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DAIARA ALLESSI A ABUSIVIDADE E A NULIDADE DA CLÁUSULA DE CARÊNCIA NOS COMPROMISSOS DE COMPRA E VENDA DE UNIDADES IMOBILIÁRIAS Monografia apresentada como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Curso de Direito, Núcleo de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas da Universidade Positivo. Orientadora: Prof a Glenda Gonçalves Gondim CURITIBA 2012

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DAIARA ALLESSI

A ABUSIVIDADE E A NULIDADE DA CLÁUSULA DE CARÊNCIA NOS

COMPROMISSOS DE COMPRA E VENDA DE UNIDADES IMOBILIÁRIAS

Monografia apresentada como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Curso de Direito, Núcleo de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas da Universidade Positivo. Orientadora: Profa Glenda Gonçalves Gondim

CURITIBA

2012

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Dedico esta monografia ao meu amado e tão

querido pai, que é a razão e o motivo de eu

ter chego até aqui. Dedico também, a minha

mãe, que sempre acreditou em mim e esteve

ao meu lado incondicionalmente.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus.

Aos meus amados pais, José e Narciza, pelo amor e carinho incondicionais

despendidos, ciente de que sem o apoio e incentivo deles, jamais teria concluído

esta jornada.

A minha irmã, Daiana, que desde o início deste sonho esteve ao meu lado,

compartilhando comigo seus conhecimentos e me incentivando, sempre, a

prosseguir.

A minha irmã Daniela pelo ombro amigo nos momentos difíceis e por sua

cumplicidade..

Agradeço ainda, a meu namorado, Yuri Felipe, pela compreensão e por seu

carinho, que me fortaleceram e me deram ânimo para continuar.

A minha amiga Glad’s Thays Lecheta que certamente tornou essa jornada

mais leve e mais fácil com sua presença diária.

Ao Profº Eros Belin Cordeiro pela atenção, pelos livros emprestados, que

foram de grande valia, e por suas orientações, as quais foram essenciais para o bom

desenvolvimento deste trabalho.

Agradeço por fim, a minha orientadora Profª Glenda Gonçalves Gondin que

em muito contribuiu para a conclusão desta pesquisa.

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"Por vezes sentimos que aquilo que fazemos

não é senão uma gota de água no mar. Mas

o mar seria menor se lhe faltasse uma gota."

(Madre Teresa de Calcutá).

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SUMÁRIO

RESUMO...................................................................................................................07

1. INTRODUÇÃO................................................................................................08

2. DA INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA.............................................................10

2.1. SURGIMENTO DA INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA NO

BRASIL............................................................................................................10

2.2. ANÁLISE DOUTRINÁRIA DA INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA: CONCEITO E

NATUREZA JURÍDICA....................................................................................12

2.3. OBRIGAÇÕES DO INCORPORADOR............................................................14

3. DO CONTRATO DE INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA..................................19

3.1. DA PROMESSA DE COMPRA E

VENDA.............................................................................................................19

3.2. REGIME JURIDICO DOS CONTRATOS: O DIÁLOGO DAS

FONTES..........................................................................................................23

3.3. DA APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO

CONSUMIDOR................................................................................................26

3.4. AS CLÁUSULAS CONTRATUAIS: CONTRATO DE

ADESÃO..........................................................................................................29

4. A CLÁUSULA DE CARÊNCIA E A PROTEÇÃO DO ADQUIRENTE:

ANÁLISE ACERCA DE SUA ILEGALIDADE.................................................31

4.1. A CLÁUSULA DE CARÊNCIA.........................................................................31

4.2. A CLÁUSULA DE CARÊNCIA E A PROTEÇÃO DOS

ADQUIRENTES...............................................................................................34

4.3. DA NULIDADE DA CLÁUSULA DE CARÊNCIA DIANTE DO

RECONHECIMENTO DE SUA ILEGALIDADE E

ABUSIVIDADE.................................................................................................45

5. AS CONSEQUENCIAS JURIDICAS DO RECONHECIMENTO DA

ILEGALIDADE DA CLÁUSULA DE CARÊNCIA............................................50

5.1. DO DEVER DE INDENIZAR............................................................................50

5.2. A CLÁUSULA DE CARÊNCIA E AS EXCLUDENTES DE

RESPONSABILIDADE CIVIL...........................................................................53

5.2.1. Caso Fortuito e Força Maior............................................................................53

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5.2.2. Teoria do Risco Empresarial...........................................................................60

5.3. DA RESCISÃO CONTRATUAL.......................................................................62

5.4.. DOS DANOS MATERIAIS...............................................................................64

5.4.1. Dos Lucros Cessantes.....................................................................................65

5.4.2. Dos Danos Emergentes..................................................................................69

5.5. DOS DANOS EXTRAPATRIMONIAIS............................................................71

6. CONCLUSÃO..................................................................................................74

REFERÊNCIAS..........................................................................................................76

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RESUMO

Por meio da análise do surgimento da incorporação imobiliária no Brasil, bem como da promulgação da Lei nº. 4.591/1964, a qual regula especificamente tal seara negocial e jurídica pretende-se alcançar os compromissos de compra e venda decorrentes do exercício de tal atividade. A promessa de compra e venda de unidade imobiliária na planta, concretiza a hipótese de obrigação futura, de modo que o incorporador ao alienar as unidades do empreendimento obriga-se essencialmente e cumulativamente a prestação de duas obrigações, de fazer e dar; ou seja, deverá construir o imóvel e ainda, efetuar a entrega das unidades imobiliárias, no prazo avençado. Por sua vez, o adquirente obriga-se a efetuar o adimplemento do preço de sua quota parte do empreendimento. O objeto da presente pesquisa é a análise da legalidade da cláusula de carência constante na grande maioria dos compromissos de compra e venda de unidades imobiliárias na planta, a qual é responsável por proporcionar ao incorporador a possibilidade de postergação automática do prazo de entrega das unidades imobiliárias. Trata-se de disposição que possibilita prerrogativas e benefícios excessivos ao incorporador, desarmonizando com as demais cláusulas contratuais. O contrato deve ser regido integralmente pela boa-fé e, sobretudo, pelo equilíbrio obrigacional, de modo que haja isonomia nas prestações de ambos os contraentes, sob pena de nulidade da referida cláusula. Palavras-chave: Incorporação Imobiliária; Promessa de Compra e Venda; Cláusula de Carência;

Ilegalidade.

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1. INTRODUÇÃO

A incorporação imobiliária desenvolveu-se abruptamente no século XX,

especialmente após a Revolução Industrial. Com o crescimento dos centros

urbanos, o setor habitacional entrou em colapso, devido a grande demanda.

Pautando-se no exarcebado aumento das relações de consumo, e com a

consequente “massificação contratual”, responsável pela padronização e

uniformização dos instrumentos particulares; visa-se analisar o panorama atual dos

negócios jurídicos de compra e venda de unidades imobiliárias na planta.

A presente pesquisa em consonância aos ditames da Lei nº. 4.591/1964 e

dos princípios protetivos do Código de Defesa do Consumidor, pretende estudar

pormenorizadamente as cláusulas abusivas notadamente com ênfase nas cláusulas

de carência impostas leoninamente nos compromissos de alienação antecipada de

unidades de empreendimentos imobiliários.

Visa-se demonstrar o patente desequilíbrio das relações contratuais havidas

entre o incorporador e o adquirente; o qual na maioria das vezes se dá pela inserção

de cláusulas abusivas nos contratos, as quais representam manifesta desvantagem

ao adquirente-consumidor.

Os contratos de consumo modernamente, em fase preliminar estabelecem

unilateralmente os termos da relação negocial, restringindo consideravelmente a

autonomia da vontade do consumidor e seu poder de tratativas; uma vez que o

mesmo limita-se simplesmente a aderir o contrato.

Portanto, pretende-se firmar o entendimento de que as cláusulas de carência;

objeto do presente estudo são manifestamente abusivas e lesivas ao consumidor;

devendo ser declaradas nulas sob pena de evidente e latente desequilíbrio e

desarmonia contratual.

A cláusula de carência, objeto primordial da presente pesquisa, tem por intuito

a postergação da entrega efetiva da unidade imobiliária, sendo uma prerrogativa

contratual do incorporador, que em caso de atraso, poderá automaticamente

prorrogar o prazo de entrega do empreendimento, por meio da utilização de um

prazo adicional para o cumprimento de sua obrigação; denominado prazo de

carência.

Pretende-se demonstrar cabalmente que o prazo de carência representa

grande desvantagem ao adquirente, que apesar de adimplir pontualmente com sua

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prestação contratual, suportará o ônus do cumprimento em atraso da obrigação de

entrega da unidade imobiliária do incorporador.

A cláusula de carência, portanto, representa uma ardilosa conduta das

incorporadoras que visam livrar-se da responsabilização civil em detrimento de seu

descumprimento contratual; consolidado pela não entrega da unidade imobiliária no

prazo estipulado contratualmente.

Cabe salientar que a dilatação do prazo de entrega, concretiza hipótese de

inadimplemento contratual gerando um ilícito, o qual consequentemente ocasiona ao

credor um dano, surgindo assim, o dever de indenizar.

Intenta-se, portanto, averiguar e preservar o equilíbrio contratual nos

compromissos de compra e venda de coisa futura afetados por cláusulas abusivas

especialmente, a cláusula de carência; de forma que nenhuma das partes

contraentes, em especial, o consumidor, seja compelido a suportar obrigação que

lhe onere ou prejudique.

Os contratos devem ser pautados sob a égide da boa-fé objetiva, a fim de

que seja respeitada a legítima expectativa dos contraentes com o cumprimento do

contrato firmado.

Portanto, a fim de assegurar os direitos protetivos do adquirente de unidades

imobiliárias é que se busca a nulidade das cláusulas de carência, por serem

abusivas e desproporcionais.

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2. DA INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA

2.1. SURGIMENTO E DESENVOLVIMENTO DA INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA

NO BRASIL

O surgimento e desenvolvimento da atividade da incorporação imobiliária no

Brasil ocorreram essencialmente em detrimento dos problemas de ordem

habitacional que eclodiram mundialmente após a Primeira Guerra Mundial.1

A Segunda Guerra Mundial intensificou ainda mais, a necessidade de novas

construções, para solucionar a alta demanda no setor habitacional.

Por sua vez, a Revolução Industrial acentuou ainda mais o crescimento

populacional nas cidades, em face da expansão comercial e industrial; de modo que

a população possuía relevante interesse em firmar moradia nos centros urbanos,

próximo às indústrias e comércios.

Há que se esclarecer que com o gigantismo da esfera imobiliária, os terrenos

bem situados passaram a se tornar escassos e de alto custo; motivo que ocasionou

a edificação de empreendimentos através da sobreposição de unidades imobiliárias

autônomas em um plano horizontal, sendo meio viável e eficiente para solucionar tal

situação.

Verifica-se, através de uma breve retrospectiva histórica, que a atividade da

incorporação imobiliária foi consequência direta do movimento capitalista, o qual

determinou um novo paradigma, marcado essencialmente pelo crescimento das

relações econômicas e comerciais; e também pela acelerada e exacerbada

urbanização das cidades.

Brilhantemente, PEREIRA descreve os primórdios da incorporação imobiliária

no Brasil, da seguinte forma:

Um indivíduo procurava o proprietário de um terreno bem situado e lhe propunha construir um prédio sobre o mesmo. Obtendo, assim, a anuência do proprietário do terreno, este indivíduo providenciava o projeto arquitetônico do edifício e oferecia à venda as suas unidades autônomas. Os candidatos à aquisição lhe faziam então propostas e quando contava com o número de pretendentes necessário para custear a obra, este indivíduo dava início a ela. Com a venda de todas as unidades autônomas do edifício, providenciava-se a transferência do domínio sobre as respectivas frações ideais a cada um de seus adquirentes através de uma

1 GHEZZI, Leandro Leal. A incorporação imobiliária à luz do Código de Defesa do Consumidor e do Código Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 57.

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mesma escritura pública. Por fim, com a conclusão da obra, o indivíduo obtinha o “habite-se” das autoridades municipais, acertava suas contas com cada adquirente e lhes entregava as chaves das suas unidades autônomas. Este “indivíduo” era o incorporador.2

A incorporação imobiliária foi regulada em escassos diplomas legais, os

quais “não cuidaram de regulá-la convenientemente.”3 PEREIRA, coerentemente

afirma que o surto imobiliário no Brasil gerou uma atividade de cunho econômico não

prevista em lei, que com o passar do tempo, atingira proporções muito avantajadas.4

O Código Brasileiro de 19165 silenciou-se acerca do tema, haja vista que o

desenvolvimento frebil da incorporação imobiliária, não era imaginado em tal

proporção na época.

Entretanto com o extraordinário surto de desenvolvimento observado após a 1ª Grande Guerra Mundial de 1914-1918, dando inicio à era da industrialização, provocou o aumento demográfico e a valorização dos terrenos urbanos, bem como a consequente necessidade de aproveitamento do espaço, suscitando então a idéia de se instituir condomínio nos prédios de mais de um andar, distribuindo-os por vários proprietários6.

Logo, diante da ausência de regulação acerca do tema no Código Civil

Brasileiro de 1916 e em detrimento da necessidade de normatização de tal atividade

foi elaborado o Decreto nº 5481/19287, o qual tratou acerca da alienação parcial dos

edifícios com mais de cinco andares; vislumbrando, mesmo que de forma superficial,

o ideal de condomínio edilício8.

Apesar das legislações complementares que buscaram tutelar tal seara

jurídica, como o Decreto nº. 5481/1928, e outras, havia a necessidade de uma

2 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Condomínio e Incorporações. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 231-232. 3 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 4. ed., Vol. V. São Paulo: Saraiva,2011, p. 373. 4 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 10. ed. Vol. 3. Rio de Janeiro: 1999, p.379. 5 BRASIL. Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916. Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 05 jan. 1916. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L3071.htm>. Acesso em: 28/04/2012. 6 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 4. ed., Vol. V. São Paulo: Saraiva,2011, p. 373-374. 7 BRASIL. Decreto nº 5481, de 25 de junho de 1928. Dispõe sobre a alienação parcial dos edifícios de mais de cinco andares e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 25 jun. 1928. Disponível:<http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaTextoIntegral.action?id=26186&norma=41641. Acesso em 14/09/2012.

8 Em linhas gerais, o condomínio edilício, conceitua-se como uma comunhão; a qual ocorre

quando uma mesma coisa/propriedade pertence simultaneamente a várias pessoas; em detrimento de um direito real.

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regulação normativa específica para a incorporação imobiliária, haja vista que tais

institutos tratavam tão somente de obras e empreendimentos já concluídos, sem

regular situações relacionadas ao início e construção dos mesmos.

Diante de uma tutela jurisdicional escassa e incapaz de suprir com as

necessidades do setor imobiliário foi promulgada a Lei nº. 4591/19649, a qual passou

a finalmente conceituar a atividade da incorporação imobiliária, bem como, tratar de

questões relativas ao projeto e execução das obras.

Nas palavras de PEREIRA, “a Lei 4.591/1964 veio moralizar uma atividade

que se achava deformada pela cupidez e pela irresponsabilidade, e imprimiu

seriedade e trouxe confiança ao mercado especializado, preparando campo ao

advento da era imobiliária.”10 Ainda da lavra do mesmo doutrinador:

Reunindo num mesmo diploma a atividade empresarial da incorporação e o regime jurídico na propriedade horizontal, essa lei, que é identificada como do Condomínio e Incorporações, imprimiu tipicidade a um novo contrato, estabelecendo a qualificação para ser incorporador (...) e as exigências para o lançamento dos edifícios coletivos. Refere-se às modalidades para a contratação em regime de empreitada (...) e de administração ou preço de custos.11

Logo, por meio da promulgação de lei específica, tal atividade passou a ser

tipificada, sendo imprescindível a análise da concepção de incorporação imobiliária e

demais conceitos correlatos, a fim de que tal ramo empresarial seja compreendido

em todas as suas ramificações, obrigações e finalidades.

2.2. ANÁLISE DOUTRINÁRIA DA INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA: CONCEITO E

NATUREZA JURÍDICA

O termo incorporação imobiliária deriva do latim incorporatio, de incorporare;

que significa dar corpo, juntar, unir.12 O vocábulo incorporação traz a ideia de

agrupamento, de união de forças para uma finalidade comum, a formação ou

concretização de algo novo.

9 BRASIL. Lei nº 4.591, de 16 de dezembro de 1964. Dispõe sobre Condomínio em Edificações e a Incorporações Imobiliárias. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 21 de dezembro de 1964. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L4591.htm>.Acesso em: 25/06/2012. 10 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Condomínio e Incorporações. 10 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 234.

11 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil.10.ed. Vol. 3. Rio de Janeiro:

Forense, 1999, pg. 379. 12 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 423.

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Neste sentido CHALHUB entende que, “incorporação significa inclusão, união,

introdução ou ligação de uma coisa no corpo de outra”.13

Logo, o vocábulo, ou melhor, a atividade da incorporação imobiliária deve ser

vislumbrada como a interação de várias pessoas para um mesmo fim. Ou seja, o

agrupamento de capital para a concretização de um empreendimento.

Tecnicamente, a incorporação imobiliária destina-se a criação de um

empreendimento imobiliário, através da promoção da alienação das futuras unidades

autônomas que comporão tal edifício. Através dos recursos angariados, o

incorporador custeará as despesas e gastos necessários para a edificação e

conclusão do imóvel.

O conceito previsto no artigo 28 da Lei nº. 4591/1964 define incorporação

imobiliária como “a atividade exercida com o intuito de promover e realizar a

construção, para alienação total ou parcial, de edificações, ou conjunto de

edificações compostas de unidades autônomas14”.

Assim sendo, na esfera contratual a incorporação imobiliária representa um

negócio jurídico complexo o qual tem por intuito a promoção da edificação de um

empreendimento e a consequente e necessária alienação de suas unidades

autônomas.

Trata-se de um negócio jurídico de alta complexidade, pois sua realização

esta condicionada à celebração de vários contratos. Os diversos contratos firmados

para a concretização da referida atividade, apesar de autônomos e distintos;

vinculam-se entre si, unificando-se em somente um único contrato; o contrato de

incorporação imobiliária.

A incorporação imobiliária, portanto, deve ser vislumbrada como atividade

preliminar, destinada a tratativas relacionadas à regularização de terreno, projeto e

demais assuntos burocráticos para início das obras; e por fim, seu exercício

estender-se-ia até a venda das unidades autônomas, execução das obras e

finalização das mesmas.

Portanto, a incorporação imobiliária nada mais é do que um negócio jurídico

que precede a efetiva propriedade do bem pelos adquirentes das unidades

correspondentes.

13 CHALHUB, Melhim Namen. Da Incorporação Imobiliária. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 9.

14 Artigo 28 da Lei nº. 4.591/1964.

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(...) a incorporação é economicamente um empreendimento que consiste em obter o capital necessário à construção do edifício, geralmente mediante a venda, por antecipação, dos apartamentos de que se constituirá. Daí a necessidade que tem o incorporador de colocar no mercado imobiliário certo numero de apartamentos, que promete construir, com as entradas dos promitentes-compradores e, não raro, com o financiamento obtido de um estabelecimento de credito.15

Buscando-se uma definição mais aprofundada e completa CHALHUB tece as

seguintes considerações:

No campo dos negócios imobiliários, a expressão incorporação imobiliária tem o significado de mobilizar fatores de produção para construir e vender, durante a construção, unidades imobiliárias em edificações coletivas, envolvendo a aglutinação de pessoas e a articulação de uma serie e medidas no sentido de levar a discriminação das unidades imobiliárias no Registro de Imóveis.16

Logo, verifica-se que a incorporação imobiliária é uma atividade

centralizadora; que mobiliza vários agentes do mercado imobiliário; em prol da

construção e alienação de um empreendimento.

A incorporação imobiliária pode ser metaforicamente equiparada à venda de

um sonho, haja vista que o incorporador vende a promessa de construção de um

imóvel ao adquirente; em outras palavras, a incorporação imobiliária só existe

durante a construção ou anteriormente à mesma; jamais após a conclusão das

obras.

O empreendimento imobiliário, o qual o incorporador assume o

desenvolvimento e conclusão, será custeado pela aglutinação de capitais dos

adquirentes que pagaram o preço, mesmo que fracionada; antes mesmo da

conclusão das obras.

Portanto o foco da incorporação imobiliária não é tão somente a produção

e/ou construção de um empreendimento, mas principalmente a alienação das

unidades autônomas decorrentes da fração ideal do terreno. Cabe salientar que a

incorporação imobiliária inexiste após a conclusão das obras.

2.3. OBRIGAÇÕES DO INCORPORADOR

15 GOMES, Orlando. Direitos Reais. 19. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p..234 16 CHALHUB, Melhim Namen. Da Incorporação Imobiliária. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 12.

