade para gente estar ensinando a Matemática para esta fase, então, você tem que estar procurando um meio para estar ensinando aquelas crianças que apresentam mais dificuldades e também aquelas outras que já estão no nível certo para fases que eles estão. Então você tem que estar trabalhando de forma diferente com aquela criança que veio lá das outras fases já com dificuldade desde a 1º, 2º, 3º ano até chegar là na 2ª fase do II Ciclo e também os outros que estão acompanhando, a gente tem também que trabalhar o conteúdo.

A implantação dessa organização escolar incide diretamente

sobre o trabalho do professor, sugerindo novas práticas, novos conhecimentos

e a reflexão acerca da prática pedagógica. Porém, Mainardes (2009) aponta

que uma das possíveis desvantagens da escola organizada em ciclos é a não

garantia das aprendizagens, visto que, em muitos casos, os diferentes níveis e

necessidades de aprendizagem não são atendidos, o que resulta em classes

heterogêneas.

Diante disso, pelo o exposto no depoimento acima entende-se

que a professora tem dificuldade de transpor os obstáculos para deixar o

trabalho homogêneo que está concebido na escola seriada; mas a escola não

pode deixar de considerar as diferenças individuais, pois ela recebe alunos em

diferentes níveis de aprendizagem.

161

Neste sentido, Nóvoa (2009) defende que a escola que poderá

contribuir para a melhoria da qualidade da educação é aquela que seja mais

orientada para as aprendizagens. Que, em vez da homogeneização

característica da escola do século XX, seja aberta à diferença, ao diálogo e à

comunicação, de maneira que a organização do trabalho educativo considere a

“aplicação de uma pedagogia diferenciada em função das necessidades de

cada aluno” (p.87).

Para o autor, “[...] não há cidadania se os alunos não aprenderem

[...]” (Idem, p. 68). Assim considerando, insiste que a escola que promove a

cidadania dos educandos é aquela que, entre outras dimensões, trabalha a

favor de mais aprendizagem. Decisivamente, nesta empreitada, o docente se

constitui elemento insubstituível, na promoção das aprendizagens e na

construção dos processos de inclusão. Isso implica em novas demandas para o

trabalho do professor indicando que ser professor hoje é tarefa mais complexa

do que no passado.

A partir das declarações supracitadas da professora Amarelo,

acredita-se que é possível sugerir que essa nova organização da escola e,

neste bojo, a heterogeneidade nos níveis de aprendizagem dos alunos,

demanda uma preocupação em torno da avaliação e da estratégia de ensino a

ser adotada, já que a avaliação deve permitir repensar o currículo da escola e

as metodologias utilizadas.

Avaliar, neste modelo, não é tarefa simples para o professor visto

que exige que dê novos sentidos à sua prática avaliativa, o que inclui romper

com certa forma de avaliação já firmada na prática educativa, caracterizada

como excludente, classificatória, quantitativa e repressora da criatividade e que

responsabilizava exclusivamente o aluno pelo fracasso escolar.

Numa proposta de avaliação que se opõe a essa tradicional,

[...] avaliação deve ser praticada para que se possa conhecer o que

os alunos aprenderam e o que lhes falta para aprender e para

recuperar, contribuindo assim, para o desenvolvimento de sua

aprendizagem. Isso significa diagnosticar as causas das deficiências

ou dificuldades apresentadas pelos alunos no processo de ensino e

aprendizagem e procurar saná-las. (VEIGA, 2009, p.69)

162

Atender necessidades de aprendizagens das crianças, por sua

vez, significa considerar as diferenças individuais e as mais variadas maneiras

que elas têm de aprender. É plausível a afirmação de que para ensinar a

Matemática, o professor deve se preocupar com a forma com que cada aluno

se apropria do conhecimento matemático. Isso requer que ele recorra a

conhecimentos diversos, entre eles, como aponta Shulman (1986, 1987 apud

Montalvão e Mizukami, 2002), o conhecimento do aluno, isto é, conhecer suas

características individuais, seus processos/estilos de aprendizagem

específicos, ritmos, interesses e história de vida.

Ademais, para o educador traçar estratégias de ensino que

possam contribuir para a melhoria da qualidade da aprendizagem de seus

alunos é preciso que ele inclua neste processo avaliativo sua prática de ensino,

fazendo uma auto-avaliação, pois o caráter fundamental da avaliação46

consiste em ajudar o aluno a aprender e o professor a ensinar.

Ainda quanto ao modo de organização da escola em ciclos de

formação, o depoimento da professora Anil é incisivo e revela insatisfação com

o sistema implantado, apontando-o como o maior desafio a ser enfrentado pelo

professor no que diz respeito às defasagens de aprendizagem dos alunos.

Esse negócio de não ter... Ah não sabe, vai embora, vão passando os alunos para frente, às vezes, sem saber ler, sem saber escrever. Tem menino que não sabe ler e nem escrever e já está no 4º ano, na 2ª fase do II ciclo. Então a culpa não é nossa. O desafio maior é a gente ter que enfrentar essa maneira como a escola está organizada, porque antigamente você não sabia, você não passava, repetia de ano. Hoje não, o aluno mesmo diz: Aquele menino não sabe nada e passou, porque é que eu tenho que estudar, se eu não estudar também eu vou passar. [...] Então eu acho que a escola que vai passando, mesmo os pais, eles não acham certo, eles acham que tem que reter a criança [...] porque antigamente a gente tinha vergonha de repetir de ano. Hoje, vai embora.

Em seu discurso a professora Anil demonstra um espírito

saudosista quanto ao antigo regime seriado e uma forte preocupação com o

aspecto de não se reprovar o aluno. Ela reclama que muitos discentes não se

interessam em estudar pelo fato de não haver mais a reprovação. Neste

46

VASCONCELLOS, Celso dos Santos. Avaliação: Concepção dialético-libertadora do processo de avaliação escolar. 3ª ed. São Paulo: Libertad, 1993. LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem escolar: Estudos e proposições. São Paulo: Cortez, 1995.

163

sentido, acredita que o problema do fracasso escolar da Matemática se prende

à nova organização escolar e diz que a culpa não é do professor. Do modo

como a professora se manifestou, parece permanecer a ideia da transferência

de responsabilidade pelas não aprendizagens do aluno. Na escola seriada o

aluno sempre era o responsável pela reprovação, e muito pouco se

questionava a omissão da escola e o desempenho do professor.

Quando a depoente afirma que os pais preferem a reprovação em

vez da progressão sem aprendizagem, está, por um lado, admitindo que os

pais desejam que a criança se aproprie do conhecimento e, por outro lado, está

mostrando a tradição da escola de isentar-se frente à reprovação. Ora, o fato é

que a escola conseguia a concordância daqueles pais que não exigiam da

mesma o cumprimento de sua função primordial, que é o ensino.

Fica claro que ela ainda não conseguiu se desprender da ideia de

avaliação classificatória que serve como instrumento de poder, de punição, de

controle do estudante. No entanto, é necessário que a avaliação seja inclusiva

e democrática, de caráter emancipatório, diagnóstico e processual, que tenha

por finalidade acompanhar o movimento das aprendizagens do aluno. Sobre a

retenção dos alunos, Mainardes (2009) explicita que pesquisas têm mostrado o

quanto a reprovação nos anos iniciais é prejudicial para a auto-estima da

criança e não coopera para as aprendizagens no ano seguinte. Segundo o

autor, “uma reprovação nessa fase é desestimulante, pode levar a criança a

não acreditar em suas possibilidades de aprendizagem ou a abandonar a

escola” (p. 67). No mesmo sentido, para Carvalho (2005), “a maior

perversidade na educação são as marcas produzidas pelo insucesso escolar”

(p.178).

Aqui é imprescindível frisar que, embora a escola organizada em

ciclos se denomine não excludente, muitos de seus alunos sofrem exclusão.

Esta escola acolhe, mas não consegue ensinar e, portanto, exclui pela não

garantia das aprendizagens dos alunos.

O problema é que existe um fosso entre a proposta do ciclo e sua

real efetivação. O ciclo, na realidade, tem se constituído numa junção de fases

com mentalidade de escola seriada. Embora a escola esteja organizada em

ciclos, a concepção dos professores continua sendo a da escola seriada.

Assim, a cultura da reprovação, como se pode verificar, é elemento fortemente

164

presente no conteúdo das falas das depoentes, o que permite deduzir que o

problema não está na organização da escola por Ciclos de Formação Humana,

embora esta tenha suas dificuldades e limitações. Está nas concepções de

escola das professoras. Permanece no imaginário destas professoras alguns

referenciais cristalizados como, por exemplo, “o ciclo é uma modalidade que

não reprova”; “no ciclo o aluno não precisa mais estudar”.

De acordo com a Proposta Curricular de Matemática – SEE-

SP/1988, a flexibilidade para o desenvolvimento dos programas dentro do Ciclo

proporciona ao professor a possibilidade de tratar os temas da Matemática com

mais autonomia, respeitando ritmos individuais e processos de maturação.

Desse modo, uma mesma noção deverá ser retomada em diferentes ocasiões,

que sejam convenientes, de modo a permitir sua elaboração e reelaboração

por parte do estudante, desde um primeiro contato, onde ele capta

intuitivamente as ideias básicas e as aplica em situações-problema, até a fase

em que é utilizado o pensamento lógico-dedutivo, permitindo uma progressiva

formalização e sistematização do conceito enfocado.

Pode-se inferir, com base nos discursos das educadoras que a

dificuldade está em que o professor não consegue ensinar esses alunos, por

razões que vêm sendo explicitadas neste estudo, quais sejam: fragilidade na

formação matemática do professor, contraída ao longo da sua vida enquanto

aluno da educação básica; na graduação, o fato de o curso de Pedagogia não

oferecer conhecimentos dos conteúdos matemáticos que o professor irá

ensinar, dando prioridade aos aspectos metodológicos do ensino desta área do

conhecimento, além de destinar uma carga horária insuficiente para esta

preparação.

É bem verdade que o ciclo possibilita a falta de compromisso

tanto do professor como do aluno em relação às aprendizagens, estimulando

uma cultura de transferência de responsabilidade. Trata-se, na verdade, de um

problema político: o trabalho do professor é inerentemente político e deve ser

permeado pelo compromisso com a aprendizagem dos alunos.

Todavia, é importante não centrar a culpa só no professor, pois na

escola organizada em ciclos a responsabilidade pelo ensino é do coletivo da

escola. A política de ciclos orienta para a superação de ações individuais e

sugere um trabalho mais articulado que envolva o coordenador pedagógico, o

165

professor, o coordenador de ciclos nas ações de planejamento e avaliação,

com vistas a dar um sentido comum ao projeto educativo da escola. Mainardes

(2009) realça que

[...] é preciso reconhecer que os ciclos trazem implicações não apenas para os professores, gestores escolares, pedagogos e demais profissionais que atuam na escola. A implantação de ciclos traz implicações sérias para os gestores do sistema educacional (equipes das secretarias de educação), para a sociedade civil (conselhos de educação, por exemplo, que poderiam avaliar, propor e mobilizar ações), bem como para a comunidade acadêmica. (p.94)

É preciso criar alternativas que possibilitem aos professores dos

anos iniciais refletirem sobre sua práxis, em que as dificuldades e os êxitos no

ensino da Matemática possam ser compartilhados tendo em vista o sucesso da

aprendizagem dos estudantes.

Neste sentido, a formação contínua na escola, como espaço de

construção do conhecimento, constitui-se instrumento importante. Ela deve

obedecer à lógica da constituição do projeto educativo, na qual a formação

docente se articula com o projeto de gestão que toma como ponto de partida

do processo de formação a própria experiência dos professores, na perspectiva

de refletir sobre a prática, buscando produzir novos conhecimentos a partir da

interação recíproca no contexto escola.

Cabe a gestão da escola, por conseguinte, criar um ambiente

agradável que favoreça e estimule os membros que compõem o coletivo da

unidade de ensino a se envolverem no diálogo e no processo de construção do

conhecimento. Como destaca Freire (1996), “na formação permanente dos

professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. É

pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a

próxima prática” (p.43,44).

Apesar disso, o que até aqui foi apresentado, tomando como

referência a fala das depoentes, revela que não há uma política de formação

centrada na escola como um todo, que possibilite aos professores pensar,

refletir sobre a sua prática pedagógica, visando a uma docência de melhor

qualidade tal como expressa Rios (2001). Isso contribui significativamente para

que essas professoras não tenham conseguido dar o salto necessário para a

compreensão dos elementos basilares da escola em ciclos. É necessária uma

166

melhor gestão deste espaço de modo que o mesmo seja realmente utilizado

para o estudo dos problemas surgidos no contexto escolar.

