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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE HENRY DOS SANTOS OLIVEIRA A (DES) CONSTRUÇÃO DE UMA NOVA CENTRALIDADE: CIDADE TOGNATO EM SÃO BERNARDO DO CAMPO São Paulo 2015

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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

HENRY DOS SANTOS OLIVEIRA

A (DES) CONSTRUÇÃO DE UMA NOVA CENTRALIDADE: CIDADE TOGNATO EM SÃO BERNARDO

DO CAMPO

São Paulo

2015

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HENRY DOS SANTOS OLIVEIRA

A (DES) CONSTRUÇÃO DE UMA NOVA CENTRALIDADE: CIDADE TOGNATO EM SÃO BERNARDO

DO CAMPO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação

em Arquitetura e Urbanismo da Universidade

Presbiteriana Mackenzie, como requisito para obtenção

do título de Mestre em Arquitetura e Urbanismo

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Nadia Somekh

São Paulo

2015

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O48d Oliveira, Henry dos Santos

A (des) construçăo de uma nova centralidade: cidade

tognato em Săo Bernardo do Campo. / Henry dos Santos

Oliveira – 2015.

126 f. : il. ; 30cm.

Dissertação (Mestrado em Arquitetura e

Urbanismo) - Universidade Presbiteriana Mackenzie, São

Paulo, 2015.

Bibliografia: f. 102-110.

1. Urbanismo. 2. Requalificaçăo Urbana. 3. São

Bernardo do Campo (SP). 4. Cidade Tognato. I. Título.

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Aos meus filhos Matheus e Vinicius Oliveira pelo

tempo ausente durante os longos períodos

necessários para pensar e escrever. À Fabiana

Padovez, motivadora deste mestrado, é minha

sorte poder dizer que ela é minha companheira,

aliada e exploradora de ideias e de cidades.

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AGRADECIMENTOS

Ao iniciarmos uma dissertação nunca sabemos ao certo os caminhos a serem

percorridos. Temos mais incertezas do que convicções. Deparamos com obstáculos

que acreditamos serem intransponíveis. No entanto, essas barreiras são de certa

forma vencidas, começamos a assimilar os conhecimentos e aos poucos as certezas

de consolidam – e de uma certa maneira as incertezas também. Porém, em todas

estas fases, se não existissem pessoas dispostas a dar seu apoio, transmitir suas

experiências e repartir seu tempo com pareceres, discussões e preciosas dicas,

seriam impossíveis o desenvolvimento e a conclusão deste trabalho. Por esta razão,

deixo expresso meu sincero agradecimento às Pessoas que contribuíram com este

trabalho. Em especial, agradeço:

- À Nadia Somekh por sua orientação, tempo e conhecimento compartilhado e

as várias revisões deste trabalho – noite, feriados e dias úteis;

- À Angélica Tanus Benatti Alvim e Sueli Schiffer pela valorosa contribuição

prestada na banca de qualificação, e principalmente pela indicação de referências

essenciais para o desenvolvimento e conclusão deste trabalho;

- À Eunice S. Abascal e Vania Lima pela ajuda e contribuição durante todo o

mestrado;

- A Amira Laila, Osmar Mendonça e todo pessoal da prefeitura de São Bernardo

do Campo, principalmente do acervo histórico;

- A toda família Tognato, em especial a dona Nair Tognato e Elizabeth Tognato

que acolheu abertamente este pesquisador em horários e dias mais inconvenientes

para as entrevistas, não sei como expressar minha gratidão.

Só posso esperar que, quando leiam ou tomem conhecimento desta

dissertação, sintam-se que o trabalho lhe faz alguma justiça.

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"O saber deve ser como um rio, cujas águas doces, grossas, copiosas,

transbordem do indivíduo, e se espraiem, estancando a sede dos outros. Sem um

fim social, o saber será a maior das futilidades."

Gilberto Freyre, em discurso de "Adeus ao Colégio", novembro de 1917.

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RESUMO

A região do Grande ABC Paulista conhecida por ser o berço político do

sindicalismo e por acomodar grandes indústrias e montadoras de veículos, tornou-se

logo após o final da década de 1950 uma importante centralidade econômica do país.

A região passa por profundas transformações desde a década de 1990 em seu

espaço urbano envolvendo a requalificação urbana de grandes áreas centrais,

tradicionalmente industrializadas, em processo de degradação e subutilização

espacial, consequências da restruturação produtiva de alguns segmentos

econômicos.

A requalificação urbana destas áreas, localizadas estrategicamente junto a

centralidades urbanas completas pela diversidade de oferta de serviços, centros

comerciais, cultura e lazer são importantes na elaboração do planejamento urbano

estratégico para mitigar conhecidos problemas que estas cidades herdaram durante

os últimos 60 anos de desenvolvimento excludente como a favelização, informalidade

econômica, acesso deficiente ou inexistente a serviços essenciais, degradação

ambiental, longos deslocamentos aliados ao alto custo do transporte de má qualidade.

O projeto de requalificação urbana abordado neste trabalho com maior

profundidade, conhecido como Cidade Tognato, é um destes casos, uma grande área

degradada localizada em uma região privilegiada de São Bernardo do Campo, com

acesso a infraestrutura urbana, centros comercias e culturais e serviços urbanos de

qualidade. O projeto Cidade Tognato, de inciativa privada, contou com forte

participação e investimentos do poder público local para viabilizar com infraestrutura

auxiliar com a inclusão de 6 obras no programa São Bernardo Moderna, e

principalmente na articulação e estabelecimento de legislação auxiliar para a

conversação de dívidas com o erário municipal da Tecelagem e Fiação Tognato em

três lotes, ofertados em quatro leilões.

Neste trabalho procuramos associar os conceitos e boas práticas disseminados

pelos acadêmicos da área de Projetos Urbanos através do Desenvolvimento Local no

processo de reconstrução e reinvenção das cidades, principalmente modelos

europeus, avaliando ônus e benefícios relacionados ao grande ABC dentro da

metrópole paulista.

Palavras Chaves: desenvolvimento local, requalificação urbana, tecido urbano,

Cidade Tognato, São Bernardo Moderna.

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ABSTRACT

The Greater ABC Paulista region, known for being the cradle of political

unionism and accommodate large industries and car manufacturers, became after the

end of 1950s an important economic centrality of the country.

The region is under deep transformations since the late 1990s in their urban

space involving urban renewal of large central areas, traditionally industrialized in

degradation and spatial underuse process, the productive restructuring from some

economic sectors consequences.

The urban renewal of these areas, located strategically along the entire urban

centralities the diversity of supply of services, shopping centers, culture and leisure are

significant in drawing up a strategic urban planning to mitigate known issues these

cities have inherited over the last 60 years of exclusive development as the slums,

economic informality, poor or without access to essential services, environmental

degradation, long journeys combined with high costs and poor quality of public

transport.

The urban renewal project discussed in this paper in greater depth, known as

Cidade Tognato, is one of these cases, a large degraded area situated in a prime area

of São Bernardo do Campo, with access to complete urban infrastructure, commercial

and cultural centers and city services quality. The project Cidade Tognato, of private

enterprise, had strong evolving and investment of local government to enable auxiliary

infrastructure adding six works in São Bernardo Moderna Program and especially in

articulating laws and establishment aid for debt conversion with the city public treasury

of Tecelagem e Fiação Tognato into three lots, offered in four auctions.

In this paper, we attempt to associate the concepts and best practices

disseminated by academics works of urban projects fields by the Local Development

Programme, in rebuilding and reinventing cities process, mainly european models

assessing burdens and benefits associated to the large ABC within São Paulo

metropolis.

Key words: local development, urban renewal, urban tissue, Cidade Tognato, São

Bernardo Moderna.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1: Obras do Megaprojeto Porto Maravilha no Rio de Janeiro ........................ 24

Figura 2: Quadrinhos dos anos 10 – André Dahmer ................................................ 30

Figura 3: Mapa das fábricas de automóveis no Brasil .............................................. 42

Figura 4: Manifesto de Apoio a greve na Irmãos Tognato. ....................................... 66

Figura 5: Operação de abandono do navio Principessa Mafalda em 25 de outubro de

1927. ......................................................................................................................... 69

Figura 6: Instalações da Tecelagem Tognato em 1962. .......................................... 71

Figura 7 : Campanha Publicitária da Cobertores Parahyba. .................................... 74

Figura 8: Tear obsoleto utilizado no filme “Meninas do ABC”................................... 80

Figura 9: Antiga torre d’água da Tecelagem Tognato, . ........................................... 82

Figura 10: Complexo Domo. ..................................................................................... 89

Figura 11: Divulgação do empreendimento DOMO .................................................. 90

Figura 12: As três áreas desttinadas a leilão pela prefeitura de São Bernardo do

Campo. ...................................................................................................................... 91

Figura 13: Novo Paço Municipal de São Bernardo. .................................................. 98

Figura 14: intervenção C05 - Alargamento da avenida Pereira Barreto. ................ 100

Figura 15: D08 - Alargamento da avenida Senador Vergueiro. .............................. 101

Figura 16: D01 - Prolongamento da Rua Kara até a Rua Atibaia. .......................... 101

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Projetos de Desenvolvimento Urbanos realizadas com o Fundo Europeu de

Desenvolvimento Regional ........................................................................................ 33

Tabela 2: Evolução da participação das regiões na produção de têxteis .................. 44

Tabela 3: Exemplo de Atração de Investimentos ...................................................... 49

Tabela 4: Atividade Industrial em São Bernardo do Campo em 1958 ....................... 72

Tabela 5: Crescimento demográfico de São Bernardo do Campo e São Paulo. ....... 76

Tabela 7: Obras do Programa São Bernardo Moderna, módulo Transporte Urbano 96

Tabela 8: Obras do Programa São Bernardo Moderna, módulo Transporte Urbano 97

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LISTA DE ABREVIATURAS

ABC – Santo André, São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul

ABIT - Associação Brasileira da Indústria Têxtil e Confecção

ADEGABC - Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC

ANFAVEA - Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores

BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento

CNI – Confederação Nacional das Industrias

CR – Câmara Regional

CUT – Central Única dos Trabalhadores

DIEESE - Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos

FAB – Força Aérea Brasileira

GT – Grupo Temático

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

ICMS - Imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre

prestações de serviços de transporte interestadual, intermunicipal e de comunicação

IDH - Índice de Desenvolvimento Humano

INSS – Instituto Nacional de Seguridade Social

IPEA - Instituto de Pesquisa Econômicas Aplicadas

IPI – Imposto dobre Produtos Industrializados

IRFM – Industrias Reunidas Francisco Matarazzo

ONG – Organização Não Governamental

PEA – População Economicamente Ativa

PIB – Produto Interno Bruto

PMSBC – Prefeitura Municipal de São Bernardo do Campo

PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

PPPs - Parceria Público-Privadas

RMSP - Região Metropolitana de São Paulo

SEADE - Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados

SMABC – Sindicato dos Metalúrgicos do ABC

UFABC – Universidade Federal do ABC

VA – Valor Adicionado

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...........................................................................................................10

CAPITULO I – INTERVENÇÕES URBANAS DE GRANDE PORTE ........................ 20

1.1 – Operações Urbanas de grande porte .............................................. 21

1.2 – Os impactos no tecido urbano ......................................................... 26

1.3 – Desenvolvimento local como alternativa ............................................ 30

CAPITULO II – NOVAS ESTRATÉGIAS DE AÇÃO REGIONAL NO GRANDE ABC 37

2.1 –Efeitos da Globalização na região do grande ABC em São Paulo. ..... 37

2.2 Guerra Fiscal e o “Custo ABC”.............................................................. 47

2.3 – Reestruturação produtiva e o setor terciário ...................................... 52

2.4 – Para onde caminha a região do ABC? ............................................... 57

CAPITULO III – “CIDADE TOGNATO” ...................................................................... 63

3.1 – Constituição da Tecelagem e Fiação Tognato ................................... 63

3.2 – A Fundação da Tecelagem Tognato .................................................. 68

3.3 – Auge e Decadência ............................................................................ 72

CAPITULO IV – PROJETO “CIDADE TOGNATO” .................................................... 84

4.1 – Projeto “Cidade Tognato” ................................................................... 84

4.2 – Programa São Bernardo Moderna ..................................................... 94

4.3 - Transição de Projetos: De “Cidade Tognato” para “Complexo Domo”

............................................................................................................................. 102

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 104

BIBLIOGRAFIA ....................................................................................................... 109

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INTRODUÇÃO

O ABC paulista é uma das mais antigas e importantes regiões industriais do

Brasil, situada a sudeste da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), é composta

por sete municípios: Santo André, São Bernardo do Campo, São Caetano do Sul,

Diadema, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra com uma população de 2,71

milhões de habitantes equivalentes a 13% da RMSP e 6,3% do Estado.

Situada estrategicamente próxima ao Porto de Santos e interligada com a

Região Metropolitana de São Paulo através das rodovias Anchieta e Imigrantes, o

Rodoanel e a rede ferroviária. Reconhecida como berço da indústria automobilística

brasileira, possui PIB regional de R$ 79 bilhões2, o 2º do Estado de São Paulo e o 4º

PIB Nacional (SP, RJ, DF e Grande ABC) alavancados pelos 44 mil estabelecimentos

formais, que geram 800 mil empregos.

A partir da década de 1990, amplia-se no Grande ABC a necessidade da uma

articulação regional, parcialmente explicada pelos efeitos e profundidade do impacto

das transformações sobre a região e o tamanho da crise econômica.

Ao iniciarmos o processo de construção deste trabalho, uma das questões de

maior inquietude está relacionado a vasta produção de livros, teses, dissertações,

artigos e diversos materiais que abordam direta ou indiretamente o processo de

transformação urbana da região do ABC Paulista. Qual contribuição que mais um

trabalho poderia agregar para tentar entender os desafios vivenciados pela região e

sua população? Esta pergunta assombra de maneira comum todo pesquisador

durante todo o processo de desenvolvimento de seu trabalho, mas à medida que

estabelece uma conexão com a bibliografia relacionada indicada pela orientação, e

mais tarde pela banca de qualificação, o quadro toma forma e a resposta surge

durante este interim. Mais recentemente, presenciamos a retomada do debate sobre

o papel das cidades-região e das regiões metropolitanas na economia mundial, nesse

sentido, representam possíveis plataformas para a elaboração e implementação de

estratégias de desenvolvimento local, geração de trabalho e renda

Os contatos iniciais com as fontes documentais e com a bibliografia revelou-

nos de início o equívoco do uso frequente da expressão “desindustrialização do

1 Cf. dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2014, o Grande ABC tem 2.702.071 habitantes. 2Cf. dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2014, o Grande ABC possui PIB no montante de R$ 78,8 bilhões nominais (sem descontar a inflação acumulada nos dois anos).

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Grande ABC”. Diferentemente do imaginado, e que exposto mais à frente, o Grande

ABC enfrenta um processo de reestruturação produtiva continua e permanente, e que

particularmente São Bernardo do Campo enfrenta desde 1956.

Talvez a maneira mais adequada de referir a este processo seja através da

expressão “ondas de reestruturação”, de maior ou menor intensidade que irão verter

na década de 1990 um processo de reestruturação amplificado pelo que Harvey

denomina como compressão do tempo-espaço na organização do capitalismo3,

abrangendo transformações em diversos níveis: crescimento de segmentos ligados

ao setor terciário, maior compartimentalização de produção automotiva e um pesado

ônus sobre a indústria têxtil, praticamente eliminando este segmento do Grande ABC.

Estas ondas de reestruturação ocasionaram diversos vazios urbanos

provenientes destas transformações em áreas providas de boa infraestrutura urbana

e fácil acesso a serviços e espações públicos de qualidade, por vezes desconectando

grandes áreas e fragmentando as cidades.

De início, o tema foi escolhido mediante a maneira como estes vazios estão

sendo ocupados: através de grandes empreendimentos imobiliários, sob a forma de

condomínios-clubes e enclaves enclausurados voltados para uma população de alto

poder aquisitivo, disposta a encastelar-se em bairros murados completamente em

uma realidade asséptica e distante dos mais pobres. Para quem vive no ABC,

estranha a rápida transformação da paisagem industrial povoada por chaminés e

regrada pelos apitos das fabricas em torres de condomínios-clubes de até 42 andares

com nomes pomposos e suntuosos dados pelo mercado imobiliário como PRIME,

PLUS, HIGH, etc., mas academicamente conhecidos como gentrificação ou

arquitetura da gentrificação.

Ao mesmo tempo que estas transformações ocorrem, as poucas obras de

infraestrutura de mobilidade urbana iniciadas a partir da década de 1990, beneficiam

estes empreendimentos em detrimento a áreas tradicionalmente carentes e

3 No terceiro capítulo: “A experiência do espaço e do tempo” (p. 185), Harvey faz uma bela reflexão sobre o espaço e o tempo, como categorias fundamentais da existência humana que, no entanto, raramente discutimos. Afirma o autor que essas duas categorias se entrecruzam no entendimento das pessoas e, por isso, são protagonistas de vários conflitos. Ainda nesse capítulo, o autor traz um conjunto de argumentos embutidos no binômio “compressão espaço-temporal”, no qual ele analisa os efeitos da acumulação flexível do capital, ou seja, da fragmentação da dispersão da produção, com impactos no campo da hegemonia do uso da mão-de-obra que se torna cada dia mais obsoleta, em virtude do grande aparato tecnológico que surge cotidianamente, acelerando o temido desemprego estrutural. (OLIVEIRA A. P., 2007)

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desconectadas do centro da cidade, conforme iremos exemplificar no capitulo inerente

ao Programa São Bernardo Moderna.

Através de experiências conduzidas em outros países para a tratativa destes

mesmos problemas, principalmente na Europa, foi criada a Agencia de

Desenvolvimento Econômico do ABC inspirada na Agencia de Desenvolvimento de

Sesto San Giovanni, visitada durante uma comitiva da região enviada no início de

Maio de 1999, por iniciativa dos prefeitos de Santo André e São Bernardo do Campo.

Particularmente o projeto urbano denominado La Bicocca em Milão chamou

atenção, por seu modelo inclusivo e de uso diversificado com universidades, torres

comerciais e residenciais chamou a atenção por revitalizar todo uma área industrial

obsoleta a cidade. Logo após a visita da comitiva, no mesmo ano de 1999, tentou-se

reproduzir este mesmo projeto na área da Tecelagem e Fiação Tognato, que viria a

ser conhecido como Cidade Tognato.

Porém, a Cidade Tognato que começou como um projeto urbano nos mesmos

moldes do La Bicocca em Milão, incluindo a construção de um hospital, uma

universidade e um novo centro de exposição de artes – motivo que justificou a inclusão

de 6 obras de infraestrutura urbana no programa São Bernardo Moderna –

metamorfoseou-se em um projeto de iniciativa privada denominado DOMO e suas

vertentes de uso residências PRIME e HOME e de uso comercial CORPORATE e

BUSINESS.

Nesse sentido, refletimos como uma grande operação urbana de

características inclusiva e integradora – no sentido de compartilhar um espaço urbano

que descontinuava a cidade – se tornou um empreendimento imobiliário, com uso de

recursos públicos, alimentando lucros do capital imobiliário, e de quebra, reproduzindo

e acentuando os problemas sociais da região. A intenção é estimular o debate em

torno das grandes operações urbanas, elas podem ser instrumentos para alçar

melhorias social e valorização ambiental como normatiza o Estatuto das Cidades? Ou

somente fonte de recursos para o poder público local? É um instrumento, que parte

do Planejamento Urbano Estratégico pode trazer inovações, no sentido de representar

uma alternativa para flexibilizar as limitações do poder público, engessadas pela

legislação normativa e burocrática, ou o contrário, tantos as virtudes quanto os

malefícios necessitam de normativa técnica?

É certo que não tivemos a intenção de alçar todas as respostas acimas, e por

certo, mesmo com esforço hercúleo de mais 40 capítulos, ainda não teríamos todas

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as respostas. Mas de forma sucinta, nos quatro capítulos a seguir procuramos

entender como as cidades, no pós-industrial enfrentam estas transformações, sob a

perspectiva de um determinado projeto urbano – Cidade Tognato.

Ao nos referirmos a este processo como (des) construção de uma nova

centralidade, abordamos desde as primeiras ações que deram origem a esta iniciativa,

que tinha como objetivo inicial a construção de uma nova centralidade em São

Bernardo do Campo, denominada Cidade Tognato, com espaços públicos de

qualidade, aproveitando a infraestrutura local, e sua mutação para um

empreendimento privado na forma de um condomínio-clube.

No primeiro capítulo, estruturamos nossa pesquisa através de revisão

bibliográfica sobre como as Intervenções Urbanas de Grande Porte são

implementadas e alavancadas pelo Estado sobre os mercados imobiliários, além dos

efeitos excludentes na população local, seja por simples remoção ou pela exclusão

através da valorização do solo local. Entender os impactos no tecido urbano na região

do Grande ABC comparando-o com as experiências internacionais de projetos de

requalificação urbana em regiões industrializadas sob os efeitos da globalização e

acirrada disputa pelos investimentos. Ao final do capitulo, dissertamos a respeito do

Desenvolvimento Local como alternativa as Intervenções Urbanas de Grande Porte,

a exemplo do modelo adotado pelo Fundo de Desenvolvimento Europeu de

Desenvolvimento Regional.

No Capitulo Dois avaliamos os efeitos da globalização no Grande ABC sob as

indústrias do setor têxtil, por representarem principal importância econômica na região

até 1950, e na indústria automotiva, considerado sinônimo de Grande ABC até a

década de 1990. Nesta mesma década, motivados pela globalização e pelo

investimento privado, acentua-se a Guerra Fiscal entre os estados da federação, que

impactou sobremaneira o setor automotivo da região, intensificando a Reestruturação

Produtiva na região do grande ABC, intensificando as transformações no mercado de

trabalho, com forte orientação para o setor terciário.

No Capitulo três recuperamos a história do objeto de estudo, a Tecelagem e

Fiação Tognato, desde sua fundação em 1909, até os dias de hoje, não somente pela

pesquisa em periódicos e no acervo histórico das cidades de São Bernardo do Campo

e Santo André, mas também através da ótica de um dos protagonistas desta história,

Dona Nair Tognato, sócia da empresa e esposa do seu mais longevo presidente

Yolando Tognato. Em muitos aspectos a história desta empresa, assemelha-se a

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história da própria região do ABC, com o início da colonização, principalmente de

italianos na região que estabeleceram-se na região, a maioria com inclinação

industrial e operaria em razão da pobre qualidade do solo da região, que contribuiria

muito para que a região desenvolvesse sua forte vocação industrial, contribuindo,

dentre outros fatores, com a concentração industrial que a região sofreu após a

década de 1950. A Tecelagem e Fiação Tognato sagraram-se como uma das

principais empresas da região, principalmente nos anos anteriores a indústria

automotiva, e juntamente com outras empresas do segmento ajudou a moldar não

somente economicamente a região, mas também o próprio sindicalismo brasileiro,

principalmente na década de 1930.

O Capitulo Quatro procuramos entender as motivações que originaram a

Cidade Tognato, e ações de maneira cronológica que foram executadas no sentido

de viabilizar este projeto de requalificação urbana nas antigas ruinas da Tecelagem e

Fiação Tognato em sua proposta original, e sequencia de acontecimentos que

acabaram por transforma-lo em um empreendimento imobiliário, beneficiado por obras

públicas do programa São Bernardo Moderna.

E finalmente algumas conclusões e considerações a respeito deste tipo de

processo, que podem ser tiradas diante do exposto nesta dissertação.

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CAPITULO I – INTERVENÇÕES URBANAS DE GRANDE PORTE

É vasta a produção acadêmica acerca de intervenções para requalificação

urbana nas metrópoles e as diversas consequências no tecido urbano. Contudo, as

estratégias são frequentemente alteradas devido a dinâmica entre os planos político

e econômico, em conveniência com a acumulação de capital.

A esses planos, geralmente sob o formato de uma PPPs (Parceria Público-

Privadas), onde o Poder Público assume o papel de mediador a fim de favorecer as

estratégias de reprodução do capital. Segundo Harvey (2012), esses projetos de

intervenção urbana é essencial par a construção de uma imagem da cidade através

da organização de espaços urbanos espetaculares ou ainda, de lugares que criem

uma imagem positiva e de alta qualidade de si mesmos, procurando uma arquitetura

e formas de projeto urbano que atendam este fim. (HARVEY, 2012)

Neste capitulo, pretende-se apresentar os principais conceitos relacionados a

Grandes Operações Urbanas, a luz dos acadêmicos contidos na bibliografia

referenciada neste trabalho. Ressaltamos que o referencial teórico presente nesta

dissertação é trabalho de uma crítica analise e triagem, baseado na revisão da

literatura, que obviamente não foi exaustiva, mas de maneira construtiva procuramos

abordar os principais aspectos relacionados ao tema.

No primeiro tópico deste capitulo iremos abordar o modo como as grandes

operações urbanas são implementadas e como ela se relaciona e transforma com a

cidade contemporânea.

Essas transformações são analisadas no segundo tópico do capitulo: Os

impactos no tecido urbano, através da revisão de produção acadêmica relacionada ao

assunto, principalmente no que concerne a região do Grande ABC.

Por último, avaliamos o Desenvolvimento Local como alternativa proposta por

diversos pesquisadores, notadamente Daniel (1999), que enxergou neste modelo uma

proposta capaz de envolver a dinâmica econômica da região de maneira integrada,

motivada principalmente pela integração social e fortalecimento da cidadania.

De qualquer modo, faz-se necessário mostrar o desenvolvimento deste

capitulo, iniciando-se pelas grandes intervenções urbanas, seus impactos no tecido

urbano, e por fim apresentar uma alternativa talvez menos atrativa do ponto de vista

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do investimento privado, mas inclusiva socialmente mesmo diante de uma cidade

cada vez mais fragmentada.

1.1 – Operações Urbanas de grande porte

Existe uma longa e bem documentada história da política de acumulação por

espoliação, e espoliar pessoas no espaço urbano é parte central da história. Uma das

primeiras afirmações nesse sentido, partiu de Engels, que em 1872 acusou o

bonapartismo, política adotada por Haussmann em Paris4, e mais tarde disseminada

nas cidades inglesas de Manchester, Liverpool e Londres, sob o signo da

industrialização, de empurrar sistematicamente a classe operária do centro da cidade

para seus arredores sob a lógica de que pessoas pobres que vivem em terras caras,

não permanecem ali por muito tempo.

Essa lógica, atual nos dias de hoje, seja pela ação do Estado ou por meios

ilegais forçam as classes menos favorecidas a sair, como ocorreu nos incêndios nas

favelas e cortiços bem localizados na malha urbana como no Estado de São Paulo

(HARVEY, MARICATO, ZIZEK, & DAVIS, 2013) ou mesmo em Nova Iorque5.

Em determinados períodos históricos este tipo de reurbanização é muito forte,

como ocorrido na primeira metade do século 20 na região metropolitana de São Paulo

e nas cidades do interior sob influência das plantações de café (CANDIDO, 2010). A

razão da escalada da expulsão por meio da reurbanização se dá pelo esgotamento

das oportunidades de investimento do capital, uma vez que outras formas de produção

e reprodução do lucro parecem não estar funcionando ou dando retorno apropriado.

De 2002 a 2011 o investimento do capital privado no mercado imobiliário cresceu 45

vezes, passando de R$1,8 bilhões para R$79,9 bilhões (HARVEY, MARICATO,

ZIZEK, & DAVIS, 2013), outro fator importante para esta movimentação que deve ser

levado em conta é a apropriação de parte destes investimentos na forma de renda,

tornando o mercado de aluguel mais atrativo.

4 Georges-Eugène Haussmann foi um advogado, funcionário público, político e administrador francês. Nomeado prefeito de Paris por Napoleão III, tinha do título de Barão e foi o grande remodelador de Paris, cuidando do planejamento da cidade, durante 17 anos, com a colaboração de arquitetos e engenheiros renomados de Paris na época. Haussmann planejou uma nova cidade, modificando parques parisienses e criando outros, construindo vários edifícios públicos como a L’Opéra. Fonte : www.wikipedia.com 5 Palestra de David Harvey, em 29 de Janeiro de 2009, no "Lutas pela reforma urbana: o direito à cidade como alternativa ao neoliberalismo", transcrição disponível no sitio: http://www.midiaindependente.org/pt/red/2009/02/440802.shtml.

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Desta forma podemos constatar o aumento dos valores das propriedades no

mundo, no meio de uma crise no mercado imobiliário, dificultando a procura de lugares

decentes para moradia, sem gastar uma parcela considerável da renda mensal com

financiamento imobiliário. No Brasil, o limite imposto para o financiamento imobiliário

em cerca de 30% da renda mensal com habitação6, contudo no Rio de Janeiro uma

parte da população tem destinado cerca de 40% a 50% de sua renda com os

aluguéis7, demonstrando uma forte ascensão do uso deste tipo de política de

expropriação por despejo. Para o capital privado, esta política pode ser demonstrada

de diversas maneiras, como por exemplo, liberando o mercado de alugueis para fazer

seu trabalho, forçando a saída das pessoas de sua área de interesse, mas também

através de intervenções do Estado por meio de operações urbanas, a exemplo do que

aconteceu nas obras preparatórias para a Copa do Mundo, no Rio de Janeiro:

“O número de famílias removidas de suas casas ou ameaçadas de remoção em virtude das obras preparatórias para a Copa do Mundo de 2014 e para a Olimpíada de 2016 no Rio de Janeiro deverá ficar em torno de 8.350. Esta é a estimativa que faz o Comitê Popular da Copa no Rio de Janeiro, entidade da sociedade civil que lança nesta quarta-feira um documento chamado "Dossiê Megaeventos e Violações de Direitos Humanos no Rio de Janeiro" (KONCHINSKI & SEGALLA, 2013, p. p. 3)

Grandes operações urbanas são excelentes oportunidades para demonstrar

como o interesse privado prevalece sobre as necessidades da comunidade (HARVEY,

2013), ou de maneira mais objetiva de como o capital vai bem, mas as pessoas vão

mal. Na análise de Harvey (2013):

“O que temos visto, nos últimos 30 anos, é a reocupação da maioria dos centros urbanos com megaprojetos. Muitos desses projetos associam a urbanização ao espetáculo. E fazem um retorno à descrição de Guy Debord sobre a sociedade do espetáculo. Faz todo sentido na diretriz da realização dos megaeventos como as Olimpíadas e a Copa do Mundo. O capital precisa que o estado assegure essa dinâmica. Assim, pode usar esses eventos como instrumentos de investimentos e mais lucratividade” (HARVEY, 2013, p. p. 12).

6 A prestação não pode ser maior que 30% da sua renda familiar mensal bruta, conforme critérios estabelecidos pela CEF para financiamento imobiliário. Fonte: http://www.caixa.gov.br. 7 TAVARES, Karina. Aluguel já consome de 40% a 50% da renda familiar do carioca. O Globo. 25 de Maio de 2014. .

