a aplicabilidade da lei brasileira de direitos autorais no Âmbito da internet
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
FACULDADE DE DIREITO
COORDENAO DE MONOGRAFIA
A APLICABILIDADE DA LEI BRASILEIRA DE DIREITOS AUTORAIS
NO MBITO DA INTERNET
PEDRO SPOLADORE FERREIRA DOS REIS
CUIAB-MT
2011
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
FACULDADE DE DIREITO
COORDENAO DE MONOGRAFIA
A APLICABILIDADE DA LEI BRASILEIRA DE DIREITOS AUTORAIS
NO MBITO DA INTERNET
PEDRO SPOLADORE FERREIRA DOS REIS
Monografia apresentada banca
examinadora da Faculdade de Direito da
UFMT como exigncia parcial para
obteno do grau de Bacharel em Direito,
sob a orientao da Professora Mestre
Vera Lucia Marques Leite.
CUIAB-MT
2011
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II
Nada mais substituir a Internet na sua faanha de responder a todas
as perguntas, no infinito do conhecimento humano, como se ahumanidade fosse uma s!
Miguel Reale
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III
DEDICO esta obra internet, repositrio de
conhecimento humano, de cultura, de discusses e
ideias livres, e que assim seja para sempre. Amm.
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IV
AGRADEO aDeus por trazer existncia as coisas
que no existem, a comear por mim, minha querida
famlia e esta monografia, que no existiria sem o
apoio e incentivo de meus irmos e pais, a quem
amo demais. Agradeo minha amada noiva,
Nayara, pela pacincia demonstrada ao longo de um
ano to atribulado. Agradecimento especial minha
orientadora e professora Vera Lucia Marques Leite,
exemplo de profissional dedicada, que me concedeu
a liberdade de pesquisar um tema recente,
complicado e ainda pouco estudado, mas
apaixonante.
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Um primata da espcie Macaca Negra (Macaca nigra) da Ilha de Celebes, na Indonsia, pega
a mquina do premiado e descuidado fotgrafo britnico David Slater e posa para um
autorretrato (julho de 2011). Pergunta-se: A quem pertencem os direitos autorais desta foto?
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SUMRIO
INTRODUO .................................................................................................................... 71 BREVE HISTRICO DOS DIREITOS AUTORAIS ................................................... 151.1 OS DIREITOS AUTORAIS NA ANTIGUIDADE......................................................... 161.2 OS DIREITOS AUTORAIS NA IDADE MDIA .......................................................... 201.3 OS DIREITOS AUTORAIS NA IDADE MODERNA ................................................... 221.3.1 Ocopyright e a legislao inglesa .............................................................................. 251.3.2 Odroit dauteur e a legislao francesa .................................................................... 301.4 OS DIREITOS AUTORAIS NA IDADE CONTEMPORNEA .................................... 321.5 EVOLUO DOS DIREITOS AUTORAIS NO BRASIL ............................................. 352 A LEI BRASILEIRA DE DIREITOS AUTORAIS ....................................................... 392.1 DIREITO AUTORAL .................................................................................................... 392.1.1 Conceituao ............................................................................................................. 392.1.2 Distino entre Propriedade Material e Propriedade Intelectual ........................... 402.1.3 Classificao .............................................................................................................. 422.1.4 Natureza jurdica ...................................................................................................... 432.1.5 Direitos morais .......................................................................................................... 462.1.6 Direitos patrimoniais ................................................................................................. 472.2 FUNO DOS DIREITOS AUTORAIS ....................................................................... 482.3 A TUTELA CONSTITUCIONAL DOS DIREITOS AUTORAIS .................................. 512.4 PRINCPIOS QUE REGEM OS DIREITOS AUTORAIS.............................................. 523 A LDA E A INTERNET ................................................................................................. 55 3.1 A INTERNET, AS TECNOLOGIAS DIGITAIS E AS BATALHAS JURDICAS ........ 553.2 A APLICABILIDADE DA LDA NO MBITO DA INTERNET .................................. 603.3 A NECESSIDADE DE REFORMAR A LDA ................................................................ 66CONSIDERAES FINAIS ............................................................................................. 68REFERNCIAS ................................................................................................................. 71ANEXO A ........................................................................................................................... 75
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INTRODUO
Valha-me Deus, com quanta nsia deves de estar esperando agoraeste prlogo, leitor ilustre (ou plebeu), pensando nele achar
vinganas, ralhos e vituprios contra o autor do segundo D. Quixote,digo daquele que dizem que foi engendrado em Tordesilhas e nasceuem Tarragona! Mas em verdade que no te darei esse gosto, pois, se
os agravos despertam a clera nos mais humildes peitos, no meu estaregra h de ter exceo. Bem quiseras que o tachasse de asno,
mentecapto e atrevido, mas isso no me passa pelo pensamento; que
o castigue o seu pecado e l coma da sua semeadura, e faa bom
proveito.
Miguel de Cervantes1
O texto em epgrafe trata-se do prefcio ao segundo volume do clssico
literrio O Engenhoso Cavaleiro Dom Quixote de La Mancha, ou
simplesmente Dom Quixote, escrito e publicado por Miguel de Cervantes em
1615 como a continuao do primeiro tomo, lanado em 1605, que obteve
estrondoso sucesso em toda a Europa, cujas primeiras dez edies em castelhano
se esgotaram logo aps a publicao, sem contar as quase imediatas tradues
para o ingls e o espanhol.
Em tom sarcstico e de forma brilhante, Cervantes nada mais faz do que
dar um tapa com luva de pelica na face de quem escrevera e publicara, em 1614
um ano antes de sua obra original , uma continuao apcrifa e de m
qualidade das aventuras de Dom Quixote as quais Cervantes deixara
propositadamente em aberto ao fim do primeiro volume para posterior
concluso, devidamente apressada por conta da imitao barata que estava
1 CERVANTES SAAVEDRA, 2007, p. 37.
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circulando. Ainda pairam discusses sobre a real identidade do autor do
Quixote apcrifo, que se apresentou pelo pseudnimo de Alonso Fernndes de
Avellaneda, mas o fato que Cervantes, ao inserir aquilo na histria2,
resolveu, com bastante astcia, um problema de direito autoral muito comum
quela poca: a imitao de obras alheias, potencializada pela popularizao da
prensa de tipos mveis, inventada por Gutenberg cerca de dois sculos antes,
conforme veremos em detalhes adiante, no histrico sobre os direitos autorais.
Alm dos problemas acarretados pela difuso em grande escala dos
livros cpias no autorizadas, imitaes, pirataria, entre outros , outra
situao histrica envolvendo direitos autorais, tambm experienciada por
Cervantes, era a questo dos privilgios editoriais concedidos pelos reis e
poderosos da poca. O jurista Plnio Cabral (2003, p. 4), especializado em
direito autoral, explica:
Como o prprio nome indica, a licena para impresso de obrasconstitua um privilgio peculiar e particular. A histria registra essasconcesses e mostra que elas representavam, inegavelmente, umaforma de controle sobre os autores e um protecionismo desmedido.Autores menos rebeldes e mais acomodados dedicavam suas obras a
bispos, reis, prncipes, duques enfim, aos poderosos do dia,buscando o beneplcito e, sobretudo, licena para impresso domaterial criado.
2 No segundo volume, Dom Quixote fica sabendo que andava circulando um livro contando suas aventuras (oprimeiro volume, por Cervantes), e ainda um outro que contava tudo errado (o de Avellaneda). Gnio que era,Cervantes bolou uma soluo perfeita para o problema do direito autoral no a pirataria, mas o problema dodono da ideia: mostrar que voc muito melhor e por isso o legtimo titereiro da ideia. E, se no inventou ametalinguagem, pelo menos a usou de forma brilhante, no melhor estilo sua-inveja-faz-a-minha-fama. E isso em1615! (CAMPOS, 2010).
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o que ilustra o Anexo A deste trabalho, onde se pode ver alm do
frontispcio apcrifo de Avellaneda que Cervantes dedica sua obra a um
conde, alm de deixar claro que possui o privilgio para a publicao de seu
livro e que, portanto, foi aprovado pela censura real.
O que aconteceu com a segunda parte do Quixote certamente no foi
exclusividade de Cervantes. Conforme esclarece a professora Maria Augusta da
Costa Vieira, na apresentao traduo da segunda parte da obra de Cervantes
(2007, p. 13),
as noes atuais de originalidade e imitao literria no coincidemcom as que imperavam nos sculos XVI e XVII, em que a imitaode obras de outros autores era prtica corriqueira e recorrente, capazde proporcionar dilogos implcitos e muitas vezes burlescos sobre asformas de composio. A prpria obra de Cervantes, se considerada apartir da rede discursiva que compunha o universo textual desse
perodo, pode ser a evidncia de que um texto brota de vrios outros,motivados por concordncias, divergncias, rebaixamentos,apropriaes, ironias, enfim, uma multiplicidade de relaespossveis.
Essa evidncia qual se refere Vieira ser o ponto de partida deste
trabalho, pelo qual pretendemos discorrer inicialmente, em nossa investigao
sobre os direitos autorais, que o prprio desenvolvimento cultural da
humanidade se autoalimenta, uma vez que, ao longo de nossa histria, todo o
repositrio cultural comum sempre foi utilizado pelos autores para efetuarem
suas criaes particulares o que a autora acima ilustrou como quando um
texto brota de vrios outros e, portanto, podemos dizer que haveria por parte
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destes uma dvida moral para com o restante da sociedade, uma vez que sua
obra s pde ser criada a partir do legado social previamente disponvel.
Nesse sentido, quanto mais restritivo for o alcance cultura disponvel, ou
seja, quanto mais rgida for a proteo s obras intelectuais, mais restritiva ser
sua esfera de reutilizao e, por conseguinte, menor o desenvolvimento cultural
da humanidade.
a partir dessa premissa que entramos no cerne da discusso proposta
neste trabalho: a Lei Brasileira de Direitos Autorais, Lei n. 9.610/98, doravante
apenas LDA, tida pelos especialistas no assunto como uma das mais restritivas
de todo o mundo, por suas muitas limitaes e rol taxativo de excees, o que
dificulta o acesso ao conhecimento e cultura.
