5. o vale do pati · proposta de criação do parque nacional da chapada diamantina, em 1985....

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57 5. O VAL E DO PAT I 5 .1 . A H I S T ÓR I A Antes da chegada dos colonizadores portugueses e da implantação da economia mercantil, a Chapada Diamantina era ocupada por tribos indígenas, principalmente os Maracás, pertencentes a grande nação T apuia. Os Maracás ou Paiaiás ocupavam o Vale do Paraguassú, principalmente a Serra do Ororobó, a Chapada Diamantina Setentrional, Morro do Chapéu e Jacobina (BANDEI RA, 1998). Dentro da mesma nação, pelo sertão baiano, haviam as tribos dos Cariris, Paiaiazes, Sapoias ou Sapuias, Cacherinhéns, T upis, Cariacão, Aracapas e os T abaj aras, todas estas dizimadas ou extremamente fragmentadas e reduzidas durante o processo de colonização e exploração do sertão. O ínicio das entradas dos bandeirantes pelos Sertões datam do final do século XVI , consolidando o processo com o advento da mineração nos finais do século XVI I . Os nativos foram exterminados “ num ato explicito de selvageria ” (BANDEI RA, 1998). Com os bandeirantes vinham os j esuítas e os colonizadores com o cultivo da cana-de-açúcar, do milho, enfim a lavoura, surgem posteriormente as plantações de café e algodão, no Sul da Chapada e o Gado em Rio de Contas e Arredores. O gado e o algodão foram fatores fundamentais no processo colonizador- mercantilista, ao dar base para o estabelecimento de aldeias e fonte de abastecimento local. Durante a época do ouro e o início das descobertas de diamante, levas de aventureiros chegavam e iam se instalando nas encostas da Chapada Velha em busca da sorte. De início, o centro diamantífero foi na Serra da Aroeira, na Chapada Velha, durando até 1844. A partir desta data, passou-se a explorar diamante próximo a Mucugê. Houve então uma grande corrida para a região, preservada por séculos pelos Maracás devido ao difícil acesso. Esta Z ona passou a ser conhecida com o nome de Lavras Diamantina, abrangendo os municípios de Mucugê, Andaraí, Lençóis e Palmeiras (BANDEI RA. 1998). Colaboraram com o movimento colonizador, os senhores de engenho, que com as levas de escravos, edificaram vilas e cidades, implantando um poder político feroz, com terras doadas pela corte. Esta elite local, os conhecidos coronéis, enriqueceram nas Lavras mediante trabalho escravo e detinham o poder e controle de grandes levas de terra na região. A Chapada Diamantina hoj e é politicamente centrada nas mão dos grandes fazendeiros.

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5. O VALE DO PAT I 5.1. A HI ST ÓR I A

Antes da chegada dos colonizadores portugueses e da implantação da economia

mercantil, a Chapada Diamantina era ocupada por tribos indígenas, principalmente os

Maracás, pertencentes a grande nação T apuia. Os Maracás ou Paiaiás ocupavam o Vale do

Paraguassú, principalmente a Serra do Ororobó, a Chapada Diamantina Setentrional, Morro

do Chapéu e Jacobina (BANDEI RA, 1998). Dentro da mesma nação, pelo sertão baiano,

haviam as tribos dos Cariris, Paiaiazes, Sapoias ou Sapuias, Cacherinhéns, T upis, Cariacão,

Aracapas e os T abajaras, todas estas dizimadas ou extremamente fragmentadas e reduzidas

durante o processo de colonização e exploração do sertão.

O ínicio das entradas dos bandeirantes pelos Sertões datam do final do século XVI ,

consolidando o processo com o advento da mineração nos finais do século XVI I . Os nativos

foram exterminados “num ato explicito de selvageria” (BANDEI RA, 1998). Com os

bandeirantes vinham os jesuítas e os colonizadores com o cultivo da cana-de-açúcar, do

milho, enfim a lavoura, surgem posteriormente as plantações de café e algodão, no Sul da

Chapada e o Gado em Rio de Contas e Arredores. O gado e o algodão foram fatores

fundamentais no processo colonizador- mercantilista, ao dar base para o estabelecimento de

aldeias e fonte de abastecimento local.

Durante a época do ouro e o início das descobertas de diamante, levas de

aventureiros chegavam e iam se instalando nas encostas da Chapada Velha em busca da

sorte. De início, o centro diamantífero foi na Serra da Aroeira, na Chapada Velha, durando

até 1844. A partir desta data, passou-se a explorar diamante próximo a Mucugê. Houve

então uma grande corrida para a região, preservada por séculos pelos Maracás devido ao

difícil acesso. Esta Zona passou a ser conhecida com o nome de Lavras Diamantina,

abrangendo os municípios de Mucugê, Andaraí, Lençóis e Palmeiras (BANDEI RA. 1998).

Colaboraram com o movimento colonizador, os senhores de engenho, que com as

levas de escravos, edificaram vilas e cidades, implantando um poder político feroz, com

terras doadas pela corte. Esta elite local, os conhecidos coronéis, enriqueceram nas Lavras

mediante trabalho escravo e detinham o poder e controle de grandes levas de terra na

região. A Chapada Diamantina hoje é politicamente centrada nas mão dos grandes

fazendeiros.

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A Chapada Diamantina também é uma das regiões mais pobres da Bahia, com altos

índices de miserabilidade (SEABRA, 1998). Populações inteiras de camponeses são expulsas

de suas terras ou saem em busca de melhores condições no Sudeste do País, muitos se

organizam em movimentos sociais como o Movimento dos T rabalhadores Sem T erra, que

possui muitos assentamentos na região.

O turismo foi incentivado com a criação do Parque e hoje constitui uma grande

“mina de ouro” para os empresários, que buscam mão de obra barata e todas as condições

para prosperar neste novo ciclo econômico que se cria.

A História do Vale do Pati é permeada por inúmeros mistérios e dúvidas quanto a

origem dos primeiro habitantes e da constituição histórica do local.

A hipótese mais provável sobre a ocupação e apropriação do Vale do Pati é que suas

terras tenham sido indígenas, provavelmente ocupadas pelos índios Maracás expulsos pelo

processo colonizador, que foi sendo ocupado gradativamente juntamente com a expansão

do Garimpo nas serras adjacentes. Segundo afirmação de alguns moradores, o primeiro a

chegar e se instalar nas terras férteis do Vale foi o Sr. Manuel Pati que veio do Mucugê,

antigo arraial de Santa I sabel, para fazer roça, dele se originou o nome do Vale e todas as

terras que posteriormente foram sendo adquiridas pelos antepassados e atuais patizeiros.

T udo isto ocorreu em meados do século XI X, e pode ser parcialmente ilustrado pela

dissertação sobre a história da família Oliveira (Sr.Eduardo e Dona Lica) escrita por sua neta

(16 anos), uma estudante da escola comunitária do Cachoeirão:

“ Os meus tataravós vieram de Capão , na época da seca. Vinheram para cá fazer roça e tentar formar uma vida melhor.

Moravam no Pati de Cima onde nessa época foi chegando muita gente que até formou uma ruinha12. Logo que chegaram aqui, compraram burro para transportar o alimento da cidade.

Meus bizavós que é João Oliveira e Beta Oliveira que compraram terra no Cochoeirão, a atividade econômica era o café e plantava cana para rapadura. O café era para vender na cidade e a rapadura era para vender aqui (...) Nessa época meu Avo já tinhas se casado (...) e tiveram dez filhos.”

O entendimento do processo de povoamento do Vale do Pati requer uma ligação

com o processo de formação sócio-econômica do território da Chapada Diamantina e da

distribuição do poder na região, marcado pelo latifúndio, pelo coronelismo e pela

consequente centralização do poder e do território (BANDEI RA, 1998). Este processo pode

12 Na época do café formou-se uma pequena rua no Pati de Cima, com algumas casas, vendas e uma

igreja. Atualmente, o local têm apenas uma igrejinha que foi derrubada para reformas através dos mutirões comunitários. A local também é parada de dormida dos turistas.

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ter favorecido o isolamento relativo dos patizeiros entre as serras em busca de terra fértil e

livre para o roçado. E mesmo sob influencia constante da economia capitalista e de seus

declínios a cultura patizeira permaneceu nos vales.

O cultivo do café, implantado principalmente nos vales íngremes, foi um dos ciclos

econômicos que se somou às atividades tradicionais na Chapada Diamantina, principalmente

a partir do declínio nas lavras de diamante em 1870 (SEABRA, 1998). A introdução do café

no Vale do Pati se deu tipicamente como em toda atividade monocultora em comunidades

tradicionais, com a sedução do lavrador para iniciar uma prática econômica, com a promessa

de maiores ganhos e facilidade de produção, inserindo-se desta forma mais fortemente ao

mercado capitalista.

Nas décadas de 60 e 70 a população do Pati diminuiu devido a crise da produção

cafeeira. Os solos dão sinais de cansaço e o governo federal, através do Programa Nacional

de Erradicação do Café, inicia um processo de financiamento para o produtor deixar as

plantações de café substituindo-as por outras variedades (FUNCH, 1997). A inserção do Pati

na economia de mercado gerou degradação ecológica e empobrecimento de boa parte dos

pequenos produtores.

Nos anos 80 e 90, até os dias de hoje, o Pati passa a ser rota do chamado

“ecoturismo”, que, no ínicio, era realizado por aventureiros que começaram a descobrir as

belezas cênicas e naturais do Vale. Por estes motivos, o Vale do Pati passa a fazer parte da

proposta de criação do Parque Nacional da Chapada Diamantina, em 1985. Posteriormente a

criação do Parque Nacional, a população do Pati passa a entrar na lógica do turismo,

controlando parte do território acessado pelos “ecoturistas” e fazendo de suas casas um

meio de hospedagem.

O “ecoturismo”, apesar de contribuir, muitas vezes negativamente, para uma

modificação da cultura local, não substituiu as práticas tradicionais já existentes. Pelo

contrário, a nova atividade econômica reforçou estas práticas, chegando em alguns casos a

aumentar o esforço produtivo dentro do Vale, devido a demanda pelo consumo de

alimentos.

5.2. A CUL T UR A

As ciências humanas, principalmente a antropologia, constantemente reduz

determinadas realidades socio-culturais através de classificações, muitas vezes redutoras,

pela própria generalização. Estas classificações guardam em seu arcabouço epistemológico o

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discurso do rigor e da objetividade e podem ter como parâmetros interativos ou em

separação, os fatores ambientais /geográficos ou a própria linguagem. Os recortes

realizados, necessários para facilitar os programas de pesquisas, muitas vezes impedem uma

análise mais complexa dos fenômenos de uma cultura.

A necessidade científica de classificação e categorizarão das populações tradicionais

gera um complicador quando nos referimos a Comunidade moradora do Pati de Baixo. Se

seguirmos a definição de Darci Ribeiro (1995), Manuel Diegues Jr (1980) e mais

recentemente de Diegues & Arruda (2001), consideraríamos a população do Pati como

sertanejos típicos. Porém, esta classificação talvez não seja procedente para o caso.