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Estão inclusos nesta lógica os espaços geográficos e dentro destes, a

urbanização ocupa lugar proeminente. Para dar vazão acumulativa do capital é

necessário a produção de novos espaços e relações espaciais. Os donos das terras

e a sinergia de interesses que se forma em torno dos investimentos imobiliários

(incorporadores, financistas, políticos, empresários da construção) ampliam seu poder

de classe e estabelecem os rumos do crescimento urbano. Simultaneamente, a

demanda e a especulação inflada artificialmente nos preços provocam crises de

sobreacumulação, endividamento e um espectro de inadimplências atrás de si. A

prática do capitalismo rentista tem seu preço. A crise do subprime nos EUA é a mais

recente e grave dessas manifestações de irracionalismo dos mercados, conduzidas

em benefício das classes dominantes (HARVEY, 2013)

Algumas operações urbanas podem ter como premissa básica a movimentação

do capital especulativo imobiliário, no entanto o período de consultas públicas seria o

remédio para tratar estas questões de maneira aberta e democrática, previsto no

Estatuto das Cidades8, ainda é pouco ou não utilizada na ocasião destas operações

urbanas, como no Projeto do Porto Maravilha (Figura 1) onde afirma Castro (2014):

“Vejamos o caso da Região Portuária, em nenhum momento o prefeito propôs uma consulta pública para verificar se a população era favorável a derrubada do Viaduto da Perimetral e a consequente revitalização da área. A toque de caixa as obras seguem a pleno vapor, quanto mais rápido o local for concluído, mais rápido é o retorno financeiro daqueles que investiram nos terrenos oriundos das desapropriações. É a lei do mercado, simples assim.” (CASTRO, 2014, p. p. 3)

8 Inciso XIII do artigo 2º do Estatuto das Cidades: audiência do Poder Público municipal e da população interessada nos processos de implantação de empreendimentos ou atividades efeito potencialmente negativos sobre o meio ambiente natural ou construído, o conforto ou a segurança da população.

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Figura 1: Obras do Megaprojeto Porto Maravilha no Rio de Janeiro

Fonte: www.portomaravilha.com.br (2015)

A lógica destes empreendimentos torna-se evidente mesmo quando a maioria

dos envolvidos na comunidade expressam sua contrariedade e mesmo assim eles

seguem adiante aprovados pelos gestores públicos reforçando o ceticismo da

população em relação a participação popular nestes processos. A participação

popular passa a ser exercida, em poucas e raras ocasiões, quando as pressões sobre

essas grandes operações urbanas tomam as ruas, através de mobilizações e

protestos, e sua vontade passa a ser exercida.

Estas operações urbanas e megaprojetos colaboram com a destruição

sistemática do espaço público da cidade, transformando-o em espaços comerciais e

privados, segmentando o público para seu uso através de interações comerciais e de

consumo, mas ao mesmo tempo pode criar uma força contraria a sua destinação

original, no sentido em que as pessoas rejeitam isso e se mobilizam, como ocorrido

em maio de 2013 na Praça Taksim e no Parque Gezi, na Turquia, onde milhares de

pessoas protestaram durante meses contra destruição do último parque no centro

histórico da cidade, para a construção de um shopping center com um complexo

planejado para atrair turistas. Após vigorosa oposição e protestos o projeto foi deixado

de lado pelo governo, garantindo a devolução do espaço para a comunidade9.

Há aqui um problema de entendimento a respeito da dinâmica das cidades. Por

um lado, subestima-se o peso dos espaços públicos urbanos na constituição da

9 REUTERS. Erdogan faz gesto conciliatório por fim dos protestos na Turquia. OESP. 14 de Junho de 2013.

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identidade local, isto é, na autoestima da população com respeito a sua cidade. Por

outro, deixa-se de lado o fato de que os centros das cidades são locais tipicamente

democráticos, uma vez que são passíveis de apropriação pelo conjunto da população

e, sobretudo, daquela que habita a periferia. As elites, ao contrário, têm acesso a

espaços privados em condomínios fechados, clubes esportivos, shopping centers etc.

Em termos urbanos, a verdadeira oposição é entre os centros das cidades (espaços

públicos) e os grandes centros de compras e lazer fechados, como shoppings

(espaços privados).

O direito a cidade foi a força motriz que impulsionou estes protestos ao negar

o direito a este espaço, onde podiam reunir-se sem ser segregado por categorias de

consumidores, e ocupar um espaço sem ter que consumir ou pagar, como Lefebvre

afirmou muito tempo atrás:

“O direito à cidade se manifesta como forma superior dos direitos: direito à liberdade, à individualização na socialização, ao habitat e ao habitar” (LEFEBVRE, 2001, p. p. 134)

No que tange ao direito à cidade, isto se vincula ao modelo de desenvolvimento

local inclusivo, alinhado com os direitos sociais e trabalhistas, à busca de inclusão

social e ao desenvolvimento urbano e ambiental. Se a cidade é, em primeira instância,

local de encontros, são importantes os espaços públicos urbanos e

consequentemente sua qualidade, sua adequação em termos ambientais e seu

potencial de apropriação pela população, como oportunidade de socialização e de

expressão cultural. Nesse caso, o direito à cidade se articula à identidade local, por

meio de marcos urbanos, do patrimônio histórico e ambiental e de manifestações

culturais comunitárias, engendrando uma síntese entre direitos e identidade a serviço

de um projeto democrático e popular. (CASTELLS, 2009)

Essa lógica justifica em parte, as críticas que a representatividade política nas

instituições tradicionais e o debate público vem sofrendo, críticas expressas com

clareza nas palavras de W. G. Santos (2013), em entrevista concedida revista Insight

Inteligência:

“As classes C e D têm uma representação majoritária na sociedade em diversos sindicatos, entidades etc., mas são minoritárias na representação parlamentar de seus interesses. Ou seja, (...) elas têm menos capacidade de articulação no âmbito das instituições [políticas] do que as classes A e B.” (SANTOS W. G., 2013, p. p. 29)

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A manifestações ocasionadas pelas transformações urbanas tem sido cada vez

mais frequente evidenciando as críticas ao sistema de representatividade, e nos

protestos de junho de 2013, o embate teve como fagulha a discussão entre aqueles

que querem das cidades melhores condições de vida e aqueles que visam apenas

extrair ganhos, tornando-a refém dos interesses do capital imobiliário. Entender estas

transformações e os impactos que imprimem no tecido urbano de nossas cidades

significa entender o tipo de cidade que buscamos, que de acordo com Harvey (2013),

é inseparável da questão do tipo de pessoa que desejamos nos tornar. (HARVEY,

2013)

1.2 – Os impactos no tecido urbano

Diante dos efeitos da crise urbana decorrente restruturação econômica global,

as cidades e setores econômicos apoiados nas atividades industriais que durante

anos pautaram seu desenvolvimento e formação de sua identidade, foram compelidas

a ordenar mudanças importantes em seu tecido urbano ocasionados pelo

deslocamento destas atividades econômicas para outras regiões.

Podemos entender estas ações como parte de uma iniciativa renovação

urbana, fomentada pelo poder dos agentes públicos, principalmente pelas prefeituras

das localidades afetadas, dentro de uma perspectiva de desenvolvimento social de

incentivo a geração de renda, emprego e combate à exclusão social.

A necessidade destes investimentos e intervenções, deve se apoiar no novo

desenho do espaço e funcionalidade urbana definidos pela necessidade e articulação

dos atores impactados pelo projeto ou pela região envolvida. Os efeitos excludentes,

que caracterizam grande parte da crítica as grandes operações urbanas nestas

últimas duas décadas, são fatores que nos levam a questionar a capacidade

mediadora e mitigadora da sociedade civil e esferas governamentais na regulação,

controle e governança da ação do capital imobiliário nestas intervenções (SOMEKH &

CAMPOS, 2005). Uma linha tênue pode separar projetos com foco no

desenvolvimento social e os megaprojetos de espoliação do espaço urbano, ou vice-

versa, como no citado caso da Praça Taksim e no Parque Gezi, na Turquia.

Através de comparações com operações urbanas em outras partes do mundo

(tabela 1), podemos avaliar os impactos e as ações mitigadoras adotadas na

elaboração e implementação destas grandes operações urbanas, tendo como régua

balizadora o benefício da população local, seja na geração de emprego e renda, a

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necessidade de habitação em um espaço provido de boa infraestrutura e

equipamentos públicos de qualidade, desprovendo o viés excludente dos

megaprojetos, seu principal efeito colateral como solução e remédio no processo de

renovação urbana.

Em detrimento de ser uma das primeiras regiões industrializadas do Brasil com

forte presença do setor automobilístico, o Grande ABC Paulista (ALMEIDA, 2008) foi

duramente atingindo pela desindustrialização face as crises ligadas ao esvaziamento

do modelo fordista de acumulação (ANAU, Evolução Econômica Recente do ABC

Paulista, 2004) e os efeitos negativos da globalização (VIANA, 2005) nos últimos 25

anos (SOMEKH & CAMPOS, 2005), em um processo que propiciou o surgimento de

grandes vazios urbanos decorrentes de áreas industriais obsoletas, ociosas ou

subaproveitadas, localizadas em áreas dotadas de boa infraestrutura e acesso a

equipamentos públicos de qualidade como efeito secundário sentido após os impactos

econômico e de identidade em uma região com clara vocação industrial.

No âmbito internacional, a região faz analogia a cidade de Detroit no Hemisfério

Norte, onde a partir da década de 1970’’ seu modelo de desenvolvimento estagnou-

se devido o surgimento de novas tecnologias, assim como as tradicionais regiões

portuárias, como o distrito de Docklands em Londres, que se tornaram obsoletas

diante do surgimento da logística compartimentalizada, na forma de contêineres. Em

algumas circunstancias, as medidas auxiliares das políticas sócias compensatórias

foram incorporadas através de programas de redução de impactos (SOMEKH &

CAMPOS, 2005).

Na região do grande ABC, marcado pela forte atuação sindical, estas medidas

passaram a ser protagonizadas principalmente pelo Sindicato dos Metalúrgicos do

ABC, que em negociação com as grandes montadoras da Região, permitiu maior

flexibilização do contrato de trabalho e medidas de ampliação do setor terciário nas

atividades não-fim. Como exemplo notório desta política, podemos citar o caso da

restruturação produtiva da Volkswagen São Bernardo do Campo de 2003 em

contrapartida da destinação do modelo Tupi Europa para a planta Anchieta, onde

frente ao quadro de 500 postos de trabalho terceirizados mapeados pelo sindicato em

1993 (SMABC, Os trabalhadores e a terceirização. Diagnóstico e Propostas dos

metalúrgicos do ABC, 1993), foram negociados a terceirização de mais 1.897 postos

de trabalhos, além da criação do Condômino de Terceiros na planta Anchieta e o

desligamento compulsório de 1.923 empregados transferindo-os para um centro de

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treinamento e capacitação, denominado Centro de Formação e Estudos (PRAUN,

2009) como forma de reinserção dos trabalhadores no mercado de trabalho ou em

atividades ligadas ao empreendedorismo.

Contudo, mesmo diante da implementação de ações para mitigar os impactos

imediatos da reestruturação produtiva global, as áreas atingidas ainda necessitavam

de medidas para dinamizar a economia urbana local melhorando a atratividade e

competitividade de suas respectivas regiões. Neste sentido Somekh (2012) aborda a

necessidade da adoção de um planejamento urbano estratégico frente ao tradicional

modelo de planejamento urbano normativo ineficiente e menos inclusivo, e aponta

experiências bem sucedidas como a grande operação urbana de renovação da

Cidade de Barcelona, neste sentido o planejamento estratégico seria uma resposta as

transformações constantes da nova ordem econômica e de um mercado altamente

competitivo, no entanto alerta para os riscos de uma característica predominante

empresarial, onde a atração de investimentos e eventos de turismo seria a principal

motivação, frente a necessidade de reinserção urbana e na intercomunalidade, bem

como numa concertação ampla.

Na mesma linha que Somekh (2012), o francês François Ascher (2010) faz uma

análise profunda entre os aspectos do urbanismo moderno, voltado a realização do

projeto através de uma regra simples, imperativa e estável do planejamento

tradicional: zoneamento, funções, gabarito, etc. em contraposição ao neourbanismo,

que Somekh denomina de planejamento urbano estratégico, onde as relações

privilegiam os resultados a serem obtidos, desafiando os atores públicos e privados a

encontrar modais para este fim, mais eficientes para a coletividade (ASCHER, 2010).

“O Neourbanismo esforça-se em construir os problemas caso a caso, e em elaborar respostas especificas para cada situação. Acumula e mobiliza experiências, os saberes e as técnicas, não para aplicar soluções repetitivas, mas para aumentar suas possibilidades de adaptação aos contextos particulares, mutantes, incertos. (ASCHER, 2010, p. p. 84)

Diante de experiências internacionais em grandes operações urbanas bem

sucedidas como o Parque das Nações em Portugal, Battery Park City em Nova York,

La Defènse em Paris ou Puerto Madero em Buenos Aires, mostrou que a visão

estratégica aliada ao planejamento urbano alçou a condição das grandes operações

de renovação urbana a uma categoria nova de oportunidades e possibilidades de

atração de investimentos para atividades terciárias de maior valor agregado e serviços

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de maior especialização localizados no centro do debate sobre competitividade e

inovação (MDIC, 2014).

Entender quais políticas e elementos foram importantes de maneira

individualizada em cada uma destas experiências tornou-se importante para os

planejadores e formuladores das grandes operações urbanas, tornando-a mais

competitivo frente aos demais, mas também aos formuladores de políticas públicas

inerentes ao planejamento urbano, no intuito de mitigar seus impactos sociais.

Do ponto de vista de atratividade dos investidores, a qualidade do projeto no

tocante ao grau de intervenção, redefinindo não só o espaço degradado e sua

utilização, mas também a vinculação da operação urbana a nomes influentes e

midiáticos na concepção arquitetônica - potencializando as tendências vigentes na

urbanização contemporânea - para satisfazer o enorme apetite da mídia para o

consumo de imagens arquitetônicas e na criação de uma nova centralidade

potencializando os ganhos proveniente destes investimentos. A necessidade de novos

investimentos tornou acirrada a disputa entre as grandes operações urbanas de

renovação diante da velocidade do capital volátil associadas à sobreacumulação e as

baixas taxas de lucro, estimulando recorrentes processos migratórios intersetoriais e

espaciais de capitais (SANTOS C. R., 2006).

Fica claro ao avaliar os limites deste modelo no que se refere as questões

habitacionais e de infraestrutura, tanto no plano de integração social quanto o fator

excludente e gentrificador das grandes operações urbanas. No âmbito econômico,

questão de geração de renda e de empregos, com o intuito de minimizar e superar os

fortes desequilíbrios sociais, são agravados pela geração de empregos nos níveis

inferiores e em seu outro extremo com postos altamente qualificados (SOMEKH &

CAMPOS, 2005), talvez sua característica mais desfavorável, por eliminar uma classe

intermediária forte, presente no modelo econômico fordista e manufatureiro e acentuar

o contraste social reforçando a distinção entre áreas periféricas e áreas renovadas.

Estas tendências já observadas na produção e reprodução do espaço urbano

no Brasil, onde a modernização é seletiva atendendo grandes capitais, tecnologias de

pontas e modelos elaborados de organizações, denominada urbanização corporativa,

encontra facilidade maior de reproduzir suas características mais neoliberais voltadas

a acumulação de capital, devorantes de recursos públicos oriundos de benefícios e

renúncias fiscais orientados para os investimentos econômicos em detrimento dos

gastos sociais (SANTOS M. , 2013). O Cartunista, André Dahmer, um crítico ácido e

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atento aos protestos ocorridos em 2013, soube capturar a essência desta dinâmica

em sua tirinha publicada em seu sitio eletrônico (Figura 2).

Figura 2: Quadrinhos dos anos 10 – André Dahmer

Fonte: http://www.andredahmer.com.br/ (2015)

Mas qual seria o modelo sustentável de renovação urbana de áreas centrais

degradadas frente ao modelo existente, amplamente reproduzido? Fica patente, que

as grandes operações urbanas contemporâneas expressam os anseios do capital

imobiliário por maior retorno financeiro, dentro de uma visão de urbanidade modelada

pelos hábitos de consumo e de lazer das classes A e B que acabam por legitimar a

redefinição dos espaços urbanos diante da escassa intervenção do poder público.

Entre alternativas apresentadas, podemos citar sua antítese, projetos urbanos

menores de desenvolvimento local direcionado as demandas econômicas e sociais

ou arranjos produtivos locais alavancados pela dinâmica econômica tradicional da

região.

1.3 – Desenvolvimento local como alternativa

O governador paulista André Franco Montoro (1983 - 1987) costumava dizer

que "o cidadão não mora na União, não mora no estado, mora no município", esta

frase consegue sintetizar de maneira expressiva a necessidade de emponderar o

governo local no sentido de criar e flexibilizar políticas públicas para dinamizar o

arranjo produtivo local existente e fomentar a cultura de um ambiente propício a

inovação e empreendedorismo, impactando diretamente a vida destes cidadãos,

principalmente integrantes das camadas mais socialmente vulneráveis.

As transformações econômicas recentes apontam para a esfera local a tarefa

de contemplar os novos requisitos locacionais favoráveis a decisões de investimentos

e geração de trabalho e renda na localidade.

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É difícil fugir do clichê “pensar global e agir local” quando tratamos de

desenvolvimento local combatendo os efeitos excludentes da globalização com

políticas locais de desenvolvimento econômico e integração de diferentes segmentos

populares, tornando o processo participativo com articulação do governo local

envolvendo os diversos agentes na formulação de medidas atenuadoras e na tomada

de decisões para aumentar a competitividade local. Nesse sentido Daniel (1999)

afirma que é necessário um modelo de desenvolvimento local que seja capaz de

envolver a dinâmica econômica da região de maneira integrada, motivada pela

integração social e fortalecimento da cidadania para combater os efeitos excludentes

da globalização através de programas que alavanquem as potencialidades locais, com

forte governança do poder público local garantindo os interesses da população

(DANIEL, 1999).

Nesse contexto, o decisivo não é se os setores são tradicionais ou de ponta,

mas sim a garantia de que sejam dinâmicos, inovadores, capazes de produzir com

custos e qualidade, permitindo-lhes alcançar os mercados exteriores à região (essa é

a pedra de toque do sucesso do setor de confecções na região de Carpi, na terceira

Itália - regiões da Emília Romagna e Vêneto). Dessa circunstância decorre a geração

de empregos de qualidade, e não apenas empregos em geral.

Experiências internacionais bem sucedidas são citadas nessa direção, com a

atuação das agências e fundos criados para o desenvolvimento e vocação de cada

localidade, como o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, que em 1990

financiou projetos de renovação em diversas regiões em segmentos culturais,

habitacionais e meio ambiente, contraposição aos projetos desenvolvidos na década

de 1980, onde a premissa de investimentos em obras de infraestrutura básica

(SOMEKH & CAMPOS, 2005).

Essas iniciativas são implementadas em uma escala menor comparadas a um

megaprojeto, através de ações direcionadas com o objetivo principal de promover uma

dinâmica maior no desenvolvimento local com geração de renda e emprego, medidas

de incentivo e apoio a pequenas empresas, requalificação profissional através de

convênios com entidades comunitárias e sindicais com forte governança dos agentes

públicos locais e envolvimento da comunidade através da gestão participativa. Os

benefícios locais gerados através destas ações são traduzidos através das vantagens

locacionais, como a criação de serviços de educação e formação de mão de obra

adequadas ao projeto de desenvolvimento, alavancado pelo potencial local

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fomentando instituições de pesquisas, difusão tecnológica e qualidade urbana,

criando um ambiente propício a inovação. Este modelo inclusivo foge ao lugar comum

dos modismos como centros tecnológicos de ponta ou gigantescos equipamentos

públicos como grandes estádios e centros poliesportivos versatilizados em centros de

convenções e eventos. Essas fórmulas prontas, além de provocar um deslizamento

artificial na vida da comunidade local incita a guerra com outras localidades atraídas

pelo canto da sereia da valorização imobiliária (DANIEL, 1999).

Projetos e programas introduzindo uma nova dinâmica local em substituição

ao arranjo produtivo em declínio tem produzido resultados positivos. Para definir o

auge e o declínio de um ciclo de vida, Oliveira Júnior (2014) aponta que a vida de um

arranjo produtivo pode ser dividido em quatro etapas: embrionária – determinada pela

introdução de uma inovação, investimentos, ou outra vantagem competitiva local;

crescimento - quando os mercados ainda estão desenvolvidos o suficiente para atrair

mais capital disposto a reproduzir o modelo de negócio vigente; maturidade – os

processos e serviços são convertidos em rotina, mantendo o status quo da localidade,

atraindo capital disposto a replicar o modelo convertendo custos em vantagem

competitiva; declínio – os produtos e serviços passam a ser substituídos por outros

mais eficientes e de baixo custo, ou sua necessidade desaparece por meio da

inovação tecnológica. Na Inglaterra, o Departamento de Comercio e Industria já

classifica o estágio do ciclo de vida em que se encontram o arranjo produtivo local,

utilizando terminologias como embrionário, em crescimento, maduro e em declive

(OLIVEIRA JR, 2014).

Logo, a tendência de transformação pode ser determinada pelo

estabelecimento de iniciativas de sucesso que agregam dinâmica econômica e social,

definindo sua identidade, porém sua duração é limitada pelo ciclo de vida descrito,

sendo necessário a implementação de um projeto de desenvolvimento local para

mitigar os efeitos negativos da exaustão deste arranjo no tecido urbano.

Utilizando-se de pequenas iniciativas através de programas participativos, o

modelo adotado na Europa incentivado pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento

Regional procura tirar proveito das potencialidades regionais em detrimento do arranjo

em declínio (tabela 1).

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Tabela 1: Projetos de Desenvolvimento Urbanos realizadas com o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional

País Localidade Vocação da Localidade

Arranjo Produtivo Implementado

Alemanha Völklingen Siderurgia Centro comercial e tecnológico para sediar pequenas e médias empresas

Alemanha Bremerhaven Naval Pólo multifuncional de serviços e um centro cultural e comunitário

Alemanha Friedichshain Industrial Projeto de qualificação para formar operários especializados na construção civil

França Mulhouse Mineração Incubadora para novos negócios e atividades industriais

Inglaterra Wolverhampton Siderurgia Bairro Cultural com atração de empresas de mídia e produção cultural

Inglaterra Stoke-on-Trent Cerâmica Centro de Design

Fonte: Pelo autor adaptado de Somekh e Campos (2005).

Em um primeiro momento, através de uma análise comparativa sobre os

resultados entre o modelo anterior e o implementado pode-se concluir que a o modelo

anterior tinha uma robustez e um vigor maior, principalmente se compararmos

atividades industriais com atividades terciárias ou pequenas iniciativas, frustrando

algumas expectativas iniciais. Essa expectativa de desempenho superior sobre o

modelo em declínio muitas vezes ocorre em função do discurso comparativo, como “o

efeito Barcelona” ressaltando as transformações que este megaprojeto imprimiu no

espaço urbano e na dinâmica desta cidade. A sensação de progresso diante da

intelligentsia e recursos envolvidos no projeto de desenvolvimento local também

potencializam essas expectativas, comparado a um ciclo de vida de um arranjo

produtivo desprovido deste planejamento, que tem um início despretensioso e de

baixo custo, e que evolui de acordo com a dinâmica do mercado.

Dentre as causas que podem determinar o fracasso destas inciativas, Mattioda

(2008) aponta que o baixo grau de articulação entre os atores envolvidos no projeto,

com dinamismo isolado pode gerar baixa geração de externalidades positivas. Neste

mesmo estudo, alguns fatores no Brasil foram apurados através de um estudo

realizado com nove projetos, e destacou-se que dentre os fatores negativos de forte

impacto podemos determinar que a especialização produtiva pode coibir os processos

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de diversificação local, de encontro com as afirmações de Daniel (1999) sobre

modismos ou apostas em megaprojetos (MATTIODA, 2008).

Outros programas apostam em reforçar a importância das regiões

industrializadas, através de ações de diversificação e dinamização do tecido

econômicos, utilizando a estrutura e base instalada como alavanca para alçar a

localidade a vanguarda do desenvolvimento e inovação. São projetos que não tem

grande apelo urbanístico e de valorização imobiliária, mas talvez possa ser uma

solução para as localidades que tem grande dependência de atividades intermediarias

ao setor primário, utilizando-se de soluções inovadoras e programas participativos

voltados a iniciativas de recuperação a dinâmica da região.

Esses programas, em países em desenvolvimento, acabam por ser financiados

pelas agências de desenvolvimento multilaterais, desde que os projetos se

enquadrem dentro dos valores que direcionam suas ações comunitárias. Contudo,

raramente esse enquadramento considera as regiões atingidas pela

desindustrialização e suas consequências, pois seus recursos são majoritariamente

direcionados para áreas e projetos não identificados com as áreas industrializadas e

desenvolvidas.

Algumas experiências brasileiras, como o Projeto do Eixo Tamanduatehy e

outras iniciativas que desenvolveremos adiante no capitulo inerente a Agência de

Desenvolvimento Econômico do Grande ABC, apontam a elaboração de uma

operação urbana, com foco no desenvolvimento local, atingido pela

desindustrialização. Essas iniciativas, e outras adotadas em território nacional, recebe

como critica comum a falta de um projeto de abrangência global, principalmente os

impactos sociais.

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Figure 1:Projetos de Urbanismo - Eixo Tamanduateí – 2001

Fonte: http://www.candidomaltacamposfilho.com.br (2015)

As agências seriam uma maneira de atenuar a deficiência de projetos que

abranjam além da municipalidade em que está inserida, sua continuidade político-

administrativa, garantindo o esforço a longo prazo, e não reduzidas a mandatos, além

de regular os interesses pontuais da iniciativa privada, na em Paris por exemplo o que

garante a continuidade destes projetos é uma entidade administrativa quem se ocupa

em transformar aquele pedaço da cidade (DANIEL & SOMEKH, 1999). Os projetos de

desenvolvimento local devem se pautar em ações que mitiguem os efeitos da

restruturação produtiva, decorrente das crises econômicas através de estratégias de

enfrentamento de problemas urbanos que ampliem a inclusão social.

De qualquer modo, a ausência de ações voltadas a fomentar a economia local

tende, nas condições dadas hoje, a condenar a região à estagnação, à decadência

ou, no mínimo, ao subaproveitamento de seu potencial de geração de investimento,

trabalho e renda.

Além disso, como a exclusão social é um fenômeno multidimensional - que

envolve elementos econômicos, culturais, urbanos, sociais - ações voltadas à garantia

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de inclusão social serão mais bem-sucedidas se considerarem essas várias

dimensões. A integração exigida para isso só pode ser alcançada localmente.

Portanto, neste capitulo 1, analisamos os conceitos que definem os Projetos

Urbanos e suas características, e a maneira como este se relaciona com a cidade

contemporânea. A importância das transformações urbanas que as grandes

operações urbanas e o interesse privado exercem quando eleitos principais

protagonistas na revitalização do tecido urbano degradado.

Verificamos quais as principais premissas que compõem uma Grande

Operação Urbana, e a argumentação teórica sobre a validade estratégica no

desenvolvimento de espaços públicos de qualidade, integrando diferentes camadas

do estrato social e sua inter-relação com os modais de transporte e acessibilidade,

como instrumento de inclusão social-econômica em contrapartida ao modelo de

Desenvolvimento Local promovido pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento.

Algumas pequenas iniciativas (tabela 1) foram descritas, analisando seus

resultados sobre a dinâmica econômica local, frente ao modelo em declínio.

No capítulo 2, descrevemos como a abertura econômica, globalização e a

guerra fiscal afetaram a partir da década de 1990, a região do grande ABC paulista, e

o seu impacto sobre a indústria têxtil e principalmente sobre a tradicional indústria

automobilística instalada nesta mesma região.

Veremos a seguir quais ações os atores envolvidos nesta questão

desenvolveram no sentido de minimizar estes impactos e fornecer uma resposta

adequada a estes desafios, que entendemos possível.

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CAPITULO II – NOVAS ESTRATÉGIAS DE AÇÃO REGIONAL NO

GRANDE ABC

Neste capitulo iremos debater o comportamento da indústria do ABC diante da

globalização a partir da década de 1990. Não limitando-se apenas ao viés

empresarial, mas também a articulação dos diversos atores envolvidos como

sindicatos, prefeituras e trabalhadores. Neste período a indústria têxtil local, já

debilitada pela abertura dos mercados de 1988 e pela obsolescência de seu parque

industrial, praticamente desaparece da região.

Também tratamos em tópico especifico, o polêmico custo ABC, frequentemente

apontado como causa da “desindustrialização” do Grande ABC a luz dos

pesquisadores que corroboram com a tese dos altos custos da região, mas também

os opositores desta corrente, como Arbix (2000) e Daniel (1999).

Tão polêmico quanto o custo ABC, o tópico sobre a reestruturação produtiva

do ABC, avalia as transformações do mercado de trabalho da região, que salta aos

olhos quando comparados os números absolutos do emprego industrial, mesmo

quando considerado a absorção pelo setor terciário10. Contudo, o mesmo autor

argumenta que o vigor econômico da região permanece, quando o percentual VA

(Valor Adicionado) do estado de São Paulo permanece em torno de 15% desde a

década de 1960.

Assim ao final deste capitulo no tópico: Para onde caminha o ABC? Analisamos

a experiência com a Agência de Desenvolvimento Econômico do ABC analisando os

Planejamentos Regionais Estratégicos referente aos períodos de 1999-2010 e o

ultimo referente ao período de 2011-2020.

2.1 –Efeitos da Globalização na região do grande ABC em São Paulo.

O acentuamento do processo de globalização a partir da década de 1990

causou enormes transformações na região do Grande ABC, composta pelos

municípios de Santo André, São Bernardo do Campo, São Caetano do Sul, Diadema,

Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra. Com o propósito de compreender estas

transformações, é necessário resgatar a motivação que induziram a região sua

10 Verifica-se que, no período 1986/98, a indústria extinguiu mais de 179 mil postos de trabalho, enquanto os serviços criaram cerca de 67 mil; o comércio, aproximadamente 14 mil; e a administração pública, pouco mais de 5 mil. Restou, assim, um saldo de quase 100 mil empregos perdidos, se compararmos a indústria apenas com o comércio e os serviços, ou 93 mil, se incluirmos a administração pública no levantamento. (ANAU, 2004)

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vocação manufatureira e de maneira mais detalhada a concentração industrial nesta

região. A questão de sua vocação manufatureira nos remete ao final do século XIX,

enquanto a concentração para as décadas de 1950 e 1960, quando se inicia o

processo de industrialização do Brasil. (CONCEIÇÃO, 2004)

De certa maneira podemos afirmar que a vocação manufatureira do Grande

ABC, principalmente São Bernardo do Campo, remota ao final do século XIX, quando

da instalação dos núcleos coloniais. O núcleo de São Bernardo, o mais antigo,

inaugurado em 03 de setembro de 1877 (CARVALHO JR, 1895), com a finalidade de

ser um cinturão agrícola estruturado para atender o abastecimento de gêneros

alimentícios da cidade de São Paulo, centro político-financeiro da elite cafeeira.