Parece que neste novo modo de organizar o espaço educativo, o

processo mesmo de formação docente, a problematização do ensino e da

prática para que novas formas de intervenções educativas sejam construídas

pelo coletivo de professores tem se dado, não antes da mudança, mas durante.

Assim, as interlocutoras deste estudo ensinam a Matemática inseridas neste

contexto, participando deste esforço coletivo de inovação e de busca dos

melhores percursos para a transformação da escola.

Diante do exposto, verifica-se que é de fundamental importância

que os cursos de Pedagogia no estado de Mato Grosso organizem a formação

do professor de modo a fornecer conhecimentos acerca dos fundamentos,

características e implicações da escola organizada em ciclos, visto que a rede

estadual de ensino deste estado e as redes municipais estão organizadas

dessa forma.

Outro desafio, ainda, que o pedagogo enfrenta para ensinar a

Matemática tem como cerne o aluno. As professoras depoentes apontam que

falta o interesse do aluno em participar da aula, há ausência de desejo em

aprender os conteúdos matemáticos e falta gosto pela Matemática. Para as

depoentes, isso traz implicações para o processo ensino-aprendizagem.

Segundo a professora Verde [...] o grande desafio mesmo é fazer com que o

aluno se interesse e preste atenção para aprender [...], e a professora

Vermelho considera que a criança que não pergunta é um desafio [...] o meu

desafio é fazer com que ela participe [...]. Neste sentido o depoimento da

professora Anil é elucidativo:

[...] o desafio mesmo é a falta de interesse do aluno. [...] às vezes,

você está explicando uma coisa e o menino está brincando com

pulseira, está brincando com lápis, está desenhando, então tem hora

que a gente pára de chamar a atenção, pára de ficar pegando no pé,

porque pede: – Faz, faz... e acaba não dando resultado. Ou, às

vezes, a gente fala para a gente mesmo: Onde é que eu estou

errando? Será que sou eu que estou deixando de fazer alguma

coisa? Mas aí quando a gente se encontra na sala de professores, a

pergunta de todo mundo é a mesma coisa. Então, não somos nós,

também a culpa é dos alunos que não estão interessados.

167

Quanto à problemática, a professora Amarelo e a professora

Violeta concordam que é tarefa complexa estimular o aluno a desenvolver o

gosto pelo estudo da Matemática. A primeira assegura que O desafio é fazer a

criança gostar mesmo da Matemática. A outra esclarece:

O desafio que eu encontro é quando o aluno demonstra resistência,

quando ele fala que não gosta de Matemática. Quando ele não gosta

já dificulta muito ele aprender [...] então o desafio é mostrar para eles

que a Matemática pode ser uma coisa prazerosa, e é uma coisa do

dia-a-dia deles [...] É o aluno gostar da Matemática. (Professora

Violeta)

Nesta teia, o desafio de ensinar esta área do conhecimento está

em encontrar a melhor forma de ensino que seja capaz de estimular o interesse

e o gosto do discente pela mesma a fim de promover aprendizagem

significativa. Nesta visão, pondera Carvalho (2005):

É óbvio que para o aluno poder construir conhecimento é preciso

querer aprender. Porém, na sala de aula, o desejo para conhecer

depende da forma como o professor apresenta o conteúdo para ser

apropriado, da forma como trabalha com o conhecimento, com a

organização da coletividade, inter-relaciona-se e seduz o aluno para a

aprendizagem. (p.177)

É, pois, no próprio cotidiano da sala de aula, no processo de

ensino, que a mediação pedagógica tem o papel principal de potencializar o

desejo dos alunos para a aprendizagem. Aliado a este desafio de despertar o

gosto e o interesse do estudante em aprender a Matemática, as falas das

professoras também mostram o desafio de [...] ensinar a Matemática de

maneira que a criança aprenda” (Professora Amarelo); fazer a criança adquirir

o conhecimento [...] desenvolver o raciocínio da criança para ela aprender a

Matemática, para ela saber como se constrói a Matemática e aonde ela a utiliza

(Professora Vermelho).

Os depoimentos supracitados apontam para a importância da

metodologia para o processo de construção das aprendizagens matemáticas.

Neste sentido, segundo Carvalho (2005, para que o docente possa

implementar uma transformação metodológica que desperte o interesse do

aluno, ele precisa dominar o processo e o produto de seu trabalho.

168

Se a forma como o educador apresenta o conteúdo para ser

apropriado pelo aluno e a maneira como trabalha com o conhecimento

influenciam no desejo do aluno para aprender, então é interessante que esse

profissional compreenda que ensinar extravasa o conceito de transferir

conhecimentos, como salienta o educador Paulo Freire (1999). Para ele o

educador precisa “saber que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar

as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção” (grifo do

autor; p. 52)

Nesta perspectiva, o ato educativo deve romper com aquele

ensino da Matemática pautado na transmissão de conteúdos, cuja

aprendizagem acontece por cansativos treinamentos, gerando a retenção de

informações em que o professor tem o papel ímpar de detentor e transmissor

do conhecimento e o aluno, por sua vez, é tratado como sujeito passivo,

receptor e reprodutor de informações. Freire (1999) esclarece que o educador

deve ser “aberto a indagações, à curiosidade, às perguntas dos alunos, a suas

inibições; um ser crítico e inquiridor, inquieto em face à tarefa que tem –“a de

ensinar e não a de transferir conhecimento” (grifo do autor; p.52).

Portanto, considera-se que, no exercício da docência, cabe ao

professor empenhar esforços no sentido de ressignificar sua prática,

modificando, assim, seu modo de ver e conceber o processo ensino-

aprendizagem da Matemática. Isso certamente exige dele a expansão do seu

entendimento de escola, sociedade e homem, e, em decorrência disto, acerca

da docência. Isto posto, trata-se, sobretudo, de compreender que a escola não

pode se limitar à função de ensinar, de treinar o aluno no desempenho das

tarefas, pois estão postas outras exigências pelo mundo contemporâneo, que

trazem consequências para o ato educativo.

Por fim, não menos importante – ao contrário! – a relação família-

escola, especificamente, a presença ou não dos pais na vida escolar de

seus filhos é apontada por unanimidade entre os sujeitos da pesquisa como

elemento essencial para o sucesso/insucesso nas aprendizagens da

Matemática. Para essas docentes, a apropriação do conhecimento matemático

envolve professor-aluno-conteúdo-família. Neste sentido, consideram um

desafio muito grande conseguir envolver a família na vida escolar da criança.

Seus depoimentos a respeito do assunto são contundentes e assinalam que há

169

falta de apoio dos familiares dos alunos no que se refere às aprendizagens da

Matemática.

Para a professora Verde, a maioria das famílias não está

preocupada com a aprendizagem das crianças. Ainda que atribua parte desta

situação ao desajuste familiar, ela dá maior destaque à falta de interesse dos

pais na vida escolar de seus filhos. Assim sendo, relata minuciosamente que o

desafio para ensinar a matemática

É a falta de apoio dos pais, eles não te dão apoio em casa e se você cobra demais, o que acontece? [...] Esse ano, comecei cobrar, cobrar, cobrar de uma aluna. O que aconteceu? [...] A mãe foi na escola e a tirou [...] em vez de falar assim: – não, a professora está cobrando para fazer com que melhore [...] é o apoio do pai, o apoio de vir para a escola, de vir ver a dificuldade do filho, de estar ajudando, de estar pondo o filho para fazer a tarefa [...] do mesmo jeito que eles levam a tarefa para casa eles voltam, e se você resolve saber, e fazer com que ele faça na sala de aula de uma maneira diferenciada, os pais ficam bravos, vêm para a escola.

Essa ocorrência é, de maneira sucinta, confirmada pelas

professoras Violeta, Lilás e Amarelo. Para a primeira, o desafio que o

pedagogo enfrenta para ensinar a Matemática é a família participar. A segunda

entrevistada afirma: Acho que falta apoio e acompanhamento dos pais, a

última, seguindo o mesmo entendimento, elege como desafio a questão

familiar, porque, às vezes, você passa atividade para casa porque a criança

tem que estar exercitando também, aí a criança, às vezes, não faz. O

depoimento da professora Anil ajuda a explicar no que consiste esta condição

desafiadora:

O maior desafio que a gente encontra, mesmo, é a relação escola-família. [...] você não tem muito a ajuda da família. O desafio maior da gente é a meninada não fazer tarefa de casa. [...] tem muita mãe que trabalha fora o dia inteiro, [...] tem mãe que mora sozinha com a filha ou com o filho, tem mãe que não está aí, está a avó ou a bisavó, e aí eles falam: – Antigamente a Matemática era mais fácil, e não estimula tanto e não pega no pé da criança para poder fazer a tarefa, ou às vezes, pergunta se tem tarefa e eles [os alunos] falam que não. Então elas não têm como olhar no caderno para ver se tem tarefa [...]

A professora Azul e a professora Rosa acrescentam que a

ausência dos pais no acompanhamento da vida escolar dos filhos agrava a

situação dos que já vêm apresentando deficit de aprendizagem e assinalam

170

que os pais deixam de enviar os filhos para as aulas de apoio pedagógico47. A

primeira detalha que

[...] A dificuldade maior que vejo na minha prática é essa questão do aluno não estar ali para aprender, de ele não vir [...] criança que falta muito, que não vem no apoio, não vem para a aula, não tem interesse da família, não tem suporte para fazer a tarefa em casa, pesquisa, nada! É essa dificuldade que gente encontra mais para ensinar.

A fala da professora Rosa corrobora com esse entendimento

apontando como desafio

[...] a ausência dos pais em relação ao acompanhamento da vida escolar do aluno. Eles não acompanham. Você tem um aluno que já vem de fases anteriores que não aprendeu porque não conseguiu construir aquele conhecimento necessário para a fase na qual está inserido [...]. Você convida os alunos para apoio, eles não vêm para o apoio, então, o retorno dos pais é pouquíssimo, não tem retorno! (Professora Rosa)

Esses depoimentos deixam claro que, para as interlocutoras, a

relação família-escola é considerada fator fundamental para o sucesso da

criança na apropriação do conhecimento matemático. Na visão das depoentes,

portanto, a família se configura como espaço decisivo de apoio às

aprendizagens do aluno. No entanto, Kosik (1976) alerta que, aquilo que se

mostra na aparência não é a realidade concreta do problema. Segundo este

autor, para se ter um conhecimento real da “coisa em si” é preciso romper com

o mundo das aparências. Torna-se necessário fazer um detour, o que significa

a recusa, da obviedade que impede a clareza da representação da coisa.

O que se percebe nesses discursos é a ausência da

compreensão de escola, da sala de aula e do papel do professor no processo

de ensino-aprendizagem. Para realizar o movimento de desvelamento da

concreticidade desta situação com vistas a contribuir para a formação

pedagogo no que se refere ao ensino da Matemática, este estudo, sem

desconsiderar a responsabilidade da família na construção da identidade da

criança, entende que a escola é, por excelência, espaço nuclear para ensinar,

aprender e construir; no caso desta pesquisa, é lugar singular em que a criança

47

Na escola organizada em Ciclos de Formação Humana é fundamental que a criança tenha a garantia de avanços na sua aprendizagem. O Apoio Pedagógico é uma das alternativas pensadas para assegurar esse direito à criança. Na Rede Municipal de Rondonópolis - MT, locus deste estudo, esse direito está assegurado pela Normativa 006/2006, art. 16, parágrafo 1º.

171

deve apropriar-se do conhecimento matemático sistematizado. A escola é,

pois, espaço de trabalho coletivo.

Isso nos remete a McLaren (1997), que vê a escola como esfera

pública democrática, cujo trabalho é dedicar-se em favorecer a aprendizagem

dos conhecimentos e das habilidades indispensáveis para a vida em uma

democracia de fato. Neste espaço, o ensino da Matemática não deve ser

considerado neutro, mas sim como instrumento que pode ajudar na tarefa de

desenvolver competências democráticas nos estudantes, como aponta

Skovsmose (2001).

