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4 Viés, ideologia, pedagogia das tecnologias: a ecologia das mídias Uma nova tecnologia compete com as demais não só por tempo, atenção, dinheiro, prestígio, mas principalmente pela predominância de sua visão de mundo, fomentando alterações sociais, institucionais e intelectuais relevantes, que por sua vez, são redirecionadas pela sociedade. Sendo assim, analistas da vertente ecológica da mídia estão menos interessados/as na eficiência do computador como ferramenta de ensino ou comunicação, do que na alteração que promovem no significado das coisas. Adriana Braga O ambiente humano contemporâneo, elétrica e midiaticamente estruturado, ao menos para os segmentos das sociedades estabelecidos nas grandes metrópoles do Ocidente, difere muito do ambiente de 20 ou 30 anos atrás. É indiscutível o fato de que o habitat desses homens e mulheres passou por drásticas transformações ao longo dos últimos dois séculos, em especial com a chegada das tecnologias do computador ao núcleo de suas vidas cotidianas. Espaços privados e públicos, antes ocupados por equipamentos de natureza mecânica, foram sendo progressivamente remodelados, fazendo com que máquinas e aparelhos eletroeletrônicos também passassem a integrar a cena do dia-a-dia de bilhões de indivíduos mundo afora. Ainda que se possa argumentar que aproximadamente 2/3 da população global não são inteiramente impactados pelo advento da Internet 104 e dos recursos embutidos nas tecnologias do computador, é de se esperar que cada vez mais pessoas sejam incluídas nessas estatísticas. Além disso, sabemos que uma nova tecnologia sempre está a causar impactos indiretos, mesmo em sociedades que não desfrutem diretamente de seus usos. Por exemplo, este é o caso da cassiterita, mineral do qual se extrai o estanho presente em muitos componentes, soldas e ligas dos equipamentos eletroeletrônicos, como televisores, laptops e aparelhos de 104 Dados de março de 2013, em http://canaltech.com.br/noticia/internet/Apenas-35-da-populacao- mundial-tem-acesso-a-internet/, acesso em 14/09/2013.

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4 Viés, ideologia, pedagogia das tecnologias: a ecologia das mídias

Uma nova tecnologia compete com as demais não só por tempo, atenção, dinheiro,

prestígio, mas principalmente pela predominância de sua visão de mundo,

fomentando alterações sociais, institucionais e intelectuais relevantes, que por sua

vez, são redirecionadas pela sociedade. Sendo assim, analistas da vertente

ecológica da mídia estão menos interessados/as na eficiência do computador como

ferramenta de ensino ou comunicação, do que na alteração que promovem no

significado das coisas.

Adriana Braga

O ambiente humano contemporâneo, elétrica e midiaticamente estruturado,

ao menos para os segmentos das sociedades estabelecidos nas grandes metrópoles

do Ocidente, difere muito do ambiente de 20 ou 30 anos atrás. É indiscutível o

fato de que o habitat desses homens e mulheres passou por drásticas

transformações ao longo dos últimos dois séculos, em especial com a chegada das

tecnologias do computador ao núcleo de suas vidas cotidianas. Espaços privados e

públicos, antes ocupados por equipamentos de natureza mecânica, foram sendo

progressivamente remodelados, fazendo com que máquinas e aparelhos

eletroeletrônicos também passassem a integrar a cena do dia-a-dia de bilhões de

indivíduos mundo afora.

Ainda que se possa argumentar que aproximadamente 2/3 da população

global não são inteiramente impactados pelo advento da Internet104 e dos recursos

embutidos nas tecnologias do computador, é de se esperar que cada vez mais

pessoas sejam incluídas nessas estatísticas. Além disso, sabemos que uma nova

tecnologia sempre está a causar impactos indiretos, mesmo em sociedades que não

desfrutem diretamente de seus usos. Por exemplo, este é o caso da cassiterita,

mineral do qual se extrai o estanho presente em muitos componentes, soldas e

ligas dos equipamentos eletroeletrônicos, como televisores, laptops e aparelhos de

104 Dados de março de 2013, em http://canaltech.com.br/noticia/internet/Apenas-35-da-populacao-

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telefonia móvel, que é amplamente explorado no Congo sob um regime de

trabalho escravo105.

Desse modo, cercados menos por elementos da fauna e da flora do que por

geringonças interativas, traquitanas digitais e objetos animados pela energia

elétrica, os seres humanos, já ao final do século XX, veem-se imersos numa

categoria bastante específica de ambiente: o dominado pelos meios de

comunicação. São objetos que permitem a comunicação por voz e por vídeo.

Meios que aproximam o que está distante e afastam o que está perto. São

equipamentos que resfriam e esquentam. Tecnologias que automatizam, que

integram, que descentralizam e que, mais importante, agem sobre a organização

da sociedade em nível estrutural e pedagógico, de maneira muitas vezes

imperceptível.

Esse habitat transformado pela presença das mídias configura o objeto de

estudo do que se convencionou chamar de ecologia das mídias, um campo de

pesquisa abrangente que se preocupa mais com as características materiais

(formais) do que com o conteúdo de um meio – “o meio é a mensagem”

(McLuhan, 1964/2007). Uma perspectiva que entende, grosso modo, que uma

“mudança tecnológica não é nem aditiva e nem subtrativa” (Postman, 1994, p.

27), mas significativa enquanto provedora de alterações na estrutura de interesses

e na pedagogia da sociedade. É significativa porque proporciona uma mudança

total no ambiente em que é inserida, segundo seu viés de funcionamento, sua

ideologia específica.

Dentro dessa “tecnodiversidade”, acreditamos que um aparelho mereça

especial atenção, tanto por sua capacidade em imiscuir-se de maneira quase

invisível no cotidiano das pessoas, quanto por suas características multifuncionais,

que permitem que seus usuários realizem atividades diversas ao mesmo tempo.

Estamos a falar dos smartphones, aparelhos de celular melhorados que hoje não

servem apenas para falar a distância, mas servem como pequenas plataformas de

entretenimento de bolso. Articulando o que há de mais avançado nas tecnologias

do computador, como aplicativos de recreação e redes de comunicação online

como o Facebook, a esferas como trabalho, lazer, escola e família, os smartphones

hoje estão por toda a parte.

105 Dados de março de 2010, em http://www.ecopolitica.com.br/2010/03/23/minerais-de-sangue-

em-nossos-computadores-e-celulares/, acesso em 09/05/2014.