Desde a sua implementao em 1998, a LDA no sofreu qualquer reviso
ou adaptao que contemplasse as novas possibilidades surgidas com as
inovaes tecnolgicas e com o uso cada vez mais expandido e cotidiano da
internet.
Mesmo as condutas mais comuns e socialmente aceitas hoje so, a rigor,
contrrias LDA. o que alerta Srgio Vieira Branco Jnior (2007, p. 2) em
seu livro Direitos autorais na internet e o uso de obras alheias:
Muitas dessas condutas, embora sejam, sob a leitura rigorosa da lei,violadoras de direitos autorais, na verdade esto a servio daliberdade de expresso e do acesso cultura, ou seja, de princpios
constitucionalmente protegidos.
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De fato, todo o sistema brasileiro de proteo aos direitos autorais baseia-
se na defesa do autor e na no utilizao de sua obra, exceto mediante expressa
autorizao legal ou com seu consentimento, situao que restringe o acesso
cultura digital, baseada no compartilhamento3.
Pela atual lei brasileira, em nenhuma situao se permite fazer cpia
integral de uma obra sem autorizao prvia e expressa do detentor de direitos
autorais. E sendo a internet um meio digital, pelo qual a cpia perfeitamente
idntica ao original porque utiliza bits e tendo uma velocidade absurda de
reproduo e propagao por conta da vasta rede (web) por onde trafegam
esses bits , necessria uma readequao da lei a essa nova realidade social, e
no o contrrio, como tentou fazer o governo dos Estados Unidos, rendido ao
lobby da indstria cinematogrfica e de produo musical, ao promulgar severas
leis contra o compartilhamento de arquivos pela internet, que pouco ou nenhum
efeito tm sobre o fenmeno.
Em que pese ser uma lei recente, o anacronismo da LDA resta evidente
quando exemplificado, seno vejamos alguns casos em que as condutas descritas
abaixo constituem potencial violao ao art. 29, inciso I 4 da lei supracitada, o
qual trata especificamente da questo de reproduo5:
3No h exagero em dizer que o compartilhamento (de textos, fotos, udio, vdeo etc.) a razo de ser das redessociais mais conhecidas, como Facebook e Twitter.4Art. 29. Depende de autorizao prvia e expressa do autor a utilizao da obra, por quaisquer modalidades,
tais como: I - a reproduo parcial ou integral;5Art. 5 Para os efeitos desta Lei, considera-se:(...) VI - reproduo - a cpia de um ou vrios exemplares deuma obra literria, artstica ou cientfica ou de um fonograma, de qualquer forma tangvel, incluindo qualquerarmazenamento permanente ou temporrio por meios eletrnicos ou qualquer outro meio de fixao que venhaa ser desenvolvido;
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a) Instituies de preservao do patrimnio cultural como bibliotecase cinematecas no podem tirar cpias para preservar obras raras,
esgotadas, ou que esto deteriorando. S permitido tal
procedimento com autorizao dos titulares;
b) Filmes e msicas no podem ser exibidos nas salas de aula, parafins pedaggicos, sem a autorizao do detentor dos direitos;
c) Transferir msica de um CD legalmente adquirido para ocomputador, convertendo o udio para um formato digital como o
MP3, s permitido com autorizao dos titulares, caso contrrio
h violao da lei;
d) Fazer o download de um filme raro, que no existe em nenhumalocadora do pas, com o intuito de assistir a ele em casa, contra a
LDA.
Diante desse cenrio, acertada a ponderao de Branco Jnior (2007, p. 2):
Naturalmente, a vedao total e incontornvel utilizao de obrasprotegidas por direitos autorais por parte de terceiros criaria umasociedade limitada em seu desenvolvimento cultural, cientfico etecnolgico. Afinal, se assim fosse, apenas mediante autorizaoexpressa do autor seria possvel fazer, por exemplo, citao de obraalheia em trabalho cientfico, o que caracteriza, per se, absurdoinaceitvel.
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E para no corrermos o risco de ser injustos, reconhecemos os avanos
proporcionados pela LDA/98, valendo-nos dos ensinamentos do jurista Plnio
Cabral (2003, p. 12):
necessrio considerar que nenhuma lei pode contemplar todos osfenmenos sociais, especialmente num perodo de constantesmutaes. A interpretao do diploma legal frente realidade quelhe vai dar vida, transformando letra e papel em fora atuante.
neste contexto que se apresenta o trabalho em relevo, perfazendo a
anlise histrica do direito autoral e sua regulamentao no Brasil atravs da
LDA, citando alguns de seus aspectos anacrnicos em face da realidade digital.
Por fim, tentaremos responder questo: a LDA, nos moldes atuais, aplicvel
internet?
No Captulo Primeiro procuramos fazer um breve relato histrico dos
direitos autorais no mundo e no Brasil, pelo que procuramos condensar, ao
mximo possvel, vrios pontos importantes e essenciais para a compreenso da
evoluo da proteo aos direitos autorais ao longo dos milnios at os dias
atuais.
J no Captulo Segundo, dedicado lei brasileira de direitos autorais,
optamos por inserir tambm a conceituao, classificao e os vrios aspectos
do direito autoral, principalmente com relao sua natureza jurdica o que
no tarefa simples em se tratando de um instituto jurdico multifacetado , uma
vez que essas caractersticas foram abordadas no mbito da realidade jurdica
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brasileira. Em seguida, ressaltamos a constitucionalidade e os princpios que
regem os direitos autorais.
Por fim, no Captulo Terceiro, abordaremos o desenvolvimento das
tecnologias digitais, calcadas na internet, para, em seguida, tratar de alguns
aspectos legais da LDA, observando que vrias de suas disposies j no
encontram respaldo social, ou seja, em muitos casos o senso comum indica que
determinadas condutas hoje no constituem qualquer violao aos direitos
autorais de obras protegidas, por isso a necessidade de reforma da lei.
Por fim, cabe dizer que o presente trabalho decorre de uma pesquisa
bibliogrfica cujo mtodo de abordagem foi a chamada pesquisa qualitativa, em
que a nfase est em seguir a tradio compreensiva, qual seja, valorizar o
aspecto interpretativo do objeto em anlise, no intuito de buscar percepes e
entendimento sobre a natureza geral de uma questo, abrindo espao para a
interpretao por parte do pesquisador.
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1 BREVE HISTRICO DOS DIREITOS AUTORAIS
O homem recria a realidade. Registra os fatos segundo seu ponto devista.
Plnio Cabral
Acreditamos ser praticamente impossvel tratar sobre direito do autor sem
antes traar a sua evoluo histrica, mesmo que breve.
A contextualizao dos direitos autorais ao longo das eras essencial para
a compreenso do ordenamento jurdico nacional sobre direitos autorais, que
to somente o resultado de sculos de aperfeioamento legal.
A maioria dos autores, ao versar sobre a histria dos direitos autorais,
inicia o seu estudo a partir do perodo histrico convencionado como
Antiguidade, em especial por razo do indiscutvel legado cultural dos
imprios romano e, principalmente, grego atravs das mais diversas
manifestaes artsticas.
Consideramos essa abordagem histrica a mais apropriada, embora no
deixemos de registrar a corajosa postura da jurista Manuella Santos (2009, p.
13), que inovou ao iniciar o estudo histrico a partir da Pr-Histria, por
entender que o direito autoral nada mais do que um produto do intelecto, uma
expresso da capacidade criativa do ser humano, cujo marco o surgimento do
homem sobre a Terra.
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Por meio dessa abordagem, a autora discorre sobre as vrias
manifestaes artsticas do homem primitivo, como os entalhes feitos em pedra,
osso ou madeira, alm das pinturas rupestres, consideradas como obras de arte
de valor inestimvel para a humanidade.
A autora esclarece ainda que,
alm da arte dos povos pr-histricos, tambm considerada arteprimitiva aquela produzida pelos ndios e outros povos que viviam na
Amrica antes da vinda de Colombo. Maias, astecas e incas nosbrindaram com pinturas, esculturas e templos feitos de pedras oumateriais preciosos, que nos contam sua histria (SANTOS, 2009, p. 15).
Julgamos apropriado dividir o histrico em quatro grandes eras, de acordo
com um entendimento de diversos autores sobre o tema: Antiguidade, Idade
Mdia, Idade Moderna e Idade Contempornea.
1.1 OS DIREITOS AUTORAIS NA ANTIGUIDADE
A Idade Antiga ou Antiguidade, compreende, segundo os historiadores, o
perodo que se estende de cerca de 4000 a.C. at 476 d.C., ou seja, do
aparecimento da escrita at a queda do Imprio Romano do Ocidente. uma
poca marcada pela conquista de povos, grande produo cultural e descobertas
essenciais para as futuras civilizaes.
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Esse perodo foi marcado principalmente pela pujana artstica das
civilizaes grega e romana, consideradas como o bero da cultura ocidental.
Com respeito a esses dois povos, Joo Carlos de Camargo Eboli (2006, p. 17)
faz uma importante e justa observao:
Diferentemente dos gregos, os romanos no eram dotados de muitaimaginao artstica. Tinham esprito prtico e dominador. Suas artesderivam de influncias recebidas de povos conquistados. pacfico oconceito de que Roma conquistou militarmente a Grcia, mas foiespiritualmente por ela dominada. Assim, os romanos passaram a
imitar os gregos, no somente na Arte, mas tambm nos trajes ecostumes. Falar grego, vestir-se grega, possuir obras de arte passoua ser um requintado hbito para o povo romano.
Naquele momento histrico, em que pese a abundante produo
intelectual e at mesmo a consagrao pblica de inmeros artistas, no lhes era
assegurado o status de propriedade das obras, muito menos o de exclusividade.