A formação cultural e os diversos elementos que compõe a cultura patizeira abrem

perspectivas interessantes, repletas de junções. Vemos elementos sertanejos nos trajes de

couro, no uso do burro, nas construções de adobe13, na música (Forró) e no falar camponês.

Por outro lado, a agricultura e o manejo dos ecossistemas (Agricultura de coivara, na

produção de farinha, na comida e pomares agroflorestais) é típica dos povos das florestas

tropicais das Américas, originada dos povos indígenas que habitavam o litoral e interior do

Brasil (POSEY, 1986; MART I NS, 2001; ADAMS, 2000; AMOROZO, 2000). Outro elemento

importante da cultura patizeira está representado pelas influências dos povos negros, não só

visto nas feições, mas nos Jarês14 do Centro de Umbanda e nos festejos locais.

Na época do Garimpo, o trabalho “livre” se mesclava ao trabalho escravo dos

negros na garimpagem, que em inúmeras ocasiões fugiam dando origem a quilombos na

Chapada Diamantina (BANDEI RA, 1998). A influência negra abre um interessante caminho

para algumas indagações referentes ás origens da cultura patizeira e possibilidades de novos

estudos. Existem dúvidas quanto à formação e existência de um quilombo na área o que

pode dar maior relevância à cultura local.

T anto o modo de vida, quanto os sistemas culturais, simbólicos e as formas de

sociabilidade das pessoas que vivem no Vale do Pati são singulares. Moradores dos vales

íngremes, úmidos e florestados no interior do Parque Nacional da Chapada Diamantina,

cercados pelos cerradões e caatingas do semi-árido baiano, a oeste, se adaptaram e

recriaram sua cultura, criando um modo de vida ímpar na região com fortes influências

entrecruzadas de diversas culturas. Observa-se uma miscigenação de elementos da cultura

13 Construção típica do nordestino para morada ou casas de produção (farinha, rapadura, etc). Utiliza-

se basicamente uma mistura de terra com água para levantar as edificações. 14 Religião presente no Vale do Pati. Constitui uma variação do Candomblé, que na Chapada

Diamantina denomina-se Jarê. No Vale do Pati o Jarê possui uma singularidade em relação ao restante da Chapada e é realizada no Centro de Umbanda do Pai Baiano.

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africana dos grupos populacionais que adentraram o sertão da Chapada Diamantina, com

grupos de europeus de cultura portuguesa já mesclados à forte presença indígena.

Os habitantes do Pati de Baixo (Fotos 10, 11, 12 e 13) possuem relações

interpessoais cooperativas com raízes na vida dura do Garimpo e da Policultura familiar, já

fizeram e viram a monocultura do café brotar em suas terras e hoje acrescentam o chamado

Ecoturismo em seu sonho de viver o e no Pati. Estas pessoas, juntamente com os moradores

do Pati de Cima vivem hoje a inquietude da perda, motivada pelo constante risco de

expulsão de seu território pela força e poder do mito e das leis, dos Parques Nacionais.

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Foto 11 – Sr. Eduardo, morador do Cachoeirão

Foto 10 – Dona Lica, moradora do Cachoeirão

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Foto 12 – Dona Elenice. Moradora do Cachoeirão

Foto 13 – Sr Massur, morador do Pati de Baixo

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5.3. SENT I DOS E CONFI GUR AÇÕES DA PAI SAGEM

A paisagem15 é fruto da interação entre o homem e seu ambiente. Neste sentido,

termos como co-evolução e Ecologia de Paisagem entram em voga e tornam-se

fundamentais para se entender, de forma complexa, a história ecológica e cultural, na

interação do homem com a natureza, até os dias atuais. A paisagem patizeira é dinâmica,

estando sempre em reconstrução e a atual configuração da biodiversidade no Pati deve-se a

co-existência com a cultura local.

A paisagem é simbolizada e utilizada de forma diferenciada entre o patizeiro e os

turistas, políticos e ambientalistas. Muitos destes últimos, passam pelo Vale do Pati com o

objetivo de visitar as belas Cachoeiras do Funil, Calixto e Cachoeirão, de ver as paisagens

exuberantes das serras e vales e se livrarem do estresse da vida na cidades vivendo

momentaneamente o mundo natural. Outros também vislumbram o ganho financeiro com a

exploração turística das belezas cênicas. Esta reverencia, muitas vezes espiritualista, do

mundo natural, enquanto beleza cênica, não é muito compartilhada pelos patizeiros do

cachoeirão. Muitos destes, dos mais velhos aos mais novos, nem sequer viram tais

cachoeiras e a percepção das belezas paisagísticas é sobreposta pela dureza do trabalho

cotidiano e dos elementos da natureza que os permeiam. Hoje alguns habitantes,

principalmente os mais jovens, são incentivados a perceberem tais paisagens como fonte

econômica e até de beleza estética, ao guiarem turistas em direção as cachoeiras.

O “olhar” das elites urbanas sobre a natureza tende a privilegiar o estético, o

paradisíaco, e também o selvagem, enquanto que as comunidades locais privilegiam o lugar,

o espaço onde vivem, onde trabalham e se reproduzem socialmente, isto é, o seu território

(DI EGUES, 2000)

A sensibilidade à terra, o afeto, se faz de outra maneira, através de outro olhar

significativo na cultura patizeira. A terra é viva e é apropriada para consecução de seus

objetivos produtivos utilitários e simbólicos. A visão que prevalece é a do roçado, dos

pomares, dos animais de caça, domésticos e os que interagem em seus domínios. Da água

para matar a sede e lavar as roupas. Da terra que vai brotar o alimento, as arvores e onde

vivem os ancestrais.

15 Lassere (1997) apud Diegues (2000), considera paisagem como “... no sentido ecológico do termo -

é uma estrutura espacial que resulta da interação entre os processos naturais e atividades humanas. Sobre o fundo estável de uma arquitetura do conjunto (montanhas, pântanos, etc) a transformação dos modos de ocupação do solo e dos sistemas de produção modifica a disposição dos habitats, a repartição dos agroecosisstemas, a fisionomia da floresta. As sociedades humanas modelam seu território...mas a vegetação também tem uma dinâmica própria...”

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A concepção de natureza como interação direta pode ser bem vista nestes trechos

de depoimentos dos estudantes:

“A natureza têm muito material que o homem precisa, como as árvores que podemos utilizar para construção. Com a água podemos fazer nossa alimentação, como um chá, como a água para beber e cuidar de nossa higiene e de nossa saúde.

Podemos utilizar a terra para fazer hortas e plantações, criar nosso animal, construir a nossa casa e ter um espaço para brincar.

Com as sementes fazemos artesanato como a lágrima de nossa senhora, e usamos bambu para fazer quiosque e colar... T odos os remédios que o homem precisa usar da natureza. Na natureza tem animais que o homem precisa usar na alimentação, como a paca que o homem mata pra comer.” (Estudante da Escola do Cachoeirão: 15 anos)

“A natureza têm muitas coisas que são muito importantes para os seres humanos. Só que os seres humanos tem que saber trabalhar com a natureza...” (Estudante da Escola do Cachoeirão: 18 anos)

A paisagem no Vale do Pati é descontínua, marcada por áreas florestais, capoeiras

e roçados que se sobrepõe em constante dinamismo. A paisagem construída pelo próprio

dinamismo natural e pela interação mutualistica entre a cultura e a natureza pode ser

descrito como um verdadeiro mosaico16 (Figura 6)

16 Defini-se uma paisagem em mosaico como ecossistemas que sofreram perturbações intermediárias

por fatores antrópicos ou naturais, ocasionando a distribuição sucessional diferenciada, no tempo e no espaço, numa superfície relativamente pequena. A variação de estágios de desenvolvimento em cada mancha florestal contribui para manter a considerável diversidade de ecossistemas (GLI ESSMAN, 2001). Entende-se por sucessão natural, o processo de desenvolvimento de uma comunidade (ecossistemas) em função das modificações das composições no ambiente considerado (ALMEI DA, 2000).

Os estudos ecológicos distinguem dois tipos básicos de sucessão dos ecossistemas naturais: A sucessão primária é o desenvolvimento de ecossistemas em locais que não foram ocupados anteriormente por organismos vivos ou não sofreram modificações geradas pelos fatores bióticos com vistas ao aproveitamento dos componentes abióticos. A sucessão secundária é o desenvolvimento de ecossistemas em locais previamente ocupados por organismos vivos, mas que foram perturbados por fatores como enchente, incêndio, vento severo e antropização. A sucessão secundária pode ser dividida em estágios iniciais de regeneração (capoeiras), intermediários (avançado) e de maturidade (Ver GLI ESSMAN, 2001; ALMEI DA, 2000).

O estágio de maturidade de um ecossistema constitui fonte de muitas controvérsias. Alguns ecólogos como ALMEI DA (2000) consideram a maturidade como clímax, ou seja um estágio final, onde o ecossistema chega a seu equilíbrio. Já muito ecólogos, principalmente ecólogos da paisagem, trabalham com o conceito de ecologia do não equilíbrio ou de equilíbrio dinâmico, onde todos ambientes estão em constante modificação e evoluindo para novas variedades devido a ocorrência de perturbações em grande e pequena escalas (GLI ESSMAN, 2001).

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Figura 6 – Desenho da Paisagem no Pati de Baixo. Adaptado do site www.infochapada.com

Logo na descida da Ladeira do I mpério, na trilha Andaraí - Pati, podemos perceber

como a paisagem toma forma. A agricultura na área é a agricultura de coivara. O terreno é

inclinado e as roças são feitas e adaptadas para estas condições, onde a perda de nutrientes

é constante, e encontram-se na base do vale, interagindo entre a mata ciliar, capoeiras e a

floresta em estágio avançado de regeneração, que fica mais no meio e no topo inclinado

perto dos rochedos. Para o patizeiro “a melhor ter ra é a que fica nos solos não pedregosos,

sempre nas encostas” .

Entre as roças encontra-se geralmente capoeiras e/ou floresta em estágio

intermediário de regeneração. Atualmente no Cachoeirão existem cerca de seis roças

itinerantes17 recém formadas, com tamanhos variando entre cerca de 200 a 700 m2, que

interagem com roças já abandonadas, capoeiras e floresta (Foto 14).

As florestas encobrem quase a totalidade do Vale do Pati, tendo áreas que

provavelmente não foram realizadas atividades agrícolas como nos grotões, nas fendas e nos

17 Ver mapa da paisagem local

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fundo dos vales. No Vale que vai até a cachoeira do Rio Cachoeirão a floresta apresenta um

estágio avançado na sucessão das espécies. Segundo os moradores encontra-se muitas

árvores no Vale (T abela 1), muitas de grande porte (Foto 15).

A condição diferencial dos estágios sucessionais na paisagem local, favorecido pela

interação Cultura-Natureza, cria um ambiente de grande complexidade, podendo favorecer a

biodiversidade local e a conservação (DI EGUES, 2000; ALT I ERI & NI CHOLLS, 2000).