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Importa inicialmente determinar-se a figura do incorporador, de modo que a

partir da determinação do mesmo, seja possível vislumbrar o leque obrigacional que

se abre sobre a atividade desempenhada pelo mesmo, uma vez que é o

incorporador o principal responsável pelo sucesso ou fracasso de um

empreendimento imobiliário, como se verá adiante.

A figura do incorporador já existia anteriormente a promulgação da lei nº.

4.591/1964 período em que tal atividade encontrava-se desamparada juridicamente;

afastada de qualquer regulamentação legal. Ante a falta de proteção aos

adquirentes de empreendimentos imobiliários, os quais não possuíam nenhuma

garantia legal acerca da responsabilização do incorporador frente ao

descumprimento contratual.

O incorporador deve ser compreendido como aquele que angaria recursos,

que capta capital para a construção do empreendimento e posterior alienação das

unidades; nas palavras de Caio Mario da Silva Pereira:

(...) considera-se incorporador e se sujeita aos preceitos dessa lei toda pessoa física ou jurídica que promova a construção para alienação total ou parcial e edificação composta de unidades autônomas, qualquer que seja a sua natureza ou destinação. 17

Ou ainda um conceito mais prático de incorporador é feito por RIZZARDO:

Define-se incorporador como a pessoa física ou jurídica, comerciante ou não, que, embora não efetuando a construção, compromisse ou efetive a venda de frações ideais de terreno objetivando a vinculação de tais frações a unidades autônomas, em edificações a serem construídas ou em construção sob regime condominial, ou que meramente aceita propostas para efetivação de tais transações, coordenando e levando a termo a incorporação e responsabilizando-se, conforme o caso, pela entrega, em certo prazo, a preço e em determinadas condições, das obras concluídas.18

Satisfeitas as ponderações feitas acerca do conceito de incorporador

imobiliário, é preciso estender tal estudo para a seara obrigacional do incorporador;

a qual pode ser dividida em três momentos distintos, ou seja, obrigações

decorrentes da fase pré-contratual, da fase de execução da obra e da fase de

conclusão do empreendimento.

17 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Condomínio e Incorporações. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 132. 18 RIZZARDO, Arnaldo. Promessa de Compra e Venda e Parcelamento de Solo Urbano. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.

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Cabe salientar que as obrigações do incorporador podem decorrer de duas

fontes específicas: legal e/ou contratual.

Em um primeiro momento, deter-se-á no conjunto obrigacional proveniente da

legislação aplicável às incorporações, tais deveres visam resguardar os adquirentes

das futuras unidades autônomas do empreendimento em face de possível fraude,

leviandade ou deslealdade do incorporador.

No que tange às obrigações legais preliminares referentes ao momento

anterior à celebração do instrumento particular de compra e venda, deve o

incorporador inscrever a incorporação junto ao Registro de Imóveis e ainda

apresentar todos os documentos descritos no artigo 32 da Lei nº. 4.591/1964.19

Em seguida à apresentação dos documentos acima expostos, deve o

incorporador consignar prazo de carência; o qual permite a desistência do

empreendimento. Optando por dar continuidade à incorporação imobiliária, na fase

da execução das obras, deve o incorporador suportar com as obrigações relativas à

efetivação da venda das unidades autônomas, obrigando-se a indicar o numero do

19

Art. 32. O incorporador somente poderá negociar sobre unidades autônomas após ter arquivado, no cartório competente de Registro de Imóveis, os seguintes documentos: a) título de propriedade de terreno, ou de promessa, irrevogável e irretratável, de compra e venda ou de cessão de direitos ou de permuta do qual conste cláusula de imissão na posse do imóvel, não haja estipulações impeditivas de sua alienação em frações ideais e inclua consentimento para demolição e construção, devidamente registrado; b) certidões negativas de impostos federais, estaduais e municipais, de protesto de títulos de ações cíveis e criminais e de ônus reais relativante ao imóvel, aos alienantes do terreno e ao incorporador; c) histórico dos títulos de propriedade do imóvel, abrangendo os últimos 20 anos, acompanhado de certidão dos respectivos registros; d) projeto de construção devidamente aprovado pelas autoridades competentes; e) cálculo das áreas das edificações, discriminando, além da global, a das partes comuns, e indicando, cada tipo de unidade a respectiva metragem de área construída; f) certidão negativa de débito para com a Previdência Social, quando o titular de direitos sobre o terreno for responsável pela arrecadação das respectivas contribuições; g) memorial descritivo das especificações da obra projetada, segundo modelo a que se refere o inciso IV, do art. 53, desta Lei; h) avaliação do custo global da obra, atualizada à data do arquivamento, calculada de acordo com a norma do inciso III, do art. 53 com base nos custos unitários referidos no art. 54, discriminando-se, também, o custo de construção de cada unidade, devidamente autenticada pelo profissional responsável pela obra; i) discriminação das frações ideais de terreno com as unidades autônomas que a elas corresponderão; j) minuta da futura Convenção de condomínio que regerá a edificação ou o conjunto de edificações; l) declaração em que se defina a parcela do preço de que trata o inciso II, do art. 39; m) certidão do instrumento público de mandato, referido no § 1º do artigo 31; n) declaração expressa em que se fixe, se houver, o prazo de carência (art. 34); o) atestado de idoneidade financeira, fornecido por estabelecimento de crédito que opere no País há mais de cinco anos. p) declaração, acompanhada de plantas elucidativas, sobre o número de veículos que a garagem comporta e os locais destinados à guarda dos mesmos. (Alínea incluída pela Lei nº 4.864, de 29.11.1965).19

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registro da incorporação nos contratos; discriminar detalhadamente a forma de

custeio da construção, apresentando memorial descritivo da obra.

Além disso, deve o incorporador informar o valor das frações ideais do

terreno e o por fim, tem por obrigação essencial dar regular andamento à execução

dos projetos, de modo que a obra seja concluída em acordo com o cronograma da

construção, a fim de que a entrega das unidades seja feita em consonância ao prazo

previsto em contrato; coibindo a mora.

Já na fase de conclusão do empreendimento, o incorporador esta incubido de

providenciar a averbação da construção e a instituição do condomínio, através da

elaboração e registro do instrumento competente. E por fim, deve o incorporador

transferir a propriedade e a respectiva fração ideal do terreno ao promitente

comprador; a conhecida e popular “entrega das chaves”.

Ademais, além das obrigações legais, ainda é necessário mencionar as

obrigações decorrentes da esfera contratual, por tal instrumento o incorporador deve

efetuar a transferência da fração ideal alienada; obriga-se a firmar a escritura

definitiva de venda da fração ideal do terreno, transmitindo a propriedade.

É obrigação do incorporador a promoção da construção em conformidade ao

projeto e cronograma de planejamento, trata-se propriamente de uma obrigação de

fazer, que se destina a uma obrigação de resultado. Portanto, deve o incorporador,

entregar aos adquirentes as unidades concluídas e devidamente averbadas.20

É de suma relevância frisar que acima de todas as obrigações legais e

contratuais, o incorporador tem o dever de ser sincero e ético em todas as suas

alegações, de modo a cumprir integralmente com todas as propostas, publicidade,

contratos e ofertas feitas; devendo, portanto seguir pontualmente com os deslindes

da boa-fé.

Podem conter no contrato de incorporação imobiliária outras cláusulas

estabelecendo diretrizes ao negocio jurídico firmado entre as partes. Com relação ao

promitente-adquirente cabe como principal obrigação o adimplemento do preço de

sua unidade autônoma do empreendimento; ou seja, deve pagar o preço de sua

fração ideal.

Diante da apresentação das inúmeras obrigações do incorporador, de cunho

legal e contratual, reitera-se a alegação de que se trata de um negócio jurídico

20

GOMES, Orlando. Contratos. 25. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 453.

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prolixo, o qual visa, sobretudo, tutelar os direitos dos adquirentes das unidades

autônomas do empreendimento.

Em síntese, o incorporador deve ser estudado em consonância ao conceito

da atividade da incorporação imobiliária, sendo o indivíduo responsável pela

captação de capital suficiente para a construção do imóvel, sendo logicamente o

principal fomentador de tal atividade respondendo21 diretamente junto ao

consumidor.

21 “A obrigação que tem é de promover a construção, não a de construir, sendo assim, obrigação da fazer, que, descumprida, pode ser executada à custa do incorporador, por decisão judicial”. GOMES, Orlando. Contratos. 26. ed. Rio de Janeiro:.Forense, 2008, p. 552.

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3. DO CONTRATO DE INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA

3.1. DA PROMESSA DE COMPRA E VENDA

O contrato de incorporação imobiliária que tem por objeto a alienação de

unidade imobiliária na planta, nada mais é do que uma promessa de compra e

venda que será transformada em um contrato fidedigno de compra e venda após a

efetiva entrega do imóvel e sua consequente escrituração.

O compromisso de compra e venda é o contrato comumentemente utilizado

para a alienação das unidades autônomas do empreendimento, motivo pelo qual

será objeto do presente estudo, apesar de haver a possibilidade de celebração de

contratos distintos a este como; contrato de construção22 e contrato de compra e

venda com pacto adjeto de alienação fiduciária.

O compromisso de compra e venda é a modalidade frequentemente escolhida

para a comercialização das unidades do empreendimento; uma vez que por meio do

mesmo importa ao incorporador assumir “o risco da construção, estabelecendo

desde logo, o preço final da unidade e obrigando-se a entregá-la concluída e

averbada no Registro de Imóveis.”23Trata-se de situação em que o incorporador por

meio da promessa de compra e venda compromete-se à transmitir a propriedade

futura da unidade após sua conclusão.

A promessa de compra e venda segundo RIZZARDO “é um verdadeiro

contrato regulado por leis especiais, que tem por objeto uma prestação de fazer,

prestação esta consistente na celebração de outro contrato, o definitivo.” 24

Neste mesmo diapasão temos que a promessa de compra e venda é “o

contrato pelo qual ambas as partes, ou uma delas, se comprometeu a celebrar, mais

tarde, o contrato de compra e venda”.25

22 O contrato de construção pode ocorrer por meio de duas modalidades distintas: a empreitada e a administração. A empreitada possui o valor da construção expressamente previsto no contrato, enquanto a construção na forma de administração possui mera estimativa do preço da construção em contrato. Existe a possibilidade de agregação do contrato de construção à promessa de compra e venda da unidade; situação em que a fração ideal do terreno é feita em instrumento apartado ao contrato de construção da unidade. 23 CHALHUB, Namem Melhim. Da Incorporação Imobiliária. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 174. 24 RIZZARDO, Arnaldo. Promessa de Compra e Venda e Parcelamento do Solo Urbano. 8. ed. São Paulo:Revista dos Tribunais, 2011, p. 108.

25 BESSONE DE OLIVEIRA,Darcy Andrade.. Da Compra e Venda, Promessa e Reserva de Domínio. Belo Horizonte: Bernardo Álvares, 1960, p. 76.

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A venda antecipada das unidades imobiliárias em regime de incorporação

nada mais é do que uma promessa de compra e venda, condicionada a

concretização de determinadas obrigações por cada uma das partes; seja pelo

promitente comprador de pagar o preço, possibilitando assim à construção do imóvel

por meio de seu investimento de ordem pecuniária; ou ainda, seja pelo promitente

vendedor de desenvolver e concluir as obras do imóvel até sua efetiva entrega. Tal

compromisso de compra e venda vincula-se à celebração do contrato efetivo de

compra e venda pelo qual a propriedade da coisa será transmitida, por meio da

escritura de compra e venda.

(...) a promessa de contratos ou contrato preliminar pressupõe, como de sua essência, um termo, dentro do qual o contrato definitivo será concluído devendo, por isso mesmo, alem da fixação deste termo, conter mais, de modo preciso, as clausulas do contrato futuro, a cuja formação tende, para que, na ocasião de ser aperfeiçoada a conclusão deste ultimo, não surjam dificuldades e dúvidas.26

A promessa de compra e venda é responsável por perfazer a principal

peculiaridade da incorporação imobiliária, a qual seja a alienação antecipada de

frações ideais antes da efetiva construção ou conclusão da edificação das mesmas.

Trata-se, portanto, de promessa de compra e venda de coisa futura, visto que

o incorporador obriga-se a uma prestação de resultado vindoura. Assim, por tratar-se

de obrigação que ainda é passível de desenvolvimento, a Lei nº. 4591/1964 visou

resguardar o adquirente, através do artigo 32; o qual consigna como requisito

indispensável para a prévia alienação das unidades autônomas do empreendimento,

o arquivamento de “elementos comprobatórios do empreendimento e da capacidade

econômica do incorporador”.27

Ademais, a Lei nº. 4591/1964 concretiza juridicamente, a hipótese de venda

de coisa futura, a qual pode ser compreendida sob a ótica de coisa a ser construída,

criada, desenvolvida ou edificada.

Considerando que a promessa de compra e venda das unidades imobiliárias

ocorre na perspectiva de alienação de coisa futura que ainda não existe, é de

extrema relevância que a “abstração” proveniente da atividade da incorporação

26 RIZZARDO, Arnaldo.Promessa de Compra e Venda e Parcelamento do Solo Urbano. 8. ed. São Paulo:Revista dos Tribunais, 2011, p 108. 27 RIZZARDO, Arnaldo.Promessa de Compra e Venda e Parcelamento do Solo Urbano. 8. ed. São Paulo:Revista dos Tribunais, 2011, p 115..

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21

imobiliária seja neutralizada a fim de que tal compromisso de compra e venda

possibilite segurança jurídica ao adquirente.

A análise da legalidade da cláusula de carência possui estrita vinculação com

o estudo da estruturação do compromisso de compra e venda na incorporação

imobiliária, sobretudo no que tange ao fato de tratar-se de obrigação de resultado,

futura.

A estipulação contratual de prazo de carência para a entrega da unidade

adquirida não merece prosperar, haja vista que embora se trate de uma perspectiva

obrigacional vindoura, que ainda deverá ser concretizada faticamente, não pode o

promitente comprador, ser responsabilizado pelos riscos da atividade da promitente

vendedora.

Neste sentido o artigo 4328 da Lei das Incorporações impõe ao incorporador

deveres relativos à responsabilidade civil, informação, garantias, execução da obra,

insolvência e demais questões capazes de influenciar a efetiva entrega da unidade

no prazo convencionado contratualmente.

28 Art. 43. Quando o incorporador contratar a entrega da unidade a prazo e preços certos,

determinados ou determináveis, mesmo quando pessoa física, ser-lhe-ão impostas as seguintes normas: I - informar obrigatòriamente aos adquirentes, por escrito, no mínimo de seis em seis meses, o estado da obra; II - responder civilmente pela execução da incorporação, devendo indenizar os adquirentes ou compromissários, dos prejuízos que a estes advierem do fato de não se concluir a edificação ou de se retardar injustificadamente a conclusão das obras, cabendo-lhe ação regressiva contra o construtor, se for o caso e se a este couber a culpa; III - em caso de falência do incorporador, pessoa física ou jurídica, e não ser possível à maioria prosseguir na construção das edificações, os subscritores ou candidatos à aquisição de unidades serão credores privilegiados pelas quantias que houverem pago ao incorporador, respondendo subsidiàriamente os bens pessoais deste; IV - é vedado ao incorporador alterar o projeto, especialmente no que se refere à unidade do adquirente e às partes comuns, modificar as especificações, ou desviar-se do plano da construção, salvo autorização unânime dos interessados ou exigência legal; V - não poderá modificar as condições de pagamento nem reajustar o preço das unidades, ainda no caso de elevação dos preços dos materiais e da mão-de-obra, salvo se tiver sido expressamente ajustada a faculdade de reajustamento, procedendo-se, então, nas condições estipuladas; VI – VETADO. VII - em caso de insolvência do incorporador que tiver optado pelo regime da afetação e não sendo possível à maioria prosseguir na construção, a assembléia geral poderá, pelo voto de 2/3 (dois terços) dos adquirentes, deliberar pela venda do terreno, das acessões e demais bens e direitos integrantes do patrimônio de afetação, mediante leilão ou outra forma que estabelecer, distribuindo entre si, na proporção dos recursos que comprovadamente tiverem aportado, o resultado líquido da venda, depois de pagas as dívidas do patrimônio de afetação e deduzido e entregue ao proprietário do terreno a quantia que lhe couber, nos termos do art. 40; não se obtendo, na venda, a reposição dos aportes efetivados pelos adquirentes, reajustada na forma da lei e de acordo com os critérios do contrato celebrado com o incorporador, os adquirentes serão credores privilegiados pelos valores da diferença não reembolsada, respondendo subsidiariamente os bens pessoais do incorporador.

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Através de uma síntese das questões abordadas nos incisos do artigo 43 da

Lei das Incorporações temos que o incorporador deve manter uma relação de

transparência e confiança junto ao adquirente; de modo a mantê-lo periodicamente

informado acerca do regular andamento das obras, bem como, do cumprimento do

cronograma e planejamento da construção.

Ainda, de relevante importância ao que concerne ao tema do presente

trabalho, a Lei 4.591/1964 tratou de proporcionar maior proteção jurídica ao

adquirente em face de possível descumprimento do prazo de entrega da unidade

imobiliária objeto da promessa de compra e venda. Logo, em caso de prejuízos

decorrentes do retardamento ou inexecução das obras, o incorporador responderá

civilmente pelos danos causados.

Neste mesmo sentido, cabe elucidar que o incorporador não poderá alterar ou

modificar o projeto; de modo a desviar-se arbitrariamente do plano de construção

ajustado anteriormente, igualmente, o preço e as condições de pagamento também

permanecerão inalteráveis, salvo disposição contrária.

Logo, verifica-se que a comercialização das unidades autônomas do

empreendimento imobiliário concretiza a atividade da incorporação imobiliária, por

meio de instrumentos de promessa de compra e venda; de coisa futura, assim como

vislumbra o artigo 483 do Código Civil Brasileiro29

Com efeito, a partir do registro da incorporação, ficam definidos os elementos identificadores do bem a ser vendido, isto é, a unidade imobiliária com a correspondente fração ideal do terreno, a área da futura unidade, entre outros, elementos esses que permitem a perfeita identificação da futura unidade, viabilizando sua completa descrição e caracterização no instrumento do contrato.30

Por fim, tendo em vista que somente se considera como incorporação

imobiliária os empreendimentos em fase de execução, a alienação das unidades

autônomas do referido imóvel configura-se como legítima promessa de compra e

venda, a qual após a conclusão das obras e entrega da unidade, permitirá a

existência de matrículas individualizadas, celebrando-se o contrato de compra e

venda propriamente dito.

29 Art. 483. A compra e venda pode ter por objeto coisa atual ou futura. Neste caso, ficará sem efeito o contrato se esta não vier a existir, salvo se a intenção das partes era de concluir contrato aleatório. 30 CHALHUB, Melhim Namem. Da Incorporação Imobiliária. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 180.

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3.2. REGIME JURÍDICO DOS CONTRATOS: O DIÁLOGO DE FONTES

O contrato de incorporação imobiliária deve ser analisado sobre a óptica de

uma série de atos jurídicos distintos, coligados em prol de um mesmo objetivo.

Trata-se, portanto, de um instrumento complexo que é composto por contratos

distintos vinculados entre si para uma finalidade comum.

O contrato de incorporação imobiliária tecnicamente é estruturado com a

finalidade essencial de atender a necessidade de ajustes de três questões, que

embora distintas, vinculam-se diretamente; as quais são: a alienação das frações

ideais do terreno, a construção do empreendimento e a constituição do regime

condominial.

