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  Revista Ceres ISSN: 0034-737X [email protected] Universidade Federal de Viçosa Brasil Altoé Baldotto, Marihus; Velloso, Ary Carlos Xavier Eletroquímica de solos modais e de sua matéria orgânica em ambientes tropicais Revista Ceres, vol. 61, núm. 6, noviembre-diciembre, 2014, pp. 1012-1021 Universidade Federal de Viçosa Vicosa, Brasil Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=305232929018  Como citar este artigo  Número completo  Mais artigos  Home da rev ista no Redalyc Sistema de Informação Científica Rede de Revistas Científicas da América Latina, Caribe , Espanha e Portugal Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto

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  • Revista CeresISSN: [email protected] Federal de ViosaBrasil

    Alto Baldotto, Marihus; Velloso, Ary Carlos XavierEletroqumica de solos modais e de sua matria orgnica em ambientes tropicais

    Revista Ceres, vol. 61, nm. 6, noviembre-diciembre, 2014, pp. 1012-1021Universidade Federal de Viosa

    Vicosa, Brasil

    Disponvel em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=305232929018

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    Sistema de Informao CientficaRede de Revistas Cientficas da Amrica Latina, Caribe , Espanha e Portugal

    Projeto acadmico sem fins lucrativos desenvolvido no mbito da iniciativa Acesso Aberto

  • 1012 Marihus Alto Baldotto & Ary Carlos Xavier Velloso

    Rev. Ceres, Viosa, v. 61, n.6, p. 1012-1021, nov/dez, 2014

    RESUMO

    ABSTRACT

    Recebido para publicao em 10/06/2013 e aprovado em 24/06/2014.1 Trabalho financiado pela FAPERJ (E-26/110.633/2007) e pela FAPEMIG (APQ-02395-10).

    2 Engenheiro-Agrnomo, Qumico. Doutor. Instituto de Cincias Agrrias, Universidade Federal de Viosa, Campus de Florestal, Rodovia LMG 818, Km 06, 35690-000, Florestal,

    Minas Gerais, Brasil. [email protected] (autor para correspondncia).3 Engenheiro-Agrnomo. Doutor. Professor Titular Aposentado da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro e da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy [email protected]

    Eletroqumica de solos modais e de sua matria orgnicaem ambientes tropicais1

    A qumica do solo vem estudando o comportamento da frao mineral dos solos tropicais intemperizados,incluindo a eletroqumica, o desenvolvimento de cargas e o fenmeno de adsoro. Por causa do amplo espectro aser coberto no entendimento do comportamento da frao mineral, somado s dificuldades metodolgicas, o estu-do da complexa frao orgnica dos solos foi relativamente menos desenvolvido. A atual proposta revisita os pri-meiros trabalhos referentes qumica de solos tropicais, buscando relacion-los com dados de eletroqumica dosestoques de carbono do solo. O objetivo deste trabalho foi revisar aspectos de eletroqumica de solos, determinare relacionar os pontos de carga zero, por diferentes mtodos, os potenciais da dupla camada eltrica e a eletroqumicado hmus de solos modais brasileiros, em uma sequncia tpica de intemperismo, visando a gerar informaes parao seu manejo e conservao. Os mtodos de estimativa dos ponto de carga zero dos solos apresentam resultadosvariados, mas com a mesma tendncia entre os solos. H predomnio de cargas negativas em ambas as camadas dossolos estudados. As cargas negativas dos coloides esto diretamente associadas disponibilidade de eltrons dohmus e ambas diminuem com o estdio de intemperismo do solo.

    Palavras-chave: qumica do solo, matria orgnica, troca inica, ponto de carga zero.

