a efetivaÇÃo das tutelas de urgÊncia …...tensão e a necessidade de uma rápida resposta do...
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XXXV CONGRESSOA NACIONAL DE PROCURADORES DO ESTADO
“O ESTADO BRASILEIRO NO SÉCULO XXI – PERSPECTIVA E DESAFIOS
PARA A ADVOCACIA PÚBLICA”
“As autonomias administrativas, funcionais e financeiras são
pressupostos básicos para Dignidade de uma Advocacia
Pública voltada à defesa do Estado Democrático de
Direito e na Efetividade dos Direitos e Garantias
Fundamentais”
1Marcos de Azevedo
“A EFETIVAÇÃO DAS TUTELAS DE URGÊNCIA CONTRA O PODE
PÚBLICO”
FORTALEZA - Ceára
2009
1 Azevedo Marcos de. É Procurador do Estado de São Paulo, Doutorando e Mestre em Direito Processual Civil, pela PUC-SP. Auto dos Livros “Direitos Humanos Fundamentais – Sua Efetivação por Intermédio das Tutelas Jurisdicionais, “ O Terceiro Setor e o Direito Ambiental” e Temas Atuais das Tutelas Diferenciadas ( em co-autoria) além de inúmeros artigos e teses publicadas.É membro do IBDP – Instituto Brasileiro de Direito Processual e IBAP – Instituto Brasileiro de Advocacia Pública.
XXXV CONGRESSOA NACIONAL DE PROCURADORES DO ESTADO
“O ESTADO BRASILEIRO NO SÉCULO XXI – PERSPECTIVA E DESAFIOS
PARA A ADVOCACIA PÚBLICA”
“A EFETIVAÇÃO DAS TUTELAS DE URGÊNCIA CONTRA O PODE
PÚBLICO”
Autor: MARCOS DE AZEVEDOMonografia – Apresentada no XXXV Congresso Nacional de Procuradores do Estado em FORTALEZA-CEARÁ.
FORTALEZA - CE
2009
SUMÁRIO:
1.INTRODUÇÃO.
2. CONCEITO E CARACTERÍSTICAS DAS TUTELAS DE URGÊNCIA OU DIFERENCIADAS
3. SUPREMACIA DE INTERESSE PÚBLICO SOBRE O PRIVADO.
4. TUTELA ANTECIPADA PROFERIDA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA.
5. CONCLUSÕES.
1. INTRODUÇÃO
As últimas décadas do século passado foram enriquecidas com inúmeros diplomas
legais que vêm renovando os Códigos e a legislação pátria, adaptando-os a uma nova
realidade, rica de inovações científicas, revolução tecnológica e dos costumes, numa
sociedade gigantesca que se transforma a cada momento, a uma velocidade espantosa, e que,
realmente, não pode ficar estática em parâmetros e formalidades rigorosas e em desuso para o
momento em que se vive à espera de providências mágicas.
O legislador brasileiro e o próprio Poder Executivo, na área processual civil,
diversamente do que fez com o Direito Civil, porque, sumamente morosa sua tramitação,
optou por reformas pontuais, de modo a viabilizar soluções casuísticas, principalmente para as
situações em que a efetividade do processo se mostra mais comprometida. Neste sentido, se
observou que o Código de Processo Civil mereceu inúmeras alterações, oriundos de estudos e
projetos de juristas, e, desta forma, não cindiu a unidade da legislação posta.
Isso porque a vida oferece, não raro, em razão da tensão que existe entre o fator
“tempo” e o fator “justiça”, certas combinações de circunstâncias e acontecimentos que nem a
mais fértil imaginação conseguiria prever, o que torna impossível antecipar a disciplina por
via legislativa. A conseqüência de tal fenômeno é necessidade de providenciar-se um
instrumento com aptidão de garantir, proteger o direito de maneira urgente. Caso contrário, a
justiça não seria feita no seu devido tempo, ocorrendo, por via de conseqüência, os atrasos
que tornariam a jurisdição completamente ineficaz.
Sabe-se que o processo, mesmo sob os influxos do rigoroso princípio da oralidade, que
não se alongue no tempo, com a concessão de prazos para que as partes, sob o pálio do
contraditório, possam apresentar seus pedidos e impugnações, comprovar suas afirmativas em
matéria de fato, insurgir-se contra decisões que lhes sejam desfavoráveis, o juiz também
precisa de tempo para analisar o conflito de interesses, para habilitar-se a bem fundamentar as
decisões interlocutórias e, com maior profundidade, a sentença. 2 Consequentemente, o
processo é um instrumento vagaroso que, em certa medida, prejudica quem tem razão e
beneficia quem não a tem.
É deste cenário que surgiu a necessidade de criação de um mecanismo que concilie a
tensão e a necessidade de uma rápida resposta do Judiciário, que existe em certos casos de
periclitância, entre segurança e efetividade dentro do processo.
2 CARNEIRO, Athos Gusmão. Da antecipação da tutela. 3.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 1.
A preocupação com a celeridade processual revelou-se especialmente com a edição da
Emenda Constitucional nº 45/2004 que, contemplando o princípio da razoável duração do
processo, fez inserir no art. 5º da Constituição Federal, o inciso LXXVIII. 3 Mesmo antes da
edição de referida emenda à Constituição Federal, não mais subsistia qualquer dúvida quanto
à intenção constitucional de elevar as garantias às tutelas de urgência, tendo em vista que
estas são, exatamente, meios cujo objetivo é garantir a celeridade da tramitação dos processos.
Seria, inclusive, impossível o legislador constitucional, se fazer mais claro, até mesmo em
decorrência da existência da previsão contida no art. 5º, XXXV da Constituição Federal. 4
Assim, ainda que não houvesse qualquer previsão infraconstitucional acerca das
tutelas urgentes, as mesmas poderiam muito bem serem pleiteadas e concedidas, obviamente,
em casos efetivamente urgentes, uma vez que são garantidas constitucionais.
Contudo, para evitar que existissem dúvidas acerca da possibilidade e das hipóteses
em que seriam concedidas, foram editadas diversas leis5, desde o início da vigência do Código
de Processo Civil, em 01 de janeiro de 1974, todas relativas à garantia da celeridade da
tramitação dos processos.
Daí o porquê dos modernos processualistas, com o foco na obtenção de uma adequada
efetividade dos provimentos jurisdicionais, considerarem dogmático o entendimento de que
os técnicos do direito devem buscar a abreviação do tempo de duração do processo, sempre
com vistas a se evitar demoras injustificáveis, formalismos exacerbados e protelações
maliciosas.