Orlando Gomes brilhantemente define o contrato de incorporação imobiliária;

nos termos de que:

Por esse contrato, obriga-se alguém a promover a construção de edifício dividido em unidades autônomas para distintos adquirentes da respectiva fração ideal do terreno, sob regime de condomínio especial.31

Tal espécie contratual pode ser caracterizada como típica, visto que possui

legislação específica que o regula, lei nº. 4591/1964. Ainda é interessante salientar

que o contrato de incorporação “compreende prestações características de outros

contratos típicos, como a compra e venda, a promessa de venda, a empreitada, a

prestação de serviços, e de contratos atípicos como a organização de condomínio

especial.”32

Nas palavras de PEREIRA, criador do projeto da Lei nº. 4591/1964, a

essência do contrato de incorporação imobiliária situa-se em dois pontos primordiais:

O primeiro esta na instituição de nova modalidade de direito real resultante da inscrição do empreendimento no Registro Imobiliário. Uma vez efetuada, e decorrido o período de carência em que é permitida no incorporador a faculdade de desistência, fica estabelecido ius in re, oponível erga omnes como todo direito real (...). O segundo, na especificação das responsabilidades do incorporador, do construtor e do próprio adquirente da unidade, agilizando a efetivação do negócio. Ao mesmo tempo que estimulou a proliferação das atividades imobiliárias, estatui segurança no mercado(...).33

31 GOMES, Orlando. Contratos. 25. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

32 GOMES, Orlando. Contratos. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 550. 33 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 10. Ed. Vol. 3. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 380

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Ademais, cabe reiterar que tal espécie contratual só existe se a alienação das

unidades autônomas do empreendimento se der antes ou durante a construção do

mesmo. Destarte, o contrato de incorporação imobiliária deve ser vislumbrado como:

É o contrato preliminar e pessoal, de natureza complexa, no qual se reúnem obrigações de dar e fazer, que operam seus efeitos em etapas sucessivas, até a conclusão do edifício e a transferência definitiva das unidades autônomas aos seus donos, e do condomínio do terreno e das áreas de utilização comum aos condôminos. Este ajuste é feito no período que antecede a construção, valendo para os tomadores de apartamentos como compromisso preliminar de aquisição futura (com custeio da obra ou sem ele) e para o incorporador como promessa de construção (com financiamento ou sem ele) e de venda das unidades autônomas com o correspondente condomínio do terreno e nas áreas de utilização comum.34

Logo, por meio do contrato de incorporação imobiliária, frequentemente

exteriorizado pelo compromisso de compra e venda, o incorporador obriga-se a uma

prestação de resultado, a qual seja, a construção e efetiva entrega da unidade

imobiliária ao adquirente.

Neste sentido, conclui-se que o contrato de incorporação imobiliária,

vislumbrado nesta pesquisa, como compromisso de compra e venda, estabelece

preliminarmente uma obrigação de fazer, consubstanciada na execução das obras

do empreendimento, e posteriormente uma obrigação de dar, vislumbrada pela

efetiva entrega e transferência da propriedade da unidade autônoma ao respectivo

adquirente.

Denota-se, que o contrato de incorporação imobiliária representa negócio

jurídico complexo, haja vista que agrega cumulativamente obrigações que são

características de outros contratos; contratos de empreitada (obrigação de fazer) e

de contrato de compra e venda (obrigação de dar)35.

As promessas de compra e venda antecipada de unidades imobiliárias são

regidas pela Lei nº. 4591/1964; que especificamente regula a atividade da

incorporação imobiliária; pelo Código de Defesa do Consumidor36; o qual é

34 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de Construir. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 211.

35 “A razão tradicional da diferença de tratamento entre as obrigações de dar e fazer é que, na primeira, visa-se geralmente a entrega de uma coisa, enquanto na segunda o credor pretende obter a realização de um serviço.” WALD, Arnoldo. Direito Civil. 20 ed. Vol. 2. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 50.. 36 Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do Consumidor e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 12 de setembro de 1990. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8078.htm>. Acesso em: 03/09/2012.

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responsável por complementar a tutela protetiva do adquirente, e pelo Código Civil, o

qual enuncia os princípios contratuais da boa-fé e equilíbrio.

Diante da pluralidade de legislações aplicáveis, faz-se necessário uma

organização de tais disposições normativas, a fim de que seja possível uma análise

integral e ampla de tal instituto. O diálogo de fontes, portanto, representa a “tentativa

de expressar a necessidade de uma aplicação coerente das leis de direito privado,

coexistentes no sistema”.37

A expressão diálogo das fontes foi criada por Erik Jayme, e significa: “di+a-

dois ou mais; logos = lógica ou modo de pensar38”, de modo a coordenar a

simultânea e coerente utilização das várias legislações.

Essencial, portanto, a existência de harmonização entre as normas do

ordenamento jurídico, de modo que os compromissos de compra e venda

decorrentes de empreendimentos sob a égide da incorporação imobiliária sejam

regulados em completude; num ideal de sistema.

A expressão “diálogo das fontes” aceita também pelo STJ (REsp 1037759/RJ)39 é hoje utilizada fortemente pelos Tribunais estaduais e nos Juizados Especiais para aplicação simultânea do CDC com mais de uma lei geral ou especial, de forma ordenada e coerente com o valor constitucional de proteção do consumidor, seja em casos de compra e venda de imóveis (TJ/RN, AC 2009.010644-040) (...).41

37MARQUES, Cláudia Lima, Diálogo das Fontes in BENJAMIN, Antonio Haerman V.; MARQUES, Claudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de Direito do Consumidor. 3. ed. São Paulo:Revista dos Tribunais, 2010, p. 109. 38 JAYME, Erik. Identité culturalle ET integration: le droit international privé postmoderne. Recueil des Cours, Académie de Droit International de la Haye, 1995, II, p.33ss apud MARQUES, Cláudia Lima, Diálogo das Fontes in BENJAMIN, Antonio Haerman V.; MARQUES, Claudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de Direito do Consumidor. 3. ed.. Editora Revista dos Tribunais, 2010. 39 “O art. 7º da Lei nº 8.078/90 fixa o chamado diálogo de fontes, segundo o qual sempre que uma lei garantir algum direito para o consumidor, ela poderá se somar ao microssistema do CDC, incorporando-se na tutela especial e tendo a mesma preferência no trato da relação de consumo.” BRASIL: Superior Tribunal de Justiça: 3ª Turma. Recurso Especial nº. 1037759. Relatora: Ministra Nancy Andrighi. Julgado em: 23/02/2010. Disponível em http://www.stj.jus.br/webstj/processo/Justica/detalhe.asp?numreg=2010089831037&pv=010000000000&tp=671. Acessado em: 25/06/2012. 40 “Registro, outrossim, a incidência do Código Civil, em vista da sua conexão axiológica como o CDC (diálogo das fontes), conforme Enunciado n. 167 do CJF, senão vejamos: Arts. 421 a 424: Com o advento do Código Civil de 2002, houve forte aproximação principiológica entre esse Código e o Código de Defesa do Consumidor no que respeita à regulação contratual, uma vez que ambos são incorporadores de uma nova teoria geral dos contratos." RIO GRANDE DO NORTE, Tribunal de Justiça: 3ª Câmara Cível, Apelação Civil nº 2009.010644-0. Relatora: Doutora Neize Fernandes. Julgado em: 01/12/2009. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/3699601/apelacao-civel-ac-1800-rn-2004000180-0-tjrn. Acesso em: 04/07/2012.

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Apesar da Lei 4591/1964 contar com inúmeros dispositivos que visam

defender os direitos dos adquirentes de unidades imobiliárias, tal tutela protetiva por

vezes, carece de ampliação; motivo pelo qual se utiliza o Código de Defesa do

Consumidor, de modo a proporcionar ao adquirente; enquanto consumidor, maiores

condições de garantir seus interesses em detrimento de possíveis abusividades ou

ilegalidades.

Igualmente, o Código Civil poderá subsidiariamente ser aplicado, de modo a

possibilitar maior compreensão no que concerne a esfera obrigacional e contratual.

Logo, por meio do diálogo de fontes, as diversas legislações aplicáveis à

incorporação imobiliária e em especial, a seus contratos vinculam-se e são utilizadas

de maneira paralela, conforme melhor se adequarem ao caso concreto, de modo a

proporcionar uma interpretação normativa coerente e extensa.

3.3. DA APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

A Lei de Condomínios e Incorporações, datada de 1964 foi uma legislação

inovadora, que desde a sua promulgação regulou dispositivos destinados à proteção

do adquirente-consumidor:

(...) sistema precursor do sistema de proteção e defesa do consumidor, contido no Código de Defesa do Consumidor – CDC, pois, trinta anos antes da formulação do CDC, a Lei nº. 4591/1964 já positivava no direito brasileiro um sistema de proteção do adquirente de imóveis em construção e fixava a responsabilidade do incorporador e demais profissionais envolvidos no negocio estruturado nos mesmos princípios que vieram a orientar o referido Código, isto é, os princípios da boa-fé, no seu sentido objetivo, e da função social do contrato, com eficazes mecanismos de compensação da vulnerabilidade da posição contratual do adquirente.42

Entretanto, o Código de Defesa do Consumidor revelou-se uma tutela mais

ampla aos direitos do adquirente-consumidor, motivo pelo qual sua aplicação nos

compromissos de compra e venda oriundos da atividade da incorporação imobiliária

passou a ser frequente. Neste diapasão pretende-se tecer considerações de cunho

41 MARQUES, Cláudia Lima, Diálogo das Fontes in BENJAMIN, Antonio Haerman V.; MARQUES, Claudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de Direito do Consumidor. 3ª edição. Editora Revista dos Tribunais, 2010. 42 CHALHUB, Melhim Namen. Da Incorporação Imobiliária. Editora Renovar, 2ª edição. Rio de Janeiro, 2005, pág. 03.

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doutrinário e jurisprudencial no que concerne a aplicação prática da Lei nº.

8.078/1990.

Embora, a incorporação imobiliária e seus contratos sejam regulados por lei

específica, o diploma consumerista deve ser utilizado em defesa dos adquirentes

das unidades imobiliárias, quando necessário, haja vista que os mesmos

caracterizam-se impreterivelmente43 como consumidores, nos termos do artigo 2º do

Código de Defesa do Consumidor44.

Ademais, a equiparação entre a figura do incorporador prevista no artigo 29

da Lei nº 4591/196445 e a figura de fornecedor disposta no artigo 3º do Código de

Defesa do Consumidor46 é evidente e possível.

O incorporador, portanto, enquadra-se perfeitamente no conceito de

fornecedor; visto que oferta bens e serviços ao mercado consumerista. Senão

vejamos o entendimento emanado pela jurisprudência:

Empresa imobiliária. Incidência do Código de Defesa do Consumidor. Rege-se, pela Lei 4.591/64, no que teme de específico para a incorporação e construção de imóveis, e pelo CDC, o contrato de promessa de compra e venda celebrado entre a companhia imobiliária e o promissário comprador. Recurso conhecido e provido.47

O entendimento firmado por alguns doutrinadores48, de que antes da vigência

do Código de Defesa do Consumidor, já havia um microssistema normativo capaz de

proteger os adquirentes, o qual seja a Lei nº 4.591/64, é acatado, entretanto, não se

43 Não é possível olvidar-se de que a teoria predominante no ordenamento brasileiro no que se refere à configuração de consumidor é a finalista. Portanto, para fins do presente trabalho, considera-se impreterivelmente como consumidor a pessoa física ou jurídica que adquira o imóvel como destinatária final, sem finalidade de investimento. 44 Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produtos ou serviço como destinatário final. 45 Considera-se incorporador a pessoa física ou jurídica, comerciante ou não, que embora não efetuando a construção, compromisse ou efetive a venda de frações ideais de terreno objetivando a vinculação de tais frações a unidades autônomas, em edificações a serem construídas ou em construção sob regime condominial, ou que meramente aceite propostas para efetivação de tais transações, coordenando e levando a termo a incorporação e responsabilizando-se, conforme o caso, pela entrega, a certo prazo, preço e determinadas condições, das obras concluídas. 46 Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. 47 BRASIL: Superior Tribunal de Justiça, 4ª Turma. Recurso Especial nº 299.445/PR – Paraná, Reg. nº 2001/0003200-1. Relator: Ministro Ruy Rosado de Aguiar: Julgado em: 20/08/2001. Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200100032001&dt_publicacao=20/8/2001. Acessado em 18/09/2012. 48 CHALHUB, Melhim Namem. Da Incorporação Imobiliária. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p 3.

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pode negar que a promulgação da Lei nº. 8078/1990 ampliou incontestavelmente a

tutela jurídica especial aos adquirentes (consumidores).

(...)não há como negar que o incorporador/construtor é um fornecedor de produtos ou serviços à luz dos conceitos claros e objetivos constantes do artigo 3º do CDC. Quando ele vende e constrói unidades imobiliárias, assume uma obrigação de dar coisa certa, é isso é da essência do conceito de produto; quando contrata a construção dessa unidade, quer por empreitada quer por administração, assume uma obrigação de fazer, o que se ajusta ao conceito de serviço.49

Com base na explanação de alguns conceitos jurídicos50 tem-se que é efetiva

e imprescindível a incidência do Código de Defesa do Consumidor nos contratos de

promessa de compra e venda objeto de incorporação imobiliária.

A aplicação da legislação consumerista aos contratos de promessa de

compra e venda na esfera da incorporação imobiliária tem o condão de possibilitar o

equilíbrio entre os contraentes, bem como, a isonomia na seara obrigacional.

O Código de Defesa do Consumidor em conjunto com a Lei nº. 4591/1964

tem o condão de combater toda e qualquer prática ou cláusula abusiva que onere

excessivamente o adquirente; ou lhe cause prejuízos.

A cláusula de carência é notoriamente uma cláusula abusiva que merece ser

regulada pelo Código de Defesa do Consumidor, haja vista onerar de maneira

excessiva o adquirente-consumidor, conferindo-lhe tão somente o ônus da atividade

empresarial desenvolvida pelo incorporador.

Neste sentido, Cláudia Lima Marques51 faz uma análise sobre a questão das

cláusulas abusivas à luz da legislação consumerista, de modo que oportunamente

pretende que o entendimento das mesmas supere o desequilíbrio contratual

buscando uma reflexão mais profunda acerca da inobservância da comutatividade

obrigacional. Logo, a abusividade além de basear-se, sobretudo na ausência de

equilíbrio na relação negocial, pauta-se na noção de desvantagem exagerada, que

onera e causa prejuízos a uma das partes.

49 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 6. ed. São Paulo:

Malheiros, 2004, p. 344. 50 Por meio do conceito de consumidor e fornecedor previstos na Lei nº. 8078/1990 e pelo conceito de incorporador previsto na Lei nº. 4591/1964 é possível equiparar tais figuras jurídicas, de modo a vincular tais legislações (diálogo de fontes). 51 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 5. ed. São Paulo:Revista dos Tribunais, 2005.

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O contrato deve ser sempre regido pelo princípio basilar do equilíbrio, de

modo que o incorporador e o adquirente sejam tratados de forma isonômica; bem

como, obriguem-se de forma equânime às disposições do compromisso celebrado.

Demonstrada a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor; é

importante discorrer acerca da formação dos contratos de adesão.

3.4. AS CLÁUSULAS CONTRATUAIS: CONTRATO DE ADESÃO

Vislumbrada a incidência e aplicabilidade direta do Código de Defesa do

Consumidor nos contratos decorrentes da atividade da incorporação imobiliária, é

interessante a análise dos contratos de adesão52.

Frente às transformações ocorridas na sociedade após a Revolução Industrial

seria inconcebível a mantença dos parâmetros da autonomia da vontade utilizados

nos contratos durante os séculos XVIII e XIX.

Diante da intensificação das relações comerciais, tornou-se praticamente

impossível corresponder à alta demanda de consumidores por meio de contratos

paritários, sendo necessário um mecanismo capaz de alcançar satisfatoriamente

toda a coletividade. Neste diapasão surge o ideal do contrato de adesão, o qual

pode ser definido singelamente como:

(...) espécie de contrato, em que as cláusulas, que o vão compor, são preliminarmente estabelecidas por uma das partes, proponente, numa proposta, que será aceita ou não pela outra parte, sem direito a qualquer discussão, aceitando-as ou não, e, no primeiro caso, aderindo à proposta feita.53

Os contratos, portanto, devem ser vislumbrados em conformidade com as

mudanças ocorridas no século XX.

(...) a característica básica da sociedade do século XX é ser de massa e de consumo, com produção planejada e executada de forma estandartizada e em série; o resultado desse modelo é a oferta de produtos e serviços “de massa”, típicos de consumo.54

52 O contrato de adesão é aquele cujas cláusulas são preestabelecidas unilateralmente pelo parceiro contratual economicamente mais forte (fornecedor). MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 71. 53 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 219. 54 NUNES, Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor. 4. ed.. São Paulo: Saraiva 2009. p.618.

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Os contratos de adesão são instrumentos necessários ante a modernização e

ampliação das relações comerciais, entretanto, diante do fato de representarem

extrema limitação à autonomia da vontade do contratante, por vezes podem ser

tornar perigosos, se elaborado em desacordo com o equilíbrio contratual.

É necessário que o formulário de adesão seja elaborado em observância às

regras estabelecidas no Código de Defesa do Consumidor, nos parágrafos do artigo

5455, tais quais: redação do contrato com termos claros, informações precisas,

caracteres ostensivos e legíveis, cláusulas restritivas de direito em destaque, dentre

outras.

Logo, verifica-se que a utilização dos contratos de adesão tornou-se

indispensável para o prosseguimento e progresso das atividades comerciais; em

consequência da extrema massificação das relações de consumo; ocasionada pelo

processo de industrialização.

Cabe reiterar que o contrato de adesão embora necessário, pode ser bastante

ardiloso ao consumidor, se suas cláusulas forem elaboradas de forma iníqua e em

desrespeito aos princípios contratuais, especialmente ao da boa-fé.

A cláusula de carência é um exemplo notório de dispositivo contratual capaz

de acentuar excessivamente a desigualdade entre os contraentes, e que é inserida

frequentemente nas promessas de compra e venda de unidade imobiliária (por

adesão); causando situação de nítida desvantagem e abusividade ao adquirente.

55 Artigo 54 - Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo. § 1º - A inserção de cláusula no formulário não desfigura a natureza de adesão do contrato. § 2º - Nos contratos de adesão admite-se cláusula resolutória, desde que alternativa, cabendo a escolha ao consumidor, ressalvando-se o disposto no § 2º do artigo anterior. § 3º Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, cujo tamanho da fonte não será inferior ao corpo doze, de modo a facilitar sua compreensão pelo consumidor. § 4º - As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão.

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4. A CLÁUSULA DE CARÊNCIA E A PROTEÇÃO DO ADQUIRENTE:

ANÁLISE ACERCA DE SUA ILEGALIDADE

4.1. DA CLÁUSULA DE CARÊNCIA

A cláusula de carência é uma disposição contratual presente em grande parte

dos compromissos de compra e venda de imóveis na planta. Entretanto, antes de

adentrar-se no mérito da questão é necessário tecer algumas considerações a

respeito do conceito e dos efeitos da referida cláusula, objeto da presente pesquisa.

A referida cláusula, também conhecida como prazo de tolerância é um

dispositivo contratual que tem como premissa a regulação do prazo de conclusão da

obra e de possíveis prorrogações deste período.

As cláusulas contidas no compromisso de compra e venda são responsáveis

por moldar o negócio jurídico firmado, de modo a definir reciprocamente os direitos e

obrigações de cada uma das partes. O contrato é o compromisso firmado, que

metaforicamente estabelece as “regras do jogo”; ou seja, direciona e apresenta

minuciosamente todas as estipulações acerca da forma do cumprimento das

obrigações; bem como elucida expressamente os direitos de cada contraente, ou

seja: “expressa, assim, a ideia do ajuste, da convenção, do pacto ou da transação

firmada ou acordada entre duas ou mais pessoas para um fim qualquer, ou seja,

adquirir, resguardar, modificar ou extinguir direitos56”.

Sem mais delongas, a cláusula de carência é comumente inserida no corpo

dos contratos de aquisição de imóvel na planta; e tem por finalidade garantir prazo

extraordinário para a conclusão e entrega das obras. Ou seja, o contrato é

flexibilizado em favor da incorporadora; que poderá finalizar o empreendimento com

atraso, sem, contudo, ser responsabilizada por isso.

Se por um lado, as principais obrigações do incorporador relacionam-se

estritamente à boa execução das obras e à entrega do empreendimento na data

aprazada, em contrapartida o promitente comprador obriga-se a adimplir o preço do

bem, conforme condições do contrato.

Devido ao superaquecimento no setor imobiliário e da construção civil, novos

empreendimentos passaram a ser lançados periodicamente a fim de atender a alta

56 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 217.

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demanda de consumidores, em busca de um imóvel próprio ou tão simplesmente, de

investimentos seguros.

Entretanto, apesar dos altos lucros auferidos na atividade da incorporação

imobiliária, os empreendimentos em fase de execução costumam trazer alguns

riscos à incorporadora que deve estar extremamente preparada para assumir um

negócio de grande monta como este; haja vista a imprescindibilidade de

planejamento e estudo de campo, de modo a garantir que a execução das obras

ocorra conforme o cronograma programado, sem que ocorram atrasos ou

divergências com o projeto inicial.

Por muitas vezes as obras acabam não sendo finalizadas em conformidade

ao ajustado no contrato, gerando à incorporadora e por vezes, à construtora o dever

de reparação de danos; seja pelos abalos morais decorrentes da frustração com o

atraso para entrega do bem, ou ainda, pelos danos materiais que podem ser

subdivididos em duas esferas: danos emergentes e lucros cessantes.

Diante de tal paradoxo e considerando o estudo de mercado e os riscos da

atividade, a maioria das incorporadoras optou por incluir em seus contratos de

adesão uma cláusula específica, popularmente conhecida como cláusula de

carência.

