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Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada 182 A- Análise da Figura 1 Antes de entrarmos na análise propriamente dita da figura 1 (anexo 8), auscultámos os alunos acerca do conhecimento do léxico apresentado no excerto e da temática da Camada de Ozono. Quanto ao primeiro ponto, os alunos garantiram conhecer os termos envolvidos. No que respeita ao segundo ponto, todos os alunos afirmaram ter ouvido falar deste tema, em contextos formais (sala de aula) e informais (meios de comunicação), como se mostra no quadro 27. Metade dos alunos (quatro) refere já ter falado deste tema, formalmente, em contexto de sala de aula, na disciplina de Ciências Naturais, em distintos anos de escolaridade (embora o AF não recorde o ano): “(...) poucas vezes- em Ciências-7ºano-foi uma vez, por acaso. Na parte em que andávamos a dar o Sol.” (AC) “No 5ºano, devia ser a Ciências.” (AG) “No 8ºano, a Ciências” (AH) “Deve ter sido a Ciências” (AF) Um aluno indica que só se lembra de ter ouvido falar deste tema na 4ª classe: “Quando andava na 4ª Classe.” (AA) Outro diz ter abordado este tema na disciplina de C.F.Q.: Quadro 27. Origem do conhecimento dos alunos sobre o tema Camada de Ozono (n A =8) Alunos entrevistados Categorias AA AB AC AD AE AF AG AH Nunca __ __ __ __ __ __ __ Na 4ª Casse __ __ __ __ __ __ __ Na disciplina de Ciências Naturais __ __ __ __ Na disciplina de C.F.Q. __ __ __ __ __ __ __ A. Na sala de aula Em todas __ __ __ __ __ __ __ B. Em diversos meios de comunicação

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Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

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A- Análise da Figura 1

Antes de entrarmos na análise propriamente dita da figura 1 (anexo 8),

auscultámos os alunos acerca do conhecimento do léxico apresentado no excerto e da

temática da Camada de Ozono. Quanto ao primeiro ponto, os alunos garantiram

conhecer os termos envolvidos.

No que respeita ao segundo ponto, todos os alunos afirmaram ter ouvido falar

deste tema, em contextos formais (sala de aula) e informais (meios de comunicação),

como se mostra no quadro 27.

Metade dos alunos (quatro) refere já ter falado deste tema, formalmente, em

contexto de sala de aula, na disciplina de Ciências Naturais, em distintos anos de

escolaridade (embora o AF não recorde o ano):

“(...) poucas vezes- em Ciências-7ºano-foi uma vez, por acaso. Na parte em que andávamos a dar o

Sol.” (AC)

“No 5ºano, devia ser a Ciências.” (AG) “No 8ºano, a Ciências” (AH) “Deve ter sido a Ciências” (AF)

Um aluno indica que só se lembra de ter ouvido falar deste tema na 4ª classe:

“Quando andava na 4ª Classe.” (AA)

Outro diz ter abordado este tema na disciplina de C.F.Q.:

Quadro 27. Origem do conhecimento dos alunos sobre o tema Camada de Ozono (nA=8)

Alunos entrevistados Categorias

AA AB AC AD AE AF AG AH

Nunca __ __ __ __ __ __ __ Na 4ª Casse __ __ __ __ __ __ __ Na disciplina de Ciências Naturais __ __ __ __

Na disciplina de C.F.Q. __ __ __ __ __ __ __

A. Na sala de

aula

Em todas __ __ __ __ __ __ __ B. Em diversos meios de comunicação

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

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”Nas aulas de C.F.Q. na Física e na Química, também por causa dos símbolos químicos, nas moléculas,

molécula de ozono, também falei sobre a camada de ozono.” (AB)

O aluno, AE, menciona que já tratou deste tema um pouco a cada disciplina:

”Já mas assim não tão aprofundado...às vezes falamos um bocadinho em todas.” (AE)

Apenas um aluno admite poder ter falado desta temática na escola, embora não

se recorde de isso ter acontecido: “Não, nunca falei, poderia ter falado mas, agora não me lembro.” (AD)

Todos os alunos mencionam ter um conhecimento informal do tema Camada

de Ozono, proveniente dos media. Este facto é ilustrado de seguida à custa de respostas

de alguns deles:

“Também ouvi na rádio, televisão.” (AB) “No telejornal, jornais, panfletos.” (AC)

No que concerne à leccionação da temática Camada de Ozono, os professores

entrevistados referiram que já a abordaram em aulas de C.F.Q., tendo, no entanto,

indicado cinco unidades programáticas diferentes para inserirem o mesmo assunto

(quadro 28).

Metade dos entrevistados afirmaram abordar o assunto da Camada de Ozono,

no 8º ano, em Química, na parte das substâncias:

“Quando estou a falar em moléculas falamos sempre na molécula do ozono e eu pergunto-lhes se sabem

o que é o ozono e para que serve.” (PD)

Quadro 28. Abordagem de assuntos relacionados com a Camada de Ozono (nP=8)

Professores entrevistados Categorias

Tema/Nível PA PB PC PD PE PF PG PH

A. Astronomia (Física), 7ºano __ __ __ __ __ __ B. Substâncias (Química), 8º ano __ __ __ __

C. Energia (Física), 9º ano __ __ __ __ __ __ D. Atmosfera (Física), 9ºano __ __ __ __ __ __ __

E. Questões Ambientais __ __ __ __ __ __

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“Refiro quando se falam nas substâncias, normalmente falo do ozono na Química do 8º ano...”(PE)

Dois professores PA e PB afirmaram abordar este tema no 7º ano, na parte de

Astronomia :

“No 7º ano, começamos com Astronomia, começamos com as camadas da terra e da atmosfera e

falamos da Camada de ozono.”(PA) “Neste momento, no 7º ano ao convergir para a Planeta Terra.” (PB)

Os professores PA e PE dizem que apresentam o tema da Camada de Ozono

no 9ºano, em Física, no capítulo da Energia:

“Já abordei a propósito do 9ºano, em Energia, em Física, quando se fala de energia solar e vem à baila

este tema porque eles lembram-se muito.” (PA)

“No 9ºano, quando falamos das energias renováveis...” (PE)

Os professores PC e PE referem abordar este tema a propósito de questões

ambientais, como explicitam:

“ (...) nas questões ambientais, foi abordado, fizemos mesmo uma exposição ilustrada, nesse ano a

professora de Inglês, que cá estava, encomendou uma exposição, isto porque as questões ambientais são

também dadas nas aulas de Inglês (...).” (PC) “ (...) sempre que vêm a propósito as condições de impactos ambientais fala-se da Camada de ozono (...)

”. (PE)

Apenas um professor (PG) garante ter abordado este tema no 9ºano, em Física,

na Área Temática opcional, Atmosfera e Mudanças de Tempo:

“Já abordei pelo menos quando dei no 9ºano na parte da Atmosfera e Mudanças de Tempo.”(PG)

Apesar do tema da Camada de Ozono não ser um conteúdo programático

obrigatório dos curricula de 2001/2002 de C.F.Q. do 3º Ciclo, os professores

entrevistados afirmaram ter abordado este tema em diferentes unidades, sempre que se

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A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

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proporcionou, e os alunos entrevistados, à excepção de um, mencionaram ter ouvido

falar deste tema na sala de aula.

Relativamente ao léxico da figura 1, foi perguntado aos professores, durante a

entrevista, se, na sua óptica, haveria algum termo que pudesse suscitar dúvidas a um

aluno no final da escolaridade obrigatória (quadro 29).

Mais de metade dos professores entrevistados (cinco) prevêem que um aluno

no final do 3º Ciclo terá dificuldades em reconhecer os significados científicos dos

vocábulos esburacada e Camada de Ozono, apresentando, desta forma, baixas

expectativas em relação à performance dos alunos na interpretação deste excerto.

Três professores (PB, PC e PD) referem que os alunos não devem apresentar

dificuldade na compreensão de nenhum vocábulo, parecendo, no entanto, estar pouco

seguros disso, como é ilustrado para dois deles:

“Não, acho que não.” (PB) “Não me parece, alguns sabem pouco, mas tinham obrigação de saber isto.” (PD)

Quatro professores, mencionam o termo esburacada como capaz de causar

algum tipo de dificuldade aos alunos. Essa suspeita, relacionada com a conceptualização

de buraco de Ozono, ilustrada de seguida:

“O esburacado, não é bem bem esburacado. Nós podemos dizer mas nós explicamos. Não é mesmo um

buraco o que lá está! Mas em termos de conceito não é muito rigoroso (....).”(PA) “Esse esburacada. Talvez não se apercebessem bem acerca do que quer dizer.” (PH)

Quadro 29. Termos científicos que, na opinião dos professores, podem suscitar dúvidas aos alunos (nP=8)

Professores entrevistados

Categorias PA PB PC PD PE PF PG PH

A. Nenhum termo suscita dúvidas __ __ __ __ __ Esburacada __ __ __ __

B. Pode suscitar dúvidas

Camada de ozono __ __ __ __ __ __ __

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O professor PF tem ainda a ideia de que os alunos saberão apenas o que é a

Camada de Ozono, desconhecendo, porventura, “pormenores” científicos relacionados

com a constituição Química dessa Camada, como explica:

“Eventualmente a camada de ozono, aqueles alunos mais desinteressados, toda a gente já ouviu falar,

mas associar o ozono à molécula O3, acho que os alunos já não conseguiriam saber”.(PF)

Quanto à interpretação do excerto, diferentes professores apresentam

expectativas diferentes acerca das respostas dos alunos (quadro 30).

Cinco professores indicam que os alunos interpretariam correctamente a figura

1. Contudo, os professores não têm certeza absoluta e/ou impõem algumas condições,

para que a interpretação efectuada pelos alunos seja correcta. Assim:

- a professora PA afirma que os alunos interpretariam o excerto de uma forma

correcta, mas não tem certeza de que isso acontecesse, colocando, no entanto,

alguma esperança na sua afirmação:

“Eu penso que eles já terão conhecimentos para ser críticos também e para ver que o esburacado não

está correcto. Oxalá chegassem a essa conclusão e fossem críticos. Mas penso que sim, que já tinham

conhecimentos para isso de acordo com o que se passa na sala de aula.” (PA) - três professores (PC, PG e PH) referem que apenas os bons alunos

interpretariam correctamente a figura 1:

“Se for um aluno que seja possuidor de uma bagagem sólida dos anos lectivos anteriores, porque este

conceito é dado não só ao nível de C.F.Q. mas também ao nível das Ciências Naturais, e ao nível do 5º,

6º ano, sobretudo no 6º ano, eles já têm a noção... da Camada de ozono. Se for um aluno nessas

condições irá entender essa linguagem científica..” (PC)

Quadro 30. Previsão efectuada pelos professores acerca da interpretação da figura 1 por alunos do 9º ano (nP=8)

Professores entrevistados

Categorias PA PB PC PD PE PF PG PH

Todos os alunos __ __ __ __ __ __ __Só os alunos bons __ __ __ __ __

A. Interpretação

correcta Após preparação prévia dos conteúdos __ __ __ __ __ __ __Diriam que era um “buraco real “ __ __ __ __ __ __Achariam exagerada a posição do Pateta __ __ __ __ __ __

B. Interpretação

“incorrecta” Diriam que a capa tem uma protecção mais eficaz do que o protector solar __ __ __ __ __ __ __

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“Aqueles que têm menos informação iriam ficar com uma ideia errada.” (PG)

- a professora PB admite que os alunos compreenderiam o excerto, mas apenas

após uma preparação prévia ao nível dos conteúdos:

“Acho que teria de existir uma preparação anterior, ao nível dos conteúdos, de termos, para

compreender este texto. Para perceberem qual era o conteúdo desse texto.” (PB)

Três professores manifestam que os alunos interpretariam “erradamente” a

figura 1, referindo, no entanto, três motivos díspares:

- dois professores (PE e PF) pensam que o tipo de interpretação em causa seria

devido à interpretação que fazem a temática “buraco de Ozono”, ou seja, que

os alunos imaginam que a Camada de Ozono tem um “buraco real”:

“(...) eles iriam imaginá-lo do tipo capacete com orifícios, e com buracos realmente e com os tais

orifícios.”(PE)

“Esburacada, acho que diria que tem buracos...”(PF)

- dois entrevistados (PD e PE) afirmam que os alunos irão considerar que a

posição do Pateta é exagerada:

“O Pateta tem sempre atitudes um pouco ... atitudes patetas, e, realmente o proteger o sol com a capa,

isto é, ao mesmo tempo uma situação um pouco hilariante. Tenho a impressão que achavam que era um

bocadinho ridículo.” (PD)

- o professor (PF) refere que este tipo de interpretação seria devido à temática

da “protecção solar”, ou seja, seria devido ao facto de os alunos pensarem

que a capa tem uma protecção mais eficaz que o protector solar:

“ (...) agora utilizar a capa, a maior parte já tem medo do sol que acha que nem o protector solar

protege e então anda com a capa.” (PF)

Em suma, a maioria dos professores entrevistados (cinco) prevê que os alunos,

de um modo geral, no terminus do 9º ano de escolaridade, façam uma interpretação

“correcta” da figura 1 enquanto os restantes professores (três) referem que os alunos não

conseguirão interpretar correctamente essa mesma figura.

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Quando se solicita aos alunos, professores e investigadoras que refiram o que,

na sua opinião, a figura 1 lhes sugere, obtêm-se duas ideias (quadro 31).