Criou-se, então, uma forma de tutela sumária, não definitiva, fundada em juízo de
aparência, que pudesse, frente ao reconhecimento de alguma verossimilhança na alegação da
parte, afastar risco iminente de dano irreparável. Porém, não representou em si uma novidade,
posto que já haviam previsões de procedimentos especiais no Código de Processo Civil ou em
3 Art. 5º, inciso LXXVIII da Carta Magna: "A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação".4 Ninguém, nem mesmo a lei, expressão maior da vontade nacional, pode excluir a lesão ou a ameaça de direito do dispositivo do controle jurisdicional. (FRIEDE, Reis. Limites objetivos para a concessão de medidas liminares em tutela cautelar e em tutela antecipatória. São Paulo: LTR, 2000, p. 122).5 Foram editadas as Leis nºs 8.950, 8.951, 8.952, 8.953 todas no ano de 1994, as às Leis nºs 10.352 e 10.358, de 26 e 27 de dezembro de 2001, respectivamente, visando modificar disposições do Código de Processo Civil vigente, com relação ao reexame necessário e aos recursos e ao processo do conhecimento. Essas normas estão vigentes desde março de 2002. Editou-se também a Lei nº 10.444 de 07 de maio de 2002, publicada em 08 de maio de 2002, com vigência prevista para 08 de agosto de 2002, introduzindo mudanças as mais variadas no Código Processo Civil, todas elas procurando dar efetividade ao processo, tentando evitar o indesejável hábito de fazer as demandas intermináveis ou mesmo, em linguagem popular, a prática de ‘ganhar e não levar’ que têm contribuído em muito para o descrédito do Judiciário e, por extensão, da Advocacia. Mais recentemente foram editadas a Lei n° 11.232, de 2005 e as Leis n° 11.276, 11.277 e 11.280, todas de 2006, visando notadamente dar maior instrumentalidade, efetividade e utilidade, extraindo das normas processuais através das modificações o máximo de eficácia que possam proporcionar.
leis extravagantes, como, por exemplo, busca e apreensão em alienação fiduciária, despejo
liminar da lei do inquilinato, possessórias, embargos de terceiro, etc.
Como em diversos países e, seguindo uma tendência contemporânea, o Brasil prevê
diversos procedimentos cíveis em que se é possível à concessão de medida liminar dirigida às
pessoas jurídicas de Direito Público, notadamente existem remédios variados e específicos
utilizados em face da Administração, que prevêem provimentos cautelares lançados em
cognição não exauriente, aptos a sustar, ao menos, efeitos lesivos ao ato impugnado, até final
julgamento da ação.
Pretendemos neste estudo demonstrar que os dispositivos legais que restringem a
concessão de tutelas de urgência (seja em caráter liminar, cautelar ou antecipatório) em face
do Poder Público, não padecem de vícios de ilegalidade ou de inconstitucionalidade, sob o
argumento da inquebrantabilidade do princípio da isonomia e da igualdade entre os litigantes,
posto que as pessoas jurídicas de Direito Público, quando forem partes em ação judicial,
passam a desfrutar de tratamento especial não reconhecido aos particulares.
Ao revés, tais dispositivos legais objetivam proteger a sociedade, pois, sendo o Estado
uma organização complexa e burocrática, que cuida, simultaneamente, de interesses
heterogêneos e da mais variada gama possível, o tratamento desnivelado que o legislador
concede ao Poder Público, ao editar determinadas prerrogativas, não ofende e não margeia o
princípio da isonomia, simplesmente trata os iguais e os desiguais de forma diversa,
nivelando, processualmente, os interesses em litígio. 6
2. CONCEITO E CARACTERÍSTICAS DAS TUTELAS DE URGÊNCIA
OU DIFERENCIADAS
Deve-se, inicialmente, no presente tópico, mencionar a impropriedade do termo
utilizado para o adiantamento de prestação jurisdicional; qual seja: antecipação de tutela.
Tutela, segundo Orlando Gomes, 7 é o encargo conferido a alguém para proteger a
pessoa e administrar os bens dos menores que não se acham sob o pátrio-poder. A adaptação
dessa palavra para o campo do direito processual, além de modificar lhe o poder semântico,
traduz de forma autoritária de quem enxerga o cidadão como incapaz, subordinado ao Estado
todo-poderoso.
6 VIANA, Juvêncio Vasconcelos. Execução contra a Fazenda Pública. São Paulo: Dialética, 1998, p. 33.7 Direito de Família. Rio de Janeiro: Forense, 1968, p.297.
Tal postura obviamente não encontra respaldo em nosso ordenamento jurídico. Ao
contrário, nele assegura-se às pessoas o direito potestativo de ação, 8 cujo exercício torna
quem o exerce credor do Estado. Este último, de sua parte, passa a ser devedor de um
provimento jurisdicional capaz de extinguir o litígio entre o autor e seu adversário. Verifica-
se, desse modo, que o Estado acionado, longe de ser tutor é, na realidade, devedor. 9 Diante de
tais assertivas, o mais correto seria falar-se em prestação jurisdicional antecipada. Não há,
portanto, sentido em emprestar o velho termo do Direito de Família, para acrescentar-lhe mais
um significado.
Até mesmo porque em toda e qualquer ciência, é de suma importância uma segura e
correta terminologia. Porém, a grande maioria dos cientistas processuais utiliza o vocábulo
tutela ao se referir ao resultado da função jurisdicional.
A fim de se definirem, melhor, as tutelas de urgência, transcrever-se-á, também, a
definição sobre o termo urgência de De Plácido e Silva10:
Do latim urgentia, de urgere (urgir, estar iminente), exprime a qualidade do que é urgente, isto é, é premente, é imperioso, é de necessidade imediata, não deve ser protelado, sob pena de provocar, ou ocasionar um dano ou um prejuízo. Assim, a urgência assinala o estado das coisas que se devam fazer imediatamente, por imperiosa necessidade, e para que se evitem males, ou perdas, conseqüentes de maiores delongas, ou protelações.
Já, sob a acepção jurídica, o conceito de urgência decorre da necessidade de que se
faça algo, por não comportar procrastinações, dependendo de todos os aspectos da situação
jurídico-fática do fator tempo. A tutela jurisdicional de urgência tem como fim evitar que a
demora do processo acabe por acarretar prejuízos a quem tenha razão na lide, seja em virtude
de risco de ineficácia da execução, seja em razão de obstáculos que o réu, agindo de má-fé,
poderá transpor para a efetiva solução do processo. Mister se faz ressaltar, logo de início, que
a urgência não está vinculada tão somente à eventual existência de perigo de dano (periculum
in mora), requisito adstrito à tutela cautelar, mas também diz respeito a qualquer situação
fática de risco ou embaraço à efetividade processual, servindo de instrumento para a
realização de pretensões que se mostrem inconciliáveis com a morosidade do procedimento
comum.
8 Entende-se como direito potestativo aquele a que não corresponde obrigação preexistente. Em rigor, o titular de direito potestativo dispõe de uma faculdade. Tal uma vez exercida cria para seu destinatário, uma obrigação (RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. 17.ed.. São Paulo: Saraiva, 1999, v. I, p. 350). No caso do direito de ação, o titular de uma pretensão em litígio exerce a faculdade de acionar o Estado. Acionado, o Estado, que até então nada devia ao autor, torna-se devedor da prestação jurisdicional. 9 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO; Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 4.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 203 e ss.10 De Plácido e Silva. Vocabulário Jurídico. Rio de Janeiro: Forense, 1980, Q-Z, v. IV, p. 1611.
Conforme entendimento de José Roberto dos Santos Bedaque11, as modalidades de
tutela jurisdicional são relevantes em virtude da urgência do provimento, seja pela existência
de perigo concreto a ameaçar a efetividade da tutela, seja porque o legislador presume e
tipifica a situação de perigo. As tutelas de urgência visam a garantir a eficácia da tutela
jurisdicional.