Um estudo da história eco/social no Pati poderia oferecer evidências interessantes

sobre a manutenção e criação da biodiversidade, principalmente após o término do ciclo do

café. Pelas informações repassadas por todos os moradores de que “existiam roças de café

por toda parte” e pelo estágio sucessional observado, com vastas áreas florestadas

margeando roças e capoeiras, pode-se afirmar que mesmo com os moradores vivendo no

Pati vemos uma recuperação do meio natural. Porém deve-se ressaltar a necessidade da

realização de estudos mais aprofundados e extensos sobre a ecologia da paisagem e

florestal, fitogeografia, a etnobotânica, história agroecológica que subsidiem conclusões e

permitam o fortalecimento de ações etnoconservacionista com bases locais.

T ABELA 1: ÁR VOR ES I DENT I FI CADAS PELOS I NFOR MANT ES NO PAT I DE BAI XO

ÉSPÉCI ES ESPÉCI ES Araçazinho (Psidium sp.) Mangueira (Mangifera indica) Aricuzinho (Cocos sp.) Mucugê (Couma rígida)

Candeia (Pipthocarpha sp.) Murici (Byrsonima sp) Candeia (Vanillosmopsis erythropappa) Negramina (T rigonia crotonoides)

Canjerana (Cabralea sp.) Palmito (Euterpe sp.) Canjoão (?) Paraíba (Simaruha versicolor)

Cedro (Cedrela sp) Pau d arco (T abebuia sp) Córea (?) Pau de Ameixa (?)

Embaúba (Cecropia sp) Pau Pombo (T apira tapirira) Goiabeira (Psidium sp) Pau de Azeitona (?)

I mbira (Daphnopsis sp.) Pau de Loro (?) I ngazeiro (I ngá sp) Pau de Rego (?)

Jacarandá (Família Papilionácea) Quina (Família Rubiácea) Jambo (Eugenia sp) T aipoca (T ecoma papyrophloes)

Jaqueira (Artocarpus integrifolia) T ambori (Enterolobium timbauva) Jaboticabeira (Plinia trunciflora)

* Plantas identificadas êmica e eticamente (Pistas taxonômicas)

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Foto 14 – Área de roçado

Foto 15 – Área florestada.

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5.4. CONEXÕES BI OCULT UR AI S : MANEJO DOS ECOSSI ST EMAS NAT UR AI S

NO VALE DO PAT I

No Vale do Pati, onde o modo de vida tradicional ainda se mantém presente, a

população combina atividades de policultura, extrativismo vegetal e caça. Estas atividades

visam o uso familiar, a troca, a venda e também suprir os festejos locais. Hoje, o ecoturismo

também aparece como uma atividade econômica importante para os moradores.

Esta combinação de práticas e usos dos recursos naturais é uma forma de utilização

do ecossistema segundo suas características e de acordo com os “ciclos naturais” (DI EGUES

& NOGARA, 1999) e está embasada num conjunto de conhecimento e práticas. Existe no

local uma extensa taxonomia Folk, segundo a qual os animais e vegetais são classificados

em categorias organizadas.

Este conhecimento foi abordado na pesquisa de forma muito limitada, devido ao

curto tempo dos trabalhos e a inexistência de bibliografias e estudos na área. Abre-se assim

um campo para estudos mais aprofundados em etnociências.

Como discutido em capitulo anterior, muitas sociedades tradicionais estão em

constante interação com as outras sociedades, havendo uma troca constante de informações

e muitas vezes com a imposição de modelo produtivos numa lógica capitalista de mercado.

Esta articulação pode mudar o ritmo produtivo na região bem como determinar a exploração

dos recursos naturais numa intensidade nunca vista no lugar.

5.4.1.I nteração com a F loresta

A intervenção dos patizeiros na floresta é fruto dos conhecimentos transmitidos

oralmente por gerações e pela criação de novas modalidades de adaptação e recriação do

meio ambiente (Práxis). Os moradores do Pati de Baixo fazem a chamada agricultura de

pousio florestal, coivara ou derrubada e queima (MART I NS, 2001; ADAMS, 2000; AMOROZO,

2000), o extrativismo florestal e pomares agroflorestais. E é da terra, através do policultivo,

que obtém sua principal fonte de alimentos e recursos.

A ocorrência deste tipo de roça e dos policultivos se repete em todas as áreas

florestais do Brasil, e com grande uniformidade de estrutura, de tamanho e de composição,

indicando uma raiz comum, com certas variações (MART I NS, 1997). Alguns autores apontam

a realização da agricultura de pousio em sociedade indígenas como os T ukâno (CHERNELA,

1997), os Kayapó (POSEY, 1987) e também em populações tradicionais de Caboclos

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Amazônicos (MART I NS, 1997), Caiçaras da Mata Atlântica (ADAMS, 2000) e algumas

comunidades de agricultores tradicionais do Mato Grosso (AMOROZO, 2000). Muitos destes

agroecossistemas constituem repositórios in situ de germnoplasma tanto de plantas

silvestres como de cultivos nativos (ALT I ERI & NI CHOLLS, 2000).

Uma das características da agricultura tradicional, na América Latina, é a

dependência de uma alta biodiversidade. Estes sistemas agrícolas emergiram de séculos de

evolução cultural e biológica e representam experiências acumuladas pelos camponeses e

indígenas em sua interação com o entorno e sem o uso de insumos, capitais ou

conhecimento científicos externos (ALT I ERI & NI CHOLLS, 2000)

a)O Ext rat ivismo F lorestal

Por coleta entende-se a obtenção de plantas silvestres, animais e produtos animais,

bem como diversos elementos inertes adequados à alimentação, ao uso como matérias

primas manufatureiras ou remédios (POSEY, 1987a)

O extrativismo de espécies vegetais no Pati é realizado visando principalmente:

alimentação, construção de casas, ferramentas de trabalho (enxadas, machados, pilão, etc),

para amarras (cipó) e artesanato. Os moradores retiram frutas, lenha, madeira, como a

quina e a imbira, cipós, palmito, sementes e bambus.

A cultura tradicional revela-se tanto no conhecimento das espécies como no

respeito as fases da lua, pois a extração de madeira só ocorre na lua minguante, afim de

evitar que os insetos estraguem a madeira, pois, “A madeira cortada fora desta lua, para

construção ou cercado apodrece mais rápido” (Moradora do Cachoeirão).

A madeira também não é retirada de forma aleatória, escolhendo-se os exemplares

de acordo com o tipo de uso, quase sempre doméstico, e de acordo com a idade (Fotos

16,17 e 18). Para a retirada de lenha para os fornos sempre derruba-se árvores secas

(T abela 2).

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T ABELA 2: EXT R AT I VI SMO: ESPÉCI ES FLOR EST AI S UT I L I ZADAS PAR A

CONST R UÇÃO, AL I MENT AÇÃO E ENER GI A

ESPÉCI ES UT I L I ZAÇÃO Candeia (Vanillosmopsis erythropappa) Lenha

Candeia (Pipthocarpha sp.) Lenha Quina (Família Rubiácea) Lenha, Construção, Berimbau

Pau-Pombo (T apira tapirira) Lenha, fruto Córea (?) Lenha

I mbira (Daphnopsis sp.) Vassoura, Cabo de Enchada, Artesanato Cipós Artesanato, cordas

T ambori (Enterolobium timbauva) Fogueira, Lenha Negramina (T rigonia crotonoides) Lenha

Araçazinho (Psidium sp.) Varas Aricuzinho (Cocos sp.) Lenha Jambo (Eugenia sp) Frutas

Murici (Byrsonima sp) Frutas Mucugê (Couma rígida) Frutas

T aipoca (T ecoma papyrophloes) Pilão, Machado e Construção Canjoao (?) Chá Medicinal (Diarréias)

Palmito (Euterpe sp.) Alimentação Gameleira (Família das Moráceas) Goma para verrugas

* Plantas identificadas êmica e eticamente (Pistas taxonômicas)

Algumas descrições dos usos podem ser observadas nestes trechos das

dissertações dos estudantes da escola do Cachoeirão:

“A natureza tem muitas riquezas que tiramos quando precisamos ... algumas são medicinais, artesanato e construção ... boldo serve para dar o chá, do sabugueiro serve para o sarampo, erva-cidreira o chá serve para dor de barriga ... Para fazer artesanato usa-se sementes, cipó ... Construção - usamos vara, tronco, óleo, resina ...” (Estudante da Escola Cachoeirão - 16 anos)

“Precisamos de árvore para fazermos nossas casas, para fazer cercado, para fazer horta, para fazer cerca. O cipó fazemos o artesanato, a quina podemos fazer o berimbau, as varas podemos fazer brinquedos, com o barro fazemos casas, telhas, artesanato ... precisamos muito da natureza, se nós não tivéssemos ela, nos não estaríamos aqui.” (Estudante da Escola Cachoeirão - 13 anos)

O extrativismo visa apenas o uso local e o impacto desta atividade deve ser objeto

de estudos. E em casos de se ter necessidade de modificação desta prática, o que não

corresponde a realidade atual, deve-se, ao invés da repreensão, apontar meios educativos e

formas participativas de gestão da natureza que gere novas alternativas compatíveis com a

cultura local.

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Fotos 16,17 e 18 (Seqüência)– Victor e Coquinho num processo de Extração de I mbira

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b)O Pomar e a Hor ta

É de costume no Pati de Baixo o plantio de árvores (T abela 3) nas proximidades

das moradias, cujos frutos e partes são utilizados para consumo doméstico, produção de

doces, decoração, e em alguns casos, como a banana, para ser vendidas principalmente

para os turistas e também utilizadas para servir aos festejos locais, fazendo a famosa iguaria

local: o Godó (Prato feito com a banana ainda madura). Além das frutíferas, algumas casas

possuíam o café em seus pomares (Fotos 19 e 20).

Com a jaca e a banana são produzidos alguns doces como a banana passa e a jaca

passa que geralmente é para consumo próprio ou é vendida para os turistas que passam

pelo Vale do Pati:

“A jaqueira ela produz flores, e depois dá os frutos, ela cresce bastante. O fruto não sei até quando ela dura na vida, mas ela dura bastante. A jaqueira tem dois tipos, uma é a jaca mole outra é a jaca dura que faz até doce. Com a jaca se faz jaca passas para uma bela merenda. Que delicia”. (Estudante da Escola do Cachoeirão - 15 anos)

Não raro, é possível observar nas trilhas que levam às moradias locais algumas

espécies frutíferas e de extração que foram plantadas pelos moradores e deixadas nos locais

para uso comum, formando verdadeiros espaços agroflorestais. Alguns destes espaços são

antigas roças de bananeiras.