A cláusula de carência visa estender o prazo contratualmente ajustado para a

entrega da unidade imobiliária. Portanto, por meio de tal instrumento, a

incorporadora reserva-se no direito de dilatar, de prorrogar o prazo final de

conclusão do empreendimento por período de aproximadamente e 120, 180 ou até

270 dias. A dilação do prazo para a entrega da unidade é variável, visto que é

ajustado em detrimento do melhor interesse do incorporador.

Portanto, se por algum motivo houver o retardamento ou paralisação das

obras, de modo que o empreendimento imobiliário não fique pronto no período

contratualmente definido, poderá a contratada, valer-se de tal cláusula para

resguardar-se de eventuais indenizações ou rescisões contratuais.

A cláusula de tolerância como o próprio nome já diz, tem o condão de

proporcionar a tolerância forçada da parte adversa, em relação ao atraso na entrega

do imóvel, de modo que durante a vigência de tal carência o contratante nada possa

intentar contra a contratada, no que se refere à responsabilização civil da mesma.

Infere-se em absoluto quanto à utilização da cláusula de carência, haja vista que a

mesma proporciona vantagem excessiva e despropositada à incorporadora.

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Entretanto, cabe salientar a existência de entendimentos contrários57, os

quais vislumbram a cláusula de carência como ajuste necessário à segurança

jurídica do incorporador, que por desenvolver atividade de complexo risco, deve ser

resguardado; em detrimento da possibilidade fática de possíveis imprevistos ao fiel

cumprimento do prazo de entrega do empreendimento.

Embora a Lei 4591/1964 regule profundamente questões relativas à

incorporação imobiliária, com traços consumerista; não consta na referida lei e em

nenhuma legislação em vigor normas que regulem formalmente o dilema referente

ao atraso na entrega de obras e empreendimentos, bem como quanto à legalidade

ou ilegalidade da cláusula de carência.

Ante a ausência de legislação acerca do tema, faz-se imprescindível uma

análise sob o prisma doutrinário e jurisprudencial, de modo a equiparar alguns

institutos já pacificados e analogicamente criar um entendimento sobre a

legitimidade ou não da utilização das clausulas de carência.

É fundamental que a pessoa física ou jurídica que irá adentrar ao ramo da

incorporação imobiliária tenha conhecimento prévio das etapas necessárias para a

construção, aperfeiçoamento e finalização do empreendimento, de modo a prever os

eventuais riscos de tal atividade.

Não se pode conceber que a incorporadora na qualidade de fornecedora, seja

favorecida por disposição contratual que lhe resguarde de arcar com o

descumprimento de sua obrigação. Ademais, o prazo ajustado para a efetiva entrega

da unidade imobiliária deve ser rigorosamente cumprido, sem que seja possibilitada

a utilização de prazos suplementares que visem prolongar o tempo de espera do

adquirente.

Embora o contrato possua por regra geral sua obrigatoriedade; o principio do

pacta sunt servanda carece de relativização em situações em que haja inconteste

57 COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. AQUISIÇÃO DE UNIDADE AUTÔNOMA. ALEGAÇÃO DE CLÁUSULA ABUSIVA. DESCABIMENTO. CLÁUSULA PREVENDO O PRAZO DE TOLERÂNCIA DE 180 DIAS QUE NÃO SE MOSTRA ABUSIVA, INCLUSIVE ESTE PRAZO É DE PRAXE NAS NEGOCIAÇÕES ENVOLVENDO IMÓVEL EM CONSTRUÇÃO. SUPERVENIÊNCIA DE ATRASO NA ENTREGA DA UNIDADE CONDOMINIAL POR 05 (CINCO) MESES APONTADA EM SEDE DE APELAÇÃO. AUTORES QUE NÃO DEMONSTRARAM SATISFATORIAMENTE OS PREJUÍZOS MATERIAIS SOFRIDOS, PRINCIPALMENTE NO QUE TANGE AO PAGAMENTO DE ALUGUERES. RECURSO DESPROVIDO. (SÃO PAULO: Tribunal de Justiça, 10ª Câmara de Direito Privado, Apelação Cível nº 0121178-92.2009.8.26.0100, Relator: Coelho Mendes, Julgado em: 31.01.2012. Disponível em: www.tjsp.jus.br. Acesso em: 14/09/2012).

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desequilíbrio contratual, de modo que em função de tal pacto uma das partes seja

prejudicada e assuma ônus desproporcionais.

Ademais, a obrigatoriedade do contrato possui estreita relação com o

princípio da autonomia da vontade. Considerando que a noção clássica de contrato

sofreu fortes alterações, de modo que a liberdade de contratar passou a ser

extremamente limitada em contratos massificados; faz-se necessária a flexibilização

do “pacta sunt servanda”58, a fim de que o instrumento contratual adapte-se a atual

realidade fática das partes.

Não se trata de um enfraquecimento desmedido do instituto contratual; mas

propriamente de garantir a existência de vinculo obrigacional equilibrado e

proporcional entre os contraentes. A revisão do contrato59 visa dar novos contornos

à relação jurídica eivada por cláusulas abusivas ou disposições que concedam

exagerada desvantagem ou prejuízo. Portanto, o contrato é preservado em prol de

uma cautelosa revisão de seus termos.

O contrato deve vigorar em conformidade ao princípio do equilíbrio contratual,

fato que não se faz possível frente à utilização usual e cada vez mais desmedida da

cláusula de carência, a qual representa dispositivo restritivo dos direitos do

consumidor, ademais, notoriamente abusivo e ilegal, que tende a desarmonizar

ainda mais a relação de consumo.

4.2. A CLÁUSULA DE CARÊNCIA E A PROTEÇÃO DO ADQUIRENTE

A cláusula de carência enseja a necessidade de um sistema de proteção ao

adquirente de unidades imobiliárias60 em empreendimentos regidos pelo regime da

incorporação imobiliária que exceda as disposições protetivas da Lei nº. 4591/1964,

visto que a mesma deixou de normatizar ajustes acerca da utilização da cláusula de

carência, sendo imprescindível a utilização subsidiaria do Código de Defesa do

Consumidor.

58 “(...)o contrato celebrado que seja com observância de todos os pressupostos e requisitos necessários à sua validade, deve ser executado pelas partes como se suas cláusulas fossem preceitos legais imperativos.” GOMES, Orlando. Contratos. 18ª ed, Forense, Rio, 1998, p. 36.

59 No que tange à revisão contratual, o Código de Defesa do Consumidor enuncia como direito básico do consumidor em seu artigo 6º, V: “a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais. (...)" 60 CHALHUB, Melhim Namen. Da Incorporação Imobiliária. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p.265.

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O Código de Defesa do Consumidor deve ser vislumbrado como uma

legislação complementar que visa suprimir as lacunas da Lei 4591/1964, de modo a

possibilitar a prestação de uma tutela protetiva mais ampla e segura ao adquirente.

É essencial salientar que a Lei das Incorporações Imobiliárias é precursora no

que concerne a estipulação legal de direitos relativos aos consumidores, na pessoa

dos adquirentes das unidades imobiliárias; possuindo forte correlação e vinculação

com o CDC, visto que ambas as legislações sustentam-se sob as mesmas

perspectivas e princípios.

O contrato de incorporação imobiliária deve ser equiparado ao contrato de

consumo, de forma que suas disposições sejam também regidas pelos ditames do

Código de Defesa do Consumidor, uma vez que não se pode sustentar que o

consumidor e o fornecedor estejam em escala de igualdade em uma relação jurídica

imobiliária:

(...) apesar desse regime peculiar de proteção, o CDC veio a equiparar, de forma indireta, o contrato de incorporação ao contrato de consumo, ao classificar o imóvel como produto e incluir a construção e a comercialização de produtos entre as atividades que caracterizam a figura do fornecedor.61

Entretanto, a utilização do Código de Defesa do Consumidor não deve ser

ilimitada, devendo o mesmo atuar complementarmente, sob pena de desconstituição

da estrutura e objeto do contrato de incorporação imobiliária. Ademais, Chalhub

brilhantemente sistematiza tal situação:

Apesar de a legislação sobre incorporações contemplar adequado sistema de proteção ao adquirente, o CDC, de forma indireta, equipara o contrato de incorporação ao contrato de consumo, ao classificar o bem imóvel como produto para efeito das relações jurídicas de consumo e, além disso, ao considerar a construção e a comercialização de imóveis como atividades caracterizadoras da figura de fornecedor.62

.

Logo, as omissões da Lei 4591/1964 devem ser preenchidas pelas

disposições do Código de Defesa do Consumidor a fim de possibilitar a efetivação

de uma tutela jurisdicional protetiva ao adquirente, de maneira ampla e eficaz. Neste

diapasão a jurisprudência tem entendido da seguinte maneira:

61 CHALHUB, Melhim Namen. Da Incorporação Imobiliária. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p.290. 62 CHALHUB, Melhim Namen. Da Incorporação Imobiliária. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p.266.

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PROMESSA DE COMPRA E VENDA. Empresa imobiliária. incidência do Código de Defesa do Consumidor. Rege-se pela Lei 4.591/64, no que tem de específico para a incorporação e construção de imóveis, e pelo CDC o contrato de promessa de compra e venda celebrado entre a companhia imobiliária e o promissário comprador. Recurso conhecido e provido.63

Equiparando-se a figura do incorporador a do fornecedor, tem-se que o

mesmo possui notória vantagem técnica, econômica e jurídica frente ao consumidor

– adquirente. Ora, o consumidor é notoriamente o polo mais frágil e mais fraco da

relação de consumo, visto tratar-se de individuo vulnerável e por vezes,

hipossuficiente; não possuindo as mesmas condições de avaliar e responder pelo

contrato.

A vulnerabilidade do consumidor concerne em sua suscetibilidade a abusos e

lesões em decorrência da complexidade do mercado de consumo, e, sobretudo, de

condutas que asseveram ainda mais a disparidade de forças entre consumidor e

fornecedor.

Diante de uma sociedade de consumo massificada é comum que os

fornecedores façam uso de artifícios que restrinjam ainda mais os direitos do

consumidor, como a utilização de contratos de adesão, formulados unilateralmente e

com cláusulas pré-estabelecidas, as quais não podem ser discutidas, nem

negociadas. Trata-se de nítida limitação à autonomia da vontade do consumidor,

que tem sua liberdade de contratar limitada à simples adesão do contrato elaborado

pelo fornecedor. Tal formatação de contrato facilita ainda mais, práticas ardilosas,

denominadas abusivas. “O artigo 54 do CDC classifica como “por adesão” os

contratos que as construtoras apresentam para assinatura pelos adquirentes.64”

Portanto, frente à vulnerabilidade do consumidor é preciso que haja um

rompimento com o estigma da igualdade formal, de modo que os adquirentes de

unidades imobiliárias sejam resguardados por uma tutela especial protetiva.

63 BRASIL: Superior Tribunal de Justiça, 4ª Turma. Recurso Especial nº 299.445/PR – Paraná, Reg. nº 2001/0003200-1. Relator: Ministro Ruy Rosado de Aguiar: Julgado em: 20/08/2001. Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200100032001&dt_publicacao=20/8/2001. Acesso em: 12/07/2012. 64 SÃO PAULO: Tribunal de Justiça, 8ª Câmara Cível. Apelação Cível nº 385.384.4/5. Relator: Des. Caetano Lagrasta, Julgado em: 17.03.2010. Disponível em: https://esaj.tjsp.jus.br/cpo/sg/show.do?processo.foro=990&processo.codigo=RMZ00KKA60000. Acesso em: 17/09/2012.

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O equilíbrio entre fornecedor e consumidor no que tange às relações

consumeristas só será alcançado igualando-se os desiguais na medida de suas

desigualdades.

Assim, considerando que o consumidor é notoriamente vulnerável; nos

contratos de compra e venda de unidade imobiliária faz-se imprescindível que seus

interesses sejam regidos por disposições especiais além das dispostas na Lei nº.

4591/1964, as quais estão previstas no Código de Defesa do Consumidor, de modo

a atenuar a discrepância entre as partes do contrato.

O contrato de compra e venda de imóvel em fase de construção, ou ainda, o

instrumento de incorporação imobiliária deve ser analisado e interpretado da

maneira mais favorável ao consumidor, nos termos do artigo 47 do Código de

Defesa do Consumidor; de modo que as cláusulas que restrinjam seus direitos ou

lhe causem prejuízos excessivos, sejam anuladas. Ainda, a respeito da interpretação

das cláusulas contratuais, o artigo 113 do Código Civil65 elucida o dever de

interpretação de tais instrumentos a luz do princípio da boa-fé.

A interpretação do instrumento contratual exerce concomitantemente duas

funcionalidades distintas a saber: objetiva e subjetiva; visto que além de analisar as

dimensões e limitações do negócio jurídico celebrado e de suas respectivas

cláusulas; ainda deverá ser observado a manifestação volitiva de cada um dos

contraentes; ou seja, a intenção das partes. Assim, apesar de falar-se de limitação

da autonomia da vontade no que concerne aos contratos de adesão; a interpretação

de tal instrumento deve ocorrer em consonância a expectativa negocial de cada um

dos contraentes. Diz-se, portanto, que a cláusula de carência é ilegal pois sua

interpretação leva a uma concepção ardilosa e contraria aos interesses do

adquirente no ato da celebração do compromisso de compra e venda.

Cabe frisar que o artigo 54, § 4º, do Código de Defesa do Consumidor66,

assevera que todas as cláusulas limitativas de direitos do adquirente devem estar

redigidas de maneira destacada, a fim de possibilitar sua imediata e fácil percepção

e compreensão. Ademais, no que concerne a cláusula de tolerância; a mesma

65 Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do

lugar de sua celebração. 66 Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo. § 4° As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão.

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geralmente é inserida no contrato sem nenhum destaque; de modo que passa

despercebida.

Portanto, é de excepcional importância que os contratos de adesão sejam

interpretados sempre da maneira mais favorável ao consumidor, em detrimento da

vulnerabilidade e hipossuficiencia que o perseguem; sendo imprescindível uma

tutela especial capaz de protegê-lo de possíveis abusos e práticas ilegais, como é o

caso da cláusula de carência.

A regra geral dos contratos prima pela boa-fé e pelo equilíbrio nos negócios

jurídicos, princípios que se articulam e delineiam a formação e desenvolvimento das

relações entre particulares, especificamente as relações de consumo.

Os contratos de incorporação imobiliária usualmente; de forma unilateral e

abusiva, apresentam cláusulas estabelecendo “prazos de carência” para a entrega

da unidade imobiliária. Tal disposição acerca da dilação do prazo para conclusão e

entrega do empreendimento deve ser sopesada e analisada à luz do Código de

Defesa do Consumidor e, sobretudo, em conformidade à legislação específica ao

caso, Lei nº. 4591/1964.

Apesar da lei nº. 4591/1964 oferecer perspectivas protetivas ao adquirente de

imóvel na planta no caso de inadimplemento do incorporador, faz-se necessária uma

tutela expansiva, que amplie o auxílio ao adquirente em face dos complexos

contratos de incorporação imobiliária, sobretudo em especial no que concerne a

cláusula de carência.

A cláusula de carência deve ser declarada ilegal e abusiva em sua essência,

uma vez que esta em dissonância com a principiologia basilar que rege as relações

contratuais decorrentes da incorporação imobiliária, especificamente no que refere-

se ao adquirente.

Ora, são princípios basilares e irrefutáveis dos contratos, o dever de boa-fé

objetiva. A boa-fé relaciona-se ao ideal de lealdade, ou ainda, à perspectiva de

cooperação entre as partes, ou seja, a busca comum dos contraentes para a

consecução e fiel cumprimento dos termos do negocio jurídico celebrado; de modo

que não haja qualquer prejuízo ou desvantagem a qualquer uma das partes.

A boa-fé possui direta ligação com o cumprimento da função social do

contrato, de forma que o negocio jurídico seja exteriorizado faticamente em

conformidade com as reais e legitimas expectativas do adquirente, e também do

incorporador. Considerando que a obrigação assumida pelo incorporador é de

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resultado, o desenvolvimento do empreendimento em discordância com o escopo

contratual gera responsabilização objetiva ao mesmo.

O contrato na esfera da incorporação imobiliária presume a venda antecipada

de um imóvel, do qual se tem somente o projeto, de modo que ainda ocorrerão

diversas etapas até a sua efetiva entrega ao adquirente e sua consequente

propriedade pelo mesmo.

A cláusula de carência surge como beneficio impróprio ao incorporador, que

se resguarda no direito de atrasar a conclusão das obras e a entrega das unidades

imobiliárias por prazo superior ao convencionado no contrato. Ora, tal dispositivo

visa asseverar a desigualdade entre as partes, de modo que o incorporador seja

revestido por vantagens e proveitos abusivos.

É interessante frisar que a obrigação do adquirente vem expressamente

regulada no contrato, de modo que a forma de pagamento prevê sanções em caso

de inadimplência ou mora, gerando diversos reflexos ao consumidor. Entretanto, o

atraso quanto à entrega do bem, geralmente não apresenta nenhuma previsão de

indenização ao adquirente.

A utilização da cláusula de carência enseja notório desequilíbrio contratual,

uma vez que o incorporador é acometido de vantagem indevida; que restringe os

direitos do adquirente.

Ademais, a promessa de compra e venda das unidades do empreendimento

imobiliário representa um contrato preliminar, o qual regula as condições do negócio

jurídico celebrado; no caso de estipulação referente a cláusula de carência, o prazo

para entrega da unidade conta com a possibilidade de prorrogação automática, em

prazo aquém do convencionado; hipótese em que o incorporador seria eximido de

qualquer responsabilização civil pelo inadimplemento de sua obrigação. O ajuste

contratual referente à tolerância de atraso para a efetiva entrega da unidade

imobiliária representa situação de notória desarmonia obrigacional.

Embora a Lei 4591/1964 disponha de dispositivos normativos que objetivam a

proteção jurídica do adquirente, tal proteção merece ser estendida, por meio da

utilização subsidiária do Código de Defesa do Consumidor, a fim de que o

compromisso de compra e venda, seja configurado como uma legítima relação de

consumo.

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O artigo 5167 do Código de Defesa do Consumidor considera abusiva e nula

de pleno direito as cláusulas que estabeleçam obrigações consideradas iníquas,

abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam

incompatíveis com a boa-fé ou a equidade. A conceituação de desvantagem

exagerada é feita no § 1º do referido artigo, de modo que entende-se como aquela

que restringe de maneira efetiva os direitos do consumidor, aqui diga-se, adquirente,

no que refere-se a obrigações essenciais do contrato. Sabe-se que as obrigações

principais decorrentes do compromisso de compra e venda de unidade imobiliária

são duas, as quais sejam: o pagamento do preço pelo adquirente, de modo a

remunerar o incorporador e proporcionar investimento para o desenvolvimento das

obras, e a entrega da unidade imobiliária individualizada do empreendimento, a ser

feita pelo incorporador na data ajustada em contrato, de modo a proporcionar ao

adquirente o uso, gozo, fruição e disposição sobre o bem imóvel objeto do contrato.

Desse modo, verifica-se que em observância a legislação de defesa do

consumidor e aos princípios nela contidos, que a estipulação de “prazo de carência”

nos contratos de aquisição de unidade imobiliária, caracteriza notória ilegalidade e

abuso; visto que é causa de desequilíbrio contratual e onera excessivamente o

adquirente, que é submetido a tolerar vantagem manifestamente exagerada em prol

do incorporador, suportando tão somente o ônus do atraso da obra.

Tal ilegalidade toma forma pelo desequilíbrio contratual existente entre as

partes, seja pela unilateralidade do contrato (contrato de adesão), e ainda pelo fato

de que a lei não estipula, nem legitima o prazo de carência, e nem faculta às

empresas nenhuma carência para que cumpram o contratado. Alguns magistrados

posicionam-se favoravelmente à ilegalidade da cláusula de carência:

PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – ATRASO NA ENTREGA DA OBRA – INDENIZAÇÃO POR LUCROS CESSANTES – TEORIA DA IMPREVISÃO – INAPLICABILIDADE. PRORROGAÇÃO DO PRAZO DE TOLERÂNCIA – CLÁUSULA ABUSIVA – CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. (…) 3. A cláusula que faculta à construtora o adiamento

67 Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao

fornecimento de produtos e serviços que: IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade; § 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vontade que: (...) II - restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual; III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.

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da entrega da obra por doze meses após o prazo previsto, sem qualquer justificativa para tanto, é abusiva e nula de pleno direito, por configurar nítido desequilíbrio contratual, rechaçado pelo Código de Proteção e Defesa do Consumidor. 4. Recurso do autor provido parcialmente. Recurso da ré improvido. Decisão unanime. .68

É preciso que haja equilíbrio contratual, sob pena de nulidade de pleno direito

das cláusulas que estabelecem obrigações desproporcionais entre as partes e

tragam excessiva vantagem a uma delas, especialmente quando o prejudicado é o

consumidor. Não se pode aceitar, que injustificadamente, ou por motivos ínfimos, o

consumidor seja prejudicado pelo atraso na entrega de seu imóvel.

