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INFLUÊNCIAS DA CULTURA ORGANIZACIONAL NA ESTRATÉGIA: UM DEBATE TEÓRICO-EMPÍRICO Autoria: Mônica Külkamp Beppler, Maurício Fernandes Pereira RESUMO O presente artigo tem como objetivo realizar um debate sobre as influências da cultura organizacional na estratégia, no sentido de analisar quão importante é o desenvolvimento de um modelo cultural consonante ao tipo de estratégia adotada pelas organizações. Para tanto, realiza-se um debate teórico-empírico em que, no momento teórico, utilizam-se as principais referências sobre os temas de estratégia e cultura organizacional, promovendo uma exposição da opinião de diferentes autores sobre os assuntos. São apresentados os principais conceitos de estratégia e suas diferentes abordagens de acordo com a visão de Whittington (2002) e Mintzberg, Ahlstrand e Lampel (2000). Para o tema de cultura organizacional, é feita uma exposição conceitual sintética e são abordadas tipologias de cultura que podem ser encontradas nas organizações, de acordo com autores como Goffee e Jones (1998) e Schneider (1996). No que tange ao debate empírico, são utilizadas três organizações empresariais consideradas casos de sucesso no que tange à estratégia e à maneira como lidam com a cultura organizacional: Southwest Airlines, Nissan e General Eletric, as quais têm sua análise fundamentada principalmente pelas obras de Freiberg e Freiberg (2000), Magee (2003) e Welch (2001). Caracterizou-se esse debate como teórico-empírico, pois foram levantadas as principais referências sobre os temas e foram escolhidas três organizações para serem analisadas à luz das teorias científicas. É um estudo descritivo, com abordagem predominantemente qualitativa e utilização de dados secundários por meio de pesquisa bibliográfica. Verificou-se, nas empresas analisadas, que a cultura organizacional exerce influência significativa na consecução da estratégia e percebeu-se que a preocupação em conhecer o modelo de cultura antes de implementar a estratégia é fundamental para garantir adesão e comprometimento de todos os envolvidos. Foi possível observar, nos casos pesquisados, que à medida que uma organização realiza o mapeamento de seu modelo cultural, encontra subsídios que corroboram a implementação eficaz da estratégia vigente ou de uma nova, tendo em vista que passa a obter informações sobre como motivar e envolver todos em busca de uma visão compartilhada. Com este artigo, pode-se perceber que, por meio do mapeamento da cultura organizacional, a organização consegue facilitar o processo de sensibilização das pessoas para mudanças incrementais que possam acontecer e, dessa forma, a estratégia encontra meios de tornar-se compartilhada por todos e, complementarmente, as pessoas tendem a internalizá-la e concatená-la aos seus objetivos pessoais, propiciando um ambiente comprometido e alinhado.

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INFLUÊNCIAS DA CULTURA ORGANIZACIONAL NA ESTRATÉGIA: UM DEBATE TEÓRICO-EMPÍRICO

Autoria: Mônica Külkamp Beppler, Maurício Fernandes Pereira

RESUMO O presente artigo tem como objetivo realizar um debate sobre as influências da cultura organizacional na estratégia, no sentido de analisar quão importante é o desenvolvimento de um modelo cultural consonante ao tipo de estratégia adotada pelas organizações. Para tanto, realiza-se um debate teórico-empírico em que, no momento teórico, utilizam-se as principais referências sobre os temas de estratégia e cultura organizacional, promovendo uma exposição da opinião de diferentes autores sobre os assuntos. São apresentados os principais conceitos de estratégia e suas diferentes abordagens de acordo com a visão de Whittington (2002) e Mintzberg, Ahlstrand e Lampel (2000). Para o tema de cultura organizacional, é feita uma exposição conceitual sintética e são abordadas tipologias de cultura que podem ser encontradas nas organizações, de acordo com autores como Goffee e Jones (1998) e Schneider (1996). No que tange ao debate empírico, são utilizadas três organizações empresariais consideradas casos de sucesso no que tange à estratégia e à maneira como lidam com a cultura organizacional: Southwest Airlines, Nissan e General Eletric, as quais têm sua análise fundamentada principalmente pelas obras de Freiberg e Freiberg (2000), Magee (2003) e Welch (2001). Caracterizou-se esse debate como teórico-empírico, pois foram levantadas as principais referências sobre os temas e foram escolhidas três organizações para serem analisadas à luz das teorias científicas. É um estudo descritivo, com abordagem predominantemente qualitativa e utilização de dados secundários por meio de pesquisa bibliográfica. Verificou-se, nas empresas analisadas, que a cultura organizacional exerce influência significativa na consecução da estratégia e percebeu-se que a preocupação em conhecer o modelo de cultura antes de implementar a estratégia é fundamental para garantir adesão e comprometimento de todos os envolvidos. Foi possível observar, nos casos pesquisados, que à medida que uma organização realiza o mapeamento de seu modelo cultural, encontra subsídios que corroboram a implementação eficaz da estratégia vigente ou de uma nova, tendo em vista que passa a obter informações sobre como motivar e envolver todos em busca de uma visão compartilhada. Com este artigo, pode-se perceber que, por meio do mapeamento da cultura organizacional, a organização consegue facilitar o processo de sensibilização das pessoas para mudanças incrementais que possam acontecer e, dessa forma, a estratégia encontra meios de tornar-se compartilhada por todos e, complementarmente, as pessoas tendem a internalizá-la e concatená-la aos seus objetivos pessoais, propiciando um ambiente comprometido e alinhado.

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1 INTRODUÇÃO A ciência da Administração tem passado por uma evolução substancial de conteúdo, tanto na variedade como na complexidade, decorrente principalmente das alterações por que a sociedade passa. Hoje, o estudo de tempos e movimentos ou a compreensão dos conceitos de eficácia e eficiência operacional não são suficientes para que as organizações consigam ocupar um espaço competitivo no mercado, clientes satisfeitos e, teoricamente, lucratividade. Os fatores influentes em uma empresa, tanto internos como externos, apresentam um grau de dinamismo elevado, fazendo com que se aumente a necessidade dos gestores aprofundarem seus conhecimentos sobre o ambiente e busquem a melhor maneira de lidar com essas inúmeras variáveis. Com vistas a compreender o comportamento da organização como parte de um meio social e, ao mesmo tempo, garantir que ela cumpra seu propósito, insere-se a importância do estudo sobre estratégia. Seu conceito sob uma ótica mais racional, adaptado do modelo militar para o ambiente organizacional, prevê a determinação de metas e de objetivos básicos de longo prazo de uma empresa, e a adoção de cursos de ação e a alocação dos recursos necessários para alcançar essas metas (CHANDLER, 1990). À medida que a estratégia é um fator fundamental ao desempenho coerente das organizações, e que estas dependem de pessoas para conseguirem funcionar, outro campo de estudos administrativos torna-se peça fundamental para compreender a dinâmica da estratégia nas organizações – a cultura organizacional. Define-se cultura organizacional como um elemento que proporciona aos membros da organização um sentimento de identidade, que gera comprometimento a crenças e valores maiores do que os individuais (DAFT, 2002), fomentando, consequentemente, a consonância entre propósitos pessoais e organizacionais. Mintzberg e Quinn (2001) defendem a ideia de ter colaboradores em todos os níveis da organização envolvidos na prática da estratégia. Todavia, para conseguir um grau de participação adequado dessas pessoas, é necessário conhecer a cultura predominante, pois por meio de seu mapeamento torna-se possível encontrar a melhor maneira de fazer com que todas as pessoas percebam sua importância para o alcance da estratégia organizacional. O propósito deste artigo, dessa forma, consiste no aprofundamento da compreensão das influências que a cultura organizacional apresenta sobre a estratégia. Após essa breve contextualização dos temas de estudo, o objetivo geral do presente artigo constitui-se na realização de um debate teórico-empírico sobre as influências da cultura organizacional na estratégia. 2 ESTRATÉGIA A administração estratégica conquistou espaço nos ambientes organizacionais como uma tentativa de adequação ao contexto turbulento por que a sociedade passa. A visão globalizada de sociedade e sua decorrente complexidade exigem das empresas uma constante busca por adaptação e, nesse sentido, o conceito de estratégia torna-se fundamental por considerar o estabelecimento de um objetivo, de um norte, para o qual se podem traçar diferentes caminhos sem comprometer a finalidade central da organização.

