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Sumário
Fernando Pessoa:
1. O Ser/Eu fragmentado -
0 Audição, leitura e análise do poema “Não sei quantas almas
tenho”; 0 Breve comentário ao poema “Viajar! Perder países!”.
2. O Sonho, a Evasão, a Angústia, o Tédio, a Frustração – trabalho degrupo
0
Leitura e análise dos poemas “Não sei se é sonho, se realidade”;“Tudo que faço ou medito; “Em toda a noite o sono não veio.Agora”, “Abdicação” e “Boiam leves, desatentos”, conformetópicos do manual.
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Fernando Pessoa - O “Eu” fragmentado
Quem sou eu?
“Cumpre-me agora dizer que espécie de homem sou.
Não importa o meu nome, nem quaisquer outros pormenores externos queme digam respeito. É acerca do meu carácter que se impõe dizer algo.
Toda a constituição do meu espírito é de hesitação e dúvida. Para mim, nadaé nem pode ser positivo; todas as coisas oscilam em torno de mim, e eu comelas, incerto para mim próprio. Tudo para mim é incoerência e mutação. Tudoé mistério, e tudo é prenhe de significado. (…)
(…) o meu carácter é do género interior, auto-cêntrico, mudo, nãoautossuficiente mas perdido em si próprio. “
1910?
Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação. Fernando Pessoa. (Textos estabelecidos e prefaciados por Georg Rudolf Lind e Jacinto do Prado Coelho.) Lisboa:Ática, 1966. - 17.Trad: Jorge Rosa
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Fernando Pessoa - O “Eu” fragmentado
“Não sei quem sou, que alma tenho.Quando falo com sinceridade não sei com que sinceridade falo. Souvariamente outro do que um eu que não sei se existe (se é esses outros).Sinto crenças que não tenho. Enlevam-me ânsias que repudio. A minha
perpétua atenção sobre mim perpetuamente me aponta traições de almaa um carácter que talvez eu não tenha, nem ela julga que eu tenho.Sinto-me múltiplo. Sou como um quarto com inúmeros espelhos fantásticos que torcem para reflexões falsas uma única anterior realidadeque não está em nenhuma e está em todas.Como o panteísta se sente árvore e até a flor, eu sinto-me vários seres.
Sinto-me viver vidas alheias, em mim, incompletamente, como se o meuser participasse de todos os homens, incompletamente de cada, por umasuma de não-eus sintetizados num eu postiço.”
1915?
Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação. Fernando Pessoa. (Textos estabelecidos e prefaciados por Georg Rudolf Lind e Jacinto do Prado Coelho.) Lisboa: Ática, 1966. - 93.
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Fernando Pessoa - O “Eu” fragmentado - Fernando Pessoa: um ser perdido no labirinto de si mesmo, não encontrando o
fio de Ariadne* que conduz à saída. (*ver Wikipédia)
0 - Tendência para a multiplicidade, segundo Jacinto do Prado Coelho:
1ª 2ª 3ª
A constituição psíquica doautor, instável e falho devontade
A qualidade do poeta detipo superior:maximamentedespersonalizado
A qualidade de português:o bom português é váriaspessoas
4ª 5ª 6ª
Uma nova fase de
civilização:a despersonalização do“Eu” de carácter histórico-sociológico
A resposta a um estado
coletivo de crise: a buscade um equilíbrio interior
A necessidade de suprir a
carência depersonalidades superiores(heteronímia)
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Não sei quantas almas tenho
Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.Continuamente me estranho.Nunca me vi nem acabei.De tanto ser, só tenho alma.Quem tem alma não tem calma.Quem vê é só o que vê,Quem sente não é quem é,
Atento ao que sou e vejo,Torno-me eles e não eu.Cada meu sonho ou desejoÉ do que nasce e não meu.Sou minha própria paisagem;Assisto à minha passagem,Diverso, móbil e só,Não sei sentir-me onde estou.
Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.O que segue não prevendo,O que passou a esquecer.Noto à margem do que liO que julguei que senti.Releio e digo : "Fui eu ?"Deus sabe, porque o escreveu.