A primeira ideia, referida por mais sujeitos, é que a figura de B.D. transmite

algo sobre a protecção da pele dos efeitos do sol. Esta ideia é referida:

- unanimemente pelas investigadoras:

“O efeito do sol sobre a pele. Que o pateta se quer proteger e então utiliza a capa e o Mickey diz que a

pode tirar se usar o protector solar. Que será suficiente.” (IA)

“ Protecção necessária para proteger a pele dos raios U.V..” (IB)

“ (...) uso ou não dos protectores solares e se o pateta com a capa está ou não protegido dos raios

U.V..” (IC)

- por dois professores (PA e PD):

“O ter que se usar protector solar.” (PA) “Para já ensina os alunos, diz lhes que devem, quando estão ao sol, usar protector solar.” (PD)

- pela maioria dos alunos (sete), e no caso AE, de uma forma um pouco

alarmista:

“É indicar às pessoas para usarem o protector solar por causa do sol.” (AD) “Está a alertar-nos para a não poluição... e para o perigo que é expormo-nos ao sol.” (AA) “(...) nós ficamos com mais medo da exposição ao sol . Por causa desses buraquinhos” (AE)

A segunda ideia associa o excerto de B.D. à Camada de Ozono e é referida:

- por duas investigadoras (IB e IC):

“ O que está aqui é a problemática da camada de ozono (...).”(IB)

Quadro 31. Interpretação da figura 1 pelos entrevistados

Grupos entrevistados

Categorias

Alunos

(nA=8)

Professores

(nP=8)

Investigadoras

(nI=3)

A. Alerta para a protecção da pele dos efeitos do sol AA, AB, AD, AF, AE, AH, AG PA, PD Todas

B. Aborda o tema da “Camada de Ozono” AC Todos IB, IC

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A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

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“Transmite-me alguma coisa sobre a camada de ozono (...).”(IC)

- por todos os professores, como ilustram os exemplos:

“O problema da camada de ozono”. (PA) “Trata do problema da Camada de ozono ( ...) ficam a saber que a Camada de ozono, actualmente, está

esburacada e devem prevenir-se.”(PD)

- por um aluno (AC):

“Põe-nos um bocadinho a par do que anda a acontecer. Que o ozono está a ficar completamente

destruído (...)”(AC)

Desta forma, verifica-se que, de um modo geral, a figura 1 é interpretada pelos

alunos, professores e investigadoras como abordando o mesmo tema, protecção solar.

No entanto, a figura 1 é interpretada apenas por um aluno como tratando do tema

Camada de Ozono, o que contrasta com o que acontece com os restantes grupos

entrevistados (professores e investigadoras) na medida em que vários elementos destes

grupos associam a figura 1 à Camada de Ozono. Parece deste modo que os alunos estão

mais despertos para o tema da protecção solar do que para a Camada de Ozono, embora

aquele seja também um conteúdo um pouco à margem dos conteúdos formais de C.F.Q.

do 3º Ciclo do programa vigente de 2001/2002. A justificação para os alunos estarem

mais alertos para a protecção solar pode ficar a dever-se à forte campanha publicitária

nos meses de Verão a apelar para cuidados com a pele e à publicidade dos protectores

solares.

No que concerne à posição tomada pelo Pateta, neste excerto de B.D., ao

preferir usar uma capa do que protector solar, uma vez que, para ele, a Camada de

Ozono está esburacada, as investigadoras e alunos afirmaram concordar ou discordar

com a personagem, devido às razões apresentadas no quadro 32.

Quadro 32. Opiniões dos alunos e investigadoras acerca da afirmação emitida pelo Pateta

Grupos entrevistados

Categorias

Alunos

(nA=8) Investigadoras

(nI=3)

O protector solar tem uma protecção limitada ____ IA , IC

Depende do contexto ____ IA, IB A. Concorda com o Pateta

Porque a camada de ozono está “esburacada” AB, AG, AH ____

É exagerado AA, AD, AE, AF Todas B. Não concorda com o Pateta

A capa não protege de todos os raios ultravioletas AC ____

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Duas investigadoras (IA e IC) concordam com o Pateta, centrando-se na

discussão capa e/ou protector solar:

“ (...) o protector solar tem uma protecção limitada ao tempo, as próprias substâncias que servem de

protectores solares que estão presentes nos cremes, o seu efeito é questionável e até que vão bloquear os

raios solares. Porque até os próprios guarda-sóis protegem da radiação que vem directa do sol, mas

aquela que é reflectida uma pessoa acaba por apanhar e a roupa é segura.” (IA)

“ (...) se ele está vestido, está protegido das radiações.” (IC)

Contudo, duas delas (IA e IB) referem que a sua concordância com o Pateta

depende do contexto da situação, como se ilustra de seguida:

“Depende um bocado da história. Já que eles não têm chapéu eles vão estar todo o tempo debaixo do

sol, se a vivência deles ou do tipo de pele que ele possa ter possa ser mais sensível ao sol, provavelmente

o protector solar pode não ser suficiente”.(IA) “Depende de muita coisa, se for um dia insolarado, se não tiver nuvens, das horas, da pele estar

sensibilizada ou não (...).” (IB) Os alunos concordam com o Pateta, centrando-se no estado esburacado da

Camada de Ozono:

- três alunos referem que a actuação do Pateta está relacionada com um certo

alarmismo por admitirem que a Camada do Ozono está esburacada:

“Porque a poluição é cada vez maior e o sol está cada vez mais perigoso. Por causa da poluição, dos

fumos, as poeiras vão para a camada de Ozono e vão rompê-la deixando mais facilmente o sol passar.”

(AB)

“Porque o buraco que há na Camada do ozono, que pelos vistos cada vez é maior, deixa passar os raios

ultravioletas e é prejudicial para a nossa pele.”(AH)

Cinco alunos e três investigadoras discordaram do Pateta por duas razões

distintas:

- considerar a situação exagerada:

“Mas este tipo de roupa é capaz de ser um exagero. Ninguém se protege ao ponto de ir com um

equipamento destes para a praia. Mas é levado ao extremo talvez para demonstrar a importância deste

problema [diminuição da Camada de Ozono].”(IA)

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“Acho que é um pouco alarmismo, é um bocado exagerado talvez para passar a mensagem [da

necessidade usarem o protecção solar].” (IB)

“A Camada do ozono não está bem, mas ele está a exagerar um bocadinho, porque para já não é

preciso tanto alarme. Também não é isso [a capa] que nos faz proteger por causa da camada de ozono”

(AE) “Acho que ninguém usa assim capas para se proteger da Camada de Ozono.” (AF)

- entender que a capa não protege de todos os raios ultravioletas:

“A capa não nos iria servir de muito. Além de que teríamos a cara ao sol e é muito perigoso. É uma

parte muito sensível. A capa pode-nos tapar um bocadinho uma vez que a camada de ozono está

completamente destruída e o ultravioleta tem facilidade em passar. Só que eu penso que a capa nos

poderia proteger de certos raios ultravioletas, mas não nos protege de todos.” (AC)

Ao compararmos os dois grupos, verificamos que três alunos (AB, AG e AH)

limitam-se a ler o que está escrito no excerto de B.D., ou seja, a efectuar uma

constatação de que a Camada de Ozono está esburacada, para argumentar a sua

concordância com a personagem, enquanto que as investigadoras adoptam uma posição

crítica perante o texto, referindo que a sua concordância depende do contexto (IA e IB)

e do facto de considerarem que o protector solar tem uma protecção limitada (IA e IC).

Pela não concordância estão quatro alunos (AA, AD, AE e AF) e todas as

investigadoras por considerarem que estar na praia com uma capa que, ainda por cima é

de chuva, é um exagero. Apenas uma aluna (AC) toma uma posição de não

concordância com o Pateta devido ao facto de, para ela, a capa não conseguir proteger

de todos os raios U.V., notando-se da parte do aluno uma posição crítica perante o texto.

Quando se solicitou aos alunos, na entrevista, que explicassem o seu

pensamento acerca do assunto Camada de Ozono, questionando-os directamente se

consideram que a Camada de Ozono está mesmo esburacada, surgiram opiniões

variadas, que agrupámos em quatro categorias (quadro 33).

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Apenas dois alunos (AC e AH) dão respostas cientificamente aceites, na

medida em que referem a função da Camada de Ozono e interpretam correctamente o

sentido da palavra esburacada no contexto da figura 1.

“É a camada de ozono que nos protege dos raios ultravioletas emitidos pelo sol. Buracos, não. Mas está

a ficar reduzida. Penso que seja só diminuição da largura.” (AC) “É uma camada que protege a Terra, penso eu, dos raios solares prejudiciais. É uma expressão

utilizada para referir que ela cada vez está a ficar mais fragilizada, mais fraca, para mim não é nenhum

buraco, está é mais frágil.” (AH)

Metade dos alunos entrevistados (quatro) conhece a função da Camada de

Ozono, explicando tudo o resto com muito pouca coerência e má interpretação do termo

esburacado:

“Serve para proteger dos raios ultravioletas do sol que são perigosos (...) situa-se à volta do planeta (...)

sei que está mais sobre a Gronelândia. Está esburacada por causa da poluição, dos fumos, as poeiras

vão para a Camada de ozono e vão rompê-la deixando mais facilmente passar o sol.” (AB) “A camada de ozono é assim como um chapeuzinho de chuva. E por exemplo, um chapéu se tiver

buraquinhos vai-nos caindo a chuva em cima e na camada de ozono é precisamente a mesma coisa., os

buraquinhos deixam passar os raios solares. Serve para nos proteger dos raios solares.” (AE) “A camada de ozono é aquela que protege um pouco dos raios ultravioletas. Sim está cheio de buracos.

É assim, falta qualquer coisa. Ali, talvez aquilo que falta é o bom.” (AF) “É tipo rede que está em volta da Terra e que protege dos raios do sol. Do perigo do sol.” (AG)

Quadro 33. Distribuição das respostas sobre o Buraco de Ozono pelas diferentes categorias de resposta (nA=8)

Alunos entrevistados

Categorias AA AB AC AD AE AF AG AH

A. Cientificamente aceite __ __ __ __ __ __

B. Correcta ao nível da função da Camada de ozono __ __ __ __

C. Correcta só em relação à designação do termo “esburacado” __ __ __ __ __ __ __ D. Não sabe nada do tema __ __ __ __ __ __ __

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

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O aluno AA parece apenas saber o significado de “buraco da Camada de

Ozono”, tendo depois uma resposta bastante confusa, no que diz respeito à função dessa

mesma Camada:

“Serve para proteger o Homem dos raios do solares e para a protecção dos meteoritos que podem cair.

Tudo aquilo que está do lado de lá da Terra. Está mais esburacada nos pólos. Não é ter buracos, tem

uma camada mais fina.” (AA)

Em síntese, apenas dois dos alunos entrevistados (AC e AH) interpretaram

correctamente o termo esburacada e a função da Camada de Ozono na figura 1, apesar

do tema ter sido abordado e/ou veiculado em contexto formais e/ou informais de

aprendizagem.

Ao lerem duas interpretações da figura 1 feitas pelos alunos AB e AG

(entrevistados anteriormente e com a escolaridade básica concluída) acerca da Camada

de Ozono e da tomada de posição do Pateta, os professores emitiram três opiniões

distintas (quadro 34).

A justificação apresentada por mais professores (cinco) indica que os alunos

em causa fazem uma interpretação “ à letra” do assunto:

“Lá está, eles consideram que o que está aqui escrito é verdadeiro e levam à letra. E portanto, na B.D.

temos que ter algum cuidado também na forma como aparece o texto escrito.” (PA) “Têm uma visão como as pessoas vulgares têm. Para já aquilo não é realmente um buraco é uma

diminuição de concentração. E eles talvez não se apercebam disso e tratam o problema terra a

terra.”(PD)

Dois professores (PE e PG) referem que os alunos têm uma ideia “errada” do

assunto:

Quadro 34. Comentários dos professores sobre as interpretações dos alunos acerca da figura 1 (nP=8)

Professores entrevistados Categorias

PA PB PC PD PE PF PG PH

A. Os alunos têm uma ideia superficial acerca do tema da Camada de Ozono __ __

B. Os alunos têm uma ideia ” errada” acerca da Camada de Ozono __ __ __ __ __ __

C. Os alunos têm concepções alternativas acerca do tema __ __ __ __ __ __ __

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

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“ (...) eles imaginam que aquele buraco existe realmente...Depois, uma coisa que eu não pensaria assim,

eu nunca pensei que realmente era melhor estar vestido, no fundo ao ver isto, eles foram sensíveis a essa

ideia, o que leva a crer que não estão muito bem informados (...) ” (PE) “ (...) dá a ideia que tem uma ideia errada. Esta da rede também não estava a espera. Quem diz é tipo

rede será que sabe que está a falar de um gás.” (PG)

O professor PH acredita que os alunos em causa têm concepções alternativas

acerca da Camada do Ozono:

“Aqui há concepções alternativas por assim dizer. Pronto são concepções que os nossos alunos têm que

não estão de acordo com os conceitos científicos. São comentários porque os alunos adquirem estas

concepções porque ouvem falar no dia a dia, nos jornais, etc, é com essas concepções alternativas que

permanecem na sua vida académica e que levam para toda a vida”. (PH)

No tocante à questão de saber se a problemática subjacente à figura 1 poder ter

uma base real ou de ficção, a grande maioria dos professores, dos alunos e todas as

investigadoras afirmou que, na sua óptica, o excerto tem uma base real. Um aluno e um

professor consideraram, no entanto, que o excerto transmitia algo de ficção.

Entrevistados acerca das razões da base de verdade/ficção imputada ao mesmo excerto,

os elementos referem motivos diferentes (quadro 35).

Cinco professores, uma investigadora (IB) e dois alunos (AC, AH) referem

que a mensagem é real, porque a Camada de Ozono está realmente a diminuir:

“A camada de ozono está a ficar mais reduzida.” (IB)

Quadro 35. Opiniões dos entrevistados acerca da veracidade da abordagem da problemática do excerto 1

Grupos entrevistados

Categorias

Alunos

(nA=8)

Professores

(nP=8)

Investigadoras

(nI=3)

A camada de ozono está a diminuir AH, AC PA, PB, PD, PG, PH IB

O buraco do ozono existe realmente AB, AE, AF ____ ____ A. Real

É necessário ter a pele protegida do sol AC, AD, AA PA, PD, PF, PG IA, IC

B. Ficção É uma mensagem exagerada AG PE ____

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

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“Porque, apesar de ser em B.D., é real porque nos alerta para o perigo. A camada de ozono está a ficar

cada vez mais fragilizada.” (AH) “Eu acho que cada vez se vêem mais problemas de alergia de pele relacionados com o sol e que estão

relacionados com o sol e que estão directamente ligados com este problema da camada de ozono.” (PA)

“É real porque a camada de ozono está a ser destruída.” (PB)

Alguns alunos justificam a realidade do excerto com o facto de considerarem

que o “Buraco da Camada de Ozono” existe:

“ (...) Acho que é bastante real. A Camada de ozono está a ficar esburacada entre aspas, já tem assim

uns buraquinhos.” (AE)

“Isto é uma mensagem para as pessoas. Acho que há mesmo um buraco.” (AF)

Outra razão apresentada (por duas investigadoras, quatro professores e três

alunos) para a veracidade do excerto é que é mesmo necessário ter a pele protegida dos

efeitos do sol:

“O problema em si é verdadeiro, a forma como ele é aqui tratado é um bocado cómica. Ninguém se

protege ao ponto de ir com um equipamento destes para a praia. Mas é levado ao extremo talvez para

demonstrar a importância deste problema.” (IA) “Cada vez mais temos de nos proteger. Mesmo de Inverno em dias de sol de Inverno é tão importante ter

a pele protegida como no Verão.” (PA) “ (...) e de facto é um perigo expormo-nos ao sol sem protecção solar.” (PF) “Basta pôr protector solar.” (AC)

Um professor (PE) e um aluno (AG) consideram que se trata de ficção, porque

a mensagem é exagerada:

“É uma mensagem exagerada, um medo despropositado, desproporcionado com falta de compreensão

até da própria situação em si.” (PE)

“E o Pateta quer ficar com esta capa na praia...uma capa assim com um calor destes!” (AG)

Apesar da figura 1 estar integrada num livro de B.D., a totalidade das

investigadoras e os professores e alunos (à excepção do aluno AG e do professor PE)

consideram a problemática veiculada pela figura 1 como real. Três alunos (AB, AE e

AF) argumentam que o excerto é real pois, confiam que existe efectivamente um buraco

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

196

na Camada de Ozono. Todos os outros alunos indicam opiniões semelhantes às opiniões

das investigadoras e professores acerca desse aspecto.

