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FILOSOFIA NO BRASIL E AMÉRICA LATINA 1 A FILOSOFIA EM IBERO-AMÉRICA 1 Ricardo Vélez Rodríguez Introdução Este trabalho analisa três problemas básicos abordados pela filosofia contemporânea na América Latina: o relativo ao método de estudo, o do arquétipo da totalidade e o da integração. Ao desenvolver o primeiro dos mencionados problemas, serão analisadas três tendências sustentadas pelos pensadores latino-americanos: a que nega originalidade à filosofia feita nesta parte do mundo, a que afirma uma originalidade total e a que defende a ideia de uma originalidade relativa. Será exposto brevemente o método para o estudo da filosofia latino-americana, que foi formulado no contexto da terceira tendência. No desenvolvimento do segundo problema, serão abordadas as duas vias pelas que enveredaram os pensadores latino-americanos: a que encara a cultura ibero- americana como totalidade arquetípica num contexto hermenêutico, e a que sustenta uma atitude crítica face a essa abordagem totalizante. No desenvolvimento do terceiro problema, serão expostas quatro concepções da integração, elaboradas por pensadores latino-americanos. 1) Questões Metodológicas - A problemática da originalidade constitui a primeira indagação, quando se trata da Filosofia na América Latina. Representa a meditação filosófica latino-americana algo de novo, no terreno mais amplo da Filosofia ocidental? Diante dessa pergunta, emergem duas respostas radicais: não há qualquer originalidade, ou, ao contrário, é possível uma originalidade total. Exemplo da primeira alternativa é a opinião do jusfilósofo brasileiro C. Bevilacqua, para quem "a especulação filosófica pressupõe uma larga e profunda base de meditação nos vários domínios do saber humano, aparecendo ela como uma flor misteriosa [...] dessa vegetação mental, assim como a poesia é a flor da emotividade" [Bevilacqua, 1899: 16]. Ora, frisa Bevilacqua, se bem a poesia floresce no Brasil, em decorrência do fato de se enraizar no sentimento, não ocorre isso, no entanto, com a filosofia, terreno no qual os brasileiros limitam-se a copiar o pensamento dos europeus, sem que exista 1 RODRÍGUEZ, Ricardo Vélez. Carta Mensal, Rio de Janeiro, vol. 41, n. 492 (1996), p. 19-48.

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FILOSOFIA NO BRASIL E AMÉRICA LATINA

1

A FILOSOFIA EM IBERO-AMÉRICA 1

Ricardo Vélez Rodríguez

Introdução

Este trabalho analisa três problemas básicos abordados pela filosofia contemporânea

na América Latina: o relativo ao método de estudo, o do arquétipo da totalidade e o

da integração.

Ao desenvolver o primeiro dos mencionados problemas, serão analisadas três

tendências sustentadas pelos pensadores latino-americanos: a que nega

originalidade à filosofia feita nesta parte do mundo, a que afirma uma originalidade

total e a que defende a ideia de uma originalidade relativa. Será exposto brevemente

o método para o estudo da filosofia latino-americana, que foi formulado no contexto

da terceira tendência.

No desenvolvimento do segundo problema, serão abordadas as duas vias pelas que

enveredaram os pensadores latino-americanos: a que encara a cultura ibero-

americana como totalidade arquetípica num contexto hermenêutico, e a que sustenta

uma atitude crítica face a essa abordagem totalizante.

No desenvolvimento do terceiro problema, serão expostas quatro concepções da

integração, elaboradas por pensadores latino-americanos.

1) Questões Metodológicas - A problemática da originalidade constitui a primeira

indagação, quando se trata da Filosofia na América Latina. Representa a meditação

filosófica latino-americana algo de novo, no terreno mais amplo da Filosofia ocidental?

Diante dessa pergunta, emergem duas respostas radicais: não há qualquer

originalidade, ou, ao contrário, é possível uma originalidade total. Exemplo da primeira

alternativa é a opinião do jusfilósofo brasileiro C. Bevilacqua, para quem "a

especulação filosófica pressupõe uma larga e profunda base de meditação nos vários

domínios do saber humano, aparecendo ela como uma flor misteriosa [...] dessa

vegetação mental, assim como a poesia é a flor da emotividade" [Bevilacqua, 1899:

16]. Ora, frisa Bevilacqua, se bem a poesia floresce no Brasil, em decorrência do fato

de se enraizar no sentimento, não ocorre isso, no entanto, com a filosofia, terreno no

qual os brasileiros limitam-se a copiar o pensamento dos europeus, sem que exista

1 RODRÍGUEZ, Ricardo Vélez. Carta Mensal, Rio de Janeiro, vol. 41, n. 492 (1996), p. 19-48.

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uma escola própria, ou um conceito original de vulto. Opinião igualmente radical é

sustentada pelo pensador colombiano F. González Ochoa, para quem é impossível

falar em filosofia latino-americana, em decorrência do fato de termos um espírito de

colonizados. "Quem é colônia por dentro -- escreve González Ochoa [1986: 76] --

concebe a liberdade como câmbio de dono".

Exemplo da segunda alternativa é a opinião do brasileiro R. Gomes, para quem seria

possível a elaboração de um pensamento latino-americano cem por cento original,

surgido da meditação sobre a própria realidade e do esquecimento da filosofia

europeia, que virou apenas cultura ornamental na América Latina. A respeito, conclui

o mencionado autor: "do ponto de vista de um pensar brasileiro, Noel Rosa

[compositor popular] tem mais a nos ensinar do que o senhor Immanuel Kant, uma

vez que a filosofia, como o samba, não se aprende no colégio" [Gomes, 1980: 107].

Opinião semelhante é sustentada pelo peruano A. Palacios quem, na sua "Mensagem

à juventude universitária de Ibero-América", considera que até agora a cultura

filosófica latino-americana foi caudatária do pensamento europeu. Essa circunstância

muda a partir do fim da Primeira Guerra Mundial, que revelou a decadência da Europa.

A América Latina, no sentir de Palácios, sente-se na iminência de dar à luz uma nova

filosofia, perfeitamente original. Na trilha dessa absoluta novidade, a revista peruana

Valoraciones chegou a propor o seguinte: "liquidemos contas com os tópicos em uso,

expressões agônicas da alma decrépita da Europa" [apud Mariátegui, J. C., 1986: 62].

O fundamento ontológico dessa renovação autóctone é a raça-síntese que vingou na

América Latina. A respeito, escreve A. Palácios: "Somos povos nascentes, livres de

amarras e atavismos, com imensas possibilidades e amplos horizontes diante de nós.

O cruzamento de raças deu-nos uma alma nova. Ao interior das nossas fronteiras

acampa a humanidade. Nós e os nossos filhos somos síntese de raças" [apud

Mariátegui, J. C., 1986: 64].

Entre essas duas posições extremas, situam-se as opiniões de vários pensadores

latino-americanos, que se debruçaram sobre a problemática da originalidade

filosófica. Assim, por exemplo, para o peruano A. Salazar Bondy [1968], embora as

condições de subdesenvolvimento tenham impedido até agora a formulação de uma

filosofia latino-americana, será contudo possível chegar a ela, na medida em que

forem superadas as causas do atraso. Criticá-las é já dar início a essa filosofia. Para

o argentino A. Korn [1940] é possível se falar em filosofia autóctone, toda vez que há

uma coletividade humana unificada por sentimentos, interesses e ideais comuns, que

desenvolve, à luz deles, a sua ação histórica. A explicitação racional desse conjunto

original, com a ajuda da tradição filosófica ocidental, constitui o que se pode chamar

de filosofia argentina.