A tutela jurisdicional de urgência é indispensável à rigidez do sistema processual,
sendo meio hábil para assegurar o resultado prático de um provimento jurisdicional definitivo
(cautela), ou mesmo possibilitar a antecipação provisória da própria pretensão formulada
(antecipação da tutela), que contribui, decisivamente, para a solidificação do sistema
processual, na medida em que assegura a efetividade do processo, e para tornar possível a
concretização de resultados, onde o processo deixa de ter sentido meramente formal,
compatibilizando-se com o desejo de instrumentalidade, conforme explanação de José
Roberto Dantas Oliva12.
Luiz Orione Neto13 afirma que as tutelas de urgência, “por intermédio da concessão
das liminares, sejam em sede de jurisdição acautelatória, ou cognitiva antecipatória,”
realizam, por intermédio do “Estado-juiz,” a abreviação dos conflitos de interesses resistidos
ou insatisfeitos.
Há autores que utilizam ainda o termo tutela jurisdicional diferenciada ao tratarem das
tutelas de urgência. Tutela jurisdicional diferenciada significa tutela adequada à realidade do
direito material. Se uma determinada pretensão de direito material está envolvida numa
situação emergencial, a única forma de tutela adequada desta pretensão é aquela que pode
satisfazê-la com base em cognição sumária.14
Como desmembramento da tutela diferenciada, encontramos a tutela antecipada que
tem por escopo a realização antecipada do direito da parte, diferenciando-se da tutela cautelar
justamente pelo fato de que esta não realiza o direito, mas sim assegura a sua realização num
outro processo. Devido ao instituto da tutela antecipada, que é uma das medidas provisórias, o
ordenamento visa evitar, sempre que possível, o perigo de dano, optando, quando houver
incerteza do direito ainda não definido, por soluções que não permitam que o direito material
seja sacrificado.
11 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência (tentativa de sistematização). 3.ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 152.12 OLIVA, José Roberto Dantas. Tutela de urgência no processo do trabalho. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002, p. 20.13 Idem, p. 79.14 ARMELIN, Donaldo. Tutela jurisdicional diferenciada. In: Repro 65/45-55. Jan-mar. /92
A tutela cautelar e a tutela antecipada, ambas com fundamento no art. 273, inciso I do
Código Processo Civil, são subespécies da chamada tutela de urgência, que se torna
inafastável quando o autor não puder aguardar o percurso do” iter processualis padrão”, isto
é, sofrerá dano irreparável ou de difícil reparação se tiver de esperar a solução da lide pela via
comum. 15
O entendimento do nascer das denominadas tutelas de urgência ou diferenciada se
confunde com as causas de seu aparecimento, uma vez que foram incorporadas ao
ordenamento pátrio jurídico para proteger um direito certo do demandante, evitando sua perda
ou deterioração pelo decurso do tempo ou por qualquer outro meio lesivo.
Foi atento a necessidade de impedir a incidência destrutiva do tempo sobre o direito,
que o legislador processual criou medidas para proteger a utilidade pratica do processo, ou
seja, evitar o dano irreparável. Primeiro adotou-se o processo cautelar, incorporado no
ordenamento jurídico já no código de 1973. Em seguida, a tutela antecipada, Lei nº 8.952/94.
Oito anos depois, a Lei 10.444/02 criou a possibilidade de antecipar-se provimentos
inibitórios.
Assim, os provimentos antecipatórios urgentes são cabíveis nas formas das tutelas
previstas em lei. A tutela de urgência destina-se a abranger todas as medidas necessárias a
evitar risco de dano ao direito. Caracterizam-se, além da sumariedade da cognição, pelo
periculum in mora. Analisa-se a situação substancial e verifica-se a necessidade de proteção
imediata, em sede cautelar, ante a impossibilidade de se aguardar o tempo necessário para
entrega da tutela final.
Interessante citar aqui os ensinamentos de Bedaque,16 que equipara as tutelas
cautelares às tutelas sumárias (urgentes), tendo-se em vista que as duas espécies tem como
finalidade assegurar a efetividade da tutela jurisdicional. Coloca-as, inclusive, no mesmo
patamar, já que propõe a divisão da categoria das tutelas urgentes em cautelares e não
cautelares, reservando àquelas apenas os provimentos de caráter puramente conservativos,
como o arresto e o seqüestro. As tutelas sumárias e provisórias, mas de conteúdo
antecipatório, seriam espécie do gênero tutela de urgência.
Observa-se assim, que as tutelas de urgência, sejam do tipo cautelar ou antecipatória,
apresentam uma característica que lhes é ínsita, qual seja, a sumarização procedimental. Este
recurso consiste na redução do lapso destinado a obtenção da providência jurisdicional
15 LOPES, João Batista. Fundamento constitucional da Tutela de Urgência. Revista Dialética de Direito Processual, n. 8, p. 69.16 Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência (tentativa de sistematização). 3.ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 152.
emitida em forma de liminar, inaudita altera pars ou após justificação prévia, mas, em
qualquer caso, sempre norteada por uma cognição sumária.
A sumarização do processo corresponde a vários reclamos e emprega diversas técnicas
procedimentais. Porém, o que torna a sumariedade uma característica inamovível no
oferecimento da tutela jurisdicional de urgência é que, nesta, a prestação há de ser pronta e
imediata, sob pena de perder a sua própria eficácia, diante da possibilidade de grave dano,
prejuízo irreparável ou de difícil reparação.17
Importante dizer inclusive que as tutelas de urgência buscam fundamento na provável
existência do direito que constituirá, ou já constitui, objeto do processo à cognição plena,
também denominado de fumus boni iuris ou no periculum in mora.
Como elemento integrante das tutelas de urgência, cite-se ainda a provisoriedade ou a
temporariedade que significam a não definitividade da providência judicial concedida, a qual
dependerá sempre de uma sentença de mérito cautelar ou de uma sentença de mérito
propriamente dita (isto é, a que decide a respeito da pretensão de direito material articulada na
petição inaugural), proferida em processo principal (ou no próprio feito, se nele ocorreu a
concessão ou denegação da medida), que a confirme ou revogue.
Enfim, cabe concluir que a tutela de urgência abrange tanto as medidas antecipatórias
como as cautelares. Logo, a tutela de urgência é o gênero de medida judicial na qual estão
inseridos os provimentos da tutela cautelar, das diversas liminares e das tutelas antecipatórias.
3. SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO SOBRE O PRIVADO
São consideradas pessoas jurídicas de Direito Público aquelas que integram a estrutura
constitucional do Estado e têm poderes políticos e administrativos, tais como a União, os
Estados-membros, os Municípios e o Distrito Federal. São também tidas como pessoas de
Direito Público de natureza meramente administrativa as autarquias (longa manus), que
podem desempenhar atividades econômicas, previdenciárias, educacionais e quaisquer outras
outorgadas por entidade estatal-matriz e, ainda, pela nova orientação da Constituição da
República Federativa do Brasil de 1988, as entidades fundacionais também.
A Fazenda Pública rege-se através de princípios e normas diferenciadas das
disposições de direito privado, em razão de sua própria natureza jurídica, de seu regime
jurídico e, principalmente, da supremacia do interesse público sobre o interesse privado.
17 ARMELIN, Donaldo. A tutela jurisdicional cautelar. In: Revista da Procuradoria Geral de São Paulo. São Paulo, v. 23. 1985, p. 125.