Não se pode conceber, que um contrato confira vantagem a uma das partes e

a outra não. Se assim fosse, caso o contrato dê a incorporadora o direito de atrasar

o cumprimento de sua obrigação (entregar o imóvel), o mesmo direito deveria ser

conferido ao adquirente, de modo a ter um “prazo de carência” para o cumprimento

de suas obrigações (realização dos pagamentos). Logo, se o contrato concede esse

direito à incorporadora e não o defere ao adquirente, pode-se concluir que há

desrespeito à exigência do Código de Defesa do Consumidor no que se refere ao

equilíbrio contratual.

O equilíbrio na relação contratual é requisito indispensável em detrimento da

necessidade de compensar-se a vulnerabilidade do consumidor; o qual visivelmente

encontra-se em situação desguarnecida frente ao incorporador; na pessoa do

fornecedor. O contrato deve ser regido por preceitos ligados intimamente à

transparência a qual faz menção imediata à questão da confiança e ao dever de

informação.

A transparência no contrato de compra e venda de imóvel na planta

representa o dever do incorporador em apresentar ao promitente comprador todas

as informações relevantes acerca do negocio jurídico; de modo a abranger com

veracidade todas as etapas do contrato; desde sua constituição até sua conclusão.

O contrato embora de adesão, deve possuir linguagem didática que possibilite a fácil

e exata compreensão de todos os dispositivos que o compõe. Denota-se entretanto;

que a cláusula de carência representa obscuridade contratual, uma vez que a

mesma é apresentada como possibilidade remota; quando é citada no ato da

celebração do negocio.

68 DISTRITO FEDERAL: Tribunal de Justiça, 5ª Turma. Apelação Cível nº. 48.245/1998. Relatora: Des. Adelith de Carvalho Lopes. Julgado em: 08.02.1999. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/diarios/39031871/djpr-27-07-2012-pg-249. Acesso em:15/07/2012.

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O adquirente compra o imóvel na planta com expectativa legitima que o

mesmo lhe será entregue no prazo previsto em contrato, entretanto, a incorporadora

utiliza-se de tal armadilha para resguardar possível atraso em seu cronograma,

condição que não ocorre para com o adquirente, visto que não lhe é possibilitado

qualquer dilação ou prorrogação ao cumprimento de sua obrigação pecuniária.

Ademais, deve-se considerar que a cláusula de carência modifica

arbitrariamente estipulação essencial do contrato, de modo a afetar

incontestavelmente o adquirente. O prazo de entrega representa a expectativa de

obtenção da posse do imóvel adquirido, de modo que grande parte, senão sua

maioria absoluta planeja e direciona preparativos para referida data.

O contrato de compra e venda no que concerne especificamente à cláusula

de carência, apresenta por si só, notório desequilíbrio, visto que tal cláusula

apresenta-se como sujeição desigual e desproporcional ao consumidor. Em outras

palavras, a isonomia nas obrigações e direitos resta fragilizada por tal cláusula, que

permite a prorrogação na entrega da obra, dilatando, por conseguinte o prazo de

cumprimento das obrigações contratuais da incorporadora, fato que não acontece

com o adquirente que não possui a possibilidade de prorrogar sua obrigação de

pagar o preço ajustado.

Neste mesmo diapasão enuncia o doutrinador Felipe Peixoto Braga Netto:

Serão inválidas as disposições que ponham em desequilíbrio a equivalência entre as partes. Se o contrato situa o consumidor em situação inferior, com nítidas desvantagens, tal contrato poderá ter a sua validade judicialmente questionada, ou, em sendo possível, ter apenas a cláusula que fere o equilíbrio afastada.69

A cláusula de carência não deve eximir a responsabilização da incorporadora

pelo atraso na entrega do empreendimento. Tal cláusula é ilegal e representa

situação abusiva que expõe o consumidor a disposição arbitrária que o coloca em

condição desvantajosa e, sobretudo, desigual.

É preciso que o contrato confira a ambas às partes direitos e deveres

equânimes, de modo que nenhum dos contraentes seja obrigado a suportar

prejuízos.

69 BRAGA NETTO, Felipe Peixoto. Manual de Direito do Consumidor. Salvador: Juspodivm, 2009, p.154.

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Por vezes, em defesa as incorporadoras suscitam que a cláusula de carência

simboliza o zelo das mesmas, para com o consumidor, tal justificativa não procede e

não carece de acolhimento, haja vista que o contrato firmado deve prever

obrigações equitativas, fato que não condiz com a realidade.

Portanto, a não entrega da unidade imobiliária no prazo previsto no

compromisso de compra e venda é suficiente para ensejar o inadimplemento

contratual e o dever de indenizar, senão vejamos:

COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL A PRESTAÇÃO. PRAZO DE ENTREGA DO IMÓVEL COMPROMISSADO. INADIMPLÊNCIA DA COMPROMISSÁRIA VENDEDORA. PRAZO DE TOLERÂNCIA PREVISTO NO CONTRATO. Considera inadimplente a construtora e compromissária vendedora quando não faz entrega do bem compromissado no prazo previsto no contrato, autorizando o acolhimento do pedido de rescisão feito pelo compromissário comprador, com devolução de todas as parcelas pagas, devidamente corrigidas, mais juros de mora e outras penalidades previstas em contrato. O prazo de tolerância previsto no contrato somente é justificativa para prorrogação do prazo contratual de entrega do imóvel compromissado quando ocorrer caso fortuito ou força maior devidamente comprovado nos autos.70

Ademais, é oportuno frisar que a incorporadora exerce atividade empresarial,

que vislumbra como objetivo final, o lucro. Por assim ser, deve arcar com os riscos

emanados de tal atividade e responsabilizar-se pelos danos ocasionados, como:

defeitos, atrasos, entre outros. Entretanto, deseja gozar tão somente do benefício e

transferir o ônus, numa postura violadora da boa-fé objetiva e em nítido

descompasso com o direito protetivo do consumidor.

Portanto, os contratos devem ser regidos pela probidade e pelo equilíbrio

contratual, os quais se coadunam na razoabilidade e proporcionalidade entre

prestações e contraprestações.

A boa-fé nada mais é do que a satisfação e o devido cumprimento das

expectativas e interesses expressados no instrumento contratual. Logo, verifica-se

que a cláusula de carência é causa latente de desequilíbrio contratual, haja vista que

onera excessivamente ao adquirente, que embora cumpra fielmente com suas

obrigações é lesado pela dilação do cumprimento da contraprestação da parte

adversa, a qual concerne na entrega do bem.

70 MINAS GERAIS: Tribunal de Justiça, 7ª Câmara Cível. Apelação Cível nº. 361.743-8.

Relator: Des. José Affonso da Costa Côrtes. Julgado em: 06.06.2002. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/diarios/37052494/djpr-17-05-2012-pg-386. Acesso em: 15/05/2012.

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O contrato concernente à compra e venda de unidade imobiliária na planta,

em regime de incorporação imobiliária nada mais é do que uma relação de consumo,

a qual deve ser lastreada pela harmonia e equilíbrio entre os interesses dos

contraentes e as respectivas prestações e contraprestações envolvidas; neste

sentido João Batista Almeida explica:

(...) o objetivo da Política Nacional de Relações de Consumo deve ser a harmonização dos interesses envolvidos e não o confronto ou o acirramento de ânimos. Interessa às partes, ou seja, aos consumidores e fornecedores, o implemento das relações de consumo, com o atendimento das necessidades dos primeiros e o cumprimento do objeto principal que justifica a existência do fornecedor: fornecer bens e serviços. Colima-se, assim, o equilíbrio entre as partes.71

Logo, em prol do equilíbrio e harmonia das relações de consumo em especial,

nas de âmbito imobiliário, cláusulas que representem efetiva onerosidade ou

prejuízo a uma das partes do negócio jurídico devem ser invalidadas, visto que

eivadas de abusividade e ilegalidade que desvirtuam a relação de consumo.

Essencial neste diapasão a reavaliação dos contratos de compra e venda de

unidade imobiliária em caráter antecipado, nos casos em que apresentem dispositivo

relativo ao prazo de carência para conclusão do empreendimento; situação em que

tal clausula deve ser desconsiderada e declarada nula, a fim de proporcionar o

reequilíbrio entre deveres e direitos no que toca ao adquirente.

Cabe mencionar que existem hipóteses excepcionais que legitimam em parte,

a utilização da cláusula de carência, as quais sejam: caso fortuito e força maior,

situações que não eram possíveis de serem previstas ou de evitadas. Entretanto,

verifica-se que raramente a utilização do prazo de carência se dá em função de fatos

imprevisíveis, mas sim, por mera liberalidade.

Apesar da existência das hipóteses excludentes de responsabilidade civil, é

importante que as incorporadoras estejam cientes de que somente situações

extremas, as quais não são possíveis de prever ou evitar serão admitidas como caso

fortuito e força maior; e legitimarão o atraso da obra, senão vejamos:

(…). Com efeito. Sucede, nas palavras de De Plácido e Silva, que se considera caso fortuito os acidentes que ocorrem sem que a vontade do homem os possa impedir ou sem que tenha ele participado, de qualquer

71 ALMEIDA, João Batista. A Proteção Jurídica Do Consumidor.4. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p.17.

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maneira, para a sua efetivação. Todos os casos, que se revelam por ‘força maior’, dizem-se ‘casos fortuitos’, porque ‘fortuito’, do latim fortuitus, de fors, quer dizer casual, acidental, ao azar. CUNHA GONÇALVES, aprofundando-se no tema, esclarece que o caso fortuito é, no sentido exato de sua derivação (acaso, imprevisão, acidente), o caso que não se poderia prever e se mostra superior às forças ou vontade do homem, quando vem, para que seja evitado. O motivo de força maior é o fato que se prevê ou é previsível, mas que não se pode, igualmente, evitar, visto que é mais forte que a vontade ou ação do homem. Assim, ambos se caracterizam pela irresistibilidade. E se distinguem pela previsibilidade. Legalmente são, entre nós, empregados como equivalentes. E a lei civil os define como o advento do fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir, assemelhando-os em virtude da invencibilidade, inevitabilidade ou irresistibilidade que os caracterizam.72

Portanto, em detrimento da abusividade da cláusula que estabelece carência

para a entrega da unidade imobiliária, por meio de prazo suplementar; vislumbra-se

notoriamente sua ilegalidade; haja vista o extremo desequilíbrio contratual que

enseja; sobretudo no que condiz a excessiva onerosidade que é transmitida ao

adquirente. Logo, a clausula de carência deve ser declarada nula, visto que fere

diretamente as disposições consumeristas; devendo ainda, ser cuidadosamente

analisada, no que refere-se a situações de caso fortuito e força maior; sob a égide

da teoria do risco empresarial.

4.3. DA NULIDADE DA CLÁUSULA DE CARÊNCIA DIANTE DO

RECONHECIMENTO DE SUA ILEGALIDADE E ABUSIVIDADE

Nos termos do artigo 51, IV do Código de Defesa do Consumidor são eivadas

de nulidade as cláusulas contratuais que estabeleçam obrigações iníquas ou

abusivas que coloquem o consumidor em extremada desvantagem; ou ainda, que

não estejam em consonância à boa-fé ou a equidade.

Fundamental reiterar que: “o objetivo da defesa do consumidor não é nem

deve ser o confronto entre as classes produtoras e consumidora, senão o de garantir

o cumprimento do objetivo da relação de consumo(...)”.73

Devem ser compreendidas como cláusulas abusivas aquelas que gerem

onerosidade excessiva ao consumidor, de modo a acentuarem a situação de

72 DISTRITO FEDERAL: Tribunal de Justiça, 1ª Turma. Apelação Cível nº.51.897/1999.

Relator: Des. Valter Xavier. Julgado em: 09.08.1999. Disponível em: http://www.radaroficial.com.br/d/4299001. Acesso em: 13/07/2012. 73 ALMEIDA, João Batista. A Proteção Jurídica Do Consumidor.4. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p.33.

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desequilíbrio entre as partes; restando em contrariedade à função social do contrato.

Destarte, a função social do instrumento particular celebrado entre

incorporadora e adquirente nada mais é do que o efetivo cumprimento do objeto do

contrato, o qual seja a execução de empreendimento imobiliário, do qual o

adquirente pagará quantia para efetuar a compra de unidade individualizada do

mesmo.

Entretanto, a liberdade contratual restringe-se aos limites da função social do

contrato, a qual em suma, pode ser conceituada como o equilíbrio entre ambos os

contraentes, a fim de coibir praticas abusivas e excessivamente onerosas ou

prejudiciais.

A cláusula de carência é notoriamente opressora dos direitos do adquirente

enquanto consumidor, haja vista que o prazo para entrega da unidade imobiliária é

postergado sem qualquer beneficio em favor do promitente-comprador, que é

obrigado a permanecer no aguardo da conclusão das obras, sem poder usufruir do

bem.

Deve-se levar em consideração que a compra de um imóvel é realizada de

forma minuciosa e planejada, ainda mais em se tratando de unidade a ser adquirida

na planta. Logo, o consumidor tem direito à contraprestação quando cumpre

fielmente com suas obrigações contratuais.

Ademais, a cláusula de carência oferece bônus a apenas uma das partes, a

incorporadora, que é beneficiada pela possibilidade de prorrogação do prazo de

entrega do bem, sendo medida de resguardo.

Ora, a inserção de dispositivo referente à concessão de prazo de carência no

que tange a entrega das unidades imobiliárias e a conclusão das obras do

empreendimento representa estratagema ardilosa e ímproba por parte das

incorporadoras, que criam a ilusão de que a entrega do imóvel será feita em data

aprazada contratualmente, a fim de angariar compradores, possibilitar o

financiamento do empreendimento e celebrar negócios.

Entretanto, olvidam-se de informar expressamente que a data definida

contratualmente é apenas e tão somente ilustrativa, não passando de mera

abstração; haja vista que não será cumprida, e que a data pretendida para

conclusão das obras e entrega do bem é outra, prevista em cláusula denominada de

carência.

As cláusulas contratuais devem ser razoáveis de forma que o instrumento

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particular represente um conjunto de disposições equilibrado, o qual obrigue os

contraentes de forma proporcional e isonômica.

Verificada a abusividade da cláusula de carência e sua patente ilegalidade

visto que fere os princípios da boa-fé objetiva, da equidade e do equilíbrio contratual

faz-se necessária a declaração de sua nulidade, a fim de que seja sanado o vício

contratual; harmonizando a relação de consumo novamente. Neste diapasão, temos

que:

Serão inválidas as disposições que ponham em desequilíbrio a equivalência entre as partes. Se o contrato situa o consumidor em situação inferior, com nítidas desvantagens, tal contrato poderá ter a sua validade judicialmente questionada, ou, em sendo possível, ter apenas a cláusula que fere o equilíbrio afastada.74

A nulidade de pleno direito, ou seja, a nulidade absoluta é a punição para as

cláusulas eivadas de abusividade.

É valido esclarecer que a declaração de nulidade da cláusula de carência não

tem o condão de afetar e inutilizar o contrato em toda sua extensão; tratando-se de

procedimento individualizado que visa sanar a abusividade de disposição contratual

determinada; conservando e preservando o objeto do contrato. Neste sentido, o

artigo 51, parágrafo 2º dispõe acerca da conservação do contrato; de modo que o

negócio jurídico celebrado continuará válido; afastando-se tão somente a cláusula

abusiva; responsável pela desarmonia contratual.

Como bem ressalta João Batista de Almeida75, não se trata de resolver o

contrato e de declarar sua integral nulidade; diante de uma cláusula abusiva, tal qual

a cláusula de carência, deve-se buscar ao máximo o adimplemento contratual, por

meio da revisão contratual, que invalidará as cláusulas consideradas abusivas.

Trata-se, portanto, de situação em que se carece de dirigismo contratual; ou

seja, deve haver intervenção estatal com o escopo essencial de garantir-se a função

social do contrato; minimizando, portanto, possíveis desigualdades e onerosidades

decorrentes de estipulação abusiva que viole a boa-fé objetiva e o dever de

equilíbrio.

CIVIL. PROCESSO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. PROMESSA DE COMPRA E

74 BRAGA NETTO, Felipe Peixoto. Manual de Direito do Consumidor. Salvador: Juspodivm,

2009, p. 117. 75 ALMEIDA, João Batista de. A Proteção Jurídica do Consumidor. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

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VENDA. INTERESSE DE AGIR COMPROVADO. DISPOSITIVO CONTRATUAL QUE SUJEITA A RECORRIDA A EXPRESSO DESEQUILÍBRIO CONTRATUAL. NULIDADE, NOS TERMOS DO ARTIGO 51 DO CDC. ADIMPLEMENTO DA AUTORA. ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL PELAS EMPRESAS RECORRENTES. INDENIZAÇÃO POR LUCROS CESSANTES DEVIDA. PROVA PERICIAL. DESNECESSIDADE. PREJUÍZO APURADO DE ACORDO COM OS ALUGUÉIS AOS QUAIS A REQUERENTE TERIA DIREITO, CASO AS RÉS NÃO SE CONSTITUÍSSEM EM MORA. APELO IMPROVIDO. SENTENÇA CONDENATÓRIA MANTIDA. (...) Imperiosa, neste caso, a declaração de nulidade do artigo 1º do contrato firmado entre as partes, que determina que o prazo para a entrega do imóvel pode ser prorrogado, por mais 180 (cento e oitenta) dias, por conveniência única e exclusiva da incorporadora, ou, ainda, pelo atraso do pagamento das parcelas dos demais adquirentes. 2. Constatado nos autos que a recorrida cumpriu adequadamente com suas obrigações, bem como comprovada a mora das empresas rés em relação à entrega do imóvel - que, diga-se de passagem, deveria ter sido entregue em 31JUL2007 (f. 49), correta a sentença que julga procedente o pleito da autora, para condenar as requeridas no pagamento de lucros cessantes, porquanto manifesto o ato ilícito por elas praticado - qual seja, a demora na entrega do imóvel -, que poderia estar rendendo lucros à autora desde a sua transferência, caso fosse realizada no termo pactuado (artigo 402 do CC/02).76

Por meio do dirigismo contratual a relação contratual celebrada deve

corresponder aos ditames da boa-fé, da dignidade e, sobretudo, da isonomia no que

refere-se a direitos e deveres; fato que não ocorre no que se refere ao prazo de

tolerância para entrega de unidades imobiliárias.

Nelson Nery Junior; compreende o dirigismo contratual como procedimento

peculiar; em que a intervenção estatal só se dará se faticamente houver situação ou

condição de notória desvantagem ou desarmonia no instrumento particular

celebrado entre os contraentes:

O dirigismo contratual não se dá em qualquer situação, mas apenas nas relações jurídicas consideradas como merecedoras de controle estatal para que seja mantido o desejado equilíbrio entre as partes contratantes.77

Logo, o dirigismo contratual denota limitação à liberdade de contratar, ou seja,

à própria autonomia da vontade; com a finalidade especial de possibilitar o

restabelecimento do equilíbrio entre as partes contratantes e obviar a proteção ao

76 DISTRITO FEDERAL: Tribunal de Justiça, 2ª Turma. Apelação Cível nº 2008.01.1.0069184. Relator: José Guilherme. Julgado em: 15/12/2009. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/8993319/acao-ci-vel-do-juizado-especial-acj 1204514120078070001-df-0120451-4120078070001-tjdf. Acesso em: 12/08/2012. 77 JÚNIOR, Nelson Nery. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado Pelos Autores do Anteprojeto. 5. ed. São Paulo:Forense Universitária, p. 348.

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consumidor.78

Carece ser declarada nula a cláusula que estabelece prazo de carência para

a entrega de imóvel adquirido antecipadamente em regime de incorporação

imobiliário, uma vez que tal estipulação contratual preceitua notória desvantagem ao

adquirente da unidade; exemplificando cláusula abusiva nos termos do artigo 51,IV

do Código de Defesa do Consumidor. A nulidade absoluta da cláusula de carência

objetiva a preservação da dignidade do adquirente e o equilíbrio contratual.

Em detrimento da ilegalidade e abusividade da clausula de tolerância, a

mesma deve ser declarada nula de pleno direito, a fim de que não produza qualquer

efeito no sentido de preservar a estabilidade e proporcionalidade do contrato.

78 ALMEIDA, João Batista. A Proteção Jurídica Do Consumidor.4. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p.141.

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5. AS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DO RECONHECIMENTO DA

ILEGALIDADE DA CLÁUSULA DE CARÊNCIA

5.1. DO DEVER DE INDENIZAR

A responsabilidade civil deve ser considerada a partir da análise de seu

conceito e do preenchimento dos requisitos, que tornam obrigatória a incidência do

dever de indenizar.

