a busca da verdade como contribuição para a paz social

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ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA Coronel Aviador MAURO LUIZ XAVIER DA SILVA A BUSCA DA VERDADE COMO CONTRIBUIÇÃO PARA A PAZ SOCIAL Rio de Janeiro 2012

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ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA

Coronel Aviador MAURO LUIZ XAVIER DA SILVA

A BUSCA DA VERDADE COMO CONTRIBUIÇÃO PARA A PAZ SOCIAL

Rio de Janeiro 2012

ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA

MAURO LUIZ XAVIER DA SILVA

A BUSCA DA VERDADE COMO CONTRIBUIÇÃO PARA A PAZ SOCIAL

Rio de Janeiro 2012

MAURO LUIZ XAVIER DA SILVA

A BUSCA DA VERDADE COMO CONTRIBUIÇÃO PARA A PAZ SOCIAL

Trabalho de Conclusão de Curso – Monografia apresentada ao Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia. ORIENTADOR: CMG RM1 José Cimar Rodrigues

Pinto

Rio de Janeiro 2012

C2012 ESG

Este trabalho, nos termos de legislação que resguarda os direitos autorais, é considerado propriedade da ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA (ESG). É permitido a transcrição parcial de textos do trabalho, ou mencioná-los, para comentários e citações, desde que sem propósitos comerciais e que seja feita a referência bibliográfica completa. Os conceitos expressos neste trabalho são de responsabilidade do autor e não expressam qualquer orientação institucional da ESG.

_________________________________

MAURO LUIZ XAVIER DA SILVA

Biblioteca General Cordeiro de Farias Silva, Mauro Luiz Xavier da.

A BUSCA DA VERDADE COMO CONTRIBUIÇÃO PARA A PAZ SOCIAL/ Coronel Aviador Mauro Luiz Xavier da Silva. - Rio de Janeiro: ESG, 2012.

42 f.: il.

Orientador: CMG RM1 José Cimar Rodrigues Pinto. Trabalho de Conclusão de Curso - Monografia apresentada ao

Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia (CAEPE), 2012.

1. Paz Social. 2.Progresso. 3. Verdade Contas Públicas. I. Título.

A minha família, pela compreensão e

apoio aos momentos difíceis que

passamos juntos ao longo de minha

carreira.

AGRADECIMENTOS

Ao Comando da Aeronáutica, por me proporcionar a indicação ao CAEPE

1012.

Ao Corpo Permanente da ESG, especialmente ao meu orientador, e aos

demais professores e palestrantes do CAEPE 2012, pela valorosa contribuição

ao aprendizado, que me permitiu compreender profundamente a realidade

conjuntural do Brasil.

Aos companheiros da Turma Programa Antártico Brasileiro – PROANTAR

(CAEPE 2012), pela amizade sincera e o convívio sadio em todos os

momentos.

RESUMO

Este estudo visou demonstrar a importância do apaziguamento dos fatos históricos

controversos de uma sociedade por meio da busca de uma verdade consensual que

aglutine forças antagônicas, a fim de que seja construída a Paz Social necessária

para consolidar o Progresso. O trabalho abordou os cuidados que se deve ter na

escolha dos membros das comissões destinadas a levantarem os acontecimentos

relacionados às visões contraditórios dos momentos passados por aquela

sociedade. Perfez-se por uma pesquisa exploratória, bibliográfica e documental.

Delimitou-se aos aspectos relacionados à sociedade brasileira e a examinar as

ideias de Nietzsche sobre o tema da verdade. Buscou evidenciar a impossibilidade

de alcançar soluções consensuais através de conclusões carregadas por viés

político-ideológico; e nos cuidados para que as pesquisas guiadas por sociólogos e

historiadores não se contaminem com o subjetivismo tendencioso que causaria a

perda do propósito da união de facções adversas. Os resultados se referiram na

dificuldade do estabelecimento de uma verdade positiva, assim como à possibilidade

de alcançar uma versão que harmonize toda uma sociedade.

Palavras-chave: Paz Social. Progresso. Verdade.

ABSTRACT

The study aimed to demonstrate the importance of controversial historical facts

appeasement of a society through the pursuit of a consensual truth that brings

together opposing forces, in order to allow be built the needed Social Peace to

consolidate the Progress. The work addressed the care that must be taken in the

choice of committee members designed to survey the events related to conflicting

visions of moments spent by that company. The study was performed by an

exploratory, bibliographic and desk research. The context was delimited to the

aspects related to the brazilian society and analysis of Nietzsche’s ideas about the

truth like subject. It sought to show the impossibility of reaching consensual solutions

through conclusions charged by political and ideological trends, and the care for that

researches guided by sociologists and historians not be contamined by tendentious

subjetivism that would cause the failure of the proposal of union from opposed

factions. The results refered to the difficulty of establishing a positive truth as well

reaching a possible and harmonic version that harmonize an entire society.

Keywords: Social Peace. Progress. Truth.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ........................................................................................... 10 2 O QUE É A VERDADE? ............................................................................. 15 3 A VERDADE POLÍTICO PARTIDÁRIO ...................................................... 19 4 A FUNÇÃO DO SOCIÓLOGO NA BUSCA DA VERDADE ....................... 24 5 HISTORIADOR: SUA ANÁLISE NA BUSCA DA VERDADE .................... 29 6 CONCLUSÃO ............................................................................................ 37 REFERÊNCIAS .......................................................................................... 41

1 INTRODUÇÃO

O Manual Básico da Escola Superior de Guerra, em seu Volume I

(2009), descreve que os Objetivos Fundamentais da Nação Brasileira são:

Democracia, Integração Nacional, Integridade do Patrimônio Nacional, Paz

Social, Progresso e Soberania.

Os Objetivos Fundamentais de Progresso e Paz Social estão

intimamente atrelados, sendo que para facilitar o atingimento sustentado do

primeiro se torna necessário assegurar a conquista do segundo.

Conforme o Manual citado anteriormente, a Paz Social é conceituada

como: ―[...] um valor de vida, não imposto, mas decorrente do consenso, em

busca de uma sociedade caracterizada pela conciliação e harmonia entre

pessoas e grupos [...]‖.

Logo, tal condição configura-se como facilitadora para atingir o

Progresso é assegurar que reine a Paz Social no seio da nação, traduzido

através dos sentimentos de união e solidariedade. Estes sentimentos serão

totalmente alcançados quando as visões contraditórias de grupos antagônicos

acerca de fatos da formação histórica de nosso país estiverem completamente

apaziguadas.

O Brasil passa atualmente por um processo de levantamento de fatos

históricos, ocorridos no período dos governos militares, que suscitam visões

conflitantes sobre a sua causa. Exemplos das visões supracitadas são as duas

reportagens destacadas abaixo.

ELIANE CANTANHÊDE escreveu, em 13 de maio de 2012, e publicado

pelo Jornal Folha de São Paulo, a seguinte coluna intitulada ―A verdade que

dói‖:

―BRASÍLIA - Conformismo‖. Essa é a palavra que melhor define a

reação dos militares à composição da comissão da Verdade, que eles

tanto rejeitam. Perdidos os anéis, vão tentar salvar os dedos: a Lei da

Anistia.

Os sete escolhidos por Dilma pessoalmente, quase solitariamente,

têm destaque na carreira e densas histórias de vida. Gente de peso.

São ex-advogados de presos políticos, como José Carlos Dias e

Rosa Maria Cunha, militantes de Direitos Humanos, como Paulo

Sérgio Pinheiro e Maria Rita Kehl, e juristas de ponta, como Gilson

Dibb, Cláudio Fontelles e José Paulo Cavalcanti Filho. Parciais? Sim,

sem dúvida.