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Nesse sentido, se a forma da percepção humana, que se transforma

juntamente com seu modo de existência, como aponta Benjamin (1955/2012), é

condicionada dentro dos grandes períodos históricos, poderíamos indagar: Que

transformações estariam em curso em decorrência do uso das tecnologias do

computador encontradas nos smartphones, especialmente quando associadas ao

uso cotidiano e massificado do Facebook? Quais impactos práticos teriam esses

dispositivos na vida de homens e mulheres com a comunicação, e que poderiam

influenciar nas performances dos usuários no fenômeno que estamos estudando?

Em um primeiro momento esse tópico pretende se dedicar à perspectiva

ecológica das mídias, apresentando referenciais teóricos que possam respaldar a

escolha dessa abordagem como importante referencial analítico de nosso trabalho.

A etapa subsequente vai abordar a origem do conceito implícito na tecnologia do

celular, recorrendo a recortes históricos para falar de sua relação com as

tecnologias do telégrafo e do computador. Em um momento seguinte

apresentaremos alguns dados de estudos recentes acerca da utilização dos

smartphones como meios de comunicação. Por fim, faremos algumas

considerações finais sobre os impactos das tecnologias, tendo por base as

informações provenientes dos estudos recentes sobre a neuroplasticidade cerebral.

Tentaremos, desse modo, construir um cenário que justifique a escolha da

ecologia das mídias enquanto perspectiva teórico-metodológica complementar de

nossa pesquisa.

4.1. Fauna e flora “abióticas”

Assim como um ecossistema é composto por diferentes espécies de plantas

e animais, que coexistem em um equilíbrio potencial dentro de determinada

cadeia alimentar, também um ambiente midiático é formado por diferentes

“espécies” de aparelhos: modelos e tipos de equipamentos de base tecnológica

que, se não compartilham de uma “cadeia alimentar” por motivos óbvios, ao

menos coabitam espaços num tipo de “cadeia elementar”. O cenário do ambiente

contemporâneo nas sociedades industrializadas é um caleidoscópio de elementos

eletrônicos, verdadeira selva de transistores, cabos, botões, luzes e circuitos que

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formam o núcleo embrionário do indivíduo contemporâneo. “Fora desse habitat”,

diriam alguns, “seria impossível sobreviver”.

O ambiente de homens e mulheres das sociedades industriais provê

aparelhos para aquecer e congelar alimentos, receber e enviar sinais de voz,

converter informação digital em imagens, captar e transmitir ondas de rádio,

transformar energia elétrica em luz. Alguns realizam múltiplas funções ao cortar,

picar, macerar e aglutinar não só legumes, mas também palavras. É diante dessas

“fauna e flora abióticas”, de suas interações entre si e em relação a seus usuários,

das modificações que promovem estados de consciência ao trazerem consigo uma

nova tecnologia para casas, escritórios e ruas, que podemos falar numa ecologia

das mídias. Sobre isso, diz-nos o teórico das comunicações Neil Postman:

[A mudança tecnológica] É ecológica. Refiro-me à “ecológica” no mesmo sentido

em que a palavra é usada pelos cientistas do meio ambiente. Uma mudança

significativa gera uma mudança total. Se você tirar as lagartas de dado habitat,

você não fica com o mesmo ambiente menos as lagartas, mas com um novo

ambiente e terá reconstruído as condições da sobrevivência; o mesmo se dá se você

acrescenta lagartas a um ambiente que não tinha nenhuma. É assim que a ecologia

do meio ambiente funciona. Uma tecnologia nova não acrescenta nem subtrai coisa

alguma. Ela muda tudo. No ano de 1500, cinquenta anos depois da invenção da

prensa tipográfica, nós não tínhamos a velha Europa mais a imprensa. Tínhamos

uma Europa diferente. (POSTMAN, 1994, p. 27).

Podemos ter uma ideia do tipo de transformação proporcionado por uma

tecnologia ao pensarmos no impacto que o uso de smartphones tem junto aos

indivíduos e seus coletivos. O flâneur de nosso tempo percorre as vias digitais

deslizando seus dedos sobre a tela. Enquanto se desloca fisicamente no plano

espacial, sua mente habita múltiplos planos virtuais. São multidões desses

flâneurs conectados nas ruas, nos transportes públicos, nas praças, mesmo dentro

de suas residências. Perambulam aparentemente sem compromisso pela rede,

pulando de link em link, de aplicativo em aplicativo, mas se comprazem

abertamente com a estética que encontram em seus computadores portáteis. Seus

olhos talvez brilhem menos pelos conteúdos que acessam do que pelas luzes que

refletem.

A abordagem ecológica das mídias pode ser bem compreendida ao

tomarmos a observação de McLuhan segundo a qual “toda tecnologia

gradualmente cria um ambiente humano totalmente novo [...] ambientes não são

envoltórios passivos, mas processos ativos” (2007, p. 10). Para o teórico que foi

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apelidado de “papa da comunicação”, a relativa facilidade com que as novas

tecnologias operam transformações nos ambientes provém da lógica mensagem-

conteúdo, onde um ambiente antigo é visto como “conteúdo” de um ambiente

novo – o rádio em relação à TV e esta em relação ao computador em rede, por

exemplo. “O novo ambiente reprocessa o velho tão radicalmente quanto a TV está

processando o cinema” (Ibid., p. 11), afirmou em 1964. No caso específico dos

smartphones, poderíamos deduzir que já se trata de uma “geração tecnológica”

que reprocessa conjuntamente o computador, o celular e a TV a cabo como seus

“conteúdos”? Possivelmente sim.

Para o entendimento desse argumento, contudo, basta que fique claro que o

homem, especialmente hoje, mas cada vez mais, vive imersa num ambiente que

difere muito dos ambientes de períodos anteriores da história. Se temos

dificuldade em falar de um ambiente “natural” nas sociedades industrializadas,

podemos tentar fazer um exercício linguístico e “naturalizar” o ambiente

tecnológico no qual somos criados. Se em dado momento o habitat humano já foi

composto majoritariamente por elementos de base mecânica feitos de ferro, aço e

madeira, no final do século XX temos o ambiente invadido por elementos de base

eletrônica construídos a partir de derivados do petróleo, estanho e outros minerais.