A responsabilidade é um vocábulo “oriundo do verbo latino respondere,

designando o fato de ter alguém se constituído garantidor de algo79”.

A responsabilidade civil, portanto, “conceitua-se como sendo a obrigação que

incumbe a alguém de ressarcir o dano causado a outrem, em virtude da inexecução

de um dever jurídico de natureza legal ou contratual (...).80”

A obrigação de indenizar é um dever jurídico secundário proveniente da

inobservância de um dever jurídico primário ou originário. “O descumprimento de um

dever originário, configura o ilícito, que frequentemente ocasiona dano para outrem;

gerando um novo dever jurídico, qual seja o de reparar o dano.”81

Logo, o descumprimento de cláusula do compromisso de compra e venda,

concretiza a hipótese de inadimplemento contratual (descumprimento de um dever

jurídico originário), presumindo a necessidade de reparação dos danos ocasionados

em detrimento de tal evento (dever jurídico sucessivo que corresponde ao dever de

indenizar).

Cabe salientar que embora o atraso na entrega da unidade não seja

condição de inadimplemento absoluto, visto que o incorporador em regra, ainda

poderá cumprir com sua prestação, ainda assim subsistirá a responsabilidade do

mesmo em função dos danos ocasionados.82

79 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 17. ed. Vol. 7. São Paulo: Saraiva, 2003, p.35. 80 WALD, Arnoldo. Direito Civil. 20 ed. Vol. 2. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 171. 81 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 2. 82 No que se refere ao inadimplemento absoluto e a mora, cabe tecer as seguintes considerações: “Apesar disso, há semelhança entre esses dois institutos, já que geram a mesma consequência, pois pelo Código Civil, arts. 389 e 394, o contratante moroso e o devedor absolutamente inadimplente responderão, havendo culpa, pela reparação do prejuízo causado ao credor pelo descumprimento da obrigação, pagando indenização por perdas e danos.” DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 17. ed. Vol. 7. São Paulo: Saraiva, 2003, p.212.

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A responsabilidade de ordem contratual concretiza-se em face do

descumprimento obrigacional fixado em uma relação negocial especifica. No que

concerne à incorporação imobiliária, tem-se que a inobservância do prazo de

entrega das unidades imobiliárias ajustadas no compromisso de compra e venda,

caracteriza pressuposto indiscutível à responsabilidade civil do incorporador.

Todo aquele que voluntariamente infringir dever jurídico estabelecido em lei ou em relação negocial, causando prejuízo a alguém, ficará obrigado a ressarci-lo (CC, arts. 186 e 927), pois uma vez vulnerado direito alheio, produzindo dano ao seu titular, imprescindível será uma reposição ao statu quo ante ou um reequilíbrio ao desajuste sofrido.83

Constituem-se como requisitos essenciais para a existência de

responsabilidade civil negocial a cumulatividade de quatro pressupostos, ou seja, a

violação de uma obrigação (descumprimento do prazo de entrega – atraso), nexo de

causalidade entre o fato e o dano (o dano suportado pelo adquirente ocorre devido

ao atraso na entrega da unidade adquirida; de modo que se a mesma tivesse sido

entregue pontualmente, inexistiriam tais infortúnios), culpa84 (visto que a inexistência

de culpa exime o dever de reparar) e efetivo prejuízo ao credor (dano de ordem

moral ou material que necessite ser compensado ou reparado).

A responsabilidade civil decorrente do descumprimento contratual se dá em

função de uma violação de um dever previamente ajustado e aderido pelas partes

contraentes, ora “a essência da responsabilidade contratual está na espera do

credor pela realização da prestação”.85

No caso em tela, o dever de reparar funda-se no atraso injustificado ao

adimplemento da obrigação contratual do incorporador, a qual seja, o fiel

desenvolvimento e execução das obras a fim de que a entrega das unidades

imobiliárias do empreendimento ocorra no prazo ajustado.

83 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 17. ed. Vol. 7. São Paulo: Saraiva,

2003, p.207. 84 Cabe salientar que apesar de tradicionalmente a culpa ser um requisito da responsabilidade civil, poderão existir situações em que a responsabilidade será objetiva, de modo que a incidência ou ausência de culpa, não será capaz de eximir a incidência do dever de indenizar. 85 NALIN, Paulo Roberto Ribeiro. Responsabilidade Civil: Descumprimento do Contrato e Dano Extrapatrimonial. Curitiba: Juruá, 1996, p. 70. .

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O descumprimento contratual é capaz de causar danos complexos86 ao

credor, aqui se entenda adquirente, danos que excedem o mero inadimplemento

obrigacional, de modo a ocasionar frustração aos interesses satisfativas do contrato.

Em outras palavras, o atraso na entrega da obra enseja a frustração das legítimas

expectativas do adquirente.

Logo, o reconhecimento da ilegalidade e da abusividade da cláusula de

carência enseja a invalidade de tal ajuste contratual; de modo que a unidade

adquirida deverá ser entregue fielmente no prazo determinado no instrumento

particular firmado entre as partes. O atraso para entrega do empreendimento gera a

presunção de dano ao adquirente, sendo este, requisito indispensável para o dever

de indenizar.

O dever de indenizar provém tradicionalmente, do preenchimento dos

pressupostos da responsabilidade civil, os quais são: ato ilícito, dano e nexo de

causalidade. A caracterização do dever de reparar é decorrente de um fato danoso

ou ilícito que gera um efetivo prejuízo/dano a alguém, e da correlação entre o fato e

o dano, nexo de causalidade.

Poder-se-á definir a responsabilidade civil como a aplicação de medidas quem obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda (responsabilidade subjetiva), ou, ainda, de simples imposição legal (responsabilidade objetiva).87

Portanto, a mora no cumprimento da obrigação principal do incorporador, a

qual seja, a entrega da unidade imobiliária no prazo convencionado, gera ao mesmo,

o dever de reparar os danos ocasionados:

ATRASO NA ENTREGA DO BEM. DANO MATERIAL COMPROVADO, ENSEJANDO O DEVER DE INDENIZAR. Restando evidente a mora, consistente no atraso da entrega do imóvel, que é admitido pela ré, e comprovados os prejuízos dela decorrentes, impositivo o dever de indenizar pelos valores despendidos pelo autor com a locação de imóvel para residência, observado o período compreendido entre a data de celebração

86 Entenda-se por danos complexos, os prejuízos de ordem material e moral contínuos e capazes de ensejar grandes infortúnios ao credor, os quais excedem em muito o padrão da normalidade e do mero aborrecimento.

87 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 17. ed. Vol. 7. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 213.

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do contrato de locação e a da entrega das chaves. APELAÇÃO DO AUTOR PARCIALMENTE PROVIDA E DESPROVIDO O RECURSO DA RÉ.88

Logo, o descumprimento do prazo contratual para entrega da unidade

imobiliária impõe ao incorporador o dever de arcar com perdas e danos, no montante

do efetivo prejuízo suportado pelo adquirente que teve a entrega de seu imóvel

atrasada; compreendam-se como integrantes desta indenização, os danos

emergentes, lucros cessantes e danos morais suportados.

Neste sentido, “o inadimplemento obriga o contratante ou aquele que não

executou as suas obrigações a indenizar a outra parte, repondo-a na situação

econômica em que se encontraria se a prestação tivesse sido tempestivamente

cumprida89.” Assim, diante do descumprimento contratual, resta evidenciado o dever

de indenizar do incorporador, em detrimento de seu inadimplemento.

5.2. A CLÁUSULA DE CARÊNCIA E AS EXCLUDENTES DE

RESPONSABILIDADE CIVIL

5.2.1. Caso Fortuito e Força Maior

O atraso na entrega do imóvel adquirido na planta por muitas vezes é

vinculado a hipóteses de ocorrência de caso fortuito e de força maior; situações

irresistíveis e inesperadas que acarretaram na mora e no consequente

descumprimento contratual.

A cláusula de carência é abusiva a teor do que dispõe o Código de Defesa do

Consumidor, a Lei nº. 4591/1964 e ainda, em detrimento de recentes decisões e

entendimentos jurisprudenciais; sendo que o contrato eivado de desarmonia e

desequilíbrio deve ser sopesado; a fim de que seja restabelecido o equilíbrio entre

os contraentes. Entretanto, apesar da abusividade de tal cláusula, por vezes, a

mesma é admitida em face de situações peculiares e extraordinárias, como as

hipóteses decorrentes de caso fortuito ou força maior.

Inicialmente é interessante caracterizar caso fortuito e força maior. Neste

sentido: “força maior é o acontecimento que escapa a toda diligência, inteiramente

88 RIO GRANDE DO SUL: Tribunal de Justiça, 18ª Câmara Cível. Apelação Cível nº 70013504808. Relator: André Luiz Planella Villarinho. Julgado em 11/10/2007. Disponível em: http://br.vlex.com/vid/-44847974. Acesso em: 01/09/2012. 89 WALD, Arnoldo. Direito Civil. 20 ed. Vol. 2. São Paulo: Saraiva, 2011, p.175.

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estranho à vontade do devedor da obrigação.”90 Já, caso fortuito é “(...) todo caso

que acontece imprevisivelmente, atuado por uma força que não se pode evitar91.”

Logo, ambos caracterizam-se essencialmente pela irresistibilidade.

O artigo 393 do Código Civil prevê como hipótese de exclusão da

responsabilidade civil situações que influenciam o regular andamento das

obrigações pactuadas, os quais sejam, caso fortuito e força maior. Vejamos as

considerações feitas por STOCO:

em pura doutrina distinguem-se estes eventos dizendo que o caso fortuito é o acontecimento natural, derivado das forças da natureza ou o fato das coisas, como o raio, a inundação, o terremoto ou o temporal. Na força maior há sempre um elemento humano, a ação das autoridades (factum principis), como a revolução, o furto ou roubo, o assalto ou, noutro gênero, a desapropriação.92

Nesse mesmo diapasão, vejamos NORONHA, faz algumas ponderações a

respeito das causas excludentes de responsabilidade:

quando a expressão caso fortuito ou de força maior é usada em sentido restrito (e sem distinguir entre fortuito e força maior), ela engloba os acontecimentos naturais, como tempestades, enchentes e doenças (que poderiam ser designadas de acts of god), e as ações humanas não individualizadas, como guerras, assaltos, depredações e até imposições da autoridade, sempre que tais fatos tenham sido determinantes do dano.”93

Portanto, apesar de caso fortuito e força maior não serem sinônimos, para

efeitos de maior didática não se discutirá a diferença entre tais conceitos, visto que

grande parte da doutrina entende que a distinção entre os mesmos é mero

formalismo. Cabe frisar que é imprescindível a demonstração da imprevisibilidade e

da inevitabilidade de tais situações.

(...) estaremos em face do caso fortuito quando se tratar de evento imprevisível e, por isso, inevitável; se o evento for inevitável, ainda que previsível, por se tratar de fato superior às forças do agente, como

90 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 68. 91 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p.159. 92STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial. 4. ed.São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p.85.

93 NORONHA, Fernando. Direito das Obrigações. .3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p.650.

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normalmente são os fatos da natureza, como as tempestades, enchentes, etc., estaremos em face da força maior, como o próprio nome o diz.94

Assim, em face das justificativas utilizadas pelas incorporadoras para a

utilização do prazo adicional de carência para a finalização das obras e entrega do

empreendimento; deve-se analisar se tais hipóteses caracterizam-se realmente

como causas excludentes de responsabilidade: caso fortuito ou força maior. Para

tanto, deve-se estudar cada uma das justificativas apresentadas; as quais sejam:

a) Elevado índice pluviométrico: ora, as precipitações só podem ser

consideradas como caso de força maior, se extremamente excessivas, ao nível de

caracterizarem-se como anormais, como desastre da natureza, que foge do comum.

Portanto, no que concerne a frequente suposição das incorporadoras, de que o

atraso das obras se deu em conseqüência do aumento do índice pluviométrico; tal

argumento não merece prosperar, uma vez que não constitui fato extraordinário ou

imprevisível capaz de justificar um atraso significativo na construção do

empreendimento, de tal sorte incumbia à incorporadora se prevenir, mediante

mecanismos que possibilitassem o prosseguimento da obra e evitassem o

injustificado atraso. Neste sentido, a jurisprudência já decidiu:

AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO. IMÓVEL EM CONSTRUÇÃO. ATRASO. OBRA NÃO ENTREGUE NO PRAZO PREVISTO. CHUVAS DEMASIADAS. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE PROVA ROBUSTA DO FATO QUE AFASTA A ALEGAÇÃO DE FORÇA MAIOR. DEVOLUÇÃO DAS PARCELAS PAGAS. RECURSO DESPROVIDO.A ausência de entrega da obra conclusa na data contratualmente prevista, por parte da construtora, não a exime do dever de indenizar caso sob o argumento de chuvas freqüentes à época do termo final para finalização da obra, porquanto somente prova robusta de que o mau tempo impediu o prosseguimento de qualquer serviço na obra poderia caracterizar a força maior. Assim, violado o termo final da avença, a não entrega do imóvel neste prazo acarreta a rescisão do contrato e a obrigação de devolução ao comprador dos valores pagos. Comprovado que os autores não obtiveram a posse de seu imóvel, dele não usufruindo pelo tempo em que ficaram privados pelo atraso na entrega da obra, é inarredável direito à indenização por perdas e danos, a ser apurada em liquidação de sentença, pelo valor dos aluguéis que poderiam ter obtido no interstício.95

E ainda:

94 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007, p.65.

95 SANTA CATARINA: Tribunal de Justiça, 1ª Câmara Cível. Apelação Cível nº.2011.010739-2. Relator: Carlos Prudêncio. Julgado em: 14/09/2011. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/5036158/apelacao-civel-ac-107392-sc-2001010739-2-tjsc. Acesso em: 29/06/2012.

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Cobrança. Valor correspondente a um aluguel. Atraso na entrega da unidade. Alegação de caso fortuito ou força maior. Chuvas não podem ser consideradas como imprevisíveis. Risco do empreendimento. Cerceamento de defesa. Inocorrência. Sentença mantida. Recurso improvido.96

Na mesma esfera de discussão:

Rescisão de compromisso de compra e venda cumulada com perdas e danos. Ação julgada procedente. Atraso na entrega da obra. Altos índices pluviométrícos e greves no setor de construção civil. Argumentos insuficientes a tipificar caso fortuito ou força maior. Inadimplemento da construtora configurado. Precedentes desta Câmara. Multa e juros previstos no contrato aplicados ao caso, por equidade. Tratando-se de obrigação contratual, os juros de mora incidem desde a citação. Recurso parcialmente provido para este fim.97

Portanto, o elevado índice de chuvas só pode ser aceito como condição

excludente de responsabilidade se tratar-se de situação exacerbada, que exceda os

limites da normalidade, tornando-se, portanto, imprevisível. Ademais, deve-se

considerar que o risco da atividade da incorporação imobiliária já é inserido no

próprio preço repassado ao adquirente; motivo pelo qual, a questão relativa a

excludentes de responsabilidade deve ser tratada e analisada minuciosamente.

b) Greve dos funcionários da construção civil: a paralisação das

atividades relacionadas à construção civil; seja pela greve de funcionários ou pela

ausência de mão-de-obra qualificada, nada mais é do que risco inerente à atividade

empresarial desenvolvida pelo incorporador; de modo que os prejuízos decorrentes

de tal risco não podem ser repassados ao consumidor. Neste sentido:

AÇÃO DECLARATÓRIA C/C PERDAS E DANOS. CONSTRUÇÃO CIVIL – ATRASO NA ENTREGA DE OBRA – MULTA CONTRATUAL – CERCEAMENTO DE DEFESA – NÃO CONFIGURADO – SUFICIENTE A ANÁLISE DAS PROVAS DOCUMENTAIS – CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR NÃO CARACTERIZADOS – CRISE ECONÔMICA DO SETOR IMOBILIÁRIO – RISCO DA ATIVIDADE INTRANSFERÍVEL AO CONSUMIDOR – CONTRATO DE ADESÃO – CLÁUSULA ABUSIVA TIDA COMO NÃO ESCRITA – AUSÊNCIA DE PROVA – APELO CONHECIDO E DESPROVIDO. (…). 2. O caso fortuito e a força maior, para excluir a

96 SÃO PAULO: Tribunal de Justiça, 8ª Câmara Cível. Apelação Cível nº 994.07.023766-7. Relator: Des. Caetano Lagrasta. Julgado em: 09.06.2010. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/diarios/39031871/djpr-27-07-2012-pg-249. Acesso em: 29/06/2012. 97 SÃO PAULO: Tribunal de Justiça; 3ª Câmara Cível. Apelação Cível nº. 198.125-4/6. Relator: Des. Caetano Lagrasta, Julgado em: 04.10.2005. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/diarios/39031871/djpr-27-07-2012-pg-249. Acesso em: 29/06/2012.

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responsabilidade pelo inadimplemento contratual, devem decorrer de eventos imprevisíveis e inevitáveis, cujos efeitos impossibilitam de forma absoluta a execução da obra, o que não se evidencia no presente caso, pois as causas argüidas são todas previsíveis no campo da construção civil. 3. A instabilidade econômica, política e social dificulta em muito o desenvolvimento de qualquer ramo de atividade, seja comercial, industrial ou de prestação de serviços. Porém, o ônus de arcar com o risco da atividade desenvolvida não pode ser transferido ao consumidor, não configurando caso fortuito ou força maior a inadimplência de credores, planos econômicos, etc., portanto, não eximem a construtora de arcar com multa pelo atraso na entrega da obra.98

E também: COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA – ATRASO NA ENTREGA DA OBRA – ALEGAÇÃO DE OCORRÊNCIA DE CHUVAS, FORTES VENTOS E GREVE NO SETOR DA CONSTRUÇÃO CIVIL – ACONTECIMENTOS LIGADOS À PRÓPRIA ORGANIZAÇÃO E DENTRO DOS RISCOS NORMAIS DA ATIVIDADE DA RÉ – FORÇA MAIOR DESCARACTERIZADA – APLICAÇÃO DA MULTA CONTRATUAL EXPRESSA E PREVIAMENTE PREVISTA POR DELIBERAÇÃO ESPONTÂNEA DAS PARTES – SENTENÇA MANTIDA.99

Portanto, não há o que se falar em inevitabilidade ou imprevisibilidade, visto

tratar-se de risco relativo ao próprio desenvolvimento da incorporação imobiliária, de

modo que a possibilidade de greve dos trabalhadores da construção civil e possível

paralisação da atividade, deve ser sopesada e analisada na projeção dos riscos de

tal setor empresarial. Nesta mesma seara, tem-se que a escassez de matéria-prima

e materiais, também não pode ser considerada como justificativa passível de eximir

a incorporadora de responsabilizar-se pelo atraso na obra:

CIVIL. AÇÃO DE CONHECIMENTO. CERCEAMENTO DE DEFESA. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMOVEL EM CONSTRUÇÃO. ATRASO NA ENTREGA. MULTA PENAL. FATO DE TERCEIRO. CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR.I. O JUIZ É O DESTINATÁRIO DA PROVA E CABE A ELE AVALIAR A NECESSIDADE DE OUTROS ELEMENTOS PROBATÓRIOS, ALÉM DAQUELES CONTIDOS NOS AUTOS, PARA A FORMAÇÃO DE SUA CONVICÇÃO.II. OS MOTIVOS ALEGADOS PELA RÉ, TAIS COMO, CHUVAS, REFORÇO ESTRUTURAL, ATRASO NA ENTREGA DE MATERIAIS, NO FORNECIMENTO DE SERVIÇOS E NA OBTENÇÃO DE LINHA DE CRÉDITO NÃO CONSTITUEM FATO DE TERCEIRO, CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR APTOS A ENSEJAR A ELISÃO DA MULTA PENAL.III. A MORA INDEVIDA DA

98 PARANÁ: Tribunal de Justiça, 16ª Câmara Cível. Apelação Cível nº. 341.530-5. Relator: Des. Sérgio Roberto Nóbrega Rolanski. Julgado em: 05.09.2007. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/diarios/37556352/djap-01-06-2012-pg-124. Acesso em: 30/06/2012.

99 SÃO PAULO: Tribunal de Justiça, 6ª Câmara Cível. Apelação Cível nº. 085.330-4/2. Relator: Des. Mohamed Amaro. Julgado em: 05.08.1999. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/21959935/embargos-declaratorios-ed-911238901-pr-911238-9-01-decisao-monocratica-tjpr. Acesso em: 02/07/2012.

