a disneyzaÇÃo da cultura infantil

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A DISNEYZAÇÃO DA CULTURA INFANTIL por Claudia Lúcia Cézar de Castro Elisabete Serafim da Silva Lima Lucilene de Oliveira Valle Maria Cecília Garcia Serafim Fulgencio Simonne Maria Fernandes Pinto “Se preocupará com a educação pré-escolar, o meio-ambiente, o emprego. A unidade familiar será sua chave. EPCOT não será um monumento arquitetural; mas será uma mostra do que a ingenuidade e o empreendimento americano podem fazer Pura filosofia ”. INTRODUÇÃO: Submetendo a Disneylândia, através de seus parques e seus filmes a uma análise através da Teoria Crítica, além de verificar os temas e as questões levantadas em torno da construção analítica dos fenômenos e os conceitos apresentados dentro da citada teoria. E, enfim, levando-se também em consideração o fato de serem veículos de comunicação de massa prestigiados e formadores de opinião, procuramos obter, dentro do material apresentado por esses meios, os dados mais explícitos que se encaixassem aos itens críticos identificados por Henry Giroux. Segundo o autor, toda sociedade costuma produzir uma imagem ideal a respeito de si mesma. É a partir dessa imagem que ela busca se enxergar e que gostaria de ser lembrada no futuro. Nos grandes centros urbanos, a sociedade procura fazer-se notar através de obras que denotam progresso, riqueza e modernidade. Na visão de Henry Giroux um exame da Cultura Infantil vem mostrar que as identidades individuais e coletivas das crianças e dos jovens são amplamente moldados, política e pedagogicamente na cultura visual dos videogames, televisão,

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Page 1: A DISNEYZAÇÃO DA CULTURA INFANTIL

 A DISNEYZAÇÃO DA CULTURA INFANTIL

por

    Claudia Lúcia Cézar de Castro Elisabete Serafim da Silva Lima

 Lucilene de Oliveira Valle  Maria Cecília Garcia Serafim Fulgencio

Simonne Maria Fernandes Pinto

 

“Se preocupará com a educação pré-escolar, o meio-ambiente, o emprego. A unidade familiar será

sua chave. EPCOT não será um monumento arquitetural; mas será uma mostra do que a ingenuidade e o

empreendimento americano podem fazer Pura filosofia ”.

 

INTRODUÇÃO:

 Submetendo a Disneylândia, através de seus parques e seus filmes a uma análise através

da Teoria Crítica, além de verificar os temas e as questões levantadas em torno da construção

analítica dos fenômenos e os conceitos apresentados dentro da citada teoria.  E, enfim,

levando-se também em consideração o fato de serem veículos de comunicação de massa

prestigiados e formadores de opinião, procuramos obter, dentro do material apresentado por

esses meios, os dados mais explícitos que se encaixassem aos itens críticos identificados por

Henry Giroux.

 Segundo o autor, toda sociedade costuma produzir uma imagem ideal a respeito de si

mesma. É a partir dessa imagem que ela busca se enxergar e que gostaria de ser lembrada no

futuro. Nos grandes centros urbanos, a sociedade procura fazer-se notar através de obras que

denotam progresso, riqueza e modernidade.

Na visão de Henry Giroux um exame da Cultura Infantil vem mostrar que as identidades

individuais e coletivas das crianças e dos jovens são amplamente moldados, política e

pedagogicamente na cultura visual dos videogames, televisão, cinema e até mesmo nos

shopping centers e parques de diversão e não apenas nas escolas.

Tornou-se claro, após uma observação mais profunda, que a idéia anterior em que os

filmes animados eram considerados estimulantes da imaginação e da fantasia e que em geral

eram “bons” para as crianças são submetidos pela relevância de os mesmos ultrapassarem as

fronteiras do divertimento e passarem a exercer um importante papel de “máquina de

ensinar”. Esses filmes inspiram autoridade cultural e legitimidade para ensinar tais como

escolas públicas, instituições religiosas e a família.

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A legitimidade imperativa desses filmes vem em parte de sua forma singular de

representação, mas também é assegurada pela mídia. Esse aparato está equipado com uma

impressionante tecnologia, com magníficos efeitos de som e imagem e, assim, suas simpáticas

e amáveis estórias são apresentadas numa atraente embalagem do entretenimento.

Ao contrário da realidade sem graça e freqüentemente dura da escolarização, os filmes

infantis fornecem um espaço visual, onde a aventura e o prazer se encontram num mundo

fantasioso de possibilidades e numa esfera comercial de consumismo. Os personagens se

tornam um veículo para estimular a crença de que felicidade é sinônimo de viver num bairro

rico com uma família de classe média, branca e intacta. A noção de que os pais solteiros e

famílias “desfeitas” são a fonte de todos os males sociais, tem se tornado a matéria prima dos

filmes da Disney.

No lado capitalista, as coisas tomaram um rumo diametralmente oposto. Nos Estados

Unidos, o ideal de felicidade tem sido, há muitos anos, quase sinônimo de riqueza e bem-estar

individuais. É o chamado ideal do self-made-man. Um dos primeiros símbolos desse ideal foi

o automóvel.

Posteriormente o prazer através do divertimento, consequentemente este prazer vem

sendo alcançado através de visitas e idas aos parques de diversão.

Na América sempre se valorizou o esforço individual em busca da felicidade, recompensado

pelo consumo de bens que podem tornar a vida mais amena e prazerosa. À medida que os

filhos do autor vivenciavam a enorme máquina de entretenimento e ensino corporificada pela

Disney, ele se tornava consciente de quanto era necessário deixar de tratar esses filmes como

diversão para questionar as diversificadas representações e mensagens que constituem a visão

conservadora do mundo que é apresentada pela Disney.

 1.  ESTRATÉGIA DE DOMÍNIO DA INDÚSTRIA CULTURAL:

Qualquer tentativa para considerar os filmes da Disney de forma crítica vai contra o

senso Afinal “O lugar mais feliz da terra” adquiriu sua popularidade, através de uma

autoproclamada imagem de inocência – sua marca registrada - que a tem protegido do olhar

questionador dos críticos.

        A Disney é um poderoso império econômico e político, arrecada milhões com

filmes, produtos associados aos filmes e personagens, com seus parques e locais de

diversão. Mas a Disney é mais que um gigante capitalista é uma instituição cultural que luta

Page 3: A DISNEYZAÇÃO DA CULTURA INFANTIL

ferozmente para proteger seu status mítico como provedora de inocência e virtude moral

americana.

        Ela processa de forma agressiva, violações de suas leis de copyright, chegou a

ameaçar o início de uma ação legal contra creches do Sul da Califórnia por usar os

personagens dos cartoons da Disney em suas paredes exteriores.  Nesse caso a reputação da

Disney ficou prejudicada, mas não subestimada.

A Disney define-se como veículo para educação e responsabilidade cívica ela patrocina

o “Prêmio do Professor do Ano”, fornece bolsas a estudantes que se “destacam” e, mais

recentemente tem oferecido ajuda financeira, treinamento e programas educacionais para

jovens urbanos pobres através de seu programa de patinação no gelo chamado Metas. 

Ao fundir cultura e diversão, há uma agressão a primeira e uma tentativa vã de

supervalorização da segunda. Não é fácil perceber este estado, mas algumas pessoas dão conta

disso: recentemente artistas que receberiam o prêmio Sharp se recusaram a comparecer à

cerimônia, alegando que a mesma não fazia sentido e não acrescentava nada, haja vista o

próprio nome do prêmio que já mostra, por si só, uma vinculação da arte com o consumo.

A dificuldade da percepção se dá também porque ocorre, nesta relação, uma diminuição

do contato das pessoas com o que é particular, subjetivo – os consumidores apenas pensam

que são sujeitos pensantes. Se a cultura contribui para domar os instintos revolucionários e os

costumes bárbaros, a cultura industrializada vai além, promovendo a tolerância da vida

desumana que cada qual vive e banalizando a vida: em alguns best-sellers, por exemplo, há

uma redução da complexidade humana, com a apresentação de personagens lineares, são bons

os tempo todos ou vice-versa.