Todos têm lado – o mesmo lado, apesar de uns mais tucanos, outros

mais petistas – e posições claras e bem conhecidas. Mas não há ali

xiitas, nem juvenis, e nenhum está tecnicamente impedido pela lei

que criou a comissão. Não há torturados ou parentes de

desaparecidos.

Perdida mais essa guerra, os militares agora alimentam uma dúvida

(ou seria certeza?): para que vai servir mesmo a comissão da

Verdade?

Eles estão convencidos de que as histórias de torturas, mortes e

desaparecimentos já são amplamente conhecidas. Tanto quanto as

vítimas e os próprios algozes.

Logo, desconfiam, ou sabem, que a comissão é a cortina de fumaça

para produzir ações penais contra os agentes do Estado que

exorbitaram durante a ditadura. Ou seja, contra os militares da época.

Será, simultaneamente, o canal para catequizar a população para a

tese de que, mais de 30 anos depois, já passou da hora de revogar a

Lei da Anistia para processar e punir torturadores. Até porque tortura

é crime imprescritível.

Uns com raiva, outros com melancolia, esses militares alegam que

todas as verdades sempre têm dois ou mais lados. Mas, na história,

quem ri por último ri melhor e a verdade é sempre a do vencedor.

No caso, de quem subiu a rampa do Planalto pela força do voto.‖

Outra visão sobre o mesmo fato foi o artigo intitulado ―O direito à

verdade‖, publicada na Revista Veja, de 20 de maio de 2012, assinado por

LAURA DlNIZ E RAFAEL FOLTRAM,:

―Livre do propósito revanchista com que foi proposta há três anos, a

Comissão da Verdade nasceu para investigar os crimes cometidos

durante o regime militar, sem excluir aqueles perpetrados por

militantes da esquerda [...]

[...] Como parece ser inescapável nessas ocasiões, a instalação da

Comissão da Verdade deu ensejo a algumas inversões da verdade. A

mais patente dessas inverdades, repetida tantas vezes que parece

verdade, é que os opositores da ditadura militar reprimidos por ela

lutavam pela redemocratização do país. Isso é uma resistente mentira

histórica. Os membros das organizações clandestinas que pegaram

em armas contra o regime lutavam pela instalação no Brasil de uma

ditadura comunista nos moldes cubanos e soviéticos [...]

[...] O sociólogo Paulo Roberto de Almeida, que pertenceu a grupos

de insurreição armada contra o regime militar brasileiro, colocou a

questão com muita clareza: "Como ex-integrante de dois desses

grupos que se alinharam contra o regime militar, posso dizer, com

pleno conhecimento de causa, que nenhum de nós estava lutando

para trazer o Brasil de volta para uma ―democracia burguesa‖, que

desprezávamos. Nós pretendíamos um regime revolucionário, que,

inevitavelmente, começaria fuzilando burgueses e latifundiários‖.

Essa é a verdade. É uma afronta à história tentar romantizar ou

edulcorar as ações, os métodos, as intenções e as ligações com

potências estrangeiras dos terroristas que agiram no Brasil no

período militar [...]‖.

Nesse contexto, a condução de qualquer processo de revisão histórica

necessita de equilíbrio e austeridade, condições que, se não forem atingidas,

não trarão a almejada contribuição para a Paz Social, uma vez que os pleitos

levantados pelos grupos antagônicos poderão não vir a ser apaziguados.

A questão central que move esta pesquisa é: como deveriam ser

escolhidos os responsáveis para compor as comissões designadas a levantar

informações sobre a verdade de fatos controversos da história de nossa nação,

a fim de que sejam encontradas conclusões isentas que tragam a unidade

nacional?

A hipótese levantada para tal questionamento é que há a necessidade

de formar comissões extrapartidárias para os estudos conjunturais de

realidades controversas ocorridas nos períodos históricos da sociedade

brasileira, a fim de que as mesmas sejam esclarecidas e, por conseguinte, as

conclusões alcançadas tragam o consenso necessário para a consolidação da

paz social almejado.

Portanto, o objeto deste trabalho é identificar a melhor expertise para

compor membros de uma comissão instituída no intuito de pacificar fatos

controversos de um fato social.

A importância desta problemática atende à consideração de que fatos

históricos controversos são bandeiras de ordem de grupos sociais antagônicos

que exercem pressões no seio da nação; e que a disputa da imposição da

verdade particular de um dos lados aumenta o litígio entre as partes; tornando-

se imprescindível que os pontos de vistas sejam clareados por uma visão mais

próxima do possível da realidade ocorrida, a fim de que nosso país consiga

alcançar o equilíbrio social necessário à utilização unificada de todo o Poder

Nacional com o propósito comum ao desenvolvimento.

Diante do exposto, é preciso estabelecer não só o fórum adequado

para estas discussões, mas, também, qual a melhor composição de seus

membros, com o intuito de que os mesmos possam debater os assuntos

polêmicos e trazer a tona, para a sociedade, as conclusões isenta e maduras.

Assim sendo, o objetivo deste trabalho é demonstrar a necessidade de

dotar as comissões designadas para a análise de fatos históricos nacionais

controversos com profissionais qualificados, capazes de alcançarem

conclusões isentas, visando alcançar a paz social.

A metodologia utilizada foi a pesquisa classificada como exploratória,

calcada em pesquisas bibliográficas, a fim de que seja alcançado o

aprimoramento das ideias que conduzam ao objetivo do trabalho. Para os

levantamentos das informações que consubstanciarão a conclusão do trabalho

foram realizadas pesquisas bibliográficas em bibliotecas e sítios disponíveis na

Internet.

O trabalho partiu da definição filosófica sobre o conceito de verdade

desenvolvida pelos expoentes do pensamento ocidental. Alcançado o propósito

anterior, passou a demonstrar a dificuldade em se atingir um consenso sobre a

realidade de fatos controversos ocorridos tomando-se por base uma visão

ideológica partidária. O estudo prosseguiu analisando a função do trabalho do

sociólogo e do historiador como profissionais pesquisadores que utilizam

técnicas científicas para o levantamento da conjuntura social vivida pela

sociedade em um dado instante histórico.

Este trabalho de pesquisa se limitou ao âmbito da sociedade brasileira

e na sua evolução histórica e cultural, estruturando o trabalho da seguinte

forma:

a) o primeiro capítulo introduzirá o problema central, o objetivo do

trabalho, e a delimitação da pesquisa;

b) o segundo capítulo será a conceituação sobre a verdade

formulada por vários filósofos, e o consenso da impossibilidade

de encontrar a verdade absoluta;

c) o terceiro capítulo será dedicado à demonstração da dificuldade

em se encontrar interpretações isentas e consensuais sobre

fatos históricos controversos baseados na ótica ideológica

partidária;

d) o quarto capítulo irá expor a função do sociólogo nos estudos e

pesquisas sobre a formação histórica da sociedade;

e) o quinto capítulo irá apresentar a função do historiador nas

pesquisas de fatos históricos; e

f) o sexto capítulo sintetizará os conhecimentos apresentados nos

capítulos anteriores, pretendendo concluir, ao final, sobre um

modelo de composição de profissionais que precisam estar

presentes em uma discussão sobre o levantamento de fatos

controversos da história nacional.

2 O QUE É A VERDADE?

Ao efetuar a pesquisa sobre o significado do vocábulo verdade nos

dicionários Houaiss, Michaelis e Aulete; percebe-se que o mesmo assume

diversos significados, entre eles: estar de acordo com a realidade; fidelidade a

um padrão ou a uma origem; ser um caso; constância; sinceridade; e outros.

