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A “DÉCADA PERDIDA” DAS EXPORTAÇÕES BRASILEIRAS DE BENS INDUSTRIALIZADOS: ANÁLISE DO PERÍODO 2005-2016 Fernando J. Ribeiro 2410

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A “DÉCADA PERDIDA” DAS EXPORTAÇÕES BRASILEIRAS DE BENS

INDUSTRIALIZADOS: ANÁLISE DO PERÍODO 2005-2016

Fernando J. Ribeiro

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TEXTO PARA DISCUSSÃO

A “DÉCADA PERDIDA” DAS EXPORTAÇÕES BRASILEIRAS DE BENS INDUSTRIALIZADOS: ANÁLISE DO PERÍODO 2005-20161

Fernando J. Ribeiro2

1. O autor agradece o apoio da assistente de pesquisa do Ipea Helen Nobre de Oliveira na manipulação e organização de diversas bases de dados utilizadas no trabalho.2. Técnico de planejamento e pesquisa e coordenador de relações econômicas internacionais na Diretoria de Estudos e Relações Econômicas e Políticas Internacionais (Dinte) do Ipea.

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Texto para Discussão

Publicação seriada que divulga resultados de estudos e

pesquisas em desenvolvimento pelo Ipea com o objetivo

de fomentar o debate e oferecer subsídios à formulação e

avaliação de políticas públicas.

© Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – ipea 2018

Texto para discussão / Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.- Brasília : Rio de Janeiro : Ipea , 1990-

ISSN 1415-4765

1.Brasil. 2.Aspectos Econômicos. 3.Aspectos Sociais. I. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.

CDD 330.908

As publicações do Ipea estão disponíveis para download

gratuito nos formatos PDF (todas) e EPUB (livros e periódicos).

Acesse: http://www.ipea.gov.br/portal/publicacoes

As opiniões emitidas nesta publicação são de exclusiva e

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necessariamente, o ponto de vista do Instituto de Pesquisa

Econômica Aplicada ou do Ministério do Planejamento,

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É permitida a reprodução deste texto e dos dados nele

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JEL: F13; F14; O25.

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Fundação pública vinculada ao Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, o Ipea fornece suporte técnico e institucional às ações governamentais – possibilitando a formulação de inúmeras políticas públicas e programas de desenvolvimento brasileiros – e disponibiliza, para a sociedade, pesquisas e estudos realizados por seus técnicos.

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Diretor de Desenvolvimento InstitucionalRogério Boueri Miranda

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Diretor de Estudos e Políticas Setoriais de Inovação e InfraestruturaFabiano Mezadre Pompermayer

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Diretor de Estudos e Relações Econômicas e Políticas InternacionaisIvan Tiago Machado Oliveira

Assessora-chefe de Imprensa e ComunicaçãoMylena Pinheiro Fiori

Ouvidoria: http://www.ipea.gov.br/ouvidoria URL: http://www.ipea.gov.br

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SUMÁRIO

SINOPSE

ABSTRACT

1 INTRODUÇÃO .........................................................................................................7

2 A “DÉCADA PERDIDA” DAS EXPORTAÇÕES DE INDUSTRIALIZADOS .........................9

3 ANÁLISE DE CMS ..................................................................................................18

4 ANÁLISE DE PRODUTOS ........................................................................................40

5 ANÁLISE DE PAÍSES DE DESTINO ...........................................................................46

6 CONCLUSÕES .......................................................................................................53

REFERÊNCIAS ..........................................................................................................57

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR ..............................................................................58

APÊNDICE ...............................................................................................................59

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SINOPSE

O objetivo deste trabalho é analisar o desempenho das exportações brasileiras de produtos industrializados no período 2005-2016, com abordagens que permitam identificar alguns fatores que caracterizaram esse processo, não apenas no nível da atividade industrial como um todo, mas também em termos dos setores de atividade da indústria de transformação, segundo a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). É importante salientar que não se pretende identificar os determinantes do mau desempenho exportador, mas contribuir para um melhor entendimento do que aconteceu com as exportações industriais do país. Para isso, utilizamos bases de dados desagregados das exportações brasileiras e das importações mundiais, para as quais realizamos alguns exercícios de desmembramento das exportações de diferentes formas, com o intuito de analisar e mensurar a magnitude e a relevância de questões como a perda de competitividade do setor, o efeito dos preços relativos e o efeito da composição das vendas em termos de produtos e de países de destino.

Palavras-chave: comércio internacional; competitividade; política industrial.

ABSTRACT

The objective of this study is to analyze the performance of Brazilian exports of industrialized products in the period 2005-2016, with approaches that allow identifying some factors that characterize this process, not only at the level of industrial activity as a whole, but also in terms of the sectors of according to the National Classification of Economic Activity (CNAE) of IBGE. It is important to emphasize that it is not intended to identify the determinants of poor export performance, but to contribute to a better understanding of what happened with the country’s industrial exports. In order to do this, we use disaggregated databases of Brazilian exports and world imports, for which we have carried out some exercises of dismembering exports in different ways, in order to analyze and measure the magnitude and relevance of issues such as the loss of competitiveness of the sector, the effect of relative prices and the effect of the composition of sales in terms of products and countries of destination.

Keywords: international trade; competitiveness; industrial policy.

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A “Década Perdida” das Exportações Brasileiras de Bens Industrializados: análise do período 2005-2016

1 INTRODUÇÃO

O desempenho das exportações da indústria brasileira no período que se seguiu à crise financeira internacional foi decepcionante, a tal ponto que, em 2016, o quantum exportado de bens industrializados1 situava-se 2,6% abaixo do nível observado em 2008. Considerando-se os últimos quarenta anos, ou seja, desde que os bens industrializados alcançaram uma posição de maior destaque na pauta exportadora brasileira, o período recente foi excepcionalmente ruim, caracterizando-se como um longo período de virtual estagnação das vendas. Não por acaso, a participação dos bens industrializados na pauta total do país, que se manteve por volta de 70% entre meados da década de 1980 e da década passada, recuou para cerca de 50% nos anos recentes. Sem qualquer exagero, é possível descrever o período recente como a “década perdida” das exportações de bens industrializados.

Uma consequência direta desse mau desempenho foi a redução do market share (MS) do país no comércio mundial de industrializados. É verdade que este nunca foi muito elevado – em média, de 0,97% entre 1978 e 2008. Todavia, de 2008 para 2016, ele recuou para 0,77 % fazendo o ajuste para o aumento dos preços relativos das exportações brasileiras comparativamente aos preços praticados no comércio mundial, a redução do MS foi ainda maior, de 0,4 p.p. Esses números têm motivado preocupações não apenas quanto ao comportamento da balança comercial brasileira − cujo equilíbrio vem dependendo cada vez mais das exportações de commodities −, mas também quanto ao próprio futuro do setor industrial brasileiro, inserindo-se em um contexto de dificuldades mais amplas enfrentadas pelo setor. Basta registrar que a produção física da indústria de transformação doméstica sofreu contração de 16,4% entre 2008 e 2016.

O objetivo deste trabalho é fazer uma espécie de anatomia do desempenho das exportações brasileiras de produtos industrializados no período 2005-2016, com abordagens que permitam identificar alguns fatores que caracterizaram esse processo, não apenas no nível da atividade industrial como um todo, mas também em termos de

1. Para efeito deste estudo, entende-se por bens industrializados aqueles classificados pela Secretaria do Comércio Exterior (Secex) do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC) como semimanufaturados e manufaturados. Em  determinados pontos do trabalho, usar-se-á também um conceito ligeiramente diferente, que é o de bens da indústria de transformação. Nessas situações, será devidamente explicitada a utilização deste conceito, em vez do de bens industrializados.

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setores de atividade da indústria de transformação, segundo a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). É importante deixar claro que não se pretende aqui identificar os determinantes do mau desempenho exportador, mas sim contribuir para um melhor entendimento do que aconteceu com as exportações industriais. Para isso, lança-se mão de amplas bases de dados desagregados das exportações brasileiras e das importações mundiais e, fundamentando-se nestas, realizam-se alguns exercícios de desmembramento das exportações de diferentes formas, com o intuito de analisar e mensurar a magnitude e a relevância de questões como a perda de competitividade e os efeitos dos preços relativos e da composição das vendas em termos de produtos e países de destino.

Após a seção 2 apresentar alguns números que descrevem a evolução das exportações de industrializados, tanto em uma perspectiva de longo prazo (desde 1980) quanto com foco nos anos mais recentes, a seção 3 apresenta os resultados de um exercício de Constant Market Share (CMS) entre os biênios 2005-2006 e 2015-2016, com números referentes não apenas ao total das exportações de industrializados, mas também para os vinte setores mais importantes da indústria de transformação, segundo a classificação CNAE. A seção inclui também uma discussão sobre os efeitos das variações dos preços relativos das exportações brasileiras comparativamente aos preços mundiais e uma breve análise da relação entre o custo unitário do trabalho (CUT) e a variação do MS. As duas seções seguintes buscam explorar mais a fundo os resultados referentes a cada um dos efeitos derivados da análise de CMS: o efeito competitividade, de variação de produtos e de destinos. A seção 4 realiza um exercício de decomposição das variações de valor exportado em nível de produtos segundo a classificação Standard International Trade Classification, Revisão 3 (SITC Rev. 3) no mesmo período de comparação (biênio 2005-2006 com biênio 2015-2016), de maneira a mensurar o quanto da variação de cada produto pode ser atribuída à variação: i) do MS do Brasil na importação mundial do produto; ii) da participação do produto (PP) na importação mundial total; ou iii) do valor da importação mundial total. A seção 5 realiza o mesmo exercício de decomposição, mas considerando a variação do valor exportado pelo Brasil para os diversos países, em vez de produtos. A última seção resume as principais conclusões do trabalho.

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A “Década Perdida” das Exportações Brasileiras de Bens Industrializados: análise do período 2005-2016

2 A “DÉCADA PERDIDA” DAS EXPORTAÇÕES DE INDUSTRIALIZADOS

As exportações brasileiras de bens industrializados eram pouco significativas até o final da década de 1960, quando, após anos de um processo acelerado de industrialização e mediante a criação de diversos incentivos fiscais, elas começaram a tomar vulto. Em 1978, elas ultrapassaram o valor das exportações de produtos básicos pela primeira vez e mantiveram esta predominância por mais de três décadas. Entre 1978 e 2016 o quantum exportado de industrializados2 teve um crescimento médio de 5,9% ao ano (a.a.), superando o crescimento do produto interno bruto (PIB) (2,4% a.a.) e da produção industrial (1,6% a.a.) no mesmo período. Ou seja, de uma perspectiva de longo prazo, a indústria brasileira é um caso de sucesso exportador nas últimas décadas, ao menos quando se focaliza o aumento das exportações como proporção do PIB e da produção.

O gráfico 1 ilustra esse sucesso, mostrando um forte crescimento ao longo do período considerado, seja em termos de quantum, seja em termos de valor exportado  – ainda que sujeito a flutuações significativas em alguns momentos. Entretanto, o gráfico evidencia que houve uma nítida mudança de tendência em meados da década passada, uma verdadeira quebra estrutural na série, tal que as exportações mantiveram-se virtualmente estagnadas nos últimos oito a dez anos. Com efeito, elas alcançaram seu  pico histórico às vésperas da crise financeira internacional − o quantum atinge seu máximo histórico em 2007 e a série em valor atinge o pico um ano depois – e, após a forte queda registrada em 2009, não foram capazes de retomar a tendência de crescimento que prevaleceu nos trinta anos anteriores (a tendência é representada pela linha tracejada no gráfico). Ao contrário, passam a “andar de lado”, de modo que, em 2016, o quantum ainda estava 6,9% abaixo do pico de 2007 e o valor exportado, 15% abaixo do pico de 2008.

A quebra da trajetória de crescimento que predominou no período 1978-2008 representou uma perda muito significativa para as contas externas do país. Caso elas tivessem mantido nos anos seguintes a mesma taxa de crescimento das três décadas anteriores, o valor exportado de bens industrializados teria alcançado o montante

2. Índice calculado pela Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex).

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de US$ 260 bilhões em 2016, o que significa 156% a mais do que o efetivamente registrado. Fazendo a mesma conta, mas considerando a manutenção da trajetória de crescimento do quantum exportado até 2008 – para descontar o efeito do aumento dos preços de exportação –, as exportações teriam sido de US$ 214,8 bilhões em 2016, com alta de 111% em relação ao valor efetivo. É possível argumentar que tais valores estariam superestimados, sob o argumento de que o valor exportado em 2008 estaria acima da tendência histórica, e de que a retração de 2009 era inevitável ante a crise internacional. De fato, a diferença entre as linhas cheias e as linhas tracejadas no gráfico sugerem que 2008 estava acima da tendência na série em valor, mas, ainda assim, a magnitude do distanciamento entre as linhas de tendência do valor e do quantum efetivamente exportado não deixam dúvidas de que as perdas de exportação foram muito significativas nos últimos anos.

GRÁFICO 1Evolução do valor e do quantum de exportações de bens industrializados no período 1978-2016 e tendência linear baseada no desempenho do período 1978-2008(Em logaritmo natural)

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Quantum Valor

Fonte: Secex/MDIC e Funcex.Elaboração do autor.Obs.: A linha tracejada representa a tendência linear dos itens.

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A “Década Perdida” das Exportações Brasileiras de Bens Industrializados: análise do período 2005-2016

Uma possível explicação para a quebra de tendência das exportações recai sobre o comportamento do comércio mundial. Após a forte queda registrada em 2009 (o quantum mundial caiu 11,8%) e da recuperação em 2010 (crescimento de 13,8%), o ritmo de crescimento do comércio mundial perdeu força em relação à tendência prevalecente nas décadas anteriores. Entre 1978 e 2008, o crescimento médio anual foi de 6,6%, taxa quase duas vezes maior do que a do PIB mundial; já entre 2011 e 2016, o comércio cresceu 3,1% a.a., contra 3,4% do PIB mundial.3 Essa desaceleração tem sido alvo de muitos estudos (IMF, 2016; Kalra, 2016; Constantinescu, Mattoo e Ruta, 2015; Aslam et al., 2017; Lewis e Monarch, 2016), que sugerem diversas explicações para a perda de dinamismo do comércio: i) a fraqueza da recuperação da demanda mundial após a crise; ii) uma possível redução da elasticidade das exportações em relação ao PIB mundial; iii) a ideia de que o crescimento acelerado do comércio nas décadas de 1990 e 2000 foi um evento excepcional, com o desempenho atual sendo simplesmente um “retorno ao normal”; ou, ainda, iv) uma possível perda de importância dos mecanismos de produção globalizada e de desenvolvimento de cadeias globais de valor, que foram uma importante alavanca do comércio mundial nas últimas décadas.

