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1 6° ENCONTRO NACIONAL DA ABRI PERSPECTIVAS SOBRE O PODER EM UM MUNDO EM REDEFINIÇÃO 25 a 28 de Julho de 2017, Belo Horizonte Área Temática: Instituições e Regimes Internacionais UMA ANÁLISE INSTITUCIONALISTA DAS AÇÕES DO CONSELHO DE SEGURANÇA DA ONU SOBRE A QUESTÃO HUMANITÁRIA RESULTANTE DOS CONFLITOS NA SÍRIA (2011-2015) Mylena Peixoto de Mattos Programa de Pós-Graduação em Ciência Política (PPGCP) Universidade Federal do Paraná

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6° ENCONTRO NACIONAL DA ABRI

PERSPECTIVAS SOBRE O PODER EM UM MUNDO EM REDEFINIÇÃO

25 a 28 de Julho de 2017, Belo Horizonte

Área Temática: Instituições e Regimes Internacionais

UMA ANÁLISE INSTITUCIONALISTA DAS AÇÕES DO CONSELHO DE SEGURANÇA

DA ONU SOBRE A QUESTÃO HUMANITÁRIA RESULTANTE DOS CONFLITOS NA

SÍRIA (2011-2015)

Mylena Peixoto de Mattos

Programa de Pós-Graduação em Ciência Política (PPGCP)

Universidade Federal do Paraná

2

Uma análise institucionalista das ações do Conselho de Segurança da ONU sobre a

questão humanitária resultante dos conflitos na Síria (2011-2015)

Mylena Peixoto de Mattos1

Resumo:

Dentro do contexto da Primavera Árabe no Oriente Médio, as revoltas populares

ocorridas na Síria em 2011 e a eclosão de uma guerra civil no país, tornou a questão síria

uma pauta relevante e recorrente nas reuniões do Conselho de Segurança da ONU. O objetivo

deste trabalho é realizar uma análise sobre a questão humanitária na Síria entre janeiro de

2011 e julho de 2015 no interior do Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU),

especialmente a questão dos refugiados. A metodologia da pesquisa consiste em pesquisas

e coletas dos arquivos do site oficial das Nações Unidas que dizem respeito ao tema. A análise

deu ênfase aos; (i) documentos das reuniões do Conselho, que apresentam todas as

discussões ocorridas nas reuniões, as declarações de todos os presentes, os projetos

discutidos e votados, os votos, abstenções e vetos à projetos; (ii) os projetos de resoluções,

que apresentam as propostas sobre o caso, que deverão ser colocados em votação; (iii) e os

documentos de resolução, que são as propostas de resoluções aprovadas. Este trabalho é

norteado pela Teoria Neoliberal Institucionalista das Relações Internacionais, a qual sustenta

que a habilidade dos Estados de se comunicar e cooperar depende da construção de

instituições. Como resultado, observou-se que a questão humanitária e a questão específica

dos refugiados são o eixo central da maior parte das discussões ocorridas no Conselho,

contudo, este apresentou baixo número de decisões e proposições para o enfrentamento dos

problemas gerados pelos conflitos na Síria. Ademais, a maioria das resoluções aprovadas não

tiveram suas determinações acatadas pelas partes do conflito. Estes resultados colocam em

discussão a habilidade do Conselho de Segurança em agir como mediador das questões e

da cooperação entre os Estados, logo que se observa baixo efeito das ações do Conselho no

conflito, este que perdura até atualmente.

Palavras-chave: CSNU, Guerra-civil, Síria.

1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Paraná. Contato: [email protected]

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1. Introdução

O presente trabalho, parte das premissas teóricas da Teoria Neoliberal Institucionalista

das Relações Internacionais de Robert Keohane. Esta teoria considera os Estados como os

principais atores, o sistema internacional como anárquico e o poder estatal como altamente

significativo, em que o forte pode prevalecer sobre o mais fraco. Todavia, mantém a ideia

liberal clássica de que as instituições internacionais podem facilitar a cooperação (Jackson;

Sorensen 2007). Baseada nas conceituações de Keohane sobre a teoria neoliberal

institucionalista

[...] a hipótese básica da corrente é a de que a habilidade dos Estados de se

comunicar e cooperar depende da construção de instituições que podem

variar em termos de suas naturezas e força. Isso não implica dizer que os

Estados ignorem o poder ou a riqueza uns dos outros, mas que suas ações

dependerão dos arranjos institucionais presentes (SARFATI, 2005, p.155).

Por ‘instituições’, Keohane (1989) entende um conjunto persistente e conectado de

regras - formais e informais - que prescrevem papéis comportamentais, restringe atividades e

modelam expectativas. Nesse contexto, de que as instituições internacionais tornam possíveis

o diálogo, os acordos e a cooperação entre os Estados, essa pesquisa buscou identificar o

comportamento de atores em suas atuações dentro do Conselho de Segurança das Nações

Unidas em relação a um conflito que se tornou uma pauta relevante e mote de discussão entre

vários Estados envolvendo disputas de poder e interesses. Sobre o tema central desta

pesquisa, será possível observar, ao longo do trabalho, que o CSNU, que é uma instituição

fadada a mediar a cooperação entre os Estados na arena internacional, colocará o conflito

sírio, suas questões humanitárias e a questão crescentemente degradante dos refugiados na

arena de discussões, incitando o diálogo e impulsionando os atores pertencentes à instituição

a se posicionarem e a contribuírem sobre o caso.

