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O ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO SOCIAL DE MATO GROSSO X DIREITOS SOCIAIS GARANTIDOS PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. Loide Santana Pessoa 1 Resumo A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 garante diversos direitos sociais para garantir o exercício da cidadania, dentre eles podemos citar: Alimentação, trabalho, renda, educação, saúde, assistência médica e social, habitação e segurança, água tratada, lazer, saneamento básico, energia elétrica, ambiente saudável, previdência social, transparência governamental, participação popular, dentre outras. Neste artigo pretende-se analisar se as variáveis que compõem o índice de Desenvolvimento Social dos Municípios criado pelo Estado de Mato Grosso são suficientes para aferir o desenvolvimento social tendo como a efetivação dos direitos sociais reconhecidos pela Carta Magna de 1988. Palavras-Chaves:Direitos sociais, cidadania, índice de desenvolvimento social. Abstratct The Constitution of the Federative Republic of Brazil in 1988 ensures various socialduties to ensure the exercise of citizenship, among them include: Food, work, income,education, health, medical and social assistance, housing and security, clean water, recreation, sanitation basic electricity, healthy environment, social security, government transparency, popular participation, among others. This article attempts to analyze the variables that comprise the index of the Municipal Social Development established by the State of Mato Grosso are sufficient to assessthe social development as having the realization of social rights granted by the Constitution of 1988. Key Words: Social rights, citizenship, social development index. I. INTRODUÇÃO 1 Estudante de Pós Graduação. Universidade Federal do Mato Grosso – UFMT . [email protected]

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O ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO SOCIAL DE MATO GROSSO X DIREITOS

SOCIAIS GARANTIDOS PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988.

Loide Santana Pessoa1

Resumo

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 garante diversos direitos sociais para garantir o exercício da cidadania, dentre eles podemos citar: Alimentação, trabalho, renda, educação, saúde, assistência médica e social, habitação e segurança, água tratada, lazer, saneamento básico, energia elétrica, ambiente saudável, previdência social, transparência governamental, participação popular, dentre outras. Neste artigo pretende-se analisar se as variáveis que compõem o índice de Desenvolvimento Social dos Municípios criado pelo Estado de Mato Grosso são suficientes para aferir o desenvolvimento social tendo como a efetivação dos direitos sociais reconhecidos pela Carta Magna de 1988. Palavras-Chaves:Direitos sociais, cidadania, índice de desenvolvimento social.

Abstratct

The Constitution of the Federative Republic of Brazil in 1988 ensures various socialduties to ensure the exercise of citizenship, among them include: Food, work, income,education, health, medical and social assistance, housing and security, clean water, recreation, sanitation basic electricity, healthy environment, social security, government transparency, popular participation, among others. This article attempts to analyze the variables that comprise the index of the Municipal Social Development established by the State of Mato Grosso are sufficient to assessthe social development as having the realization of social rights granted by the Constitution of 1988. Key Words: Social rights, citizenship, social development index.

I. INTRODUÇÃO

1 Estudante de Pós Graduação. Universidade Federal do Mato Grosso – UFMT . [email protected]

O que permite avaliar o nível de desenvolvimento social de um país ou região é

a proporção de pessoas que têm suas necessidades básicas satisfeitas: Alimentação

necessária para atender os requisitos nutricionais mínimos, trabalho, renda mínima

para atender suas necessidades básicas, acesso à educação, à saúde e assistência

médica, habitação e segurança, água tratada, acesso a área de lazer, saneamento

básico, energia elétrica, ambiente saudável, assistência social, transparência dos

órgãos públicos, meios e condições para a efetiva participação popular na elaboração

do plano de governo.

Essas necessidades básicas e outras mais estão reconhecidas em vários

dispositivos da Constituição Federal de 1988, dentre eles os incisos I, III e IV do artigo

2.º, artigos 6º a 11, incisos VII e VIII do artigo 170 e artigos 193 a 217 e 225 a 227.