Contudo, diante da má qualidade do solo11, os colonos de vocação agrícola

abandonaram o núcleo, permanecendo somente aqueles com alguma aptidão e

habilidades ligadas a produção de dormentes para a ferrovia Santos – Jundiaí,

fabricação de moveis e principalmente na produção de carvão, fonte de energia na

maior parte dos lares de São Paulo. (ALVES A. , 2001)

Dentro do contexto histórico, este autor considera o ciclo de concentração

industrial de São Bernardo do Campo ocorrido na década de 1950 como a terceira

onda de industrialização do município, precedida pelas instalações de serrarias e

fabricas de moveis na região entre 1884 a 1920 como a primeira onda e principal

atividade econômica do município (MEDICI, 2012). A segunda onda acontece após

1920 até o final da década de 1940 com a instalação de grandes indústrias têxteis no

município como a Industria Reunidas Francisco Matarazzo S/A, Tecelagem e Fiação

Tognato S/A, Soc. Elni de Prod. Manufaturados S/A. (JESUS, 2009)

Tanto a primeira como a segunda onda se valeram dos abundantes recursos

naturais da região – madeira, no caso das serrarias e água para as tecelagens - para

se estabelecer no município de São Bernardo do Campo. Já a terceira onda –

estabelecimento das indústrias automobilísticas – beneficia-se da mão-de-obra

semiqualificada, sob clara orientação industrial, e da localização estratégica da cidade

entre o porto de Santos e a cidade de São Paulo - maior mercado consumidor do país

11 Nas palavras do diretor da Agência de Colonização e Trabalho, “…muito manchadas, havendo poucos lotes de terras boas. Geralmente são brancas, arenosas, secas, de piçarras, de saibro e de pedregulho e também avermelhadas e pretas. Não se prestam para cultura, se bem que haja alguma cultura de cereaes, vinha, etc. com algum desenvolvimento”. Cf. Relatório de Henrique P. Ribeiro, diretor da Agência de Colonização e Trabalho, 12 de Junho de 1907. SANTO ANDRÉ. Prefeitura Municipal de Santo André. Projeto Viva-Cidade. Santo André, 1989.

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- incrementada pela construção do primeiro trecho da Via Anchieta em 1947 (SOUZA,

2002).

A base para o desenvolvimento industrial da região a partir da década de 1950

articula-se principalmente nos setores metalúrgicos, químico e construção civil. Esta

concentração industrial, traduz-se ainda na atualidade em um PIB regional de R$ 80

bilhões, assegurando a região o segundo maior PIB do estado e o quarto do Brasil,

atrás de São Paulo, Rio de Janeiro e Distrito Federal12.

Do ponto de vista das transformações urbanas, as ondas de migração ocorridas

entre as décadas de 1950 e 1980 oriundos principalmente das regiões Norte, Nordeste

e outros estados da região Sudeste, causaram imensos impactos na região

decorrentes da explosão demográfica, superando o crescimento da capital paulista13,

refletindo na ocupação desordenada do solo em prejuízo ao planejamento urbano-

ambiental contrastando com alto valor do PIB produzido pela região. Mesmo nessa

época, já havia o problema de invasão de áreas de mananciais decorrente da

incapacidade administrativa dos municípios da região em gerir essas áreas, através

de políticas de desenvolvimento e ocupação do solo (ITIKAWA & ALVIM, 2008). De

acordo com a prefeitura de São Bernardo do Campo, estima-se uma população de

222.693 residindo em áreas de proteção aos mananciais14, a grande maioria em

ocupações irregulares. Toda a dinâmica deste ciclo migratório somado a omissão dos

agentes públicos local, resultaram na escassez de oferta de terras, e elevação dos

preços dos aluguéis pressionando o custo de vida da região, um dos mais caros do

estado de São Paulo (CONCEIÇÃO, 2004).

Durante a década de 1990 a globalização atingiu duramente a região com a

intensificação da globalização, por isso, entendemos ser necessário conceituar

rapidamente o significado do processo de globalização sem a pretensão de efetuar

uma avaliação detalhada desse processo que não cabe nos limites deste texto, antes

de prosseguirmos em nossa análise de seus impactos na região do grande ABC.

12 Cf. Dados do IBGE, 2010. 13 Cf. tabela 5. 14 A Represa Billings, no que se refere ao seu espelho d’água, ocupa uma área de 75,8 km² (18,6% da área total do Município). Após a Represa Billings, em direção ao Sul do Município até o divisor de águas sul da Represa, tem-se uma área onde está localizado o Riacho Grande: um distrito com característica Urbana já existente anteriormente à década de 1970. A partir do divisor de águas sul da Bacia da Represa Billings até o limite sul do Município tem-se uma área caracterizada como sendo de preservação da Mata Atlântica, onde se situa o Parque Estadual da Serra do Mar, com aproximadamente 110 km2. Ainda e dentro desse perímetro, tem-se uma área de 6,0 km² (correspondente a 1,5% da área total do Município) ocupada pelo espelho d’água da Represa do Rio das Pedras. (PMSBC, 2010)

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Conceição (2004) define a globalização como a expansão das relações

comerciais, industriais, financeiras e econômicas entre as nações, por intermédio de

um conjunto de processos que torna possível a criação, desenvolvimento, produção e

distribuição de produtos e serviços em escala mundial de consumo, pressionado por

uma lógica de ferina concorrência internacional. Para Santos (2000) a globalização é

o ápice do processo de internacionalização do mundo capitalista, e uma das práticas

mais perversas deste modelo, é a descentralização produtiva, ou a fragmentação da

produção com unidade econômica de comando do capital, enfraquecendo a ação dos

Estados e das instituições, promovendo seu caráter perverso atual, em sua lógica da

emergência do dinheiro em estado puro como motor da vida econômica e social

(SANTOS M. , 2000). Neste sentido Vargas (1999) afirma que a característica principal

da globalização seria a gradual e sistemática perda da capacidade de decisão dos

governos nacionais, substituídos pelos centros decisórios de alguns poucos países

ricos, dirigidos majoritariamente pelos interesses de poucas e grandes empresas

transnacionais (VARGAS, 1999). Daniel (1999), de forma mais ampla afirma que a

globalização tem sido um produto da combinação de fatores econômicos, políticos e

socioculturais, inspirada em especial na ideologia neoliberal, apresentando como

resultados uma redução generalizada da inflação, taxas de crescimento econômico

bastante modestas, recorrente instabilidade financeira internacional, expressivo

crescimento das taxas de desemprego e uma preocupante expansão da exclusão

social, afetando os países desenvolvidos e se aprofundando de maneira significativa

esses efeitos nos não-desenvolvidos (DANIEL, 1999). Sobre o enfraquecimento do

papel do Estado, Bauman (1999) expressa sua opinião de maneira não convencional.

“No cabaré da globalização, o Estado passa por um strip-tease e no final do espetáculo é deixado apenas com as necessidades básicas: seu poder de repressão. Com sua base material destruída, sua soberania e independência anuladas, sua classe política apagada, a nação-estado torna-se um mero serviço de segurança para as megaempresas...” (BAUMAN, Globalização - As Conseqüências Humanas, 1999, p. p. 74)

Quanto aos impactos negativos na região do ABC parecem particularmente

elevados ao compararmos com outras regiões brasileiras. Diante da ausência de uma

política industrial, a abertura do mercado brasileiro automotivo fora levada ao extremo,

passando de 115 veículos licenciados em 1990 para quase 369.048 mil em 1995, um

acréscimo superior a 3.000 vezes de veículos importados neste pequeno intervalo

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(ANFAVEA, 2014). Esse aspecto é muito importante para análise dos impactos na

região do ABC, o efeito imediato desta abertura de mercado, foi o fechamento de

diversas empresas, em 1990 a taxa de desemprego que era de 11,7% saltou para

15,1 em 1996 e dois anos depois, em 1998 já atingia 20,3% da População Ativamente

Econômica (PEA)15, agravando sobremaneira a região em consequência da

concentração industrial, principalmente no segmento automotivo.

Do ponto de vista da região do ABC, as perspectivas tornam-se sombrias:

desemprego, perda do dinamismo econômico e desgaste do tecido social. Com base

na experiência de alguns países europeus, e diante da emergência do fechamento da

fábricas automotivas na região, é estabelecido a câmara setorial automotiva para

formular em acordo assinado em Brasília, no dia 26 de março de 1992, entre governo,

empresários do setor automotivo e os sindicatos de Metalúrgicos de São Bernardo e

Diadema, Santo André e de Betim em Minas Gerais, todos da Central Única dos

trabalhadores (CUT), reduzindo em média 22% e o preço dos automóveis e

aumentado a alíquota de importação dos automóveis importados nos anos

subsequentes em até 35%. (SMABC, 1992)

Contudo, a alíquota para matérias primas básicas e autopeças era inferior a

5%, resultando em fechamento de diversas indústrias de autopeças, não somente na

região do ABC, mas em todo país, uma vez que somente a indústria automotiva

permanecia sob a proteção das políticas formuladas pela câmara setorial. Este

aspecto é de grande importância, pois através desta logica justifica-se o aumento do

número de fabricantes de automóveis no Brasil (Figura 3). A fim de obter menores

tarifas de importação de veículos acabados pelo programa INOVAR-AUTO, podem

importar conjuntos e autopeças por tarifa menores e obter crédito adicional de até 30%

do Impostos sobre Produtos Industrializados (IPI).

15 Cf. Pesquisa Emprego/Desemprego – SEADE/DIEESE, disponível no sitio: http://www.saobernardo.sp.gov.br/secretarias/sp/geoportal/COMPENDIO/P20.pdf (acesso: ano corrente)

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Figura 3: Mapa das fábricas de automóveis no Brasil

Fonte: http://carros.ig.com.br (acesso: 2015)

Entretanto, grande parte das plantas das fabricas de veículos recentemente

instaladas no Brasil ou em projeto apresentam-se com arranjos industriais diferentes

do utilizado pelas fábricas instaladas na região do Grande ABC. Estes arranjos não

envolvem somente a fabricante de veículos, mas também alguns de seus

fornecedores diretos. Conhecidos como condomínios industriais, possuem

características bastante particulares, diferente de distritos e parques industriais.

Proveniente da necessidade de maior integração logística e de algumas condições

particulares do setor automotivo, como o fornecimento de subconjuntos, a estrutura

“piramidal” da cadeia de suprimentos e a concentração do poder de barganha nos

níveis superiores da cadeia. A nova fábrica da General Motors em Gravataí, dentro

desta concepção piramidal produz cerca de 47,5 carros por trabalhador ao ano, ao

passo que a Volkswagen de São Bernardo do Campo e a General Motors de São

Caetano produz em torno de 10,3 carros por trabalhador ao ano. (ANFAVEA, 2014)

Quando comparada a produtividade entre os dois tipos de arranjos produtivos,

verifica-se grande disparidade. Seriam os trabalhadores das novas instalações mais

produtivos que os trabalhadores das antigas fabricas da região do Grande ABC?

Conceição (2004) afirma que esta diferença de produtividade pode ser explicada pela

grande participação de peças importadas, automatização e alto grau de terceirização

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– modelo piramidal, condomínio industrial ou no jargão utilizado no ambiente de

negócios outsourcing ou terceirização. Devemos acrescentar também a diferença

entre as jornadas de trabalhos, os trabalhadores das novas instalações cumprem

jornadas de 44 horas semanais contra 40 horas dos trabalhadores do ABC. Contudo,

a diferença de produtividade pode ser entendida perfeitamente quando debatida

dentro da dialética montar um veículo versus produzir um veículo.

Autores mais alinhados com estas práticas, como Lins (2000), admitem que a

terceirização possibilita a redução de custos devido a privação ou transferência da

necessidade de investimentos em equipamentos, máquinas e em mão-de-obra. Ao

mesmo tempo permite a obtenção de especializações que complementem sua

atividade fim. Porém, essa pratica também vincula-se à conveniência de não precisar

investir para dispor dessas atividades ou serviços. (LINS, 2000)

O impacto na região do ABC da abertura abrupta da economia atingiu

linearmente todas os setores produtivos, diferenciando-se somente a capacidade de

mobilização e organização destes setores. No entanto, os fabricantes de veículos e

os sindicatos representante dos empregados metalúrgicos do ABC são entidades

extremamente organizadas e com alto poder de mobilização, minimizando estes

impactos. Porém a indústria têxtil e as organizações ligadas a este segmento na

região, já estava debilitada pela abertura comercial iniciada na segunda metade da

década de 1980 e acelerada a partir da década de 1990 e a mudança do eixo produtivo

Sudeste para a região Nordeste (tabela 2).

Colaborou com este enfraquecimento o fechamento, durante as décadas de

1960 e 1970, de cerca de 50 fiações e tecelagens na região do ABC, porém, ligadas

a motivos sucessórios e falta de capacidade de investimento que resultou em um

parque industrial obsoleto, tolerado e de certa maneira prospero em função da reserva

de mercado vigente a época. (JESUS, 2009)

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Tabela 2: Evolução da participação das regiões na produção de têxteis (1990 a 2000)

Fonte: UNICAMP-IE-NEIT et IEMI (2002)

Nota: (1) – A diferença entre 100,0 e a soma dos valores, nas linhas, são as participações das regiões Norte e Centro-Oeste, sempre inexpressivas.

Na contramão da abertura econômica para os produtos da indústria têxtil, em

decorrência do déficit fiscal e de olho no aumento de máquinas e equipamentos

têxteis, o governo sobretaxou os insumos produtivos e os maquinários ligados ao

setor, necessárias ao avanço tecnológico e aumento da competitividade. Somente

para se ter uma ideia, enquanto as importações de produtos têxteis importados eram

isentas de tarifas, um tear importado era taxado em 20%, extinto somente em 1998.

(ALVES L. R., 2006). As entidades sindicais representativas também estavam

enfraquecidas pela redução no número de postos de trabalhos e empresas no início

da década de 1990.

Concomitantemente, o início do Plano Real, baseado na âncora cambial,

funcionou como um fator limitante à produção sobre a indústria têxtil nacional. A

sobrevalorização do Real favoreceu a invasão de produtos importados para disputar

com os produtos nacionais no intuito de forçar a queda dos preços, acabou por

desencorajou a produção local. Nesse mesmo tempo, a taxa de juros alta serviu como

mecanismo de controle da demanda. Desta forma o governo brasileiro estimulou a

demanda através das importações mas ao mesmo tempo, controlou-a efetivamente

através dessa política restritiva. (MASSUDA, 2007)

Elos da Cadeia Total¹

1990 2000 1990 2000 1990 2000 -

Fios 24,9 35,4 55,2 42,6 17,2 21,7 100,0

Tecidos 17,6 21,5 65,6 62,0 12,8 13,7 100,0

Malhas 2,8 10,0 39,9 35,2 55,7 53,5 100,0

Confecções 8,0 11,3 66,6 56,1 21,6 25,4 100,0

Geral 13,3 19,6 56,8 49,0 26,8 28,5 100,0

Nordeste Sudeste Sul

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Ao explorarmos a trajetória da indústria automobilística e da indústria têxtil na

região da ABC, podemos apontar importantes mudanças da reestruturação

produtiva16 destes segmentos na região.

Primeiro as indústrias automobilísticas, através da articulação dos diversos

atores envolvidos, a exemplo de experiências europeias (LUCINDA, 2012), minimizou

parte dos impactos com relativo sucesso frente a experiências norte-americana de

Detroit. Entre as ações que contribuíram para minimizar os impactos está a

flexibilização do contrato de trabalho e a adoção de um modelo que permitiu maior

terceirização de atividades, consideradas não fim. Estes arranjos garantiram a

sobrevida e modernização de fabricas consideradas obsoletas e dispendiosas e os

empregos associados a sua atividade, mantendo sua importância, ainda que reduzida

na economia da região. Existem críticas a este tipo de acordo, principalmente quando

há algum tipo de renúncia fiscal17 a favor da indústria automobilística, conhecidos

como incentivos fiscais, que reduz ou abolem os impostos cobrados por determinado

intervalo de tempo. Outra crítica recorrente é quanto a mobilidade urbana e ambiental,

pois com esta política privilegia-se o transporte individual frente ao coletivo, conforme

afirma reportagem no Jornal Extra Classe, vinculado ao Sindicato dos Professores do

Rio Grande do Sul, filiado à CUT:

“Na verdade, o governo está fazendo o que sempre faz em termos de política industrial, focando na economia e nos empregos, e deixando de lado os problemas gerados nos grandes centros urbanos, os congestionamentos, os acidentes e a poluição”, enumera o pesquisador Carlos Henrique Carvalho, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a respeito da nova política de incentivo à compra de veículos baseada na redução do IPI e no aumento dos prazos de pagamento ......... “Qualquer crise, a indústria automobilística sente muito rápido e pressiona o governo. O fato é que, independente de crise, o nível de emprego caiu muito nos últimos 20 anos. Além disso, barateia-se o transporte individual, enquanto o coletivo encarece. Mais carros significam mais problemas, tais como acidentes, emissão de CO2 e horas perdidas em engarrafamentos, principalmente nos grandes centros urbanos. A questão é estrutural”, explica Carvalho. “No Brasil não há, por exemplo, um aeroporto de onde você caminhe 10 metros ou menos para chegar a uma estação de metrô. O país poderia ter uma mobilidade urbana eficiente, e emitir menos CO2, mas parou de fazer planejamento”, completa o técnico Altair Garcia, do Dieese”. (BEMFICA, 2012, p. p. 2)

16 O termo termo reestruturação produtiva nesse contexto, referencia-se aos conjuntos de mudanças ocorridas no setor industrial através das inovações tecnológicas, organizacionais e territoriais em função da integração produtiva flexível, com o objetivo de aumentar a produção, 17 Neste ano, até maio, a renúncia fiscal somou R$ 42,087 bilhões, muito acima dos R$ 28,642 bilhões em igual período de 2013. Fonte: Agência Reuters. IPI de automóvel seguirá baixo até fim do ano. 30 de Junho de 2014

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Quanto a indústria têxtil na região do ABC, que atingiu seu Auge na década de

1970, com 315 estabelecimentos na região, restou pouco deste parque industrial,

reduzido apenas 10 pequenos estabelecimentos, a Valisere Industria e Comercio

Ltda, a maior de todas com cerca de 600 funcionários (CNI/ABIT, 2000). Diante da

paralisia e baixa mobilização dos atores envolvidos, tanto o empresariado, os

sindicatos patronais e de empregados e o poder público e a baixa influência afetada

pelas crises vivenciadas nas décadas anteriores. Como iremos ver adiante, no

exemplo da Tecelagem e Fiação, a mobilização do poder público ocorre por motivação

muito diferente das indústrias automobilísticas, no sentido de facilitar o “desmonte”

dos esqueletos desta outrora florescente indústria para sua conversão em

empreendimentos imobiliários.

Podemos afirmar que dentre os dois esquemas seguidos nestes dois

segmentos diante dos impactos e desafios da globalização, a indústria automobilística

da região do ABC conseguiu maiores êxitos, com alguns custos sociais e econômicos,

frente a indústria têxtil. Não é o objetivo deste estudo criticar ou desfazer das duas

situações apresentadas, o objetivo é rever, da melhor forma possível, as questões

concretas adotadas e seus respectivos resultados. Contudo, estes resultados foram

capitaneados diante de um panorama onde o as empresas procuram diminuir seu

tamanho, sob a dialética de focar seus esforços e recursos no core-business18, este

emagrecimento sob a várias denominações - Condomínio Industrial, terceirizações,

arranjo piramidal ou verticalização – visa romper unilateralmente os vínculos que o

aprisionam ao trabalho e o subordinavam ao Estado.

O capital, dessa maneira, liberta-se de sua dependência com o espaço urbano,

cessando o pacto de estabilidade acordado com o trabalho, podendo fluir para outras

localidades. Nesse sentido, Bauman (2001) afirma que o capital, em seu estágio

liquido, não estava radicado ao lugar ou solo quanto os trabalhadores que empregava,

desmobilizado, pode viajar livremente, mas o trabalho permanece tão solido e pesado

quanto no passado, nas palavras do autor:

“O capital viaja esperançoso, contando com breves e lucrativas aventuras e confiante em que não haverá escassez delas e de parceiros com quem compartilhá-las. O capital viaja rápido e leve, e

18 Cf. Wikipédia, core-business é um termo inglês que significa a parte central de um negócio ou de uma área de negócios, e que é geralmente definido em função da estratégia dessa empresa para o mercado. Este termo é utilizado habitualmente para definir qual o ponto forte e estratégico da atuação de uma determinada empresa.

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sua leveza e mobilidade se tornam as fontes mais importantes de incerteza para todo o resto. Essa é hoje a principal base da dominação e o principal fator das divisões sociais. (BAUMAN, 2001, p. p. 141)

Diante deste cenário desta fluidez, preparou-se o terreno para outra mazela da

globalização na disputa do capital entre as diversas regiões da federação, a Guerra

Fiscal, que atingiu a região do ABC, uma das concentrações industriais mais

fustigadas. (ARBIX, 2000)

2.2 Guerra Fiscal e o “Custo ABC”

Se a globalização e ao regime de acumulação financeirizado, já impõem

dificuldades para a era da modernidade liquida (BAUMAN, 2001), a “Guerra Fiscal”

assegura dificuldades adicionais para os Estados Nacionais. Este termo é utilizado

para denominar políticas de atração ou retenção de investimentos através de isenção

fiscal, ou de acordo com a definição de Calciolari (2006):

“A chamada guerra fiscal é conceituada como a exacerbação de práticas competitivas entre entes de uma mesma federação em busca de investimentos privados. Benesses fiscais atrativas incentivariam a migração de determinados agentes privados, os quais, segundo postulados econômicos clássicos, tendem sempre a buscar o menor custo produtivo e, consequentemente, maior lucro”. (CALCIOLARI, 2006, p. p. 5)

Segundo Piancastelli (2004), o Guerra Fiscal foi implementado de maneira mais

acelerada a partir de 1988, quando boa parte dos estados brasileiros cederam parte

de sua receita própria, baseadas no Imposto sobre Circulação de Mercadorias19, em

razão do montante de recursos de transferências recebidos do Governo Federal,

deixando-os em uma posição confortável. A região Nordeste, enquadrada na política

de incentivos da Sudene, aproveitava deste tipo de incentivo. Contudo, somente

quando esta pratica espalhou-se pela federação, a situação assumiu contornos

importantes, refletindo-se de maneira quase que exclusiva no ICMS, o principal tributo

do país representando entre 7% e 8% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. A

situação, contudo, só assumiria contornos mais dilatados com a entrada em vigor do

Plano Real em 1994. A administração pública já havia habituado a trabalhar em um

ambiente de inflação, onde o crescimento da arrecadação estancadas durante anos

19 Definição oficial de ICMS: Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação. Fonte: Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo.

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eram compensadas por uma ciranda financeira, ou seja, qualquer despesa com um

atraso de dois ou três meses era garantido seu pagamento pela inflação. Com a

estabilização da inflação em níveis atuais, a “receita” proveniente da inflação deixou

de existir, causando enorme impacto na administração pública. (PIANCASTELLI,

2004)

No contexto regional do Grande ABC, o impacto deu-se principalmente no

segmento automotivo, onde a evolução da indústria automobilística se confunde com

a história da região, 47% dos empregados eram das linhas de produção em 1985,

este valor se reduz a 20,5% em 1999. A taxa de desemprego na região que era de

12,8% em 1985, atingiu o valor recorde histórico de 23,1% em agosto de 1999,

segundo dados do Seade- Dieese (CORREIA, 2008).

Estes números são justificados, em partes, pela preferência dos estados e

municípios pelas indústrias automobilísticas e consequentemente a indústria de

autopeças. Essa preferência traduz-se em artifícios de atração que vão desde a

renúncia fiscal e diferimento de impostos a doação de imensas áreas de terras com

toda infraestrutura básica inclusa. Em números absolutos a indústria automobilística

representa 23% do PIB industrial do país (ANFAVEA, 2014) representando um

impulsionador da economia reunida ao seu redor, imenso prestigio político entre os

eleitores e por ser identificados como o mais rápido e eficaz caminho para o emprego

abundante, a alta tecnologia e a modernidade.

Na Guerra Fiscal, o pacote de bondades é despendido mesmo diante de

um importante paradoxo: a administração pública dos estados e municípios em

situação financeira precária realizando investimentos para grandes empresas da

indústria automobilística, como por exemplo o Paraná, que gasta hoje entre 70% a

80% de suas receitas com pagamento de pessoal, concedeu considerável volume de

recursos, por meio de renúncia fiscal e infraestrutura a Renault, com participação

acionaria do estado. (PIANCASTELLI, 2004)

Para entender melhor a dimensão da renúncia fiscal assumiu no Brasil durante

a década de 1990, o DIEESE/ABC preparou um comparativo (tabela 3) fundamentado

nos estudos de Arbix (2000), evidenciando o real custo médio de um emprego criado

mediante o montante investido, em relação a mesma pratica em outros países.

(CORREIA, 2008)

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Tabela 3: Exemplo de Atração de Investimentos

Fonte: Arbix (2000)

A política de renúncia fiscal, levou ao questionamento dos resultados, mediante

o volume de recursos aplicados. Para Correia (2008), as indústrias automobilísticas

não promovem nenhum benefício direto as regiões onde instalam-se, ao contrário,

exigindo do poder público municipal maior capacidade de investimentos em

infraestrutura, particularmente no sistema viário, a fim de evitar os transtornos

logísticos na movimentação de materiais, autopeças e distribuição de seus produtos.

Mesmo possuindo uma montadora instalada no município, os ganhos de

qualidade de vida não são assegurados, é inquestionável o número de outras

empresas e de empregos qualificados que uma indústria deste segmento atrai. Nos

municípios de São Bernardo do Campo e de São Caetano do Sul, com plantas

industriais automotivas instaladas a mais de 50 anos é visível o dinamismo econômico

em muitos dos indicadores socioeconômicos, como o Índice de Desenvolvimento

Humano (IDH) formulado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

(PNUD), sem a concessão de renúncia fiscal. Porém, questionável os ganhos deste

poder dinamismo econômico quando comparados com outros municípios de São

Paulo, onde a concentração industrial não tem a mesma dimensão, complexidade ou

seja tão significativo. (CORREIA, 2008)

Além das benesses contidas na guerra fiscal, existiriam outros motivos

que possam motivar a desconcentração industrial na região do ABC? Para Arbix

(2000), em revisão a literatura especializada, aponta três motivos em ordem de

importância que podem nos ajudar a compreender este fenômeno:

Local Ano EmpresaInvestimento

Estado

Investimento

Montadora

Empregos

diretos

Incentivos /

empregos

Ohio 1980 Honda 20,0 800,0 5.000 4.000

Michigan 1984 Mazda 48,5 747,0 3.500 13.857

Kentucky 1985 Toyota 149,7 823,9 3.000 49.900

Indiana 1986 Isuzu 86,0 490,0 1.700 50.588

Carolina 1994 BMW 130,0 450,0 1.200 108.333

França 1995 Swatch 110,0 370,0 1.950 56.410

Gravataí 1999 GM 226,6 600,0 1.300 174.308

valores em milhões de US$

(o ICMS)

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i. Custos trabalhistas, a região do ABC estaria fora dos novos planos

indústrias, principalmente das montadoras em função de seu alto

nível de organização sindical e da sua história de conflitos

trabalhistas20.

ii. Disposição das empresas de afastar-se das áreas industriais mais

consolidadas em função do alto nível de mobilização sindical que,

geralmente, acarreta custos maiores ao fator trabalho. Por essa

segunda hipótese, a região do ABC também estaria fora dos novos

planos das montadoras em razão de seu alto nível de mobilização

sindical e da sua longa história de conflitos e impasses trabalhistas.

iii. Alteração nas condições que impulsionaram a concentração de

investimentos automotivos no ABC nas décadas de 1950 e 1960.

Neste período, a pouca infraestrutura rodoviária e ferroviária do país

e a concentração do mercado e do trabalho qualificado na região

Sudeste contribuíram para a escolha do ABC.

Complementando o ponto de vista de Arbix (2000), Lima (1998) afirma que a

competitividade da região está abalada pelo custo ABC, ressalta a incorporação de

custos pelas empresas de serviços de responsabilidade do estado, como saúde e

transporte, com contribuição residual dos trabalhadores nestes custos, além de

derrubar o mito da qualificação da mão de obra da região do ABC como um fator

preponderante:

“O mito da qualificação da mão-de-obra metalúrgica do Grande ABC não passa mesmo disso — mito. Cada vez mais não tem sentido o discurso de louvação demagógica à mão-de-obra regional como fator de atratividade de investimentos. Uma verdade que há alguns anos é comentada como segredo, porque a propagação poderia gerar contratempos, agora integra o relatório da Câmara Regional”. (LIMA, 1998, p. p. 5)

No entanto, em oposição as ideias de Arbix (2000) e Lima (1998), Daniel (1999)

afirma que o equilíbrio entre os benefícios sociais e os custos locais é o que determina

a competitividade de uma região, responsabilizando a ausência de ações dos agentes

públicos voltadas ao fomento da economia local, considerados fatores que condena a

20 Cada hora trabalhada na Ford do ABC custa cerca de US$ 14. Na fábrica de motores da VW (interior de São Paulo) esse mesmo custo é de US$ 6,80. Na Fiat em Betim (Minas Gerais) o custo médio é de US$ 7,30 (LIMA, 1998)

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região a estagnação e a decadência, ou no mínimo o subaproveitamento de seu

potencial, salientando:

“Na opinião pública tem prevalecido a ideia de que o decisivo, para as escolhas locacionais das empresas, são os baixos custos da localidade, em termos de tributos, preços públicos, salários etc. A guerra fiscal, nesse contexto, é a expressão mais viva da opção por reduzir custos para atrair empreendimentos privados. Trata-se, porém, de uma visão equivocada (porque simplificadora) e de uma escolha política, entre outras possíveis. Na verdade, contam igualmente os benefícios locais postos à disposição das empresas, que guardam relação com as novas tecnologias, formas de organização do trabalho e configurações da concorrência, tais como: educação e formação profissional adequadas às vocações econômicas, instituições voltadas a pesquisa e desenvolvimento tecnológico (bem como a apoio e difusão tecnológica), fatores logísticos (sistema de transportes, terminais de carga, aeroportos, portos), qualidade de vida urbana, ambiental, relações capital-trabalho (propícias a elevações de produtividade), proximidade de fornecedores, ambiente favorável a inovações e à cooperação etc. (DANIEL, 1999, p. p. 191)

Não na mesma linha que Daniel (1999), mas polemizando a respeito do “custo

ABC” ou o “custo Brasil”, o jornalista Joel Silveira Leite (2012), especializado na

cobertura do setor automobilístico, escreveu um artigo na Folha de São Paulo em 14

de Dezembro de 2012, intitulado: O “lucro Brasil” das montadoras, revelando o

reverso da moeda:

“Os dirigentes das montadoras disseminam há décadas a tese de que a causa do alto preço do carro no Brasil é o imposto. O mantra pegou e é quase senso comum que a carga tributária é que faz o brasileiro pagar o carro mais caro do mundo. Outro fator que costuma ser citado é o custo Brasil, um conjunto de dificuldades estruturais e burocráticas, destacando-se a falta de qualificação profissional e uma estrutura logística cara, insuficiente e arcaica.......... Realizada na semana passada, com a presença de representantes do Ministério da Fazenda, do Ministério do Desenvolvimento, do Ministério Público Federal, do Sindipeças (Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores) e deste jornalista. Lamentada ausência da Anfavea, a audiência revelou (por um estudo apresentado pelo Sindipeças) que a margem de lucro das montadoras instaladas no Brasil é três vezes maior que nos EUA: no Brasil é de 10%, nos EUA é 3% e a média mundial é de 5%” (LEITE, 2012, p. p. 3)

Diante do exposto, isso pode ajudar esclarecer parte da motivação da

desconcentração industrial em curso na região do ABC. A instalação de fabricas novas

nos estados de Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Bahia e Paraná tem pouco a ver

com a diferença dos custos trabalhistas entre a região do ABC e outras regiões, com

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menor ou maior grau de mobilização sindical, ou mesmo a falta ou presença de

infraestrutura, assunto presente em quase todos os discursos financistas. O elemento

fundamental mais conveniente apto a explicar o processo relativo de desconcentração

industrial na região do ABC é a guerra fiscal e as ofertas deflagrada entre estados e

municípios brasileiros à procura de investimento privado.