Verdade pode, ainda, descrever o que é uma realidade, ou possibilidade de

realidade, inserida sobre um conceito de valores. A verdade sobre a leitura de

um fato ao ser submetido a um sistema de valoração se sujeita tanto a uma

ótica pessoal, quanto a uma opinião imposta por grupos.

Toda essa variedade acerca do significado do conceito de verdade

decorre das diversas visões que podem ser exploradas sobre o tema. O dilema

sobre a verdade originou uma gama de teorias sobre o assunto que, desde a

antiguidade até os dias atuais, são objetos de estudos de filósofos.

Para abordar este tema, a Filosofia desenvolveu várias escolas com o

intuito de conceituar a verdade. São elas: a metafísica que se dedica a

natureza da verdade; a epistemológica que se aprofunda no conhecimento; e a

lógica que se atém a preservação da verdade.

As teorias metafísicas da verdade se dividem nas verdades por

correspondência (adequação), desmenção, desvelamento e pragmatismo.

A definição como correspondência é a mais antiga visão sobre o

conceito de verdade. Platão definiu que: ―Verdadeiro é o discurso que diz as

coisas como são; falso é aquele que diz como não são‖1.

Aristóteles em seu tratado ―Da Interpretação‖, aborda a verdade como

a adequação do objeto na realidade com a projeção que se encontra na mente.

Para fundamentar seu pensamento, Aristóteles enunciou dois teoremas

fundamentais: ―a verdade está no pensamento ou na linguagem, não no ser ou

na coisa‖2; ―a medida da verdade é o ser ou a coisa, não o pensamento ou o

discurso‖. Ele dizia: ―Negar aquilo que é, e negar aquilo que não é, é falso;

enquanto afirmar o que é e negar o que não é, é verdadeiro.‖3.

1 (Crtas., 385b; v.Sof,262 e Fil.,37c)

2 (Met. VI, 4,1027b25)

3 (Met.,VI,4,1027 b 25)

Os críticos a esta escola se apegam ao fato da dificuldade em

mensurar uma verdade definida pela expressão da correspondência do

significado entre o que é e o dito.

Segundo a visão desmencionista, a verdade é encontrada se, e

somente se, o ente for o que é. Portanto, não seria necessária a colocação de

aspas em sua proposição. Assim sendo, a proposição ―A grama é verde‖ é

verdadeira se, e somente se, a grama é verde.

A crítica à abordagem desmencionista leva em consideração que a

proposição deva ser aprovada a todos os entes correspondentes aquela

afirmativa. Para gêneros muito numerosos, ou com variações entre eles, ficaria

improvável o atendimento à assertiva. Logo, este método encontra falhas em

sua premissa básica.

O desvelamento considera que a verdade está sempre em construção,

onde o ser deve deixá-la se manifestar. Segundo a visão de Martin Heidegger,

em Ser e tempo, parágrafo 44, a pessoa deverá estar sempre com mente

aberta para que a verdade possa se manifestar. Portanto, a verdade jamais

será absoluta.

A escola desvelamencista, em seu pressuposto básico, afirma que a

verdade é algo intangível, e é mutável.

A vertente do pragmatismo, por sua vez, prega que a verdade deve ser

auferida por meio de valores que são agregadas a ela; chegando ao ponto em

que para ser verdade há a necessidade de que a mesma seja confundida com

um consenso do grupo. Ou seja, não necessariamente a coisa é o que é, mas

sim o que o grupo concorda que seja.

A Teoria Epistemológica sugere a dificuldade de definir a verdade

devido a sua forma da percepção do conhecimento. A percepção objetiva é

facilmente determinada por comprovações de observação ou medições, como:

a maça está sobre a mesa. Porém, a percepção subjetiva é intrínseca a cada

indivíduo e a sua forma de reagir a estímulos, tornando imprecisa qualquer

validação daquela verdade, como por exemplo: a água está quente.

Como foi descrito, não existe uma forma consensual de conceituar a

verdade, nem um método seguro em de obtê-la.

Para Nietzsche, a verdade não passa de um ponto de vista. Em sua

opinião, não há como conceituá-la nem defini-la; pois não tem como alcançar,

com precisão, o seu oposto, a mentira. A verdade, para este pensador, é uma

ilusão produzida pelo ser humano.

A verdade sempre acompanhou o trabalho de Nietzsche. Ele realça o

caráter revelador da ciência em contrapartida ao caráter redentor da arte; onde

a verdade destruiria a existência e a arte deveria salvá-la.

Em sua obra Sobre Verdade e Mentira (1873, tradução de Fernando de

Moraes Barros), Nietzsche se volta contra as teorias filosóficas sobre a

verdade. A busca pela conceituação da verdade seria um resultado da vaidade

dos filósofos, que os afastou da realidade e os colocou em um patamar

universal. Ao tomar consciência do caráter efêmero da verdade, os pensadores

se desiludem e desesperam com tal constatação.

Nietzsche entende que não há razão para o mundo se mostrar como

ele realmente é. Como relatado na obra supracitada, à verdade e a mentira são

invenções da sociedade e de sua correspondente linguagem. O ser humano

desta sociedade chama de verdade tudo que auxilia na conservação daquela

sociedade, e de mentira tudo que colocaria em risco a sociedade. Logo,

verdade e mentira são produtos de conveniências atreladas à continuidade da

paz social de sua sociedade. Portanto, a sociedade é que dita a sua verdade.

Nietzsche acredita que na medida em que o homem deseja viver em

sociedade, tornasse necessário diminuir ao máximo as tendências de conflitos

e instituir uma paz. Para essa consecução, são fixadas ―verdades‖ que serão

validadas pela linguagem. Os homens se afastam menos das mentiras do que

os prejuízos que a realidade poderia trazer para a sociedade.

Considerando a visão de Nietzsche como balizador deste estudo, fica

clara a necessidade da sociedade apaziguar as tensões das visões sobre fatos

contraditórios de grupos internos com verdades consensuais, a fim de que se

atinja a paz social. Caso contrário, haveria a desestabilização social, que

gerariam conflitos e, consequentemente, a desagregação societária.

Entretanto, a dúvida está na capacidade de formar uma comissão com

membros que atenda aos anseios desses grupos antagônicos, de forma que

todos os lados se sintam representados, a fim de que acolham as conclusões

consensualmente.

3 A VERDADE POLÍTICO PARTIDÁRIA

Uma comissão baseado em uma ótica política traria algumas

dificuldades de consenso. Para melhor entendimento, faz-se mister

compreender os significados de Ideologia e Partido Político.

O Conde de Tracy4, em 1801, criou o termo ideologia, dando a ele o

significado de ciências das ideias. Embora, os filósofos da Antiguidade Clássica

e da Idade Média já possuíssem o entendimento de tal conceito,

compreendendo-a pelo significado do agrupamento de ideias e opiniões que

regem uma sociedade.

Contudo, o Conde de Tracy e seus seguidores logo sofreram a primeira

crítica, oriunda de Napoleão, o qual o acusou e a seus seguidores de

―deformadores da realidade‖, alcunhando-os de ―ideólogos‖.

Napoleão, num discurso ao Conselho de Estado em 1812, declarou:

―Todas as desgraças que afligem nossa bela França devem ser atribuídas à

ideologia, essa tenebrosa metafísica que, buscando com sutilezas as causas

primeiras, quer fundar sobre suas bases a legislação dos povos, em vez de

adaptar as leis ao conhecimento do coração humano e às lições da história.‖ 5

A ideologia é definida por duas vertentes. A primeira concepção é

denominada por neutra; ou seja, a ideologia estaria ligada ao sentido de um

conjunto de ideias como sinônimo de ao ideário comum, possuidora de um

sentido neutro, isento. (Pompeo, Flávio Sposto, 13 de abril de 2008).