Interesse público é a atividade de tal modo relevante, que o Estado a titulariza,
incluindo-a entre os fins que deve, necessária e precipuamente, perseguir. É o próprio
interesse coletivo colocado pelo Estado entre seus próprios interesses, assumindo-os sob
regime jurídico de direito público, exorbitante e derrogatório do direito comum. A finalidade
de toda e qualquer administração é o interesse público. O Estado não pode ter, senão,
interesses públicos.
Diante disso, o regime jurídico-administrativo tem como um de seus principais
assentos a supremacia do interesse público, que guarda estreita afinidade com os demais
princípios que informam a atuação da Administração Pública em geral.
Não se pode olvidar que o interesse público, como o interesse do todo, nada mais é do
que uma forma, um aspecto, uma função qualificada do interesse das partes, ou seja, não há
como se conceber que o interesse público seja contraposto e antinômico ao interesse privado.
Caso assim fosse, teria que se rever a concepção do que é a função administrativa.
Cumpre arrematar, que interesse público nada mais é do que a expressão dos direitos
individuais, vista sob um prisma coletivo. Diante disto, é fácil concluir que a Fazenda Pública
não pode ser tratada como uma parte comum, eis que defende os superiores interesses do
Estado, nos quais se subentendem os próprios interesses individuais, fato que impõe
tratamentos preferenciais em favor do ente estatal, como forma de preservação do interesse
público.
No direito pátrio, porém, interesse público, na acepção que se quer emprestar, é,
segundo já se deixou perceber, sinônimo de interesse geral da sociedade, de interesse do
Estado, enquanto comunidade política e juridicamente organizada, vale afirmar-se, do Estado
como expressão suprema da organização político-jurídica da sociedade. A essa altura, tem-se,
portanto, numa rápida e panorâmica visão, o conceito de interesse conectado ao qualificativo
público, fechando o circuito fenomenológico em apreço e, com isso, completando a idéia
matriz que tal locução encerra, mas – ocioso dizer-se –, sem a menor preocupação (ou
pretensão) de ser exaustivo, por óbvias razões.
De acordo com as considerações alhures expostas, emerge o princípio da supremacia
do interesse público ou princípio da finalidade pública, presente desde o momento da
elaboração da lei, até o momento de sua execução pela Administração Pública, vinculando o
legislador, bem como a autoridade administrativa em toda a sua atuação.
Observa-se que as normas regradoras das prerrogativas da Fazenda Pública são
infringentes ao princípio da isonomia, que permite à lei descriminar, desigualando, a fim de
poder igualar os destinatários da norma: “Mais rudemente, toda lei gera necessária
distinção”.18
Remata-se, pois, que o princípio da igualdade existe para a realização da justiça. Deve-
se ressaltar, porém, que na esfera processual, o Estado é profundamente diferente do
particular, não havendo igualdade formal.
Considerando somente o direito material e, de forma genérica, conclui-se que tanto o
Estado, quanto o particular, a ele estão submetidos. Afinal, este é o fundamento do Estado de
Direito.
Entretanto, diante da norma processual, a situação é totalmente desigual, uma vez que
o Estado comparece em juízo com as características que lhe são próprias, não obstante sua
finalidade precípua, o interesse público, o bem comum.
Por isso mesmo a Fazenda Pública desfruta de uma série de benefícios em juízo: prazo
em dobro para recorrer e em quádruplo para contestar (art. 188 do Código de Processo Civil);
dispensa do pagamento antecipado das despesas processuais (art. 20 do Código de Processo
Civil) e do depósito na ação rescisória (art. 488, parágrafo único do Código de Processo
Civil), duplo grau de jurisdição obrigatório (art. 475 do Código de Processo Civil),
inocorrência dos efeitos da revelia (art. 320, inciso II do Código de Processo Civil),
pagamento por precatório de débitos pecuniários resultantes de sentença (art. 100 da
Constituição Federal), impenhorabilidade de seus bens (art. 67 do Código Civil c.c o art. 648
do Código de Processo Civil).
Vislumbra-se, desse modo , no que diz respeito à influência na elaboração da lei, a
distinção que se faz entre o direito público e o privado leva em conta o interesse que o mesmo
busca proteger: o direito privado contém normas de interesse individual, enquanto o direito
público, normas de interesse público, ou seja, de toda sociedade politicamente organizada. Por
outro lado, os opositores desse critério argumentam que existem normas de direito privado
que objetivam defender o interesse público (direito de família); e outras de direito público,
que buscam proteger interesses particulares, como, por exemplo, a saúde.
Todavia, embora pertinentes, as críticas, quando asseveram que tal critério não é
absoluto, não se pode olvidar de sua legitimidade, eis que, não obstante as normas de direito
público reflexamente protegerem interesse individual, têm o objetivo primordial de atender ao
interesse público ou ao bem-estar coletivo. Tal princípio serve de fundamento para todo o
direito administrativo e vincula a administração em todas as suas decisões.
18 PEREIRA, Hélio do Valle. Manual da Fazenda Pública em Juízo. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 19.
Ainda no que se refere à supremacia do interesse público, vale ressaltar que a
Administração existe para a realização dos fins previstos na lei, enquanto os interesses legais
representam conveniências e necessidades da própria sociedade, jamais vantagens e
conveniências privadas. No conflito entre o coletivo e o individual, reconhece-se a
predominância do coletivo, pois seria inconcebível que na defesa de interesses individuais se
pudesse prejudicar a realização dos fins coletivos.
À medida que se vai delimitando o conceito de interesse público, tornam-se cada vez
mais evidentes algumas conclusões, tais como a de que, no embate entre o interesse público e
particular, há que prevalecer o interesse público, que se traduz no grande princípio
informativo do direito público.
Igualmente, não se pode imaginar que o contrário possa acontecer, ou seja, que o
interesse de um grupo possa vigorar sobre o interesse de todos. A supremacia do interesse
público sobre o particular está presente em vários momentos, como na desapropriação e na
servidão administrativa.
Contudo, importa salientar que a aplicabilidade do princípio em questão não significa
o desrespeito ao interesse privado, posto que o Poder Público deve obediência ao direito
adquirido, à coisa julgada e ao ato jurídico perfeito, conforme previsto na Constituição
Federal. Já os direitos de ordem patrimonial, que são afetados pela supremacia do interesse
público, devem ser indenizados de forma cabal19.
Ademais, conforme já asseverado anteriormente, é a própria definição de Fazenda
Pública que promove essa diversidade de tratamento, posto que excluem das prerrogativas
processuais previstas no ordenamento jurídico as entidades governamentais criadas sob a
roupagem de pessoa jurídica de direito privado, tais como as sociedades de economia mista,
as empresas públicas e as fundações privadas.
Concluindo, justifica-se o tratamento diferenciado porque a Fazenda Pública, como
corporificação da Administração em juízo, nada mais é do que o conjunto formado pela soma
interesses de todas as pessoas, da coletividade. A res publica a todos pertence e disso resulta a
indisponibilidade dos seus interesses. A Fazenda, ao ser demandada em juízo, deverá
perseguir o interesse público. Por isso, as normas processuais que lhes conferem algumas
prerrogativas, compatibilizam-se com os preceitos constitucionais.