Qualquer que seja a explicação para a desaceleração do comércio mundial, o gráfico 2 evidencia que esse fator não explica o mau desempenho das exportações de industrializados do Brasil. Na verdade, o que se vê é que a indústria brasileira acompanhou de perto o crescimento do comércio mundial de bens industrializados entre 1978 e 2008,4 inclusive com períodos em que seu desempenho foi bem melhor do que o do comércio mundial, como na primeira metade da década de 1980 e na primeira metade dos anos 2000. No entanto, após a queda de 2009, as vendas brasileiras não se recuperaram com a mesma intensidade que as mundiais, abrindo-se uma distância entre as duas séries. Entre 2008 e 2016, o quantum brasileiro acumulou redução de 2,9% e o quantum mundial cresceu 14,1%. Portanto, ainda que a crise financeira mundial e a desaceleração do comércio mundial que se seguiu possam ter contribuído para o mau desempenho das exportações brasileiras de industrializados, não parecem ter sido os principais determinantes.

3. Dados extraídos do World Economic Outlook Database, do Fundo Monetário Internacional (FMI).4. A série de quantum de importação mundial de industrializados foi obtida pelos dados de importação mundial em dólares correntes, extraídos da base de dados Comtrade, deflacionados pelo índice de preço de exportação de manufaturas do World Economic Outlook Database do FMI.

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GRÁFICO 2Quantum de exportações brasileiras e quantum de importações mundiais de produtos industrializados (1978-2016)(Em logaritmo natural)

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Quantum exportação Brasil Quantum importação mundo

2,32,42,52,62,72,82,93,03,13,23,33,43,53,63,73,83,94,04,14,24,34,44,54,64,74,84,9

Fonte: United Nations International Trade Statistics Database (Comtrade), FMI e Funcex.Elaboração do autor.

Uma observação mais acurada do gráfico 2 mostra que, na verdade, as exportações brasileiras de industrializados já haviam começado a perder fôlego bem antes da crise internacional, ainda na virada de 2005 para 2006. O gráfico 3, com dados mensais em médias móveis de doze meses,5 mostra que, já em 2006 e 2007, o quantum exportado de bens industrializados do país crescia mais lentamente do que o quantum das importações mundiais, e esse diferencial de crescimento se manteve, a rigor, até 2015, visto que a distância entre as duas séries cresceu continuamente nesse período. Portanto, duas coisas ficam evidentes: i) fatores de ordem doméstica certamente tiveram um papel importante no

5. A série mensal de quantum de importação mundial de industrializados foi obtida pelos dados de importação mundial em dólares correntes, extraídos da base de dados Comtrade, deflacionados pelo índice mensal de preço de exportação de manufaturas calculado pela Organização Mundial do Comércio (OMC).

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A “Década Perdida” das Exportações Brasileiras de Bens Industrializados: análise do período 2005-2016

mau desempenho das exportações; e ii) não é exagero afirmar que o período compreendido entre 2006 e 2015 foi uma “década perdida” para as exportações de industrializados do país.

GRÁFICO 3Quantum de exportações brasileiras e quantum de importações mundiais de produtos industrializados – médias móveis de doze meses(2005=100)

Exportação Brasil Importação mundial

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6Fonte: Comtrade, FMI e Funcex.Elaboração do autor.Obs.: A linha tracejada representa a tendência linear dos itens.

Outro fato que sugere a relevância de fatores domésticos como condicionantes das exportações industriais é o desempenho da produção industrial doméstica no período considerado. O gráfico 4 ilustra que a produção doméstica se saiu melhor do que as exportações no período de crise e recuperação do biênio 2009-2010. Isso provavelmente se deve ao fato de que a adoção de políticas expansionistas no Brasil propiciou uma queda mais suave e uma recuperação mais intensa da demanda doméstica, comparativamente ao que aconteceu com a mundial. Contudo, a exemplo do que ocorreu com as exportações, a produção doméstica estagnou a partir de 2011, e a situação piorou ainda mais no biênio 2015-2016, diante da forte recessão que atingiu o país.

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GRÁFICO 4Quantum das exportações brasileiras de bens industriais e produção física da indústria de transformação – médias móveis de doze meses(2005=100)

Quantum de exportação industrial

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Produção física da indústria de transformação

Fonte: Comtrade, FMI e Funcex.Elaboração do autor.

O gráfico 5 mostra que o desempenho da indústria de transformação foi consistentemente inferior ao do PIB a partir do final de 2008, de forma que o crescimento industrial acumulado desde então até o final de 2016 foi negativo em 7,8%, ao passo que o PIB cresceu 24,9%, puxado pelo setor de serviços (28,2%) e pela indústria extrativa mineral (41,6%). Esse diferencial de desempenho da indústria é um claro sinal de que o setor enfrentou problemas de competitividade, cujo reflexo foi o deslocamento de recursos para o setor de serviços e para atividades extrativas e agropecuária.6

6. Vale destacar que tais deslocamentos são comuns de ocorrer em países ricos em recursos naturais (como o Brasil) e/ou que convivem com taxas de câmbio reais apreciadas (como foi claramente o caso do Brasil entre 2006 e 2014).

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A “Década Perdida” das Exportações Brasileiras de Bens Industrializados: análise do período 2005-2016

Outro sinal da crescente dificuldade de a indústria nacional enfrentar os concorrentes internacionais é a evolução dos coeficientes de exportação e de importação. O coeficiente de exportação, calculado a preços constantes, caiu de 19,7% em 2005 para 13,8% em 2015.7 No mesmo período, o coeficiente de penetração de importações (participação das importações no consumo aparente doméstico) saiu de 12,7% em 2005 para 16,8% em 2015, após ter alcançado o recorde histórico de 18,2% em 2013.

GRÁFICO 5Séries dessazonalizadas: evolução do índice real do PIB e de componentes selecionados(2005.IV=100)

90

95

100

105

110

115

120

125

130

135

140

145

2005

.IV20

06.I

2006

.II20

06.II

I20

06.IV

2007

.I20

07.II

2007

.III

2007

.IV20

08.I

2008

.II20

08.II

I20

08.IV

2009

.I20

09.II

2009

.III

2009

.IV20

10.I

2010

.II20

10.II

I20

10.IV

2011

.I20

11.II

2011

.III

2011

.IV20

12.I

2012

.II20

12.II

I20

12.IV

2013

.I20

13.II

2013

.III

2013

.IV20

14.I

2014

.II20

14.II

I20

14.IV

2015

.I20

15.II

2015

.III

2015

.IV20

16.I

2016

.II20

16.II

I20

16.IV

Indústrias de transformação PIB Indústrias extrativas Serviços

Fonte: Comtrade, FMI e Funcex.Elaboração do autor.

O resultado do mau desempenho relativo das exportações brasileiras de industrializados resultou na redução de seu MS nas importações mundiais – de 0,97% para

7. Coeficiente medido a preços constantes, calculado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). Dados e metodologia disponíveis em: <https://bit.ly/2m6IQAv>.

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0,75% (-0,18 p.p.) – quando se compara o biênio 2005-2006 com o biênio 2015-2016. O nível atual está entre os mais baixos das últimas décadas, equivalendo-se apenas aos alcançados no biênio 1999-2000. O gráfico 6 mostra que o MS brasileiro já foi bem mais elevado, da ordem de 1,5% em meados da década de 1980, mas desde o início dos anos 1990 ele vem oscilando entre 0,75% e 1,0%.

Uma análise mais precisa do MS necessita levar em conta o impacto dos preços relativos. Isso porque ele é calculado a partir de valores em dólares correntes dos fluxos de comércio, e tais valores dependem do comportamento dos preços médios praticados nas exportações brasileiras e nas importações mundiais. Assim, é necessário calcular um MS ajustado, que desconta da variação do MS as variações dos preços relativos. Na prática, o MS ajustado parte da hipótese de que tanto o valor das exportações brasileiras quanto o das importações mundiais crescem à taxa dada pela variação do quantum, fixando-se os preços relativos no nível prevalecente no ano final da série (2016). Dessa forma, a diferença entre o MS normal e o ajustado em cada ano representa o tamanho do ganho ou perda de MS associado exclusivamente aos preços relativos. Em outras palavras, se o MS normal for maior do que o ajustado em determinado ano, significa que os preços relativos naquele ano foram mais favoráveis ao Brasil do que os preços prevalecentes em 2016; se for menor, os preços relativos no ano foram menos favoráveis do que em 2016.

O resultado dos cálculos do MS normal e ajustado é apresentado no gráfico 6. Observa-se, em primeiro lugar, que durante a maior parte do tempo (a rigor, em todo o período entre 1983 e 2007) o MS normal foi menor do que o ajustado, significando que o preço relativo das exportações brasileiras foi mais baixo do que o prevalecente em 2016 − ou seja, o MS foi menor do que teria sido caso os preços relativos fossem os mesmos de 2016. A diferença foi especialmente elevada entre 1999 e 2005, quando foi, em média, de 0,24 p.p., mas a situação se inverteu a partir de então, tal que, em 2011, registrou-se um ganho de 0,17 p.p. no MS em virtude do aumento do preço relativo. De fato, esse período foi marcado não só por um forte aumento de preços de commodities, mas também por aumentos expressivos nos preços de exportação de bens industrializados do país. Essa questão dos preços relativos será tratada em maior detalhe na subseção 3.3.

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A “Década Perdida” das Exportações Brasileiras de Bens Industrializados: análise do período 2005-2016

O mais importante a considerar aqui é que, ao descontar-se o efeito dos preços relativos, a perda de MS entre os biênios 2005-2006 e 2015-2016 mostra-se muito mais intensa, dobrando de tamanho em relação à perda calculada com o MS normal (-0,39 p.p. contra -0,18 p.p.). Isso significa que a queda de MS poderia ter sido ainda mais expressiva não fosse o comportamento favorável dos preços relativos dos bens exportados pelo Brasil comparativamente aos preços médios de venda desses bens  no comércio mundial total. Esse número reflete mais fielmente a disparidade entre o desempenho das exportações brasileiras e o das importações mundiais de bens industrializados no período: o quantum do comércio mundial de manufaturas cresceu 36,7%, ao passo que o quantum exportado pelo Brasil sofreu queda de 7,1%.

GRÁFICO 6MS das exportações brasileiras de produtos industrializados nas importações mundiais, em dólares correntes e ajustados por preços relativos (1980-2016)(Em %)

0,83

0,98

1,56

1,19

0,93

0,990,96

0,65

0,70

0,75

0,80

0,85

0,90

0,95

1,00

1,05

1,10

1,15

1,20

1,25

1,30

1,35

1,40

1,45

1,50

1,55

1,60

MS industrializados MS industrializados – ajustado por preços relativos

0,77

1980

1981

1982

1983

1984

1985

1986

1987

1988

1989

1990

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

2011

2012

2013

2014

2015

2016

Fonte: Comtrade, FMI e Funcex.Elaboração do autor.

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É justamente em torno dessa perda de MS nas exportações de industrializados nos últimos dez anos que gira toda a análise feita nas próximas seções deste trabalho.

3 ANÁLISE DE CMS

Esta seção apresenta a desagregação da variação do comportamento do MS brasileiro no mercado mundial de bens industrializados com base na metodologia de CMS. Este método parte da ideia de que o MS das exportações de um país no comércio mundial tende a se manter constante, a não ser que determinados fatores venham a alterá-lo. Leamer e Stern (1970, p. 171) mostram que o ritmo de crescimento das exportações de um dado país pode ser maior ou menor do que o ritmo de crescimento das exportações mundiais por três fatores: i) porque seus produtos estariam ganhando ou perdendo competitividade em relação aos produtos dos países concorrentes; ii) porque os principais produtos de sua pauta poderiam estar aumentando ou diminuindo sua participação na demanda mundial de importações; ou iii) porque os principais países de destino de suas vendas estariam ganhando ou perdendo importância relativa nas importações mundiais.

A forma de cálculo de CMS neste trabalho baseia-se na formulação de Fagerberg e Sollie (1987), que decompõe a variação do MS das exportações de um país em cinco efeitos, e não apenas em três. Eles procuraram solucionar um problema relacionado aos efeitos de produtos e de destinos, no sentido de que era incorreto interpretá-los diretamente como resultantes de mudanças na estrutura da pauta, quando na verdade se referem ao efeito advindo da estrutura existente em um dado período utilizado como base para os cálculos (Richardson, 1971).

Com isso, a análise de CMS decompõe a variação de MS em cinco efeitos: além dos mencionados efeito produto, efeito destino e efeito competitividade, há dois efeitos adicionais, que o autor denomina como efeito adaptação em produtos e efeito adaptação em mercados.8 Esses efeitos podem ser interpretados como a capacidade relativa do país em questão de, ao longo do período, adaptar sua estrutura exportadora às mudanças

8. Para uma discussão mais detalhada dessa decomposição, ver Nonnenberg e Carneiro (2015, seção 4).

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A “Década Perdida” das Exportações Brasileiras de Bens Industrializados: análise do período 2005-2016

ocorridas na composição das importações mundiais, tanto no que tange aos produtos comercializados quanto aos mercados envolvidos.

Formalmente, os efeitos podem ser descritos como se segue. Sendo 0 e t os períodos inicial e final, respectivamente; n o número de mercadorias; e s o número de países, e definindo:

• exportações do produto i, do país k para o país l;

• importações do produto i pelo país l;

• market share do país k nas importações mundiais; ;

• market shares, por mercadoria, do país k nas importações do país l; vetor-linha de dimensão n: , onde ;

• participação de cada mercadoria nas importações do país l; vetor-coluna de dimensão n: , onde ;

• c participação de cada país nas importações mundiais; vetor-coluna de dimensão s: , onde ; e

• participação do país k nas importações de cada país; vetor-linha de dimensão s: , onde .

A variação no MS do país em análise nas importações globais (ΔMk) pode ser decomposta em cinco efeitos: 9

(1)

Onde:

• Efeito competitividade: ;

• Efeito composição em produtos: ;

• Efeito composição em destinos: ;

• Efeito adaptação em produtos: ; e

• Efeito adaptação em destinos: .

9. A álgebra detrás dessa decomposição é apresentada em Fageberg e Sollie (1987).

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Os dados utilizados para o cálculo da CMS para o Brasil foram obtidos da base do Comtrade, mantida pelas Organização das Nações Unidas (ONU).10 Foram extraídos os dados das importações totais e das oriundas do Brasil de um conjunto de 38 países, para os quais se dispunham de dados completos, não apenas do valor total das importações, mas também de valores desagregados segundo produtos para os anos de 2005, 2006, 2015 e 2016. Tais países representaram, nos anos em questão, cerca de 90% das exportações brasileiras e 85% das importações mundiais.11 A classificação de produtos utilizada foi a SITC Rev. 3 a quatro dígitos, que possui 489 produtos associados à indústria de transformação.