Embora o cotidiano escolar esteja eivado por contradições

sociais, é na sala de aula, recinto central em que se dá construção do

conhecimento, que o professor, como o principal agente mediador do saber

escolar, deve dar sentido à aprendizagem e direção ao ensino de modo a

conduzir o aluno ao encontro com o saber sistematizado. Carvalho (2005, p.

187)

[...] compete ao professor a nobre tarefa de problematizar os saberes

e propor situações de aprendizagem adequadas que desenvolvam a

competência cognitiva do aluno, bem como seu discernimento crítico

sobre a realidade social. Neste sentido, a sala de aula passa a ser o

lugar onde o professor e aluno se reúnem para socializar o saber,

aprender e construir coletivamente o conhecimento

Embora este estudo considere o professor como elemento

insubstituível para o sucesso das aprendizagens matemáticas do aluno,

igualmente, entende a escola como espaço de trabalho coletivo. Nesta trilha, o

docente precisa entender a função dos diferentes atores que fazem parte da

dinâmica da escola no seu cotidiano e como se articulam essas funções no

processo do seu fazer pedagógico. É preciso que ele tenha clareza da sua

função, do papel da equipe diretiva da escola, do lugar da família do aluno

neste contexto e de suas conseqüências no seu fazer pedagógico.

No contexto do processo ensino-aprendizagem da Matemática, as

professoras, em suas falas, revelam um desejo e uma necessidade da

participação ativa dos pais na vida escolar de seus filhos. No depoimento

abaixo, a professora Vermelho diz que é urgente a necessidade de trazer os

pais para participar junto com a criança na vida da escola. Para essa

172

educadora, o “olhar” dos pais é fundamental para a criança não apenas no

aspecto cognitivo, mas, principalmente, no emocional. Ela ratifica que para

melhorar a aprendizagem da Matemática é desafiador

Trazer esses pais para participar, para ajudar, quando eu digo o pai ajudar, não é ajudar fazer tarefa. [...] é incentivar pelo menos para ele [o aluno] vir para a escola porque tem criança que a gente tem que estar acudindo lá para não faltar, tem que estar chamando [...] incentivar é apoiar, é olhar o caderno. Se não sabe ler, não tem problema, tem pai que não sabe ler, não tem problema, mas olhar se ele fez alguma coisa. É trazer esses pais para participar junto com essa criança. É levantar a auto-estima, porque muitas crianças precisam, porque tem a auto-estima baixa. A criança precisa desse apoio. A criança quer esse olhar é do pai, é da mãe. [...] Então é assim quando os pais estão ali juntos ajuda muito. Essa participação é fundamental, então eu diria que esse é sim o maior desafio. (Professora Vermelho)

A professora Verde afirma que os pais delegam responsabilidades

que são suas à escola. Para ela

[...] a maioria deles não estão preocupados com a aprendizagem, estão preocupados em trazer o filho para a escola, deixar o filho na escola ser alimentados e fazer com que se passem quatro horas, aí você está cuidando deles, é como se você tivesse cuidando do filho deles. [...] deveria partir deles a cobrança da aprendizagem do filho, agora você chama o pai, você reclama com o pai, você cobra do pai para ele [o aluno] vir para a escola e ele não vem. E aí, você vai fazer o quê se você não tem apoio?

Esses depoimentos, por um lado, mostram que, no entendimento

destas entrevistadas, os pais vêm transferindo suas responsabilidades

relacionadas à educação para a escola e, dessa maneira, esquivando-se de

cumprir suas obrigações. Por outro lado, apontam um possível caminho que a

escola deve tomar para melhorar a qualidade do ensino-aprendizagem, não só

da Matemática, mas também das outras áreas do conhecimento, qual seja:

incentivar a participação efetiva dos pais na vida escolar da criança. Mas,

novamente se questiona: O simples fato de os pais participarem da vida da

escola garante a aprendizagem da Matemática dos alunos?

É fato que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação - 9394/96 que

responsabiliza a família e o Estado, na educação das crianças:

Art.2º A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos

princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por

173

finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o

exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. (BRASIL,

1996)

Também é verdade que aos pais cabe a participação ativa na vida

escolar de seus filhos. Mas o problema central, no que se refere ao ensino da

Matemática, não reside neste aspecto. Ainda que se possa considerar um

apoio importante, a participação ativa dos pais na vida escolar de seus filhos

não pode garantir, por si, a aprendizagem desta área do conhecimento. A

melhoria da qualidade do processo ensino-aprendizagem da Matemática está

necessariamente ligada ao professor, que tem a incumbência de buscar

metodologias que favoreçam esse processo e seduza o aluno para aprender os

conteúdos matemáticos. Isto exige que o educador se engaje num processo de

formação e autoformação em que a equipe gestora da escola tenha a

responsabilidade de assegurar condições para a formação centrada no espaço

escolar.

O que se percebe nos desabafos das professoras é que elas

sentem necessidade de apoio nas questões relacionadas ao ensino da

Matemática. Porém se pergunta: A quem cabe a tarefa de dar tal suporte ao

trabalho do professor?

É certo que este deve envolver-se em processos de formação e

autoformação, visto que, como afirma Leitão de Mello (1999, p. 26 apud Veiga,

2009), “O professor é um dos profissionais que mais necessidade tem de se

manter atualizado, aliando à tarefa de ensinar a tarefa de estudar” (p. 26).

Contudo, para dar respostas aos desafios do cotidiano escolar, da

contemporaneidade e do avanço tecnológico, ele precisa que se criem

condições que lhe possibilitem o referido envolvimento.

De acordo com Veiga (2009)

[...] é preciso investir na valorização profissional dignificando o

trabalho pedagógico e a carreira docente, melhorar suas condições

de trabalho, estimular a organização coletiva dos profissionais em

entidades sindicais, científicas, entre outras. (p.20)

Na relação família-escola, no que se refere ao ensino da

Matemática, existem eventos de “queixumes” em que os pais culpam a escola

174

por não conseguir ensinar, a qual, por sua vez, aponta a falta de apoio e

participação dos pais na vida escolar dos filhos. Em meio a este duelo que

parece não ter fim, na realidade concreta da sala de aula, estão o professor e o

aluno envolvidos no processo ensino-aprendizagem, dia após dia, trilhando um

caminho que se espera levar o aluno à apropriação do conhecimento. No

entanto, Carvalho (2005) denuncia este caminho como sendo cheio de

perversidade e exclusão.

É entre estas condições que se tem dado o trabalho com a

Matemática, nas escolas; verifica-se, então, que, além da problemática da

formação do pedagogo, essa realidade apontada tem desafiado os professores

a desenvolverem um ensino significativo de Matemática que garanta o sucesso

de todos os alunos.

Ainda que se considere que o professor é agente essencial no

ensino do conhecimento escolar, é fundamental que a escola e os profissionais

da educação, principalmente diretores, supervisores e os próprios docentes

sejam abertos ao diálogo com a comunidade, buscando, por meio de uma

postura reflexiva, inserir no projeto pedagógico dessa escola o que dizem os

pais sobre a vida escolar de seus filhos. É preciso saber discutir com eles o

projeto pedagógico da escola, mostrando qual concepção de escola,

conhecimento, homem e sociedade permeia esse projeto educativo. Isto pode

se constituir num primeiro passo rumo à superação do distanciamento entre

escola e família.

Ainda, a respeito dos desafios que o professor graduado em

Pedagogia enfrenta para ensinar a Matemática, a professora Vermelho, em

consonância com o depoimento da professora Verde, acima citado, afirma que

os pais transferem para a escola responsabilidades que são suas:

[...] Hoje a família é um desafio, porque os filhos são criados sozinhos

[...] Tudo arrebenta na escola. Hoje o professor é psicólogo, é

enfermeiro, os problemas caem na escola. Hoje em dia você fala: –

Pai tem que levar seu filho no especialista. E ele fala assim: – Com

que dinheiro que eu vou? Eu não tenho dinheiro para ir. Não tem

como vocês encaminharem? Não tem como vocês levarem? Então,

eles estão transferindo o trabalho deles, a maioria, para a gente, para

nós na escola e nós não damos conta. Eu sempre falo para os meus

alunos e para os pais dos meus alunos: – Eu não sou responsável

pela educação, eu sou responsável, aqui na escola, pelo meu

175

trabalho. O meu trabalho é ajudar fazer com que eles aprendam,

fazer com que eles se desenvolvam, fazer com que eles se tornem

cidadãos melhores, mas assim, a responsabilidade de educar o filho

é do pai. E os pais estão perdendo esse direcionamento.

O fato real é que a escola sofre interferências socioeconômicas e

culturais que requerem um novo pensar da construção humana. Neste

contexto, o professor, como um ser no mundo e com o mundo (FREIRE,1987),

tem seu trabalho impactado por essas influências, o que exige que sua prática

educativa se dê para a formação da pessoa na dimensão da humanização.

Estes depoimentos permitem inferir que muitas das crianças

atendidas por essas docentes são oriundos de camadas sociais menos

favorecidas. O fato é que a democratização do acesso à escola trouxe, além

dos alunos oriundos da classe média e alta que já eram alunos da escola, uma

grande demanda das classes populares, fato que tem solicitado que se dê um

novo sentido à educação.

Na realidade, compreende-se que hoje a situação da escola é

mais complexa e dela é exigida uma postura política que seja marcada pelo

engajamento na luta para garantir que todas as crianças tenham acesso à

cultura sistematizada. Nesta trama, é imperioso que o pedagogo seja capaz de

compreender a escola como organização complexa que tem a função de

promover a educação para e na cidadania, segundo recomendam as DCNs

(2006).

Neste contexto, o professor tem sido afetado pelo “mal estar”

docente, revela relatório preliminar de pesquisa sobre a atratividade da carreira

docente no Brasil, realizada pela Fundação Carlos Chagas (2009)48,

[...] esse “mal estar” tem duas características: a atividade docente tem se tornado cada vez mais complexa, porém o prestígio social da profissão docente tende a diminuir; e, por outro lado, a defasagem entre a definição ideal da docência e a realidade em que se desenvolve o ofício tende a aumentar, gerando uma sensação de impotência, frustração e desânimo. (p.12)

Inseridas nesta luta, a escola e a família têm a missão de ajudar a

criança a desenvolver a autonomia de pensamento e, especificamente, o

48Atratividade da Carreira Docente no Brasil. disponível em HTTP://catracalivre.folha.uol.com.br/wp-content/uploads/2010/01/Pesquisa-Fundacao-Victor-Civita-Atratividade_da_Carreira_Docente_no_Brasil-alterado.pdf. Acesso em Abril/2011

176

professor deve ensinar a Matemática assumindo um compromisso político,

ético e moral com a finalidade de promover a libertação da classe socialmente

oprimida, conforme preconiza a concepção a Educação Matemática Crítica.

Veiga (2009) contribui com esse entendimento observando que

[...] a escola não pode se limitar à função de ensinar. Dela são

exigidas, cada vez mais, a função de ensinar e a ocupação educativa

dos tempos livres com ações pedagógicas. A escola deve ser cada

vez mais próxima à realidade. Muitos dos problemas enfrentados por

ela relacionam-se com a crescente diversidade cultural e social dos

alunos. No entanto, essa diversidade pode ser encarada não apenas

como um problema, mas também como uma força, caso o currículo

deixe de ser homogêneo e passe a dar espaço e voz à própria

escola. (p.15)

A democratização da escola requer um novo projeto educativo

comprometido com a superação das desigualdades sociais, o que implica,

necessariamente em considerar a comunidade como parte integrante e

participativa dessa escola. Tal projeto deve ter caráter mais relacional e

dialógico, de modo a valorizar a cultura dos alunos e o contexto da

comunidade, dando importância à relação com todas as pessoas que

constituem a comunidade escolar – diretor, supervisor, coordenador,

professores, alunos e pais

A propósito, convém lembrar que Nóvoa (2009) defende que a

missão da escola seja repensada; suas ideias mostram que a sociedade tem

atribuído à escola uma diversidade de missões que resultam num

“transbordamento” de tarefas a ela delegadas e numa “pobreza teórica e

prática”. Em vista disto, o autor parte em defesa do “retraimento” da escola

afirmando que cabe a ela promover a educação, porém, seu trabalho deve

valorizar aquilo que é especificamente escolar.