A segunda concepção de definição da Ideologia é denominada de

crítica. Para a Teoria Crítica, da Escola de Frankfurt, a ideologia encobre a

realidade de um objeto, exaltando as qualidades que desejam ser realçadas e

mascarando as demais. Para autores que adotam esta concepção, a ideologia

é utilizada como uma forma de dominação pelo convencimento, alienando a

consciência social.

4 Antoine-Louis-Claude Destutt, o conde de Tracy (Paris, 20 de julho de 1754 – Paris, 10 de

março de 1836), foi um filósofo, político, soldado francês e líder da escola filosófica dos Ideólogos. Criou o termo idéologie (1801) no tempo da Revolução Francesa, com o significado de ciência das idéias, tomando-se idéias no sentido bem amplo de estados de consciência.

5 O que é ideologia, Chauí, pag 10

Chauí comenta que: ―Um dos traços fundamentais da ideologia

consiste, justamente, em tomar as ideias independentes da realidade histórica

e social, de modo a fazer com que tais ideias expliquem aquela realidade que

torna compreensíveis as ideias elaboradas...‖; ―(as ideias) São, na verdade,

expressões dessas condições reais, porém de modo invertido e dissimulado.

Com tais ideias pretende-se explicar a realidade, sem se perceber que são elas

que precisam ser explicadas pela realidade‖.

Chauí, em seu livro ―O que é ideologia‖, declara que Karl Marx, em sua

obra ―Ideologia Alemã‖, considerava que a ideologia mascara a realidade, Ele

desenvolveu a teoria na qual a ideologia cria uma realidade falsa a fim de

justificar a dominação oriunda da divisão entre o trabalho manual e intelectual.

Desta divisão, os ideólogos passariam a modificar a compreensão das relações

da produção, encobrindo as ideias a favor das classes dominantes.

John B. Thompson formula sua teoria crítica sobre a ideologia,

comungando com a visão de Marx, sobre o aspecto de sua utilização na prática

da relação de dominação; embora discorde quanto do uso da ideologia para

distorcer a realidade, afirmando que não necessariamente haveria a

necessidade de falsear a consciência coletiva. Thompson, também, considera

que não existe apenas o uso da ideologia apenas para a dominação entre

classes. O autor enumera outras dominações na sociedade, como a entre

pretos e brancos, homens e mulheres, naturais e estrangeiros e etc.... 6.

Chauí destacou que para Augusto Comte, o criador do positivismo, a

ideologia é uma organização sistemática do conhecimento científico, as quais

foram produzidas por sábios que recolhiam opiniões e as corrigiam, eliminando

elementos metafísicos ou religiosos caso existissem nestas opiniões. Assim a

ideologia manipulava as ações dos homens, que eram submetidos a este poder

ideológico o qual era dominado pelos burgueses, então caso fossem

desrespeitados estes ideais o homem estaria agindo contras a ordem da

sociedade, e de acordo com o lema positivista ―Ordem e Progresso‖, estaria

também atrapalhando o progresso social.

6 Thompson, John B. Ideologia e cultura moderna: teoria social crítica na era dos meios de

comunicação de massa (em português). 6 ed. Petrópolis: Vozes, 2000. 430 p. ISBN 9788532614841. Página visitada em 11 de março de 2012.

Para Durkheim7 a ideologia é todo conhecimento da sociedade que não

respeito o critério da objetividade científica sendo a da separação entre sujeito

do conhecimento e objeto do conhecimento, separação que garante a

objetividade porque garante a neutralidade do cientista, Durkheim tem a

intenção de criar a sociologia como ciência, como conhecimento racional,

objetivo, observacional e necessário da sociedade. Para isso é preciso tratar o

fato social como uma coisa, exatamente como o cientista da Natureza trata os

fenômenos naturais. Isto significa que a condição para uma sociologia científica

é tomar os fatos sociais como desprovidos de interioridade, isto é, de

subjetividade, de modo a permitir que o sociólogo encare uma realidade, da

qual participa, como se não fizesse parte dela.

A ideologia é um conjunto de ideais e valores, normas e regras, os

quais manipulam os membros de uma sociedade, interferindo em seus meios

de pensar e agir, com o intuito de conformar a sociedade de suas diferenças

sociais, politicas e culturais. Desta forma, a ideologia tem a função de dar uma

explicação racional a esta desigualdade, tentando estabelecer uma

estabilidade entre dominantes e dominados.

Independente da concepção que seja acolhida, a neutra ou crítica, elas

possuem em comum a certeza que Ideologia é uma visão a cerca de um

contexto, e que busca através desta visão explicar as relações sociais.

Definido o que é Ideologia, cabe agora compreender o significado de

Partido Político.

Segundo R. Michels, o partido político é uma entidade de associação

organizada através da participação voluntária, legalmente constituída, e

orientada por uma ideologia a fim de influenciar ou ocupar o poder de um

Estado politicamente organizado8.

7 Émile Durkheim (Épinal, 15 de abril de 1858 – Paris, 15 de novembro de 1917) é considerado

um dos pais da Sociologia moderna, tendo sido o fundador da escola francesa, posterior a Marx, que combinava a pesquisa empérica com a teoria sociológica. É amplamente reconhecido como um dos melhores teóricos do conceito da coesão social.

8 (MICHELS, R., Sociologia dos Partidos Políticos, Brasília, UnB, 1982)

Os partidos políticos foram se evoluindo através do tempo, sendo que o

formato atual surgiu durante o Século XIX, na Europa e nos Estados Unidos,

com o desenvolvimento dos sistemas eleitorais a fim de concorrerem aos

cargos parlamentares criados após o absolutismo.

Logo, o partido político objetiva conquistar e exercer o poder político de

um Estado. Sua legitimidade está em desenvolver essa busca pelo poder como

representantes de uma ideologia que expressa os interesses de um grupo

social ou de parte dele.

Como o partido político é baseado em uma ideologia, o grupo que

constitui seus representantes possuem uma visão própria sobre as relações

sociais que convivem.

Para conseguir atingir o poder, e perpetuar-se nele, o partido político

deve neutralizar, ou extinguir, a visão ideológica do partido opositor, a fim de

que o grupo que representa se torne hegemônico.

Ao ser constituído uma comissão para apurar fatos controversos de um

período histórico da sociedade baseado em componentes partidários, os

resultados estarão carregados de ideias concebidas ideologicamente, as quais

jamais poderão resultar em conclusões consensuais que tragam a paz social.

O resultado poderá ser o oposto. O grupo que não tiver sido contemplado

poderá acirrar ainda mais a contenda, proporcionando mais instabilidade social,

que poderá ser o fator motivador de ações antagônicas ao desenvolvimento

nacional.

Mesmo que a referida comissão seja composta por representantes de

partidos políticos opostos, as discussões serão dominadas por embates

ideológicos, que sobrepujariam os levantamentos dos fatos controversos.

Portanto, uma comissão com os propósitos de apaziguar uma

sociedade não poderá ser conduzida por visões partidárias, sob o risco de não

ser conclusiva ou, ainda, acirrar o desequilíbrio social.

Como a comissão que busca clarear fatos controversos necessita ser

apartidária, torna-se imprescindível encontrar profissionais técnicos que sejam

capazes de cumprir a missão almejada.