4.2. O viés da comunicação

A perspectiva teórica que primeiro apontou para “as mudanças sociais

decorrentes da introdução de uma nova tecnologia em uma cultura” (Braga, 2006,

p. 28) foi apresentada pelo canadense Harold Innis na obra O viés da

comunicação (1951). Formado em ciência política, o autor se preocupou em

analisar o modo como os meios de comunicação e seus suportes (que para ele

eram também meios), tecnologias materiais de poder, eram controlados por

aqueles que detêm o saber especializado. Sem ser determinista, já que

compreendia que os que detêm esse saber nunca podem prever de modo integral

como uma tecnologia vai se desenvolver em determinadas condições, a análise de

Innis conseguiu erigir uma questão de extrema importância – questão que de certo

modo impulsionou a abordagem teórico-metodológica da ecologia das mídias.

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Para o autor, cada meio de comunicação (tábuas de pedra ou argila, papiro,

pergaminho, papel, eletrônico) possui um bias próprio, isto é, um viés que decorre

de suas características e propriedades materiais, e que irá influenciar de

determinado modo a manutenção de um monopólio do conhecimento de uma

determinada sociedade. Os meios tenderiam a evidenciar mais uma cultura através

do viés tempo ou do viés espaço, segundo suas características próprias, como

pesado, leve, durável, perecível, entre outras. Nas palavras do próprio Innis:

Um meio de comunicação tem uma importante influência na disseminação do

conhecimento através do espaço e do tempo e se torna necessário estudar suas

características a fim de avaliar sua influência sobre o quadro cultural. De acordo

com suas características, um meio pode ser mais apropriado para disseminação do

conhecimento através do tempo em detrimento do espaço, particularmente se o

meio for pesado, durável e não apropriado para o transporte ou, ao inverso, pode

ser mais apropriado para a disseminação do conhecimento através do espaço em

detrimento do tempo, se o meio for leve e facilmente transportável. A relativa

ênfase no tempo ou no espaço irá implicar um bias de significação para a cultura

na qual está inserido. (INNIS, 2011, p. 103).

Desse modo, as mudanças em um sistema de comunicação acentuam

determinado aspecto da realidade, tendendo a dar ênfase ao tempo ou ao espaço.

Para Innis, o bias tempo alude à preeminência do passado em relação ao presente,

sendo característico especialmente nos períodos onde há governos de aspecto

marcadamente religiosos. O bias espaço, ao contrário, remete à supremacia do

global em relação ao vernáculo, à tradição local, sendo mais comum em períodos

onde há governos militares e/ou burocráticos (Innis, 1951/2011). De maneira

muito sucinta, um meio pesado pode ser mais difícil de ser transportado, mas é

mais durável e permite que o conhecimento se consolide no tempo,

diferentemente de um meio leve, que apesar da pouca durabilidade, é mais prático

de ser deslocado, de modo a difundir determinado conhecimento por grandes

extensões territoriais (espaço).

Contudo, é importante compreender que a abordagem innisiana não é

taxativa e seus conceitos não são mutuamente excludentes. Innis não prevê

anulação do tempo ou do espaço, governos religiosos ou militares, meios pesados

ou leves, mas apenas busca observar a tendência ou a ênfase de aspectos da

realidade acentuados pelos meios de comunicação de determinados períodos.

Como já frisamos alguns capítulos atrás, os processos históricos não se dão de

maneira estanque e para nosso propósito basta que entendamos que um meio de

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comunicação não deve ser visto de modo meramente utilitarista. Cada meio é

significativo nos termos da mudança que ajuda a promover na sociedade.

4.3. O efeito bilateral das tecnologias

O processo de nossa adaptação mental e social às novas tecnologias intelectuais se

reflete nas metáforas que usamos para descrever e explicar o funcionamento da

natureza e é forçado por elas. Uma vez que os mapas se tornaram comuns, as

pessoas começaram a representar todos os tipos de relações naturais e sociais como

cartográficas, como um conjunto de arranjos delimitados, fixos, no espaço real ou

figurativo. Começamos a ‘mapear’ nossas vidas, nossas esferas sociais e mesmo

nossas ideias. Sob o balanço do relógio mecânico, as pessoas começaram a pensar

nos seus cérebros e nos seus corpos – no universo todo, de fato – como operando

‘do modo de um relógio. (CARR, 2011, p. 77).

Gostaríamos de observar que não somente as novas tecnologias, mas

também as tecnologias desenvolvidas ao final do século XIX, a despeito de suas

diferenças marcantes, dependem quase que em sua maioria de alguma forma de

energia elétrica para o seu funcionamento. De nada adianta um iPad

“ultramoderno” se não tenho um dispositivo de tomada para carregá-lo. Posso

prescindir do software x ou y para fazer meu computador funcionar, mas de

maneira alguma consigo tal feito sem uma fonte de eletricidade106. Neste sentido,

podemos começar a intuir o papel capital que a descoberta e a subsequente

produção desse tipo de energia tiveram (e ainda têm) no desenvolvimento das

tecnologias desde o final do século XIX. Não só não haveria foguete, como não

haveria telefone.

O caso do telégrafo é especialmente interessante, pois é o modelo

tecnológico desenvolvido a partir das, à época, primeiras pesquisas com a energia

elétrica. E mais: é a tecnologia que serviu de modelo (ou de “conteúdo”, segundo

McLuhan) para o desenvolvimento de tecnologias futuras, como o telefone e a

Internet. “O efeito do telégrafo na vida moderna e seu papel como modelo para

futuros desenvolvimentos nas comunicações foram muito pouco explorados”,

ressalta James Carey (1992, p. 201, tradução nossa) em Communication as culture

(1989). Pegando carona na malha ferroviária norte-americana, a Western Union,

“primeiro grande monopólio industrial” (Idem, tradução nossa), a tecnologia

106 A título de curiosidade, vale reproduzir uma frase contemporânea que diz: “meu celular passa

tanto tempo na tomada que as vezes penso que tenho um telefone fixo”.

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proporcionada pelo telégrafo estabeleceu não só as técnicas modernas de

gerenciamento, mas foi a fundadora da indústria de bens elétricos; “a primeira das

indústrias de base científica aplicada” (Ibid., p. 202, tradução nossa).

Porém, dois outros impactos promovidos pela tecnologia do telégrafo são de

particular interesse para nós. De maneira imbricada, o telégrafo trouxe também

mudanças à linguagem, ao conhecimento e à consciência, tornando-se, por isso,

um marco na história da comunicação. Resumidamente, ao possibilitar que

determinado produtor negociasse sua produção a quilômetros de distância, antes

mesmo do plantio (ou confecção), da colheita ou do deslocamento do produto em

si, o telégrafo “permitiu pela primeira vez a efetiva separação da comunicação do

transporte” (Ibid., p. 203, tradução nossa).

