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    Direo

    Benjamin Abclala JuniorSamira Youssef Campedelli

    Preparao de texto

    lvany Picasso Batista

    Edio de arte (miolo)Milton Takeda

    Divina Rocha Corte

    Coordenao de composio (Composio/ Paginao em vdeo)

    Neide Hiromi Toyota

    Dirce Ribeiro de Arajo

    CapaPaulo Csar Pereira

    4 edio

    6

    impressaoImpresso nas oficinas da EDITORA PARMA LTDA.

    ISBN 85 08 03732 5

    2005

    Todos osdireitos reservados pela Editora tica

    Rua Baxo de lguape, 110-CEP O15O7-900

    Caixa Postal 2937 CEP 01065-970So Paulo SP

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    Sumrio

    1. Teorias lingsticas do texto e teoria semitica ________________________________ 10

    A noo de texto _________________________________________________________________

    Percurso gerativo do sentido ________________________________________________________

    2. Sintaxe narrativa ___________________________________________________________ 20

    Enunciado elementar _____________________________________________________________

    Programa narrativo _______________________________________________________________

    Percurso narrativo _______________________________________________________________

    Esquema narrativo _______________________________________________________________

    3. Semntica narrativa ________________________________________________________ 44

    Modalizao do fazer _____________________________________________________________

    Modalizao do ser ______________________________________________________________

    4. Sintaxe discursiva __________________________________________________________ 53

    Projees da enunciao __________________________________________________________

    Efeito de proximidade ou de distanciamento da enunciao _______________________________

    Efeito de realidade ou de referente __________________________________________________

    Relaes argumentativas entre enunciador e enunciatrio __________________________________

    5. Semntica discursiva _______________________________________________________ 66

    Tematizao ____________________________________________________________________

    Figurativizao __________________________________________________________________

    Coerncia textual ________________________________________________________________

    Estruturas fundamentais ___________________________________________________________

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    Teorias lingsticas do texto e teoria semitica

    A inteno deste livro apresentar, de forma sucinta e simples, osfundamentos da teoria semitica. Por teoria semitica est-se entendendo a teoriadesenvolvida por A. J. Greimas e pelo Grupo de Investigaes Smio-lingsticasda Escola de Altos Estudos em Cincias Sociais. Existem outras teorias semiticas,tambm bastante conhecidas, como a de Charles Peirce e a da Escola de Tartu. Porrazes diversas, entre as quais a de exigidade de espao e a de tipo de publicao,no se faro comparaes entre as diferentes propostas e, muito menos,apreciaes do mrito e das vantagens indiscutveis de cada uma delas. A opopela semitica greimasiana deve-se a motivos vrios, alguns mesmo de ordempessoal, e merece referncia o carter de teoria do texto que assume a semiticaescolhida para esta apresentao.

    A semitica insere-se, portanto, no quadro das teorias que se (pre)ocupamcom o texto.

    A lingstica foi, durante muito tempo, uma teoria da lngua e da linguagemque no ia alm das dimenses da frase, seja por acreditarem alguns ser a frase aunidade lingstica por excelncia, seja por dificuldades prticas de outros que

    reconhecem unidades maiores que a frase. A essa delimitao da lingstica soma-semais uma, a de ser lingstica da lngua, e de deixar, para outros campos doconhecimento, as questes de uso da lngua ou as implicaes do contexto social ehistrico dos falantes. Os estudos lingsticos circunscrevem-se, assim, em umespao ao mesmo tempo vasto e restrito e tomam por objeto unidades da dimensomxima da frase, concebidas fora de qualquer contexto de enunciao.

    Os limites impostos foram facilmente mantidos no perodo em que alingstica se confundia com a fonologia e a morfologia, com menos facilidadedurante o reinado da sintaxe, e tornaram-se insustentveis no ressurgimento dosestudos semnticos nos anos sessenta. A semntica, cujos princpios diacrnicos

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    foram formulados por M. Bral, em fins do sculo passado, foi, durante a primeirametade deste sculo, a parente pobre da lingstica, desenvolvida como semnticada palavra isolada ou semntica lexical e considerada incapaz de levar adiante oprojeto de uma cincia lingstica em construo. A semntica estrutural

    desenvolveu-se por volta de 1960, paralelamente semntica lgica, e, apesar dascrticas sofridas, teve o mrito inegvel de reintroduzir as preocupaes com osentido no seio dos estudos lingsticos. A partir de L. Hjelmslev, que mostrou serpossvel examinar o plano do contedo em separado do plano da expresso, talcomo a fonologia fizera com o plano da expresso, a semntica estruturaldesenvolveu princpios e mtodo para estudar o sentido. As dificuldades forammuitas e no se conseguiu ir alm da descrio de uma fatia reduzida do contedode uma lngua, tampouco ultrapassar os limites da frase. A preocupao com osentido, no entanto, forou o lingista a rever sua concepo de lngua e de estudosda linguagem e a romper as barreiras estabelecidas entre a frase e o texto e entre o

    enunciado e a enunciao. Sem derrubar essas demarcaes, no se pode realizarnenhum estudo satisfatrio do sentido.

    A mudana de posicionamento frente aos fatos de linguagem levou aoaparecimento de propostas tericas diversas que concebem o texto, e no mais afrase, como unidade de sentido e que consideram, portanto, que o sentido da frasedepende do sentido do texto. Ao lado dos estudos do texto, desenvolveram-se,tambm, diferentes teorias pragmticas ou da enunciao que tm em comum oponto de vista adotado de exame das relaes entre a instncia da enunciao e o

    texto-enunciado e entre o enunciador do texto e o enunciatrio, para quem o texto fabricado.

    Houve, por conseguinte, mudana de perspectiva terica com oaparecimento de estudos da organizao do texto e das relaes entre enunciado eenunciao. As teorias desenvolvidas privilegiaram uma ou outra das abordagens. Alio da semntica, porm, que abriu o caminho duplo da busca do sentido no tersido bem entendida se forem separadas as duas preocupaes, a que se volta para otexto, a que se dirige para a enunciao.

    A noo de texto A semitica tem por objeto o texto, ou melhor, procuradescrever e explicar o que otexto diz e como ele faz para dizer o que diz.

    necessrio, portanto, para que se possa caracterizar, mesmo quegrosseiramente, uma teoria semitica, determinar, em primeiro lugar, o que otexto, seu objeto de estudo.

    Um texto define-se de duas formas que se complementam: pela organizaoou estruturao que faz dele um todo de sentido, como objeto da comunicaoque se estabelece entre um destinador e um destinatrio. A primeira concepo de

    texto, entendido como objeto de significao, faz que seu estudo se confunda com oexame dos procedimentos e mecanismos que o estruturam, que o tecem como um

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    todo de sentido. A esse tipo de descrio tem-se atribudo o nome de anliseinterna ou estrutural do tex to. Diferentes teorias voltam-se para essa anlise do texto, apartir de princpios e com mtodos e tcnicas diferentes. A semitica uma delas.

    A segunda caracterizao de texto no mais o toma como objeto de significao,mas como objeto de comunicao entre dois sujeitos. Assim concebido, o textoencontra seu lugar entre os objetos culturais, inserido numa sociedade (de classes) edeterminado por formaes ideolgicas especficas. Nesse caso, o texto precisa serexaminado em relao ao contexto scio-histrico que o envolve e que, em ltimainstncia, lhe atribui sentido. Teorias diversas tm tambm procurado examinar otexto desse ponto de vista, cumprindo o que se costuma denominar anlise ex ternado texto.

    Os que se dedicam ao exame interno do texto e aqueles que se devotam

    sua anlise externa se recriminam e se criticam uns aos outros: os primeiros soacusados de reducionismo, de empobrecimento e de desconhecimento da histria;os ltimos, de subjetividade e de confundirem a anlise do texto com outrasanlises. No entanto, o texto s existe quando concebido na dualidade que o define objeto de significao e objeto de comunicao e, dessa forma, o estudo dotexto com vistas construo de seu ou de seus sentidos s pode ser entrevistocomo o exame tanto dos mecanismos internos quanto dos fatores contextuais ouscio-histricos de fabricao do sentido. Nos seus desenvolvimentos maisrecentes, a semitica tem caminhado nessa direo e procurado conciliar, com omesmo aparato terico-metodolgico, as anlises ditas interna e externa dotexto. Para explicar o que o texto diz e como o diz, a semitica trata, assim, deexaminar os procedimentos da organizao textual e, ao mesmo tempo, osmecanismos enunciativos de produo e de recepo do texto.

    Resta ainda um ponto a ser esclarecido nesta rpida exposio da noo detexto: o objeto de estudo da semitica apenas o texto verbal ou lingstico? Otexto, acima definido por sua organizao interna e pelas determinaescontextuais, pode ser tanto um texto lingstico, indiferentemente oral ou escrito uma poesia, um romance, um editorial de jornal, uma orao, um discurso

    poltico, um sermo, uma aula, uma conversa de crianas quanto um texto visualou gestual uma aquarela, uma gravura, uma dana ou, mais freqentemente,um texto sincrtico de mais de uma expresso uma histria em quadrinhos, umfilme, uma cano popular. As diferentes possibilidades de manifestao textualdificultam, sem dvida, o trabalho de qualquer estudioso do texto, e as teoriastendem a se especializar em teorias do texto literrio, semiologia da imagem eassim por diante. Com isso, perdem-se, muitas vezes, as caractersticas comuns aostextos, que independem das expresses diferentes que os manifestam, e ficamimpossibilitadas as comparaes entre textos diversos.

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    A semitica sabe da necessidade de uma teoria geral do texto e reconhecesuas dificuldades. Por isso mesmo, na esteira de L. Hjelmslev, prope, comoprimeiro passo para a anlise, que se faa abstrao das diferentes manifestaes visuais, gestuais, verbais ou sincrticas e que se examine apenas seu plano do

    contedo. As especificidades da expresso, na sua relao com o contedo, seroestudadas posteriormente.

    A semitica deve ser assim entendida como a teoria que procura explicar oou os sentidos do texto pelo exame, em primeiro lugar, de seu plano do contedo.