Assim sendo, este trabalho irá analisar as competências de

historiadores e sociólogos na condução das comissões supracitadas.

4 A FUNÇÃO DO SOCIÓLOGO NA BUSCA DA VERDADE

Carlos Benedito Martins define a Sociologia como o estudo do

comportamento social, as interações e organizações humanas, objetivando

sistematizar o entendimento do cotidiano da sociedade ―O que é Sociologia‖,

38.ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. (Coleção Primeiros Passos). Para este

eminente autor: ―A sociologia constitui um projeto intelectual tenso e

contraditório‖.

A sua posição é notavelmente contraditória. De um lado, foi proscrita de inúmeros centros de ensino. Foi fustigada, em passado recente, nas universidades brasileiras, congeladas pelos militares argentino, chilenos e outros do gênero. Em 1968, os coronéis gregos acusavam –na de ser disfarce do marxismo e teoria da revolução. Enquanto isso, os estudantes de Paris escreviam nos muros de Soborne que ―não teríamos mais problemas quando o último sociólogo fosse estrangulado com as tripas do último burocrata.

O termo Sociologia foi criado por Auguste Comte em 1838.

Comte almejava a unificação de todas as ciências relativas ao homem,

como: a História, a Psicologia e a Economia.

Porém, a Sociologia só desenvolveu seus fundamentos, e cresceu

como ciência, através da institucionalização dos trabalhos de Karl Marx9, Émile

Durkheim e Max Weber10.

A Sociologia surgiu no alvorecer da sociedade capitalista, Século XVIII.

Neste período, o mundo sofria os reflexos dos ideais iluministas; as

transformações econômicas, políticas e culturais trazidas pelas consequências

das revoluções Francesa e Industrial; e as quedas das monarquias substituídas

pela constituição dos Estados nacionais no Ocidente. Esta realidade alterou,

radicalmente a relação social existente, transformando o sistema feudal da

sociedade europeia, até então vigente, para o novo sistema capitalista burguês.

9 Karl Heinrich Marx (Tréveris, 5 de maio de 1818 — Londres, 14 de março de 1883) foi um

intelectual e revolucionário alemão, fundador da doutrina comunista moderna, que atuou como economista, filósofo, historiador, teórico político e jornalista.

10

Maximilian Karl Emil Weber (Erfurt, 21 de Abril de 1864 — Munique, 14 de Junho de 1920) foi um intelectual alemão, jurista, economista e considerado um dos fundadores da Sociologia. Seu irmão foi o também famoso sociólogo e economista Alfred Weber

Dentro deste novo contexto, a Sociologia desponta com a pretensão de

compreender, cientificamente, as novas relações sociais que estavam sendo

formada.

Inicialmente, a sociologia, foi moldada pelas inspirações positivistas.

Surgiu como alternativa intelectual às proposições iluministas e as demandas

do proletariado, ligando-se aos movimentos conservadores, a fim de alcançar

um estado de equilíbrio para aquela nova sociedade.

O pensador Saint-Simon11 é reconhecido como um dos pioneiros do

positivismo. Para ele, o progresso econômico gerado pelo capitalismo

contribuiria para a coesão social. Entretanto, Saint-Simon acreditava que

deveria partir das elites as iniciativas de melhorias na vida dos trabalhadores.

Os pensamentos de Auguste Comte foram fortemente influenciados

pelas principais ideias a Saint-Simon. Reconhecido como inteiramente

conservador, Auguste Comte pregava a necessidade de estabelecer uma

ordem que atrelada ao progresso edificaria a nova sociedade mais equilibrada.

Durkheim também concordava sobre a necessidade que a ordem social

deveria ser uma preocupação constante, e dedicou-se em definir esse marco

como sendo o objeto de estudo da sociologia, estabelecendo um método de

investigação.

Todavia, Durkheim ao estabelecer relevada importância ao fenômeno

da divisão do trabalho pela sociedade, chegou a conclusão que o não

estabelecimento de regras claras relativas à esta relação seria a causa da

anomalia social.

Devido aos antagonismos presente nas sociedades capitalistas, que

impediam um consenso entre os pensadores sobre o objeto e os métodos de

pesquisa, propiciou a criação de distintas vertentes sociológicas.

11 Claude-Henri de Rouvroy, Conde de Saint-Simon, (Paris, 17 de outubro de 1760 — Paris, 19

de maio de 1825), foi um filósofo e economista francês, um dos fundadores do socialismo moderno e teórico do socialismo utópico. Propôs a criação de um novo regime político-econômico, pautado no progresso científico e industrial, em que todos os homens dividissem os mesmos interesses e recebessem adequadamente pelo seu trabalho.

Contrapondo a essa sociologia positivista, nasceu o pensamento

socialista, que ao contrário do positivismo, apresenta uma crítica ao sistema

capitalista. Este novo pensamento também recebeu relevante importância no

escopo sociológico.

Os filósofos socialistas, observando os trabalhadores como meios de

produção, irão basear-se neste referencial teórico com o intuito de levar adiante

as lutas de classes. Esta nova postura sociologia modifica o significado

reflexivo da Sociologia para ações interventivas práticas.

Os dois expoentes pensadores da ideologia socialista foram Marx

(1818-1883) e Engels12 (1820-1903). Suas obras contribuíram para a

estruturação das ciências sociais com o legado da aplicação do materialismo

dialético ao estudo dos fenômenos da sociedade.

Com o intuito de alcançar uma neutralidade científica, Max Weber

(1864-1920), tenta isolar a ciência ―Sociologia‖ dos movimentos

revolucionários. Weber não concebia que a economia dominasse as demais

esferas da realidade social. Para ele, ocorriam outros fenômenos sociais que

influenciavam as relações na sociedade, como: a burocracia estatal; e a

importância da ética protestante para o sucesso do capitalismo.

Os trabalhos desses pensadores contribuíram para a humanidade

compreender o conjunto das relações daquela sociedade da época, e o

entendimento do que há na ligação entre a biografia dos homens e os

processos históricos.

A Sociologia, portanto, tem a pretensão de observar os fenômenos que

se repetem nas relações sociais e, assim, formular explicações gerais ou

teóricas sobre o fato social. A Sociologia, também, se preocupa com aqueles

eventos únicos, como por exemplo, o surgimento do capitalismo ou do Estado

12 Friedrich Engels (Barmen, 28 de novembro de 1820 — Londres, 5 de agosto de 1895) foi um

teórico revolucionário alemão que junto com Karl Marx fundou o chamado socialismo científico ou marxismo. Ele foi coautor de diversas obras com Marx, sendo que a mais conhecida é o Manifesto Comunista. Também ajudou a publicar, após a morte de Marx, os dois últimos volumes de O Capital, principal obra de seu amigo e colaborador.

Grande companheiro de Karl

Marx, escreveu livros de profunda análise social. Entre dezembro de 1847 à janeiro de 1848, junto com Marx, escreve o Manifesto do Partido Comunista, onde faz uma breve apresentação de uma nova concepção deahistória.

Moderno, explicando seus significados e importância que esses eventos têm na

vida dos cidadãos.

Sendo uma ciência, a Sociologia pretende explicar a totalidade do seu

universo de pesquisa. O conhecimento sociológico, por meio dos seus

conceitos, teorias e métodos, constituem um instrumento de compreensão da

realidade social e de suas múltiplas redes ou relações sociais.

São objetos de estudos dos sociólogos os elementos estruturantes da

sociedade, como: as etnias formadoras (raças, regionalismos), estratificações

sociais (operários, militares, empresários, políticos), nos gêneros e suas

interações, nas leis e suas transgressões, e as instituições vigentes (família,

Estado, escola, religião).