O pensador mexicano J. Vasconcelos [1927 e 1986] considera que os latino-

americanos não podem se furtar à elaboração de uma filosofia própria, que constitui

"uma maneira renovada e sincera de contemplar o universo" [Vasconcelos, J., 1986:

50] e que é formulada a partir da assimilação crítica dos valores e dos conceitos

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herdados da cultura ocidental. Esse processo construtivo deve levar em consideração

a apreensão emocional do mundo, que ocorre na vivência estética. Este aspecto é

fundamental à interpretação do mundo pelos latino-americanos, que são, no sentir de

J. Vasconcelos [1986: 58], uma "raça emotiva".

Já o pensador peruano J. C. Mariátegui [1978 e 1986] destaca que não existe um

pensamento caracteristicamente hispano-americano. "Parece-me evidente - escreve

Mariátegui [1986: 63] - a existência de um pensamento francês, de um pensamento

alemão, etc., na cultura do Ocidente. Não me parece igualmente evidente, no mesmo

sentido, a existência de um pensamento hispano-americano. Todos os pensadores da

nossa América têm-se educado na escola europeia. Não se sente na sua obra o

espírito da raça". No entanto, isso não significa que seja impossível a aparição, no

futuro, de uma filosofia tipicamente latino-americana, na medida em que forem

incorporadas à meditação filosófica as culturas indígenas. Por isso, Mariátegui conclui

esperançoso: "O espírito hispano-americano está em formação". De outro lado, o

pensador peruano reconhece que a filosofia europeia entrou em crise, porque está em

declínio a expressão capitalista dessa cultura. No entanto, ele acha que a Europa se

renovará. "O pensamento europeu submerge-se nos mais longínquos mistérios, nas

mais velhas civilizações. Por isso mesmo demonstra a sua possibilidade de

convalescer e renascer". Cabe aos pensadores latino-americanos saber assimilar a

seiva do pensamento universal, que circula nas veias da filosofia europeia [Mariátegui,

1986: 62].

O pensador argentino F. Romero [1944, 1952 e 1986] considera que, para discutir a

questão de se há uma filosofia latino-americana, deve-se, em primeiro lugar, descartar

as duas posições extremas que foram mencionadas no início. Elas são sintetizadas

assim por ele: a que sustenta "que tudo foi já dito e não resta senão repetir

devotamente os esquemas ilustres" e a que "espera revelações portentosas,

novidades inauditas, criações ex nihilo". Romero [1986: 69] refuta assim uma e outra

posições: "A primeira implica decretar a radical esterilidade do presente e do futuro,

lhes negar, sem razões válidas, a virtude inovadora que palpita em toda época, e se

acolher a uma plácida contemplação da riqueza amealhada pelos antepassados. É a

cómoda atitude do herdeiro, que quando chega ao extremo culmina na néscia

dilapidação do legado. Quanto à espera e demanda de portentosas revelações --

resíduo da atitude mítica --, acusa ignorância, porque a história da filosofia

testemunha, em cada um dos seus instantes, a continuidade e articulação do

pensamento filosófico, que até nos seus grandes recôncavos e inflexões conta com

as aquisições obtidas e nelas se apoia para aperfeiçoá-las e ainda para contradizê-

las". Romero destaca, a seguir, o fenômeno da "normalidade filosófica", que constitui

o clima atual da filosofia na América Latina e que é definida assim: "o exercício da

filosofia como função ordinária da cultura, ao lado das outras preocupações da

inteligência" [Romero, 1986: 68]. Esse clima abre a porta para o amadurecimento da

consciência de si e a formulação, num futuro próximo, de uma autêntica filosofia latino-

americana. A respeito, escreve Romero [1986: 71]: "O que existe é muito mais

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modesto, mas também muito mais sólido e autoriza qualquer esperança, já que é o

pressuposto indispensável para que surja e prospere a seu tempo uma filosofia

original. A veia filosófica aflora por todas partes; seria estupidez ou malevolência exigir

que as águas brotem, de início, abundantes e cristalinas, quando em países de muito

amadurecida civilidade houve apenas fiozinhos precários. A nascente filosofia tem de

ir ainda muito à escola; e ainda deve ser estimulada a prolongar a escolaridade,

porque todas as precocidades -- e mais ainda as da inteligência -- são perigosas, e

nos casos menos graves, desaguam em lamentáveis perdas de tempo. O essencial,

definitivamente, é isto: que na nossa espiritualidade a vocação filosófica chegou a

adquirir consciência de si e busca a sua expressão".

O pensador venezuelano E. Mayz Vallenilla [1959 e 1986] considera que é possível

uma filosofia latino-americana, na medida em que, seguindo o método heideggeriano

da hermenêutica existencial (de clara inspiração fenomenológica), os homens desta

parte do mundo descubram a sua origem, ou seja, a sua apreensão primordial do ser.

A originalidade, em filosofia, pressupõe duas coisas basicamente: de um lado,

conhecimento aprofundado do patrimônio filosófico da humanidade e, de outro,

explicitação da forma peculiar em que, no decorrer da história, o homem latino-

americano tem vivido sua experiência de ser a qual, por ser limitada, caracteriza-se

por algumas notas particulares. Estas características exprimiriam a originalidade

(a originariedade, diz Vallenilla) da filosofia latino-americana. "A experiência do ser do

homem americano -- frisa o pensador venezuelano [1986: 80] -- encontra-se

emparentada com a história da experiência do ser realizada pela Humanidade na sua

totalidade e, no entanto, nela acusa-se a presença de uma original originariedade. A

originariedade consiste na diversa forma de compreender o ser e, portanto, de

objetivar o seu sentido e até as suas significações categoriais". Essa originariedade

da filosofia na América Latina é expressada assim: um apreender-se o homem desta

parte do mundo como um "não-ser-sempre-ainda", que põe a nu o inacabamento

existencial do universo histórico latino-americano.

Para o pensador peruano F. Miró Quesada [1974 e 1986], é indiscutível que se está

formulando, hodiernamente, uma autêntica filosofia latino-americana, que percorre

duas vias: a dos que pensam, a partir da América Latina, os problemas universais da

filosofia e a dos que pensam, à luz da filosofia universal, os problemas do homem

latino-americano. Essa tarefa está sendo realizada pela "terceira geração" de

pensadores latino-americanos deste século, sendo que a primeira foi a dos

"patriarcas" ou "fundadores" (que falaram pela primeira vez em "filosofia americana",

como J. B. Alberdi, A. Korn, J. E. Rodó, C. Vaz Ferreira, E. Molina, A. Deustua, R. de

Farías Brito, J. Vasconcelos e A. Caso) e a segunda foi a dos "consolidadores" ou

"forjadores" (que formularam a problemática da autenticidade dessa filosofia como,

por exemplo, F. Romero, C. Astrada, N. de Anquín, J. de Figueiredo, A. Amoroso Lima,

J. C. Mariátegui, S. Ramos, etc.). A terceira geração realiza esse ideal, percorrendo

as duas vias mencionadas. G. Marquínez Argote [1986b: 13] sintetizou assim as

características desta geração, que é chamada de "técnica": os seus membros

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"nascem na segunda década do século vinte aproximadamente. Assumem e dão

continuidade ao projeto da geração anterior, mas com a vantagem de que já a filosofia

tem chegado a uma primeira maturidade de disciplina normalizada, sobre cujas bases

pode-se pensar na criação de uma filosofia autêntica". (Situar-se-iam nesta geração,

além do próprio F. Miró Quesada, autores como R. Frondizi, V. Fatone, C. Cosio, J.