    Percurso gerativo do sentido Para construir o sentido dotexto, a semitica concebe o seu plano do contedo sob a forma de um percursogerativo. A noo de percurso gerativo do sentido fundamental para a teoriasemitica e pode ser resumida como segue:

    a) o percurso gerativo do sentido vai do mais simples e abstrato ao mais complexoe concreto;

    b) so estabelecidas trs etapas no percurso, podendo cada uma delas ser descrita eexplicada por uma gramtica autnoma, muito embora o sentido do texto dependada relao entre os nveis;

    c) a primeira etapa do percurso, a mais simples e abstrata, recebe o nome de nvelfundamental ou das estruturas fundamentais e nele surge a significao como uma

    oposio semntica mnima;

    d) no segundo patamar, denominado nvel narrativo ou das estruturas narrativas,organiza-se a narrativa, do ponto de vista de um sujeito;

    e) o terceiro nvel o do discurso ou das estruturas discursivas em que a narrativa assumida pelo sujeito da enunciao.

    Para bem explicar o papel do percurso gerativo na construo semitica dosentido do texto e para uma primeira apresentao, bastante imprecisa, de cadanvel do percurso, sero examinados, em rpidas pinceladas, dois textos. So eles aletra da cano infantil Histria de uma gata, de Luiz Henriquez, Srgio Bardottie Chico Buarque (1980, p. 40), e o poema Psicanlise do acar, de Joo Cabralde Melo Neto (1975, p. 27).

    H istria de uma gata

    Me alimentaramme acariciaramme aliciaramme acostumaram.

    O meu mundo era o apartamento.Detefon, almofada e trato

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    todo dia fil-mignonou mesmo um bom fil... de gatome diziam, todo momento:Fique em casa, no tome vento.Mas duro ficar na sua

    quando luz da luatantos gatos pela ruatoda a noite vo cantando assim:Ns, gatos, j nascemos pobresporm, j nascemos livres.Senhor, senhora, senhorio.Felino, no reconhecers.De manh eu voltei pra casa

    fui barrada na portaria,sem fil e sem almofada

    por causa da cantoria.Mas agora o meu dia-a-dia no meio da gatariapela rua virando lataeu sou mais eu, mais gatanuma louca serenataque de noite sai cantando assim:Ns, gatos, j nascemos pobresporm, j nascemos livres.Senhor, senhora ou senhorio.Felino, no reconhecers.

    A anlise do texto considerar cada nvel separadamente e procurar dar umaviso geral de como so concebidos o percurso e suas etapas.

    No nvel das estruturas fundamentais preciso determinar a oposio ou asoposies semnticas a partir das quais se constri o sentido do texto. EmHistria de uma gata a categoria semntica fundamental :

    liberdade vs. dominao (explorao, opresso)

    Essa oposio manifesta-se de formas diversas no texto: me aliciaram/ meacostumaram, Fique em casa, no tome vento, Mas duro ficar na sua, jnascemos livres, Senhor, senhora, senhorio etc.

    As categorias fundamentais so determinadas como positivas ou eufricas enegativas ou disfricas. No texto, a liberdade eufrica, a opresso, disfrica.

    Alm das relaes mencionadas e de sua determinao axiolgica, estabelece-se no nvel das estruturas fundamentais um percurso entre os termos. Passa-se, notexto em exame, da dominao negativa liberdade positiva.

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    dominao ---------------------- no-dominao -------------------------liberdade(disforia) (no-disforia)

    A no-dominao, ou melhor, a negao da dominao aparece sobretudoem Mas duro ficar na sua....

    Histria de uma gata tem, portanto, como contedo mnimo fundamentala negao da dominao ou da explorao, sentida como negativa, e a afirmao daliberdade eufrica.

    No segundo patamar, nvel das estruturas narrativas, os elementos dasoposies semnticas fundamentais assumidos como valores por um sujeito ecirculam entre sujeito graas aotambm de sujeitos. Ou seja, no se trata maisde afirmar ou de negar contedos, de asseverar a liberdade e de recusar a

    dominao, mas de transformar, pela ao do sujeito, estados de liberdade ou deopresso. Histria de uma gata , assim, a histria de um sujeito (gata)manipulado por um outro sujeito (dono) por tentao boa casa, proteo,carinho, comida para que fique em casa, no se misture com os gatos derua, seja fiel. O sujeito gata quer cumprir e realmente cumpre o acordo, parareceber os valores que o tentam. reconhecido como bom gato e recompensadocom fil-mignon, detefon e bons tratos. Surgem, porm, o gatos de rua, comoutros valores, os da liberdade (sem fil e sem almofada), que tambm tentam o sujeito gata e fazem que ele v rua e ponha de lado, por conseguinte, o primeirocompromisso.

    A gata esfora-se por esconder o rompimento do primeiro contrato e voltapara casa: ela procura no parecer uma gata de rua, ainda que o fosse, ela tentaparecer fiel, embora tivesse praticado a infidelidade. O segredo ou a mentira sodesmascarados e ela perde o reconhecimento de bom gato e as recompensas.Assume, a partir da, os valores da liberdade.

    A narrativa, como se viu, sofreu desdobramento polmico. Opem-sevalores e a gata sincretiza os papis de sujeito de fazeres contrrios.

    A ltima etapa do percurso gerativo o das estruturas discursivas. Asestruturas discursivas devem ser examinadas do ponto de vista das relaes que seinstauram entre a instncia da enunciao, responsvel pela produo e pelacomunicao do discurso, e o texto-enunciado. Em Histria de uma gata,utilizam-se recursos discursivos variados para fabricar a iluso de verdade. Projeta-se um narrador em eu e obtm-se o efeito de subjetividade; indetermina-se o sujeitoda primeira manipulao (me alimentaram me diziam, fui barrada) e cria-se oefeito de generalizao; delega-se a palavra aos manipuladores, dono e gatos de rua,e chega-se iluso de realidade.

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    Ainda no nvel discursivo, as oposies fundamentais, assumidas comovalores narrativos, desenvolvem-se sob a forma de temas e, em muitos textos,concretizam-se por meio de figuras. No texto em exame, desenrolam-se vriasleituras temticas:

    a) tema da domesticidade ou da dominao e explorao do animaldomstico pelo homem;

    b) tema da sexualidade da mulher-objeto ou de explorao da mulhercomprada para o prazer;

    c) tema da passagem da adolescncia idade adulta ou da opresso da famliasobre a criana e o jovem (Fique em casa, no tome vento);

    d) tema socioeconmico da marginalizao da boemia.As leituras abstratas temticas esto concretizadas em diferentes

    investimentos figurativos, todos eles caracterizados pela oposio de traossensoriais, espaciais e temporais que separam, no texto, a liberdade da dominao.

    trao

    espacial

    espacial

    temporal

    ttil

    ttil

    olfativo

    gustativo

    auditivo

    visual

    dominao vs.

    fechado

    interno

    dia

    macio

    quente

    cheiroso

    gostoso

    silencioso

    claro

    liberdade

    aberto

    externo

    noite

    duro, spero

    frio (vento)

    malcheiroso (lixo)

    ruim, azedo

    ruidoso

    penumbra (luz da lua)

    Esses traos organizam figuras diferentes nas diferentes leituras temticas. Otrao olfativo, por exemplo, manifesta-se sob a forma do detefon, na leitura doanimal domstico, como perfumes e cosmticos, na da mulher-objeto, e como cuidadose limpeza (talcos, pomadas) na do adolescente.

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    A anlise do poema de Joo Cabral de Melo Neto, Psicanlise do acar(1975, p. 27), dever completar essa viso de conjunto do percurso gerativo dosentido, tal como o concebe a teoria semitica.

    O acar cristal, ou acar de usina,mostra a mais instvel das brancuras:

    quem do Recife sabe direito o quanto,e o pouco desse quanto, que ela dura.Sabe o mnimo do pouco que o cristalse estabiliza cristal sobre o acar,por cima do fundo antigo, de mascavo,do mascavo barrento que se incuba;

    e sabe que tudo pode romper o mnimoem que o cristal capaz de censura:pois o tal fundo mascavo logo afloraquer inverno ou vero mele o acar.

    S os bangos que ainda purgam aindao acar bruto com barro, de mistura;a usina jno o purga: da infncia,no de depois de adulto, ela o educa;em enfermarias, com vcuos e turbinas,em mos de metal de gente indstria,a usina o leva a sublimar em cristalo pardo do xarope: no o purga, cura.Mas como a cana se cria ainda hoje,em mos de barro de gente agricultura,o barrento da pr-infncia logo aflora

    quer inverno ou vero mele o acar. No nvel das estruturas fundamentais, o poema parte da oposio entre:

    puro (branco, limpo, claro) vs. sujo (impuro, escuro, barrento)

    acar cristal da usina acar mascavo

    Dois percursos ocorrem no texto. Passa-se da pureza impureza, quando omascavo barrento rompe o cristal, ou da sujeira do acar bruto brancura do

    cristal da usina:

    sujo -------------------------------------- no.sujo --------------------------------- puro(acar bruto) (cristal por cima do m

    puro --------------------------------------- impuro ---------------------------------- sujo(cristal) (fundo mascavo que aflora) (a

    A assero da pureza, no primeiro percurso, e a da sujeira, no segundo,

    fazem surgir, no texto de Cabral, uma terceira possibilidade, a da afirmaoconcomitante da pureza e da sujeira, no acar do bang. O acar do bang

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    tem caractersticas tanto do mascavo sujo quanto do cristal puro, purgado que com barro, de mistura.

    No nvel das estruturas narrativas, as operaes da etapa fundamental devemser examinadas como transformaes operadas por sujeitos. Em Psicanlise do

    acar mudam-se as qualificaes do sujeito acar, ora puro ora sujo,transforma-se sua competncia, enfim, para a ao. Tanto a usina quanto o tempoou o bang so responsveis pelas alteraes das qualificaes do sujeito. A usinamanipula o sujeito sobretudo pela intimidao das mos de metal, para que eleaja de modo til, puro e racional, sem os impulsos ou os instintos sujos. Aela, ope-se o tempo, o inverno ou o vero que melam o acar, ou seja, quedesqualificam o sujeito para a ao pretendida pela usina. O tempo, na verdade,desmascara o sujeito ao mostrar o carter passageiro e mentiroso de suabrancura. O acar de usina parece puro e competente para a ao, mas no o, pois o inverno ou o vero fazem aflorar seu fundo mascavo. A usina responde,

    portanto, por transformaes apenas aparentes do sujeito, ao mud-lo de sujoem puro cristal. O tempo faz saber que a pureza superficial e esconde o ser dosujeito moldado pelas mos de barro de gente agricultura. Faz-se o percursoinverso, da aparncia essncia.