Aos alunos entrevistados foi perguntado se o excerto ia ao encontro do que

eles sabiam acerca do assunto. Todos eles afirmaram que a informação emanada da

figura 1 era compatível com o que eles conheciam, embora por razões diferentes

(quadro 36).

Ao ler o excerto, três alunos (AB, AE e AG) afirmam que a figura 1 confirma

o seu pensamento, porque o Pateta refere que a Camada de Ozono está esburacada e

eles efectivamente julgam que é verdade:

“Sim porque já tinha ouvido falar, nas aulas, na televisão, já tinha conhecimento disto. Pelo termo

esburacado que já conhecia.” (AB) “Sim, a camada de ozono está esburacada.” (AE) “Vai, porque ele diz “esburacado”. Ou seja, sei mais ou menos o que é a camada de ozono tem tipo

umas manchas tipo esburacadas” (AG)

Três alunos (AA, AC e AH) referem apenas que o excerto vai ao encontro do

que conheciam, ou seja, que a Camada de Ozono se encontra destruída:

“Está estragada, acontece o efeito de estufa. Que temos que ter mais cuidado.” (AA) “Põe-nos um bocadinho a par do que anda a acontecer. Que o ozono está a ficar completamente

destruído, e que isso vai-nos criar bastantes problemas de cancro.”(AC) “Porque eu já pensava assim, acho que tinha este pensamento acerca da camada de ozono.”(AH)

Quadro 36. Razões da concordância entre a mensagem que os alunos pensam ser transmitida pela figura 1 e

os seus conhecimentos prévios

(nA=8) Alunos entrevistados

Categorias AA AB AC AD AE AF AG AH

A Camada de Ozono está esburacada __ __ __ __ __

A Camada de Ozono está destruída __ __ __ __ __ A. Sim

É necessário protecção do sol __ __ __ __ __ __ __ B. Não ___ ___ ___ ___ ___ ___ ___ ___

C. Não sabe __ __ __ __ __ __ __

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

197

O aluno AF afirma que as ideias veiculadas pelo excerto são concordantes com

o que ele já sabia, porque ele sabe que tem de usar o protector solar para se proteger do

sol: “Vai, porque sempre ouvi dizer que se tem de usar protector solar para proteger dos raios.” (AF).

A aluna AD não se pronunciou, pois revelou não ter conhecimento prévio

desta temática.

Assim, parece-nos que, no caso dos alunos AC e AH, a utilização de um termo

menos científico (esburacado) não foi, para nenhum deles, entrave à compreensão do

excerto, pois já tinham demonstrado que conheciam o tema (quadro 32) e, portanto,

foram coerentes ao manifestar concordância entre o que eles sabiam e a figura 1. Em

relação aos alunos AB, AE e AG, a razão da concordância com a mensagem do excerto

1 parece ser devida ao facto destes alunos acatarem o que está escrito no excerto, uma

vez que repetem o que está escrito. Os alunos AA e AF ao concordarem com a ideia

veiculada no excerto estão, de certo modo, a reforçar a sua ideia prévia do assunto, pois,

apesar do termo esburacado não lhes causar dificuldades na interpretação do excerto

(quadro 32), os mesmos têm ideias menos claras acerca do assunto. Contudo, enquanto

o aluno AA revela alguma confusão entre o efeito de estufa e a Camada de Ozono, o

aluno AF remete também para a leitura do excerto a sua justificação, pelo que parece

que a figura 1 está de certo modo a reforçar a ideia prévia que tinha. O aluno AD ignora

por completo esta temática.

Estes resultados são consistentes com um estudo com 91 alunos canadianos,

considerados “bons” alunos, a terminar o equivalente ao nosso ensino secundário com

disciplinas científicas nas áreas de Química, Biologia e Física ou algumas combinações,

realizado por Phillips e Norris (1999). Nesse estudo, a maioria dos alunos adoptou uma

posição de acatamento e de confiança perante questões colocadas pelos investigadores

sobre os conteúdos científicos existentes em quatro extractos de jornais e/ou revistas

científicas e não científicas.

Auscultámos, em seguida, a opinião dos alunos e investigadoras acerca de qual

das personagens do excerto, Mickey ou Pateta, no seu entender, poderia ter razão acerca

de qual dos meios, capa ou do protector solar, teria uma maior eficácia para a protecção

do sol (quadro 37).

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

198

Verifica-se (quadro 37) que as investigadoras foram consensuais em atribuir

razão à actuação do Mickey, no contexto da figura 1. Semelhante posição foi tomada

pela maioria dos alunos (seis). Uma das razões apontadas para justificarem esta opinião

tem a ver com o facto de considerarem que o protector solar fornece protecção

suficiente, como se ilustra a seguir:

“Para o senso comum e a publicidade a que estamos sujeitos e tudo, o protector solar é protecção

suficiente...” (IA) “ É o Mickey, porque acho que o uso do protector solar deverá ser suficiente para a protecção.” (IB) “ Porque o Mickey fala do protector solar que temos de usar.” (IC)

Reiterando a razão atribuída ao Mickey, uma investigadora (IC) e um aluno

(AC) referem ainda que ir para a praia com uma capa é exagerado, do ponto de vista

prático, normal, de um veraneante que se quer bronzear:

“ Por um lado é absurdo estar numa praia com capa (...)” (IC). “O Mickey, acho que a B.D. exagera sempre um bocadinho nem que seja para soltarmos uma

gargalhada.” (AC)

Uma das investigadoras (IA), apesar de ter concordado com o Mickey,

considera que é necessário conhecer o contexto em que a discussão tem lugar porque,

dependendo desse contexto, o Pateta poderá ter razão, uma vez que:

“ (...) há pessoas que deveriam mesmo vestir-se. ...principalmente se não se sabe as horas do dia que

aqui estão, quanto tempo estão (...).” (IA)

Três alunos (AB, AG e AH) dão a razão ao Pateta por considerarem que com a

capa fica mais protegido dos perigos do sol:

Quadro 37. Opinião dos alunos e das investigadoras acerca da posição do Mickey e/ou do Pateta na figura1

Grupos entrevistados

Categorias

Alunos

(nA=8)

Investigadoras

(nI=3)

É absurdo estar numa praia com uma capa AC IC A. O Mickey tem razão

O protector solar é protecção suficiente AB, AC, AD, AE, AF, AH Todas

Depende do contexto ____ IA B. O Pateta tem razão

Fica mais protegido dos perigos do sol AB, AG, AH ___

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

199

“O Mickey está todo descontraído [...]. O Pateta é o que tem mais consciência do que se está a passar

na vida real com a Camada de ozono.” (AB) “É o Pateta. Enquanto os outros puseram protector solar, ele não quer, fica mais protegido.” (AG) “Porque se está a precaver para não ter nenhum problema de pele.” (AH)

Em termos de rigor científico foi solicitado às investigadoras que

comentassem a utilização no excerto de B.D. do termo esburacada, para o Pateta se

referir à diminuição da Camada de Ozono. As três investigadoras foram unânimes em

considerar que, como é um termo utilizado num livro de B.D., a sua utilização não é

problemática (quadro 38).

Todas as investigadoras defendem que o termo esburacado é acessível a todas

as pessoas que lêem B.D.:

“Agora temos de transmitir através de uma linguagem que as pessoas percebam e que elas se

identifiquem de alguma forma (...) ” (IA) “Muitas vezes é um termo para chamar a atenção das crianças, acho que como é na B.D. é para ter um

termo mais cómico [...] não substituiria por outro.” (IB)

Duas investigadoras (IA e IB) consideram que a utilização do termo

esburacado não é problemático pois, é um termo próprio da B.D:

“Se o objectivo da B.D. é chegar aos mais jovens e é fazer com que eles se sintam de alguma forma

traduzidos no que acontece, a linguagem tem de ser uma linguagem que eles compreendam...a

linguagem que é utilizada na B.D., a B.D. (não é um livro científico), tem um papel importante para

alertar por exemplo, sobre essas questões, eles sabem que esburacado é uma superfície que tem vários

buracos, vários orifícios. Não podemos dizer em B.D., que existem algumas zonas deficitárias em...

não batia os desenhos com o texto, e aí os miúdos não gostavam...a ciência tem de ser levada a todas

as camadas, não só às crianças, mas também aqueles que não têm acesso às universidades, aos

estudos. (IA)”

Quadro 38. Opiniões das investigadoras acerca da utilização do termo Esburacada na figura 1 (nI=3)

Investigadoras entrevistadas

Categorias IA IB IC

A. Esburacada é um termo acessível para todas as pessoas que lêem B.D

B. Numa aula o termo deve ser substituído __ __

C. É um termo próprio da B.D. __

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

200

“Acho que na B.D. é para ter um termo mais cómico.” (IB)

No entanto, outra investigadora (IC) acrescenta ainda que uma professora

deveria substituir o termo esburacado por um mais adequado em situações de ensino e

de aprendizagem, numa aula, como é relatado a seguir:

“Uma professora ao pegar neste excerto para dar uma aula deve usar um termo adequado para os

alunos se aperceberem melhor da dimensão do que está a acontecer.” (IC)

Em suma, os elementos entrevistados consideram que a problemática da figura

1 tem uma base real. No entanto, alunos e investigadoras centram as suas atenções em

problemáticas semelhantes, ou seja, enquanto que os primeiros incidem as suas atenções

apenas na protecção solar, os segundos centram-se na protecção solar e Camada de

Ozono.

Porém, quando é solicitado aos alunos e às investigadoras para tomarem uma

posição a favor ou contra uma das personagens no contexto da figura 1, os alunos, na

sua maioria, tomam uma posição baseada no que as personagens dizem, ou seja, acatam

(à excepção da aluna AC) a mensagem que é veiculada pela figura, enquanto que as

investigadoras adoptam uma posição crítica perante o que as personagens dizem.

Ao contrário das investigadoras que, ao analisar a figura 1, ponderam o

contexto em termos da hora do dia e eficácia do protector solar, os alunos emitem

opiniões baseadas no que supostamente sabem/conhecem do assunto, esquecendo-se, do

no nosso ponto de vista, de argumentar com base num contexto. Assim, apesar de dois

alunos, ao longo da entrevista, terem manifestado conhecer o tema da Camada de

Ozono e saberem interpretar o excerto, não conseguiram ponderar as circunstâncias e

avaliar a situação da figura 1 com base num contexto.

A previsão dos professores relativamente aos alunos conhecerem a função da

Camada de Ozono e entenderem o termo esburacada estava correcta, pois apenas dois

alunos (AC e AH) o fizeram efectivamente, apesar do tema ser conhecido e ter sido

abordado formal e informalmente. Desta forma, poder-se-á afirmar que as expectativas

dos professores, em relação ao desempenho dos alunos, se confirmam, o que pode

indicar que eles terão consciência que este tema, no Ensino Básico, não estará a ser

objecto da melhor abordagem. Acresce ainda que, apesar de ser um tema tão veiculado

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

201

informal e actualmente, devem ser poucas/raras as vezes que materiais do tipo informal

(jornais, revistas, B.D., entre outros) abordando estes temas sejam analisados na sala de

aula, o que não facilitará a aproximação entre dois mundos tão próximos, mas que

permanecem tão distantes.

B- Análise da Figura 2

Perguntámos aos alunos se conheciam todos os vocábulos usados no excerto

de B.D. apresentado na figura 2. A maioria dos alunos (seis) refere não conhecer o

significado da palavra comburente (quadro 39), como dá a entender um deles:

“Comburente? Não, nunca ouvi falar!” (AF) Dois deles indicam não conhecer o que significa

combustão, como menciona o aluno, AG: “Lembro-me de falar da palavra combustão, mas não

conheço o significado.” (AG)

Apenas dois dos alunos entrevistados (AC e AH) admitem conhecer todas as

palavras incluídas no excerto. No entanto, quando se lhes solicitou um exemplo de uma

situação do dia-a-dia em que aparecessem essas palavras, as respostas por eles

apresentadas deixaram transparecer algumas dúvidas quanto ao significado dos termos

em causa, uma vez que afirmaram que o gás e a madeira tinham a função de comburente

e o fogo/calor a função de combustível:

“Combustão, ligar o gás. Combustível: petróleo, gasolina; Comburente, gás.” (AC) “Madeira a arder. E nesse contexto, o comburente é a madeira e o combustível é o fogo ou o

calor”.(AH)

Quadro 39. Familiaridade dos alunos com os vocábulos apresentados na figura 2 (nA=8)

Alunos entrevistados

Categorias AA AB AC AD AE AF AG AH

A. Conhece todas as palavras __ __ __ __ __ __

Combustão __ __ __ __ __ __ B. Não conhece

Comburente __ __

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

202

Com o objectivo de elucidar a maioria dos alunos acerca dos termos,

Combustão e comburente, ou seja, para tentar ultrapassar o “ruído” de comunicação e

permitir, dentro do possível, prosseguir com a entrevista, foi dado um exemplo de uma

combustão e de um comburente.

Aos alunos perguntou-se o meio de informação a partir do qual tiveram

conhecimento do tema da figura 2, ou seja, de combustão (quadro 40). O aluno AD

apresentou um desconhecimento total do tema, argumentando que nunca, em contexto

algum, ouviu falar deste tema, enquanto que todos os restantes afirmaram já ter ouvido

falar do assunto.