A criao intelectual girava em torno do interesse do seu autor, mesmo que o
foco principal da reivindicao no se localizasse no plano econmico, mas sim
no reconhecimento pblico da paternidade dos discursos e escritos e
consequente incremento de fama e prestgio do autor, conforme narrado pelo
autor Jos Carlos Costa Netto (2008, p. 50):
curioso observar que, na histria do direito de autor, uma das maisantigas regras oficiais conhecidas surgiu no inconformismo queexiste at hoje dos autores de peas teatrais em relao improvisao dos atores em cena, incluindo os vulgarmentedenominados cacos (falas improvisadas) aos textos originais dasobras representadas. Nesse sentido, Michaelides Novaros destaca, nombito do direito moral de autor relativo ao respeito integridade da
sua obra (neste caso teatral), uma lei ateniense, de 330 a.C., queordenou que cpias exatas das obras de trs grandes clssicos haviam
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sido depositadas nos arquivos do Estado e que, constituindo textooficial, deveriam ser respeitados pelos atores em suas representaes.
Nos dias atuais, os princpios mais elementares das leis de direitos
autorais vedam a transmisso da autoria da obra, independentemente do meio
pelo qual se d a cesso o caso das obras que caem em domnio pblico, no
qual o nome do autor deve estar a elas vinculado eternamente , mas na
Antiguidade era permitido ao autor da obra negociar a sua autoria, uma vez que
o domnio do autor sobre sua obra ainda era muito forte e pessoal. o que relata
Daniel Rocha (2001, p. 15)6:
H registros de um interessante caso em que o poeta Marcial discutecom Fidentino, suposto plagiador de sua obra, os meios de aquisiode seus trabalhos. Marcial teria argumentado: segundo consta,Fidentino, tu ls os meus trabalhos ao povo como se fossem teus. Sequeres que os digam meus, mandar-te-ei de graa os meus poemas; sequiseres que os digam teus, compra-os, para que deixem de sermeus. E teria ainda afirmado que quem busca a fama por meio depoesias alheias, que l como suas, deve comprar no o livro, mas osilncio do autor.
Portanto, embora no contasse com um sistema legal de proteo aos
direitos autorais, j existia um direito subjetivo coletivo, que procurava destacar
o autor da obra e reprovar o plgio, como nos ensinam Branco Jnior e Moniz
(2009, p. 13-14):
Inexistiam os direitos de autor para proteger as diversasmanifestaes de uma obra, como sua reproduo, publicao,representao e execuo. Concebia-se, na poca, que o criador
intelectual no devia descer condio de comerciante dos produtos
6 ROCHA, Daniel. Direito de autor. So Paulo: Irmos Vitale, 2001.
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de sua inteligncia. Porm, j surgiam as primeiras discussesacerca da titularidade dos direitos autorais. A opinio pblicadesprezava os plagiadores, embora a lei no dispusesse de remdioseficazes contra a reproduo indevida de trabalhos alheios .
Depreende-se, ento, que, mesmo carecendo de regulamentao prpria, o
direito do autor, em seus aspectos morais, j era amparado pelo direito de
personalidade. Essa concluso reforada ao vislumbrarmos naquela poca a
existncia da actio injuriarum, instrumento processual romano que consistianum interdito criado no sculo II a.C. para defesa do sujeito contra a ofensa
honra e liberdade, entre outros, vindo a substituir a vingana privada naquela
sociedade, conforme explicado pelo jurista Cludio Luiz Bueno de GODOY
(2001, p. 17).
Para os romanos, a injria (etimologicamente: in = no + jus, juris =
direito e, portanto, significa no direito) era considerada, em sentido amplo,
tudo aquilo que se faria sem direito e, em sentido estrito, todo ato voluntrio,
ofensivo da honra ou boa reputao do indivduo (COSTA NETTO, 2008, p.
51).
Nesse sentido, a prpria legislao brasileira hoje em vigor, semelhana
da actio injuriarum, protege os direitos de personalidade e morais do criador
intelectual, ao assegurar a integridade de sua obra, opondo-se a quaisquer
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modificaes, ou prtica de atos que, de qualquer forma, possam prejudic-la,
ou atingi-lo, como autor em sua reputao ou honra7.
Em suma, a normatizao do direito de autor, como Direito Positivo,
representando um conjunto de normas de carter universal e obrigatrio, surgiu
muito depois da Antiguidade Clssica. Entretanto, embora o fato de o Direito
Romano, fonte maior do nosso Direito Positivo, no possuir qualquer disposio
legal especfica sobre as prerrogativas dos criadores intelectuais, no significa
que os direitos dos artistas plsticos, dramaturgos e escritores no fossem
amparados dentro da lei geral, dispensando uma legislao especial (EBOLI,
2006, p. 19). Nesse sentido, o jurista Joo Henrique da Rocha Fragoso (2009, p.
60) nos explica que,
no mundo helnico, e mais comprovadamente em Roma, sesancionava a usurpao da paternidade (como o moderno plgio) e amodificao das obras, ou seja, se sancionavam direitos morais comosano social, mas ainda no como sano jurdica.
1.2 OS DIREITOS AUTORAIS NA IDADE MDIA
Os historiadores convencionaram o incio da Idade Mdia como sendo no
ano de 476 d.C., com a queda do Imprio Romano do Ocidente, encerrando-se
em 1453, com a tomada de Constantinopla pelos turco-otomanos.
7 Artigo 24, inciso IV da Lei n 9.610/98 (nova lei brasileira de direitos autorais).
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Apesar de a Idade Mdia ser conhecida como a poca do primitivismo, do
atraso e do empobrecimento cultural, ganhando inclusive a alcunha de Idade das
Trevas, hoje existe um entendimento entre os historiadores de que no foi o
mundo todo coberto por um manto de trevas culturais naquela poca, ou seja, na
verdade, essa periodizao estaria mais restrita ao continente europeu e no a
toda a humanidade. Prova disso foi o avano da matemtica e da astronomia no
mundo muulmano durante a Idade Mdia todo esse conhecimento cientfico
seria utilizado mais tarde pelos europeus para empreenderem as grandes
navegaes, por exemplo.
Costa Netto (2008, p. 52) nos ensina que, com a queda de Roma, a Europa
mergulhou em um perodo difcil para as artes, com distrbios e invases que
assolaram as populaes. As coisas do esprito, salvo a religio, assumem
carter secundrio.
A igreja detinha o monoplio cultural e uma evidncia disso foi o trabalho
dos monges copistas, reclusos em mosteiros, que permitiu preservar muitos
manuscritos da Antiguidade Clssica. No perodo medieval esses indivduos
eram praticamente os nicos letrados. Sobre a influncia do trabalho dos
copistas nos direitos autorais, Santos (2009, p. 22) esclarece:
Como os manuscritos eram copiados mo, um a um, a reproduoera muito difcil e por isso a utilizao de uma obra no prejudicavaos direitos patrimoniais do autor, pois sua produo no estavacentrada na difuso de inmeros exemplares.
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Por outro lado, conforme destacado por Costa Netto (2008, p. 52),
a preocupao com a disseminao de temas religiosos,
principalmente no que concerne aos manuscritos duplicados emmonastrios, implicou na dificuldade de identificao de autoria(direito moral) e provvel ausncia de interesse econmico.
1.3 OS DIREITOS AUTORAIS NA IDADE MODERNA
A Idade Moderna tem incio em 1453, com a tomada de Constantinopla
pelos turco-otomanos, e termina em 1789, com a Revoluo Francesa mais
precisamente, com a queda da Bastilha.
Em 1436, o alemo Hans Gutenberg inventou a prensa de tipos mveis 8,
revolucionando o sistema de extrao de cpias, em grandes quantidades e com
baixo custo, de obras literrias e outros escritos que, durante os vinte sculos
anteriores eram manuscritos. Estima-se que, antes da prensa, existiam na Europa
cerca de 30 mil livros, sendo a maior parte deles Bblias, as quais levavam em
mdia um ano para serem transcritas por monges copistas. Apenas cinquenta
anos aps a inveno da prensa, j circulavam por toda a Europa mais de 13
8 Todos os estudos histricos sobre os direitos autorais destacam a importncia da inveno da prensa de tiposmveis, criada por Johannes Gutenberg por volta do ano 1450. Entretanto, embora reconhecida a importncia daprensa de Gutenberg para a reproduo de textos impressos em larga escala, no podemos deixar de registrar quea prensa j era conhecida na China desde 1040, tendo sido inventada pelo chins Pi Sheng. A maioria doshistoriadores acredita que Gutenberg desconhecia a inveno chinesa e acreditava estar desenvolvendo uma
tecnologia inteiramente nova. (TRIDENTE, 2009 apudHAVEN, 2006, p. 49)8.
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milhes de livros, versando sobre poltica, cincias, literatura e os mais variados
assuntos9.
A prensa de Gutenberg consiste em um marco na conscientizao sobre a
necessidade de estabelecimento de uma forma de proteo diferenciada do
regime comum e genrico prprio aos bens materiais mveis. Segundo Costa
Netto (2006, p. 52),
as vrias cpias extradas de um nico livro no consistiam apenas nareproduo de um objeto qualquer pois, ao contrrio, continham umbem imaterial dissociado do suporte fsico dos exemplares e ligado personalidade do autor: a obra intelectual.
Outra consequncia importante do surgimento da prensa de Gutenberg
apontada por Eduardo Lycurgo Leite (2004, p. 130-131):
A partir dos tipos mveis, tornou-se mais fcil fazer a afirmao deque um determinado texto seria a representao estrita do esprito epropriedade de uma s pessoa, sendo que, atravs da ideia de fixao,a associao da obra como uma fonte particular de criao, a qual,atravs de associao virtual, poderia reivindicar a propriedadedaquela obra, passou a ser mais facilmente realizada.
Essa associao, aliada ao crescimento do mercado de obrasintelectuais, em especial, das obras literrias, fez surgir dentre osautores a viso de que os mesmo poderiam ser reconhecidos e suasobras valoradas dependendo da fama que obtivessem.
Com isso, os autores, em razo da fama que buscavam e davalorizao de suas criaes intelectuais, passam a exigir que aautoria de suas obras seja apontada e sua propriedade reconhecida.Nasce assim, para os Autores, o sentimento que podemos chamar deindividualismo possessivo e o qual representa o desejo de se elevar eprestigiar o trabalho intelectual.