Fernando Pessoa, Ortónimo
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Vetores estruturantes do poema
Não sei quantas almas tenho.Cada momento mudei.Continuamente me estranho.Nunca me vi nem acabei.De tanto ser, só tenho alma.Quem tem alma não tem calma.Quem vê é só o que vê,Quem sente não é quem é,
Atento ao que sou e vejo,Torno-me eles e não eu.Cada meu sonho ou desejoÉ do que nasce e não meu.Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,Diverso, móbil e só,Não sei sentir-me onde estou.
Por isso, alheio, vou lendoComo páginas, meu ser.O que segue não prevendo,O que passou a esquecer.Noto à margem do que liO que julguei que senti.Releio e digo : "Fui eu ?"Deus sabe, porque o escreveu.
Fernando Pessoa, Ortónimo
A dúvida e a indefinição do sujeito poético relativamente à sua identidade
A constante fragmentação e a divisão do “eu”
A perda da identidade
A angústia do autoconhecimento
A angústia existencial
A racionalização do sentir
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Não sei quantas almas tenho o poeta confessa a sua desfragmentação em múltiplos “eus”,
revelando a sua dor de pensar;
esta divisão provém do facto de intelectualizar as emoções;
a sucessiva mudança leva-o a ser estranho de si mesmo (nãoreconhece aquilo que escreveu);
metáfora da vida como um livro: lê a sua própria história(despersonalização, distancia-se para se ver)
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Não sei quantas almas tenho
O poeta reflete acerca de si próprio, tentando responder à questão “Quem sou eu?”.
Na primeira estrofe há uma alternância temporal presente/passado que, aliada aoadvérbio de predicado “continuamente”, expressa a constante fragmentação sentidapelo sujeito poético, ontem, hoje, sempre.
Nos três últimos versos da primeira estrofe, o sujeito poético passa da primeira para aterceira pessoa através da generalização (“Quem” com valor idêntico a “todo(s),
toda(s), o(s), a(s), aquele(s), aquela(s)”).
No sexto verso denuncia a angústia que a instabilidade lhe provoca, ou seja, o poetaque é constituído apenas por alma, vive na ânsia de se encontrar; por isso, vive sem“calma”, sem repouso.
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Não sei quantas almas tenho
"De tanto ser, só tenho alma", o sujeito poético não sente ter vida, massó alma - ou seja, a sua vida foi (e é) toda pensada, toda racionalizada.
Mas a vantagem de tudo ser inteligência tem desvantagens: "Quemtem alma não tem calma". Quem pensa não tem paz; é inconciliávelpensar e viver, ou se vive sem pensar ou se pensa sem viver. Viver a vida
ou pensar a vida é um oposto que sempre desafia Pessoa.
"Quem vê é só o que vê, / Quem sente não é quem é," marca ainda maisesta oposição viver/pensar. "Quem vê" é aquele que vive só a vida e nãoa pensa (sente). "Quem sente não é quem é" - o pensamento impede aação na vida.
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Não sei quantas almas tenho
As duas primeiras estrofes salientam:
a fragmentação do sujeito poético “Não sei quantas almas tenho. /Cada momento
mudei. /Continuamente me estranho.” e “Torno-me eles e não eu.”;
O seu desconhecimento em relação a si próprio “Cada momento mudei. /
Continuamente me estranho. / Nunca me vi nem achei.”;
O sentimento de despersonalização “Torno-me eles e não eu. / Cada meu sonhoou desejo/ é do que nasce e não meu.”;
O seu papel de “espectador” de si “Sou minha própria paisagem, / assisto à minha
passagem”;
A sua constante inadaptação “Diverso, móbil e só, / não sei sentir-me ondeestou.”. O poeta é "diverso, móbil e só“ [tripla adjetivação] . É um ser volúvel einconstante (“móbil”), salientando a sua solidão
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Não sei quantas almas tenho
Terceira estrofe
A locução adverbial conectiva “Por isso” assume o carácter explicativo/conclusivo em
relação às duas estrofes anteriores. O sujeito poético, tendo tomado consciência dadivisão do seu “eu”, do seu auto desconhecimento, sente-se um estranho (“alheio”)
em relação a si próprio. Olha para as “páginas” da sua vida como quem lê um livro que
outrem escreveu, chegando a pôr em dúvida os seus próprios sentimentos – “o que
julguei que senti”. A vida foi racionalizada, reduzida a linguagem escrita, transferidapara os seus personagens literários.