Fazendo questão de se definir como provedora de idéias e não de mercadorias, ela está

desenvolvendo, de forma agressiva, sua imagem como uma indústria de serviço público, ela

planeja construir nos próximos anos uma escola protótipo, que um de seus materiais de

propaganda proclama que “servirá como modelo para educação no próximo século”. Segundo

executivos da empresa, será desenhada tendo como modelo “as ruas principais da América

das pequenas cidades e lembrará as imagens de Norma Rockwell” (citada em Walsh, 1994,

p.1).

Exemplos da Disneyzação abundam.  Por exemplo, o aeroporto de Houston construiu

seu sistema de transporte de trilho único de acordo com o existente na Disneylândia.

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Jon Wiener argumenta que a versão do Main Street América apresentada pela Disney

ecoa uma “imagem de pequenas cidades caracterizadas por um vivo comércio, com bandinhas

e sorvetes e gloriosos desfiles”. 

Para Wiener essa visão não apenas transforma em ficção e trivializa a história ou as

reais, Main Streets na virada do século, ela também representa uma apropriação do passado

que tem a finalidade de legitimar um presente que é descrito como um mundo “sem favelas ou

pobreza ou conflitos urbanos de classe... trata-se de um ingênuo nativo sonho branco e

protestante, de um mundo sem negros ou imigrantes”.  (Wiener, 1994, p.134).

 2.  QUALIDADE DO CONSUMO DOS PRODUTOS CULTURAIS

Na análise dos mais recentes filmes animados da Disney produzidos a partir de 1989,

observa-se que os mesmos têm recebido grandes elogios da imprensa dominante e têm sido

campeões de bilheteria, para muitas crianças representam sua primeira introdução ao mundo

Disney;

Em suma, os espectadores estão mais dispostos a suspender seu julgamento crítico em relação

a esses filmes infantis. O público da Disney, as instituições legais, os teóricos do cinema, os

críticos culturais vêem “os filmes da Disney como” fora dos limites” do empreendimento

crítico.

Este analisa a Disney como uma metonímia para a “América limpa, decente, trabalhadora –”

“o lugar mais feliz sobre a terra”.  Houve uma massificação da opinião pública.

Como qualquer instituição educacional, a visão de mundo da Disney precisa ser analisada

pela forma como narra a cultura infantil e responsabilizada pelo que faz como uma importante

esfera pública cultural. A influência comercial e cultural da Disney é grande e extensa para

que se permita que ela se defina a si própria exclusivamente no interior do imaginário

discurso da inocência, do orgulho cívico e o entretenimento.

A maioria dos espetáculos televisivos visa à produção ou, pelo menos, à reprodução de

muita mediocridade, de inércia intelectual e de credulidade que parecem adequar-se aos

credos totalitários, mesmo que a mensagem explícita e visível dos espetáculos possa ser

antitotalitária.

 A manipulação do público – perseguida e conseguida pela Indústria Cultural entendida

como forma de domínio das sociedades altamente desenvolvidas – passa assim para o meio

televisivo, mediante efeitos que se põem em prática nos níveis latentes das mensagens.

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Através do material que observa, o observador é continuamente colocado, sem o saber, na

situação de absorver ordens, indicações, proibições.

3.  OS FILMES DA DISNEY SÃO BONS PARA AS CRIANÇAS?

Não há uma resposta fácil e ainda reside a uma análise simplista nos registros

tradicionais e supostamente não ideológicos do divertimento e do entretenimento.

A Disney constrói uma cultura de alegria e inocência para as crianças e através de

fontes mais recentes da Disney, é que podemos destacar os filmes “A Pequena Sereia “

(1992), “ A Bela e a Fera” (1991), “ Aladim” (1992), e “ Rei leão” (1994).

4.  O FILME INFANTIL E A CORREÇÃO POLÍTICA.

Como se sabe, o filme infantil é raro na paisagem cinematográfica. Tão ou mais raro,

dir-se-ia, do que a comédia com que partilha tantos aspectos da sua definição sócio-comercial,

e muito mais raro do que o filme de terror ou de Ficção Científica. Se passarmos ao filme

infantil de animação, a raridade alia-se a uma quase exclusividade dos grandes estúdios

tradicionais na sua produção, a ponto de para muita gente, filme de animação equivaler a

Disney - equivalência não desprovida de pertinência histórica, pelo menos. Esta raridade (e

abandonemos agora a perspectiva histórica para nos determos na situação atual) não é sem

conseqüências para o próprio perfil do filme infantil. Como bem sabemos da nossa

experiência feita de cidadãos do planeta Hollywood, cada novo filme Disney é anunciado e

promovido como se de uma obra definitiva se tratasse, dentro de um imaginário estritamente

capitalista que faz (mais uma ironia da história) da quantidade o motor exclusivo da

qualidade: o número de horas envolvido na realização de uma cena de conjunto; o volume de

efeitos «especiais» novos, sobretudo os resultantes da interação da animação com a

informática; o número de pessoas que trabalhou, direta ou indiretamente, no filme ou numa

das suas cenas emblemáticas, etc. Digamo-lo, pois: se Hollywood é o cinema enquanto

felicidade despesista, o filme de animação (a Disney) vive há muito em regime de produção-

Titanic.

 É coisa de muito poucos capitães de indústria para todos os deserdados do imaginário

do capitalismo. Ou, por outras palavras: é o imaginário infantil enquanto opulência, mas

sobretudo a opulência do capital enquanto imaginário disponível aos infantes que todos

somos.Ora, o filme de animação é hoje o mais poderoso divulgador desta visão ecológica

politicamente correta: pense-se em Rei Leão, Pocahontas, Os 101 Dálmatas, etc. A questão

em pauta não é, aliás, o politicamente correto, de que na Europa, e mais ainda num país

periférico como o nosso, em cuja estrutura sócio-cultural profunda não ecoam as razões

daquilo que, do lado de lá do Atlântico, suscitou a reação Politicamente Correta, nos chegou

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apenas uma versão folclórica e redutora. Num certo sentido, a Disney sempre foi uma

convicta praticante da correção política. Nem se vê como poderia assim não ser, tratando-se

de uma produtora de filmes infantis, gênero, como vimos, impensáveis fora da Cena da

Educação. Pensemos um pouco nos clássicos, atividade sempre formativa: o que nos

ensinavaDumbo senão aquilo a que o discurso politicamente correta de hoje chama o

«respeito pela diferença»? Ao tempo, porém, esse enunciado era codificado dentro de uma

pedagogia cristã da compaixão mais ou menos enternecida - pedagogia aliás transponível para

as relações entre ricos e pobres, etnias majoritárias e minoritárias, no campo social.

É a cultura da Indústria. Uma cultura que se situa na interseção entre entretenimento,

defesa de idéias políticas e sociais, prazer e consumismo.

A arte se torna, então, um negócio; (não existe mais arte cinematográfica e sim

indústria cinematográfica) cujo fim é a aquisição de capital; assim o lucro não é mais só a

intenção, mas o princípio exclusivo, por isso, interessa à Indústria Cultural a constituição de

subgrupos, como o dos jovens ou o dos negros, por exemplo, que ela transforma em objetos

lucrativos, além de privilegiar a idolatria, a infantilidade, a euforia generalizada, a platéia.

Todos esses filmes têm alcançado uma campanha de publicidade muito grande e mostra

que publicidade é, hoje, um exemplo forte da Indústria Cultural porque ambas estão fundidas.

A função de um publicitário é fazer com que o consumidor compre aquilo que ele não precisa

com o dinheiro que ele não tem; ele, de fato, consegue cumpri-la: quando produz uma

propaganda, já sabe qual público atingir porque pesquisou, anteriormente, suas necessidades

(que foram construídas por ele próprio). Deste modo, o consumidor é o objeto da Indústria

Cultural. A Indústria Cultural extermina o que é particular, nega a particularização, seja a cor,

a composição, a arquitetura.