2. O contexto histórico do conflito sírio

Segundo a análise da conjuntura dos acontecimentos de Santos Filho (2013) a

Primavera Árabe teve sua origem em dezembro de 2010, com a autoimolação de um jovem

vendedor de rua na Tunísia, que desencadeou uma série de protestos que se estenderam do

Norte da África, atravessando o Oriente Médio, chegando ao Golfo Pérsico. A partir desse

estopim ocorreram revoltas e manifestações na Tunísia, Egito, Argélia, Líbia, Jordânia, Iêmen,

Marrocos, Bahrein, Irã, Omã e Síria. Conforme Visentini (2014), essa inesperada onda de

revoltas abalou e derrubou velhas oligarquias autoritárias que estavam no poder há décadas,

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tanto monarquias tradicionais como repúblicas modernizadoras, representando um

movimento geral, com bases comuns em toda a região, mas relacionadas à crise econômica

mundial. Porém, cada país encontra formas e contradições específicas.

Segundo Fonseca (2013), pode-se considerar que existe um elo condutor que

possibilita falar das revoluções árabes em conjunto como se fossem um mesmo fenômeno,

pois, por um lado, as reivindicações, apesar de heterogêneas, derivam de suas situações

ditatoriais de injustiça e repressão, similares em certa medida. E por outro lado, semelhantes

formas de organização e mobilização em países onde se levantaram as revoluções.

De acordo com Abu-El-Haj (2014) a Primavera Árabe consolidou uma nova cultura de

direitos, estabelecendo a noção de que a legitimidade e a sustentabilidade dos governantes

dependem da sua capacidade de transformar as preferências e as demandas dos cidadãos

em políticas concretas que melhorem as expectativas de vida do conjunto da sociedade e de

que o preferido sistema político para viabilizar a integração entre as demandas sociais e as

instituições governamentais depende de eleições livres, nas quais todos os cidadãos tenham

direitos iguais (Idem, 2014, p. 32). Ramírez (2012) afirma que essas revoltas no Oriente Médio

têm sido, desde o início, ideológicas, marxistas, de independência comunista e religiosas.

Revoluções que buscaram restaurar os direitos individuais de liberdade e dignidade

expropriados. Dentre todos os acontecimentos, um caso que se destaca, e que também teve

seu início marcado pela Primavera Árabe, é o caso sírio.

A Síria é um país formado por uma diversidade étnico-religiosa, sendo a maioria

muçulmana sunita, e a parcela restante dividida entre os chamados alauítas, os drusos e os

cristãos. A conquista de sua independência ocorreu em 1946, ao sair do controle

administrativo e territorial da França. Desde então, o país teve sua história política marcada

por diversos golpes e uma recorrente alternância de presidentes no poder (Zahreddine, 2013).

Desde a chegada do partido Baath ao poder em 1963, o regime sírio é um claro

exemplo de sistema autoritário fechado em que não há separação de poderes, não há

pluralismo político, o acesso ao poder por meios democráticos não é viável e não são

preservados os direitos e as liberdades políticas (Alvariño, 2015). Neste cenário, o governo

de Hafez al-Assad é marcado pelo foco nas minorias étnico-religiosas, em detrimento dos

sunitas (Zahreddine, 2013). Embora estabelecida uma firme aliança com a URSS sob esta

presidência, ocorreu o isolamento da Síria em relação ao restante do cenário mundial. Hafez

al-Assad governou por quase 30 anos, até sua morte em junho de 2000, assumindo como

sucessor, seu filho, Bashar al-Assad.

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No início do governo de Bashar al-Assad, houve algumas tentativas de mudanças no

país, como a investida de retirar a Síria de seu forte isolamento político e o maior acesso à

informação via internet. Contudo, forças políticas sírias não permitiram mudanças mais

profundas (Zahreddine, 2013). A ascensão de Bashar al-Assad ao poder marcou o fim de uma

era de instabilidade crônica, sendo seu regime, apesar de não legitimado por grande parte da

população, firme o suficiente para controlar a política interna da Síria e, também, gerir uma

política externa consistente. Todavia,

[...] todos os efeitos das mudanças foram minimizados pelo conflito iniciado

em 2011. As sanções econômicas aplicadas ao regime por outros países

pioraram a situação da Síria, que já enfrentava problemas estruturais como

alto desemprego, grande déficit público, rápido aumento populacional e

pressão por maior disponibilidade de energia e por mais recursos hídricos

para agricultura. (Visentini, 2014, p. 204)

Além disso, a estabilidade interna do país sob o governo de Assad teria sido alcançada

através de ações atrozes contra a população sunita (Olmert, 2011). Desde décadas atrás, o

regime Baathista teve com a população síria um “contrato social” pelo qual o governo

proporcionava alimentos subsidiados e emprego para as classes média e baixa. (Alvariño,

2015). Com a liberalização econômica, esse contrato social quebrou o Estado sírio, não

cumprindo suas necessidades mais básicas, causando a privatização parcial dos serviços

sociais, o aumento de 14% da pobreza nos primeiros dez anos de governo de Bashar al-

Assad, aumento do custo de vida no país, alta inflação, a crescente desigualdade e o

empobrecimento das oportunidades de emprego, logo gerando grande insegurança a muitos

trabalhadores sírios (Idem, 2015).

