5. escoamentos em canais de leito móvel - resistência ao ... · depende do coeficiente de...
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Hidráulica Fluvial V − Escoamentos em canais de leito móvel
5. Escoamentos em canais de leito móvel -
Resistência ao escoamento
5.1. Introdução: rugosidade de grão
e de forma
Em leitos naturais a curva de vazão, Q=Q(h), que
resulta da lei de resistência (ex.: Q ),
depende do coeficiente de rugosidade de Strickler (Ks)
que, por sua vez, depende das características do
escoamento:
2/13/2 JRAKs=
− Em leito plano, a resistência ao escoamento é
praticamente devida à rugosidade dos grãos do leito;
− Quando se formam configurações de fundo, a
resistência que estas introduzem adiciona-se à
resistência dos grãos.
Assim, a resistência ao escoamento depende de:
− resistência do grão (forças de atrito)
− resistência de forma (variação brusca do campo de
pressões e velocidades)
Processos Fluviais e Costeiros, 2002 V−1 Francisco Sancho
Hidráulica Fluvial V − Escoamentos em canais de leito móvel
A rugosidade equivalente de Nikuradse total, k, resulta
assim da adição:
fg kkk +=
sendo kg e kf as rugosidades de grão e de forma.
Nota: k=rugosidade de fundo (m) e Ks=coeficiente de
Strickler (m1/3/s)
Existem 2 mecanismos principais que provocam a
alteração da resistência ao escoamento:
1) A variação da velocidade e do caudal provoca a
variação da forma de fundo e ∴ da resistência;
Atenção: Dunas → transição: ↑ Q ⇒ ↑ Ks (↓ n), pode ⇒ ↓ h !!!
Processos Fluviais e Costeiros, 2002 V−2 Francisco Sancho
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2) O material sólido em suspensão modifica a
distribuição de velocidades e, indirectamente, a
resistência ao escoamento:
– Para iguais condições de altura do escoamento e
declive, a turbulência diminui com o aumento da
concentração de sedimentos, levando a uma
menor resistência global e, consequente, aumento
da velocidade e caudal.
No regime de transição pode ainda ocorrer histerese, ou
seja, a curva de vazão não é única, dependendo da
“história do fundo”.
Métodos distintos p/ fundos móveis planos e não planos!
5.2. Resistência ao escoamento em fundos
móveis planos Recorre-se às fórmulas de resistência válidas para fundo
plano fixo! (Colebrook-White, Chezy, Manning-Strickler)
Assim, a grande diferença do fundo móvel plano para
um fundo fixo plano resulta na caracterização da
rugosidade do grão de uma granulometria não uniforme.
Processos Fluviais e Costeiros, 2002 V−3 Francisco Sancho
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a) Para areias não uniformes, Meyer-Peter e Müller (1948)
relacionaram a rugosidade do grão com o factor de
resistência de Manning, n:
261 61
90DK
ns
==
com [D]=m e [n]=m-1/3s.
D90 = diâmetro para o qual 90% do material é mais fino
b) Para fundos de seixo e calhaus, Lane e Carlson (1953)
sugeriram:
1.211 61
75DK
ns
==
c) Para enrocamentos, fórmula do “Federal Highway
Administration” (USA):
615004815.0 Dn =
d) A partir de dados de 67 rios com fundos de calhau e
seixo, Bray (1979) propõe a seguinte fórmula para o
coeficiente de Darcy-Weisbach:
Processos Fluviais e Costeiros, 2002 V−4 Francisco Sancho
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281.0
5021 36.11
=
Dh
f
Em fundo plano móvel, pode-se ainda generalizar a lei
logarítmica de velocidades, deduzida para escoamentos
turbulentos rugosos em leito plano fixo (Einstein, 1950):
=
∗ kR
uU χ27.12log75.5
sendo:
R =raio hidráulico
χ = coeficiente de correcção = f(k/δ’) (ver Fig. 2.7)
δ’ = espessura da subcamada viscosa
Esta generalização pressupõe que se substitua a
rugosidade total, k, por um diâmetro equivalente do
fundo:
− Einstein, = 65Dk ;
− Ackers e White, 3525.1 Dk = ;
− Engelund e Hansen, 652Dk = ;
− Kamphuis, 905.2 Dk = ;
− Van Rijn, 903Dk = .