    Finalmente, a essas transformaes opostas da competncia do sujeito vemsomar-se a manipulao do bang. O bang qualifica o sujeito com a pureza ecom a sujeira, faz dele um ser complexo, ao mistur-lo com barro, para purific-lo. O acar-mistura do bang define-se miticamente pela conciliao de opostos.

    S assim, duplamente competente, o sujeito est qualificado para agir til, pura eracionalmente e, ao mesmo tempo, impulsivamente. Est pronto para realizar ofazer de adoar.

    As estruturas discursivas, no ltimo patamar do percurso,. mostram umdiscurso em terceira pessoa, verdadeiro porque objetivo. Para a iluso deobjetividade e de verdade contribuem o argumento de autoridade e o efeito derealidade obtidos com o emprego de um sujeito do saber: quem do Recife sabedireito.

    Vrios temas realizam os valores da pureza e da sujeira, no discurso:

    a) tema da purificao do acar, em que se opem os mtodos da usina e dobang, se apresentam as vantagens de cada um deles e se desmascara a excessivapureza do acar cristal, que esconde sua sujeira;

    b) tema psicanaltico da censura, dos recalques, da sublimao e do aflorarconstante dos instintos e dos desejos reprimidos (se sublimao, para a psicanlise, o processo inconsciente que consiste em desviar a energia da libido para novosobjetos, de carter til (N ovo dicionrio A urlio), o texto de Cabral mostra que a

    educao

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    na famlia, na escola, na sociedade pe o homem, desde a infncia, na boadireo, mas que os impulsos constantemente afloram, em atos falhos etc.);

    c) tema tnico do racismo, que se desenvolve na leitura do aniquilamento donegro, pondo em evidncia o branco, e na soluo apresentada da mestiagem;

    d) tema socioeconmico do desmantelamento da agricultura ou dosprocedimentos pr-industriais, em favor da usina ou do grande complexo industrial(o meio-termo do bang seria o caminho visado);

    e) tema poltico, em que se fala da aparncia de pureza e de limpeza, deordem de certos pases, sob a qual fervilham as doenas sociais da rebelio que, aqualquer momento, podem aflorar.

    As duas anlises esboadas quiseram apenas mostrar, no todo, como se

    articulam as etapas do percurso gerativo do sentido e como a semitica dele seserve para ler textos. Ser agora examinado detalhadamente cada nvel do percurso.

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    2Sintaxe narrativa

    Nos captulos 2 e 3 sero apresentados os princpios semiticos deorganizao da narrativa. Ainda que a separao seja difcil, sero distinguidos osmecanismos de estruturao sinttica da narrativa (captulo 2) e as questessemnticas de modalizao (captulo 3).

    A sintaxe narrativa deve ser pensada como um espetculo quesimula o fazer do homem que transforma o mundo. Para entendera organizao narrativa de um texto, preciso, portanto, descrevero espetculo, determinar seus participantes e o papel que representam nahistoriazinha simulada.

    A semitica parte dessa viso espetacular da sintaxe e prope duasconcepes complementares de narrativa: narrativa como mudana de estados,operada pelo fazer transformador de um sujeito que age no e sobre o mundo embusca dos valores investidos nos objetos; narrativa como sucesso deestabelecimentos e de rupturas de contratos entre um destinador e um destinatrio,

    de que decorrem a comunicao e os conflitos entre sujeitos e a circulao deobjetos. As estruturas narrativas simulam, por conseguinte, tanto a histria dohomem em busca de valores ou procura de sentido quanto a dos contratos e dosconflitos que marcam os relacionamentos humanos.

    Enunciado elementar Oenunciado elementar da sintaxenarrativa caracteriza-se pela relao de transitividade entre dois actantes, o sujeito e oobjeto. A relao define os actantes; a relao transitiva entre sujeito e objeto d-lhesexistncia, ou seja, o sujeito o actante que se relaciona transitivamente com oobjeto, o objeto aquele que mantm laos com o sujeito. H duas diferentes

    relaes ou funes transitivas, a juno e a transformao e, portanto, duas formas de

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    enunciado elementar, que, no texto, estabelecem a distino entre estado etransformao:

    enunciado de estado: F juno (S,O)

    enunciado de fazer: F transformao (S,O)

    F = funo S = sujeito O = objeto

    No texto j citado Histria de uma gata encontram-se, entre outros, osseguintes enunciados de estado e de fazer:

    enunciados de estado: o sujeito gata mantm relao de juno com vriosobjetos, nos versos O meu mundo era o apartamento./ Detefon, almofada etrato/ todo dia fil-mignon;

    enunciados de fazer: o sujeito dono transforma a relao de juno do sujeitogata com os objetos apartamento, almofada etc. H uma mudana de estadoem fui barrada na portaria,/ sem fil e sem almofada.

    Para exemplificar a organizao narrativa ser utilizada, alm dos textos jrapidamente analisados, no item sobre o percurso gerativo, uma fala de Joana, emGota ddgua, de Chico Buarque e Paulo Pontes (1975). Joana fora abandonada peloamante Jaso, aps o sucesso do samba Gota dgua. A fala proferida quandoJoana fica sabendo que Jaso vai casar-se com a filha de Creonte, o explorador da

    Vila do Meio-Dia, onde mora Joana.

    Joana Pois bem, vocvai escutar as contas que eu vou lhe fazer:te conheci moleque, frouxo, perna bamba,

    barba rala, cala larga, bolso sem fundoNo sabia nada de mulher nem de sambae tinha um puto dum medo de olhar pro mundo

    As marcas do homem, uma a uma, Jaso, tu tirou todas de mim. O primeiro prato,o primeiro aplauso, a primeira inspirao,

    a primeira gravata, o primeiro sapatode duas cores, lembra? O primeiro cigarro,

    a primeira bebedeira, o primeiro filho,o primeiro violo, o primeiro sarro,o primeiro refro e o primeiro estribilhoTe dei cada sinal do teu temperamentoTe dei matria-prima para o teu tutano

    E mesmo essa ambio que, neste momentose volta contra mim, eu te dei, por enganoFui eu, Jaso, voc no se encontrou na rua

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    Voc andava tonto quando eu te encontreiFabriquei energia que no era tuapra iluminar uma estrada que eu te aponteiE foi assim, enfim, que eu vi nascer do nadauma alma ansiosa, faminta, buliosa,uma alma de homem. Enquanto eu, enciumada

    dessa exploso, ao mesmo tempo, eu vaidosa,orgulhosa de ti, Jaso, era feliz,eu era feliz, Jaso, feliz e iludida,porque o que eu no imaginava, quando fizdos meus dez anos a mais uma sobre-vidapra completar a vida que voc no tinha, que estava desperdiando o meu alento,estava vestindo um boneco de farinhaAssim que bateu o primeiro p-de-vento,assim que despontou um segundo horizonte,l se foi meu homem-orgulho, minha obra

    completa, l se foi pro acervo de Creonte..Certo, o que eu no tenho, Creonte tem de sobraPrestgio, posio... Teu samba vai tocarem tudo quanto programa. Tenho certezaque a gota dgua no vai parar de pingarde boca em boca... Em troca pela gentilezavais engolir a filha, aquela mosca-mortacomo engoliu meus dez anos. Esse o teu preo,dez anos. At que aparea uma outra portaque te leve direto pro inferno. Conheoa vida rapaz. S de ambio, sem amor,

    tua alma vai ficar torta, desgrenhada,aleijada, pestilenta... Aproveitador!Aproveitador!

    Podem-se reconhecer enunciados de estado e enunciados de fazer:

    enunciados de estado: a relao de juno entre o sujeito Jaso e os objetosprimeiro prato, gravata, sapato de duas cores, saber sobre as mulheres e sambaetc., no incio do texto;

    enunciados de fazer: a transformao operada pelo sujeito Joana, na relao deJaso com os objetos (Te dei cada sinal do teu temperamento.. . ).

    A juno, como indicam os dois exemplos acima, a relao que determinao estado, a situao do sujeito em relao a um objeto qualquer. O objeto,enquanto objeto sinttico, uma espcie de casa vazia, que recebe investimentos deprojetos e de determinaes do sujeito. No exemplo de Jaso, os objetos com osquais mantm relao juntiva esto determinados pelas aspiraes e projetos de umsujeito em busca de dinheiro, fama e prestgio. Os investimentos fazem do objetoum objeto-valore , assim, por meio do objeto que o sujeito tem acesso aos valores.

    H dois tipos de juno, ou seja, dois modos diferentes de relao do sujeitocom os valores investidos nos objetos, a conjuno e a disjuno:

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    PN6: o tempo mela o acar, tira-lhe a brancura e a pureza (o sujeito do fazer o tempo; a transformao a de melar ou desmascarar; o sujeito de estado oacar).

    F (melar) [S1 (tempo) S2 (acar) 0v (brancura, pureza)]PN7: o bang purga o acar pela mistura com o barro (o sujeito do fazer obang; a transformao purificar; o sujeito de estado o acar).