Todos esses fatores levaram ao terreno fértil do levante popular em 2011, quando

parte da população síria saiu às ruas exigindo pacificamente uma reforma profunda das

estruturas de poder e, sobretudo, uma transição para a democracia (Alvariño, 2015). Os

manifestantes clamavam pelo fim do estado de emergência, pela legalização de partidos

políticos e por uma maior liberalização e participação política (Visentini, 2014). A essas

reivindicações de reformas constitucionais e maior abertura política, houve uma violenta

reação (Zahreddine, 2013). Após a eclosão da revolta, o Presidente Bashar al-Assad optou

por uma solução militar ao perceber que sua própria sobrevivência estava em jogo. A

repressão brutal contra os manifestantes causou centenas de vítimas e convenceu a oposição

sobre a necessidade de recorrer às armas para defender a população, levando, assim, à

militarização da revolta (Alvariño, 2015). Todo esse processo desencadeou uma Guerra Civil

no país.

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Com o agravamento dessa guerra civil, o número de refugiados sírios foi crescente.

Segundo dados da UN Refugee Agency (UNHCR), Office for the Coordination of Humanitarian

Affairs (OCHA) e International Organization of Migration (IOM), compilados pelo Amnesty

International2 existiam, até meados de 2016, mais de 4,5 milhões de refugiados sírios, que se

concentraram principalmente em cinco países: Turquia, Líbano, Jordânia, Iraque e Egito. A

Turquia acolheu em torno de 2,5 milhões de refugiados, enquanto o Líbano recebeu 1,1

milhão. A Jordânia acolheu ao todo 635 mil refugiados, o Iraque em torno de 245 mil e, por

fim, o Egito que acolheu por volta de 117 mil refugiados. Desde o início da guerra civil síria,

esses cinco países têm sido os principais destinos dos refugiados, sendo crescente o número

deste, sobretudo no recorte temporal analisado nesta pesquisa (2011-2015) como ilustrado

na figura 1:

Figura 1 – Refugiados sírios registrados pelos países de asilo de 2011 (1° de fev) a 2016 (1°

de maio).

Fonte: Eurostat (EU28, Norway and Switzerland); UNHCR (Turkey, Lebanon, Jordan, Iraq and Egypt)3

É possível observar, também na Figura 1, que a Europa se tornou um destino

crescente de refugiados, ultrapassando o Egito e o Iraque a partir de 2014 e 2015,

respectivamente, em número de refugiados acolhidos. O fato da Europa estar envolvida, de

2 https://www.amnesty.org/en/latest/news/2016/02/syrias-refugee-crisis-in-numbers/ 3 Disponível em: http://www.migrationpolicycentre.eu/migrant-crisis/focus-on-syrians/

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certa maneira, no conflito, sendo também destino dos refugiados, dá ainda mais visibilidade à

questão da Síria no cenário internacional. Contudo há, em grande parte, uma paralisia que

impede com que se faça muito mais pelos refugiados em termos de políticas públicas, sendo

essa paralisia advinda de uma visão que enxerga os refugiados como “uma massa de

problemas estranhos que se introduzem em Estado alheio” (Andrade, 2011, p. 130)

Na esfera externa, é possível perceber, segundo Visentini (2014), um grande conflito

regional por trás dos problemas na Síria, bem como uma presença de interesses de grandes

potências. A multidimensionalidade deste conflito é um impasse na resolução do problema

sírio, pois há a presença de forças transnacionais com interesses distintos e ambas as partes,

governo e oposição, não alcançam poder suficiente para fazer com que a outra ceda,

causando a estagnação do conflito, sustento da violência e o aumento do número de mortes

de civis (Zahreddine, 2013). As divergências entre as potências, tanto de cunho político,

quanto econômico, destoam do foco principal que é trabalhar em um projeto pró-Síria. Outro

fator é a falta de diálogo entre a oposição e o governo (Corrêa, 2013). O apoio do ocidente à

oposição aumenta o isolamento desta em relação ao governo e o isolamento do governo sírio

em relação ao cenário internacional em geral. Por fim, outro fator que não contribui para a

resolução deste impasse é o uso do veto pela Rússia e pela China dentro do Conselho de

Segurança da ONU (Idem, 2013).

De acordo com Alvariño, (2015, p. 172, sem grifos no original),

As revoltas populares iniciadas em Março de 2011 na Síria não só levaram a

uma mudança política, mas também têm intensificado o regime autoritário

que, desde o início optou por uma solução militar. [...] Em seus quatro anos,

a crise síria mudou sua natureza, a partir de uma revolta anti-autoritária a uma

guerra por procuração com a presença ativa de poderes e atores regionais.

[...] A comunidade internacional, com a sua política de esperar para ver,

é também responsável pela deriva síria, na medida que tem permitido

que a ferida se gangrene e que a metástase contagie todo o país

espalhando o sectarismo.

Todavia, mesmo havendo propostas de soluções do conflito aprovadas pelo Conselho

de Segurança, ocorre dos lados do conflito não as acatarem. A partir desses impasses, o

conflito sírio colocou em xeque a capacidade do Conselho de Segurança da ONU de lidar com

problemas de natureza conflituosa. Dentro dos embates de interesses individuais atrelados

ao conflito, envolvendo parceiros econômicos e aliados políticos, um dos maiores impasses

do Conselho de Segurança da ONU é a desunião e o desacordo entre dois blocos dominantes:

de um lado EUA, França e Reino Unido, do outro Rússia e China (Corrêa, 2013). Diante dessa

situação, começam a ser levantados questionamentos acerca de qual seria a legitimidade dos

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membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU em deter a exclusividade da

decisão sobre o que deve ser feito na Síria; e em qualquer outra situação de conflito (Corrêa,

2013).