Para auferir se um país ou região estão promovendo a cidadania e a inclusão

social por meio do respeito aos direitos sociais, é necessário que os indicadores

sociais sejam completos e adequados como já vem sendo demonstrado por entidades

internacionais (como por exemplo, a Comissão de Estatística das Nações Unidas que

em sessão de 29/02/1997 aprovou a adoção de um conjunto de indicadores sociais

para compor uma base de dados nacionais mínimas (MNSDS) a ser utilizada pelos

países membros e que já é adotada pelo IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística e pelo IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – na utilização de

indicadores para analisar as políticas sociais do Brasil.

Assim sendo, o objeto do presente artigo é verificação da compatibilidade das

variáveis atualmente utilizadas pelo Estado de Mato Grosso na elaboração do índice

de Desenvolvimento Social dos Municípios de Mato Grosso – IDS-M, com os direitos

sociais reconhecidos na Constituição Federal de 1988.

II. INDICADORES SOCIAIS CRIADOS PELO ESTADO DE MATO GROSSO,

ESTADO SOCIAL E DESENVOLVIMENTO:

2.1. Instituição do “Índice de Desenvolvimento Social – IDS-M” no Estado de

Mato Grosso:

O Estado de Mato Grosso, por meio da Lei n.º 9.391 de 14 de junho de 2010,

criou o Índice de Desenvolvimento Social dos Municípios de Mato Grosso – IDS-M,

estabelecendo que na elaboração do IDS-M deve ser considerado como variável

relevante para a indicação dos resultados obtidos pelos municípios, “especialmente”

os esforços dos gestores públicos na área de saúde, educação, renda, finanças

públicas e meio ambiente.

As variáveis acima enumeradas não são suficientes para se aferir o

desenvolvimento social de um Município, pois não estão sendo considerados outros

direitos sociais relevantes e necessários para a inclusão social, o exercício da

cidadania e uma sobrevivência digna, os quais já foram reconhecidos pela

Constituição Federal de 1988: moradia, renda, trabalho, alimentação, lazer e outros.

Além disso, a variável "finanças públicas" não é conceitualmente um direito

social, ela nem está, conseqüentemente, incluída entre os direitos sociais

reconhecidos na Constituição Federal.

Observa-se que em outros Estados (Ceará, Bahia, Santa Catarina) as diretrizes

metodológicas na elaboração do índice de desenvolvimento social também são

incompletas e isto acontece porque o Ministério de Desenvolvimento Social e de

Combate à fome (MDS), criado por meio da Medida Provisória n.º 163 de 23/01/042,

não vem cumprindo com a sua função de elaborar Políticas de Desenvolvimento

Social para o Brasil e, ainda de estabelecer diretrizes e normas, orientar, supervisionar

e avaliar a execução das políticas de desenvolvimento social, segurança alimentar e

2 Convertida na Lei n.º 10.869 de 13/05/04, a qual por sua vez altera a Lei n.º 10.683 de 28/05/03

que dispõe sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios

nutricional, de renda, cidadania e de assistência social conforme o art. 27, inciso II,

alíneas “a” “e” e “h” da Lei n.º 10.683/2003.

2.2. Estado Social, Políticas Públicas X Políticas Sociais:

O Estado Social, de acordo com Pereira (2007, p.31-41 e 33) ao traçar um

breve histórico da emergência, afirmação e crise do Estado social, se caracteriza pela

proteção social básica que dá a todos os cidadãos, independentemente de renda e da

sua capacidade de contribuição para o financiamento do sistema. Necessário salientar

que essa proteção social foi resultado da participação dos trabalhadores nas lutas por

melhores condições de trabalho e qualidade de vida e representa um

aperfeiçoamento político-institucional importante.

