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FORMAÇÃO SUPERVISÃO CLÍNICA EM ENFERMAGEM FORMAÇÃO O BROTAR DA INTELIGÊNCIA EMOCIONAL NO MUNDO DA SUPERVISÃO CLÍNICA EM ENFERMAGEM enfermagem em revista N.º111 . DEZEMBRO 2013 A ENFERMAGEM E FORMAÇÃO ISSN 0872-8844

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FORMAÇÃOSUPERVISÃO CLÍNICA EM ENFERMAGEM

FORMAÇÃOO BROTAR DA INTELIGÊNCIA EMOCIONAL NO MUNDO DA SUPERVISÃO CLÍNICA EM ENFERMAGEM

enfermagem em revista

N.º111 . DEZEMBRO 2013

A ENFERMAGEM E FORMAÇÃO

ISSN

087

2-88

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PUB

• Preparação do leito da ferida: avaliação, intervenção e utilização de produtos

• Efectividade e eficiência na prevenção de UPP e no tratamento de feridas

• Abordagem diferencial entre úlceras por pressão e outras entidades

• Prevenção e controlo de infeções e resistências aos antimicrobianos

• Sistemas de informação de Enfermagem: a evidência da decisão e efetividade clinica

• Terapia Compressiva: O estado da arte

• Pessoa com alteração da integridade cutânea no membro inferior

• Pé Diabético: abordagem custo-efectividade

2 e 3 MAIO2014

LISBOA

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SUMÁRIO

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FICHA TÉCNICAPROPRIEDADE E ADMINISTRAÇÃO Formasau, Formação e Saúde, Lda. Parque Empresarial de Eiras, Lote 19, Eiras - 3020-265 Coimbra T 239 801 020 F 239 801 029 CONTRIBUINTE 503 231 533

CAPITAL SOCIAL 21.947,90 € DIRECTOR António Fernando Amaral DIRECTORES-ADJUNTOS Carlos Alberto Margato / Fernando Dias Henriques EDITORES Arménio Guardado Cruz / João Petetim Ferreira / José Carlos Santos / Paulo Pina Queirós / Rui Manuel Jarrô Margato ASSESSORIA CIENTÍFICA Ana Cristina Cardoso / Arlindo Reis Silva / Daniel Vicente Pico / Elsa Caravela Menoita / Fernando Alberto Soares Petronilho / João Manuel Pimentel Cainé / Luís Miguel Oliveira / Maria Esperança Jarró / Vitor Santos RECEPÇÃO DE ARTIGOS Mariana Cruz Gomes CORRESPONDENTES PERMANENTES REGIÃO SUL Ana M. Loff Almeida / Maria José Almeida REGIÃO NORTE M. Céu Barbiéri Figueiredo MADEIRA Maria Mercês Gonçalves COLABORADORES PERMANENTES Maria Arminda Costa / Nélson César Fernandes / M. Conceição Bento / Manuel José Lopes / Marta Lima Basto / António Carlos INTERNET www.sinaisvitais.pt E-MAIL [email protected] ASSINATURAS Mariana Cruz Gomes / Célia Margarida Sousa Pratas INCLUI Revista de Investigação em Enfermagem (versão online) PREÇOS ASSINATURA INDIVIDUAL Revista Sinais Vitais (6 números/ano): €10.00 / Revista de Investigação em Enfermagem (4 números/ano): €10.00 ASSINATURA CONJUNTA (SV 6 números/ano + RIE 4 números/ano): €15.00 ASSINATURAS ANUAIS: pessoas colectivas (Instituições /Associações): Revista Sinais Vitais (6 números/ano): €20.00 / Revista de Investigação em Enfermagem (4números/ano): €20.00 / Assinatura conjunta (SV 6 números/ano + RIE 4 números/ano): €35.00. FOTOGRAFIA 123rf© NÚMERO DE REGISTO 118 368 DEPÓSITO LEGAL 88306/ 95 ISSN 0872-8844

SUMÁRIO

P04 EDITORIAL

P05 FORMAÇÃOO BROTAR DA INTELIGÊNCIA EMOCIONAL NO MUNDO DA SUPERVISÃO CLÍNICA EM ENFERMAGEM: UM CAMINHO A DESBRAVAR…

P12 FORMAÇÃOSUPERVISÃO CLÍNICA EM ENFERMAGEM: A IMPORTÂNCIA DA RELAÇÃO SUPERVISIVA NA PARTILHA E CONSTRUÇÃO DE CONHECIMENTO

P22 CIÊNCIA & TÉCNICA A QUALIDADE EM ENFERMAGEM

P29 CIÊNCIA & TÉCNICA ESTRATÉGIAS NÃO FARMACOLÓGICAS NO CONTROLO DA DOR À CRIANÇA

P36 CIÊNCIA & TÉCNICA A CRIANÇA NÃO É UM ADULTO EM PONTO PEQUENO

P41 CIÊNCIA & TÉCNICACUIDADOS DE ENFERMAGEM IMEDIATOS AO RECÉM-NASCIDO: DO EXAME FÍSICO AO NEUROLÓGICO

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U� ��lat��i� �e��n��, �ec����n�� �� �� es�ud� ��r����, ���l�r� � c�n��it� �� “��idado� nã� ��estado�” p�� �n������ro�. Es�� c�n��it� � ��� �id�, �es�� ��lat��i�, c�m� �u�l���� ��i�sã� n� sa�isfaçã� da� �e�es�ida�e� do� d��n�e�. S���� � ��i�sã� �� ��idado�, j� a��� ���h� es��it� �� e�it��i�i� �n���i��e�, �m� ��� ��� dad� � ��fi ���n�� ra�i� �� �n������ro� p�� d��n��, c�� � c���e�p�n��n�� ������içã� d� ����r� �� h�ra� p�r� ��idado� e�s� f�lt� ���i� ���i�. O es�ud� ���rt � ��nd� p�r� � fact� �� � �����n�� �n�� �ec���� � �rá�ic� � � fact� �� h���� �n������ro� ��� �e���v����� ��ita� a���ida�e� ��� nã� sã� d� ��� d����i� f�r�� t����� ��e�it��e� �e�sa� ��i�s�e�. P�r� ���� �i�s�, � ��lat��i� �e���� ��� � ��e���n�i� �� ��i�s�e� �� ��idado� �� a�so�i� c�� � ��r�eçã� do� �n������ro� s���� � �e��r�nç� do� d��n�e�. N� es�ud� �e���id� � �ot ��i� � ��i��ida�� ��lo� �n������ro� à� a��-�ida�e� ��� ��� � ��� c�� a� ��es��iç�e� �é�ica�, t�� c�m� � �e�icaçã�, ma� p��e��� a������� p�uc� ��i��ida�� à� �n�����nç�e� �� �n���ma���, t�i� c�m�, � ��v�n�� do� d��n�e�, � �e����laçã�, a� �e�es�ida�e� p�ico�so�i�i�, � �l��e���nt� do� ��idado� � e�ucaçã� do� d��n�e�. A� r�z�e� p�r� esta� �e�is�e� d� �i�-�-�i�, d� h�r�-�-h�r� �� ���ut�–�-���ut� sã� �i� í��i� �� ����ic��, ma� sã�, t�����, ��it� boa� ��r��nta� p�r� ���es�ig��. S�r� ��� � m�i�� ��i���zaçã� da� �n������-ç�e� ��es��ita�, c�m� � �e�icaçã�, ��� � ��� c�� � ��r�eçã� do� �n������ro� s���� � p���� �e������had� ��lo� �e�ic���nto� � s���� � �u� �ut�-��r�eçã� �� m�i�� c���e��n�i� p�r� � a����is�raçã� �� �e�ic���nto� d� ��� p�r� o� ��idado� �� ��p�� � p�ico�so�i�� , �� ��ud� n� ���p�raçã� d� �e��e�s� � cas� �� d� e�ucaçã� do� d��n�e�?

Ou�ra� ��est�e� po��� ��� ��ita�. S�r� ��� o� Sr�. En������ro� D��et��e� � a� a�-���is�raç�e� do� ho��it�i� j� p�r�r�� p�r� ��ns�� s���� � ��� o� d��n�e� �e�e�-�it�� �� ��idado� �� �n���ma��� �� c�n���u�� � ��ns�� ��� toda� a� t��efa� ��� �is��ma�ic���n�� sã� a��es��ntada� a� �r�b��h� do� �n������ro� sã� e� �n�i�i� � po��� ��� �e���zada� �e�m� c�� � esca� �� �� �n������ro� ��� o� ����iço� ���?

Ou�r� ��estã� s���� � �u�� o� �n������ro� ��� ��� ��� e��� � s���� � ��es��n�� c��-����ida�� da� �e�es�ida�e� nã� ���na� ��la�i�nada� c�� a� �ud�nça� no� d�-�n�e� m�i� ������e�ido� � c�� �i�uaç�e� m�i� ��i��n�e�, ma� t����� c�� a� ���-��n�ia� d� �r���i� �is��m� �� ��idado�. D� ��� f��m� � ��� ��n�iad� � �r�b��h� do� �n������ro� �u�nd� ��e� sã� a�i�i�nada� �e�p�ns����ida�e� nã� �l��eada� �, a� �e�m�, �� ��e� ��i�� ��� c�n������ � f���� � ��� j� f��i�� ��� ���p� ��it� m�i� c�n��nsad�?

A��es�� � �ud� ist� ��� ��nd� nã� � pos����� , ��lo� �is��ma� �� �nf��maçã�, c��-����� s���� � ��� fi c� p�� f���� � �u�i� o� e��ito� ��� i�s� �r�voc� no� �e��ltado� ��� �� �b��� no� d��n�e�. M�i�, ��nd� v�mo� c�n���u�� � as�is��� � �m� �nfa�� n� �e�uçã� do� �usto� do� ��idado� ��� �� ���, �l�r���n��, ��� e�id� no� ��idado� �� �n���ma��� � �� c�n���u�r� � ��� e���, c�� m�i�� a�u��z�, c�� na��r�i� ��� �xo� n� �u��ida��, n� esf�rç� � n� �e��r�nç� do� d��n�e�.

P�ns� ��� ��mo� todo� ��� no� c�ns���n�i���z�� �est� �r����má�ic�, p�r��� p�r� ���� do� d��n�e�, � do� e��ito� ��� �ud� ist� ��� n� �u� �e��r�nç�, � t����� � �r�fi �sã� ��� est� �� c�us�.

ANTÓNIO FERNANDO S. AMARAL, [email protected]

EDITORIAL

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O BROTAR DA INTELIGÊNCIA EMOCIONAL NO MUNDO DA SUPERVISÃO CLÍNICA EM

ENFERMAGEM: UM CAMINHO A DESBRAVAR…

ENTRADA DO ARTIGO OUTUBRO 2011

PEDRO ANDRÉ VELHO CARVALHOEnfermeiro no Serviço de Urgência Central do Centro Hospitalar Lisboa Norte, Hospital de Santa Maria. Licenciado em Enfermagem. Pós-graduado em Supervisão Clínica em Enfermagem. Mestrando em Gestão em Enfermagem na Escola Superior de Enfermagem de Lisboa.

ANA MARGARIDA MOREIRA RAMOSEnfermeira no Serviço de Urgência Central do Centro Hospitalar Lisboa Norte, Hospital de Santa Maria. Licenciada em Enfermagem. Pós-graduada em Supervisão Clínica em Enfermagem. Mestranda em Gestão em Enfermagem na Escola Superior de Enfermagem de Lisboa

RESUMO

Actualmente, a implementação e noção de Su-

pervisão Clínica em Enfermagem têm vindo a as-

sumir uma conotação de extrema relevância no

desenvolvimento da profi ssão. Cuidamos de pes-

soas numa vertente holística, por isso exige-se ao

supervisor e ao supervisado não só conhecimen-

tos teórico-práticos, mas também inteligência

emocional para o estabelecimento de uma rela-

ção empática, entre estes três elementos: super-

visor, supervisado e utente. Este artigo visa, deste

modo, promover a sensibilização para esta nova

temática e a sua importância no nosso contexto

profi ssional.

Palavras-Chave: Supervisão Clínica em Enferma-

gem; Inteligência Emocional; Empatia

ABSTRACT

EMOTIONAL INTELLIGENCE THE CROP UP

INTO THE CLINICAL SUPERVISION IN NURSING

WORLDS: A PATH TO GRUB…”

The very own defi nition and implementation of

Clinical Supervision in Nursing, has been assum-

ing the supply to our career development. The

patient is seen at a holistic perspective and not in

disease cause-effect alone. Therefore, nowadays

it is required, at the nurse training process, not

only theoretical knowledge, but also emotional

intelligence, to set up an empathetic relationship.

As far as we’re concerned, the article promotes

the minds gap on this matter, in order to be aware

of its weight to our profession.

Keywords: Clinical Supervision in Nursing; Emo-

tional Intelligence; Empathetic relationship

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“Não há nada na nossa inteligência que não tenha passado pelos sentidos”

Aristóteles

Formação em Supervisão Clínica em En-fermagem, mais que necessária, uma lei…Vivemos num mundo onde singra a pa-lavra evolução. Em toda a panóplia de profi ssões, nas mais diferenciadas áreas, pretende-se uma mudança rumo ao aper-feiçoamento, que apesar de ser uma meta inatingível, move e motiva profi ssional e pessoalmente a sociedade.A Enfermagem assenta neste conceito desde os seus primórdios, já que é uma profi ssão que prima pelo cuidado à pes-soa. Mais do que um cuidar focalizado e imerso apenas na doença, a enfermagem defende um cuidar holístico, sendo abran-gente a todas as vertentes do utente, como pessoa inserida numa sociedade. Se no século passado a profi ssão cingia-se a uma vertente única de aplicação de co-nhecimentos teórico-práticos, nesta era contemporânea pretende-se ir um pouco mais além. Assim sendo, estes conheci-mentos não se restringem apenas à sua aplicação, mas também ao seu ensino. E aqui a Ordem dos Enfermeiros (OE) dá “o tal” passo em frente e defi ne as compe-tências do enfermeiro de cuidados gerais como regulamento, onde documenta que “os enfermeiros contribuem, no exercício da sua actividade na área de gestão, investiga-ção, docência, formação e assessoria, para a melhoria e evolução da prestação dos cui-dados de enfermagem, nomeadamente: a) organizando, coordenando, executando, su-pervisando e avaliando a formação dos en-fermeiros” (REPE 1996, citado por ORDEM dos ENFERMEIROS 1996).

O conceito de supervisão clínica, que nos dias de hoje tem vindo a ser exponen-cialmente comentado, emerge como res-posta a esta nova norma e constitui uma arma de evolução. Foi rapidamente perceptível que a Super-visão Clínica em Enfermagem, iria assumir um papel importante para o aperfeiçoa-mento da profi ssão. Mais do que aspectos meramente teóricos ou práticas descon-textualizadas, a formação na nossa profi s-são deve passar pela aplicação da teoria na prática em contexto real e a refl exão cons-tante sobre a mesma. E assim a Ordem dos Enfermeiros lança, o “Regulamento de Idoneidade Formativa dos Contextos de Prática Clínica”, aprovado pela Assembleia--geral a 29 de Maio de 2010. Aqui é defi nido o supervisor clínico como alguém credita-do devidamente e fornecido um referencial de avaliação, que nos presenteia com as “li-nhas com que nos havemos de coser”.

Mas afi nal o que é, então, Supervisão Clínica em Enfermagem? A palavra “supervisão”, sobre um primei-ro vislumbre, depreende manter alguém “debaixo de olho”, assegurando que uma tarefa está a ser desempenhada de forma correcta. A componente “clínica” reporta--nos para um modelo biomédico, em que a principal preocupação se centra no “quê” e no “como” dos aspectos técnicos. BOND e HOLLAND (1997), citando DE-PARTMENT OF HEALTH (1993), defi nem a supervisão como sendo um processo for-mal de aprendizagem, em que os interve-nientes adquirem a capacidade de desen-volver competências e assumem a respon-sabilidade da sua própria prática. Contudo, este prisma é muito redutor da

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verdadeira essência contextual, já que o conceito assenta imperiosamente sobre a relação entre seres humanos, o que inclui todo um leque de contextos, experiências e vivências. As autoras Bond e Holland em 1997 exploram esta ideia e desenvolvem, então, uma defi nição menos trivial e mili-tarista. A Supervisão clínica é um momen-to salvaguardado para a refl exão sobre a prática da enfermagem, mediante o apoio de colegas mais experientes, devendo ser um processo contínuo, assumindo como meta o utente (BOND e HOLLAND 1997).A imperatividade relacional neste âmbito remete-nos para o desconhecido que tem deixado o seu lado utópico para começar a dar os seus primeiros passos. Segundo DIOGO (2006), o enfermeiro confronta--se diariamente com a experiência de sentir e de lidar com a emotividade, num mundo em que se defendia que a emoção (estado mental e fi siológico, associado a sentimentos, pensamentos e comporta-mentos) deveria ser reprimida e colocada para segundo plano.