A guerra fiscal, no que tange a redução das desigualdades regionais, segundo

Calciolari (2006), é política inócua, afirma ainda que as empresas ao apresentarem

custos menores com estas políticas, passam a investir maciçamente na contratação

de burocracia especializada na negociação destas concessões em detrimento dos

investimentos tecnológicos e melhoria da capacidade produtiva. Numa inversão de

valores, o grau de competitividade das empresas passa a ser medido não pela sua

capacidade em reduzir custos de produção, mas pela capacidade de negociar tirando

melhor proveito deste ambiente de guerra fiscal (CALCIOLARI, 2006)

2.3 – Reestruturação produtiva e o setor terciário

O trabalho na região do grande ABC, em razão da reestruturação produtiva

industrial intensificada no início da década de 1990 com a abertura de mercados, vem

passando por alterações que produzem indagações sobre o futuro da região, pois

sempre foi considerado como fator preponderante no progresso social e econômico

da região, e qualquer modificação em suas relações cause imediato medo e

apreensão.

Exposto as frequentes oscilações do mercado, o trabalho ganha novas formas

em contrapartida ao que conhecíamos na modernidade sólida21. Entretanto, devemos

examinar com mais cautela esta questão, em razão do dinamismo do próprio mercado

de trabalho, que no caso do Brasil, formou-se precariamente a partir de um capitalismo

tardio, com todos os impactos deste modelo.

De qualquer maneira, o modelo adotado na região do grande ABC, fornecia

uma ideia de longa duração ligado ao modelo fordista de acumulação, eliminado pela

21 A modernidade sólida, com sua proposta de durabilidade, pautou-se pela busca da ordem, eliminando e excluindo todo o tipo de imprevisto e desordem. A intenção era deixar o lugar limpo, sempre em busca de algo novo, melhor e mais sólido, em contrapartida ao que Bauman chamou de modernidade líquida para caracterizar a sociedade contemporânea. Esta, por sua vez, não mais pautada pela durabilidade, pela ordem e pela racionalidade, mas, sim, pela liquidez na qual nada consegue manter sua forma por muito tempo; uma época em que a rotina e a mesmice não são bem vistas e tudo que é sólido se desmancha no ar. (BUNGENSTAB, 2014)

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curta duração inerente a modernidade liquida, com características mais leves e

flexível. Para Bauman (2001):

“Quem, como jovem aprendiz, tivesse seu primeiro emprego na Ford, poderia ter certeza de terminar sua vida profissional no mesmo lugar. Os horizontes temporais do capitalismo pesado eram de longo prazo. Para os trabalhadores, os horizontes eram desenhados pela perspectiva de emprego por toda a vida dentro de uma empresa que poderia ou não ser imortal, mas cuja a vida seria, (...), muito mais longa que a deles mesmos.” (BAUMAN, 2001, p. p.168)

Neste contexto, a relação do trabalhador com a localidade de trabalho é, em

termos qualitativos, outra comparados com a modernidade sólida. Antes, poderia até

haver um ambiente de colaboração e engajamento entre o trabalho e o capital, devido

a mutua dependência, porém observamos uma mudança nestas relações,

ocasionando um ambiente de insegurança e incertezas, principalmente quando

analisado diante da conjuntura de empresas que deixam a região.

A consequência imediata é o desemprego estrutural22 e a deterioração dos

níveis de renda e queda na qualidade de vida. Em oposição a estes acontecimentos,

a expansão do setor terciário na região do Grande ABC também chama atenção.

Novos centros comerciais, novos arranjos produtivos, grandes empreendimentos

imobiliários e grandes empreendimentos públicos-privados surgem na região e outros

segmentos favorecidos pelo processo de abertura do mercado, efeito acentuado já

referido com a globalização na década de 1990. No entanto, estes empregos gerados

pelo setor terciário não neutralizam os efeitos dos empregos perdidos, nem em termos

de qualidade ou mesmo em quantidade, resultando em baixos níveis salariais para

um número de empregados menor que o liberado pelo setor industrial, intensificando

o desemprego estrutural causado pela restruturação produtiva da região. (ANAU,

2004)

Obviamente isso causa maior tendência de estratificação social e urbana

causado pelos níveis salariais inferiores dos empregados do setor terciário, causando

maior impacto meio ambiente. O agravamento das condições sociais leva a ocupação

22 Desemprego Estrutural é uma forma particularmente grave e generalizada de desemprego que ocorre pelo desequilíbrio entre a oferta e a procura de competências de trabalho numa dada economia. É causado pelo fato da força de trabalho disponível não possuir as competências que as organizações procuram. Uma vez que as pessoas desempregadas necessitam dispender tempo e esforço para se ajustarem às necessidades do mercado de trabalho, o desemprego estrutural pode manter-se durante um período longo de tempo.

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desordenada, de áreas ambientalmente frágeis, como as áreas protegidas dos

mananciais.

Porém, ao considerarmos o desemprego na região do ABC, que em 1999

chegou a atingir 21,4% da População Economicamente Ativa (PEA), percebe-se uma

crise relacionada ao emprego, comparando-se com o índice de 10,3% da PEA de

2013, e não a atividade industrial da região que emprega menos atualmente, porém

mantem-se estável ao longo do tempo (DIEESE, 2009).

Está em curso uma transformação do mercado de trabalho na região do grande

ABC. Nos últimos anos quem mais emprega são as empresas de serviço e comercio,

que respondem hoje por quase metade da força produtiva de trabalho da região23,

consolidando sua função estratégica para a região, principalmente dos serviços

auxiliares ligados a produção industrial, servindo como apoio as indústrias do

segmento químico, as montadoras de veículos, as indústrias de maquinas e

equipamentos, e propriamente as ligadas aos serviços, como informática,

telecomunicações, educação, logística, etc.

Estes dados nos revelam a capacidade de transformação da região do grande

ABC, evidenciando as mudanças nos aspectos produtivos local, contudo não

invalidando os argumentos relativos a desindustrialização da região, principalmente

se compararmos os dados do Instituto de Pesquisa Econômicas Aplicadas (IPEA). De

acordo com estes dados, em 1975 a produção da região do grande ABC representava

4,72% do PIB brasileiro, e em 2012 apenas 1,98%, uma queda de quase 60%24,

enquanto o PIB do estado de São Paulo representava em 1975, 39,05% (AZZONI,

1993) contra 33%25 em 2012, representando uma variação de 18%, uma queda bem

menos agressiva que na região do grande ABC.

Em diversas oportunidades, Somekh (2013) chama atenção para não

confundirmos transformação e reestruturação do tecido industrial com esvaziamento

do tecido urbano, comumente atribuído a este fenômeno a localidades que passam

por este tipo de transformação da estrutura produtiva predominante, porém sem perda

23 Estudo apresentando no boletim trimestral Observatório Econômico (nº 2, Ano I, Setembro/Outubro/Novembro de 2003), baseia-se em dados da PED-ABC/SEADE/DIEESE ano 2002, e também da Atividade do Setor de Serviços Empresariais do Grande ABC (PASSE/ABC), publicado igualmente em 2002 pela Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC. 24 AMARAL, Anderson. DGABC. Com indústria em queda, PIB do ABC encolheu pelo 2º ano seguido em 2012. De 12 de Dezembro de 2014 25 Cf. informações contidas no site da fundação SEADE, no sitio: http://www.seade.gov.br/pibmensal/, acessado em 23 de Dezembro de 2014.

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do dinamismo econômico. Ao verificarmos os extensos estudos de ANAU (2004)

sobre o Valor Adicionado (VA), desde a década de 1990, mostram que a participação

do ABC permanece em torno de 15% do total do VA do estado de São Paulo, mantem-

se estáveis. Ao debruçarmo-nos sobre os investimentos direcionados para a região

do grande ABC, verificamos que as indústrias estabelecidas na região irão investir

cerca de R$ 10 bilhões entre 2015 e 201926 mantendo a importância no segmento

industrial da região, pelo menos a médio prazo. Outra importante informação, que vai

na contramão da tese da desindustrialização, é referente ao “Polo de Defesa do

Grande ABC” que começa a ser implementado na região em razão da aquisição de

36 caças Gripen NG da sueca SAAB, que serão fornecidas a Força Área Brasileira

(FAB) ao custo de R$13,4 bilhões27. Há ainda investimentos de alta monta em

infraestrutura de mobilidade, como a linha 18 – Bronze do metro de R$4,2 bilhões28 e

do Aeroporto de Cargas de São Bernardo, de R$6 bilhões29, estes dois últimos

investimentos devem aumentar a dinâmica econômica em torno do setor terciário da

região do ABC, confirmando o caráter de reestruturação produtiva e mantendo sua

atratividade para investimentos, tanto na esfera pública como privada.

Outros fatores privilegiam a escolha destes investimentos na região, a

localização intermediaria entre o Porto de Santos e a cidade de São Paulo, principal

mercado consumidor do País, facilitado pelas rodovias Anchieta e Imigrantes,

recentemente modernizadas e ampliadas, acrescentam condições ideias para

interações com os mercados internos e externos potencializados pela cultura

consumista do mercado apoiado em um modelo com dinâmica just-in-time30 exige

proximidade ou rapidez na circulação de mercadorias e serviços.

Estes fatos podem indicar que a economia do grande ABC já consolidou os

ajustes exigidos pelo mercado em nome da competitividade, o que permitiria a

26 FARIAS, Leone. DGABC. Setor metalúrgico deve investir R$ 10 bilhões na região. De 10 de Outubro de 2014. 27 FARIAS, Leone. DGABC. Setor aeronáutico é aposta de indústria do Grande ABC. De 22 de Setembro de 2014. 28 Ministério do Planejamento. Assinado contrato para a construção de monotrilho entre São Paulo e Grande ABC. De 22 de Agosto de 2014, disponível no sitio: http://www.pac.gov.br/noticia/4db3fab8, acesso em 23 de Dezembro de 2014. 29 CRISTINA, Paula. DCI. Aeroporto em São Bernardo deve custar até R$ 6 bilhões. De23 de Setembro de 2014. 30 A produção, nos parâmetros do just-in-time, deve estar associada à demanda, com número zero de estoques, aproximando os componentes ou matérias-primas do operador, reduzindo-lhe o número de movimentos, e, consequentemente, aumentando a produtividade, com eliminação de postos de trabalhos (HEIDMANN, 2004)

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retomada gradual e constante do desenvolvimento sustentável. A disputa e

atratividade dos vazios e ruínas industriais, deixados por industrias obsoletas na

região voltados para grandes projetos de a requalificação seriam os sinais do

esgotamento destes ajustes.

Ajustes necessários diante da abertura abrupta do mercado na década de

1990, patrocinado pelo governo Collor de Mello, seguido pela desregulamentação do

mercado e reformulação política industrial, redução das barreiras tarifária do governo

Fernando Henrique Cardoso, talvez esses ajustes tenham ocorrido em uma

velocidade incompatível com os segmentos mais fragilizados da região - a exemplo

do setor têxtil.

Autores como Acca (2006) afirmam que o crescimento do setor de serviços é

indissociável da dinâmica industrial, acentuando o caráter híbrido da região

metropolitana de São Paulo, ao passo que as atividades dos serviços se desenvolvem

estritamente dependente das relações organizadas no interior da indústria, sendo

assim o setor terciário avança como resultado da reestruturação produtiva industrial

decorrente na década de 1990. A diferença entre a produtividade das atividades

industriais e do setor terciário podem nos conduzir a uma impressão que estamos

vivenciando um declínio do setor industrial, motor do desenvolvimento econômico do

País em décadas anteriores a globalização. (ACCA, 2006)

Porém, como evidenciado anteriormente, e amparados pelos estudos de ANAU

(2004) o declínio do setor industrial no Produto Interno Bruto (PIB) vem afetando

consequentemente a base quantitativa do emprego industrial, absorvidos pelo setor

terciário e aumentando sua relevância regional. De fato, quando observamos o

período entre 1997 e 2002, o número de pessoas neste segmento mais que dobrou,

passando de 40 mil pessoas para 108 mil. (IBGE, 2006)

Pode-se refletir sob o prisma do que foi exposto, que a região do grande ABC

não padece de uma crise industrial, ou que a região não perdeu influência e poder

industrial, diante da estabilidade da participação do VA no Estado de São Paulo, mas

que outras regiões com baixo desenvolvimento passaram a apresentar um nível de

maior industrialização, durante a década de 1990 (ANAU, 2004). No entanto, devemos

considerar que a utilização do VA como medida de analise, pode apresentar alguns

problemas por se tratar de números absolutos estatísticos, diante de sua importância

como instrumento utilizado para o repasse do ICMS entre os municípios, o VA pode

ser vítima de manipulação e sonegação municipal, o que leva a contestação sobre a

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participação dos municípios sobre o repasse31. Contudo, temos que salientar, que o

VA é a única medida estatística de desempenho econômico vigente, capar de

abranger e traduzir as transformações da atividade econômica das diferentes regiões

e setores desse sistema.

Ao analisarmos estas transformações induzidas pelo declínio da atividade

industrial na região do grande ABC, surge a necessidade de ocupação destes

espaços, que traduz-se em uma ótima oportunidade para o capital imobiliário e

principalmente para o setor terciário com um forte desenvolvimento na região, porém

sem a mesma atratividade econômica, sob a ótica do mercado de trabalho, que o setor

industrial. Este desenvolvimento do setor terciário, se traduz em alguns problemas

para a região, o primeiro trata-se da própria competitividade do setor, em razão da

proximidade da região do ABC conturbada com a capital paulista, centro de

convergência das principais atividades deste segmento. E outros relacionados com a

própria evasão industrial, aumentando as taxas de desemprego e diminuição dos

postos de trabalhos neste segmento ocasionando perda de massa salarial na região.

2.4 – Para onde caminha a região do ABC?

Na década de 1990, ainda sob efeito da crise econômica, foi instituída pelos

sete municípios da região do grande ABC a Câmara Regional do ABC (CR), em um

cenário de contestação do papel do Estado pela sua redefinição, surge o enfoque

gerencial das cidades, estimulando formas de empreendedorismo local, visando o

desenvolvimento econômico da região, utilizadas, desde a década de 1960 por

Governos locais comandados por diferentes ideologias políticas. O regimento da CR,

aprovado em fevereiro de 1997, criou três diferentes linhas de ações: o Conselho

Deliberativo, a Coordenação Executiva e quatro Grupos Temáticos (GT):

Desenvolvimento Econômico e Emprego, Planejamento Urbano e Meio Ambiente e

Temas Administrativos e Financeiros. (DANIEL & SOMEKH, 1999)

Dos Grupos Temáticos, nasce a proposta de criação da Agência de

Desenvolvimento Econômico do Grande ABC (ADEGABC), em 15 de Julho de 1997

31 Notícias Garça. Jornal da Comarca de Garça. Cidades da região amargam queda de ICMS para 2015. 20 de Dezembro de 2014.

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no 1° Seminário Geral de Entidades em São Bernardo do Campo coordenado pelo

então prefeito de Santo André, Celso Daniel

Em dezembro de 1997, foi proposto e aprovado um convenio entre a Agencia

do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), para a contratação de cinco

consultores internacionais, para subsidiar o planejamento estratégico regional. Uma

das contribuições deste convenio, um relatório sugerindo a promoção de constituição

de redes de empresas de pequeno porte, que atuariam em sinergia, seguindo o

conceito de “clusters”, através do consultor contratado Allen Scott (Agência de

Desenvolvimento Econômico do Grande ABC, 1997). A Câmara ainda realizou em

1996 visita em duas regiões italianas que contam com agências de desenvolvimento

regional: Sesto San Giovanni, próximo a Milão e Emilia Romagna, com delegação

composta de várias prefeituras, empresários, sindicalistas e membros do Fórum da

Cidadania.

A ADEGABC é configurada institucionalmente como uma Organização Não-

Governamental (ONG) mista, com custos rateados entre seus associados e agentes.

Entre os documentos encaminhados para a Câmara Regional do ABC, em 1999, um

chama atenção o documento intitulado “Grande ABC; cenário futuro”, contendo as

expectativas de um futuro desejado para a região, que deveriam ser encorajadas, com

realização prevista para o ano de 2010. Estruturado em três partes, a primeira parte

composta pelo Plano de Metas com tópicos para o desenvolvimento da região, a

segunda parte disserta sobre as transformações industriais na região, notadamente a

automobilística, e finalmente a terceira parte apontando dois possíveis cenários para

a região.

O primeiro negativo, reforçando características constatadas no passado de

periferia urbana combinada com decadência econômica. Um segundo cenário, mais

positivo, apontando caminhos com ajuda e mobilização da sociedade e dos agentes

públicos na construção de uma região mais competitiva, transformada do ponto de

vista industrial de acordo com a visão do relatório de Allan Scott, com uma rede

estruturadas de pequenas e médias industrias complementando a grandeza das

indústrias globalizadas, através de um Polo Tecnológico, desfrutando de alto índice

de qualidade de vida, citando como exemplo a “terceira Itália”. (Agência de

Desenvolvimento Econômico do Grande ABC, 2000)

O documento sugeria o estimulo a criação do polo de prestação de serviços,

caracterizando o Grande ABC como um avançado centro terciário, na vanguarda da

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metrópole, ressaltando o papel da Região Metropolitana de São Paulo como uma

“cidade global”, respeitando e mantendo o equilíbrio entre os grandes investimentos

no setor de base de comércio com os existentes, incentivando a criação de novas

centralidades, contemplando a dinamização do comercio de rua, capacitando o

pequeno e médio comerciante ou prestador de serviços, oferecendo-lhe condições de

concorrer com os grandes empreendedores. Previa ainda, o estimulo ao turismo

regional e a criação de núcleos de apoio ao desenvolvimento da produção e pesquisa

(informática, design, marketing, cinema, etc.) para o setor terciário local. Para a

indústria, a principal estratégia seria manter o parque existente através de sinergias e

complementariedades das cadeias produtivas, fortemente baseadas nas vocações

existentes e do setor terciário desejado. (Agência de Desenvolvimento Econômico do

Grande ABC, 2000)

Ao compararmos o documento de 1999 com os dados econômicos da região

de 2010 sobre o VA, verificamos que o setor terciário responde por 52,4%, o setor

industrial por 41,1% e a Administração Pública, 7,5% da participação. (PMSBC, 2010).

Em uma análise rápida e superficial dos dados, podemos inferir que os números

refletem o planejamento de 1999. Exceção apenas ao item que refere-se ao Polo

Tecnológico, que ainda continua nas pautas de reinvindicações junto ao Governo

Estadual.

Contudo, ao analisarmos o Planejamento Regional Estratégico que contempla

o período de 2011 – 2020 (Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC,

2009), verificamos uma mudança no foco da Agência de Desenvolvimento Econômico

do Grande ABC, deixando as ações de fomento econômico e empreendedorismo em

segundo plano, passando para uma atuação com ênfase social.

O documento que contempla a perspectiva de futuro para o período de 2011 –

2020 destaca as enchentes que provocam deslizamentos como principal problema da

região32 que o principal problema da região são as enchentes, seguido dos problemas

relacionados a mobilidade urbana.

O documento destaca três Grupos de Trabalho que compõem o Eixo de

Atuação Infraestrutura: Infraestrutura, Mobilidade e Defesa Civil, elencando as

prioridades através das seguintes ações:

32 Em janeira de 2010, morreram cerca de 8 pessoas na região (Santo André, Mauá e Ribeirão Pires). Redação Terra. Chuvas bloqueiam marginais e matam 8 pessoas em SP Site: http://noticias.terra.com.br. De 21 de janeiro de 2010. Acesso em: 26 de Dezembro de 2014

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Integrar a região aos principais sistemas viários da Região Metropolitana

de São Paulo aos portos e aeroportos;

Aprimorar os sistemas logísticos de transporte rodoviário e ferroviário de

cargas;

Aprimorar os sistemas de telecomunicações vinculados às novas

tecnologias;

Promover investimentos no saneamento integrado básico e serviços

urbanos;

Colaborar para o gerenciamento regional de trânsito;

Implantar programas de operação e manutenção do sistema de

macrodrenagem;

Aprimorar o transporte coletivo urbano municipal e metropolitano;

Desenvolver plano regional de acessibilidade;

Aprimorar o transporte coletivo urbano municipal e metropolitano.

O Eixo de Atuação Desenvolvimento Econômico Regional passa para segundo

plano, com a atuação de cinco Grupos de Trabalho: Desenvolvimento Econômico,

Turismo, Trabalho e Renda, Automotivo e Procon Regional. As prioridades destes

Grupos seriam:

Atuar pelo fortalecimento e modernização de complexos e setores

estratégicos para a atividade econômica regional, destacando-se o ramo

da cadeia produtiva automotiva, do complexo petroquímico, cosmética,

moveleira, gráfica, construção civil, metalomecânica, turismo, comércio

e serviços;

Desenvolver políticas de incentivo às micro e pequenas empresas;

Desenvolver atividades de apoio à modernização da economia regional,

como a logística,

Tecnologia da informação, telecomunicações, design, engenharia e

gestão da qualidade;

Promover ações visando a geração de trabalho e renda.

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De fato, com uma taxa de desemprego em torno de 10,6%33, a menor desde

julho de 1998, os problemas evidenciados com as manifestações de junho e julho de

2013 que tomaram de assalto o País passaram a pautar a agenda política. Para alguns

autores (ROLNIK, MARICATO e VAINER, 2013) a questão urbana, principalmente

ligada aos problemas mobilidade urbana, deve-se particularmente a priorização dos

problemas econômicos pelo Poder Público em prol do crescimento econômico,

geração de empregos e aumentos salariais voltados a facilitar a ação do mercado,

abrindo frentes de expansão do Capital Financeirizado.

“Entretanto, não se compra o direito à cidade em concessionárias de automóveis e no Feirão da Caixa: o aumento de renda, que possibilita o crescimento do consumo, não “resolve” nem o problema da falta de urbanidade nem a precariedade dos serviços públicos de educação e saúde, muito menos a inexistência total de sistemas integrados eficientes e acessíveis de transporte ou a enorme fragmentação representada pela dualidade da nossa condição urbana (favela versus asfalto, legal versus ilegal, permanente versus provisório). A “fagulha” das manifestações de junho não surgiu do nada: foram anos de constituição de uma nova geração de movimentos urbanos – o MPL, a resistência urbana, os movimentos sem-teto, os movimentos estudantis –, que, entre “catracaços”, ocupações e manifestações foram se articulando em redes mais amplas, como os Comitês Populares da Copa e sua articulação nacional, a Ancop.” (ROLNIK, 2013, p. p. 12)

Concluindo este tópico, a experiência com Agência de Desenvolvimento

Econômico do ABC traz a luz questões e situações de crises mais variadas, para

discussão de maneira cooperativa e em nível institucional. Porém dependem de atores

sociais politicamente fortes e influentes – papeis desempenhados por Celso Daniel e

Mauricio Soares, prefeitos de Santo André e São Bernardo do Campo,

respectivamente. O acumulo de experiência da região – no caso do ABC o forte

protagonismo sindical – e a capacidade de articulação destes conscientes atores, sem

menosprezar os conflitos pertinentes a cada classe foram determinantes para o

sucesso desta iniciativa.

33 As informações da Pesquisa de Emprego e Desemprego, realizada pela Fundação Seade e pelo Dieese, em parceria com o Consórcio Intermunicipal Grande ABC, mostram que a taxa de desemprego total na Região do ABC aumentou, ao passar de 9,7%, em junho, para os atuais 10,6%. Apesar da elevação, essa taxa ainda é a menor registrada para julho desde o início da série da pesquisa, em abril de 1998. Seu principal componente, a taxa de desemprego aberto, cresceu de 8,0% para 9,1%, no período em análise. Nota à imprensa. No ABC, a taxa de desemprego aumenta. De 27 de Agosto de 2014. Sitio: http://www.seade.gov.br/no-abc-a-taxa-de-desemprego-aumenta/. Acesso em: 26 de Dezembro de 2014.

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O balanço desta experiência demonstra os avanços na elaboração pautas e

diretrizes especificas para a revitalização e o desenvolvimento econômico. Em uma

segunda etapa, a Agência tem a responsabilidade de mostrar o mesmo protagonismo

em ações e articulações de infraestrutura e mobilidade urbana, atendendo os mais

variados setores da sociedade civil, mantendo o dinamismo econômico da Região do

Grande ABC.

Neste capitulo 2, analisamos os efeitos da abertura econômica, da globalização

e da Guerra Fiscal na economia da região do grande ABC, e o desdobramento sobre

o setor industrial têxtil e automobilístico. Utilizando referencial teórico fornecidos por

Schiffer (2014), compreendemos melhor a questão da desindustrialização versus

reestruturação produtiva da região do grande ABC paulista, e as transformações da

economia da região com ênfase no setor terciário.

A seguir, iremos entender como se constitui-o segmento têxtil na região e sua

importância que mescla-se com a história dos primeiros imigrantes italianos que

desembarcaram no porto de Santos século XX carregados de sonhos e esperanças.

O processo de constituição da Tecelagem Tognato dentro da escala do tempo

desta centenária empresa e sua importância econômica e social para a construção da

identidade da região.

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CAPITULO III – “CIDADE TOGNATO”

Neste capitulo iremos abordar de forma mais detalhada o início e constituição

da indústria têxtil paulista, principalmente na região do grande ABC, com o início da

imigração no final da década de 1890, que cresceu de maneira acelerada até a década

o final da década de 1920, com o crash da bolsa de Nova Iorque. (JESUS, 2009)

No tópico referente a constituição da Tecelagem e Fiação Tognato, resgatamos

através de entrevistas concedidas pela Sra. Nair Tognato, que pacientemente nos

ajudou a relacionar os pontos do referencial teórico com a história que viveu e fez

parte.

Descrevemos em tópico especifico, o auge e a decadência desta centenária

empresa, a luz dos acontecimentos explorados e descritos no capitulo Dois. Contudo

entendemos também não somente o fim de uma indústria, mas também a mudança

de hábitos de todo um mercado consumidor que corroboraram com o enfraquecimento

desta empresa dedicada a manufatura de cobertores e mantas jaqcard e piquet.

Entender também a mudança de paisagem do bairro Baeta Neves, marcada

pelas chaminés e pela caixa d’água da empresa. Podemos traçar um paralelo entre

reestruturação econômica ocorrida associada equivocadamente a desindustrialização

da região do Grande ABC. A mesma dinâmica se aplica com a paisagem local, pois

anterior a tecelagem Tognato na mesma área esteve localizada a fazenda Baeta

Neves e sua olaria.

3.1 – Constituição da Tecelagem e Fiação Tognato

No final do século XIX os imigrantes italianos que se estabeleciam em São

Paulo, tinham como parada obrigatório a Hospedagem dos Imigrantes, no bairro do

Brás, de lá direcionavam-se para trabalhar na lavoura nos núcleos coloniais, nas

fazendas de café ou nas industrias estabelecidas na capital (LEONE & TEIXEIRA,

2010).

No começo do século a indústria têxtil estava em franca expansão na capital

paulista, as tecelagens funcionavam em regime de 24 horas, os estabelecimentos

existentes dobraram de tamanho em relação à última década do século XIX,

demandando grande quantidade de mão de obra, preferencialmente de origem

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estrangeira, não raro explicitado nos anúncios de jornais da época com a expressão

“dá-se preferência a estrangeiros” (JACINO, 2012).

Os trabalhos ligados a indústria têxtil estavam em alta, pois o tecido tinha uma

importância econômica significativa em toda a cadeia produtiva, desde a embalagens

para exportação de sacas de café e comercio em geral interno, a produção de cordas

e tecidos para o “boom” demográfico que São Paulo vivenciou nas primeiras décadas

do século XX. A demanda por tecelões inflacionou o salário percebido por esta

categoria, sendo considerada uma das mais bem pagas da época, conforme cita

Jacino (2012):

“Na discriminação das ocupações, encontramos os seguintes valores: batedor 5$533, carcador r$971, maçaroqueiro 6$006, fiandeiro 5$067, bobineiro 5$369, tecelão 8$812, urdidor 7$062, engomador 7$347, alvejador 5$778, tintureiro 5$686, acabador 5$803”. (JACINO, 2012, p. p. 153)

Diante da escassez da necessidade crescente de mão de obra,

especificamente para a indústria têxtil era permitida por lei, o emprego de menores de

12 anos para exercício de funções ligadas ao aprendizado deste segmento, conforme

decreto número 1.313 em seu artigo segundo e terceiro:

“Art. 2º Não serão admittidas ao trabalho effectivo nas fabricas crianças de um e outro sexo menores de doze annos, salvo, a titulo de aprendizado, nas fabricas de tecidos as que se acharem comprehendidas entre aquella idade e a de oito annos completos. Art. 3º Em cada estabelecimento fabril haverá um livro, aberto e rubricado pelo inspector, para a matricula dos menores, no qual se escreverão as notas e dados individuaes de cada um e a data da admissão” (Decreto nº 1.313, 1891)

Diante deste cenário chega ao Brasil em 27 de outubro de 1895, a bordo do

vapor Attivitá, originário da Província de Rovigo na região Vêneta, Valentino Tognato

com sua esposa Giulia e seus nove filhos, onde após uma breve passagem pela

lavoura de café no município de Mococa, resolve voltar para São Paulo e se emprega

no Cotonifício Rodolfo Crespi (1897), uma das maiores tecelagens em funcionamento

no Brasil, que em 1900 já contava com 1305 empregados e 500 teares.

Por volta de 1901, a família se muda para Santo André e passa a trabalhar para

a tecelagem Ipiranguinha, fruto da união das tecelagens São Bernardo Fabril com a

Silva Seabra & Cia, e a maior da região e estabelecida desde 1899 (PASSARELLI,

2005). Santo André, na época fazia parte do município de São Bernardo juntamente

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com São Caetano do Sul e Diadema, e de população predominantemente italiana34,

e com vocação industrial ou artesanal, uma vez que a qualidade do solo da região não

era atraente para os imigrantes de vocação agraria.

Os trabalhadores oriundos da Tecelagem Ipiranguinha e da Fábrica de

Casemira Kowarick, após dominarem os misteres de tecelão, acabaram por fundar

boa parte das indústrias têxteis da Região do ABC, uma vez que no início do século

XX eram somente as duas citadas, já em 1935 formavam 38 estabelecimentos

voltados a produção têxtil, conforme levantamento realizado por Jesus (2009) nos

livros de apuração de impostos da cidade de Santo André.

Neste contexto, surge a Irmãos Tognato, que seria de grande importância e

coadjuvante das mudanças urbanísticas na região ocorridas no século passado. Além

destas mudanças, a tecelagem foi importante também na construção da própria

história do ABC.