3. A questão síria em pauta no Conselho

Em uma pesquisa no site oficial das Nações Unidas4, foram identificados, coletados e

analisados 40 documentos das Reuniões do Conselho, 18 de Projetos de resoluções e 14

resoluções aprovadas, entre julho de 2011 e julho de 2015, que tratam objetivamente sobre a

situação do Oriente Médio, sendo a Síria o cerne das discussões. Em 2011, com o início do

conflito sírio e o agravamento deste, o debate sobre a Síria começa a tornar-se significativo.

Em agosto de 2011, na 6598th Meeting, se iniciam os apelos dos membros do Conselho pelo

fim imediato da violência de ambas as partes do conflito, manifestando preocupação pela

deterioração da situação da população, e da Síria em geral, condenando a violação

generalizada dos direitos humanos e o uso da força contra civis pelas autoridades sírias,

impelindo estas a aliviar a situação humanitária em zonas de crise. Todavia, reafirmando o

forte compromisso do Conselho com a soberania, independência e a integridade territorial da

Síria. Até então, nada é citado sobre refugiados.

Na reunião seguinte, a 6627th Meeting, ocorrida em outubro de 2011, é votado o

projeto de resolução S/2011/612. Este projeto indica a suspensão da violência pelo governo

sírio; a investigação das violações dos direitos humanos durante as manifestações mais

recentes na época; sublinha a necessidade de responsabilizar os identificados por violar

esses direitos; insta as autoridades sírias a cooperar de forma abrangente com as Nações

Unidas e sublinha que a única solução para a crise síria é através de um processo político

inclusivo no país. Este projeto também expressa lamentos e preocupações com a violência e

demanda que as autoridades sírias cessem imediatamente as violações dos direitos

humanos; permita o pleno exercício desses direitos e das liberdades fundamentais por toda a

população, inclusive o direito de liberdade de expressão e de reunião pacífica. O projeto de

resolução também demanda a libertação de todos os presos políticos e manifestantes

pacíficos, a cessão do uso da força contra civis, o alívio da situação humanitária em zonas de

crise, permitindo, inclusive, o acesso rápido e livre de agências e trabalhadores humanitários,

garantindo, também, o retorno seguro e voluntário aos seus lares de pessoas que fugiram da

violência. Condena também os ataques aos diplomatas, e exorta todos os Estados a

exercerem vigilância e cautela sobre o abastecimento, venda ou transferência de armas e

4 http://www.un.org/en/sc/

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materiais conexos, para a Síria, bem como a formação técnica, recursos financeiros,

consultoria, assistência, ou outros serviços, relacionados a essas armas e materiais conexos.

Ao ser votado, esse projeto foi recusado pela Rússia e pela China. Pelo voto negativo provindo

de membro permanente do Conselho, o projeto não foi adotado, o que causou furor entre os

membros na reunião.

Na próxima reunião do Conselho sobre o tema foi em janeiro de 2012, a 6710th

Meeting, é novamente citada a situação de declínio do povo sírio e é abordado o sofrimento

dos refugiados. Na reunião seguinte, a 6711th Meeting, em fevereiro de 2012, é votado o

projeto de resolução S/2012/77, projeto que segue a mesma linha de abordagem do assunto

que o projeto de resolução descrito anteriormente, e não adotado novamente, devido aos

votos negativos dos membros Rússia e China. Nessa reunião, aborda-se sobre a questão

humanitária do país, mas não é mencionado o caso dos refugiados. Nas reuniões seguintes,

a 6734th Meeting, a 6736th Meeting e a 6746th Meeting, ocorridas as duas primeiras em

março e a terceira em abril, é afirmado que o conflito e, particularmente, o número de

refugiados são crescentes na Síria, manifestando grande preocupação com a deterioração da

situação na Síria, o que resultou em uma grave crise dos direitos humanos e uma situação

humanitária deplorável, instando novamente o fim da violência e a cooperação plena, por

parte das autoridades sírias com as Nações Unidas e as organizações dispostas, facilitando

a ação destas na prestação de assistência humanitária. Em abril deste mesmo ano, é votado,

na 6751st Meeting, o projeto de resolução S/2012/219, que é aprovado unanimemente pelos

membros, e adotada como a resolução 2042 (2012). Em relação à questão humanitária, essa

resolução condena as violações dos direitos humanos e apela às autoridades sírias para

permitir o imediato e total livre acesso de ajuda humanitária a toda a população que necessita

de assistência e apela a todas as partes na Síria, mas, sobretudo, às autoridades, que

cooperem plenamente com as Nações Unidas e com as organizações humanitárias para

facilitar a prestação dessa assistência. Nesta resolução é anexada o Plano de Paz de Seis

Pontos – do inglês six-point peaceplan - de Kofi Annan, contudo, nada mais significativo é

discutido sobre os refugiados. Na 6756th Meeting que ocorre em abril de 2012, é votado o

projeto de resolução S/2012/245, adotado unanimemente como a resolução 2043 (2012).

Essa resolução é muito semelhante à anterior, expressando a apreciação pela ajuda

humanitária vinda de outros Estados, e exortando todas as partes do conflito sírio, incluindo

a oposição, a cessão imediata de toda violência armada em todas as suas formas. Nesta

reunião, é afirmado que a urgência humanitária é maior do que nunca e que a situação

humanitária piora a cada dia. É considerada, também, toda a ajuda aos refugiados sírios e

gratidão às acolhidas a esses refugiados.