3.1 Resultados para o total da indústria de transformação

O resultado do cálculo de CMS e seus componentes para o total da indústria de transformação é apresentado no gráfico 7. Para simplificação da análise, os dois componentes referentes aos produtos (efeitos composição e adaptação) são somados, bem como os dois efeitos referentes aos destinos. O resultado mais notável é que a redução de 0,17 p.p. do MS do país nas exportações de bens industrializados no período considerado foi determinada quase totalmente pela perda de competitividade. Sozinho, esse efeito respondeu por uma redução de 0,30 p.p. do MS.

O efeito de destinos compensou em parte a perda de competitividade, representando um ganho de MS de 0.14 p.p. Isso significa que países cujo peso na pauta exportadora brasileira é maior do que na importação mundial tiveram um crescimento de suas importações superior à média mundial no período (que foi de 24,6%). Com efeito, entre os dez principais países de destino das exportações brasileiras de bens industrializados que representam cerca de dois terços da pauta, oito tiveram crescimento de importações superior à média mundial, com destaque para Argentina (77,9%), México (61,1%), Chile (89,2%), China (125,2%) e Rússia (60,5%).

10. Disponível em: <https://comtrade.un.org/data/>.11. Os países considerados são: África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Bélgica, Bolívia, Canadá, Chile, China, Cingapura, Colômbia, Coreia do Sul, Egito, Emirados Árabes Unidos, Espanha, Estados Unidos, França, Holanda, Hong Kong, Índia, Indonésia, Irã, Itália, Japão, Luxemburgo, Malásia, México, Nigéria, Paraguai, Peru, Portugal, Reino Unido, Rússia, Suíça, Tailândia, Taiwan, Uruguai e Venezuela.

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Finalmente, o efeito de produtos foi pouco significativo, contribuindo com redução de apenas 0,01 p.p. no MS. Isso significa que as eventuais alterações da participação no comércio mundial dos principais produtos industriais exportados pelo país tiveram efeito praticamente neutro sobre o desempenho exportador do país.

GRÁFICO 7Análise da CMS das exportações da indústria de transformação (2005-2006 e 2015-2016)(Em %)

-0,36

-0,32

-0,28

-0,24

-0,20 -0,17

-0,30

-0,01

0,14

-0,16

-0,12

-0,08

-0,04

0,00

0,04

0,08

0,12

0,16

0,20

Total Efeito competitividade Efeito variação de produtos Efeito variação de destinos

Fonte: Comtrade.Elaboração do autor.

Com base nos cálculos de CMS, é possível estimar o quanto o Brasil ganhou ou perdeu em termos de valor exportado por conta da variação do MS e de cada um dos seus efeitos da forma discriminada a seguir. Multiplica-se o MS total de 2005-2006 por cada uma das variações percentuais – total ou de cada um dos efeitos. O resultado dessa multiplicação representa o MS que o país teria alcançado caso a variação de cada um dos efeitos fosse zero. Cada resultado é, então, multiplicado pela importação total mundial de bens industriais. A diferença entre o valor assim obtido e o efetivamente exportado representa a perda ou ganho de exportação associado a cada um dos efeitos. Os resultados são mostrados no gráfico 8, no qual valores negativos significam que o valor efetivamente exportado foi inferior ao obtido caso o efeito fosse zero.

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A redução do MS total representou um dano de US$ 13,7 bilhões em exportações de bens industrializados, o equivalente a 14,4% das exportações efetivamente realizadas no biênio 2015-2016. A perda por conta do efeito competitividade foi a grande responsável por esse resultado negativo, visto que representou, isoladamente, um prejuízo de US$ 24,2 bilhões, superando amplamente o ganho de US$ 11,2 bilhões referente ao efeito de destinos. A perda referente à variação de produtos, por sua vez, foi bem pequena, de apenas US$ 707 milhões. Em outras palavras, a perda de competividade custou à indústria brasileira uma perda de faturamento exportador da ordem de 25% em um período de cerca de dez anos, e esse dano impediu que o país se beneficiasse plenamente do efeito positivo da composição demanda externa segundo mercados de destino. Ou seja, o país desperdiçou a oportunidade de obter ganhos significativos de exportação em virtude de os principais mercados de destino das vendas dos produtos industriais nacionais terem tido um crescimento de importações muito superior à média mundial.

GRÁFICO 8Análise da CMS das exportações da indústria de transformação – impacto sobre o valor exportado (2005-2006 e 2015-2016)(Em US$ milhões)

Total Efeito competitividade Efeito variação de produtos Efeito variação de destinos

-30.000,00

-27.000,00

-24.000,00

-21.000,00

-18.000,00

-15.000,00

-12.000,00

-9.000,00

-6.000,00

-13.669

-24.173

-707

11.212

-3.000,00

0,00

3.000,00

6.000,00

9.000,00

12.000,00

15.000,00

Fonte: Comtrade.Elaboração do autor.

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A “Década Perdida” das Exportações Brasileiras de Bens Industrializados: análise do período 2005-2016

3.2 Resultados para os setores industriais

O mesmo exercício de decomposição de efeitos na metodologia CMS foi realizado para as mercadorias distribuídas segundo os setores de atividade a que pertencem – correspondentes a vinte setores da CNAE, excluídos três cujas exportações do país são de montante muito baixo: bebidas, produtos do fumo e impressão e reprodução de gravações. Os resultados são apresentados na tabela 1, que mostra o quanto da variação do MS em pontos percentuais se deveu a cada um dos três efeitos, apresentando também a participação que cada setor teve na pauta de exportação do país para os 38 países considerados nos cálculos. A tabela 2, por sua vez, mostra o quanto a variação do MS e de cada um dos seus efeitos representou em termos de ganho ou perda de valor exportado de cada setor no biênio 2015-2016, em cálculo análogo ao apresentado no gráfico 8. Apresenta, ainda, o quanto o ganho ou a perda representou como proporção do valor efetivamente exportado no biênio 2015-2016.

Sinteticamente, a análise dos resultados conduz às seguintes constatações. Primeiro, a perda de MS foi um fenômeno generalizado, uma vez que apenas cinco setores obtiveram aumento do MS nas importações mundiais no período. Segundo, e talvez a mais importante, é que o efeito competitividade foi o principal determinante da perda de MS em catorze dos quinze setores afetados. A exceção é o setor de produtos químicos, em que o efeito positivo da variação de produtos foi um pouco mais significativo do que o efeito negativo da competitividade. A terceira constatação que se deriva das tabelas é que o efeito de produtos foi pouco significativo na grande maioria dos setores, representando, via de regra, uma variação inferior a 0,1 p.p. do MS total, sendo que exatamente metade dos setores sofreu impacto positivo e metade teve impacto negativo. A quarta constatação é que o efeito de variação de destinos foi positivo e muito significativo para a grande maioria dos setores, com exceção de três: outros equipamentos de transporte, derivados de petróleo e produtos de madeira. No entanto, em nenhum deles a magnitude desse efeito foi suficiente para compensar totalmente o resultado negativo dos efeitos de competitividade e produtos. Na verdade, a alteração da composição da demanda em termos de países de destino teria trazido ganhos de MS para quase todos os setores, mas essa oportunidade não foi aproveitada em virtude da perda de competitividade.

As tabelas 1 e 2 apresentam os setores separados em três grupos, a fim de facilitar a análise. O primeiro grupo inclui os cinco setores que conseguiram aumentar seu MS

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no período considerado, destacados na parte superior da tabela. Merecem destaque os descritos a seguir.

• Celulose e papel – o aumento de competitividade trouxe alta de 1,59 p.p. do MS, o equivalente a um ganho de US$ 1,8 bilhão de exportações. O setor beneficiou-se também de ganhos expressivos pelos efeitos de variação de produtos e destinos. O país é tradicionalmente competitivo na produção de celulose, fato refletido em um crescimento de exportações de mais de 100% no período considerado. As exportações de papel e cartão também tiveram bom desempenho.

• Outros equipamentos de transporte – o aumento de 0,20 p.p. do MS representou um acréscimo de valor exportado de US$ 675 milhões. A maior parte do ganho veio do aumento da competitividade (+0,16 p.p.), mas a variação de produtos também deu contribuição importante (+0,08 p.p.). Cerca de três quartos das vendas brasileiras do setor refere-se aos aviões, em que o MS do país é relativamente elevado (3,77% em 2015-2016) e cresceu em relação ao biênio 2005-2016 (+0,30 p.p.). Todavia, deve-se atentar também para o efeito positivo das exportações de plataformas de petróleo, cujas exportações multiplicaram-se mais de vinte vezes entre os dois biênios, lembrando que se trata de uma exportação ficta, pois o produto não sai efetivamente do país, já que permanece operando no regime de aluguel.

• Produtos farmoquímicos e farmacêuticos – o MS aumentou 0,11 p.p., sendo 0,9 p.p. referente ao efeito competitividade. As exportações brasileiras de medicamentos cresceram 178% no período. Trata-se de um surpreendente caso de sucesso exportador, cujo entendimento demanda estudos mais profundos.

O segundo grupo de setores, ressaltado com fundo cinza nas tabelas, é certamente o mais interessante de analisar, visto que reúne alguns dos setores com maior participação na pauta de industrializados do país – em 2015-2016 eles responderam por quase 60% do total – e nos quais se concentram as maiores perdas de valor exportado do país entre os biênios considerados (tabela 2). A perda varia de cerca de quase US$ 1 bilhão no setor de produtos alimentícios até US$ 5 bilhões em máquinas, aparelhos e materiais elétricos. A perda conjunta somou US$ 16,6 bilhões. Considerando apenas as perdas relacionadas à competitividade, o prejuízo é ainda maior: US$ 24,6 bilhões. De fato, o efeito competitividade foi, em geral, bastante negativo nesses setores (tabela 1), e a maioria deles também sofreu impacto negativo por conta da variação de produtos. Isso impediu que eles se beneficiassem dos efeitos positivos da variação de destinos, que foram bastante expressivos em alguns casos, como produtos alimentícios, veículos automotores e máquinas e equipamentos.

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A “Década Perdida” das Exportações Brasileiras de Bens Industrializados: análise do período 2005-2016

TABELA 1Análise de CMS das exportações da indústria de transformação e dos setores de atividade (2005-2006 e 2015-2016)(Em %)

Setores CNAEVariação

totalEfeito

competitividadeEfeito de variação

de produtosEfeito de variação

de destinosParticipação na

pauta 2005-2006Participação na

pauta 2015-2016

Indústria de transformação -0,17 -0,30 -0,01 0,14 100,0 100,0

Celulose, papel e produtos de papel 2,70 1,59 0,31 0,81 5,1 8,5

Outros equipamentos de transporte, exceto veículos automotores

0,20 0,16 0,08 -0,04 3,4 5,8

Produtos farmoquímicos e farmacêuticos 0,11 0,09 -0,03 0,06 0,6 1,4

Derivados do petróleo, biocombustíveis e coque 0,02 0,13 -0,06 -0,04 0,8 0,9

Indústrias diversas 0,06 -0,03 0,04 0,04 1,0 1,4

Produtos de madeira -2,06 -1,52 -0,23 -0,31 3,8 2,1

Máquinas, aparelhos e materiais elétricos -0,29 -0,33 0,03 0,01 7,0 2,9

Couros e calçados -1,56 -1,16 -0,64 0,24 4,3 3,0

Produtos alimentícios -0,24 -1,13 -0,30 1,19 18,8 24,7

Veículos automotores, reboques e carrocerias -0,37 -0,70 -0,04 0,37 11,0 9,4

Máquinas e equipamentos -0,33 -0,49 0,02 0,14 10,3 7,7

Metalurgia -0,37 -0,44 -0,14 0,21 14,1 10,4

Produtos de metal, exceto máquinas e equipamentos

-0,20 -0,35 0,02 0,13 1,3 1,2

Produtos têxteis -0,47 -0,60 -0,02 0,14 1,5 0,8

Móveis -0,76 -0,90 0,00 0,14 1,2 0,6

Produtos de minerais não metálicos -0,35 -0,33 -0,12 0,10 2,2 2,1

Produtos de borracha e de material plástico -0,09 -0,23 0,00 0,15 4,0 4,5

Confecção de artigos do vestuário e acessórios -0,13 -0,15 -0,00 0,02 0,4 0,1

Produtos químicos -0,02 -0,08 -0,10 0,16 6,1 7,4

Equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos

-0,03 -0,08 0,01 0,03 0,2 0,2

Fonte: Comtrade.Elaboração do autor.Obs.: O total das duas últimas colunas não soma 100% devido à exclusão dos setores de bebidas, fumo e impressão e reprodução de gravações, além de alguns produtos

não classificados.

Esse grupo reúne setores bastante distintos entre si. Três deles são caracterizados por maior conteúdo tecnológico e nos quais o Brasil possui evidentes problemas de competitividade: i) veículos automotores; ii) máquinas, aparelhos e materiais elétricos; e iii) máquinas e equipamentos. Com efeito, as perdas de competitividade desses três significaram um prejuízo de US$ 15,8 bilhões para as exportações do país. Deve-se registrar, ainda, que os três viram sua participação conjunta na pauta exportadora do país cair de 28,3% em 2005-2006 para 20,0% em 2015-2016.

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TABELA 2Análise de CMS das exportações da indústria de transformação e dos setores de atividade – impacto sobre o valor exportado (2005-2006 e 2015-2016)(Em US$ milhões)

Setores CNAE TotalEfeito

competitividadeEfeito de variação

de produtosEfeito de variação

de destinosVariação exportação

total (%)

Indústria de transformação -13.668,5 -24.056,3 -784,5 11.172,4 -14,4

Celulose, papel e produtos de papel 3.039,1 1.786,6 343,5 909,0 37,8

Outros equipamentos de transporte, exceto veículos automotores 675,2 533,5 264,9 -123,2 12,2

Produtos farmoquímicos e farmacêuticos 368,3 277,4 -96,8 187,7 28,6

Derivados do petróleo, biocombustíveis e coque 14,3 96,9 -49,0 -33,6 1,6

Indústrias diversas 267,2 -117,1 197,4 186,8 20,6

Produtos de madeira -1.160,9 -855,2 -128,6 -177,1 -58,8

Máquinas, aparelhos e materiais elétricos -5.006,8 -5.612,7 467,7 138,3 -183,7

Couros e calçados -2.003,7 -1.491,5 -819,6 307,4 -69,8

Produtos alimentícios -986,0 -4.671,4 -1.222,5 4.907,9 -4,2

Veículos automotores, reboques e carrocerias -2.965,1 -5.691,9 -293,5 3.020,3 -33,2

Máquinas e equipamentos -2.990,7 -4.496,6 189,3 1.316,6 -40,7

Metalurgia -1.449,6 -1.740,8 -544,1 835,3 -14,7

Produtos de metal, exceto máquinas e equipamentos -403,8 -707,7 42,8 261,1 -34,2

Produtos têxteis -607,8 -769,2 -21,0 182,5 -78,0

Móveis -760,3 -895,2 0,0 134,9 -130,5

Produtos de minerais não metálicos -424,1 -403,7 -144,3 123,9 -21,7

Produtos de borracha e de material plástico -366,2 -1.000,1 6,9 627,0 -8,6

Confecção de artigos do vestuário e acessórios -268,5 -305,9 -1,3 38,7 -265,1

Produtos químicos -92,8 -444,8 -579,6 931,7 -1,3

Equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos -66,8 -148,0 27,6 53,6 -33,8

Fonte: Contrade.Elaboração do autor.