A pesquisa sociológica objetiva conhecer as relações sociais e

aperfeiçoá-las, pois possibilita aos interessados compreenderem com mais

propriedade as interações intergrupais, de forma particularizada, bem como a

sociedade com um todo. Por tratar-se de uma ciência humanística, a Sociologia

é uma forma de interpretar a consciência social e desenvolver espírito crítico

sobre o assunto.

Contudo, pelo conhecimento partir da própria sociedade, a pesquisa

sociológica corre o risco de ser contaminada por visões e interesses de alguma

parcela grupal componente da mesma ou de categorias sociais que, de forma

dolosa ou não, induza viés ideológico em suas conclusões, desvirtuando a

meta de neutralidade e objetividade característica da ciência.

Portanto, caso o pesquisador sociólogo consiga abster-se de

influências ideológicas dominantes do contexto social em que está inserido,

poderá reproduzir com boa precisão as interações intergrupais que se

sucederam no determinado momento em análise, e alcançar conclusões

imparciais sobre fatos controversos ocorridos no período estudado daquela

sociedade.

5 HISTORIADOR: SUA ANÁLISE NA BUSCA PELA VERDADE

Qual seria a função do historiador? Trata-se de um questionamento

antigo; porém, ainda válido e pouco debatido.

A inquirição supracitada suscita ao levantamento das ferramentas que

os historiadores utilizam, tais como: embasamentos teóricos; recursos; a

seleção das metodologias de pesquisa; e de fontes.

A dúvida inicial fomenta outras questões relativas ao assunto, tais

como: Qual o passado estudado? Sobre quem é pesquisado? Para quem? O

que motivou o historiador a debruçar sobre o tema? Qual é a vertente

defendida, a dos "vencedores" ou a dos "vencidos"? Quais figuras, fatos,

poderes, segmentos, personalidades míticas e imaginárias serão

representadas?

Leopold Von Ranke13, o pai da História Científica, no século XIX,

pregava a possibilidade de construir a história focando-se exclusivamente pelo

passado. O historiador deveria usar uma metodologia de pesquisa baseada

nas análises documentais. Segundo este autor, este método garantiria a

necessária imparcialidade, a fim de que o historiador chegasse à verdade

histórica clara e objetiva.

Esta linha de pensamento, conhecida como dos positivistas, almejava a

construção da História que retratassem os vieses conservadores, pois, os fatos

e eventos políticos estudados seriam os mesmos relatos, documentados e

legitimados pelo Estado. A consequência deste propósito seria a obtenção de

um alicerce de expectativas apaziguadas com as constatações do passado, a

qual construiria o futuro próspero e produtivo.

O maior intuito desta metodologia era enaltecer os feitos gloriosos para

que estes influenciassem o presente e propiciasse um futuro, também,

13 Leopold von Ranke (Wiehe/Unstrut, 21 de Dezembro de 1795 — Berlim, 23 de Maio de

1886) foi um dos maiores historiadores alemães do século XIX, e é frequentemente considerado como o pai da "História cientifica". Ranke definiu o tom de boa parte dos escritos históricos posteriores, introduzindo ideais de vital importância para o uso do método cientifico na pesquisa histórica como o uso prioritário de fontes primárias, uma enfâse na história narrativa e especialmente em política internacional (Aussenpolitik) e um comprometimento em mostrar o passado tal como realmente foi (wie es eigentlich gewesen ist).

próspero. Os atores principais da historiografia eram os ―grandes homens‖.

Seus feitos eram enaltecidos pelas elites do Estado, perpetuando suas

memórias por séculos.

Ranke foi funcionário público do governo alemão, e incumbiu-se de

fundar a raiz daquela nação. Assim sendo, necessitava de um fator que

aglutinasse o povo. A solução encontrada foi o uso da História. Através dela,

haveria a possibilidade de manipular o senso comum do presente pela

exaltação aos grandes homens do passado, fazendo serem vistos como

modelos a serem seguidos e ponto de ponto de unidade nacional.

"Homem de poder ao lado do poder, o historiador tece as continuidades do espaço político que organiza a nova sociedade. Essa função do historiador, a reprodução do poder, vai perdurar durante muito tempo, até o começo do século XX, adaptando-se aos diversos regimes políticos." (François Dosse)

Atualmente, a objetividade do conhecimento histórico sofre inúmeras

críticas. Diversos pensadores, como Georges Duby14, coadunam com a ideia

de ser a História uma ciência distinta da forma científica tradicional, pois a

mesma não seria calcada em fatos comprováveis. Duby, diferentemente dos

propósitos positivistas, entende ser improvável que a narrativa histórica seja

pautada pela objetividade; afinal, já se manifesta a subjetividade nas pessoas

que escrevem e relatam os fatos, contaminando qualquer tipo de documento

com o juízo de valores e tendências de sua época. Ao escolher qualquer objeto

para estudo, o historiador já determina, também, juízo de valor, tornando-se

imparcial perante a escolha do tema a ser pesquisado.

"O passado é uma construção e uma reinterpretação constante e tem um futuro que é parte integrante e significativa da História". (Jacques Le Goff

15)

14 Georges Duby (7 de Outubro de 1919 - 3 de Dezembro de 1996) foi um historiador francês,

especialista na Idade Média. Deu início à sua carreira universitária em Lyon, no ano de 1949, tendo sido posteriormente membro da Academia Francesa e professor do Collège de France entre os anos de 1970 e 1992. Foi um especialista em história medieval, lançou mais de 70

livros e coordenou coleções importantes, como a História da vida privada.

15 Jacques Le Goff (Toulon, 1 de janeiro de 1924) é um historiador francês especialista em

Idade Média. Autor de dezenas de livros e trabalhos; membro da Escola dos Annales, se empregou na antropologia histórica do ocidente medieval.

Pelas constatações acima descritas, chegasse à conclusão que o

conhecimento histórico se torna mutável, tendendo ao historicista. Entenda-se

por historicistas, no sentido estrito, as perspectivas do entendimento de

qualquer período da história, não de acordo com as ideias e os conceitos de

hoje, mas com os instrumentos intelectuais disponíveis nesse tempo.

Não é a história que faz o homem, mas o homem que faz a história.. A história não é objeto, é opção; não é estática, é movimento. (Castanheira Neves)

Portanto, conforme entendido por Georges Duby, a tese histórica é

pautada em um fato, que passa por uma proposição inicial; porém, após sofrer

uma antítese é contestada, resultando em uma nova abordagem sobre mesmo

fato. Desta forma, a História seria um ciclo de análises constantemente

construída e modificada.

Edward Hallet Carr16 critica a metodologia positivista de análise da

objetividade História:

A história consiste num corpo de fatos verificados. Os fatos estão disponíveis para os historiadores nos documentos, nas inscrições, e assim por diante, como os peixes na tábua do peixeiro. O historiador deve reuni-los, depois levá-los para casa, cozinhá-los, e então servi-los da maneira que o atrai mais. (Carr, p. 45).