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Em julho de 2012, na 6810th Meeting, é votado o projeto de resolução S/2012/538, o

qual condena as violações generalizadas dos direitos humanos e o uso deliberado da força

tanto pelas autoridades sírias, como pela oposição; deplorando a já citada deterioração da

situação humanitária e a incapacidade de assegurar a disponibilização oportuna de

assistência humanitária a todas as zonas afetadas pelos combates. Nesse projeto é

manifestada, também, uma profunda preocupação com o aumento crescente do número de

pessoas deslocadas internamente e do número de refugiados, resultados da violência em

curso. Este projeto reitera, novamente, o apreço e agradecimento aos Estados que estão

acolhendo essas pessoas refugiadas. Este projeto não é adotado, devido, mais uma vez, ao

veto da Rússia e da China. Mas na seguinte reunião de julho, a 6812th Meeting, é aprovada

a resolução 2059 (2012), a qual, em resumo, elogia os esforços da United Nations Supervision

Mission in Syria (UNSMIS). Todavia, nada sobre a questão humanitária e sobre os refugiados

é tratado de maneira mais específica.

No restante do ano de 2012, são realizadas mais três reuniões do Conselho sobre o

tema; a 6826th Meeting em agosto, a 6841st Meeting em setembro, e a 6849th Meeting em

outubro. Em geral, começa-se a tratar sobre as consequências para os países vizinhos que

abriram suas fronteiras para os refugiados sírios. É citado o agravamento da causa

humanitária e do número de refugiados, o que repercute em consequências e impactos

significativos, tanto econômicos, quanto políticos e sociais nos países acolhedores. Sobre o

caso também é afirmado que se a assistência humanitária conseguir se tornar mais eficaz

dentro da Síria, reduziria o número da população forçada a fugir através das fronteiras. Assim,

apela-se mais uma vez para que haja a concessão do acesso humanitário sem restrições

dentro do país, para que esses atores humanitários possam oferecer proteção e assistência,

sem discriminação, de acordo com os princípios humanitários. Vale ressaltar que nestas

reuniões é declarado que não existe solução humanitária para a crise síria. Somente uma

solução política que conduza à paz, permitiria a conclusão dessa emergência humanitária.

Outro ponto que se ressalta é a posição de alguns membros como, por exemplo, o

representante da Turquia, que infere que essa situação humanitária alarmante é

consequência das ações de um só responsável: o regime sírio. Este afirma que nenhum dos

refugiados que deixa a Síria, o faz por causa dos grupos de oposição que estão lutando para

parar os assassinatos por lá, mas sim estão fugindo da opressão do regime autoritário sírio.

Destaca-se, também, o apelo à comunidade internacional para que esta forneça apoio aos

países que estão enfrentando o desafio de acolher o grande número de refugiados.

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Em dezembro ocorreu a 6893rd Meeting, na qual foi votado o projeto de resolução

S/2012/935, adotado como a resolução 2084 (2012). Essa resolução, em resumo, expressa

preocupação com os conflitos fronteiriços entre Israel e Síria, apelando para que as partes

contenham e evitem qualquer violação do cessar-fogo dessa área de separação, ressaltando

que não deve haver nenhuma atividade militar na área de separação. Em 2013, a primeira

reunião sobre o caso ocorre no mês de junho, a 6991st Meeting, na qual foi aprovada e

adotada a resolução 2108 (2013). Essa resolução é semelhante a anteriormente adotada, que

trata sobre os conflitos fronteiriços entre Israel e Síria, e nada é citado sobre a questão

humanitária do conflito interno sírio ou sobre o caso dos refugiados. Em julho, na 7000th

Meeting, são reconhecidos todos os esforços das equipes humanitárias no auxílio aos

necessitados, todavia, é dito que a ajuda ainda é insuficiente para satisfazer as necessidades

identificadas, além de que alguns locais permanecem inacessíveis devido à luta ativa e à

insegurança e, por vezes, áreas de entrada não são autorizadas. Nessa reunião é reiterado,

também, o crescente número de refugiados e o impacto esmagador disso nos países

acolhedores.

Sr. Antonio Guterres, Alto Comissário da Agência das Nações Unidas para os

Refugiados (ACNUR), declara que se deve reconhecer que não se pode continuar a tratar o

impacto da crise síria como uma emergência humanitária simples, sendo necessária uma

abordagem de longo prazo, com foco na assistência ao desenvolvimento para os países e

comunidades mais gravemente afetados pela crise dos refugiados. Guterres reitera nessa

reunião, também, o apelo a todos os Estados e uma massiva solidariedade internacional, tanto

na região quanto os mais afastadamente localizados, para manter as fronteiras abertas e

receber todos os sírios que buscam proteção.

Em setembro, na 7038th Meeting, é votado o projeto de resolução S/2013/575,

adotado como a resolução 2118 (2013). Esta resolução trata sobre as armas químicas

utilizadas nos conflitos sírios, afirmando que a proliferação dessas armas constitui uma

ameaça à paz e à segurança internacionais e afirma que nenhuma parte do conflito deve usar,

desenvolver, produzir, adquirir, armazenar, conservar ou transferir armas químicas. Essa

resolução ressalta, também, que, em todas as circunstâncias, o Governo deve permitir

imediato e integral acesso à ajuda humanitária por organizações a todas as áreas afetadas

pelo conflito, todavia, nada é tratado sobre os refugiados. Na reunião, a questão humanitária

é abordada, muitas vezes, nas declarações dos representantes dos países. O representante

da China afirma que a situação humanitária na Síria está se deteriorando, o dos Estados

Unidos ressalta que se deve continuar a fornecer a ajuda humanitária, e que nem Al-Assad,

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nem ninguém deve ficar entre a ajuda e as pessoas que precisam dela. Antonio Guterres

declara que a Síria se tornou a tragédia deste século, uma calamidade humanitária

vergonhosa com o sofrimento e deslocamento paralelo na história recente.