Quase todos os alunos (sete) falaram do tema da Combustão na sala de aula,

na disciplina de C.F.Q., especificando, alguns deles, terem abordado as combustões na

componente de Química:

“Química, 8º ano, Reagentes, Produtos de reacção?” (AA) “Acho que foi na Química. Estávamos simplesmente a falar sobre a combustão, combustível, era uma

matéria que vinha no programa, no livro do 8ºano (...). ” (AB) “Sim, no 8º ano a C.F.Q..” (AH)

O aluno (AC) refere também ter tido conhecimento do tema Combustão

através de panfletos de alerta: “Cuidados com o fogo, em panfletos de alerta.” E o aluno AA

assume ter conhecimento desta temática através do avô que é mecânico, “O meu avô é

mecânico. E no Verão eu ia ao pé dele. E ele mexia nos carburadores dos carros, especialmente. E aprendi isso.

Com o afinar dos carros” (AA)

Quadro 40. Origem do conhecimento dos alunos sobre a temática Combustão e Símbolos de perigo (nA=8)

Alunos entrevistados

Categorias AA AB AC AD AE AF AG AH

Da disciplina de C.F.Q. - Química __

De panfletos de alerta __ __ __ __ __ __ __ A. Conhece

Através do avô __ __ __ __ __ __ __ De combustão __ __ __ __ __ __ __ B. Não conhece/

Não ouviu falar Dos símbolos de perigo __ __ __ __

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

203

No entanto, apenas quatro alunos conhecem os símbolos de perigo associados

às combustões e, de acordo com os mesmos alunos, esses símbolos terão sido

aprendidos na aula de C.F.Q.:

“Alguns. Há sim! Vinha no livro. Em C.F.Q. no 9º ano.” (AF) “Foi no 8ºano. Logo no início, penso que foi na Química”. (AG)

Estranha-se o facto do aluno AD referir não estar informado acerca do tema da

Combustão e dos símbolos de perigo, uma vez que estes são conteúdos obrigatórios na

componente de Química do 8ºano e são, frequentemente, abordados pelos meios de

comunicação social. Obviamente que estes factos podem ser condição necessária, mas

não são condição suficiente para a aprendizagem dos assuntos em causa.

Quanto à leccionação destes mesmos conteúdos (combustão/símbolos de

perigo), na disciplina de C.F.Q., os professores entrevistados garantem tê-lo feito

(quadro 41), como não podia deixar de ser, uma vez que é um conteúdo obrigatório do

programa do 8º ano da componente de Química.

No entanto, quando questionados sobre se alguma palavra incluída no excerto

ofereceria dificuldades aos alunos, os professores dividem-se, conforme é discriminado

no quadro 42.

Quadro 41. Abordagem dos temas Combustão e Símbolos de perigo (nP=8)

Professores entrevistados

Categorias PA PB PC PD PE PF PG PH

A. Combustão 8º ano, Transformações Químicas B. Símbolos de perigo 8º ano, no início da Química

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

204

A maioria dos professores (cinco) é de opinião que há termos na figura 2 que

causarão dúvida nos alunos. A palavra comburente é a palavra apontada por mais

professores (cinco) como capaz de provocar dificuldades aos alunos. Segundo estes

professores, a causa dessas dificuldades tem a ver com o facto desta palavra ser pouco

usada:

“ (...) acho que comburente, embora nós falemos do comburente mas, porque acho que é um conceito

que lhes passa ao lado.” (PA) “A palavra comburente, porque é pouco utilizada no dia a dia.”(PG)

O professor PF estava convencido que o termo combustível, iria causar

dificuldades aos alunos, argumentando que nunca o abordou na sala de aula. Esta

consideração causa-nos alguma estranheza pois, geralmente, este termo é bastante

veiculado pelos media, a propósito da oscilação de preço que este líquido está

frequentemente sujeito, entre outros assuntos:

“Quase de certeza absoluta que combustível e comburente eles não vão saber. [...] Eu nunca falei” (PF)

Apenas dois professores (PC e PH) consideram que nenhum aluno teria

dificuldades em entender palavras contidas no excerto; outro professor (PD) pensa que

isso só seria para os alunos bons:

“Porque, talvez, eu sou de uma geração que acompanhei a utilização destas palavras sem haver

rupturas, eu não vejo nada aos meus olhos que possa suscitar dúvidas.” (PC)

Quadro 42. Termos científicos que, na opinião dos professores, podem suscitar dúvidas aos alunos (nP=8)

Professores entrevistados

Categorias PA PB PC PD PE PF PG PH

Todos __ __ __ __ __ __ A. Nenhum causa dificuldade

Só os bons alunos __ __ __ __ __ __ __ Combustível __ __ __ __ __ __ __ Comburente __ __ __ B. Causa dificuldade

União __ __ __ __ __ __

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

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205

“Não, porque ele já conhece. Quanto a mim combustão ele sabe o que é, comburente já não se utiliza

muito, nem combustível. Ainda agora tenho feito revisões e eles sabem. São termos, lá está uma pessoa

apela para o dia a dia, e nunca mais se esquecem.” (PH) “Bem, se ele fosse um bom aluno eu acho que não.” (PD)

Dois professores (PB e PE) afirmam que os alunos não compreenderão o

conceito de união, no contexto da figura 2:

“A palavra união pode causar dúvidas aos alunos.” (PB) “A palavra união. Pronto, o que é que eles entenderiam acerca do termo. Daí considero que esta

palavra levantaria e suscitaria mais atenção para explicar.” (PE)

Embora nenhum dos professores (PB e PE) tenha justificado o porquê da indicação do

termo união, depreende-se que, para estes, os alunos não seriam capazes de lhe dar o

significado correcto, do ponto de vista científico. A fim de obtermos fundamentação

para esta inferência, pedimos aos professores opiniões acerca do modo como pensam

que os alunos interpretariam o termo união. Aos alunos solicitámos que nos

esclarecessem o significado da mesma palavra, no mesmo contexto. Colocámos no

mesmo quadro 43 as apreciações efectuadas por estes grupos de entrevistados.

Pela análise do quadro 43, nota-se um contraste entre aquilo que os

professores prevêem que os alunos diriam e o que eles dizem realmente.

Desta forma, seis professores admitem que os alunos associem de imediato, neste

contexto, união a reacção, embora uns tivessem mais certeza disso do que outros:

“Eu penso que eles chegavam à conclusão que é uma reacção entre dois reagentes, comburente e

combustível para formar produtos. Deveriam entender.” (PA) “Eu tenho a certeza de que um aluno do 9º ano diria reacção. Porque eles associam uma combustão a

uma reacção de facto. Tenho a certeza de que se pedisse a um aluno para corrigir isto eles diriam

reacção.” (PH)

Quadro 43. Significado do termo união no contexto da figura 2

Grupos entrevistados

Categorias

Alunos

(nA=8)

Professores

(nP=8)

A. Reacção AC PA, PC, PD, PF, PG, PH

B. Significados do dia-a-dia AA, AB, AF, AG, AH PB, PE

C. Não sabe AD, AE ______

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

206

Os professores que diagnosticam que os alunos não darão o significado

correcto à palavra união são os mesmos que pensam que este vocábulo suscitaria

dúvidas aos alunos, pois não compreenderiam a aplicação da palavra união neste

contexto:

“Porque uma união para eles é estar unido um ao outro. Em contacto.” (PB) “Um aluno que tivesse entendido não consideraria isto correcto. Não diria que é pela união do

combustível ao comburente, questionaria também nesse sentido. Um aluno que não tivesse entendido

imaginaria que o combustível e o comburente passavam a unir-se no sentido físico (...) ” (PE)

Quanto aos alunos, a maioria (cinco) associa à palavra união um termo

inadequado ao exigido no contexto, dando sinónimos como mistura, junção:

“Misturar. É como aquilo que acontece nos carros. Há o oxigénio e a gasolina é pulverizada.” (AA) “É a junção dos dois. Quando juntamos fogo a um combustível este incendei-a imediatamente, portanto,

acho eu que há aí uma ligação Química.” (AB) “É de junção. Porque o combustível vai-se unir com o comburente. É uma coisa ligada a outra.” (AH) “É junção. Junção de alguma coisa com outra ou contacto. União do tipo tem um copo de água e

metemos lá o azeite.” (AF)

Dois alunos não conseguem esclarecer o significado da palavra união neste

contexto, “Aqui não posso falar tanto. É uma matéria que eu não aprofundei muito.” (AE). Somente um

aluno associa o termo união ao vocábulo correcto, reacção, para atribuir significado

químico à frase; todavia fá-lo de uma forma confusa: “(...) quer dizer que essas duas substâncias é

como o pólo positivo com o negativo que se atraem. Mas neste caso, eles reagem.”(AC)

Na análise da figura 2, professores e investigadores foram unânimes em

considerar que o excerto trata de uma Combustão (quadro 44).

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

207

A justificar, investigadoras e professores referem afirmações do género: “O fogo parece ter saído do balde do lixo.” (IA) “Da necessidade de existir o comburente e o combustível para a combustão, um incêndio.” (IB) “Vamos falar de combustão.” (IC)

“Fica a saber que numa combustão há o comburente e o combustível.” (PD) “A reacção de uma combustão. Seria uma descrição de o que era uma combustão. De alguém que já tem

informação suficiente para dizer o que entendia de o que é uma combustão.” (PE)

“Dá uma informação de que para haver combustão é preciso haver os dois componentes. “ (PG)

Apenas um aluno refere que o excerto trata de uma combustão, “O comburente e o

combustível dão origem à combustão que aqui é originada pelo combustível que aqui é o papel. Para

arder é preciso oxigénio” (AA)

Três alunos (AB, AG e AH) argumentam que o excerto dá uma informação

acerca dos dois termos, comburente e combustível, considerando o aluno AG ter

enriquecido o seu vocabulário com o excerto em questão:

“Porque o comburente e o combustível existem” (AB) “Assim já aprendemos mais uma palavra.” (AG) “É para as pessoas saberem que normalmente tem de haver sempre um comburente e um combustível.”

(AH)

Três alunos (AC, AD e AF) pensam que o excerto os alerta para questões de

segurança, ou seja, para cuidados que é preciso ter quando se lida com alguns

produtos/combustíveis:

Quadro 44. Interpretação da figura 2 pelos entrevistados

Grupos entrevistados

Categorias

Alunos

(nA=8)

Professores

(nP=8)

Investigadoras

(nI=3)

A. Trata de uma Combustão AA Todos Todas

B. Alerta para os cuidados a ter com o fogo AC, AD, AF ____ ____

C. Informa acerca dos termos combustível, comburente AB, AG, AH ____ ____

D. Não sabe/ não responde AE ____ ____

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

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208

“Pode fazer explosão.” (AC)

“Que é preciso ter cuidado com o combustível.” (AD) “Ter cuidados com os produtos tóxicos. Para não haver nada que ponha em risco.” (AF)

Em relação ao carácter (real ou ficcional) do excerto, todas as investigadoras,

professores e alunos (à excepção de dois que não se conseguem pronunciar) referem o

mesmo, isto é, que figura 2 tem uma base verdadeira/real (quadro 45).

O único argumento utilizado pelas investigadoras, pelos professores e por

cinco alunos é que a figura 2 trata de uma combustão, que pode efectivamente

acontecer:

“Não só a situação em si pode acontecer como também a análise feita pelo Peninha pode ser verdade,

está correcta, tudo o que está aqui, tanto o fogo como o extintor.” (IA)

“Isto pode acontecer no dia a dia. Pode acontecer uma combustão em casa.” (IC) “Real, porque está aqui um caixote de lixo que está a arder e pode acontecer.” (PF) “Acho que é real. Realmente pode dizer mais qualquer coisa de facto relativamente à combustão.” (PA) “Pode acontecer a qualquer um. Isto aqui foi papel basta uma “beata” para dar origem ao fogo.” (AA)

“Pode ser. Pode acontecer a qualquer um se tiver comburente e combustível.” (AG)

O aluno AF apresenta outra justificação para considerar que a figura tem um

fundo real, pois, na sua perspectiva, o excerto, alerta para os cuidados que é necessário

ter devido à perigosidade dos produtos tóxicos:

“Ter cuidados com os produtos tóxicos. Para não haver nada que ponha em risco.” (AF)

Quadro 45. Opiniões dos entrevistados acerca da veracidade da abordagem da problemática do excerto 2

Grupos entrevistados

Categorias

Alunos

(nA=8)

Professores

(nP=8)

Investigadoras

(nI=3)

Uma combustão pode acontecer AA, AC, AB, AG, AH Todos Todas A. Real

Alerta para o cuidado com os produtos tóxicos AF ____ ____

B. Ficção ____ ____ ____

C. Não sabe/ não responde AD, AE ____ ____

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

209

No que respeita ao rigor científico da figura 2 de B.D., todas as investigadoras

e dois alunos (AA e AB) são peremptórios em afirmar que o excerto não tem rigor

científico. Já os restantes alunos dividem a sua opinião: quatro consideram o excerto,

sob ponto de vista científico, rigoroso e dois alunos referem não conseguir emitir

nenhum veredicto (quadro 46).