9 The practice of printing spread through Europe via a diaspora of German printers. By 1500, presses had beenestablished in more than 250 places in Europe () The presses produced about 27.000 editions by the year
1500, wich means that, assuming an average print run of 500 copies per edition about thirteen million books
were circulating by that date in a Europe of 100 million people. (BRIGGS; BURKE, 2007, p. 13)
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Todavia, mesmo naquela poca, a identificao do titular da proteo
ainda no seria direcionada ao autor da obra. Era mais visvel a atividade tcnica
tipogrfica e dos impressores, ante a evidente necessidade de proteo do seu
investimento e das atividades comerciais.
Nesse sentido, Branco Jnior e Moniz (2009, p. 15) esclarecem que
a inveno da tipografia e da imprensa, no sculo XV, revolucionouos direitos autorais, porque os autores passaram a ter suas obras
disponveis de maneira muito mais ampla. Nessa poca surgiram osprivilgios concedidos a livreiros e editores, verdadeiros monoplios,sem haver ainda o intuito, porm, de proteger os direitos dos autores.
Argumenta Fragoso (2009, p. 65) que os direitos autorais no incio da
Idade Moderna ainda se encontravam enraizados
no direito ou privilgio concedido pelos monarcas aos que atualmentedenominamos editores, no caso, os editores grficos ou aqueles quedo publicidade obra literria e outras reproduzveis por meiosgrficos, com a finalidade de sua explorao patrimonial.
Por fim, Branco Jnior e Moniz (2009, p. 16) sentenciam:
Claramente, o alvorecer do direito autoral nada mais foi que acomposio de interesses econmicos e polticos. No se queriaproteger prioritariamente a obra em si, mas os lucros que delapoderiam advir. evidente que ao autor interessava tambm ter suaobra protegida em razo da fama e da notoriedade de que poderia vira desfrutar, mas essa preocupao vinha, sem dvida, por viatransversa.
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1.3.1 Ocopyright e a legislao inglesa
Com o desenvolvimento cultural europeu e o crescente acesso da
populao alfabetizao, com a descoberta da imprensa e a consequente
facilidade na obteno da reproduo dos trabalhos literrios, surgiu tambm a
concorrncia das edies abusivas. Da o interesse em reprimi-las, pois o autor,
que antes tinha pelo menos um controle sobre a reproduo das obras,decorrente da posse do manuscrito original, passou a perd-lo, uma vez que cada
possuidor de uma cpia impressa podia, com toda facilidade, reproduzi-la
(COSTA NETTO, 2006, p. 54).
Em face desse estado de coisas, originou-se o que podemos considerar
como a primeira categoria organizada de comerciantes de obras intelectuais na
rea literria: os impressores e vendedores de livros, precursores dos editores
modernos, considerados como os intermedirios entre o autor da obra intelectual
e o pblico. Interessados principalmente no resultado econmico, os stationers,
como eram denominados na Inglaterra, impulsionaram sobremaneira ofortalecimento dos direitos patrimoniais decorrentes da explorao econmica
da obra. Contudo, naturalmente, tais intermedirios reivindicavam para si a
titularidade desses direitos. Por isso, esclarece Costa Netto (2006, p. 55), os
privilgios obtidos naquela ocasio devem ser considerados mais
propriamente editoriais do que autorais.
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Paralelamente ao monoplio dos livreiros, surge a pirataria, que oferecia
livros a preos populares. Sob o pretexto de combat-la, os livreiros ingleses
conseguiram ampliar ainda mais seus poderes por meio de um decreto real de
1586. Assim, os anseios do autor continuavam sendo ignorados.
Em 1662, na Inglaterra, publicado o Licensing Act, um decreto querefora ainda mais o monoplio dos livreiros. Por meio dessa norma,os livreiros passaram a exercer mais plenamente a censura naimprensa e nos livros importados, os nicos a trazerem textos dereprovao conduta do rei ou de sua famlia. A situao no poderia
ter um desfecho mais bvio para a poca: os livros piratas e oscensurados eram queimados em praa pblica (SANTOS, 2009, p. 34).
Ao mesmo tempo em que a indstria editorial se desenvolvia, a
insatisfao dos autores crescia, at que, em 1694, culminou no trmino da
censura e do monoplio na Inglaterra. Como consequncia, os livreiros ficaram
enfraquecidos, sofrendo inclusive a concorrncia de estrangeiros, em razo da
abertura de mercado. Os livreiros decidem ento mudar de estratgia, passando a
solicitar proteo no mais para eles, mas para os autores, na esperana de
negociar com estes a cesso dos direitos sobre as obras (BRANCO JNIOR;
MONIZ, 2009, p. 16).
Com aLicensing Actexpirada em 1695, a Inglaterra ficou vrios anos sem
uma legislao especfica que regulasse o direito dos livreiros, os quais
passariam a utilizar-se da jurisprudncia consolidada dos julgados nas cortes
pelos juzes, no intuito de garantir seus privilgios de publicao ad eternum.
Ainda assim, como a competio estrangeira reduzia seus ganhos, houve reao
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dos livreiros, que pressionaram o Parlamento para que este criasse uma lei que
lhes desse novamente o controle exclusivo sobre a publicao.
Como resultado, em 14 de abril de 1710 foi publicada aquela que seria
considerada a primeira lei de direito autoral do mundo, a Copyright Act,
conhecida como o Estatuto de da Rainha Ana.
O Estatuto estabelecia aos autores o direito exclusivo de imprimir seus
livros e dispor das cpias pelo perodo de catorze anos, renovvel uma vez se o
autor estivesse vivo, e todas as obras publicadas at aquele momento teriam um
perodo nico de proteo de vinte e um anos a mais (1710 + 21). Institua-se o
copyright (ou o j aportuguesado copirraite), derrogando-se, assim, o
privilgio feudal, vigente desde 1552, em favor da corporao dos impressores e
livreiros ingleses (COSTA NETTO, 2006, p. 55).
Nas palavras do professor e escritor norte-americano Lawrence Lessig
(2004, p. 78):
O Estatuto de Anne dava ao autor ou proprietrio de um livro umdireito exclusivo de publicar aquele livro. Uma limitao importante,
porm, para horror dos livreiros, era que a lei dava ao livreiro odireito apenas por um certo perodo. No final desse perodo, ocopyrightexpirava e a obra ento era livre e poderia ser publicadapor qualquer um.
O referido autor nos ajuda a entender como a ganncia dos stationers
dificultava o acesso ao conhecimento, e como o Parlamento ingls procurou
frear esse mpeto monopolista:
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Muitos acreditavam que o poder que os livreiros exerciam sobre adisseminao do conhecimento estava prejudicando-a, justo na pocaem que o Iluminismo estava ensinando-os a importncia da educaoe da divulgao do conhecimento. A ideia de que o conhecimento
deveria ser livre era uma marca desse perodo, e esses interessescomerciais estavam interferindo na ideia.
Para equilibrar tal poder, o Parlamento decidiu aumentar acompetio entre as distribuidoras, e a forma mais simples eraespalhar a riqueza de livros valiosos. O Parlamento, portanto, limitouo perodo do copyright e assim garantiu que livros valiosos iriamtornar-se abertos para qualquer distribuidor os publicar aps certotempo. Dessa forma a definio de um tempo para as obras existentesde apenas 21 anos era uma forma de lutar contra o poder doslivreiros. A limitao dos perodos era uma forma indireta de garantir
a competio entre os distribuidores e, portanto, a construo eampliao da cultura.
Quando chegou o ano de 1731 (1710 + 21), porm, os livreirosficaram preocupados. Eles viam as consequncias de uma maiorcompetio, e, como todo competidor, no gostaram delas. De incio,os livreiros simplesmente ignoraram o Estatuto de Anne, continuandoa insistir no direito perptuo de controlar a publicao. Mas entre1735 e 1737, eles tentaram persuadir o Parlamento a estenderem osperodos. Vinte e um anos no eram suficientes, eles diziam. Elesprecisavam de mais tempo. O Parlamento rejeitou esses pedidos.Como um panfleto colocou, em palavras que ecoam at hoje: Noh Motivo para dar agora um Perodo maior, de modo a nos
obrigarmos a d-lo novamente sucessivamente, conforme os
Anteriores forem Expirando; se esse Projeto passar, ele ir em suma
criar um Monoplio perptuo, uma Coisa extremamente odiosa aos
Olhos da Lei; ele ser uma grande Obstruo para os Negcios, uma
Barreira para o Aprendizado, que no retornar nenhum Benefcio
aos Autores, mas sim uma Taxa pesada ao Pblico, apenas para
aumentar os Ganhos privados dos Livreiros (LESSIG, 2004, p. 80-81).
Inconformados com a derrota diante do Parlamento, o qual restringiu um
privilgio que lhes havia sido atribudo em carter perptuo, os distribuidores
desafiaram a legitimidade desse diploma legal e partiram para as cortes inglesas
em uma srie de casos, argumentando que, embora o Estatuto de Anne
protegesse alguns direitos dos autores, tais protees no poderiam sobrepor-se jurisprudncia j consolidada.
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Em outras palavras, o argumento principal dos livreiros era o seguinte:
S porque as protees definidas no Estatuto de Anne tinham
expirado, no queria dizer que as protees da jurisprudncia otinham tambm. E pela jurisprudncia eles tinham o direito de proibira publicao de um livro, mesmo se o Estatuto de Anne afirmasse queo copyright tinha expirado (LESSIG, 2004, p. 81).
Apesar da ofensiva, resultaram vencidos, desencadeando uma reao
popular sem precedentes. Os jornais da poca narram que nenhuma outra
demanda judicial antes daquela causara tanta comoo entre a populao
inglesa, que celebrou nas ruas a vitria sobre os editores, com rojes e fogos de
artifcio10.
Essa reao popular compreensvel dentro do contexto ideolgico que
ambientou a Inglaterra do sculo XVIII, marcado pela contestao, conforme
Alessandra Tridente (2009, p. 10):
ao absolutismo real, visto como direito divino, pelo jugo de corposditos intermedirios como as corporaes de ofcios sobreposioe m definio de direitos, poder eclesistico, privilgios diversos deorigem feudal, submisso da atividade econmica a interesses domonarca ou da nobreza, donde o mercantilismo em suas vriasformas.