Antes do telégrafo, “comunicação” era usado para descrever o transporte assim

como a transmissão de mensagens pela simples razão de que o movimento das

mensagens era dependente de serem carregadas a pé, a cavalo ou por trilhos. O

telégrafo, acabando com essa identidade, permitiu que os símbolos se movessem

independentemente de e mais rápido do que o transporte [...] o telégrafo libertou a

comunicação das restrições geográficas [...] assim também alterou as formas

fundamentais pelas quais a comunicação era pensada [...] abriram-se novos

caminhos para pensar a comunicação tanto dentro da prática formal da teoria

quanto na consciência prática do dia-a-dia (CAREY, 1992, p. 204, tradução nossa).

Buscando uma meticulosa análise das consequências do telégrafo, Carey

identifica três relações principais entre este e sua ideologia. São elas: a) a

afinidade entre a tecnologia do telégrafo e o monopólio capitalista; b) o

imaginário popular (basicamente de cunho religioso); e c) a “pedagogia” que

estrutura pensamento, atitudes, consciência prática e senso comum. Para o autor,

este último ponto seria o que mais necessitaria ser aprofundado. A ideologia

presente nas tecnologias (nos meios) “têm o poder de impor seus pressupostos e

sua própria adoção aos incautos” (McLuhan, 2007, p. 30), criam padrões sociais e

comportamentais de organização, também segundo o modo como se apresentam

materialmente.

Apesar de lançar mão de argumentos que soam instrumentalistas107, isto é,

que tendem a apontar para uma suposta neutralidade das tecnologias, Carey

reconhece as implicações da tecnologia do telégrafo junto à sociedade. Do mesmo

107 “Tecnologia é tecnologia; é um meio de comunicar e transportar sobre o espaço, e nada mais”

(CAREY, 1992, p. 140, tradução e grifos nossos).

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modo, observando os impactos da tecnologia do computador, Postman afirma que

este “redefine os humanos como ‘processadores de informação’ e a própria

natureza como informação a ser processada” (Postman, 1994, p. 117). Para o autor

de Tecnopólio, “a mensagem metafórica fundamental do computador é que nós

somos máquinas” (Ibid., p. 118). A metáfora extrapola seus limites quando

rapidamente saltamos de uma comparação (somos como máquinas) para uma

constatação (somos máquinas), num processo exagerado de indução.

Tal operação pode ser constatada quando observamos as alterações nas

expressões e nas linguagens utilizadas para falar tanto do “corpo-máquina” quanto

da “máquina-corpo”: é necessário se “programar” para fazer as coisas; o cérebro

se tornou um “hardware”, que “armazena” e “recupera dados”; os atletas

olímpicos são “máquinas” esportivas; os computadores são passíveis de adquirir

diferentes tipos de “vírus”, podendo ser “infectadas”, e por isso devem colocar

seus arquivos em “quarentena”. Postman acredita que essa alteração na linguagem

é reflexo de uma substancial mudança na percepção da relação entre humanos e

computadores, o que acaba por acarretar um efeito de transferência de

responsabilidade.

Embora seja uma forma curiosa de alquimia gramatical, a frase “nós usamos o

computador para calcular” passa a significar “o computador calcula”. Se um

computador calcula, então pode decidir fazer cálculos errados ou não calcular coisa

nenhuma. É isso que os caixas de banco querem dizer quando respondem que não

podem saber quanto dinheiro há em sua conta corrente porque “os computadores

estão fora do ar”. A dedução, claro, é que ninguém do banco é responsável. Os

computadores cometem erros, ficam cansados e adoecem. (POSTMAN, 1994, p.

120).

Diferentemente de um computador, a mente humana opera no plano dos

significados – da identificação de signos e da busca de sentido. Enquanto o

computador executa funções de base lógico-matemática, conectando e

desconectando símbolos de maneira calculada e objetiva, a “vida mental do ser

humano é única, com raízes biológicas e outras mais complexas, que podem ser

simuladas, mas não copiadas” (Ibid., p. 118). Vivemos em uma realidade de

interseções que mistura o subjetivo e o objetivo, o consciente e o inconsciente, o

racional e o emocional, o frio e o quente, a dúvida e a certeza, o cálculo e a

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meditação. Quando uma máquina “pergunta algo”108, ela não se questiona sobre o

significado da pergunta, suas implicações na vida do outro – em verdade, não

parece haver alteridade nessa relação, mas tão somente um ponto na extremidade

do circuito ao qual se destina a mensagem. O computador, que “opera” de modo

“cirúrgico”, visa à “assepsia” de suas “intervenções”.

Segundo Postman (1994), interessa ao tecnopólio que pensemos estar plenos

quando agimos como máquinas, confiando nestas para agirem em nosso nome. A

crença no poder da técnica e a fé na calculabilidade maquínica acarretam, na

opinião do autor, uma desvalorização na capacidade humana de compreensão do

mundo. A ausência de uma perspectiva mais geral é danosa e dificulta que

percebamos o ônus de assimilação de determinada tecnologia. Nessa perspectiva,

nas palavras da comunicóloga Adriana Braga (2006, p. 34), “é impossível

minimizar os danos de uma tecnologia a partir do controle de seus usos e

conteúdos. Uma vez implementada, a tecnologia atua sem que tenhamos plena

consciência do processo: introduz ideologia própria, muda significados”.

Assim, dimensões psíquicas, emocionais e morais tornam-se insignificantes

diante da ênfase dada aos processos técnicos. Promovendo a matematização do

mundo, a grandeza do computador estaria em simular funções humanas, bem

como em possibilitar velocidade na transmissão de dados e expandir o volume

destes – um alargamento e um enriquecimento da tradição das tecnologias da

escrita (Postman, 1994). Desse modo, o uso irrestrito das tecnologias do

computador “pode ser diversivo e perigoso quando aplicado de forma

indiscriminada nos assuntos humanos” (Postman, 1994, p. 125).

4.4. Tecnopedagogias: impactos do uso excessivo dos smartphones

A velocidade com a qual as informações circulam, no contexto do telégrafo

ou na rede mundial de computadores, é a grande operação da tecnologia nas

sociedades industrializadas/pós-industrializadas. O imperialismo, a globalização,

a financeirização da comunicação são faces de um mesmo processo iniciado com

108 Até bem pouco tempo atrás, o Facebook, assim que acessado, apresentava a pergunta “Como

você está se sentindo?”, de modo a estimular que seus usuários escrevessem sobre suas vidas. Hoje

a pergunta tem o mesmo objetivo, mas se tornou uma sentença em tom imperativo: “Escreva aqui

o que você está pensando”.