T ambém próximo às moradias, nos quintais, custuma-se plantar, nos canteiros,

flores, ervas medicinais e algumas hortaliças e condimentos para a cozinha (T abela 3) (Fotos

21 e 22). As plantas medicinais são recursos importantes que ligam as pessoas com o

ambiente. O conhecimento nativo em plantas medicinais é, geralmente, pouco difundido

entre as populações ocidentais e a maior parte das populações do mundo se utilizam dos

conhecimentos da medicina tradicional (BEGOSSI , 2001). No vale do Pati encontra-se um

Centro de Umbanda (Jarê), que atua como centro difusor da religião e de forma interligada,

da cura através de ervas e rituais. As ervas coletadas e utilizadas pelos moradores são as

seguintes:

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T ABELA 3 : ER VAS E ÁR VOR ES UT I L I ZADAS, R ET I R ADAS DOS POMAR ES E

HOR T AS NO PAT I DE BAI XO

ESPÉCI ES UT I L I ZAÇÃO Frut íferas

Abacaxi (Anana sativus) Alimentação Laranjeira (Citrus sp.) Gripe/ Alimentação Limoeiro (Citrus sp.) Gripe

Mangueira (Mangifera indica) Alimentação Bananeira (Musa paradisíaca) Alimentação/ banana passa

Abacateiro (Persea sp.) Alimentação Jaqueira (Artocarpus integrifolia) Alimentação/ jaca passa Jabuticabeira (Plinia trunciflora) Alimentação

Goiabeira (Psidium sp) Alimentação/ T rata diarréia Mamoeiro (Carica papaya) Alimentação

Cajuzeiro (Anacardium occidentale) Alimentação Pinha (Anonna sp.) Alimentação Jambo (Eugenia sp) Alimentação/ doces

Sabugueiro (Sambucus sp) Sarampo / Estômago Ervas

Pimenta (Pimenta sp) Condimento Boldo (Pneumus boldus) Dor de barriga/ Fígado

Hortelã (Mentha sp) Verme Arruda da serra (Família das Rutáceas) Vias respiratórias

Cidreira (Cymbopogon sp.) Calmante Capim – santo (Andropogon nardus) Gripe

Quitoco (Pluchea sp.) Fígado Gengibre (Zingiber sp.) Gripe/ I nflamação na garganta

Manjericão (Ocimum sp.) Gripe/ T empero Arnica (Arnica montana) Cicatrização e Pancada/Dores Musculares

Erva doce (Foeniculum vulgare) Gripe/ Pressão alta/ Diarréia Mil folhas (Achillea millefolium) Dor no corpo

Couve (Brassica sp) Gastrite Açafrão (Escobedia curialis) Corante (Junto com sabugueiro - sarampo)

Salsa (Petroselinum sp) T empero Quebra-pedra (Phyllanthus sp) Rins/ I nfecção

Romã (Punica sp) I nflamação da garganta Mentras (Família das Labiadas) I nflamação

Outros Cebola (Allium sp) Gripe/ T empero

Alho (Allium sativus) Gripe/ tempero * Plantas identificadas êmica e eticamente (Pistas taxonômicas)

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Foto 19 – Pomar existente na moradia do Sr. Bezo

Foto 20 – Pomar existente na casa do Sr. Massur

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Fotos 21 e 22 (Seqüência) – Dona Lica retirando amostras de ervas que utiliza na medicina caseira e para condimentos

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c) A roça

A agricultura de pousio é realizada através da derrubada, queima e plantio, até

quando o solo começa a esgotar-se (geralmente em três anos). Após este tempo, o

agricultor abandona a área, deixando-a em recuperação e inicia-se uma nova roça em uma

antiga plantação. Esta técnica caracteriza-se por: ter um número e tamanho de parcelas

trabalhadas variando com a fertilidade do solo, a densidade populacional, a extensão do

pousio e grau de comercialização; pode haver troca de espécimes; geralmente a posse de

terra é comum; muitas vezes ocorre mutirão para limpeza da área; método de cultivo é

baseado na força animal ou humana, com utilização de ferramentas manuais; existe pouco

cultivo e pouco manejo após o semeio das culturas; a fertilidade do solo é mantida com o

uso de estercos, ou, na maioria das vezes com a própria cinza da queima e decomposição da

vegetação (ADAMS, 2000).

Neste tipo de prática agrícola, herdada dos indígenas, não há necessidade de

utilização de nenhum arsenal de técnicas ou instrumentos agrícolas de alta tecnologia. No

Pati utiliza-se principalmente o facão, a enxada e o machado. O fogo também possui papel

fundamental no cultivo itinerante do Pati, e contrariando os preservacionistas, utilizando-o

de forma controlada no roçado, pode ter um papel importante na manutenção da

biodiversidade e no controle dos incêndios naturais (GLI ESSMAN, 2001) e criminosos que

devastam os ecossistemas do Parque Nacional da Chapada Diamantina.

O trabalho na roça é realizado por toda família, pelos casais, filhos e netos. Cada

família possui seu roçado que se distribuem pelas encostas íngremes do Vale, ficando

próximas das moradias e circundados por antigos roçados, ainda manejados, por Floresta

Secundária em diversos estágios de sucessão e por mata ciliar. Algumas roças são

combinadas com diversas culturas perenes.

A principal cultura utilizada nos roçados é a mandioca (Manihot esculenta), servindo

para fazer a farinha e outras iguarias. Planta-se, em conjunto, o milho (Zea mays), o feijão

(Canavalia sp) e a cana-de-açucar (Saccharum officinale).

O plantio da mandioca, do milho e do feijão ocorre geralmente nos períodos de

março/ abril e setembro/outubro e novembro, épocas com os menores índices pluviométricos

na região da Chapada Diamantina. Além dos meses correlatos o plantio deve ser realizado de

acordo com os ciclos lunares, sendo a mandioca, o feijão e o milho plantados com a lua nova

ou crescente, pois, segundo um morador do Cachoeirão, “A lua têm ciência e ajuda a

crescer”. Em contrapartida, o plantio da cana-de-açúcar ocorre com a lua minguante senão,

“Se plantar com lua crescente da broca, uma lagartinha” (Morador do Cachoeirão)

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A conhecimento da interação entre os ciclos lunares, as fases das plantas silvestres

e cultivares, e a fauna corresponde a um valioso artifício que a comunidade têm para manter

um sistema agrícola resiliente.

O plantio é realizado em antigos roçados em descanso e nas seguintes etapas (Foto

23 e 24):

1 - Escolha de uma área não pedregosa e com solo fértil;

2 - Roçar a vegetação arbustiva e herbácea;

3 - Corte e derrubada de árvores de maior porte em antigas capoeiras;

4 - Amontoa-se os troncos e galhos (Coivara);

5 - Coloca-se fogo de forma controlada por aceros18. As cinzas proporcionam

condições para um melhor desenvolvimento dos cultivares. Para o patizeiro, “Se não

limpar o mato não nasce nada, parece que têm micróbio, que não deixa crescer, têm

que queimar ... se não queima a mandioca nasce mirrada” (Morador do Cachoeirão)

6 - Fazer a cova para inserção da maniva da mandioca, algumas vezes é introduzida

sementes de feijão em consórcio com a mandioca.

A mandioca começa a ser colhida entre seis meses a um ano, a depender da

demanda, e pode ficar na roça por cerca de 03 anos. Ocorrem cerca de três plantios em

cada roça, esgotando o solo em seguida.

A roça, então, é abandonada e deixada em descanso, onde será colonizada por

outras espécies, avançando no processo de sucessão. O descanso dura de dois a dez anos e

é uma das fases mais importantes da agricultura de pousio, a que garante a sustentabilidade

deste modelo agroecológico (ADAMS,2000). O agricultor do Pati sabe da importância deste

período;

“Quanto mais o mato cria mais a terra é forte e mais descansada... a folha vai caindo e dando sustança a terra ... a terra afofa toda. Faz uma roça aqui, deixa, e em alguns anos ele recupera e vira aquele mato ali“ (Morador do Cachoeirão - Apontando uma floresta em Estágio inicial de sucessão)

Os moradores não se utilizam de insumos externos como agrotóxicos e pesticidas

para controle de pragas, que é feito pela própria técnica da agricultura itinerante de

derrubada e queima e pela realização de um policultivo rico em diversidade intra-específica e

18 São faixas limpas de vegetação utilizada para realização de queimadas controladas. São feitos

canais, com profundidade e larguras adequadas, no entorno da área onde será realizado a queima. Evitando-se desta forma a passagem do fogo para outras áreas e o descontrole (RAMOS & SANT OS, 2001).

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de espécies (POSEY, 1987; GLI ESSMAN, 2001). Como afirmam, “Não se usa nenhum

remédio! Sabendo plantar os insetos não pegam” (Morador do cachoeirão)

Boa parte da produção de mandioca é processada e torrada artesanalmente nas

casas de farinha, onde posteriormente será usada para consumo próprio ou será vendida

sob encomenda. Existem cerca de quatro casas de farinha no Pati de Baixo, construídas com

adobe e madeira. A produção obedece as seguintes etapas (Fotos 25,26,27,28 e 29):

1. Após colheita, descasca-se a mandioca;

2. Passa a mandioca já descascada no moedor;

3. Leva a massa ensacada para a prensa, deixando virar o dia;

4. Após estes processos leva-se ao forno para torragem com uso constante de um

rodo.

Geralmente utilizam o equivalente a 20 “pés” de mandio ca “grossa” para produção

de um saco com cerca de 60 Kg.

Sabe-se hoje que a agricultura itinerante praticada tradicionalmente é uma forma

sustentável de produção, que resulta em mínima erosão genética e máxima conservação,

podendo continuar indefinidamente nos solos pouco férteis encontrados sob a maioria das

florestas tropicais úmidas, contanto que o suporte da terra não seja excedida (ADAMS,

2000), o que pode ocorrer por diminuição do tempo de descanso, aumento gradativo das

áreas roçadas, incremento tecnológico e uso de insumos externos, caso haja inserção direta

das comunidades na economia capitalista, aumento populacional e restrição do território

tradicional.

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Fotos 23 – Processo de limpeza do terreno

Fotos 24 – Roça de mandioca

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Fotos 25, 26, 27, 28 e 29 (seqüência) – Processo de fabricação da farinha, realizado por T onho e Loma

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5.4.2.I nteração com a Fauna

Muitos animais do Vale do Pati (Figura 7 e T abela 4) têm ao mesmo tempo uma

conotação misteriosa, amedrontadora e uma função ecológica, alimentar e econômica.

Conversando com o Sr. Eduardo, na trilha Andarai-Pati, sobre a fauna local observei que

alguns animais representam uma ameaça gerando medo e mitos. A onça pintada talvez seja

o maior deles, é “Bicho -fera que sangra os bois”. Questionado se ainda existe onça na

região, “foi visto uma onça preta onti a noite perto da bica” (A bica é uma área onde os

burros param para beber água). E onde elas ficam, “ficam mais nas serras, mas já pegou

uns burros de Sr. Mansur “. Os animais de Sr. Mansur foram atacados e mortos, acredita-se

que por uma onça, em sua morada na parte baixa do Vale, o Sr Mansur foi indenizado pelo

I BAMA para que não matasse o animal. Segundo alguns moradores, a onça vive pelas serras

da Garapa, Andarai, Mucugê, Gavião e nos Gerais do Rio Preto e do Vieira até chegar ao

Morro do Castelo. E podem ser descritas da seguinte forma:

“A onça é um animal de cores preta e amarela, outras pretas que são as panteras. Ela fica mais na mata, não é fácil encontrar ela porque ela aparece quando está com fome, ela come carne, como outros animais como burros, mocó, todos esses bichos que fica na mata, os dentes dela é bem afiados, é capaz de comer até gente, ela é da família do gato, tem unhas afiadas, ela salta, sobe arvores” (Estudante da Escola Cachoeirão: 13 anos)

As serpentes também alimentam o imaginário de medo em muitos moradores, muitas

delas vivem em volta das casas e se encontradas podem ser mortas senão “podem voltar e

fazer algum mal”. Segundo Sr. Eduardo, as cobras possuem pés, “dois pé na frente e mais

dois perto do cabo” que utilizam para subir em árvores, segundo ele os pés são bem visíveis

e “somem quando pegamos ela”. Alguma cobras como a cascavel voam “elas voam para nos

atacar”. Muitas “pegam as galinhas toda”.