No Brasil, no período de 1930-1945, o populismo de Vargas possibilitou a

concessão de direitos sociais principalmente os relacionados com o trabalho

(Carvalho, 2008, p.126). Porém, esses direitos não eram vistos como tais, como

independentes da ação do governo, mas como um favor em troca do qual os cidadãos

deveriam retribuir com gratidão e lealdade. Portanto, a tal cidadania era passiva e

receptora, em vez de ativa e reivindicadora.

A importância da redemocratização ocorrida nos anos 1980 que resultaram no

desenho social-democrata da Constituição de 1988 é abordada na obra “Política

Social Fundamentos e História” de autoria de Elaine Rossetti Behring e Ivanete

Boschetti, que salientam a introdução do conceito de seguridade social (2008, p. 144)

a articulação entre as políticas de previdência, saúde e assistência social, com

ampliação da cobertura previdenciária aos trabalhadores rurais, benefício de

prestação continuada para idosos e pessoas com deficiência, estatuto dos municípios

como entes federativos autônomos, conselhos paritários de políticas e, principalmente,

por meio do artigo 6.º, considerando como direito social, dentre outros, a educação, a

saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à

maternidade, à infância e a assistência aos desamparados.

Necessário salientar que a esse dispositivo foi acrescentado como direito social

a moradia, por meio da Emenda Constitucional n.º 26 de 14/02/2000 e recentemente,

em 04/02/2010, por meio da E.C. n.º 64, a alimentação.

Neste contexto, política pública é um conjunto de ações desencadeados pelo

Estado (nas esferas federal, estadual e municipal, no caso brasileiro) com vistas a

alcançar ao bem coletivo e pode ser de diversos tipos: industrial, agrícola, monetária,

de proteção social (assistência social), ambiental, educacional e outros. Sendo que a

política social é um tipo de política pública (espécie do gênero).

De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) na obra “A

Constituição Brasileira de 1988 revisada: Recuperação Histórica e Desafios Atuais das

Políticas Públicas nas Áreas Econômicas e Sociais.”, 2009, defende que uma política

social deve buscar (2009, p. 58): i) a promoção social, mediante a geração de

oportunidades e de resultados para indivíduos e/ou grupos sociais; e ii) promover a

solidariedade social, mediante a garantia de segurança ao indivíduo em determinadas

situações de dependência ou vulnerabilidade, entre as quais se podem citar: a)

incapacidade de ganhar a vida por conta própria em decorrência de fatores externos,

que independem da vontade individual; b) vulnerabilidade devido ao ciclo vital do ser

humano – crianças e idosos, por exemplo; e c) situações de risco, como em caso de

acidentes – invalidez por acidente etc.

Nessa obra há o reconhecimento (2009, p. 57) de que um sistema de proteção

social apresenta complexos esquemas de distribuição e redistribuição de renda,

aplicando significativas parcelas do Produto Interno Bruto (PIB) em ações e programas

sociais;

2.3. Desenvolvimento Econômico & Desenvolvimento Social e Políticas Públicas:

Amartya Sen (2000, p. 09-17; 336), em sua obra “Desenvolvimento como

Liberdade” salienta que apesar de vivermos em um mundo de opulência sem

precedentes com alto grau de desenvolvimento econômico, vivemos igualmente em

um mundo de privação, destituição e opressão extraordinária com persistência da

pobreza e de necessidades essenciais não satisfeitas, ameaças cada vez mais graves

ao meio ambiente e à sustentabilidade de nossa vida econômica e social.

Segundo o autor (2000, p. 10-18) o desenvolvimento (neste contexto,

“desenvolvimento como liberdade”) requer que se removam as principais fontes de

privação de liberdade: pobreza e tirania, carência de oportunidades econômicas e

destituição social sistemática, negligência dos serviços públicos e intolerância ou

interferência excessiva de Estados Repressivos, para que as pessoas tenham

oportunidades de exercerem sua condição de agente. Afirma que (2000, p. 26) “Com

oportunidades sociais adequadas, os indivíduos podem efetivamente moldar seu

próprio destino e ajudar uns aos outros”.