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a “revolução” tecnológica do telégrafo, um desenvolvimento que hoje culmina no

fenômeno que Sodré chama de “teledistribuição mundial de pessoas e coisas”

(Sodré, 2012, p. 12). Assim como a colheita de tomates, negociada antes mesmo

de colocada as sementes no solo, o beijo virtual que envio hoje, através de minha

rede social digital vinculada ao meu celular, pode chegar só amanhã, depois de

amanhã, ou talvez nunca chegue – caso o destinatário não tome conhecimento da

mensagem.

Um aparelho de smartphone, mistura de tradicionais formas discursivas que

culminam em um híbrido tecnológico que é uma pequena plataforma de

entretenimento de bolso, segue uma lógica semelhante. Ainda que encontremos

críticas ao modelo que pensa “as novas tecnologias da informação e da

comunicação de maneira linear” (Winkin, 1998, p. 201), temos de atentar para o

fato de que tais críticas se destinam à comparação entre a comunicação via e-mail

(online) e o telégrafo. O plano é o da transmissão da informação e não o da

materialidade do meio e de sua ideologia inerente, do que aqui tratamos. “Em

termos da mudança que a máquina introduziu em nossas relações com outros e

conosco mesmos, pouco importava que ela produzisse flocos de milho ou

Cadilacs”, alertou Mcluhan (2007, p. 21).

O celular do início do século XXI, diferentemente de seus primeiros

modelos, que além de corpulentos eram apenas protótipos sem fio dos tradicionais

telefones fixos, são “inteligentes”. Ao manusear um smartphone, imersos em

qualquer uma das suas múltiplas funções, muitas vezes não nos damos conta de

que estamos também diante de um telefone. E não só diante disso, mas de uma

calculadora, de uma agenda, de uma central com acesso remoto à Internet, de um

computador de mão que nos solicita e que nos condiciona a apertar virtualmente

seus botões para acessar este ou aquele conteúdo. A navegação é fluida, passamos

tranquilamente de uma função a outra. Não percebemos, na maioria dos casos, a

que tipo de ideologia e a que modelo de pedagogia estamos sendo submetidos.

Walter Benjamin (2012, p. 184) disse que “fazer as coisas ‘ficarem mais

próximas’ é uma preocupação tão apaixonada das massas modernas como sua

tendência a superar o caráter único de todos os fatos através da sua

reprodutibilidade”. O ano era 1936 e o filósofo falava sobre a reprodutibilidade da

obra de arte: xilogravura, litografia, fotografia e cinema. Falava diretamente de

autenticidade, aura, valor de culto e exposição, mas falava indiretamente das

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tecnologias que impactavam as massas, assim como os indivíduos que as

compunham, com suas respectivas ideologias. O resultado, as preocupações

apaixonadas das massas modernas, era fruto de um processo pedagógico

promovido pelas tecnologias da então incipiente indústria cultural.

Ainda hoje as massas sentem prazer em deixar as coisas o mais próximo

possível, ainda que virtualmente. De certo modo o caráter protético dos

smartphones, principalmente quando vinculados às redes sociais, ratifica isso. Não

basta ter amigos, é preciso que eles estejam conosco, conectados 24 horas por dia,

sete dias por semana. É necessário que estejam ao alcance de um toque, assim

como nossos arquivos de trabalho, nossas opiniões e nossas confidências. É

fundamental que a forma de nossas relações, nossa performance de usuários seja

de alguma maneira reproduzível, até porque, desse modo, somos quantificáveis,

nos tornamos números, estatísticas109.

Todavia, novamente, o ponto importante a retermos aqui, para além de

qualquer juízo de valor, é que se torna imperativo refletirmos sobre o impacto do

uso de smartphones de modo indiscriminado em praticamente todas as esferas de

nossas vidas. Aceitamos passivamente que se trate apenas de mais uma tecnologia

neutra, o que já seria um contrassenso, e o que importa é a finalidade de seu uso.

Como já indicado, essa era a preocupação de Postman com relação ao tecnopólio,

ao modo como as novas tecnologias alteram as estruturas de nossos interesses, o

caráter de nossos símbolos e a natureza de nossas comunidades. Era essa a sua

preocupação em relação aos computadores, que nada mais são do que a matriz

lógico-operacional de nossos smartphones.

A imodéstia tecnológica é sempre um perigo agudo do tecnopólio, que a encoraja.

O tecnopólio também encoraja a insensibilidade às habilidades que se podem

perder com a aquisição de outras. É importante lembrar o que pode ser feito sem

computadores, e também é importante que nos lembremos do que se pode perder

quando os usamos (POSTMAN, 1994, p. 126).

A professora Larissa Barber, do departamento de psicologia da Northern

Illinois University, publicou em novembro de 2014, no Journal of Occupational

Health Psychology, uma pesquisa sobre o que ela chama de workplace

109 Queremos dizer com isso que geramos dados em larga escala, que podem e são usados pelos

mercados, ao traçar os perfis de seus consumidores, por exemplo.

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telepressure 110. Em livre tradução, a “telepressão do local de trabalho” nada mais

é do que a preocupação e a urgência com que funcionários de diversas áreas têm

em responder e-mails, mensagens de texto e e-mails de voz de clientes, colegas e

supervisores. O comportamento, indica a pesquisa, interfere no tempo de

recuperação pós-trabalho, está relacionado ao estresse e à falta de foco nas

atividades, o que afeta diretamente a qualidade do serviço e a produtividade das

empresas.

Outra pesquisa, desenvolvida em 2012 pela GFI Softwares111, mostrou que

81% dos empregados norte-americanos checam seus e-mails de trabalho... fora do

local de trabalho. Do total de entrevistados, 32% respondem suas mensagens em

menos de 15 minutos e 53% afirmam que, ao enviar um e-mail, esperam uma

resposta em até 60 minutos112. Se tivermos em mente que as vendas de

smartphones vêm continuamente superando as vendas de computadores pessoais

(ou PCs), ao menos desde 2011113, podemos deduzir que parcela significativa das

pessoas que sofrem com o workplace telepressure cada vez mais é exposta à

tecnologia desses aparelhos – um ciclo interminável em que o cão corre atrás do

próprio rabo.