Esta publicidade é dirigida a um enorme público, principalmente o infantil.

Por exemplo o mercado de vídeo, é considerado um mercado da cultura.

E a Disney foi uma das primeiras empresas a ligar a venda de brinquedos aos filmes.

Não só os brinquedos fazem parte deste Mercado Cultural, que também podemos assim

classificar como indústria cultural, que é importante destacar que ela é o fruto de uma

sociedade Quando se fala em Indústria Cultural, capitalista industrializada, onde até mesmo a

cultura é vista como produto a ser comercializado1.

Assim, cada vez mais, a máquina da Indústria Cultural, ao preferir a eficácia dos seus

produtos, determina o consumo dos mesmos e exclui tudo o que é novo, tudo o que ela

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configura como risco. A identidade do domínio que a indústria cultura exerce sobre os

indivíduos, aquilo que ela oferece de continuamente novo não é mais do que a representação,

sob formas diferentes, de algo que é sempre igual; a mudança oculta um esqueleto, no qual

muda tão pouco com no próprio conceito de lucro, deste que este adquiriu o predomínio sobre

a cultura. Com seus produtos, a Indústria Cultural pratica o reforço das normas sociais,

repetidas vezes até a exaustão, sem discussão. Ela fabrica seus produtos com a finalidade de:

promover a deturpação e a degradação do gosto popular,

      obter uma atitude sempre passiva do consumidor simplificando ao máximo seus

produtos.

      Eles são construídos propositadamente para um consumo descontraído, não

comprometedor.

      serem trocados por moeda,

Segundo Adorno (1944), cada um desses produtos reflete o mecanismo econômico que

domina o tempo do trabalho e o tempo do lazer.

Com relação à indústria do filme, é possível assistir a uma montagem feliz dos

melhores filmes da Disney. Alegria, cor, emoção, são os ingredientes desta fantástica viagem

a histórias. Até a primeira metade deste século, o sucesso alcançado pelos filmes de longa-

metragem era devido exclusivamente aos seus próprios méritos, ao contrário de hoje, quando

os longas são apresentados acompanhados de diferentes artigos produzidos para serem

consumidos simultaneamente e contribuindo diretamente para o sucesso do filme. No caso

dosfilmes infantis de animação os artigos vão desde camisetas, sapatos, jogos eletrônicos, até

grande número de artigos escolares como cadernos, lancheiras, mochilas.

Atualmente, o filme é apenas um dos produtos que compõem um agregado de produtos

formando um pacote multimídia de consumo cultural que funciona dentro da lógica capitalista

do mundo globalizado. Desse modo, os custos da produção podem ser garantidos não apenas

pela bilheteria do cinema, mas sim por uma ampla estratégia publicitária e de marketing. Uma

das conseqüências é que o processo de significação é ampliado envolvendo outros espaços

além da sala de cinema. Um exemplo interessante foi o que ocorreu com o filme

Os caça-fantasmas(Ghostbusters) do qual o logotipo foi divulgado muito antes do seu

lançamento, através de camisetas, bonés e até mesmo da trilha sonora;  o filme entrou aí

apenas como mais um dos produtos a serem vendidos (Turner, 1997).

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Mais recentemente, com o lançamento do filme Tigrão, os estúdios Disney em parceria

com a mega rede de sanduíches McDonald´s comercializou 2 milhões de personagens do

filme em forma de bonecos para atender a demanda. Segundo Turner (1997), ultimamente

muitos orçamentos de produção de filmes têm sido menores do que a verba destinada para sua

publicidade. Os desenhos animados, no formato de filmes infantis, têm sido produzidos em

números cada vez maiores, pelos grandes estúdios cinematográficos. Longe de serem simples

mecanismos de diversão, tais filmes podem ser considerados artefatos que exercem uma

determinada pedagogia cultural. É a partir desta perspectiva que se busca analisá-los como

espaços de constituição de identidades de gênero e sexuais, e como construtores de uma

heterossexualidade normativa que produz sujeitos da educação. Freqüentemente,

osfilmes infantis produzidos constroem as diferenças de gênero e sexuais de forma

"convencional", determinando a construção hierárquica do feminino e do masculino como

definitivas e imutáveis.

Tais  são dirigidos mais especificamente a uma faixa etária determinada e neles o que

podemos observar é uma série de narrativas em torno de comportamentos e valores que, entre

outras coisas, estão produzindo determinados sujeitos de gênero. É nesse sentido que se torna

importante estarmos atentas/os para as formas através das quais as representações de gênero

têm sido reafirmadas na sociedade ocidental contemporânea, contribuindo para educar

sujeitos e normalizar condutas.

Como exemplo disso, podemos ver na adaptação da Disney para o clássico “O Corcunda de

Notre Dame”, de Victor Hugo. A história foi "adocicada" para tornar se tornar –se mais

palatável ao consumidor...

Assim, a Indústria Cultural pretende alienar e não conscientizar. Acomodar, e não

incitar.

Como são feitos para serem vendidos, os produtos da Indústria Cultural jamais devem

desagradar os compradores. A produção é homogeneizada e nivelada por baixo. A visão

crítica, por parte do expectador, não é possível dentro da Indústria Cultural, pois, “A

transformação do ato cultural em valor suprime sua função crítica e nele dissolve os traços de

uma experiência autêntica”.

Embora seja fundamental para a análise dos meios de comunicação de massa, em

especial na primeira metade do século passado, a noção de Indústria Cultural tem sido objeto

de diversas críticas.

Com relação à Indústria Cultural, então, iniciam questionamentos tais como: Por que se

consome tal produto, seja ele um filme ou uma roupa? E nessa comercialização pode-se notar

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o consumo, pois neste não está presente o interesse da coletividade, mas apenas do individual.

Por exemplo: “A Bela e a Fera” e “A Pequena Sereia”, tiveram uma venda conjunta de 34

milhões de fitas. Além disso, Aladim rendeu um bilhão de dólares com a venda de ingressos

de cinema, fitas de vídeo, quinquilharias laterais como vestidos da Princesa Jasmine.

Paralelamente, surgem outros produtos como Videogames que venderam mais de 3

milhões de cópias em 1993.

Também obtiveram recordes de venda com o filme do Rei Leão que, em até 1994

(agosto), tinha obtido um lucro de 252,5 milhões de dólares. Foi considerado um dos filmes

mais lucrativos da Disney.

 

Entre os filmes da Disney, alguns como, Mickey, Branca de Neve, Aladim   e outros  se

tornam modelos para inúmeros jogos, brinquedos que inundam lojas do mundo inteiro e o

consumo desses produtos, pode levar à alienação/revelação2. Não são apenas as crianças que

sonham em mergulhar no mundo de Mickey e família. Gente grande fica com água na boca

diante da perspectiva de passear pela coleção de clássicos como “Mary Poppins” e “Bambi”

ou pegar como lembrança esculturas da Bela da Fera e do Simba. Perplexo? Pois é possível

comprar pela Rede, tão facilmente quanto na real.

 Os parques de diversão, por exemplo, encantam a todos que o freqüentam e até aos

que os vêem através de propagandas. O parque é localizado em uma área de 400.000 m2.

Embora seja muito mais um parque temático do que um estúdio de filmagens, vários

programas de televisão são produzidos lá. 

O sistema de estacionamento é como o do” Magic Kingdom”, onde se pega o trenzinho

para se chegar ao parque. Esqueça um pouco do Mickey e sua turma, aqui, pois ele e a Minnie

aparecem só de vez em quando para dar autógrafos. É mais provável encontrar o carro dos

"Caça Fantasmas" ou o Aladim, a Fera,  a Pocahontas ou o simpático Woody do “Toy Story”.