Nesta visão, a escola deve ser mais aberta à sociedade ao

cumprir sua principal tarefa: promover mais aprendizagem. Esta posição inclui

considerar, entre outras questões, que lhe compete exercer sua missão em

comunhão e em colaboração com a sociedade, diminuindo a distância

existente entre a família e a escola. Neste sentido, as Diretrizes Curriculares

Nacionais para o Curso de Pedagogia (2006) orientam que o egresso deste

177

precisa ser preparado para promover e facilitar as relações de cooperação

entre a instituição educativa, a família e a comunidade.

É oportuno salientar que o trabalho do professor no ensino da

Matemática não pode ser analisado tendo-se o foco em apenas parte dele, mas

se deve considerado na teia do tecido social. Dada a natureza da prática

docente, o professor necessita fazer ajustes permanentes em suas ações de

ensino porque lida com situações que não permanecem no tempo. Não

obstante, o docente graduado em Pedagogia defronta-se em seu ato educativo

com situações de ensino que requerem a busca pelo aprimoramento de suas

ações. Estas exigências, de natureza pedagógica, como por exemplo o

conhecimento do conteúdo matemático a ser ensinado, a avaliação a ser

implementada e o trabalho com turmas bastante heterogêneas, não são

poucas, devido à existência de pontos frágeis na sua formação inicial.

Quando as interlocutoras evidenciam em suas falas a fragilidade

de sua formação no que se refere ao ensino da Matemática, ao mesmo tempo,

revelam que sentem a necessidade de aprender, já que os imperativos e

exigências postos pela realidade objetiva, especialmente as necessidades de

aprendizagens de seus alunos, suscitam a obrigação de estarem em formação

permanente. Tendo em vista a complexidade do trabalho docente, esta

formação deve acontecer numa perspectiva crítico-reflexiva, de modo a criar

condições para que os professores sejam capazes de refletir sobre-a-ação e

sobre-a-reflexão-na-ação.

De fato, “não há docência sem discência” como entende Freire

(1999). Logo, a formação do professor no curso de Pedagogia deve centrar-se

na concepção de aprender (CARVALHO, 2005), simplesmente porque o

docente necessita ser preparado para aprender a aprender, visto que nenhuma

formação inicial poderá dar conta da complexidade da sala de aula e da

realidade da escola. Neste contexto, Franco (2006) adverte que a formação do

pedagogo docente se constitui uma tarefa árdua, se considerada a docência

em toda a sua complexidade.

Além disso, existem saberes que só podem ser construídos no

espaço de atuação do professor e jamais poderão ser apropriados no curso de

Pedagogia, pois representam uma elaboração pessoal do professor ao

178

confrontar-se com o processo de transformar em ensino o conteúdo aprendido

em seu percurso formativo.

Esses requisitos se justificam na fala das depoentes. Para elas

muitos dos saberes de que necessitam para ensinar a Matemática são

construídos, sobretudo, no cotidiano da escola e da sala de aula, na relação

com seus pares, na consulta a livros didáticos e à internet. Também apontam a

participação em cursos de formação continuada oferecidos pela Secretaria

Municipal de Educação como importante para a melhoria da sua prática

educativa.

Isso fica aclarado no depoimento da professora Verde, para quem

O que você aprende é no dia-a-dia, é com a ajuda de um professor, é

uma coisa que um professor faz aqui e dá certo, outro faz ali e dá

certo, então isso contribui muito mais que a própria faculdade. Então

eu aprendi muito mais em cursos oferecidos pela Secretaria, com os

colegas, do que na própria faculdade. [...] eu senti a necessidade de

aprender, então eu sentei e aprendi. [...] Eu peguei o livro didático e

fui olhando, fui fazendo a partir dos exemplos. Então eu tinha

dificuldade para entender uma situação-problema, eu tinha

dificuldade para fazer divisão, eu tinha essas dificuldades, [...] Então

eu acho que a maior parte é a prática mesmo e muito os colegas –

troca de informações, troca de atividades, planejar junto com o

colega.

Fato interessante percebido nesta fala é que a docente valoriza

de maneira significativa os conhecimentos construídos no cotidiano da escola

em detrimento dos adquiridos na Universidade. Tal posicionamente remete a

Tardif (2002), que revela que o professor tem “uma nítida tendência a

desvalorizar sua própria formação, associando-a à pedagogia e às teorias

abstratas dos formadores universitários” (p.41). Segundo o autor, isto se

justifica porque para o professor os saberes docentes (disciplinares;

curriculares; da formação profissional) adquiridos nos cursos de graduação têm

caráter de exterioridade, uma vez que são definidos em outras instâncias e não

podem ser por ele controlados.

Já no saber construído no dia-a-dia aparece a marca da

interioridade, pois o docente, na impossibilidade de controlar aqueles saberes,

busca dar-lhes este outro caráter produzindo saberes que denominam de

práticos ou experienciais, por meio dos quais ele compreende e domina sua

179

prática. Contudo, não se trata de um novo saber, mas sim da incorporação à

prática de outros conhecimentos, muitos adquiridos, também, no curso de

graduação. É a esses saberes práticos ou experienciais que a professora Azul

faz referência:

Quando eu tenho alguma dúvida eu procuro professores da escola

formados em Matemática e falo: – Olha, professor, e esse conteúdo

aqui como que é?[...] Então eu busco com o professor, busco nos

livros – nós temos muitos livros didáticos, na Internet hoje em dia a

gente consegue achar muita coisa, então dessa forma a gente vai

tentando resolver os desafios [...].

A professora Vermelho, semelhantemente, admite:

[...] o mais, mesmo, eu aprendi buscando, mesmo, [...] sempre soube

perguntar, se eu não sei, eu não tenho vergonha de falar para você: –

Olha, eu não sei, me explica isso aqui que eu preciso ensinar. [...]

Aprendi trabalhando juntos, com os alunos, com colegas, na escola,

construindo juntos.

Também a professora Rosa diz:

[...] os conhecimentos que eu tenho hoje, que eu construo com

frequência, são necessidades que eu vejo que os meus alunos têm e

que eu não estou conseguindo [...] a solução para aquele problema,

porque eu não vi em lugar nenhum, eu vou buscando, eu busco na

Internet, eu busco num livrinho que eu tenho, eu busco numa

atividade, eu busco com colegas [...] Procuro também companheiras,

colegas de trabalho que têm uma metodologia mais inovadora.

Outros livros, por exemplo [...].

Neste mesmo sentido, afirma a professora Lilás: Foi na prática no

dia-a-dia, conhecendo a criança no dia-a-dia, na formação continuada, fui

buscar nos livros, nos PCNs49. Por sua vez, pondera a professora Anil: [...] a

gente tem muitos colegas que podem ajudar a gente, tem os livros – os livros

mais antigos são muito melhores do que esses livros de hoje [...] você aprende

no seu dia-a-dia conforme você vai dando aula com a experiência.

A fala da professora Amarelo confirma essa realidade:

[...] em sala de aula eu tive que buscar outras coisas, outros meios,

para me ajudar [...] a gente tem que estar buscando mais e mais

ainda [...] a gente precisa ainda complementar com cursos e aí a

49

Parâmetros Curriculares Nacionais.

180

gente vai vendo com a prática a dificuldade que a gente tem para

ensinar e vai buscando [...], eu tenho que estar buscando,

participando de cursos; e vejo um livro aqui, um livro ali [...] primeiro

eu vou pesquisar nos livros para eu aprender [...] o que me ajudou,

mesmo, foram os cursos. [...] Eu pesquiso em vários livros, peço

ajuda com um colega que tem mais conhecimento que eu. E os

cursos de Matemática que aparecem, eu tento fazer para não ficar

muito alheia às novidades que surgem para ajudar [...].

Desses depoimentos, é possível concluir que no ensino da

Matemática muitos saberes pedagógicos são construídos no dia-a-dia, no fazer

diário em sala de aula, gerando-se desta forma uma dicotomia entre os

saberes desta prática e os saberes da formação organizados nos cursos de

graduação em Pedagogia. Esses saberes práticos são construídos no cotidiano

e não podem ser ensinados nas instituições que formam professores. Trata-se,

de acordo com Shulman (1986, 1987 apud Montalvão e Mizukami, 2002), do

conhecimento pedagógico do conteúdo, que é forjado por uma elaboração

pessoal do professor, fruto da interação de diferentes conhecimentos, entre

eles o conhecimento dos conteúdos das disciplinas curriculares –

conhecimento da matéria e o conhecimento pedagógico geral.

Em se tratando do ensino de Matemática, para o pedagogo o

processo de construção deste novo conhecimento não se dá de maneira

tranquila dada a existência de fragilidade teórica no que se refere aos

conhecimentos matemáticos. Isto se deve ao fato já reiterado de que o curso

de Pedagogia tem oferecido uma formação que não considera suficientemente

o aspecto do conteúdo matemático, dando maior visibilidade às questões

metodológicas.

Quando perguntadas a respeito de como buscam enfrentar os

desafios e as dificuldades que aparecem no seu cotidiano quanto ao ensino da

Matemática, a maioria das professoras aponta o livro didático como apoio

pedagógico essencial para trabalho do professor, o que se verifica nos

seguintes excertos de suas falas já mencionadas: E assim responderam: [...] eu

senti a necessidade de aprender, então eu sentei e aprendi. [...] Eu peguei o

livro didático e fui olhando, fui fazendo a partir dos exemplos (Professora

Verde); Quando eu tenho alguma dúvida [...] busco nos livros – nós temos

muitos livros didáticos (Professora Azul); [...] os conhecimentos que eu tenho

hoje, eu construí eu busco num livrinho que eu tenho, [...] em outros livros

181

(Professora Rosa); a professora Lilás expõe: [...] fui buscar nos livros; [...] a

gente tem os livros – os livros mais antigos são muito melhores do que esses

livros de hoje, conta a professora Anil; e, por fim, a professora Amarelo

assegura: [...] em sala de aula eu tive que buscar outras coisas, outros meios,

para me ajudar [...] vejo um livro aqui, um livro ali [...] primeiro eu vou pesquisar

nos livros para eu aprender.

Em concordância com Saviani (2008), pode-se afirmar que é o

livro didático que tem dado forma prática à teoria no que se refere ao ensino da

Matemática. Este estudioso aponta que a raiz do problema da formação de

professores no Brasil reside na dissociação de aspectos indissociáveis da

função docente: a forma e o conteúdo.

Para Saviani (2008), os institutos de educação têm formado os

especialistas das formas abstraídos dos conteúdos, e os institutos e faculdades

correspondentes às outras disciplinas do currículo têm formado os

especialistas em conteúdos abstraídos das formas que os veiculam. Diante

dessa problemática, o autor observa que o livro didático tem sido o instrumento

que tem possibilitado a junção entre forma e conteúdo. Este parece ser um dos

fatores pelos quais as depoentes recorrem ao livro didático no planejamento de

suas aulas de Matemática: a necessidade de articular conteúdo e forma.

O mesmo autor aponta que um possível caminho para a

reformulação do curso de Pedagogia e de outras licenciaturas seria centrá-los

nos livros didáticos, pois,

Com efeito, mal ou bem, os livros didáticos fazem a articulação entre

a forma e o conteúdo, isto é, eles dispõem os conhecimentos numa

forma que visa viabilizar o processo de transmissão-assimilação que

caracteriza a relação professor-aluno em sala de aula. A questão

pedagógica por excelência que diz respeito à seleção, organização,

distribuição, dosagem e sequênciação dos elementos relevantes para

a formação dos educandos é, assim, realizada, no que se refere à

pedagogia escolar, pelo livro didático o qual se transforma, ainda que

de modo "empírico", isto é, sem consciência plena desse fato, no

"grande pedagogo" de nossas escolas. (SAVIANI, 2008, p. 15)

É certo que o livro didático tem se constituído suporte importante

para a prática do professor. O problema é que esta ferramenta pode ser usada

de maneira acrítica, como mostra o próprio Saviani (2008): “efetivamente, é ele

que, geralmente de maneira acrítica, dá forma prática à teoria pedagógica nas

182

suas diferentes versões” (p. 15). Contudo, não se pode desconsiderar que

papel do livro didático no processo de ensino tem sido exarcebado, tanto pelos

programas governamentais, que destinam grandes somas para distribuir livros

às escolas públicas quanto,

[...] pela formação aligeirada do professor no que diz respeito a conhecimentos mais profundos sobre conteúdos e metodologias, reduzindo significativamente a autonomia do professor, o controle de suas ações e o poder de decisão no âmbito de seu trabalho. Expropriado dos domínios metodológicos e de conteúdo, o professor busca apoio nos livros didáticos, na maioria das vezes, influenciado pelo selo oficial que “garante” a qualidade do livro indicado. (RUGGIERO E BASSO

50, 2003, p. 18-19)

O professor, como intelectual, não pode reduzir seu trabalho à

simples repetição do livro didático de modo acrítico, atuando como mero

reprodutor de conteúdos e formas que foram pensados em outras instâncias.