O medo da cobra e sua conseguinte morte, segundo os moradores lhes trarão

segurança, pois estes animais podem representar a perda de animais importantes para a

vida patizeira como o Burro e as galinhas, bem como representa perigo para os moradores,

que para chegar a um posto médico em caso de picada teriam que ser carregados por 22

Km por cerca de 6 horas (Foto 30).

Alguns primatas interagem com os moradores de forma harmônica, e segundo os

patizeiros dentre eles está o “soin”, “macaquinho pequeno com rabo grande” que vive de

preferência na “mata mais grossa” nos grotões e vales mais fechados. T ambém passam em

bandos pelos pomares e perto das casas na época das frutíferas. Os Barbados, ameaçados

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de extinção, habitam as florestas mais frondosas das fendas e partes mais altas dos vales

mais fechados, são ouvidos e já foram vistos em frente da casa da Família Oliveira, na fenda

que origina o córrego Manuel Nunes, e também no Vale da Lapinha, que origina o rio do

mesmo nome e onde encontra-se a cachoeira do Calixto. Os Barbados “vivem na serra,

quando turram da um ecos que restrondo tudo... quando firma pra chover eles turram” . As

vocalizações, segundo os patizeiros ocorrem quando aproximam-se as nuvens de

precipitação. A percepção dos ciclos naturais, por parte dos moradores, é muito acurada e

está ligada ao comportamento da fauna, floração, ciclos da lua e clima.

Os Barbados foram vistos recentemente, pelos moradores, atravessando, em solo, os

gerais do Vieira, podendo indicar fluxos migratórios de novos bandos para outras áreas.

Estes primatas eram caçados no Vale do Pati para alimentação da população local. A

caça dos Bugios está encerrada, provavelmente devido à diminuição do número de

espécimes e/ou devido a pressão do I BAMA.

A avefauna também é abundante no vale. Vivem na Chapada Diamantina cerca de

354 espécies de aves (PARRI NI et alii, 1999). Algumas são representativas para os

moradores por sua beleza estética e canto a ave “Aracuã companheira do Jacú ...quando faz

festa é que tá pra chover”. As principais aves identificadas pelos moradores estão descritas

na T abela 5. Aves como a Araponga, Maritaca, Saira-sete-cores, Sanhaço, etc, listada pelos

informantes segundo sua presença, proximidade e abundância, também podem ser

importantes indicadores do estágio de desenvolvimento da floresta local (ALMEI DA, 2000).

No Vale do Pati a caça é uma atividade que visa apenas a obtenção de proteína

para consumo próprio, sendo realizada em pequena escala sempre que necessário.

“Aqui nós só caça quando acha caça fácil, só caça pra comer. Se ver no mato e não for comer deixa” (Morador do Cachoeirão)

É uma atividade que vem sofrendo modificações devidas, segundo alguns

moradores, por falta de caçador e por “desconfiança” do I BAMA.

“Já trabalhei muito com a caça, hoje não faço mais por causa da idade” “Não tem mais caçador por aqui... O I BAMBA não deixa caçar, não colocar

fogo, não fazer roça , mas não dão dinheiro para as despesas” (Morador do Cachoeirão)

Os principais animais caçados são a paca, o tatu e o mocó. São animais que vivem

no vale, próximo aos pomares ou roçados, e nas serras.

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“O mocó é um poquinho menor que a preá (...) eu caçava o mocó em ci ma da serra e também no vale (...) carne boa parece galinha ou tatu” (Morador do Cachoeirão)

T ABELA 4 – PR I NCI PAI S R EPR ESENT ANT ES DOS MAMÍ FER OS E R ÉPT EI S

I DENT I FI CADOS PELOS MOR ADOR ES DO PAT I DE BAI XO

Filo Espécies

Área de Maior Ocorrência/Usos

Mamíferos T atu Peba (Euphractus sexcicntus) Por todo vale, nas roças / Caça T atu Galinha (Dasypus novencintus) Por todo vale, nas roças / Caça T atu Rabo de Couro (Cabassois

unicinctus) Por todo vale, nas roças / Caça

Michila, tamanduá mirim (T amandua tetradactyla)

Principalmente nos gerais do Vieira e do Rio Preto / T er cuidado com as unhas afiadas

Barbado (Allouatta sp.) Floresta Secundária, fundo dos vales, fendas / Vocalizam antes das chuvas

Soin (Saguí) (Callithrix penicilata) Floresta Secundária, próximo a frutíferas Saruê (Sariguê) (Didephis albiventris) Floresta Secundária, Quintal e Pomares Cachorro-do-mato (Ducicycon

ventulus) Floresta Secundária, Capoeiras

Coati (Nasua nasua) Floresta Secundária, Roças e Pomares Meleiro (Eira bárbara) Floresta Secundária Gato-do-Mato (Felis wiedii) Floresta Secundária Jaguatirica (Felis pardalis) Floresta Secundária Raposa (Dusicyon sp.) Floresta Secundária, Capoeiras, Quintal e

Pomares Onça Pintada (Panthera onça) Principalmente nas serras Sussuarana (Felis concolor) Principalmente na serra de Andaraí Porco do Mato (T ayassu pecari) Floresta Secundária e Capoeiras Luiz caixeiro (Coendou prehensilis) Floresta Secundaria, Capoeiras, Quintal e

Pomares Paca (Aguti paca) Floresta Secundária, Rochedos, Próximo aos

Rios / Caça Mocó (Kerondon rupestris) Roças, Serra, em Rochedos / Caça R épteis

T eiú (T upinambis merignal) Floresta Secundária, capoeiras Jibóia (Boa constrictor constrictor) Encontrada em todo vale Jararaca (Bothrops sp.) Floresta Secundária, Capoeiras, Gerais Coral (Micrurus sp.) Floresta Secundária, Capoeiras, Gerais Cabeça de Capanga (Bothrops sp.) Floresta Secundária, Capoeiras, Gerais Cascavel (Crotalus durissus

cascavella) Capoeiras, Gerais, campos rupestres, rochas e fendas

Cipó (Chironius sp.) Floresta Secundária, Capoeiras, Gerais Cobra d’água (Helicops sp.) Rios e Pedras Cobra espada ( ? ) - Salamanta (Epicrates cenchria assisi) - Rabo de Fogo ( ? ) - Cainana (Pseutes sp.) - Esparradeira (Eaglerophis merrimii) -

* Fauna identificada êmica e eticamente (Pistas taxonômicas)

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Há muito se discute se a caça de subsistência praticada por camponeses, índios ou

outras populações tradicionais, afeta a resiliência das espécies animais nas florestas

tropicais, na medida em que alguns consideram que esta atividades são reguladas

culturalmente pelas populações e não afetariam a fauna local a longo prazo (ADAMS, 2000).

Sem alguns animais domésticos (Foto 31) os moradores do Vale do Pati não

conseguiriam reproduzir seu modo de vida entre as escarpas rochosas da Chapada. O Burro,

a Galinha e o Cachorro fazem parte da vida no Pati.

A interação entre o “animal” ou burro, como chamam, se faz numa relação de

mútua dependência. Para o patizeiro o burro é um complemento vital para o transporte e

trabalhos de força. O animal torna-se meio material de manutenção da vida econômica

(transporte) e de informações, bem como um companheiro nas constantes e longas viagens

para Andaraí e Guiné. O Burro permite ao patizeiro transportar as cargas com produtos para

venda em Andaraí e o transporte de suprimentos para dentro do Vale, o que seria

humanamente impossível sem a força animal. Além disto, o burro serve como “ambulância”,

para, quando necessário, levar pessoas com ferimentos ou doentes para os hospitais mais

próximos.

T ABELA 5 : AVEFAUNA I DENT I FI CADA PELO MOR ADOR ES DO PAT I DE BAI XO

ESPÉCI ES ESPÉCI ES Cauã (Herpetatheres cachinnans) Curió (Oryzoborus angolensis)

T iziu (Volatinia jacarina) Jacu (Penélope sp.) Garrincha (T hryothorus sp.) T ico-T ico (Zonotrichia capensis)

Caga Sebo (Lophotriccus galeatus) Bem-te-vi (Sub-Familia T yranninae) Xiriba (Pyrrhura sp.) Carcará (Polyborus plancus) Aracuã (Ortalis sp.) Gavião (Família Accipitridae)

Bigode (Sporophila lineola) Galinha d’água (Gallinula Chloropus) Garça Branca (Família Ardeidae) Nambu (T inamus sp.)

Juriti (Leptotila verreauxi) Verdadeira (?) Sanhaço (T raupis sp.) Fogo Pago (Scardaffela squammata) Sofrê (I cterus icterus) Cardeal Canário (Paroaria sp.) Azulão (Passerina sp.) pica-pau-cabeça vermelha (Dryocopus lineatus)

Sabiá Preto (Família T urdidae) Sabiá-bico-de-osso (Família T urdidae) Martim pescador (Chlerocery sp.) Curiango (Família Caprimugidae)

Seriema (Cariama cristata) Mãe de lua (Nyctibius aetereus) Patativa (Sporophila sp.) Coruja (Família Strigidae) Vivi Amarelo e Preto (?) Anum (Crotophaga sp.)

Saira-sete-cores (T angara seledon) Maria Preta (Knipolegus sp.) Araponga (Procnias nudicollis) Cata Capim (Sporophila sp.)

Coletor (?) Figa (Conirostrum speciocolor) Coqui (Gnorimopsar chopi) Estevão (?)

Alma de Gato (Piaya cayana) Sabiá (Família T urdidae) * Aves identificada êmica e eticamente (Pistas taxonômicas)

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O uso da fauna silvestre e doméstica para fins medicinais está descrita em diversos

trabalhos de pesquisa junto às populações tradicionais dos trópicos (BEGOSSI , 2001). Um

estudo de SOUT O et al. (1996) realizados em Andaraí, apresenta uma lista da fauna utilizada

por alguns moradores locais na medicina, o que abre possibilidades de maiores estudos

etnozoológicos na região.

O conhecimento etnozoológico do patizeiro, principalmente a respeito da fauna

ameaçada de extinção, pode fornecer valiosos dados, que darão subsídios à estratégias de

conservação da fauna do Vale do Pati (Figura 7).