Lá também tem parada e, em Julho de 2000, teve a do filme "Mulan", que foi linda e exótica ,

com um colorido diferente, grandes personagens com pernas de pau e um enorme dragão com

a muralha da China sobre suas costas. Super criativo e bonito! Como sempre a Disney nos

surpreende! Hollywood Boulevard foi criado no estilo “art deco”, inspirada na Hollywood de

1930. As fachadas das lojas são perfeitas e dão boas fotos. Durante o dia é possível ver algum

artista passeando pela calçada. A época, na qual subir-se numa montanha russa, era a

experiência máxima ficou para trás. Muito mais os anos que ir até a Florida ou Califórnia e

apertar a mão de um Mickey do tamanho de uma pessoa era o melhor que podia acontecer a

uma criança.

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Neste momento, no qual as possibilidades da experiência virtual ultrapassam as da

realidade, os novos parques virtuais são a máxima sensação.

Conscientes disso, os executivos da Disney, Steven Spielberg, a Sega e a Sony

desenvolveram novos centros de entretenimento nos quais, dentro de um pequeno prédio e

sentado numa cadeira com um capacete, você pode viajar num tapete mágico, dirigir um X-

wing ou formar parte de um mundo surrealista.

A função manifesta da publicidade é aquela de “vender um produto”, “aumentar o

consumo” e “abrir mercados”. Se compararmos ao fenômeno do “consumo de anúncios” e o

de “produtos”, podemos perceber que o volume de “consumo” implicado no primeiro é

infinitamente superior ao do segundo. Em cada anúncio “vende-se” estilo de vida, sensações,

visões de mundo, relações humanas, sistemas de classificação, hierarquia, etc.      

Tudo isso compete a uma indústria cultural e que é hoje nada mais nada menos que

a GLOBALIZAÇÃO: ou seja, um processo de aceleração capitalista. Essa globalização da

cultura extrapola limites físicos e é generalizante (se antes, atravessar um país como o Brasil

era uma tarefa para bandeirantes que, às vezes, pagavam a aventura com a própria vida, hoje,

a Disneylândia é “caminho da roça” para os novos ricos brasileiros).

        Ela transforma as representações culturais e tende a homogeneizar comportamentos

(recentemente, divulgou-se, no Brasil, um vídeo norte-americano entre as empresas de

turismo brasileiras, que “ensinava” como nós deveríamos nos comportar em visita àquele

país, especialmente grupos de turistas que iriam para Orlando), fato que, aos brasileiros, soou

grosseiro, ofensivo e arrogante.

Como se pode notar, através das exemplificações supracitadas, o processo é complexo;

se ele promove intercâmbio, integração entre os povos, também faz surgir conflitos de

natureza territorial, envolvendo questões culturais e religiosas, que parecem buscar uma

identidade local ou regional, ou seja, generaliza e, paradoxalmente, particulariza. A cultura do

mercantilismo da Disney é um grande negócio e os brinquedos são modelados de acordo com

seus filmes animados, que fornecem mercadorias para mais de 300 lojas espalhadas pelo

mundo.

  

A Disney tem tentado reconstruir suas próprias bases em que a cultura popular é

definida e moldada.Ela tem ido contra a corrente da forma estética e da legitimidade cultural.

Por exemplo: quando “Fantasia” apareceu, nos anos 30, provocou a ira dos críticos de

música; pois combinava música clássica, que era considerada parte da alta cultura, com a

Page 11: A DISNEYZAÇÃO DA CULTURA INFANTIL

baixa cultura de um desenho animado, mas conseqüentemente abriu um novo espaço para

novos artistas.

Por exemplo, a música ligeira ou popular é feita de tal modo que o processo de tradução

da unicidade numa regra, está já planificado e conseguido na própria composição. A

composição identificada do modelo pelo outro. É desta forma que a música ligeira despoja o

ouvinte da sua espontaneidade e fomenta reflexos condicionados. Assemelha-se com tudo e

por tudo, a um questionário de escolha múltipla: que o preenche e está limitado a alternativas

muito precisas e previamente fixado. Enquanto na música clássica, todos os elementos de

reconhecimento são organizados numa totalidade única, na qual adquirem o seu sentido –

assim como, numa poesia, cada palavra adquire o seu significado a partir da unidade e da

totalidade da poesia e não da sua utilização cotidiana, mesmo que o reconhecimento do

significado denotativo, nessa utilização, seja já um pré-requisito da compreensão do seu

significado na poesia -, na música ligeira, é precisamente a relação entre o que se reconhece e

o que é novo que é destruída. O reconhecimento torna-se um fim e não um meio. Nesse

gênero de música, reconhecimento e compreensão é o ato através do qual o reconhecimento

leva a extrair algo de novo.

“Fantasia 2000”, lançado já neste século, ainda não deixou para trás a celeuma

ocasionada pelo original. Primeiro, com certa ironia, disseram que Disney estava tentando

cortejar a comunidade intelectual, de quem merecia tão pouco crédito. E uma das primeiras

críticas veio justamente daí: o famoso arquiteto americano Frank Lloyd Wright achava um

absurdo ilustrar música. Uma vez que os valores expressos em seus filmes eram

essencialmente os valores simples do desenho e das histórias infantis, ficava fácil taxá-lo de

ingênuo. Um gênio, talvez, mas ingênuo. Muita gente preferia ver nele apenas um grande

empresário voltado apenas para o lucro. Outro destaque importante, é quanto à fantasia, ela

está em toda parte, pois, ocorre no momento, em que os filmes animados produzem uma série

de vilões, heróis, heroínas, exóticos e estereotipados.

A estratégia de domínio da Indústria Cultural vem, portanto, de longe e dispõe de

múltiplas táticas.  Uma delas consiste na ESTEREOTIPIZAÇÃO.

 Os estereótipos são um elemento indispensável para se organizar e antecipar as

experiências da realidade social que o sujeito leva a efeito. Impedem o caos cognitivo, a

desorganização mental, constitui, em suma, um instrumento necessário de economia na

aprendizagem. Como tal, nenhuma atividade pode prescindir deles; todavia, na evolução

histórica da Indústria Cultural, a função dos estereótipos alterou-se e modificou-se

profundamente.

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A divisão do conteúdo televisivo em vários gêneros (jogos, policiais, comédia, etc.)

conduziu ao desenvolvimento de formas rígidas, fixas, importantes porque definem o modelo

de atitude do espectador, antes de este se interrogar acerca de qualquer conteúdo específico,

determinando assim, em larga medida, o modo como esse conteúdo é percebido.

Quanto mais os estereótipos se materializam e fortalecem, provavelmente, tanto menos

as pessoas modificarão as suas idéias preconcebidas com o aumento da sua experiência.

Quanto mais dura e complicada é a vida moderna, mais as pessoas se sentem tentadas a

agarrar-se a clichês que parecem conferir uma certa ordem àquilo que, de outra forma, seria

incompreensível.

Por exemplo:

  A BELA E A FERA:

O castelo torna-se mágico, os objetos são transformados; xícaras dançantes, chaleiras

falantes, talheres que se movimentam.

O monstro parecido com lobo evoca uma rara combinação de terror e delicadeza.

 A PEQUENA SEREIA:

A Sereia Ariel, aparece com um cruzamento entre a típica adolescente rebelde e uma

top módel do sul da Califórnia.

Úrsula, a lula gigante, preta e gotejante, preta e roxa, explode com malícia e ironia.

Mulheres Boas e Más parecem ter sido modeladas nos escritórios editoriais da Revista

Vogue.

 

                       REI LEÃO:

Scar, o suave felino, habilidosamente encarna uma planejada idéia do mal e traição.

 

A DAMA E O VAGABUNDO tinha como cenários os subúrbios de uma cidade

americana média, nos primeiros anos do século, um ambiente com componentes ainda

familiares hoje.