10 -nos difcil imaginar, mas essa deciso da Cmara dos Lordes energizou uma reao popular e polticaextraordinria. Na Esccia, onde a maior parte dos distribuidores piratas fazia seu trabalho, as pessoascelebraram a deciso nas ruas. Como o Edinburgh Advertiserrelatou, nenhuma causa privada chamouanteriormente tamanha ateno do pblico, e nenhuma causa levada anteriormente Cmara dos Lordes fez comque as pessoas ficassem to interessadas. Grande jbilo em Edimburgo aps vitria sobre a propriedadeliterria: fogueiras e fogos de artifcio (LESSIG, 2004, p. 83).
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1.3.2 Odroit dauteur e a legislao francesa
Esse ambiente ideolgico acompanhado de manifestaes nos campos
social, poltico e econmico encontrou na Frana do sculo XVIII, em pleno
auge do movimento romntico e culto da expresso individualista, a
circunstncia ideal para a consagrao dos direitos dos autores em face dos
editores
11
.
Em 1777, ainda no reinado de Lus XVI, antes mesmo da revoluo que
se avizinhava, promulgaram-se seis decretos em que se reconheceu ao autor o
direito de editar e vender suas obras, e criaram-se duas categorias diferentes de
privilgios: o dos editores, que era por tempo limitado e proporcional ao
montante do investimento, e o reservado aos autores, que tinha como
fundamento a atividade criadora e que, em razo disso, era perptuo. Assim,
estava reconhecida a precedncia do autor sobre o livreiro.
Com respeito a esses avanos na proteo do direito do autor, bastante
procedente a observao de Fabio Maria de Mattia (1980, p. 51):
Em verdade h uma relao de causa e efeito entre a existncia doprivilgio do editor e o aparecimento do direito de autor. S a reaodos autores ao monoplio estabelecido em favor dos editores poderiater tido a fora de desencadear um processo reivindicatrio queculminaria na Inglaterra, no incio do sculo XVIII, e na Frana, nosfins do mesmo sculo, com o aparecimento e reconhecimento dodireito de autor. Conclumos, pois, no sentido de que o direito deautor surgiu em consequncia de um instituto jurdico que o
antecedeu e que foi o privilgio do editor.11 SANTOS (2009, p. 36) lembra que, em 1725, utiliza-se pela primeira vez a expresso direito de autor (droitdauteur), pelo advogado francs Lus DHericourt, no decurso de um processo entre livreiros de Paris.
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Copyrighte droit dauteurso, portanto, sistemas ligados na origem, uma
vez que o direito dos autores somente pde surgir em oposio ao privilgio
dos editores.
A Revoluo Francesa foi um grande marco na consolidao dos direitos
de autor, abolindo o privilgio dos editores e resultando em duas normas
aprovadas pela Assembleia Constituinte: a de 1791, que consagrou o direito de
representao, ainda que restrita ao mbito do teatro, e a de 1793, que estendeu
esses direitos s outras formas de manifestao artstica. O artigo 1 dessa
pequena lei, que dispunha de apenas seis artigos, mas que serviu de inspirao
para a legislao especfica de diversos pases, diz o seguinte:
Art 1 Os autores de escritos de toda espcie, os compositores de
msica, os arquitetos, os escultores, os pintores, os desenhistas, osque gravarem quadros ou desenhos, gozaro, durante toda a vida, dodireito exclusivo de vender, fazer vender, distribuir suas obras noterritrio da Repblica, e ceder-lhe a propriedade, no todo ou emparte.
Assim, o copirraite anglo-americano, de orientao comercial, nascido
do Copyright Act, de um lado, e, de outro lado, o droit dauteur, de orientaoindividualista, nascido nos decretos da Revoluo Francesa, constituram a
origem da moderna legislao sobre direito de autor nos pases de tradio
jurdica baseada na common law, no primeiro caso, e de tradio jurdica
continental europeia ou latina, no segundo, conforme nos ensina Costa Netto
(2006, p. 57).
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1.4 OS DIREITOS AUTORAIS NA IDADE CONTEMPORNEA
A Idade Contempornea inicia-se logo aps a Revoluo Francesa, em
1789, e estende-se at os dias atuais. Os princpios de liberdade, igualdade e
fraternidade, alm do direito propriedade, opunham-se ao sistema de
privilgios absolutistas at ento reinantes.
No incio desse perodo, a Revoluo Industrial impulsionou ainda mais a
imprensa e as publicaes literrias em geral, com o uso do vapor na impresso
de jornais, revistas e livros.
A despeito de todos os esforos individuais de pases como a Inglaterra e
Frana na proteo dos direitos do autor, o que se via na Europa da primeira
metade do sculo XIX era, na verdade, o direito contrafao 12, mesmo que
informalmente, conforme ensinado por Maristela Basso (2000, p. 86-87):
A contrafao integrava a indstria nacional e at os monarcasfavoreciam a sua prtica, nos seus Estados. Em cada pas se praticavaa contrafao estrangeira, em alguns mais, em outros menos. O que,de uma certa forma, contemporizava a prtica da contrafao, em
alguns pases, era a censura. Na Holanda se podia publicar o que naFrana, s vezes, a censura real no permitia e isso acontecia tambmem outros pases. Nos pases divididos em vrias provncias, comoHolanda, Itlia e Alemanha, os autores sofriam ainda maioresconstrangimentos. Uma obra impressa em Roma ou em Florenapoderia ser reimpressa em Turim, Npoles ou em qualquer outrolugar, sem que isso fosse considerado fraude e sem pagamento dedireitos autorais. Pases de lngua e de literatura mais conhecidas,como a Frana, viam seus autores sofrerem a contrafao de formaainda mais marcante e aberta. [...]
12 Definio de contrafao dada pelo Dicionrio HOUAISS: usurpao ou violao dos direitos autorais ou dapropriedade intelectual sobre obra literria, cientfica ou artstica.
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Nos pases cujos autores foram mais saqueados nos seus direitos,surgiu o movimento a favor do reconhecimento e da proteo dosseus direitos:
1) Inicialmente, os autores e editores buscam os privilgiosconcedidos pelo Papa, imperador, reis (da Frana e Espanha), ouprncipes, que implicavam monoplio por certo perodo;
2) Numa segunda etapa, os particulares se do conta da repercussointernacional de seus direitos e da continuidade da sua personalidade
jurdica, e comeam a apresentar propostas com vistas a umaconferncia internacional sobre a matria.
Cabral (2003, p. 5) deixa claro que no era interesse dos pases europeus
que essa situao de ausncia legal de proteo aos direitos autorais continuasse:
A partir do Estatuto da Rainha Ana vrios pases editaram leisprotegendo os direitos do autor. Pode parecer estranho, primeiravista, esse af governamental em proteger o autor, geralmente umrebelde. Acontece que a cultura e o conhecimento constituempatrimnio nacional a ser estimulado e protegido, o que provocou aao legal de quase todos os pases da Europa, preocupados em
defender seus interesses na consolidao e hegemonia dos Estadosnacionais.
Por outro lado, mesmo com leis nacionais era impossvel segurar a arte
em seu prprio pas, uma vez que esta no reconhece fronteiras, situando-se
sempre acima dos pases, porque a arte pertence a toda a humanidade.
Essa caracterstica da arte criou vrios problemas no momento de
reivindicar direitos e aplicar a lei. Celebraram-se inmeros tratados e convnios
para tentar resolver essa situao entre os pases, mas o excesso de normas
legais tornou difcil sua prpria operacionalidade. Cabral (2003, p. 6) conta que
a Frana, para citar apenas um caso, chegou a ter 24 tratados bilaterais sobre
direitos de autor.
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Nesse cenrio de caos legal, o governo da Sua decidiu conclamar as
naes de todo o mundo para que se unissem e tentassem um acordo geral que
pudesse resolver esse problema crnico dos direitos autorais interpases.
Foi ento que, em setembro de 1886, realizou-se em Berna, Sua, a
terceira conferncia diplomtica sobre direitos autorais. A ata dessa conferncia
que viria a constituir, finalmente, a celebrao da Conveno de Berna para a
Proteo das Obras Literrias e Artsticas, da qual surgiriam as primeiras
diretrizes a darem ampla proteo aos direitos autorais:
A conveno imps verdadeiras normas de direito material, alm deinstituir normas reguladoras de conflitos. Mas o que de fatoimpressiona que, apesar das constantes adaptaes que sofreu emrazo das revises de seu texto em 1896, em Paris; 1908, emBerlim; 1914, em Berna; 1928, em Roma; 1948, em Bruxelas; 1967,em Estocolmo; 1971, em Paris e 1979 (quando foi emendada) , a
Conveno de Berna, passados mais de 120 anos de sua elaborao,continua a servir de matriz para a confeco das leis nacionais (entreas quais a brasileira) que iro, no mbito de seus Estados signatrios,regular a matria atinente aos direitos autorais. Inclusive no que dizrespeito a obras disponveis na internet. (BRANCO JNIOR;MONIZ, 2009, p. 17)
Cabral (2003, p. 6) ressalta que a Conveno trata-se de um documento
notvel. Ele objetivo, preciso e, ao mesmo tempo, flexvel. o mais antigo
tratado internacional em vigor e aplicado.
No texto da Conveno de Berna esto definies e dispositivos que,
posteriormente, foram acolhidos pela legislao de diversos pases, inclusive o
Brasil. Dentre os vrios itens do texto, destacam-se: a definio de obra literria,
artstica ou cientfica; a durao mnima de proteo por toda a vida do autor
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mais cinquenta anos; a referncia proteo das tradues, adaptaes e de
arranjos, dentre outras.