    F (purificar) [S1 (bang) S2 (acar) Ov (brancura + escuro)]Os sete exemplos acima deixam antever diferentes tipos de programas

    narrativos, segundo critrios tambm diversos:

    a) natureza da funo: se a transformao resulta em conjunto do sujeito com o

    objeto, tem-se um programa de aquisio de objeto-valor; se termina em disjuno,fala-se em programa de privao (os PN1, PN3, PN5 e PN7 so programas deaquisio, pois, no PN1, a gata adquire comida e carinho; no PN3, ela obtmliberdade e identidade prpria; nos PN5 e PN7, o acar adquire pureza, segundodiferentes concepes de puro; j os PN2, PN4 e PN6 so programas de privao,pois no PN2 a gata privada de casa e comida; no PN4, de liberdade e deidentidade; e no PN5, o acar perde a pureza);

    b) complex idade e hierarquia de programas: os programas podem ser simples oucomplexos, isto , constitudos por mais de um programa hierarquizado (nesse caso

    diferencia-se o programa principal ou programa de base dos programas secundriosou de uso, pressupostos pelo programa de base. Pode-se dizer, por exemplo, que apurificao do acar um programa de uso necessrio consecuo do programade base de adoar ou ainda que, para Jona, os programas de Jaso so programasde uso que lhe permitio realizar o programa de base da obteno de poder numasociedade capitalista);

    c) valor investido no objeto: os valores podem ser modais, como o dever, o querer,o poder e o saber, que modalizam ou modificam a relao do sujeito com os

    valores e os fazeres, ou descritivos (Os programas narrativos examinados foramapresentados como programas narrativos com valores descritivos, como casa,comida, liberdade ou pureza. Muitos deles, porm, quando analisados com maiorpreciso, mostraro seu carter modal: o dono da gata leva-a a dever- fazer, ou seja, adever no se misturar com os gatos de rua para adquirir os valores descritivos decasa, comida e conforto; o bang e a usina alteram as qualidades modais doacar, ao modificarem seu poderde adoar. O exemplo mais claro, porm, deprograma narrativo com valores modais, o de Joana, que transforma o querere osaberde Jaso: Te dei cada sinal do teu temperamento/ Te dei matria-prima para oteu tutano/ E mesmo essa ambio que, neste momento/ se volta contra mim, eu te

    dei, por engano/ Fui eu, Jaso, voc no se encontrou na rua);

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    d) relao entre os actantes narrativos (sujeito de estado e sujeito do fazer) e osatores que os manifestam no discurso: os dois sujeitos, do fazer (S1) e do estado (S2),podem ser assumidos por um nico ator ou por atores diferentes. (Os PN1, PN2,PN5, PN6 e PN7 tm atores diferentes para os dois sujeitos. So programastransitivos: nos PN1 e PN2, o sujeito do fazer o dono, e o de estado, a gata;

    nos PN5, PN6 e PN7, os sujeitos do fazer so, respectivamente, a usina, o tempo eo bang, e os sujeitos de estado, nos trs programas o acar. Os PN3 e PN4 soprogramas reflexivos, em os sujeitos do fazer (S1) e do estado (S2) so realizadospor um mesmo ator, a gata.)

    Se forem combinados os critrios a (aquisio vs. privao) e d(transitivo vs.reflexivo), obtm-se o quadro abaixo:

    (a)

    naturezada funo

    (d) relao

    narrativa/ discurso denominao exemplo

    aquisio transitiva Doao PN1: o dono doa objetos-valor para a gata

    aquisio reflexiva apropriaoPN3: a gata adquire por si mesma aliberdade

    privao transitiva espoliao PN2 o dono tira da gata os objetos-valor

    privao reflexiva renncia PN4: a gata renuncia liberdade

    fcil perceber que os programas narrativos projetam sempre um programacorrelato, isto , se um sujeito adquire um valor porque outro sujeito foi deleprivado ou dele se privou. Os objetos circulam entre os sujeitos, graas stransformaes, e pem os sujeitos em relao. Dessa forma, o programa dedoao corresponde, em outra perspectiva, ao programa de renncia, e o deapropriao, ao de espoliao. Na fala de Joana, em Gota dgua, a transformaooperada ora descrita como uma doao de valores a Jaso (aquisio transitiva),

    ora como a renncia de Joana a esses valores (privao reflexiva).doaoTe dei cada sinal do teu temperamento

    Te dei matria-prima para o teu tutano

    E mesmo essa ambio que, neste momento

    se volta contra mim, eu te dei, por engano

    rennciaporque o que eu no imaginava, quando fiz

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    PN de perfrmance mesmo ator aquisio valores descritivos

    F (compor sambas) [S1 (Jaso) S2 (Jaso) Ov (fama e fortuna)]A relao entre o programa de uso e o programa de base clara: as

    qualidades modais de querer e saber compor que Jaso recebe de Joana no

    programa de competncia so condio para a realizao do programa deperfrmance de Jaso, de compor sambas.

    A fbula de Millr, O gato e a barata (1975, p. 17), fornecer mais algunsexemplos de programas narrativos.

    A baratinha velha subiu pelo p do copo que, ainda com um pouco de vinho, tinha sidolargado a um canto da cozinha, desceu pela parte de dentro e comeou a lambiscar o vinho. Dadaa pequena distncia que nas baratas vai da boca ao crebro, o lcool lhe subiu logo a este. Bbada,a baratinha caiu dentro do copo. Debateu-se, bebeu mais vinho, ficou mais tonta, debateu-se

    mais, bebeu mais, tonteou mais e j quase morria quando deparou com o caro do gatodomstico que sorria de sua aflio, do alto do copo. Gatinho, meu gatinho , pediu ela me salva, me salva. Me salva que assim que eu sairdaqui eu deixo voc me engolir inteirinha, como voc gosta. Me salva. Voc deixa mesmo eu engolir voc? disse o gato. Me saaaalva! implorou a baratinha. Eu prometo.O gato ento virou o copo com uma pata, o liquido escorreu e com ele a baratinha que, assimque se viu no cho, saiu correndo para o buraco mais perto, onde caiu na gargalhada. Que isso? perguntou o gato. Voc no vai sair da e cumprir sua promessa? Voc disseque deixaria eu comer voc inteira. Ah, ah, ah riu ento a barata, sem poder se conter. E voc to imbecil a ponto de

    acreditar na promessa de uma barata velha e bbada?Moral: s vezes a autodepreciao nos livra do peloto.

    A barata prope ao gato um acordo: que ele a salve, em troca de comida (elaprpria). Com isso, ela leva o gato a querersalv-la, a querer tir-la do copo. Tem-seum programa de competncia:

    PN de competnciaF (propor um acordo)

    atores distintos[S1 (barata) S2(gato)

    aquisio

    0vvalores modais(querer tirar a baratado copo)

    O gato realiza a ao de tirar a barata do copo, cumprindo dessa forma seuprograma de perfrmance, com o que espera obter comida.

    PN de perfrmanceF (virar o copo)

    mesmo ator[S1 (gato) S2 (gato)

    aquisio

    0vvalor descritivo(comida)

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    competente para o fazer, sujeito operador ou do fazer (que compe), sujeitorealizado pelo fazer e pela obteno dos valores desejados. Na fbula de Millr, osujeito gato assume os papis actanciais de: sujeito do no-querer-fazer (quandodeparou com o caro do gato domstico que sorria de sua aflio, do alto docopo), mas sujeito do saber e do poder-fazer; sujeito do querer-fazer (depois da

    proposta da barata), sujeito competente (quer, sabe e pode salvar a barata), sujeitooperador (o gato ento virou o copo), sujeito no-realizado (no obtm, com aperfrmance, o valor comida, desejado).

    Se os percursos so definidos pelo encadeamento de programas narrativos,emprega-se, para denomin-los, a noo de actante funcional. Assim, o percursocaracterizado pela seqncia lgica dos programas de competncia e deperfrmance chama-se, como se viu, percurso do sujeito. Esse sujeito no mais osujeito de estado ou o sujeito do fazer, e sim um actante funcional definido por umconjunto varivel de papis actanciais. H na caracterizao do sujeito algumas

    determinaes mnimas, entre as quais se encontram a de ser o sujeito de estadoafetado, de alguma forma, pelo programa de competncia e a de ser o sujeitorealizador da perfrmance ou, ao menos, competente para realiz-la. Os demaispapis actanciais faro que o sujeito seja diferente em cada texto. Jaso e o gato nocumprem os mesmos papis actanciais, mas so ambos manifestaes do actantesujeito, em seus respectivos textos.

    O percurso do sujeito representa, sintaticamente, a aquisio, pelo sujeito, dacompetncia necessria ao e a execuo, por ele, dessa perfrmance. H

    diferentes espcies de programas de competncia e de perfrmance e maneirasdiversas de se encadearem os programas, havendo, por conseguinte, percursos dosujeito diferenciados em cada texto.

    O percurso do sujeito no o nico tipo de percurso encontrado naorganizao narrativa. Existem dois outros mais: o percurso do destinador-manipulador e o percurso do destinador-julgador.

    No percurso do destinador-manipulador, o programa de competncia examinado no na perspectiva do sujeito de estado que recebe os valores modais,

    mas do ponto de vista do sujeito doadorou destinadordesses valores, O destinador-manipulador o actante funcional que engloba vrios papis actanciais, entre osquais se encontra necessariamente o de sujeito doador de valores modais. ele, nanarrativa, a fonte de valores do sujeito, seu destinatrio: tanto determina quevalores sero visados pelo sujeito quanto dota o sujeito dos valores modaisnecessrios execuo da ao.

    As aes do sujeito e do destinador diferenciam-se nitidamente: o sujeitotransforma estados, faz-sere simula a ao do homem sobre as coisas do mundo; odestinador modifica o sujeito, pela alterao de suas determinaes semnticas emodais, e faz-fazer, representando, assim, a ao do homem sobre o homem.

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    A ordem na manipulao depender da relao entre manipulador emanipulado. H os que comeam com a tentao e acabam na intimidao e vice-versa.

    Em Histria de uma gata, encontram-se dois exemplos de manipulao

    por tentao. No primeiro, o destinador-manipulador dono estabelece umcontrato com o destinatrio-sujeito gata, em que o dono oferece gata valorespositivos, que ela deseja, tais como alimentos, carinho, luxo, em troca de umbom comportamento, isto , no sair de casa, ser fiel, no se misturar com osgatos de rua, enfeitar a casa. A gata se deixa persuadir, acredita nos valores e nopoder do dono, aceita o contrato e passa a querer-fazer o que lhe solicitado, paraassim receber os valores contratuais.

    Me alimentaramme acariciaram

    me aliciaramme acostumaram.O meu mundo era o apartamento.Detefon, almofada e trato todo dia fil-mignonou mesmo um bom fil.., de gatome diziam, todo momento:Fique em casa, no tome vento.

    O segundo caso de tentao ocorre quando a gata manipulada pelos gatosde rua, que a tentam com os valores positivos de liberdade e de identidade

    prpria, a que ela tambm aspira:

    Mas duro ficar na suaquando luz da luatantos gatos pela ruatoda a noite vo cantando assim:Ns, gatos, j nascemos pobresporm, j nascemos livres.Senhor, senhora, senhorio.Felino, no reconhecers.

    A fbula de Millr, O leo, o burro e o rato (1978, p. 43-5), pode bemexemplificar os percursos de manipulao por seduo e por intimidao.

    Um leo, um burro e um rato voltaram, afinal, da caada que haviam empreendido juntos1e colocaram numa clareira tudo que tinham caado: dois veados, algumas perdizes, trs tatus,uma paca e muita caa menor. O leo sentou-se num tronco e, com voz tonitruante queprocurava inutilmente suavizar, berrou: Bem, agora que terminamos um magnfico dia detrabalho, descansemos aqui, camaradas, para a justa partilha do nosso esforo conjunto.Compadre burro, por favor, voc, que o mais sbio de ns trs (com licena do compadre rato),voc, compadre burro, vai fazer a partilha desta caa em trs partes absolutamente iguais. Vamos,

    1

    A conjugao de esforos to heterogneos na destruio do meio ambiente coisa muito comum.