Page 13: A DISNEYZAÇÃO DA CULTURA INFANTIL

 CINDERELA

Quem não sonhou em ser uma princesa como Cinderela? Isso é tão comum que existe um

complexo que recebe esse nome, por mulheres que fantasiam em encontrar seu príncipe

encantado. Isso chega a ser tão grave, que a mulher não consegue se

relacionar.com.homem.algum.

Ela não pensa em suas responsabilidades, buscando um cara que se disponha a sustentá-la e a

protegê-la material e moralmente. O que acaba resultando em decepções e frustrações quando

seu namorado, noivo ou marido não atende a suas expectativas e ansiedades. Mas o Dr. José

Teixeira complementa, “não pense que só as mulheres sofrem desse mal, há homens que

também projetam a mulher perfeita além do normal.

É comum fantasiarmos com o parceiro perfeito. O problema aparece quando não conseguimos

suportar nenhum defeito ou fragilidade do sexo oposto”.

 PETER PAN

Ao se lembrar daquele personagem que foi parar na Terra do Nunca e que ficou criança

para sempre. Pois é, tem gente que deseja manter-se sempre jovem e, por essa razão, se

descuidam das responsabilidades de virar um adulto, deixam de assumi-las ou por sentirem

dificuldades de enfrentá-las.

Isso acontece por falta de desenvolvimento do senso moral, que é o que propicia a superação

de obstáculos íntimos ou externos. A pessoa não assume qualquer tipo de responsabilidade. É

como se ela parasse no tempo.

5.      CHAUVINISMO MASCULINO.

Tanto na “Pequena Sereia” quanto no “Rei Leão” e “Mulan” as

personagens femininas são construídas de acordo com papéis e gêneros estreitamente

definidos são em última instância, subordinados às masculinas....

 

”Ùrsula diz a Ariel que perder sua voz não é assim tão ruim porque

os homens não gostam de mulheres que falam”

O outro personagem masculino no filme “A BELA E A FERA”, seria o forte e lindo

Gaston, o homem mais popular da cidade. Ele seria facilmente reconhecido, pela audiência,

como o homem musculoso que é apaixonado por si mesmo, e que tentaria conquista Bela

usando o seu machismo. De início, ele assume que vai casar-se com Bela, mesmo não tendo

feito um pedido de casamento. Essa é a visão original de Gaston, com visual inspirado nos

antigos nobres com perucas brancas.

Page 14: A DISNEYZAÇÃO DA CULTURA INFANTIL

 Declara-se, então, a mudança de um gênero para outro; uma

transformação que precisa de alguns artifícios para se concretizar. Mulan,

então, passa por um processo de construção de uma nova identidade. Ao ser

rejeitada como candidata a noiva, ela canta: quem é que está aqui junto a

mim/ em meu ser/ é a minha imagem/ eu não sei dizer/ vou desvendar quem

sou/ eu vou lembrar/ quando a imagem de quem sou/ se revelar. Essa busca

de Mulan anuncia sua transformação subjetiva, no momento em que percebe

que não se sairá bem como Neste artigo a aé limitada à construção da

heterossexualidade normativa.

A construção da personagem representa a oscilação permanente entre qualidades

consideradas femininas e outras consideradas masculinas, através de um sucessivo número de

nomeações. O dragão Mushu (um ser enviado pelos ancestrais para proteger Mulan) ensina-a

como agir: é o seguinte: tem que andar que nem homem, levanta o queixo, ombro pra trás,

separa os pés, ergue a cabeça...Ao avistar um grupo de soldados, um mexendo nos pés, outro

com o dedo no nariz, ela diz isso é uma nojeira! e o dragão responde: não, são homens e você

vai ter que ser igual a eles. Em outro momento, enquanto toma banho no lago, Mulan (agora

chamada Ping) justifica-se: Só porque pareço com um homem não quer dizer que tenha que

cheirar como um. Retomo aqui a intenção inicial de pensar possíveis cruzamentos entre a

noção de representação e de linguagem performativa: acredito que falar em uma não exclui a

outra, pelo fato de que ambas implicam ações que operam para constituir o real. No caso do

cinema, existe uma complementação na qual a imagem junto com a fala constrói

representações. A imagem, junto com a linguagem tem uma função performativa que constrói

algo ao mesmo tempo em que representa e age sobre um sujeito, no caso a personagem,

nomeando-o. Nesse sentido, é preciso lembrar que todos os esforços de Mulan estão

analisados para um objetivo maior: salvar a honra da família, como o representante masculino

“que vai defender seu país na batalha contra os Hunos. Desse modo, só podemos identificá-la

como heroína no momento em que a confrontamos com o outro. Ser um homem significa não

apenas ser forte, mas também ser grosseiro, mal educado e violento, características que ela

precisa adotar para ser reconhecida e respeitada no exército. É possível ler, então, essa

narrativa de dois modos: por um lado, existe a reiteração constante das qualidades que deve

ter uma mulher; por outro lado, há a representação do homem como o ser abjeto e, nesse

sentido, a performativa presente no filme pode funcionar como reiteração e subversão ao

mesmo tempo”.

  6.       UM EXEMPLO DE ANÁLISE:

ANASTÁSIA, filme que motiva estas divagações, não é «juridicamente» um filme

Disney. Trata-se, muito diversamente, da entrada (ou da tentativa de) da Twentieth Century

Page 15: A DISNEYZAÇÃO DA CULTURA INFANTIL

Fox no mercado da animação. Os seus criadores, porém (Don Bluth e Gary Goldman), são,

«formalmente», filhos da Casa Disney, não adiantando a sua obra nada que de significativo se

veja em relação à poderosa operação de re-figuração do seu legado que a Disney vem

empreendendo na última década. Anastásia é em tudo um filme conservador: nas suas opções

dramáticas, nas suas soluções figurativas, na sua economia entre a palavra dita e a cantada e

ainda, “last but...”, no conteúdo histórico da sua narrativa. Porque, e essa poderia ser a

novidade trazida pela Fox à animação, ao contrário do que por princípio sucede com a Disney

– e decerto para evitar uma colonização pelo universo da Casa Mãe – em Anastásia o

universo de referência desloca-se do mítico e do fabuloso para o (aparentemente) histórico.

Trata-se, pois, de contar a história de Anastásia, aquela que, depois de morta, desejou ser

imperatriz. As potencialidades da história, reconheçam-se, são vastas e mesmo perturbadoras:

Anastásia é aquela que escapa ao feroz determinismo da História por meio de um daqueles

truques ou ruses que gostamos de pensar disponíveis, no momento da morte inexorável.

Nesse sentido, e muito aquém ou além de qualquer ideologia, Anastásia somos todos nós. O

pequeno problema desta história, contudo, é que a margem de indeterminismo assegurada por

Anastásia em relação a todas as teleonomias da História, só cobra pertinência quando

entendida como linha de fuga (ou variação) em relação a essa melodia massacrante que nos

promete um futuro sem a opacidade que o caracteriza. Ora, no caso de Anastásia a melodia dá

pelo nome de Outubro, sendo o seu principal tenor um tal Lenine.

É aqui que o filme decididamente nos surpreende. Mas para percebermos a que ponto,

convirá produzir brevemente a sua sinopse: os Romanov viviam felizes no seu palácio de

Inverno em São Petersburgo, entregues a uma existência de harmonia familiar e bailes

cortesãos. Até que um dia uma sombra negra se abateu sobre este universo idílico: a sombra

chamava-se Rasputin, o qual, quando escorraçado pelo imperador, jurou vingar-se, lançando

uma maldição sobre os Romanov. Após um breve interlúdio ocupado com imagens da

felicidade da corte nos vastos salões do palácio, eis que uma multidão em fúria entra pelo

palácio, aprisionando os membros da família real. Anastásia, ainda criança, graças à ajuda de

um amigo plebeu, consegue fugir por uma passagem secreta com a avó. Já no exterior do

palácio, eis que Rasputin lhes barra o caminho. Na luta que se segue, Rasputin afoga-se num

buraco no gelo, não sem antes repetir a maldição dos Romanov. Segue-se uma tentativa de

fuga para Paris em que Anastásia não consegue acompanhar a avó, ficando em território

russo. Anos mais tarde, sem saber exatamente quem é, Anastásia sai do lar onde viveu até à

adolescência para ir ao encontro de uma avó que, numa vaga reminiscência, sabe encontrar-se

em Paris. Cai nas mãos de um par de «empresários» em busca de alguém que se faça passar

por Anastásia, de modo a conseguir iludir a avó, então residente em Paris, e passar por último

rebento dos Romanov. Em todo este processo, Rasputin, ainda que de além-túmulo, fará o

possível por se opor ao triunfo de Anastásia, até que, numa luta titânica, em Paris, o seu

fantasma será definitivamente destruído.