Conclui-se, por conseguinte, que, como existe nítida desigualdade entre o Estado e o
particular, dessa maneira devem ser os mesmos tratados.
19 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 12-13.
4. TUTELA ANTECIPADA PROFERIDA CONTRA A FAZENDA
PÚBLICA
O Professor Cândido Rangel Dinamarco, em sua obra Reforma da Reforma, analisa as
principais alterações ocorridas no Estatuto Processual Civil, de forma balizada, inclusive as
adicionadas com o advento da Lei n. 10.444, de 7 de maio de 200220 .
Entre tantas reformulações, destaca-se o instituto da Tutela Antecipada, espécie de
modalidade das tutelas de urgência ou diferenciadas, que merece atenção especial, pela
notoriedade e eficácia que vêm alcançando seus fins, introduzindo profundas modificações no
sistema processual e do qual se passa a abordar.
A tutela antecipada é um dos temas que mais têm chamado a atenção dos
processualistas brasileiros nos últimos tempos. Instituto conhecido da doutrina há bastante
tempo e presente no ordenamento brasileiro, em normas espaçadas, como as que prevêem a
reintegração liminar da posse, o despejo liminar e o aluguel provisório, passou a merecer mais
atenção dos doutos depois que o movimento conhecido como “a reforma do Código de
Processo Civil” alterou a redação do art. 273 daquele Código, para assim, criar norma
genérica, aplicável, a princípio, a todos os processos.
Com isso, reforma processual introduzida pela Lei nº 8.952, de 13 de dezembro de
1994, instituiu a figura da tutela antecipada, que pode ser deferida desde que, existindo prova
inequívoca, convença-se o juiz da verossimilhança da alegação e haja fundado receito de dano
irreparável ou de difícil reparação, ou que fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou
o manifesto propósito protelatório do réu (CPC, art. 273).
Anteriormente à reforma processual de 1994, em algumas ações, tais como, embargos
de terceiros, ação possessória, ação popular, ação civil pública, mandado de segurança, ação
expropriatória, ação direta de inconstitucionalidade, ação locatícia em algumas demandas do
Código de Defesa do Consumidor, já era possível a figura da antecipação da tutela.
A antecipação de tutela hoje prevista no art. 273 do Código de Processo Civil, no
título relativo ao processo e procedimento, do livro que cuida do processo de conhecimento, é
aplicável tanto para o procedimento ordinário quanto para o sumário (antigo sumaríssimo), e,
também, para os procedimentos especiais, regidos, subsidiariamente, pelas disposições gerais
do procedimento ordinário.
20 DINAMARCO, Candido Rangel. A Reforma da Reforma. 6.ed. rev. ampl. E atual. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 304.
O instituto da tutela antecipada provocou, desde o seu início, diversas polêmicas,
principalmente quanto à possibilidade de sua concessão contra a Fazenda Pública, posto que
os operadores do Direito, notadamente os advogados, passaram a manusear tal tipo de tutela
de urgência em situações que envolvessem a Fazenda Pública.
Contudo, mesmo após a promulgação da Lei nº 9.494, de 10 de setembro de 1997,
que, conforme sua ementa, "disciplina a aplicação de tutela antecipada contra a Fazenda
Pública", esse questionamento ainda restou presente, havendo muitos os que defendiam sua
impossibilidade, especialmente por força dos seguintes obstáculos: a necessidade da remessa
obrigatória; a previsão do precatório bem como “sentença judiciária”, para fins do art. 100 da
Constituição Federal, e, por fim, o elevado risco de irreversibilidade que resultaria da
efetivação do provimento antecipatório.
A Lei n.º 9.494/97, resultante da conversão da Medida Provisória n.º 1.570, estatui, em
seu artigo 1º, que, em relação à sua concessão contra a Fazenda Pública, "Aplica-se à tutela
antecipada prevista nos arts. 273 e 461 do Código de Processo Civil o disposto nos arts. 5º e
seu parágrafo único e 7º da Lei n.º4.438, de 26 de junho de 1964, no art. 1º e seu §4º da Lei
n.º5.021, de 9 de junho de 1966, e nos art. 1º, 3º e 4º da Lei n.º8.437, de 30 de junho de 1992."
Conta inclusive com o “acolhimento” do Supremo Tribunal Federal, lançado na
decisão da ADC nº 4-6, do Distrito Federal, ao entender que não se aplica em matéria de
natureza previdenciária.
Todas as disposições legais a que se refere o artigo acima transcrito tratam de
limitações a liminares e cautelares contra o Poder Público, e a Lei, ao impor esses limites,
reconheceu, a contrario sensu, a admissibilidade da tutela antecipada contra a Fazenda Pública
nas demais situações não alcançadas pelos dispositivos abrangidos.
Concordamos com os ensinamentos de Humberto Theodoro Júnior21, que defende que
a aplicação dos arts. 273, 461, 798 e 799 do Código de Processo Civil devem ser feitas a
todos os tipos de procedimentos, atingindo tanto os particulares como o Poder Público.
Excluindo-se, destarte, as restrições peculiares às liminares (tutelas de urgência) contra o
Poder Público, traçadas pelas Leis nº 8.437/92 e 9.494/97, assim como o Código Tributário
Nacional, as ações do contribuinte contra a Administração Pública, acerca de temas de Direito
Tributário, não escapam às liminares próprias do poder cautelar geral e do poder de
antecipação de tutela.
21 Tutela antecipada. In: Aspectos polêmicos da antecipação de tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 111.
Entende-se, com isso, que a antecipação de tutela, novo instituto que inaugurou a
recente reforma processual, conquanto solução de grande importância para a efetividade do
direito, merece cuidadosa interpretação, para que não venha a se transformar em verdadeira
panacéia, em prejuízo das relações jurídicas e do sistema processual vigente.
Ressalta-se, no entanto, que o sistema especial não fere o princípio da isonomia, na
medida do relevo do interesse público, que goza de supremacia à frente do particular, porque
diz respeito a todos, inclusive ao demandante.
Há que observar-se inúmeras passagens no Código de Processo Civil e em outros
textos legais, que revelam a preocupação do legislador, como no caso do parágrafo 4º do art.
20, que exclui a Fazenda, na condenação, do limite mínimo na fixação dos honorários
advocatícios ou, ainda, nos casos em que dilata prazos, como os da contestação e dos recursos
(art. 188); de ineficácia da sentença sujeita ao reexame necessário (art. 475) e da sujeição da
execução ao rito dos arts 730 do Código de Processo Civil e 100, da Constituição Federal; do
procedimento para a execução fiscal (Lei n° 6.830/80), do arresto independente de
justificação judicial (art. 816, inciso I); da reintegração de posse (art.928); entre outras.
Exatamente essa sistemática voltada à segurança e proteção do interesse público,
impede a antecipação de tutela contra a Fazenda Pública, não se tratando, a toda evidência, de
hipótese de vedação do acesso à justiça, mas, sim, de impedimento de acesso indiscriminado,
porque contrário ao sistema legal vigente.
O texto legal é expresso ao negar eficácia à sentença proferida contra a Fazenda
Pública antes do desfecho da devolução obrigatória22.