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Figura 7 – Mapa da localização de alguns componentes da fauna local (Mamíferos e Répteis), identificados pelos moradores do Pati de Baixo. Adaptado do site www.infochapada.com

Tatu

Mocó

Cobras/Serpentes Macaco Guariba

Jaguatirica

Paca Tamanduá-mirim Onça

VALE DO PATI

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Foto 30– Cobra Rabo de Fogo

Foto 31 – Sr. Eduardo alimentando as galinhas

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5.5. S I ST EMA DE ACESSO A T ER R A E AOS R ECUR SOS NAT UR AI S

A maioria dos patizeiros são chamados de posseiros (FUNCH, 1996), possuem a

posse da terra, compradas e ocupadas durante os diversos ciclos econômicos, porém poucos

possuem o título de proprietário. As terras dos patizeiros foram repassadas de geração em

geração por seus ancestrais. Existe um respeito pela terra que não refere-se apenas ao uso

e a sobrevivência, mas fundamentalmente com a ancestralidade, com o respeito pelos

mortos.

1.Uso e sobrevivência

“O I BAMA que tirar nós daqui, mas daqui não saio, ja morei fora e sei das miséria do mundo (...) não entendo, com tanta terra, eles querem que nós morre de fome.” (Morador do Cachoeirão)

2. Ancestralidade

“Faço as roça no terreno de meu pai, pois tenho que cuida do que foi dele” (Morador do Cachoeirão)

“Meu pai morreu em cima desta terra! T o aqui tomando conta.” (Morador do Cachoeirão)

O sistema de acesso a terra e aos recursos naturais no Cachoeirão condiz com as

características descritas por DI EGUES & ARRUDA (2001) em relação as populações

tradicionais. A propriedade familiar entrelaça-se com o a propriedade comum. Cada família

possui seu próprio roçado e área de plantio. Já quando nos referimos às áreas florestadas,

as serras e gerais a propriedade torna-se comum, manejada sobre o contrato do “respeito

mutuo”, onde realiza-se a caça, a coleta do palmito, de lenha e madeira para construção,

bem como é a área de pastagem dos burros.

Chegando na casa da Família Oliveira, Dona Elenice, mostra-me apontando a

capoeira já avançada, dentro da propriedade de sua família, o local onde o conhecido T onho

e sua família, reproduziam seus modos de vida, moravam e roçavam. Apontando um modelo

mais condizente as propriedades comunais. É bem provável, que a forma de propriedade

prevalecente antes do conflito com o I BAMA fosse a comunal. Conforme depoimento da

professora local, T atiane Coelho, tal conflito favoreceu o atomismo local, com cada morador

buscando definir claramente a propriedade privativa, como forma de garantir a indenização

no caso de desapropriação do interior do Parque Nacional da Chapada Diamantina.

Os recursos naturais são, em parte, comunais. Das matas se retiram árvores,

arbustos, cipós, pedras e a caça. Não há restrição particular de uso, mas sim um controle

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coletivo. Nas serras também se realiza a caça, porém não conseguimos devido ao tempo de

estudo e falta de referencial teórico sobre a fauna local, saber se existe algum controle

etnoconservacionista sobre esta atividade.

Nos territórios das famílias, o roçado e algumas plantações de maior importância

econômica (banana, mandioca, aipim e milho) são de uso familiar, porém pode-se negociar o

uso destes caso alguma outra família ou pessoas necessitem, ou como ocorre em muitos

casos pode ocorrer uma redistribuição alimentar19 quando na ocorrência dos festejos locais

e/ou na prática religiosa. O mesmo verifica-se, e de forma muito mais livre, com a utilização

de madeira e de frutos (Jaca, Manga, Laranja, etc) por parte de algumas pessoas em

território de outra família.

“Aqui qualquer um (da comunidade) pode pegar madeira e frutas no terreno de outro ... mas não pode tirar muito né” (Moradora do Cachoeirão)

Segundo a professora local, quando o recurso é extraído em demasia ou de forma

errônea (como o corte de lenha ainda verde) e quando, por exemplo, frutas são retiradas

antes do tempo de maturação, podem ocorrer formas de repreensão de acordo com a

política local marcada fortemente pela resolução face-a-face, sem intermediações de um

poder central.

Outro fator de controle do uso dos recursos está na possibilidade de exclusão (FEENY

et. al., 2001), onde o patizeiro só permite o uso dos recursos por visitantes “de fora” caso

haja possibilidade (existência em boa quantidade do recurso e perspectiva de ciclagem) e

compadrio, ou seja ligação afetiva entre os moradores e deste com os “de fora”.

T al configuração do espaço e uso da natureza favorecido por um controle coletivo,

com mecanismos de exclusão e repreensão, pode favorecer a conservação dos recursos

naturais (FEENY, et.al, op.cit.) mediante um processo etnoconservacionista. De forma

contrária, a propriedade privada e estatal, bem como o livre acesso, podem contribuir

fortemente para a degradação ecológica (ALI ER, 1998; ibid, 2001).

A criação do Parque Nacional da Chapada Diamantina criou um conflito entre

espaço público/estatal e espaço comunitário segundo perspectivas e visões opostas de uso

da terra. De um lado o Estado, representando uma elite urbana, reivindicando o espaço para

preservação dos recursos naturais e das belezas cênicas e, de outro, a população do Pati,

que teria que sacrificar seu modo de vida, abandonando compulsoriamente seu território.

19 Refere-se a uma hipótese da existência de mecanismos cooperativos de distribuição alimentar nas

comunidades tradicionais. Gravado do relato oral do Prof. Dr. José Geraldo Marques no Curso de Etnoconservação da Biodiversidade, realizado nos dias 28/04/2003 a 03/05/2003 em I guape/São Paulo.

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6. CONFL I T OS NA CONSER VAÇÃO: UM PONT O DE VI ST A

Os moradores que vivem no Parque são considerados pelos preservacionistas como

os “piores predadores dos recursos naturais da serra”, justamente porque se utilizam do

fogo, da caça , da roça e do extrativismo como meio de vida (FUNCH, 1997), que em todos

os casos seriam atividades predatórias. Além desse argumento, constantemente invocam

que o crescimento populacional é inevitável e um potencial causador de danos ecológicos

futuros no vale (ibid, 1997). Não se considera, neste ponto de vista, a intensidade e a

extensão espaço/tempo do uso dos recursos.

Neste sentido, coloca-se em proposta, mesmo reconhecendo-se os problemas

sociais decorrentes da desapropriação, a retirada dos moradores do Parque Nacional através

das seguintes estratégias: oferecimento de indenização e/ou troca de terras; ceder o direito

de morada “em vida” para quem não quiser sair imediatamente, onde posteriormente a terra

será de posse do Governo; e oferecimento de emprego aos moradores para serem fiscais da

reserva (FUNCH, 1997).

Segundo os moradores, os fiscais do I BAMA não passam muito pela área,

mantendo a história da não participação e da falta de democracia desde a criação do Parque,

feito, sem no mínimo, uma consulta. Como afirma um morador,

“O I BAMBA nunca veio aqui falar nada com ninguém ... só os puxa-saco {preservacionistas} vieram proibir...nunca veio conversar ... não querem que desmate mesmo, de jeito nenhum ... porque é parque não pode” (Morador do Cachoeirão)

De fato este enfoque preservacionista parte do pressuposto de que toda atividade

humana é prejudicial à natureza, então se deve criar ilhas que são os “barcos de salva-vidas

para nós humanos” (FUNCH, 1997). Esta versão da Ecologia Profunda pode ser importante

como critica a arrogância de muitos humanos civilizados, mas choca-se com as diversas

culturas e racionalidades ambientais existentes e com as divisões dentro da própria

sociedade civilizada (BOOKCHI N, 1993).

Segundo os preservacionistas o maior inimigo do Parque Nacional é o fogo. Os

incêndios no Parque Nacional, mesmos os naturais, estariam prejudicando intensamente a

biodiversidade e os solos. Esta é uma questão relevante ainda mais quando a Chapada

Diamantina corresponde a uma “ilha” de biodiversidade cercada pela degradação, e que

constantemente “arde” com as chamas colocadas de forma criminosa ou natural. Mas o fogo

nem sempre é prejudicial, possuindo um papel relevante para a natureza e para os

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agroecosisstemas. O fogo pode ser um importante mecanismo natural de renovação da vida

e criação da Biodiversidade (GLIESSMAN, 2001).

Segundo GOMEZ-POMPA & KAUS (1992), as novas descobertas científicas indicam

que todas as partes do globo, desde as florestas boreais até os trópicos, foram habitadas e

modificadas ao longo da história humana e o fogo, tanto natural quanto antropogênico,

contribuiu para a atual composição e a estrutura das chamadas florestas virgens e dos

ecossistemas naturais. Muitas sociedades milenares usaram o fogo como técnicas de manejo

dos agroecosisstemas.

As queimadas antropogências, fruto da agricultura de derrubada e queima realizada

no Pati é parte integral dos ecossistemas das florestas tropicais há milênios e não deve ser

confundida com a queimada destrutiva, realizada por interesses do lucro e do controle da

terra. Além disto, existem fortes evidências que o mosaico florestal forma uma paisagem

ideal para o controle das queimadas nas florestas (GOMEZ-POMPA & KAUS, op.cit.), o que

pode parcialmente explicar o baixo índice de incêndios no Vale do Pati.

As queimadas no Pati são realizadas de forma controlada com a construção de

aceros que impedem que o fogo se alastre. Os agricultores tradicionais geralmente

conhecem o vento, as mudanças climáticas anuais e as histórias das queimadas anteriores e

todo este conhecimento é utilizado no momento critico de se fazer a queimada.

O fogo, neste caso, permite uma renovação do solo e realocação dos nutrientes,

gerando um aumento de biomassa considerável nas primeiras fases de sucessão. A

biodiversidade diminui também nesta fase, na área de plantio, mas com o descanso a área

tende a ser recolonizada (ADAMS, 2000; GLI ESSMAN, 2001). Além disto às perturbações de

baixa intensidade contribui decisivamente para o incremento da biodiversidade (GOMEZ-

POMPA & KAUS, 1992; DI EGUES, 2000; GLI ESSMAN, 2001)

A importância do manejo tradicional reside numa racionalidade ambiental,

permeada por uma cultura, que, em muitos casos conservou e até criou componentes da

biodiversidade (GLEI SSMAN, op.cit.). É de extrema importância o estudo e acompanhamento

desta prática produtiva no Vale do Pati. Os moradores devem receber assessoria para a

realização de um manejo integrado das diversas atividades produtivas existentes e das

possíveis inserções de novas práticas, permeadas pela agroecologia (LEFF, 2000)

A caça é outro problema apontado pelos preservacionistas e com razão, haja visto

que boa parte da fauna da Chapada Diamantina foi dizimada pela perda de hábitats

decorrente da agricultura mercantil/capitalista e da pecuária e encontram-se extinta na

região ou sob ameaça de extinção. Porém necessita-se de estudos mais conclusivos para

determinar o impacto da caça tradicional no interior do Parque Nacional e na Chapada

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Diamantina. I sto não impede que ações conservacionistas possam ser postas em prática na

área, o que não ocorre atualmente, com a participação real e consciente da população do

Pati.