Há outros dois setores que registraram as maiores quedas absolutas de MS no período: i) produtos de madeira; e ii) couros e calçados. O primeiro teve uma redução de mais de 2 p.p. em seu MS, em sua maior parte devido à perda de competitividade (-1,52 p.p.) e a perda de valor exportado foi de US$ 1,16 bilhão. Em couros e calçados, a queda de MS foi de 1,56 p.p. (1,16 p.p. por conta da competitividade) e o prejuízo exportador alcançou US$ 2 bilhões.

Menos óbvio é entender o que houve com os setores de produtos alimentícios e metalurgia, pois trata-se de setores intensivos em recursos naturais, em que o país tem longa tradição exportadora, beneficiando-se do fácil acesso aos principais insumos da cadeia produtiva. Apesar disso, ambos tiveram perdas significativas de competitividade:

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A “Década Perdida” das Exportações Brasileiras de Bens Industrializados: análise do período 2005-2016

de US$ 4,7  bilhões para o setor alimentício (em sua maior parte compensado por um forte efeito positivo da variação de destinos) e US$ 1,7 bilhão para a metalurgia. Neste último, a explicação mais provável recai nos grandes investimentos em siderurgia e metalurgia realizados por outros países, especialmente a China, criando um excesso de oferta mundial e enfraquecendo a posição competitiva do país. A crise de magnitude mundial que abalou o setor é bem representada pela redução de 8% das importações mundiais de seus produtos entre os biênios considerados.

Quanto ao setor alimentício, o desempenho das exportações brasileiras no período foi positivo no agregado, especialmente as vendas de carnes. Todavia, a perda de MS do país deveu-se principalmente à perda de participação no comércio de óleo e de farelo de soja. Somente esses dois produtos representaram uma perda de exportações de US$ 1,4 bilhão, e sua queda se deu em benefício de um forte aumento das exportações de soja em grão.

Finalmente, o terceiro grupo envolve oito setores de menor expressão em termos de participação na pauta exportadora. A perda conjunta de exportações em função do menor MS foi de US$ 3 bilhões, sendo US$ 4,7 bilhões referentes à perda de competitividade. Neste grupo, há setores mais intensivos em mão de obra, que sofreram com o aumento do CUT no país (móveis, vestuário e têxteis) e também setores em que a produção brasileira sofre com evidentes deficiências competitivas em função de escala de produção e/ou de questões tecnológicas (produtos de metal, químicos, informática e eletrônicos), além dos produtos de borracha e plástico e dos produtos de minerais não metálicos.

3.3 Efeito dos preços relativos

Conforme destacado na seção 2, a variação dos preços relativos das exportações brasileiras em relação aos preços médios praticados nas importações mundiais de um determinado produto pode ter influência na evolução do MS de um país, o qual não é explicitado na decomposição pelo método CMS. O gráfico 4 ilustrou a relevância deste efeito no caso das exportações brasileiras de bens industrializados, dadas as diferenças entre o MS calculado a preços correntes e o MS ajustado para a variação dos preços relativos no período.

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Com efeito, o país foi capaz de manter seu MS no comércio mundial de bens industrializados razoavelmente estável entre 2005 e 2011 apenas em função do aumento dos preços relativos. Quando estes inverteram sua trajetória e passaram a cair, o MS também caiu de forma rápida. Tais movimentos são visualizados mais claramente no gráfico 9, que mostra a evolução mensal dos preços relativos – medidos pela razão entre o índice de preço das exportações brasileiras de bens industrializados e das exportações mundiais de manufaturas calculado pela OMC – e do MS brasileiro nas importações mundiais de industrializados. Ambas as séries são apresentadas em médias móveis de doze meses.

GRÁFICO 9Brasil versus mundo: preço relativo de exportação de bens industrializados e MS brasileiro nas importações mundiais de bens industrializados(Em %)

0,72

0,74

0,76

0,78

0,80

0,82

0,84

0,86

0,88

0,90

0,92

0,94

0,96

0,98

1,00

1,02

98,0

102,0

106,0

110,0

114,0

118,0

122,0

126,0

130,0

134,0

138,0

142,0

146,0

dez

./200

5ab

r./2

006

ago

./200

6d

ez./2

006

abr.

/200

7ag

o./2

007

dez

./200

7ab

r./2

008

ago

./200

8d

ez./2

008

abr.

/200

9ag

o./2

009

dez

./200

9ab

r./2

010

ago

./201

0d

ez./2

010

abr.

/201

1ag

o./2

011

dez

./201

1ab

r./2

012

ago

./201

2d

ez./2

012

abr.

/201

3ag

o./2

013

dez

./201

3ab

r./2

014

ago

./201

4d

ez./2

014

abr.

/201

5ag

o./2

015

dez

./201

5ab

r./2

016

ago

./201

6d

ez./2

016

Preço relativo de exportação de bens industrializados brasileiros/mundo MS Brasil

Fonte: Funcex e OMC.Elaboração do autor.Obs.: Índice com base dez./2005 = 100.

As variações de preços relativos estão implícitas na decomposição de CMS, mais especificamente na variável akl da equação (2), que representa os MS, por mercadoria, do Brasil (país k) nas importações de cada um dos l países da amostra. Devido a

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A “Década Perdida” das Exportações Brasileiras de Bens Industrializados: análise do período 2005-2016

isso, mudanças nesta variável impactam a magnitude do efeito competitividade.12 Esse efeito direto é tal que, quando o preço relativo das exportações brasileiras aumenta, o valor de akl o acompanha. Note-se que, pela equação (2), o efeito competitividade (ou efeito market share) é definido como:

(2)

Considerando que o valor da exportação brasileira (X) é definido pela multiplicação do preço médio de exportação (P) pela quantidade exportada (Q), e que o valor da importação (B) do país l é definido pelo preço médio de importação (PB) e pela quantidade importada (QB) do país l, tem-se que:

(3)

Portanto, é função positiva de e de . O primeiro termo nada mais é do que a razão entre o preço da exportação brasileira e o preço médio de importação do país l, ou, de forma mais abrangente, o preço relativo da exportação brasileira para opaís l e da importação total do país l. O segundo termo é a razão entre o quantum exportado brasileiro e o importado pelo país l. Podemos definir este segundo elemento como sendo o efeito competitividade stricto sensu, pois determina como está evoluindo a participação dos produtos brasileiros no volume de bens importados pelo país l. Portanto, parte daquilo que é medido como sendo ganho ou perda de competitividade no mercado importador de um determinado país pode estar associado não a uma variação de competitividade stricto sensu, mas a aumentos ou reduções de preços relativos.

Diante disso, e considerando os resultados do efeito competitividade medido pela decomposição de CMS entre os biênios 2005-2006 e 2015-2016, surgem três possíveis situações, conforme a seguir descritas.

12. Mudanças em akl também têm impacto sobre o efeito adaptação em produtos, mas este será desconsiderado nesse momento, uma vez que o foco da análise é a questão da competitividade.

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1) Se o efeito competitividade foi negativo (o que significa que a variação de foi negativa) e a variação de preços relativos foi positiva, pode-se afirmar que a perda de competitividade stricto sensu foi maior do que a reportada pela decomposição de CMS.

2) Se o efeito competitividade foi positivo (o que significa que a variação de foi positiva) e a variação de preços relativos foi negativa, pode-se afirmar que o ganho de competitividade stricto sensu foi maior do que o reportado pela decomposição de CMS.

3) Se os sinais do efeito competitividade e da variação dos preços relativos forem iguais, nada se pode afirmar sobre a magnitude do efeito competitividade stricto sensu.

A tabela 3 apresenta a variação do valor exportado total pelo efeito competitividade, e a dos preços relativos entre os biênios considerados para o total da indústria de transformação e para os vinte setores de atividade destacados na subseção 3.2. Como não há dados de preços de exportação do comércio mundial em nível de setores de atividade, o preço relativo foi calculado pela divisão dos índices de preços de exportação setoriais brasileiros, calculados pela Funcex, e os índices de preços ao produtor (Producer Price Index – PPI) setoriais dos Estados Unidos.13 Por se tratar do maior importador mundial de manufaturas e de uma economia com baixíssimos níveis de proteção ao comércio, pode-se considerar que os preços praticados no país refletem, de forma muito próxima, a dinâmica dos preços de comercialização mundiais. Na verdade, é razoável considerar que esse país exerce papel relevante na própria determinação dos preços mundiais.

Os números da tabela 3 sugerem que a real magnitude da perda de competitividade entre os biênios 2005-2006 e 2015-2016 estaria subestimada tanto na indústria de transformação como um todo quanto na grande maioria dos setores, que recaem no primeiro caso descrito acima, ou seja, há perda de competitividade combinada com aumento de preços relativos. Os casos que merecem maior atenção são aqueles destacados com fundo cinza no meio da tabela, que registraram as maiores perdas de exportação pelo efeito competitividade. Destes, cinco tiveram aumento de preços relativos na casa dos dois dígitos − máquinas, aparelhos e materiais elétricos; produtos alimentícios; veículos automotores; máquinas e equipamentos; e produtos de madeira −, indicando que a perda de competitividade stricto sensu foi substancialmente mais elevada do que a reportada pela decomposição de CMS.

13. Calculados pelo Bureau of Labor Statistics (BLS) dos Estados Unidos.

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A “Década Perdida” das Exportações Brasileiras de Bens Industrializados: análise do período 2005-2016

TABELA 3Indústria de transformação dos setores de atividade: variação do valor exportado total e devido ao efeito competitividade e variação do preço relativo das exportações (2005-2006 e 2015-2016)

Setores CNAETotal

(US$ milhões)Efeito competitividade

(US$ milhões)Variação de preço

relativo (%)

Indústria de transformação -13.668,5 -24.056,3 17,2

Celulose, papel e produtos de papel 3.039,1 1.786,6 -5,8

Outros equipamentos de transporte, exceto veículos automotores 675,2 533,5 5,4

Produtos farmoquímicos e farmacêuticos 368,3 277,4 -44,5

Derivados do petróleo, biocombustíveis e coque 14,3 96,9 -4,5

Indústrias diversas 267,2 -117,1 53,6

Produtos de madeira -1.160,9 -855,2 14,4

Máquinas, aparelhos e materiais elétricos -5.006,8 -5.612,7 16,7

Couros e calçados -2.003,7 -1.491,5 6,1

Produtos alimentícios -986,0 -4.671,4 11,0

Veículos automotores, reboques e carrocerias -2.965,1 -5.691,9 18,1

Máquinas e equipamentos -2.990,7 -4.496,6 18,9

Metalurgia -1.449,6 -1.740,8 4,4

Produtos de metal, exceto máquinas e equipamentos -403,8 -707,7 12,9

Produtos têxteis -607,8 -769,2 11,4

Móveis -760,3 -895,2 -10,2

Produtos de minerais não metálicos -424,1 -403,7 -10,5

Produtos de borracha e de material plástico -366,2 -1.000,1 14,9

Confecção de artigos do vestuário e acessórios -268,5 -305,9 39,5

Produtos químicos -92,8 -444,8 -13,2

Equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos -66,8 -148,0 19,9

Fonte: Funcex e BLS.Elaboração do autor.

Dos oito setores da parte inferior da tabela, apenas três – móveis, produtos de minerais não metálicos e produtos químicos − tiveram perda de competitividade e queda de preços relativos, não sendo possível afirmar o que ocorreu com a competitividade stricto sensu. O mesmo vale para outros equipamentos de transporte e indústrias diversas, que tiveram ganho de competitividade com aumento do preço relativo. Na parte superior da tabela, três setores − celulose e papel; produtos farmoquímicos e farmacêuticos; e derivados do petróleo − tiveram ganho de competitividade com redução do preço relativo, indicando que o ganho de competitividade stricto sensu foi maior do que o reportado pela análise de CMS.

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É certo que esse conceito de competitividade stricto sensu deve ser interpretado com a devida cautela, pois parte da hipótese de que qualquer aumento do preço relativo das exportações é resultado de aumentos de custos de produção, refletindo, portanto, uma piora de sua posição competitiva. Tal hipótese parece bastante razoável quando se considera que o mercado internacional de produtos industriais é altamente competitivo na grande maioria dos produtos, mesmo aqueles que tradicionalmente se organizam como oligopólios, como, por exemplo, o setor automobilístico. Nesses casos, a magnitude do mercado mundial garante a coexistência de um número razoavelmente elevado de concorrentes, impedindo que algumas poucas empresas ou países tenham poder suficiente para impor preços. Portanto, o preço pode ser considerado uma variável crucial para determinar a capacidade competitiva.

Sendo assim, caso a indústria brasileira se defronte com uma evolução desfavorável de algumas variáveis – como a produtividade, o salário real, o custo dos insumos ou a taxa de câmbio − relativamente a seus concorrentes internacionais, a reação natural é tentar compensar o aumento de custos com aumento dos preços praticados na exportação. Caso ela consiga exercer tal aumento, isso ocorrerá, quase certamente, em prejuízo da quantidade exportada, o que implicará redução da razão – ou seja, uma perda de competitividade stricto sensu.

No caso brasileiro, o gráfico 10 fornece alguma evidência de que os preços de exportação estão correlacionados a fatores domésticos que afetam a competitividade, como o índice de preços ao produtor amplo (IPA) e o CUT, que é a razão entre o salário real e a produtividade do trabalho.14 Como os preços de exportação são medidos em dólares, o IPA e o CUT também são ajustados pela taxa de câmbio nominal. Com efeito, o gráfico evidencia que os preços de exportação cresceram até o final de 2012 e recuaram a partir de então, movimento semelhante ao observado no CUT e no IPA, sugerindo a ocorrência de algum grau de repasse das variações de custos domésticos para os preços de exportação.

14. O salário real médio refere-se ao rendimento real médio habitual obtido da Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do IBGE até 2015 e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC) em 2015 e 2016. A produtividade é calculada pela divisão do índice de produção física da indústria de transformação obtido da Pesquisa Industrial Mensal – Produção Física (PIM-PF) do IBGE pelo número de horas trabalhadas na indústria obtido da pesquisa industrial da CNI.

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A “Década Perdida” das Exportações Brasileiras de Bens Industrializados: análise do período 2005-2016

GRÁFICO 10Preço de exportação de bens industrializados, CUT e índice de preços ao produtor amplo – médias móveis de doze meses(2006 = 100)

dez

./200

5

abr.

/200

6

ago

./200

6

dez

./200

6

abr.