Trata-se, portanto, de condição de eficácia da sentença. José Afonso da Silva23,
comentando o artigo 475 do Código de Processo Civil, afirma que “nesse caso, estamos diante
da sentença de eficácia pendente, isto é, pendente de uma confirmação no tribunal.”
Em recente julgamento, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que o art. 475, inciso II
do Código de Processo Civil, que trata do reexame obrigatório é “providência imperativa na
fase de conhecimento”24. Posteriormente, referido Tribunal decidiu que “sendo a decisão
submetida ao reexame obrigatório, por força do disposto no artigo 475 do Código de Processo
22 CONTE, Francesco. In: Informativo Semanal COAD. n° 25/95, p. 269; DE PAULA, Alexandre. Código de Processo Civil anotado. 7.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p. 1372; DE ASSIS, Araken. In: Aspectos Polêmicos da Antecipação de Tutela. coord. Teresa Arruda Alvim Wambier, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 28.23 Estudos sobre o novo CPC. São Paulo: Resenha Tributária, 1999, p. 192.24 REsp 156,966-SP , Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, DJU 11.05.98, j. 19.03.98.
Civil, são ineficazes os atos de liquidação eventualmente praticados, devendo a expedição do
ofício requisitório aguardar o pronunciamento do Tribunal” 25.
A respeito da tutela antecipada, a doutrina já vinha levantando vozes contrárias à sua
aplicação em face da Fazenda Pública. Merece destaque a posição de Antonio Raphael da
Silva Salvador26 ao afirmar que é:
(...) impossível a tutela antecipada concedida a favor de autor contra a União, Estados e Municípios, pois aí haveria, obrigatoriamente, pedido de reexame necessário se a concessão fosse em sentença final, o que mostra que não é possível, então, a tutela antecipada, que burlaria a proteção legal prevista no artigo 475,II do Código de Processo Civil.
Ressalte-se apenas que a grande maioria dos nobres defensores dessa tese admitem,
quando houver sério risco a inviolabilidade do direito à vida e a saúde, a mitigação dessa
vedação.
No entanto, a antecipação de tutela convive de maneira harmoniosa com as causas
sujeitas a futura suspensividade recursal, desde que atendidos os requisitos do art. 273 do
Código, pois o objetivo do instituto é justamente o de evitar que a demora na prestação
jurisdicional venha a tornar inócua a providência judicial.
Vale ressaltar que a inovação teve por objeto justamente atenuar o rigoroso
formalismo processual, diante da prova inequívoca de verossimilhança.
A Lei n° 9.494/97 estendeu a antecipação de tutela às restrições antes indicadas,
adaptando a Lei n° 8.437/92 à inovação da Lei n° 8.952/94 (reforma processual), cabendo
afirmar, segundo o raciocínio dos próprios doutrinadores avessos à tese aqui defendida, que
referida lei veio a revogar, quanto à Fazenda Pública, o disposto no art. 273, do CPC
(veiculado pela Lei. 8.952/94).
Demonstrada a constitucionalidade da norma legal, há que ser ela adequada ao sistema
legal vigente. Desde logo frisa-se que a edição do texto não significa o reconhecimento da
aplicabilidade da tutela antecipada contra a Fazenda Pública, ao contrário dos argumentos já
enumerados, porque o texto legal que reafirma o sistema vigente não tem essa extensão.
Sobre isso, Cassio Scarpinella Bueno27 afirma que:
25 REsp 166.793-SP, de 23 de junho de 1998, publicado no Bol. AASP 2091/857 - Rel. Min. Helio Mosimann.26 Da Ação Monitória e da Tutela Jurisdicional Antecipada. São Paulo: Malheiros Editores, 1996, p. 56.27 Tutela antecipada e ações contra o Poder Público - Reflexão quanto a seu cabimento como conseqüência da necessidade de efetividade do processo. In: Aspectos polêmicos da antecipação de tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 79.
(...) ao estender ao instituto da tutela antecipada as mesmas restrições constantes do ordenamento jurídico brasileiro a respeito da liminar em mandado de segurança, bem como da tutela cautelar, reconheceu este ato do Executivo, para todos os fins, o cabimento deste novo instituto contra a Fazenda Pública, superando, com tal iniciativa, todos aqueles óbices legais referidos na doutrina quando da edição da Lei 8952/94 (...). Fosse descabida a antecipação de tutela contra a Fazenda Pública, por alguma razão relacionada à sua própria natureza ou em função do sistema processual e, certamente, não haveria preocupação em disciplinar ou restringir sua incidência nas ações movidas em face do Poder Público.
Então, a se admitir a doutrina que considera o direito à antecipação de tutela aplicável
a todo e qualquer processo, se estará não só subvertendo todo o sistema processual vigente,
como exaustivamente demonstrado, como contrariando o próprio instituto, que certamente
não foi introduzido com o objetivo de resolver o problema da morosidade da máquina
judiciária, muito mais profundo e carente de medidas de cunho administrativo, mas, sim, de
torná-la eficiente nos casos indicados, sujeitos à ordem legal.
Por outro norte, combatendo a respeitável posição do não cabimento de antecipação de
tutela contra a Fazenda Pública, parte majoritária da doutrina28 e da jurisprudência nacional29,
apontam ser inaplicável o simples argumento de que o reexame necessário impede a tutela
antecipada contra a Fazenda Pública.
Para tanto, utiliza basicamente os seguintes argumentos:
a) o reexame necessário somente diz respeito às sentenças proferidas contra a União, o
Estado, o Distrito Federal, o Município e as respectivas autarquias e fundações de direito
público, e não com relação às decisões interlocutórias proferidas contra estes;
b) se a Lei não possui comandos inúteis, e a Lei n° 9.494/97 previu os casos em que
não poderá ser antecipada a tutela contra a Fazenda Pública, por certo, nos demais casos, não
há proibição.
28 JÚNIOR, Humberto Theodoro. Aspectos Polêmicos da Antecipação de Tutela. coord. Teresa Arruda Alvim Wambier, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997; LAMEGO, Luciano De Castro. Comentários sobre a antecipação a Tutela e a Fazenda Pública. In: Revista do Curso de Direito da FUMEC. v. 2/2000, p. 39; DE MATTOS, Mauro Roberto Gomes. Da legalidade da antecipação da tutela contra o poder público – controle efetivo dos atos administrativos. In: ST. nº 107, Porto Alegre: Síntese, maio/98; ALVIM, José Eduardo Carreira. Medida Liminares e elementos co-naturais do sistema da tutela jurídica. In: Revista Trimestral de Jurisprudência dos Estados. v. 160, São Paulo: Vellenich, 1997, p. 88; WAMBIER, Luiz Rodrigues. Antecipação da tutela em face da Fazenda Pública. In: www.vepg.br/rj/a1v1at14.htm; NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria Andrade. Código de Processo Civil Comentado. 4.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 754.29 "Afora a exceção restritiva prevista na Lei nº 9.494, de 10.9.97, é admissível a antecipação de tutela contra a Fazenda Pública, circunstância que demonstra presente o fumus boni iuris. A probabilidade de as autuações e as execuções fiscais levadas a efeito pelo Fisco ocasionar prejuízo de difícil ou penosa reparação configuram a presença do periculum in mora" (STJ - MC n.º 1.794, Min. Franciulli Netto). Vide ainda nesse sentido: STF RDA 222/244; REsp n.º 180.948, Min. Vicente Leal; TRF 4ª R. – AI 2001.04.01.009191-2 – RS – 6ª T. – Rel. Juiz Nylson Paim de Abreu – DJU 27.06.2001.