As investigadoras e os alunos AA e AB atribuem a falta de rigor científico da

figura 2 à ausência explícita da fonte de ignição, como é exemplificado por alguns dos

entrevistados:

“Se o combustível não estiver na presença do comburente o fogo não se dá. Claro que tem de haver uma

fonte de ignição que falta aqui.” (IA) “Mas aqui o fogo não pode aparecer do nada. Para haver fogo tem que haver ignição. Pode haver um

curto-circuito. Uma combustão não aparece do nada. Está mal porque aqui não há ignição, não há uma

faísca, não há fogo.” (AA) “Eu acho que unir o comburente, o oxigénio, ao combustível, acho que isso não vai provocar uma

combustão.” (AB)

Além deste factor, a investigadora IC refere outros dois motivos para a falta de

rigor científico. Um deles está relacionado com o facto do excerto só falar num dos

vários tipos de combustão existentes:

“Define combustão no sentido de comburente...mas, depois associa a uma imagem que pode conduzir a

que os alunos pensem que combustão é fogo, porque existem outros tipos de combustão, menos

assustadoras, por exemplo o da glicose no nosso corpo, outros tipos de combustão que não aparecem na

B.D. (...)” (IC)

Quadro 46. Opiniões dos alunos e das investigadoras acerca do rigor científico da figura 2

Grupos entrevistados

Categorias

Alunos

(nA=8)

Investigadoras

(nI=3)

A. Tem rigor científico AC, AF, AG, AH ____

Falta a fonte de ignição AA, AB Todas

Só fala num tipo de combustão ____ IC B. Não tem rigor

científico O termo União pode trazer concepções alternativas ____ IC

C. Não sabe/ não responde AD, AE ____

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

210

O outro, com a inadequação do termo união, uma vez que para a investigadora

IC o mesmo pode induzir concepções alternativas nos alunos:

“Aos miúdos quando se fala em reacções junta-se isto com aquilo. Eles podem pensar que existe

realmente uma união e isso não está certo, existe uma reacção que depois dá... e isso pode trazer

concepções alternativas aos alunos.” (IC)

Já a metade dos alunos (quatro) considera a afirmação cientificamente correcta

porque, de acordo com a opinião deles, o que a personagem diz “Sim, Uma combustão

provocada pela união do comburente ao combustível! BZZ!” é correcto:

“Está correcta. Ele aqui está assustado por ver o fogo. Porque é uma combustão provocada pela união

do comburente ao combustível.” (AF) “Sim, pelo que ele diz.” (AG)

É de realçar que o aluno AD refere não conseguir pronunciar-se acerca do

rigor do excerto porque revelou já não conhecer o tema (quadro 39). O facto de o aluno

AE não conhecer a palavra comburente causou-lhe alguma dificuldade e não conseguiu

lidar com a informação que estava escrita no excerto, referindo: “Mas se o comburente pode ser

oxigénio não tem assim muita lógica. Isto é, o comburente ao combustível, não pode dar combustão. Ao ler isto não

consigo tirar significado.” (AE)

Em síntese, metade dos alunos entrevistados (quatro) considera que o que a

personagem diz é rigoroso, opinião que contrasta com a falta de rigor indicada pelas

investigadoras acerca do mesmo excerto

Metade dos alunos entrevistados (quatro) afirma que a informação contida no

excerto vai ao encontro do que eles conheciam (quadro 47), dando, no entanto,

justificações muito vagas, embora compatíveis com ideias apresentadas anteriormente.

Quadro 47. Razões da concordância entre a mensagem que os alunos pensam ser transmitida pela figura 2

e os seus conhecimentos prévios

(nA=8) Alunos entrevistados

Categorias AA AB AC AD AE AF AG AH

Não se deve misturar combustível com comburente __ __ __ __ __ __ __ A. Sim

Combustão exige combustível e comburente __ __ __ __ __

B. Não As combustões não são espontâneas __ __ __ __ __ __ __ C. Não sabe __ __ __ __ __

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

211

Três alunos (AB, AC e AH) identificam o seu modo de pensar com o que está

escrito no excerto uma vez que, para eles, uma combustão exige necessariamente a

presença de um combustível e de um comburente, apresentando no entanto,

justificações muito vagas, embora compatíveis com ideias apresentadas anteriormente:

“Sim, porque para haver uma combustão é preciso haver um comburente e um combustível, porque sem

comburente é impossível haver combustão.”(AB)

“Vem de encontro ao que eu sabia.” (AC) “Vai, porque eu sempre ouvi assim, pensei assim, tinha que haver combustível e comburente para haver

combustão”.(AH)

O aluno AF refere que a informação contida no excerto 2 vai de encontro ao

seu conhecimento prévio pois, na sua opinião, não se deve misturar o combustível ao

comburente, denotando uma grande falta de cultura científica a este respeito:

“Sim, vai. Porque não devemos misturar uma coisa com outra para não nos pormos em risco. O

combustível com outra coisa qualquer.” (AF)

O aluno AA diz que o excerto vai contra ao que ele conhecia do assunto, uma

vez que, para ele, o excerto não traduz uma combustão espontânea:

“Não, um caixote do lixo não pega fogo do nada. Devia ser ele que estava a fumar e deitou para o lixo e

então houve a tal ignição” (AA)

Enquanto que os outros quatro alunos que manifestaram conhecer

formalmente os termos do excerto, quadro 40, concordam com a figura 2, limitando-se,

no nosso entender, a repetir o que estava escrito, adoptando assim uma posição bastante

passiva perante o texto. Três alunos (AD, AE e AG) admitem não conhecer o tema e/ou

não conhecem os termos como comburente e combustão (quadros 39 e 40), como tal,

não se conseguem pronunciar sobre a relação do excerto com os seus conhecimentos

prévios. O aluno AA, que já havia referido que conhecia todos os termos associados à

combustão, é o único que refere que o excerto vai contra o que ele conhecia acerca do

assunto. Curioso é o facto deste aluno conseguir interpretar o excerto e argumentar

sobre o que nele é dito, considerando-o não rigoroso:

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

212

“Está mal porque não há ignição, não há faísca, não há fogo.” (AA).

Este conhecimento foi obtido, essencialmente, devido à vivência que tem com o avô que

é mecânico, como assume: (...) o que conheço é de vê-lo [ao avô] a trabalhar com os carros e ajudá-lo nas

férias (AA) ”. Estes resultados são concordantes com um estudo realizado por Phillips e

Norris (1999). Pois, tal como nesse estudo, a maioria dos alunos adoptou uma posição

de acatamento e de confiança perante questões colocadas pelos investigadores sobre os

conteúdo científicos existentes em quatro extractos de jornais e/ou revistas científicas e

não científicas.

Os professores, ao conhecer algumas afirmações dos alunos sobre o excerto

apresentado na figura 2, quase todas denotando algum desconhecimento da temática

implícita, e inclusivamente de termos como comburente, combustão, tecem alguns

comentários (quadro 48), uns centrados no programa e outros nos alunos.

No primeiro caso, os comentários enunciados por seis professores, têm

intrínseca alguma crítica aos programas, da componente de Química do 8º ano, em

vigor à data de recolha de dados:

“ (...) já depende muito se o assunto é interiorizado, evidentemente nas aulas. E comparando [com os

programas do seu tempo em que era aluna], era uma coisa que vincava logo muito, composição do ar,

oxigénio para um lado, hidrogénio, acompanhado de uma experiência de preparação do hidrogénio e

registávamos as observações.” (PC) “Mesmo o que lhes é ensinado na aula, não chega ao entendimento deles, porque se calhar não é

explicado ao nível do que eles precisariam para entender, porque é exagerado, abstracto (...) ” (PE) “Se calhar estes dois termos [comburente e combustível] são um bocado complicados porque são coisas

muito semelhantes e de facto é difícil perceber, é um bocado de abstracção.” (PF)

Quadro 48. Comentários dos professores sobre as interpretações dos alunos acerca da figura 2 (nP=8)

Professores entrevistados

Categorias PA PB PC PD PE PF PG PH

A. Conteúdo só abordado na Química do 8ºano __ __ B. Conceitos não interiorizados pelos alunos __ __

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

213

No segundo caso, os comentários avançados por seis professores, vão no

sentido de desculpabilização dos alunos, referindo que estes não têm os conceitos bem

interiorizados:

“O programa, de facto, não insiste muito nas reacções de combustão. “ (PA) “Tenho a impressão que quanto mais baixo for o nível etário com que os alunos começarem a

familiarizar com estes vocábulos e que implicam conceitos científicos eu tenho a impressão de que é

melhor. Porque depois eles têm várias oportunidades de chegar às palavras e chegarem aos conceitos

que elas encerram.” (PC) “Acredito que nem sequer os livros falam muito no comburente, acredito que haja muitos professores

que também não falam. Combustível é fácil porque se fala todos os dias, os combustíveis aumentam, etc.

Comburente acredito é mais nas Ciências, mas atenção, penso que eles dão estes termos antes.” (PH)

Em síntese, apesar da maioria dos alunos entrevistados ter manifestado

desconhecimento de alguns termos utilizados no excerto e do assunto que este aborda

ter sido veiculado ao nível formal (aulas de C.F.Q.- componente de Química) e informal

(meios de comunicação), quatro alunos admitem que a figura 2 tem rigor científico.

Estes alunos acreditam que o que a personagem diz é verdade/real, o que contraria a

opinião das investigadoras que são unânimes em considerar que o excerto em causa tem

falta de rigor científico por algumas razões já indicadas anteriormente.

Esta incongruência poderá ser devida ao alheamento que os alunos têm em

relação a alguns temas leccionados na sala de aula, e/ou ao contacto com o mundo que o

rodeia, e/ou ao facto de a explicação destes conteúdos não ter eventualmente sido

contextualizada ao nível da sua vivência pessoal e social, e/ou porque os professores,

como afirmaram, não utilizam muito os termos científicos associados à combustão

quando abordam este assunto na sala de aula.

Assim, deste modo, no final da escolaridade obrigatória apenas um aluno (dos

oito alunos entrevistados) consegue interpretar adequadamente o excerto 2, dois referem

não conhecer o tema e quatro alunos referem que a informação veiculada pelo excerto 2

vai ao encontro do conhecimento que tinham acerca do assunto, significando que o

excerto poderá contribuir para reforçarem as ideias prévias que tinham acerca do

assunto sem colocar em causa, o conteúdo “científico” que a personagem da B.D.

utiliza.

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

214

C- Análise da Figura 3

Ao ler a figura 3 (excerto de B.D. de um livro do Astérix) todos os alunos

mostraram compreender o significado de todos os vocábulos presentes no excerto de

B.D. que ela apresenta.

Ao questionar alunos, professores e investigadoras acerca da mensagem que a

figura 3 lhes transmite, surgem várias sugestões que foram agrupadas em quatro

categorias (quadro 49).

A maioria dos entrevistados (seis alunos, três professores e uma investigadora)

menciona que a personagem sugere um profeta com capacidades para fazer

profecias/previsões:

“Parece uma passagem da bíblia. Os profetas diziam uma coisa e daqui a cem anos ia

acontecer.” (AA) “Penso que não seja tão contemporâneo como isso. O homem parece um ancião e ele prevê que depois

da chuva vem sempre o bom tempo.” (AB)

“Depois da tempestade vem a bonança, é um mito, não existe.” (AC) “É normal que depois da chuva venha o bom tempo. Chove e acho que em alguma altura tem de vir o

bom tempo.” (AE)

“ (...) um fenómeno natural associado a uma profecia...” (PC)

A investigadora IA refere que a personagem do excerto é um profeta, embora

em sua opinião, não seja necessário um profeta para afirmar o que esta personagem

afirma na figura 3:

Quadro 49. Interpretação da figura 3 pelos entrevistados

Grupos entrevistados

Categorias

Alunos

(nA=8)

Professores

(nP=8)

Investigadoras

(nI=3)

A. Profecia/Previsão AA, AB, AC, AD, AE, AH PC, PD, PG IA

B. Ditado popular ____ PA IB, IC

C. Método científico ____ PB, PE, PF ____

D. Outra resposta AF, AG PH ____

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

215

“Ele é um profeta, e não é preciso um profeta para dizer que depois da chuva vem o bom tempo.”(IA)

Um professor e duas investigadoras afirmam que o excerto lhes sugere um

ditado popular:

“ (...) conselhos que ainda hoje os antigos nos dão relativamente aos provérbios, tempo, relacionados

com a agricultura, meteorologia, etc.” (PA) “ Depois da chuva pode vir o bom tempo, isto é um ditado popular (...) ”(IC)

Três professores (PB, PF, PG) referem implícita ou explicitamente, que a

figura lhes sugere procedimentos associados ao método científico:

“Provavelmente provar que choveu.” (PB) “Ao ler a mim chama-me a atenção o conceito de ciência.” (PE) “Sugere-me o método científico que pôs uma hipótese e depois confirmou.” (PF) Em Outras respostas aparecem afirmações relacionadas apenas com repetição

do que a personagem diz, dos seus ensinamentos:

“Isto aqui é que eu não sei se é verdade. Depois da chuva pode vir outra chuva.” (AF) “O homem está à espera de bom tempo para ensinar mais alunos.” (AG) “Já não é necessário ensinar-vos a vocês e vou ensinar outros. Eu só estou a ver isto em termos de

pedagogia.” (PH)

Confrontados com uma pergunta acerca da possível realidade/ficção/história da

afirmação feita pela personagem (figura 3) “Conforme eu tinha profetizado, depois da chuva, vem o

bom tempo... Vou portanto deixá-los, pois outros precisam da minha Ciência”, as opiniões dos

entrevistados dividem-se em duas vertentes (quadro 50).

Quadro 50. Opiniões dos entrevistados acerca da veracidade da abordagem da problemática do excerto 3

Grupos entrevistados

Categorias

Alunos

(nA=8)

Professores

(nP=8)

Investigadoras

(nI=3)

A. Real Traduz conhecimento empírico AA, AB, PA, PD, PE, PH Todas

Fala de profecia e previsão AC, AD, AE, AF AH PG ____ B. Ficção

Recorre a ideias antigas como se fossem actuais AG PB, PC, PF ____

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

216

A vertente mais consensual é a que tem a ver com a afirmação da personagem

ser encarada como real por todas as investigadoras, metade dos professores (quatro) e

dois alunos. A razão invocada por estes está associada ao facto dos entrevistados

referirem que a personagem transmite conhecimentos empíricos:

“Pode ser real porque ele sabe que isso acontece devido aos anos de vida” (AA) “Que há-de ter um fundo real. Todos os provérbios relacionados com a meteorologia, as marés, as luas,

têm um fundo científico de facto. Embora os antigos não tivessem muitos conhecimentos para perceber

isto, quanto mais não fosse pela experiência, acabavam por ver que as coisas aconteciam assim” (PA) “A questão que depois da chuva vem o bom tempo é verdadeira, depois de um mês toda a gente sabe

que isto é verdade, isto é conhecimento empírico” (IA)

Para a maioria dos alunos (cinco) e para o professor PG, a figura 3 só pode ser

ficção, uma vez que estes não concebem uma profecia ou uma previsão como algo

real/verdadeiro:

“Porque não acredito naquilo que ele está a dizer. Acho que isto é uma previsão e não a ciência dele”

(AE)

“A ciência não é um mito, depois da chuva vem o bom tempo, nunca se sabe!” (AC) “Mas já dá uma ideia de ser uma história de ficção, pela palavra profetizado, profecia, acho pouco

real” (PG).