Ao contrário, ao utilizar o livro didático de Matemática, é necessário que ele

considere os aspectos políticos e sociais dos conteúdos, conforme preconiza a

perspectiva crítica da Educação Matemática.

Nesta prática educativa, os ambientes culturais em que os

estudantes estão inseridos devem ocupar lugar de relevo, de modo que o livro

didático não se constitua o centro do processo ensino-aprendizagem, pois é

fundamental que alunos e professores estejam envolvidos no controle do

processo educacional. Para isso, estudantes e professor devem estabelecer

uma distância crítica destes conteúdos ao desenvolverem os conhecimentos

matemático, tecnológico e reflexivo, tal como defende Skovsmose (2001).

Assim sendo, o ensino da Matemática poderá possibilitar o desenvolvimento de

competência democrática visando ao empowerment destes alunos.

Um outro aspecto interessante da ação educativa reside no

trabalho com os pares, prática que parece já fazer parte da cultura da escola.

Em busca de soluções para os problemas que se apresentam na prática, as

entrevistadas dizem recorrer aos colegas de trabalho e, especialmente, aos

professores que são licenciados em Matemática. É nesta relação que ocorre

50 RUGGIERO, M. A. e BASSO, I. S. A Matemática no Livro didático: uma reflexão crítica na

perspectiva histórico-cultural.In: Bolema, 20, 2003, p. 17-36.

183

aquilo que as interlocutoras definem como sendo o planejamento coletivo e as

trocas de informações e de atividades.

Esta interação possibilita problematizar a prática, trazer questões

para a discussão e confrontar pontos de vista. Além de provocar

estranhamentos, questionamentos, compartilhamento de ideias, colaboração

na solução de problemas e de desafios postos pela prática, contribui para que

o professor possa sentir-se parte de um todo, minimizando o isolamento no

trabalho docente. Nestes momentos se torna possível que o educador perceba

que seus colegas se deparam com problemas semelhantes para atuar no

ensino da Matemática e, assim, conjuntamente, podem refletir sobre possíveis

soluções.

Neste ambiente, o professor, na condição de um ser de relações,

histórico e inacabado e, por consequência, sempre pronto a aprender, é

concebido como sujeito da sua formação. É nesse movimento que ele se

desenvolve, se educa, se constrói pela interação com o outro, já que, de

acordo com a concepção de educação libertadora, o professor é considerado

um ser-no-mundo, mas também um ser-com-os-outros. Daí o diálogo ser

inerente ao processo de formação do educador com fins de humanização dos

homens.

No bojo destas idéias, Tardif (2002, p. 87), “a experiência dos

outros, dos pares, dos colegas que dão conselhos” se constitui fonte de

aprendizagem do trabalho docente. Com efeito, esta relação permite ao

docente mobilizar saberes que possibilitam conferir novos significados à sua

prática, que podem resultar em mudanças de concepção de ensino da

Matemática, visto que os saberes iniciais são confrontados com as

experiências práticas vivenciadas no contexto escolar. Esse processo que se

dá no dia-dia da escola, em meio a situações conflituosas e angustiantes, idas

e vindas nas discussões com os pares, pode produzir reflexões e

(re)elaborações nos saberes docentes. Esta observação permite dizer que tal

formação é, na verdade, a autoformação.

Evidencia-se, portanto, que o pedagogo que ensina a Matemática

para as crianças não pode ser considerado mero executor de metodologias e

técnicas a serem aplicadas nas aulas. Pelo contrário, como professor

intelectual, sua ação pedagógica no ensino de Matemática precisa ser

184

permeada pela conscientização dos limites de sua formação nesta área do

conhecimento e da complexidade da prática docente, pois, como já explicitado

neste trabalho, alguns saberes dos quais o pedagogo precisa para ensinar a

Matemática só podem ser aprendidos no cotidiano da escola. Esta

conscientização deve impeli-lo a embrenhar-se em processos de formação e

autoformação, considerando as suas necessidades de aprendizagem e as de

seus alunos. Assim sendo, neste movimento de construção de saberes é

aceitável afirmar que a profissão docente exige formação e autoformação.

Wogel (2007)51, recorrendo a outros teóricos, explica que

Um dos modelos de formação de professor é o da autoformação, que

“é uma formação em que o indivíduo participa de forma independente

e tendo sob o seu próprio controle os objetivos, os processos, os

instrumentos e os resultados da própria formação” (Debesse, 1982

apud Marcelo Garcia, 1999, p. 19). Inclui todas as atividades de

formação na qual a pessoa toma a iniciativa, com ou sem ajuda de

outros, de planejar, desenvolver e avaliar as suas próprias atividades

de aprendizagem. [...] É o assumir e assumir-se, na formação, a

própria identidade cultural constituída por experiências históricas,

políticas, culturais e sociais e o respeito e partilha destas. É um

processo de formação permanente, um processo contínuo que ocorre

durante a vida toda do professor, que produz a vida do próprio

professor. (p.107-108)

Deste modo, a autoformação é fundamental para promover a

qualidade da docência de tal forma que professor, conhecendo o seu papel,

esteja comprometido com a construção de uma sociedade que visa à justiça

social, à democracia e à equidade de direitos.

A partir do que foi exposto é lícito asseverar que a formação do

pedagogo desenvolvida no curso de graduação não dá conta da complexidade

que envolve o trabalho deste profissional. É necessário, portanto, que as

propostas de formação de docentes para os Anos Iniciais do Ensino

Fundamental compreendam os professores como profissionais intelectuais que

sejam preparados para (re) construir os conhecimentos docentes de maneira

ativa e reflexiva.

51 Wogel, Lívio dos Santos. Ócio do ofício: contribuições da pedagogia do ócio para a

formação de professores. 166p. Dissertação (mestrado). Cuiabá, - Universidade Federal de

Mato Grosso - Instituto de Educação - Programa de Pós-Graduação em Educação, 2007.

185

Isto exige, porém, uma formação desenvolvida numa concepção

que supere a lógica da racionalidade técnica – esta visão compreende a

formação do professor como centrada no desenvolvimento de competências;

no saber fazer; na prescrição; na aprendizagem por competência – como

propugna Veiga (2009). A referida lógica entende a formação como acúmulo de

conhecimentos teóricos para serem aplicados posteriormente, na prática; é

preciso, todavia, que a formação de professores, no caso deste estudo, do

pedagogo, consista num pensamento e proposta de formação elaborados para

que os professores possam refletir e agir sobre e no seu trabalho pedagógico.

A análise do conteúdo das entrevistas ajuda a justificar esta

posição, visto mostrar que é no cotidiano da escola, que o educador tenta fazer

frente às exigências do trabalho de ensino da Matemática. Consequentemente,

a aprendizagem da docência não pode ser entendida como o armazenamento

estanque de conhecimentos sistematicamente construídos, que em algum

momento podem ser substituídos ou receberem a adição de novos

conhecimentos. Para Damasceno e Monteiro (2007)52, trata-se de “uma

aprendizagem plural, formada pelo conjunto de conhecimentos provenientes de

vários contextos e circunstâncias, assim como da experiência pessoal e

profissional [...] “(p. 96)

Outro aspecto que tem contribuído para a prática das depoentes,

segundo suas falas, é a formação continuada/cursos de capacitação.

A Professora Violeta diz acerca do assunto:

[...] no seu dia-a-dia você vem recebendo várias formações. Nós

temos o Pró-letramento, fizemos o GESTAR53

. No GESTAR nós

tivemos bastante orientação de como trabalhar a Matemática [...] na

nossa época não existia gráficos, tabelas, e hoje nós temos. Então,

nós conseguimos ter esse acompanhamento através das formações

que nós profissionais recebemos. Por isso é importante que os

profissionais, professores, estarem em constante formação [...]. Os

demais vêm do seu dia-a-dia mesmo, vêm nas qualificações, vêm nos

52

DAMASCENO, Kelly Kátia; MONTEIRO, Filomena M.A. Aprendizagem da docência: Uma

contribuição da formação continuada. In: O trabalho docente na educação básica: contribuições formativas e investigativas em diferentes contextos/ organização de Filomena Maria de Arruda Monteiro et al. Cuiabá: EdUFMT, 2007. 53 GESTAR – Programa de Gestão de Aprendizagem Escolar. Este programa foi criado com a

finalidade de melhorar o desempenho dos alunos nas disciplinas Matemática e Língua Portuguesa. A formação continuada de professores utiliza recursos da educação a distância com momentos presenciais e atende professores dos anos iniciais (DAMASCENO E MONTEIRO, 2007).

186

cursos que você participa, vem através do apoio – que é um livro

didático que nós recebemos – que serve como apoio [...].

A fala da professora Amarelo confirma:

[...] em sala de aula eu tive que buscar outras coisas, outros meios,

para me ajudar [...] a gente precisa ainda complementar com cursos

[...] eu tenho que estar buscando, participando de cursos [...] o que

me ajudou mesmo foram os cursos. Os cursos de Matemática que

aparecem eu tento fazer para não ficar muito alheia às novidades que

surgem para ajudar [...].

A esse respeito declara a professora Verde: eu aprendi muito

mais em cursos oferecidos pela Secretaria . Estes depoimentos mostram que

as professoras valorizam a formação continuada, visto que buscam nos cursos

proporcionados pela Secretaria Municipal de Educação apoio pedagógico para

ajudá-las no ensino da Matemática.

A Secretaria Municipal de Educação de Rondonópolis, seguindo

uma política de desenvolvimento do trabalho do professor, oferece cursos de

formação continuada nas diferentes áreas do conhecimento. Quanto à

Matemática, no período de 2004 a 2008, foram organizados seis cursos

destinados ä formação do professor do Ensino Fundamental: Conhecimentos

Matemáticos e Procedimentos Metodológicos (40h); Ensino da Matemática

(40h); V Jornada Municipal de Estudos do Ensino Fundamental - Os Saberes

Matemáticos e suas Tecnologias: Uma Dimensão Integrada de Currículo (20h);

Geometria Plana e Espacial (4h); Novas Metodologias – Utilização do Material

Dourado (3h); Gestar Matemática.

Esses dados mostram que são parcas as oportunidades de

cursos oferecidos por esta Secretaria no que diz respeito ao ensino da

matemática. Para Mingareli (2010)54, a formação continuada que a Secretaria

Municipal de Educação de Rondonópolis organiza ainda tem se dado de forma

descontínua. Trata-se de formações caracterizadas por treinamentos, por meio

54 MINGARELI, Regina Celia Farias. Cursos realizados pela Secretaria Municipal de

Rondonópolis – MT nos anos de 2004 a 2008: um olhar na formação continuada de professores. In: Seminário de Educação 2010 – Educação, Formação de Professores e suas dimensões sócio-históricas: Desafios e perspectivas. EdUFMT, 2010.

187

de cursos esporádicos e rápidos, com poucas horas de duração. Este modelo

de formação tem recebido críticas recorrentes, por ser concebido como uma

coisa encomendada por outros, não pelo professor. No entendimento da

estudiosa, ora em foco, nos debates atuais se propõe a superação desta

concepção de formação continuada, visto que não nasce de reflexão realizada

pelo professor, de seus desafios e de sua prática cotidiana.

É interessante observar que as depoentes em nenhum momento

mencionaram as contribuições da formação continuada desenvolvida na

escola. A Rede Municipal de Rondonópolis estabelece que semanalmente o

professor destine duas horas para estudo coletivo. Esta formação é uma

realidade em todas as unidades de ensino desta rede e tem por finalidade o

aprimoramento profissional dentro do ambiente de trabalho.

Fica claro que as entrevistadas concebem a formação continuada

como formação que acontece de fora para dentro, numa relação verticalizada,

em que o professor é o receptor de conhecimentos que são dados em cursos

pontuais, que, na verdade, mais se dedicam ao treinamento do professor.