Tais argumentos, por si só, serviriam para elidir a suposta vedação de antecipação de
tutela em face do reexame obrigatório.
Contudo, com o advento da Lei 10.352/2001, que introduziu alterações no Código de
Processo Civil, surge mais um fundamento afastando a suposta vedação de antecipação de
tutela contra a Fazenda Pública.
A citada Lei acrescentou o inciso VII ao artigo 520 do Código de Processo Civil,
elaborado dessa maneira: "Art. 520. A apelação será recebida em seu efeito devolutivo e
suspensivo. Será, no entanto, recebida só no efeito devolutivo, quando interposta de sentença
que: (...); VII - confirmar a antecipação dos efeitos da tutela."
Assim, com essa alteração, a suposta vedação de antecipação de tutela contra a
Fazenda Pública, pelo fato de esta não possuiria eficácia, ainda que provisória, enquanto o
Tribunal ad quem não a apreciasse, passa, a partir de agora, a encontrar resistência no inciso
VII, do art. 520 do Código de Processo Civil, que estabelece regra em sentido diametralmente
oposto.
Explique-se apenas que, como, in casu, estamos cuidando de processo de
conhecimento, essa prevalência não afasta por completo o comando contido no artigo 475,
inciso I do Código de Processo Civil, mas sim, serve apenas para atribuir eficácia provisória a
sentença que confirmar a antecipação da tutela, salvo nos casos em que a lei expressamente a
vedar30.
As normas que impedem a concessão das tutelas de urgência (cautelares ou de
antecipações de tutela) em face do Poder Público objetivam evitar lesões ao patrimônio e ao
interesse públicos, que estariam sendo postos de lado em virtude da prevalência de interesses
privados, e, ainda, assegurar o contraditório da Fazenda Pública. Leva-se em consideração
também, serem necessárias tais restrições à concessão das tutelas de urgências em razão dos
princípios da indisponibilidade dos bens públicos, da continuidade do serviço público e da
presunção de legitimidade dos atos da Administração.31
Conclui-se, portanto, que a antecipação da tutela prevista no art. 273 do Código de
Processo Civil deve ser interpretada à luz do sistema processual vigente, respeitadas,
especialmente, as normas que regem as ações em que figura como parte a Fazenda Pública,
sendo os principais óbices à tutela antecipada no sistema processual brasileiro os seguintes: o
30 v.g.: Art. 3º da Lei 8.437/92 que atribui efeito suspensivo ao recurso voluntário ou ex officio interposto contra sentença em processo cautelar, proferida contra pessoa jurídica de direito público ou seus agentes, que importe em outorga ou adição de vencimentos ou de reclassificação funcional – artigo aplicável igualmente a tutela antecipada por força do artigo 1º da Lei 9.494/97.31 GUIMARÃES, José Lázaro Alfredo. As ações Coletivas e as Liminares contra Atos do Poder Público. 2.ed. Salvador: Panorama Gráfica e Editora, 1993, p. 31-32.
reexame necessário32, pois se antecipa a sentença e esta não tem eficácia antes do desfecho da
devolução obrigatória, nos termos do art. 475 do Código de Processo Civil; nega vigência ao
art. 188 do Código de Processo Civil, pois reduz prazo de defesa e de recurso; contraria o
artigo 730 do Código de Processo Civil e o artigo 100 da Constituição Federal, bem como os
dispositivos orçamentários constitucionais, quando gera antecipação financeira. A
instrumentação da execução, além de ferir a ordem cronológica do precatório, esbarra no
conjunto de requisitos cumulativos do art. 273 do CPC, especialmente o periculum in mora e
a irreversibilidade.
Ainda, a legislação federal, editada a respeito das medidas cautelares e da antecipação
de tutela contra a Fazenda Pública - Leis n°s 8437/92 e 9494/97 -, apenas reafirmam o sistema
vigente, tendo sido julgadas constitucionais as medidas ali inseridas.
A antecipação de tutela contra a Fazenda Pública tem cabimento nas ações civis
públicas, populares e mandados de segurança, ressalvado limitações expressas em lei, como
por exemplo, em casos de aumento de vencimentos ou vantagens aos servidores públicos, ex
vi da Lei n° 9.494/97. Dessa forma, todas as demandas cuja causa de pedir esteja fora do
espectro da incidência dessa norma, não estão sujeitas àquelas limitações e, presentes, no caso
concreto, seus requisitos, virá a antecipação de tutela e sua respectiva efetivação.33
Raciocinar em sentido contrário seria o mesmo que retirar do juiz a possibilidade de
análise das reais necessidades do caso concreto, da verificação dos requisitos próprios à tutela
de urgência que a parte vem postular.
32 "O instituto da tutela antecipada, assim como qualquer medida de caráter liminar contra a fazenda pública, não se compatibiliza com o princípio do duplo grau de jurisdição necessário, eis que a decisão só se torna exeqüível após sua confirmação pelo Tribunal ad quem." (STJ – REsp 103752 – SP – 5ª T. – Rel. Min. Edson Vidigal – DJU 01.02.1999 – p. 223). "ANTECIPAÇÃO DE TUTELA EM FACE PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO – INADMISSIBILIDADE – INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA – INTELIGÊNCIA DO ART. 475, II, CPC – OBRIGATORIEDADE DO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO.Ao contrário das cautelares que visam, tão-somente, à garantia processual do resultado útil da sentença, a tutela antecipada, como o próprio nome sugere, antecipa os efeitos da decisão final no todo ou em parte produzindo, portanto, os efeitos reservados à sentença transitada em julgado ou cujo recurso careça de efeito suspensivo.A natureza jurídica da antecipação da tutela esbarra com o disposto no art. 475, do Codex Instrumentalis, que exige o reexame das decisões proferidas contra as pessoas jurídicas de direito público elencadas no inciso II, do referido artigo." (TJSC - Agravo de instrumento nº 00.020316-5, da Capital, Relator: Des. Volnei Carlin). E ainda: "É inadmissível a antecipação da tutela contra a Fazenda Pública porque, se a própria sentença está sujeita ao reexame necessário, não se pode antecipar efeitos que ela não possui (...)." (TJMS – AG 66.823-5 – Classe B – XII – Campo Grande – 3ª T.Cív. – Rel. Des. Nelson Mendes Fontoura – J. 25.08.1999).33 Em sede de agravo de instrumento, o Desembargador Albano Nogueira, levando ao conhecimento do Colegiado, deixou proclamado o cabimento de antecipação de tutela em ações contra o Poder Público, extraindo-se do seu voto condutor as seguintes considerações: “(...) é possível a concessão antecipada da tutela em qualquer processo de conhecimento, desde que preenchidos os requisitos legais” (TJSP. 7ª Câmara de Direito Público. AI 5.979-5/1, SP, j. 19.08.1996, In: COAD, Informativo Semanal, v. 5, n. 77047, p. 77, 1997).