A idéia de que qualquer população humana tende inevitavelmente ao crescimento

demográfico e a posterior destruição dos recursos naturais é um mito propalado pelos neo-

maltusianos e biocêntricos. Esta abordagem causal não admite as reais divisões hierárquicas

conflitivas existentes no seio da humanidade, entre classes, etnias, questões de gênero,

familiares, etc, onde prevalece o domínio do homem sobre o homem e fundamenta-se a

lógica do domínio sobre a natureza (BOOKCHI N, 1988;1989). A possibilidade das

comunidades humanas recrutarem toda sua inteligência, informação e liberdade para tecer

um arranjo social que permita o pleno esclarecimento, a auto-educação, a constituição de

tecnologias limpas e de uma racionalidade ambiental, até controle populacional, é

simplesmente descartada por uma abordagem ambiental conservadora.

O crescimento populacional não é a raiz dos problemas ecológicos vigentes até

então, mas sim um amplificador que pode contribuir para o aprofundamento da crise, e é

fruto de uma forma de organização social hierárquica, geradora de desinformação, e de uma

economia fundadora das desigualdades (BOOKCHI N, op.cit.).

A agricultura de derrubada e queima pode passar a ser degradante caso haja uma

crescimento populacional (ADAMS, 2000), porém a noção de crescimento deterministica foge

a realidade. Sem dúvida, mantendo-se a condição social vigente, o crescimento populacional

amplificará os impactos no Vale. Neste caso deve-se juntar todos os esforços para,

primeiramente, estancar as causas sociais do crescimento e trabalhar a educação e formas

de manejo ecológico dos ecossistemas do Vale do Pati.

Não tratamos de recriar o mito do nobre selvagem (ALCORN, 1994), mas sim

apontar o potencial do caráter conservacionista, consciente ou não, da população tradicional

do Pati e a importância dos seus conhecimentos. E apontar que as mesmas populações, por

estarem inseridas num contexto onde prevalece o mecanismo hierárquico/ autoritário de

organização social, devem fortalecer-se para não sofrerem mudanças que levem à práticas

de degradação ecológica.

A prevalência de práticas degradadoras no Vale do Pati, não justifica a expulsão da

população, já contigenciada socialmente e economicamente, de seu território. Estas devem

ser aliadas num processo conservacionista.

A utilização dos recursos naturais de forma predatória pelas populações tradicionais

pode ocorrer, quando expulsos de seus territórios, por contingência econômica ou por

pressão do poder estatal (DI EGUES, 2000; COLCHEST ER, 1997).

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T rata-se, portanto, de colocar a ecologia num quadro social e de resolver as

questões emergentes da conservação dos ecossistemas no Vale do Pati, não apenas na

relação direta entre o homem e natureza, mas fundamentalmente na relação entre as

pessoas, e no potencial etnoconservacionista de suas práticas, mitos e conhecimentos,

gerados por esta relação.

A integração da perspectiva da conservação juntamente com o sonho de continuar

no Pati é emocionalmente expressado nas escritas de uma estudante da Escola do

Cachoeirão (16 anos),

“O meu sonho é que existissem Parque Nacional, que todo mundo tivessem a consciência sobre a preservação e morassem onde quisessem ... eu quero ser muito feliz.”

7. ECOLOGI A SOCI AL E ET NOCONSER VAÇÃO NO VALE DO PAT I

A conservação da biodiversidade e dos recursos naturais constitui dois importantes

objetivos de boa parte do movimento ecológico e de muitas populações tradicionais. A perda

ininterrupta destes bens naturais afeta não só o funcionamento dos ecossistemas, mas, em

grande parte, o conhecimento e modo de vida de boa parte da população mundial que vive

diretamente dos recursos extraídos da natureza.

Muitas estratégias foram e estão sendo desenvolvidas para estancar a perda de

biodiversidade. Podemos citar inicialmente, de forma geral, o modelo conservador de

conservação, realizado por uma elite intelectual e científica, que muitas vezes se alia aos

estados e corporações visando mitigar os efeitos deletérios das atividades “sujas”. Propõem

uma conservação tecnológicizada, baseada em informações científicas e em ações

coercitivas, tendo como base filosófica uma certa ecologia biocêntrica. A separação evidente

entre fins e meios e a incapacidade de contextualizar as realidades ecosociais demonstram a

ineficácia desta estratégia até o presente momento.

Uma outra vertente mais radical “à direita” crê que exista uma “mão invisível” que

alocará os recursos de forma ótima, de acordo com o movimento de um mercado livre e

competitivo. Acreditam, desta forma, que a competição geraria uma necessidade de

diminuição de custos e, por conseguinte, de utilização dos bens naturais. Crêem também

que avanço tecnocientífico, intrínseco a lógica competitiva, engendraria mecanismos

tecnológicos de proteção da natureza.

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As duas vertentes supra citadas compõem uma parte do movimento ambientalista,

que podemos chamar de Ecocapitalistas ou Ecotecnocratas (WALDMAN, 1992).

Uma outra parte do movimento e de grande importância é composta por militantes

e organizações biocêntricas, muitas vezes apoiadas na filosofia da Ecologia Profunda.

Diferentemente dos mais conservadores, estes criticam radicalmente a civilização humana,

apontando o homem como instintivamente destruidor. Propondo um retorno ao mundo

natural (BOOKCHI N, 1993).

T odas estas concepções e práticas tiveram alguns resultados parciais positivos, mas

por não tocarem a fundo na problemática ecológica, foram sucumbidos pela própria

cegueira, e hoje, como nunca antes, a destruição da natureza pode estar levando ao colapso

as sociedades humanas. Além disto, estas concepções, com algumas variações, propõem

modelos de áreas de preservação de uso restrito, implantados sob autoridade central e com

base num mínimo necessário de área para a conservação ou num mito de natureza intocada

x homem destruidor.

Outra vertente da conservação e não menos importante é a Biologia da

Conservação. Este modelo, com grande aceitação mundial, possui formas distintas de

atuação, mas o eixo fundamental é ter uma base conceitual e metodológica fruto de

informações científicas (Ecologia de populações, Biogeografia, História natural, Ecologia da

restauração, etc). A Biologia da Conservação inicialmente tinha caráter científico, de

proteção de espécies ameaçadas e de elaboração de estratégias de conservação baseadas

nas ciências naturais. Desta forma gerariam dados que subsidiariam as ações coercitivas do

Poder Público (Criação de Unidades de Conservação e fiscalização) e a execução de

programas de Educação Ambiental (PRI MACK & RODRI GUES, 2001).

A Biologia da Conservação sofreu inúmeras criticas pelo seu cientificismo

generalista que não adequava-se às realidade dos países tropicais, portadores de culturas

distintas e estreitamente ligadas a natureza. Porém muitos grupos e biólogos da conservação

tentam, muitas vezes com sucesso, realizar um diálogo entre os saberes científicos e

tradicionais. E intentam aprofundar as discussões e ações em busca da conservação da

biodiversidade levando-se em conta a ecologia social.

A Ecologia Social é, em geral, uma concepção que insere o homem na natureza,

sem naturalizá-lo. T rabalha com a noção de complexidade das relações e propõem a ação

direta e a busca por justiça social no avanço dos movimentos para sanar a crise ecológica.

Pode-se separar/integrar a ecologia social em duas linhas mais influentes, a I ndiana e a

Norte-Americana.

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O termo ecologia social foi cunhado em 1942 por Radhakamal Mukerjee, na índia.

O principio central da Ecologia Social indiana é que as sociedades tradicionais têm uma longa

tradição de interação com os ecossistemas. Estas sociedades desenvolveram práticas

culturais de utilização dos recursos naturais que levaram a um uso sustentável dos bens

naturais (SARKAR, 1998). Apontam que o modo de vida tradicional está cada vez mais

desorganizado pela expropriação pelo desenvolvimento econômico, pelo uso de tecnologias

novas e destrutivas e perda do controle dos ecossistemas. Os responsáveis seriam os

colonizadores desenvolvimentistas e, mais recentemente, os conservacionistas com suas

concepções de áreas protegidas. Sendo assim, a luta política pelos direitos e reconhecimento

dos povos tradicionais é condição necessária para a conservação da diversidade biológica.

No Brasil, este ecologismo popular (ALI ER, 1998) se expressou através de movimentos

sociais como o dos Seringueiros, com Chico Mendes, o Movimento Nacional dos Pescadores

Artesanais e os Movimentos camponeses para manutenção e reapropriação do território.

A teoria e a prática da conservação da biodiversidade que utiliza o conhecimento e

o manejo tradicional é chamada de Etnoconservação (DI EGUES, 1999).

A etnoconservação seria as ações ou práticas projetadas por povos indígenas ou

por integrantes de sociedades de pequena escala para prevenir ou mitigar a depleção de

recursos, a extirpação de populações e/ou a degradação de habitats (SMI T H & WI SHNI E,

2000).

A etnoconservação não é de domínio do estado e de determinados cientistas, mas

de um movimento que reúne cientistas naturais e sociais, as comunidades e as organizações

sócio-ecológicas que objetivam implantar uma conservação real das paisagens, da

biodiversidade e da sociodiversidade (DI EGUES, op.cit.). Os modelos científicos são

geralmente descrições qualitativas das relações homem/ ambiente, baseada nas observações

sistemática das interações.

A Ecologia Social Norte-Americana têm como precursor o filósofo Murray Bookchin.

Esta filosofia militante traz em seu interior uma critica profunda a atual organização social

capitalista e a todas as organizações sociais hierarquizadas. Propõe a ação direta num

processo de autogestão comunalista para gerar uma ruptura social que engendrará uma

sociedade ecológica orgânica de cunho libertária (BOOKCHI N, 1993). A Ecologia Social não é

um ramo da Ecologia Clássica, nem apenas uma disciplina científica, mas sim uma filosofia e

uma ética, que embasa alguns estudos das interações sociedade/ecologia e ações em busca

da transformação radical da atual sociedade à uma sociedade orgânica libertária. Propondo

formas de organização social horizontalizadas, tecnologias leves e limpas, a autogestão

social, etc.

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Busquei realizar uma breve introdução sobre alguns importantes movimentos

ecológicos contemporâneos para a produção de algumas proposições para subsidiar práticas

da Ecologia Social e da Etnoconservação no Vale do Pati.

a) R econhecimento do T err itór io: Questões legais

Os passos iniciais para iniciar-se um manejo etnoconservacionista dependerá do

acesso ao território, fonte de saber e da cultura no Pati. Este pode ser realizado pela

automobilização local em conjunto com a tomada de ações legais e científicas. Hoje,

ameaçado pela apropriação estatal, o processo de reconhecimento territorial pode ser feito

mediante a automobilização dos moradores para fortalecimento sociocultural e político: ou

seja ação política. E a estratégia de atuação legal pode ser realizada através da modificação

do estatuto do Parque Nacional, reduzindo os limites de sua área, na região denominada

Vale do Pati, transformando esta em Reserva Extrativista ou Reserva de Desenvolvimento

Sustentável.