Se a emoção é o fundamento da nossa personalidade e a base de qualquer rela-ção, será que devia ser amordaçada? Não virá desta contenção, mais mal do que bem? Não seria mais benéfi co usufruir desta nossa capacidade em prol do outro?É mais fácil simplesmente esconder as emoções do que orquestrá-las, sem no en-tanto as manipular. Apesar disso, alguns de entre nós começam a explorar esta nova era, em que a emoção e o seu reco-nhecimento no outro constituem alicerces para se criar uma relação empática.Esta noção da importância da expressão emocional surge com Charles Darwin que

defende o seu poder para a continuidade e adaptação das espécies. Contudo, foi a partir de 1985 que Wayne Payne associa os conceitos de inteligência e de emo-ção, pela primeira vez segundo BOND e HOLLAND (1997). Foi este o momento crucial em que fi nalmente emerge o con-ceito de Inteligência Emocional, como a capacidade de aceitar os nossos próprios sentimentos, os dos outros e a forma como lidamos com os mesmos.

Por mares nunca antes navegados…Inicia-se, então, uma nova jornada e na-vegam-se por “mares nunca antes navega-dos”, um território tão omitido e fl agela-do, por desconhecido que era, hoje explo-rado com a curiosidade de uma criança e terá a sua extrema importância nos vá-rios domínios da sociedade.Em 1995 começa-se a assumir e a defen-der que as emoções devem ser educadas e disciplinadas (GOLEMAN 1995). À se-melhança de conhecimentos científi cos, linguísticos e artísticos que requerem inteligência para os manusear, também esta capacidade requer discernimento. Percebe-se que as emoções não devem ser contidas mas que se tem a obrigação de possuir a arte de as sentir, de as re-conhecer e a partir daí mover a empatia com outro…com a sociedade em que se insere. Pode-se mesmo dizer que o Coefi -ciente de Inteligência Emocional é direc-tamente proporcional ao Coefi ciente de Inteligência e igualmente importante.Inteligência emocional é, segundo GOLE-MAN (1995), a “ (…) capacidade de identi-fi car os nossos próprios sentimentos e os dos outros, de nos motivarmos e de gerir bem as emoções dentro de nós e nos nossos relacio-

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namentos.” De acordo o psicólogo GOLE-MAN (1995), esta pode ser classifi cada em cinco habilidades, nomeadamente: auto--conhecimento emocional, controle emo-cional, auto-motivação, reconhecimento de emoções em outras pessoas e habili-dade em relacionamentos inter-pessoais.Para SALOVEY e MAYER (2000), citados por MENDONÇA (2009), a Inteligência Emocional passa não só por identifi car emoções, mas também por ter a capaci-dade de as perceber e exprimir. A emoção deve ser assimilada ao pensamento, com-preendida e utilizada no raciocínio, há que saber regulá-la no próprio indivíduo e nos outros.

Inteligência Emocional e a Enfermagem, o passo em frente…Este conceito deixou de ser uma noção me-ramente académica e começou a ser aplica-do na sociedade. Ao contrário do que surge numa primeira conjectura, não se fala aqui no abstracto e subjectivo. O Professor An-tónio Damásio, neurologista português de renome, citado por GOLEMAN (1995), refe-re-se a este processo de interacção razão--pensamento como resultado da ligação entre amígdala e o neocórtex. As emoções assumem também uma co-notação mais científi ca e são defi nidas como conjuntos complicados de respos-tas químicas e neurais que formam um padrão (DAMÁSIO 2001). Verifi cadas as premissas, testadas as hi-póteses e comprovado o carácter cien-tífi co deste nosso poder, a Inteligência Emocional começa a ser aplicada na vida social, como ciência e como arte. Parte de uma dimensão mais empresarial e hoje já se adianta para as profi ssões de Saúde,

ainda mais incidente sobre a Psicologia, mas depositando a semente para outras áreas. GOLEMAN citado por ALVES e VEI-GA et al (2003), acredita que a formação dos profi ssionais de saúde deveria “…incluir algumas ferramentas básicas de in-teligência emocional, especialmente auto--consciência e as artes da empatia e de saber ouvir.” Estas devem ser instrumentos ru-dimentares de trabalho, que serão utili-zados, desenvolvidos e adaptados a cada contexto. Já um velho provérbio oriental diz que se encontrarmos um homem com fome, não devemos dar o peixe, mas sim ensiná-lo a pescar. Nada faria mais sen-tido neste contexto. São-nos fornecidas apenas as bases, todo o restante proces-so partirá do (s) indivíduo (s) que estiver (em) envolvido (s) no decurso.Em Enfermagem cuidamos diariamen-te de pessoas, criamos relações, fomen-tamos interacções com estas. De forma inconsciente é-nos exigida a capacidade de adaptação à pessoa que temos à nos-sa frente. Somos confrontados com mo-mentos em que temos de ter a destreza não só de identifi car as nossas emoções, mas também a do outro e compreender como lidar e proceder ante os mesmos. DIOGO (2006) defende que compreen-der a emotividade nos cuidados pode ser orientador do processo de cuidados. No seu estudo da vida emocional do enfer-meiro, alguns dos participantes que res-ponderam aos seus questionários, referi-ram que seria pertinente a análise de prá-ticas e enquadramento teórico das emo-ções, nos cursos de formação para profi s-sionais. A esta relação dá-se o nome de empatia. Para GOLEMAN (1995), esta é a mais fundamental das aptidões pessoais, é compreender os outros, ver as situações

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mediante a sua perspectiva, “respeitar as diferenças no modo como as pessoas sentem a respeito disto ou daquilo”. STRICKLAND (2000) defende a empatia como sendo a capacidade de considerar os sentimentos de outrem, enquanto simultaneamente se tomam decisões inteligentes.As relações empáticas em contexto de supervisão clínica são formadas entre três elementos: supervisor, supervisado e utente. Esta relação correlaciona-se positivamente a níveis de rentabilidade distintos, tanto na aprendizagem como laboralmente. Se o crescimento e a for-mação dos profi ssionais de saúde têm sempre como meta o utente, esta situ-ação não constitui excepção à regra. O usufruto de inteligência emocional como capacidade e agente de formação, permi-te não apenas ao supervisado estabelecer uma franca relação com o utente, como também possibilita ao supervisor avaliar atitudes e comportamentos do seu super-visado, de modo a ser efi caz no seu papel de orientador e, assim, contribuir para a sua formação de um modo mais persona-lizado e arguto possível, tendo em vista as necessidades individuais e não a con-juntura geral.

Será possível avaliar esta capacidade? À semelhança do Coefi ciente de Inteli-gência, também o Coefi ciente de inteli-gência emocional é mensurável. Actual-mente, existem escalas que calculam o nível de inteligência emocional, nomea-damente o MSCEIT, Mayer-Salovey-Caruso Emotional Intelligence Test, relatados por FREITAS e NORONHA (2006), onde são abordadas áreas, escalas e tarefas como se encontra enunciado na tabela 1.

Tabela 1 - Mayer-Salovery-Caruso Emotional Intelligence Test (FREITAS e NORONHA 2006)

Inteligência Emocional

Áreas Escalas Tarefas

Experiencial de

Inteligência Emocional

PercepçãoFaces

Figuras

Facilitar o Pensamento

Facilitar

Sensações

Estratégia de

Inteligência Emocional

Compreender as Emoções

Combinação

Mudanças

Gerir as Emoções

Gestão Emocional

Relações Emocionais

Seria pertinente implementar na forma-ção de base de licenciatura em Enferma-gem, a abordagem desta temática? Ou seria mais pertinente a sua integração em cursos pós-graduados ou inseridos nas especialidades? Como seria constitu-ído o teste adaptado à Supervisão Clínica em Enfermagem, tanto na avaliação de alunos como de supervisores? Numa fase inicial estamos demasiado centrados na componente técnico-cien-tífi ca, sente-se a necessidade de adquirir noções para saber-fazer. O saber-estar, onde esta área se insere, é desenvolvido aprofundadamente à posteriori, dado que já há uma certa maturidade. No entanto, este seria um bom tema de estudo para uma investigação futura.

Considerações FinaisA sociedade em que vivemos tem sofrido constantes mudanças, adaptações a no-vas situações que advêm de novas des-cobertas. O grau de exigência aumenta a um ritmo alucinante, onde é abarcada a área da saúde. Os utentes, que no fundo somos todos nós, já não são meros leigos,

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passivos na sua saúde e submissos na sua doença. Por termos acesso a todo um role de informações, tornámo-nos mais exi-gentes e a qualidade passa a ser um re-quisito básico, seja no sector privado ou no público, e desta advém o grau de sa-tisfação. ROCHAS et al (2007) relacionam a qualidade dos cuidados com a diminui-ção dos gastos em saúde, em que o grau de satisfação do utente é inversamente proporcional às despesas. Saber gerir confl itos e saber motivar são alguns dos pré-requisitos, necessários para dar resposta a esta relação, que mais do que económica, é pessoal. Assim, a Inteligência Emocional surge como res-posta a estas necessidades e aos direitos de cada um. Não se trata de saber forjar reacções, é antes uma capacidade em de-senvolvimento, que tem como natureza a idoneidade de agir em conformidade com as emoções do outro.Somos convidados a explorar um cami-nho ainda desconhecido, a irmos um pouco mais além e a abandonar a super-fi cialidade e a apatia. Somos convocados a enveredar pelo desconhecido de um intelecto emocional e a sermos mais do que reprodutivos, criativos nesta dimen-são poderosa. Temos de ser empreendedores, só com-preendendo esta nossa vertente, é que podemos marcar a diferença.

“O intelecto humano não é luz pura, pois recebe infl uência da vontade e dos afec-

tos, de onde se pode gerar a ciência que se quer.”

(Francis Bacon)

BIBLIOGRAFIA

Abreu, Wilson Correia de – Formação e aprendizagem em contexto clínico: fundamentos, teorias e considera-ções didácticas. Coimbra: Formasau. 2007. ISBN 978-972-8485-87-0

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SUPERVISÃO CLÍNICA EM ENFERMAGEM: A IMPORTÂNCIA DA RELAÇÃO SUPERVISIVA NA

PARTILHA E CONSTRUÇÃO DE CONHECIMENTO

ENTRADA DO ARTIGO DEZEMBRO 2011

MARIA ANTÓNIA CERQUEIRA MORAIS DA COSTA Enfermeira na ULSAM, EPE. Mestre em Cuidados Paliativos. Pós-graduada em Enfermagem Oncológica e Supervisão Clínica.

SUSANA VIEIRA MORAIS Enfermeira na ULSAM,EPE. Pós-graduada em Supervisão Clínica.

RESUMO

A supervisão clínica em enfermagem potencia a

aprendizagem ao longo da vida pela acção e inte-

racção nos diversos contextos, onde a experiência

deixa de ser desperdiçada, para ganhar relevância

quando analisada e refl ectida segundo cada um

dos intervenientes. O sucesso da aprendizagem

está não só dependente das experiências avalia-

das como signifi cativas pelos sujeitos envolvidos;

como também da qualidade da relação entre su-

pervisor e supervisado, devendo estabelecer-se

num clima afectivo - relacional de entreajuda e

empatia.

Palavras-Chave: Supervisão Clínica; Relação Su-

pervisiva; Aprendizagem Signifi cativa; Refl exão

ABSTRACT

CLINICAL SUPERVISION IN NURSING: THE SU-

PERVISORY RELATIONSHIP IMPORTANCE IN

KNOWLEDGE SHARING AND CONSTRUCTION

Clinical supervision in nursing increases life-long

learning by action and interaction in various

contexts, where experience ceases to be wasted,

gaining relevance when analyzed and refl ected by

everyone involved. Success in learning is not only

dependent on the experience perceived as signifi -

cant by the subjects, but also on the quality of the

relationship between supervisor and supervised,

building an emotional-relational environment of

cooperation and mutual empathy.

Keywords: Clinical Supervision; Supervision Rela-

tionship; Signifi cant Learning; Refl ection

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Ao longo dos últimos anos as transforma-ções do mundo moderno, conduziram a realidades complexas, geradoras de no-vas necessidades de cuidados, levando os serviços de saúde a adequar as práticas; o termo “qualidade” passou a fazer par-te do vocabulário quotidiano, e a busca incessante da mesma, está hoje patente nos processos de acreditação dos hospi-tais ou centros de saúde.O sucesso de um sistema de gestão da qualidade está dependente da forma como este se integra na dinâmica orga-nizacional e se desenvolve a par e com as diversas dimensões existentes; como es-trutura dinâmica, pressupõe um desen-volvimento contínuo através da mobiliza-ção das instâncias que a própria organi-zação possui para planear, implementar e monitorizar estratégias de mudança. Nos sistemas de gestão de qualidade ins-tituídos, a supervisão clínica é uma ferra-menta indispensável, por se encontrar no epicentro dos diversos processos que se cruzam nas organizações (Abreu, 2007).As normas para acreditação do King’s Fund Health Quality Service, por exem-plo, incluem uma referência expressa à supervisão das práticas clínicas. A lei nº 111/2009 de 16 de Setembro procedeu à primeira alteração do Estatuto da Or-dem dos enfermeiros; e no seu artigo 7º, confi gura-se um novo sistema de certifi -cação de competências, deixando de ser “um processo meramente administrati-vo, passando a ser baseado no reconhe-cimento e validação das competências através de uma estrutura de prática tutelada, assegurando a qualidade e se-gurança dos cuidados prestados pelos enfermeiros” (Santos et al., 2011:57). O Modelo de Desenvolvimento Profi ssional

construído pela Ordem dos Enfermeiros contempla o Exercício Profi ssional Tu-telado e o Desenvolvimento Profi ssional Tutelado, acontecendo estes dois perío-dos de prática tutelada em enfermagem no quadro de um modelo de supervisão clínica; neste contexto Nunes (2011:33) defi ne supervisão clínica como um pro-cesso formal de acompanhamento da prática profi ssional, que visa promover a tomada de decisão autónoma, valorizan-do a protecção da pessoa e a segurança dos cuidados, através de processos de re-fl exão e análise da prática clínica.Os efeitos da supervisão clínica na qua-lidade dos cuidados são de acordo com Cruz (2011:37) citando Hyrkäs e Lehti (2003) um dos aspectos fundamentais na melhoria da qualidade e foram defi nidos como uma área alvo pela Organização Mundial de Saúde.

SUPERVISÃO CLÍNICA EM ENFERMAGEMEm Portugal, apesar de não se encon-trarem directrizes tão específi cas para o desenvolvimento de programas de su-pervisão, como é o caso do Reino Unido e Canadá, por exemplo; face à conjuntura actual do desenvolvimento profi ssional, e ao movimento no sentido de avaliação da qualidade, certifi cação e promoção da excelência, a adopção de politicas desta natureza é inevitável, e é uma ferramen-ta insubstituível. A investigação sugere a necessidade de se estabelecer um sistema de supervisão clínica em enfermagem, para dar respos-ta às difi culdades experienciadas no per-curso formativo para o desenvolvimento pessoal e profi ssional, como nos refere Soares (2011:54), na opinião do mesmo

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autor, a supervisão clínica ajudaria os en-fermeiros a refl ectir nas suas actividades profi ssionais e a promover a qualidade dos cuidados.No contexto actual a formação não é um momento isolado na vida das pessoas; situa-se face ao seu passado, ao seu pre-sente, tendo em atenção o seu futuro e o seu projecto pessoal, que lhe confere um sentido, colocando a tónica na aquisição e desenvolvimento de novas competências, no desenvolvimento global da pessoa, para além da aquisição de determinados saberes específi cos (Carvalhal, 2003).Em qualquer processo formativo a supervi-são clínica é imprescindível; Orga (2004) su-blinha que “o processo de supervisão pode ser considerado um dos processos possíveis de formação contínua e de desenvolvimen-to profi ssional na idade adulta”.Desenvolver-se e aprender para poder en-sinar a aprender e, ajudar a desenvolver o supervisado, parece ser, na realidade, não apenas o objectivo fundamental da activi-dade de supervisão, mas, também, a prin-cipal tarefa a realizar (Koch, 2009).A supervisão clínica segundo Abreu (2011:14) corroborando a ideia de Maia e Abreu (2003) é um processo dinâmico, in-terpessoal e formal de suporte, acompa-nhamento e desenvolvimento de compe-tências profi ssionais, através da refl exão, ajuda, orientação e monitorização, tendo em vista a qualidade dos cuidados de en-fermagem, a protecção e segurança dos utentes e o aumento da satisfação pessoal.Simões e Garrido (2007) referem-se ao conceito de supervisão clínica em enfer-magem como uma relação profi ssional centrada na exigência, na formação, no trabalho e no desenvolvimento emocio-nal, que envolve uma refl exão sobre o

desenvolvimento das práticas orientadas por um profi ssional qualifi cado. Para Se-verinsson (2001) é “‘um fenómeno que contém não só a relação entre o super-visor e o supervisado mas também o pro-cesso de aprendizagem da experiência clínica’ e ainda, que o seu objectivo geral é ‘apoiar o desenvolvimento da identida-de laboral do supervisado, as suas compe-tências e a sua ética’ (Cruz, 2008).”Processo formal facilitador do apoio pro-fi ssional e aprendizagem, tendo como funções fundamentais, a função formati-va, restaurativa e normativa; a função nor-mativa contribui para o desenvolvimento de competências e habilidades, através da refl exão e análise das experiencias do supervisado; a função restaurativa pro-porciona apoio profi ssional contribuindo para diminuir o stress e manter emoções adequadas, ajudando a ultrapassar situa-ções signifi cativas (Pires, 2011:31).A supervisão clínica está direccionada para o processo de supervisão de pares, emaranhando-se com os processos de certifi cação, qualidade, segurança de cui-dados e formação em enfermagem (Sil-va, Pires e Vilela, 2011). Para Carvalhal et al (2011:45), “‘supervisão clínica de pares em enfermagem’ é o acompanhamento, orientação e suporte de enfermeiros por enfermeiros com o intuito do crescimento pessoal e profi ssional mútuo, em que há refl exão sobre as práticas de forma a fun-damentar uma tomada de decisão autóno-ma e efi caz para maximizar a qualidade e segurança dos cuidados de enfermagem”.Para além do desenvolvimento do conhe-cimento, outro objectivo da supervisão clínica é potenciar capacidades e repensar atitudes (Rodrigues et al., 2007); para tal, é necessário um clima favorável, uma at-

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mosfera afectivo - relacional e cultural po-sitiva, de entreajuda, dialogante, recípro-ca, aberta, espontânea, autêntica, cordial, empática, colaborativa e solidária, dinâmi-ca, encorajadora e facilitadora, responsá-vel entre o supervisor e o formando.O êxito do processo de supervisão clíni-ca em enfermagem está dependente, na opinião de Abreu (2002) citando Brock-lehurst, da qualidade da relação entre o supervisor e o supervisado.