Três professores (PB, PC e PF) e um aluno (AG) consideram ainda o excerto

com algo de ficção, uma vez que o excerto transmite algo passado, antigo, concordante

com o modo de ensinar e questionamento sobre a chuva/bom tempo que na época tinha

razão de ser:

“Actualmente já ninguém questiona a chuva, mas os nossos antepassados tiveram já um pensamento

destes.” (PF)

“Isto já parece tudo antigo. Ele a ensinar os seus conhecimentos” (AG)

Foi pedido aos professores entrevistados uma previsão sobre o modo como os

alunos interpretariam o termo Ciência, em termos de conceito/significado, no contexto

da figura 3 (quadro 51).

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

217

A este repto, a maioria dos professores respondeu defendendo que os alunos

iriam referir que o que está no excerto não condiz com o seu pensamento acerca de

Ciência, devido:

- às contradições que reconheceriam entre o termo profetizado e Ciência:

“Acho que eles diriam que isto não é ciência. Este termo” profetizado”… parece que aqui há bruxedo e

a ciência é investigação e não a profetização, bruxedo.” (PF)

- à noção que têm de que a Ciência é experiência:

“Eu acho que não iam entender. Porque relacionam muito a ciência com a experiência e penso que não

iam abranger este conceito de ciência neste contexto.” (PA)

“Eu acho que neste contexto iria associar a ciência a uma maneira de explicação de fenómenos que

podem ser testados através da ciência.” (PB)

“Se calhar já não aceitavam com naturalidade isto ser ciência. Acho que não iriam associar o termo

profetizado à ciência. Acho que um aluno do 9ºano já tem ideia do método científico, dos passos do

método científico.” (PG)

- ao facto de não ser um assunto abordado na sala de aula:

“Eu não sei se os alunos do 9ºano teriam uma interpretação correcta ou mais ou menos correcta do que

é a ciência. Apenas dão no início do 8º ano o que é Química e o que é Física. Associam a Química a

transformações Químicas e isto tem que ser uma coisa muito bem trabalhada. Eu vejo pelos meus

alunos. Mas não muito mais do que isso, eles não são capazes de dizer o que é a Ciência, a não ser que

consigam distinguir transformações físicas de transformações químicas. Eles relacionariam às

transformações químicas e físicas.” (PH)

- ao facto de o excerto não dar indicações sobre como a personagem da figura

3 reuniu as informações para afirmar que vai chover:

“Eu aqui não sei se eles iriam dar aqui a todas as influências científicas. E sabe porque é que eu digo

que não sei, a chuva não podemos tirar a ideia da pressão atmosférica estar baixa a baixo de 760 mmHg

Quadro 51. Previsão efectuada pelos professores acerca da interpretação da figura 3, por alunos do 9º ano (nP=8)

Professores entrevistados

Categorias PA PB PC PD PE PF PG PH

A. Não considerariam Ciência __ __

B. Associariam a Ciência a sabedoria __ __ __ __ __ __

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

218

e o bom tempo associados a pressão atmosférica de 760 mmHg, mas no fundo eles ouvem muito a

previsão do tempo. Mas repare nunca como agora houve tanta informação da previsão do tempo, com

imagens, com informação com vários países da Europa, mas por estranho que pareça já detectei que os

alunos não ligam nada às condições do tempo. Mas eu penso que, aparece ali um monte de imagens,

mas não há impressão de que houve um barómetro a medir a pressão atmosférica, houve um termómetro

a medir a temperatura e pronto outras condições que se têm de reunir para que haja chuva.” (PC) Dois professores (PD e PE) mencionam que os alunos iriam associar a

Ciência, no contexto da figura 3, à sabedoria:

“Isto aqui, ” Ciência” tem mais a ver com sabedoria (…).”(PD)

“Ciência-sabedoria. Eu acho que eles diriam que este é um sabichão, um sábio e que até sabia que

depois da chuva vem o bom tempo.” (PE)

Quanto ao facto do conceito de Ciência ter sido abordado/discutido na sala de

aula no ano lectivo de 2001/2002, metade dos professores (quatro) afirma nunca o ter

feito (quadro 52).

Como indicam dois deles:

”Nunca falei. Porque estou a seguir uma programação e digamos que o tema está lá mas bem associado

a outro tipo de matéria.” (PB) “Não, já tenho falado, mas este ano não falei. ...falo no início do ano da relação da Química e Física

com outras ciências... talvez isso fique mais para os cursos de Filosofia, é mais no âmbito da Filosofia.”

(PD)

Quadro 52. Abordagem de assuntos relacionados com a Ciência (nP=8)

Professores entrevistados Categorias

PA PB PC PD PE PF PG PH

O tema não está explicito __ __ __ __ __ A. Nunca falei

O tema tem mais a ver com a Filosofia __ __ __ __ __ __ __ O método científico __ __ __ __ __

Sobre Relação da Ciência com a Sociedade __ __ __ __ __ __ __ No 7ºano, no início __ __ __ __ __ __ __ No 8ºano __ __ __ __ __ __

B. Falei

Quando

No 9ºano, em Química e Sociedade __ __ __ __ __ __ __

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

219

Quatro professores referem já ter falado no assunto Ciência em três momentos

diferentes. Três professores referem ter falado apenas do método científico, reduzindo a

Ciência ao método científico:

“Ciência, ciência não. Mas falei do método científico, dos passos e quando falei na química associei às

outras ciências, daí a importância dela.” (PF) “Sim, normalmente no 8ºano uma vez que era iniciação. Este ano já dei no 7ºano, embora eles já

tenham Ciências Naturais desde o 5ºano. Já sabem o que é o método experimental já fizeram uma ou

outra experiência. Já estão um bocadinho por dentro do que a ciência estuda.” (PA) “Sim, nós, quando abordamos a introdução da disciplina falamos um pouco com eles, no método

científico, sobre a ciência.” (PE)

A professora PC menciona ter abordado o assunto Ciência na sala de aula a

propósito das ligações da Ciência com a Sociedade: “Sim e isso concretamente no programa do 9ºano de Química, há uma área científica que é Ciência e

Sociedade.“ (PC)

No quadro 53 estão as respostas dadas à mesma questão pelos alunos,

agrupadas em duas categorias, cada uma das quais correspondendo a um contexto

formal (sala de aula) e informal (comunicação social) em que o assunto Ciência terá

sido abordado.

A maioria dos alunos (cinco) menciona que já abordou/discutiu o conceito

Ciência num contexto formal, dividindo-se, no entanto, na disciplina onde o assunto foi

tratado. Desta forma, quatro alunos referem que falaram da Ciência na disciplina de

Ciências:

“Na aula de Ciências, não directamente, mas sim.” (AD)

Quadro 53. Origem do conhecimento dos alunos sobre o assunto Ciência (nA=8)

Alunos entrevistados Categorias

AA AB AC AD AE AF AG AH

Na disciplina de Ciências __ __ __ __

Na disciplina de C.F.Q. __ __ __ __ __ __ A Na sala de aula

Nas aulas de Português e Inglês __ __ __ __ __ __ __

B. Em diversos meios de comunicação __ __ __ __ __

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

220

“Na de Ciências da Natureza. Há sempre aqueles instrumentos de trabalho e com o estudo descobriram-

se os outros.” (AF) “No 7ºano, na aula de Ciências Naturais.” (AG) “ (...) a Ciências Naturais, no 8ºano,...serve para estudar, tentar arranjar explicações ou esclarecer-nos

sobre certos acontecimentos.”(AH)

Dois alunos (AB e AH) referem que ouviram falar deste conceito na aula de

Ciências Físico-Químicas:

“Em Ciências Físico-Químicas.” (AB) “Em Ciências Físico-Químicas, no 8ºano, na componente da Química.” (AH)

O aluno AF, para além de ter ouvido falar de Ciência nas aulas de Ciências,

assume que discutiu o conceito de Ciência na aula de Português e de Inglês: “Nas aulas é

mais aquela coisa dos telemóveis não sei quê, foi a “Ciência” que descobriu. Na aula de Português e de Inglês. Nos

textos vem sempre alguma coisa relacionada com a ciência.” (AF)

Três alunos (AB, AE e AG) referem ter ouvido falar de Ciência fora da escola,

nomeadamente em diversos meios de comunicação:

“ (...) de casa, da televisão.” (AB) “ (...) da televisão. Essencialmente da televisão.” (AE) “Da televisão, dos mass média, do meio exterior.” (AG)

Curioso é o facto dos alunos AA e AC, apesar de nunca terem abordado este

tema na sala de aula, referirem que a ideia que têm da Ciência não teve influências do

meio exterior, uma vez que nunca tinham reflectido sobre essa questão:

“Saiu-me agora, nunca tinha pensado nisso.” (AA) “Nunca pensei o que achava de Ciência.” (AC)

Ao solicitar às investigadoras e aos alunos para confrontarem a sua opinião da

Ciência com a que é emanada do excerto, os mesmos admitem, por unanimidade, que a

ideia da Ciência que têm não corresponde à que é veiculada pelo excerto (quadro 54).

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

221

No entanto, a investigadora IA e dois alunos (AD e AG) admitem que, eventualmente,

poderão encontrar alguma relação entre as duas ideias de Ciência.

A investigadora IA afirma que a única semelhança que consegue encontrar é

que a Ciência também faz previsões:

“A ciência consegue fazer previsões em termos de futuro. ...estas previsões são feitas com base na

análise de situações, base de estudos rigorosos. Por outro lado é bom que as pessoas acreditem na

ciência, a ciência tem a capacidade de prever, mas não prevê banalidades.” (IA)

Dois alunos (AD e AG) admitem existir uma semelhança entre a Ciência e a

afirmação da personagem, dado que a Ciência, tal como refere a personagem, ajuda as

pessoas:

“O que está no excerto é que esta pessoa gostava de ajudar as pessoas e acho que tem o sentido de um

médico.” (AD)

“Para mim acho que a ciência pode ajudar na saúde e pode ajudar em várias coisas [...] Porque está a

ajudar.” (AG)

O consenso existente entre os alunos e as investigadoras, em relação ao facto

de o que a personagem diz não ser Ciência, assenta na opinião que a Ciência tem a ver

com cálculos e experiências rigorosas e não com previsões de tipo adivinhação:

“A ciência é mais complexa do que o homem está a dizer, são precisos cálculos, são precisas

observações por meio de telescópios.” (AB) “Penso que a ciência dele se deve à sua inteligência. A ciência tem as suas experiências.” (AC) “Para obtermos ciência temos que experimentar algo. Não é só adivinhar, é experimentar. Sem

experimentar não obtemos resultados. A ciência dele é adivinhar as coisas, para mim é experimentar. A

ciência está na experimentação de muitas coisas. Ninguém pode dizer uma coisa de que não tenha

certeza.” (AF)

Quadro 54. Opiniões dos alunos e das investigadoras acerca da imagem de Ciência veiculada pela figura 3

Grupos entrevistados

Categorias

Alunos

(nA=8)

Investigadoras

(nI=3)

A ciência consegue fazer previsões ___ IA A. Concorda

A ciência ajuda a comunidade AD, AG ___

B. Não concorda O tipo de previsões efectuadas não é científico Todos Todas

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

222

“A ciência, para a sociedade, será útil enquanto nos ajudar a resolver problemas actuais e a prever

questões de futuro. Não é a viajar de um lado para o outro que as pessoas têm essas previsões científicas.

As pessoas têm de ler! É todo o método científico que está ligado à ciência e que não é visível. Faz parte

a análise, a observação, o registo, as hipóteses, a elaboração da hipótese (...). ” (IA)

“Ciência é um acumular de factos, com uma explicação, isto não, não tem nada de científico. A ciência

baseia-se em factos e hipóteses para chegar ao conhecimento.” (IB) “Ciência, de uma forma geral, não se adivinha. Não se diz como aconteceu no ano passado, agora vem

assim, em ciência têm de se fazer testes, estatísticas, uma recolha de dados, uma análise, uma

interpretação, uma comparação com outros cientistas que também fizeram/desenvolveram esses testes. A

ciência é uma dúvida constante (...).” (IC)

Foi também um dos objectivos da entrevista conhecer se a figura 3 ia de

encontro ao modo de pensar dos alunos entrevistados acerca da Ciência (quadro 55).

À excepção dos alunos AD e AG, todos os outros mencionaram que a Ciência,

na sua óptica, tem características/qualidades diferentes das contidas no excerto 3:

“Não está alterada. Fica na mesma. A ciência é o que o homem estuda.” (AA) “Não estou de acordo com isto. Não estou de acordo com estes mitos. A ciência tem as suas ideias.”

(AC) “Acho que não; tenho as minhas ideias. A meu ver é assim; a ciência arranja sempre uma explicação

lógica para as coisas que acontecem.” (AH)

Somente dois alunos (AD e AG) referem que o excerto vem confirmar a suas

ideias acerca da Ciência. Explicitam-no, do seguinte modo:

Quadro 55. Razões da concordância entre a mensagem que os alunos pensam ser transmitida pela figura 3 e os

seus conhecimentos prévios

(nA=8) Alunos

Categorias AA AB AC AD AE AF AG AH

A. Sim __ __ __ __ __ __

A Ciência é o que o homem estuda __ __ __ __ __ __ A Ciência tem as suas ideais /explicação lógica __ __ __ __ __ B. Não

A Ciência é experimentação __ __ __ __ __ __ __ C. Não sabe __ __ __ __ __ __ __ __

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

223

“Aquilo que eu tenho ideia é o que está aqui. É que há pessoas que estão doentes e deviam ser

ajudadas.” (AD) “Ficou confirmada. Essa “Ciência” de que fala são as Ciências Naturais.”(AG)

Deste modo, apesar de terem ido contra o seu conhecimento prévio acerca do

assunto, os alunos não o fazem da melhor maneira, ou seja, não utilizam argumentos

concordantes com as ideias aceites pela comunidade científica sobre a natureza da

Ciência de acordo com Mc Comas (1998).

Os comentários dos professores, a algumas opiniões do tipo “A ciência dele é

adivinhar as coisas. Para mim é experimentar. A ciência está na experimentação de muitas coisas. Ninguém pode

dizer uma coisa de que não tenha certeza. Adivinhar é ao calhas”, emitidas pelos alunos entrevistados

acerca do excerto, assentam em quatro razões (quadro 56).