Sendo assim, o sistema jurídico brasileiro admite o adiantamento da tutela, mesmo
quando requerido contra a Fazenda Pública, desde que a antecipação possa ocorrer sem violar
a legislação infraconstitucional que prevê casos expressos de seu não cabimento.34
5. CONCLUSÕES
1-Com a inovação surgida em 1988, não é necessário que exista a lesão, basta apenas
se vislumbrar a ameaça para que o Poder Judiciário esteja autorizado a apreciar a contenda
colocada sob sua jurisdição.35 Verifica-se, portanto, que as tutelas de urgência (tutela
provisória), aí incluída as medidas antecipatórias, provêm do sistema constitucional, sendo
instrumentos de harmonização destinados a dar condições de convivência simultânea aos
direitos fundamentais da efetividade da jurisdição e da segurança jurídica. Tem como
pressuposto uma situação de urgência, que é formada à base de cognição sumária e possui
eficácia limitada no tempo, podendo ser modificada ou revogada a qualquer tempo.
2-Dentro do princípio da efetividade está o acesso à Justiça, que deve ter como
finalidade o acesso a uma justiça organizada, que seja também assegurada por instrumentos
processuais para a realização do direito. Exemplos típicos destes instrumentos são a tutela
antecipada e a medida cautelar.
3-Trata-se de poder que nasce, não propriamente do art. 5º, incisos XXXV e LXXVIII
da Constituição unicamente, como tutela preventiva, mas do sistema constitucional
organicamente considerado, e, em ocorrendo a colisão entre segurança e efetividade da
jurisdição, tornar-se-á inafastável a necessidade de formular solução harmonizadora, tarefa
que, na omissão da lei e na falta de sua previsão expressa, deve, por imposição do sistema
constitucional, ser assumida necessariamente pelo Juiz.
4-Assim, o princípio regente é o da inafastabilidade do controle jurisdicional do ato
ilegal, ou eivado de abuso de poder, ou até mesmo da ameaça de lesão a direito.
5-Além disso, assevere-se que nem todo direito, para ser realizado, requer ampla
defesa e contraditório; o direito pode ser evidente (liquidez e certeza) ou apenas verossímil; a
34 MACHADO, Antonio Cláudio da Costa. Tutela antecipada. 2. ed. São Paulo: Oliveira Mendes, 1998, p.84; FRIAS, J. E. S. Tutela antecipada em face da Fazenda Pública. Revista dos Tribunais, nº 728; BUENO, Cássio Scarpinella. Liminar em mandado de segurança: um tema com variações. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, p.26-62; ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da tutela. São Paulo: Saraiva, 2000. 260p.; FRIEDE, Reis. Tutela antecipada, tutela específica e tutela cautelar. Belo Horizonte: Del Rey, 1999, p.190; BENUCCI, Renato Luiz. Antecipação da tutela em face da Fazenda Pública. São Paulo: Dialética, 2001, 125p. 35 CRETELLA JUNIOR, José. Comentários à Constituição de 1988. São Paulo: Forense Universitária, 1992. v.1, p. 437.
situação carente de tutela jurisdicional pode estar fulcrada pela urgência; ou parcela autônoma
da lide vem trazida ao processo (sumariedade material e cognição parcial); ou o legislador
pode tratar determinadas situações isoladas de maneira diferenciada - e o processo deve ser
construído em função dessas diferenças. Assim é que, pela tutela antecipada do pedido a que
alude o art. 273 do Código de Processo Civil, o juiz pode, em sumaria cognitio, antecipar os
efeitos daquela que seria uma futura sentença de mérito.
6-Deve-se atentar, como restou registrado anteriormente, que não se trata de medida
cautelar, concedida diante das regras e princípios que disciplinam essa espécie do processo
civil contencioso, mas, sim, cuida-se de prestação jurisdicional cognitiva, consistente na
outorga adiantada da proteção que se busca no processo do conhecimento, a qual, verificados
os pressupostos da lei, é anteposta ao momento procedimental próprio. Configurados os
respectivos requisitos, que se descobrem no caput do artigo, nos seus dois incisos e no seu
parágrafo 2º, o juiz, por razões de economia, celeridade e efetividade, concede, desde logo, e
provisoriamente, a proteção jurídica, que só a sentença transitada em julgado assegura em
termos definitivos.
7-A relevância do tema é latente, caracterizando-se em verdadeiro direito fundamental
de acessibilidade do Poder Judiciário, que reclama uma tutela adequada, diferenciada e
específica, de modo a ensejar uma imediata reparação.
8-As pessoas jurídicas de Direito Público, quando forem partes em ação judicial,
também passam a desfrutar de tratamento especial não reconhecido aos particulares.
9-Apesar de atos normativos de caráter infraconstitucional vedarem o exercício
liminar da tutela jurisdicional cautelar ou antecipatória pelo Estado (Leis nºs 8.437/92 e
9.494/97), tais preceitos se interpretados de modo absoluto possuem o objetivo de aniquilar o
próprio direito material, maculando o princípio constitucional da inafastabilidade do controle
jurisdicional (art. 5º, XXXV da Carta Magna), que representa, pelo seu caráter global, o
direito de ingresso em juízo com a ação de conhecimento, como também a possibilidade de
escolha de ações que possuam rito mais célere e eficaz, no afã de que seja encurtado o tempo
de permanência em juízo.
10-Às limitações infraconstitucionais da antecipação da tutela face às pessoas jurídicas
de Direito Público, permite-nos rematar que o legislador, ao estender a tutela antecipada à
restrição de liminares no ordenamento jurídico brasileiro, reconheceu o cabimento deste
instituto em ações contra o Poder Público. Embora essas normas possam ser consideradas
constitucionais, não devem, necessariamente, ser aplicadas para todos os casos, desde que se
trate de conflito de valores jurídicos igualmente relevantes, como a prestação jurisdicional
efetiva e adequada, e a segurança jurídica e o risco de danos ao interesse público. Esta
aferição apenas poderia ser realizada em concreto, fazendo prevalecer o princípio da
efetividade da Justiça, contido no inciso XXXV do art. 5º da Carta Magna.
11-Conclui-se, portanto, que a proteção do interesse público, corolário do Estado
Democrático de Direito, não chega a afastar a efetividade da tutela antecipada, devendo o
juiz, diante de cada caso concreto, através da aplicação do princípio da proporcionalidade dos
bens jurídicos em conflito e diante do princípio da isonomia, reconhecer a aplicação da tutela
antecipada, mas repita-se com acuidade necessária para que a coletividade não seja penalizada
em detrimento do interesse individual( que em alguns casos, como a máfia montada para
fornecimento de medicamentos de alto custo e, muitas vezes ainda não aprovados pela
ANVISA, à pacientes que na maioria das vezes poderiam custear o tratamento) inviabiliza o
Sistema Único de Saúde e retira verbas preciosas da Saúde Pública .
12-As restrições legais ao poder cautelar do Juiz, dentre as quais sobreleva a vedação
de liminares contra atos do Poder Público, prevista no art. 1º da Lei nº 8.437/92, devem ser
interpretadas mediante um controle de razoabilidade da proibição imposta, a ser efetuado em
cada caso concreto, evitando-se o abuso das limitações e a conseqüente afronta à plenitude da
jurisdição do Poder Judiciário e, por expor titulares de direitos subjetivos ao perigo de lesão
grave, de difícil ou incerta reparação.