A administração estratégica assume o papel de empreender processos de planejamento, organização, liderança e controle como uma maneira de garantir que as ações coletivas e os planos estejam convergindo com a estratégia estabelecida. Sendo assim, estratégia pode ser definida como o caminho que a empresa percorre para competir com sucesso, estabelecendo uma vantagem competitiva (Barney, 2001). Chandler (1990) corrobora essa abordagem, conceituando estratégia como a definição de metas e objetivos de longo

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prazo de uma organização e a consequente adoção de ações e alocação de recursos necessários para atingir tais metas.

Porter (1986) compreende a estratégia sob um enfoque mais utilitarista e racional, considerando-a como um conjunto de ações ofensivas ou defensivas que têm o intuito de colocar a organização em uma posição de proteção para que possa enfrentar as forças competitivas de mercado e obter maior retorno sobre o investimento. O autor acredita que todas as empresas têm uma estratégia, esteja ela formalizada ou não, e que a diferença está no grau de importância que as pessoas atribuem à mesma. Além disso, discorre sobre a importância de uma estratégia adequadamente disseminada, a qual proporciona à organização um diferencial competitivo sustentável a longo prazo.

Ainda, segundo Picchiai (1998), a estratégia também pode ser entendida como um padrão consistente de escolhas. O autor, por meio de uma síntese dos conceitos existentes, comenta que ela está relacionada a padrões de decisão que posicionam a organização no mercado e têm o intuito de fazê-la atingir seus objetivos, de uma maneira integrativa, a qual utiliza recursos e potencialidades internas com vistas a alavancar oportunidades e dirimir ameaças existentes no ambiente externo.

Mintzberg e Quinn (2001), ao conceituar estratégia, abordam os chamados 5 Ps: plano, padrão, posição, perspectiva e pretexto. Como plano, a estratégia é compreendida no sentido de prever um curso de ação para o futuro, ou seja, a pretensão da organização a longo prazo. A estratégia como padrão prevê uma consonância de comportamento ao longo do tempo. Quanto ao posicionamento, relaciona-se à maneira como a empresa se coloca no mercado frente a seus concorrentes. A estratégia como perspectiva leva em consideração a cultura do grupo e a maneira como a organização opera. Por fim, a estratégia encarada como pretexto prevê as manobras executadas para obter vantagens em relação à concorrência.

Após serem apresentados esses diferentes conceitos sobre estratégia, pode haver uma indagação sobre qual é o mais apropriado ou eficaz para adotar como referência. Não há um conceito universal, mas sim linhas de pensamento que norteiam a estratégia e que cooperam no sentido de dar ao gestor opções de escolha de acordo com o perfil de sua organização. O tópico subsequente é colocado com o intuito de detalhar algumas dessas abordagens de estratégia. 2.1 ABORDAGENS SOBRE ESTRATÉGIA Os estudos sobre estratégia, embora sejam considerados relativamente recentes na área de administração, têm uma amplitude significativa. De acordo com Pereira et al (2010), sua inserção teve uma origem mais formal na década de 60 e, desde então, o campo de discussões teóricas abrange diferentes visões conceituais. Para o presente estudo, detalham-se as classificações de Whittington (2002) e Mintzberg, Ahlstrand e Lampel (2000), as quais corroboram a influência da cultura organizacional na estratégia, que é o tema de investigação proposto. Whittington (2002) propõe quatro perspectivas genéricas que delineiam as variações do conceito de estratégia: clássica, evolucionária, processual e sistêmica. A abordagem clássica compreende a estratégia como um processo racional e deliberado, viabilizado por um planejamento capaz de adaptar-se frente às mudanças de mercado. A abordagem evolucionária considera a imprevisibilidade do ambiente externo, dentro do qual os gestores devem buscar baixos custos e, ao mesmo tempo, manter opções abertas de postura. Na abordagem processual, o aprendizado organizacional é enfatizado e acredita-se que as estratégias emergem a partir da compreensão e envolvimento íntimo com as operações organizacionais. Por fim, a abordagem sistêmica delineia a estratégia como um reflexo da influência dos sistemas sociais nos quais a organização está inserida. O Quadro 1 apresenta

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uma visão sintética das linhas que norteiam as quatro perspectivas sobre estratégia apontadas por Whittington (2002): Quadro 1 – As quatro perspectivas sobre estratégia

Clássica Processual Evolucionária Sistêmica Estratégia Formal Elaborada Eficiente Inserida

Justificativa Maximização de lucro Vaga Sobrevivência Local

Foco Interna (planos) Interna (políticas/cognições) Externa (mercados) Externa

(sociedades)

Processos Analítica Negociação/ aprendizagem Darwiniana Social

Influências-chave

Economia/ militarismo Psicologia Economia/biologia Sociologia

Autores-chave Chandler, Ansoff, Porter

Cyert & March, Mintzberg, Pettigrew

Hannan & Freeman, Williamson

Granovetter, Whitley

Surgimento Anos 1960 Anos 1970 Anos 1980 Anos 1990 Fonte: Whittington (2002, p. 46)

Também com o intuito de esclarecer as diferentes dimensões do pensamento estratégico, os autores Mintzberg, Ahlstrand e Lampel (2000) realizaram um levantamento teórico sobre o tema e dividiram as perspectivas obtidas com o estudo em dez escolas, que surgiram em estágios diferentes da administração estratégica. Os autores comentam que algumas delas já atingiram o pico e declinaram, outras estão em desenvolvimento e outras têm pouco espaço, mas são significativas em termos de publicação e prática (MINTZBERG, AHLSTRAND e LAMPEL, 2000). As três primeiras escolas são classificadas pelos autores como de natureza prescritiva, ou seja, preocupam-se mais detalhar a estratégia, ao invés de focar em como elas são formuladas. A Escola do Design considera a formação da estratégia como um processo de concepção, originada por um processo de pensamento consciente simples e informal, o qual estabelece estratégias únicas. A Escola de Planejamento acredita na formação da estratégia como um processo formal, consciente e planejado, o qual faz parte das responsabilidades do executivo principal, que entrega estratégias prontas, as quais precisam apenas ser implementadas. A terceira escola prescritiva é a Escola do Posicionamento, que percebe a formação da estratégia como um processo analítico de definição de posições genéricas (MINTZBERG, AHLSTRAND e LAMPEL, 2000). As seis escolas que seguem pertencem ao grupo de natureza descritiva, posto que consideram aspectos específicos do processo de formulação estratégica e preocupam-se mais na descrição de como as estratégias são formuladas. A Escola Empreendedora visualiza a formação da estratégia como um processo visionário que se encontra na mente do líder. A formação da estratégia ocorre de maneira semi-consciente, baseada na experiência do líder, fazendo com que a estratégia assuma um caráter mais maleável e a organização, flexível. A Escola Cognitiva defende a formação da estratégia como um processo mental, implícito ao estrategista. Nessa perspectiva, as estratégias moldam a forma como as pessoas lidam com as informações. A Escola de Aprendizado aceita a formação da estratégia como um processo emergente, devido à natureza complexa e imprevisível do ambiente no qual a empresa está inserida. O líder, nesse contexto, passa a gerenciar o aprendizado estratégico, ao invés de preconceber estratégias (MINTZBERG, AHLSTRAND e LAMPEL, 2000). A Escola do Poder defende a formação da estratégia como um processo de negociação, moldada por poder e política. A Escola Cultural, por outro lado, percebe a formação da estratégia como um processo coletivo, baseado em crenças e intenções conjuntas. Finalizando as escolas descritivas, a Escola Ambiental acredita que a formação da estratégia seja um processo