Vale ainda mencionar um vídeo produzido pelo Google, publicado no

YouTube em abril de 2011114, que apresenta algumas curiosidades sobre a relação

que homens e mulheres vêm mantendo com seus smartphones: 39% usam o

aparelho mesmo no banheiro, 33% enquanto assistem TV e 22% enquanto leem

jornal. A metáfora de um meio como extensão do homem (ou seria o contrário?)

não poderia fazer mais sentido. Porém, como podemos perceber, essa relação gera

uma série de impactos na vida humana, comprometendo até mesmo a saúde de

110 Dados de novembro de 2014, em

http://psycnet.apa.org/index.cfm?fa=buy.optionToBuy&id=2014-45450-001, acesso em

18/05/2014. 111 Dados de 2012, em http://www.gfi.com/documents/Research_Brief_UK_US.PDF, acesso em

03/06/2014. 112 Dados de maio de 2013, em http://www.gfi.com/blog/survey-81-of-u-s-employees-check-their-

work-mail-outside-work-hours/, acesso em 03/06/2014. 113 Dados de fevereiro de 2012, em http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,vendas-de-

smartphones-tem-forte-alta-e-ja-superam-as-de-pcs-no-mundo,102001e, acesso em 20/08/2013. 114 Dados de abril de 2011, em https://www.youtube.com/watch?v=CjUcq_E4I-s, acesso em

22/09/2013.

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seus usuários115. E se uma prótese denuncia a ausência de algo, o que denunciaria

o uso protético desse tipo de acessório?

A pedagogia embutida nos smartphones também pode se revelar de modo

assustador quando conferimos o número de pessoas mortas em decorrência do

hábito de fazer selfies. Não tem sido nada incomum em nosso tempo deparamo-

nos com reportagens que apresentam jovens que, ao se posicionarem em frentes às

próprias câmeras de seus celulares, distraíram-se na direção do carro, no alto da

montanha, próximo a uma via de tráfego intenso, e envolveram-se em acidentes

fatais. Segundo matéria do blog Experiências Digitais da Revista Época116, o

número de mortos nesse tipo de ocorrências já supera o de ataques de tubarão. Em

todo o mundo, ao longo do ano de 2012, foram oito mortes ocasionadas por

ataques de tubarão, número inferior aos doze falecimentos em decorrência das

selfies.

4.4.1. Considerações

O ambiente das sociedades industrializadas/pós-industrializadas no início do

século XXI é um campo privilegiado para os estudiosos da ecologia das mídias.

Dentre os vários elementos que compõem esse habitat, um deles se destaca pelos

seguintes motivos: a) por ser um tipo de tecnologia afinada com o que há de mais

atual nas tecnologias do computador; b) por ser um aparelho para onde também

convergem tecnologias mais antigas, como a TV e o telefone; c) por ser um

dispositivo móvel e portátil que pode ser incluído nas principais tarefas e

atividades do dia-a-dia; d) por ser um equipamento de uso bastante difundido em

todos os estratos das camadas sociais e por ser um meio que impõe sua pedagogia

e ideologia específicas sem levantar muitas suspeitas ou sem encontrar muita

resistência.

O exercício de reflexão acerca do modo como as tecnologias podem nos

afetar negativamente, em geral, fica eclipsado pelos discursos publicitários e

115 Dados de novembro de 2014, em

http://tvcultura.cmais.com.br/jcprimeiraedicao/reportagens/uso-de-celular-com-postura-errada-

pode-provocar-problemas-na-coluna-28-11-2014, acesso em 28/11/2014. 116 Dados de setembro de 2015, em http://epoca.globo.com/vida/experiencias-

digitais/noticia/2015/09/selfies-ja-matam-mais-humanos-do-que-ataques-de-tubaroes.html, acesso

em 24/09/2015.

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mercadológicos, que exaltam a criação e conferem visibilidade exclusivamente a

seus aspectos “inovadores”, seus impactos positivos. A tarefa é hercúlea, mas nem

por isso menos importante ou legítima. Então, o que pode ser perdido quando

usamos em demasia os smartphones? Oportunidades de interação face-a-face com

outras pessoas? Certamente. Capacidade para recorrermos a outros meios como

fonte de informação? Provável. Um pouco de nossa saúde mental e física?

Possivelmente. Descontruir o mito que celebra exultante uma nova era de

benesses proporcionadas por uma revolução tecnológica na comunicação talvez

fosse um primeiro passo.

Entretanto, é necessário lembrar que os adventos das tecnologias do

computador, e dos dispositivos eletroeletrônicos em geral, inegavelmente

trouxeram uma série de mudanças de aspecto positivo para as sociedades que as

conceberam. Não somente os campos da computação, ou comunicação acessam, e

fazem uso constante desse conhecimento, mas igualmente a medicina, a

engenharia, a economia, a biologia, entre muitas outras disciplinas das ciências

exatas, humanas e sociais. Se hoje encontramos praticidade em determinadas

tarefas do dia-a-dia, como consultar um especialista para tratar de um tipo

específico de enfermidade, fazer uma transferência bancária sem precisar ir ao

banco ou mesmo esclarecer com rapidez uma questão profissional urgente, não há

dúvidas que devemos isso a inventos de base tecnológica avançada.

Portanto, não se trata de demonizar essa tecnologia, mas de criar condições

e espaços de reflexão para que não sejamos surpreendidos pelas distorções por ela

eventualmente promovidas. Para que compreendamos que há sempre algo em

jogo quando se ouve falar em “revolução tecnológica”, quando uma nova mídia se

apresenta como solução para o isolamento, a apatia interacional – como vimos

acima, muitas vezes o resultado pode ser diametralmente oposto. Trata-se de

acordar do “sonambulismo de nossos dias” (McLuhan, 2007, p. 25) e sair de uma

postura ingênua, quiçá letárgica, diante dos poderes discursivos do tecnopólio.

Trata-se de encarar com seriedade um tema que nos chega com a roupagem do

espetacular, de modo a colocar em questão hábitos, costumes e valores adquiridos

há pouco mais de uma década. É também deslocarmo-nos para o cerne do

problema.

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Por fim, pegando carona no argumento de Carey117, ainda no início da

infância e não somente ao final de uma vida de trabalho, nossas crianças são

presenteadas com smartphones, tablets e aparelhos do gênero. Um ritual que serve

para que aprendam, desde muito cedo, uma lição muito contundente do “mundo

adulto”: a dificuldade de perceber e negociar com as ideologias das tecnologias

que hoje anulam virtualmente tempo e espaço. Em todo caso, assim como o bônus

do que foi outrora chamado de “revolução”, o ônus da peripécia tecnopedagógica

dos “computadores de mão”, ou smartphones, também já pode – e talvez deva –

começar a ser aferido.