Mas apesar desse reconhecimento da situação humanitária decadente, e a situação

precária dos refugiados, o Secretário-Geral da reunião afirma que essa resolução aprovada é

histórica e é a primeira notícia esperançosa sobre a Síria, em um longo tempo. Em outubro,

na 7039th Meeting, é aprovada a declaração presidencial sob o símbolo S/PRST/2013/15.

Essa declaração do presidente do Conselho sublinha a magnitude da tragédia humanitária,

focando as apelações relacionadas a essa questão, e à questão dos refugiados, clamando

para que as autoridades sírias facilitem a entrada de forças de ajuda humanitária e a

aprovação de projetos humanitários; e expressa preocupação em relação ao número

crescente de refugiados, reconhecendo os esforços dos Estados que os estão abrigando e,

também, o direito dos refugiados de retornarem ao país. Nesta declaração, o presidente do

Conselho de Segurança também trata da crise que os países hóspedes dos refugiados estão

enfrentando.

Uma segunda reunião é realizada em outubro, a 7049th Meeting, na qual Valerie

Amos, Subsecretária-Geral de Assuntos Humanitários e Coordenador da Ajuda de

Emergência, declara que, apesar dos alarmes do Conselho, a situação humanitária da Síria

sofre uma deterioração rápida e significativa, e que a resposta humanitária na Síria continua

a ser severamente insuficiente em relação às necessidades crescentes. Amos incita as

autoridades sírias a tomar atitudes imediatas em relação à questão humanitária e à permissão

da expansão dos esforços e redução dos impedimentos aos auxílios humanitários. Em

dezembro, na 7089th Meeting, é aprovada unanimemente e adotada a resolução 2131 (2013)

que trata, novamente, somente sobre os conflitos fronteiriços entre Israel e Síria, sem

mencionar a questão humanitária mais propriamente, ou a questão dos refugiados.

Em fevereiro de 2014, na 7116th Meeting, é votado o projeto de resolução S/2014/115,

o qual é aprovado e adotado como a resolução 2139 (2014). Essa resolução volta a tratar da

questão humanitária, e mais particularmente sobre os refugiados, manifestando profundo

alarme com a deterioração rápida e significativa da situação humanitária na Síria, e grande

preocupação com o aumento do número de refugiados e deslocados causados pelos conflitos.

Exorta todas as partes a acabar imediatamente com toda a violência que leva a esse

sofrimento humano, condenando veementemente o aumento dos ataques terroristas. Por fim,

sublinha que a situação humanitária continuará a se deteriorar na ausência de uma solução

política para a crise. Na reunião, é tratada, sobretudo, a questão humanitária, e é afirmado

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que essa resolução adotada tem como objetivo procurar proteger os civis afetados pelo

conflito na Síria, exigindo que o acesso humanitário seja rápido, seguro e sem obstáculos,

para que essa assistência seja transmitida mais diretamente para as pessoas que dela

necessitam. Também é declarado que essa resolução lida com as várias dimensões da

tragédia humanitária na Síria, que é insustentável em nível interno, e tem ido além das

fronteiras da Síria, para os países vizinhos, criando, assim, um problema internacional

humanitário em consequência do fluxo dos refugiados, que tem afetado todos os aspectos da

vida econômica e social e a segurança desses países acolhedores.

Em junho de 2014, na 7180th Meeting, é votado o projeto de resolução S/2014/348

que não é adotado pelo Conselho, devido aos votos negativos da Rússia e da China. Neste

projeto de resolução, o Conselho intenta remeter a situação síria ao Tribunal Internacional de

Crimes de Guerra, conhecido também como Corte Penal Internacional (ICC - International

Criminal Court), o que não é aceito pelos membros que votaram contra.

Em junho de 2014, na 7209th Meeting é aprovada a resolução 2163 (2014) que

condena a violência corrente no conflito sírio e proclama a todas as partes respeitarem as leis

humanitárias, focando, também, nos conflitos fronteiriços entre Síria e Israel. Nesta resolução

nada é mencionado sobre os refugiados. Na 7212th Meeting, o Secretário Geral do Conselho

faz o relatório da implementação da resolução 2139 (2014), esta que trata mais propriamente

sobre a questão humanitária na Síria. O Secretário informa ao Conselho que a violência e

ataques a civis, por todas as partes do conflito, e abusos de direitos humanos continuam a

grassar, com consequências devastadoras para as pessoas afetadas, ressaltando que,

apesar dos esforços das agências das nações unidas e não-governamentais de ajuda

humanitária, a violência e os crimes contra a humanidade perduram e a dificuldade das

assistências humanitárias atingirem os necessitados é significativa. O representante da Síria,

nesta reunião, declara que está surpreso que este relatório do Secretário-Geral ignora o fato

de que a principal razão para o surgimento e agravamento da situação humanitária está,

segundo ele, enraizada na ascensão e escalada do terrorismo no país.

Na 7216th Meeting, de julho de 2014, é votado o projeto de resolução S/2014/490,

aprovado e adotado unanimemente como a resolução 2165 (2014); que deplora o fato de as

exigências da resolução 2139 (2014) não terem sido atendidas, reiterando a apreciação às

ajudas humanitárias realizadas e aos países acolhedores de refugiados. Essa resolução

condena também toda a violência, os crimes contra a humanidade e as violações da lei

humanitária internacional, e manifesta profundo alarme na propagação de grupos extremistas,

condenando o terrorismo em todas as suas formas e manifestações. Nesta reunião, o

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representante da Síria volta a questionar a recriminação das autoridades sírias por parte dos

demais representantes, e afirma que a existência de refugiados e pessoas deslocadas na

Síria é devido ao mesmo motivo que a deterioração da situação humanitária: o terrorismo,

sendo este patrocinado por atores externos.