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reativo, em que o ambiente torna-se o agente central no seu processo de geração (MINTZBERG, AHLSTRAND e LAMPEL, 2000). A última escola, chamada Escola de Configuração, difere de todas as outras porque apresenta um aspecto fundamental: “ela oferece a possibilidade de reconciliação, uma maneira para integrar as mensagens de outras escolas” (MINTZBERG, AHLSTRAND E LAMPEL, 2000, p. 222). Ela define a formação da estratégia como um processo de transformação, vinculada a períodos de estabilidade, sequências padronizadas e mudanças constantes. À medida que as empresas evoluem na maneira de pensar estrategicamente, elas podem tender para certo tipo de abordagem em detrimento dos demais. A atitude estratégica tem forte influência do estágio do ciclo de vida em que a organização se encontra. As abordagens de Whittington (2002) e Mintzberg, Ahlstrand e Lampel (2000) contemplam, em seu conjunto, características fundamentais à prática estratégica nas organizações. De forma a compreender como a estratégia é empreendida no ambiente, um fator importante é a cultura organizacional, conforme exposto na introdução deste estudo, cujos conceitos são apresentados na sequência. 3 CULTURA ORGANIZACIONAL

Os estudos sobre cultura organizacional, de acordo com Freitas (2002), tiveram maior amplitude de produção na década de 80 e, embora na época pensassem tratar-se de um modismo, o tema é atualmente tido como fundamental na análise e compreensão das práticas organizacionais. Pereira et al (2010) corroboram tal percepção comentando que a cultura é decisiva na formulação e execução do planejamento organizacional. Os autores acreditam que, para alterar uma organização, seja pela introdução de novos processos ou para empreender uma nova estratégia, não basta alterar metas e estrutura. A mudança deve acontecer nos sistemas em que as pessoas trabalham, os quais são permeados pela cultura.

Introduzindo alguns conceitos, Daft (2002, p. 293) defende que “a cultura proporciona aos membros da organização um senso de identidade organizacional e gera um comprometimento com crenças e valores que são maiores que os próprios membros da organização”. Corroborando essa perspectiva, Pettigrew (1996) comenta que esse comprometimento organizacional relaciona-se à premissa de que a cultura permeia todos os sistemas, processos, pessoas e estruturas existentes. O estudo da cultura organizacional juntamente com o tema de estratégia encontra justificativa pela premissa de que, “sendo a cultura organizacional um conjunto de valores percebidos e tidos como válidos por um grupo, então esta cultura terá impacto no desempenho da organização, visto que o processo decisório estará baseado nesses valores do grupo” (RONCHI, 2004, p. 49). O desempenho organizacional é direcionado em função de uma estratégia previamente definida e, dessa forma, torna-se interessante compreender a dinâmica de influências que a cultura organizacional pode exercer sobre a estratégia. Schein define cultura organizacional como um

conjunto de pressupostos básicos (basic assumptions) que um grupo inventou, descobriu ou desenvolveu ao aprender como lidar com os problemas de adaptação externa e integração interna e que funcionaram bem o suficiente para serem considerados válidos e ensinados a novos membros como a forma correta de perceber, pensar e sentir em relação a esses problemas. (SCHEIN apud FLEURY; FISCHER, 1996, p. 20)

Apresentando uma concepção um pouco diferente, Freitas (2002) entende a cultura organizacional tanto como um instrumento de poder quanto como representações imaginárias sociais. Essas representações imaginárias são construídas nas relações cotidianas das organizações e podem ser legitimadas por meio de valores, normas, significados e

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interpretações. A autora comenta que tais relações objetivam um sentido de direção e unidade, fazendo com que a organização torne-se uma fonte de identidade e reconhecimento para seus membros. No que tange ao papel da cultura organizacional, Robbins (2002) aponta que ela assume uma perspectiva de atuação multifuncional, e consequentemente complexa. O autor cita como papel principal a definição de fronteiras, a qual pressupõe um sentido de identidade às pessoas, contribuindo para o comprometimento organizacional. Uma segunda função seria a de estabilização social, por meio da qual a organização mantém-se coesa. Como terceira função, tem-se seu uso como “sinalizador de sentido e de um mecanismo de controle que visa orientar e dar forma às atitudes e comportamentos” (ROBBINS, 2002, p. 503)

Como forma de entender e sistematizar a dinâmica da cultura organizacional, Schein (2009) estabelece três níveis de análise: artefatos, crenças e valores expostos e suposições básicas. Os artefatos visíveis compreendem o ambiente construído da organização, no sentido de sua estrutura física, as roupas, os rituais de comportamento visíveis e documentos públicos. Essa dimensão de análise, conforme aponta Schein (2009), é enganadora porque, embora os dados sejam facilmente obtidos, são difíceis de interpretar, tendo em vista que os artefatos decorrem da interpretação e essa, por sua vez, pode ser uma projeção de sentimentos e ações. Fleury e Fischer (1996, p. 20) corroboram comentando que “é possível descrever como um grupo constrói o seu ambiente e quais são os padrões de comportamento [...], mas frequentemente não se consegue compreender a lógica subjacente [...]”. No que tange a crenças e valores expostos, é necessária a realização de uma entrevista com os membros-chave para identificá-los, visto que são mais difíceis de obter com simples observação. Schein apud Fleury e Fischer (1996, p. 20) também ressalta que, uma vez identificados, é necessário perceber que tratam-se apenas de valores manifestos, ou seja, “expressam o que as pessoas reportam ser a razão do seu comportamento, o que na maioria das vezes são idealizações ou racionalizações”, mantendo razões subjacentes escondidas ou inconscientes. Por fim, tem-se o nível das suposições básicas, as quais tendem a não ser confrontadas nem debatidas e, por esse motivo, são mais difíceis de mudar. Schein (2009, p. 29) comenta que “a cultura como um conjunto de suposições básicas define a que devemos prestar atenção, o que as coisas significam, como reagir emocionalmente ao que ocorre e que ações adotar em vários tipos de situações”. De maneira geral, tratam dos modelos mentais que as pessoas apresentam, ou seja, resultam em um padrão de atitudes decorrentes de experiências anteriores atreladas a crenças e valores pessoais. Schein utiliza a noção de que a cultura atua entre dois extremos: o muito visível e o invisível, tácito, inconsciente. Além disso, defende a possibilidade de existência de uma forte cultura se a organização como um todo passou por experiências em comum, e essa cultura é tão arraigada a ponto de prevalecer sobre subculturas que eventualmente existam nos diferentes níveis organizacionais. Também atribui aos fundadores da organização uma grande importância no molde dos padrões culturais, argumentando que os líderes iniciais acabam passando sua visão de mundo e o papel da organização na sociedade aos demais membros à medida que desenvolvem e usam maneiras próprias de lidar com situações e problemas específicos (FLEURY; FISCHER, 1996). De maneira a compreender a interação da cultura e os demais elementos organizacionais, é interessante observar as tipologias existentes sobre a mesma, com vistas a possibilitar uma classificação da organização em algum quadro teórico específico, que já apresente uma descrição científica de características, proporcionando a realização de interpretações e inferências. 3.2 TIPOLOGIAS DE CULTURA ORGANIZACIONAL