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    compadre rato, at o rio, beber um pouco de gua, deixando nosso grande amigo burro em pazpara deliberar.

    Os dois se afastaram, os dois foram ao rio, beberam gua2 e ficaram um tempo. Voltarame verificaram que o burro tinha feito um trabalho extremamente meticuloso, dividindo a caa emtrs partes absolutamente iguais. Assim que viu os dois voltando, o burro perguntou ao leo:

    Pronto, compadre leo, a est que acha da partilha? O leo no disse uma palavra. Deuuma violenta patada na nuca do burro, prostrando-o no cho, morto.

    Sorrindo, o leo voltou-se para o rato e disse: Compadre rato, lamento muito, mas tenhoa impresso de que concorda em que no podamos suportar a presena de tamanha inaptido eburrice. Desculpe eu ter perdido a pacincia, mas no havia outra coisa a fazer. H muito que euno suportava mais o compadre burro. Me faa um favor agora divida voc o bolo da caa, incluindo, por favor, o corpo do compadre burro. Vou at o rio,novamente, deixando-lhe calma para uma deliberao sensata.

    Mal o leo se afastou, o rato no teve a menor dvida. Dividiu o monte de caa em dois.

    De um lado toda a caa, inclusive o corpo do burro. Do outro apenas um ratinho cinza3

    mortopor acaso. O leo ainda no tinha chegado ao rio quando o rato o chamou: Compadre leo, estpronta a partilha! O leo, vendo a caa dividida de maneira to justa, no pde deixar decumprimentar o rato: Maravilhoso, meu caro compadre, maravilhoso! Como voc chegou todepressa a uma partilha to certa? E o rato respondeu: Muito simples. Estabeleci uma relaomatemtica entre seu tamanho e o meu claro que voc precisa comer muito mais. Traceiuma comparao entre a sua fora e a minha claro que voc precisa de muito maior volumede alimentao do que eu. Comparei, ponderadamente, sua posio na floresta com a minha e,evidentemente, a partilha s podia ser esta. Alm do que, sou um intelectual, sou todo esprito.Inacreditvel, inacreditvel! Que compreenso! Que argcia!, exclamou o leo, realmenteadmirado. Olha, juro que nunca tinha notado, em voc, essa cultura. Como voc escondeu isso

    o tempo todo, e quem lhe ensinou tanta sabedoria? Na verdade, leo, eu nunca soube nada. Seme perdoa um elogio fnebre, se no se ofende, acabei de aprender tudo agora mesmo, com oburro morto.

    Moral: S um burro tenta ficar com a parte do leo.

    No incio da fbula, o leo manipula o burro por seduo, ao apresentar umaimagem positiva da competncia, do saber do burro.

    Compadre burro, por favor, voc, que o mais sbio de ns trs (com licena docompadre rato), voc, compadre burro, vai fazer a partilha desta caa em trs partes

    absolutamente iguais.

    O burro deixa-se convencer pelo leo, nele acredita e aceita o contrato,procurando cumpri-lo de modo a confirmar as qualidades de sabedoria que lheforam atribudas no processo de seduo.

    Voltaram e verificaram que o burro tinha feito um trabalho extremamente meticuloso,dividindo a caa em trs partes absolutamente iguais. Assim que viu os dois voltando, o burroperguntou ao leo: Pronto, compadre leo, ai est que acha da partilha?

    2 Enquanto estavam bebendo gua, o leo reparou que o rato estava sujando a gua que ele bebia.Mas isso outra fbula.3

    Os ratos devem aprender a se alimentar de ratos. Como diziam os latinos: Similia similibusjantantur.

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    Se o leo no ficou satisfeito, seu descontentamento deveu-se ao fato de aseduo servir, na verdade, para encobrir um processo de manipulao porintimidao. A intimidao nem sempre faz bem imagem que os poderosos,como o leo, querem que deles se faa. Interessava ao leo matar o burro e ficarcom a parte dele na caada, mas preferiu atribuir a culpa da morte burrice do

    burro e no sua prpria ambio e voracidade.O leo no disse uma palavra. Deu uma violenta patada na nuca do burro, prostrando-o

    no cho, morto. Sorrindo, o leo voltou-se para o rato e disse: Compadre rato, lamento muito,mas tenho a impresso de que concorda em que no podamos suportar a presena de tamanhainaptido e burrice. Desculpe eu ter perdido a pacincia, mas no havia outra coisa a fazer.

    O mesmo recurso utilizado para manipular o rato, que, no entanto, combase no exemplo do burro, l corretamente a intimidao, sob a aparncia deseduo. Quando o leo prope ao rato uma deliberao sensata, o rato nopensa em comprovar sua sabedoria na art da partilha, mas sim em fazer adiviso que o leo deseja. Interpreta bem a intimidao implcita: ou ele dava toda acaa ao leo ou o leo o matava, como fizera com o burro. O rato reconhece ser oleo capaz de cumprir ameaas e, para evitar os valores negativos que teme, v-seobrigado a atender s pretenses do leo. O final da fbula desmascara aintimidao:

    Na verdade, leo, eu nunca soube nada. Se me perdoa um elogio fnebre, se no seofende, acabei de aprender tudo agora mesmo, com o burro morto.

    A fala de Joana, em Gota ddgua, ilustra a manipulao por provocao, aindaque malsucedida. Joana provoca Jaso, chama-o de boneco de farinha e deaproveitador, com o fito de conseguir que ele volte para ela e para os filhos,mostrando, dessa forma, no ser o mau-carter que ela diz. Jaso, porm, no aceitaa manipulao, isto , no se preocupa em negar a imagem negativa que ela deleapresenta.

    Os exemplos examinados permitem organizar os tipos de manipulaosegundo dois critrios: o da competncia do manipulador, ora sujeito do saber, orasujeito do poder, e o da alterao modal, operada na competncia do sujeito

    manipulado.

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    Na fbula O leo, o burro e o rato, o rato explica ao leo o que o levou arealizar partilha to justa. O leo reconhece seus valores e, assim sendo, sancionapositivamente o rato. O leo realizou as seguintes operaes de interpretao: numprimeiro momento, diz que o rato no parecia arguto e sbio, embora o fosse(Olha, juro que nunca tinha notado, em voc, essa cultura. Como voc escondeu

    isso o tempo todo, e quem lhe ensinou tanta sabedoria?), em seguida, reconhece orato como o heri verdadeiro, cumpridor do contrato de dar ao leo a parte doleo.

    O segundo programa narrativo no percurso do destinador-julgador o dasano pragmtica ou retribuio. O sujeito reconhecido como cumpridor doscompromissos assumidos julgado positivamente e recebe uma retribuio, sob aforma de recompensa. J o sujeito desmascarado, por no ter executado sua parte nocontrato, sofre julgamento negativo e punio.

    A retribuio, como recompensa ou punio, faz parte da estruturacontratual inicial e restabelece o equilbrio narrativo, pois o momento de o destinador cumprir as obrigaes assumidas com osujeito, na hora da manipulao.

    Os textos empregados para exemplificar a sintaxe narrativa oferecemdiferentes casos de retribuio. Em Histria de uma gata,o sujeito no obedece ao contrato com o dono e, depois de julgamento negativo,recebe a punio de perder as mordomias.

    fui barrada na portaria,sem fil e sem almofadapor causa da cantoria.

    A fala de Joana comea pela apresentao das contas, ou seja, pelodesmascaramento do sujeito, e termina com o castigo: S de ambio, semamor,/ tua alma vai ficar torta, desgrenhada,/ aleijada, pestilenta... (p. 76).

    Em O gato e a barata, ao contrrio, no o sujeito que deixa de cumprir ocompromisso, como nos exemplos anteriores, mas o destinador quem no assume

    sua parte do contrato. A barata, que afirmara ao gato deixar-se engolir, se ele asalvasse, quando livre no faz o prometido. O gato no recebe, assim, arecompensa esperada.

    A fbula O leo, o burro e o rato oferece um exemplo de retribuiopositiva ou recompensa. O rato, interpretado como sujeito que realizou a partilhajusta, tem como recompensa o direito de conservar a vida.

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    Os trs percursos estudados do sujeito, do destinador-manipulador e dodestinatrio-julgador organizam-se no esquemanarrativo.

    Esquema narrativo As unidades sintticas da narrativa mantm relaohierrquica, que vai do programa ao esquema narrativo.

    Unidadessintaticas

    caracterizao actantes

    esquemanarrativo

    encadeamento lgico depercursos narrativos

    actantes funcionais: sujeito, objeto, destinador,destinatrio

    percursonarrativo

    encadeamento lgico deprogramas narrativos

    papis actanciais: sujeito competente, sujeitooperador, sujeito do querer, sujeito do saber etc.

    programanarrativo

    encadeamento lgico deenunciados

    actantes sintticos: sujeito de estado, sujeito dofazer, objeto

    A constituio de cada um dos nveis de organizao narrativa a que constado quadro da pgina seguinte.

    O esquema narrativo cannico um modelo hipottico da estruturao geralda narrativa. Cumpre o papel de ser a organizao de referncia, a partir da qual soexaminadas as expanses e variaes e estabelecidas as comparaes entrenarrativas.

    O esquema narrativo retoma as contribuies de V. Propp. Os trs percursoscomponentes do esquema podem ser cotejados com as provas proppianas,qualificante, principal e glorificante. Para Greimas o esquema procura representar,formalmente, o sentido da vida, enquanto projeto, realizao e destino. No sepode ignorar, porm, que, embora se conserve o ponto de vista de Propp nadefinio do esquema, muitas mudanas ocorreram no estudo da narrativa. Aprincipal delas parece ser o reconhecimento dos dispositivos modais da narrativa,

    que levam reinterpretao da sintaxe narrativa como uma sintaxe modal.

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    O estudo da narrativa deixou de restringir-se ao exame da ao, para ocupar-se tambm da manipulao, da sano e da determinao da competncia do sujeitoe de sua existncia passional.