Em agosto de 2014 ocorre a 7252nd Meeting, na qual é declarado que a situação

humanitária, apesar das resoluções adotadas, deteriorou, em vez de ser diminuída. Contudo,

pela primeira vez em seis meses houve alguma melhoria sobre o acesso humanitário, este

conseguindo alcançar mais pessoas necessitadas em áreas de difícil alcance, como resultado

da adoção, pelo Conselho, da resolução 2165 (2014). As seguintes reuniões do Conselho

ocorridas em 2014, a 7273rd Meeting em setembro, a 7293rd Meeting em outubro, a 7324th

Meeting em novembro e a 7342nd Meeting em dezembro, também abordam sobre a situação

síria após a aprovação das últimas resoluções, reconhecendo que a resolução 2165 (2014)

ajudou as Nações Unidas a superar alguns dos desafios enfrentados ao permitir que a ajuda

humanitária chegasse diretamente à população necessitada, mas que, em geral, a situação

humanitária da Síria continua se deteriorando, a violência continua crescente, assim como é

crescente o número de refugiados.

Em dezembro deste mesmo ano, é votado, na 7344th Meeting, o projeto de resolução

S/2014/897, aprovado e adotado como a resolução 2191 (2014). Esta resolução, dentro do

intervalo de tempo analisado nesse trabalho, é a última adotada pelo Conselho que trata mais

especificamente sobre a questão humanitária da Síria. Nesta é declarada a preocupação com

a deterioração continuada da devastadora situação humanitária na Síria, também com a falta

de implementação das demais resoluções aprovadas pelo Conselho, pelas partes do conflito

interno sírio, expressando profunda preocupação também com as áreas da Síria que estão

sob o controle do Estado Islâmico. Essa resolução condena fortemente a detenção e tortura

de civis, expressando a preocupação com os contínuos e novos impedimentos à prestação

de assistência humanitária através das fronteiras e através das linhas de conflito. Expressa,

também, preocupação com o grande número de refugiados e dos riscos de estabilidade

regional dos países acolhedores. Além de condenar a violência generalizada, os abusos dos

direitos humanos e as violações da lei humanitária internacional, é ressaltado, como antes já

visto, que a situação humanitária continuará a se deteriorar na ausência de uma solução

política para a crise.

Ainda neste ano, é adotada mais uma resolução, a 2192 (2014), que condena o

combate fronteiriço entre Israel e Síria. No início de 2015, na 7369th Meeting em janeiro, e na

7394th Meeting de fevereiro é majoritariamente tratado sobre a questão humanitária, e a

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deterioração desta; sobre a questão específica dos refugiados, que atingiu números

crescentes surpreendentes; sobre a não-adoção das resoluções pelo governo sírio; e sobre o

reconhecimento de toda ajuda humanitária possível de ser realizada e da acolhida dos

refugiados pelos países vizinhos. Sobre o caso, o representante da Síria declara que se seguir

a crise humanitária objetivamente, pode ser visto que essa crise, incluindo a questão dos

refugiados, surgiu apenas nas áreas controladas por grupos terroristas armados, e que se o

Conselho de Segurança deseja verdadeiramente ajudar os refugiados sírios, é necessário

ajudá-los a voltarem para a Síria em cooperação com o governo do país. Na 7401st Meeting,

em março de 2015, é votado o projeto de resolução S/2015/161, aprovado e adotado pelo

Conselho como a resolução 2209 (2015), que reitera a condenação do uso de armas

químicas, ressaltando que nenhuma das partes do conflito deve fazer o uso dessas. Na

reunião, esse uso de armas químicas é declarado como crime contra a humanidade e que

viola a lei humanitária internacional.

Até o fim de julho de 2015, é adotada mais uma resolução, a 2229 (2015), que trata,

novamente, sobre a condenação expressa dos conflitos fronteiriços entre Israel e Síria.

Ademais, nas últimas seis reuniões ocorridas até o fim de julho deste mesmo ano, a 7418th

Meeting em março, a 7433rd Meeting em abril, a 7452nd Meeting em maio, a 7476th Meeting

em junho e as 7493rd Meeting e 7497th Meeting ocorridas em julho, trataram com significativa

primazia a questão humanitária e sobre os refugiados. De maneira geral, o assunto é tratado

de forma semelhante às reuniões anteriores, considerando toda a ajuda humanitária oferecida

à população necessitada, e a cooperação do governo sírio com as Nações Unidas para

facilitar a prestação dessa assistência humanitária a todos os civis. Contudo, é ressaltado o

aumento significativo do número de refugiados e a deterioração da situação desses e da

situação humanitária do país, em geral. Além disso, também é abordado o agravamento da

situação dos países acolhedores desse grande número de refugiados. Nesse contexto, o

representante da Síria volta a defender que a principal razão para o surgimento da crise

humanitária na Síria é, essencialmente, o fenômeno terrorista generalizado, sendo este

apoiado por forças externas. Desta maneira, declara-se, na última reunião ocorrida dentro do

intervalo de tempo analisado, que o conflito sírio se tornou um símbolo vergonhoso de divisão

e fracasso da comunidade internacional, e se expressa o profundo desapontamento sobre a

não-adoção das resoluções do Conselho de Segurança, destinadas a aliviar o sofrimento

humanitário ou de combate ao terrorismo, sendo este caso da Síria, considerado a maior crise

humanitária do mundo.