/200

7

ago

./200

7

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./200

7

abr.

/200

8

ago

./200

8

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./200

8

abr.

/200

9

ago

./200

9

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./200

9

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/201

0

ago

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0

dez

./201

0

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/201

1

ago

./201

1

dez

./201

1

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/201

2

ago

./201

2

dez

./201

2

abr.

/201

3

ago

./201

3

dez

./201

3

abr.

/201

4

ago

./201

4

dez

./201

4

abr.

/201

5

ago

./201

5

dez

./201

5

abr.

/201

6

ago

./201

6

dez

./201

6

65

70

75

80

85

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65

70

IPA-indústria de transformação em US$

75

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110

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120

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130

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150

155

160

165

Preço de exportação de bens industrializados CUT em US$

Fonte: Funcex, IBGE e Fundação Getulio Vargas (FGV).

Entretanto, é possível imaginar também que haja um mecanismo de repasse das variações cambiais para os preços, de forma que, quando há uma valorização cambial, os exportadores procurem aumentar o preço em dólares de forma a não prejudicar sua rentabilidade medida em reais. Inversamente, uma desvalorização permitiria a redução dos preços em dólares sem prejuízo de sua receita em reais. A subseção 3.4 se dedica a entender melhor a relação entre o CUT e o MS ajustado pelos preços relativos, com o intuito de identificar de forma mais clara em que medida as duas variáveis estão ou não correlacionadas.

Entretanto, é preciso deixar claro que nem todo aumento de preço de exportação está necessariamente associado à perda de competitividade. Eles podem ocorrer, também, se houver uma mudança nas características do produto exportado que justifique

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a cobrança de um preço mais elevado – por exemplo, a incorporação de inovações tecnológicas ou algum tipo de diferenciação que o torne mais atraente em relação aos concorrentes. Em níveis mais agregados, o preço de exportação de um determinado setor produtivo pode aumentar caso haja uma mudança na pauta exportadora do setor na direção de produtos com preços médios mais elevados. Nesses casos, mesmo que haja uma redução na quantidade exportada de um produto ou um conjunto de produtos, não se pode afirmar que esteja ocorrendo uma perda de competitividade. Identificar a ocorrências desses dois tipos de fenômenos, contudo, é tarefa praticamente impossível, mesmo que se disponha de dados de fluxos de comércio suficientemente desagregados em nível de produtos e países.

3.4 CUT

O custo da mão de obra é um dos principais elementos determinantes da competitividade da produção industrial. Essa importância é tão maior quanto mais intensiva em trabalho for a estrutura produtiva de um bem. Entretanto, o custo salarial tem impacto amplo sobre toda a economia, não só pela via direta, relacionada às despesas de uma empresa ou setor com salários e encargos, mas também pela via indireta, por meio do peso que os salários têm no custo dos insumos. O impacto dos salários sobre o custo final de um bem depende não apenas do salário médio pago aos trabalhadores, mas também da produtividade da mão de obra. Um aumento de salários que seja equivalente ao aumento da produtividade da mão de obra tende a ter efeito nulo sobre o custo final de produção.

Por isso, a variável mais comumente utilizada para avaliar o impacto dos salários sobre a competitividade é o CUT, que é a razão entre o salário real médio por empregado e a produtividade média do trabalhador.15 Quando a análise está voltada para a competitividade em relação aos concorrentes no mercado internacional, deve-se adicionar também o efeito da taxa de câmbio sobre o custo unitário. Isso porque, em tese, um eventual aumento de salário em reais pode ser compensado por uma desvalorização cambial, de modo que o custo salarial medido em dólares – que é o que importa em termos de comparações internacionais – não

15. Bonelli (2012); Mello e Barbosa Filho (2014).

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A “Década Perdida” das Exportações Brasileiras de Bens Industrializados: análise do período 2005-2016

se altera. Para isso, calcula-se o CUT em dólares, que nada mais é do que a razão entre salário e produtividade dividida pela taxa de câmbio nominal R$/US$.

Nesse sentido, pode-se imaginar que a perda de competitividade da indústria brasileira ao longo do período 2005-2016, e a consequente redução do MS do país, esteja correlacionada com a evolução do CUT em dólares. Este último é calculado para a indústria de transformação brasileira da seguinte forma: o salário real médio é obtido a partir dos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD),16 considerando o rendimento médio mensal, em reais correntes, das pessoas ocupadas na indústria de transformação e em cada um dos setores a ela relacionados, deflacionado pelos respectivos Índices de Preços ao Produtor Amplo-Origem (IPA-OG) da FGV. A produtividade é calculada tomando-se os índices de produção física da indústria de transformação e de seus setores, extraídos da PIM-PF do IBGE e dividindo-os pelo número de pessoas ocupadas em cada segmento, dados estes extraídos da PNAD.17 Por fim, divide-se o salário real médio pela produtividade e o resultado é dividido pela taxa de câmbio média de venda, obtida na base do Banco Central do Brasil (BCB).

O gráfico 11 apresenta, para o período 2005-2016, a evolução do MS da indústria de transformação ajustado para a variação dos preços relativos, conforme apresentado anteriormente, e a evolução do CUT em dólares.18 Observa-se uma clara correlação negativa entre as séries, mais nitidamente entre 2005 e 2012 (note-se que a série do CUT está em escala invertida). Já nos anos posteriores, há um descolamento, com uma forte redução do CUT – que em 2016 alcança um nível inferior ao do início da série − e apenas um discreto aumento do MS.

16. Como não há informações da PNAD para 2016, utilizam-se as séries equivalentes disponível na PNADC e aplicam-se, nos dados de 2015 da PNAD, as variações dos dados da PNADC entre 2015 e 2016.17. Idem.18. Certamente o ideal seria que o gráfico contivesse a série anual da variação do efeito competitividade em vez do MS. De qualquer modo, tendo em vista que a análise da seção 3 mostrou que a variação do MS é função direta da variação da competitividade, é razoável adotar a hipótese de que a variação do MS é uma boa proxy para a variação da competitividade, ao menos no período analisado.

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GRÁFICO 11Indústria de transformação: CUT e MS ajustado por preços relativos(2005 = 100)

CUT em dólares MS industrializado ajustado por preços relativos

0,68

0,72

0,76

0,80

0,84

0,88

0,92

0,96

1,00

1,04

1,08

1,12

1,16

1,2080

90

100

110

120

130

140

150

160

170

2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016

Fonte: IBGE, BCB e Comtrade.

O gráfico 12 evidencia que a queda do CUT a partir de 2013 foi determinada primordialmente pela desvalorização da taxa de câmbio, na qual o dólar saiu de menos de R$ 2,00 em 2012 para R$ 3,49 em 2016. O salário real médio continuou crescendo até 2014 e teve apenas leve recuo em 2015 e 2016, mas ainda estando, neste último ano, 37% acima do nível de 2005, e a produtividade manteve-se virtualmente estagnada entre 2010 e 2016.

Ao retirar a taxa de câmbio e considerar o CUT em reais – ou seja, apenas a razão entre salário médio e produtividade –, a correlação entre o CUT e o MS ajustado fica muito mais forte, como se vê no gráfico 13. À exceção do triênio 2009-2011, em que os dados tiveram grande volatilidade, as séries caminham muito próximas, inclusive nos anos finais da série, nos quais a queda do CUT é acompanhada pelo aumento do MS ajustado. Portanto, aparentemente, a taxa de câmbio não é uma variável tão relevante para determinar a competitividade das exportações − conclusão, aliás, que está em linha com a literatura empírica sobre o tema, a qual identifica uma relação frágil ou inexistente entre taxa de câmbio e exportações de bens industrializados.19

19. Para uma discussão mais detalhada desse tema, ver Padrón et al. (2015).

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GRÁFICO 12Indústria de transformação: evolução dos componentes do CUT(2005 = 100)

2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016

65

70

75

80

85

90

95

100

105

110

115

120

125

130

135

140

145

Câmbio Produtividade pessoas ocupadas Salário médio real

Fonte: IBGE e BCB.

GRÁFICO 13Indústria de transformação: CUT e MS ajustado por preços relativos(2005 = 100)

2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016

CUT em reais MS industrializado ajustado por preços relativos

0,68

0,72

0,76

0,80

0,84

0,88

0,92

0,96

1,00

1,04

1,08

1,12

1,16

1,2099

102

105

108

111

114

117

120

123

126

Fonte: IBGE, BSB e Comtrade.Elaboração do autor.

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É verdade que a identificação de uma correlação entre duas variáveis pode não significar nada, sendo necessária a realização de exercícios econométricos que controlem a relação entre o CUT e o MS para outras variáveis relevantes, tarefa que está além dos objetivos deste trabalho. De qualquer forma, os dados sugerem fortemente que variações do CUT explicam boa parte da perda de competitividade da indústria de transformação no período analisado e a consequente perda de MS. Se isto for verdade, e em se mantendo a tendência recente de redução do CUT, as exportações de bens industrializados podem ter um período de bom crescimento nos anos vindouros.

Os dados em nível setorial, por sua vez, são menos conclusivos quanto à relação entre CUT e competitividade. A tabela 4 apresenta o tamanho do efeito competitividade em pontos percentuais e em milhões de dólares; e a variação do CUT em reais para os vinte setores considerados. Infelizmente, como não se dispõe de dados setoriais na PNAD que permitam calcular o CUT para 2016, faz-se a comparação entre os biênios 2004-2005 e 2014-2015, a fim de considerar um intervalo equivalente de dez anos. A tabela mostra que quase todos os setores tiveram aumento expressivo do CUT no período, e que as exceções − móveis; produtos químicos; máquinas, aparelhos e materiais elétricos; e indústrias diversas – não se referem a setores que tiveram desempenho positivo da competitividade. Na verdade, mesmo os setores que ganharam competitividade, como celulose e papel e outros equipamentos de transporte, tiveram grande aumento do CUT. Portanto, não é possível identificar uma correlação clara entre o tamanho da variação do CUT e o tamanho de perda ou ganho de competitividade no nível dos setores de atividade.

É provável que a ausência de correlação entre a variação do CUT e a magnitude do efeito competitividade reflita simplesmente o fato de que o custo da mão de obra tem efeito diferenciado entre os setores. Seria de se esperar que setores mais intensivos em trabalho − como couros e calçados; vestuário; produtos de madeira; e produtos têxteis − tivessem sua competitividade muito ligada à evolução do CUT; de fato, estes estão entre os setores que tiveram maior aumento do custo do trabalho no período analisado e sofreram perdas significativas por conta do efeito competitividade. No  entanto, setores mais intensivos em capital ou em recursos naturais deveriam ser pouco sensíveis ao CUT. Isso é verdade para alguns setores, inclusive os quatro que tiveram ganhos de competitividade no período, mas não para todos. Os casos de veículos automotores; máquinas e equipamentos; e produtos de metal, por exemplo, sugerem um impacto importante do CUT sobre a competitividade.

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TABELA 4Efeito competitividade, Índice de Vantagens Comparativas Reveladas (IVCR) e variação do CUT

Setores CNAE Efeito competitividade IVCR Saldo comercial ajustado (US$ milhões)

p.p. US$ milhões 2005-2006 2015-2016 2005-2006 2015-2016

Celulose, papel e produtos de papel 1,59 1.786,63 3,3 6,0 1.833,8 7.502,3

Outros equipamentos de transporte, exceto veículos automotores 0,16 533,50 1,1 1,4 754,5 4.089,2

Produtos farmoquímicos e farmacêuticos 0,09 277,36 0,2 0,3 -3.317,1 -5.532,8

Derivados do petróleo, biocombustíveis e coque 0,13 96,89 0,8 1,0 -836,9 -5.851,0

Produtos alimentícios -1,13 -4.671,40 4,3 4,8 18.522,5 31.538,4

Produtos de madeira -1,52 -855,18 4,1 2,9 2.124,9 3.257,9

Metalurgia -0,44 -1.740,79 2,1 2,1 9.574,6 12.733,4

Couros e calçados -1,16 -1.491,54 2,8 1,9 2.477,7 3.540,9

Produtos de minerais não metálicos -0,33 -403,68 1,4 1,3 456,4 1.790,1

Veículos automotores, reboques e carrocerias -0,70 -5.691,90 1,1 0,9 7.121,8 -783,8

Móveis -0,90 -895,18 1,0 0,5 -34,4 1.181,0

Produtos químicos -0,08 -444,78 0,9 1,0 -7.365,9 -18.182,1

Equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos -0,08 -148,02 0,1 0,1 -10.002,2 -15.330,3

Máquinas e equipamentos -0,49 -4.496,64 0,8 0,7 -2.066,3 -7.028,4

Máquinas, aparelhos e materiais elétricos -0,33 -5.612,72 0,3 0,1 -1.293,7 -3.128,1

Produtos de borracha e de material plástico -0,23 -1.000,11 0,8 0,8 -1.059,2 -736,0

Confecção de artigos do vestuário e acessórios -0,15 -305,87 0,1 0,0 -823,2 -581,0

Produtos de metal, exceto máquinas e equipamentos -0,35 -707,69 0,6 0,5 -897,4 -174,2

Produtos têxteis -0,60 -769,24 0,8 0,5 -267,4 593,5

Indústrias diversas -0,03 -117,08 0,2 0,2 1.425,0 3.581,6

Fonte: Comtrade e SECEX/MDIC.Elaboração do autor.

Na prática, os números evidenciam que vários outros fatores precisam ser levados em conta para explicar a variação da competitividade em cada setor, e que a importância relativa de cada um desses fatores varia de setor para setor. Apenas a realização de exercícios econométricos que permitam o controle para outros aspectos relevantes da competitividade poderiam identificar em que grau a competitividade de cada um dos setores é sensível a variações do CUT. Sendo assim, embora a análise feita aqui permita antever uma melhoria do desempenho exportador nos próximos anos caso o CUT mantenha o movimento de queda observado no último biênio, não é possível antever quais setores poderiam ter melhor desempenho em termos de ganhos de competitividade em função disso.