Carr apregoa a relação gerada entre a proximidade do historiador de

seus fatos: a maior proximidade melhora a análise do objeto. Para o autor, o

16

Edward Hallett "Ted" Carr (Londres, 28 de junho de 1892 - 3 de novembro de 1982) foi um

historiador, jornalista e teórico das relações internacionais britânico de esquerda, e um adversário do empirismo na historiografia. Como intelectual, Carr ficou conhecida por seu trabalho sobre a história da União Soviética, em que demonstrou uma visão simpática à história soviética de 1917 a 1929; por seus escritos sobre as relações internacionais; e por seu livro What Is History?, de 1961, em que estabeleceu princípios historiográficos radicais que rejeitavam as práticas e métodos históricos tradicionais.Educado em Cambridge, Carr começou sua carreira como diplomata, em 1916. Cada vez mais preocupado com o estudo das relações internacionais e da União Soviética, deixou o Foreign Office em 1936 para começar uma carreira acadêmica. De 1941 a 1946, trabalhou como editor assistente no London Times, onde ficou célebre pelos editoriais de esquerda, que escrevia exortando um sistema socialista e uma aliança anglo-soviética como base para a nova ordem do pós-guerra. Posteriormente, trabalhou em um enorme trabalho de catorze volumes sobre história soviética

fato em si não fala por ele mesmo; ele só ganha legitimidade diante da História

após o historiador o questiona.

É o historiador quem decide por suas próprias razões que o fato de César atravessar aquele pequeno riacho, o Rubicão, é um fato da história [...]. (Carr, p. 47).

Portanto, caberá ao historiador selecionar determinado fato como da

História, e que realmente merece ser analisado e compreendido num contexto

mais amplo.

A questão de analisar os fatos, para os historiadores, está relacionada

a dois pontos: teoria e prática. O campo teórico ainda se subdividiria em três

ramificações: epistemologia, metodologia e ideologia.

Para Jenkins, a epistemologia está vinculada ao conhecimento

presente das sociedades, e nunca aos seus conhecimentos passados delas. O

vínculo ao presente impossibilita interpretações consensuais sobre o passado;

pois, serão levantadas várias interpretações sobre o mesmo fato pretérito. O

entendimento histórico se torna múltiplo: um mesmo fato, mas vários

historiadores.

O campo metodológico permitirá a História um padrão inserido em uma

vasta gama de discursos a respeito do mundo. A liberdade de escolha, por

parte do historiador, sobre o conjunto de metodologias, por exemplo, ser mais

prática ou mais particularizada, será determinante na inserção do fato à

historiografia resultante, cuja forma de descrever e interpretar o seu modelo é

que delimitará suas fronteiras. A metodologia é a ferramenta utilizada nas

análises das fontes escolhidas pelos pesquisadores, para criticar e identificar

um período histórico.

Já a ideologia, poderá se apropriar dos fatos a fim de lhes conferir

sentidos e significados às relações da sociedade em estudo ou ao seu redor.

Alguns autores afirmam que a História sempre será utilizada para um propósito

político, sejam como forma colaborativa para substanciar as ideologias, ou

legitimando personagens, instituições, poder público, e doutrina social.

Decorre da força histórica, descrita acima, a importância dada pelos

antigos impérios e seus líderes quanto à narração das passagens de seu

governo pelos arquivos oficiais, e conferindo sentido aos seus atos e a da

coletividade.

Le Goff preconizava a teoria de que a construção da verdade seria

fruto mais muito maior de esforço criativo ao invés de descobertas factuais.

Nesse sentido, o autor afirmava a inexistência da verdade no sentido absoluto

na narrativa histórica; pois os discursos seriam influenciados por tradições

culturais predominantes.

Assim sendo, nenhum relato recuperaria totalmente os fatos ocorridos

devido ao limitado conhecimento dos acontecimentos; afinal, os mesmos

seriam traduzidos por versões parciais do momento relatadas por pequenas

frações de atores comprometidos.

Seguindo a mesma linha de raciocínio, Keith Jenkins afirmava que:

História não consistiria unicamente num estudo do passado, mas sim num

estudo da historiografia do passado, pois o pesquisador analisa e interpreta

uma obra escrita em um determinado período histórico, e não o passado

histórico de maneira geral. Referencia ao final

Todavia, Duby admitia que os trabalhos realizados pela escola

positivista não deve ser desprezado. Segundo o autor: ―Esse material constitui,

hoje, o meu principal alimento e eu tento reler, com outro espírito, os textos que

a história positiva do século XIX utilizou para construir uma história dos

acontecimentos.‖ (Duby, p. 12).

Duby ainda afirma que: os historiadores devem utilizar todas as fontes

que se julgarem necessárias, mas devem ter sempre em sua consciência que

―jamais chegaremos a uma verdade objetiva.‖ (Duby, p. 13).

Nós bem sabemos como a Grécia do século V era vista por um cidadão ateniense; mas não sabemos praticamente nada de como era vista por um espartano, um corintiano, ou um tebano – para não mencionar um persa, ou um escravo ou outro nãocidadão residente em Atenas. Nossa imagem foi pré-selecionada e predeterminada para nós, não tanto por acaso mas por pessoas que estavam consciente ou inconscientemente imbuídas de uma visão particular e que consideravam os fatos que sustentavam esta visão dignos de serem preservados. (Carr, p. 49).

Hallet Carr analisa que, apesar do esforço realizado pelos positivistas

ao reunir a maior quantidade de dados e documentos, ―a história tem sido vista

como uma enorme quebra-cabeças com muitas partes faltando.‖ (Carr, p. 49).

Exemplificando a análise supracitada, embora exista um número significativo

de fontes sobre o tema Mesopotâmia, o conhecimento em relação a esta

sociedade continua limitado; afinal, são conclusões retiradas de fragmentos

arqueológicos e em fontes iconográficas rupestres, o que não nos assegura

afirmar sobre um todo baseado apenas em contexto segmentados.

A dificuldade em se levantar uma verdade absoluta não se restringe as

limitações documentais sobre um fato. Acontecimentos relevantes mais

próximos de nossa época, dos quais existem vastas historiografias registradas,

como a Conjuração Mineira ou o período Revolucionário Militar, dificilmente

conseguiríamos conhecer qual seria a ―verdade absoluta‖ do período, ou seja,

a sua história objetiva, devido aos trabalhos de pesquisas dos historiadores

serem realizados de forma subjetiva sobre tais eventos.

Portanto, os documentos refletem, unicamente, o ponto de vista de que

certo escritor entende acerca de determinado acontecimento. A ―verdade‖ se

restringe apenas para os que admitem a sua forma de interpretação ou o seu

modo de entendimento.

Partindo deste pressuposto, Duby declara que a história não passa de

uma ficção: ―o historiador conta uma história, uma história que ele forja

recorrendo a um certo número de informações concretas.‖ (Duby, p. 13).

Segundo este autor, existem acontecimentos históricos que são

escolhidos e distorcidos a serviço de certa ideologia. Daí decorre a relevância

em saber a fonte do documento e, principalmente, questionar qual o tempo

histórico do autor.

Em primeiro lugar, os fatos da história nunca chegam a nós ―puros‖, desde que eles não existem nem podem existir numa forma pura: eles são sempre refratados através da mente do registrador. Como consequência, quando pegamos um trabalho de história, nossa primeira preocupação não deveria ser com os fatos que ele contém, mas com o historiador que o escreveu. (Carr, p. 58).

Em consequência, Hallet Carr destaca que os fatos históricos e os

documentos são instrumentos importantes para o historiador. Porém, eles em si

não retratam a História. Torna-se necessário ao historiador que debruce sobre

seu objeto, elabore indagações sobre ele, busque interpretá-lo, e pesquisá-lo

sob a ótica das ciências auxiliares.

―A função do historiador não é amar o passado ou emancipar-se do passado, mas dominá-lo e entendê-lo como a chave para a compreensão do presente.‖ (Carr, p. 61).

O historiador não deve teorizar o passado baseado em convicções

ideológicas pré-concebidas,pois as interpretações históricas poderão ser

utilizadas, mesmo que involuntariamente, como objeto político, a fim de

legitimar ideologias ou consolidar a constituição de poderes em determinado

grupo social. Há de compreender que as conclusões decorrentes de um estudo

histórico poderão acarretar consequências éticas e políticas.