Um fato curioso atribuído ao operariado da Irmãos Tognato, predominante

feminino, foi um dos primeiros movimentos grevistas femininos a eclodir em São

Paulo, entrando em greve em agosto de 1931 reivindicando melhores condições de

trabalho e remuneração, passando a contar com a solidariedade da Força Operaria

de São Paulo, que panfletou a fábrica com um manifesto de apoio, conforme figura 1:

34 O relatório do Ministério da Agricultura ano de 1893 aponta um levantamento relativo a nacionalidade dos habitantes do distrito de São Bernardo: Italianos 459, Austríacos 83, Brasileiros 78, Alemães 21, Franceses 10, Suíços 10, Ingleses 3 e Uruguaios 1. (COSTALLAT, 1893)

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Figura 4: Manifesto de Apoio a greve na Irmãos Tognato.

Fonte: Arquivo do Estado de São Paulo (DEOPS), Prontuário de Abillio Neves (1946)

Além da importância no desenvolvimento da região, é inegável a contribuição

histórica para o movimento sindical, no que se refere a participação feminina, uma vez

que a participação das mulheres não era bem assimilada pelos movimentos sindicais,

conforme afirma Leone & Teixeira (2010):

“Outro fator se refere ao machismo, uma vez que os espaços sindicais são considerados espaços masculinos. Para Alves (1999), as mulheres não se sentem habilitadas para a disputa de espaços de poder, na hora de discursar ou propor-se para determinados cargos, sentem-se melhor na execução de tarefas. Embora se possa reconhecer que as mulheres apresentam maior dificuldade em se impor e disputar espaço pela condição a que foram submetidas historicamente, também é verdadeiro que os homens não cedem espaço espontaneamente.” (LEONE & TEIXEIRA, 2010, p. p. 14)

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Outra pratica adotada por empresas na região, a da bica d´água foi iniciada

pela empresa em 1952, quando se mudou de Santo André para São Bernardo do

Campo.

A Bica d´água é uma das recordações mais associadas a imagem da

Tecelagem Tognato pelos moradores do Baeta Neves, essa gentileza urbana

compartilhada com a população do entorno não foi uma iniciativa apenas da

Tecelagem Tognato, a Fiação Lydia I.R.F.M e a Termomecânica São Paulo35 também

ofereciam este recurso a vizinhança, em comum entre elas a origem italiana. Difícil

determinar de como e por que surgiu esse costume de instalar bicas água na entrada

principal das empresas. Quanto esta questão, Lopes (2008) atribui essa pratica

denominada “política das bicas d’água”:

““Política das bicas d’água”, virou sinônimo de clientelismo, devido profusão de ocorrências voltada ao abastecimento nas regiões. Onde não havia políticas públicas responsáveis pelas demandas da população, vereadores e deputados trocavam o precioso líquido por votos, colocando bicas d’água nas praças. Festas eram realizadas, onde havia muita exaltação e discursos emocionados”. (LOPES, 2008, p. p. 7)

Porém, estas empresas não exigiam contrapartida política em favor próprio ou

alheio para a utilização das bicas d’água, muito provavelmente por serem grandes

consumidores de recursos hídricos, e por falta de uma legislação ambiental sobre

tratamentos de resíduos industriais36, lançados livremente nos rios e córregos

próximos e utilizados pela população. A instalação de bicas d’água seria uma

compensação a esta população pelo uso e poluição deste recurso, e recebiam de bom

grado a gentileza pela praticidade das bicas em comparação ao rios e córregos de

difícil acesso, a associação frequentemente atribuída pureza e limpeza da água da

bica provavelmente remete a este contraste.

A importância histórica da tecelagem não foi determinante apenas para a

formação do bairro Baeta Neves e seu entorno, principalmente no período pré-

automobilístico, anterior a década de 1950, onde a indústria têxtil era economicamente

importante para o recém emancipado município por sua forte necessidade de mão de

obra e fonte geradora de receita (JESUS, 2009).

35 ZUCATELLI, Kelly. Água de bica é tradição no Grande ABC. DGABC, 08 de Março de 2009. 36 A primeira lei específica sobre meio ambiente surgiu apenas em 1981, com a Política Nacional de Meio Ambiente, para resíduos industriais em 05 de março 2003 com a RDC n° 33.

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3.2 – A Fundação da Tecelagem Tognato

Em 1909, os irmãos Giacinto Pietro, Romano, Attilio, Massimiliano Ângelo e

Amabile Tognato iniciaram as atividades da Irmãos Tognato com dois teares ingleses,

adquiridos com dinheiro de empréstimos do Banco de Londres, nos fundos da casa

onde moravam com a família localizada no cruzamento da Rua Alfredo Flaquer com

as Rua Fernando Prestes, no bairro Ipiranguinha, porém a licença para funcionamento

formal só foi expedida em 1910, com a emissão do alvará de funcionamento pela

Prefeitura de Santo André. (JESUS, 2009)

Sendo o terceiro estabelecimento a se fixar na região, a Irmãos Tognato a

princípio, se concentrou na fabricação de uma pequena quantidade de seda. A

iniciativa surte efeito, e em 1913 a Irmãos Tognato conta com 10 teares, dez anos

depois com 53 teares e força de trabalho de 500 pessoas, em sua maioria mulheres

e menores de idade, mão de obra habitual nesta época para operação deste tipo de

manufatura, em uma área adquirida pela família na Rua Siqueira Campos em Santo

André fabricando colhas piquet e cobertores (TOGNATO, 2014).

Por volta da década de 1930, a sociedade Irmãos Tognato contava apenas com

os irmãos Giacinto, Attilio e Romano. Os outros irmãos haviam se desligado da

sociedade para outros projetos pessoais assim como Romano Tognato, que pouco

tempo depois deixou a sociedade para se dedicar a um projeto de construção de um

cinema em Osasco, restando apenas Giacinto e Attilio Tognato.

A tecelagem havia se firmado como umas das mais importantes fabricantes de

enxovais de cama do país, e dividia cordialmente o mercado com a Oddone, Scavone

& Comp., propriedade de italianos estabelecidos em Itatiba, interior de São Paulo.

Além das linhas de colchas e cobertores, foi convencido por fabricantes de material

para higiene e hospitalar a produzir algodão esterilizado para hospitais e cotonetes,

tornando-se um produto de alta demanda pressionando as linhas de produção já

esgargaladas da Irmãos Tognato, o que levou Giacinto considerar a mudança para

um local mais amplo onde pudesse expandir o fluxo produtivo dos produtos em linha

e eventualmente desenvolver novos produtos e novidades que trazia anualmente da

Europa. (TOGNATO, 2014)

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Giacinto Tognato, juntamente com seus filhos estava presente em todas etapas

e processos da Irmãos Tognato, viajava todos os anos para a Europa a bordo de

vapores a fim de trazer as novidades e ultimas tendências do velho continente para

os teares da Irmãos Tognato. Em uma dessas viagens retornando ao Brasil, sofreu

naufrágio a bordo do “Principessa Mafalda” (figura 2), em 25 de Outubro de 1927,

sendo resgatado e levado ao litoral baiano, um choque para todos ainda abalados

com o naufrágio do Titanic 15 anos antes, e que Giacinto Tognato37 recordaria por

toda vida. (TOGNATO, 2014)

Figura 5: Operação de abandono do navio Principessa Mafalda em 25 de outubro de 1927.

Fonte: pt.wikipedia.org/wiki/Principessa_Mafalda.

Com o crescimento da Irmãos Tognato foi necessária mudar para instalações

maiores, onde pudessem não somente desapertar e liberar mais o fluxo produtivo,

mas alçar novo ganho de escala com a ampliação produtiva e aquisição ou fabricação

própria de novos teares (TOGNATO, 2014).

O arranjo produtivo utilizado no início do século XX era extremamente

verticalizado ou All-core, onde todas as etapas do processo desde produção a

distribuição de mercadorias são assumidas pela empresa (STORPER & HARRISON,

1991), não diferente na Irmãos Tognato, que fabricava desde os próprios teares e

montagem das caixas de papelão dos cobertores para embalagem, necessitando de

uma grande área para a operação de manufatura.

Por conta deste tipo de arranjo-produtivo, e pressionado por mais espaço para

a produção, em 1940 a Irmãos Tognato compra do inglês Charles Murray, um

prospero exportador de café e autor do plano de aquisição e destruição das safras de

37 Giacinto Tognato consta na lista de sobreviventes da segunda classe do Principessa Mafalda, disponível no site sites.google.com/site/mafaldasinking/survivors-victims/second-class.

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café adotado pelo governo federal durante a crise de 1929 (SIMONSEN, 1973), uma

grande área de 220 mil m², conforme figura 3, no Bairro Baeta Neves em São Bernardo

do Campo38.

Façamos um recuo no tempo para determinar a propriedade desta área,

originalmente era parte da fazenda39 de 83 alqueires demarcada em 1862 de

propriedade de Antonio Serafim Bueno, após sua morte em 1903, parte desta fazenda

foi vendida para o Dr. Luís Filipe Baeta Neves, médico e cafeicultor da região de

Limeira, pretendia lotear e vender a área em conjunto com os irmãos Pujol, mas por

ocasião da crise do café, negociou a área com Wallace Simonsen e o inglês Charles

Murray40, exceto a área compreendida entre a avenida Pereira Barreto e avenida e

rua Dr. Amâncio de Carvalho, que continuou sua propriedade, loteada por seu ex-

capataz João Versolato. Este é um ponto importante da pesquisa, pois em algumas

pesquisas a instalação da Irmãos Tognato em São Bernardo do Campo é atribuída a

doação da área pela prefeitura do município. Esta política realmente existiu, na

década de 1950 na gestão do prefeito Lauro Gomes no seu primeiro mandato de 1952

a 1955, posterior a instalação completa da Irmãos Tognato para São Bernardo do

Campo em 1952 (JESUS, 2009).

Na primeira metade do século passado o uso de algodão era predominante ao

uso de fibras sintéticas, para cada quilo de tecido tingido e acabado consumia-se 100

litros de água nas etapas produtivas41, a exigência de água foi fator determinante para

escolha do local, onde ocorre o encontro do Ribeirão dos Meninos de São Bernardo

do Campo com o Córrego Taioca de Santo André e com várias exsurgência,

permitindo a abertura de vários poços artesianos em toda área adquirida. Esta

abundância de recursos hídricos na área da Tecelagem ficou popularmente conhecida

no bairro Baeta Neves, onde vários moradores abasteciam-se de água nas várias

bicas instaladas na portaria da empresa para este fim, e que durou até a mudança da

Tecelagem em 2001.

38 200 mil m² – inicialmente o local tinha 222 mil m² mas uma parte foi vendida na década de 1990. OLIVEIRA, Mariana. Perto dos 100 anos, Tognato paralisa produção e venda. Diário do Grande ABC, 13 de jun. 2005. 39 Sitio dos Viana abrangia a Vila Baeta Neves, Bairro Jardim do Mar e parte da Bairro Chácara Inglesa em São Bernardo do Campo - Seção de Pesquisa e Documentação - Prefeitura do Município de São Bernardo do Campo. 40 Documentação sobre a Villa Baeta Neves, na Memória e Patrimônio Histórico e Cultural da Prefeitura de São Bernardo do Campo. 41 Segunda a ABIT, eram 100 litros de água usados para produzir 1 kg de tecido beneficiado, antes do ano 2000.

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A área também ficava pouco mais de 5 quilômetros da Irmãos Tognato original,

e muito próximo a área que a família Tognato mudara-se, um onipotente casarão

localizado na avenida Dom Pedro II, conhecido como “Mansão Tognato”42, projeto e

construído pelo engenheiro Luiz Giacometti na década de 1930.

A mudança da Irmãos Tognato iniciada na década de 1940 foi concluída em

1952, acelerada por uma explosão de uma caldeira em 1950 nas instalações da rua

Alfredo Flaquer, ocupando 75 mil m² dos 220 mil m² do total da área terreno, passando

a partir deste evento a denominar-se Tecelagem e Fiação Tognato (TOGNATO,

2014).

As novas instalações eram dedicadas a produção de colchas, cobertores e

enxovais de camas. Composta de galpões para lavanderia, tinturaria, costura, fiação,

tecelagem, mecânica - para conserto e confecção de teares – vestiários, refeitório,

enfermaria, administração, expedição e um bem cuidado campo de futebol para os

empregados e usado por times da primeira divisão do futebol paulista como Palmeiras,

Santos e Corinthians para treinamento. (JESUS, 2009).

Figura 6: Instalações da Tecelagem Tognato em 1962.

Fonte : http://www.abcdpedia.com.br (2015)

Neste período, Yolando Tognato, filho mais velho de Giacinto Tognato é

elevado a condição de Diretor-Presidente da Tecelagem e Fiação Tognato. Yolando

Tognato já estava sendo preparado desde 15 anos, enviado para a Europa para

42 Data de Tombamento: 17/04/2007. Considerado exemplar da arquitetura da elite industrial na cidade, possuindo familiaridade com os grandes palacetes da cidade de São Paulo.

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estudar tecelagem e fiação, permanecendo por 3 anos na Itália e 2 anos na Alemanha

no período posterior ao início da segunda guerra mundial, permaneceu nesta posição

até pouco antes de sua morte em 1995, considerado o membro da família que

permaneceu mais tempo a frente da Tecelagem. (TOGNATO, 2014)

3.3 – Auge e Decadência

De acordo com o IBGE, em sua publicação Enciclopédia dos Munícipios de

1958, as principais indústrias de São Bernardo do Campo eram: Varam Motores S.A.;

Mercedez Benz do Brasil S.A.; Tecelagem e Fiação Tognato S.A.; Cia Comercial e

Industrial Brasmotor; Nubrisa S.A.; Fontoura; Fontoura Wyeth S.A.; S.A. Elni de

produtos Manufaturados; Fiação Lydia I.R.F.M. S.A.; Indústria Elétrica e Musical

Odeon S.A.

Pouco tempo depois de estabelecida em São Bernardo do Campo, a

Tecelagem Tognato figurava juntamente com Tecelagem Elni (1947) e a Fiação Lydia,

das Indústrias Reunidas Francisco Matarazzo (1946) – a segunda fonte geradora de

renda do município (tabela 4), atrás apenas da Varam Motores.

Tabela 4: Atividade Industrial em São Bernardo do Campo em 1958 Segmento Unidade Quantidade CR$/Milhões %

Fabricação e Montagem de Veículos Unitário 3.000 627,00 29%

Industria Têxtil M 7.300.000 590,00 28%

Industria moveleira Cj. 65.500 446,00 21%

Fabricação de Refrigeradores Unitário 19.500 332,00 16%

Fabricação de Discos fonográficos Unitário 3.500 135,00 6%

2.130,00 100%Total

Fonte: IBGE

Já na a década de1970, município de São Bernardo do Campo abrigava uma

população de 201.662 habitantes43, com 66.90044 empregados formais, a Tecelagem

Tognato tinha cerca de 1.70045 empregados representando quase 2,5% da população

formalmente empregada no município.

43 De acordo com dados obtidos no Sumário de Dados de 2010 de São Bernardo do Campo 44 Informações IBGE (www.ibge.gov.br) PEA – População Economicamente Ativa. Acessado em 06/06/2014. 45 Entrevista José Santos, que trabalhou 35 anos na Tecelagem Tognato no controle de produção, em 16/07/2014

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A tecelagem atingira seu auge nesta década, aproveitando-se do apogeu

econômico vivido pelas indústrias têxtis nas décadas de 1950, 1960 e 1970 (NEIRA,

2012).

Durante este período a tecelagem direcionou-se majoritariamente para

produção de cobertores, colchas e lençóis, contudo, a colcha piquet jacquard foi o

produto mais conhecido da Tecelagem Tognato que por mais de 60 anos forneceu

quase que exclusivamente para hotéis de primeira linha, como por exemplo o

Copacabana Palace. Este item também era extremamente demandado pelas noivas

das décadas de 1950, 1960 e 1970 onde a presença de pelos menos três colchas no

enxoval de casamento era praticamente obrigatória. A produção de colchas piquet

ocupava pouco mais de 20% da capacidade produtiva, mas chegou a representar

quase 50% do faturamento da tecelagem por ser um produto de maior valor agregado.

(TOGNATO, 2014)

Porém, a demanda interna por cobertores fez com que a tecelagem concentra-

se cada vez mais neste item, dedicando 80% de seu efetivo produtivo e áreas

auxiliares para a confecção de cobertores. Em 1976 atinge seu auge com 1.700

empregados e uma produção anual de 12,3 milhões de cobertores por ano. Seu maior

concorrente nesta década era a Tecelagem e Fiação Parahyba, que também produzia

cobertores, mas seu parque três vezes menor, tinha apenas 60 mil m² e 1.200

empregados em seu auge na década de 1940, mas apesar de menor se tornou mais

famosa pela emblemática campanha de marketing que veiculou na década de 1960 e

1970 nas rádios e TV, uma canção simples que acabou se tornando referência em

todo o Brasil, colocada estrategicamente no horário das 21 horas foi um sucesso

absoluto por quase 20 anos, relembrado na figura 4.

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Figura 7 : Campanha Publicitária da Cobertores Parahyba.

Fonte: youtube.com – Comercial Cobertores Parahyba

Yolando Tognato, diretor-presidente da tecelagem, era refratário a qualquer

tipo de propaganda dos produtos da tecelagem. Este ponto de vista foi herdado de

Giacinto Tognato, que em 1936 havia recusado a patrocinar uma cota da publicação

Álbum de São Bernardo do Campo, da Organização Cruzeiro do Sul de autoria de

João Netto Caldeira. Mesmo sendo uma das maiores empresas da região a esta

época não figurou na publicação. Neste sentido dona Nair Tognato, afirma em

entrevista:

“O pessoal reclamava que os Tognato não faziam propaganda dos cobertores, mas não precisava, vendia muito, um rapaz da fábrica dizia dona Nair, se fizer propaganda, pode encostar todos nós na caixa (previdência social), porque não vamos dar conta de produzir” (TOGNATO, 2014)

Durante a década de 1970 houve algumas ofertas do governo do Ceará para

estabelecer-se ou abrir unidade fabril no polo têxtil de Fortaleza, mas desconsiderou

a proposta por acreditarem que poderia expandir dentro da própria área estabelecida

no Baeta Neves. Outro fator que desmotivou a instalação de novas unidades fabris

fora do estado, foi a quantidade de propriedades, principalmente terrenos adquiridos

desde 1930 por Giacinto e Yolando Tognato (TOGNATO, 2014). A princípio estas

áreas eram adquiridas para alojar a família, conforme filhos e netos constituíam

unidade familiar eram alojados próximo a Mansão Tognato na avenida Dom Pedro II

em Santo André, mais tarde nas décadas de 1990, 2000 e 2010 essas áreas se

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tornariam parte dos condomínios de alto padrão construídos ao longo desta avenida

em Santo André46.

A localização da Tecelagem Tognato também contribuiu para seu auge na

década de 1970, a região de São Bernardo do Campo sem precedentes na região

metropolitana de São Paulo, a população mais que dobrava de tamanho durante as

décadas de 1960 até 1980 (Tabela 5) motivada pela expansão industrial

automobilística no município durante este período, isso também ajudou a expandir as

vendas da tecelagem, que além de abastecer as lojas locais, mantinha uma loja de

fábrica para venda de seus artigos altamente demandada por uma população recém

estabelecida e não habituadas as baixas temperaturas do inverno nesta região47.

A tecelagem antes situada isoladamente em uma região regata e espraiada,

assistiu o povoamento de seu entorno por uma massa de migrantes de origem rural a

procura de inserção nas modernas relações do capital-trabalho no ABC paulista, que

desfrutava de um cenário privilegiado dentro do país por sua abundância de recursos

naturais, amplitude migratória, formação de um mercado de trabalho livre e volumosa

entrada do capital industrial.

Contudo, a supremacia econômica da indústria têxtil em São Bernardo do

Campo já havia sido substituída desde final da década de 1950, com o

estabelecimento das indústrias automobilísticas na região. No final da década de 1970

a tecelagem não acompanhou a transição do modelo de administração tradicional

para um modelo de administração empresarial, onde as decisões dos negócios são

determinadas de acordo com o cenário econômico e perspectiva de crescimento do

negócio, e ainda operava no mesmo modelo organizacional totalmente verticalizado

desde seu estabelecimento na década de 1950.

46 TRIELLI, Daniel. Chácara da década de 1940 vai dar espaço a prédios residenciais. DGABC, 07 de Setembro de 2008. 47 As temperaturas médias de inverno durante as décadas de 1960 e 1970 variavam a máximas de 20°C e mínimas de 9°C, sem os efeitos do fenômeno atual das ilhas de calor urbana. FONTE: Seção de Estatística e Banco de Dados - SP – PMSBC.

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Tabela 5: Crescimento demográfico de São Bernardo do Campo e São Paulo.

Fonte: IBGE (organizado pelo autor)

A década de 1980 seria o início do período mais turbulento vivido pela

tecelagem, o número de empregados durante o início da década de 1980 diminui para

cerca de 1.250, decorrentes de ajustes produtivos e em função da profunda crise

cambial da economia e aceleração inflacionária ocorrida no Brasil, o que levou vários

autores a chamarem a década de 1980 de “A Década Perdida”48 (KURZ, 1994),

apesar da política de estímulo às exportações e restrições às importações de produtos

têxteis em vigor no período.

Boa parte do maquinário a serviço da tecelagem eram réplicas de teares em

grande parte já tinham uma defasagem tecnológica (JESUS, 2009), a tecelagem ainda

operava os diferentes processos de fabricação com pouco ou nenhuma inter-relação

entre estas etapas de transformação. O produto final de uma etapa produtiva era a

matéria-prima da etapa seguinte, esta característica até facilitaria tentativas de

modernização, pois a inclusão de equipamentos últimos modelos em qualquer etapa

do processo onde o resto é obsoleto, é tecnicamente viável devido esta característica

de descontinuidade deste arranjo produtivo (VERSIANI, 1982), mas a abundância

relativa de mão de obra barata e barreiras de proteção do mercado têxtil eram grandes

fatores de restrição a modernização.

Nesta mesma década nos países asiáticos, inicia-se a substituição dos teares

obsoletos por teares mais modernos e eficientes. Durante o período de 1984 a 1993

48 A “década perdida”, referência aos anos 80, caracterizou-se pelo baixo crescimento, desemprego, explosão da dívida externa provocada pelo aumento extraordinário da taxa de juro americana e inflação fora de controle.

População Percentual População Percentual

1940 17.063 - - 579.033 -

1950 29.295 71,69% 1940 - 1950 2.198.096 279,61%

1960 82.411 181,31% 1950 - 1960 3.781.446 72,03%

1970 201.662 144,70% 1960 - 1970 5.924.615 56,68%

1980 425.602 111,05% 1970 - 1980 8.493.226 43,35%

1991 566.893 33,20% 1980 - 1990 9.646.185 13,58%

2000 703.177 24,04% 1990 - 2000 10.434.252 8,17%

2008 801.580 13,99% 2000 - 2008 11.244.369 7,76%

Acumulado 579,98% 481,19%

São Bernado do Campo São PauloPeriodoAno

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estes países foram responsáveis pela compra de 55% destes equipamentos no

mundo, enquanto a América do Sul representava apenas 3%. Os teares jato de ar ou

água, mais modernos e produtivos com pouca ou quase nenhuma utilização de mão

obra atingiam velocidades entre 800 e 1000 batidas por minuto (bpm),

respectivamente, enquanto os teares de lançadeira mais obsoletos atingiam apenas

200 batidas por minuto (OLIVEIRA & MEDEIROS, 1996).

Na tecelagem Tognato todos os teares eram de lançadeiras, e combalida pela

política econômica da década de 1980 adentra a década 1990 com pouco menos de

1000 empregados e um parque industrial obsoleto.

Os efeitos da abertura e integração comercial brasileira ao mercado

internacional, promovida na Década de 1990, só viriam a agravar a situação de toda

a indústria têxtil brasileira com a eliminação das barreiras tarifárias, principalmente de

empresas como a Tecelagem Tognato de forte atuação no mercado interno, conforme

afirma o relatório anual da CNI/ABIT:

“A abertura da economia brasileira na década de 1990 e o acirramento da competição mundial, com a consolidação de diversos produtores de baixo custo – basicamente os asiáticos, ..., promoveram radical transformação do setor, .... As empresas mais atingidas foram as firmas de menor porte, com atuação exclusiva no mercado interno e baixo nível tecnológico. Dentro da cadeia têxtil, os setores mais atingidos pela concorrência externa foram o produtor de fibras de algodão, o de fios e tecidos sintéticos e o de confecções.” (CNI/ABIT, 2000, p. p. 7)

Segundo Massuda (2007), a participação do Brasil no comercio internacional

de produtos têxtil é historicamente inferior a 1%, a maior parte da produção têxtil

brasileira era voltado para o mercado interno em nichos regionais de mercado. A

tecelagem Tognato não era exceção a essa regra, desde a década de 1980 a empresa

concentrava-se cada vez mais na produção de cobertores, representando quase que

a totalidade de seu faturamento no início da década de 1990 (TOGNATO, 2014), uma

vez que entre 1992 e 1994 a importação de tecidos cresceu 20 vezes neste período

(MASSUDA, 2007), inviabilizando a produção de tecidos a custos competitivos frente

aos similares importados.

A decisão de centralizar os recursos na produção de cobertores fragilizou a

tecelagem na primeira metade da década de 1990 com a chegada dos cobertores

importados do México com preços muito inferior aos nacionais (PARRA, 2002), o

governo federal havia iniciado uma política de abertura comercial brasileira ao

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mercado internacional entre 1992 e 1999 com o intuito de forçar a queda dos preços

dos similares nacionais (MASSUDA, 2007), contudo o efeito foi devastador não

apenas para a Tecelagem Tognato, mas também para seus concorrentes nacionais

como a Cobertores Parahyba e S/A Fabril Scavone. Conforme Parra (2002), o efeito

das importações só foi mitigado a partir de 1995, quando o governo aumentou a

alíquota de importação sobre cobertores de 20% para 70%.

Apesar da iniciativa do governo de aumentar a alíquota guarnecer defesas

contra a importação de cobertores, o edredom, outra novidade disseminada por esta

mesma abertura iria prejudicar os resultados da tecelagem na segunda metade da

década de 1990.

O edredom começou a ser mais largamente usado a partir de 1995, além de

ser mais leve que o cobertor e ter características antialérgicas, podia ser estendido

diretamente na cama apresentando um visual mais leve por serem estampados, ou

não, em uma das faces, ao contrário do tradicional uso do cobertor combinado com a

colcha. Essa praticidade foi valorizada nas últimas duas décadas, principalmente

pelas mulheres inseridas cada vez mais no mercado de trabalho e com menos tempo

para as tarefas domésticas49.

Em 1995 falece Yolando Tognato dois anos após deixar a presidência da

Tecelagem Tognato em 1993, membro da família que ficou mais tempo a frente da

empresa50. Depois de um período de 43 anos com um único diretor-presidente, depois

de 1993 teve a frente quatro diretores-presidentes, por ordem Oliver Tognato, Névio

Tognato, Joaquim Piveta e João Batista Carvalho da Silva mais tarde, sob a

denominação de T4 Tognato, até a data atual.

Depois de duas décadas de sucessivas crises econômicas concomitante ao

abandono das políticas de proteção ao mercado da indústria têxtil e mudanças nos

hábitos de consumo em seu nicho de mercado, fez com que a Tecelagem Tognato

reduzisse o número de empregados na década de 1990, até chegar em 1999 com 350

empregados51, uma dívida acumulada de quase R$40 milhões52 com todas as esferas

49 Pesquisa realizada pela Fundação Perseu Abramos, em outubro de 2001, com 2.502 mulheres de 15 anos ou mais, em 187 municípios de 24 Estados brasileiros, mostra que 96% das mulheres inseridas no mercado de trabalho eram as principais responsáveis pela orientação e/ou execução dos afazeres domésticos. 50 Yolando Tognato foi diretor-presidente da Tecelagem Tognato durante o período de 1950 a 1993. 51 COTRIM, Fabiana. Tognato tem 40% da fábrica transferida. Diário do Grande ABC, 01 dez. 2000. 52 OLIVEIRA, Mariana. Perto dos 100 anos, Tognato paralisa produção e venda. Diário do Grande ABC, 13 de jun. de 2005.

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governamentais – municipal, estadual e federal – e R$ 2 milhões53 em dívidas

trabalhistas. Somente com o erário municipal a dívida era superior a R$30 milhões54

referente ao recolhimento do IPTU.

Foi nesta época que a decisão deixar as instalações do Baeta Neves foi

tomada, os acionistas recebiam constantemente consultas e propostas de empresas

do ramo de incorporações imobiliárias a respeito da área onde a fábrica estava

instalada. A grande área de 220 mil m², anteriormente era uma vantagem competitiva

tornou-se um ônus diante da valorização territorial da região em que estava inserida,

o bairro Baeta Neves antes conhecido como “risca-faca” converteu-se em uma área

nobre e valorizada da cidade por sua localização e infraestrutura.

Os acionistas da tecelagem foram procurados na época pelo arquiteto e ex-

prefeito de Mauá, José Carlos Grecco para apresentar o projeto nos moldes da

“Cidade Pirelli”, que estava em desenvolvimento em Santo André com entusiasmo

pela prefeitura de Santo André desde setembro de 1998 (NOBRE, 2013), a situação

e a área da tecelagem se enquadravam dentro do mesmo contexto da de

desenvolvimento e concepção desta operação urbana inspirada no projeto La Bicocca

em Milão.

Diante da subocupação das instalações industriais e perto de completar 100

anos de existência, a empresa decide mudar-se do terreno 200 mil m² para outro de

aproximadamente 15 mil m², alugando o galpão da antiga fábrica de bicicleta e

máquinas de costuras Mercantil Suíça, de propriedade da Walcar Industrial, localizado

no km 22 da marginal direita da Via Anchieta, levando 90 do seus 100 teares deixando

10 mais obsoletos nas instalações da empresa no Baeta Neves, curiosamente,

destaca Jesus (2009) que esses teares obsoletos (figura 2), seriam utilizados em 2002

no filme de Carlos Reichenbach “Meninas do ABC” produzidos nas Cia Vera Cruz, em

uma tentativa de retomada das produções cinematográficas da região (MACÊDO,

2005).

53 IDEM 54 IDEM

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Figura 8: Tear obsoleto utilizado no filme “Meninas do ABC”.

Fonte: Autor (2015)

A mudança das instalações ao custo de U$3 milhões55 objetivava a

modernização do parque fabril para um espaço mais enxuto, minimizando os custos

operacionais de produção e principalmente liberar a área da antiga instalação da

tecelagem para demolição e disponibilizar a área para empreendimentos imobiliários,

conforme palavras do presidente da tecelagem na época, Névio Tognato:

“A mudança foi definida também porque estamos em uma área nobre, no Centro da cidade, que cresceu ao redor da indústria. Com a transferência, será possível revitalizar toda essa região” (COTRIM, 2000, p. p. 1)

O projeto denominado “Cidade Tognato” não deslanchou da maneira como

havia sido concebido, a condução do projeto, a cargo de José Carlos Grecco e do

escritório de advocacia de Alfredo Rigamonti não conseguiu atrair um interesse maior

da prefeitura de São Bernardo e, principalmente, de empreendedores para o projeto

nos moldes apresentados. A iniciativa é abandonada pelos acionistas em 2004, pois

além dos custos envolvidos no desenvolvimento do projeto, a tecelagem contabilizava

uma dívida de quase US$40 milhões em impostos, dívidas trabalhistas e R$1 milhão56

referente a alugueis atrasados das novas instalações na Via Anchieta, além de três

pedidos de pedidos de falência contra si em andamento da justiça. (TOGNATO, 2014).