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A elaboração de tipologias culturais, ou seja, da classificação ou categorização dos padrões de cultura notados em certo ambiente, de acordo com Schein (2009), contribuem para atribuir sentido às variações observadas. Os novos conceitos tornam-se úteis por motivos como: dar sentido e ordem sob a perspectiva de quem está fora do sistema; ajudar a definir a estrutura básica dos fenômenos para se construir uma nova teoria; e possibilitar a previsão de como outros fenômenos tendem a se comportar. Não há como obter uma classificação única dos tipos de cultura existentes nas organizações, pois, tendo em vista a pluralidade de características e variáveis existentes, cada autor opta por utilizar um enfoque específico, coerente com o que pretende analisar. Corroborando essa ideia, Ronchi (2004, p. 77), ao parafrasear Freitas, expõe que “nenhuma tipologia corresponde a uma realidade em todos os seus matizes”, em suma, ela expressa as variáveis teóricas consideradas relevantes para o estudo da cultura sob a ótica do autor que a elaborou, e as abordagens divergem em decorrência da multiplicidade de percepções e enfoques dados ao tema. Goffee e Jones (1998) apud Schein (2009) apresentam uma tipologia cultural baseada em duas variáveis: solidariedade, encarada como a tendência de pensar da mesma maneira; e sociabilidade, vista como a predisposição das pessoas em serem amigáveis. Por meio dessas duas variáveis, o autor criou quatro categorias que expressam a cultura organizacional, retratadas no Quadro 2.

Quadro 2 – Tipologias de Goffee e Jones (1998) apud Schein (2009) Cultura Solidariedade Sociabilidade

Fragmentada Baixa Baixa Mercenária Alta Baixa Comunitária Baixa Alta

Em rede Alta Alta Fonte: Adaptado de Schein (2009)

Schneider (1996), por outro lado, construiu um modelo de análise que envolve variáveis como: estrutura, autoridade, liderança, relacionamentos, seleção de pessoal, tomada de decisão e gerenciamento de desempenho. De acordo com tais pressupostos, o autor classifica as organizações em quatro tipos, detalhados no Quadro 3, e considerados sob os eixos de pessoalidade (total impessoalidade a pessoalidade plena) e foco temporal (atualidade a possibilidade):

Quadro 3 – Tipologia de Schneider Tipo cultural Eixo relacionado Características

Colaboração Pessoalidade-Atualidade Ênfase nas pessoas e na manutenção da realidade.

Cultivo Pessoalidade-Possibilidade Ênfase no desenvolvimento pessoal, visando oportunidades futuras.

Controle Impessoalidade-Atualidade Ênfase em cargos, em detrimento de pessoas, busca a realidade.

Competência Impessoalidade-Possibilidade Ênfase em relacionamentos impessoais e nas possibilidades do futuro.

Fonte: Adaptado de Schneider (1996) É importante perceber que a implementação de uma tipologia não garante à organização uma análise global de sua cultura. Os autores elegem focos de análise de acordo com suas pretensões de pesquisa, e tais focos nem sempre atuam na totalidade de ambientes da empresa. Citando um exemplo para melhor elucidação, Schein (2009) tece uma crítica sobre a tipologia proposta por Goffee e Jones (1998), comentando que ela desconsidera a maneira de interação da organização com o ambiente externo. Isso posto, é interessante analisar a possibilidade de aplicar mais tipologias em conjunto, pois assim tem-se um diagnóstico mais completo sobre o perfil cultural da organização.

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A preocupação dos autores em tipificar a cultura demonstra a importância de sua compreensão dentro do ambiente organizacional. Ao realizar uma análise teórico-empírica das influências da cultura na prática da estratégia – escopo do presente artigo –, pretende-se aprofundar o entendimento de como os traços culturais moldam o tipo de estratégia e a maneira como a cultura relaciona-se com a estratégia no sentido de motivar a realização de esforços conjuntos para atingi-la. 4 ASPECTOS METODOLÓGICOS A tradução dos aspectos metodológicos utilizados faz-se por meio do detalhamento de quatro pontos: caracterização da pesquisa, universo de estudo, métodos de coleta de dados e métodos de análise de dados. Quanto à caracterização, é uma pesquisa qualitativa, descritiva e aplicada, que utiliza abordagem dedutiva. O universo de estudo deste artigo são três empresas – Southwest Airlines, Nissan e General Eletric –, analisadas com base em bibliografias publicadas sobre as mesmas, utilizando como filtros os temas de estratégia e cultura organizacional. Justifica-se a escolha dessas empresas devido às suas peculiaridades no que tange aos assuntos de estudo, a citar: a Southwest Airlines é uma empresa regional com estratégia coerentemente regional e um modelo peculiar de cultura, que serve como modelo de caso de sucesso para outras empresas; a Nissan passou por um processo de aliança que alterou sua cultura e sua estratégia, tendo em vista que antes era uma empresa global de pensamento regional, e, nesse processo de aliança, precisou lidar com fatores complexos para integrar culturas diferentes; e por fim a General Eletric, por ser uma empresa global com uma estratégia competitiva bastante agressiva e que, ao mesmo tempo, apresenta uma cultura disposta a lidar com os constantes desafios do mercado em que se encontra a organização. No que tange à coleta de dados, foi feita uma revisão de literatura, caracterizando uma pesquisa bibliográfica. Foram analisados livros e artigos relacionados aos temas de estratégia e cultura organizacional, e os principais conceitos encontrados integram a fundamentação teórica deste artigo. Quanto à coleta de dados do universo de estudo, também escolheu-se o uso de bibliografias publicadas sobre as empresas, ou seja, dados secundários, tendo em vista que apresentavam um rico detalhamento sobre os temas de investigação. Além disso, foram feitas pesquisas complementares sobre as empresas, para verificar possíveis alterações que tenham ocorrido. Por fim, a análise dos dados é feita pelo que se caracterizou como um debate teórico-empírico. Tendo em vista os conceitos apresentados sobre estratégia e cultura organizacional, buscou-se, a partir deles, encontrar características convergentes nas empresas investigadas, apontadas por meio da descrição da cultura e da estratégia de cada uma e verificando a possibilidade de enquadrá-las em algum dos modelos teóricos propostos. O intuito da análise foi demonstrar as influências que a cultura organizacional e a estratégia estabelecem entre si. 5 INFLUÊNCIAS DA CULTURAL ORGANIZACIONAL NA ESTRATÉGIA A cultura organizacional é muitas vezes apontada como uma barreira à implementação da estratégia, mas essa é uma perspectiva falaciosa decorrente de análises superficiais e desvalorização das pessoas na prática estratégica. Barney (1991), tratando sobre a visão baseada em recursos, comenta que somente a percepção das oportunidades existentes no mercado não assegura à organização um desempenho competitivo. A competitividade está calcada, de acordo com o autor, na percepção dos fatores ambientais e, ao mesmo tempo, no desenvolvimento e articulação dos recursos internos da organização.