Branco Jnior (2007, p. 18) relata que, no texto da Conveno, tambm se
pode encontrar
um dispositivo determinando que aos autores compete o direitoexclusivo de autorizar a reproduo de suas obras, de qualquer modoou sob a forma que seja. Estabelece, ainda, o mesmo artigo, que slegislaes dos pases da Unio reserva-se a faculdade de permitir areproduo das referidas obras em certos casos especiais, contantoque tal reproduo no afete a explorao normal da obra nem causeprejuzo injustificado aos interesses legtimos do autor. Assim,compete a cada pas regulamentar o chamado fair use, ou uso
justo, de obras alheias.
Ao longo dos anos, a Conveno sofreu vrias revises de atualizao s
novas realidades de um mundo em transformao, mas a sua espinha dorsal foi
mantida: a proteo dos direitos patrimoniais e morais do autor.
1.5 EVOLUO DOS DIREITOS AUTORAIS NO BRASIL
Vrios autores consideram o ano de 1827 o marco inicial do direito
autoral no Brasil, data em que foi publicado o primeiro diploma legal a fazer
referncia aos direitos autorais. Trata-se da lei que criou os cursos jurdicos de
Olinda e So Paulo, que diz no seu artigo 7:
Art. 7. - Os Lentes faro a escolha dos compendios da sua profisso,ou os arranjaro, no existindo j feitos, com tanto que as doutrinasestejam de accrdo com o systema jurado pela nao. Estescompendios, depois de approvados pela Congregao, serviro
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interinamente; submettendo-se porm approvao da AssemblaGeral, e o Governo os far imprimir e fornecer s escolas,competindo aos seus autores o privilegio exclusivo da obra, por dezannos.13
Eduardo Vieira Manso (1987, p. 16) explica que, por meio dessa lei, os
mestres nomeados deveriam encaminhar s Assembleias Gerais os compndios
das matrias que lecionavam, a fim de receber ou no a aprovao. Se
recebessem a aprovao, gozariam, tambm, do privilgio de publicao por dez
anos. Tratava-se, assim, de uma norma aplicvel apenas intramuros, nas
Faculdades de Direito de Olinda e So Paulo, no alcanando os demais autores.
Pela leitura desse dispositivo legal, percebe-se, em que pese o direito de
os autores terem a exclusividade da obra por dez anos, o forte controle do
Estado sobre o material, o qual era impresso e fornecido pelo prprio governo.
No mbito penal, o aspecto moral do direito autoral seria reconhecido trs
anos depois, com a criao do Cdigo Criminal do Imprio de 1830, que trouxe
a seguinte previso legal, em seu artigo 261:
Art. 261 - Imprimir, gravar, litografar ou introduzir quaisquer escritosou estampas, que tiverem sido feitos, compostos ou traduzidos porcidados brasileiros, enquanto estes viverem, e dez anos depois desua morte se deixarem herdeiros.
Pena Perda de todos os exemplares para o autor ou tradutor, ou seusherdeiros, ou, na falta deles, do seu valor e outro tanto, e de multaigual ao dobro do valor dos exemplares. Se os escritos ou estampaspertencerem a corporaes, a proibio de imprimir, gravar, litografarou introduzir durar somente por espao de dez anos. (COSTANETTO, 2008, p. 37)
13 Lei n. 11 de agosto de 1827. "Cra dous Cursos de sciencias Juridicas e Sociaes, um na cidade de S. Paulo eoutro na de Olinda." Disponvel em: .Acesso em: 15 jun. 2011.
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Santos (2009, p. 45) esclarece que o referido artigo institui o delito de
contrafao, considerando crime a violao de direitos autorais e punindo com a
perda dos exemplares. Indiretamente se criou a proteo aos direitos de
reproduo a partir de um tipo incriminador que proibia vrias modalidades de
reproduo, como imprimir, gravar ou litografar escritos ou estampas feitas por
brasileiros.
Fica evidente que a primeira regulao dos direitos autorais no Brasil
feita pela legislao penal e no pela civil. Enquanto em outros pases a
imposio de normas de carter penal um evento relativamente recente, em
nosso pas sempre se enfatizou a proteo pela via penal, em detrimento da civil,
A efetividade da proteo pela esfera penal cada vez mais discutvel.
De acordo com Santos (2009, p. 45), o Cdigo Penal de 1890 continuou a
legislar sobre direitos autorais. Os artigos 342 a 350 dispunham a respeito da
violao dos direitos da propriedade literria e cientfica. Esses dispositivos
tinham por inspirao os Cdigos Penais da Frana e de Portugal.
Ocorre que ainda no havia dispositivos especficos de proteo dessa
matria. A primeira lei brasileira a tratar especificamente da proteo autoral foi
a Lei n. 496/1898, tambm chamada de Lei Medeiros e Albuquerque, em
homenagem a seu autor:
At o advento dessa lei, no Brasil, a obra intelectual era terra de
ningum. Tanto era assim que Pinheiro Chagas, escritor portugus,reclamava ter no Rio de Janeiro um ladro habitual, que ainda tinhaa audcia de lhe escrever dizendo: Tudo que V. Ex. publica
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admirvel! Fao o que posso para o tornar conhecido no Brasil,
reimprimindo tudo!. O que ocorria que, na poca, era comumpensar-se que a obra estrangeira, ainda mais do que a nacional, podiaser copiada indiscriminadamente (ROCHA, 2001, p. 18, apud
BRANCO JNIOR; MONIZ, 2009, p. 17).
Essa lei seria, alguns anos depois, revogada pelo Cdigo Civil de 1916,
que classificou o direito de autor como bem mvel, fixou o prazo prescricional
da ao civil por ofensa a direitos autorais em cinco anos e regulou alguns
aspectos da matria nos captulos Da Propriedade Literria, Artstica e
Cientfica, Da Edio e Da Representao Dramtica (BRANCO JNIOR,
2007, p. 20).
Da edio da Lei Medeiros de Albuquerque at o advento da lei de
direitos autorais, em 1973, o Brasil viu surgirem diversos diplomas legais quevisavam regulao no s dos direitos autorais, mas de temas correlatos.14
Somente em 1973 o Brasil viu publicada uma norma reguladora nica e
abrangente a tratar dos direitos autorais. A Lei n. 5.988, de 14 de dezembro de
1973, vigoraria at a aprovao, pelo Congresso Nacional, da Lei n. 9.610, de
19 de fevereiro de 1998, que a atual lei regulamentadora dos direitos autorais
em territrio nacional.
14 Exemplificativamente, o Decreto n. 4.790 de 1924 definiu os direitos autorais, o Decreto n. 5.492 de 1928regulou a organizao das empresas de diverso e a locao de servios teatrais, o Decreto-Lei n. 21.111, de1932, deu normatividade execuo de servios de radiocomunicao em todo o territrio nacional. A lista extensa (BRANCO JNIOR, 2007, p. 20).
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2 A LEI BRASILEIRA DE DIREITOS AUTORAIS
Quando o Direito ignora a realidade, a realidade se vinga, ignorandoo Direito.
Georges Ripert
2.1 DIREITO AUTORAL
2.1.1 Conceituao
Em princpio, alguns autores preferem separar Direito Autoral (a
disciplina) de direito de autor e, ainda, dos direitos autorais.
O jurista Joo Henrique da Rocha Fragoso, por exemplo, entende que o
Direito Autoral o ramo do Direito que trata dos direitos dos autores e dos que
lhes so conexos. A opo por esta nomenclatura prende-se sua especialidade,
isto , aglutinadora dos direitos de autor e dos que lhes so conexos.
(FRAGOSO, 2009, p. 27). J para os direitos autorais, no plural, Fragoso explica
que designam duas espcies: uma de natureza moral e outra de natureza
patrimonial.
Antnio Chaves (1977, p. 107) assim conceitua o direito autoral:
Podemos defini-lo como o conjunto de prerrogativas de ordem no
patrimonial e de ordem pecuniria que a lei reconhece a todo criadorde obras literrias, artsticas e cientficas, de alguma originalidade, noque diz respeito sua paternidade e ao seu ulterior aproveitamento
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por qualquer meio, durante toda a sua vida, e aos sucessores, ou peloprazo que ela fixar.
Entretanto uma das melhores conceituaes sobre o direito autoral, pela
sua clareza, objetividade e simplicidade, no reside nos livros, mas no caderno
Direito autoral em debate, publicado na internet atravs da Rede pela
Reforma da Lei de Direito Autoral:
O direito autoral um instrumento jurdico originalmente criado comintuito de incentivar a criao intelectual, para o benefcio do criadore tambm da sociedade. Na sua dimenso patrimonial, direito autoral o direito que dado ao autor para explorar sua obra comexclusividade por um perodo limitado de tempo (hoje, por toda suavida, mais 70 anos). , por exemplo, o direito que tem um escritor depublicar o seu livro, sem que ningum mais possa public-lo sem asua autorizao. No entanto, como normalmente o escritor no tem osmeios de fazer isso, ele transfere esse direito, por meio de contrato,para um intermedirio - uma editora - e, em parceria com ela lana olivro. Quando o livro vende, uma parte do rendimento que essaempreitada comercial gera fica com a editora, na forma de lucro, eoutra parte, na forma de royalties de direito autoral, fica com autor. Omesmo vale, com algumas diferenas, para a msica e outrosprodutos culturais (REDE PELA REFORMA DA LDA, 2010, p. 5).
2.1.2 Distino entre Propriedade Material e Propriedade Intelectual
A propriedade um bem adquirido por qualquer meio lcito, como a
aquisio (compra), posse, sucesso (herana) ou mediante a prpria produo
(por exemplo, construir a sua prpria casa).
J a origem da propriedade intelectual advir sempre de dentro do
homem: o ato da criao intelectual. A propriedade intelectual lida, portanto,
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com os direitos de propriedade das coisas intangveis oriundas das inovaes e
criaes da mente. a que se insere o direito autoral.
Quando adquire um bem mvel, seu titular exerce sobre o referido bem as
faculdades de usar, gozar, dispor e reivindicar. Dessa forma, o proprietrio pode,
por sua vontade, usar a coisa, abandon-la, alien-la, destru-la, ou ainda limitar
seu uso por meio da constituio de direitos em nome de terceiros.