A. Vásquez, E. Pucciarelli, A. Vasallo, M. Reale, O. N. Derisi, M. A. Virasoro, A. W. de

Reyna, A. Ardao, J. Llambias de Azebedo, V. Ferreira da Silva, J.Cruz Costa, G.

Francovich, L. E. Nieto Arteta, C. Betancur, D. Cruz Vélez, J. Jaramillo Uribe, E. Mayz

Vallenilla, L. Zea, R. Soler, E. García Maynez, F. Larroyo, E. de Gortari, L. Villoro, A.

Sanchez Vásquez, L. Recasens Siches, E. Nicol, J. Gaos,, J. Xirau, J. D. García

Bacca, E. Imaz, M. Granel, J. Ferrater Mora, M. Zambrano, etc. Embora não

mencionados por Miró Quesada nem por Marquínez Argote, estariam nesta geração

também, ao nosso modo de ver, relevantes pensadores como R. Uribe Ferrer, A.

Restrepo Arbeláez, A. Paim, C. B. Gutiérrez, D. Menezes, J. P. Galvão de Sousa,

Alexandre Correia e outros).

O pensador mexicano L. Zea [1974, 1976 e 1986] considera que é possível se falar

numa "filosofia latino-americana como filosofia sem mais", ou autêntica filosofia [Zea:

1974]. Inspirado em conceitos provenientes da dialética hegeliana, Zea destaca que,

pelo fato de os latino-americanos serem homens, estão dotados da capacidade de

pensarem filosoficamente. Só que a meditação filosófica ocorreu na América Latina

de forma diferente à que deu lugar à filosofia na Europa. Alicerçados nos pensadores

europeus, os latino-americanos partiram para a discussão do problema fundamental

que sempre os preocupou: a liberdade. Nessa empreitada interpretaram os autores

europeus, tentando solucionar, à luz dos seus ensinamentos, a problemática que os

preocupa. Ora, essa solução aponta para um caminho: superar o passado de

colonialismo e o presente de neocolonialismo. Mas a tomada de consciência desse

repto ocorreu, para os pensadores latino-americanos, no seio do estudo da história

das ideias, ou seja, da forma em que as várias gerações tentaram, à luz do

pensamento europeu, solucionar a problemática básica da liberdade. Racionalismo,

positivismo, liberalismo, etc., as várias tendências do pensamento europeu foram

confrontadas pelos pensadores latino-americanos com o grande repto que os

empolgava: a questão da liberdade. Nesse esforço, da negação da servidão surgiram

lampejos do que poder-se-ia chamar de uma autêntica filosofia da história latino-

americana, que foi a forma prevalecente adotada pela filosofia nesta parte do mundo.

Forma que é, no sentir de Zea, "filosofia sem mais", porquanto responde à pergunta

fundamental do ser humano pelo sentido do seu ser.

Zea sintetiza da seguinte forma a sua concepção acerca da filosofia latino-americana:

"Resumindo, poderíamos dizer que a nossa filosofia, inegável filosofia, partiu e parte

da consciência da servidão e da dependência impostas pelos interesses de outros

homens. Mas servidão e dependência que não poderão ser anuladas se simplesmente

se pretender ser eco de outros homens, mesmo que sejam homens livres, com

esquecimento da experiência das próprias servidão e dependência. Porque não se

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pode ser outro diferente de si mesmo: e é de si mesmo que haverá de partir para ser

livre. É o mesmo homem que, sem deixar de sê-lo, toma consciência da sua servidão

para transformá-la em liberdade, sem deixar por isso de ser o mesmo homem concreto

que aspira a ser livre. Tudo isso decorre de uma filosofia da história expressa nessa

história da filosofia latino-americana. Filosofia da história que, ao tomar consciência

da servidão e da dependência, transforma-se numa filosofia sem mais, que projeta

pôr fim à servidão e à dependência impostas ao longo dessa nossa história. Filosofia

da libertação que é, enfim, a preocupação de toda filosofia, mas que nesta nossa

América apresenta-se como preocupação central. Uma filosofia que, para ser tal, não

deve esperar que os homens da nossa América sejam livres. Numa sociedade de

homens plenamente livres, outras serão as preocupações filosóficas de seus

indivíduos. Numa sociedade em que a liberdade continua a ser colocada em risco, a

preocupação central de tal filosofia deve ser a conquista da liberdade" [Zea, 1986:

127].

Para o pensador argentino E. Dussel [1980 e 1986] é possível uma filosofia latino-

americana como filosofia da libertação. O pensamento europeu-norte-americano

ontologizou-se, deixando de apreender o autêntico ponto de vista metafísico, que

consiste em abarcar e compreender a realidade humana do mundo periférico,

submetido à dominação do centro. Trata-se de elaborar um novo discurso filosófico, a

partir da perspectiva dos dominados. De forma semelhante a como, na teologia da

libertação, identifica-se o lugar teológico da Revelação com a luta histórica dos

explorados contra os exploradores, assim, na filosofia das libertação, o lugar de

apreensão da verdadeira dimensão metafísica é essa mesma luta. Este novo modo

de filosofar, que surgiu na Argentina em 1972 e que rapidamente se espalhou, nos

anos seguintes, pelo resto da América Latina, "parte, evidentemente, da periferia, mas

ainda usa a linguagem do centro" [Dussel, 1980: 7]. Esta linguagem abarca algumas

categorias provindas das filosofias hegeliana, heideggeriana, husserliana e marxista.

O grupo de categorias que tende a prevalecer é, parece, o proveniente do

materialismo histórico de Marx. As questões relativas à temática da libertação dos

oprimidos são as fundamentais para a filosofia da libertação. O ponto central é o

seguinte: "não há libertação nacional diante dos impérios de turno, sem libertação

social das classes oprimidas. Assumida essa tese, a filosofia da libertação clarifica a

sua definição histórica" [Dussel, 1986: 134] e passa a se identificar com a praxe

libertadora dos oprimidos.

Para o pensador brasileiro A. Bezerra [1936: 72] é fora de dúvida que houve, já desde

o período colonial, uma filosofia autóctone no Brasil, decorrente da união da

meditação europeia com a "filosofia dos Naturwölker". O também brasileiro L. W. Vita

[1964, 1969a e 1969b] considera, outrossim, fora de discussão a existência da filosofia

brasileira, "não como um organismo eidético, supratemporal, totalmente imune à

contingência histórica, mas alguma coisa que não é mais que a elevação abstrativa

de uma situação vital historicamente dada. No processo de assimilação das ideias

alheias, imprimimos as nossas características, de acordo aliás com o velho princípio

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‘tudo o que se recebe toma a forma do recipiente’, ou como certos perfumes que, em

contato com a epiderme, sofrem uma alteração química que lhes altera a fragrância,

e nisto consiste a nossa ‘originalidade’" [Vita, L. W., 1969b: 6].

Dois pensadores brasileiros, M. Reale [1947, 1977, 1981a e 1981b] e A. Paim [1977,

1981, 1984 e 1986] formularam a metodologia que permite à filosofia latino-americana

caracterizar a sua originalidade, sem contudo cair no extremo de uma originalidade

total (reivindicada, segundo já foi visto atrás, por autores como R. Gomes ou A.