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CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA EM PROVIDENCIAR A ENERGIZAÇÃO DEFINITIVA DA OBRA CONSTITUI MOTIVO PARA A PRORROGAÇÃO DO CONTRATO, CONSOANTE CONSTA DE SEUS TERMOS, POIS A CONSTRUTORA SOMENTE OBTEVE O FORNECIMENTO POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL.IV. DEU-SE PARCIAL PROVIMENTO.100

Trata-se, portanto, da organização e planejamento da atividade, de seu

desenvolvimento e conclusão; à luz dos benefícios e riscos envolvidos em tal esfera.

c) Ordens Judiciais e Inadimplemento de Compradores: ainda no que se

refere ao atraso na entrega da unidade imobiliária em decorrência de complicações

judiciais que impossibilitam o prosseguimento da construção do imóvel, o mesmo

não pode ser vislumbrado como caso fortuito, uma vez que é passível de previsão.

Os incorporadores são sujeitos qualificados e em regra aptos ao exercício de tal

atividade econômica, possuindo ampla preparação de cunho jurídico, econômico e

comercial. Não se pode conceber, que um empreendimento de alta monta e

complexidade seja desenvolvido sem estudos prévios. De modo que uma ordem

judicial de paralisação das obras, se não é esperada, pelo menos é prevista como

possível pelo incorporador. Neste sentido:

COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. RESCISÃO DE CONTRATO. OBRA EMBARGADA. ATRASO NA ENTREGA. CASO FORTUITO NÃO CONFIGURADO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO. A construtora assume integral responsabilidade pela regularidade da obra, inclusive, pela obtenção de toda a documentação indispensável ao seu prosseguimento, não a eximindo da responsabilidade pelo atraso na entrega, os embargos da obra, opostos pelo Poder Público, que não configuram hipótese de caso fortuito ou força maior..101

No que concerne ao inadimplemento dos adquirentes, vislumbra-se que a

ausência de pecúnia para prosseguimento do empreendimento não enquadra-se

como situação de caso fortuito ou força maior, visto que insere-se no risco da

atividade:

100 DISTRITO FEDERAL: Tribunal de Justiça, 6ª Turma Cível. Apelação Cível nº. 0073414-81.2008.807.0001. Relator: Jose Divino de Oliveira. Julgado em: 04/08/2010. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/15667216/apelacao-ci-vel-apl-734148120088070001-df-0073414-8120088070001-tjdf. Acesso em: 19/08/2012. 101 PARANÁ: Tribunal de Justiça, 4ª Câmara Cível. Apelação Cível nº. 0134475-4. Relator: Dilmar Kessler. Julgado em: 28/05/2003. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/6391780/apelacao-civel-ac-1344754-pr-0134475-4-tjpr. Acesso em: 19/09/2012.

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CIVIL. CONTRATO. RESCISÃO. CASO FORTUITO E MOTIVO DE FORÇA MAIOR. LIMITES. Eventuais dificuldades da construtora para obter financiamento da obra ou contratar mão-de-obra não constituem caso fortuito nem motivo de força maior. Apelo não provido. Unânime.102

Denota-se que as principais justificativas para a utilização da cláusula de

carência e para o atraso na entrega dos imóveis referem-se a hipótese de greve dos

trabalhadores da construção civil, chuvas intensas, escassez de mão-de-obra e

materiais; e ainda, complicações de ordem judicial, como, embargo da obra.

Entretanto, tais justificativas não podem ser acatadas, haja vista que a dilação

do prazo para entrega das unidades é extremamente prejudicial ao adquirente, não

havendo qualquer razoabilidade em tal posicionamento, que assevera ainda mais, a

desigualdade entre as partes contraentes. Já é sabido que a atividade empresarial

de incorporação imobiliária é de alto risco e bastante complexa, incidindo-se assim,

a necessidade de estudos e conhecimentos na área. Neste contexto, entende-se

que o incorporador tem por obrigação observar a possibilidade de imprevistos

durante a execução das obras, de modo a garantir ao consumidor a entrega pontual

do imóvel adquirido.

A cláusula de carência visa eximir a responsabilidade do incorporador, na

hipótese de atraso para a conclusão das obras e entrega das unidades; de modo

que por meio de tal disposição contratual, ocorre a prorrogação automática do prazo

de entrega do empreendimento; por vezes, em detrimento de caso fortuito ou força

maior.

Todavia, a mora para o cumprimento da obrigação primordial do incorporador,

a qual seja a efetiva entrega da unidade imobiliária não pode ser genericamente

denominada ou justificada por hipótese de caso fortuito ou de força maior, de modo

a isentá-lo de responder pelo atraso.

Logo, se o contrato eventualmente dispor acerca do prazo de carência, o

mesmo só poderá ser utilizado pelo incorporador sem situações extremas, de caso

fortuito ou força maior, não considerando-se que essa carência é uma prorrogação

automática do prazo de entrega.

Igualmente, se por um lado o adquirente tem por obrigação essencial o

adimplemento do preço, por meio de pagamentos realizados conforme os prazos e

102 DISTRITO FEDERAL: Tribunal de Justiça, 1ª Turma Cível. Apelação Cível nº. 1999071 007021-8. Relator: Des. Valer Xavier. Julgado em: 23.03.2001. Disponível em: http://www.tjdft.jus.br/institucional/documentos/jurisprudencial/2591542006.pdf. Acesso em: 13/08/2012.

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formas previstas em contrato; a incorporadora tem por obrigação a entrega pontual

da unidade imobiliária, nos limites do prazo fixado em contrato.

5.2.2. Teoria do Risco Empresarial

A teoria do risco surgiu no final do século XIX como fundamento para a

responsabilidade objetiva. “Risco é perigo, é probabilidade de dano (...)103”. Portanto,

a teoria do risco pode ser compreendida como o dever de reparar os prejuízos

ocasionados, independentemente de culpa; no que concerne ao serviço, à atividade

empreendida. Logo:

Pela teoria do risco do empreendimento, todo aquele que se disponha a exercer alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder pelos eventuais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa.104

A incorporação imobiliária representa atividade empresarial que visa o lucro,

de modo que o descumprimento contratual relativo ao atraso na entrega do

empreendimento deve ser analisado sob o prisma da teoria do risco.

Neste diapasão denota-se que o adquirente da unidade imobiliária integrante

do empreendimento não pode ser compelido a arcar com os riscos decorrentes da

atividade empresarial desenvolvida pelo incorporador. Portanto, o descumprimento

contratual em decorrência do atraso da obra e da efetiva entrega do imóvel; não

pode ser eximido de responsabilização civil, haja vista que o próprio preço pago pelo

adquirente possui parcela relacionada aos riscos do negócio.

Ainda, é interessante trazer à lide a ideia de fortuito interno, segundo o qual,

embora não decorra da vontade do agente, os eventos vinculam-se diretamente aos

riscos do empreendimento, ou seja, à atividade profissional exercida pelo causador

do dano, não elidindo sua responsabilidade.

O incorporador não poderá ser eximido de reparar os danos decorrentes do

atraso na entrega do imóvel, haja vista que as possíveis alegações acerca da

ocorrência de caso fortuito ou de força maior, podem ser justificadas sem maiores

esforços, pela hipótese de fortuito interno.

103 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 7. ed. São Paulo:

Atlas, 2007, p.459

104CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 7.ed. São Paulo: Atlas, 2007, p.459.

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Sérgio Cavalieri Filho ensina que o fortuito interno:

(...) assim entendido o fato imprevisível e, por isso inevitável, não exclui a responsabilidade do fornecedor porque faz parte da sua atividade, liga-se aos riscos do empreendimento. „(omissis) "; se o fato se deu durante a prestação do serviço, "não importa saber o motivo que determinou o defeito; o fornecedor é sempre responsável pelas suas consequências, ainda que decorrente de fato imprevisível e inevitável.105

Neste sentido, a jurisprudência consubstancia que o fortuito interno decorre

diretamente do risco da atividade exercida sendo descabida a isenção de

responsabilidade pelo atraso na entrega da obra, no caso das incorporadoras:

Direito Processual Civil - Promessa de Compra e Venda de imóvel - Atraso na entrega -Contrato que não disciplina sobre a prorrogação da entrega do imóvel - Caso fortuito e força maior não evidenciados - Fortuito interno decorrente da atividade e do risco do negócio - Atraso na entrega da obra que acarreta a aplicação da multa, tal qual prevista em contrato. Sentença mantida. Recurso improvido.106

Portanto, a precipitação excessiva, a greve de funcionários da construção

civil, a escassez de materiais, o embargo da obra; não podem ser consideradas

como causas excludentes de responsabilidade civil; haja vista que tais situações

possuem vinculação direta ao risco da atividade da incorporação imobiliária

empreendida; de modo que os danos decorrentes do atraso na entrega da obra

devem ser suportados pelo incorporador; e não transferidos aos adquirentes.

Assim, a partir do momento em que o incorporador decide colocar em pratica

a atividade da incorporação imobiliária deve analisar todos os riscos envolvidos em

tal empreendimento, de modo a responsabilizarem-se integralmente pelos prejuízos

decorrentes do mesmo, “a responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se

alguém a realizar atividade (...) ou executar determinados serviços. O fornecedor

passa a ser o garante dos produtos e serviços que oferece no mercado de

consumo107”.

105 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Direito do Consumidor. São Paulo: Atlas, 2008, p. 256.

106 SÃO PAULO: Tribunal de Justiça, 7ª Câmara de Direito Privado. Apelação Cível nº. 9091474-84.2009.8.26.0000. Relator: Luiz Antonio Costa. Julgado em: 25/04/2012. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/21657795/apelacao-apl-9091474842009826-sp-9091474-8420098260000-tjsp. Acessado em: 19/09/2012. 107 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2008.

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Neste sentido, a avaliação dos riscos que a atividade empresarial provoca aos consumidores não só se torna perfeitamente possível, como necessária. A possibilidade de avaliação e análise dos riscos da atividade empresarial é perfeitamente cabível diante da evolução tecnológica. Portanto, aquele que se dispõe a exercer alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder pelos eventuais vícios ou defeitos nos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa.108

O dever de arcar com os riscos decorrentes da atividade empresarial

empreendida, no que tange aos casos de atraso na entrega de imóveis em regime

de incorporação imobiliária, vem sendo constantemente analisado nos tribunais, os

quais tem se manifestado no seguinte sentido: “Cabe à construtora/incorporadora

entregar a unidade no prazo estipulado e, não cumprindo sua obrigação, responde

pelos prejuízos que sua mora causar. (art. 43, II, Lei 4.591⁄64).109”

Portanto, a teoria do risco enfatiza que a responsabilidade independente de

culpa se dá pelo fato de que não devem ser toleradas violações dos direitos dos

adquirentes, mesmo quando o incorporador tenha procedido com todos os cuidados

e zelo exigíveis para a consecução de tal atividade. “Se alguém tem de suportar o

prejuízo, não deve ser a pessoa que era titular do direito.110”

O artigo 927111, parágrafo único do Código Civil estabelece o dever de

responsabilização objetiva em decorrência do risco da atividade desenvolvida,

sintetizando o ideal da teoria do risco empresarial.

5.3. DA RESCISÃO CONTRATUAL

O descumprimento da obrigação principal do compromisso de compra e

venda, a qual seja o pagamento do preço pelo adquirente e a edificação e entrega

da unidade imobiliária pelo incorporador gera a ambas as partes a possibilidade de

rescisão do negócio jurídico celebrado contratualmente.

108 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2008.p. 234.

109 ESPÍRITO SANTO: Tribunal de Justiça, 2ª Câmara Cível. Apelação Cível nº 024.020.083.077. Relator: Des. Elpídio José Duque. Julgado em:14/10/2005. Disponível em: http://www.cgj.es.gov.br/arquivos/legislacao/Provimento36-05.pdf. Acessado em: 10/07/2012.

110 NORONHA, Fernando. Direito das Obrigações. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 76. 111 Art. 927. Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

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As obrigações assumidas no contrato – não é demais repetir – devem ser fielmente executadas. A regra fundamental é que o devedor esta obrigado a efetuar a prestação devida de um modo completo, no tempo e lugar determinado na obrigação. Haverá responsabilidade contratual sempre que a inexecução do contrato decorrer de fato imputável ao devedor. Logo, a responsabilidade contratual é também um dever sucessivo decorrente da violação de um dever primário estabelecido no contrato.112

Logo, o inadimplemento contratual ou mora no cumprimento da obrigação em

detrimento da culpa de uma das partes, é causa legítima para o pedido de rescisão

contratual pela parte lesada. O artigo 475113 do Código Civil de 2002 prevê

expressamente a hipótese de rompimento do contrato celebrado em razão do

inadimplemento.

COMPROMISSO DE VENDA E COMPRA. Empresa que não entregou a unidade no prazo ajustado. Sentença que julgou procedente o pedido do comprador de rescisão contratual com a devolução das quantias pagas. Relação de consumo, obrigação de devolução de valores pagos a título de aquisição de imóvel que não foi entregue por culpa da vendedora. Recurso dela, desprovido.114

Nesta mesma seara, a jurisprudência vem entendendo a possibilidade de

rescisão contratual em face do atraso na entrega da unidade imobiliária adquirida,

haja vista a mora no cumprimento da obrigação essencial do compromisso

celebrado:

RESCISÃO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA – ATRASO NA ENTREGA DA OBRA – MORA DA CONSTRUTORA – RESCISÃO CONTRATUAL – DEVOLUÇÃO DAS QUANTIAS PAGAS – CORREÇÃO MONETÁRIA – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – LIMITES DO ART. 20, § 3º, DO C.P.C. O atraso verificado na entrega da obra motiva a rescisão do contrato, por inadimplência contratual, com direito à restituição das prestações pagas, corrigidas monetariamente. ‘A restituição das importâncias pagas pelos compromissários-compradores deve operar-se de modo integral, com correção monetária desde a data do desembolso, sob pena de enriquecimento sem causa’. ‘De acordo dom os ditames do Codecon, se a construtora atrasa a entrega do imóvel além do que foi estipulado no contrato, faculta ao comprador a rescisão do contrato com a

112 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 6. Ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p.298. 113 “A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos.” 114 SÃO PAULO: Tribunal de Justiça, 4ª Câmara Cível. Apelação Cível nº. 994.07119626-0. Relator: Des. Teixeira Leite. Julgado em: 08.07.2010. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/diarios/37052495/djpr-17-05-2012-pg-387. Acessado em: 19/08/2012.

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devolução das parcelas pagas, devidamente corrigidas monetariamente. Teoria do risco do empreendimento, consolidada pela Lei 8.078/90.115

Logo, a despeito de elementos concretos e comprobatórios acerca da

inadimplência da incorporadora no que tange ao atraso para entrega da unidade

compromissada junto ao adquirente, e ainda, constatada a culpa exclusiva da

promissária-vendedora, não se pode conceber que o adquirente seja penalizado e

compelido a manter o compromisso celebrado.

O contrato de incorporação imobiliária resolve-se, como todo contrato sinalagmático, por inexecução oriunda do inadimplemento de uma obrigação essencial por uma das partes. (...) Quando por conseguinte, se reconhece a inexecução culposa de um dos contraentes, a sua resolução cabe.116

Assim, não pode o incorporador constranger o adquirente ao cumprimento de

sua obrigação, sem que tenha efetivamente cumprido com a sua, o que

convenientemente seria uma nítida situação de enriquecimento sem causa, o que é

vedado pelo sistema jurídico.

5.4. DOS DANOS MATERIAIS

Se apesar do inadimplemento contratual da incorporadora, caracterizado pela

procrastinação da entrega da unidade imobiliária adquirida, o adquirente optar por

preservar o compromisso de compra e venda, o mesmo terá direito à reparação dos

danos materiais suportados até a efetiva entrega do imóvel, frisa-se, que não há o

que se falar em prorrogação de prazo, por meio da cláusula de carência, visto que já

fora espessamente demonstrada sua ilegalidade; frente ao notório desequilíbrio que

gera na esfera obrigacional.

O dano material é aquele que atinge propriamente o patrimônio do ofendido,

sendo passível de reparação pecuniária. Ademais, cabe salientar que o dano de

ordem material é capaz de afetar tanto o patrimônio presente; quanto o patrimônio

futuro da vítima, de modo a ocasionar a sua redução ou ainda, impossibilitar seu

115 MINAS GERAIS: Tribunal de Justiça, 1ª Câmara Cível. Apelação Cível nº. 0396927-

3/2003. Relator: Juiz Gouvêa Rios. Julgado em: 09.09.2003. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/21959935/embargos-declaratorios-ed-911238901-pr-911238-9-01-decisao-monocratica-tjpr. Acessado em: 20/08/2012. 116 GOMES, Orlando. Contratos. 26. ed. Rio de Janeiro:.Forense, 2008, p.564.

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progresso; crescimento. Logo, o dano material possui duas espécies distintas: danos

emergentes e lucros cessantes.

Desta feita, tem-se que:

O dano patrimonial vem a ser a lesão concreta, que afeta um interesse relativo ao patrimônio da vitima, consistente na perda ou deteriorização total ou parcial, dos bens materiais que lhe pertencem, sendo suscetível de avaliação pecuniária e de indenização pelo responsável.117

Porquanto, a incorporadora deixou de cumprir com sua obrigação principal de

entrega de coisa futura, seu inadimplemento configura ato ilícito, o qual é capaz de

gerar danos de ordem patrimonial aos adquirentes. O liame entre o inadimplemento

contratual e os danos efetivos de ordem patrimonial, geram à incorporadora o dever

de reparar os danos materiais. As perdas e danos “abrangem o que efetivamente foi

perdido pela parte lesada e o que ela deixou de ganhar de acordo com o curso

ordinário dos acontecimentos, atendendo-se pois, não somente ao dano emergente,

mas também ao lucro cessante118”.

As obrigações firmadas contratualmente devem ser cumpridas em

conformidade aos ajustes do instrumento celebrado. Portanto, o adimplemento da

obrigação pactuada no contrato é regra; enquanto o inadimplemento consiste em

exceção.

5.4.1. Dos Lucros Cessantes

A indenização por lucros cessantes vincula-se a um desfalque de ordem

pecuniária no patrimônio futuro do ofendido. Trata-se da perda de um ganho

esperável; ou ainda, da frustração da expectativa de lucro.

Sob esse prisma, os danos materiais na espécie de lucros cessantes fazem

referência à esfera patrimonial futura; de modo, que resta impedido o crescimento e

progresso de ordem pecuniária do ofendido, em detrimento de ato ilícito de outrem.

No que se refere ao atraso na entrega da unidade imobiliária, tem-se que o

inadimplemento contratual do incorporador coaduna-se como ato ilícito, capaz de

gerar prejuízos ao adquirente da unidade compromissada de empreendimento em

117 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 17. ed. Vol. 7. São Paulo:

Saraiva, 2003. 118 WALD, Arnoldo. Direito Civil. 20 ed. Vol. 2. São Paulo: Saraiva, 2011, p.176.

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mora. Logo, se a entrega tivesse ocorrido no prazo convencionado, o adquirente

poderia dispor usar e gozar de seu bem, da forma que melhor lhe aprouvesse.

O lucro cessante reflete a “perda do ganho esperável, a frustração da

expectativa de lucro” e decorre “não só da paralisação da atividade lucrativa ou

produtiva da vítima, como, também, da frustração daquilo que era razoavelmente

esperado”, desde que se configure como conseqüência necessária da conduta do

agente“. 119

O reconhecimento da ilegalidade da cláusula de carência impedirá que a

incorporadora tenha prazo adicional para efetuar a entrega do imóvel adquirido, de

modo que a procrastinação no cumprimento de sua obrigação acarretará hipótese

em que o dever de indenizar será inequívoco. Ora, o atraso na entrega do bem,

certamente ocasionará danos materiais ao adquirente, em ambas as suas espécies.

No que se refere aos lucros cessantes, é inquestionável sua incidência, haja

vista que o adquirente deixou de usufruir de sua unidade; e com a mesma lucrar.

Para se computar o lucro cessante, a mera possibilidade é insuficiente, embora não se exija uma certeza absoluta, de forma que o critério mais acertado estaria em condicioná-lo a uma probabilidade objetiva, resultante do desenvolvimento normal dos acontecimentos, conjugados às circunstancias peculiares do caso concreto (RT, 434:163, 494:133).120

O ganho esperado, ou até mesmo o lucro do adquirente com a entrega de sua

unidade imobiliária dentro do prazo previsto contratualmente se dá pelo fato de

poder dispor do bem imóvel; podendo locá-lo a terceiro, ou ainda, tê-lo a seu dispor,

conforme sua conveniência. A incidência do dever de reparar danos materiais do

gênero, lucros cessantes, deve ser condicionada a uma probabilidade objetiva,

resultante da ocorrência natural e normal dos acontecimentos. Considerando que a

entrega do bem na data ajustada era acontecimento esperado e certo, plenamente

devida, é a indenização por lucros cessantes.