RELAÇÃO SUPERVISIVAPara o sucesso do processo de supervisão, e para que haja uma actividade de ensino/aprendizagem mutua é necessário uma atmosfera afectivo - relacional e cultural positiva, de entreajuda recíproca, aberta, espontânea, autentica, cordial, empática, colaborativa e solidária entre o supervi-sor e o supervisado (Alarcão e Tavares, 2003); potencializando assim os conheci-mentos, a imaginação, a afectividade, as técnicas e as estratégias de que cada um é capaz, a fi m de que os problemas que surjam no processo de ensino - aprendi-zagem sejam devidamente identifi cados, analisados e resolvidos.Supervisionar deve então ser um proces-so de interacção consigo e com os outros, devendo incluir processos de observação, refl exão e acção de forma a corrigir os aspectos menos bons tendo como objec-tivo a melhoria continua; como tal as ca-racterísticas pessoais e profi ssionais dos enfermeiros supervisores são aspectos cruciais no sucesso da supervisão (Simão e Garrido, 2007); as características pesso-ais centram-se na empatia, auto-estima positiva, facilidade no relacionamento interpessoal, saber ouvir, capacidade de

observação e análise e boa comunicação (feedback), enquanto que as caracterís-ticas profi ssionais englobam, competên-cias técnicas, boas capacidades de lide-rança, organização e planeamento.De acordo com o que foi dito anteriormen-te, é então essencial que o supervisor esta-beleça uma comunicação efi caz a fi m de perceber as opiniões e sentimentos do su-pervisado. Saber escutar, prestar atenção, escutar, compreender, comunicar verbal e não verbalmente são pontos essenciais para uma comunicação efi caz. Só uma comunicação interpessoal de qualidade desencadeia e faz renascer relações in-terpessoais de qualidade, facilitadoras do processo de aprendizagem (Pereira, 1996).Partindo do pressuposto que na prática clínica a relação orientador orientado se faz em torno da relação de ajuda, uma relação recíproca, assimétrica e dialécti-ca entre as pessoas que sejam capazes de sair de si mesmas e colocar-se no lugar do outro, compreende-lo em profundida-de e riqueza, sem deixar de ser ele pró-prio; neste tipo de relação ao promover--se o desenvolvimento pessoal do outro, em relação a nós e facilitando a relação, também nos desenvolvemos de igual modo (Tavares, 1996); como tal, a atitu-de empática é imprescindível, uma vez que pressupõe a capacidade de imersão no mundo subjectivo do outro e de par-ticipar na sua experiência na medida em que a comunicação verbal ou não verbal o permitam (Chalifour, 1993).O supervisor não é aquele que transmite o saber, mas o que promove a mudança positiva, educa, monitoriza, recomenda, desafi a, sustenta e pesquisa.

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APRENDIZAGEM EXPERIENCIALAprender é tão natural como respirar; se não fi zéssemos aprendizagens funda-mentais desde que nascemos, não con-seguiríamos sobreviver. Sendo assim, o processo de aprendizagem é coincidente com um processo largo e multiforme de socialização (Rodrigues et al., 2007); o contexto de trabalho é para o mesmo au-tor citando Costa (1995) um local privile-giado da aprendizagem, permitindo que os saberes formalizados se confrontem com a prática e que os saberes práticos se formalizem, num ciclo recursivo.Em 1945, Kurt Lewin verifi cou que a aprendizagem, a mudança e o conheci-mento tinham sempre na sua base uma determinada experiência, seguida de um processo refl exivo; cuja informação resul-tante da análise estaria na base de novas experiências e de outros comportamen-tos. Mas a experiência só por si não gera conhecimento (Hesbeen, 2001).Cavaco (2002) refere que no processo de aquisição de conhecimentos através da via experiencial o indivíduo adquire não só a competência do saber - fazer, mas também do saber e do saber - ser; mas esta aquisição varia de sujeito para sujei-to, dependendo do valor que este atribui à experiência; só se tornando a experiên-cia formativa quando provoca alterações duráveis no indivíduo.David Kolb (1984) defi nia aprendizagem experiencial como um processo no de-curso do qual um saber é criado graças à transformação pela experiência, é um processo de transformação em que o conhecimento é continuamente criado e recriado. O modelo de aprendizagem pela experiência deste autor, baseia-se no pressuposto de que as ideias não são es-

táveis e imutáveis no tempo e no espaço. São conteúdos do pensamento ou repre-sentações testadas permanentemente através da experiência (Abreu, 2007).Kolb (1984) cit. por Abreu (2007) sugere ainda que a aprendizagem experiencial, é sobretudo um processo, não um resulta-do; é um processo contínuo ancorado na experiência; requer a resolução de confl i-tos entre modos de adaptação dialectica-mente opostos; possui um sentido holís-tico; solicita a ocorrência de transacções entre a pessoa e o seu meio e é um pro-cesso de transformação de conhecimento. Refere ainda que, para que haja aprendi-zagem signifi cativa é preciso que se reú-nam três condições; existir no sujeito uma disposição para aprender; os conteúdos da aprendizagem devem ser potencialmente signifi cativos, têm que ser lógica (depende da natureza dos conteúdos) e psicologica-mente (experiência subjectiva que cada indivíduo vivencia) signifi cativos para o sujeito; e existência de um conteúdo mí-nimo na estrutura cognitiva do indivíduo, com subsunçores sufi cientes para suprir as necessidades relacionais.A articulação entre a aprendizagem e a experiência é uma necessidade, já que a experiência não é em si uma aprendiza-gem e esta não pode passar sem a expe-riência, como nos refere Nunes(1995) cit. por Menoita (2011), segundo a mesma autora, para que determinada aprendiza-gem possa ser qualifi cada de experiencial é necessário haver primeiramente o con-tacto directo do indivíduo, em todas as suas dimensões (cognitiva, afectiva, com-portamental), consigo, com os outros e com o meio envolvente.A essência do processo de aprendizagem signifi cativa é que ideias simbolicamente

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expressas sejam relacionadas de maneira não literal e não arbitrária ao que o for-mando já sabe, a algum aspecto da sua estrutura cognitiva especifi camente rele-vante para a aprendizagem dessas ideias (Abreu, 2007).

PRÁTICA REFLEXIVAUma supervisão efi caz na opinião de Abreu (2007) requer como competência, capacidade de refl ectir a prática.Schön (1983) considera que a componente profi ssional prática permite uma refl exão dialogante sobre o observado e o vivido, conduzindo para a construção activa do conhecimento na acção, aprender fazendo. A refl exão sobre a prática em contexto de trabalho adquire grande importância, na medida em que; o contexto de trabalho é um espaço de transformação de compe-tências profi ssionais, logo a refl exão sobre a sua organização é um factor decisivo para os trajectos de formação; emergindo os problemas de formação das situações de trabalho, utilizando mecanismos de refl exão sobre os problemas vivenciados, de negociações com as diversas formas de poder e das interacções com os pares. Os actores promovem o desenvolvimento de práticas analítico - refl exivas sobre o exer-cício e a organização do trabalho, desen-volvendo um conjunto de aprendizagens colectivas que substantivam a existência de um dispositivo de formação no contex-to de trabalho (Abreu, 2007).É ao refl ectir sobre a acção que se toma consciência do conhecimento tácito, se identifi cam crenças erróneas e se (re)formula o pensamento. Segundo Alarcão (1996) cit. por Rua (2011) essa refl exão consiste numa reconstrução mental re-

trospectiva da acção para tentar analisá--la, constituindo um acto natural quando percepcionamos diferentemente a acção.Schön (1992) considera a prática refl exiva como um processo de transformar o pen-samento da prática numa potencial situ-ação de aprendizagem a qual pode ajudar a alterar e modifi car as abordagens nessa mesma prática. Na obra de Schön a perspectiva do ensino e aprendizagem profi ssional parte dos con-ceitos de “refl exão na acção” e “refl exão sobre a acção”. Ao tentar perceber os fun-damentos da acção e contexto em que ela ocorre, tendo em vista a decisão, o profi s-sional está a refl ectir, processo que Schön designa de “refl exão na acção”. Permitin-do enquadrar a acção. Por outro lado, se o profi ssional incidir a sua refl exão sobre situações passadas, de forma retrospecti-va, estamos perante uma “refl exão sobre a acção”; o que implica uma recontextuali-zação das acções e uma recomposição dos espaços, tempos e actores nela envolvidos, assim como os resultados que produziu. Schön fala ainda de refl exão sobre a refl e-xão na acção, que pode acontecer quan-do o profi ssional aprecia a forma como se compreendeu a acção, o que implica a existência de um processo mais elaborado. Esta sistematização é relevante para a in-tegração da informação e a criação de for-mas alternativas para situações similares.A complexidade única das situações pro-fi ssionais práticas não são redutíveis a factos e fórmulas predeterminadas, sendo recomendado a refl exão na e sobre a ac-ção para se obter um esquema de se ad-quirir conhecimentos a partir da prática e se facilitar a aprendizagem (Schön, 1992).D’Espiney (1997) considera que a refl exão não é um fi m em si mesma, é um meio

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que permite aos sujeitos através de um processo de descontextualização da ac-ção e de recontextualização, uma (re)construção interna da situação, que ad-quire outros signifi cados, permitindo visualizar novas formas de operar e de-senvolver o refl exo de aprendizagem per-manente nas e através das situações pro-fi ssionais, no quadro de uma organização autoformativa (Abreu, 2007).

RELAÇÃO SUPERVISIVA, APRENDIZA-GENS SIGNIFICATIVAS E REFLEXÃO NO PROCESSO DE SUPERVISÃO CLÍNICA EM ENFERMAGEMA aprendizagem nos adultos é concebida como um processo de transformação e construção pessoal, em relação aos seus conhecimentos, convicções, comporta-mentos e atitudes, resultante de uma ex-periência. Deste modo, a aprendizagem nos adultos centra-se em dois eixos: a aprendizagem pela experiência e a apren-dizagem pelo signifi cado atribuído à ex-periência (Gago, 2008). A experiência e a refl exão são segundo a autora, fazendo referência a Alarcão (2002) dois agentes de aprendizagem nos adultos; em que a experiência, quando refl ectida e concep-tualizada, permite compreender a reali-dade, permite aprender.Amulya (2005) encara a refl exão como sendo a base da aprendizagem signifi ca-tiva que se pode encarar enquanto pro-cesso activo de certifi cação da própria experiência de modo a olhá-la de perto e explorá-la em profundidade, constituin-do a chave para aprender a dar signifi ca-do às próprias experiências, ou seja, exa-minar a experiência mais do que vivê-la. Deste modo, desenvolvendo a curiosida-

de acerca das nossas próprias experiên-cias, rapidamente abrimos as possibilida-des de aprender signifi cativamente, não só a partir de livros ou peritos, mas a par-tir do nosso trabalho e das nossas vidas.Na opinião de Abreu (2003) a refl exão é uma competência essencial e implícita na prática profi ssional de enfermagem, pelo que deve ser trabalhada a nível da supervisão. A capacidade para concre-tizar diagnósticos clínicos e intervir em contextos de cuidados de enfermagem requer refl exão.O desenvolvimento da aprendizagem clí-nica através de um processo refl exivo, com base na experiência, requer que se enfatize a ligação com os contextos pro-fi ssionais; é a sua actividade que constitui o ponto de partida, para que a experiência se converta em saber, é necessário fazer do exercício do trabalho objecto de refl e-xão e pesquisa pelos que nele estão di-rectamente implicados (Carvalhal, 2003); como tal a relação entre o supervisor e o supervisado deve assentar num ambiente favorável, caracterizado pela reciprocida-de, entreajuda, abertura, espontaneida-de, autenticidade, cordialidade, empatia, colaboração e solidariedade, sendo para tal necessário desfazer preconceitos em torno do estatuto e do relacionamento entre o supervisor e o supervisado, como superior e inferior (Abreu, 2002).A refl exão é considerada um efi ciente método de aprendizagem, como nos lem-bram Hyrkäs et al. (2001), mas não sendo um processo automático, representa um enorme desafi o para o supervisor, reque-rendo coragem, investimento, supervisão e treino. Como processo activo que é, com foco e conteúdo, envolve mais do que a simples recolha de experiências; ela incor-

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pora um empenho activo, envolvimento pessoal e uma mudança nos comporta-mentos ou pontos de vista (Santos, 2009).O desenvolvimento de competências re-fl exivas, tendo como pressuposto a refl e-xão, torna o profi ssional sabedor daquilo que faz, porque ao realizar uma análise retrospectiva consciente e intencional acerca do que aconteceu começa a com-preender e a controlar a sua experiencia (Palmer, Bums e Bulman, 1995; Newton, 2000; cit. por Santos, 2009); o ensino re-fl exivo deve então contemplar a própria experiência do sujeito como pessoa, ten-do em conta os seus saberes e valores e a sua cultura e individualidade própria (Pereira, 2007).A refl exão assenta assim nos princípios da aprendizagem experiencial. No do-mínio das práticas de enfermagem, a refl exão ajuda a expor o que é a enfer-magem, auxilia na prática de informar e na formação dos profi ssionais e ajuda os enfermeiros a pensar crítica e constru-tivamente, tornando o profi ssional mais confi ante nas suas práticas, mais seguro e mais competente no desempenho, tal como nos diz Fernandez (1998) cit. por Abreu (2007). Para Orga (2004) a “aprendizagem pela experiência” é um dos conceitos centrais nas perspectivas educacional e desenvol-vimentista da supervisão. A supervisão é um bom exemplo de um processo dialécti-co e facilitador da aprendizagem, no qual a experiência de trabalho e os saberes te-óricos se articulam ou, dizendo de outra forma, onde existe uma assimilação da experiência de trabalho com a produção de saberes mediados pela esfera pessoal.A comunicação, empatia, motivação e relação de ajuda, são elementos fulcrais

no processo supervisivo e para que se es-tabeleça uma boa relação entre o super-visor e o supervisado, desempenhando um papel único no processo de ensino - aprendizagem. O supervisor deverá pro-mover uma relação de colaboração num ambiente afectivo - relacional favorável, valorizando o trabalho do supervisado e tendo a consciência de que no processo de supervisão clínica também ele se en-contra em aprendizagem e desenvolvi-mento profi ssional. A sua função é ajudar a controlar as difi culdades que este pro-cesso de acompanhamento comporta, e possibilitar o desenvolvimento de compe-tências para haver cada vez mais qualida-de no cuidar (Garrido, 2005).

CONCLUSÃOA aprendizagem dos adultos, e conco-mitantemente dos enfermeiros, integra processos de transformação de conheci-mentos, atitudes, valores e experiências individuais; neste sentido, o contexto de trabalho, é também um local privilegiado de aprendizagem, e de desenvolvimento de competências.A aprendizagem experiencial em enfer-magem é um processo contínuo e infor-mal, no entanto, requer disposição do indivíduo para aprender, e interacção, da pessoa consigo e da pessoa com a re-alidade exterior; de modo a existir uma transformação do conhecimento pela ex-periência. Para transformar a experiência prática numa situação de aprendizagem, é necessário refl ectir na e sobre a mesma, descontextualizando e recontextualizan-do a acção, integrando-a nas suas expe-riências pessoais, na sua individualidade, crenças, valores e cultura, enfatizando a

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ligação com os contextos profi ssionais.A refl exão é o processo através do qual uma aprendizagem se torna signifi cativa.O processo de supervisão clínica em en-fermagem, como processo dinâmico, de suporte, de acompanhamento, orienta-ção e monitorização que é, deve ajudar os enfermeiros a refl ectir sobre as suas prá-ticas, de forma a fundamentar a tomada de decisão autónoma e efi caz, promover o desenvolvimento pessoal e profi ssional mútuo, e maximizar a qualidade e segu-rança dos cuidados prestados.A supervisão deve desenvolver condições adequadas a uma aprendizagem cognitiva-mente estimulante e afectivamente grati-fi cante e, em simultâneo, monitorizar pro-cessos sistemáticos e continuados sobre a própria prática (Rodrigues et al., 2007).O desenvolvimento pessoal e profi ssional assim como a aprendizagem, são facilitados quando se estabelece uma relação supervisi-va emocionalmente sólida e duradoura.