A opinião emitida por mais professores (quatro) é que os alunos associam

muito a Ciência à experimentação:

“Lá está, eles relacionam muito a ciência com a experimentação e com as experiências... isto é um

bocado na linha do que eu pensaria que eles respondessem.” (PA) “ (...) tinha a consciência de que a ciência se vai construindo, do que é a ciência, refere a

experimentação.”(PE) “Lá está, eles já associam o método científico à experimentação.” (PG) “Lá está, é aquilo que eles fazem. É a experiência. Eles associam a ciência às experiências e mais

nada.” (PH)

Quadro 56. Comentários dos professores sobre as interpretações dos alunos acerca da figura 3. (nP=8)

Professores entrevistados Categorias

PA PB PC PD PE PF PG PH

A. Têm uma visão limitada da “Ciência” __ __ __ __ __ __ __

B. Reconhecem a contradição entre “Ciência” (no contexto do excerto) e “Ciência” __ __ __ __ __ __

C. Fazem uma forte associação entre a “Ciência” e a “experimentação” __ __ __ __

D. Têm uma visão “correcta” do que é a “Ciência” __ __ __ __ __

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

224

O segundo comentário, enunciado por três professores (PD, PE e PF), está

relacionado com o facto de os alunos apresentarem uma noção “correcta” da Ciência:

“Ele até tem uma visão mais ou menos correcta sobre o assunto” (PD) “ (...) refere a ideia do método científico, realmente já tem uma ideia mais clara da ciência do que a que

se pressupõe da figura” (PE) “Sei que têm uma noção sobre o que é a ciência e como é que ela funciona” (PF)

A terceira opinião, referida pelos professores PB e PE; é que os alunos

conseguiram detectar a contradição entre a Ciência, no contexto do excerto, e a Ciência

de Investigação:

“Eu acho que ele aqui conseguiu perfeitamente distinguir a situação da figura da definição, digamos

assim, da ciência, consegue separar os dois mundos.” (PB) “No fundo este aluno apercebeu-se da contradição já que a ciência teria a ver com um processo

progressivo e que normalmente tem a contradição...” (PE)

A professora PC constata que as opiniões transmitidas pelos alunos acerca da

Ciência ficam aquém do esperado para alunos desse ano de escolaridade, afirmando “A

“Ciência” não é só isto, é algo mais. Pressupõe até que um aluno do 9º ano já teria obrigação de não dar uma

resposta desta. No mínimo, no 8ºano, com certeza que fez a abordagem e reflectiu acerca do método científico.”

(PC)

O assunto Ciência não fez parte, explicitamente, do currículo de Ciências do

3º Ciclo do Ensino Básico vigente em 2001/2002 e, portanto, foi um assunto deixado

um pouco à margem do ensino, sendo abordado apenas quando se proporcionou e

somente por quatro dos professores entrevistados. Com uma geração de professores que

tem, muitas das vezes, concepções de Ciência assentes em alguns dos mitos que são

referidos no capítulo 2, é compreensível que a maioria dos alunos entrevistados tenha

salientado as suas divergências em relação ao conceito de Ciência apresentado na figura

3, argumentando que, para eles, a Ciência é experimentação ou que a Ciência está

confinada ao método científico. Para isso contribui também a exagerada importância

que os professores entrevistados deram ao método científico, esquecendo-se que, em

Ciência, existem várias metodologias para levar a cabo o trabalho científico.

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

225

Este carácter redutor apresentado pelos alunos sobre a Ciência e a escassa

discussão do que é a Ciência, num contexto formal, deixa os alunos completamente

desprotegidos e incapazes de terem uma argumentação fundamentada acerca de

qualquer assunto que envolva a Ciência, os seus métodos, os seus processos e as suas

interacções com a sociedade em que vivemos.

D- Análise das figuras 4 e 5

No que respeita às figuras 4 e 5, os alunos, professores e investigadoras

referiram a sua opinião acerca do que elas representam. As interpretações foram

múltiplas, conforme se mostra no quadro 57.

Seis entrevistados (dois alunos- AD e AE, dois professores- PA e PE e duas

investigadoras- IA e IC) admitem que a sequência das figuras lhes transmite a ideia de

uma explosão, como se ilustra de seguida:

“É um senhor que está a fazer uma mistura qualquer e que deu uma grande explosão.” (AE)

“Juntar uma coisa à outra e resultar numa explosão.” (PA) “Um caldeirão que já fumega e que se deita umas gotas e se dá uma explosão.” (IA)

Quatro professores e dois alunos (AA e AC) consideram que as figuras lhes

sugerem uma reacção química:

“Foi uma coisa que ele andava a fazer mas não sabia que ia acontecer aquilo [...] que dava esta

reacção.” (AA)

Quadro 57. Interpretação das figuras 4 e 5 pelos entrevistados

Grupos entrevistados

Categorias

Alunos

(nA=8)

Professores

(nP=8)

Investigadoras

(nI=3)

A. Explosão AD, AE PA, PE IA, IC

B. Reacção química AA, AC PB, PC, PF, PH ___

C. Alquimia ___ ___ IB

D. Mágico AB, AH PG ___

E. Outras interpretações AF, AG PD ___

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

226

“Estou a vê-lo ali deitar algo no estado líquido e considero estar a haver uma reacção.” (PC)

“Aqui é uma transformação química de certeza absoluta. Não sei qual é mas reagiu bem, reagiu!” (PH)

Dois alunos (AB e AH) e o professor PG referem que as figuras lhes

transmitem a ideia de magia:

“(...) parece ser um mágico.” (AH)

“Estas imagens dão logo assim a ideia de magia.” (PG)

A investigadora IB refere que as imagens lhe sugerem a Alquimia, “Acho que é a

ideia do que foi a Alquimia há uns anos atrás.” (IB)

Em Outras interpretações estão contidas três respostas cada uma delas

apresentadas por únicos sujeitos, como se descreve a seguir:

- o aluno AF diz que as figuras lhe sugerem um aspirante a cientista: “Este homem queria ser um cientista e não sabia como” (AF) - o aluno AG considera os excertos hilariantes, não acreditando na informação

que veiculam:

“Isto também é só para rir.” (AG)

- o professor PD refere que as figuras lhe dão a ideia de um cozinhado:

“Isto é um cozinhado. Tenho umas vagas reminiscências de estar a falar disso e que isto não é

química, é um cozinhado.” (PD)

As opiniões dos alunos, professores e investigadoras, sobre o acontecimento

descrito pela sequência das figuras 4 e 5, dividem-se em duas categorias: real e ficção

(quadro 58).

Quadro 58. Opiniões dos entrevistados acerca da veracidade da abordagem da problemática do excerto 4

Grupos entrevistados

Categorias

Alunos

(nA=8)

Professores

(nP=8)

Investigadoras

(nI=3)

Poderá ter acontecido há alguns anos atrás ___ PG IA, IB A. Real

Pode acontecer no dia a dia AA, AC PB, PC, PF, PH IC

É fantasia AE PE ___ B. Ficção

Não corresponde à forma de trabalhar de um cientista AD, AF, AG, AH PA, PD ___

C. Outra resposta AB ___ ___

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

227

A maioria dos entrevistados (todas as investigadoras, cinco professores e dois

alunos) considera que o excerto traduz um acontecimento real, ou seja, que já

correspondeu à realidade. A razão principal desta opinião tem a ver com o facto de:

- acreditarem que o que consta das figuras poder acontecer no dia-a-dia:

“Eu já vi pessoas que estão a fazer experiências e aquilo começou a encher, encher e provocou uma

explosão. Quando as pessoas não sabem o que estão a fazer pode acontecer” (AA)

“Por vezes pode acontecer misturar uma coisa com outra. Mas às vezes controlamos as explosões que

queremos” (PB) “Pode acontecer uma explosão” (PF)

“Pode, isto pode nos acontecer com uma panela e pode explodir”. (IC)

Duas investigadoras (IA e IB) e um professor (PG) apresentam que:

- há uns anos atrás, o excerto poderia ter evidenciado uma situação real:

“Mas no início da Química, nos primórdios, na Alquimia, as reacções eram capazes de ser feitas em

caldeirões destes, num céu aberto... não usa qualquer roupa adequada, não usa óculos, não usa nada,

poderia ter acontecido isto. Existem substâncias que podem ser misturadas e podem ter reacções

bombásticas como esta” (IA) “Real, há muitos talvez muitos anos atrás” (IB) “Porque noutros tempos implica realidade.” (PG)

Para a maioria dos alunos (cinco) e três professores (PE, PA e PD) o

acontecimento traduz uma situação fictícia. A razão de ser desta opinião, mencionada

por mais elementos, está relacionada com o facto de alguns entrevistados assumirem

que o cientista não trabalha dessa forma:

“(...) porque um cientista não era capaz de fazer estas coisas na panela.”(AD) “Como eu nunca vi fazer isto, o que ele está a fazer, para mim é ficção.” (AH) “É um bocadinho de ficção, na medida em que nem sempre isto acontece.” (PA)

A razão avançada pelos restantes sujeitos tem a ver com o facto de

considerarem que as figuras e os seus actos transparecem fantasia:

“Porque parece-me um bruxo e só existe na fantasia.” (AE)

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

228

“Porque passa um bocado a ideia de que um pózinho de pirlinpim pim que conseguimos um grande

efeito, algo muito viscoso e uma grande transformação e as coisas não se processam bem assim, com

uma ligeireza.” (PE)

Em Outra resposta está um aluno (AB) que manifestou dúvidas e não se

conseguiu decidir quanto à realidade/ficção subjacente ao excerto, considerando,

contudo, que o excerto traduzia um facto histórico, o que, na nossa opinião, evidencia

uma confusão estórias de B.D. e História:

“(...) isto é muito mais antigo que um cientista contemporâneo. Não sei, porque nunca vi nenhum

cientista na idade média, mas como isto é história só deve aparecer em histórias.” (AB).

Solicitámos aos professores entrevistados que previssem se um aluno do 9ºano

reconheceria nas figuras 4 e 5 um cientista (quadro 59).

A este propósito, a quase totalidade dos professores (seis) augura que um

aluno não reconheceria um cientista nas figuras 4 e 5, sendo avançadas três razões

fundamentais. A primeira (enunciada por seis professores) tem a ver com o facto de

considerarem que as figuras não traduzem cabalmente o modo como os cientistas

trabalham, tendo em conta que a personagem da figura 4 não está num laboratório e não

está rodeada pelo material que, supostamente, o caracteriza:

“ (...) porque não tem ali provetas para medir, balanças para pesar...eles acham que um cientista está

no laboratório.” (PD) “Por causa do material. Acho que não ia associar esta figura à do cientista. Mas principalmente por ter

um caldeirão. Por estar a juntar duas substâncias num caldeirão.” (PG) “ (...) pelo modo de trabalhar, não.” (PH)

Quadro 59. Previsão efectuada pelos professores acerca da interpretação das figuras 4 e 5 por alunos do 9ºano (nP=8)

Professores entrevistados Categorias

PA PB PC PD PE PF PG PH

A. Reconhecem Está a fazer experiências (explosões) __ __ __ __ __

Um cientista não trabalha dessa forma/neste ambiente __ __

Não obedece às regras de segurança __ __ __ __ __ B. Não

Reconhecem A imagem/vestuário não corresponde ao do cientista __ __ __ __ __

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

229

Outra razão, indicada por três professores (PD, PE e PF), é que os alunos

diriam que a personagem que consta das figuras 4 e 5 não está a respeitar as regras de

segurança, imprescindíveis na profissão em causa:

“ (...) não tinha ali segurança nenhuma. O druida está a trabalhar sem qualquer tipo de protecção, não

tem os olhos protegidos...” (PD) “ (...) há cuidados elementares de questão de segurança.”(PE)

Três professores (PE, PF e PH) salientam que o modo de vestir/imagem da

personagem, apresentada na sequência das figuras 4 e 5, não ajudaria no

reconhecimento de um cientista, talvez porque, como refere o professor PF, o Cientista

é uma pessoa séria:

“Para já a imagem de um cientista é uma figura muito séria, e não uma figura de animação” (PF) “ (...) pelo modo de vestir, não”(PH)

No entanto, três professores (PB, PC e PH) pensam que um aluno do 9ºano

diria que as figuras 4 e 5 representariam um cientista, uma vez que está a fazer

experiências/explosões:

“Lá está. Se não levasse a figura à letra poderia fazer uma associação perfeita entre esta imagem e o

cientista. Porque a situação acaba por ser idêntica. A misturar reagentes, a ver o que é que lá está”

(PB) “ (...) eu penso que sim [...] é que em qualquer sitio se pode fazer experiência” (PC) “No ano passado, na semana cultural, nós passámos um filme que era o jovem Einstein e eles deliraram

com o filme. Aquilo era só experiências explosivas e mais nada. E eles associam muito o cientista a

essas coisas” (PH)

De notar que para o professor PH existem nestas figuras elementos que, por

um lado, levariam os alunos a “ver” um Cientista e outros que os levariam a não

considerar a existência de um Cientista.

À excepção do professor PE, todos os outros mencionaram já ter discutido o

assunto O Cientista (quadro 60) nas suas aulas de C.F.Q.- componente de Química.

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

230

Quatro professores admitem tê-lo feito apenas quando leccionaram o método

científico, como se ilustra de seguida:

“Somente no 8ºano se abordam esses assuntos, mas só na introdução. Fala-se no método científico e nos

vários passos.” (PG) “ (...) quando é no tal método científico quando digo a maneira como o cientista trabalha.”(PH)

Três professores (PA, PB e PC) falam dos cientistas na sala de aula, e mais

concretamente sobre o trabalho destes, realçando o seu lado de executantes de

experiências:

“Às vezes até tenho por hábito passar um filme que é de uma escola secundária que mostra alunos a

trabalhar e a demonstrar como é que trabalham. Nesse aspecto acho que lhes passo a mensagem

embora o trabalho de um cientista seja tão vasto em termos de investigação e tudo e que muitas vezes

não se cinge ao laboratório. Realmente associam muito o cientista a trabalhar no laboratório.