    Para encerrar este longo captulo sobre a sintaxe narrativa, sero retomadas

    as duas definies de narrativa inicialmente propostas: sucesso de estados e detransformaes; sucesso de estabelecimentos e de rupturas de contratos. Aprimeira definio adota a perspectiva do sujeito e de sua ao; a segunda, a dasrelaes entre o destinador e o destinatrio-sujeito O esquema narrativo engloba osdois pontos de vista e simula a histria do homem. A partir de certos valores e dedeterminados contratos o homem age e transforma o mundo, procura dessesvalores. Ope-se, na busca, a sujeitos interessados nos mesmos valores ecomprometidos com outros destinadores. Cumprido ou no o acordo, o sujeito,sua ao e os resultados dela s cobraro sentido quando reconhecidos einterpretados no quadro de um sistema de valores.

    Os esquemas narrativos, assim como as demais unidades sintticas,organizam-se hierarquicamente, podendo um texto contar com um esquemanarrativo a que outros estejam subordinados.

    No texto de Jos Cndido de Carvalho, Toda honestidade tem sua fitamtrica (1972, p. 4-5), h esquemas hierarquizados e delimitam-se claramente ostrs segmentos do esquema narrativo, embora a nfase no esteja no percurso dodestinador-manipujador.

    CRAVINO DIAS, encharcado de gua de matar gato, subiu para o alto da torre da Igrejade Nossa Senhora do Parto e deu de gritar:

    Vou criar asa, minha gente! Vou virar aeroplano. Se morrer, meu bondoso primoSicarino Dias, que mora em Morrinhos, est capacitado para mandar um relatrio de minha lavraao pessoal do governo. Triste de Jacubais do Norte se meu relatrio abrir a boca. Fecha esteninho de sem-vergonhismo, de no abrir em derredor de cem anos. No fica uma reputao emp. Nem o sacristo Cravino Papa-Hstia escapa, que o maior beliscador de popa de moa quej vi. Meu relatrio, povo de Jacubais do Norte, pior que mordida de lobisomem em noite desexta-feira. Pega todo mundo. pedir a Deus que meu relatrio no saia ventando peloscompartimentos do governo. E madeira de dar em doido!

    Diante de tamanha ameaa, Jacubais do Norte mobilizou os prstimos do Dr. VarjoDourado, sujeito de muito respeito, de colarinho engomado, sempre de preto, do chapu sbotinas. Nunca, em vinte anos, soltou uma risada. Quando esse boitat chegou na Praa daMatriz, recebeu de Cravino uma tijolada de desmontar os parafusos. Neste jeito empenado:

    Logo quem vem falar comigo! Varjo do cartrio! Esse, minha gente, no agentameia sindicncia. Pega logo trinta anos de cadeia no abrir da primeira pgina. Com partezinha delavrar escrituras, o maior dilapidador de vivas de Jacubais do Norte. No perde uma! Esteboitat puxa o estandarte do meu relatrio. Para que esse avassalador papel no rolasse para asmos do governo, como uma cascavel de chocalho aceso, Jacubais do Norte fez uma subscriode modo a limpar todas as dvidas de Cravino Dias, desde que mamou at que botou sapato nop. Cravino j desceu da torre da Igreja de Nossa Senhora do Parto com um cargo de bons

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    O texto mostra sobretudo os recursos utilizados pelo destinador Cravinopara estabelecer o contrato de confiana e persuadir o destinatrio a aceitar oacordo. O destinatrio, para ser convencido, precisa acreditar em que:

    a) a ameaa o atinge em coisas que tm, para ele, valor (Triste de Jacubais

    do Norte se meu relatrio abrir a boca. Fecha este ninho de sem-vergonhismo, deno abrir em derredor de cem anos. No fica uma reputao em p);

    b) o destinador-manipulador pode (tem poder para) cumprir a ameaa. (Eleprecisar, no caso, conhecer as falcatruas e sem-vergonhices que promete delatar.Mostra esse conhecimento ao mencionar alguns fatos: Nem o sacristo CravinoPapa-Hstia escapa, que o maior beliscador de popa de moa que j vi [...] Varjodo cartrio! Esse, minha gente, no agenta meia sindicncia. Pega logo trinta anosde cadeia no abrir da primeira pgina. Com partezinha de lavrar escrituras, omaior dilapidador de vivas de Jacubais do Norte. No perde uma! Este boitat

    puxa o estandarte do meu relatrio);

    c) o destinador-manipulador quer, realmente, cumprir a ameaa (o fato de elesubir no alto da torre da Igreja de Nossa Senhora do Parto e de deixar o relatriocom um primo, de nome e endereo citados, fazem crer em sua pretenso).

    Ao fazer persuasivo do destinador, acima descrito, segue-se o fazerinterpretativo do destinatrio, que reconhece como seus os valores empregados namanipulao e acredita na capacidade do destinador em cumprir as ameaas. Odestinatrio, assim persuadido, no tem escolha: ou se deixa manipular e fazo que odestinador deseja ou escapa da manipulao e sofre as conseqncias previstas naintimidao.

    O destinatrio aceita, portanto, a manipulao e o acordo proposto, paraevitar os castigos e poder continuar a manter as aparncias e praticar impunementeas falcatruas sugeridas. Como sujeito, realiza, ento, a perfrmance exigida.

    Para que esse avassalador papel no rolasse para as mos do governo, como uma cascavelde chocalho aceso, Jacubais do Norte fez uma subscrio de modo a limpar todas as dvidas deCravino Dias, desde que mamou at que botou sapato no p. Cravino j desceu da torre da Igreja

    de Nossa Senhora do Parto com um cargo de bons dinheiros no cartrio do Dr. Varjo Dourado.

    No percurso do sujeito, o sujeito povo de Jacubais do Norte executa aao de pagar as dvidas de Cravino, garantir-lhe boa vida e compra, assim, o seusilncio. Consegue que Cravino desa da torre e aceite o emprego no cartrio. Odesmascaramento, graas ao do sujeito, foi evitado e no se interrompeu, enfim,o reconhecimento positivo e o recebimento de recompensas, no percurso dasano.

    Cravino, por sua vez, muda de posio na narrativa. Em lugar de realizar opapel actancial de destinador-manipulador e julgador do povo de Jacubais doNorte, passa a ocupar a casa do sujeito das falcatruas e das sem-vergonhices

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    encobertas e recompensadas: Meu tempo de aeroplano j passou. Agora sou dacaixa registradora.

    Esto claros, nesta narrativa, os valores que a organizam e que permitemcaracterizar a vida social pelas aparncias que ocultam fraudes e pela honestidade

    que o dinheiro compra. O desdobramento polmico aparece nos dois esquemashierarquizados. Dessa forma a ao do sujeito importantes do lugar, com o fimde adquirir dinheiro e prazeres, priva desses valores o anti-sujeito vivas, moasetc. e impede, ao comprar Cravino, no s o desmascaramento do vilo, mastambm o reconhecimento e a recompensa do verdadeiro heri.

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    3Semntica narrativa

    O captulo sobre a semntica narrativa examinar apenas e de modo bemsuperficial duas questes: a da modalizao e a das paixes dela decorrentes.

    No percurso gerativo, a semntica narrativa o momento em que oselementos semnticos so selecionados e relacionados com os sujeitos. Para isso,esses elementos inscrevem-se como valores, nos objetos, no interior dosenunciados de estado. Em Histria de uma gata, o sujeito gata est em relao deconjuno com os valores de alimento, abrigo, proteo e amor, inseridos nosobjetos manifestados como fil-mignon, apartamento, carinhos.

    As relaes do sujeito com os valores podem ser modificadas pordeterminaes modais. A relao de juno existente entre o sujeito gata e ovalor alimento est determinada, no texto, como uma relao desejvel a gataquero valor alimento e possvel a gata pode ter a comida.

    Do mesmo modo, a relao do sujeito com seu fazer sofre qualificaesmodais. A gata, ao ouvir os gatos de rua, passa a querer-fazer alguma coisa sair decasa para obter o valor de liberdade.A modalizao de enunciados de estado tambm denominada modalizao do sere

    atribui existncia modal ao sujeito de estado.

    A modalizao de enunciados do fazer , por sua vez, responsvel pelacompetncia modal do sujeito do fazer, por sua qualificao para a ao, conformese verificou nos itens sobre os programas narrativos de competncia e amanipulao.

    Tanto para a modalizao do ser quanto para a do fazer, a semitica prevessencialmente quatro modalidades: o querer, o dever, o podere o saber.

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    No tive um filho de meu.Um filho!... No foi de jeito...Mas trago dentro do peitoMeu filho que no nasceu.Criou-me, desde eu menino,Para arquiteto meu pai.

    Foi-se-me um dia a sade...Fiz-me arquiteto? No pude!Sou poeta menor, perdoai!No fao versos de guerra.No fao porque no sei.Mas num torpedo-suicidaDarei de bom grado a vidaNa luta em que no lutei!

    29 de janeiro de 1943.

    H no poema incompatibilidades entre o querere o saberou o poder, ou seja, osujeito quer fazer, mas no o sabe ou pode. Faltam-lhe esses elementos decompetncia, e, por conseguinte, o sujeito no se realiza pela ao, no obtm osvalores almejados, ao mesmo tempo que se conserva como sujeito virtual, que quer.O poema mostra, porm, que pelo fato de no-saber-fazer (No fao versos deguerra./ No fao porque no sei.) ou de no-poder-fazer (No tive um filho demeu./ Um filho!... No foi de jeito.../ [...] Criou-me, desde eu menino,/ Paraarquiteto meu pai./ Foi-se-me um dia a sade.. ./ Fiz-me arquiteto? No pude!), osujeito virtual do querer desenvolveu um outro saber e um outro poder, qual seja ode fazer na fantasia e na imaginao, o de criar na poesia. Para isso, no lhe faltacompetncia.

    A determinao e a organizao da competncia modal do sujeito permitemsubstituir as casas vazias ou neutras da emisso e da recepo, na teoria dacomunicao, por sujeitos dotados de competncia modal varivel (Greimas,1983, p. 115) e abrem caminho para um melhor tratamento das relaesintersubjetivas.

    ModaIizao do ser A lingstica e a semitica temeram sempre o

    psicologismo e evitaram a recada nos estudos de caracteres e de temperamentos,que durante um certo tempo marcaram os estudos do texto. Com medo deincorrerem no mesmo erro, deixaram de lado certos aspectos imprescindveis doexame do texto. O amadurecimento e a segurana, atualmente alcanados nasanlises discursivas, permitiram semitica avanar na abordagem das paixes, semtemer um retrocesso no caminho duramente percorrido. Os resultados dos estudosda modalizao do ser foram, sem dvida nenhuma, fundamentais para esseavano.