No Brasil, o órgão responsável pela elaboração e articulação com os governos

estaduais e municipais para estabelecimento das diretrizes para as Políticas Nacionais

de Desenvolvimento Social no Brasil é o Ministério de Desenvolvimento Social e de

Combate à forme.

Em que pese o fato de existir legislação3 estabelecendo compromisso nacional

pelo Desenvolvimento Social a ser firmado entre os entes da federação (União,

Estados, Municípios e Distrito Federal) não existe ainda uma norma estabelecendo as

diretrizes para a Política Nacional de Desenvolvimento Social.

Entretanto, existem entidades públicas com estudos publicados onde se

evidencia a preocupação, no Brasil, com o índice de Desenvolvimento Social, dentre

3 Decreto n.º 6.393, de 12 de março de 2008 – Estabelece o Compromisso Nacional pelo

Desenvolvimento Social, a ser firmado entre a União, os Estados e o Distrito Federal. Portaria n.º 343, de 10 de outubro de 2008, estabelece os procedimentos de adesão dos Estados e do Distrito Federal ao Compromisso Nacional pelo Desenvolvimento Nacional, a ser firmado com a União, e dá outras providências.

eles as obras publicadas pelo IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada –

como por exemplo: “A Constituição Brasileira de 1988 revisada: recuperação histórica

e desafios atuais das políticas públicas nas áreas econômica e social” em 2009; “Brasil

em desenvolvimento – Estado, Planejamento e Políticas Públicas” também em 2009;

“Desigualdade de Renda no Brasil: uma análise da queda recente” em 2006; “Questão

Social e Políticas Sociais no Brasil Contemporâneo” em 2005.

Entretanto, o que se observa nos trabalhos sobre desenvolvimento social

encontrados é que nenhum deles adota índices que permitam aferir o resultado de

todos os direitos sociais reconhecidos pela Constituição Federal de 1988.

III - CONCLUSÃO

O desenvolvimento econômico e financeiro de um país nem sempre é

acompanhado com o desenvolvimento social de seus “cidadãos”. E é com o

desenvolvimento social que os “cidadãos” conseguem exercer a cidadania, ou seja, é

somente quando está com suas necessidades básicas preenchidas (alimentado, com

moradia em um meio-ambiente saudável, renda, oportunidade de educação e lazer,

segurança, saúde, assistência social) é que um indivíduo consegue escolher, com

independência e discernimento as pessoas que o representam, bem como entender e

sobreviver no sistema político e financeiro vigente.

Nesse sentido as variáveis adotadas pelo Estado de Mato Grosso, por meio da

Lei n.º 9.391 de 14 de junho de 2010, para auferir o Índice de Desenvolvimento Social

dos Municípios de Mato Grosso – IDS-M, estão incompletas e insuficientes porque não

estão sendo considerados direitos sociais relevantes e necessários para a inclusão

social, o exercício da cidadania e uma sobrevivência digna, os quais já foram

reconhecidos pela Constituição Federal de 1988, quais sejam: moradia, renda,

trabalho, alimentação, lazer e outros.

IV. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

_____________. Constituição Federal da República Federativa do Brasil. Brasília, DF : Senado, 1998.

_____________. Lei n.º 9.391, de 14 de junho de 2010.D.O. de 14.06.10. Cria o Índice de Desenvolvimento dos Municípios de Mato Grosso IDS-M. Diário Oficial do Estado de Mato Grosso de 14.06.10. Assembléia Legislativa, Cuiabá, MT, 2010. Disponível em: <www.al.mt.gov.br>, acesso em 23 set 2010. _____________. Lei n.º 10.869 de 13 de maio de 2004. Dispõe sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios, e dá outras providências. Congresso Nacional. Alterada pela Lei 10.869 de 13/05/04, conversão da MPv n.º 163 de 2004. DOU de 29/05/2010. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2003/L10.683.htm>, acesso em 23 set 2010.

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