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A QUALIDADE EM ENFERMAGEM

ENTRADA DO ARTIGO JANEIRO 2012

RESUMO

Com este artigo teórico, a autora pretende

evidenciar uma das questões profi ssionais mais

emergentes da actualidade: o exercício profi ssional

do Enfermeiro como um processo essencial na

construção de um sistema de melhoria contínua

da Qualidade, onde “a satisfação do utente, a

promoção da saúde, a prevenção de complicações,

o bem-estar e o autocuidado dos clientes, a

readaptação funcional e a organização dos serviços

de Enfermagem” (Ordem Enfermeiros, 2004:18)

são alcançadas diariamente com intervenções

de Enfermagem, sejam estas autónomas ou

interdependentes, traduzindo-se em enormes

ganhos em saúde.

Palavras-Chave: Qualidade, Cuidados, Saúde, En-

fermagem

ABSTRACT

THE QUALITY IN NURSING.

With this theoretical article, the author intends

to show one of the most professional of the

emerging timeliness: the exercise of professional

nurses as an essential process in building a system

of continuous quality improvement, where "the

satisfaction of users, health promotion, prevention

of complications, the well-being and self care clients,

the rehabilitation and functional organization of

nursing services" (Nurses Association, 2004:18) are

achieved with daily nursing interventions

Keywords: Quality, Care, Health, Nursing

SANDRA MANUELA FIGUEIRA HELENO SERRANOEnfermeira do Gabinete da Qualidade da Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo. Pós-licenciatura de especialização em Enfermagem em Saúde Infantil e Pediatria. Mestre em Bioética.Doutora em Psicopedagogia.

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INTRODUÇÃOActualmente os Sistemas de Saúde con-frontam-se com inúmeras preocupações relacionadas com a justiça social, o direi-to à saúde para todos, a participação e a solidariedade; numa tentativa de equi-dade e acessibilidade aos cuidados de saúde. Para que estes valores sejam atin-gidos é fundamental que “os sistemas de saúde respondam aos desafi os de um mundo em mudança e às crescentes expectativas de um melhor desempenho” (OMS, 2008, xii), considerando as verdadeiras necessida-des dos cidadãos. No entanto, a natureza dos problemas de saúde altera-se a um ritmo inesperado: o envelhecimento, os efeitos do desenvolvimento tecnológico e o aparecimento de doenças crónicas exige aos sistemas de saúde uma gestão integrada e abrangente da realidade hu-mana, social e política. De acordo com o expresso no Relatório Mundial de Saúde (2008, xiii): «Em muitos aspectos, as respostas do sec-tor da saúde ao mundo em mudança têm sido desadequadas e ingénuas. Desade-quadas, na medida em que falham não só na antecipação mas também na resposta apropriada: vezes de mais com muito pou-co, tarde de mais ou excessivamente no sí-tio errado. Ingénuas, na medida em que falhas do sistema requerem uma solução ao nível do sistema, e não soluções tempo-rárias. Os problemas com os recursos hu-manos para a saúde pública e cuidados de saúde, com sistemas de fi nanciamento, in-fraestruturais ou sistemas de informação estendem-se invariavelmente para além do sector da saúde no seu sentido restrito, para além de um único nível de infl uência política e, cada vez mais, atravessam fron-teiras: isto eleva o patamar em termos de

trabalho efectivo entre todos os governos e parceiros.»Talvez por esta tomada de consciência, consideramos que a necessidade de im-plementar sistemas de Qualidade é actu-almente mais do que uma preocupação - é uma necessidade, e deve ser encarada como uma exigência e um compromisso aceite e defendido por toda a organiza-ção prestadora de serviços de saúde. É, portanto imperativo que as instituições de saúde criem e promovam a “cultura da Qualidade”, envolvendo todos os profi s-sionais, de forma a responder adequada-mente aos desafi os sociais, tecnológicos, políticos e económicos. Desafi o social, porque os cidadãos e os profi ssionais são cada vez mais exigentes, tanto na qua-lidade de consumo como na produção. Desafi o tecnológico, devido ao constante desenvolvimento e inovação das tecnolo-gias de informação e comunicação adop-tadas pela saúde, que obriga a uma actu-alização permanente nos procedimentos e na melhoraria do desempenho nessa área. Desafi o político porque “a necessi-dade de implementar sistemas de Qualidade está hoje assumida formalmente, quer por instâncias Internacionais” (como a Orga-nização Mundial da Saúde e o Conselho Internacional de Enfermeiros), quer por organizações nacionais (pela Ordem dos Enfermeiros, pelo Conselho Nacional da Qualidade e pela Direcção Geral de Saú-de). Desafi o económico, porque sendo a concorrência uma constante e a oferta cada vez maior, a oportunidade de esco-lha depende da relação custo/benefício e também porque “é importante diminuir custos, evitando o supérfl uo, a negligência e a omissão” (Imperatori, citado por Frede-rico, 2001).

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DEFINIÇÃO DA QUALIDADE EM SAÚDESeria prudente iniciar esta exposição, apresentando a defi nição de “Qualidade em Saúde”, contudo qualquer defi nição poderá tornar-se redutora e pouco pre-cisa, uma vez que reúne atributos como a efectividade, a efi ciência, a aceitabili-dade, a satisfação, a equidade, …entre tantas outras dimensões. Biscaia (2000, p.8) defi niu a Qualidade na saúde como “um conjunto integrado de actividades pla-neadas, baseado na defi nição de metas ex-plícitas e na avaliação de desempenho”, que abrange todos os níveis de cuidados e que tem como objectivo uma melhoria contí-nua na Qualidade dos cuidados a pres-tar. A defi nição da Qualidade em saúde segundo Mezomo (2001, p.73) implica a incorporação dos direitos fundamentais da pessoa humana que devem ser garan-tidos e preservados na integridade, refe-rindo-se à Qualidade como “um conjunto de propriedades de um serviço (produto) que o tornam adequado à missão de uma orga-nização (empresa) concebida como resposta às necessidades e legítimas expectativas de seus clientes.” Por seu lado, Donabedian (citado por Mezomo (2001, p.73), afi r-mava que a Qualidade pode ser “defi nida como a obtenção dos maiores benefícios, com os menores riscos para o paciente, be-nefícios estes que, por sua vez, se defi nem em função do alcançável de acordo com os recursos disponíveis e os valores sociais existentes”. Note-se que nesta defi nição também é implícito, a defesa dos direi-tos fundamentais da pessoa humana e a gestão efi ciente dos recursos disponíveis, cada vez mais escassos para dar resposta a uma procura de cuidados cada vez mais exigente. Por estes motivos, a Organiza-ção Mundial de Saúde afi rmou a necessi-

dade de se implementar, em cada estado membro, uma estratégia nacional para a Qualidade e segurança em saúde, que promova a gestão efi ciente dos recursos disponíveis para responder a um volume crescente da procura de cuidados de saú-de com um elevado nível de Qualidade na prestação de cuidados. Este contex-to concede enormes desafi os quer para os profi ssionais de saúde, quer para os gestores dos Sistemas de Saúde, exigin-do uma actualização de conhecimentos constante e um esforço de promover e garantir a melhoria contínua da Qualida-de dos cuidados prestados.Para que uma instituição de saúde consi-ga desenvolver uma “cultura da Qualida-de”, onde a Qualidade que se transforma num compromisso pessoal de cada pro-fi ssional é necessário:• O envolvimento dos órgãos de gestão, de forma a ensinar, motivar e apoiar os seus colaboradores;• A criação de indicadores de Qualidade e de produtividade;• A educação e sensibilização de todos os profi ssionais de saúde, de forma a com-preenderem e atenderem aos indicadores de Qualidade. Ishikawa, citado por Mezo-mo (2001, p. 57), defende que a “a Qualida-de começa e termina com a educação”, uma educação que capacite as pessoas para a análise concreta dos problemas, para a tomada de decisões, para o trabalho de equipa na procura da melhoria contínua, para o constante desenvolvimento de ha-bilidades de forma a desenvolver os pro-cessos e a avaliar os resultados;• A criação de equipas que se responsabi-lizem por melhorar os sistemas;• O desenvolvimento de um compromis-so e participação na missão, nos objecti-

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vos e nas políticas da organização a todas as pessoas envolvidas.

O ENFERMEIRO COMO IMPORTANTE IMPULSIONADOR DA QUALIDADE DOS CUIDADOS DE SAÚDEO facto de prestar cuidados de forma continuada, com uma presença constan-te nos Serviços de Saúde (de 24 sobre 24 horas), determina que seja o Enfermei-ro que, na realidade, promove a gestão da Qualidade e dos recursos humanos e materiais nas instituições, em função das necessidades dos utentes em cuida-dos de saúde. Esse reconhecimento está manifesto no preâmbulo do Estatuto da Ordem do Enfermeiros, quando o Esta-do Português afi rma, no Decreto-lei nº 104/98 de 21 de Abril, que «Os Enfermeiros constituem, actualmente, uma comunidade profi ssional e científi ca da maior relevância no funcionamento do sistema de saúde e na garantia do acesso da população a cuidados de saúde de Qualidade, em especial em cui-dados de Enfermagem...». Donabedian, citado por Azevedo (2001), considerou que a Qualidade dos Cuidados de Saúde não poderiam apenas abranger as componentes técnicas, como também a Qualidade das relações interpessoais entre o profi ssional de saúde e o utente, considerando os conhecimentos, as ati-tudes e os comportamentos implicados nas acções promotoras de saúde, pre-ventivas e curativas. Assim, a avaliação da Qualidade deve ser orientada através de critérios ou padrões preestabelecidos, considerando a necessidade de associar a uma metodologia estruturada a compo-nente da subjectividade (individualização e adaptação dos cuidados às caracterís-

ticas de cada utente). Contudo, para o Enfermeiro nem sempre é fácil defi nir a excelência dos cuidados de Enfermagem através de critérios, de grelhas de avalia-ção ou de processos de validação, já que é permanentemente confrontado com novos desafi os que abordam as questões da efi cácia, da efi ciência, da equidade, da Qualidade e do humanismo (infl uenciado por valores, crenças, conhecimento e ati-tudes dos próprios Enfermeiros e do pú-blico em geral).Sabemos que a investigação tem de-sempenhado um papel fundamental na Enfermagem, que estabelece uma base científi ca para criar novos conhecimen-tos e conduzir a prática dos cuidados de Enfermagem aos mais elevados níveis de Qualidade. Como tal, não devemos deixar que o nosso exercício profi ssional seja deixado invisível nos esforços de se obter a Qualidade em saúde, de forma a infl uenciarmos activamente as decisões políticas, económicas e de gestão que dominam o nosso percurso profi ssional, bem como o nosso reconhecimento e vi-sibilidade social.Como Hesbeen nos escreveu «é funda-mental que os Enfermeiros comecem a re-velar o conteúdo real e sentido da arte do cuidar… para que a essência da sua práti-ca não seja esquecida, negligenciada ou até mesmo pervertida» (2001, p.42). Um cuidar de Qualidade exige-nos uma valorização no relacionamento com a pessoa alvo de cuidados, onde o acolhimento, a escuta, a disponibilidade e a criatividade se devem associar aos conhecimentos científi cos e às competências técnicas. É claro que aqueles que não se orgulham da subti-leza associada à arte do cuidar, como a essência da profi ssão de Enfermagem,

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argumentarão desde logo o carácter im-preciso e complexo associado ao cuidar… Talvez para alguns a arte de cuidar ainda esteja por descobrir… e muito desse des-conhecimento se deve nós próprios, por-que como Enfermeiros, quando falamos da nossa prática, referimo-nos essencial-mente aos actos técnico-científi cos que praticamos e só muito raramente abor-damos a complexa dimensão do cuidar.Na Norma Internacional (ISO 9000, 2000, 3.1) “a Qualidade é defi nida como o conjun-to das características de uma entidade, que lhe confere a aptidão para satisfazer neces-sidades explícitas e implícitas”, assim pode ser facilmente associada a factores de natureza subjectiva, onde se torna fun-damental reconhecer os valores que lhe são inerentes, de forma a descrevê-los e a encontrar medidas apropriadas que os validem. O Processo de Enfermagem, enquanto metodologia utilizada na prática de Enfer-magem, permite ao Enfermeiro identifi -car as necessidades de cuidados de saúde dos utentes. Este processo tem sido con-ceituado como uma série de acções siste-matizadas direccionadas para a preven-ção e tratamento da doença e promoção da saúde, podendo ser resumida em cinco fases: a) A colheita de dados ou a identi-fi cação de problemas; b) Os diagnósticos de Enfermagem; c) O planeamento das atitudes terapêuticas e das intervenções de Enfermagem; d) A implementação; e) A avaliação de todo o processo (Monte et al, 2001). Poderemos considerar que este processo é muito semelhante ao utilizado num Processo de Melhoria Contínua da Qualidade, uma vez que identifi ca o pro-blema ou a situação a melhorar; planeia intervenções; executa-as e avalia (planear

– fazer – verifi car - agir). A Melhoria Con-tínua da Qualidade é considerada como um conjunto de actividades integradas e planeadas, que se inicia na medição do ní-vel dos cuidados prestados, defi nidos em termos de critérios (sejam eles critérios de efi ciência, efectividade, acessibilidade, ou outros) visando a introdução continu-ada de medidas correctoras, no sentido de se obter ganhos em saúde e aumento na satisfação dos utentes.

A IMPORTÂNCIA DE SE AVALIAR OS CUIDADOS DE ENFERMAGEMAvaliar a Qualidade dos cuidados de En-fermagem é um procedimento complexo, mas necessário. Os primeiros documen-tos sobre a avaliação dos Cuidados de Enfermagem remontam ao século XVIII, quando John Howard e Elisabeth Fry des-creveram a Qualidade dos cuidados pres-tados aos doentes nos hospitais (Sale, 1998). Também Florence Nighthingale, em 1850 avaliou os cuidados de Enferma-gem, na tentativa de melhorar os servi-ços prestados. Inclusivamente em 1895 foi criado o Royal College of Nursing Stan-dards of Care Project, com o objectivo de defi nir a fundamentação académica para a Qualidade dos cuidados e encorajar as Enfermeiras a formular e monitorizar essa Qualidade. Em 1963, Reiter defi niu um sistema baseado na classifi cação de doentes e, desde então a avaliação em Enfermagem se tornou uma preocupação dos Enfermeiros, sendo realizada de for-ma sistemática e estruturada. A maior parte dos instrumentos de ava-liação da Qualidade dos cuidados de En-fermagem têm sido desenvolvidos nos Estados Unidos e no Canadá. Um dos

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instrumentos incluí a Auditoria em En-fermagem de Phaneuf, que avalia a Qua-lidade dos cuidados prestados aos do-entes mediante análise do Processo de Enfermagem e o modo como aqueles a referem nos questionários após a alta e a abordagem de Donabedian, que divi-diu a avaliação da Qualidade de cuidados em diversos indicadores de estrutura, de processo e de resultados (Sale, 1998). No entanto, constatou-se que as auditorias, por si só, não promoviam uma melhoria contínua dos cuidados de Enfermagem, o que levou ao desenvolvimento e imple-mentação de sistemas de garantia e de melhoria contínua da Qualidade, com a identifi cação de um quadro conceptual e de critérios para avaliação da Qualidade dos cuidados.Actualmente, são vários os modelos con-ceptuais de avaliação dos cuidados de Enfermagem, no entanto poderemos descrever a sua metodologia de forma quase idêntica, já que o primeiro passo é descrever a fi losofi a que orienta a presta-ção dos cuidados; seguido da defi nição de objectivos; da identifi cação de normas e critérios; e da construção de indicadores (considerando a estrutura, o processo e os resultados).No nosso país, já se desenvolveram al-guns projectos nesta área, nomeadamen-te em 1984, com a implementação do Método de Avaliação da Qualidade dos Cuidados de Enfermagem Hospitalares (MAQCEH) nalgumas instituições, que viabilizou a introdução de melhorias na análise comparativa entre os cuidados prestados e as normas previamente es-tabelecidas. E agora, mais recentemente, em 2001, o Conselho de Enfermagem da Ordem dos Enfermeiros Portugueses de-

senvolveu esforços para defi nir uma es-tratégia de mecanismos que visassem a melhoria contínua da Qualidade, através de Padrões de Qualidade dos Cuidados de Enfermagem, onde foram defi nidas seis categorias de enunciados descritivos de Qualidade que orientam o Enfermeiro na procura contínua da excelência no seu exercício profi ssional, nomeadamente a satisfação do cliente, promoção da saúde, prevenção de complicações, ao bem-estar e autocuidado dos clientes, à readaptação funcional e organização dos serviços de En-fermagem (Ordem Enfermeiros, 2004:18). Estes enunciados norteiam a elaboração de indicadores de Qualidade no exercício profi ssional dos Enfermeiros.