Processos Fluviais e Costeiros, 2002 V−5 Francisco Sancho
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5.3. Resistência ao escoamento com
configurações de fundo
Em geral, são de aplicação mais complicada que as
fórmulas para o fundo plano.
Os critérios de previsão da resistência ao escoamento
com formas de fundo dividem-se naqueles que necessi-
tam o conhecimento prévio do tipo de configuração e os
que não o precisam.
Os seguintes critérios são aqueles que parecem conduzir
às melhores previsões (Neves, 1990; Cardoso et al.,
1994):
− Brownlie (em particular para Fr<0.32);
− Karin e Kennedy;
− Van Rijn (em particular para Fr<0.32);
Todos os rios
Rios Portugueses
− Engelund;
− White et al.
Critérios válidos para canais ideais, de secção
rectangular larga ⇒ R≈h.
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5.3.1. Critério de Einstein e Barbarossa (1952)
Admite-se que dissipação de energia (i.e., a perda de
carga unitária, J ) se deve à resistência do grão e à
resistência de forma, o que equivale considerar que a
tensão de arrastamento, τ0, é composta por:
000 τττ ′′+′=
em que
τ’0 = tensão de arrastamento resultante da rugosidade
do grão
τ”0 = tensão de arrastamento associada à rugosidade de
forma.
Associada a esta divisão da tensão de arrastamento,
divide-se também o raio hidráulico em duas parcelas,
tais que:
RRR ′′+′=
JR′=′ γτ0 e JR ′′=′′ γτ0
⇒ JRgu ′=′∗ e JRgu ′′=′′∗
em que
Processos Fluviais e Costeiros, 2002 V−7 Francisco Sancho
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R’ = raio hidráulico para um dado escoamento,
admitindo que o fundo é plano;
R” = parcela adicional do raio hidráulico resultante da
existência de formas de fundo.
Da equação JRγτ =0 resulta então:
( ) ( ) ( )222∗∗∗ ′′+′= uuu
A resistência do grão resulta da aplicação da lei
logarítmica, adaptada para esta contribuição somente:
′=
′∗ 65
27.12log75.5D
RuU χ
A segunda parcela, a resistência de forma, ∗′′uU , está
relacionada com o transporte sólido, expresso em
função do parâmetro de escoamento, ψ’:
JRDs
′−
=′ 35ρ
ρρψ
através do Ábaco (experimental) seguinte:
Processos Fluviais e Costeiros, 2002 V−8 Francisco Sancho
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(Adaptado de Cardoso, 1998)
Procedimento de cálculo:
1) Arbitra-se R’ e calcula-se u’∗, usando JRg ′=u′∗ ;
2) calcula-se U através da lei logarítmica anterior para
∗′uU e do gráfico (fig. 2.7) que dá χ;
3) calcula-se ψ’ e lê-se ∗′′uU no gráfico acima; calcula-
se u∗” sabendo U, e R” através de JRg ′′=u ′′∗ ;
4) calcula-se R=R’+R” e o valor da área da secção A;
5) Finalmente, determina-se Q=UA, e verifica-se que
este valor coincide com o caudal pretendido!
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5.3.2. Critério de Brownlie (1983)
O metodologia de Brownlie difere de muitas outras no
facto de que a resistência ao escoamento não é
separada em resistência de grão e de forma, mas as
formas de fundo são entendidas como macro-
rugosidades.
Neste critério, a tensão de arrastamento, (∝ RJ ), ou
seja a resistência ao escoamento, depende do caudal
unitário, q, do declive do canal, J, e das características
dos sedimentos (D50 , σD).
O raio hidráulico, R, depende do regime de escoamento
e é dado por:
− regime inferior:
( ) 1050.009188.06539.0
503724.0 DJJq
DJR σ∗=
− regime superior:
( ) σ∗=0.6248 0.0875 0.08013
50
0.2836 DR J q J JD
Processos Fluviais e Costeiros, 2002 V−10 Francisco Sancho
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em que 350Dg
q=∗q
q = caudal líquido por unidade de largura (caudal
unitário)
Para a aplicação deste critério é necessário conhecer J,
D50 , σD, δ’.