Relativamente a outro tipo de investigação nunca falei.” (PA) “O que é que faz. Abordei o tema mas, não estive a defini-lo. Falei normalmente nos processos e mais

para a frente falamos na história da química e eu vou abordar.” (PB)

“É assim, até colaborei com os alunos da escola onde eu com exposições por exemplo, acerca de quem

inventou o post-it, lembro-me que tinha diversas curiosidades e chamava-se ciência ao acaso e falava

em muitas experiências.” (PC)

No que concerne ao acontecimento traduzido pelas figuras 4 e 5 poder ou não

representar a vivência de um Cientista, a maioria dos alunos tem dúvidas. Apenas dois

alunos (AA e AH) e todas as investigadoras admitem que o que observam não traduz

Quadro 60. Abordagem de assuntos relacionados com o Cientista (nP=8)

Professores entrevistados Categorias

PA PB PC PD PE PF PG PH

Quanto ao modo de trabalho __ __ __ __ __ A. Sim

Em relação com o método científico __ __ __ __

B. Não Necessidade de cumprir o programa __ __ __ __ __ __ __

Quadro 61. Opiniões dos entrevistados acerca das figura 4 e 5 não representarem a vivência de um Cientista

Grupos entrevistados

Categorias

Alunos

(nA=8)

Investigadoras

(nI=3)

Está vestido de branco AD, AG ___

Está a fazer experiências/explosões AB, AC, AE, AF, AG ___ A. Traduz

Aspecto de cientista AG ___

Não respeita as normas de segurança AA, AB, AC, AD, AF, AG, AH IB, IC

O cientista actualmente não trabalha dessa forma AE, AC, AF, AG, AH IA B. Não traduz

Não tem aspecto/vestuário de cientista AC, AE, AH ___

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

231

um Cientista da actualidade, indicando duas ou três justificações para o facto,

respectivamente (quadro 61). Seis alunos referem elementos das figuras que os levam a

“ver” um cientista, mas o não respeito da personagem da figura 4 pelas regras de

segurança e a aparência do personagem da figura 4 leva-os a admitir que o excerto não

traduz um Cientista (quadro 61).

Pelo não reconhecimento de um Cientista na sequência das figuras estão

razões como:

- falta de respeito pelas normas de segurança, indicada por sete alunos e duas

investigadoras (IB e IC):

“Porque não trabalha assim. Trabalha com protecções, óculos, luvas, batas” (AB) “Este não tem segurança nenhuma! Pôs lá um liquido e não sabe o que vai acontecer. O cientista não.

Já fez estudos com pormenores e tudo. Já tem aquela coisa que sabe que não vai haver perigo” (AG)

“Não, por várias coisas, por causa das regras de segurança, os cuidados a ter, o manuseamento do

material, o cuidado que se deve ter com explosões, o manuseamento das substâncias explosivas e porque

pode contaminar o meio ambiente.” (IB) “Porque os cientistas têm de ter regras de segurança, tem que ler os riscos do reagentes e por aí fora, e

não ia fazer nada que desse uma explosão e que pusesse em perigo o laboratório, ou nós próprios [...] o

cientista nem sequer usa bata, não tem óculos de segurança (...) ” (IC)

- o Cientista não trabalhar da forma que está indicada nas figuras, referindo-se

basicamente ao facto de não estar num laboratório com o material de vidro

usual, indicado por cinco alunos e uma investigadora (IA):

“O Cientista trabalha num laboratório. Trabalha com as coisas que lhe fazem dúvidas...” (AC)

“Ele não me parece um cientista, porque tem um espaço ao ar livre, um caldeirão, e não está vestido de

uma maneira normal, pode estar para ser um cientista, só que não tem aqueles instrumentos, que eu

compreendo, que os cientistas usem.” (AH) “(...) o cientista actual é uma pessoa normal veste a bata e vai , ou não, para o laboratório, a ciência

hoje em dia passa muito pela leitura (porque é com base não só nas conclusões do que se passa no

laboratório mas, também pelo que se passa nos outros sítios), se ele estivesse a ler ou agarrado a um

computador ninguém diria que é um cientista.” (IA)

- não ter aspecto/vestuário de um cientista:

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

232

“Batinha branca, idealizamos sempre um cientista de batinha branca, com óculos de intelectual.” (AC)

“Não estou propriamente a ver este senhor a ser um cientista, com uma barba destas... talvez por causa

do vestuário.” (AE)

As razões que levam seis alunos a considerar que as figuras 4 e 5 traduzem um

Cientista devem-se ao facto da personagem incluída na figura 4:

- estar a fazer experiências/explosões:

“As ideias que nós temos que as experiências correm mal” (AC)

“Acho semelhante esse pózinho, essa explosão por causa dos filmes” (AE)

- estar vestida de branco:

“Porque está vestido de branco” (AD) “É o facto dele estar de bata branca” (AG)

- ser “careca”:

“É o facto de ele ser careca” (AG).

Os alunos foram questionados sobre a origem da informação que têm acerca

do Cientista (quadro 62).

Pela análise do quadro 62, verifica-se que a totalidade dos alunos revela uma

imagem do cientista influenciada por diversos meios de comunicação:

“Pelos livros (também lá tenho livros de Astérix), filmes de ficção científica, por ex: naquela viagem ao

futuro de Júlio Verne, esse cientista de batinha branca, de óculinhos, cabelo branco volumoso, com cara

de maluco ou coisa parecida”(AC)

Quadro 62. Origem do conhecimento dos alunos sobre o assunto Cientista (nA=8)

Alunos entrevistados

Categorias AA AB AC AD AE AF AG AH

C. F.Q. __ __ __ __ __ A Na sala de aula

História __ __ __ __ __ __ __

B. Em diversos meios de comunicação

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

233

“Vem de filmes e também de desenhos animados. Desenhos animados que passavam na televisão, em

que o rapazinho tinha um grande laboratório, e tinha assim uma bata branca, por acaso vem-me um

bocado a ideia daí. Era um rapazinho, baixinho, tinha uns óculos e costumava usar uma bata branca”

(AE) “Basicamente dos filmes” (AG)

Apenas três alunos (AF, AG e AH) mencionam que o Cientista foi um tema

abordado na sala de aula, tendo três alunos especificado que foi na aula de C.F.Q. e um

deles referido também a aula de História:

“Na disciplina de C.F.Q e na disciplina de História.” (AG) “Na sala de aula foi das experiências que fiz em C.F.Q.” (AH)

Os alunos foram questionados sobre a relação deste excerto com as suas

concepções sobre os Cientistas, isto é, se de alguma forma estas figuras eram diferentes

da sua opinião ou se, pelo contrário eram concordantes com as suas ideias (quadro 63).

A maioria dos alunos (seis) respondeu que a figura é discordante com o seu

modo de pensar, uma vez que a ideia/imagem que detêm sobre os cientistas é

contraditória com as informações veiculadas pelas figuras 4 e 5, avançando razões

concordantes com os argumentos avançados pelos alunos no sentido da personagem da

figura 4 não traduzir um Cientista (ver quadro 61):

- o facto de não ter vestuário/aspecto/material que, no entender dos alunos,

caracteriza o Cientista:

Quadro 63. Razões da concordância entre a mensagem que os alunos pensam ser transmitida pelas figuras 4 e 5 e

os seus conhecimentos prévios

(nA=8) Alunos entrevistados

Categorias AA AB AC AD AE AF AG AH

Devido à explosão __ __ __ __ __ __ __A. Sim Devido ao aspecto __ __ __ __ __ __ __

Devido ao aspecto/vestuário/material da personagem __ __ __ __ B. Não Devido às questões de segurança __ __

C. Não sabe __ __ __ __ __ __ __ __

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

234

“Não. O cientista nunca faz experiências com um jarro tão grande. Faz mais com outros instrumentos”

(AA)

- falta de respeito da personagem pelas normas de segurança:

“Acho que a minha ideia do cientista, para mim, é uma pessoa que deve ter cuidados que este senhor do

excerto não tem” (AD)

Contudo, dois alunos (AE e AG) referiram que o excerto ia ao encontro da

ideia/imagem idealizada de um Cientista, uma vez que, para estes, a explosão e o

aspecto do Cientista está de acordo com a sua concepção do Cientista:

“Nos bonecos normalmente há sempre aquelas explosões. Parece- me um bocado aquele propósito”

(AE) “Confirmar. Porque não trouxe nada de novo. Se este cientista estivesse no laboratório e com aquelas

garrafas com líquidos e tudo já vinha modificar. Aí, já pensava que ele não era maluco.” (AG)

Levados a comentar as opiniões de alunos entrevistados acerca da

interpretação das figuras 4 e 5, “ Acho que os cientistas não trabalham em caldeirões destes. Não estou

propriamente a ver este senhor a ser um cientista, com uma barba destas, talvez também por causa do vestuário.

Também por ser ao ar livre.”, os professores apresentaram três ideias-chave (quadro 64).

A maioria dos professores (cinco) refere que os alunos têm uma concepção do

Cientista parcialmente inadequada, sendo as aulas de Ciências Físico-Químicas

responsáveis directos ou indirectos, pela inadequação dessa imagem:

“Pois, vai um bocadinho de acordo àquilo que nós dizemos, o tipo de material, a bata, o dever ter o

cabelo apanhado, aqui fala um bocado da barba, o vestuário e o ar livre...eles consideram que o

laboratório é um espaço fechado... Estão sempre a ver isso e se calhar nunca pensaram que, por

Quadro 64. Comentários dos professores sobre as interpretações dos alunos acerca das figuras 4 e 5 (nP=8)

Professores entrevistados Categorias

PA PB PC PD PE PF PG PH

A. Têm uma imagem estereotipada acerca dos cientistas __ __ __ __ __ __

B. Têm uma imagem parcialmente inadequada __ __ __

C. Têm uma imagem correcta __ __ __ __ __ __ __

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

235

exemplo, um botânico ou outro investigador tem mesmo de trabalhar ao ar livre. Nunca lhes passei essa

mensagem, é curioso.” (PA) “Ele valorizou a questão do ar livre, eles devem ter a ideia de que realmente os cientistas trabalham nos

laboratórios, fechados nas salas. Porque eu penso que eles já aprenderam alguma coisa, o uso da bata,

porque nós dizemos que eles devem estar de cabelo apanhado.” (PE) “Porque lá está, como eles trabalham no caso da Física e da Química no laboratório é natural que eles

reconheçam a ciência só no laboratório e mais nada. A questão do ar livre é pertinente, mas lá está, isto

só se associa porque eles fazem experiências no laboratório.” (PH)

Dois professores (PB e PC) afirmam que os alunos têm uma ideia ou imagem

estereotipada do Cientista não especulando sobre a origem das mesmas:

“Lá está, eles aqui tentaram associar esta imagem, decalcar esta imagem à imagem de um cientista que

eles têm.” (PB) “Esta ideia surge de uma imagem de marca, estereotipada.” (PC)

O professor PF admite que os alunos têm uma ideia “correcta” do que é um

Cientista, o que significa que o próprio professor valoriza aspectos da imagem do

Cientista um pouco desadequados e diferentes dos que deveriam ser incutidos na sala de

aula:

“Acho que é uma imagem correcta terem uma noção de facto como é que os cientistas trabalham.” (PF)

Enquanto que as investigadoras são peremptórias ao afirmar que a personagem

das figuras 4 e 5 não pode, por vários motivos, assemelhar-se à imagem de um

Cientista, os alunos demonstram ainda algumas reminiscências da imagem estereotipada

de um Cientista (com alguns estereótipos referidos em 2.4), provavelmente veiculada

por fontes informais e até mesmo reforçada por práticas explícitas e por omissão em

sala de aula.

Verifica-se que o assunto Cientista é pouco referido pelos professores

entrevistados, na sala de aula, parecendo a sua importância estar reduzida ao facto de

serem pessoas que põem em prática o método cientifico. Os alunos referem obter

informações sobre os Cientistas sobretudo a partir de fontes informais (apenas 2 dos

alunos entrevistados mencionam ter falado de Cientistas nas aulas de Ciências). Este

assunto é demasiado sério para ficar à mercê exclusiva dos meios exteriores à escola.

Esta deve responsabilizar-se por uma abordagem séria e credível de assuntos

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

236

relacionados com a natureza da Ciência, a fim de criar imagens do Cientista livre de

estereótipos e de fazer com que os alunos pensem que ser Cientista está ao alcance de

todos os que tiverem condições de trabalhar para esse fim e não só de génios ou de

pessoas brilhantes.

Em jeito de conclusão, pode afirmar-se que na análise das duas primeiras

figuras de B.D. centradas em assuntos de Química, os alunos entrevistados, de uma

forma geral:

- não adoptaram uma posição crítica face ao que os excertos veiculavam,

acatando a informação transmitida pelas personagens de B.D. em causa,

posição esta que contrasta com a posição tomada pelas investigadoras. É

de notar que no primeiro caso e apesar de os alunos afirmarem estar

familiarizados com o vocabulário da temática formal Camada de Ozono,

revelaram não ser cientificamente alfabetizados, de modo a adoptarem

uma posição crítica perante os excertos de B.D. e a interpretar

adequadamente a mensagem por eles veiculada.

Quanto à análise dos outros dois excertos de B.D. relacionados com a natureza

da Ciência e com a imagem do Cientista, os alunos entrevistados, de uma forma geral:

- não identificam a imagem Ciência veiculada pela figura 3, com as imagens

que perfilham deste assunto, adoptando assim uma posição semelhante das

investigadoras entrevistadas. Contudo, os argumentos que utilizam deixam

transparecer que os mesmos alunos têm uma visão muito redutora da Ciência,

associando-a fortemente à experimentação. A causa desse facto pode ser

imputada à pouca importância atribuída pelos professores a este assunto nos

processos de ensino e de aprendizagem das Ciências, pois, de um modo geral,

referem só ter falado no método científico, o que limita muito a abordagem de

um assunto que tem uma grande importância na formação científica dos

cidadãos;

Capítulo 4- Apresentação e Discussão dos Resultados

A Química e a imagem da Ciência e dos Cientistas na Banda Desenhada

237

- afirmaram, à semelhança das investigadoras, que as imagens que têm sobre

os Cientistas não é totalmente concordante com a imagem veiculada pelas

figuras 4 e 5. No entanto, a maioria dos alunos encontra algumas semelhanças

entre a personagem apresentada na figura 4 e o Cientista actual, semelhanças

essas que têm a ver com estereótipos identificados em alguns estudos referidos

no capítulo 2 (ponto 2.4).

O assunto Cientista para além de ter sido escassamente abordado ao nível da sala

de aula, foi percepcionado pela maioria dos alunos entrevistados como alguém que faz

experiências ou que segue o método científico. No entanto, a imagem dos Cientistas foi

amplamente veiculada pelos meios de comunicação social, os quais parecem ter

influenciado os alunos entrevistados a este respeito. O problema é que, tal como

referimos no capítulo II (2.4.1), os meios de comunicação social não veiculam imagens

adequadas dos Cientistas e os professores apresentam algumas dificuldades em lidar

com esta temática.