Embora essa rede ofereça tal capacitação para os docentes,considera-se que

a melhor formação é aquela em que os professores têm a oportunidade de

repensar e transformar sua maneira de ensinar para fazer com que todos os

alunos aprendam, aquela formação em que saberes são construídos pelos

próprios docentes por meio da reflexão de sua prática. Essa visão demanda:

[...] conceber a escola como um ambiente educativo, onde trabalhar

e formar não sejam actividades distintas, sendo a formação encarada

como um processo permanente, integrado no dia-a-dia dos

professores e das escolas, e não como uma função que intervém à

margem dos projectos profissionais e organizacionais. (NÓVOA,

1992, p. 29)

Ao finalizar esta unidade é possível mostrar, de forma sintética,

que os problemas para ensinar a Matemática na 1ª e 2ª fases do II Ciclo

residem em situações que envolvem a formação do professor, principalmente

no que se refere à apropriação dos conteúdos matemáticos a serem ensinados.

Para as depoentes, esses entraves têm origem em dificuldades que nasceram

na educação básica e na frágil formação recebida na graduação, visto que os

cursos de Pedagogia pouco exploram “o que” ensinar, dedicando-se com mais

188

intensidade aos aspectos de “como” ensinar a Matemática. Além desta

problemática do conhecimento do conteúdo matemático a ser ensinado,

existem outros desafios de natureza pedagógica que dificultam o trabalho

docente no ensino desta área do conhecimento, como por exemplo, a

avaliação e a estratégia de ensino a serem adotadas no trabalho com classes

muito heterogêneas quanto aos níveis de aprendizagem e o problema do deficit

de aprendizagem dos alunos. Estas questões desafiadoras ficam mais

complexas à medida que ainda existe uma mentalidade de escola seriada

dentro da escola que se denomina organizada por ciclos.

189

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A intenção desta pesquisa centrou-se em mostrar a importância

da formação no curso de Pedagogia para o ensino de Matemática. Este

interesse foi motivado pelo fato de que, atualmente, em nosso país, a

responsabilidade pela formação do professor que ensina Matemática nos Anos

Iniciais é atribuída a esse curso.

Diante disso, o problema que moveu e determinou o estudo foi

assim formulado: O professor graduado em Pedagogia, para ensinar a

Matemática nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, enfrenta que

desafios? e foi dinamizado principalmente pelo seguinte objetivo geral:

identificar e compreender como os professores dos Anos Iniciais mobilizam os

conhecimentos matemáticos de que se apropriaram no curso de Pedagogia.

Como objetivos específicos destaquei: Dialogar com um determinado

referencial teórico que possibilite a compreensão e interpretação dos dados da

pesquisa; buscar entender que concepção de ensino de Matemática embasa a

prática pedagógica dos docentes que atuam nos Anos Iniciais do Ensino

Fundamental; analisar o que pensam esses profissionais sobre a sua

formação; procurar identificar os problemas, dificuldades e desafios que

professores dos Anos Iniciais enfrentam no ensino dos conteúdos matemáticos

para os alunos da 1ª e 2ª fases do II Ciclo.

A pesquisa partiu da hipótese de que a condição primeira para a

superação de tais dificuldades consiste em que a formação e a prática

docentes sejam repensadas e reestruturadas considerando-se os problemas e

desafios com os quais se defronta o professor no cotidiano escolar em função

dos saberes e habilidades que se propõe desenvolver na interação professor-

aluno-conhecimento matemático.

No bojo destas preocupações, encontra-se a constatação de que

a formação do pedagogo tem sido marcada por idas e vindas que ocasionaram

a fragilidade e a crise de identidade do curso. Na busca desta identidade, os

debates se concentraram na questão de ser a Pedagogia ou a docência a base

da identidade do curso. As discussões ainda persistem, mas, com a aprovação

das Diretrizes Curriculares Nacionais, em 2006, definiu-se que é a docência a

base de formação dos pedagogos.

190

Assumindo esta compreensão do pedagogo como professor por

excelência, as discussões e reflexões aqui empreendidas foram embasadas

em teóricos que discutem a formação docente na perspectiva de uma

educação crítica e emancipadora. A partir do estudo, defendo que o curso de

Pedagogia deve buscar tecer um projeto educativo voltado à formação de um

professor que se constitua num sujeito histórico, crítico e criativo, capaz de

pensar sua própria condição de ser humano; que, sendo agente da práxis

educativa, mostre-se apto a perceber-se como educador-educando; que, ainda

como sujeito de seu próprio desenvolvimento, seja encorajado a apropriar-se

das habilidades e conhecimentos necessários ao exercício do magistério;

finalmente, que, tendo o compromisso político, ético e técnico, seja capaz de

intervir na transformação da qualidade da educação matemática.

A pesquisa levou-me a compreender a formação do professor

como percurso, processo, trajetória de vida pessoal e profissional; como sendo

“inconclusa” e por isso permanente, com vistas à formação de educadores

autônomos, que sejam sujeitos capazes e livres para construir e reconstruir

constantemente os saberes que realizam em sua prática.

A identidade docente, nesta perspectiva, não é vista como um

dado adquirido, mas algo que se constrói num espaço de lutas e conflitos. Esta

construção, ademais, se dá nas dimensões do desenvolvimento pessoal, do

desenvolvimento profissional e do desenvolvimento organizacional (NÓVOA,

1992).

Assim sendo, este trabalho mostra que a formação de um

professor não se limita à que se desenvolve na graduação. Por outro lado,

considera que esta instância representa uma formação essencial para o

exercício do trabalho docente.

Não obstante a importância que cabe a essa formação inicial,

contudo, na visão expressa pelos sujeitos da pesquisa acerca da sua

formação, bem como na análise do currículo dos cinco cursos de Pedagogia

focalizados no estudo, verificou-se que, no que se refere à formação para o

ensino de Matemática, a formação do pedagogo aparece como insuficiente e

repleta de fragilidades.

Nesta dimensão da formação do pedagogo para o ensino de

Matemática nos currículos dos cursos pesquisados sobressai a pequena carga

191

horária destinada a tal formação, que atinge em média 4,5% da totalidade em

cada curso. A metodologia aparece como aspecto fundamental da formação

em detrimento dos conteúdos a serem ensinados pelo futuro docente. A fala

das professoras, por seu turno, apontou como ponte de convergência a

ênfase dada à formação insuficiente para o ensino de Matemática, que, para

elas, é devida a dois fatores: o distanciamento entre o que é ensinado no curso

e a realidade escolar; e a falta de articulação entre teoria e prática.

Disto se depreende que as educadoras entrevistadas demonstram

entender que o curso de Pedagogia constitui-se num espaço de formação que,

mesmo sendo um pré-requisito necessário ao exercício docente e tendo a

obrigação de muni-los dos fundamentos para o ensino, não é capaz de

prepará-los satisfatoriamente para atuar no ensino de Matemática.

Assim sendo, penso que os cursos de formação inicial devem

trazer em seus currículos elementos que permitam construir-se a base de

conhecimentos necessários para o professor começar a ensinar Matemática –

conhecimento dos conteúdos matemáticos a serem ensinados, seus conceitos

fundamentais e a história de tais conceitos; o conhecimento pedagógico geral,

que corresponde aos conhecimentos sobre os processos de ensino e

aprendizagem de Matemática e aos procedimentos didáticos necessários à

transformação do conteúdo a ser ensinado em conteúdo a ser aprendido.

As análises realizadas, porém, mostraram que o curso de

Pedagogia não tem conseguido esgotar todos os conhecimentos necessários

para o ensino de Matemática, mesmo porque alguns destes são construídos na

ação e no contexto em que ocorre a atividade docente. Ao mesmo tempo,

evidenciou-se a partir do entendimento da formação do professor como sendo

antes forjada no processo pré-profissional, que as pedagogas em foco

apresentam defasagens de conteúdos que deveriam ter sido apropriados ao

longo da educação básica. Diante destas observações, é possível afirmar que

nem o curso de Pedagogia, nem a licenciatura em Matemática têm dado conta

de formar professores capazes de desenvolver nas escolas um ensino desta

disciplina que produza, de fato, mudanças significativas na aprendizagem dos

alunos.

Além disso, considerando que muitos dos conhecimentos que

constituem a base para a docência se constroem na ação, no contexto da

192

escola, entende-se que é necessário dar continuidade à formação do professor,

a fim de buscar superar os desafios que surgem na sua prática.

Isto permite dizer que, ao se pensar a formação do pedagogo

deve-se levar em conta que o ensino de Matemática requer uma atuação

profissional fundada na reflexividade crítica sobre a prática pedagógica diária,

num processo permanente de construção e reconstrução de suas ações, de

modo a garantir as conexões entre sua formação e as experiências vividas ao

longo de sua profissão como professor desta área do conhecimento.

O até aqui exposto demonstra que os cursos de formação inicial

precisam fornecer, além dos conhecimentos fundamentais para o ensino,

elementos que contribuam para a construção da autonomia do professor

despertando o desejo nos futuros docentes por transcender os desafios que

encontrarão na realidade da escola e incentivando-os a buscar seu

desenvolvimento profissional. Autonomia, aqui, é entendida como

processo de conquista de uma identidade livre e consciente do alcance e significatividade de sua ação e de seus processos decisórios, feitas a partir da reflexão da própria existência, das condições do trabalho e também dos anseios e desejos que põe em ação para a realização da atividade docente e para a constituição de si mesmo com alguém que age por convicções e em vista de qualificar sua ação e existência. (CARVALHO et al., 2010, p.1)

Nos aspectos relacionados ao processo ensino-aprendizagem

de Matemática no cotidiano escolar, constatou-se que a prática das

interlocutoras orienta-se por pressupostos das tendências de ensino empírico-

ativista, construtivista, socioetnocultural e sociointeracionista-semântica.

Acrescento que há convergência nos discursos das docentes quanto à

concepção de Matemática, no tocante à ideia de que esta última faz parte do

cotidiano do aluno, sendo entendida como ciência ligada à vida com a

finalidade de resolver problemas do dia a dia. No que diz respeito às

concepções de ensino e de aprendizagem de Matemática, o ensino aparece,

majoritariamente, na perspectiva da construção, da elaboração, que dá maior

valor ao processo do que ao produto na produção do conhecimento

matemático.

No que se refere à atuação do pedagogo no ensino de

Matemática na 1ª e 2ª fases do II Ciclo do Ensino Fundamental, encontrei

também um ponto de convergência na fala das professoras: os desafios e

193

problemas enfrentados, de acordo com as entrevistadas, inserem-se em

questões externas à sua própria prática pedagógica, ou seja, centradas na

formação do professor, na organização da escola por Ciclos de Formação

Humana, no aluno e na família do aluno.

Como já mencionado, a problemática da formação, no

entendimento dessas educadoras, reside mais fortemente na apropriação

insuficiente dos conteúdos matemáticos a serem ensinados. O fato é que as

depoentes deixam claro em seu discurso que se percebem como agentes

destituídos do conhecimento do conteúdo que precisam ensinar. Nesta

condição, recorrem, principalmente, ao livro didático para transformar o

conteúdo específico em ensinável.

Contudo, é preciso enfatizar que não basta ao educador saber o

conteúdo matemático e a metodologia, como foi explicitado pelas docentes,

Longe disso, outros elementos são relevantes para que este conhecimento

específico em Matemática se transforme em conhecimento escolar. Para fazer

a transposição didática, o professor também necessita da apropriação de

conhecimentos que são base da docência, entre eles o conhecimento do aluno

e do contexto. Mostra-se importante, pois, compreender as peculiaridades que

envolvem o trabalho docente ao ensinar Matemática em um sistema de ensino

organizado por Ciclos de Formação Humana. É preciso, ainda, ponderar as

particularidades que este sistema encontra no município onde as entrevistadas

ensinam a disciplina em pauta.

Com efeito, ensinar a Matemática no contexto da escola

organizada por ciclos exige que o desenvolvimento dos programas leve em

conta uma visão da Matemática que seja flexível, de forma a propiciar meios

para que o docente possa trabalhar com mais autonomia, respeitando o

processo de maturação do aluno. É em trabalho desta natureza que permite

uma elaboração e reelaboração por parte do aprendiz desde o primeiro

momento em que ele se apropria das ideias básicas até a fase do pensamente

lógico-dedutivo.