55 OLIVEIRA, Mariana. Perto dos 100 anos, Tognato paralisa produção e venda. Diário do Grande ABC, 13 de jun. de 2005

56 IDEM

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A empresa toma uma decisão inédita em sua história, e em 2005 com

dificuldades financeiras paralisa suas operações colocando pela primeira vez seus 90

empregados em regime de férias coletivas durante 51 dias, na esperança que os

diretores e seus 27 acionistas decidissem pelo fechamento definitivo da empresa ou

por um plano de restruturação das dívidas. Em agosto de 2005, reabre suas

operações, porém centrada principalmente na produção de colchas piquet e jacard.

Fragilizada pelas políticas de abertura de mercado iniciada na década de 1980,

um parque fabril obsoleto e pela introdução de novos hábitos de consumo como o

edredom e cobertores de microfibra, a empresa foi a falência em 2006.

Neste mesmo ano de 2006 os acionistas aceitam a proposta de compra de

duas incorporados - Cyrela & Agra e Setin – para a área da antiga tecelagem, que

iremos desenvolver com maior profundidade no próximo capitulo.

A marca “Tognato” ainda sobrevive, agora incorporada pela empresa T4

Indústria de Comércio Importação e Exportação Ltda, no mesmo endereço da Via

Anchieta produzindo em pequena escala colchas piquet, uma parte customizadas

para hotéis, como o Copacabana Palace. O maquinário para produção de cobertores

foi deixado de lado, e a empresa iniciou a importação de cobertores de microfibra da

China, apenas agregando sua marca, aproveitando-se da inserção de mercado

conseguida nos últimos 100 anos.

Já as marcas da tecelagem Tognato aos poucos vão deixando de existir em

São Bernardo do Campo apagadas pelos empreendimentos imobiliários na área da

antiga tecelagem, além da caixa d´água da empresa (figura 6) tombada pelo

patrimônio histórico de São Bernardo do Campo, resiste desfigurada entre os prédios

construídos ao seu redor e destituída de valor pelos atuais habitantes desta região,

existe ainda no bairro a rua Giacinto Tognato, nome do patriarca e fundador da

empresa em 1909. Nas missas dominicais na igreja da paroquia de São José, no

bairro Baeta Neves, ainda é possível encontrar trabalhadores aposentados da

tecelagem, testemunhas da história da tecelagem e das mudanças ocorridas em seu

entorno.

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Figura 9: Antiga torre d’água da Tecelagem Tognato, desfigurada entre os prédios.

Fonte: Autor (2015)

Não poderíamos de deixar de nos indagar se este seria o destino de outras

industrias obsoletas estabelecidas na região de São Bernardo do Campo desde a

década de 1950, pressionadas pelos ditames da alta competitividade baseados no

baixo custo produtivo, conforme abordamos no capitulo 2, e se as ações articuladas

pelos atores envolvidos se manterão eficazes ao longo do tempo, frente aos diversos

desafios como a valorização imobiliária e reestruturação econômica da região. O

estudo e o registro destas mudanças são importantes para que pesquisadores de

várias áreas de estudos possam avaliar não somente os impactos urbanísticos, mas

também outros aspectos e impactos sobre a população da região de tudo aquilo que

advém com estas transformações.

Neste Capitulo entendemos como a Tecelagem Tognato constitui-se ao longo

de quase um século, e de como sua evolução afetou todo o entorno do Baeta Neves,

conferindo-lhe algumas características que até hoje compõe a identidade da

população local.

Tivemos a oportunidade de conhecer as características que fizeram da região

do ABC, notadamente, São Bernardo do Campo uma das regiões mais importantes

do segmento têxtil e como estas características ajudaram a constituir uma região com

vocação industrial que a catapultaram para o desenvolvimento industrial

automobilísticos na segunda metade da década de 1950.

No próximo capitulo iremos entender, como o “vazio urbano” deixado pela

Tecelagem Tognato foi preterido para o Grande Projeto Urbano de requalificação

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urbana conhecido como “Cidade Tognato”, e como esta iniciativa metamorfoseou-se

no projeto de iniciativa privada conhecido como DOMO.

Entender como as iniciativas do Poder Público articulou-se, por intermédio da

operação urbana denominada “São Bernardo Moderna” para viabilizar o projeto da

iniciativa privada e o desdobramento destas ações na constituição de mais um enclave

enclausurado na área da antiga Tecelagem Tognato.

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CAPITULO IV – PROJETO “CIDADE TOGNATO”

Pode-se concluir que esta dissertação foi gestada nesta capitulo, e que os

capítulos anteriores gravitam entorno deste tópico.

Entender as grandes intervenções Urbanas e sua relação com a cidade

contemporânea, os impactos no tecido urbano e projetos de desenvolvimento local,

foram cuidadosamente escolhidos como base argumentativa para entender como e

porque surgiu uma iniciativa deste porte pra a área da antiga Tecelagem e Fiação

Tognato.

Descrever os impactos da globalização, da guerra fiscal, do custo ABC é

entender porque a Tecelagem combaliu, mesmo chegando deficitária no início da

década de 1990. Mas importante para entender porque uma iniciativa privada quase

centenária cerrou-se diante das várias mudanças econômicas, de costumes e de

maneira resumida como afirmam os mais idosos: “do tempo”. Seria diferente em outro

país, outro segmento? Talvez não, arriscamos a traçar um paralelo com a renovação

celular de nosso corpo, gradativamente eliminadas e substituídas por outras, mas em

determinado tempo entra em colapso e cerra-se.

Dissertar sobre a “Cidade Tognato”, sem conhecer a história da Tecelagem

Tognato descrita no Capitulo Três, teria a mesma lógica que escrever um

detalhamento funcional de um determinado objeto, sem nunca tê-lo visto.

Neste capítulo apresenta-se o tema e procura-se justificar a sua pertinência.

4.1 – Projeto “Cidade Tognato”

Articulados por Mauricio Sores, prefeito de São Bernardo do Campo (1997 –

2003) e Celso Daniel, prefeito de Santo André (1997 – 2002), duas maiores cidades

da região, nasce em 1988 a Agência de Desenvolvimento do ABC inspirada na

Agência de Desenvolvimento de Sesto San Giovanni, com a missão de unir as forças

de instituições públicas e privadas para promover o fomento e desenvolvimento

econômico sustentável da região do Grande ABC. (DANIEL & SOMEKH, 1014)

Em uma das missões patrocinadas pela Agência que esteve em Sesto San

Giovanni, na Itália, no início de maio de 1999, inspirando iniciativas como a “Cidade

Pirelli” e “Cidade Tognato”57, esse modelo de projeto começava a fazer sentido na

57 CARDOSO, Adriana. Cidade Tognato depende de parceiros. Diário do Grande ABC, 31 de maio de 1999.

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região do Grande ABC que enfrentava problemas da desindustrialização. Os efeitos

dessas transformações se fez sentir através de vários indicadores econômicos

regionais, Pamplona (2001) descreveu a situação de maneira bem objetiva:

“Estimativas realizadas com base na PED (Seade/Dieese) revelaram que, ao longo dos anos 90, a indústria do Grande ABC eliminou cerca de 120 mil postos de trabalho. Isso fez com que a participação do setor industrial no total da ocupação da região caísse de aproximadamente 45% (no biênio 1988-1989) para algo em torno de 26% (em 1999). Essa redução brutal da ocupação industrial na região produziu aumento do desemprego e queda da qualidade do emprego. Em agosto de 1999, o desemprego no ABC atingiu o nível de 23,1%.” (PAMPLONA, 2001, p. p. 3)

A localização da área da tecelagem somado ao quadro econômico-financeira

da empresa se encaixavam nos moldes para a aplicação das práticas do projeto

urbano Milão Pirelli La Bicocca (SOMEKH & EIGENHEER, 2012), necessitando de

articulação do poder público, um projeto arquitetônico que valorizasse a infraestrutura

já instalada para atrair o capital da iniciativa privada, constituindo assim uma nova

centralidade e reconversão desta área industrial ociosa em um polo gerador de renda,

dentro da mesma concepção do projeto Eixo Tamanduateí.

Contratado pela Tecelagem Tognato, para desenvolver o projeto o arquiteto e

ex-prefeito de Mauá, José Carlos Grecco apresentou um esboço do projeto para a

prefeitura de São Bernardo do Campo na gestão do prefeito Mauricio Soares durante

o mandato de 1997 – 2003. A prefeitura aprovou o projeto, conforme reportagem

publicada nos jornais da região:

“Representantes da sociedade civil e políticos encaram como positivo o projeto do prefeito de São Bernardo, Maurício Soares, de construir um centro de negócios, serviços e lazer no terreno da fábrica Tognato, na avenida Pereira Barreto, Centro. O empreendimento, pensado nos mesmos moldes da Cidade Pirelli, de Santo André, já está sendo chamado de Cidade Tognato.” (DGABC, 1999, p. p. A4)

O projeto adotado pela prefeitura, deveria ser executado em parceria com a

iniciativa privada, deveria seguir as diretrizes no projeto “Cidade Pirelli”, desenvolvido

no município de Santo André, pelo arquiteto Edo Rocha, conforme descreve Nobre

(2013):

“Edo Rocha desenvolveu o Master Plan considerando um programa bastante complexo e ousado para a Vila Homero Thon, um típico bairro residencial que cresceu no entorno da fábrica. O Master Plan foi revisado algumas vezes, mas sempre mantendo o mesmo programa que buscava atrair empresas de pequeno, médio e brande porte para o local. Esses edifícios corporativos seriam servidos com muitos

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equipamentos comerciais e de serviços, como lojas, restaurantes, cinemas, hotéis com centro de convenções, salas de reunião e auditório, além de um edifício garagem e um espaço multiuso para trazer grandes espetáculos e shows à região.” (NOBRE, 2013, p. p. 121)

O projeto de requalificação urbana “Cidade Tognato” previa a instalação de um

centro de negócios, serviços e lazer no terreno de 220 mil m² da antiga Tecelagem

Tognato em uma parceria público-privada. O projeto original era a construção de 3.500

apartamentos residenciais de 3 e 4 dormitórios, 400 unidades flats, um hotel de 4 ou

5 estrelas com oferta de 400 quartos, um novo Shopping Center com 150 lojas58

próximo a uma área de lazer com 10 mil m² para recreação e galerias para exposição

de obras de artes e amostras itinerantes.

O projeto ambicionava atrair a atenção da iniciativa privada para as

oportunidades desta nova centralidade, em uma área considerada nobre pelos

empreendedores, localizada na divisa de São Bernardo do Campo com Santo André,

o projeto “Cidade Tognato” posicionado a pouco mais de 600 metros da prefeitura,

incrustado entre os Bairros Baeta Neves e Jardim do Mar aproveitando toda uma

infraestrutura existente desde a década de 1960 com a construção do novo paço

municipal.

Foram criadas duas empresas pelos acionistas da Tecelagem Tognato,

denominada Cidade Tognato S/A Empreendimentos Imobiliários e a Pereira Barreto

Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda para administração do projeto junto a

Prefeitura e aos empreendedores interessados no projeto,

Assim, com a mudança da tecelagem em 2001 a área estava preparada para

sofrer duas intervenções programadas pela Prefeitura e incluída no “Programa São

Bernardo Moderna”, qualificada dentro do programa como obra de Integração Urbana,

obras previstas para serem realizadas com recursos próprios do município, as

intervenções previstas que estavam inseridas dentro da área da tecelagem foram o

prolongamento da avenida Lauro Gomes até a Avenida Pereira Barreto, interligação

com a Praça Samuel Sabatini e prolongamento da Rua Kara até a Rua Atibaia59, além

do alargamento da avenida Pereira Barreto, porém esta já existente e fora dos limites

da área da tecelagem.

58 O projeto do Shopping era um opcional, pois o projeto trabalhava a possibilidade de uma renovação do Shopping Metrópole, o que realmente ocorreu em 2011, com ampliação de 150 para 192 lojas. 59 Esta via foi rebatizada com o nome Rua Doutor Marcel Preotesco em 02 de Maio de 2012.

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Em uma reportagem no site da prefeitura de São Bernardo do Campo sobre o

leilão da área da tecelagem Tognato entregue para quitação dos débitos municipais,

as intervenções do Programa São Bernardo Moderna são destacadas:

“A boa localização do terreno somada às intervenções que estão sendo feitas no município pelo Programa São Bernardo Moderna são consideradas importantes para o investimento nos lotes, já que o espaço fica próximo ao Paço Municipal e às obras que serão feitas no entorno.” (SIVIERO, 1997)

No entanto, o projeto “Cidade Tognato” orçado inicialmente em R$800

milhões60, enfrentou os primeiros obstáculos quando as construtoras interessadas no

projeto desistiram da iniciativa pouco tempo depois da mudança da tecelagem para o

galpão alugado na Via Anchieta, um dos motivos alegados na época pelo secretário

de desenvolvimento econômico de São Bernardo do Campo, o advogado Fernando

Longo, afirmou que o impasse dos acionistas em relação a destinação do terreno, que

não chegaram em um consenso, desestimulou os potenciais investidores61, um dos

acionistas da Cidade Tognato S/A Empreendimentos Imobiliários confirmou: “O fato é

que é muita gente - 27 acionistas - para decidir e isso acaba atrasando o processo.

Faremos de tudo para que a Tognato continue viva”62.

Além do impasse entre os acionistas, algumas ações começaram a surgir na

justiça, interpelando a venda do terreno. Em uma delas a Justiça do Trabalho de São

Bernardo do Campo considerou precedente uma medida cautelar em favor do

Sindicato dos Trabalhadores da Industria de Tecelagem e Fiação de São Bernardo e

Diadema, em 15 de Julho de 2005, para o arresto do terreno da tecelagem63.

Em 2006 a Fazenda Nacional e o INSS, também interpelava na justiça da

Cidade Tognato S/A Empreendimentos Imobiliários, em função dos débitos da

Tecelagem e Fiação Tognato S/A, em um dos autos do processo a referencial textual

ao processo de cisão:

“Compulsando os autos, verifica-se pela bem lançada decisão de fls. 344/349 que o redirecionamento da execução fiscal para a pessoa jurídica denominada Cidade Tognato S/A Empreendimentos Imobiliários, bem como a pessoa dos respectivos sócios, resultou da

60 OLIVEIRA, Mariana. Perto dos 100 anos, Tognato paralisa produção e venda. Diário do Grande ABC, 13 de jun. de 2005. 61 IDEM 62 IDEM 63 REDAÇÃO. Justiça torna indisponível para venda terreno da Tognato. Diário do Grande ABC, 19 de jun. de 2005.

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conclusão inequívoca, destacada brilhantemente pelo ilustre magistrado atuante no presente feito, no sentido da pratica de atos fraudulentos pela executada para se esquivar do pagamento dos tributos devidos. Com efeito, infere-se dos documentos carreados aos autos, que a executada Tecelagem e Fiação Tognato S/A utilizou-se de expediente fraudulento, consistente na realização de cisão parcial, para a constituição de outra pessoa jurídica, Cidade Tognato S/A Empreendimentos Imobiliários, como forma de alcançar a blindagem de seu patrimônio e viabilizar a transferência de imóvel de sua propriedade para a empresa constituída, valendo-se da adesão a parcelamentos tributários antes deferidos como forma de afastar eventuais entraves na transferência patrimonial.” (Fiação e Tecelagem Tognato S.A. X Fazenda/INSS, 2011)

Entre os questionamentos judiciais e dividas com a esfera pública, depois de

2001 a inciativa “Cidade Tognato”, em sua concepção original foi abandonada,

contudo a Prefeitura de São Bernardo manteve o planejamento de abertura das vias

públicas Lauro Gomes e Kara – atual Rua Doutor Marcel Preotesco.

Depois de 5 anos de ostracismo, em 2006 uma alternativa ao projeto “Cidade

Tognato” surge, duas incorporadoras – Cyrela & Agra e Setin – se interessaram por

100 mil m² da área total de 200 mil m² para a construção de um condomínio dividido

para uso residencial e comercial64, a partir deste momento toda referência ao projeto

“Cidade Tognato” desaparece dando lugar a denominação “Complexo Domo” (figura

7), composto pelas torres comerciais Domo Business e Domo Corporate, e pelas

torres de uso residencial: Domo Prime, Domo Home e Domo Life. (SÍGOLO, 2011)

O projeto faz alusão direta ao conceito de condomínios-clube como estratégia

de marketing imobiliário para segmentos sociais de renda média e alta, utilizando a

arquitetura para projetar e construir de simulacros como garantia de segurança,

tranquilidade, status e bem-estar. Esta tendência crescente de privatização do

espaço-público, expressa o conflito de classes, isolando uma parcela da comunidade,

produzindo a não-convivência, inerente ao uma cidade harmonizada e plural. A cidade

tona-se então, campo dos excluídos, uma vez que o controle de quem transita nos

condomínios-clubes, selecionando quem pode transitar e ter acesso, convertendo

este espaço em uma utopia de uma comunidade de iguais.

64 FARIAS, Leone. Tognato vende área em S. Bernardo. Diário do Grande ABC, 16 de fev. de 2006.

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Figura 10: Complexo Domo.

Fonte: ficherimoveis.com.br (2015)

Em sua obra intitulada Comunidade, Bauman (2003) tece considerações sobre

a separação e a criação de guetos. O autor afirma que existem dois tipos de guetos:

os voluntários e os involuntários. Os guetos voluntários não são verdadeiros, pois

diferem dos verdadeiros em um aspecto decisivo. Nos guetos reais não há

possibilidade de sair, pois não podem casualmente atravessar a rua para ir ao bairro

branco vizinho, pois seria hostilizado, quando não detido pela polícia. E no gueto

voluntário, ao contrário o principal objetivo seria impedir a entrada de indesejados,

porém os seus habitantes podem sair quando bem desejarem. Quanto a atratividade

destes guetos, diz:

“Realmente, as pessoas que dão um braço e uma perna pelo privilégio do “confinamento espacial e fechamento social” são zelosas na justificação do investimento pintando a selva do lado de fora dos portões com cores mais carregadas, exatamente como pode parecer aos habitantes dos guetos reais. Nada, contudo, inspiraria os que se decidem pelo isolamento estilo gueto a trancar os portões se não fosse a tranquilizante consciência de que não há nada de final ou irrevogável na decisão de comprar uma casa dentro dos muros do quase-gueto. Os guetos reais implicam na negação da liberdade. Os guetos voluntários pretendem servir à causa da liberdade.” (BAUMAN, 2003, p. p. 106)

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Figura 11: Divulgação do empreendimento DOMO

(Folha de São Paulo apud SÍGOLO) em Outubro de 2007

A ideia de todo o marketing

utilizado pelas incorporadoras no

projeto denominado DOMO, foi

capturado esplendidamente por

Sígolo (2011) ao analisar o anuncio

publicitário publicado no Jornal

Folha de São Paulo em Outubro de

2007 (figura 11) sobre o DOMO

HOME em São Bernardo do

Campo, demonstra claramente as

estratégias de valorização

utilizadas pelo setor imobiliário, a

figura da redoma sobre o

empreendimento é auto explicativa

e pictural para elucidar o conceito

de enclave enclausurado. Temos

ainda o uso da frase “Uma cidade

dentro da cidade”

Outra área de 44,5 mil m² foram entregues para a prefeitura do município para

pagamento de dívidas, estimada em R$30 milhões da Tecelagem Tognato com o

erário municipal65 em 2006, esta operação foi autorizada pela lei n° 5.732 de 20 de

setembro de 2007.

A área de 44,5 mil m² entregue para a prefeitura foi parcelada em três áreas de

34,4 mil m², 5,9 mil m² e 4,1 mil m² conforme figura 4. Estas áreas foram ofertadas

pela prefeitura em quatro ocasiões diferentes em leilões realizados entre 2007 e 2008,

as três primeiras tentativas sem sucesso por falta de interessados.

No quarto leilão, realizado em 2008, obteve êxito na venda do menor lote de

4,1 mil m² por R$2,8 milhões dividido em 9 parcelas fixas arrematado pela Absoluta

Construtora e Incorporadora Ltda – única credenciada a participar do leilão. Os lotes

de 34,4 mil m² e 5,9 mil m² estavam à venda pelo lance mínimo de R$32,3 milhões e

65 DONATO, Rita. São Bernardo vende terreno da antiga fábrica Tognato. Diário do Grande ABC, 24 de Abril de 2008.

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R$4 milhões respectivamente, nesta opção os interessados poderiam dividir o valor

em nove parcelas fixas, não foram vendidos.

Figura 12: As três áreas destinadas a leilão pela prefeitura de São Bernardo do Campo.

Fonte: http://www.metodista.br/rronline/noticias/cidades/pasta-10/sao-bernardo-faz-leilao-de-tres-terrenos

Posterior ao insucesso do leilão das duas maiores áreas, a prefeitura destinou

do lote maior de 34,4 mil m², uma área de 9,5 mil m² que serão destinados a

construção de um terminal rodoviário junto a futura estação Baeta Neves da linha 18

- Bronze do metro.

A Prefeitura de São Bernardo do Campo, na gestão do prefeito Willian Dib,

utilizou uma área de aproximadamente 10,7 mil m² na permuta com a administradora

do Shopping Metrópole, Sonae Sierra Brasil em setembro de 2007, recebendo críticas

na época.

“A Prefeitura de São Bernardo é brasileira e não desiste nunca. Depois de quatro tentativas fracassadas de leiloar o antigo terreno das indústrias Tognato, apossado pela Administração para cobrir uma dívida de IPTU de R$ 40 milhões, a Câmara aprovou hoje uma permuta de terrenos que pode ter como objetivo melhorar as condições de venda da área. O terreno público que será repassado para uma empreiteira é onde funciona hoje uma "garagem informal" de ônibus, na Avenida Aldino Pinotti, atrás do Shopping Metrópole. Com a transferência do terreno, a Prefeitura deixará de pagar R$ 3 milhões para a empresa por conta de um processo que envolve a

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construção da própria avenida Aldino Pinotti e a expansão da Pereira Barreto. A Administração de William Dib (PSB) teria construído sobre solo particular sem consultar os donos do terreno. “Mas, no final, saímos ganhando. O terreno que vamos receber vale mais do que o que estamos doando, que seria difícil de vender, porque tem formato de meia-lua", justificou o líder de governo, Ary de Oliveira (PR). De acordo com o parlamentar, a troca de terrenos possibilitará que a rua Cara, no Jardim do Mar, seja estendida para fazer a ligação com o bairro Baeta Neves. Já o oposicionista Wagner Lino (PT) não tem certeza de que o negócio foi assim tão bom. "Não nos enviaram laudos que comprovam o valor dos terrenos, nem plantas, nada. Como posso saber se realmente é uma boa troca, sem nenhuma informação?", questionou. "E é muito estranha essa história de a Prefeitura construir em cima de terreno particular. Aquela avenida com certeza valorizou muito os imóveis nos entornos", alfinetou.” (MAIOR, 2007)

Houve ainda uma tentativa em 2007 do Ministro da Previdência Luiz Marinho e

do Ministro da Educação Fernando Haddad junto ao prefeito Willian Dib, para cessão

de parte da área, especificamente a área negociada com a Sonae Sierra Brasil, da

tecelagem Tognato para a construção do Campus da UFABC, mas o prefeito ofereceu

outra na Rodovia Índio Tibiriçá nos limites da área de proteção aos mananciais, vetada

pelo presidente66.

O restante da área foi convertido na avenida Aldino Pinotti, nas ruas José

Versolato e Doutor Marcel Preotesco, alargamento da avenida Pereira Barreto e

respectivos passeios.

Assim o desfecho final do projeto “Cidade Tognato” que converteu-se em um

projeto de parceria público privada para um projeto privado, porém com investimentos

públicos em infraestrutura, para a um projeto de condomínios de alto padrão voltado

exclusivamente para classe mais abastada.

As iniciativas de inserção de equipamentos urbanos como o terminal rodoviário

e a estação Baeta Neves da Linha 18-Bronze do metro nesta área, enfrentam

oposição resistência dos moradores que ali se estabeleceram, conforme noticiado

pelo Jornal Destak, em Novembro de 2012:

“O processo licitatório da linha 18/Bronze do Metrô, que ligará o ABC a São Paulo pelo sistema de monotrilho, nem foi aberto. Mas a construção dos 20 km de extensão e 18 estações já provoca polêmica na região. Um grupo de moradores da região central de São Bernardo reivindica mudanças no traçado do modal. Entre elas, a alteração do

66 NEGRIN, Illena. Lula veta UFABC em área doada por São Bernardo. DGABC, 13 de junho de 2007 e SARTORATO, Diego. Câmara de S. Bernardo aprova permuta duvidosa de terreno. ABCD Maior, 19 de set. de 2007. SARTORATO, Diego. Leilão da Prefeitura fracassa pela terceira vez em S. Bernardo. ABCD MAIOR, 30 de maio de 2007.

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trajeto na avenida Aldino Pinotti, via aberta entre 2007 e 2008 pela prefeitura, para a avenida Pereira Barreto, que liga São Bernardo a Santo André. O Metrô informou ontem, por nota, que não há decisão para mudança do referido traçado. "O projeto funcional do monotrilho foi feito em 2005 pela prefeitura e está totalmente desatualizado", afirmou o analista de sistemas Felipe Nyitry, um dos 11 integrantes da Comissão São Bernardo Melhor e que reivindica a mudança do trajeto. Questionada sobre o assunto, a Prefeitura de São Bernardo não respondeu. Pelo projeto funcional, a estação Baeta Neves será construída na frente da garagem de entrada e saída de veículos do condomínio Domo Home, residencial de alto padrão composto por 784 apartamentos, distribuídos entre sete torres e no total representam cerca de 3 mil moradores. "A avenida Pereira Barreto possui maior movimento e comércios, ao contrário da Aldino Pinotti que é estritamente residencial", reforçou o representante da comissão formada em fevereiro de 2011.O Metrô confirmou que o projeto foi feito por empresa privada, contratada pela administração de São Bernardo, com acompanhamento da Secretaria dos Transportes Metropolitanos, Metrô, e prefeituras de Santo André, São Caetano e São Paulo. A previsão do início das obras é 2013.” (DESTAK, 2012, p. p. B2)

Outras ações articuladas por esta associação de moradores, já conseguiu

pressionando a prefeitura de São Bernardo a mudança do Carnaval de rua da cidade,

realizado nesta mesma Avenida desde 2004, conforme reportagem:

“Realizado na avenida Aldino Pinotti desde 2004, o Carnaval de São Bernardo será transferido para outro endereço a partir do ano que vem. A mudança atenderá solicitação dos moradores dos condomínios residenciais localizados na via, que nos últimos três anos pedem à prefeitura a transferência do evento. Para as pessoas que residem na região, o Carnaval causa uma série de transtornos. Em entrevista exclusiva ao, o secretário municipal de Cultura, Osvaldo de Oliveira Neto garantiu a mudança e ainda falou de projetos, investimentos, e também da polêmica sobre a construção do Museu do Trabalhador, entre outros assuntos. Como estão as tratativas para que o desfile de Carnaval deixe de acontecer na avenida Aldino Pinotti e ocorra em outro lugar? O estudo da prefeitura para a transferência do Carnaval é realizado desde 2012. Porém, ainda não conseguimos outro local para o evento, mas no ano que vem é certeza de que não acontecerá lá. Primeiro por conta da solicitação dos moradores, e segundo, porque a via receberá intervenções, como obras do projeto Drenar, de mobilidade urbana, como os corredores de ônibus e a estação da Linha 18-Bronze do Metrô. Isso inviabiliza a realização dos desfiles lá. Já existe algum local em avaliação? O Carnaval é um bem público, o problema é que causa transtorno para os moradores que estão em volta. Ninguém quer que seja feito na própria rua, mas de alguma maneira quer que seja feito. Estamos buscando um espaço, pois queremos algo que dê segurança e conforto de ir e vir através do transporte, o que também é uma grande dificuldade na cidade como um todo. (DESTAK, 2014, p. p. A4)

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4.2 – Programa São Bernardo Moderna

No segundo semestre de 2002, durante a gestão do prefeito Willian Dib, a

prefeitura de São Bernardo iniciou os trabalhos de elaboração do “Programa São

Bernardo Moderna”, sob coordenação do Secretário de Projetos Especiais Eurico

Leite67, o Programa previa inicialmente cerca de 800 intervenções físicas e um

conjunto de 23 obras de intervenção viária no município orçado em R$833 milhões68

e duração prevista de 5 anos, com apoio de financiamento do Banco de

Interamericano de Desenvolvimento – BID - aprovado em 2004 com aval do governo

federal69.

O principal objetivo do programa era melhorar a integração das diversas

regiões do município proporcionando um melhor uso e equilíbrio da ocupação do solo,

melhorar a infraestrutura do município a fim de atrair mais investimentos da iniciativa

privada e favorecer a mobilidade urbana priorizando o transporte público e de

pedestres.

O programa foi dividido em 2 principais módulos: o primeiro intitulado

Transporte Urbano com ações previstas para ser realizadas com financiamento

internacional do BID, orçado em R$393,6 milhões, e o segundo Integração Urbana

com ações previstas para ser executadas com recursos próprios da Prefeitura do

Município de São Bernardo do Campo orçadas em R$439,5 milhões. O programa com

início previsto para 2004 iniciou as primeiras obras em outubro de 2007. Os motivos

dos atrasos foram consequência das licenças ambientais extras para a instalação do

canteiro de obras, bem como a destinação de todos os detritos produzidos, inclusive

os orgânicos que deveriam ser informados por força de clausula contratual com o

BID70 e o cancelamento da licitação do terceiro lote da concorrência ganho pela

empreiteira Gautama, investigada pela Policia Federal por envolvimento em casos de

desvio de verba pública, também por solicitação do BID71.

No módulo Transporte Urbano foram previstos um pacote com 9 obras de

intervenções e 2 terminais rodoviários urbanos, identificadas por códigos conforme

67 Nomeado para a direção Programa de Transporte Urbano de São Bernardo do Campo através da portaria 8170 de 24 de out. de 2003, mais tarde denominado. 68R$3,28/US$1, projetada para a PLDO 2005 do Governo Federal. 69 Sendo 60% sob responsabilidade do BID e 40% contrapartida da Prefeitura. 70 Redação. Com 7 meses de atraso, obras do S. Bernardo Moderna começam. Repórter Diário, 24 de out. de 2007 71 SARTORATO, Diego. Dib anuncia São Bernardo Moderna. ABCD Maior, 24 de out. de 2007.

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tabela 7, essas obras tinham como finalidade realizar alterações no sistema público

de transporte coletivo para ampliar e melhorar o atendimento à população,

complementações do anel viário periférico, integração viária municipal para disciplinar

o tráfego de passagem e melhorar a integração de diversas áreas do município e

acessibilidade entre bairros.

No módulo Integração Urbana, composto por um pacote de 1 terminal

rodoviário urbano e 14 intervenções de reconfiguração, ampliação e complementação

da rede viária existente, conforme tabela 8, destinado a melhorar a fluidez aliviando o

trafego local e a fluidez. Neste módulo o maior volume de investimento é aportado

com 52% do montante total previsto.