CONSIDERAÇÕES FINAISPara que a Qualidade dos Cuidados de Enfermagem seja efectiva é necessário que o Enfermeiro se envolva no proces-so de Qualidade, e os gestores permitam o desenvolvimento de investigação, por equipas interdisciplinares, assumindo a evidência científi ca como única. Como refere Pisco (2001, p.37) “a prestação de cuidados de saúde de Qualidade tem como principais objectivos promover e manter a saúde da população, assegurar a satisfação dos utilizadores dos serviços de saúde e as-segurar que os recursos disponíveis são uti-lizados de uma forma efi ciente e racional”, exigindo uma sensibilidade e um aperfei-çoamento das competências profi ssio-nais dos prestadores de cuidados a todos os níveis, de forma a estruturarem os ser-viços de saúde de acordo com as neces-sidades e expectativas dos utentes e da população em geral. É fundamental um empenho na refl exão sobre o saber cien-

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tífi co, o saber técnico e principalmente sobre o saber ético, de forma a darmos resposta efectiva aos novos contextos de saúde. A Qualidade exige uma constante refl e-xão sobre a prática e uma enorme res-ponsabilidade do Enfermeiro perante a pessoa que é alvo dos seus cuidados. Sabemos que ainda é longo o caminho a percorrer, no entanto acreditamos que os ganhos em saúde sensíveis aos cuidados de Enfermagem nos exigem que façamos esse caminho com a competência e o pro-fi ssionalismo que nos é específi co.

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ESTRATÉGIAS NÃO FARMACOLÓGICAS NO CONTROLO DA DOR À CRIANÇA

ENTRADA DO ARTIGO JANEIRO 2012

RESUMO

Optou-se por um estudo transversal, descritivo

e de natureza quantitativa, com o objectivo de

controlar e aliviar a dor na criança hospitalizada

utilizando estratégias não farmacológicas selec-

cionadas (musicoterapia, distracção e massagem)

e avaliar a sua efi cácia, tendo como fundamen-

tação a perspectiva dos enfermeiros do serviço e

pais/acompanhantes das crianças. O instrumento

de colheita de dados utilizado foi um questioná-

rio dirigido aos enfermeiros e outro dirigido aos

pais. Os resultados revelaram que quanto menor

for os anos de serviço profi ssional em pediatria e

a idade dos enfermeiros maior importância atri-

bui à aplicação das estratégias não farmacológi-

cas no contexto da prática de enfermagem. Ao

utilizarmos as estratégias não farmacológicas ve-

rifi cámos que, os pais/ acompanhantes para além

de as aceitarem mostraram interesse em adquirir

novos conhecimentos e informações, colaboran-

do activamente durante a sua implementação e

que para além da importância que lhes atribuí-

ram também as consideraram mais efi cazes em

relação à utilização de técnicas farmacológicas.

Palavras-Chave: Estratégias não farmacológicas,

dor

ABSTRACT

NON-PHARMACOLOGICAL STRATEGIES IN PAIN

MANAGEMENT TO THE CHILD

We chose a cross-sectional, descriptive and quan-

titative, in order to control and relieve pain in

hospitalized children using non-pharmacological

strategies selected (music therapy, distraction

and massage) and evaluate their effectiveness,

with the reasoning in the perspective of service

nurses and parents / caregivers of children. The

data collection instrument used was a question-

naire sent to nurses and other directed to par-

ents. The results revealed that the lower the years

of professional service and age of the pediatric

nurses attributed more importance to the appli-

cation of non-pharmacological strategies in the

context of nursing practice. By utilizing the non-

pharmacological strategies found that parents /

caregivers as well as accept them showed inter-

est in acquiring new knowledge and information,

and collaborate actively in its implementation

and that in addition to the importance attributed

to them also considered more effective in relation

to use of pharmacological techniques.

Keywords: Non-pharmacological strategies, pain

ANABELA LAMBRANCA OLIVEIRA ROSALicenciada em Enfermagem

ANTÓNIA MARIA CANAVERDE CRISPIM HIPÓLITOLicenciada em Enfermagem

LURDES ABREU CARVALHO SEQUEIRAEnfermeira Especialista em Enfermagem de Saúde Infantil e Pediátrica a exercer funções no serviço de Pediatria do Hospital do Espírito Santo de Évora.

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INTRODUÇÃOA experiência da dor é universal, tem início precoce na vida de cada um e en-quanto experiência individual marca de forma variável a construção psicológica e social da pessoa. Pode ser resposta a um problema de saúde ou ser, ela mesma, o problema. O controlo da dor em pedia-tria é um desafi o dado a difi culdade das crianças em expressá-la e especifi cá-la. A dor e a ansiedade coexistem, portanto a combinação de técnicas farmacológicas e não farmacológicas torna-se essencial no controlo/alívio da dor na criança. O objec-tivo deste estudo consistiu em conhecer as perspectivas dos pais/acompanhantes e enfermeiros da área pediátrica durante a aplicação da musicoterapia, distracção (histórias e contos infantis) ou técnicas de relaxamento (massagem) avaliando a sua efi cácia no controlo e alívio da dor às crianças hospitalizadas.

CONCEITO E CARACTERIZAÇÃO DA DORSegundo Atkinson e Murray, citado por Caetano et al (2003:13), a dor “é uma sen-sação pessoal e particular do sofrimento físico, um estímulo nocivo que indica lesão ou dano tecidular actual ou eminente, um padrão de respostas que actuam para prote-ger o organismo contra o dano”. Para Burr, citado por Caetano et al (2003), a dor “é um fenómeno complexo, subjectivo e mul-tidimensional, difícil de aprender, defi nir, explicar ou medir”. As maiores diferenças nas manifestações de dor relacionam-se com a idade, por razões temperamentais e de aprendizagem. No bebé as reacções à dor são os movimentos corporais, as expressões faciais específi cas e padrões

de choro característicos; nas crianças in-cluem a localização da região dolorosa acompanhada de verbalizações de dor e desconforto. Segundo Almada (1992) a dor classifi ca-se tendo em conta a sua origem e localização (subcutânea ou su-perfi cial, profunda, visceral, psicogénica e psicofi siológica), a sua intensidade (li-geira, moderada, intensa, agónica), o seu tipo (aguda intensa, espasmódica, inter-mitente, constante) e à sua duração (agu-da, crónica).

AVALIAÇÃO DA DOR NA CRIANÇA A avaliação da dor é uma actividade inte-grante das funções e obrigações dos pro-fi ssionais de saúde por ser indispensável à excelência dos cuidados de saúde. Ob-servar a criança sem dor serve de parâ-metro para conhecê-la e facilitar a identi-fi cação de mudanças de comportamento que indiquem um quadro álgico. Não é possível estabelecer um padrão exacto para mensurar a dor, contudo existem escalas validadas e com utilidade clínica comprovada para utilização em crianças (Batalha, 2005). Existem dois métodos para avaliar a dor, por auto-avaliação (a própria criança avalia) ou por hetero-ava-liação (o enfermeiro ou os pais). Na pri-meira podem utilizar-se a escala de faces, a visual numérica e a visual analógica, en-quanto na segunda podem usar-se a es-cala de CRIES (critérios: choro, necessita de administração de oxigénio para satu-ração superior a 95%, maiores valores de sinais vitais, expressões, padrão de sono), a FLACC (critérios: face, pernas, activida-de, choro, consolabilidade) e a de Faces (Almada, 1992).Actualmente a avaliação, prevenção, con-

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trolo e tratamento da dor é uma priori-dade na prestação de cuidados á criança, consignada na Circular Normativa nº 9/DGCG de 14 de Junho de 2003, pois para além do direito a não sofrer, razões fi sio-patológicas resultantes de complicações associadas á dor não tratada e até econó-micas (abstinência á escola, aumento do tempo de internamento, da morbilidade e mortalidade) assim o justifi cam.Como fenómeno multidimensional e uni-versal, a dor exige dos enfermeiros uma resposta personalizada e abrangente para se obter a excelência nos cuidados de enfermagem prestados. Os enfermei-ros têm um papel importante no reconhe-cimento, avaliação e controlo da dor na criança hospitalizada, contribuindo para a antecipação de respostas/intervenções incorporando as técnicas não farmacoló-gicas para permitir o controlo efectivo e optimizado da dor em pediatria (Batalha, 2005). Como estratégias não farmacoló-gicas entende-se “as técnicas que visam a assistência á saúde/doença, seja na pre-venção ou tratamento sem o recurso a medidas farmacológicas” (Trovo, 2003).

MUSICOTERAPIAÉ uma ciência aplicada por pessoa qua-lifi cada como uma intervenção terapêu-tica, para estimular mudanças positivas em quatro áreas das funções humanas: cognitiva, física, psicológica e social, po-dendo ser aplicada desde a vida intra--uterina até crianças em idade escolar. A música foi usada como forma de cura no início de 1800, quando Florence Nightin-gale observou o efeito benéfi co da voz humana na recuperação dos utentes (Ca-ramelo, 2005). No fi nal do século XIX um

número crescente de investigadores ini-ciou estudos sistemáticos sobre a música, observando o seu relacionamento com as respostas fi siológicas e psicológicas do organismo (Gasparini, 2006). Durante a II Guerra Mundial a musicoterapia tornou--se ofi cialmente reconhecida com fi ns terapêuticos para ser usada em hospitais na assistência aos doentes feridos (Gas-parini, 2006). A música “relaxa e tranqui-liza as crianças (...), os sons evocam fan-tasia, imaginação e mesmo transforma-ção” (Watson, 2002), contribuindo assim para reduzir o stress e a dor, pois o utente “aprende a distrair-se da dor, orientando a sua percepção para a música, isto é pos-sível porque a dor e a música mobilizam as mesmas regiões do cérebro para serem processadas (Gasparini, 2006). Quando a dor é aguda e persistente poder-se-á aplicar música suave, calma e com som baixo de modo a permitir o relaxamento. Quando a dor é traumática poder-se-á aplicar músicas infantis do conhecimen-to da criança e de acordo com o seu gosto de modo a permitir a distracção. Segun-do Baptista (1999) “a musicoterapia não elimina as farmacoterapias mas pode, associando-se a elas, permitir a redução das dores”.

DISTRACÇÃOÉ um modo útil de ajudar a aliviar a dor aguda, bem como aquelas que persistem por longos períodos, tanto na idade pré--escolar como na escolar. O que se pre-tende é propor ou sugerir à criança uma situação atraente e envolvente para conseguir concentrar a sua atenção, de modo a que os estímulos nóxicos fi quem em segundo plano e sejam esquecidos ou

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a sua percepção seja menos intensa (Albu-querque, 2000). Um livro de histórias cur-tas, contadas com palavras fáceis de ler e entender, ilustrado com imagens que fa-lam da história, das personagens e da ac-ção que estão a ser lidas e mostradas, que façam pensar em coisas novas, que infor-me, que faça rir de verdade, que seja en-graçado, que faça brincar com as mãos é como que o cenário ideal para despertar a criança, abstraindo-a do que sente… a dor! (Bettelheim, 1998). Na História Favorita um gesto tão simples como ler um conto pode ser a ponte perfeita para despertar o interesse e conseguir minimizar a atenção na dor. Na Imaginação Guiada a criança imagina o seu conto de fadas, faz a sua his-tória de castelos e princesas conseguindo colocar-se num local a seu gosto, no meio de personagens favoritas; não esqueça-mos que as crianças dão vida a tudo, para elas o sol é vivo, a lua é viva (Bettelheim, 1998). A criança identifi ca-se com os seus heróis, podendo assim superar o medo e a dor sendo forte e identifi cando-se com o adulto, abstraindo-se assim da sua reali-dade de dor ou mal-estar, contudo distrair não pode signifi car desvalorizar, ignorar ou menosprezar os sentimentos e percep-ções da criança, que necessita de alguém em quem confi ar e lhe assegure que a vai acompanhar (Albuquerque, 2000).

MASSAGEMÉ o uso de diversas técnicas manuais, cujo objectivo é promover o alívio da dor, ocasionando o relaxamento. A massagem para bebés é conhecida como um meio ideal de promoção da comunicação táctil, exercendo um efeito benéfi co sobre o de-senvolvimento, agilidade e estado emo-

cional. É benéfi co o uso da massagem em todos os bebés e crianças pequenas, sen-do útil em bebés com cólicas, que choram frequentemente, em bebés hipersensí-veis a estímulos externos, bebés irritáveis e com distúrbios do sono (Sousa, 1999). Como benefícios da massagem nos pais temos: conhecimento do bebé; vínculo; aumento da confi ança; melhor comuni-cação; relaxamento; diminuição da ansie-dade e do stress.Desde tempos remotos que os humanos primitivos já tinham conhecimento que a fricção vigorosa de uma área lesionada ali-viava a dor. A fricção estimula mecanorre-ceptores cutâneos e estes sinais aferentes são capazes de bloquear a transmissão – e provavelmente a percepção – dos sinais nociceptivos (dolorosos) (Sousa, 1999).

MÉTODOSDepois de reunida a matéria-prima des-te processo de investigação optou-se por um estudo transversal, descritivo e de na-tureza quantitativa. Dado o carácter do estudo e objectivos com que foi elabora-do, a população alvo do estudo foram to-dos os enfermeiros que exercem funções no serviço de pediatria do Hospital do Espírito Santo de Évora e pelos pais das crianças internadas no referido serviço durante o período de aplicação do instru-mento de colheita de dados. No entanto e por motivo de férias, baixas de saúde e indisponibilidade de aplicação das estra-tégias não farmacológicas, apenas alguns enfermeiros responderam ao questioná-rio. Os pais responderam na sequência da aplicabilidade das estratégias não far-macológicas. Na escolha do Instrumento de colheita de dados utilizou-se o ques-

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tionário, o qual foi aplicado de forma vo-luntária e anónima. Para o nosso estudo foram elaborados dois questionários, um dirigido aos enfermeiros, outro aos pais/ acompanhantes das crianças internadas. O questionário dirigido aos enfermeiros foi constituído por sete questões fecha-das e duas abertas. O questionário dirigi-do aos pais/ acompanhantes foi constitu-ído por oito questões fechadas. Os dados foram tratados manual e informatica-mente (SPSS versão 13.0). Relativamente às questões abertas, foi efectuada uma análise de conteúdo, recorrendo-se a ca-tegorização a posteriori.

APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOSDurante o tratamento e análise dos da-dos em estudo iniciamos uma análise univariada sobre a importância atribuída pelos enfermeiros à aplicação de estraté-gias não farmacológicas no controlo da dor à criança, a sua contribuição para a melhoria dos cuidados de enfermagem e se estas deverão fazer parte dos cuidados de enfermagem, da qual obtivemos os se-guintes resultados:- Quanto à importância da aplicação de estratégias não farmacológicas de con-trolo da dor na criança destaca-se uma maioria de opiniões referindo serem mui-to importantes (78,6%);- Quanto à aplicabilidade das estratégias não farmacológicas no controlo da dor à criança verifi camos, que a maioria dos enfermeiros (85,7%) considera que con-tribuem muito para a melhoria dos cui-dados de enfermagem (Gráfi co nº 1);- Relativamente à opinião dos enfermeiros se as estratégias não farmacológicas no

controlo da dor à criança deverão fazer par-te dos cuidados de enfermagem, constata-mos que a maioria dos enfermeiros (85,7%) respondeu afi rmativamente (Gráfi co nº 2).

Gráfi co nº1 – Distribuição dos enfermeiros segundo a aplicabilidade atribuída às estratégias não farmacológicas no controlo da dor à criança e a sua contribuição para a melhoria dos cuidados de enfermagem

0

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6

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12

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muito pouco Total

Gráfi co nº2 – Distribuição dos enfermeiros segundo a sua opinião se as estratégias não farmacológicas no controlo da dor à criança, deverão fazer parte dos cuidados de enfermagem

0

2

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6

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10

12

14

sim nao Total

Foram ainda incluídas no nosso questio-nário perguntas de resposta aberta para sabermos em que situações deveriam ser utilizadas as estratégias não farmacológi-cas e constatamos que a maioria dos enfer-meiros respondeu que as estratégias não farmacológicas deveriam ser utilizadas em qualquer procedimento doloroso efectua-do. Ao realizar um cruzamento bivariado en-tre o tempo de exercício profi ssional em unidades de pediatria e a idade dos profi s-

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sionais, com a importância atribuída à apli-cação das estratégias não farmacológicas no controlo da dor à criança hospitalizada obtivemos os seguintes resultados:- Relacionando o tempo de exercício profi s-sional em unidades de pediatria com a im-portância atribuída à aplicação das estraté-gias não farmacológicas verifi camos que é na categoria dos 0-5 anos de serviço que é considerada muito importante (75%);- Relacionando a idade dos enfermeiros inquiridos com a importância atribuída à aplicação das estratégias não farmacoló-gicas no controlo da dor à criança verifi -camos que a totalidade dos enfermeiros (100%) no grupo etário dos 20-30 anos as considera muito importantes.Quanto aos pais inquiridos, no que se refere ao conhecimento sobre estraté-gias não farmacológicas no alívio da dor à criança, constatamos que a maioria (76,9%) tem conhecimento sobre as mes-mas, e que 46,1% dos pais, refere que as estratégias não farmacológicas são mui-to importantes. No que se refere à sua implementação, verifi camos que 84,6% dos pais são da opinião que a mesma é muito importante. Na aplicação da estra-tégia não farmacológica verifi camos que 84,6% dos pais considerou-a efi caz no controlo da dor à criança (Gráfi co nº 3).

Gráfi co nº 3 – Distribuição dos pais/ acompanhantes quanto à efi cácia da estratégia não farmacológica aplica-da no controlo e alívio da dor à criança.