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Entre essas 40 reuniões ocorridas no CSNU para tratar especificamente da questão

síria foram propostos, ao todo, 18 projetos de resolução. Dentre esses 18 projetos elaborados,

14 foram aprovados pelos membros do Conselho e adotados como resoluções. Dentre o

recorte de tempo analisado, é possível observar que entre 2011 a 2012 e 2013 a 2014 são os

períodos em que houve mais projetos de resoluções propostos, sendo 6 propostas em cada

período. Contudo, infere-se que o agravamento do conflito, a deterioração da situação

humanitária e o crescente número de refugiados tornaram os membros do Conselho mais

condescendentes, pois no período de 2013 a 2014 cinco dos seis projetos propostos se

tornaram resoluções, ou seja, quase todos os projetos propostos foram aprovados. O período

entre 2012 e 2013, foi o que houve menos propostas de resoluções, sendo dois projetos,

embora ambos tendo sido aprovados. Por fim, no último período analisado, 2014 a 2015 foram

propostos o total de 4 proposições de resoluções, tendo sido todos aprovados pelo Conselho.

4. Considerações finais

Através deste exame dos documentos do Conselho de Segurança da ONU, é possível

observar que a ONU trouxe a questão síria para o espaço de discussões, tornando o caso

pauta de muitas reuniões do Conselho. Todavia, poucas propostas de decisões foram

elaboradas, estendendo a discussão enquanto o conflito se agrava progressivamente, além

de que disputas de interesses e ‘alianças’ prejudicaram algumas tomadas de decisões dentro

do Conselho, como pode ser observado nos vetos que as propostas de resolução receberam,

o que congelou, de certa maneira, as ações do Conselho. É possível observar, neste sentido,

através da leitura dos documentos, o posicionamento dos membros permanentes, e essas

‘alianças’ estabelecidas, em que “por um lado, EUA, França e Grã-Bretanha apoiam uma

intervenção humanitária, de outro, Rússia e China pregam a não interferência externa”

(Corrêa, 2013).

A análise desses documentos permitiu perceber, também, que a questão humanitária

era o ponto central das discussões e um dos temas de maior preocupação, expressa nas

declarações dos membros do Conselho. A questão específica sobre os refugiados veio a

ganhar mais espaço nas discussões, proporcionalmente ao número crescente de casos e

agravo da situação, tornando-se outro ponto central de discussão entre os membros. Além da

questão dos refugiados em si, tornou-se pauta a situação crítica dos países acolhedores

desses refugiados, que veio a ganhar mais espaço juntamente com o aumento do número

destes. Em relação ao que foi decidido, é possível perceber que, em relação ao número de

reuniões ocorridas sobre o tema, houve, o que pode se considerar, um baixo número de

resoluções e proposições para enfrentamento do caso. As resoluções que foram elaboradas,

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em parte, tinham o intuito de resolver a questão humanitária e a questão específica dos

refugiados, contudo, algumas delas foram recusadas por membros permanentes do

Conselho, o que travou, de certa maneira, as ações deste. Sobre as resoluções aprovadas, é

possível observar, segundo as declarações nas reuniões, que o resultado positivo mais

significativo provindo de um apelo das resoluções, é a colaboração do governo sírio para

facilitar a ação humanitária permitindo a entrada de agentes para atender a população

necessitada. Todavia, de maneira geral, os apelos e condenações que constam nas

resoluções não são atendidas pelas partes do conflito, o que promove certa estagnação das

ações do Conselho de Segurança sobre o caso sírio.

Essa estagnação do Conselho coloca em dúvida a competência e a essencialidade

deste órgão de agir como mediador das questões e da cooperação entre os Estados, como a

Teoria Institucionalista Neoliberal considera que deveria ser. Pelas ações do Conselho não

terem sido suficientes para minimizar o conflito a hipótese desta pesquisa, de que o Conselho

seria decisivo na tomada decisões que encaminhariam soluções para a questão síria, é

rejeitada. Porém, o fato de o Conselho trazer o conflito sírio para a arena de discussões,

tornando esse assunto pauta de muitas reuniões e invocando o pronunciamento das posições

dos países membros sobre o caso, reitera o seu papel de “instituição” reconhecido pela Teoria

Institucionalista Neoliberal. Além disso, o efeito positivo de maior condescendência do

governo sírio em relação à entrada de ajuda humanitária no país, provindo de um apelo de

uma resolução aprovada pelo CSNU, mesmo não solucionando toda a questão humanitária,

é relevante e não deve ser ignorada. A Teoria Neoliberal promove a importância das

instituições na teia de relações entre os estados, porém admite, também, que estes podem

ou não cooperar por meio dessas instituições, como o Conselho de Segurança da ONU.

Esta pesquisa se propôs a analisar um recorte de um conflito que ainda perdura, e que

não há previsão de término. Atualmente, o cenário interno do Conselho de Segurança em

relação a este conflito pode estar diferente ao configurado neste trabalho, o que abre margem

para futuras pesquisas. Além disso, o exame dos documentos do CSNU permite entender o

posicionamento dos membros permanentes em relação a diversas questões em pauta no

cenário mundial. As questões do Oriente Médio estão em voga na arena de debate do

Conselho há muito tempo, e através destes documentos é possível analisar a trajetória de

posicionamento de potências mundiais em diversos conflitos vigentes nesse meio, abrindo

espaço para outras possibilidades de análises em diferentes aspectos.

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Referências Bibliográficas

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