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Dessa forma, partindo do pressuposto que as pessoas são recursos internos da organização, é fundamental que se compreenda a cultura organizacional que permeia o ambiente, tendo em vista que as pessoas são responsáveis por desenvolvê-la, mesmo que inconscientemente. Nesse sentido, Wright, Kroll e Parnell (2000) defendem que a cultura organizacional é um meio de determinar e disseminar as crenças relacionadas às competências essenciais da empresa, e isso causa impacto direto na estratégia. Os autores acreditam que a cultura deve adequar-se à estratégia, oferecendo meios para que a empresa se adapte e reaja às variações ambientais. Da mesma maneira, a estratégia promove a alteração de padrões culturais na empresa, pois dissemina valores e dá abertura a novos modelos de comportamento. O alinhamento entre cultura organizacional e estratégia é um ponto importante no sentido de alavancar o desempenho organizacional. Feita essa breve contextualização, é realizado, na sequência o debate teórico-empírico proposto. Para organizar de maneira lógica, no primeiro momento são detalhadas separadamente as empresas em estudo. É feita uma breve descrição das mesmas e são detalhadas as características sobre sua estratégia e cultura organizacional, as quais são relacionadas, sempre que possível, aos modelos teóricos expostos na fundamentação teórica, constituindo, então, o debate teórico-empírico proposto. No segundo momento, é apresentado um quadro com uma visão geral da cultura e da estratégia das organizações e dos modelos aos quais elas podem ser relacionadas. 5.1 DEBATE TEÓRICO-EMPÍRICO Antes de iniciar a caracterização das empresas, ressalta-se que são utilizadas como referências principais: para a Southwest Airlines, a obra Nuts! (FREIBERG; FREIBERG, 2000); para a Nissan, a obra Turbinado (MAGEE, 2003) e para a General Eletric, a obra Jack Definitivo (WELCH, 2001). As características encontradas nessas referências são comparadas, quando possível, às metodologias de estratégia apresentadas por Whittington (2002) e Mintzberg, Ahlstrand e Lampel (2000). Quanto à cultura organizacional, as obras são relacionadas às tipologias de Goffee e Jones (1998) apud Schein (2009) e Schneider (1996). 5.1.1 Southwest Airlines: criatividade, flexibilidade, cultura e liderança A Southwest Airlines teve sua aprovação para funcionamento no ano 1971, comercializando voos nas rotas de três cidades do Texas – Dallas, Houston e San Antonio. Para consolidar uma participação significativa no ramo de aviação dos Estados Unidos, passou por problemas envolvendo desde recursos financeiros até embates diretos com uma concorrência receosa, a qual queria retirá-los do mercado. Entretanto, o fato de Kelleher e sua equipe vislumbrarem um modelo diferente de companhia aérea, calcado basicamente em dois fatores – custos e pessoas –, chamou atenção do público consumidor e fez com que a empresa conseguisse meios para dar continuidade a sua estratégia. Tratando um pouco mais detalhadamente sobre a estratégia da Southwest Airlines, conforme exposto anteriormente, o modelo alia basicamente baixos custos e funcionários comprometidos com os resultados organizacionais. De forma a obter uma redução de custos diferenciada em relação à concorrência, um fator fundamental foi a definição do mercado em que a Southwest atuaria: uma companhia de aviação regional que se propõe a atender dois perfis de clientes – aqueles que viajam a negócios e não são vulneráveis a preços, mas sim a pontualidade; e aqueles que viajam a lazer e prezam por tarifas atrativas e horários flexíveis. Por meio dessas diretrizes, conseguiram estabelecer um padrão de serviço elevado e, ao mesmo tempo, custos baixos, adotando uma postura coerente dentro do seu âmbito de

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atuação. Eles souberam manter o foco estratégico enquanto a concorrência atraía-se por buscar outros nichos de mercado. O segundo ponto sobre a estratégia da Southwest Airlines é sua maneira de lidar com as pessoas. De acordo com Freiberg e Freiberg (2000), toda a estratégia de administração da empresa é igualitária, assegurando que todos os funcionários obtenham informações relevantes sobre a organização, e assim, saibam adaptar seu desempenho para garantir o alcance de resultados. A Southwest Airlines acredita que existe para “ter lucros, garantir a segurança no emprego para todos os seus funcionários e tornar o voo possível para o bolso de todas as pessoas” (FREIBERG; FREIBERG, 2000, p. 58). Outra característica interessante de se destacar é que Kelleher não acredita em planejamento estratégico, pois considera que “projetos a longo prazo se transformam em um estigma” (FREIBERG; FREIBERG, 2000, p. 105) que incute às pessoas um pensamento rígido e menos propício à geração de novas ideias. Por meio dessa análise geral sobre a estratégia da Southwest Airlines, percebe-se que há um misto de abordagens existentes. Em se tratando desse foco em baixo custo e lucratividade, pode-se perceber a presença de características da abordagem clássica apresentada por Whittington (2002), embora Kelleher não atribua tanta importância ao planejamento estratégico. Percebe-se também uma pré-disposição evolucionista no que tange à proposta de diferenciação que a Southwest Airlines apresenta a seus clientes, com vistas a manter uma vantagem competitiva. Além disso, no ambiente interno da organização, pode-se perceber traços da abordagem processual no que tange à maneira de lidar com as pessoas. Whittington (2002, p. 26) comenta, nessa abordagem, que as empresas “são coalizões de indivíduos em que cada um traz à organização objetivos pessoais e inclinações cognitivas”. Corroborando tal visão, Freiberg e Freiberg (2000, p. 81) comentam que, para a Southwest Airlines, “ os funcionários são mais do que apenas recursos: eles são pessoas de verdade, que têm necessidades e emoções reais, e cuja satisfação é valorizada e respeitada”. Quanto ao processo de formação da estratégia apontado por Mintzberg, Ahlstrand e Lampel (2000), encontram-se características da Escola Empreendedora, pois a estratégia baseia-se em experiência e intuição do líder, o qual promove fortemente a visão e, com isso, possibilita uma flexibilidade da organização, tendo em vista que a estratégia e os rumos podem ser alterados, desde que a visão permaneça a mesma. É interessante notar que, embora apresente traços de uma abordagem clássica, a formação da estratégia não se dá de acordo com escolas de design, planejamento ou posicionamento (de natureza prescritiva), que confluem aos princípios de tal abordagem, e sim adota uma natureza mais descritiva. No que tange à cultura organizacional, a empresa adotou um modelo de cooperação interna extremamente flexível e criativo, com funcionários dispostos a assumir diferentes funções em prol do alcance dos objetivos organizacionais. De acordo com Freiberg e Freiberg (2000), o perfil da empresa é de independência e determinação, onde as pessoas têm autonomia para agir. Essa autonomia decorre, todavia, de um profundo conhecimento dos valores e propósitos da empresa. Nesse ponto, percebe-se a forte influência entre cultura organizacional e estratégia. A força de trabalho da Southwest Airlines apresenta uma postura que alia os objetivos pessoais aos organizacionais, fazendo com que a estratégia permeie todos os ambientes. É esse modelo de cultura que possibilita que a estratégia seja vivenciada em todos os momentos. É possível perceber, por meio do relato de Freiberg e Freiberg (2000), que a cultura organizacional incute um alto grau de comprometimento dos funcionários e uma ampla compreensão do papel da empresa na sociedade, refletindo na visão compartilhada dos objetivos e da estratégia. A luta por enfrentar barreiras ambientais e tornar a empresa competitiva trouxe às pessoas da Southwest um espírito de fluidez e cooperação, espelhados principalmente na postura de Kelleher em proteger a equipe. Para garantir a perpetuação de sua cultura, um fator considerado importante na gestão da Southwest Airlines é a