Os desafios para o pedagogo ensinar a Matemática, que nos

depoimentos aparecem como sendo ligados ao aluno e à família deste

assumem, de fato, uma natureza pedagógica devendo também estar

associados à temática do mal-estar docente, a ser abordada, de forma breve,

194

mais adiante. Os percalços de caráter pedagógico vinculam-se à avaliação e à

estratégia de ensino a serem adotadas no trabalho com classes bastante

heterogêneas nos níveis de aprendizagem e ao problema do deficit de

aprendizagem dos alunos, considerado pelas docentes como consequência da

organização da escola em ciclos

Em um sistema de ensino que permite a formação de turmas

consideravelmente heterogêneas na questão das aprendizagens, como é o

caso desta organização escolar, torna-se exigência basilar que o professor

consiga ensinar alunos que se encontram em níveis de aprendizagem bastante

diferentes dentro de uma mesma sala de aula. Na visão das depoentes, trata-

se de um trabalho desafiador e complexo, não sendo, muitas vezes, possível

obter resultado satisfatório com todos os educandos no tempo e espaço

regulares da aula.

Por isso, consideram que, nesse contexto, é imprescindível aos

alunos que continuam apresentando deficit de aprendizagem, mesmo depois

das intervenções pedagógicas realizadas no período regular, que participem

simultaneamente das aulas de Apoio Pedagógico. Ao enfatizarem a seriedade

de o aluno frequentar essas aulas, apontam a ausência de compromisso dos

pais com esse programa, visto que, por vezes, não enviam seus filhos para

esses encontros oferecidos no contraturno.

Não desconsiderando a importância da família na vida escolar da

criança, porém, acredito ser fundamental entender que a discussão não se

esgota focando apenas a responsabilidade de pais, alunos e professores no

tocante ao Apoio Pedagógico. Tendo em vista a realidade mostrada nos

depoimentos das interlocutoras do presente estudo acerca da existência de

estudantes que carregam defasagens significativas ano após ano e chegam ao

segundo ciclo do Ensino Fundamental sem saber os conteúdos matemáticos

que deveriam ter sido apropriados no primeiro ciclo, e, ainda, considerando a

relevância do referido projeto para ajudar na superação das defasagens de

aprendizagem matemática, há de se problematizar como o sistema de ensino

tem tratado o projeto de Apoio Pedagógico nas escolas públicas deste

município. Essas escolas têm espaço físico apropriado, no período contrário,

para que sejam ministradas tais aulas? A carga horária – 2 horas semanais –

voltada ao atendimento do aluno é suficiente? Como se efetiva o trabalho

195

pedagógico nesse espaço? De que modo a coordenação pedagógica tem

tratado este projeto no âmbito da formação do professor?

Por agora, é possível assegurar com base nas entrevistas que o

professor entende a relevância do Apoio Pedagógico, vendo-o como espaço

que pode ajudar o educando a se apropriar do conhecimento matemático. No

entanto, o atendimento às necessidades de aprendizagem do aluno requer,

também, compromisso do sistema, que pela não garantia das necessárias

condições de trabalho ao professor e ao aluno, pode contribuir para entravar o

processo de ensino-aprendizagem de Matemática.

Um olhar atento permite identificar que, ao responsabilizar os

familiares do aluno pelas dificuldades vivenciadas no ensino dessa área do

conhecimento, o professor, na verdade, está dizendo nas entrelinhas, que

precisa de ajuda para exercer sua função e, portanto, nomeia estes sujeitos

como aqueles que podem oferecer o suporte necessário.

O fato é que, por detrás destes argumentos, esconde-se a

problemática do mal-estar docente, visto que hoje os professores se percebem

um tanto descontentes em termos profissionais devido à desvalorização por

que passa o magistério. Eles vivem a realidade concreta desse desprestígio

social e econômico da profissão, que se evidencia, entre outros fatores, em

salários defasados e extensa jornada de trabalho. Este mal-estar ocasiona

certa dificuldade para o professor se apropriar de elementos que podem

melhorar a qualidade da docência, como, por exemplo, estudar, pesquisar,

fazer cursos, e isso os leva a fazer incidir muitos dos problemas que enfrenta

para ensinar Matemática nos pais e nos alunos.

É certo que a família precisa envolver-se na educação escolar

da criança, por isso é necessário que a relação família-escola não fique restrita

à dimensão das reclamações. Cabe, portanto, à gestão escolar construir

espaços de discussão quanto ao papel dos pais junto à escola e, sobretudo,

apresentar esta temática para os momentos de formação contìnua dos

educadores. Também concorda-se que é imperioso que o aluno se dedique a

aprender. Contudo, é preciso compreender que o nó do problema do ensino de

Matemática não reside fortemente nesses fatores.

A verdade é que o avanço na qualidade do ensino-aprendizagem

desta disciplina encontra-se atrelado a assuntos da formação do professor,

196

acrescidos do cuidado que se deve ter com as questões relativas ao contexto

em que se desenvolvem as atividades de ensino e às condições institucionais

para isso.

O elemento nodal do embaraço no processo de ensino e

aprendizagem da área do conhecimento em questão consiste, em última

análise, no fato de que os professores, em seu percurso formativo, conheceram

a Matemática orientada pela perspectiva tradicional de ensino, mas, hoje, como

docentes, precisam ensinar a Matemática cujo foco de ensino assenta-se na

resolução de problemas. Esta opção metodológica traz implícita a convicção de

que o conhecimento matemático ganha significado quando os alunos se

defrontam com situações desafiadoras para resolver e trabalham no de-

senvolvimento de estratégias de resolução.

Desde a década de 80, as propostas curriculares (Parâmetros

Curriculares Nacionais) e as avaliações nacionais como, por exemplo, a Prova

Brasil têm exigido que o conhecimento matemático se dê nesta direção, porém,

o docente enfrenta dificuldade por ser portador da visão de uma Matemática

estanque, pronta e acabada, que é ensinada mecanicamente. O professor

tendo sido formado nesse enfoque da Matemática tradicional formal, julga mais

tranquilo prosseguir realizando o ensino nesta perspectiva.

Logo, a questão se encontra em que sua experiência como

estudante dessa disciplina, fortemente presente na sua formação é a de uma

Matemática trabalhada de forma diferente da que está posta hoje, e o

professor, mesmo depois do curso de formação inicial continua ensinando esta

Matemática formal. Faz-se necessário ao professor, conforme se pode ver, dar

um salto da Matemática formal para aquela centralizada, quanto ao ensino-

aprendizagem, na resolução de problemas.

Acredita-se, todavia, que ainda possa levar tempo para se

efetivar este avanço e se implementar o ensino da Matemática com esse novo

enfoque. Implantar o ensino que se fundamente na reflexão e questionamento

do que historicamente vem sendo praticado, com vistas a mudanças, afinal,

requer trabalho árduo por parte dos programas de formação de professores e

do sistema de ensino, assim como o engajamento dos educadores que atuam

no ensino desta área do conhecimento em processos de formação continuada

e autoformação.

197

E assim compreendendo que, tendo em vista que o curso de

Pedagogia não prepara, a contento, o professor dos anos iniciais para ensinar

Matemática, como se patenteou nesta pesquisa, e, além disso, que existem

conhecimentos/saberes que só podem ser construídos na prática, como por

exemplo, o conhecimento pedagógico do conteúdo e o conhecimento do aluno

e dos contextos (SHULMAN,1986; 1987, apud MONTALVÃO E MIZUKAMI,

2002), aponto como uma possível contribuição deste estudo, a urgência de se

repensar a formação inicial e contínua do professor a partir das necessidades

que se evidenciam na escola, Penso que a formação continuada deve levar

em consideração o contexto em que se desenvolve a prática docente – neste

caso, a escola organizada por Ciclos de Formação Humana – as

especificidades e peculiaridades da unidade escolar no município em que os

professores atuam, visto existirem conhecimentos, conforme apontado, que se

constituem na própria ação.

O pedagogo que atua no ensino de Matemática nos anos iniciais,

consciente dos limites da sua formação, deve, por isso, embrenhar-se pelos

caminhos da autoformação e formação contínua centrada na escola. É preciso,

também, que sejam tais percursos permeados pela pesquisa que tenha a

prática como ponto de partida, num movimento de ação-reflexão-ação, visando

à melhoria da boa qualidade da docência, o que necessariamente passa pelas

dimensões política, ética e técnica (RIOS, 2001), nesta área de ensino.

Mostra-se, desta forma, imprescindível que o professor, como

sujeito por essência aprendente, se conscientize de que necessita dedicar-se à

formação continuada, compreendendo que se trata de instrumento passível de

contribuir para alterar de maneira crítica sua ação pedagógica. Todavia, é

fundamental não somente que os docentes tenham esse entendimento, mas

que, durante toda sua trajetória profissional, sejam incentivados a buscar, por

meio da formação permanente, possíveis soluções para os desafios

vivenciados no ensino da Matemática.

Impõe-se, ademais, que os professores entendam formação

também como autoformação. Não se trata de isentar o sistema da

responsabilidade de oferecer-lhes formação contínua de qualidade e trazer

para o professor toda a responsabilidade por esta formação. Trata-se, isto sim,

de mostrar que a construção da autonomia do educador passa pela dimensão

198

de assumir a sua formação continuada como uma prática necessária para a

constituição de sua identidade docente. É forçoso, portanto, que o professor

que ensina Matemática nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental busque,

incessantemente, um crescimento profissional por meio de estudo, a partir da

sua necessidade de formação centrada na escola, aqui entendida como

formação que procura dar respostas aos problemas que emergem no próprio

contexto da escolar.

É oportuno, a esta altura, esclarecer que a formação continuada,

tal como se defende, não tem como foco principal suprir lacunas deixadas pelo

curso de graduação, mas representa um instrumento que pode ampliar a

compreensão e superação dos desafios vivenciados no processo de ensino-

aprendizagem de Matemática no cotidiano da sala de aula.

Diante dessas dificuldades, propõe-se como uma contribuição

possível para a melhoria da qualidade do ensino de Matemática o

entendimento de que se faz imperioso que o docente se dedique a buscar os

conhecimentos necessários à sua prática para além daquilo que o sistema lhe

oferece, na perspectiva de que o professor se faz professor e que essa feitura

exige que ele disponha de autonomia e meios de aperfeiçoar a sua capacidade

de refletir e interpretar a realidade.

Contudo, é de fundamental importância lembrar também que a

melhoria da qualidade no ensino de Matemática encontra-se vinculada às

condições de trabalho e à valorização social da profissão engendradas pelas

políticas de Estado, visto que, historicamente, a profissão do professor tem sido

marcada pela sua desvalorização e pela ausência de condições necessárias à

formação de qualidade e de condições dignas de trabalho.

Este quadro corrobora que é necessária a implementação de

políticas públicas que, ao invés de cercearem o trabalho do professor e sua

autonomia por meio do oferecimento de instrumentos que, aparentemente,

destinam-se a ajudá-lo a realizar a sua própria aula, proponham-se de fato,

construir um projeto de valorização da formação de professores e de seu

trabalho ponderando a precarização e desvalorização social e econômica que

tem revestido a profissão-professor e, ao mesmo tempo, desvelando a

complexidade da natureza do trabalho docente.

199

Por outro lado, ainda que as condições de trabalho e a

desvalorização socioeconômica impostas à profissão docente possam inibir o

educador de produzir a sua profissão na perspectiva do desenvolvimento

profissional, como defende Nóvoa (1992), elas não têm o poder de anular a

prerrogativa do professor de pensar e construir sua aprendizagem e,

sobretudo, fazer-se professor.

Também considero oportuno sugerir, no que se refere ao curso de

Pedagogia e à formação para o ensino de Matemática, que se busquem a

articulação entre teoria e prática e a aproximação entre a realidade escolar e as

teorias estudadas no curso. A proposta consiste em que este último, sendo

permeado pela pesquisa, ofereça ao discente a oportunidade de teorizar sobre

a sua e outras práticas, concebendo a investigação como processo formativo

inerente à prática do professor. Concomitantemente, essa formação deve

procurar conscientizar os futuros docentes sobre a necessidade de um

investimento profissional permanente, dada a natureza de sua atividade

profissional, sempre considerando os aspectos relativos ao modo como a

profissão é representada socialmente e às condições em que atuarão esses

educadores.

Penso que, por meio destas ações, alguns dos problemas e

desafios vivenciados pelo pedagogo ao ensinar Matemática nos Anos Iniciais

do Ensino Fundamental venham a ser mais bem evidenciados e

compreendidos, de modo que o docente, atuando como professor intelectual,

seja capaz de dar novos sentidos ao seu trabalho no ensino de tal disciplina.

Assim, ressignificando a sua prática, ele poderá experimentar soluções para os

problemas e desafios que tem enfrentado nesse ensino.