    Dois ngulos devem ser examinados, na modalizao do ser: o da

    modalizao veridictria, que determina a relao do sujeito com o objeto, dizendo-a verdadeira ou falsa, mentirosa ou secreta, e o da modalizao pelo querer, dever,

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    poder e saber, que incide especifica- mente sobre os valores investidos nos objetos.As modalidades veridictrias articulam-se como categoria modal, em / ser/vs./ parecer/ .

    (Greimas e Courts, s.d., p.488)

    Com a modalizao veridictria substitui-se a questo da verdade pelada veridico ou do dizer verdadeiro: um estado considerado verdadeiro quando umsujeito, diferente do sujeito modalizado, o diz verdadeiro. Parte-se do parecer ou dono-parecer da manifestao e constri-se ou infere-se o ser ou o no-ser daimanncia. O rato da fbula O leo, o burro e o rato interpreta o leo e suasaes: ele parece leo, autoritrio e opressor, na voz tonitruante, ao dar asordens, ao matar o burro, e o rato infere que ele leo. S o burro acredita natentativa do leo de esconder sua ferocidade (coro voz tonitruante que procurava

    inutilmente suavizar, berrou:; Sorrindo, o leo voltou-se para o rato). O burroincorreu no mesmo erro de interpretao que o gato da fbula O gato e a barata.O gato, como bem lembrou a barata, apesar da aparncia pouco confivel de umabarata velha e bbada, concluiu que ela era sincera e nela acreditou. J em Todahonestidade tem sua fita mtrica, o sacristo e o escrivo manifestam um parecerde santidade e de honestidade (Diante de tamanha ameaa, Jacubais do Nortemobilizou os prstimos do Dr. Varjo Dourado, sujeito de muito respeito, decolarinho engomado, sempre de preto, do chapu s botinas. Nunca, em vinteanos, soltou uma risada), mas, por baixo de tanta santidade, Cravino revela aessncia da sem-vergonhice!

    A modalizao veridictria relaciona-se ao fazer interpretativo, examinadono item sobre manipulao.

    Diz respeito tambm modalizao do ser, a determinao pelasmodalidades do querer, saber, dever e poderdarelao do sujeito com os valores. Essetipo de modalizao altera a existncia modal do sujeito, como ocorre com Jaso, notrecho citado de Gota dgua. Nele, modifica-se a relao de Jaso com o dinheiro ea fama: Jaso queria no ser(ou seja tinha um puto dum medo de olhar pro

    mundo) e passa, graas a Joana, a no querer no sere, finalmente, a querer ser(E foiassim, enfim, que eu vi nascer do nada/ uma alma ansiosa, faminta, buliosa,/ umaalma de homem). Da mesma forma, transforma-se sua relao com o poder, da

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    impossibilidade ou no poder ser para a possibilidade ou poder ser. No entanto,surge umsegundo horizonte e Joana no mais capaz de tornar possveis todasas relaes que Jaso passou a considerar desejveis. Pode-se representar noesquema da pgina seguinte o percurso modal do sujeito Jaso.

    Os efeitos de sentido desses dispositivos modais podem ser reconhecidoscomo medo, ambio ou amor. Em outras palavras, a modalizao do ser produzefeitos de sentido afetivos ou passionais.

    1) antes de Joana 2) com Joana e o samba 3) aps o 1 sucessoquer no ser quer ser quer serno pode ser pode ser no pode ser

    4) com Creonte 5) segundo a maldio de Joanaquer ser quer ser

    pode ser no pode ser

    As paixes, do ponto de vista da semitica, entendem-se como efeitos desentido de qualificaes modais que modificam o sujeito de estado. Essasqualificaes organizam-se sob a forma de arranjos sintagmticos de modalidades ouconfiguraes passionais.

    A lgica e a psicanlise, em geral, tm preocupaes taxionmicas, quandoabordam as paixes. Tomou-se aqui o caminho inverso do processo, ao tentardeterminar qual o arranjo modal e qual a estrutura narrativa que caracterizam esustentam as denominaes de paixes, como a clera, a frustrao, o amorou aindiferena. Trata-se, em suma, de descrev-las com uma sintaxe narrativa modal emque se examinem as combinaes de modalidades.

    Numa narrativa, o sujeito segue um percurso, ou seja, ocupa diferentesposies passionais, saltando de estados de tenso e de disforia para estados derelaxamento e de euforia e vice-versa.

    Distinguem-se paixes simples e paixes complexas, pelo critrio da

    complexidade sinttica do percurso. As paixes simples resultam de um nicoarranjo modal, que modifica a relao entre o sujeito e o objeto-valor; enquanto aspaixes complexas so efeitos de uma configurao de modalidades, que sedesenvolve em vrios percursos passionais.

    O conto de Machado de Assis, Papis velhos (1952, p. 133-45), de que seextrairo alguns trechos, fornecer os exemplos necessrios a uma apresentaorpida da semitica das paixes!

    Tudo isso iria menos mal, se o Brotero no cobiasse ambas as fortunas, a pasta e a viva;

    mas, cobi-las, cortej-las e perd-las, sem que ao menos uma viesse consol-lo da perda daoutra, digam-me francamente se no era bastante a explicar a renncia do nosso amigo (p. 137).

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    Nesse conto, o deputado Brotero esperava tanto ser escolhido para ministrono Gabinete que se organizava quanto casar-se com uma viva gentil eabastada, desejos que no se concretizaram.

    A paixo da cobia (da ambio, do anseio) uma paixo simples: o querer-ser

    qualifica a relao do sujeito Brotero com os objetos ministrio e viva,fazendo-a desejvel. No necessrio retomar nenhum percurso narrativo modalanterior, para a compreenso do efeito passional da cobia. Acontecediferentemente com as paixes da frustrao e da decepo de Brotero e para as quaisparece precisar de consolo. Para se entender a frustrao e a decepo, devem-seprever estados passionais anteriores e transformaes que desemboquem nassituaes de frustrao e de decepo. S o sujeito que ambicionar um objeto-valore que acreditar poder obt-lo sofrer a frustrao, se no o conseguir; s o sujeitoque esperar de outro a realizao de suas aspiraes ficar com ele decepcionado, seelas no se concretizarem. H, portanto, um percurso passional marcado por

    determinaes modais, que produz os efeitos passionais em exame.

    As paixes simples decorrem da modalizao pelo querer-ser. H paixes emque o sujeito quer o objeto-valor, como na cobia, na ambio ou no desejo; outras emque o sujeito no quer o objeto-valor, como na repulsa, no medo ou na averso; outrasainda em que ele deseja no ter certos valores, como no desprendimento, nagenerosidade ou na liberalidade; e, finalmente, aquelas em que o sujeito no quer deixarde ter valores, como na avareza ou na sovinice. As paixes simples diferenciam-sepela intensidade do querer e pelo tipo de valor desejado. O desejo de valores

    cognitivos caracteriza, por exemplo, a curiosidade ou o querer-saber.As paixes complexas, conforme foi dito acima, prevem a explicao de

    todo um percurso passional. Ilustram-se as paixes complexas com a carta-rennciade Brotero, dirigida, aps as perdas sofridas, ao Presidente do Conselho, no contode Machado:

    Excelentssimo senhor.

    H de parecer estranho a V. Ex. tudo o que vou dizer neste papel; mas, por mais estranhoque lhe parea, e a mim tambm, h situaes to extraordinrias que s comportam soluesextraordinrias. No quero desabafar nas esquinas, na rua do Ouvidor, ou nos corredores daCmara. Tambm no quero manifestar-me na tribuna, amanh ou depois, quando V. Ex. forapresentar o programa do seu ministrio; seria digno, mas seria aceitar a cumplicidade de umaordem de coisas, que inteiramente repudio. Tenho um s alvitre: renunciar cadeira de deputadoe voltar vida ntima.

    No sei se, ainda assim, V. Ex. me chamar despeitado. Se o fizer, creio que ter razo. Mas rogo-lhe que advirta que h duas qualidades de despeito, e o meu da melhor. No pense V. Ex. querecuo diante de certas deputaes influentes, nem que me senti ferido pelas intrigas do A... e portudo o que fez o B... para meter o C... no ministrio. Tudo isso so coisas mnimas. A questopara mim de lealdade, j no digo poltica, mas pessoal: a questo com V. Ex. Foi V. Ex. queme obrigou a romper com o ministrio dissolvido, mais cedo do que era minha inteno, e,talvez, mais cedo o que convinha ao partido. Foi V. Ex. que, uma vez, em casa do Z..., me disse,a uma janela, que os meus estudos de questes diplomticas me indicavam naturalmente a pasta

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    de estrangeiros. H de lembrar-se que lhe respondi ento ser para mim indiferente subir aoministrio, uma vez que servisse ao meu pas. V. Ex. replicou: muito bonito, mas os bonstalentos querem-se no ministrio.

    Na Cmara, j pela posio que fui adquirindo, j pelas distines especiais de que era objeto,dizia-se, acreditava-se que eu seria ministro na primeira ocasio; e, ao ser chamado V. Ex. ontem

    para organizar o novo gabinete, no se jurou outra coisa. As combinaes variavam, mas o meunome figurava em todas elas. que ningum ignorava as finezas de V. Ex. para comigo, osbilhetes em que me louvava, os seus reiterados convites, etc. Confesso a V. Ex. que acompanhei aopinio geral. A opinio enganou-se, eu enganei-me; o ministrio est organizado sem mim.Considero esta excluso um desdouro irreparvel, e determinei deixar a cadeira de deputado aalgum mais capaz, e, principalmente, mais dcil. No ser difcil a V. Ex. ach-lo entre os seusnumerosos admiradores. Sou, com elevada estima e considerao,

    De V. Ex. desobrigado amigo,

    Brotero.