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sim nao Total

CONCLUSÃOAtravés da realização do presente estu-do, tendo em conta os objectivos, após aplicação do questionário e análise e interpretação dos resultados conclui--se que quanto menor forem os anos de serviço profi ssional em pediatria e a ida-de dos enfermeiros maior importância atribuem à aplicação das estratégias não farmacológicas no contexto da prática de enfermagem. Conclui-se que a maioria dos enfermeiros sente satisfação por ve-rifi carem que estas estratégias começam a fazer parte dos cuidados de enferma-gem, atribuindo-lhe assim aplicabilidade e importância. Ao utilizarmos as estra-tégias não farmacológicas verifi cámos que, os pais/ acompanhantes para além de as aceitarem mostraram interesse em adquirir novos conhecimentos e informa-ções, colaborando activamente durante a sua implementação e que para além da importância que lhes atribuíram também as consideraram mais efi cazes em relação à utilização de técnicas farmacológicas.

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A CRIANÇA NÃO É UM ADULTO EM PONTO PEQUENO

ENTRADA DO ARTIGO JULHO 2008

RESUMO

A criança não é um adulto em ponto pequeno...

apresenta características próprias da menoridade.

Este trabalho pretende, de algum modo, ajudar o

enfermeiro a relembrar e a aprofundar o seu co-

nhecimento sobre as idiossincrasias desta faixa

etária. Segundo uma pesquisa bibliográfi ca orien-

tada por uma lógica funcional do organismo, ten-

tou-se mostrar algumas das especifi cidades aná-

tomo-fi siológicas de recém-nascidos, lactentes e

crianças, sugerindo simultaneamente acções de

enfermagem conscientes dessas características

próprias da faixa etária.

Em contexto de trabalho, constata-se que é pouco

signifi cativo o conhecimento científi co relativo à

menoridade adquirido na licenciatura de enfer-

magem, nomeadamente nas particularidades do

sistema nervoso central, do aparelho cardiovas-

cular, do aparelho respiratório, do fígado e do rim.

Palavras-Chave: diferenças anátomo-fi siológicas,

SNC, aparelho cardiovascular, aparelho respirató-

rio, rim, termorregulação

ABSTRACT

A CHILD IS NOT AN ADULT IN SMALL SIZE ….

HAS THE CHARACTERISTICS PROPER OF MI-

NORITY.

This work pretends to help Nurses remembering

and deepening their knowledge on the idiosyncra-

sys of this age. According a bibliographic research

oriented on a functional logic of the human body,

I tried to show some of the physiological-anatom-

ic own characteristics of the newly borns, babys

until one month of age and children, suggesting

simultaneously some nursing procedures aware

of that self characteristics.

In hospital environment, one can easily realise

that is very few the scientifi c knowledge regard-

ing minority, acquired in Nursing degree, mostly

in what respects the Central nervous system, the

cardiac-vascular system, the breath system, the

liver and the kidney.

Keywords: child, adult differences

LILIANA SANTOSEnfermeira no Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia e Espinho, EPE - Bloco Operatório. Pós-graduação em enfermagem de Anestesiologia e especializada em enfermagem Médico-Cirúrgica

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INTRODUÇÃOÉ importante refl ectir na formação de cinco anos de um enfermeiro e reco-nhecer que a mesma, em contexto hos-pitalar, é totalmente direccionada para os serviços de internamento de adultos. Esta lacuna da licenciatura em Enferma-gem é responsável pela morosidade na aquisição de competências nos serviços de bloco operatório, cuidados intensi-vos, neonatologia, urgência e pediatria. A assumpção deste handicap é funda-mental para quem inicie ou já desempe-nhe funções nos serviços anteriormente mencionados.O meu percurso profi ssional iniciou-se no Bloco Operatório com a valência de Pediatria Cirúrgica. Para além de todas as difi culdades inerentes à especifi cida-de do bloco operatório, as difi culdades na área da Pediatria foram as que mais se fi zeram sentir. Apenas socorrendo--me dos conhecimentos dos colegas mais experientes, pesquisas bibliográ-fi cas e com a frequência de uma Pós--graduação em Enfermagem de Aneste-siologia, fui conseguindo desmistifi car todos os medos associados à menorida-de e evitar erros potencialmente gra-ves. A partilha de conhecimentos da anátomo-fi siologia deste escalão etá-rio promove o sucesso do trabalho em equipa.

DIFERENÇAS ANÁTOMO-FISIOLÓGICASA menoridade subdivide-se em diferen-tes escalões: prematuros (menos de 37 semanas de gestação), recém-nascidos (menos de 30 dias de idade), lactentes (1-12 meses de idade) e crianças (1-18 anos de idade).

SISTEMA NERVOSO CENTRALNo momento que sucede ao nascimento, os fármacos lipossolúveis têm uma acção quase instantânea, na medida em que a barreira hemato-encefálica está incom-pleta. Esta elevada permeabilidade e a falta de mielização provocam a acumu-lação de fármacos como os barbitúricos e os opióides no sistema nervoso central, especialmente dos prematuros e recém--nascidos. Um mau doseamento dos fár-macos contribui para uma rápida depres-são respiratória, difícil de reverter em comparação com um adulto.

APARELHO CARDIOVASCULARNo recém-nascido, a estrutura miocár-dica envolvida na contractibilidade está signifi cativamente menos desenvolvida do que no adulto. Esta imaturidade con-fere pouca distensibilidade aos ventrícu-los e má tolerância quer às sobrecargas de volume quer ao aumento do afterload.No recém-nascido e no lactente, o volu-me de ejecção é relativamente fi xo, o débito cardíaco depende sobretudo da frequência cardíaca. Embora a frequên-cia cardíaca basal seja mais elevada, a ac-tivação do sistema nervoso parassimpá-tico, a dose excessiva de anestésico ou a hipóxia podem provocar bradicardia profunda e diminuição do débito cardí-aco. No recém-nascido e no lactente, a resposta do sistema cardiovascular à hi-povolémia é constituída por hipotensão sem taquicardia.

APARELHO RESPIRATÓRIOAs diferenças anatómicas entre a via aé-rea do adulto e da criança afectam a ven-

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tilação com a máscara facial e a intuba-ção traqueal.Até cerca dos 2 anos, os músculos inter-costais e o diafragma são defi cientes em fi bras musculares tipo I (são estas que proporcionam a capacidade de realizar exercício repetido). A parede toráxica cartilagínea tem uma alta compliance, apesar do número reduzido das pequenas vias aéreas e alvéolos. A combinação des-tes dois traduz-se numa reserva limitada de oxigénio para períodos de apneia e um aumento da probabilidade de ocorrência de atelectasias.O recém-nascido e o lactente apresentam uma cabeça proporcionalmente maior do que a do adulto e o occipital proeminente. Estas diferenças anatómicas infl uenciam a técnica anestésica. Um occipital proe-minente conduz a uma fl exão da cabeça antes da intubação. Esta situação deve ser corrigida elevando-se ligeiramente os ombros com um rolo de silicone ou com um lençol enrolado em forma tubular.A língua é grande para o tamanho da oro-faringe, o que aumenta a probabilidade de obstrução das vias aéreas e da ocor-rência de difi culdades na intubação tra-queal. A utilização de um tubo de Guedel facilita a ventilação com a máscara facial.A epiglote é mais curta e mais larga do que a do adulto, tem a forma em U e está frequentemente angulada sobre a larin-ge, o que difi culta o seu controle com a lâmina do laringoscópio. No recém-nas-cido e no lactente, a utilização de larin-goscópios equipados com lâminas rectas poderá facilitar a intubação traqueal.A laringe tem uma posição mais anterior e mais alta no pescoço do que no adulto (ao nível da C3 no prematuro e ao nível da C4 nas outras crianças) - este factor

contribui para uma respiração quase obrigatoriamente nasal nos lactentes.A escolha do tubo endotraqueal é muito importante porque um tubo demasiado largo provocará pressão sobre a super-fície interna da cartilagem cricóide, con-duzindo a um edema que poderá levar a obstrução da via aérea na extubação.Nas crianças com idade inferior a 10 anos deve-se usar tubos endotraqueais sem cuff (com diâmetro interno maior do que no tubo com cuff), que permitam uma pequena fuga com pressão de insufl ação de 20 mmHg, com objectivo de minimi-zar o risco de barotrauma acidental. O diâmetro interno do tubo endotraqueal é inicialmente estimado por uma fórmula baseada na idade. No quadro I faz-se uma correspondência entre a idade da criança e o tubo endotraqueal adequado:

Prematuro 2,5 – 3,0 mm

RN – 6 meses 3,0 – 3,5 mm

6 meses – 1 ano 3,5 – 4,0 mm

1 – 2 anos 4,0 – 5,0 mm

> 2 anosUsar a fórmula

4 + (idade / 4)

Por uma questão de segurança é impor-tante disponibilizar os tubos endotraque-ais com o intervalo de 0,5 mm de diâmetro superior ou inferior ao escolhido para a in-tubação. Isto é, se o tubo escolhido para a intubação for um de 3,5 mm, é impor-tante estar disponível o tubo endotraque-al com diâmetro superior, ou seja, o de 4 mm e o de diâmetro inferior, o de 3 mm . O quadro I e a fórmula servem somente de orientação, a confi rmação é fornecida pela fácil passagem para dentro da larin-ge e pelo desenvolvimento de uma fuga de

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gás com pressão de 20 mmHg. A ausência dessa fuga indica um tamanho excessivo do tubo que deve ser substituído para evi-tar edema pós-operatório. Por outro lado, uma fuga excessiva pode impedir uma ventilação adequada e contaminar a sala de cirurgia com gases anestésicos.Os recém-nascidos e os lactentes não res-pondem à hipoxia e à hipercapnia com o aumento da ventilação. Ao contrário do que acontece nos adultos, estes facto-res podem até deprimir a ventilação. A margem de erro nos doentes pediátricos é mínima, levando a que a capnografi a e a oximetria de pulso assumam um papel essencial na monitorização.A ventilação alveolar/min está aumenta-da, relativamente à do adulto, de modo a satisfazer este aumento das necessi-dades de oxigénio. O aumento da venti-lação alveolar é conseguido através do aumento da frequência respiratória.

O FÍGADONo nascimento, o pH gástrico é alcalói-de, tornando-se semelhante ao do adulto pelo 2º dia de vida. Até ao 4º e 5º mês de vida, a coordenação entre a deglutição e a respiração é defi ciente e a incidência de refl uxo gástrico-esofágico é alta.A maioria dos sistemas enzimáticos ne-cessários ao metabolismo de fármacos estão completamente desenvolvidos, mas ainda não foram induzidos (estimulados pelos agentes que irão metabolizar). A semi-vida de eliminação de fármacos me-tabolizados pelo fígado do recém-nascido é maior do que no adulto. Posteriormen-te, a capacidade de metabolizar fármacos vai aumentando porque– Aumenta o fl uxo sanguíneo hepático

(maior quantidade de fármaco é trans-

portado até ao fígado)– Os sistemas enzimáticos vão sendo in-

duzidos

Os níveis plasmáticos de albumina e de outras proteínas necessárias à ligação de fármacos são menores no recém-nascido de termo (e ainda menores no prematu-ro) do que no adulto, situação que conduz a maiores níveis de fármaco livre (fracção activa do fármaco).

O fígado do recém-nascido tem reser-vas mínimas de glicogénio – tendência para a hipoglicemia e a acidemia. Os re-cém-nascidos que apresentam maiores riscos de hipoglicemia são os de baixo peso para a idade gestacional, os pre-maturos e os fi lhos de mãe diabética.

Hipoglicemia:• RN – Glicemia‹30mg/dl• Lactente – Glicemia‹40mg/dl

O RIMO rim do RN caracteriza-se por imaturi-dade das funções glomerular e tubular:– Taxa de fi ltração glomerular diminuída– Excreção de sódio diminuída– Diminuição da capacidade de concen-

tração e diluiçãoEstas alterações aumentam a importân-cia de uma atenção meticulosa na admi-nistração de líquidos nos primeiros dias de vida.

A TERMORREGULAÇÃOO lactente é particularmente vulnerável à hipotermia devido à menor espessura da pele e às reservas limitadas de gordura.Nos primeiros 3 meses de vida, o principal

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mecanismo de produção de calor não é o shivering, mas antes, a termogénese celu-lar (metabolismo da gordura castanha). Este tipo de gordura localiza-se principal-mente em torno da omoplata, no medias-tino e à volta das glândulas supra-renais e dos rins.Durante a anestesia a probabilidade de ocorrência de hipotermia é grande devi-do:– Temperatura das salas operatórias– Exposição cirúrgica– Administração endovenosa de fl uidos

não aquecidos– Administração de gases não humidifi -

cados e sobretudo não aquecidos– Efeito directo dos anestésicos sobre a

regulação da temperatura

A hipotermia pode acarretar vários tipos de complicações:– Despertar tardio da anestesia– Irritabilidade cardíaca– Depressão respiratória– Aumento da resistência vascular pul-

monar– Alteração na resposta aos fármacos

É extremamente importante monitorizar a temperatura da criança no intra-opera-tório. Os meios utilizados para reduzir a perda de calor são:– Aumentar a temperatura da sala– Envolver a cabeça e as extremidades da

criança em algodão ou compressas– Utilizar lençóis de aquecimento e/ou

colchão térmico– Aquecimento e humidifi cação dos ga-

ses inspirados– Aquecimento dos fl uidos endovenosos

CONCLUSÃOAs alterações anátomo-fi siológicas da menoridade mais signifi cativas aqui re-tratadas foram:

Diferenças anátomo-

fi siológicas

Alterações estruturais/ Res-posta Fisiológica

Cuidados de Enfer-magem

Sistema Ner-voso Central

A barreira he-mato-encefálica está incompleta

Atenção redobrada no doseamento dos fármacos.

Aparelho cardiovas-cular

A resposta à hipovolémia é a hipotensão sem taquicardia

Controlo no balanço hídrico e nas perdas sanguíneas

Aparelho respiratório

Ausência de re-sposta à hipóxia e à hipercapnia, com o aumento da ventilação.

A capnografi a e a oximetria de pulso são fundamentais na monitorização

O rimImaturo na fun-ção glomerular e tubular

Administração de líquidos nos pri-meiros dias de vida.

A termor-regulação

Espessura da pele reduzida

Monitorizar a tem-peratura da criança criança no intra-operatório e utilizar utilizar meios ad-equados para reduzir as perdas de calor

BIBLIOGRAFIA

Jr., G. Edward Morgan, Mikhail, Maged S., Anestesiolo-gia Clínica, Rio de Janeiro, Livraria e Editora Revinter Lda, 2003, pp. 698-702

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CUIDADOS DE ENFERMAGEM IMEDIATOS AO RECÉM-NASCIDO:

DO EXAME FÍSICO AO NEUROLÓGICO

ENTRADA DO ARTIGO JUNHO 2011

RESUMO

Imediatamente após o parto, e ainda na própria

sala de partos, deve-se efectuar um exame físico

sumário ao recém-nascido para se eliminar a exis-

tência de algum problema grave que necessite

de uma intervenção urgente, devendo-se repetir

posteriormente o exame com maior rigor, normal-

mente ao longo das primeiras 24 horas. Durante

esta avaliação, de preferência realizada em condi-

ções de iluminação e temperatura óptimas para o

exame, deve-se proceder a uma observação geral

do recém-nascido que compreende a componente

física e neurológica. Este artigo tem como objecti-

vo descrever as etapas do exame físico e neurológi-

co do recém-nascido, a fi m de assegurarmo-nos do

bom estado geral do recém-nascido, do despiste de

lesões, anomalias e malformações que necessitem

de tratamento de urgência. Por outro lado orienta

a tomada de decisão em relação às intervenções a

prestar ao recém-nascido.

Palavras-Chave: Exame físico; Exame neurológico;

Recém nascido; Cuidados de Enfermagem

ABSTRACT

Immediately after delivery, should be performed

in the delivery room itself a physical examination

of the newborn to eliminate the existence of a

serious problem that require urgent action, that

should be repeated more rigorously, usually over

the fi rst 24 hours. During this evaluation, pref-

erably carried out at optimum temperature and

lighting for the exam, a general observation of

the newborn should be made that includes physi-

cal and neurological component. This article aims

to describe the stages of physical and neurologi-

cal examination of the newborn in order to assure

the good general state of the newborn, screening

of injuries and congenital anomalies that require

emergency treatment. On the other hand guides

the decision making process, regarding interven-

tions to provide to the newborn.

Keywords: Physical Examination, Neurological

Examination, Newborn; Nursing Care

ARMINDA PEREIRAEnfermeira especialista em Saúde Materna e Obstetrícia.Mestre em Ciências de Enfermagem.

EVA TANQUEIROProfessora Assistente na Escola Superior de Saúde da Cruz Vermelha Portuguesa. Especialista em saúde materna e obstetrícia e Doutoranda em Psicologia da Saúde.

MANUELA NÉNÉDoutorados em Psicologia da Saúde e da Educação, professores coordenadores na Escola Superior de Saúde da Cruz Vermelha Portuguesa.

JOSÉ VILELASDoutorados em Psicologia da Saúde e da Educação, professores coordenadores na Escola Superior de Saúde da Cruz Vermelha Portuguesa.