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responsabilidade na contratação das pessoas. Com pessoas talentosas e alinhadas aos propósitos organizacionais, é possível delegar responsabilidades e dar mais autonomia a cada um. Assim, torna-se possível fomentar um ambiente permeado por criatividade e inovação. Dentro desse contexto, tentando estabelecer um comparativo com as tipologias culturais apresentadas na fundamentação teórica, de acordo com a tipologia de Goffee e Jones (1998) apud Schein (2009), a Southwest Airlines apresenta um modelo de cultura em rede, tendo em vista seu alto grau tanto de sociabilidade como de solidariedade. Para o modelo de Schneider (1996), de acordo com o que se pode perceber do relato de Freiberg e Freiberg (2000), a Southwest Airlines tem ênfase nas pessoas e em uma estratégia focada na realidade, corroborando uma cultura de colaboração. Consolidando a análise da Southwest Airlines, percebe-se que a disseminação e efetiva prática da estratégia escolhida é possível devido à cultura organizacional existente. As pessoas compreendem seu papel no desempenho da organização, apresentam postura inovadora e, com isso, possibilitam um atendimento diferenciado, que culmina em clientes safisteitos. A premissa de tratar os funcionários como a principal variável é, na verdade, uma forma de alavancar as outras premissas estratégicas da organização. Com funcionários satisfeitos e alinhados à estratégia, é possível obter clientes satisfeitos e, consequentemente, investidores satisfeitos. A visão desse ciclo sob a ótica da Southwest Airlines permite compreender o motivo da empresa ser considerada um caso de sucesso. 5.1.2 Nissan: transparência, cultura e foco estratégico O caso da Nissan é analisado no que tange à crise que enfrentava nos anos noventa e, principalmente o processo de aliança que estabeleceu com a Renault. O desafio de aliar culturas japonesa e francesa, tão diferentes, sob uma mesma estratégia trouxe um enriquecimento significativo ao campo de conhecimento sobre os assuntos. A Nissan, antes da aliança, era uma empresa global com pensamento regional. Passava por problemas estratégicos importantes, não conseguia uma atuação global uniforme e faltava uma estratégia mais agressiva com intuito, principalmente, de motivar seus funcionários, os quais achavam que não seriam demitidos devido ao modelo japonês de organização. A aliança surgiu em decorrência de um vislumbre estratégico da Renault, a qual percebeu as dificuldades por que a Nissan estava passando, principalmente no que tange a comodismo da gerência e indiferença às mudanças de mercado e necessidades do consumidor, e ao mesmo tempo tinha consciência dos pontos fortes da empresa, como habilidades de fabricação e engenharia. As práticas modernas de administração não estavam tendo espaço nas organizações japonesas devido ao ceticismo do país em relação à maneira ocidental de realizar negócios. Esse ponto serviu para utilizar uma abordagem diferente durante o processo de aliança, calcada principalmente em uma integração cultural baseada na transparência. Sobre a estratégia, quando Carlos Ghosn, responsável por conduzir o processo de aliança entre Nissan e Renault, chegou ao Japão, retirou qualquer ideia preconcebida sobre a organização e estruturou um diagnóstico organizacional baseado em tudo o que percebeu in loco. Alguns problemas percebidos foram falta de orientação clara para os lucros, baixa concentração nos clientes, falta de sensação de urgência e ausência de visão compartilhada e de uma estratégia unificada a longo prazo. Diante desse cenário, de acordo com Magee, (2003), Ghosn adotou a estratégia de desvincular recursos antes alocados a ativos não-estratégicos e não-essenciais e investi-los no negócio da empresa, os carros, e, concomitantemente, reduzir a dívida. Ghosn acreditava que o investimento em pesquisa e desenvolvimento de novos produtos estava sendo prejudicado pela dívida, a qual tolhia os investimentos futuros da Nissan.

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Conforme aponta Magee (2003, p. 170), o objetivo era “transformar a Nissan, de um fabricante de automóveis que opera no mesmo nível de suas competidoras, na melhor marca do mundo”. Para isso, eles queriam que os japoneses alavancassem a empresa por meio da participação coletiva e ativa no planejamento e na implementação das mudanças que precisavam acontecer. Tanto que, após o resultado favorável do processo de aliança, os gerentes japoneses mudaram a mentalidade, passando a crer que empresas saudáveis são aquelas altamente lucrativas, e essas conseguem empregar mais pessoas. Foi uma alteração significativa no modelo mental que permeava as estratégias praticadas no Japão. Diante desse cenário de construção de uma nova estratégia, pode-se perceber que Carlos Ghosn incutiu à Nissan uma postura mais competitiva de mercado por meio de estratégias que visavam, basicamente, a lucratividade e o desenvolvimento de novas soluções. De acordo com a classificação estratégida apresentada por Whittington (2002), pode-se perceber traços clássicos de pensamento instrumental (que visa o lucro), construído de acordo com um planejamento de ações. Corroborando a visão clássica, há também a desvinculação entre formulação e implementação da estratégia e a ideia de que a estratégia deve ser uma atribuição da gerência, a qual desvincula-se de suas demais atividades para obter o resultado pretendido. Complementando, de acordo com as escolas de Mintzberg, Ahlstrand e Lampel (2000), pode-se enquadrar a estratégia adotada pela Nissan-Renault nas premissas da Escola de Design, a qual estabelece a formação da estratégia como um processo de concepção. A estratégia decorre de um processo consciente de análise, sob responsabilidade do executivo principal, e assume características simples e informais. Nota-se também, nessa escola, a separação entre formulação e implementação, corroborando sua abordagem clássica. Sobre a cultura organizacional, Ghosn percebeu a segunda dimensão do desafio a que se propôs. Além de reerguer estrategicamente a Nissan, era necessário reestruturar os modelos mentais, pois percebia-se uma ausência de confiança das pessoas que lá trabalhavam. A Nissan apresentava como ponto forte um sistema de fabricação líder no mundo, funcionários dedicados e talentosos, e foram esses aspectos que serviram de base para Ghosn implementar ações que visassem a adaptação da cultura organizacional existente. Ele acreditava que, se tivesse o apoio das pessoas que estavam dentro da empresa, conseguiria uma unificação entre objetivos pessoais e propósitos organizacionais, garantindo um alinhamento estratégico fundamental à alavancagem do desempenho da organização. Para conseguir essa mudança, ele optou por agir com transparência total e formou equipes transcorporativas, as quais tinham o objetivo de analisar a possibilidade de unir duas culturas diferentes e obter o melhor de cada uma. Todos compreendiam o propósito dessas equipes e obtinham informações sobre todas as mudanças que aconteciam na empresa, desde o fechamento de fábricas até o ajuste da capacidade ociosa de certos espaços. A principal recomendação dada por Ghosn a essas equipes era a busca por recomendações que visassem restaurar a lucratividade e o crescimento da empresa.

O processo de aliança entre Nissan e Renault foi bem-sucedido em decorrência do conhecimento de ambas as partes sobre seus papéis. De acordo com Magee (2003, p. 111), “o objetivo não era fundir a Renault com a Nissan, mas encontrar terreno comum onde e quando fizesse sentido, evitando a duplicação”, fazendo com que as empresas obtivessem vantagens competitivas sem perder suas identidades. O cuidado de Ghosn ao conduzir esse processo de aliança possibilitou à Nissan incutir um novo modelo mental e cultural dentro da organização, o qual valoriza a diversidade e se adapta ao conceito de globalização.