    O estado inicial do percurso das paixes complexas denominado porGreimas (1983) estado de espera. A espera define-se pela combinao demodalidades, pois o sujeito deseja um objeto (querer-ser) mas nada faz paraconsegui-lo e acredita (crer-ser) poder contar com outro sujeito na realizao desuas esperanas ou na obteno de seus direitos. Caracteriza-se, portanto, pelaconfiana no outro e em si mesmo e pela satisfao antecipada ou imaginada daaquisio do valor desejado. Ao saber impossvel a realizao do seu querereinfundadas as suas crenas, o sujeito passa ao estado de insatisfao e de decepo:

    relaxamento da espera inteno

    satisfao (imaginada) insatisfao

    confiana decepo

    Na carta em exame, Brotero exprime claramente sua insatisfao e suadecepo, explicando-as pela espera pressuposta. D nfase sobretudo decepo, crise de confiana em que se encontra no momento de redao da carta: Aquesto para mim de lealdade, j no digo poltica, mas pessoal: a questo comV. Ex. Foi V. Ex. que me obrigou a romper com o ministrio dissolvido, mais cedodo que era minha inteno, e, talvez, mais cedo do que convinha ao partido. Foi V.Ex. que, uma vez, em casa do Z..., me disse, a uma janela, que os meus estudos dequestes diplomticas me indicavam naturalmente a pasta de estrangeiros. H delembrar-se que lhe respondi ento ser para mim indiferente subir ao ministrio,uma vez que servisse ao meu pas. V. Ex. replicou: muito bonito, mas os bonstalentos querem-se no ministrio (p. 135). Nesse trecho, mostra-se que o sujeitoacreditava piamente que ia ser escolhido para ministro e que o Conselheiro devia-lhea indicao pelos acordos anteriormente estabelecidos (As combinaes variavam,

    mas o meu nome figurava em todas elas. E que ningum ignorava as finezas de V.Ex. para comigo, os bilhetes em que me louvava, os seus reiterados convites, etc.Confesso a V. Ex. que acompanhei a opinio geral) (p. 136). A carta marca bem

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    sua desiluso com o Conselheiro, que, a seu ver, foi desleal e no cumpriu sua parteno compromisso assumido, O Conselheiro, no papel de destinador, manipulou odeputado Brotero por tentao, ao acenar-lhe com um ministrio: Brotero agiu deacordo com os desejos do Conselheiro, que no lhe concedeu, em contrapartida, oreconhecimento e retribuio devidos. No o fez ministro, O deputado interpreta o

    fato de no ter sido indicado como algo extraordinrio, como uma ruptura nopercurso narrativo.

    H de parecer estranho a V. Ex. tudo o que vou dizer neste papel; mas, por mais estranhoque lhe parea, e a mim tambm, h situaes to extraordinrias que s comportam soluesextraordinrias (p. 134).

    O contrato de confiana estabelecido entre sujeitos no necessariamenteum contrato verdadeiro, mas, na maior parte das vezes, um contrato imaginrio,um simulacro (Greimas, 1983). Os simulacros no tm fundamento intersubjetivo,

    embora determinem, mesmo assim, as relaes entre sujeitos. O Conselheiro, noexemplo, pode sempre afirmar que nunca prometera nada a Brotero, o que noinvalida a confiana nele depositada pelo deputado. Brotero construiu umsimulacro que determinou seu relacionamento com os outros e tambm suas aese, de repente, viu malograr sua confiana.

    As paixes de insatisfao e/ ou de decepo denominam-se, em portugus,amargura (efeitos passionais de insatisfao e de decepo), desiluso ou desengano(efeitos passionais de decepo apenas), frustrao (efeitos passionais de insatisfao)e outros. As paixes contrrias, isto , de satisfao e de confiana, ocorrem como

    alegria e felicidade (efeitos da satisfao pela obteno do objeto), esperana e iluso(efeitos passionais da confiana no outro).

    Iluso e felicidade eram as paixes de Brotero enquanto acreditava na suafutura indicao para o ministrio e se alegrava com as distines especiais de queera objeto na Cmara e com as finezas do Conselheiro. A notcia da indicao donovo ministrio viria, assim, comprovar-lhe e renovar-lhe a crena e a alegria ou,como aconteceu, lev-lo crise de confiana.

    A insatisfao e a decepo conduzem, por sua vez, a outros estados,conforme as mudanas narrativas ocorridas: ou se volta situao inicial deconfiana e de satisfao, ou se passa, pelo recrudescimento do sentimento de faltaou de perda, s situaes de aflio ede insegurana. A insegurana e a aflio sopaixes tensas, resultantes da certeza do sujeito de que no conseguir os valoresalmejados e de que o sujeito em quem depositou confiana no era dela merecedor.Surge o sentimento de falta, e o sujeito aflito e inseguro encontra-se em situaoinsustentvel de tenso. A falta resolve-se de duas formas: pela reparao ou pelaresignao e conformao.

    O texto da carta ilustra a insegurana e a aflio de Brotero, assim como suatentativa de liquidao da falta. A aflio e a insegurana exprimem-se nos trechoscomo A opinio enganou-se, eu enganei-me; o ministrio est organizado sem

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    mim. Considero esta excluso um desdouro irreparvel, e determinei deixar acadeira de deputado a algum mais capaz, e, principalmente, mais dcil (p. 136),onde se l o desespero pela perda do cargo e a insegurana nos relacionamentos,pois no sabe mais em quem acreditar. A reparao da falta manifesta-se, emprimeiro lugar, sob a forma da hostilidade do sujeito para com o responsvel por

    suas perdas. Ao dizer que renuncia cadeira de deputado (p. 134) ou que a deixapara algum mais capaz e principalmente, mais dcil (p. 136), Brotero rompe ocontrato com o destinador desleal, que no cumpriu o compromisso assumido, eregistra o sentimento de malquerena que marca seu novo relacionamento com oConselheiro. Esse desejo de fazer mal instala, pelo querer-fazer, o sujeito reparadorda falta. Para liquidar a falta, o sujeito malevolente deve ser ainda modalizado pelopoder-fazer. O poder-fazermanifesta-se como a possibilidade de destruio doofensor, graas ao desejo desse aniquilamento provocado pelo sentimento de honraofendida. No texto de Machado, o cargo de deputado oferece a Brotero apossibilidade de prejudicar o Conselheiro: No quero desabafar nas esquinas, na

    rua do Ouvidor, ou nos corredores da Cmara. Tambm no quero manifestar-mena tribuna, amanh ou depois, quando V. Ex. for apresentar o programa do seuministrio (p. 134).

    Qualificado pelo querer-fazer mal a quem o ofendeu e pelo poder de faz-lo,o sujeito Brotero est pronto para reparar a falta, pela vingana ou pela revolta.Trata-se, no caso, de revolta contra o destinador injusto. Segundo Fontanille, osujeito revoltado rejeita o destinador, mas no os valores que o destinadorrepresenta, ou seja, Brotero descr do Conselheiro, mas continua a acreditar no

    sistema de que faz parte e em que permanece.O sujeito da malevolncia vive as paixes da hostilidade, da antipatia, da averso,

    enquanto os sujeitos que podem reparar a falta sofrem o dio, a clera, a raiva ou orancor. Brotero um sujeito encolerizado.

    Do mesmo modo que a insatisfao e a decepo levam malquerena dahostilidade e do dio, a satisfao e a confiana conduzem benquerena daafeio, sob a forma do amor, da amizade, da estima ou da simpatia.

    O exemplo escolhido mostrou, em resumo, que as paixes complexas seexplicam como uma configurao modal sustentada pela organizao narrativa. Orancor de Brotero define-se pelo querer e poder fazer mal ao destinador que nocumpriu o compromisso assumido, segundo interpretao de Brotero. Broteropercorreu as etapas passionais da espera satisfeita e confiante, da frustrao e dadecepo, da aflio e da insegurana devido falta sofrida, que lhe despertaram orancorto bem expresso na carta.

    O exame das paixes, sob a forma de percursos modais, explica aorganizao semntica da narrativa, ou seja, os estados de alma dos sujeitos,modificados no desenrolar da histria.

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    4Sintaxe discursiva

    Sero apresentados nos captulos 4 e 5os elementos fundamentais para aanlise das estruturas discursivas, tal como os concebe a teoria semitica. Asemitica constri os sentidos do texto sob a forma de um percurso gerativo. Onvel discursivo o patamar mais superficial do percurso, o mais prximo damanifestao textual. Pela prpria definio do percurso gerativo, as estruturasdiscursivas so mais especficas, mas tambm mais complexas e enriquecidassemanticamente, que as estruturas narrativas e as fundamentais. Pelo exame dasintaxe e da semntica do discurso, sero explicadas a especificidade e acomplexidade das organizaes discursivas.

    As estruturas narrativas convertem-se em estruturas discursivas quandoassumidas pelo sujeito da enunciao. O sujeito da enunciao faz uma srie deescolhas, de pessoa, de tempo, de espao, de figuras, e conta ou passa anarrativa, transformando-a em discurso. O discurso nada mais , portanto, que a

    narrativa enriquecida por todas essas opes do sujeito da enunciao, quemarcam os diferentes modos pelos quais a enunciao se relaciona com o discursoque enuncia. A anlise discursiva opera, por conseguinte, sobre os mesmoselementos que a anlise narrativa, mas retoma aspectos que tenham sido postos delado, tais como as projees da enunciao no enunciado, os recursos de persuasoutilizados pelo enunciador para manipular o enunciatrio ou a cobertura figurativados contedos narrativos abstratos.

    A enunciao caracteriza-se, em primeira definio, como a instncia demediao entre estruturas narrativas e discursivas. Pode, nas diversas concepes

    lingsticas e semiticas, ser reconstruda a partir sobretudo das marcas queespalha no discurso. nas estruturas discursivas que a enunciao mais se revela e

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    onde mais facilmente se apreendem os valores sobre os quais ou para os quais otexto foi construdo. Analisar o discurso , portanto, determinar, ao menos emparte, as condies de produo do texto.

    Cabe sintaxe do discurso explicar as relaes do sujeito da enunciao com

    o discurso-enunciado e tambm as relaes que se estabelecem entre enunciador eenunciatrio. O discurso define-se, ao mesmo tempo, como objeto produzido pelosujeito da enunciao e como objeto de comunicao entre um destinador e umdestinatrio.

    Os dois tipos de mecanismos sintticos confundem-se, em geral, pois osdispositivos empregados na produo do discurso servem tambm de meios depersuaso, utilizados pelo enunciador para convencer o enunciatrio da verdadedo seu texto.

    Projees da enunciao A semitica examina as relaes entreenunciao e discurso sob a forma das diferentes projees da enunciao com asquais o discurso se fabrica. A enunciao projeta, para fora de si, os actantes e ascoordenadas espcio-temporais do discurso, que no se confundem com o sujeito,o espao e o tempo da enunciao. Essa operao denomina-se desembreagem e nelaso utilizadas as categorias da pessoa, do espao e do tempo.

    Em outras palavras, o sujeito da enunci