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INTRODUÇÃOO nascimento é o acto mais sublime da vida do ser humano, que envolve não apenas um contexto técnico mas essencialmente humano, ao qual estão associados aspectos familiares, demográfi cos, sociais e políti-cos. Ao nascer, a criança é um ser particu-larmente frágil, necessitando de cuidados a fi m de lhe permitirem uma boa transição para a vida extra-uterina. Vamos pois de-bruçarmo-nos sobre os cuidados a prestar ao recém-nascido logo após o nascimento e a avaliação completa e sistemática que o enfermeiro deve efectuar nesta fase de vul-nerabilidade. Desta avaliação fazem parte os cuidados imediatos ao recém-nascido após o seu nascimento e, o exame físico e neurológico, os quais devem repetir-se até à alta hospitalar, com especial atenção para o signifi cado das variações identifi cadas, pode afectar a adaptação do recém-nasci-do. Antes do nascimento, o enfermeiro de-verá conhecer os antecedentes obstétricos da grávida para avaliar o grau de risco da gravidez e do parto. Cabe a este profi ssio-nal acompanhar a evolução do trabalho de parto, atendendo às manobras obstétricas efectuadas e medicação administrada, com a fi nalidade de antecipar os potenciais pro-blemas perinatais. O profi ssional de saúde deve antecipadamente preparar e verifi car a funcionalidade de todo o material ne-cessário à recepção do recém-nascido e à prestação dos cuidados imediatos, devendo também garantir que o ambiente da sala se mantenha aquecido tendo em conta a imaturidade do recém-nascido. A manipu-lação do recém-nascido deve se feita com assepsia, pelo que o enfermeiro deve utili-zar luvas esterilizadas (Campos et al., 2008) e o restante material também. Logo após o nascimento deve ser efectuado um exame

físico, a fi m de nos assegurarmos do bom estado geral do recém-nascido, do despiste de lesões, anomalias e malformações que necessitem de tratamento de urgência. A realização do exame neurológico, também é importante permitindo obter o grau de maturidade neurológica do recém-nascido, bem como uma detecção das patologias neurológicas ou sistémicas que repercu-tem no sistema nervoso central no período perinatal, estabelecendo a sua topologia.

CUIDADOS IMEDIATO AO RECÉM-NASCIDOO recém-nascido possui uma massa corpo-ral muito pequena para produzir e conser-var o calor, poucas habilidades para con-servar o calor por meio de mudanças de posição e nenhuma habilidade para ajustar o vestuário às alterações de temperatu-ra. Assim, cabe ao enfermeiro desenvolver um conjunto de intervenções com vista à manutenção da temperatura corporal do recém-nascido dentro dos parâmetros nor-mais: manter o ambiente da sala de partos entre 36,1ºC e 36,7ºC; aquecer previamente 2 toalhas esterilizadas (uma para limpar o liquido amniótico do recém-nascido e ou-tra para o envolver após o limpar), bem como a roupa do recém-nascido; manter uma fonte irradiante de calor sobre a mesa onde são prestados os cuidados ao recém--nascido. Manter o recém-nascido envolvido em lençóis aquecidos, protegendo a cabeça de forma a reduzir as perdas de calor por evaporação (sobretudo no pré-termo). Após estabilização da temperatura, pode-se usar água ou soro fi siológico para remover o san-gue da face e cabeça, tendo em atenção de não remover o vérnix caseoso (substância branca, espessa e oleosa que recobre a pele

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dos recém-nascidos de termo, que constitui um excelente hidratante). A lavagem total do recém-nascido na sala de partos está apenas indicada nas situações de risco de transmissão vertical de doenças infecto--contagiosas – VIH, hepatite B e C e no re-cém-nascido banhado em mecónio espesso. Segue-se a identifi cação através de uma pulseira tradicional ou electrónica, colocada no punho ou membro inferior. Esta não deve fi car demasiado apertada nem ser possível retirar. Na pulseira deve constar o nome da mãe e o número do processo clínico deven-do o seu preenchimento ser efectuado pelo enfermeiro que presta os cuidados imedia-tos. A fi m de prevenir a doença hemorrági-ca, faz-se a administração de vitamina K por via intra-muscular na primeira hora após o nascimento (Hansen et al., 2003) (1mg no recém-nascido com mais de 1000 gr ou 0,5 mg com peso inferior a 1000kg). Deve-se fazer a profi laxia da oftalmia purulenta do recém-nascido (Profi laxia de Credé), a qual pode levar à cegueira. Utiliza-se para o efei-to a administração de gotas ou de pomada oftálmica de cloridrato de oxitetraciclina nos dois olhos, devendo o excesso ser re-movido (Isenberg et al., 2003). A respiração deve estar estabelecida ao fi m do 1º minuto. Portanto se houver secreções e ao 1º minuto o recém-nascido não estiver a chorar, deve--se aspirar a orofaringe e posteriormente as fossas nasais (Campos et al, 2008), utilizan-do uma sonda de aspiração fi na de calibre CH 6 a CH 8, conectada a um aspirador de baixa pressão (50 a 100 mmhg). Neste período inicial, o enfermeiro deverá determinar o índice de Apgar, monitorizar os sinais vitais e as medidas antropométri-cas à medida que observa minuciosamente o recém-nascido, efectuando o exame físico completo com o objectivo de detectar alte-

rações anatómicas e determinar o estado de saúde do neonato. A avaliação do Índice de Apgar ao primeiro e quinto minutos de vida é um método utilizado universalmen-te para determinar a estabilidade clínica do recém-nascido à vida extra-uterina, des-crito por Virgínia Apgar em 1953. Os parâ-metros clínicos são a frequência cardíaca, respiração, tónus muscular, irritabilidade refl exa e coloração da pele, como ilustra o quadro n.º 1. Cada item é classifi cado de 0 a 2. Se o somatório for superior a 7 considera-se que o recém-nascido tem boa vitalidade; quando o valor está compreen-dido entre 5 e 7 apresenta depressão ligei-ra; entre 3 e 4 indica depressão moderada e se menor a 3 classifi ca-se como depressão grave, que necessitará de manobras de re-animação, (Graça, 2005; Hockenberry; Wil-son e Winkelstein, 2006).

Quadro n.º 1: Índice de Apgar

0 1 2

F r e q u ê n c i a Cardíaca

Ausente < 100 ppm > 100 ppm

Respiração AusenteIrregular, len-to, choro fraco

Regular, choro forte

Tónus mus-cular

HipotoniaLigeira fl exão das extremi-dades

Movimentos activos

Irritabilidade refl exa

Ausente Careta Choro forte

Coloração da pele

Cianótica ou pálida

Corpo rosado, extremidades cianóticas

C o m p l e t a -mente rosado

O enfermeiro deverá ter presente que o índice de Apgar é infl uenciado pela ima-turidade fi siológica do neonato, infecção, malformação congénita, sedação ou anal-gesia materna e alterações neuromuscu-

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lares (Hockenberry; Wilson e Winkelstein, 2006). Independentemente destas situa-ções e de acordo com o índice de Apgar, ao 1º minuto, impõem-se um conjunto de cuidados a prestar ao recém-nascido: quadro 2.

Quadro 2 - Medidas a serem empregues para os recém--nascidos, de acordo com o índice de Apgar.

APGAR INTERVENÇÕES

9-10

Secar a pele da criança e protegê-la contra a perda de calor; Avaliar o Apgar aos 5 minutos para assegurar-se das boas condições do recém--nascido.

7-8

Secar a pele para prevenir a perda de calor; As-pirar o muco da boca e nariz quando indicado; Administrar oxigénio por máscara ao rn se neces-sário; Estimular o choro; Avaliar o Apgar aos 5 minutos analisando a melhoria do estado geral.

4-5-6

Secar a pele e colocar em ambiente aquecido; As-pirar as vias aéreas superiores; Administrar oxi-génio por máscara; Estimular o choro; Esperar a melhoria imediata se tal não acontecer continuar com a ventilação.

1-2-3

Fornecer calor de preferência irradiante; Aspi-rar o muco das vias aéreas. Usar laringóscópio e a entubação traqueal quando se suspeitar de obstrução; Administrar imediatamente oxigénio por máscara, e verifi car a insufl ação pulmonar; Estimular uma respiração profunda e o choro; Aguardar a melhoria da situação; Caso não ocor-ra melhoria nos próximos cinco minutos, consi-derar a necessidade de corrigir a acidose e a hi-povolémia. Perfundir glicose.

Antes de avançarmos para o exame fí-sico, jamais poderíamos deixar de abor-dar a importância do estabelecimento duma relação precoce durante todo este processo. O contacto físico da mãe--pai/fi lho é de grande importância para o desenvolvimento da criança. À mãe/pai não deve ser apenas dada a possi-bilidade de ver e tocar o seu fi lho(a),

mas acima de tudo devemos estimular esta relação o mais precocemente pos-sível (Brazelton & Cramer, 1993). Para além da grande ansiedade que os pais sentem até poderem tocar nos seus fi -lhos, é importante que eles conheçam o seu fi lho real e possam confrontar com o seu fi lho ideal. É neste momento que o enfermeiro tem um papel primordial na ajuda e apoio ao estabelecimento desta relação, não somente no seu estímulo, como também na orientação e ensino dos pais, ávidos de querer saber, e tocar no seu fi lho (Davis & Elliman, 2008). O início da amamentação deve ser o mais precoce possível, tendo sempre em consideração o desejo da mãe em ama-mentar e/ou a não existência de contra--indicações (Martinho & Leal, 2004). O recém-nascido deve ser colocado ao peito da mãe a fi m de permitir o esta-belecimento precoce da relação mãe/fi lho, de estimular a produção de leite e de prevenir a hipoglicémia do recém--nascido (Cornblath & Ichord, 2003) O momento em que os pais contactam com o seu fi lho é importante, pois pode fornecer dados sobre os conhecimentos que eles possuem e as necessidades in-formação que têm, com vista a estabe-lecer um plano de cuidados. Durante a permanência do recém-nascido na sala de partos, no puerpério imediato (2 a 4 horas pós dequitadura), deve manter-se uma observação cuidadosa, com parti-cular incidência na detecção de gemido ou de outros sinais de difi culdade respi-ratória.

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AVALIAÇÃO FÍSICA DO RECÉM-NASCI-DOA avaliação antropométrica é uma outra intervenção que também deverá ser rea-lizada ao recém-nascido. Na prática, em alguns serviços, faz-se apenas a avalia-ção do peso imediatamente após o parto sendo os restantes parâmetros avaliados posteriormente, nas primeiras 24 horas. O peso do recém-nascido de termo va-ria entre 2700 a 4000 g (Hockenberry; Wilson e Winkelstein, 2006). Se o peso for inferior a 2500g ou superior a 4000 g, deve ser solicitada a observação pelo pediatra e determinar a glicemia capilar, de acordo com protocolos específi cos instituídos no serviço. Ao longo da prestação dos cuidados ime-diatos ao recém-nascido o enfermeiro faz o exame físico sumário no sentido cefalo-caudal (Levene, Tudehope & Si-nha, 2008), despistando possíveis altera-ções (Brêtas et al., 2005) O exame físico completo deve realizar--se nas primeiras 24 horas de vida do recém-nascido, embora alguns autores afirmem que pode chegar às 72horas (Davis & Elliman, 2008; Demott et al, 2006). Se o recém-nascido é de termo e apresenta boa adaptação deve iniciar--se o exame físico, sempre que possí-vel na presença dos pais, pois torna-se num momento importante para de-monstrar as capacidades do seu filho saudável, esclarecendo-lhes todas as dúvidas e favorecendo a aproximação da tríade. Este exame tem como objec-tivo detectar malformações congéni-

tas, sinais de infecção, distúrbios me-tabólicos e alterações no recém-nasci-do induzidas pela gestação e trabalho de parto, assim como, a sua adaptação ao meio extra-uterino. Durante a reali-zação do exame físico o enfermeiro de-verá ter especial atenção à iluminação e temperatura do ambiente, mantendo silencioso com uma luz suficiente para fazer uma boa observação mas não muito intensa que afecte o recém-nas-cido. A temperatura deve ser amena (semelhante à temperatura corporal do recém-nascido) e sem correntes de ar. Os objectos que serão usados nos cuidados directos com o recém-nasci-do, como os lençóis, estetoscópio e in-cubadora, deverão ser aquecidos para evitar a hipotermia, que contribui para um aumento das necessidades meta-bólicas, apnéia e bradicardia. O recém--nascido deve ser examinado despido e a sua manipulação deve ser cuidadosa para evitar traumatismo, especialmen-te em prematuros ou recém-nascidos doentes. Realizar antes e depois do exame a higienização cuidadosa das mãos e utilizar precauções universais, como medidas muito importantes para prevenir as infecções nosocomiais (Le-vene, Tudehope & Sinha, 2008). Obser-var atentamente o comportamento do recém-nascido antes de o manipular, pois o seu aspecto geral informa-nos sobre o seu bem-estar. Deve-se realizar primeiro a monitorização dos sinais vi-tais antes de iniciar o exame físico, por este estar mais calmo (quadro nº2).

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Quadro n.º 2 – Avaliação dos sinais vitais

Frequên-cia cardí-aca

É o sinal mais importante e deve ser avaliada com o auxílio de um estetoscópio pediátrico. Colocar o estetoscópio durante um minuto no quarto ou quinto espaço intercostal na linha mediana da clavícula esquerda, sobre o ápice cardíaco. A frequência cardíaca varia entre 120 a 140 batimentos por minuto. Avaliar a regularidade do ritmo cardíaco. Valores abaixo das 100 p/m podem indicar asfi xia grave. Caso a frequência cardíaca aumente com a reanimação, em geral o prognóstico é bom, mas se não aumenta, indica que os esforços de reanimação estão a ser inefi cazes e o prognóstico em geral é reservado.

Frequên-cia respi-ratória

É o segundo sinal mais importante. Contar os movimentos respiratórios durante 1 minuto. A frequência respiratória varia entre 30 a 60 movimentos por minuto. Avaliar a regularidade do padrão respiratório e observar sinais de difi culdade respiratória: tiragem intercostal, adejo nasal, expansão torácica assimétrica, gemidos, estridor e períodos de apneia superiores a 20 segundos. A apneia exige tratamento imediato. O recém-nascido com respiração superfi cial, lenta, irregular e com choro fraco deve ser considerado em difi culdade respiratória. O recém-nascido vigoroso tem os movimentos respiratórios bem estabelecidos ao fi m do 1º minuto.

Tempera-turaTimpâ-nica

Colocar a cápsula do termómetro, no pavilhão auricular, puxando-o para baixo e para trás. A temperatura varia entre 37ºc e 37,5ºc. A este valor deve-se retirar 0,5ºc, pois a temperatura timpânica é superior à temperatura da pele. Se verifi car hipo ou hipertermia avaliar o meio envolvente ao recém-nascido, repetindo novamente 15 minutos depois.

Tensão arterial

Colocar o manguito directamente sobre a artéria braquial ou poplítea, mantendo o braço ou a perna do recém-nascido em extensão durante a insufl ação. A largura do manguito deve ser metade da circunferência no braço do recém-nascido ou deve ocupar 2/3 do comprimento do membro onde se vai avaliar a tensão. Um manguito grande ou pequeno é responsável por uma leitura errada da tensão arterial. A tensão arterial das extremidades superiores e inferiores deve ser idêntica. O valor da tensão arterial dependerá da idade gestacional, da idade pós-natal e do peso de nascimento. No recém-nascido de termo a média da tensão sistólica/diastólica é de 65/41 do primeiro ao terceiro dia de vida.

Após a determinação dos sinais vitais, o enfermeiro deverá medir e pesar o re-

cém-nascido, atendendo aos parâmetros normais para um neonato de termo e es-tabelecendo uma relação entre eles (qua-dro nº 3).

Quadro n.º 3: Avaliação das medidas antropométricas

Peso Corporal

Colocar uma folha de papel descartável na ba-lança, previamente aquecida. Colocar o recém--nascido despido sobre a balança. O peso do recém-nascido de termo varia entre 2700 a 4000 g.

Compri-mento

Colocar o recém-nascido em decúbito dorsal, com as pernas estendidas e medir da cabeça ao calcanhar. O comprimento do recém-nascido de termo varia entre 45 a 53 cm.

Perímetro cefálico

Colocar a fi ta métrica em torno do recém-nasci-do do maior diâmetro da cabeça, desde a parte anterior da cabeça, acima da região supraciliar sobrancelhas até à proeminência occipital, pas-sando acima dos pavilhões auriculares. Esta cir-cunferência occipitofrontal no recém-nascido de termo varia entre 33 a 35,5 cm. Esta medi-ção imediatamente após o parto poderá não ser fi dedigna devido ao processo de cavalgamento dos ossos do crânio ou edema da cabeça, duran-te o parto.

Perímetro torácico

Colocar a fi ta métrica em torno do tórax, na al-tura dos mamilos. Medir após o recém-nascido ter inspirado, antes do início da expiração. No recém-nascido de termo o perímetro torácico mede cerca de 2 cm menos do que o perímetro cefálico, oscila entre 30,5 a 33 cm. Devido à mol-dagem do crânio durante o parto, estas medidas inicialmente podem parecer iguais.Formas anormais do tórax (Brêtas et al, 2005):-Tórax plano: reduzido diâmetro Antero-poste-rior;-Tórax em túnel: diâmetro Antero-posterior igual ao transversal. Aparece em problemas pulmonares crónicos (asma e fi brose quistica…);-Tórax cariniforme: saliência ao nível do ester-no. Aparece nos casos de raquitismo;-Tórax em sino ou funil: porção inferior da caixa torácica alarga-se. Aparece em casos de obstru-ções respiratórias crónicas.