De acordo com essas ações empreendidas no âmbito da cultura organizacional, pode-se perceber que a Nissan encaminha-se no sentido de obter um cultura em rede, de acordo com a classificação de Goffee e Jones (1998) apud Schein (2009), pois Ghosn procura desenvolver um modelo que valoriza as premissas de solidariedade, ou seja, visão

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compartilhada dos objetivos, e sociabilidade, estimulando as pessoas a cooperarem e serem amigáveis, mesmo em um ambiente onde coexistem duas culturas. Quanto ao modelo de Schneider (1996), pode-se enquadrar a cultura da Nissan como uma cultura de cultivo, a qual tem foco nas pessoas e nas oportunidades futuras que o mercado pode apresentar. De maneira geral, o processo de aliança realizado entre Nissan e Renault demonstra a importância de valorizar a influência existente entre estratégia e cultura organizacional. A estratégia adotada para viabilizar a aliança e para lançar a Nissan novamente em uma posição competitiva no mercado baseou-se na premissa de fomentar uma cultura organizacional transparente, disposta a mudanças, visto que todos tinham informações o suficiente para entender que essas mudanças seriam para melhorar o desempenho organizacional. 5.1.3 General Eletric: liderança, cultura e competitividade A General Eletric é um conglomerado multinacional que atua em diversos mercados desde 1890. A perenidade da empresa é um fator que chama atenção, tendo em vista principalmente os constantes resultados positivos que tem alcançado. Para o presente estudo, analisa-se a GE durante o período de administração de Jack Welch, CEO de 1981 a 2001, de acordo com a bibliografia escolhida para referência. Dessa forma, os comentários tecidos a respeito da cultura organizacional e da estratégia consideram, como pano de fundo, o tipo de gestão de Jack Welch, quem se demonstrou um líder de presença forte, postura competitiva e visão estratégica focada para lidar com a complexidade de maneira eficiente. Welch (2001) apresenta um perfil de gestão ofensivo, no sentido de competir com todas as forças para vencer, enfrentar a realidade, motivar as pessoas, fixar metas mais extensas e monitorar implacavelmente os indivíduos para garantir o cumprimento das tarefas. Ao mesmo tempo, acredita que as pessoas, para produzir, precisam de estímulos e autoconfiança e, para isso, precisam ser colocadas nos lugares certos e tratadas com as devidas diferenças. Quanto à estratégia utilizada pela GE sob sua gestão, Welch definiu que a empresa deveria atuar em setores que estivesse posicionada na primeira ou segunda posição. Os demais setores seriam vendidos, fechados ou transformados em outra fonte de investimento para a empresa. Para tanto, Welch (2003) tinha a premissa de atuar como uma pequena empresa, ou seja, dar visibilidade a projetos, dispor das melhores pessoas e investir em ideias inovadoras. Para lidar com o ambiente competitivo, ele estimulava as pessoas a enxergar a realidade como ela realmente se mostrava, pois assim seria viabilizada a estratégia principal da empresa. Ele queria, por meio dessa estratégia, alavancar a vantagem competitiva da GE. Welch (2003, p. 135) comenta que a GE foi a “primeira grande empresa próspera e lucrativa da corrente dominante que adotou ações objetivas para se tornar mais competitiva”. Além disso, outro componente que compunha a estratégia da empresa era a adoção de uma perspectiva inversa de globalização. A GE concentrava sua atenção em áreas do planeta que se encontravam em período de transição ou eram esquecidas pelos demais, pois acreditava que nesses locais encontraria a melhor relação risco-recompensa. Welch (2003) acredita que a estratégia deva ser dinâmica e premonitória, ou seja, preparada para alterações que podem acontecer em um cenário futuro. Diante disso, não acredita em previsões, mas sim em capacidade de reagir com rapidez quando a mudança acontece. De acordo com essas características, pode-se perceber que a estratégia adotada por Welch enquadra-se na abordagem evolucionária (WHITTINGTON, 2002), pois foca-se amplamente no ambiente e no mercado para determinar os próximos movimentos da empresa. A competitividade é um traço marcante dessa abordagem e pode ser percebido na postura de gestão de Welch, que optou por atuar apenas em mercados onde a GE se posiciona como

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primeira ou segunda, sob a perspectiva ambiental de que os mais fortes se estabelecem no mercado ganhando na competitividade. Analisando a estratégia da GE sob a ótica de Mintzberg, Ahlstrand e Lampel (2000), pode-se enquadrá-la na Escola de Posicionamento, tendo em vista que adota-se a premissa de que poucas estratégias-chave são defensáveis em uma determinada indústria. A ideia de proteger-se dos concorrentes atuais e futuros e buscar uma posição de vantagem competitiva também corrobora essa classificação. Além disso, a escolha da estratégia é feita por meio de cálculos e análises que justificam a adoção da mesma. Incluir a estratégia da GE na escola de posicionamento é coerente com a classificação da mesma como evolucionária, pois ambas apresentam interesse em lucratividade e valorizam o planejamento das ações estratégicas antes da execução. Fazendo um paralelo com um de seus negócios, com vistas a mostrar que a consonância de pensamento estratégico na organização ocorre ao longo do tempo, Whittington (2002, p. 13) traz um breve relato sobre a postura de Alfred Sloan, presidente da General Motors nos anos 30, o qual definiu o problema estratégico fundamental como posicionamento da empresa “nos mercados dentro dos quais é possível alcançar o maior índice de lucros”. Sloan comentou que “o objetivo estratégico de uma empresa é obter retorno do capital, e se em um caso específico o retorno a longo prazo não for satisfatório, o defeito deve ser corrigido ou a atividade deve ser abandonada” (WHITTINGTON, 2002, p. 13). No que concerne à cultura organizacional da GE, foi elaborada sob a ótica do desempenho. Welch (2001) aliou seu perfil altamente competitivo à necessidade de impor altos padrões de desempenho e, ao mesmo tempo, de proporcionar oportunidades de crescimento às pessoas de sua equipe. Além do desempenho, a cultura carrega como base as premissas de honestidade e franqueza, implementadas em um sistema transparente de feedback. Welch defende que, para obter o melhor das empresas, é necessário criar espaços abertos, dentro dos quais as ideias fluem com liberdade, sem obstáculos de níveis ou funções. É importante ressaltar que, quando assumiu o cargo de CEO, ele herdou uma cultura diferente e fora dos padrões adequados ao contexto globalizado dos mercados. Com vistas a obter uma alteração de valores e princípios norteadores, incentivou sua equipe dizendo que, alcançando a qualidade e a excelência nos negócios da GE, as pessoas se sentiriam motivadas a distender-se além de seus limites por meio da superação contínua. Ele utilizou tais argumentos na tentativa de fomentar um ambiente criativo, com pessoas ousadas que buscariam padrões de excelência para suas próprias ações. A implementação de uma cultura de desempenho não aconteceu de uma hora para outra. Welch conhecia situações que as próprias subculturas existentes na GE tentavam sabotar essa alteração de modelo mental. Entretanto, adotando uma postura transparente, contratando pessoas competentes e as colocando na posição certa desde o início, desenvolvendo as pessoas, tratando-as individualmente, respeitando as diferenças, e implementando um clima de excelência e qualidade, Welch conseguiu uma mudança significativa e alinhada. Analisando os pontos culturais apresentados de acordo com a tipologia de Goffee e Jones (1998) apud Schein (2009), a GE poderia ser classificada como uma cultura comunitária que tende a se tornar uma cultura em rede. Pelo que se pode perceber na obra de Welch (2003), há um alto grau de sociabilidade, ou seja, as pessoas comportam-se de maneira amigável, entretanto ainda não se pode dizer que as pessoas apresentem um alto grau de solidariedade, visto que o pensamento homogêneo não é constatado em todas as instâncias, a citar o exemplo citado por Welch de que havia repartições que não compartilhavam a mesma visão transmitida pela alta gerência da organização. Tende a tornar-se em rede, entretanto, apoiando-se em um modelo de cultura que, quando mais evoluído, pode permitir que tal consonância de objetivos e propósitos exista. De acordo com a tipologia de Schneider (1996),