Palacios). Partindo do fato de que a meditação filosófica contemporânea ocorre

preferencialmente sob a forma de discussão de problemas e não como formulação

das grandes perspectivas transcendente e transcendental (que já foram fixadas nas

filosofias de Platão e Kant, respectivamente), ou como construção de sistemas (que

foi a modalidade adotada pela meditação ocidental até o final do século passado),

Reale e Paim partem para a formulação de um método que permita a análise da

produção filosófica brasileira e latino-americana como discussão de problemas,

superando o vício do engajamento apologético, que condena ou hipervaloriza autores,

de acordo com as preferências axiológicas do estudioso e vencendo, de outro lado, a

atitude puramente analítica, que reduz a filosofia ao estudo dos clássicos, sem

contudo reconhecer nos pensadores latino-americanos a meditação sobre a própria

realidade. Em relação a este posicionamento, A. Paim [1981: 92] escreveu: "A filosofia

é certamente um saber especulativo, que se volta para uma problemática que, embora

renovada através dos tempos, se tem revelado perene em contraposição à alternância

dos sistemas. Esses problemas, contudo, têm sempre a ver com a circunstância

cultural. De sorte que o caráter especulativo da filosofia não pode ser arrolado como

simples diletantismo, como se a filosofia não tivesse nenhum compromisso com a

temporalidade e as angústias de determinado momento da cultura de um povo".

A. Paim [1981: 92], inspirado na corrente culturalista brasileira (tributária do neo-

kantismo e da fenomenologia), sintetizou da seguinte forma a proposta metodológica

em apreço: "O método sugerido por Miguel Reale para a investigação da filosofia

brasileira compõe-se dos seguintes elementos: 1) identificar o problema (ou os

problemas) que tinha pela frente o pensador, prescindindo da busca de filiações a

correntes que lhes são contemporâneas no exterior; 2) abandonar o empenho de

averiguar se o pensador brasileiro interpretou adequadamente as ideias de

determinado autor estrangeiro, mais expressamente, renunciar ao confronto de

interpretações e, portanto, ao cotejo da interpretação do pensador brasileiro estudado

com outras interpretações possíveis, para eleger entre uma ou outra; e 3) ocupar-se

preferentemente da identificação de elos e derivações que permitam apreender as

linhas de continuidade real de nossa meditação".

2) A problemática da totalidade - Este é um dos temas que, ao longo do presente

século, têm exercido mais atração entre os pensadores latino-americanos, tanto no

que se refere a uma abordagem hermenêutica, quanto no que diz relação a uma

apreciação crítica. O primeiro tipo de análise será ilustrado a partir do pensamento de

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dois autores, o mexicano O. Paz e o brasileiro V. F. da Silva. A segunda abordagem

será analisada na obra dos brasileiros R. M. de Barros e M. Penna.

A abordagem hermenêutica remonta a um arquétipo que veicula a ideia de unidade

primordial. O mundo ibero-americano é apreendido, nessa perspectiva, como

realidade proto-histórica que confere sentido ao presente [cf. Vélez Rodríguez. R.,

1993a].

Uma versão atual dessa concepção encontra-se na obra ensaística de O. Paz [1983,

1986, 1989, 1990a, 1990b, 1992a, 1992b]. Para avançar no caminho que conduz à

identidade ibero-americana, o poeta-filósofo mexicano segue, no seu ensaio intitulado

"Nueva España: orfandad y legitimidad" [in Paz, 1983: 38 seg.], os passos do etnólogo

francês J. Lafaye [1974], quem aprofunda na análise das crenças sobre as que se

levanta o edifício da cultura mexicana. Paz inspira-se também em Ortega y Gasset,

para quem "a substância da história, seu miolo, não são as ideias, mas o que está por

baixo delas: as crenças. Um homem define-se mais por aquilo que crê do que por

aquilo que pensa" [in Paz, 1983: 39].

Os mitos que inspiram o povo mexicano provêm de dois sincretismos: o catolicismo

peninsular e a religião ameríndia. "O primeiro, frisa Paz [1983: 39], marcado pela sua

coexistência de séculos com o Islã, religião de cruzada e de final de século; o segundo

também religião militante de povo eleito". Algo análogo poder-se-ia afirmar das demais

culturas ibero-americanas. Esses mitos, no sentir de Paz, são os que permitiram aos

mexicanos encontrar a sua identidade, ao longo de séculos de exploração e

frustrações. "Os dois mitos -- escreve o ensaísta mexicano [Paz 1983: 40] -- sobretudo

o de Guadalupe, convertem-se em símbolos e bandeiras da guerra de Independência

e chegam até os nossos dias, não como especulações de teólogos e de ideólogos,

mas como imagens coletivas. O povo mexicano, depois de mais de dois séculos de

experimentos e fracassos, já não acredita senão na Virgem de Guadalupe e na Loteria

Nacional".

Esses mitos encontram a sua original expressão no século XVII, no duplo processo

de identificação de Quetzalcóatl com o Apóstolo São Tomé e de Tonantzin com a

Virgem de Guadalupe. Essa foi, no sentir de Paz [1983: 48], "a criação mais complexa

e singular da Nova Espanha". O mito de Quetzalcóatl/São Tomé, apesar de não ter

sido realmente popular, permitiu aos jesuítas exprimir a realidade da Nova Espanha

que nascia das cinzas da Velha. C. de Sigüenza y Góngora (1645/1700) chama São

Tomé/Quetzalcóatl de Fénix de Ocidente, ou seja, o Fénix americano. "O Apóstolo --

escreve a respeito Paz [1983: 41-42] -- nasce da fogueira em que se incendeia o deus

indígena e Nova Espanha brota das cinzas da Velha. Mistério insondável: é outra e é

a mesma. Esse mistério dá-lhe o ser mas encerra uma contradição que não pode ser

resolvida sem deixar de ser: para ser outra deve morrer, negar a Velha e a Nova".

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Mas, se de um lado o mito de Quetzalcóatl/São Tomé exprime a universalidade da

Nova a Espanha e a sua renovação perante a ordem antiga, é também o mito da

legitimidade. A respeito, Paz [1983:51] escreve: "Quetzalcóatl ou a legitimidade: ao

demonstrar, com todo tipo de provas, a identidade entre Quetzalcóatl e o Apóstolo

São Tomé, dom Carlos de Sigüenza y Góngora e o jesuíta Manuel Duarte só fazem

repetir a operação de legitimação religiosa dos astecas vários séculos antes". Esse

processo legitimador estabelece uma ponte entre o México pré-colombiano e a Nova

Espanha. A respeito, J. Lafaye [in Paz, 1983: 47] escreve: "ao abolir a ruptura da

história americana que a conquista representava, intentava-se dar à América um

estatuto espiritual -- e, consequentemente, jurídico e político -- que a colocasse em pé

de igualdade com a potência tutora, Espanha".

Já o mito que estabelece a identidade entre Tonantzin e a Virgem de Guadalupe

penetrou mais fundo no imaginário social do povo mexicano, tendo-lhe permitido

estabelecer a sua identidade primordial no seio da Virgem-Mãe. "Mãe de deuses e de

homens - escreve Paz [1983: 49] -, de astros e formigas, do milho e do maguey,

Tonantzin/Guadalupe foi a resposta da imaginação à situação de orfandade em que a

Conquista deixou os índios. Exterminados os seus sacerdotes e destruídos os seus

ídolos, cortados os vínculos com o passado e com o mundo sobrenatural, os índios

refugiaram-se na saia da Tonantzin/Guadalupe: saia de mãe-montanha, saia de mãe-

água. A situação ambígua da Nova Espanha produziu uma reação semelhante: os

crioulos buscaram nas entranhas de Tonantzin/Guadalupe a sua verdadeira mãe.