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4 ANÁLISE DE PRODUTOS

A decomposição das exportações conforme a metodologia de CMS demonstrou que o efeito de variação de produtos não teve impacto relevante sobre o MS total do país nas exportações de industrializados. Isso não significa, contudo, que não tenha havido mudanças relevantes na composição da pauta exportadora do país. Com o objetivo de explorar mais a fundo o que ocorreu com a composição das exportações brasileiras de  bens industrializados segundo produtos, esta seção apresenta um exercício que objetiva decompor a variação do valor exportado dos diversos produtos no mesmo período de comparação (biênio 2005-2006 com biênio 2015-2016), de maneira análoga – mas não idêntica – ao exercício de CMS apresentado na seção anterior. O valor da exportação brasileira de um determinado produto pode ser definida como:

V = ms.pp.imp (4)

Onde V = valor de exportação do produto; ms = MS do Brasil na importação mundial do produto; pp = PP na importação mundial total; e imp = importação mundial total. Assim, a variação absoluta do valor de exportação de cada produto pode ser representada pela seguinte equação:

V1 – V0 = (ms1.pp1.imp1) – (ms0.pp0.imp0) (5)

Algebricamente, temos que:

(ms1.pp1.imp1) – (ms0.pp0.imp0) =

= (ms1.pp1.imp1) – (ms1.pp0.imp0) + (ms1.pp0.imp0) – (ms0.pp0.imp0) =

= (ms1 – ms0).(pp0.imp0) + ms1.(pp1.imp1 – pp0.imp0) =

= (ms1 – ms0).(pp0.imp0) + ms1.( pp1.imp1 – pp0.imp1 + pp0.imp1 − pp0.imp0)

= (ms1 – ms0).(pp0.imp0) + ms1.[(pp1 – pp0).imp1 + (imp1 − imp0).pp0]

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Portanto:

V1 – V0 = [(ms1 – ms0).(pp0.imp0)] + [(pp1 – pp0).ms1.imp1] + [(imp1 − imp0).ms1.pp0] (6)

Sendo:

(ms1 – ms0).(pp0.imp0) = variação do valor exportado do produto em resposta à variação do MS do Brasil na importação mundial do produto.

(pp1 – pp0).ms1.imp1 = variação do valor exportado do produto em resposta à variação da PP na importação mundial total.

(imp1 − imp0).ms1.pp0 = variação do valor exportado do produto em resposta à variação do valor da importação mundial total.

O exercício foi realizado a partir da mesma base de dados utilizada na seção anterior, que considera as importações mundiais como sendo as importações de um conjunto de 38 países selecionados e desagrega as importações segundo a classificação de produtos SITC Rev. 3 a quatro dígitos, que possui 489 produtos associados à indústria de transformação. Feita a decomposição para cada um desses produtos, eles foram divididos em quatro grupos, de acordo com o que ocorreu com o MS do país na importação mundial do produto e com a PP na importação mundial entre os biênios considerados: i) grupo 1: aumento do MS e aumento da PP; ii) grupo 2: aumento do MS e queda da PP; iii) grupo 3: queda do MS e aumento da PP; e iv) grupo 4: queda do MS e queda do PP.

A tabela 5 resume os resultados da decomposição proposta para o total dos produtos da indústria de transformação e para cada um dos grupos acima definidos. A  tabela apresenta, na parte com fundo cinza, a variação do valor exportado brasileiro dos produtos entre a média dos biênios 2005-2006 e 2015-2016 e a decomposição desta variação entre os efeitos de MS, de PP e de importação mundial. A primeira coluna da tabela mostra que a queda de 0,17 p.p. do MS total dos produtos industriais resultou de um crescimento das exportações brasileiras de 9,0% ante uma expansão de 24,6% das importações mundiais.20

20. Lembrando que o “mundo” aqui considerado é representado por um conjunto de 38 países, conforme exposto na seção anterior.

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A queda do MS representou, isoladamente, uma perda de US$ 11 bilhões nas exportações do país, e o resultado final só foi positivo em US$ 7,8 bilhões em virtude do efeito do crescimento da importação mundial. O efeito da participação dos produtos, neste caso, é zero por definição, já que os efeitos de cada produto se anulam no resultado agregado.

TABELA 5Indústria de transformação: decomposição da variação do valor exportado segundo grupos de produtos

Produtos SITC 4 dígitosTotal de produtos da indústria de transformação

Aumento de MS Queda de MS

Aumento de PP (Grupo 1)

Queda de PP (Grupo 2)

Aumento de PP (Grupo 3)

Queda de PP (Grupo 4)

Número de produtos 489 96 85 146 162

Variação do MS (em pontos percentuais) -0,17 0,43 1,46 -0,41 -0,50

Variação da PP (em pontos percentuais) - 3,5 -2,5 7,0 -8,1

Variação do valor exportado (US$ milhões) 7.819,7 14.415,2 7.158,3 -634,0 -13.119,7

Devido à variação de MS -10.967,9 4.238,9 8.895,5 -8.807,8 -13.173,6

Devido à variação de PP - 5.437,0 -7.249,1 4.207,5 -5.038,5

Devido à variação da importação mundial 18.787,6 4.739,2 5.511,9 3.966,3 5.092,4

MS 2015-2016 (%) 1,20 1,94 3,68 0,75 0,78

MS 2005-2006 (%) 1,37 1,51 2,22 1,16 1,28

PP 2015-2016 (%) 100,0 19,07 7,05 40,61 33,27

PP 2005-2006 (%) 100,0 15,55 9,53 33,57 41,35

Crescimento exportações brasileiras (%) 9,0 96,00 53,10 -2,50 -38,80

Crescimento importações mundiais (%) 24,6 52,90 -7,80 50,70 0,30

Fonte: Comtrade.Elaboração do autor.

Analisando-se os números referentes aos quatro grupos, alguns aspectos se destacam. O primeiro é que a maioria dos produtos tive queda do MS − 308 de um total de 489 itens, referentes aos grupos 3 e 4. Os produtos que obtiveram aumento de MS e também de PP (grupo 1) foram menos de 20% do total de itens, e um número semelhante de produtos teve aumento de MS com queda de PP (grupo 2).

O segundo ponto a destacar, talvez ainda mais importante do que o primeiro, é que os produtos que perderam MS – grosso modo, produtos em que o país vem perdendo competitividade − têm participação amplamente dominante no comércio mundial, tendo respondido por 74% do total no biênio 2015-2016. Nestes dois grupos, chama atenção também o fato de que as exportações brasileiras tiveram redução do valor exportado em termos nominais. Em outras palavras, as exportações brasileiras sofreram queda em um grupo de produtos que representa quase três quartos do comércio mundial, e o melhor desempenho ficou restrito a um grupo que representa menos de 20% do comércio mundial.

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Os gráficos 14 e 15 ilustram os principais resultados desta análise. O desempenho exportador do país foi muito bom em cerca de 20% dos produtos analisados (96 produtos), que representaram, no biênio 2015-2016, 19% do comércio mundial e 30,9% das exportações brasileiras de bens industrializados. São produtos com os quais o país conseguiu reunir ganho de MS em relação ao biênio 2005-2006 (+0,43  p.p.) e bom dinamismo das importações mundiais no mesmo período (aumento da participação no total de 3,52 p.p.). Sua participação na pauta exportadora brasileira cresceu ainda mais: 14 p.p., aproximadamente. Com efeito, trata-se do grupo mais dinâmico da pauta, combinando um forte crescimento das exportações (96,0% no período) com uma demanda mundial em rápida expansão (52,9%, quase o dobro da taxa total). Consequentemente, esses produtos foram responsáveis por um importante aumento das exportações do país no período (+US$  14,4  bilhões), ganho esse devido tanto ao efeito MS (US$ 4,2 bilhões) quanto ao efeito de participação dos produtos na importação mundial (US$ 5,4 bilhões), além do efeito da demanda mundial (US$ 4,7 bilhões). Os produtos de destaque nesse grupo são celulose, aviões, carnes de frango e bovina, polímeros, medicamentos e embarcações.

GRÁFICO 14Dados selecionados segundo grupos de produtos da indústria de transformação(Em %)

0,431,46

0,41 0,50

3,52

-2,48

7,04

-8,08

13,75

6,26

3,01

-16,99-18

-15

-12

-9

-6

-3

0

3

6

9

12

15

18

Variação do MS do Brasil Variação da participação do produto na importação mundial

Variação da participação do produto na pauta Brasil

Grupo 1 - 96 produtos30,9% x 19,1%

Grupo 2 - 85 produtos21,7% x 7,1%

Grupo 3 - 146 produtos25,5% x 40,6%

Grupo 4 - 162 produtos21,8% x 33,3%

Fonte: Comtrade.Elaboração do autor.

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GRÁFICO 15Variação das exportações em função dos efeitos de MS, participação de produtos e demanda mundial, segundo grupos de produtos da indústria de transformação(Em US$ milhões)

Ganho potencial (PP + importação mundial) Variação devida ao MS

Indústria total Grupo 1 -96 produtos

Grupo 2 -85 produtos

Grupo 3 -146 produtos

Grupo 4 -162 produtos

10.176 8.174

-10.968

18.7884.239

8.896

-8.808

-13.174

54

-14.000

-12.000

-10.000

-8.000

-6.000

-4.000

0

2.000

4.000

6.000

8.000

10.000

12.000

14.000

16.000

18.000

20.000

-2.000-1.737

Fonte: Comtrade.Elaboração do autor.

O desempenho exportador do país também foi bom em outro grupo, que reúne 85 produtos (17,4% do total), cuja participação nas exportações brasileiras foi de  21,7% em 2015-2016. Esse conjunto registrou o maior MS agregado do país em 2015-2016 (3,7%), com as exportações brasileiras tendo crescimento de 53% em relação a 2005-2006. Entretanto, tais produtos vêm tendo baixo dinamismo no comércio mundial (queda de participação no comércio mundial de 2,48 p.p. entre os biênios) e representam uma parcela pequena deste (7,1%). Foi nesse grupo que o país registrou o maior ganho de exportação em virtude do MS (US$ 8,9 bilhões), mas o efeito de participação de produto foi negativo em US$ 7,25 bilhões, compensando a maior parte do ganho referente ao MS. Portanto, são produtos em que o país ganhou competitividade, mas o resultado final em termos de aumento de exportação foi muito limitado em virtude do fraco desempenho da demanda mundial. Entre os produtos que compõem este grupo, os mais importantes para as exportações brasileiras são ferro-ligas, couros, sucos, artefatos de ferro, pedras para construção, papel e cartão e bobinas de aço.

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A “Década Perdida” das Exportações Brasileiras de Bens Industrializados: análise do período 2005-2016

O terceiro grupo reúne 146 produtos, que responderam por 40,6% das importações mundiais em 2015-2016 e por 25,5% das exportações brasileiras. É neste grupo que se encontram as principais oportunidades perdidas de expansão das exportações de industrializados, uma vez que tiveram desempenho dinâmico no comércio mundial (alta de 7 p.p. na pauta), mas as exportações brasileiras sofreram queda de 2,5% no período considerado, resultado em uma redução de MS de 0,41 p.p. Tal redução representou uma perda de exportações equivalente a US$ 8,8 bilhões, compensando o ganho potencial de US$ 8,2 bilhões advindo do aumento da importação mundial e da participação dos produtos no comércio. Em síntese, são produtos com bom dinamismo em termos da demanda mundial, mas com os quais o país tem problemas de competitividade que impedem o aproveitamento das oportunidades. Entre os produtos deste grupo destacam-se açúcar em bruto, farelo de soja, óleo de soja, pneus, tratores rodoviários, partes para motores de veículos, móveis, calçados, bombas e centrífugas.

Por fim, o último grupo congrega 162 produtos, que representam um terço das importações mundiais e 21,8% das exportações brasileiras. Esses produtos conjugam baixo dinamismo do comércio mundial (queda de 8 p.p. participação dos produtos entre os biênios) com perda de competitividade da produção nacional (redução de 0,5 p.p. do MS brasileiro). Não por acaso, este grupo foi responsável pela maior perda total de exportações do país no período (-US$ 13,1 bilhões), com perda de US$ 13,2 bilhões devido ao MS e de US$ 5 bilhões devido à participação dos produtos – este último valor foi quase idêntico ao efeito positivo do aumento da importação mundial. Entre os itens que compõem esse grupo e que possuem participação relevante na pauta exportadora brasileira estão automóveis, caminhões, ônibus, motores a combustão, álcool, madeira serrada, alumínio, ferro-gusa e ferro fundido.

Em resumo, a análise precedente mostra um quadro pouco animador, no qual: i) o país teve bom desempenho exportador em um número relativamente pequeno de produtos, que representam pouco mais de um quarto das importações mundiais; ii) em apenas 20% dos produtos houve uma combinação de ganho de MS do país com aumento da participação dos produtos nas importações mundiais (produtos dinâmicos); iii) o país perdeu competitividade em mais de 60% dos produtos exportados, produtos estes que respondem por quase três quartos das importações mundiais; e iv) o país não foi capaz de aproveitar oportunidades de aumento de exportações em um grupo de produtos que representam cerca de 40% das importações mundiais, cujo desempenho

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no comércio mundial foi bastante dinâmico, mas as vendas brasileiras sofreram queda. Este mapeamento do desempenho por produtos ajuda a entender o porquê de o desempenho exportador da indústria brasileira ter sido bem inferior à média mundial, com consequente redução do MS do país.

5 ANÁLISE DE PAÍSES DE DESTINO

Esta seção apresenta os resultados de um exercício semelhante ao que foi feito na seção anterior, de decomposição da variação do valor exportado de bens industrializados entre os biênios 2005-2006 e 2015-2016, mas agora decompondo segundo os países de destino. Com efeito, anteriormente, este trabalho mostrou que o efeito de variação de destino teve uma contribuição positiva e significativa para a variação do MS do Brasil nas importações de bens industrializados nesse período. Nesse sentido, busca-se analisar em maior detalhe como evoluiu o MS do Brasil nas importações de cada país, levando em conta também a variação da participação do país nas importações mundiais, e o quanto essas variações impactaram, positiva ou negativamente, as exportações de industrializados – identificando, inclusive, os países que tiveram maior ou menor impacto. A variação do valor exportado para cada país pode ser definido como:

V j1 – V j

0 = (ms j1.pp j

1.imp j1) – (ms j

0.pp j0.imp j

0) =

= [(ms j1 – m j0).(pp j

0.imp j0)] + [(pp j

1 – pp j0).ms j1.imp j

1] + [(imp j1 − imp j

0).m j1.pp j

0] (7)

Sendo:

(ms j1 – m j

0).(pp j0.imp j

0) = variação do valor exportado do Brasil para o país j em resposta à variação do MS do Brasil na importação total do país j.

(pp j1 – pp j

0).ms j1.imp j

1 = variação do valor exportado do Brasil para o país j em resposta à variação da participação do país j na importação mundial total.

(imp j1 − imp j

0).m j

1.pp j0 = variação do valor exportado do Brasil para o país j em

resposta à variação do valor da importação mundial total.

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A “Década Perdida” das Exportações Brasileiras de Bens Industrializados: análise do período 2005-2016

Para este exercício, foram utilizados dados do Comtrade referentes às importações totais de cada país e às exportações do Brasil para cada país em 2005, 2006, 2015 e 2016. Foram considerados apenas os países para os quais se dispunha destes dados para todos os anos em questão, o que significa uma amostra de 91 países que responderam, em todos os anos, por mais de 90% das importações mundiais de bens industrializados.21 Deve-se notar que esta amostra é diferente da que foi utilizada nos exercícios realizados nas seções anteriores (que consideraram apenas 38 países), pois naqueles casos havia também a restrição de se dispor de dados desagregados segundo produtos da SITC Rev 3. Por isso mesmo, os dados referentes à variação do valor exportado e ao MS total são diferentes dos apresentados anteriormente. De qualquer forma, quanto maior o número de países considerados, mais útil e informativo é este tipo de análise.