Até Junho de 2014 de um total de 23 intervenções, 11 haviam sido concluídas,

parcialmente concluídas ou em execução, 9 foram canceladas e apenas 1 não havia

iniciado.

Algumas obras do programa “São Bernardo Moderna” foram canceladas em

fevereiro de 2011, na gestão do prefeito Luiz Marinho, pelo secretário Oscar Silveira

Campos em razão da valorização do dólar, uma vez que o contrato de financiamento

do BID havia sido feito com uma paridade de R$3,28 para US$1,00 em 2002, em

fevereiro de 2011 a paridade estava R$1,66, um acréscimo de 50% nos valores

contratados para o financiamento, tornando-se extremamente oneroso ao erário

municipal72.

72 MUNHOZ, Fábio. Prefeitura enxuga obras do São Bernardo Moderna. DGABC, 10 de fev. de 2011.

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Tabela 6: Obras do Programa São Bernardo Moderna, módulo Transporte Urbano

Fonte: Autor

Códigos Obra Objetivo principal Evolução (Jun/14)

A07

Trata-se da implantação um par de túneis, com

extensão aproximada de 660 m cada, para transposição

da Via Anchieta na altura do km 17, na diretriz da

Avenida São Paulo, para conexão do Bairro Jordanópolis

com a área de implantação do novo Paço Municipal, no

Bairro Parque Anchieta

Ligação da área de implantação do novo Paço Municipal com os

bairros a Oeste da Via Anchieta e com o futuro elo Oeste do Anel

Viário Municipal no vale do Ribeirão dos Couros, interligando as

avenidas Lauro Gomes, Senador Vergueiro e Kennedy com as

avenidas Robert Kennedy e Piraporinha

Cancelado

A09

Implantação da continuação da avenida Lauro Gomes, a

partir do cruzamento com a Estrada das Lágrimas, até

quase a divisa com São Paulo, atingindo a Avenida

Rudge às margens da transposição do Ribeirão dos

Couros.

Criar um corredor, que juntamente com o trecho já existente da Av.

Lauro Gomes entre a Estrada das Lágrimas e a Av. Kennedy, mais

o trecho em Implantação da mesma avenida entre a Av. Kennedy e

a Rua Luís Ferreira da Silva e mais o trecho final a implantar entre a

Rua Luís Ferreira da Silva e Av. Pereira Barreto (intervenção C.03)

Cancelado

A11

Transposições em desnível nas avenidas Senador

Vergueiro e Vivaldi e Rua Brasil, sobre o Anel Viário

Metropolitano (Av. Lions), onde este será rebaixado em

cut & cover invertido com contenção lateral de paredes

diafragma - A11 (b), além da implantação de um par

binário de vias constituído pela Rua Vivaldi e pela Av.

Senador Vergueiro, numa extensão total de cerca de

4000 m

Redução dos tempos de viagem dos usuários de transporte

coletivo que utilizam a Avenida Senador Vergueiro e nos

congestionamentos que ocorrem diariamente nesta via, reduzindo

os tempos de viagem na ligação Centro – Rudge Ramos

Concluída em

Maio/2012

D08

Alargamento da Av. Senador Vergueiro no trecho

compreendido entre a Rua José Versolato e a Av.

Winston Churchill, garantindo uma largura mínima de 13

m (duas faixas por sentido) para o sub-trecho entre a

Rua José Versolato e a Av. Kennedy, e uma largura

mínima de 19 m (3 faixas por sentido) entre a Av.

Kennedy e a Av. Winston Churchill.

Redução nos congestionamentos que ocorrem diariamente na Av.

Senador Vergueiro, reduzindo os tempos de viagem na ligação

entre o centro de São Bernardo do Campo e a região de Rudge

Ramos, ou mais especificamente até o início da intervenção

Concluída em

Agosto/2008

TAL Terminal Alvarenga

A obra tem como finalidade possibilitar a implantação de sistema

tronco-alimentado, favorecendo a oferta de destinos diretos

alternativos aos usuários do sistema e a criação de serviços

diferenciados como linhas expressas e paradoras, a partir da região

do Alvarenga

Não concluída

Sem inicio previsto

TRR Terminal Rudge Ramos

A obra tem como finalidade possibilitar a implantação de sistema

tronco-alimentado, favorecendo a oferta de destinos diretos

alternativos aos usuários do sistema e a criação de serviços

diferenciados como linhas expressas e paradoras, a partir da região

do Rudge Ramos

Não concluída

Sem inicio previsto

D01

Implantação de Alça, em “looping”, no Quadrante

Nordeste da interseção entre a Via Anchieta e o Anel

Viário Metropolitano (Av. Lions), complementando a

configuração de trevo convencional, e incorporando o

fluxo S-W à pista Oeste do Anel Metropolitano

Melhoria nas condições gerais de operação do sistema viário

localizado na região do entorno da interseção da Via Anchieta com

o Anel Viário Metropolitano com a diminuição dos

congestionamentos existentes

Cancelado

A12

Cruzamento de Anel Viário Metropolitano com a Av.

Lauro Gomes, elo Leste do Anel Viário Municipal,

implantação de dois viadutos, com extensão aproximada

de 333 m sobre a rotatória da interseção do Anel

Metropolitano com a Av. Lauro Gomes (SBC), com .três

faixas de tráfego cada, e com vão central de 90 metros

construído pelo método de balanços sucessivos

Eliminar os congestionamentos e promover a fluidez do tráfego

intermunicipal do Anel Metropolitano, eliminando as interferências

do tráfego de passagem na operação do Sistema Viário Principal do

Município

Concluída em

Ago/2008

B01

Implantação de duas pistas marginais com três faixas

de tráfego cada, paralelas ao Ribeirão dos Couros, no

trecho entre a Av. Piraporinha e o Anel Viário

Metropolitano, englobando, ainda, a canalização do

Ribeirão dos Couros, neste mesmo trecho

Melhorar as condições de operação no entroncamento do Anel

Viário Metropolitano com o Anel Viário Periférico (Av. 31 de Março),

diminuindo os congestionamentos que ocorrem diariamente

Cancelado

C05

Execução da terceira faixa de rolamento na Av. Pereira

Barreto, na pista sentido Santo André/São Bernardo,

entre a Rua José Versolato ate a rua Atibaia, em uma

extensão aproximada de 450 m

Melhorar as condições de operação do tráfego intenso proveniente

do município de Santo André em direção a São Bernardo do

Campo, Diadema e à Via Anchieta

Concluída em

Dez/2008

D02

Duplicação da Av. Pery Ronchetti, em uma extensão

aproximada de 850 m, e canalização em galeria do

Córrego Saracantã entre a Rua Marechal Deodoro e a

Rua Princesa Maria Amélia, em uma extensão

aproximada de 780 m

Facilitar a ligação dos Bairros Nova Petrópolis, parte do Bairro

Baeta Neves e Parque São Bernardo ao centro da cidade e seu

acesso à Via Anchieta

Concluída em

Ago/2008

Transporte Urbano

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Tabela 7: Obras do Programa São Bernardo Moderna, módulo Transporte Urbano

Fonte: Autor

Outro motivo que levou a prefeitura cancelar algumas obras do programa foi a

exigência do BID obrigar a Prefeitura só iniciar uma obra quando todas as famílias

afetadas no trecho em questão forem realocadas73. Pelo levantamento contido no EIA

/ RIMA do programa, 2.506 moradores ou 704 imóveis deveriam ser desapropriados

para a conclusão das intervenções contidas no programa. Do total, 1.239 eram

73 CIPRIANO, Rodrigo. Obras viárias vão despejar 2,5 mil em S. Bernardo. DGABC, 24 de fev. de 2006.

Códigos Obra Objetivo principal Evolução (Jun/14)

A02Km 18 da Via Anchieta – Conexão entre a Av. Lucas

Nogueira Garcez e a Via Anchieta

Melhoria nas condições gerais de operação da interseção do km

18,0 e da Av. Piraporinha, com a diminuição dos volumes

Concluído

Jun/2008

A04Trevo da Via Anchieta – KM 20,7: Complementação do

Complexo Viário Mário Covas

Transformar o dispositivo no principal acesso a SBC, em especial

ao centro histórico da cidade

Concluído

Ago/2008

A05Trevo da Via Anchieta – km 22,5: Interligação Assunção /

Ferrazópolis

O objetivo da destinação proposta para o viaduto do km 22,5, a

partir da implementação integrada de uma série de obras

complementares é o de criar uma nova opção de transposição da

Via Anchieta, com a função de dar acesso à Via Anchieta e à

região de Ferrazópolis para a população da porção oeste do

município

Concluído

Ago/2008

A08 Complexo Viário do novo Paço Municipal

A obra tem como finalidade possibilitar a implantação de sistema

tronco-alimentado, favorecendo a oferta de destinos diretos

alternativos aos usuários do sistema e a criação de serviços

diferenciados como linhas expressas e paradoras, a partir da região

do Riacho Grande

Não Iniciado

A10Duplicação da Av. Winston Churchil e nova conexão

com a Via Anchieta

Aumentar a capacidade da Avenida Winston Churchill e completar a

ligação viária para os veículos oriundos de Santo André e do bairro

Rudge Ramos com destino à Via Anchieta

Cancelado

B02Alargamento e Ampliação da Av. José Odorizzi entre o

trevo do km 20,7 da Via Anchieta e a R. dos Saíras

Melhoria nas condições de operação do macro sistema viário

municipal após conclusão do conjunto de obras que formarão um

corredor diametral entre a Rodovia dos Imigrantes (km 20) e a

Praça dos Bombeiros (no final da Av. Prestes Maia) e limite Leste

com o Município de Santo André, cruzando ainda com o futuro Anel

Viário Periférico na interseção da Av. Robert Kennedy

Em execução

C01

Av. Marginal do Córrego Linha Camargo - Execução da

Av. Marginal entre a Estrada dos Alvarenga e a Av. Plínio

Barreto

Facilitar a ligação entre os bairros Independência. Alves Dias e dos

Casa sem necessidade de se deslocar até a Av. Robert KennedyCancelado

C02Duplicação da Rua Tiradentes entre a Av. Francisco

Prestes Maia e a Praça dos Bombeiros

Eliminar estrangulamento de seção viária no eixo formado pela Av.

Francisco Prestes Maia e Rua Tiradentes, que por sua vez fará

parte do futuro eixo leste-oeste que abrangerá ainda as avenidas

Samuel Aizemberg, José Odorizzi, Complexo Viário Mário Covas e

Newton Monteiro de Andrade

Concluído

Ago/2008

C03Prolongamento da Av. Lauro Gomes até a Av. Pereira

Barreto e Interligação com a Praça Samuel Sabatini

Propiciar o fechamento do Anel Viário Periférico e do sistema de

Mini-Anéis e ligação entre bairros, permitindo o escoamento do

tráfego sem transitar pela Via Anchieta, proporcionando alívio do

sistema viário da área central no movimento centro-norte, desta

forma possibilitando melhores condições de operação do transporte

coletivo

Concluído

Ago/2008

Em partes

C04Duplicação da Av. Newton Monteiro de Andrade e

conexão com a Av. Brigadeiro Faria Lima

Duplicação de trecho da Av. Newton Monteiro de Andrade e

execução de ligação direta desta avenida com a Av. Francisco

Prestes Maia, com remodelação do cruzamento com a Av.

Brigadeiro Faria Lima.

Concluído

Ago/2008

D01 Prolongamento da Rua Kara até a Rua Atibaia

Facilitar a integração entre as avenidas Kennedy, Lauro Gomes e

Pereira Barreto e promover a integração entre os bairros centrais, o

bairro Baeta Neves e o município de Santo André

Em execução

D05Duplicação da Estrada dos Alvarenga entre Rodovia dos

Imigrantes e Jardim Thelma

Atender a alta demanda viária de ligação entre a Via Anchieta e a

Rodovia dos Imigrantes, e de seus bairros lindeiros, contribuindo

para melhorar a fluidez dos transportes coletivos

Cancelada

D06 Duplicação da estrada Galvão Bueno

Atender o tráfego do município, em especial dos veículos oriundos

dos bairros Demarchi, Batistini e dos Casa com destino à Rodovia

dos Imigrantes e dos usuários do transporte coletivo, através do

aumento da capacidade viária e das condições de segurança da

Estrada Galvão Bueno

Concluído

Jun/2009

D07 Duplicação da Estrada Samuel Aizemberg Aumentar a capacidade viária deste importante corredor de acesso

à Rodovia dos ImigrantesCancelada

TRG Terminal Riacho Grande Reforma do terminal existente. Cancelado

Integração Urbana

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moradores de áreas ocupadas irregularmente que deveriam ser realojados em

conjuntos habitacionais. A exigência travou algumas das principais intervenções,

como B01 -abertura de uma avenida sobre o ribeirão dos Couros, entre a Robert

Kennedy e a 31 de Março.

A única obra ainda não iniciada refere-se ao Complexo do novo Paço Municipal,

pois a médio prazo a mudança potencialmente irá acontecer e as obras referentes ao

Complexo Viário do novo Paço Municipal, provavelmente irão ocorrer em conjunto

com toda a obra. O projeto está a cargo do arquiteto Carlos Bratke, responsável pelo

projeto de 80 mil m², visto na figura 5, localizados na região norte do município, entre

o km 15 da Via Anchieta, marginal esquerda e início da Avenida Kennedy atrás do

Ginásio Poliesportivo Adib Moisés Dib.

Figura 13: Novo Paço Municipal de São Bernardo.

Fonte: www.carlosbratke.com.br/estudos/pacosbc/pacosbc2.jpg (2015)

Podemos concluir que houve benefícios de algumas obras do programa “São

Bernardo Moderna” para o projeto “Cidade Tognato”, posteriormente “Complexo

Domus”, pelo menos nas intervenções sob os códigos C03, C05, D01 e D08.

A intervenção C03 - prolongamento da avenida Lauro Gomes até a Avenida

Pereira Barreto, parte concluída em Agosto de 2008, conhecida hoje como Avenida

Aldino Pinotti passam dentro da área da antiga tecelagem, e conforme constatado por

Jesus (2009):

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“Ao realizarmos consultas na prefeitura de São Bernardo em 2006 para sabermos se o terminal estava em parte da propriedade da Tognato, tanto o setor de Planejamento Urbano quanto o de Títulos e Imóveis nos informaram que de forma alguma o terminal estava ocupando área da tecelagem, no entanto o senhor Campanaro ex-trabalhador da tecelagem e membro do sindicato dos tecelões afirmou que aquela foi sim uma área pertencente a tecelagem, que foi desapropriada para o alargamento da rua José Versolato, que passa ao lado da tecelagem, alargando a avenida entre a tecelagem e o shopping, para que ocorresse esse alargamento houve a desapropriação de uma faixa lateral do terreno da tecelagem e a desapropriação de uma longa faixa ao longo do terreno onde estava o imóvel da Tognato dando origem a avenida Aldino Pinotti, o que fez com que o imóvel da tecelagem ficasse dividido em dois.” (JESUS, 2009, p. p. 106)

Corroborando com os argumentos de Jesus (2009), foi promulgada pelo

Gabinete do Executivo do Município a Lei nº 5.732, em 20 de setembro de 2007:

“Art 1. Fica o executivo autorizado a permutar o imóvel de propriedade do Município com o imóvel pertencente a Pereira Barreto Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda........Um terreno designado como área B3 com 10.093,84 m2, destinado a abertura da Avenida Aldino Pinotti, Bairro Centro, São Bernardo do Campo – Estado de São Paulo, que consta pertencer a Pereira Barreto Empreendimentos Imobiliários SPE.” (Lei_n_5.732, 2007, p. Lei)

Para a intervenção C05 - Alargamento da avenida Pereira Barreto, uma área

de 1.306,66 m², foi desapropriada pelo Decreto nº 15.712 de 30 de Agosto de 2006, o

mesmo procedimento adotado com a intervenção conforme croqui na figura 6, D08 -

Alargamento da avenida Senador Vergueiro no trecho compreendido entre a Rua Kara

e Rua Banda, onde uma área de 5.002,05 m², conforme croqui na figura 7, foi

desapropriado pelo Decreto nº 16.102 de 29 de Agosto de 2007 ambos decretos em

favor da Cidade Tognato S/A - Empreendimentos Imobiliários.

A intervenção D01 - Prolongamento da Rua Kara até a Rua Atibaia, em

execução até Junho de 2014, estava dentro do terreno de 44,5 mil m², conforme croqui

na figura 8, que foi entregue para a prefeitura pagamento de dívidas em 2006.

Tentamos agendar uma entrevista com o prefeito Willian Dib durante os

mandatos de 2003 / 2005 e 2005 / 2009, e seu o ex-Secretário de Projetos

Especiais Eurico Leite para clarificarmos as ações da municipalidade dentro

do programa “São Bernardo Moderna” no fomento do projeto “Cidade

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Tognato”, porém infrutíferas, a assessoria de Willian Dib nos retornou o e-

mail:

“Caro Henry. O que é de conhecimento dessa assessoria é que a empresa que representou os proprietários da área da antiga tecelagem Tognato denomina-se Cidade Tognato S/A Empreendimentos, um investimento privado e não houve um projeto da prefeitura denominado Cidade Tognato. Espero ter ajudado na sua pesquisa. Atenciosamente.” (LAILA, 2014)

Figura 14: intervenção C05 - Alargamento da avenida Pereira Barreto.

Fonte: EIA/RIMA Programa de Transporte Urbano de São Bernardo do Campo (2004)

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Figura 15: D08 - Alargamento da avenida Senador Vergueiro.

Fonte: EIA/RIMA Programa de Transporte Urbano de São Bernardo do Campo (2004).

Figura 16: D01 - Prolongamento da Rua Kara até a Rua Atibaia.

Fonte: EIA/RIMA Programa de Transporte Urbano de São Bernardo do Campo (2004)

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4.3 - Transição de Projetos: De “Cidade Tognato” para “Complexo Domo”

O surgimento do projeto Cidade Tognato se materializou em um cenário onde

uma grande área inserida em uma região valorizada e dotada de boa infraestrutura,

pertencente a uma indústria centenária da região do Grande ABC, fragilizada por duas

décadas -1980 e 1990 - seguidas de estagnação econômica, atraso tecnológico e uma

dívida com erário municipal a cada mês maior, aceitasse prematuramente e sem maior

conhecimento um projeto com uma roupagem europeia como solução de seus

problemas financeiros e sucessórios. O projeto foi ofertado por políticos da região, em

final de mandato, que por uma conjunção de fatores eleitorais não conseguiu atrair a

mesma atenção de seus sucessores, sendo do mesmo partido ou não. Neste sentido,

os acionistas da Tecelagem Tognato sentem-se abandonados (TOGNATO, 2014), e

desistem da empreitada.

Em um segundo momento, seis anos após a iniciativa Cidade Tognato, há

interesse de duas incorporadoras – Cyrela & Agra e Setin – que se interessam por

parte da área, e encabeçam junto ao poder público a viabilização do projeto Complexo

Domo. Neste momento, há participação da prefeitura do município nas negociações,

no sentido de viabilizar o negócio entre os acionistas da Tecelagem Tognato e as duas

incorporadoras, e ao mesmo tempo fornecer garantias a incorporadora a conclusão

das obras do programa São Bernardo Moderna, que afetam o empreendimento, e

pouco mais de um ano depois, em outubro de 2007 (NOBRE, 2013), as primeiras

unidades do projeto eram comercializadas.

Há uma certa ironia na maneira como ocorreu a transição dos projetos, na fase

Cidade Tognato, quando o poder público, vigente a época na forma de representantes

das prefeituras da região do Grande ABC, encabeçam a iniciativa e procuram os

acionistas para propor o projeto, realizaram as etapas e ações que definiriam o

sucesso do projeto com morosidade e dispêndio do capital privado família para evoluir

o projeto, e sem sucesso na atração do capital de empreendedores. Porém, anos mais

tarde, quando a iniciativa é encabeçada pela iniciativa privada, inclusive

intermediando junto a poder público, pouco tempo depois exibem o sucesso do projeto

na forma de uma vasta campanha de vendas das unidades.

Inegável o apelo e o poder do capital nos grandes projetos urbanos privados e

empreendimentos imobiliários, que de certa maneira, preenche o espaço vazio

deixado pelo poder público na gestão do espaço urbano. O que de certa maneira,

torna a cidade e os espaços urbanos mais vulneráveis e em um produto de consumo

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com acesso restrito apenas as classes mais privilegiadas, e caracterizado com

tipologia arquitetônica inerente a estes empreendimentos.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste trabalho procuramos entender os pontos inerentes as Grandes

Operações Urbanas e a maneira como estes pontos relacionam-se com a cidade

contemporânea, sob a perspectiva da região do grande ABC, principalmente a cidade

de São Bernardo do Campo.

Através do referencial teórico, pudemos entender como as intervenções de

grande porte relaciona-se com o espaço urbano e com o direito a cidade da população.

Procuramos mostrar preocupação com a apropriação do espaço público por projetos

urbanos aprovados por gestores públicos, reforçando o ceticismo da população em

relação a processos participativos em operações urbanas.

Observamos que parte da insatisfação popular que ocasionou os protestos

iniciados na Turquia com a praça Taksim, e no Brasil com as obras da Copa de 2014,

foram motivados pelos efeitos excludentes das grandes intervenções urbanas e

megaprojetos. Procuramos mostrar algumas iniciativas de sucesso apoiadas pelo

Fundo Europeu de Desenvolvimento os efeitos mitigadores como alguns projetos,

principalmente na Europa, incentivados pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento

como contrapartida a estas grandes intervenções e megaprojetos.

Verificamos que o modelo adotado pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento,

com projetos e operações urbanas em menor escala, voltada ao desenvolvimento

local como uma alternativa adequada no combate a degradação do tecido urbano em

substituição ao arranjo produtivo em declínio. Contudo, as expectativas com o novo

modelo devem ser trabalhadas na comunidade, principalmente no que concerne ao

discurso comparativo entre o modelo implementado e o em declínio.

Mais ainda, as questões da inclusão social são consideradas em projetos de

desenvolvimento local, garantidas pela ampla discussão com a participação dos

diversos atores envolvidos, num esforço de superação da lógica de mercado

imobiliário e da nova gentrificação presente nas intervenções urbanas

contemporâneas.

Os processos de desenvolvimento local, entre outras características, é um

manancial permanente de oportunidades para atender as necessidades sociais, de ir

ao encontro de necessidades sociais reivindicadas e ampliar os ganhos sociais

mediante seu potencial efeito transformador do espaço urbano. Temos um aí um fator

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determinante, caracterizado potencialmente pelas parcerias inauguradas com os

projetos de desenvolvimento local e de requalificação. Dar atenção aos ativos locais

e em recursos inovadores da gestão combinados com o planejamento e participação

da sociedade civil nas experiências de desenvolvimento local evidenciam uma nova

possibilidade referencial para as políticas públicas indicam, ao mesmo tempo, novos

referenciais para as políticas públicas como alternativa ao modelo existente.

Entendemos assim que os projetos e Operações Urbanas devem implicar em

uma política urbana que priorize ações para a redução das desigualdades, não

apenas com ênfase na questão da moradia, mas também com a preocupação de

recuperação do dinamismo econômico no sentido de obter novas alternativas de

trabalho e renda. Devemos incentivar a participação de todos os atores envolvidos na

construção do projeto para assegurar não somente o direito a cidade, mas uma cidade

mais democrática, justa e principalmente de cunho sustentável.

A tônica adotada no capitulo 2 foi no sentido de entender quais foram as razões

do declínio do modelo industrial fordista na região do grande ABC, e durante a

pesquisa entendemos que os efeitos da abertura do mercado do Brasil e a

globalização durante a década de 1990 produziram efeitos no espaço urbano

industrializado, mas diferentemente daquilo apontando como desindustrialização,

entendemos ser uma reestruturação produtiva da região.

A reestruturação produtiva passou a ter uma ênfase maior no setor terciário,

que hoje (2014) responde por mais de 50% do VA da região. E como apontando

acima, diante do discurso comparativo entre o setor terciário e o modelo em declínio

industrial, o setor terciário apresenta algumas desvantagens, principalmente na

remuneração ou ganhos equivalentes, porém os dinamismos da região do grande

ABC mamem-se estável, representando 15% do total do VA do estado de São Paulo,

índice que apresentava nas décadas de 1980 e 1990.

A liderança do setor industrial na região do grande ABC diminui sua influência

em termos absolutos de números de empregos e oferta. Também se diminui a

ocupação em termos espaciais, principalmente nos segmentos obsoletos da

economia local, como o têxtil e nos municípios predecessores na industrialização local

como Santo André e São Caetano, que passaram a ter uma tônica maior no setor

terciário em sua dinâmica econômica. A presença do segmento industrial tende a

diminuir em números absolutos também, ou mesmo a retrair-se e estagnar-se,

conforme elucidado por Anau (2004). Nos municípios de São Bernardo, Diadema e

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Mauá continuam com forte presença industrial, mesmo tendo sofrido os efeitos da

evasão industrial. Outrossim, a expansão do setor terciário no grande ABC,

intensificado a partir da década de 1990 aumentando a diversificação da economia

local absorvendo boa parte do contingente de mão-de-obra local, porém, este

processo de absorção está muito aquém de minimizar os efeitos restritivos do ajuste

mercado de trabalho industrial, pois a transferência para o setor terciário é

acompanhada por perda significativa de renda, e consequentemente nos padrões de

consumo dos trabalhadores absorvidos.

Existem perdedores e ganhadores nestes processos, os trabalhadores

industriais que ainda restam nas atividades ligadas as indústrias remanescentes da

região estão sempre inquietos ante a possibilidade de uma nova onda de

desarticulação industrial, e evidentemente na outra ponta temos os executivos e

empresários locais que somados aos segmentos sócio profissionais mais ligados a

estes, se situam em posição socioeconômica mais favorecida por este processo, e o

mesmo fenômeno replica-se na qualidade de vida dos dois extremos com a mesma

tônica. Portanto, não é de se estranhar que o planejamento regional estratégico de

2011 – 2020 da Agência de Desenvolvimento Econômico do ABC privilegiando ações

para melhorar a qualidade de vida da população dependente de serviços públicos,

fomentando o desenvolvimento integral do ambiente urbano dentro de uma política de

requalificação urbana com inclusão social.

Concomitantemente a este processo, os poderes públicos locais têm se

articulado desde o final da década de 1980, aumentando o diálogo com a sociedade

civil, em um esforço de mobilização local para o enfrentamento dos desafios

dissertados. Neste sentido, surgiram iniciativas como o Consórcio Intermunicipal das

Bacias do Alto Tamanduateí e Billings, o Fórum da Cidadania do Grande ABC e o

Subcomitê Billings/Tamanduateí, este último no âmbito do Comitê da Bacia

Hidrográfica do Alto Tietê (ALVIM, BRUNA, & KATO, 2008). Culminando em 1997

com a criação, através da articulação dos prefeitos de Santo André e São Bernardo

do Campo da Câmara Regional do Grande ABC, espelhando na experiência da

Câmara Setorial Automotiva e, através desta pela articulação direta de Celso Daniel

a Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC. Estas iniciativas foram

motivadas pelo protagonismo dos agentes políticos, sociais e econômicos que juntos

organizaram-se e através da articulação regional preparam-se para o entendimento e

enfrentamento das questões advindas da reestruturação produtiva, o que é sempre

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bem-vindo em um panorama onde existe um déficit de processos participativos que

precisa ser resolvido.

Neste sentido a formulação de políticas encorajadoras de desenvolvimento

local é, certamente, possível e desejável. Muito além do efeito local urgente, um dos

principais objetivos desta política é restaurar a percepção do poder público na indução

e promoção do desenvolvimento socioeconômico como mola propulsora para

equalização das diferenças sociais e regionais, ao mesmo tempo, atuar como

elemento regulador a movimentação autônoma do capital nocivo a todo o estrato

social, principalmente os mais desprotegidos. As experiências desenvolvidas na

região do grande ABC podem estimular os mesmos mecanismos em outras regiões,

talvez com resultados que complementem as alternativas o sentido de criar novas

políticas desenvolvimento regional e nacional.

Ao analisarmos as ações que culminaram no projeto Cidade Tognato,

posteriormente inciativa DOMO, verificamos a flexibilização e o uso de programas de

infraestrutura da municipalidade com o objetivo de alavancar o projeto de iniciativa

privada, na forma de um empreendimento imobiliário de uso privado para a produção

do espaço. O conceito de requalificação e produção de uma nova centralidade foi

amplamente difundido a época do projeto, viabilizando a ação do poder público para

a Cidade Tognato. Porém o projeto se metamorfoseou-se em um condômino-clube

DOMO, com direito a todas as facilidades e articulação do poder público local

meritórias a um grande projeto e operação urbana, que tinha como objetivo principal

dinamizar a economia local e produzir espaços públicos de qualidade.

Podemos também verificar, que os novos moradores inseridos em

condomínios-clubes assimilaram bem a peça publicitaria da incorporadora: “Uma

cidade dentro da cidade”, porém a cidade privada, a cidade adquirida e de uso privado,

intensificando a segregação espacial. Esta associação promove ações através de

uma associação constituída por estes moradores – São Bernardo Melhor - no âmbito

de desarticular iniciativas que descaracterizem este conceito de cidade privada, como

o exemplo citamos a mobilização destes moradores para desviar a rota do projeto da

linha 18 – Bronze do metro que contempla a Avenida Aldino Pinotti, que passa

exatamente pelo meio do Condomínio-clube. A associação já logrou a mudança do

tradicional carnaval de rua de São Bernardo a partir de 2015 para endereço incerto

ainda, promovendo a higienização social.

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108

Como vimos a experiência de articulação de associações colaborativas no

grande ABC, é uma experiência com resultados tangíveis, para o bem ou para o mal.

Entendemos que o dispêndio de esforços na estruturação e implementação de

intervenções urbanas, principalmente no que diz respeito a agentes e recursos

públicos, devem ser orientados no sentido de reduzir desigualdades e melhorar a

qualidade de vida, premissas que transcendem de maneira abismal os interesses do

capital imobiliário, encontrando formas de inclusão social através da gestão

democrática e projetos de desenvolvimento local, assumindo um caráter mais amplo,

solidário e unificado, capaz de envolver e integrar os diversos segmentos da

população, direito respaldado por legislação federal constante no Estatuto das

Cidades, além de intervir para melhorar a organização espacial em termos de

integração e mobilidade entre os espaços urbanos.

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118

Anexo I: Entrevista transcritas

Entrevista com Nair Tognato

Arquivo A1 – Tempo de Gravação 1:15 minutos

Realizada em 22 de Junho de 2014.

Obs.: exclusos diálogos de caráter pessoal a pedido da família

Henry S. Oliveira: Esta greve teve várias outras greves. Mas tem uma

documentada pelo Dops, eu tenho a documentação aqui do Dops aqui, vou até

mostrar para a senhora, foi até um fato curioso, manifesto greve de 1930. Eu vou

mostra para a senhora o que o menino, era um anarquista, foi antes da Segunda

Guerra Mundial, né? Então tinha aqui no Brasil muito movimento anarquista, muito

Nair Tognato: Ah, as italianas estavam tudo no meio, né?