Uma mãe natural e sobrenatural, feita de terra americana e de teologia europeia. Para

os crioulos a Virgem Morena representou a possibilidade de deitar raízes na terra de

Anáhuac. Foi matriz e também túmulo: deitar raízes é se enterrar. No culto dos crioulos

à Virgem há a fascinação pela morte e a oculta esperança de que essa morte seja

transfiguração: plantar-se na Virgem talvez signifique conseguir

a naturalização americana".

O mito de Tonantzin/Guadalupe encontrou, na realidade brasileira, um

correspondente no de Iemanjá/Nossa Senhora Aparecida, evidentemente posterior

este último, dadas as peculiares condições da conquista e da colonização do Brasil

pelos portugueses, na qual o elemento cultural africano veio se somar ao ameríndio e

ao ibérico, num contexto fortemente dominado pela perspectiva familiar e intimista [cf.

Holanda, S. B., 1989: 110].

Sobre a base mitológica que foi destacada, os pensadores mexicanos do século XVII

e início do XVIII, Cigüenza y Góngora, soror J. I. de la Cruz (1651/1695) e J. Eguiara

y Eguren (1706/1763) elaboraram uma concepção original, na qual elementos

provenientes da filosofia moderna -- como a defesa da independência das ciências

face à filosofia e à teologia e o pressuposto de que é possível uma concepção racional

do mundo sem alicerce nos dogmas -- coexistiam com a tentativa de elaborar

uma Weltanschauung universalista. [cf. Ibargüengoitia Chico, A., 1980: 98-101].

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O. Paz exprimiu da seguinte forma esse universalismo: "no século XVII os crioulos

descobrem que têm uma pátria. Essa palavra aparece tanto nos escritos de soror

Juana quanto nos de Sigüenza, e nos dois designa invariavelmente a Nova Espanha.

O patriotismo dos crioulos não contradizia a sua fidelidade ao Império e à Igreja: eram

duas ordens de lealdades diferentes. Mesmo que os crioulos do seiscentos sintam um

intenso anti-espanholismo, não há neles, no sentido moderno, nacionalismo. São bons

vassalos de El-Rei e, sem contradição, patriotas de Anáhuac. Ainda um século e meio

mais tarde, ao reivindicarem a Independência, os crioulos desejam ser governados

por um príncipe da casa real espanhola. No teatro de soror Juana e nos seus

vilancicos cantam e falam, cada um à sua maneira, índios e negros, brancos e

mestiços. A universalidade do Império favorecia a pluralidade de falas e de povos. O

patriotismo novo-hispano e o reconhecimento das suas singularidades estéticas não

estava em contradição com esse universalismo" [Paz, 1983: 46].

A reflexão de O. Paz destaca, portanto, a existência de um arquétipo mitológico na

cultura hispano-americana, que inspira, hodiernamente, uma visão totalizante do

homem desta parte do mundo, e que permite superar as diferenças nacionais e ir além

das próprias instituições. Para além do país formal existe o mundo real, barroco,

universalista, sincrético, cuja seiva são os mitos pré-colombianos indissoluvelmente

ligados à mitologia ibérica, bem como aos conceitos provenientes do racionalismo. "O

caraterístico do caso mexicano -- frisa Paz [1983: 80] -- (e esta afirmação pode ser

aplicada ao restante mundo ibero-americano), não é que as supervivências pré-

colombianas se apresentem mascaradas, mas que é impossível separar a máscara

do rosto: fundiram-se". O homem hispano-americano não pode ser entendido sem

referência a esse pano de fundo sincrético e totalizante.

Uma outra abordagem hermenêutica da problemática da totalidade, é a elaborada

pelo filósofo brasileiro V. F. da Silva [1964]. Inspirado na filosofia de Schelling e de

Heidegger, bem como na meditação do pensador português A. da Silva e nos estudos

de W. Otto, K. Kerényi e M. Eliade sobre o mito, V. F. da Silva identifica a origem do

mundo humano numa dimensão transcendente chamada por ele de Fascinator, "fonte

pulsional e criadora de todo ente, matriz de luz e trevas, aliciante e mesmo sedutora",

segundo frisa M. Reale [1982: 1131]. Como destaca A. Crippa [1984: 115], "a filosofia

da mitologia constitui [...] o capítulo mais importante da reflexão filosófica de Ferreira

da Silva". Há, para o pensador brasileiro, uma realidade inaugural constituída

pelo Fascinator e que se revela na mitologia. Para F. da Silva [1964, I: 318] é claro

que "os conteúdos do relato mítico e a cosmografia revelada nesse saber remetem-

nos às coisas mesmas, instalando-nos num mundo de presenças reais e imperiosas".

Em relação ao papel que desempenha a mitologia na revelação da realidade

primordial do Fascinator (que é a fonte primeira do ser), F. da Silva [1964, I: 318]

escreve: "A mitologia é a abertura de um regime de fascinação [...]. Os conteúdos dos

relato mítico e a cosmografia revelada nesse saber remetem-nos às coisas mesmas,

instalando-nos num mundo de presenças reais e imperiosas. A configuração das

coisas presentes nesse cosmos é esboçada e estilizada pelo projeto-fascinante, que

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faz com que ela se alteie em sua identidade intramundana própria. Todas as coisas

são coisas míticas. A presença e a manifestação das forças numinosas que

desencadeiam o soerguer-se de um mundo, constituem mais que um mero fenômeno

de representação [...]. A função iluminante e fascinante que ergue esse cenário

cósmico-patético pertence ao mito e somente ao mito, que não é mera palavra ou

epos literário, mas sim presença real e efetiva dos deuses e da atuação divina".

Na origem da cultura humana está a compreensão do mito. As várias culturas firmam-

se e diferenciam-se referindo-se a um mito dominante, que configura a sua concreção

histórica. Neste, ponto, F. da Silva [1964, I: 354] faz próprias as palavras de W. Otto:

"O que denominamos cultura é função, em sua configuração total, de um Mito

dominante, que está inseparavelmente unido ao Mito do Divino. Com a criação desse

Mito constitui-se a cultura e o povo; antes não existe de modo algum". A. Crippa [1984:

188] identifica da seguinte forma o conceito de cultura segundo F. da Silva: "projeto

temporal que se configurou a partir do deslumbramento causado pela manifestação

inicial do divino". Essa definição exige, de um lado, considerar a cultura como algo

absolutamente anterior a qualquer iniciativa humana e, de outro, identificá-la com uma

manifestação de caráter divino e paradigmático.

O pensamento de F. da Silva não deixa dúvidas a respeito dessa dimensão supra-

humana da invenção ou da descoberta da cultura. "Devemos retirar do homem

entendido como agente individual e singular -- escreve o pensador brasileiro [F. da

Silva, 1964, I: 355] -- toda a responsabilidade pela invenção ou descoberta dos bens

culturais". Estes --[Silva, 1964, I: 352] -- "são expressões de uma alma, de uma

concepção seletiva do mundo". Em outro lugar, escreve: "Devemos voltar a encontrar

na existência transcendente e meta-humana dos poderes e das figuras numinosas, o

ponto de partida para a compreensão exaustiva dos processos históricos" [Silva, 1964,

I: 281]. Na seguinte afirmação do pensador brasileiro ressalta, outrossim, o caráter

numinoso que inspira a realidade cultural: "O estado de fascinação provocado por uma

imagem do mundo, por uma epifania de realidades superiores, é essencial à ação

criadora e instituidora das formas socioculturais" [Silva, 1964, I: 353].

A fundação da cultura é, para F. da Silva, um acontecimento primordial, de caráter

meta-histórico. Essa ideia é salientada pelo pensador brasileiro da seguinte forma:

"Não se tem um exemplo sequer, empiricamente constatável, do aparecimento de

uma civilização ou de uma cultura, a partir da deliberação e da vontade dos indivíduos.