O sujeito poético sinaliza versos em que se define como um ser sem passado nemfuturo “o que segue não prevendo, /o que passou a esquecer.”
Os dois últimos versos são um desfecho lógico para o poema sendo “alheio” à forma
como a sua vida se desenrola, não passando de um “espectador” que assiste à sua“passagem”, o sujeito poético não poderia tão pouco redigir notas à margem no
“livro” da sua vida. O último verso encerra a resposta à interrogação retórica do versoanterior: alguém superior ao próprio sujeito comanda a sua vida.
Pessoa-ele-mesmo vê-se apenas uma "nota à margem" do livro que foi a sua vida.
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Não sei quantas almas tenho
Análise formal:
0 O poema é constituído por três oitavas de versos de redondilhamaior.
0 A rima apresenta-se segundo o seguinte esquema:ABABCCDD/EFEFGGHH/….., sendo, por isso cruzada nos quatroprimeiros versos de cada estrofe e emparelhada nos restantes;predomina a rima pobre (ex.: tenho/estranho; mudei/achei ),verificando-se em alguns casos rima rica [vejo (verbo - v.9)/ desejo
(nome – v.11)](…)
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A fragmentação do “Eu“ / o tédio existencial
• Tendência para a intelectualizaçãoPermanente processo de autoanálise
• Dúvida e indefinição face à sua identidade, a
angústia do auto-desconhecimento ("Por isso,
alheio, vou lendo / Como páginas meu ser")
- Incapacidade de viver a vida
- Tédio e angústias existenciais
- Desalento e ceticismo profundos
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Correspondências biográficas:
- a morte do seu amigo Sá-Carneiro (Abril 1916)
- procura insistente da felicidade
- dificuldades em ser entendido (?)
- dificuldade em sair do turbilhão em que se enredou
- dificuldades de relacionamento - sente-se um ser marginal
- insatisfação face ao presente - incapacidade de o viver em
plenitude (fragmentação do ser)
- ânsia por vivências, ilusões, sonhos - que possibilitem coisasimpossíveis
- desejo de viajar, de ser o que não é
- insatisfação permanente
- mesmo o próximo é sentido como longínquo
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Não sei quantas almas tenho.Fernando Pessoa
0 Quem sou eu? Oficina de escrita - proposta
O desafio é responder à pergunta que poderia ter estado na origem dopoema de F. Pessoa: Quem sou eu?
Antes de redigires um texto de reflexão sobre esta questão, vais elaborar umplano que deverá obedecer a uma ordem cronológica, assentando numasequência temporal. Aponta datas/momentos que consideres maisimportantes na tua vida e situa as tuas reflexões à volta delas/deles.
O texto deverá ter entre cento e trinta e duzentas palavras e deverá estarorganizado da seguinte forma: introdução (um parágrafo);
desenvolvimento (três parágrafos) e conclusão (um parágrafo).Para que o texto se apresente lógico e equilibrado, utiliza
conectores/articuladores textuais que evidenciem bem as relações lógicas quepretendes estabelecer entre as diversas partes.
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Viajar! Perder países!
Viajar! Perder países!
Ser outro constantemente,
Por a alma não ter raízes
De viver de ver somente!
Não pertencer nem a mim!
Ir em frente, ir a seguirA ausência de ter um fim,
E a ânsia de o conseguir!
Viajar assim é viagem.
Mas faço-o sem ter de meu
Mais que o sonho da passagem.
O resto é só terra e céu.
A noção de viagem associada à ideia de procura
Para o sujeito poético viajar é a procura de si
mesmo, encontro consigo mesmo.
O poema parte de uma ideia paradoxal de viagem,falando-se aqui de uma viagem permanente, departidas constantes, na qual cada rosto de si mesmoencontrado é um lugar imediatamente perdido. Ouseja, trata-se de uma viagem permanente de
procura e descoberta do ser que é sempre outro enão tem amarras a ninguém, nem a si mesmo.
Viajar é viver nas paisagens e não em si mesmo.
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2. O Sonho, a Evasão, a Angústia, o Tédio, a Frustração
2.Trabalho de grupo
0 Leitura e análise dos poemas “Não sei se é sonho, se realidade”;
“Tudo que faço ou medito; “Em toda a noite o sono não veio.Agora”, Abdicação e “Boiam leves, desatentos”, conforme ostópicos propostos no manual.