Portanto, os historiadores precisam ser capazes de dominar as

diversas metodologias relativas ao seu campo e as relacionadas a ciências

sociais, e de tornar-se reflexivo ao interpretar os fatos históricos, a fim de que

restrinja, ao máximo, os subjetivismos inerentes tanto aos seus aspectos

pessoais quanto aos de seus objetos de pesquisa.

Cabe ressaltar que apesar de todo o domínio técnico do processo da

pesquisa histórica a subjetividade ainda ocorrerá. Esta constatação se deve ao

fato que o profissional por trás do trabalho continua sendo um ser humano,

dotado de raciocínio, e passível de conclusões parciais impostas por ideologias

intrínsecas ao seu inconsciente e ao coletivo que em que vive.

Portanto, as narrativas históricas sempre deverão ser utilizadas como

instrumentos de estudos tomando-se o cuidado de se criticar quanto as suas

fontes e o contexto ao qual foi redigido o relato.

Como foi demonstrado, à quase uma impossibilidade de se alcançar a

história positiva e isenta.

Contudo, realça-se o fato de o historiador ser um cientista social

preparado e treinado quanto aos desvios que podem ocorrer em suas

pesquisas. Caso este pesquisador cerque das ferramentas que minimizem os

erros em suas avaliações, as conclusões alcançadas serão as mais próximas

aos fatos ocorridos ao contexto histórico estudado.

Assim sendo, o historiador se torna o cientista mais preparado para

alcançar conclusões mais próximas possíveis a uma realidade vivida em um

período histórico, e esclarecer fatos controversos de uma sociedade; desde

que o mesmo se imbua dos cuidados relativos ao afastamento das

subjetividades intrínsecas ao ser humano.

6 CONCLUSÃO

Este trabalho de pesquisa nasceu da minha inquietude quanto à

necessidade de seja atingida a Paz Social no seio na sociedade brasileira,

traduzido pela união e solidariedade de seus cidadãos, a fim de que se

pavimentem os caminhos do Progresso Nacional.

Para que a sociedade esteja unida, os fatos controversos da formação

histórica da nação deverão ser apaziguados, e uma das formas de se atingir

este objetivo é na constituição de comissões voltadas a este fim.

Contudo, uma comissão como descrita acima precisaria ser composta

por membros que pudessem traduzir os anseios das partes envolvidas, e que

se propusessem a descrever os acontecimentos com a isenção necessária,

para que os grupos antagônicos aceitem as conclusões das verdades

alcançadas.

Com o intuito de determinar como deveriam ser os membros na

composição da comissão supracitada, esta pesquisa iniciou o estudo com o

entendimento acerca do significado da verdade.

O que ficou demonstrado é que o tema sobre a verdade persegue a

humanidade deste os primórdios gregos, os quais criam que ela deveria ser

única, pois ao contrário não a seria.

Entretanto, os filósofos contemporâneos já admitem outras

interpretações sobre o mesmo tema. Nietzsche afirma que a verdade é apenas

um ponto de vista.

Este autor sugere, ainda, que para o ser humano viver em sociedade

torna-se necessário diminuir as tendências de conflitos, admitindo, para isso,

aceitar ideias coletivas que atendam a este propósito, independentemente de

sua veracidade.

Esta teoria marcou o restante do trabalho, que ao procurar o perfil para

a melhor composição dos membros das comissões consideradas responsáveis

em desvendar os fatos controversos da sociedade, esbarrou no entendimento

contemporâneo sobre o que seria a verdade.

Inicialmente, foi pesquisada a possibilidade dos membros das

comissões da verdade fossem caracterizados pelos vieses político partidário.

Porém, ficou claro que este grupo luta pela tomada e perpetuação do poder,

amparado por um pensamento ideológico que, por sua natureza, distorce a

realidade para o melhor atendimento dos fins desejados.

Este tipo de composição não atenderia ao propósito de apaziguar os

grupos antagônicos de uma sociedade.

O segundo perfil pesquisado para membros das comissões são os

sociólogos, que possuem como objeto de estudo a explicação da sociedade

através do entendimento de da realidade social e de suas múltiplas redes de

relações.

O sociólogo, então, procura conhecer as interações intergrupais, tanto

de forma particularizada por seus subgrupos como, também, de uma sociedade

no seu todo.

Todavia, devido ao fato do entendimento sociológico partir da própria

sociedade, existe o risco da pesquisa ser contaminada pelas ideologias

reinantes de parcelas de sua população, o que desvirtuaria as conclusões e a

neutralidade do objeto controverso em pesquisa.

Logo, apesar do sociólogo ser um cientista social preparado para

analisar as formas de interações da população, haveria a necessidade de que

este pesquisador tivesse a atenção e o firme propósito em abster das

impressões subjetivas a fim de alcançar o objetivo de chegar a conclusões que

apaziguassem os grupos controversos.

O trabalho prosseguiu em pesquisa levantando a possibilidade da

comissão em questão ser conduzida por historiadores.

Porém, ao contrário da visão positivista inicial que imperava ao estudo

histórico, atualmente existe a compreensão que os relatos de fatos são

totalmente contaminados tanto pela sua origem, quanto pelo seu pesquisador;

pois, ao se revelar uma narrativa, ela é posta sob a ótica de um grupo que a

propôs descrevê-la, segundo o seu entendimento.

Mesmo que existam abundantes fontes de consultas, de diversas

origens e interpretações distintas sobre o mesmo acontecimento, caberá o

poder discricionário do historiador eleger esta ou aquela versão que será

explorada.

Assim sendo, caberá, unicamente, ao pesquisador histórico atentar

para as técnicas de evitar o subjetivismo que distorceria as interpretações

sobre um determinado objeto de estudo.

Conforme o resumo da pesquisa descrito acima, ficou claro a

dificuldade de se determinar uma verdade isenta sobre fatos históricos. Sempre

existirá o risco sobre a contaminação das conclusões obtidas pela ótica a qual

o pesquisador irá desenvolver o seu trabalho.

Logo, qualquer comissão que seja montada para este fim, caso não

exista um comprometimento de seus componentes, só atenderia a necessidade

de legitimar a versão do grupo dominante.

Se a comissão tiver um viés político, ficaria assegurada a parcialidade

das conclusões alcançadas. Uma comissão sob o viés político só teria a

finalidade de impor uma teoria acerca do fato contraditório.

A solução acima descrita não traria o apaziguamento necessário das

partes litigiosas em questão a ponto de se unirem para a construção de uma

Paz Social que aglutinassem as forças nacionais de todas as partes para o

progresso da nação.

A comissão com sob uma interpretação sociológica teria uma forte

tendência a se contaminar com as afirmações admitidas por aquela sociedade,

podendo desvirtuar da consciência temporal vivida na época das ocorrências

dos fatos contraditórios. Porém, se os pesquisadores conseguirem filtrar as

propensões sociais, poderia efetuar um levantamento próximo do fidedigno e

capaz de abrandar as discórdias no seio da sociedade.

Portanto, segundo o resultado deste trabalho, apesar da

impossibilidade de desvendar totalmente a veracidade dos acontecimentos, o

historiador seria o cientista social mais apto a desvendar os acontecimentos

que circundam um fato controverso da sociedade e, assim, alcançar um

apaziguamento entre os grupos distintos; desde que o mesmo se proponha a

utilizar todas as técnicas possíveis para minimizar o subjetivismo inevitável que

cerca toda verdade social.

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