4.5. Neuroplasticidade e as consequências biológicas do hábito

A máquina de escrever é uma tecnologia intelectual. E do mesmo modo o ábaco e a

régua de cálculo, o sextante e o globo, o livro e o jornal, a escola e a biblioteca, o

computador e a internet [...] são as tecnologias intelectuais que têm o maior e mais

duradouro poder sobre o que e como pensamos. São as ferramentas mais íntimas,

as que usamos para a autoexpressão, para moldar a nossa identidade pública e

pessoal e para cultivar relações com os outros [...] as tecnologias intelectuais,

quando se tornam de uso popular, muitas vezes promovem novos modos de pensar

e estendem à população geral modos estabelecidos de pensamento que estiveram

restritos a um pequeno grupo de elite. Toda tecnologia intelectual, colocando de

um outro modo, incorpora uma ética intelectual, um conjunto de suposições sobre

como a mente humana funciona ou deveria funcionar. (CARR, 2011, p. 70).

Vimos então que uma tecnologia não é neutra e que por isso seu uso

acarreta impactos bilaterais, isto é, que podem ser vistos como ônus e bônus

quando compreendidos em um quadro analítico mais amplo. Vimos que a

materialidade dos meios também deve ser entendida enquanto mensagem, pois

possui, no conjunto de suas características e propriedades, um viés ideológico e

pedagógico que tem relativa independência do conteúdo que veiculam. Sendo

assim, gostaríamos agora de acrescentar à nossa argumentação algumas

informações que julgamos convergente e complementar à abordagem ecológica

das mídias, que são provenientes dos estudos sobre a neuroplasticidade cerebral.

117 “A concepção moderna de tempo enraizou em nossa consciência de maneira tão profunda que a

cena do trabalhador que recebe um relógio em sua aposentadoria é grotesca e cômica. Ele recebe

um relógio quando sua necessidade de contar o tempo acabou. Ele recebe um relógio como um

tributo por ter aprendido a lição mais difícil do trabalhador - contar o tempo” (CAREY, 1992, p.

229, tradução nossa).

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De maneira resumida, o fenômeno pode ser entendido como a capacidade

que o cérebro tem de se adaptar a determinados estímulos, destinando partes de

sua estrutura para este ou aquele sentido. Trata-se da maleabilidade do cérebro em

criar sinapses, conexões neurais novas dependendo do estímulo externo a que são

submetidos (Carr, 2011). Exceto em caso de um dano físico em alguma parte do

cérebro, o que se observa é que a área destinada às conexões químicas de

determinada função, como o tato ou a audição, pode ser reaproveitada. A parte do

cérebro onde ocorriam as sinapses referentes à visão em uma pessoa que tenha

ficado cega não permanece inutilizada, mas é reaproveitada para uso das conexões

neuronais referentes ao aparelho auditivo, por exemplo (Carr, 2011).

O hábito tem consequências biológicas. A metáfora usada pelos

neurocientistas para ilustrar a maneira como os impulsos elétricos neuronais

ocorrem é a da água escavando por si mesma um canal numa rocha (Carr, 2011).

Com o tempo, o caminho tende a ficar mais fundo e evidente. A água sempre

tenderá a seguir por esse mesmo caminho. Do mesmo modo, as impressões dos

objetos externos modelam os caminhos mais apropriados no sistema nervoso e

estes são recorridos mesmo se tiverem sido interrompidos por algum tempo (Carr,

2011). A mudança de hábitos então gera novas possibilidades de caminhos para as

conexões. O próprio vício pode ser explicado através dos estímulos que a

dopamina promove no cérebro – um caminho, por assim dizer, “viciado”.

Toda vez que realizamos uma tarefa ou experimentamos uma sensação física ou

mental, um conjunto de neurônios do nosso cérebro é ativado. Se estão próximos

entre si, esses neurônios conectam-se através da troca de neurotransmissores

sinápticos, como o aminoácido glutamato. Quando a mesma experiência se repete,

os enlaces sinápticos entre os neurônios se fortalecem e tornam-se mais numerosos,

tanto através de mudanças fisiológicas, tais como a liberação de concentrações

mais altas de neurotransmissores, como anatômicas, como a geração de novos

neurônios ou crescimento de novos terminais sinápticos nos axônios e dendritos

existentes. Enlaces sinápticos podem também se enfraquecer em resposta a

experiências, de novo como resultado de alterações fisiológicas e anatômicas.

(CARR, 2011, p. 46).

A neuroplasticidade não deve ser confundida com elasticidade. Por isso os

enlaces neurais de nosso cérebro não retornam ao estado anterior imediatamente

após a mudança de um hábito. Eles tendem a permanecer no estado alterado e

somente o exercício e a persistência dos novos estímulos é que podem provocar

aos poucos a mudança. O escritor norte-americano Nicholas Carr, um dos

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vencedores do The Media Ecology Association Awards 2015, na categoria The

Neil Postman Award for Career Achievement in Public Intellectual Activity118,

afirma que “maus hábitos ficam arraigados em nossos neurônios tão facilmente

quanto os bons hábitos” (2011, p. 57).

Para o autor, as tecnologias poderiam ser dividias em quatro grandes grupos,

a saber: a) de extensão de força física, destreza e resiliência: arado, agulha, avião;

b) de extensão da faixa de sensibilidade dos sentidos: microscópio, amplificador;

c) de remodelamento da natureza para necessidades e desejos: reservatório, pílula

anticoncepcional, soja geneticamente modificada; d) intelectuais de extensão e

suporte aos poderes mentais: mapa, relógio, escrita, computador, prensa (Carr,

2011). Para o autor, que assim como nós dedica especial atenção ao último grupo,

os meios não somente armazenam e/ou transmitem informações, mas também

modos particulares de ver e pensar (“ética intelectual”, “pedagogia da tecnologia”,

“bias dos meios” etc.).

A ética intelectual de uma tecnologia raramente é reconhecida pelos seus

inventores. Em geral estão envolvidos na resolução de um problema particular, ou

desfazendo algum espinhoso dilema científico ou de engenharia, que não veem as

implicações mais amplas do seu trabalho. Também os usuários da tecnologia

costumeiramente não estão cônscios da sua ética. Eles, ademais, estão preocupados

com os benefícios práticos que obtêm com o emprego da ferramenta. (CARR,

2011, p. 71).