A tabela 6 apresenta os resultados dos cálculos, separando os países em quatro grupos, conforme o que aconteceu com o MS do Brasil nas importações do país e com a participação dos países nas importações mundiais: i) grupo 1: aumento do MS e da PP; ii) grupo 2: aumento do MS e queda da PP; iii) grupo 3: queda do MS e aumento da PP; e iv) grupo 4: queda do MS e queda do PP.

TABELA 6Decomposição da variação do valor exportado da indústria de transformação, segundo países de destino

PaísesTotal

de países

Aumento de MS Queda de MS

Aumento de PP (grupo 1)

Queda de PP (grupo 2)

Aumento de PP (grupo 3)

Queda de PP (grupo 4)

Número de países 91 14 9 40 28

Variação do MS (p.p.) -0,21 0,23 0,14 -0,86 -0,26

Variação da PP (p.p.) - 6,06 -1,42 3,84 -8,48

Variação do valor exportado (US$ milhões) 13.111,1 11.895,7 2.264,6 4.605,1 -5.654,4

Devido à variação de MS -23.381,2 2.120,0 1.244,0 -12.358,2 -14.387,0

Devido à variação de PP 7.850,0 6.226,7 -1.350,7 8.600,3 -5.626,2

Devido à variação da importação mundial 28.642,3 3.549,0 2.371,4 8.363,0 14.358,9

MS 2015-2016 (%) 0,86 0,78 0,68 1,53 0,65

MS 2005-2006 (%) 1,07 0,55 0,54 2,40 0,91

PP 2015-2016 (%) 100,00 19,09 7,84 19,54 53,54

PP 2005-2006 (%) 100,00 13,03 9,26 15,70 62,02

Taxa de crescimento (%) 14,80 198,50 54,20 14,60 -12,00

Taxa de crescimento (%) 43,70 110,60 21,70 78,90 24,10

Fonte: Comtrade.Elaboração do autor.

21. A lista completa dos países é apresentada no apêndice.

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Os números referentes ao total das exportações brasileiras de industrializados para os 91 países mostram que o MS do Brasil reduziu-se em 0,21 p.p. – de 1,07% em 2005-2006 para 0,86% em 2015-2016. Essa redução implicou uma perda de US$ 23,4 bilhões de valor exportado no período. O aumento efetivo de US$ 13,1 bilhões nas exportações só foi possível em virtude do crescimento das importações mundiais, que promoveu um ganho de US$ 28,6 bilhões, e de uma variação positiva na composição das vendas em termos de destino, ou seja, um crescimento relativamente mais elevado das importações em países que têm peso relativamente maior na pauta de exportações brasileiras. Esse último efeito gerou um ganho de US$ 7,9 bilhões, resultado que está em linha com os ganhos referentes à variação de destinos computados no exercício de CMS apresentado anteriormente, que foi positivo em US$ 11,2 bilhões − lembrando, mais uma vez, que este último dado considera apenas uma amostra de 38 países.

A tabela 6 mostra que, de fato, o país perdeu MS na grande maioria dos países considerados (68 do total de 91), e que estes representam parcela muito elevada das importações mundiais de industrializados (cerca de 75% em ambos os biênios). O resultado, portanto, foi uma redução do MS total de bens industrializados. Em contrapartida, a maior parte dos países (54 dos 91) viu sua participação nas importações mundiais elevar-se. Embora tais países tenham representado pouco mais de 38% das importações mundiais no biênio 2015-2016, sua participação nas exportações brasileiras foi bem mais elevada, representando 52%. É justamente o fato de esses países terem peso maior nas exportações brasileiras do que nas importações mundiais que explica o resultado positivo do efeito de variação de países e do efeito de variação de destinos calculado anteriormente neste trabalho.

Explorando, agora em maior detalhe, o desempenho em diferentes grupos de países, observa-se que a maior parte da variação do valor exportado de bens industrializados do país concentrou-se em um pequeno grupo de catorze países (grupo 1) que aumentaram sua participação das importações mundiais (em 6,06 p.p.) e nos quais o Brasil obteve ganho de MS (de 0,23 p.p.). A variação total de US$ 11,9 bilhões dividiu-se em ganho de MS de US$ 2,1 bilhões, ganho de PP de US$ 6,2 bilhões e aumento de US$ 3,5 bilhões devido ao crescimento da importação mundial.

A tabela 7 mostra que o grande destaque neste grupo de países é a China, responsável por mais da metade dos ganhos de valor exportado, tanto o ganho total quanto os referentes ao MS, à PP e à importação mundial. Outros três países também têm destaque nesse grupo: Índia, Paraguai e Hong Kong. Voltando ao caso da China, sabe-se as vendas brasileiras para

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A “Década Perdida” das Exportações Brasileiras de Bens Industrializados: análise do período 2005-2016

este país são majoritariamente de produtos básicos e as exportações de bens industrializados seguem essa mesma linha, uma vez que os produtos que mais contribuíram para o crescimento das vendas são quase todos caracterizados como bens de baixo grau de elaboração, derivados de agrícolas e minérios: celulose (crescimento de 517% das exportações no período), açúcar em bruto (2.770%), catodos de cobre (27.669%), ferro-ligas (500%) e couros e peles (89%). A grande exceção são os aviões, cujas vendas saíram de valores inexpressivos em 2005-2006 para mais de US$ 500 milhões na média de 2015-2016.

TABELA 7Decomposição da variação do valor exportado da indústria de transformação, segundo países de destino selecionados

PaísesMS em

2015-2016 (%)Participação do país em 2015-2016 (%)

Variação do valor exportado (US$ milhões)

TotalPela variação

de MSPela variação

de PPPela variação da

importação mundial

Total da indústria de transformação 0,8 100,0 13.111,1 -23.381,2 7.850,0 28.642,3

Aumento de MS e de PP 0,8 19,1 11.895,7 2.120,0 6.226,7 3.549,0

China 0,8 10,0 6.622,2 1.386,6 3.406,4 1.829,1

Índia 0,9 2,0 1.557,3 232,0 928,2 397,1

Paraguai 23,7 0,1 1.392,2 7,8 979,5 405,0

Hong Kong 0,4 4,4 1.237,2 303,4 378,2 555,5

Demais - - 1.086,8 190,2 534,4 362,3

Aumento de MS e queda de PP 0,7 7,8 2.264,6 1.244,0 -1.350,7 2.371,4

Noruega 1,4 0,6 582,1 391,7 -148,9 339,2

Cingapura 0,5 2,1 515,3 218,3 -93,6 390,6

Bélgica 0,7 2,6 382,6 131,3 -618,5 869,7

Malásia 0,5 1,3 257,4 28,9 -8,2 236,7

Islândia 3,9 0,0 199,7 201,3 -92,3 90,6

Demais - - 327,6 272,4 -389,4 444,5

Queda de MS e aumento de PP 1,5 19,5 4.605,1 -12.358,2 8.600,3 8.363,0

Argentina 24,4 0,4 2.132,2 -3.443,9 2.443,3 3.132,8

Emirados Árabes Unidos 1,0 1,4 1.421,9 -35,3 1.313,5 143,7

Peru 5,7 0,3 879,1 -400,7 1.000,5 279,2

Colômbia 4,4 0,4 447,0 -635,8 671,7 411,1

Uruguai 17,0 0,1 409,8 -323,8 494,0 239,6

Chile 5,5 0,5 -78,3 -1.517,8 733,8 705,7

Rússia 1,2 1,4 -480,8 -1.225,6 206,3 538,5

México 1,1 3,0 -687,1 -2.233,5 438,7 1.107,8

Demais - - 561,2 -2.541,8 1.298,6 1.804,5

Queda de MS e de PP 0,6 53,5 -5.654,4 -14.387,0 -5.626,2 14.358,9

Japão 0,7 3,8 519,0 -43,5 -529,9 1.092,4

Canadá 0,7 3,1 -86,7 -628,0 -328,1 869,3

França 0,5 4,2 -127,0 -472,9 -518,2 864,0

Reino Unido 0,4 4,7 -253,7 -663,2 -488,0 897,5

Holanda 0,5 2,9 -364,8 -822,6 -54,0 511,7

Alemanha 0,5 7,3 -562,8 -1.504,3 -589,5 1.531,0

Estados Unidos 1,0 16,6 -3.370,6 -8.273,9 -1.263,3 6.166,6

Demais - - -1.407,7 -1.978,6 -1.855,3 2.426,2

Fonte: Comtrade.Elaboração do autor.

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Os outros nove países em que o Brasil registrou aumento de MS (classificados no grupo 2) têm peso relativamente pequeno nas importações mundiais de industrializados (7,8% em 2015-2016) e viram essa participação cair em relação a 2005-2006. O efeito prático para o Brasil foi que o ganho derivado do aumento do MS (US$ 1,2 bilhão) foi equivalente à perda referente à participação dos países (US$ 1,3 bilhão), de modo que a variação do valor exportado de US$ 2,3 bilhões resultou unicamente do efeito de aumento da importação mundial. Portanto, o ganho de MS acabou sendo inócuo. Neste grupo de países, os mais relevantes em termos de variação do valor exportado do Brasil são Noruega, Cingapura, Bélgica, Malásia e Islândia (tabela 7).

O grupo de países que aumentaram sua participação nas importações mundiais, mas nos quais o MS do Brasil se reduziu, é o mais numeroso da amostra (quarenta países), mas sua participação no total mundial é proporcionalmente baixa (apenas 19,5% em 2015-2016). Entretanto, é neste grupo que o Brasil possui o MS agregado mais elevado (1,53% em 2015-2016) e sofreu a perda de MS mais elevada em relação a 2005-2006 (0,86 p.p.). Por conta disso, a perda de valor exportado por conta do efeito de variação do MS foi expressiva, de US$ 12,4 bilhões, superando o ganho referente ao aumento da PP (US$ 8,6 bilhões). Esse grupo inclui a maioria dos países da América Latina, como Argentina, México, Chile, Colômbia, Peru e Uruguai, o que explica o porquê de o MS agregado ser o mais elevado entre os grupos. A redução de MS implicou perdas significativas de exportação, principalmente na Argentina (US$ 3,4 bilhões), no México (US$ 2,2 bilhões), no Chile (US$ 1,5 bilhão) e também na Rússia (US$ 1,2 bilhão).

Por fim, o pior desempenho das exportações brasileiras de industrializados concentrou-se em 28 países que perderam participação nas importações mundiais (-8,48 p.p.) e nos quais o MS do Brasil também se reduziu (-0,26 p.p.). Vale destacar que esses produtos representam 53,5% das importações mundiais. Por conta disso, seu impacto sobre a variação do valor exportado do Brasil foi bastante elevado em termos absolutos: perda de US$ 14,4 bilhões devido à redução do MS e perda de US$ 5,6 bilhões devido à redução da PP, parcialmente compensadas pelo ganho de US$ 14,4 bilhões do efeito da importação mundial.

Nesse grupo de países encontram-se os mais tradicionais importadores do mundo: Estados Unidos, Japão, Canadá, França, Reino Unido, Alemanha e Holanda (tabela 7).

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A “Década Perdida” das Exportações Brasileiras de Bens Industrializados: análise do período 2005-2016

Em termos das exportações brasileiras, é especialmente notável o impacto dos Estados Unidos, que ainda responde por um sexto das importações mundiais. A redução do MS brasileiro nesse mercado gerou uma perda de exportações de US$ 8,3 bilhões (de longe o montante mais elevado para um país individual), e a perda pelo efeito de participação do país foi de US$ 1,3 bilhão. Na verdade, o país registrou queda de exportações para os Estados Unidos na grande maioria dos produtos importantes da pauta, sendo as principais exceções os seguintes itens: celulose, ferro fundido e aviões.

Os gráficos 16 e 17 ajudam a resumir os resultados apresentados até aqui. Os países que fazem parte do grupo 1 (em que a China é o grande destaque) vêm ganhando muito espaço nas importações mundiais (crescimento de 110,6% no período, contra 43,7% do total de países) e as exportações brasileiras para eles também tiveram bom desempenho (alta de 198,5%), gerando um ganho de 0,23 p.p., do MS. Daí os ganhos relevantes de valor exportado, devido tanto ao MS (US$ 2,1 bilhões) quanto à participação dos países e ao comércio mundial (US$ 9,8 bilhões).

GRÁFICO 16Países de destino das exportações da indústria de transformação: dados selecionados(Em %)

0,23 0,14

- 0,86 - 0,26

6,06

- 1,42

3,84

- 8,48

- 2,28

0,05

- 0,81

3,04

-10

-8

-6

-4

-2

0

2

4

6

8

10Grupo 2 - 9 países Grupo 3 - 40 países Grupo 4 - 28 países

Variação do MS do Brasil

Variação da participação do produto na importação mundial

Variação da participação do produto na pauta Brasil

Grupo 1 - 14 países

16,4% x 19,1% 42,3% x 53,5%35,0% x 19,5%6,3% x 7,8%

Fonte: Comtrade.Elaboração do autor.

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GRÁFICO 17Variação das exportações da indústria de transformação em função dos efeitos de MS, PP e demanda mundial, segundo países de destino(Em US$ milhões)

-25.000

-20.000

-15.000

-10.000

-5.000

0

5.000

10.000

15.000

20.000

25.000

30.000

35.000

40.000

Indústria total Grupo 1 - 14 países Grupo 2 - 9 países Grupo 3 - 40 países Grupo 4 - 28 países

Ganho potencial (PP + importação mundial) Variação devida ao MS

-23.381

2.120

1.244

-12.358 -14.387

36.492

9.776

1.021

16.963

8.733

Fonte: Comtrade.Elaboração do autor.

O desempenho exportador do Brasil também foi favorável nos nove países que compõem o grupo 2, com aumento de MS de 0,14 p.p.; contudo, a baixa representatividade deles nas importações mundiais e a queda de sua participação no comércio global (-1,42 p.p.) acabou levando a um ganho reduzido em termos de valor exportado. O gráfico 17 mostra que nesses dois grupos o país conciliou um ganho potencial positivo de US$ 1 bilhão, por conta das importações mundiais e do efeito de PP, com ganho referente ao MS de US$ 1,2 bilhão.

Nos grupos 3 e 4, o ganho potencial foi bastante positivo (superior a US$ 25 bilhões), mas o Brasil não foi capaz de aproveitar esse potencial, com perdas expressivas em virtude da redução de seu MS (-US$16,7 bilhões). No grupo 3 estão as principais oportunidades perdidas, pois o país reduziu seu MS (-0,86 p.p.) em países que vêm ganhando espaço nas importações mundiais (+3,84 p.p.) e que representam

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A “Década Perdida” das Exportações Brasileiras de Bens Industrializados: análise do período 2005-2016

quase 20% das importações mundiais. Esse grupo inclui, principalmente, os países latino-americanos, explicitando a necessidade de o país aumentar os esforços para, ao menos, preservar o MS que ainda possui na região e, se possível, recuperar parte do terreno perdido nos últimos anos.