Mas, quando se trata de direito autoral, faz-se necessrio apontar uma
peculiaridade que constitua uma diferena bsica entre a titularidade de um bem
de direito autoral e a titularidade dos demais bens: a incidncia da propriedade
sobre o objeto.
Branco Jnior e Moniz (2009, p. 66-67) exemplificam essa diferena de
forma esclarecedora:
A aquisio de um livro cujo texto se encontre protegido pelo direitoautoral no transfere ao adquirente qualquer direito sobre a obra, queno o livro, mas o texto contido no livro. Dessa forma, sobre o livro bem fsico , o proprietrio pode exercer todas as faculdadesinerentes propriedade, como se o livro fosse um outro bemqualquer, como um relgio ou um carro. Pode destru-lo, abandon-lo, emprest-lo, alug-lo ou vend-lo, se assim o desejar.
Mas o uso da obra em si, do texto do livro, s pode ser efetivadodentro das premissas expressas da lei. Por isso, embora numaprimeira anlise ao leigo possa parecer razovel, no facultado aoproprietrio do livro copiar seu contedo na ntegra para revenda.Afinal, nesse caso no se trata de uso do bem material livro, e simde uso do bem intelectual (texto) que o livro contm.
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Vale ressaltar a posio pacfica dos doutrinadores em encaixar o direito
autoral como uma espcie da propriedade intelectual.
2.1.3 Classificao
Torna-se bastante complicado classificar o direito autoral se nos
propusermos a encaix-lo dentro de um nico ramo jurdico existente. O direito
autoral j foi associado a diferentes ramos do direito, sendo considerado direito
de propriedade e codificado como parte do direito civil. Por sua ligao com a
propriedade industrial, j foi inserido no mbito do direito empresarial. Envolve,
ainda, pagamento de tributos. Por vezes h o estabelecimento de relaes
trabalhistas, bem como noes de direito do consumidor e conhecimento de
direito internacional. Essas vrias facetas indicam a complexidade do direito
autoral.
Costa Netto (2008, p. 80) optou por inserir o direito de autor no campo do
direito civil, sugerindo, a exemplo de outros autores, que este deveria ser
acomodado como um sexto ramo especializado 15.
J Santos (2009, p. 80) defende que, como matria do direito civil, o
direito autoral situa-se no mbito dos direitos da personalidade, que pode
inclusive abranger direitos de ordem patrimonial.
15 Os cinco ramos do Direito Civil j codificados no Brasil: das coisas, das obrigaes, de famlia e das sucessese, finalmente, dos direitos de personalidade.
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Embora inserido na seara do direito civil, o direito do autor, por sua
especificidade, j rene as caractersticas que sustentam a sua autonomia
cientfica como um ramo do Direito16.
2.1.4 Natureza jurdica
Na tentativa de disciplinar a questo dos direitos autorais, os legisladores,
segundo Branco Jnior (2007, p. 26) deparam com dois interesses contrapostos:
a) a utilizao imediata pela coletividade das obras criadas, com afinalidade de promoo e desenvolvimento social, e
b) a manuteno, por parte do autor, da possibilidade deaproveitamento econmico de sua obra.
Nesse sentido, a definio da natureza jurdica dos direitos autorais
bastante controvertida, uma vez que os seus mltiplos aspectos peculiares os
aproximam, mas igualmente os afastam dos direitos de propriedade bem como
dos direitos da personalidade, sem nunca se enquadrarem com preciso em
qualquer das categorias (BRANCO JNIOR, 2007, p. 26).
16 Carlos Alberto Bittar, aplicando as lies de Alfredo Rocco, enumera os quatro requisitos para se ter aautonomia cientfica de um ramo do Direito: objeto, princpios especficos, normas especiais e conceitos efiguras prprias. (ROCCO, p. 161, apudBITTAR, 2004, p. 68-69)
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Sua definio, ainda que controvertida, complicada, necessria, uma vez
que, enquanto no se define a natureza jurdica do direito autoral, no possvel
se lhe atriburem os efeitos jurdicos adequados.
A investigao histrica de autores como Antnio Chaves contempla,
inicialmente, trs correntes divergentes sobre a natureza jurdica dos direitos
autorais e sua classificao:
a) no passaria de uma forma particular pela qual se manifesta apersonalidade;
b) no haveria no caso, propriamente, um direito, mas um simplesprivilgio concedido para o incremento das artes, das cincias e das
letras;
c) modalidade especial da propriedade.
Costa Netto (2008, p. 75), valendo-se dos ensinamentos de Henry Jessen,
indica a existncia de diversas teorias que pretendem explicar a natureza jurdica
dos direitos autorais, que seriam na verdade variantes das cinco principais:
a) teoria da propriedade (concepo clssica dos direitos reais) aobra seria um bem mvel e o seu autor seria titular de um direito
real sobre aquela;
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b) teoria da personalidade a obra uma extenso da pessoa do autor,cuja personalidade no pode ser dissociada do produto de sua
inteligncia;
c) teoria dos bens jurdicos imateriais reconhece ao autor um direitoabsoluto sui generis sobre sua obra, de natureza real, existindo
paralelamente o direito de personalidade, independente, que
consiste na relao jurdica de natureza pessoal entre o autor e a
obra;
d) teoria dos direitos sobre bens intelectuais o direito das coisasincorpreas (obras literrias, artsticas e cientficas, patentes de
inveno e marcas de comrcio); e
e) teoria dualista que, segundo Jessen, teria, de certa forma,conciliado as teses anteriores.
Branco Jnior (2007, p. 27) detalha a teoria dualista, vista como a mais
aceita hoje:
De acordo com a teoria dualista, em um nico bem a obraintelectual coexistiriam 2 (dois) direitos integrados, o direitopatrimonial, transfervel onerosa ou gratuitamente, pelo autor ou porseus herdeiros enquanto no cair a obra em domnio pblico, e odireito moral, que por ser considerado, por muitos autores, uma dasemanaes dos direitos da personalidade, tem como caractersticasgerais, por consequncia, ser extrapatrimonial, intransfervel,
imprescritvel, impenhorvel, vitalcio, necessrio, erga omnes, entreoutras.
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Conforme sentenciado por Costa Netto (2008, p. 77) a soluo pela
teoria dualista no pacfica, mas tem sido considerada como a mais adequada
conceituao do direito de autor na localizao de sua natureza jurdica sui
generis ou hbrida.
Direito autoral trata-se, portanto, de direito da personalidade que abrange
aspectos morais e patrimoniais do direito do autor.
2.1.5 Direitos morais
A obra intelectual, como criao do esprito, vincula-se personalidade
do autor, portanto os direitos morais so os laos permanentes que unem o autor sua criao intelectual.
Alm disso, os direitos morais do autor so uma prerrogativa de carter
pessoal; so um direito personalssimo e caracterizam-se por serem inalienveis,
irrenunciveis, imprescritveis e impenhorveis.
O art. 24 da LDA elenca os direitos morais do autor:
Art. 24. So direitos morais do autor:
I - o de reivindicar, a qualquer tempo, a autoria da obra;
II - o de ter seu nome, pseudnimo ou sinal convencional indicado ouanunciado, como sendo o do autor, na utilizao de sua obra;
III - o de conservar a obra indita;
IV - o de assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquermodificaes ou prtica de atos que, de qualquer forma, possamprejudic-la ou atingi-lo, como autor, em sua reputao ou honra;
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V - o de modificar a obra, antes ou depois de utilizada;
VI - o de retirar de circulao a obra ou de suspender qualquer formade utilizao j autorizada, quando a circulao ou utilizaoimplicarem afronta sua reputao e imagem;
VII - o de ter acesso a exemplar nico e raro da obra, quando seencontre legitimamente em poder de outrem, para o fim de, por meiode processo fotogrfico ou assemelhado, ou audiovisual, preservarsua memria, de forma que cause o menor inconveniente possvel aseu detentor, que, em todo caso, ser indenizado de qualquer dano ouprejuzo que lhe seja causado.
Santos (2009, p. 83) ressalta que
em regra os direitos da personalidade no so transmitidos aossucessores, no entanto, a lei autoral excepciona relativamente aalguns direitos morais do autor. O art. 24 1, preceitua que, pormorte do autor, transmitem-se a seus sucessores os direitos a que sereferem os incisos I a IV.
Ainda que a obra fatalmente caia em domnio pblico, o sucessor continualegitimado a tutelar a defesa dos direitos morais do autor.
2.1.6 Direitos patrimoniais
Por sua vez, os direitos patrimoniais do autor so direitos pecunirios
exclusivos do criador, decorrentes da explorao econmica da obra, conforme
se depreende da leitura do art. 28 da LDA:
Art. 28. Cabe ao autor o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor daobra literria, artstica ou cientfica.
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O art. 29 elenca todas as modalidades de utilizao econmica da obra
(reproduo, exibio, exposio etc.), as quais devem ser precedidas de prvia
e expressa autorizao do autor ou de quem o represente, por serem direitos
exclusivos.
2.2 FUNO DOS DIREITOS AUTORAIS
A concepo clssica do direito de propriedade previa que o proprietrio
podia exercer seu domnio sobre a coisa como melhor lhe aprouvesse.
Contemporaneamente, no entanto, a concepo bem diversa. A propriedadetem, por determinao constitucional, uma funo a cumprir.
A Carta Magna, em seus arts. 5, XXIII, e 170, III, prescreve:
Art. 5 Todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquernatureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentesno Pas a inviolabilidade do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade, nos termos seguintes:
................................................................................................................
XXII garantido o direito de propriedade;
................................................................................................................
Art. 170. A ordem econmica, fundada na valorizao do trabalhohumano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existnciadigna, conforme os ditames da justia social, observados os seguintesprincpios:
................................................................................................................
III - funo social da propriedade;
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Branco Jnior (2007, p. 65-66) esclarece que,
se, de acordo com a doutrina dominante, o direito autoral ramo
especfico da propriedade intelectual, h que se averiguar em quemedida a funcionalizao social da propriedade incide sobre o direitoautoral.
Preliminarmente, dadas as caractersticas dos direitos de propriedade,observa-se que possvel atribuir ao direito autoral as peculiaridadesatinentes propriedade, exceto no que diz respeito perpetuidade.