O dever de indenizar por lucros cessantes vem sendo discutido largamente

pelos tribunais, de modo que os entendimentos mais favoráveis aos adquirentes

coadunam-se na condenação da incorporadora ao pagamento do valor de aluguel

de mercado da unidade não entregue; multiplicado pelos meses de mora, até o

119 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007. 120 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 17. ed. Vol. 7. São Paulo: Saraiva, 2003, p.66.

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efetivo cumprimento da obrigação do incorporador; a qual seja; a entrega do bem.

Senão vejamos:

CIVIL E PROCESSO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. LUCROS CESSANTES. POSSIBILIDADE. SUSPENSÃO DO PAGAMENTO DAS PARCELAS MENSAIS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. AS PERDAS E DANOS ABRANGEM, ALÉM DO QUE O LESADO PERDEU, AQUILO QUE DEIXOU DE AUFERIR - CC, ART. 402. LOGO, SE A INCORPORADORA NÃO CUMPRIU O AVENÇADO E DEIXOU DE ENTREGAR O IMÓVEL AO ADQUIRENTE NO PRAZO ESTABELECIDO NO CONTRATO, SUA CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE LUCROS CESSANTES NO PERÍODO DE INADIMPLÊNCIA, CONSUBSTANCIADO NO VALOR DE ALUGUEL DE IMÓVEL COM AS MESMAS CARACTERÍSTICAS, É MEDIDA QUE SE IMPÕE.CC402.121

Já há entendimento no sentido de que: “Faz jus às perdas e danos, sob a

forma de lucros cessantes, o comprador de imóvel residencial, ao valor dos

alugueres que deixou de usufruir, em razão da não entrega do imóvel no prazo

estipulado pela incorporadora.122”

A incorporadora deve ser responsabilizada pelos prejuízos de ordem

pecuniária suportados pelo adquirente, inclusive os que afetam seu patrimônio

futuro, ensejando a frustração de lucros. Ainda, acerca do cabimento de lucros

cessantes em detrimento do atraso na entrega do imóvel.

CIVIL. CONSUMIDOR. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. LUCROS CESSANTES. OCORRÊNCIA. ESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA JÁ FIRMOU ENTENDIMENTO NO SENTIDO DE QUE O ATRASO NA ENTREGA DE IMÓVEL CAUSA LUCRO CESSANTE AO ADQUIRENTE, QUE DEIXA DE AUFERIR LUCRO COM O ALUGUEL, OU DEIXA DE REDUZIR SUAS DESPESAS COM O PAGAMENTO DE ALUGUEL DE OUTRO IMÓVEL PARA RESIDIR. O FATO DE O IMÓVEL NÃO SER QUITADO NÃO OBSTA A OCORRÊNCIA DE LUCROS CESSANTES, EIS QUE TAL NÃO IMPOSSIBILITA AO ADQUIRENTE AUFERIR LUCRO COM O ALUGUEL DO IMÓVEL. A CLÁUSULA CONTRATUAL QUE PREVÊ A PRORROGAÇÃO DO PRAZO DE ENTREGA DO IMÓVEL POR MOTIVOS SUPERVENIENTES OU DE FORÇA MAIOR NÃO É AUTOMÁTICA, CABENDO À CONSTRUTORA FAZER PROVA DOS MOTIVOS QUE IMPEDIRAM A CONCLUSÃO E ENTREGA DO IMÓVEL NO TEMPO

121 DISTRITO FEDERAL: Tribunal de Justiça, 1ª Turma Cível. Apelação Cível nº 08726641.2009.807.0001. Relator: Lecir Manoel da Luz. Julgado em:21/03/2012. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/21432439/apelacao-ci-vel-apl-872664120098070001-df-0087266-4120098070001-tjdf. Acessado em: 18/09/2012. 122 SANTA CATARINA: Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 2002.004706-6. Relator: Des. José Volpato de Souza. Julgado em: 12/11/2002. Disponível em: http://app6.tjsc.jus.br/cposg/servlet/ServletArquivo?cdProcesso=010007HBS0000&nuSeqProcessoMv=null&tipoDocumento=D&cdAcordaoDoc=null&nuDocumento=1891403&pdf=false&enviarMsg=true. Acessado em 14/07/2012.

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APRAZADO. A INADIMPLÊNCIA DE ADQUIRENTES DE IMÓVEIS NO MESMO EMPREENDIMENTO É PLENAMENTE PREVISÍVEL, ESTANDO INSERIDA NO RISCO DA ATIVIDADE EXERCIDA PELA RÉ, NÃO PODENDO TAIS PREJUÍZOS SER TRANSFERIDOS AOS DEMAIS COMPRADORES. A NÃO ENTREGA DE IMÓVEL ADQUIRIDO NA PLANTA NÃO TEM, EM PRINCÍPIO, APTIDÃO PARA GERAR RESPONSABILIZAÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL, UMA VEZ QUE NÃO HÁ OFENSA A ATRIBUTOS DA PERSONALIDADE. PARCIAL PROVIMENTO DADO AO RECURSO DA AUTORA/APELANTE. IMPROVIDO O RECURSO DO RÉU 123

Portanto, a indenização por lucros cessantes tem por intuito reparar os lucros

dos quais os adquirentes foram privados ao não terem ao seu dispor a unidade

imobiliária adquirida, em virtude do inadimplemento contratual da incorporadora,

culminado pelo atraso na entrega do bem. “O lucrum cessans é o que deveria vir124“.

Nesta mesma seara:

EMBARGOS DECLARATÓRIOS CUJAS RAZÕES SÃO EXCLUSIVAMENTE INFRINGENTES. FUNGIBILIDADE DOS RECURSOS. RECEBIMENTO COMO AGRAVO REGIMENTAL. COMPRA E VENDA. IMÓVEL. ATRASO NA ENTREGA. LUCROS CESSANTES. PRESUNÇÃO. PROVIMENTO. I. Nos termos da mais recente jurisprudência do STJ, há presunção relativa do prejuízo do promitente-comprador pelo atraso na entrega de imóvel pelo promitente-vendedor, cabendo a este, para se eximir do dever de indenizar, fazer prova de que a mora contratual não lhe é imputável. Precedentes.II. Agravo regimental provido.125

E ainda enuncia o Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que o

cabimento de lucros cessantes em detrimento do atraso na entrega da obra, é

presumido:

AGRAVO REGIMENTAL - COMPRA E VENDA. IMÓVEL. ATRASO NA ENTREGA -LUCROS CESSANTES - PRESUNÇÃO - CABIMENTO - DECISÃO AGRAVADA MANTIDA- IMPROVIMENTO. 1.- A jurisprudência desta Casa é pacífica no sentido de que,descumprido o prazo para entrega do imóvel objeto do compromisso de compra e venda, é cabível a condenação por lucros cessantes. Nesse caso, há presunção de prejuízo do promitente-comprador, cabendo ao vendedor, para se eximir do dever de indenizar, fazer prova de que amora contratual não lhe é imputável.

123 DISTRITO FEDERAL: Tribunal de justiça, 1ª Turma Cível. Apelação Cível nº. 61109420108070001. Relator: Esdras Neves. Julgado em:25/05/2011. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/19240224/apelacao-ci-vel-apl-61109420108070001-df-0006110-9420108070001-tjdf. Acessado em: 17/09/2012.

124 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p.504. 125 BRASIL: Superior Tribunal de Justiça, 4ª Turma. Agravo regimental nº1036023. Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior. Julgado em: 23/11/2010. Disponível em: http://www.stj.jus.br/webstj/processo/Justica/detalhe.asp?numreg=200800711037&pv=010000000000&tp=51. Acessado em: 14/07/2012.

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Precedentes. 2.- O agravo não trouxe nenhum argumento novo capaz de modificar o decidido, que se mantém por seus próprios fundamentos.3.- Agravo Regimental improvido.126

Portanto, o atraso na entrega da unidade imobiliária presume o efetivo

prejuízo do adquirente, que poderia dispor de seu imóvel livremente, entretanto, viu-

se privado de utilizar da unidade adquirida, em virtude do inadimplemento da

incorporadora. Ademais, a inexecução da obrigação por mora do incorporador, gera

ao mesmo efeitos jurídicos concernentes ao dever de reparar os prejuízos causados

em virtude de seu inadimplemento, “mediante pagamento de juros moratórios legais

ou convencionais; indenização do lucro cessante, isto é, daquilo que o credor deixou

de ganhar em razão da mora, compreendendo os frutos e rendimentos que poderia

te r tirado da coisa devida.”127

5.4.2. Dos Danos Emergentes

Ainda no que concerne aos danos materiais, há que se falar dos danos

emergentes, os quais consistem em uma redução do patrimônio efetivo do ofendido.

Dano positivo ou emergente, que consiste num déficit real e efetivo no patrimônio do lesado, isto é, numa concreta diminuição em sua fortuna, seja porque se depreciou o ativo, seja porque aumentou o passivo, sendo pois, imprescindível que a vítima tenha, efetivamente, experimentado um real prejuízo (...).128

Assim, o atraso na entrega do imóvel acarreta aos adquirentes uma série de

gastos e prejuízos; decorrentes da necessidade de manter uma moradia além da

unidade imobiliária adquirida.

Cabe salientar que por vezes, a aquisição de um bem imóvel na planta esta

condicionado a situações da vida cotidiana do adquirente, tal qual, casamento,

126 BRASIL: Superior Tribunal de Justiça. 3ª Turma. Agravo Regimental nº. 2010/0123862-0. Relator: Ministro Sidnei Beneti. Julgado em: 07/02/2012. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/21266289/agravo-regimental-no-recurso-especial-agrg-no-resp-1202506-rj-2010-0123862-0-stj. Acesso em: 18/09/2012. 127 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 17. ed. Vol. 7. São Paulo: Saraiva, 2003, p.210. 128 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 17. ed. Vol. 7. São Paulo: Saraiva, 2003, p 216.

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moradia própria, emancipação financeira, vinda de um filho, entre outros. A compra

da unidade na planta é vinculada essencialmente ao seu prazo de entrega, de modo

que o adquirente planeja momentos importantes de sua vida em detrimento de tal

ajuste. O atraso na entrega do bem adquirido, por certo, causa sensação de

frustração e impotência que em muito supera o mero aborrecimento, haja vista que a

concretização de sonhos e planos pessoais passa a depender estritamente do

adimplemento contratual da incorporadora.

A necessidade de reparação dos danos emergentes funda-se no fato de que

“tais prejuízos se traduzem num empobrecimento do patrimônio atual do lesado pela

(...) privação do uso e gozo, etc. de seus bens existentes no momento do evento

danoso e pelos gastos que, em razão da lesão, teve de realizar129”.

A jurisprudência compreende que a incorporadora deve arcar com os custos

dos alugueres suportados pelo adquirente até a efetiva entrega do imóvel; de modo

a compensá-lo pelos gastos desnecessários referentes à moradia, visto que se a

entrega tivesse ocorrido no prazo, inexistiria a necessidade de tais gastos.

. ATRASO NA ENTREGA DE APARTAMENTO. INDENIZAÇÃO EM FAVOR DOS PROMITENTES COMPRADORES. VIABILIDADE. REEMBOLSO DE ALUGUÉIS DEVIDOS. MÁ-FÉ DESCARACTERIZADA. O atraso na entrega da obra, no prazo contratualmente estabelecido, ocasiona o inadimplemento, justificando o pleito rescisório, caso em que deverá ser devolvida a quantia já paga, com os acréscimos legais e contratuais. Em sendo o promitente comprador obrigado a alugar outro imóvel para morar, é devido o reembolso integral dos aluguéis por ele pagos, ainda que o contrato esteja quitado apenas de forma parcial. Recurso conhecido e desprovido.130

A indenização de ordem patrimonial suscita a necessidade de uma reparação

cumulativa no que concerne aos danos emergentes; efetivamente suportados pelo

adquirente em razão da mora no cumprimento da obrigação de entrega do bem; e

ainda, enseja o dever de compensação dos lucros cessantes, em razão da privação

de extensão do patrimônio do ofendido.

129

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 17. ed. Vol. 7. São Paulo: Saraiva, 2003, p.66. 130 SANTA CATARINA: Tribunal de Justiça. 3ª Câmara Cível. Apelação Cível nº 2000.014654-4. Relator: Des. Dionízio Jenczak. Julgado em: 13.05.2005. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/diarios/39031872/djpr-27-07-2012-pg-250. Acessado em: 14/08/2012.

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5.5. DOS DANOS EXTRAPATRIMONIAIS

Já é sabido que o insucesso negocial ou o inadimplemento contratual não são

causas presumidas do dever de reparação de danos de ordem extrapatrimoniais.

Entretanto, tal posicionamento merece ser analisado de forma mais profunda,

a fim de que não cause injustiças. É essencial a observância de que nem todo

inadimplemento contratual gera meros dissabores e transtornos, de modo que

algumas situações excedem a simples insatisfação e frustração; adentrando em uma

esfera mais intensa; de sensações negativas e sofrimentos.

O dano moral deve ser analisado sob a égide da “privação ou diminuição

daqueles bens que tem um valor precípuo na vida do homem e que são a paz, a

tranquilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade individual, a integridade

física, a honra e os demais sagrados afetos131”.

Obviamente que não será todo e qualquer descumprimento contratual que

ensejará indenização por danos de ordem extrapatrimonial, é necessária uma

avaliação do caso concreto e uma releitura das normas civilistas e consumeristas

que regem as relações contratuais; de modo que reste incontestavelmente

demonstrado o abalo psíquico e emocional do adquirente.

Assim, sob o prisma da boa-fé, da transparência, da confiança, da

informação e demais preceitos principiológicos acatados pelo ordenamento jurídico

brasileiro, será possível sopesar os danos suportados pelo ofendido, a fim de

presumir-se ou não a incidência de danos morais.

De tal sorte, não será qualquer inadimplemento que gerará o dever de

indenizar por danos de ordem moral. Entretanto, o descumprimento do compromisso

de compra e venda de unidade imobiliária representa condição de nítido prejuízo de

ordem moral ao adquirente; haja vista que por tratar-se de coisa futura, envolve uma

grande expectativa na concretização do negócio jurídico.

Não se pode conceber que o atraso na entrega do imóvel após anos de

espera, seja considerado ato rotineiro, da vida comum e que não gera ao adquirente

mais do que meros aborrecimentos. A compra de um imóvel na planta dispensa por

parte dos adquirentes grandes esforços, ademais, após longo lapso temporal

131 DALMARTELLO, Danno morali contrattuali. Rivista di Diritto Civile 1933/55, apud

CAHALI, Yussef Said. Dano Moral. 3. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 22.

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adimplindo a obrigação de pagar o preço, é justo que tenha sua contraprestação, de

entrega do bem, devidamente adimplida no prazo ajustado.

Frise-se que a defesa relacionada à incidência de danos morais refere-se

propriamente aos adquirentes que compraram antecipadamente o imóvel na planta

com o intuito próprio de moradia, de modo que a procrastinação na entrega de

referido bem lhes causa sofrimentos de ordem emocional e psíquica; em detrimento

da frustração injusta de uma legítima expectativa.

Neste diapasão, alguns tribunais vem inovando e acatando a incidência de

danos morais em casos de inadimplemento de contratos de incorporação imobiliária.

É fato gerador de dano moral: a não entrega de apartamento no prazo convencionado, quando em meio aos sonhos e ilusões, às noites mal dormidas, vivem os adquirentes, num misto de angústias e de revolta, as expectativas da entrega do bem que um dia sonharam ocupar132.

O adquirente não pode ser compelido a suportar o ônus decorrente do

descumprimento contratual da incorporadora. Ora, a não entrega do

empreendimento no prazo avençado por si só, é capaz de ensejar a presunção de

dor e sofrimento ao promitente-comprador; haja vista que a aquisição de bem de

forma antecipada, gera ao mesmo legitimas expectativas relativas ao imóvel. Neste

sentido a jurisprudência vem decidindo:

APELAÇÃO CÍVEL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. O atraso na entrega de obra de empreendimento gera dano moral passível de indenização, uma vez que a expectativa dos adquirentes foi frustrada. Sobretudo na espécie em que o atraso quase completa um ano.” NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO. UNÂNIME.133

E ainda: APELAÇÃO CÍVEL. COMPRA E VENDA. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. DANO MORAL. CONFIGURADO. Na hipótese, dos autos há elementos probatórios que conduzem a existência de expectativa da entrega da obra. Assim, diante da prova carreada aos autos, o incumprimento contratual gera o dever de indenizar os danos psíquicos

132RIO DE JANEIRO: Tribunal de Justiça, 13ª Câmara Cível. Apelação Cível nº 2002.001.17310. Relator: Des. Ademir Pimentel. Disponível em: http://www.tjrj.jus.br/c/document_library/get_file?uuid=a2768f6d-cc2b-4bc6-bc84-d02365e35763&groupId=10136. Acessado em: 15/09/2012. 133 RIO GRANDE DO SUL: Tribunal de Justiça, 20ª Câmara Cível. Apelação Cível nº. 70042050237. Relatora: Walda Maria Melo Pierro, Julgado em 17/08/2011. Disponível em: http://br.vlex.com/vid/-315674030. Acesso em: 21/08/2012.

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suportados pelos autores. Redução do quantum indenizatório. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. 134

Portanto, a procrastinação injustificada na entrega do imóvel importa em

prejuízo efetivo ao adquirente, na medida em que frustra o objetivo da aquisição do

bem; configurando notória situação ensejadora de dano moral. Não se trata de

enriquecimento indevido, mas tão somente de justa indenização, a fim de compensar

a dor, insegurança e humilhação experimentadas.

134 RIO GRANDE DO SUL: Tribunal de Justiça, 20ª Câmara Cível. Apelação Cível nº 70034511378. Relator: Glênio José Wasserstein Hekman. Julgado em 28/09/2011.Disponível em: http://br.vlex.com/vid/-324732235. Acesso em: 21/08/2012.

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6. CONCLUSÃO

Após a realização da presente pesquisa chega-se a algumas conclusões

acerca do tema proposto.

A cláusula de carência à luz da Lei nº. 4591/1964, do Código de Defesa do

Consumidor e do Código Civil representa sem dúvidas, dispositivo contratual

ensejador de inconteste desequilíbrio negocial e obrigacional, haja vista que causa

extrema onerosidade ao adquirente da unidade imobiliária, em prol de injustificada

vantagem ao incorporador.

O compromisso de compra e venda de unidade imobiliária é um contrato de

adesão que não permite ao adquirente expressar sua autonomia da vontade,

limitando-se tão somente a aderir os termos pré-elaborados. Assim, obriga-se o

adquirente ao cumprimento da obrigação pecuniária, de pagar o preço; enquanto a

incorporadora obriga-se a efetuar a edificação do empreendimento e efetiva entrega

do imóvel aos adquirentes.

Denota-se, portanto, que a extensão do prazo para cumprimento da obrigação

da incorporadora, através da utilização da cláusula de carência; resta

desproporcional e abusiva, visto que o adquirente na condição de consumidor é

obrigado a suportar situação de inquestionável desvantagem, visto que, mesmo

tendo adimplido pontualmente com sua obrigação contratual, terá que aguardar a

entrega do empreendimento em prazo muito superior ao convencionado, sem ter

qualquer beneficio em detrimento de tal condição.

Em linhas gerais, a cláusula de carência tem por objetivo prorrogar

automaticamente o prazo de entrega do empreendimento em caso de mora da

incorporadora, de modo que tal inadimplemento relativo reste suprido por tal ajuste;

resguardando o incorporador de possíveis responsabilizações de ordem civil.

O estabelecimento de prazo de carência para a entrega das unidades

imobiliária é cláusula abusiva e ilegal nos termos do artigo 51, IV do Código de

Defesa do Consumidor. Ademais, a própria Lei nº. 4591/1964 vislumbra como

obrigação primordial do incorporador a execução das obras em concordância com o

cronograma, a fim de que a conclusão do empreendimento ocorra impreterivelmente

dentro do prazo ajustado.

A cláusula de carência, portanto, por gerar desequilíbrio contratual,

prejudicando e onerando excessivamente o consumidor, deve ser declarada nula, a

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fim de que não produza efeitos. Não se pode conceber que o consumidor seja

compelido a arcar com o ônus do atraso na entrega, sem que a incorporadora

responda por sua mora.

É indiscutível que a celebração do compromisso de compra e venda de

unidade imobiliária gera ao adquirente legítimas expectativas acerca do bem futuro

adquirida, de modo que o prazo de conclusão das obras e entrega do imóvel, torna-

se condição fundamental do negócio jurídico.

O atraso na entrega da unidade imobiliária adquirida antecipadamente, na

planta gera o dever de indenizar, de modo que o adquirente deve ser ressarcido pela

incorporadora pelos danos suportados, de ordem material e também,

extrapatrimonial. Ademais, poderá resolver o contrato, caso seja de seu interesse,

visto que o descumprimento de obrigação essencial gera ao contraente prejudicado

a possibilidade de rescisão contratual.

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