Nunca assistimos ao nascimento de uma cultura. Para que haja ação ou inter-ação

entre indivíduos, já deve estar previamente inaugurado o teatro social de uma ação

culturalmente relevante. Uma cultura é um prius absoluto em relação a qualquer

criação de bens ou de instituições derivadas." [Silva, 1964, II: 447]. A cultura como

des-velamento primordial ocorre no seio de uma epifania mito-poética, que resgata a

unidade primordial entre o ser e os entes. A respeito, o pensador brasileiro afirma:

"Quando atribuímos ao assédio mítico-poético do divino a irrupção de um mundo, nos

referimos evidentemente ao des-velamento da totalidade do ente, ou das

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possibilidades terrestres ou celestes que se tornam disponíveis ao dealbar de uma

cultura. Deus ou os deuses são princípios fundantes no sentido de desentranhar do

sigilo do oculto todos os níveis e possibilidades do mundo" [Silva, 1964,I: 383].

A linguagem mito-poética é, para o pensador brasileiro, a forma primordial de

apreensão humana da cultura. F. da Silva aproxima-se, aqui, da temática

desenvolvida por Heidegger ao tratar da poesia como linguagem fundante do falar

humano e se situa, também, no contexto da valorização da expressão poética pelos

românticos alemães (Hölderlin, Novalis, Schelling). A morte prematura impediu ao

pensador brasileiro de fazer uma aplicação sistemática da sua ideia de cultura à

meditação sobre o homem latino-americano, com as suas implicações

historiográficas, antropológicas, sociais, morais e teológicas [cf. Crippa, 1984: 187].

No entanto, encontram-se na sua obra referências à importância que o estudo das

mitologias tem para a compreensão do homem brasileiro, o que possibilita a

identificação de uma antropologia filosófica em F. da Silva [cf. Vélez Rodríguez, 1981].

A partir da ideia ferreiriana de "mito dominante" como fundante da cultura de um povo,

estudiosos da obra do pensador brasileiro partem para a formulação de um modelo

arquetípico ou mito-poético aplicável ao estudo da cultura latino-americana. Segundo

essa interpretação, à luz dos mitos ameríndios seria possível resgatar a originalidade

do filosofar latino-americano [cf. Cesar, C. 1980 e Barbosa, E., 1975], preservando a

ideia de cultura como totalidade e incorporando, também, a mitologia judaico-cristã, à

luz da qual se firma a ideia de história como progresso [cf. Crippa, 1975].

A questão da América Latina enquanto realidade apreendida à luz de um arquétipo

totalizante, tem sido abordada por outros autores, além dos analisados nas páginas

precedentes. Apenas para salientar o interesse que o tema suscita hodiernamente

entre os pensadores hispano-americanos, podem ser mencionados A. Roig [1982], A.

Sánchez Vásquez [1975], M. Ferrandis Torres [1933], R. Levillier [1976], L. Zea [1978

e 1986], G. Giucci [1992], O. Morales Benítez [1979, 1984 e 1988], G. Arciniegas [1959

e 1988], E. de Souza [1981], I. Ellacuría [1990], L. Boff [1988], E. Cardenal [1988], G.

Gutiérrez [1980, 1981 e 1986], P. Freire [1982 e 1985], A. G. Cassani [1990], J. C.

Scannone [1990], J. Vasconcelos [1990], L. F. Crespo [1990], I. Lins [1966], C. B.

Gutiérrez [1983a, 1983b, 1983c e 1984], etc.

A abordagem da América Latina como totalidade tem encontrado repercussão no

pensamento filosófico norte-americano. R. Morse, na obra intitulada Prospero’s

mirror [1982], analisa a cultura ibero-americana como paradigma totalizante que, a

partir da segunda escolástica espanhola, integrou o Novo Mundo numa concepção

ecumênica (e, no sentir de Morse, modernizadora). Assim como o mito universalista

dos pensadores mexicanos do século XVII ensejou uma concepção totalizante que se

projeta até os nossos dias, de forma semelhante o universalismo da segunda

escolástica constituiu também um arquétipo totalizante, graças ao qual Ibero-América

pôde tomar consciência de si mesma como unidade, constituindo, assim, um exemplo

para a América do Norte, às voltas com uma crise de identidade e de auto-confiança.

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A problemática da totalidade no pensamento latino-americano tem sido abordada,

também, do ângulo crítico. A principal análise nesse sentido é a empreendida pelo

pensador brasileiro R. M. de Barros [1990], para quem a existência humana oscila

dramaticamente entre os extremos do fenômeno totalitário e do fenômeno da

liberdade. Inspirado no pensamento de Zamiátin, Huxley, Orwell e Tocqueville e

munido de profundo conhecimento da filosofia política, M. de Barros considera que o

fenômeno totalitário não se restringe apenas aos totalitarismos nazista ou comunista

do século XX, mas ancora mais fundo na alma humana, como uma das tendências

ônticas do homem. A respeito, M. de Barros [1990: 745-746] afirma: "Ao menos

enquanto o homem for homem -- ser ambíguo, imanente e transcendente ao mundo,

ao mesmo tempo sequioso de liberdade e nostálgico da totalidade -- o devir continuará

como algo aberto, pronto a colher em ciladas sucessivas o pensamento preditivo,

como também o pensamento desejoso ou o temeroso. Acentuemos apenas [...] que o

‘fenômeno totalitário’, na sua significação ôntica profunda, que vai muito além da

esfera política, não é algo ocasional e passageiro, mas algo que deita raízes no âmago

mesmo do ente humano. Do mesmo modo que o fenômeno da liberdade". À luz dessa

abordagem ontológica, a opção totalitária ou a coletivista (à moda inspirada pelo

Estado patrimonial na América Latina), é uma tentação sempre presente ao espírito

humano, que é capaz, em todos os tempos e lugares, de trocar a liberdade pela

servidão. A grandeza humana consiste em optar pelo risco da liberdade, superando o

canto de sereia do espírito totalitário. O totalitarismo "não é necessariamente fundado

no terror, mas pode sê-lo mesmo na felicidade, "desde que a liberdade não apareça

para comprometê-la" [Barros, 1990: 742].

O pensador brasileiro M. Penna [1988 e 1994], por sua vez, a partir de uma sólida

posição liberal de defesa incondicional da liberdade, critica o modelo de autoritarismo

patrimonial que vingou no Brasil e na América Latina, como também os coletivismos

do século XX (alicerçados na religião civil do Estado totalitário), como reificações de

um paradigma que trata de reduzir o indivíduo à massa. A problemática da totalidade

é enfocada por ele criticamente, como processo de despersonalização do homem

contemporâneo. A história do século XX é a luta do indivíduo que tenta preservar a

sua liberdade contra o processo de massificação em andamento. "A história de nosso

século é a história do homem singular - frisa M. Penna [1994: 14] - . É a história do

conflito do indivíduo livre, em sua resistência ao avassalamento crescente pela

sociedade coletivista, a sociedade de massas que o socialismo e a estrutura do Estado

nacional soberano impõem. É a história do protesto contra o que os alemães, que

disso mais sofreram do que qualquer outro povo, chamam de Massenmensch em suas

diversas modalidades. A história da resistência contra o que Ortega y Gasset

descreveu como La rebelión de las masas. Também do lado de cá da Cortina de Ferro,

nossa mente foi atacada, numa espécie de psicopatologia coletiva, pelos mitos e

manipulações ideológicas, e a adoração de ídolos como aqueles a que se referia

Francis Bacon. A cada um coube situar-se nesse entrevero fatal [...]".