Page 16: A DISNEYZAÇÃO DA CULTURA INFANTIL

Lições da História: quem tomou o Palácio de Inverno? Rasputin (ou seja: o demônio).

Mas então, se ele morreu nesse assalto, quem ficou a governar a grande Rússia? Percebe-se

que a população treme de pavor perante as autoridades, mas delas apenas uma imagem breve

nos é dada, no momento em que, na sua inocência, Anastásia se dirige à estação para comprar

um bilhete de comboio para Paris. Um indivíduo desdentado e mal encarado, com uma farda

que ostenta uma estrela vermelha de cinco pontas, faz-lhe ver, com muito maus modos, que

tal é impossível. E é tudo.

Será excessivo recordar, neste ponto, os famosos exercícios de «desaparição» a que os

técnicos de fotografia do Kremlin sujeitavam os comparsas do Paizinho de todos os sovietes

nas fotos mais emblemáticas da Revolução de Outubro? Decerto, a correção política do

período estalinista (lá como cá e por toda a Europa) pressupunha que Estalin, se não fizera a

Revolução só, pelo menos edificara sozinho a URSS. Ora, Anastásia é uma peça mais (ainda

que singela) na edificação, a que tantos se votaram e votam dedicadamente neste século, de

uma «ars oblivionis». Se a História é escrita pelos vencedores, então parece que Anastásia

triunfou sobre Lenine. Este enunciado singelo deve contudo ser lido restritivamente: pois é

certo que o mundo seria bem mais habitável (ou redimível) se a cada decreto de fuzilamento

produzido por um qualquer dos Lenines (ou Romanos) disponíveis escapasse pelo menos uma

Anastásia. Nunca isso porém redundaria numa vitória de Anastásia, já que ela não é senão o

resgate trágico de uma História que, por definição, só conhece perdedores. Uma vitória tão

esmagadora de Anastásia sobre Lenine como a que nos é proposta neste filme, corresponderia

antes a uma vitória dos beatos do Sentido, a qual, como sempre, exige a História como

amnésia. Esta amnésia é todo o conteúdo ideológico da versão da correção política

que Anastásia nos propõe. Nesse sentido, Anastásia é um filme de uma inabalável correção

política. É o filme em que Hollywood, ou os EUA, ou o Ocidente, vencedores da Guerra Fria,

nos vêm dizer que a Revolução Soviética nunca existiu. Como nunca existiu Lenine. E, como

sempre sucede, quando a política é evacuada, resta-nos o seu grau zero, a saber: a moral, aqui

reencarnada no velho combate entre o Bem (Anastásia) e o Mal (Rasputin). No caso deste

filme, um combate entre espectros: Anastásia (aquela que não morre) e Rasputin (aquele que

não vive). Espectralidade radical: pois para que Anastásia exista é necessário que Lenine a

mande executar. Só assim ela pode vir a ser crítica moral da tragédia da política no nosso

século. Desacompanhada de Lenine, Anastásia é uma lição de irrelevância política e moral: é

apenas correção política, isto é, felicidade histórica que, para o ser, necessita de esquecer a

sua própria historicidade constitutiva. É, enfim, a História como limbo ou buraco negro,

enunciação de um trabalho de luto que, de tão fácil, se diria - no mínimo - suspeitoso.

Pois este é um terrífico retorno do recalcado da Revolução (de todas as revoluções).

Esse recalcado, aquilo para que a Revolução não tem tempo a perder.Anastásia, da sua

posição transcendental - tal é a posição do Anjo da Amnésia, o tal que, à sua passagem,

Page 17: A DISNEYZAÇÃO DA CULTURA INFANTIL

reconstrói as ruínas de ontem em palácios dourados -, mostra-nos a irrisão e dispensabilidade

de tudo isso. Eis, enfim, o que é o kitsch reconfigurado em Cena da Educação: uma música no

coração que nos vai sugerindo que nada morre, nem mesmo Anastásia, precisamente porque

tudo foi ilusão. Infelizmente, é neste passo fatal que a pedagogia politicamente correto

de Anastásia acaba por assassinar a sua cândida personagem, realizando assim aquilo em que

Lenine tinha estrondosamente falhado. Pois enquanto ambos conviviam no cenário desse

filme a que em tempos chamamos Revolução, ou História, tal filme ensinava-nos a pedagogia

negativa da sua tragédia, como falhanço «programado» pelos deuses cínicos que nos

desgovernam. Eliminado Lenine do plateau, Anastásia já não nos faz falta. Até porque sem

ele Anastásia é uma personagem de romance de faca e alguidar. É a típica personagem da

releitura kitsch a que o discurso PC sujeita a História: assim como no Oeste afinal houve cow-

girls e cow-boys negros (quando não gays), Anastásia existiu mesmo, ainda que à custa da

inexistência de quem a mandou matar. É certo que assim perdeu a sua virtualidade de

instância crítica da fenomenologia histórica - mas esse é provavelmente o preço a pagar por se

ter mudado para Hollywood (ou por Hollywood se ter mudado para o país dos sovietes).

O poder que inspira a reprodução Disneyzada de estereótipos negativos sobre mulheres

e adolescentes ganha força, em parte, através da forma consciente pela qual mensagens

similares são postas a circular e reproduzir, em vários graus, em todos os filmes animados da

Disney, é de se perguntar por que não existe nenhuma mãe nesses filmes.

A desbarbarização da humanidade inicia na busca do entendimento dos processos que

geram a violência - mesmo aquela não tão facilmente perceptível - e na tentativa de esvaziá-

los.

7.       O ESTEREÓTIPO RACIAL

É outra questão importante que aparece em muitos filmes da Disney. Representações racistas

de estadunidenses nativos, apresentados como “peles vermelhas violentos”.

Imagens depreciativas de pessoas de cor em filmes, como “Song of the South”(1946).

Política de identidade associada com a cultura árabe, com total reforço da mídia, através

de sua interpretação na Guerra do Golfo.

ALADIM:

Representa um exemplo particularmente importante porque foi um filme especial, ganhador de dois “Oscars” e um dos filmes mais bem sucedidos na história da Disney. Exibido para públicos enorme de crianças a canção de abertura do filme, Arabian Nights”com uma letra preconceituosa diz:

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 “Oh venho de uma terra

De um lugar bem longe

Onde os camelos passeiam em caravana

Onde eles cortam nossa orelha

Se, por acaso não gostarem da nossa cara

É uma coisa bárbara, mas é o lar”.

 

PERSONAGENS SECUNDÁRIOS:

São descritos como violentos, grotescos e cruéis.

O filme foi caracterizado por um antigo porta-voz para a Associação Islâmica da Bahia

Sul da seguinte forma:

Os personagens MAUS se apresentam de uma

forma bem caracterizada

O personagem BOM, ou seja o personagem PRINCIPAL é o típico

americano que foi baseado em Ton Cruise: ALADIM.

 Têm barba  Nariz grande e grosso,  Olhos sinistros,

Fortes sotaques Constantemente agitando espadas

 Isto faz com que o grau de RACISMO seja tão acentuado, que a filha de Yousef Salen

diz “Tenho até vergonha em dizer que sou árabe, por causa de coisas como essa”.