Na busca para se atingir o equilbrio entre o direito detido pelo autor e o
direito de acesso ao conhecimento de que goza a sociedade, a funo social
exerce papel importantssimo. Branco Jnior e Moniz (2009, p. 71) advertem
que a leitura literal da lei brasileira desautoriza uma srie de condutas que esto
em conformidade com a funcionalizao do instituto da propriedade. E
exemplificam:
Pela LDA, no se pode fazer cpia de livro que, mesmo com ediocomercial esgotada, ainda esteja no prazo de proteo dos direitosautorais. Mas, pelos princpios constitucionais do direito educao(art. 6, caput, art. 205), do direito de acesso cultura, educao e cincia (art. 23, V) e, mais importante, pela determinao de que apropriedade deve atender a sua funo social (art. 5, XXIII), necessrio que se admita cpia do livro, ainda que protegido. Ocontrrio seria um contrassenso, uma inverso da lgica jurdica, j
que princpios constitucionais teriam que se curvar ao disposto emuma lei ordinria (a LDA), quando na verdade o oposto que deveocorrer.
Santos (2009, p. 87-89) acredita que a funo social do direito autoral
a difuso cultural em prol da coletividade e do meio ambientesocial, elemento essencial no processo evolutivo das civilizaes. Em
outras palavras, quando o autor divulga o seu conhecimento,disponibilizando-o sociedade, ele est cumprindo a funo social dodireito de autor.
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E conclui:
Desse modo, o direito autoral tem duas funes:
a) a funo para o autor: quem vive do seu trabalho tem totalindependncia para criar;
b) a funo social: contribuir com o crescimento cultural do pas.Os dois interesses so convergentes e complementares.
Em sntese, conjugar os dois aspectos, o do autor e o da sociedade,em uma economia capitalista, globalizada e, no bastasse, digital, afuno rdua a que devemos nos dedicar.
No obstante, no entendimento de Fbio Ulhoa Coelho, prefaciando a
obra de Alessandra Tridente, essas duas funes, na prtica, no so
convergentes nem complementares, mas constituem o paradoxo fundamental do
direito autoral:
O que se destinaria afinal a amparar o desenvolvimento cultural acabaservindo, enfim, para trav-lo. As dificuldades na identificao dotitular do direito autoral, a necessidade de autorizao para qualqueruso de sua obra (exceto pardias) e a larga durao dos privilgios,bem sopesadas as coisas, obstam ao invs de promover a criao.(TRIDENTE, 2009, p. XIV-XV)
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2.3 A TUTELA CONSTITUCIONAL DOS DIREITOS AUTORAIS
No Brasil, a proteo aos direitos do autor possui antiga raiz
constitucional. A Constituio de 1891, promulgada dois anos aps o
nascimento da Repblica e cinco anos aps a Conveno de Berna o que
explica o cuidado em proteger o tema , inaugurou o tratamento constitucional
da matria. De fato, exceo das Cartas de 1824 (Imprio) e 1937 (ditaduragetulista do Estado Novo), nossas Constituies tm contemplado o direito do
autor sobre suas obras no rol de direitos fundamentais.
Atualmente o direito de autor encontra proteo no art. 5, incisos XXVII
e XXVIII da Constituio Federal de 1988:
Art. 5 Todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquernatureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentesno Pas a inviolabilidade do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade, nos termos seguintes:
................................................................................................................
XXVII - aos autores pertence o direito exclusivo de utilizao,publicao ou reproduo de suas obras, transmissvel aos herdeirospelo tempo que a lei fixar; (grifo nosso)
XXVIII - so assegurados, nos termos da lei:a) a proteo s participaes individuais em obras coletivas e reproduo da imagem e voz humanas, inclusive nas atividadesdesportivas;
b) o direito de fiscalizao do aproveitamento econmico das obrasque criarem ou de que participarem aos criadores, aos intrpretes e srespectivas representaes sindicais e associativas;
A CF/88 avanou em relao s Constituies anteriores ao incluir no rol
exclusividade dos autores a publicao da obra. Como decorrncia disso, o
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legislador garantiu aos autores a faculdade de oferecer ou no ao pblico o
acesso sua obra, o que reconheceu o aspecto moral dos direitos do autor.
Ademais, Santos (2009, p. 50) observa que,
ao elencar o direito de autor no Ttulo II, que cuida dos direitos egarantias fundamentais, mais especificamente no captulo dos direitose deveres individuais e coletivos, o constituinte elevou esse instituto categoria de especial proteo em nossa Constituio, de garantiainstitucional.
Em outras palavras, o direito autoral deixa de ser um instituto restrito ao
direito privado, pois se junta ao conjunto de normas amparadas pela prpria
CF/88, assumindo, assim, a condio de um preceito de natureza maior, ou seja,
um princpio constitucional.
2.4 PRINCPIOS QUE REGEM OS DIREITOS AUTORAIS
Pela leitura da LDA, podemos extrair alguns princpios relativos aos
direitos autorais, dos quais citamos (BRANCO JNIOR; MONIZ, 2009, p. 53-
56):
a) Temporariedade pela LDA, uma obra protegida pelos direitosautorais possui um prazo de proteo, que dura enquanto vive o
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autor e mais 70 anos17, contados a partir do dia 1 de janeiro do ano
subsequente aps o seu falecimento (art. 41);
b) Prvia autorizao enquanto a obra no cai em domnio pblico,s ser possvel a terceiros se valer dela se tiverem prvia e
expressa autorizao do titular dos direitos sobre a obra (art. 29);
c) Ausncia de formalidade ou proteo automtica a proteo aosdireitos autorais independe de registro (art. 18);
d) Perpetuidade do vnculo autor-obra decorrente do direito moraldo autor, estabelece que o nome do autor estar eternamente
conectado obra que criou;
e)
Individualidade da proteo cada obra deve ser protegidaindependentemente;
f) Independncia das utilizaes as diversas modalidades deutilizao de obras literrias, artsticas ou cientficas ou de
fonogramas so independentes entre si, e a autorizao concedida
pelo autor, ou pelo produtor, respectivamente, no se estende a
quaisquer das demais (art. 31). Este princpio decorrncia direta
do art. 4 da LDA, que prev que se interpretem restritivamente os
negcios jurdicos sobre os direitos autorais.
17 O prazo de setenta anos foi colocado para que os sucessores do falecido autor tambm estejam protegidos epossam obter rendimento sobre a obra. Apesar de alguns autores considerarem o prazo muito longo, no seriapossvel ao legislador estipular um prazo inferior a 50 anos aps a morte do autor, uma vez que o Brasil signatrio da Conveno de Berna, a qual estabelece esse piso em seu texto (BRANCO JNIOR; MONIZ, 2009,p. 57).
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g) Direito de propriedade sobre o bem quando adquirimos um bemprotegido por propriedade intelectual, na verdade adquirimos o bem
material em que a obra est fixada, ou seja, no temos qualquer
direito sobre a obra (corpus misticum), mas somente sobre o
suporte material (corpus mechanicum).
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3 A LDA E A INTERNET
No importa quantas pessoas a compartilhem, a ideia no se reduz.Quando escuto sua ideia, ganho conhecimento sem diminuir nadaseu. Da mesma forma, se uso sua vela para acender a minha, eu meilumino sem escurec-lo.
Thomas Jefferson
3.1 A INTERNET, AS TECNOLOGIAS DIGITAIS E AS BATALHAS
JURDICAS
Foi veloz e vibrante a escalada das mudanas e do aperfeioamento
constante por que passaram as tecnologias digitais surgidas no final do sculo
XX apoiadas no uso de cdigos binrios sequncias variadas dos nmeros zeroe um utilizados pelos computadores a partir da segunda metade do sculo
passado. Utilizadas para processamento e transmisso de informaes (escrita,
imagem, som e outros), diferem das tecnologias afins anteriores por
possibilitarem cpias perfeitamente idnticas com custo de produo bem
inferior.
Toda pessoa acima de 30 anos conhece, por experincia prpria, a m
qualidade e o alto custo das cpias geradas por fotocopiadoras, gravadores e
videocassetes. As tecnologias digitais, aliadas internet, tornaram acessvel a
produo de cpias de excelente qualidade e de custo muito baixo, dilatando a
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distribuio, antes tambm cara e restritiva, a bilhes18 de pessoas a custo
tendente a zero.
Entrando rapidamente em cena um mundo de usurios que hoje inclui de
pr-adolescentes (ou mesmo crianas) a idosos, as tecnologias digitais
popularizaram-se ao trazer para o ambiente domstico a facilidade de
reproduo e distribuio das cpias. Criou-se assim um ambiente de grande
preocupao entre os detentores de direitos autorais, sobretudo nos Estados
Unidos, onde se encontra a maior indstria de entretenimento do mundo.
Antes da virada do milnio, o Escritrio de Marcas e Patentes norte-
americano (rgo que seria o equivalente ao nosso Instituto Nacional da
Propriedade Intelectual, o INPI) elaborou um documento, que ficou conhecido
como White Paper, que consolidava o resultado de uma srie de estudos sobre a
situao dos direitos de propriedade intelectual diante das novas tecnologias e
recomendava a criao de nova legislao para enfrentar a crise.
Divulgado em 1995 pelo Departamento de Comrcio norte-americano (e
profundamente influenciado pelos ativistas do copyright), esse documento, de
acordo com Lessig (2004, p. 113), sintetizava em quatro propostas principais a
estratgia para se enfrentar a ameaa posta pela internet e pelas tecnologias
digitais:
18 Estatsticas elaboradas em maro de 2011 estimam a existncia de mais de 2 bilhes de usurios conectados internet (2.095.006.005, para ser mais exato). Disponvel em: < http://internetworldstats.com/stats.htm>. Acessoem: 22 set. 2011.
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(1) o Congresso deveria reforar a lei de propriedade intelectual, (2)as empresas deveriam adotar tcnicas de marketing inovadoras, (3) ostecnlogos deveriam ser pressionados a desenvolverem cdigos paraproteo do material sob copyright e (4) os educadores deveria