De acordo com Carr, apesar de deterministas e instrumentalistas recorrerem

a fortes argumentos nas defesas de suas ideias, uma visão histórica mais ampla

tende a conferir mais credibilidade aos primeiros. “Seria excesso de credulidade

argumentar que ‘escolhemos’ usar mapas e relógios (como se pudéssemos ter

escolhido não usá-los)” (Ibid., p. 72), argumenta. Seria desconsiderar os efeitos e

as influências político-econômicas, os “monopólios do poder”, que apesar de

parecem seguir uma lógica própria, ajudam a promover um cenário onde oscilam

os ideais de uso teóricos e práticos para esta ou aquela tecnologia.

Dessa forma, as descobertas da neuroplasticidade corrobora a ideia de que

as tecnologias ajudam a moldar o “padrão” de funcionamento, e mesmo a

estrutura física, de nossos cérebros. O hábito do uso de determinadas tecnologias

“fortaleceu alguns circuitos neurais e enfraqueceu outros, reforçou certos traços

118 Em http://www.media-ecology.org/awards/2015_awards.html, acesso em 05/01/2016.

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mentais enquanto deixou esmaecer outros” (Ibid., p. 75), conclui Carr, que assim

como Innis, McLuhan, Postman e Braga, parece ser adepto da modéstia

tecnológica.

4.6. O Facebook enquanto dispositivo

Integrados a redes sociais como o Facebook, os smartphones potencializam

não somente o que Deleuze (1990/2010) chamava de formas ultrarrápidas de

controle ao ar livre, mas também o indivíduo enquanto eixo tecnointerativo

dessas redes, enquanto agente ativo de construção de discursos. Por suas

características multifuncionais, entendemos que se trata de um dispositivo e nos

parágrafos seguintes pretendemos explicar por quê.

Levantamentos recentes119 mostram que somente o Brasil contabiliza 114

milhões de acessos à banda larga, sendo 93,2 milhões provenientes de conexões

móveis e os demais de acessos fixos – no mundo todo, usuários ativos do

Facebook já somam mais de um bilhão120. Dados como esses se mostram

relevantes por deixar explícita a relação de intimidade que vem se estabelecendo

entre as pessoas e esses dispositivos de comunicação. Ainda que o efeito dessas

tecnologias não seja diretamente percebido por comunidades aqui ou acolá,

podemos partir da premissa de que o surgimento de quaisquer inovações

tecnológicas “interpela o mundo até mesmo daqueles que não se servem

diretamente dessa tecnologia” (Machado, 2010, p. 22), especialmente no contexto

da globalização.

Nesse sentido, não seria exagero algum reconhecer que o Facebook, como

grande parte das produções encontradas na Internet, segue uma lógica econômica,

isto é, que enquanto produto está adequado à lógica de mercado. Logo, é

destinado ao consumo, sendo uma empresa com capital aberto, investidores,

operações financeiras que dependem diretamente dos humores das bolsas e de

seus consumidores – os usuários. Obviamente, como bem observou Morin em

Cultura de massas no século XX (1962), boa parte do sucesso desse mercado,

119 Dados de setembro de 2013, em http://computerworld.uol.com.br/telecom/2013/09/30/brasil-

fecha-agosto-com-114-milhoes-de-acesso-banda-larga/, acesso em 29/01/2014. 120 Dados de abril de 2014, em http://gizmodo.uol.com.br/facebook-1q2014/, acesso em

13/08/2014.

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como de qualquer outro, se deve à aptidão de alcançar o lucro, à voracidade de

seus métodos e às condições inerentes ao sistema capitalista.

Especificamente no caso do Facebook, os usuários (indivíduos-

consumidores) são inseridos em um conjunto articulado e integrado de relações

bem planejadas, ou seja, ao consumirem seu produto, navegar e interagir nas redes

o fazem segundo regras de fluxo. São regras de um jogo que tem códigos próprios

como pano de fundo, amarras digitais binárias, interfaces virtualizantes e

premissas da indústria espetacular do entretenimento. De outro modo, podemos

dizer que os usuários são inevitavelmente impelidos a responder nos termos de

funcionamento dessas ferramentas, isto é, segundo a lógica de programação (e de

mercado) sobre a qual estas foram erigidas.

Enquanto redes sociais na Internet, essas ferramentas funcionam como

dispositivos exemplares, em que podemos observar a crescente tecnologização da

cultura (Felinto, 2005). Ao ampliar as experiências da realidade tradicional, o

Facebook torna-se lugar para onde convergem as mais variadas práticas humanas

e toda sua complexa e vasta gama de operações comunicacionais.

Relacionamentos, afetividades, discussões políticas e outras inúmeras atividades

que caracterizam o humano, tais como experiências de fruição artística, ganham

novas dimensões, alimentando nesse processo o princípio dessas ferramentas, e

fornecendo o substrato, os registros e os dados interacionais tão valiosos para seu

funcionamento.

Por essas razões o Facebook poderia ser definido como um mecanismo, ou

melhor, um dispositivo, se não de controle, ao menos de comunicação. A Internet,

os smartphones, a televisão, as câmeras de monitoramento são alguns exemplos

de dispositivos contemporâneos. Utilizaremos aqui a concepção agambeana,

moldada na esteira da filosofia de Michel Foucault, para definir um dispositivo,

isto é, enquanto produto dos cruzamentos de relações de poder e saber, segundo

um conjunto heterogêneo de elementos linguísticos e não linguísticos, que pode

adotar uma função estratégica concreta numa relação de poder específica:

[...] chamarei literalmente de dispositivo qualquer coisa que tenha de algum modo

a capacidade de capturar, orientar, determinar, interceptar, modelar, controlar e

assegurar os gestos, as condutas, as opiniões e os discursos dos seres viventes [...]

um mesmo indivíduo, uma mesma substância, pode ser o lugar dos múltiplos

processos de subjetivação: o usuário de telefones celulares, o navegador na

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internet, o escritor de contos, o apaixonado por tango, o não-global etc.

(AGAMBEN, 2009, p. 40).

A definição é abrangente, mas nem por isso menos interessante ou adequada

já que o mecanismo ao qual se aplica possui também abrangência sobre diversos

aspectos da vida humana. A abordagem dessa concepção também pode ser

profícua por direcionar nossa percepção para a compreensão da relação, isto é, da

proximidade teórica e prática existente entre as tecnologias e os dispositivos.

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