A partir daí foi lidera uma campanha de protesto contra os temas anti-árábes em

Aladim.

Em princípio, os executivos da Disney ignoraram o protesto e até descartaram as

acusações de racismo como irrelevantes, argumentando que essas críticas vinham de uma

minoria e que a maioria dos espectadores estavam satisfeitos com o conteúdo do filme. Mas

posteriormente, concordaram em mudar uma linha da estrofe nas cópias do filme e da fita de

vídeo.

Quanto a letra do CD com trilha sonora de Aladim, mas os executivos da Disney não

haviam se conscientizado e suas implicações racistas. E com isso foi feita uma letra

alternativa, juntamente com a letra original. Embora a nova letra aparecesse na versão em

vídeo cassete de Aladim, muitos grupos árabes ficaram aborrecidos porque o verso não foi

alterado totalmente.

 

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LETRA ORIGINAL LETRA ALTERNATIVA

Onde é plano e imensoE o calor é intenso“É uma coisa bárbara, mas é o

nosso lar”

Onde eles cortam nossa orelhaSe eles não gostarem da nossa cara“É uma coisa bárbara, mas é o nosso

lar”

  

     Pronúncia errada de nomes árabes no filme, a conotação racial dos

sotaques.

    Uso de garatujas sem sentido, em substituição da língua árabe escrita.

  O racismo nos filmes não aparece somente em imagens, ele aparece também através

da linguagem e um sotaque totalmente carregado.

          Aladim descreve os árabes “maus” - com sotaques carregados e estrangeiros.

          Aladim e Jasmine – são personagens anglos, falando um inglês americanizado

padrão.

Uma linguagem racialmente carregada ocorre em:

a)     MULAN

Como os Hunos e como os homens, tal como são ali representados. Entendo que o

outro aparece sob duas formas: como os Hunos e como os homens, seus companheiros de

exército, tal como estão ali representados. Como bons vilãos, os Hunos são representados

imageticamente em cores escuras, traços pontiagudos, vozes firmes e pausadas, corpos fortes

e assustadores. As cores do filme, até então claras e alegres, passam a sombrias quando a cena

concentra-se no inimigo. Os vilãos têm poucas aparições e poucos diálogos. Sua presença

forte afirma pela imagem o contraste entre as qualidades desejáveis de um herói e as

indesejáveis de seu outro. O filme concentra sua atenção na representação de gênero, isto é,

volta-se mais diretamente para marcar diferenças entre o feminino e o masculino de sujeitos

que estão "do mesmo lado", ou seja, entre os que estão lutando pela libertação do Império

Chinês. Sendo Mulan a heroína, ela é apresentada como o modelo a ser seguido, enquanto que

o outro está representado pelos soldados que lutam com ela.

  b)  REI LEÃO:

             Membros da Família Real: falam com sotaque britânico afetado.

Page 20: A DISNEYZAÇÃO DA CULTURA INFANTIL

             Shenzi e Banzai – as desprezíveis tropas de ataque e hienas, falam através da

voz de Woopi Goldberg e Cheech Marin – com sotaques racialmente carregados, que

assumem nuances do discurso de um jovem urbano, negro ou latino.

O uso de uma linguagem racialmente carregada, já é antigo nos filmes da Disney, já que

na primeira versão dos Três Porquinhos, “Song of the South” e “The Jungle Book” já era

encontrada este tipo de linguagem.

Há uma conotação muito forte nestes filmes de que eles reproduzem uma série de

códigos e representações através dos quais se ensina às crianças que as diferenças culturais

que não trazem a marca da etnicidade branca é inferior e pouco inteligentes. O racismo destes

filmes é marcante, quando nos mostra a ausência das representações dos afro-americanos e

outras raças.  A branquidade é privilegiada nas relações sociais.

7.     RELAÇÕES SOCIAIS ANTIDEMOCRÁTICAS.

Uma outra forma usada para demonstrar uma hierarquização é quanto a Natureza e ao

Reino Animal, onde vai se legitimar a casta a realeza e a desigualdade como fazendo parte da

ordem natural.Outra característica marcante é que os machos governam e há uma hierarquia

social de liderança, daí uma sociedade modelada de acordo com a monarquia britânica dos

séculos XVIII. Provando que a “harmonia” é obtida ao preço da dominação.

Exemplo:

                      BAMBI

                      REI LEÃO

Para as crianças, as mensagens retiradas dos filmes da Disney demonstram e sugerem

que todos os problemas sociais, o racismo, o genocídio dos índios americanos, a prevalência

do sexismo e a crise da democracia são resolvidos simplesmente através das leis da natureza.

1.                    O desenho animado "Mogli, o Menino Lobo", de Walt Disney, é

bastante conhecido. Inspirado no "Livro da Jângal", de Rudyard Kipling, o desenho

conta a história de uma criança que, ainda bebê, perde-se de sua família e é adotada e

criada por lobos, no coração da selva da Índia. Na história original, Mogli cresce

interagindo e conversando com os bichos e, quase adolescente, reintegra-se facilmente

ao seu grupo humano antes de ser expulso como "bruxo", devido ao seu poder sobre

os bichos.

Page 21: A DISNEYZAÇÃO DA CULTURA INFANTIL

2.                    A triste e comovente história das crianças selvagens, que sobreviveram

quase milagrosamente entre os bichos e penaram para alcançar apenas as mais básicas

marcas de uma existência "civilizada", deixa uma lição que não pode ser ignorada:

sem o denso tecido de interações sociais do qual participa toda criança, simplesmente

não há humanidade.

8.      TRANSCENDÊNCIA DA REALIDADE OCULTA:

No filme CINDERELA, que é a história da “Gata Borralheira”, Disney transforma em

desenho a história de Cinderela, bebendo a versão de PERRAUT(1989) e apresenta uma fada

madrinha que canta as palavras mágicas e é meio atrapalhada. Na linha do politicamente

correto GARNER(1999), a fada madrinha aparece sob a figura masculina travestida de Drag-

queen.

Ainda em nossos tempos, persiste a imagem da fada madrinha como elemento mágico e

de transcendência a condições melhores. Essa busca da madrinha e o que simboliza –

realização está imortalizada até em expressões como ser padrinho de alguém para conseguir

algum benefício. Em NUNES (1985), a casa da Madrinha representa que a única solução para

a pobreza é o sonho, sobretudo a fé nesse sonho. Nessa linha, a proteção da madrinha

significa a segurança e a magia eterna buscadas pelas crianças, jovens e adultos.

As FADAS3, de origem pagã, estão intimamente ligadas à natureza. Para certos povos, ela era

vista como mensageira que viajava sob a forma de um pássaro, como a ave de Afrodite. Essa

relação fada-pássaro manifesta-se no conto GRIMM (1994) onde este elemento mágico faz a

ponte entre o humano e o divino, entre real e sobrenatural.

Essa associação de cristianização foi desaparecendo e a imagem de fada passou a ser

associada à de mulher.   A presença de FADAS-MADRINHAS:

Diante das maldades da madrasta, cabe à madrinha o conselho que indica o caminho

certo que pode aqui ser simbolizado pela escada e pelo príncipe (ascensão social e pessoal).

Essa relação é resgatada por GRIMM, (1984) em sua versão que apresenta a imagem materna,

ao morrer, como uma espécie de fada que vai acompanhar os passos da filha. Em

PERRAULT (1989), a figura da mãe não está em relevo e a fada-madrinha surge para realizar

o desejo da Borralheira.Nas duas versões de Cinderela, a fada-madrinha ou sua representação

por elementos da natureza (árvores, pássaros) é responsável por promover o afastamento

temporário das cinzas (borralho) e criar uma esperança luminosa por favorecer a ida ao baile.

Além disso, é indiretamente responsável pelo casamento (equilíbrio e felicidade) e o início de

um lar (amor).CHUÌ(1984) afirma ser a fada-madrinha também um elemento repressor

da sexualidade feminina.     