Fonte: Hockenberry; Wilson e Winkelstein (2006).

O aspecto geral do recém-nascido fornece importantes informações sobre o seu es-tado clínico, nomeadamente a postura e o

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comportamento. A postura do neonato de termo é de fl exão, como resultado da sua posição intra-uterina. Deve especialmen-te analisar-se o grau de alerta, sonolência e irritabilidade, os quais poderão sugerir alterações neurológicas. A observação da pele passa pela atenção do enfermeiro relativamente à textura da pele, colora-ção, turgor e presença de alterações fi sio-lógicas, como ilustra o quadro n.º 4.

Quadro n.º 4: Avaliação da pele

Cor

A coloração da pele varia com os antece-dentes raciais. Em geral os recém-nascidos caucasianos apresentam pele rosa pálido ou avermelhada; os de raça negra aparecem com cor rosa pálido com matizes amareladas ou vermelhas e os asiáticos surgem com pele vermelha rosada com matizes amareladas. As extremidades poderão manter-se ligeiramen-te cianóticas nas primeiras 24 horas de vida. Caso se mantenha poderá indicar compro-metimento cardíaco. A coloração cianótica em todo o corpo anuncia comprometimento respiratório. A coloração plectórica é mais frequente nos recém-nascidos com policite-mia ou hiperviscosidade sanguínea. A palidez indica anemia ou comprometimento cardio-pulmonar. A icterícia nas primeiras 24 horas de vida adverte para a icterícia patológica que pode ter como causa a doença hemolíti-ca, policitemia, defi ciência enzimática, entre outras.

Textura

O recém-nascido de termo tem a pele nor-malmente lisa e macia. A presença de vérnix e veias visíveis é frequente na prematurida-de. Os recém-nascidos pós-maturos têm pele descamativa, seca e com fi ssuras.

Lanugem

No recém-nascido de termo a lanugem (pê-los fi nos e sedosos) são escassos e presentes apenas nos ombros. A sua ausência sugere pós-maturidade e a lanugem em quantidade abundante em todo o corpo indica prematu-ridade.

Turgor

Após exercer pressão sobre a pele, esta retor-na rapidamente à posição inicial no recém--nascido de termo. Quando se verifi ca um retorno lento poderá ser sugestivo de desi-dratação.

Vérnix Caseoso

Substância branca, espessa e oleosa que reco-bre a pele dos recém-nascidos de termo. Tem a função de proteger e facilitar a passagem no canal de parto. A quantidade variável, de-saparecendo ao longo do tempo.

Mília

São erupções de coloração branca, mais fre-quentes na região perinasal e mento, produ-zidas pela acumulação de gordura nas glân-dulas sudoríparas, desaparecendo ao fi nal de poucos dias.

M a n c h a Mongólica

Mancha de tonalidade azulada, que se loca-liza mais frequentemente na região sacro-coccígena podendo também aparecer com menos frequência nas coxas e ombros. A cor das manchas deve-se à localização dérmica de melanócitos que migram para a epiderme. Tende a desaparecer na primeira infância e 80% que possuem mancha mongólica são de raça negra ou mongólica.

Fonte: Brêtas et al (2005); Davis & Elliman (2008)

Para uma avaliação física completa, o enfermeiro deve usar uma abordagem sistemática e completa da cabeça aos pés, assegurando a termorregulação do recém-nascido através de uma fonte de calor radiante e examinando apenas uma área de cada vez. Esta avaliação passa pela observação da pele, cabeça, pescoço, tórax, dorso, região perineal e membros do recém-nascido e de acordo com a sua tolerância, como demonstra o quadro n.º 5, relativamente ao neo-nato de termo. Na avaliação da cabeça deverá procurar-se lesões que tenham resultado do uso de ventosa ou fórceps ou monitores fetais, analisando o tama-nho, as fontanelas e a forma do crânio.

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Quadro n.º 5: Avaliação da cabeça, face, pescoço, tórax, abdómen, dorso, região perineal e membros.

Cabeça

Tamanho

O perímetro cefálico reduzido po-derá ter como causa microcefalia causada por síndroma congénito ou restrição do crescimento intra--uterino. Enquanto, que o tamanho aumentado da cabeça indicará ma-crocefalia, possivelmente causada por hidrocefalia.

Fontane-las

A fontanela anterior têm a forma de losango, situada entre o frontal e os dois parietais, a nível do bregma e resulta da junção das suturas sagi-tal, frontal e coronal. Encerra entre os 12 aos 18 meses de vida. A fonta-nela posterior têm a forma triangu-lar, localizada na junção das suturas sagital e lambdoidal, encerra entre os 2 e 3 meses de vida. O encerra-mento precoce da fontanela ante-rior indica défi ce de desenvolvimen-to cerebral. A fontanela anterior deprimida é sugestivo de desidrata-ção e o seu abaulamento sugere um aumento da pressão intra-craniana, como acontece nos casos de menin-gite ou hidrocefalia.

Forma

O cefalo-hematoma (colecção de sangue entre o crânio e o periósteo que não atravessa as linhas de sutu-ra) causado normalmente por partos instrumentados que pode durar até 8 semanas. O Caput Succedaneum ou bossa é um edema difuso dos te-cidos moles do escalpe, que podem estender-se para além das linhas das suturas cranianas, normalmente causada pela pressão sobre o crânio no canal de parto. Este desaparece espontaneamente na primeira se-mana de vida A sobreposição das suturas por pressão sobre o crânio durante o parto vaginal, pode origi-nar uma assimetria temporária da cabeça, que desaparece ao fi m de uma semana. Poderão também sur-gir áreas eritematosas causadas pela aplicação de fórceps ou ventosas no parto distócico.Quanto à simetria: -Turricefalia: ca-beça alongada; -Escafocefalia: parte média do crânio alta; -Craniocineto-se: encerramento precoce das sutu-ras e fontanelas, levando a deformi-dades; -Plagiocefalia: crânio saliente anteriormente de um lado e poste-riormente de outro;- Braquicefalia: aumento do diâmetro transverso.

Face

Olhos

Olhos simétricos, alinhados com as orelhas, com a face e com a linha média do nariz, espaçados aproxi-madamente 2,5 cm. Esclerótica e conjuntiva clara. Ducto lacrimal pal-pável. Reacção à luz simétrica e re-fl exo de piscar positivo em resposta à luz. Refl exo dos olhos em boneca positivo (os olhos permanecem fi xos quando a cabeça é movida para a es-querda ou para a direita).

NarizLocalizado na linha média. Verifi car a permeabilidade das narinas.

Orelhas

Simétricas em tamanho, forma e po-sição. A extremidade superior deve ser paralela ao canto externo dos olhos. O pavilhão auricular curvado com cartilagem rígida e deve voltar à posição inicial quando dobrada. Refl exo de susto positivo (o recém--nascido reage em resposta a um ruído).

Boca

Simétrica, tamanho adequado para a face e localizada na linha média. Lábios rosados, húmidos e comple-tamente formados. Palato intacto sem fi ssuras e poderá visualizar-se Pérolas de Epstein (manchas pe-quenas, duras e brancas). Língua localizada na linha média e tama-nho adequado para a face e quando estimulada projecta-se para fora da boca. A úvula eleva-se com o choro. Os refl exos de procura, de sucção e deglutição presentes e coordenados.Alterações da língua: -Saburrosa surge no caso de desidratações; -Lisa surge quando existe uma atrofi a das papilas gustativas ou em casos de desidratação; -Framboesa aparece na escarlatina; -Geográfi ca, sem signifi cado clínico; -Escrotal, defi ci-ência de vitaminas do complexo B; -Macroglossia, aumento anormal da língua devido a tumor ou em caso de trissomia 21; -Glossite, infl ama-ção da língua; -Monilíase oral, lesões brancas chamadas “sapinhos” origi-nadas por fungos.

Mento Tamanho adequado para a face e le-vemente retraído.

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PescoçoSimétrico, com mobilidade ampla. Pulsos carotí-deos fortes, regulares e simétricos bilateralmente. Pesquisar massas, fístulas e excesso de pele.

Tórax

ClavículasSimétricas, indolores, sem massas ou nódulos.

CostelasSimétricas, fl exíveis, sem massas ou crepitações.

Mamas

Alinhamento horizontal, mamilos bem espaçados. Pode verifi car-se hipertrofi a mamária e secreção ma-milar devido à infl uência hormonal materna, normalmente aparece nos primeiros 2 a 3 dias após o nasci-mento e em geral diminui na primei-ra ou segunda semana.

Apêndice xifóide

Pequena protusão observada no fi -nal do esterno. A sua ausência ou depressão poderá ser sugestivo de fractura.

Abdó-men

Forma Simétrico e arredondado.

C o r d ã o umbilical

Branco-azulado, gelatinoso com duas artérias e uma veia.

Palpação a b d o m i -nal

Abdómen fl ácido, sem pontos dolo-rosos nem massas. Observa-se uma pequena separação dos músculos rectos abdominais.

DorsoC o l u n a vertebral

Colocar o recém-nascido em decúbi-to ventral e percorrer a coluna com os dedos para pesquisar: recta, sem desvios, sem massas ou regiões do-lorosas.Alterações: -Escoliose: curvatura la-teral da coluna; -Lordose: Curvatura exageradamente convexa da região lombar; -Cifose: Curvatura exagera-damente côncava da região dorsal.

Região perineal

ÂnusLocalizado na linha média e perfu-rado. Eliminação de mecónio ocorre nas primeiras 24 a 48 horas.

Genitália feminina

Clitóris aumentado devido às hor-monas maternas. Meato uretral an-terior ao orifício vaginal. Vagina com secreção branca ou escassa hemor-ragia (pseudo-menstruação).

Genitália masculina

Meato urinário localizado na linha média, na extremidade da glande. Testículos com pigmentação escura e com inúmeras rugas, descidos em pelo menos um dos lados. O meato urinário deve situar-se na região mediana da glande denominando-se normospádias.Alterações: -Epispádia: meato uriná-rio encontra-se na região dorsal do pénis; -Hipospádias: meato urinário na superfície ventral do pénis.Quanto à bolsa escrotal deve-se ob-servar o tamanho, forma, consistên-cia e cor. Poderão existir algumas al-terações: -Hidrocelo: que é a presen-ça de líquido na túnica vaginal que envolve os testículos; -Criptorquia. Que signifi ca a ausência de um ou dos dois testículos na bolsa escrotal.

MicçãoA primeira micção deve verifi car-se nas primeiras 24 horas de vida.

Mem-bros

A s p e c t o geral

Comprimento adequado em relação ao corpo, iguais bilateralmente e ausência de massas. Avaliar tónus muscular o qual deve ser simétri-co. Os membros inferiores podem apresentar alterações: -Genuvaro: Deformidade de membros inferiores caracterizadas por desvio do joelho para fora, deixando as pernas em forma de arco. -Gemevalgo: Defor-midade de membros inferiores tam-bém conhecida como joelhos juntos, caracterizada por desvio do joelho para dentro.

Movimen-to

Amplitude completa e movimentos simétricos.

Mãos e pés

Cinco dedos igualmente espaçados e ausência de membranas interdigi-tais em cada mão e em cada pé.Alterações dos pés: -pé valgo (dedos virados para fora); -pé varso (dedos voltados para dentro).Leitos ungueais rosados e teste de preenchimento capilar (dentro de 3 segundos). Apreensão palmar forte.

PulsosPulso braquial e radial fortes e si-métricos bilateralmente e iguais ao pulso femoral.

Fonte: Brêtas et al (2005); Davis & Elliman (2008)

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Durante o exame físico o enfermeiro tem a oportunidade de iniciar o exame neuro-lógico, pela observação da postura, tónus muscular, controlo da cabeça e movimen-tos. No entanto, há refl exos que necessitam de ser efectuados no fi nal do exame por po-derem perturbar o recém-nascido e inter-ferir nos resultados. Grande parte do com-portamento motor da criança é constituída por refl exos, que são respostas involuntá-rias que surgem na presença de estímulos precisos, a partir de informações externas ou proprioceptivas. Estudos realizados com crianças nascidas antes do termo vieram pôr em evidência que no período fetal exis-te já uma quantidade enorme de respostas refl exas, muitas das quais detectadas des-de muito cedo. Os refl exos são acções em que não há possibilidade de escolha, isto é, a certo(s) estímulo(s) surge associada uma resposta única e predizível. O quadro n.º 6 apresenta os refl exos a avaliar e descreve o método, devendo ser comunicado ao médi-co sempre que se verifi ca um refl exo dimi-nuído, ausente ou assimétrico.

Quadro n.º 6: Avaliação dos refl exos neurológicos.

Refl exo Método Resposta esperada

Refl exo coreano

Dirigir uma luz intensa em direcção ao olho.

O recém-nascido pisca o olho. Este refl exo mantém-se por toda a vida.

Refl exo pupilar

Dirigir uma luz intensa em direcção ao olho.

A pupila contrai-se em ambos os olhos. Este refl exo mantém-se por toda a vida.

Olhos de boneca

Virar lentamente a cabeça do recém-nascido para a esquerda e para a direita

Os olhos do recém--nascido permanecem imóveis.

SucçãoColocar o dedo na boca do recém-nascido.

O recém-nascido inicia movimentos de suc-ção. Persiste durante toda a infância, mes-mo sem estimulação, quando está a dormir.

Procura ou rotação da cabeça

Tocar na bochecha ao lado da boca.

O recém-nascido vira a cabeça para esse lado e começa a sugar. Desaparece aos 3 a 4 meses, mas pode persistir até aos 12 meses.

ExtrusãoTocar ou pressionar a língua para baixo.

O recém-nascido coloca a língua para fora. Desaparece aos 4 meses de vida.

Babinski

Estimular a região plantar no sentido do calcanhar em direcção aos dedos do pé.

Hiperextensão dos dedos com dorsifl exão do hálux. Desaparece após o primeiro ano de vida.

ApreensãoColocar o dedo na palma da mão e nos dedos dos pés do recém-nascido.

O recém-nascido agarra o dedo da mão, este refl exo diminui aos 3 meses para ser substituído pelo movi-mento voluntário. Na apreensão plantar, o recém-nascido curva os dedos do pé e di-minui por volta dos 8 meses.

GatinharColocar o recém-nascido em decúbito ventral numa superfície plana.

O recém-nascido tenta gatinhar usando as mãos e os pés. Desa-parece às 6 semanas de vida.

Marcha

Segurar o recém-nascido de modo que as plantas dos pés toquem numa superfície rígida.

O recém-nascido esboça movimentos de caminhar. Desaparece após as 3 a 4 semanas de vida.

Galant

Estimular com o dedo por um um lado da coluna vertebral da cabeça até as nádegas.

O tronco do recém--nascido curva-se para o lado estimulado. Desaparece por volta das 4 semanas de vida.

Moro

Com gentileza, deixar cair subitamente a cabeça do recém-nascido para trás.

O recém-nascido estende e abduz as extremidades bilate-ralmente e simetrica-mente, com o polegar e o indicador em forma de C. Desapare-ce após os 3 a 4 meses, sendo mais forte nos primeiros 2 meses de vida.

Fonte: Fleming & Newra (2003)

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CONCLUSÕESOs cuidados prestados ao recém-nascido imediatamente após o parto são essen-ciais para a adaptação do bebé diminuin-do a morbi-mortalidade neonatal. O deli-cado momento de transição do meio intra para o extra-uterino é marcado por inú-meras mudanças para a criança. O meio intra-uterino proporciona um ambiente de aconchego, de temperatura e luminosida-de constantes, os ruídos são ouvidos sua-vemente, não necessitando de esforço para realizar as funções vitais. Com o nascimen-to o bebé vai se adaptando gradualmente ao meio extra-uterino superando as difi cul-dades inerentes ao seu desenvolvimento. A vertente humanizadora de assistência ao parto e nascimento preconiza que os pro-fi ssionais devem estimular a aproximação entre a mãe e o bebé no pós-parto imedia-to, em contacto pele a pele. Os cuidados podem ser prestados mantendo-se e res-peitando este momento de interacção para que se favoreça o estabelecimento precoce do vínculo. O exame físico, também é uma intervenção de enfermagem que se vai re-alizando após o nascimento do bebé e que deve culminar após as 24 h de vida. Sen-do um processo sistemático, a execução do exame físico inclui as técnicas básicas como: inspecção, palpação, percussão e auscultação. Utilizando estas técnicas o enfermeiro precisa ser criativo, estar aten-to ao aspecto da conduta e actividade da criança para interpretar, correctamente, os dados, de acordo com a característica do crescimento e desenvolvimento do bebés. Assim sendo, o exame físico é um instru-mento de recolha de dados que enriquece a informação e fundamenta as intervenções de enfermagem, colaborando, assim, para ampliar a autonomia profi ssional, por for-

necer dados que subsidiam a defi nição do diagnóstico, a prescrição de enfermagem, e contribui para a efectividade das interven-ções de enfermagem.

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