Posto isto, a presente investigação permite desmascarar a ideia

de que os alunos não sabem Matemática tão somente porque quem a ensina

nos anos iniciais é o pedagogo, visto que os depoentes já apresentavam, na

sua formação anterior ao curso de Pedagogia, dificuldades com essa área do

conhecimento. Também é importante que se tenha a consciência de que

ensinar Matemática nos anos iniciais representa um desafio, tanto para os

pedagogos quanto para os licenciados em Matemática, já que um curso de

graduação não consegue esgotar os conhecimentos necessários ao exercício

da docência, o que requer a continuidade na formação do professor. Com isto,

200

ele poderá buscar respostas aos desafios experimentados no dia a dia da sala

de aula.

Portanto, se quisermos buscar o aprimoramento do ensino da

Matemática nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, como tem sido

propagado pelo poder público, adquire relevância a consideração de todas as

facetas do trabalho do professor, já citadas neste estudo, e, sobretudo, que se

problematize a formação contínua centrada na escola, no sentido de

compreender como tem sido pensado e utilizado o espaço que se dedica a tal

formação no ambiente escolar, para que o mesmo seja realmente destinado ao

estudo dos problemas surgidos no contexto da escola.

A temática abordada nesta investigação sinaliza para a busca de

aprofundamento no âmbito da aprendizagem da docência a fim de se desvelar,

com futuros estudos, como o professor ensina Matemática no contexto da

escola organizada em Ciclos de Formação Humana, considerando a

complexidade que envolve o seu trabalho, com o objetivo de contribuir para a

melhoria da qualidade do ensino-aprendizagem desta disciplina nas escolas

públicas de nosso país.

201

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Matemática. Várzea Grande: UNIVAG, 2009.

206

ANEXOS

ANEXOS

207

Anexo 1 - Roteiro das entrevistas

1) Como você define a Matemática?

2) Que importância você atribui ao ensino de Matemática?

3) Que recursos didáticos utiliza para trabalhar os conteúdos matemáticos?

4) Em sua opinião, qual a melhor maneira para se aprender matemática?

5) Você encontra dificuldades para ensinar os conteúdos de Matemática? Quais?

6) De que forma seu aluno se apropria do conhecimento matemático?

7) Quando seu aluno apresenta dificuldades para desenvolver o conteúdo de Matemática, qual o procedimento que utiliza para ajudá-lo?

8) Quais os desafios que você encontra para ensinar a matemática?

9) O que você aprendeu no curso de Pedagogia trouxe qual suporte para você ensinar a matemática?

208

Anexo 2 - Questionário: Caracterização do professor

1. Dados Pessoais: Nome:__________________________________ __ Sexo: ( ) Masc. ( ) Fem. Data de nascimento:___/___/____ Natural de:__________________________ Email______________________________________tel___________cel______ 2. Escolaridade: Ensino Médio: ( ) Magistério ( ) Propedêutico ( ) Outros:__________________ Formação Acadêmica

Curso/habilitação Ano / Início e Término

Instituição/Cidade/Estado

Título da Monografia

Graduação

Especialização

Mestrado

3. Experiência Profissional:

a) Há quantos anos você trabalha na área de Educação como Professor (a)? _____________ b) E como professor(a) de Matemática? ________________________ c) Qual (is) ciclo (s) você leciona nessa Escola: _____________________ d) Vínculo com essa Escola: ( ) Efetivo ( ) Interino/Substituto ( ) Outros e) Turno em que trabalha nessa Escola: ( ) Matutino ( ) Vespertino ( ) Noturno f) Qual é a sua jornada de trabalho semanal? __________ __ g) Você trabalha em outra escola? _____________________ h) Exerce outra profissão além de Professor? ( ) sim ( ) não Qual?__________________ Onde?________________________________________ i) Quanto tempo leciona no Ensino Fundamental?_____________________________ j) Na rede Municipal? __________ Como Efetivo? ____________________________ l) Na rede Estadual?_______________________ m) Na rede Privada? ______________________ 4. Sobre o ensino da Matemática:

a) Em quais fases você ministra a disciplina?______________ b) Quantas aulas por semana?_________________ c) Qual a carga horária semanal dessa disciplina? __________ d) Qual o tempo de duração de cada aula?__________ e) Quantos alunos você tem (média) por turma?_____________

209

Anexo 3 - Proposta curricular para Matemática e suas Tecnologias – 1ª fase do II ciclo

Saberes e Habilidades Conteúdos

Resolve situações-problemas que envolvem a construção de algoritmo para o cálculo de resultados das operações fundamentais com números naturais, ampliando o repertório numérico.

Resolve situações-problema que envolvem as 4 operações com números naturais.

Identifica a idéia de números ordinais em situações de competição.

Interpreta e produz escritas numéricas que devem ser expressas por números racionais, nas formas fracionária e decimal.

Identifica representações equivalentes de números racionais, nas formas fracionária e decimal.

Representa e compara números racionais registrados nas formas decimal, fracionária e percentual.

Efetua adição, subtração e multiplicação com números racionais na forma decimal por estratégias pessoais ou técnicas convencionais.

Reconhece cédulas/moedas e seu uso, percebendo o significado de “troco” em situações cotidianas.

Identifica, compara os algarismos romanos relacionados ao cotidiano.

Encontra todas as possibilidades fazendo uso de raciocínio combinatório.

Identifica, descreve e representa um e sua posição no espaço, de diferentes maneiras (moldes, vistas, representação em malhas, etc.).

Identifica relações de paralelismo e perpendicularismo e classifica triângulos e quadriláteros, usando como critérios essas relações.

Reconhece semelhanças e diferenças entre polígonos usando critérios como: número de lados, eixos de simetria e comprimentos de seus lados.

Calcula área e perímetro de figuras planas.

Compõe e decompõe figuras planas.

Identifica semelhanças e diferenças entre: cubos e quadrados, paralelepípedos e retângulos, pirâmides e triângulos, esferas e circunferências.

Reconhece as três dimensões.

Identifica figuras simétricas e eixo de simetria.

Compara grandezas de mesma espécie [comprimento (utilizando instrumentos adequados como a régua e fita métrica), massa, capacidade e tempo], registrando as medidas por meio de unidades não padronizadas ou padronizadas.

Identifica e relaciona medidas de tempo (hora, dia, semana, mês e ano), utilizando o relógio e o calendário.

Identifica a posição de um objeto a partir da utilização de malhas, plantas ou mapas.

Elabora listas, tabelas simples e gráficos de barras a partir de dados fornecidos.

Identifica, interpreta e utiliza informações organizadas em tabelas e gráficos, na resolução de situações-

Origem dos números – de uma forma lúdica.

Sistema de Numeração: egípcia, romano e indo-arábico.

Sistema de Numeração Decimal.

Contagem e agrupamentos.

Correspondência biunívoca.

Operações com números naturais (adição, subtração, multiplicação e divisão).

Números ordinais.

Números racionais escritos na forma fracionária, decimal e percentual.

Frações com denominadores iguais.

Adição, subtração e multiplicação com números racionais (fracionários e decimais)

Sistema monetário.

Expressões numéricas.

Possibilidades e raciocíno combinatório.

Retas paralelas e retas perpendiculares.

Reconhecendo objetos e suas formas.

Figuras planas: polígonos e círculos.

Perímetro e áreas.

Figuras não planas: Sólidos Geométricos (paralelepípedo, prisma, pirâmide, cilindro, cone e esfera)

Semelhanças e diferenças entre figuras planas e não planas.

Simetria.

Medidas de tempo: frações de tempo, dia, semana, mês, ano, bimestre, semestre.

Medidas de comprimento: metro, centímetro e quilômetro.

Medidas de massa: quilograma, grama, tonelada e arroba.

Medidas de capacidade: litro e mililitro.

Estatísticas.

Coleta de dados, tabelas e gráficos.

210

problema.

Fonte: Secretaria Municipal de Educação de Rondonópolis – MT – 2008

211

Anexo 4 - Proposta curricular para Matemática e suas Tecnologias –

2ª fase do II ciclo

Saberes e Habilidades Conteúdos

Resolve situações-problemas que envolvem a construção de algoritmo para o cálculo de resultados das operações fundamentais com números naturais, ampliando o repertório numérico.

Resolve situações-problema que envolve as quatro operações com números naturais.

Identifica a idéia de números ordinais em situações de competição.

Conhecer o valor posicional dos algarismos reconhecendo as classes e as ordens.

Compor e decompor números naturais.

Reconhece e determina os múltiplos de um número.

Identifica se um número é ou não divisor de outro número.

Reconhece e determina os divisores de um número utilizando a multiplicação.

Reconhece como números primos aqueles que têm apenas dois divisores.

Decompõe um número em fatores primos.

Interpreta e produz escritas numéricas que devem ser expressas por números racionais, nas formas fracionária e decimal.

Identifica representações equivalentes de números racionais, nas formas fracionária e decimal.

Representa e compara números racionais registrados nas formas decimal, fracionária e percentual.

Reconhece frações equivalentes como representações diferentes de um mesmo número racional.

Reconhece que existem números representados por uma parte inteira e outra fracionária.

Efetua adição, subtração, multiplicação e divisão com números racionais na forma decimal por estratégias pessoais ou técnicas convencionais.

Reconhece cédulas/moedas e seu uso, percebendo o significado de “troco” em situações cotidianas.

Identifica, compara os algarismos romanos relacionados ao cotidiano.

Encontra todas as possibilidades fazendo uso de raciocínio combinatório.

Identifica, descreve e representa um objeto e sua posição no espaço, de diferentes maneiras (moldes, vistas, representação em malhas, etc.).

Identifica relações de paralelismo e perpendicularismo e classifica triângulos e quadriláteros, usando como critérios essas relações.

Comparar as medidas de segmentos de retas.

Reconhece semelhanças e diferenças entre polígonos usando critérios como: número de lados, eixos de simetria e comprimentos de seus lados.

Identificar e nomear polígonos de acordo com o número de lados.

Definir: triângulos, quadriláteros e circunferências.

Classificar triângulos e quadriláteros.

Construir e identificar ângulos: reto, agudo e obtuso.

Origem dos números - de uma forma lúdica

Sistema de Numeração: Sistemas de numeração egípcia, romano e indo-arábico.

Sistema de Numeração Decimal.

Valor posicional.

Operações com números naturais (adição. subtração, multiplicação e divisão).

Números ordinais.

Múltiplos e divisores.

Números racionais escritos na forma fracionária, decimal e percentual.

Frações com denominadores iguais.

Número misto.

Adição, subtração, multiplicação e divisão com números racionais (fracionários e decimais).

Sistema monetário.

Expressões numéricas. Possibilidades e raciocino combinatório.

Retas paralelas e retas perpendiculares.

Reconhecendo objetos e suas formas.

Figuras planas: segmentos de retas, medidas de segmentos de retas, polígonos, quadriláteros, triângulos, círculos e ângulos.

Perímetro e áreas.

Figuras não plana: Sólidos Geométricos (paralelepípedo, prisma, pirâmide, cilindro, cone e

212

Calcula área e perímetro de figuras planas.

Compõe e decompõe figuras planas.

Identifica semelhanças e diferenças entre: cubos e quadrados, paralelepípedos e retângulos, pirâmides e triângulos, esferas e circunferências. Reconhece as três dimensões. Identifica figuras simétricas e eixo de simetria.

Compara grandezas de mesma espécie [comprimento (utilizando instrumentos adequados como a régua e fita métrica), massa, capacidade e tempo], registrando as medidas por meio de unidades não padronizadas ou padronizadas.

Identifica e relaciona medidas de tempo (hora, dia, semana, mês e ano), utilizando o relógio e o calendário.

Identifica a posição de um objeto a partir da utilização de malhas, plantas ou mapas.

Elabora listas, tabelas simples e gráficos de barras a partir de dados fornecidos.

Identifica, interpreta e utiliza informações organizadas em tabelas e gráficos, na resolução de situações-problema.

Interpreta legendas.

esfera).

Semelhanças e diferenças entre figuras planas e não planas.

Simetria. Medidas de tempo: frações de tempo, dia, semana, mês, ano, bimestre, semestre.

Medidas de comprimento.

Medida de superfície.

Medidas de massa:

Medidas de capacidade

Estatísticas.

Coleta de dados, tabelas e gráficos.

Fonte: Secretaria Municipal de Educação de Rondonópolis – MT – 2008