H: É tinha bastante italiano e tinha um português, que ele foi inclusive deportado

para Portugal em 1937 por conta, e este processo aqui ajudou. Ele foi na porta da

tecelagem em 1937, eu acredito que a tecelagem era ainda era aqui.

N: Era aqui, era aqui.

H: A maioria dos empegados da tecelagem eram mulheres e crianças, né? Ah

tá aqui. Este aqui foi o Manifesto de greve que ele... Federação operária de São Paulo,

né? Este documento aqui é do dia 17 do 8 de 1931.

N: Nossa mãe do céu né, cada coisa, hã?

H: Greve dos operários tecelões de São Bernardo, comício da federação

operária, então...

N: Bom, em 37 eu não tava aqui, né, eu tava em Mococa ainda.

H: Então, ele fez uma greve aqui, com um pessoal, 17 de agosto de 31, né, em

que ele diz o seguinte, que o comício teve a felicidade de interessar toda a população

obreira de São Bernardo ......, e aí ó, e outro no meio dos manifestantes fizeram-se

ouvir declarando estes os quais atitudes dos quais os trabalhadores deviam manter

em face a greve que estariam sustentando de intransigência a toda prova contra os

industriais irmãos Tognato. O nome da tecelagem era irmãos Tognato.

N: É, era irmãos Tognato, é.

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H: Que haviam revelando uma má fé de ofício que fará inveja ao Al Capones,

que nestes Brasis assentaram a praça comerciante industriais. Aos gritos de viva a

solidariedade operária, viva os trabalhadores uma greve, viva o proletariado, viva a

federação operária de São Paulo, dissolveu-se o comício. Eu trouxe isto aqui para

mostrar para a senhora isto aqui, isto aqui foi um registro histórico, como a maioria

dos operários da fábrica eram mulheres e crianças, este foi o primeiro movimento

operário feminino que se tem registro no Brasil.

N: Nossa mãe, não diga viu, eu não sabia disto.

H: É, é o primeiro movimento operário, isto está registrado na história por conta

deste manifesto aqui, né? Boa parte do empregados por serem mulheres...

N: Mas eu sei que meu sogro era grevista.

H: O sogro da senhora...

N: Quando ele trabalhava na na na

H: O Jacinto...

N: Ele fazia greve.

H: Ah tá, ele fazia greve quando ele trabalhava na Ipiranguinha.

N: Fazia greve, agora com a fábrica dele eu não sei, mas lá ele fazia greve.

H: (risos). Ele fazia greve. Ele puxava greve, lá.

N: Minha sogra falou que ele, o avô do deste prefeito, do também, ele falava:

Ei Marina, você lembra quando nós trabalhava no Ipiranguinha? Eles eram grevistas,

eles faziam greve e meu sogro era cabeça de greve mesmo. Uma vez eu falei prá ele

assim: Eu soube que o senhor fazia greve. Ele falou fazia sim, quando eu era operário

eu fazia greve. Uma vez minha sogra falou que ele comprou bastante comida para

poder sustentar os grevistas porque naquele tempo, não podia fazer greve sem dar

comida para a família, então eles compravam comida, os operários e faziam greve.

H: Estocavam a comida e faziam greve?

N: É, lá no, no, ele também , meu sogro era uma pessoa...

H: Em 1917 teve uma greve grande aqui em Santo André dos tecelões,

realmente.

N: Meu marido, meu sogro não sabia muito, não era muito culto, ele não tinha

muita cultura, mas tinha uma cabeça, que nossa mãe, eu nunca vi uma coisa igual,

né? Meu marido falou que uma vez chegou na 25 de Março, falaram para ele assim,

oh Iolando, você não viu a casa de casimira que o teu pai tem aí? Ele falou casa de

casimira? Vende casimira estrangeira? Quem falou? Ele falou assim era sócio com o

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cunhado que era o Pessolo, e ele não contou nem pros filhos, ele tinha uma loja na

25 de Março ele montou com o cunhado e nem contava pros filhos. Ele era danado

para ganhar dinheiro.

Assuntos aleatórios

H: São sete irmãos do Jacinto. Estes sete irmãos depois tiveram problema

depois na divisão da...

N: Não, foi assim: meu sogro falava que as irmãs, que eram as irmãs, era estas

quatro irmãs, não duas dela, três delas, não, duas delas, é pera ai, não, era cinco

irmãs. Três delas queria muito bem meu sogro, vinha na casa delas, uma morava aqui,

outra morava num bairro ai, elas queriam muito bem meu sogro, e as outras duas

brigaram, porque elas tinham parte, elas entraram na sociedade, com os maridos, a

Pessolo, né? A família Pessolo tudo, e elas quiseram dinheiro. Então meu sogro disse

que pegou o dinheiro, deu para todas elas e depois quando a fiação foi pra frente elas

queriam, ficaram com raiva, né, porque... Mas não, só duas, três não, três nunca ligou

pra nada, as outras duas viviam com raiva dele não se davam com meu cunhado.

H: E dos irmãos, né, o Iolando, o Nevio, o Oliver, que

N: E o Ermelindo, é, que tocaram.

N: O Ermelindo era vendedor.

H: Trabalhava com vendas da tecelagem.

Assuntos aleatórios.

N: Depois ele morreu de diabetes, quando soube que tava diabético deu um

ataque cardíaco e ele morreu, porque ele não se conformava de ficar diabético. Morreu

cedo.

Assuntos aleatórios.

H: Então, ai, a senhora chegou a enfrentar problemas no caso Iolando

presidente, ele teve, é qual foi assim o período mais duro de greves na Tognato, foi

na década de 70, 80?.

N: Não, não, não teve greve. Com meu marido não fazia greve. Não.

H: Tinha até uma empresa em São Bernardo, do Salvador Arena, ela virou

inclusive emblemática porque os operários se recusavam a fazer greve, porque ele

era muito...

N: Ele era muito coiso. Mas o meu marido também, quando tinha greve assim,

que ele tava com muito serviço, ele resolvia tudo na hora ali.

H: Tudo na hora com...

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N: Tudo na hora, nunca teve uma greve feia assim não.

H: Nunca, né?

N: Não. Eu me lembro até que meu marido falava: Não, não, não, vamos

resolver isto, vamos resolver.

H: Então a pior greve que teve foi esta, greve não, né? Foi esta paralização de

51 dias, né, que teve com o Névio em 1995.

N: Foi, foi isso ai, mas com o meu marido não teve nada. Meu marido nunca

tinha, se ameaçavam assim e ele dava um jeito sempre. Aquele tempo a fábrica, ele

prá falar a verdade ficou pouco tempo com a situação financeira da fabrica ruim.

Porque quando ele, nós estávamos no coisa a fábrica vendia muito, tinha muito

dinheiro, né. Então ele não, ele já resolvia os problemas logo. Não tinha, não, não

tinha problema.

H: E a fábrica ela entrou no auge dela com os cobertores, ela começou

fabricando seda...

N: É, mas cobertores...

H: Ah, mas deixa eu te fazer uma pergunta pra senhora, chegou algum

momento a ter uma pequena fábrica de produção de fita de seda pra cobertores na,

no Ipiranga, ali naquela... Presidente Wilson?

N: Não sei se meu sogro tinha sociedade com qualquer coisa, porque fabricava,

eu acho que não, tinha qualquer coisa que depois não, não teve mais nada. Eu acho

que só fabricava na fábrica mesmo.

H: Ficava tudo na fábrica, né? A fábrica ela fazia inclusive as caixas de, ela

montava as caixas de papelão.

N: Ela montava as caixas de papelão, né?

H: Para colocar os...

N: E tinha as caixas né? Não tem, não tem, não teve não, a fábrica fabricava

tudo.

H: Inclusive uma época, ela chegou a fabricar até os teares mesmo, né?

N: É fazia muito teares também.

H: Ela fazia o próprio terá dela prá, prá...

N: Ela fabricava tear, montava tear e fazia. É.

H: Porque não podia importar, era muito caro, ficava muito caro.

N: É depois só que, quando meu marido tava, quando a fiação foi prá lá que o

Névio importou uma colcha, né? É, é isto ai viu, não tem... Meu marido não chegou a

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pegar a situação ruim da fábrica mesmo, muito ruim. Ele morreu em 1995, né? Tinha

cheia de problemas mas...

H: Agora, uma opinião pessoal, a senhora pode dar a sua opinião pessoal. O

que a senhora acha da transformação que ocorreu da Tecelagem Tognato para os

prédios que tem lá? Se a senhora conhece, né? Se a senhora foi?

N: Eu acho que tá tudo bem, tinha que ser, né?

H: Tinha que ser...

N: Tinha que ser aquilo, porque a fiação, ali no centro já ia mal, né, não era,

era uma coisa que ia bem, então eu acho que essa transformação foi muito boa,

porque não podia mais continuar daquele jeito. Imensa daquele jeito, tendo prejuízo,

como é que podia continuar? Não podia.

H: E a senhora também achou satisfatório o acordo com a Cirella?

N: Ah sim, achamos tudo satisfatório. Apesar de ainda ter problema, lá até

agora tem apartamentos pra vender lá, também, parece que tem um tanto de

apartamento pra vender, ainda não tá liberado, apesar de tudo isto, a gente...

H: A senhora achou que foi um bom acordo?

N: Foi um bom acordo e ficamos satisfeitos com tudo. A família ficou satisfeita

porque, sabe foi falado, a verdade, ninguém ficou passando muita necessidade.

H: Todo mundo ficou bem remediado?

N: Ficou bem remediado, ficou todo mundo com seus, com suas renda, tem as

suas renda, então isto ajudou também prá ninguém ficar, ficar, né?

Assuntos aleatórios.

H: O Névio numa entrevista no Diário, ele disse o seguinte, né, que uma das

principais dificuldades que tinha prá se chegar num acordo final daquele terreno eram

que eram 27 acionistas, e era muito difícil estas 27 pessoas entrarem num acordo,

acho que teve um período difícil no começo, não sei.

N: É porque aqueles, aqueles filhos do Lineo que ele tinha uma parte pequena,

foram indenizados, né, e já saíram fora. Quer dizer que então o resto era mais a

família, a família do Jacinto, né, que os outros era tudo... Então todo mundo...

H: Basicamente estes 27 acionistas são da família do Jacinto?

N: São do Jacinto, né? São a minha neta, as minhas enteadas, e a gente tá,

fica de acordo.

Assuntos aleatórios

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H: Deixa eu pedir um ultimo favor para a senhora. Será que a senhora teria

fotos?

N: Não, eu vou ver se a Ermídia arruma. Eu não tenho, mas quem tem é a

Ermídia, minha cunhada.

H: Da antiga tecelagem, do período...

N: É isso ai eu não sei, mas eu vou ver com a Ermídia, que a Ermídia deve ter.

H: Do Iolando na produção, dessas coisas assim.

N: Estas fotografias parece que ficou tudo com a minha cunhada. Eu vou ver

com ela.

H: A Elizabeth falou que teve uma neta da senhora também que gosta muito

destas fotografias também, que possivelmente pode ter uma parte com ela.

N: Não sei,eu vou ver. Isto ai eu vou procurar você me deixa seu telefone,

depois eu procuro e vejo. Tá bom?

H: Tá legal.

Agradecimentos e despedida.

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Anexo II: Legislação

Decreto nº 1.313, de 17 de Janeiro de 1891

Estabelece providencias para regularisar o trabalho dos menores empregados

nas fabricas da Capital Federal.

O Generalissimo Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisorio

da Republica dos Estados Unidos do Brazil, attendendo à conveniencia e necessidade

de regularisar o trabalho e as condições dos menores empregados em avultado

numero de fabricas existentes na Capital Federal, afim de impedir que, com prejuizo

proprio e da prosperidade futura da patria, sejam sacrificadas milhares de crianças,

Decreta:

Art. 1º E' instituida a fiscalização permanente de todos os estabelecimentos

fabris em que trabalharem menores, a qual ficará a cargo de um inspector geral,

immediatamente subordinado ao Ministro do Interior, e ao qual incumbe:

1º Velar pela rigorosa observancia das disposições do presente decreto,

tendo para esse fim o direito de livre entrada em todos os estabelecimentos fabris,

officinas, laboratorios e depositos de manufacturas da Capital Federal;

2º Visitar cada estabelecimento ao menos uma vez por mez; podendo,

quando entender conveniente, requisitar do Ministerio do Interior a presença de um

engenheiro ou de alguma autoridade sanitaria;

3º Apresentar, no mez de janeiro, ao Ministro do Interior, o relatorio das

occurrencias mais notaveis do anno antecedente, relativamente ás condições dos

menores, indicando as medidas que julgar convenientes para a realização efficaz da

Assistencia. Acompanharão o relatorio quadros estatisticos, em que se mencionem os

estabelecimentos inspeccionados, e, quanto aos menores, o nome, idade,

nacionalidade propria e paterna, nota de analphabeto ou não, e outros quaesquer

esclarecimentos.

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Art. 2º Não serão admittidas ao trabalho effectivo nas fabricas crianças de

um e outro sexo menores de 12 annos, salvo, a titulo de aprendizado, nas fabricas de

tecidos as que se acharem comprehendidas entre aquella idade e a de oito annos

completos.

Art. 3º Em cada estabelecimento fabril haverá um livro, aberto e rubricado

pelo inspector, para a matricula dos menores, no qual se escreverão as notas e dados

individuaes de cada um e a data da admissão.

Art. 4º Os menores do sexo feminino de 12 a 15 annos e os do sexo

masculino de 12 a 14 só poderão trabalhar no maximo sete horas por dia, não

consecutivas, de modo que nunca exceda de quatro horas o trabalho continuo, e os

do sexo masculino de 14 a 15 annos até nove horas, nas mesmas condições. Dos

admittidos ao aprendizado nas fabricas de tecidos só poderão occupar-se durante tres

horas os de 8 a 10 annos de idade, e durante quatro horas os de 10 a 12 annos,

devendo para ambas as classes ser o tempo de trabalho interrompido por meia hora

no primeiro caso e por uma hora no segundo.

Art. 5º E' prohibido qualquer trabalho, comprehendido o da limpeza das

officinas, aos domingos e dias de festa nacional, bem assim das 6 horas da tarde ás

6 da manhã, em qualquer dia, aos menores de ambos os sexos até 15 annos.

Art. 6º As officinas destinadas ao trabalho serão sufficientemente espaçosas

e sua cubagem tal que cada operario tenha, pelo menos, 20 metros cubicos de ar

respiravel.

Art. 7º A ventilação das officinas será franca e completa, a juizo do inspector,

o qual poderá obrigar o dono da fabrica, quando for preciso, a empregar qualquer dos

differentes processos de ventilação artificial, de modo que nunca haja risco de

confinamento e impurificação do meio respiratorio.

Art. 8º O solo das officinas será perfeitamente secco e impermeavel, os

detritos inconvenientes promptamente removidos e as aguas servidas esgotadas.

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Art. 9º O inspector geral aconselhará, conforme a qualidade da fabrica, as

demais condições que convenha observar no interesse da hygiene.

Art. 10. Aos menores não poderá ser commettida qualquer operação que,

dada sua inexperiencia, os exponha a risco de vida, taes como: a limpeza e direcção

de machinas em movimento, o trabalho ao lado de volantes, rodas, engrenagens,

correias em acção, em summa, qualquer trabalho que exija da parte delles esforço

excessivo.

Art. 11. Não poderão os menores ser empregados em deposito de carvão

vegetal ou animal, em quaesquer manipulações directas sobre fumo, petroleo,

benzina, acidos corrosivos, preparados de chumbo, sulphureto de carbono,

phosphoros, nitro-glycerina, algodão-polvora, fulminatos, polvora e outros misteres

prejudiciaes, a juizo do inspector.

Art. 12. Ao infractor de qualquer disposição do presente decreto será

imposta pelo inspector, com recurso para o Ministro, dentro do prazo de cinco dias, a

multa de 50$ a 100$, conforme a gravidade do caso, sendo do dobro na reincidencia.

Na imposição e cobrança das multas se observarão as regras estabelecidas

relativamente ás que são impostas por infracção das disposições do regulamento do

serviço sanitario.

Art. 13. Tambem haverá recurso para o Ministro do Interior das intimações

do inspector relativas ás medidas que importem avultada despeza por parte dos donos

dos estabelecimentos ou alteração do plano do edificio, ainda que á ordem daquelle

funccionario tenha precedido o parecer de profissional technico.

Art. 14. O vencimento do inspector será de 4:800$ annuaes, sendo 3:600$

de ordenado e 1:200$ de gratificação, levada a despeza á conta do producto dos

impostos creados com applicação especial aos serviços da Assistencia pelo art. 10 da

lei n. 3395 de 24 de novembro de 1888.

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Art. 15. Em todas as fabricas em que houver menores será affixado um

impresso, contendo as disposições do presente decreto.

Art. 16. E' concedido o prazo de seis mezes para que os donos dos

estabelecimentos fabris os adaptem ao regimen deste decreto.

Art. 17. Revogam-se as disposições em contrario.

Sala das sessões do Governo Provisorio, 17 de janeiro de 1891, 3º da

Republica.

Manoel Deodoro da Fonseca.

José Cesario de Faria Alvim.

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Anexo III: Legislação

Lei 5732/07 | Lei nº 5732 de 20 de setembro de 2007

DISPÕE SOBRE PERMUTA DE ÁREA DE PROPRIEDADE MUNICIPAL COM

ÁREA DE PARTICULAR, E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS. Ver tópico (1 documento)

Projeto de Lei nº 106/2007 - Executivo Municipal WILLIAM DIB, Prefeito do

Município de São Bernardo do Campo, faz saber que a Câmara Municipal de São

Bernardo do Campo decretou e ele promulga a seguinte lei:

Art. 1º Fica o executivo autorizado a permutar imóvel de propriedade do

Município com imóvel pertencente à Pereira Barreto Empreendimentos Imobiliários

SPE Ltda. Ver tópico

Parágrafo Único - As áreas de que trata este artigo estão discriminadas na

planta A0-1453-H, elaborada pela Seção de Cadastro da Secretaria de Planejamento

e Tecnologia da Informação, constante do processo administrativo nº 12550/2007,

desta Prefeitura, e têm as seguintes características: Ver tópico

I - Áreas de propriedade do Município: Ver tópico

ÁREA C Um terreno designado como Área C, com 7.125,59m² (sete mil, cento

e vinte e cinco metros e cinqüenta e nove decímetros quadrados), parte do imóvel

objeto da matrícula nº 17.166 do 1º Registro de Imóveis, localizada na Rua José

Versolato, Bairro Centro, Município de São Bernardo do Campo - Estado de São

Paulo, que assim se descreve e caracteriza:

Tem início no ponto B4, o qual está localizado no alinhamento predial lateral

direito da Rua José Versolato e a área de propriedade do Município de São Bernardo

do Campo (álveo abandonado); desse ponto segue em reta pelo último alinhamento

predial citado, na distância de 2,45m (dois metros e quarenta e cinco centímetros), até

encontrar o ponto A20, confrontando, à esquerda, com a Rua José Versolato; desse

ponto deflete à direita e segue em curva, na distância de 12,88m (doze metros e

oitenta e oito centímetros), até encontrar o ponto A19; desse ponto segue em reta pelo

alinhamento predial lateral direito da Avenida Aldino Pinotti, na distância de 209,63m

(duzentos e nove metros e sessenta e três centímetros), até encontrar o ponto B5,

confrontando, à esquerda, nessas 2 (duas) últimas distâncias, com a Avenida Aldino

Pinotti; desse ponto deflete à direita e segue em reta, na distância de 15,65m (quinze

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metros e sessenta e cinco centímetros), até encontrar o ponto 4, confrontando, à

esquerda, com parte do imóvel objeto da matrícula nº 90.737 do 1º R.I. de propriedade

de Pereira Barreto Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda.; desse ponto deflete à

direita e segue por uma linha sinuosa, na distância de 231,00m (duzentos e trinta e

um metros), até encontrar o ponto B4, ponto esse onde teve início a presente

descrição, confrontando, à esquerda, com área de propriedade do Município de São

Bernardo do Campo (álveo abandonado).

ÁREA D Um terreno designado como Área D, com 974,07m² (novecentos e

setenta e quatro metros e sete decímetros quadrados), parte do imóvel objeto da

transcrição nº 68.931 do 1º Registro de Imóveis, localizada na Rua José Versolato,

Bairro Centro, Município de São Bernardo do Campo - Estado de São Paulo, que

assim se descreve e caracteriza:

Tem início no ponto B4, o qual está localizado no alinhamento predial lateral

direito da Rua José Versolato e a área de propriedade do Município de São Bernardo

do Campo (álveo abandonado); desse ponto segue por uma linha sinuosa, na

distância de 265,27m (duzentos e sessenta e cinco metros e vinte e sete centímetros),

até encontrar o ponto B3, confrontando, à esquerda, com o imóvel objeto da matrícula

nº 17.166 do 1º R.I. de propriedade do Município de São Bernardo do Campo e com

parte do imóvel objeto da matrícula nº 90.737 do 1º R.I. de propriedade de Pereira

Barreto Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda.; desse ponto segue em reta pelo

alinhamento predial lateral direito da Avenida Aldino Pinotti, na distância de 46,52m

(quarenta e seis metros e cinqüenta e dois centímetros), até encontrar o ponto B2,

confrontando, à esquerda, com área de propriedade do Município de São Bernardo

do Campo (álveo abandonado), utilizado pela abertura da Avenida Aldino Pinotti;

desse ponto deflete à direita e segue por uma linha sinuosa, na distância de 291,37m

(duzentos e noventa e um metros e trinta e sete centímetros), até encontrar o ponto

14, confrontando, à esquerda, com o imóvel objeto da matrícula nº 106.091 do 1º R.I.

de propriedade de Pereira Barreto Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda. e com o

imóvel objeto da matrícula 90.740 do 1º R.I. de propriedade de Cidade Tognato S/A

Empreendimentos Imobiliários; desse ponto deflete à direita e segue em reta, na

distância de 4,81m (quatro metros e oitenta e um centímetros), até encontrar o ponto

B4, ponto esse onde teve início a presente descrição, confrontando, à esquerda, com

a Rua José Versolato.

II - Áreas de propriedade particular: Ver tópico

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ÁREA "A4" Um terreno designado como Área "A4", com 1.306,66m² (um mil,

trezentos e seis metros e sessenta e seis decímetros quadrados), destinada ao

alargamento da Avenida Pereira Barreto, parte do imóvel objeto da matrícula nº

106.091 do 1º Registro de Imóveis, localizada na Avenida Pereira Barreto, Bairro

Centro, Município de São Bernardo do Campo, Estado de São Paulo, que consta

pertencer a Pereira Barreto Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda. e que assim se

descreve e caracteriza:

Tem início no ponto A, o qual está localizado no alinhamento predial lateral

esquerdo da Avenida Pereira Barreto e linha de divisa da área de propriedade do

Município de São Bernardo do Campo, objeto da matricula nº 106.090 do 1º Registro

de Imóveis; desse ponto segue em reta pelo alinhamento predial lateral esquerdo da

Avenida Pereira Barreto, na distância de 355,58m (trezentos e cinqüenta e cinco

metros e cinqüenta e oito centímetros), até encontrar o ponto 20; desse ponto segue

em reta, na distância de 10,00m (dez metros), até encontrar o ponto 1, confrontando,

à esquerda, nessas 2 (duas) últimas distâncias, com a Avenida Pereira Barreto; desse

ponto deflete à direita e segue em curva, na distância de 14,20m (quatorze metros e

vinte centímetros), até encontrar o ponto 2; desse ponto segue em reta, na distância

de 1,17m (um metro e dezessete centímetros), até encontrar o ponto A1,

confrontando, à esquerda, nessas 2 (duas) últimas distâncias, com a Rua José

Versolato; desse ponto deflete à direita e segue em curva, na distância de 10,06m

(dez metros e seis centímetros), até encontrar o ponto A2; desse ponto segue em reta

pelo alinhamento predial lateral esquerdo (projetado) da Avenida Pereira Barreto, na

distância de 353,32m (trezentos e cinqüenta e três metros e trinta e dois centímetros),

até encontrar o ponto A3, confrontando, à esquerda, nessas 2 (duas) últimas

distâncias com área de propriedade de Pereira Barreto Empreendimentos Imobiliários

SPE Ltda.; desse ponto deflete à direita e segue em reta, na distância de 3,65m (três

metros e sessenta e cinco centímetros), até encontrar o ponto A, ponto esse onde

teve início a presente descrição, confrontando, à esquerda, com área de propriedade

do Município de São Bernardo do Campo.

ÁREA "A5" Um terreno designado como Área "A5", com 36,16 m² (trinta e seis

metros e dezesseis decímetros quadrados), destinada a abertura da Avenida Aldino

Pinotti, parte do imóvel objeto da matrícula nº 106.091 do 1º Registro de Imóveis,

localizada na Avenida Aldino Pinotti, Bairro Centro, Município de São Bernardo do

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Campo, Estado de São Paulo, que consta pertencer a Pereira Barreto

Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda. e que assim se descreve e caracteriza:

Tem início no ponto B1, o qual está localizado no alinhamento predial lateral

direito da Avenida Aldino Pinotti e linha de divisa da área de propriedade do Município

de São Bernardo do Campo, objeto da matricula nº 106.090 do 1º Registro de Imóveis;

desse ponto segue em reta pelo último alinhamento predial citado, na distância de

46,58m (quarenta e seis metros e cinqüenta e oito centímetros), até encontrar o ponto

B2, confrontando, à esquerda, com área de Pereira Barreto Empreendimentos

Imobiliários SPE Ltda.; desse ponto deflete à direita segue por uma linha sinuosa, na

distância de 46,68m (quarenta e seis metros e sessenta e oito centímetros), até

encontrar o ponto B, confrontando, à esquerda, com área de propriedade do Município

de São Bernardo do Campo (álveo abandonado); desse ponto deflete à direita e segue

em reta, na distância de 1,41m (um metro e quarenta e um centímetros), até encontrar

o ponto B1, ponto esse onde teve início a presente descrição, confrontando, à

esquerda, com área de propriedade do Município de São Bernardo do Campo.

ÁREA "B2" Um terreno designado como Área "B2", com 193,02m² (cento e

noventa e três metros e dois decímetros quadrados), parte do imóvel objeto da

matrícula nº 90.737 do 1º Registro de Imóveis, localizada na Avenida Senador

Vergueiro, Bairro Centro, Município de São Bernardo do Campo - Estado de São

Paulo, que consta pertencer à Pereira Barreto Empreendimentos Imobiliários SPE

Ltda., que assim se descreve e caracteriza:

Tem início no ponto B13, o qual está localizado no alinhamento predial lateral

esquerdo da Avenida Aldino Pinotti e a linha de divisa do imóvel de propriedade de

Fiação e Tecelagem Tognato S/A; desse ponto segue em reta pelo último alinhamento

predial citado, na distância de 15,68m (quinze metros e sessenta e oito centímetros),

até encontrar o ponto B12, confrontando, à esquerda, com a área destinada a abertura

da Avenida Aldino Pinotti; desse ponto deflete à direita e segue em curva, na distância

de 5,80m (cinco metros e oitenta centímetros), até encontrar o ponto B14; desse ponto

segue em reta, na distância de 13,17m (treze metros e dezessete centímetros), até

encontrar o ponto 27; confrontando, à esquerda, nessas 2 (duas) últimas distâncias,

com área remanescente da matrícula nº 90.737 do 1º R.I., de propriedade de Pereira

Barreto Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda.; desse ponto deflete à direita e

segue em curva, na distância de 12,82m (doze metros e oitenta centímetros), até

encontrar o ponto 28; desse ponto segue em reta, na distância de 10,41m (dez metros

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e quarenta e um centímetros), até encontrar o ponto 29, confrontando, nessas 2 (duas)

últimas distâncias, com a área objeto da matrícula nº 90.736 do 1º R.I., de propriedade

do Município de São Bernardo do Campo; desse ponto deflete à direita e segue em

reta na, distância de 9,45m (nove metros e quarenta e cinco centímetros), até

encontrar o ponto B13, ponto esse onde teve início a presente descrição,

confrontando, à esquerda, com área de propriedade de Fiação e Tecelagem Tognato

S/A.

ÁREA "B3" Um terreno designado como Área "B3", com 10.093,84m² (dez mil,

noventa e três metros e oitenta e quatro decímetros quadrados), destinada a abertura

da Avenida Aldino Pinotti, parte do imóvel objeto da matrícula nº 90.737 do 1º Registro

de Imóveis, localizada na Avenida Aldino Pinotti, Bairro Centro, Município de São

Bernardo do Campo - Estado de São Paulo, que consta pertencer a Pereira Barreto

Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda., que assim se descreve e caracteriza:

Tem início no ponto B13, o qual está localizado no alinhamento predial lateral

esquerdo da Avenida Aldino Pinotti e a linha de divisa do imóvel de propriedade de

Fiação e Tecelagem Tognato S/A; desse ponto segue em reta pelo último alinhamento

predial citado, na distância de 297,34m (duzentos e noventa e sete metros e trinta e

quatro centímetros), até encontrar o ponto B6, confrontando, à direita, com o

remanescente do imóvel objeto da matrícula nº 90.737 do 1º R.I. de propriedade de

Pereira Barreto Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda.; desse ponto deflete à

esquerda e segue em reta, na distância de 41,66m (quarenta e metros e sessenta e

seis centímetros), até encontrar o ponto B5, confrontando, à direita, com o leito da

Avenida Aldino Pinotti; desse ponto deflete à esquerda e segue em reta, na distância

de 28,35m (vinte e oito metros e trinta e cinco centímetros), até encontrar o ponto B3,

confrontando, à direita, com o remanescente do imóvel objeto da matrícula nº 90.737

do 1º R.I. de propriedade de Pereira Barreto Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda.;

desse ponto segue por uma linha sinuosa, na distância de 278,87m (duzentos e

setenta e oito metros e oitenta e sete centímetros), até encontrar o ponto 7,

confrontando, à direita, com área de propriedade do Município de São Bernardo do

Campo (álveo abandonado); desse ponto deflete à esquerda e segue em reta, na

distância de 26,11m (vinte seis metros e onze centímetros), até encontrar o ponto B13,

confrontando, à direita, com área de propriedade de Fiação e Tecelagem Tognato

S/A., ponto esse onde teve início a presente descrição, confrontando, à direita, com o

leito da Avenida Aldino Pinotti.

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Art. 2º A permuta de que trata esta lei far-se-á sem reposição de valores por

parte do Município, e de particular. Ver tópico

Art. 3º Antecedendo a lavratura do instrumento público competente, o particular

deverá promover a desistência do feito judicial de indenização por apossamento

administrativo que move em face do Município. Ver tópico

Art. 4º As despesas decorrentes da lavratura e registro da escritura correrão

por conta do particular. Ver tópico

Art. 5º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as

disposições em contrário. Ver tópico

São Bernardo do Campo, 20 de setembro de 2007

WILLIAM DIB

Prefeito

ANTÔNIO ARALDO FERRAZ DAL POZZO

Respondendo pelo Expediente da Coordenação de Assessoramento

Governamental

MIGUEL CORDOVANI

Secretário de Assuntos Jurídicos

CARLOS ROBERTO MACIEL

Secretário de Governo HIROYUKI MINAMI

Secretário de Planejamento e Tecnologia da Informação

MÁRCIA DAMI

Diretora do SG-3