DETERMINAÇÃO DO REGIME DE ESCOAMENTO
O regime de escoamento depende:
i. da perda de carga unitária, J,
ii. do N.º de Froude do grão, Fg, definido como
ρρρ−
=s
g DgUF50
que reflecte a relação entre a força de arrastamento
que actua numa partícula e o seu peso submerso.
iii. e da relação δ ′50D
Processos Fluviais e Costeiros, 2002 V−11 Francisco Sancho
Hidráulica Fluvial V − Escoamentos em canais de leito móvel
(Adaptado de Cardoso, 1998)
Segundo o gráfico o limite entre regime inferior e
superior depende de:
3/174.1 −=′= JFF gg
ocorrendo o regime superior sempre que . 006.0>J
Para é necessário refinar os limites onde
podem ocorrer regime superior, de transição ou inferior
006.0<J
:
Processos Fluviais e Costeiros, 2002 V−12 Francisco Sancho
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− limite entre o regime de transição e o superior:
δ
δδ
δ
′>
′<
′=
′+
′+−=
′
2,
2,
25.1
log8381.0
log1517.002469.0log
50
50
250
50
D
D
FF
D
DFF
gg
g
g
− limite entre o regime inferior e o de transição:
δ
δδ
δ
′>
′<
′=
′+
′+−=
′
2,
2,
8.0
log933.0
log07026.02026.0log
50
50
250
50
D
D
FF
D
DFF
gg
g
g
em que:
∗=′ uνδ 6.11
e os casos em que δ ′> 250D correspondem a
desprezarem-se os efeitos da viscosidade
Processos Fluviais e Costeiros, 2002 V−13 Francisco Sancho
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PROCEDIMENTO DE CÁLCULO
Procedimento para o cálculo de R (≈h) dados os valores
de q, J, D50 , σD:
1) Se J temos regime superior e pode-se logo
determinar R pela equação
006.0>
=50DJR , válida para
esse regime;
2) Se J então: 006.0<
a) calcula-se F’g ;
b) calcula-se q∗ ;
c) determinam-se 2 valores de R, para os 2 regimes,
através das relações =50DJR ;
d) com os 2 valores de R determinam-se duas
velocidades do escoamento, U Rq /= , e do
parâmetro Fg ;
e) calculam-se 2 valores de gg F ′F usando os
resultados de a) e d);
f) calculam-se 2 valores de δ’ para os 2 valores de R
(em reg. inferior e superior) e determinam-se os
Processos Fluviais e Costeiros, 2002 V−14 Francisco Sancho
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2 limites de ocorrência do regime de transição
(expressões pág. anterior);
g) − se ambos os valores de gg FF ′ calculados em e)
forem menores que os valores limite calculados
em f), ocorre o regime inferior;
− se ambos forem maiores ocorre o regime
superior. O raio hidráulico fica assim bem
definido.
− Nos restantes casos ocorre o regime de
transição e existe um intervalo de valores de R
para a solução.
5.4. Secções compostas
As fórmulas anteriores foram deduzidas para secções
rectangulares largas (⇒ R≈h), ou seja, em que o raio
hidráulico do fundo, Rb≈R≈h.
Na prática, os critérios anteriores fornecem Rb , sendo
necessário para secções onde B/h seja relativamente
pequeno (não >>1) determinar o verdadeiro R e h.
Processos Fluviais e Costeiros, 2002 V−15 Francisco Sancho
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CORRECÇÃO DOS EFEITOS DE PAREDE
Método de correcção de Vanoni e Brooks (1975):
permite determinar R, por tentativas/iterações, através
de Rb calculado por um critério de resistência. (p.179,
Cardoso, 1998)
RUGOSIDADE COMPOSTA PARA CANAIS NATURAIS
A fórmula de Manning pode ser aplicada a cada sub-
secção, com velocidades e rugosidades diferentes, para
determinar h, U e a rugosidade composta da secção
total:
∑=
=n
iii AUQ
1 , 21
321 JPA
nU
i
i
ii
=
(Adaptado de Chang, 1988)
Processos Fluviais e Costeiros, 2002 V−16 Francisco Sancho