No grupo 4 estão países que respondem por mais de metade da demanda mundial de bens industrializados, incluindo alguns dos maiores mercados do mundo (Estados Unidos, Europa Ocidental e Japão). Ainda que tenham apresentado baixo dinamismo das importações (queda de 8,5 p.p. na participação nas importações mundiais), o desempenho exportador brasileiro foi muito ruim, com queda de 12%, levando a elevadas perdas de exportação pelo efeito de MS (-US$ 14,4 bilhões).

6 CONCLUSÕES

O desempenho das exportações da indústria brasileira no período que se seguiu à crise financeira internacional foi decepcionante, a tal ponto que, em 2016, o quantum exportado de bens industrializados situava-se 2,6% abaixo do nível observado em 2008. Esses números contrastam com o desempenho observado nas três décadas anteriores, quando houve crescimento consistente, com apenas alguns curtos períodos de retração. Sem qualquer exagero, é possível descrever o período recente como a “década perdida” das exportações de bens industrializados.

Uma consequência direta desse mau desempenho foi a redução do MS do país no comércio mundial de industrializados. Este trabalho buscou analisar esse fenômeno mais profundamente, fazendo uma espécie de “anatomia” do desempenho das exportações brasileiras de produtos industrializados no período 2005-2016, com foco justamente no comportamento do MS, com abordagens que procuram identificar fatos estilizados e elementos característicos desse processo.

A segunda seção do trabalho dedicou-se a apresentar indicadores que descrevem o comportamento das exportações. A análise do quantum exportado de bens industrializados mostra que houve uma verdadeira quebra estrutural na série na segunda metade da década passada, tal que as exportações se mantiveram virtualmente estagnadas nos anos posteriores. Elas atingiram seu pico histórico às vésperas da crise

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financeira internacional e, após a forte queda registrada em 2009, não foram capazes de retomar a tendência de crescimento que prevaleceu nos trinta anos anteriores. A comparação com o que aconteceu com o comércio mundial neste período deixa claro que este não pode ser identificado como a principal causa do mau desempenho do país. Embora os anos recentes tenham testemunhado, de fato, uma desaceleração do ritmo de crescimento das importações mundiais, os números são positivos em comparação aos do Brasil: entre 2008 e 2016, o quantum mundial cresceu 14,1%, ao passo que o quantum brasileiro acumulou redução de 2,9%. Essa diferença contrasta com a tendência que prevaleceu nas três décadas anteriores, quando a indústria brasileira acompanhou de perto o crescimento do comércio mundial de bens industrializados.

Como resultado, o MS das exportações brasileiras nas importações mundiais se reduziu de 0,97% para 0,75% (-0,18 p.p.), quando se compara o biênio 2005-2006 com o biênio 2015-2016. O nível atual está entre os mais baixos das últimas décadas, equivalendo-se apenas aos alcançados no biênio 1999-2000. A queda é ainda mais intensa quando se desconta o efeito dos preços relativos − ou seja, da relação entre os preços de exportação praticados nas exportações brasileiras e os praticados nas exportações mundiais. Dado que os preços relativos tiveram aumento expressivo no período, ao excluir este efeito a perda de MS mais do que dobra (-0,39 p.p. contra -0,18 p.p.). Isso significa que a queda de MS foi bem maior quando se considera a participação das exportações brasileiras no volume físico de importações mundiais.

A análise de CMS apresentada na seção 3 permite decompor a variação do MS das exportações de um país em três efeitos: i) a variação da competitividade; ii)  a variação da composição do comércio em termos de produtos; e iii) a variação em termos de países de destino. Os cálculos para o Brasil, comparando a variação do MS entre 2005-2006 e 2015-2016, deixam claro que toda a perda de MS deveu-se à redução da competitividade, efeito que respondeu, sozinho, por uma perda de US$ 24,2 bilhões. O efeito de destinos teve impacto positivo (US$ 11,2 bilhões), mas não suficiente para compensar a redução da competitividade. Isso significa que o país desperdiçou a oportunidade de expandir suas vendas de industrializados oferecida pelo bom crescimento das importações de seus principais países de destino. Por sua vez, o efeito de produtos foi pouco significativo.

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A mesma análise de CMS é feita para vinte setores da indústria de transformação, mostrando que a perda de MS foi um fenômeno generalizado. Apenas cinco setores obtiveram aumento do MS nas importações mundiais no período, e o efeito competitividade foi o principal determinante da perda de MS em catorze dos quinze setores afetados. O efeito de produtos foi pouco significativo na grande maioria dos setores, representando, via de regra, uma variação inferior a 0,1 p.p. do MS total, e o efeito de destinos foi positivo e muito significativo para a grande maioria dos setores.

Os resultados da análise de CMS são confrontados com os possíveis efeitos da variação dos preços relativos, os quais não são explicitados na decomposição, mas que pode ter influência na evolução do MS de um país, mais especialmente na magnitude do efeito competitividade. Na verdade, um ganho de preços relativos causa, ceteris paribus, um ganho no efeito competitividade. Quando se ajusta a variação do MS para descontar o efeito da variação de preços relativos da exportação brasileira e do comércio mundial, pode-se ter uma ideia do que aconteceu com o efeito competitividade stricto sensu. Conclui-se que a perda de competitividade stricto sensu entre os biênios 2005-2006 e 2015-2016 foi maior do que a perda medida pela decomposição de CMS, tanto na indústria de transformação como um todo quanto na grande maioria dos setores, pois nestes houve um ganho de preços relativos que suavizou a perda medida pelo efeito competitividade.

A seção 3 encerra-se com uma breve análise da relação entre a perda de competitividade e a evolução do CUT. De fato, observa-se uma forte correlação entre a evolução deste (medido em reais constantes) e do MS de bens industrializados entre 2005 e 2016. Ainda que fosse necessária a realização de exercícios econométricos que controlem a relação entre o CUT e o MS para outras variáveis relevantes – o que está além do escopo deste trabalho −, os dados sugerem que o aumento do primeiro é um dos fatores que explicam a perda de competitividade da indústria de transformação no período analisado, e a consequente perda do segundo. Os dados em nível setorial, por sua vez, são menos conclusivos, não sendo possível identificar uma correlação clara entre o tamanho da variação do CUT e o tamanho de perda ou ganho de competitividade, até porque o custo da mão de obra tem efeito diferenciado entre os setores, dependendo das características de seu processo produtivo.

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Com relação ao efeito de composição de produtos, a seção 4 apresenta um exercício que objetiva decompor a variação do valor exportado dos diversos produtos no mesmo período de comparação (biênio 2005-2006 com biênio 2015-2016) em três componentes: i) a variação do MS do Brasil na importação mundial do produto; ii) a variação da PP na importação mundial total; e iii) a variação do valor da importação mundial total. Os resultados mostram que o desempenho exportador do país foi muito bom em apenas cerca de 20% dos produtos analisados, os quais representam 19% do comércio mundial e nos quais o país conseguiu reunir dois aspectos favoráveis: ganho de MS e bom dinamismo das importações mundiais. Em contraste, o desempenho exportador do país foi muito ruim em 63% dos produtos considerados, os quais responderam por 73,6% das importações mundiais. Dentro desse último grupo, há um subconjunto de itens que são muito representativos em termos de comércio mundial, respondendo por cerca de 40% do total, e cujo comércio mundial cresceu a taxas relativamente elevadas no período considerado, mas nos quais as exportações brasileiras sofreram queda no período considerado. Esse grupo concentra as maiores oportunidades perdidas de expansão das exportações de industrializados.

A mesma desagregação da variação do valor exportado foi realizada em nível de países de destino, mostrando que o país perdeu MS na grande maioria dos países considerados (68 do total de 91), e que estes representam parcela muito elevada das importações mundiais de industrializados (cerca de 75% em ambos os biênios). Os países em que o Brasil ganhou MS e cujas importações foram mais dinâmicas no período é um grupo bastante restrito – em termos de relevância do valor exportado, eles resumem-se a China, Índia, Paraguai e Hong Kong. Em contraste, o Brasil perdeu MS em dois grupos de países muito importantes. O primeiro teve um crescimento baixo das importações no período, mas responde por mais de metade do comércio mundial, e inclui Estados Unidos, União Europeia e Japão. O segundo é menos relevante no comércio mundial, mas inclui países onde o Brasil tem, tradicionalmente, um MS mais elevado. Este grupo envolve, basicamente, os parceiros da América Latina. Portanto, o país vem perdendo espaço na maior parte dos mercados, inclusive nos de maior porte e em mercados mais cativos, com os da vizinhança latino-americana. O ganho em mercados com China e Índia é relevante, mas não é capaz de compensar o prejuízo da perda de participação nos demais.

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A conclusão geral é que os últimos dez anos foram muito ruins para as exportações brasileiras de bens industrializados, com redução do quantum exportado e perda de MS generalizada, seja em termos de setores, de produtos ou de países de destino, caracterizando-se como uma verdadeira “década perdida”. O exercício de CMS evidenciou que a perda de MS foi determinada basicamente pelo efeito competitividade, e análises mais detalhadas de aspectos relacionados à competitividade, à composição de produtos e à composição de países de destino levantam diversas questões que merecem análises mais profundas, inclusive por meio de exercícios econométricos que permitam identificar os fatores determinantes da perda de competitividade. Ainda que careçam de melhor entendimento, as evidências aqui apresentadas deixam clara a necessidade de se adotar políticas que permitam reverter, ao menos em parte, a perda de competitividade da indústria, sob pena de o país transitar para uma pauta exportadora muito concentrada e depender cada vez mais das exportações de produtos básicos para garantir o equilíbrio da balança comercial.

REFERÊNCIAS

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BONELLI, R. Os custos unitários do trabalho no Brasil nos anos 2000. Revista Conjuntura da Construção, n. 3, p. 10-13, 2012.

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FAGERBERG, J.; SOLLIE, G. The method of constant market shares analysis reconsidered. Applied Economics, v. 19, p. 1571-1583, 1987.

IMF – INTERNATIONAL MONETARY FUND. Global trade: what’s behind the slowdown? In: ______. World Economic Outlook. Washington: IMF, Oct. 2016.

KALRA, S. 6½ decades of global trade and income: “new normal” or “back to normal” after GTC and GFC? Washington: IMF, 2016. (Working Paper, n. 16/139).

LEAMER, E. E.; STERN, R. M. Quantitative international economics. Chicago: Allyn and Bacon, 1970.

LEWIS, L.; MONARCH, R. Causes of the Global Trade Slowdown. Washington: Board of Governors of the Federal Reserve System, Nov. 2016. (IFDP Notes).

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MELLO, P. H. S.; BARBOSA FILHO, F. H. O custo unitário do trabalho no Brasil: evolução agregada e regional. In: ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA, 41., 2013, Foz do Iguaçu. Anais... Foz do Iguaçu: Anpec, 2014.

NONNENBERG, M. J. B.; CARNEIRO, F. Evolução das exportações brasileiras, Preços e Competitividade. In: MELLO E SOUZA, A.; MIRANDA, P. (Ed.). Brasil em Desenvolvimento 2015: Estado, planejamento e políticas públicas. Brasília: Ipea, 2015.

PADRÓN, A. et al. Por que a elasticidade-preço das exportações é baixa no Brasil? Novas evidências desagregadas. In: MELLO E SOUZA, A.; MIRANDA, P. (Ed.). Brasil em Desenvolvimento 2015: Estado, planejamento e políticas públicas. Brasília: Ipea, 2015.

PANDIELLA, A. A constant market share analysis of Spanish goods exports. Paris: OECD, 2015. (Working Papers, n. 1186).

RICHARDSON, J. D. Constant-Market-Shares analysis of export growth. Journal of International Economics, v. 1, p. 227-239, 1971.

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR

BALASSA, B. Trade liberalization and “revealed” comparative advantage. The Manchester School, v. 33, p. 99-123, 1965.

MERKIES, A.; VAN DER MEER, T. A theoretical foundation for constant market share analysis. Empirical Economics, v. 13, n. 2, p. 65-80, 1988.

MILANA, C. Constant market-shares analysis and index number theory. European Journal of Political Economy, v. 4, n. 4, 1988.

SKRINER, E. Competitiveness and specialization of the Austrian export sector: a constant-market-shares analysis. Wien: IHS, 2009. (Economics Series, n. 235).

TYSZYNSKI, H. World trade in manufactured commodities, 1899-1950. The Manchester School of Economics and Social Studies, v. 19, p. 272-304, 1951.

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APÊNDICE

QUADRO A.1

Lista de paísesÁfrica do Sul Israel

Albânia Itália

Alemanha Jamaica

Argélia Japão

Argentina Jordânia

Armênia Letônia

Austrália Lituânia

Bahrein Luxemburgo

Barbados Macedônia

Bélgica Madagascar

Belize Malásia

Bielo-Rússia Maldivas

Bósnia-Herzegovina Malta

Bulgária Marrocos

Camboja México

Canadá Moldávia

Casaquistão Mongólia

Chile Namíbia

China Níger

Chipre Noruega

Cingapura Nova Zelândia

Colômbia Omã

Coreia do Sul Outros da Ásia

Costa Rica Panamá

Croácia Paquistão

Dinamarca Paraguai

El Salvador Peru

Emirados Árabes Unidos Polônia

Equador Portugal

Eslováquia Quirgistão

Espanha Reino Unido

Estados Unidos República Tcheca

Estônia Romênia

Etiópia Ruanda

França Rússia

(Continua)

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(Continuação)

Geórgia Senegal

Grécia Sérvia

Guiana Sri Lanka

Holanda Suécia

Hong Kong Suíça

Hungria Tanzânia

Ilhas Fiji Tunísia

Ilhas Maurício Turquia

Índia Uruguai

Irlanda Zimbábue

Islândia  

Elaboração do autor.

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EDITORIAL

CoordenaçãoCláudio Passos de Oliveira

SupervisãoAndrea Bossle de Abreu

RevisãoCarlos Eduardo Gonçalves de MeloElaine Oliveira CoutoLis Silva HallMariana Silva de LimaRava Caldeira de Andrada VieiraVivian Barros Volotão SantosBruna Oliveira Ranquine da Rocha (estagiária)Lorena de Sant’Anna Fontoura Vale (estagiária)

EditoraçãoAline Cristine Torres da Silva MartinsCarlos Henrique Santos ViannaMayana Mendes de Mattos (estagiária)Vinícius Arruda de Souza (estagiário)

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Missão do IpeaAprimorar as políticas públicas essenciais ao desenvolvimento brasileiropor meio da produção e disseminação de conhecimentos e da assessoriaao Estado nas suas decisões estratégicas.

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