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M. Penna considera que somente será possível ao homem contemporâneo reagir

contra o risco da massificação, mediante a superação da religião política, segundo os

princípios da tradição liberal. Cabe-nos superá-la "numa sociedade aberta, pluralista

e ecumênica, orientada segundo critérios de razão prática ou ética pragmática -- uma

sociedade aberta para o mundo mas introvertendo, na autonomia do homem moral

responsável, os princípios da filosofia perene" [Penna, 1994: 14].

A abordagem crítica da problemática da totalidade tem sido objeto de estudo por parte

de inúmeros pensadores, que destacam o valor da pessoa e da liberdade, como

contraponto à compreensão do homem latino-americano a partir de um arquétipo

totalizante. Não haveria espaço aqui para fazer uma exposição, mesmo que sumária,

acerca do pensamento desses autores. Limitamo-nos, apenas, à menção dos seus

nomes: U. Zilles [1989 e 1991], M. Reale [1956, 1963 e 1969], A. Paim [1981 e 1994],

A. López Trujillo [1977], R. Vélez Rodríguez [1987b], R. Uribe Ferrer [1990], F. A.

Santos [1981], C. Rangel [1981], A. Oliva [1993 e 1994], A. Wehling [1994], B.

Kloppenburg [1983], R. Campos [1994], T. Padilha [1955, 1975 e 1982], A. Lima [1955,

1974 e 1977], M. V. de Mello [1994], R. Durand Flórez [1988], J. G. Merquior [1987],

R. L. Torres [1991], U. Macedo [1978], V. Barretto [1989], E. Soveral [1993], etc.

3) A problemática da integração - A ideia da integração constitui um Leitmotiv do

pensamento filosófico latino-americano. Embora a origem da temática se situe no

período colonial, a partir do ecumenismo da segunda escolástica ibérica [cf. Morse,

1982], será destacada aqui, apenas, a forma em que essa ideia foi tratada pelos

pensadores latino-americanos ao longo deste século.

Cabe, em primeiro lugar, mencionar a repercussão que teve, na América Latina, a

concepção dos hispanistas. Estes eram pensadores espanhóis de início de século,

que defendiam a tese de que a Espanha deveria ter, em relação à América Latina, a

atitude de uma mãe que zela pela preservação dos ideais ibéricos, dos quais forma

parte uma concepção orgânica da sociedade, que se contrapõe ao laissez-fairismo do

liberalismo clássico e que restabelece os princípios de uma "selectocracia", contra a

ideia pura e simples de uma democracia de massas. Os hispanistas afirmavam, de

outro lado, que a sociedade materialista frustra os valores espirituais da pessoa. A

democracia capitalista estava, para eles, intimamente vinculada ao materialismo.

Os hispanistas reconheciam, de outro lado, que era necessário dar alguma

participação às massas na gestão dos negócios públicos, a fim de contrabalançar os

desejos revolucionários, mas somente no que tange aos interesses mais imediatos,

garantindo a independência e a capacidade de decisão das elites, em assuntos de

maior importância. De outro lado, os hispanistas acreditavam que a Espanha deveria

zelar pela não penetração, no mundo ibero-americano, de culturas alheias ao espírito

ibérico, especialmente a anglo-saxã e a francesa. Eles acreditavam na Ilustração, na

medida em que reconheciam a importância da educação para a cidadania, como

forma de combater os vícios do absolutismo político e do dogmatismo. Poder-se-ia

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dizer, numa palavra, que eram liberais moderados, animados pela ideia de reconstruir,

no terreno cultural, o universo ibérico.

Os hispanistas inspiraram-se no "racionalismo harmônico" do filósofo alemão K. C. F.

Krause (1781/1832). O mais importante representante dessa escola neste século é o

pensador espanhol F. Giner de Los Ríos. Outros hispanistas de nomeada são M.

Rodríguez Navas, F. Rahola, A. González Posada, R. M. de Labra, L. Alas e R.

Altamira. Entre os autores latino-americanos, foi o uruguaio J. E. Rodó [1986] quem

de forma mais direta inspirou-se nas ideias dos hispanistas. Rodó mostra a

necessidade de fortalecer os nexos entre Espanha e a América espanhola, a fim de

que, mediante um esforço conjunto dos povos ibero-americanos, se afastem os

perigos provenientes da democracia materialista e utilitarista, mediante o cultivo dos

valores espirituais no seio do povo.

Em segundo lugar, cabe mencionar o filósofo mexicano J. Vasconcelos [1926 e 1986].

A. Basave [1958: 451] considera que "Vasconcelos é hoje a figura de maior relevo

intelectual em Hispano-América". Apesar dessa importância, o pensador mexicano,

ao adotar uma ideia de intuição inteiramente mística, "mistura sem escrúpulo -- na

opinião de Z. Kourím [1976: 148] -- vários planos de reflexão e investigação" e rejeita

filósofos contemporâneos como Husserl e Heidegger. As suas fontes de inspiração

situam-se no pitagorismo, no plotinismo, no cristianismo e no racionalismo de Leibniz

(1646/1716). Vasconcelos valoriza a noção de energia, que representa no seu

pensamento, consoante Ferrater Mora [1984], um papel análogo ao da ideia de

substância nas antigas concepções emanantistas. A apreensão da verdadeira

realidade, da energia, que constitui "o estado definitivo da substância", não acontecerá

pelo caminho analítico da razão discursiva, mas mediante a intuição estética. Na

apreensão da beleza não têm vez, portanto, nem as leis abstratas, nem a razão pura

kantiana. Ela é apreendida vivencial e integralmente pelo órgão estético, a alma, que

é uma realidade concreta. Parodiando o esprit de finesse pascaliano, Vasconcelos

considera que há uma "lógica orgânica", a da alma, que conduz a um tipo de

conhecimento vivencial, intuitivo e natural, absolutamente diferente do conhecimento

conceitual. É através desse conhecimento, eminentemente estético, que o homem

pode intuir a unidade do universo, cuja lei suprema é o amor, essência do cristianismo.

Aos povos ibero-americanos, herdeiros do fenômeno estético e espiritual que consiste

na "mestiçagem universal", iniciada por espanhóis e portugueses, está destinada a

missão de tornar realidade a "raça definitiva, a raça síntese ou raça integral" que,

tendo a Amazônia como centro, organizará a cidade do futuro, Universópolis, terceiro

estado da Humanidade, o estético (ou da "beleza que convence"), tendo superado,

definitivamente, os imperfeitos estados anteriores: o material (ou guerreiro) e o

intelectual (ou político). A integração ibero-americana ocorrerá, assim, por força

do élan criador da raça integral, que tem como missão conduzir a humanidade até a

sua plenitude.

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Vale a pena lembrar, em terceiro lugar, o filósofo colombiano L. López de Mesa. A sua

filosofia [cf. Velásquez, F. M., et alii, 1985] consiste num ecletismo humanista

influenciado, entre outros autores, por Espinosa (1632/1677), Comte (1798/1857),

Planck (1858/1947), Whitehead (1861/1947), Santayana (1863/1952), Bergson

(1859/1941), etc. O ponto central de sua concepção humanística identifica-se com a

convicção de que o homem é o eixo de todos os valores e de que, portanto, devem

estar submetidas a ele as ciências e as técnicas, a fim de que possa se realizar

plenamente, nos planos individual e social, preservando a sua liberdade e a sua

dignidade. O progresso humano, para López de Mesa, deve-se fundamentar em

quatro princípios básicos: o vigor da raça, o vigor da economia, o vigor da educação

e o vigor da vontade criadora. Alicerçado nesses quatro princípios, o ser humano é

artífice da sua própria vida e criador de culturas.