Page 22: A DISNEYZAÇÃO DA CULTURA INFANTIL

 CONSIDERAÇÕES FINAIS

    Estes são alguns dos estereótipos explorados nos filmes, mas o encantamento cobra

um alto preço, quando um de seus efeitos consiste em fazer seu público suspender o seu

julgamento crítico sobre mensagens ideológicas dominantes produzidas por seus filmes.

O grande desafio consiste em analisar os vários temas dos filmes.Isso permite que os

educadores compreendam como esses filmes podem se tornar locais de contestação, tradução

e troca.

Mas isso não significa apenas reconhecer a pluralidade da leitura dos filmes e que podem

provocar. Há uma necessidade política de analisar como as leituras privilegiadas dominantes

desses textos constroem seus significados carregados de poder.

Os filmes e desenhos da Disney exploram temas como:

      liberdade,

      ritos de passagem,

      intolerância,

      escolhas,

      as violências do chauvinismo masculino.

Sugerem-se estratégias para compreender como regimes dominantes do poder

funcionam para limitar de forma séria, a gama de visões que as crianças podem trazer para os

filmes animados da Disney.

Por outro lado esses filmes podem ser usados pedagogicamente para que possam ser

lidos e interpretados de forma correta, ou seja, dentro, contra e fora dos códigos dominantes

em que eles se baseiam.

O importante, neste contexto, é levar a criança a se conscientizar que surge sempre nos

filmes que a sociedade é sempre a vencedora e o indivíduo não passa de um fantoche

manipulado pelas normas sociais. A influência da Indústria Cultural, em todas as

manifestações, leva a alterar a própria individualidade do consumidor, que é como o

prisioneiro que cede à tortura por confessar seja o que for, mesmo aquilo que não fez. Algo de

semelhante acontece com a resistência do ouvinte de música ligeira ou popular, em virtude da

enorme quantidade de que agem sobre ele. Assim, a desproporção entre a força de cada

Page 23: A DISNEYZAÇÃO DA CULTURA INFANTIL

indivíduo e a estrutura social concentrada que pesa sobre ele, destrói a sua resistência e,

simultaneamente, provoca nele uma má consciência motivada pela sua vontade de resistir.

Quando a música ligeira se repete com tal intensidade que deixa de parecer um meio para

parecer um elemento intrínseco ao mundo natural, a resistência assume um aspecto diferente

porque a unidade da individualidade começa a desmoronar-se.

Em “Educação e emancipação”, ADORNO denuncia a presença de uma “consciência

coisificada” (São características da consciência coisificada, a ausência de afeto nas relações, o

pensamento através de categorias prévias, o uso de literatura secundária como forma de não

enfrentamento, a relação com as pessoas como se elas fossem coisas, clichês, etc.) tanto na

escola quanto nos professores e aponta como responsável por tal presença, os conteúdos

fragmentários veiculados na escola que constituem, segundo ele, uma colcha de retalhos de

informações desconexas, que são decoradas e que não permitem a reflexão.

           Conhecidos o alcance e a influência cultural da Disney e o poder que ela exerce

sobre a cultura infantil, seus filmes não devem ser ignorados nem simplesmente censurados.

            Existe uma série de questões a serem consideradas com respeito à criação de

uma pedagogia que vá contra a forma como a Disney molda a cultura infantil.

            Giroux nos fornece algumas sugestões sobre como todos os envolvidos na

formação cultural da criança (pais, educadores, etc...).  Podem discutir a influência da Disney

na formação do ambiente simbólico no qual nossos filhos nascem e todos nós vivemos:

                       Os textos que dominam a cultura infantil, incluindo os filmes animados da

Disney, devem ser incorporados às escolas como objeto de conhecimento social e de análise

crítica, fornecendo um novo registro para discutir como a mídia popular dirigida à formação

da cultura infantil está implicada num conjunto de relações poder / saber.

                     Os educadores precisam discutir seriamente a tentativa da Disney de moldar a

memória coletiva, particularmente quando essas tentativas são desavergonhosamente

definidas pelos imaginadores da Disney, onde cuidadosamente programam para deixar de fora

todos os elementos negativos e indesejados e ao mesmo tempo, incluir os elementos positivos.

Esses filmes produzem uma visão estreita dos valores familiares, atribuem papéis

rígidos às mulheres e às pessoas não brancas.

Uma forma pela qual os educadores culturais podem “pensar através de imagens” é

demonstrar pedagógica e politicamente que a história e sua interpretação da identidade

nacional têm que ser contestadas e discutidas.

Page 24: A DISNEYZAÇÃO DA CULTURA INFANTIL

Questões referentes à construção do gênero, da raça, da classe, da casta e outros

aspectos do eu e da identidade coletiva são princípios definidores dos filmes infantis da

Disney.

                     Os pais e educadores devem prestar atenção à forma como os filmes e os

meios visuais da Disney são utilizados e compreendidos de forma diferente pelos vários

grupos de crianças.

Além de fornecer uma oportunidade para os pais e educadores falarem com as crianças

sobre cultura popular, cria a base para uma melhor compreensão de como os jovens se

identificam com esses filmes, que questões e precisam ser discutidas e como essas discussões

podem se abrir para uma linguagem de prazer e crítica, em vez de, simplesmente, fechá-la.

                     A Disney precisa ser responsabilizada, não apenas em termos comerciais, mas

também em termos políticos e éticos e para isso os pais e os educadores têm que contestar e

romper o poder institucional e as imagens, representações e valores oferecidos pela máquina

de ensinar da Disney.

  REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ADORNO, Theodor W. EDUCAÇÃO E EMANCIPAÇÃO. Rio de Janeiro, Paz e

Terra, 1995.

DIFEL, O imaginário: ensaios acerca das ciências e da filosofia da imagem. Rio de Janeiro,, 1998.

DINES, Alberto – Site Observatório da Imprensa (UOL).DONALD, James. Pedagogia dos monstros: o que está em jogo nos filmes de vampiro?

In:GIROUX Henry A - A disneyzação da Cultura InfantilMARTINS Fontes, As estruturas antropológicas do imaginário, São Paulo, 1997.

              PRATES, Eufrásio – Resumo das Teorias da Comunicação de Mauro Woolf. IESB 1998.

SANTOS, Boaventura de Sousa: Por que é tão difícil construir uma teoria crítica? (Revista crítica de Ciências Sociais, nº 54, junho. 1999. pp197-214).

 TERRAZZI, Neusa dos Santos -Professora de Língua Portuguesa – UFRO – Indústria Cultural

 TURNER, Graemer. O cinema como prática social São Paulo: Summus, 1997. 174 pp.

1 Podemos dizer que é Indústria Cultural é tudo o que é produzido pelo sistema industrializado de produção cultural (TV, rádio, jornal, revistas, etc.)

elaborado de forma a influenciar, aumentar o consumo, transformar hábitos, educar, informar, pretendendo-se ainda, em alguns casos ser capaz de

atingir a sociedade como todo. Há também: Discos com trilhas sonoras, Roupas infantis; Móveis, Atrações nos parques.

2 Entendido como um processo no qual o indivíduo é levado a não meditar sobre si mesmo e sobre a totalidade do meio social a seu redor,

transformando-o com isso em mero joguete e, afinal, em simples produto para alimentar o sistema que o envolve.

Page 25: A DISNEYZAÇÃO DA CULTURA INFANTIL

3 Etimologicamente, fada provém do latim fatun (destino, fatalidade, oráculo), e interfere no destino dos heróis.São seres fantásticos de grande beleza

que se apresentam, na maioria das vezes. Sob forma feminina. Devotada de virtudes e poderes sobrenaturais, interferem na vida do herói para auxilia-

lo em situações-limite, quando uma solução material não seria possível. Representam simbolicamente a capacidade que o homem possui para

construir, na imaginação, os projetos que não pode realizar.