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nota-se uma cultura de cultivo, a qual valoriza a pessoalidade e posiciona suas ações na dimensão da possibilidade, ou seja, vislumbrando as oportunidades futuras. De acordo com o exposto, percebe-se que houve uma tentativa de alterar o modelo cultural da GE para que a estratégia adotada pudesse ser posta em prática. Nesse sentido, é interessante perceber, mais uma vez, a influência da cultura nas práticas estratégicas de uma organização. A cultura antiga vigente na GE não propiciava a consecução da estratégia concebida por Welch e, para tanto, foi necessária uma mudança calcada basicamente no desempenho. O conhecimento da cultura anterior e a percepção da necessidade de mudança foram fatores fundamentais para que a proposta estratégica de Welch pudesse ser implementada de maneira global na organização. 5.2 VISÃO GERAL Realizando uma síntese das análises anteriores, o Quadro 4 apresenta uma visão geral sobre as características de cultura e estratégia das organizações estudadas e a relação com o construto científico apresentado na fundamentação teórica do artigo.

Quadro 4 – Análise geral das influências da cultura organizacional na estratégia Southwest Airlines Nissan General Eletric

Características da estratégia

• Baixo custo • Lucratividade • Funcionários satisfeitos

• Redução de custos • Lucratividade • Investimentos • Inovação

• Competitividade • Lucratividade • Inovação

Características da cultura

• Informalidade • Autonomia • Criatividade • Independência • Inovação • Comprometimento

• Transparência • Equipes mistas • Pensamento global

• Desempenho • Qualidade • Excelência • Inovação • Tratamento individual

Abordagem estratégica

• Misto de Clássica, Evolucionária e Processual

• Escola Empreendedora

• Abordagem Clássica • Escola de Design

• Abordagem evolucionária • Escola de Posicionamento

Tipologia cultural

• Cultura em rede • Cultura de colaboração

• Cultura em rede • Cultura de cultivo

• Cultura comunitária • Cultura de cultivo

Fonte: Elaborado pela autora (2010). 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente artigo teve o intuito de analisar as influências da cultura organizacional na estratégia das organizações por meio de um debate teórico-empírico, ou seja, utilizando referências científicas sobre os temas e analisando o comportamento de três empresas no que tange aos aspectos teóricos e às informações empíricas retratadas pelos autores. Por meio desse debate teórico-empírico, foi possível perceber, dentro do universo das empresas estudadas, que há influência do modelo cultural existente sobre a estratégia.

É interessante apontar os seguintes aspectos, relembrando que as percepções e análises realizadas levam em consideração as informações contidas nas referências bibliográficas sobre as empresas: • A Southwest Airlines apresenta uma estratégia mista, com traços clássicos,

evolucionistas e processuais, e as premissas dessa estratégia existem desde a fundação da empresa. Sua estratégia externa é predominantemente clássica, mas no que tange ao ambiente interno da organização, há uma perspectiva processual que considera a influência das pessoas envolvidas no processo. Acredita-se que essa tendência

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processual decorre do modelo de cultura organizacional existente, o qual prega por valorizar os funcionários e dar a eles um significativo grau de liberdade e responsabilidade. Entretanto, é por meio dessas premissas que a empresa consegue tornar-se competitiva em seu mercado, corroborando a relação de influência da cultura organizacional sobre a estratégia;

• Na Nissan, em oposição à Southwest Airlines, a estratégia e o modelo de cultura retratados por Magee (2003) não são aqueles que nasceram com a empresa. Aconteceu uma alteração da estratégia devido aos propósitos da aliança com a Renault e, para que essa mudança pudesse ser implementada com sucesso, é interessante notar que, desde o início Carlos Ghosn, tinha consciência sobre a importância do apoio das pessoas. Nesse sentido, ele proporcionou uma mudança de cultura significativa, que ampliou a compreensão dos funcionários sobre a atuação global da Nissan. A estratégia focou-se em um modelo clássico, apoiado por uma cultura de cultivo, ou seja, baseada na pessoalidade e na visão de futuro;

• O caso da General Eletric não trata de uma estratégia que nasce com a empresa, tampouco uma estratégia que permeia processo de mudança. O que aconteceu foi a troca de gestão e, tendo em vista toda a informação e experiência acumulada ao longo dos anos, a GE percebeu a necessidade de enxugar suas estruturas com vistas a lucratividade, formulando uma estratégia clássica em busca de competitividade. A sensibilização das pessoas foi mais complicada, tendo em vista que a cultura organizacional da GE apresentava quase um século de enraizamento. Mesmo assim, foi possível conseguir significativa adesão. Vale ressaltar que, para implementar uma estratégia desse tipo, foi fundamental essa cooperação das pessoas, as quais precisaram alterar seus modelos mentais em busca de um padrão de qualidade e excelência em suas atividades.

Complementando, percebe-se que a abordagem estratégica clássica ainda é praticada pelas empresas no que tange ao posicionamento frente ao mercado, entretanto percebe-se o surgimento de uma nova variável dentro do modelo clássico. Além da necessidade de planejar, da busca por lucro e por competitividade, também é possível notar a importância do alinhamento cultural, ou seja, a importância de a cultura organizacional atuar no sentido de fazer as pessoas compreenderem a estratégia e moverem esforços no sentido de atingi-la. Não se pode dizer que é um modelo somente clássico, nem somente processual. Há uma percepção híbrida, que na verdade é plausível à realidade das organizações atuais. A empresa que escolhe uma única abordagem para desenvolver sua estratégia acaba pecando por comodismo, pois desconsidera os pontos fortes existentes nas demais, os quais podem trabalhar no sentido de alavancar o desempenho organizacional. As abordagens não são mutuamente excludentes. Dentro dos casos analisados, foi possível perceber que, para a estratégia poder ser colocada em prática, antes foi necessário conhecer a cultura da organização e desenvolvê-la no sentido de moldar comportamentos alinhados estrategicamente. A cultura de responsabilidade da Southwest Airlines e a cultura de desempenho da GE, por exemplo, não vingariam em uma empresa com estratégia puramente processual, pois as pessoas tenderiam a se sentir desmotivadas e incomodadas com a zona de conforto e inércia frente às variáveis ambientais. Por fim, diante dos resultados percebidos no presente estudo, percebe-se que a influência da cultura organizacional na estratégia pode ocorrer de maneira positiva ou negativa. As organizações que adotam um pensamento estratégico sem disseminá-lo adequadamente podem ser surpreendidas com barreiras internas, expressas por posturas inertes dos funcionários no sentido de agir de maneira alinhada. Quando a estratégia é “imposta”, há uma tendência das pessoas bloquearem sua influência. Por outro lado, quando

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se realiza uma análise cultural antes de implementar uma nova estratégia, o cenário assume outro comportamento. Além de mapear a cultura, a organização busca meios de sensibilizar as pessoas para mudanças incrementais que possam acontecer. Dessa forma, a estratégia torna-se compartilhada por todos e, complementarmente, as pessoas tendem a internalizá-la e concatená-la aos seus objetivos pessoais, propiciando um ambiente comprometido e alinhado. REFERÊNCIAS BARNEY, J. B. Firm Resources and Sustained Competitive Advantage. In: Journal of Management, v.17, n.1, p. 99-120, 1991.

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