No que tange à realidade latino-americana -- que López de Mesa prefere chamar de

ibero-americana --, o pensador colombiano considera que a civilização europeia está

decadente (seguindo, nesse ponto, a ideia de Spengler) e que agora é a vez do mundo

ibero-americano. A sua força radica na universalidade das suas origens. A propósito,

López de Mesa escreve, no seu livro A civilização contemporânea [1936: 51]: "A

história não repete os seus fatos, isso é uma ilusão de pensadores imaginativos e

mais nada. América será América fundamentalmente. Estendida de polo a polo entre

os dois magnos oceanos, e sendo oriente de uma civilização e ocaso de outra,

América pensa e pensará em função de universalidade. As nossas raças vieram dos

quatro pontos cardeais e o nosso pensamento alimenta-se da tenda asiática, da selva

africana, da urbe europeia, mas o subsolo é sempre o granito dos Andes".

No entanto, o papel que a história reservou a Ibero-América, no sentido de ser a

civilização do futuro, não é um cego determinismo. Os latino-americanos devem

construir o seu próprio destino, que é variado, mas unido numa grande fraternidade.

Nesse esforço comum, devem ser exploradas as próprias riquezas e assimilada a

técnica ocidental. A respeito, López de Mesa [1936: 57] escreve: "A missão cultural

ibero-americana não será, talvez, rigorosamente igual para todos os países em que

está se desenvolvendo. Há influências sociais, étnicas e geográficas que obrigar-nos-

ão a uma prudente distribuição desse esforço comum; terá, contudo, o selo da

fraternidade inicial e da finalidade mesma que vamos perseguindo. Será, perante a

história, qualificada univocamente de cultura ibero-americana; e florescerá quando

percorramos as etapas de preparação que a condicionam: desenvolvimento de nossa

riqueza, fusão de nossas raças e assimilação da técnica ocidental".

Nesse esforço de construção da realidade ibero-americana, López de Mesa -- quem

no seu país foi educador e Ministro da Educação -- dá enorme importância à educação

para a cidadania. Parte inicialmente da afirmação de que o conceito de "povo" é mais

o de Volkgeist, não o de uma realidade apenas física. O povo, afirma o pensador

colombiano, "não é uma massa ignorante e suja dos baixos arraiais, nem a elegante

sociedade dos clubes, mas o espírito que uma nação vai formando com o tempo e

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firmando com caraterísticas peculiares suas, no leito portentoso da história universal

[...]. O povo é uma cultura ou, pelo menos, um ideal, e não simples porção da raça ou

parte do território" [López de Mesa, 1936: 58]. Se o povo é uma realidade cultural, a

educação é, para López de Mesa, a formadora da nacionalidade, cabendo aos

dirigentes dos países ibero-americanos o dever de criar uma consciência histórica

entre os habitantes do continente. A respeito, o pensador colombiano frisa que os

dirigentes devem "ensinar ao povo que tem para cumprir uma missão histórica:

harmonizar com os outros os atos da sua vida, em direção a algo superior. O cidadão

pertence a um povo histórico e não a um rebanho [...]. Cada povo, com real sentido

da história, forma, dia a dia, a consciência universal" [López de Mesa, 1936: 58].

Em quarto lugar, cabe destacar a figura do pensador argentino F. Romero. A sua

concepção filosófica, de inspiração anti-positivista e espiritualista, polariza-se ao redor

de dois pontos fundamentais: uma axiologia, na qual se destaca a transcendência dos

valores e um personalismo, no qual se firma o valor absoluto do espírito, que se torna

presente na pessoa humana. Romero considera que América Latina será uma grande

nação, em cujo seio conviverão pacificamente todos os povos latino-americanos. A

possibilidade de que isso se concretize depende do desenvolvimento da consciência

acerca dos valores comuns, que fundamentam a cultura latino-americana. Essa

consciência se desenvolve no seio da meditação filosófica. Como salienta E. Mays

Vallenilla, F. Romero dedicou a sua vida ao esforço em prol de derrubar as fronteiras

do desconhecimento mútuo entre os intelectuais latino-americanos: "O seu propósito

era estender fios de comunicação espiritual entre todos os países, a fim de ensejar o

conhecimento, a amizade e o intercâmbio de obras entre os pensadores isolados,

entre os estudiosos ou entre os simples aficionados que neles cultivassem a filosofia.

As suas cartas, bilhetes ou brevíssimas linhas, o contínuo envio de catálogos ou

recortes de jornal, a comunicação de nomes, endereços e dados acerca dos que, em

qualquer país latino-americano, pudessem estar interessados em receber ou enviar

as obras que se publicavam [...], era um trabalho cotidiano que realizava com

miraculosa energia, sempre coroada por uma admirável e exemplar cordialidade" [in

Ardao, A. et alii,1983: 2].

Romero chama a atenção para o fato de que a consciência filosófica tem amadurecido

na América Latina, a partir, sobretudo, da Segunda Guerra Mundial. Já foi superada a

etapa inicial do monopólio filosófico e os pensadores meditam conjuntamente acerca

da problemática do homem latino-americano, intercambiando projetos e ideias. Essa

nova etapa conduzirá, com certeza, a formular com maior precisão a particularidade

do "fato" americano, superada a atomização que era efeito do mútuo

desconhecimento. A verdadeira integração é, no sentir de Romero, aquela que se

realiza à luz do pensamento filosófico. Eis as suas palavras a respeito: "A presente

preocupação pela filosofia em Ibero-América oferece condições e aspectos muito ricos

e diversos, que suscitam a exposição e o comentário. Mas por baixo dos fatos visíveis

e patentes, a maneira como se incubou e continua germinando, nas profundezas, este

movimento, [...] supera em tamanho e abrangência o simples registro de uma série de

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novos trabalhos. Os fatos [...] convidam a refletir sobre temas muito mais amplos: o

curso total da cultura nestas terras, o seu papel futuro no interior e fora do contexto

latino-americano, a índole e os caminhos da espiritualidade da América e a

peculiaridade do ‘fato’ americano, encoberto pela atomização dos ‘fatos’ americanos

[...]" [Romero, 1986: 72-73].

Foi destacada, nesta última parte, a forma em que os pensadores latino-americanos

focalizaram a integração continental. Esse ideal, verdadeiro arquétipo herdado do

ecumenismo ibérico do século XVI, tem inspirado também a outros agentes sociais.

Recente estudo [Vásquez Carrizosa, 1993] destaca, por exemplo, os ideais

integracionistas do Libertador S. Bolívar (1783/1830), quem pretendia criar uma

Confederação Latino-Americana, integrada por México, Peru, Chile, Argentina e

Colômbia, reunida numa Assembleia de Plenipotenciários de cada Estado. Essa ideia

era, sem dúvida, muito avançada na época, pois superava a noção de solidariedade

da Santa Aliança, que então tinha vigência na Europa. A Confederação imaginada por

Bolívar assemelhava-se mais à OTAN que à OEA, pois contava com um sistema

defensivo. Essa ideia, que o próprio Bolívar tentou consolidar em duas oportunidades,

somente voltaria a ser proposta, a nível mundial, com o Tratado de Versalhes, em

1919, e com a Carta das Nações Unidas, uma vez finalizada a Segunda Guerra

Mundial. Não há dúvida que o processo de integração latino-americana, concretizado

inicialmente na ALALC e hodiernamente identificado com iniciativas como o

MERCOSUL e o Pacto Andino, deitam raízes nessa tradição cultural.

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