I sto só pode ser feito mediante reconhecimento da tradicionalidade dos moradores

do Pati, o que conclama os cientistas militantes aos estudos, e posterior elaboração de lei

específica para supressão da área do Parque e criação de outra categoria de uso sustentável,

mais compatível com a realidade local.

b) O papel das ciências: O diálogo dos saberes

Os cientistas têm que ter consciência de suas práticas, o que pressupõe o

reconhecimento dos limites que as abordagens simplificadas impõe às ações

conservacionistas atuais (PI MBERT & PRET T Y, 1997). O paradigma da Etnoconservação

implica um reconhecimento das complexidades dos contextos interativos entre a sociedade e

a natureza, bem como o reconhecimento de outros saberes. Neste sentido os cientistas para

atuarem no Vale do Pati poderão se utilizar de estratégias advindas da Biologia da

Conservação, que oferece um arcabouço importante para mensuração e estudo da biota

local, ainda muito pouco estudada, principalmente a fauna. A Ecologia de Paisagem, a

Agroecologia e a economia também possuem papel importante neste processo de

conservação in situ.

Através das etnociências (etnoecologia, etnobotânica, etnopedologia,

etnocosmologia, etc) pode-se conhecer a biodiversidade local e as relações ecológicas

subjacentes. O que dará base para um “dialogo de saberes” (LEFF, 2001) na gestão da

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natureza no Vale do Pati. O reconhecimento de que a população do Vale do Pati possui um

conhecimento definido como “saber” e “saber fazer”, a respeito do mundo natural, bem

como uma interação fundamental com o meio, oferecerá as bases para um manejo integrado

dos ecossistemas locais. O que incluiria o estabelecimento, em conjunto, de novas

tecnologias e informações para o manejo agroflorestal, a agricultura de pousio, as hortas

medicinais, os pomares e a caça.

Neste sentido a imposição autoritária de modelos vai de encontro com a

conservação das diversidades culturais e biológicas, justamente por não se levar em conta o

contexto sociocultural no Vale do Pati . Deve haver um “diálogo dos saberes” que ofereça

dados e empodere a comunidade em seu processo autogestionário20.

c) A Educação

O processo educativo deve ter bases locais e enfatizar os contextos ecológicos,

sociocultural e político da região. Buscando formar o cidadão livre e consciente do ser no

mundo. A Escola Comunitária do Cachoeirão (Com cerca de 13 estudantes) iniciou um

processo de resgate da história do Vale do Pati, que está mobilizando as crianças a

buscarem informações sobre o seu passado e tomarem um posicionamento critico a respeito

do atual conflito com o Parque Nacional (Foto 33).

Além disto, realiza-se uma educação ambiental fundada nos aspectos da ecologia

local e da atual fase da economia patizeira, sendo assim existe na escola as disciplinas de

Ecoturismo e Agricultura Orgânica.

T odo o processo de organização da escola e de andamento pedagógico é realizado

participativamente em reuniões semanais entre os estudantes e os professores. E

periodicamente com os pais, estudantes e professores. gerando assim um sentimento de co-

responsabilidade pelo processo educativo por parte da comunidade.

A Escola Comunitária deixou de ser financiada pela Prefeitura Municipal de Andaraí,

o que prejudicou a comunidade, gerando um processo de automobilização, que resultou na

20 Autogestão seria a livre associação entre os homens, em caráter de igualdade, para gerirem sua

vida social e política de forma autônoma. Pressupõe uma interdependência com outros atores sociais independentes, configurando uma Rede ou uma Federação (GUI LLERM & BOURDET , 1976). A autogestão não pressupõe um “atomismo”, um “fechar em si mesmo”, mas sim uma intensa pa rticipação e decisão dos interessados na gestão dos interesses coletivos, de forma livre. Pressupõe, fundamentalmente, a consolidação de redes juntamente com outras organizações autogeridas, ou instituições afins, em estreita interdependência. Elimina, desta forma, as desigualdades de poder (poder igualitário) ao eliminar a figura das hierarquias, e horizontaliza as decisões.

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criação da Associação dos Pais e Amigos da Escola do Cachoeirão21. A Associação visa

autogerir a escola na busca por recursos e na elaboração do planejamento pedagógico.

Para que um processo etnoconservacionista tenha condições de avançar é

importante o fortalecimento das condições educativas da população, que só ocorrerá com a

manutenção da escola local. Sugere-se neste sentido o apoio irrestrito a escola formal do

Vale, seja apoiando diretamente à associação ou pressionando a prefeitura local. Nesta

deve-se fortalecer o ensino sobre o meio ambiente local e sobre a o contexto social vigente.

d) Autogestão e R edes

As populações tradicionais detêm um certo controle sobre o seu espaço e os

processo sociais que nele ocorrem. No vale do Pati existem atualmente duas associações, a

Associação dos Pais e Amigos da Escola do Cachoeirão e a Associação Comunitária do Vale

do Pati (ASCOPA) (Foto 32), esta última com o objetivo de ser um pólo de intercâmbio entre

os moradores, na busca de resoluções para os problemas comunitários.

Estas associações devem ser fortalecidas para que a comunidade se fortaleça e

sofra um empoderamento. Neste sentido deve-se oferecer/trocar todas as informações,

através de debates e cursos, que concernem à Educação Associativista, a Gestão de

Associações, a T ecnologias Alternativas, a Políticas Públicas e as Pesquisas Ecológicas em

andamento.

A fortalecimento endógeno pela automobilização pode ser favorecido pela formação

de Redes de Solidariedade e Apoio Mútuo. Esta rede seria composta, além das associações

do vale, por associações rurais, cooperativas populares, Ong s, grupos ecológicos

autônomos, universidades e pessoas interessadas, das localidades vizinhas e da região. O

município também possui um papel importante, pois este é o espaço real da vida pública. A

rede poderia conduzir um fórum, para avançar no processo de mobilização e manutenção do

território pelas populações tradicionais.

O processo de autogestão e formação de redes objetiva a manutenção do território,

o manejo integrado e sustentável dos bens naturais e as condições igualitárias de acesso aos

recursos naturais no Vale do Pati, o que entra em conflito com o Estado e os interesses

econômico da sociedade envolvente.

A autogestão do Ecoturismo, apesar das contradições desta prática econômica, é

condição necessária para a sustentabilidade local, haja vista o aumento do número de

21 Até a revisão deste trabalho a Associação de Pais e a Escola Comunitária estavam em processo de

fechamento devido a falta de recursos e apoio para manter as estruturas.

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turistas na área, aumentando a degradação sem que haja retorno econômico relevante aos

moradores. Alguns moradores questionam se o esforço realizado, juntamente com as

problemáticas socioculturais do turismo, valeria o ganho econômico obtido. Os moradores

devem, mediante informações e recursos, ter o controle do fluxo turístico no Vale do Pati.

Estas propostas só se realizam mediante debate intenso com a comunidade e os

profissionais da conservação. Estes últimos deverão ter ciência de seus papéis como

assessores/multiplicadores neste processo e cabe aos moradores, dentro do processo de

autogestão e com as informações disponíveis, decidirem os caminhos que seguirão. Cada

envolvido têm que assumir suas responsabilidades na conservação dos ecossistemas do Vale

do Pati.

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Foto 33– Escola Comunitária do Cachoeirão

Foto 32– Reunião da ASCOPA

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CONCLUSÃO NÃO CONCLUSI VA

O presente trabalho propôs uma inicial discussão a respeito da Chapada

Diamantina, um lugar ao mesmo tempo tão belo e tão sofrido, tão misterioso e cheio de

saberes, extremamente abandonado e muito procurado, tão falado e pouco conhecido.

Ì numeras questões estão em aberto para futuras pesquisas e as conclusões aqui

apresentadas são parciais, frutos de uma pesquisa que se propôs, em parte, não conclusiva.

O Vale do Pati é revestido pela Floresta Estacional Sempre Verde, possui uma rica

fauna e abundancia em recursos hídricos. Estes elementos da natureza estão em processo

de degradação desde as entradas pelos sertões empreendidas pelos colonizadores. As

principais causas da destruição dos recursos naturais na região são: a agricultura moderna, a

pecuária, extração de madeira para o mercado, poluição dos rios, mineração empresarial, e,

em menor grau, o garimpo de pequena escala. A caça pode ter sido um fator preponderante

na perda da biodiversidade local. Portanto as causas da degradação estão intimamente

ligadas ao modo de produção e organização capitalista.

T anto o modo de vida, quanto os sistemas culturais, simbólicos e as formas de

sociabilidade dos moradores do Pati são singulares. Estas pessoas se adaptaram e recriaram

sua cultura, criando um modo de vida com uma miscigenação da cultura africana, dos

grupos populacionais que adentraram sertão da Chapada Diamantina e com grupos de

europeus de cultura portuguesa já mesclados da forte presença indígena. T al flexibilidade

cultural influenciou nas práticas de manejo integrado dos ecossistemas locais. E o isolamento

relativo a sociedade envolvente permitiu a configuração de um modo de vida integrado a

natureza e aos seus ciclos, ao mesmo tempo em que se desenvolvem o conhecimento e

práticas de manejo adequadas ao local.

A paisagem no Pati é descontínua, marcada por áreas florestais, capoeiras e

roçados, onde o espaço e o acesso aos recursos naturais são em parte familiar e comunal. A

paisagem construída pelo dinamismo natural e pela interação mutualistica entre a cultura e a

natureza pode ser descrita como uma verdadeira paisagem em mosaico.

A população combina atividades de policultura (Agricultura itinerante e pomares),

extrativismo vegetal e caça. Estas atividades visam o uso familiar, a troca, a venda e

também suprir os festejos locais.

Hoje o ecoturismo também aparece como uma atividade econômica

financeiramente importante para os moradores, porém os benefícios devem ser relativizados

pelos impactos culturais e socioambientais gerados. Esta combinação de práticas e usos dos

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recursos naturais é uma forma de utilização do ecossistema segundo suas características e

de acordo com os “ciclos naturais”. Existe no local uma extensa taxonomia Folk.

Ao profissional da conservação cabe reforçar a cultura local, através da valorização

dos conhecimentos e práticas tradicionais e do apoio a automobilização dos moradores,

neste sentido a educação libertadora possui um papel relevante, assim como a consolidação

de redes de solidariedade. Abre-se a perspectiva de, em paralelo ao reconhecimento legal do

território, se consolidar um processo autogestionário na comunidade.

A criação do Parque Nacional da Chapada Diamantina criou um conflito entre

espaço publico e espaço comunitário segundo perspectivas e visões opostas de uso da terra.

De um lado o Estado, representando uma elite urbana, reivindicando o espaço para

preservação dos recursos naturais e das belezas cênicas e de outro a população do Pati, que

teria que sacrificar seu modo de vida abandonando compulsoriamente seu território.

A conclusão principal deste trabalho diz respeito a necessidade de tratar a ecologia

de forma sistêmica, tanto no âmbito das relações ecológicas como na relação direta do

homem com a natureza e fundamentalmente a relação entre os homens. Hoje marcada pela

hierarquia, pela dominação e pela exploração. A Ecologia Social e a etnoecologia possuem

um papel importante no processo de entendimento destas relações e de posterior

transformação das realidades.

Acredito ter contribuído para iniciar estudos que subsidiem ações para conservar as

riquezas naturais e culturais do Vale do Pati antes que tão belo local possa ficar

desabitado...ou habitado pelos “amantes da natureza” e pelo turismo empresarial.

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