    Marihus Alto Baldotto1, Ary Carlos Xavier Velloso2

    http://dx.doi.org/10.1590/0034-737X201461060018

    Electrochemistry of modal soils and its organic matter in tropical environmentsSoil chemistry soils studies the behavior of the mineral fraction of weathered tropical soils, including

    electrochemistry, development of charges and adsorption phenomenon. Because of the broad spectrum to be coveredin the understanding of the behavior of mineral fraction added to the methodological difficulties, the study ofcomplex soil organic fraction was relatively less developed. The current proposal revisits the early works related tothe chemistry of tropical soils with the objective to relate them with electrochemical data of soil carbon stocks.The objective of this study was to review aspects of soil electrochemistry, to determine and to relate the points ofzero charge by different methods, the potentials of the electric double layer and the electrochemistry of humus ofBrazilian modal soils in a typical sequence of weathering, aiming to generate information for their management andconservation. The methods for estimating the point of zero charge of the soils show different results, but with thesame trend among soils. There is a predominance of negative charges on both layers of soils. The negative chargesof the colloids are significantly associated with the availability of electrons from the humus and both decrease withthe weathering stage of the soil.

    Key words: electrochemistry, ionic exchange, organic matter,point of zero charge, soil chemistry.

  • 1013Eletroqumica de solos modais e de sua matria orgnica em ambientes tropicais

    Rev. Ceres, Viosa, v. 61, n.6, p. 1012-1021, nov/dez, 2014

    INTRODUOA qumica de superfcie de solos tropicais vem sen-

    do estudada, ao longo das ltimas dcadas (Stern, 1924;Schofield, 1949; Parks & Bruyn, 1962; Parks, 1965;Raij & Peech, 1972; Raij, 1973a,b; Uehara, 1979;Uehara & Gilman, 1980 a, b; Sposito, 1981; Leal etal., 1983; Magalhes & Page, 1984a,b; Sposito, 1989;Siqueira et al., 1990a, b, c; Chaves & Trajano, 1992;Stumm, 1992; Oliveira et al., 1993; Manzato et al.,1994; Silva et al., 1996; Peixoto, 1997; Sposito, 1998;Fontes et al., 2001; Struyk & Sposito, 2001; Baldotto,2006; Sposito, 2008; Baldotto et al., 2010). A cargalquida total das partculas dos solos (p) pode ser po-sitiva, zero ou negativa, segundo a equao (01): p =0 + H + is + os (Sposito, 2008). Nessa equao, asvariveis 0, H, is e os representam as cargas perma-nente, varivel, advindas de complexos de superfciespor adsoro especfica (inner sphere) e no espe-cfica (outer sphere), respectivamente, as quais se-ro descritas a seguir:

    A 0 a carga permanente, resultante de substituioisomrfica, H a carga varivel, e desenvolve-se na fra-o hmus do solo, nos xidos e nas argilas silicatadas1:1 (Sposito, 2008); is e os so as cargas de comple-xos inner sphere e referem-se carga lquida total deons (que no sejam H+ e OH-) (Sposito, 2008). Dife-rentemente da carga intrnseca, is e os resultam somentede constituintes da soluo do solo, adsorvidos nas su-perfcies das partculas (Leal & Velloso, 1973; Charlet& Sposito, 1987).

    Na equao (01), p precisa ser balanceada, no casode diferir de zero, por outro tipo de carga que resulte deons da soluo do solo que no estejam ligados a com-plexos de superfcie, mas sejam adsorvidos pelas part-culas do solo, isto , ons da camada difusa (D) ou du-pla camada eltrica (Stern, 1924; Sposito, 2008). Essesons da camada difusa movem-se livremente, na soluodo solo, ao mesmo tempo permanecendo nas proximi-dades das superfcies das partculas para criarem umacarga de superfcie efetiva, contrabalanando p (Sposito,2008).

    A soma algbrica de 0 e H representa a carga su-perficial intrnseca do solo. Essas cargas resultam, prin-cipalmente, dos componentes estruturais dos adsor-ventes, por exemplo, dos constituintes inicos dos mi-nerais e dos grupamentos protonveis, nos slidos or-gnicos e inorgnicos. A contribuio relativa de cadauma dessas cargas depender do estdio de intemperismoe do teor e qualidade da matria orgnica do solo (Lealet al., 1983; Oliveira et al., 1993; Manzato et al., 1994;Peixoto, 1997; Fontes et al., 2001; Sposito, 2008;Baldotto et al., 2010).

    Com relao mineralogia do solo, desde que a fon-te principal de carga permanente esteja na cavidadesiloxane (Sposito, 2008),

    o predomina nos solos nos

    estdios inicial e intermedirio de intemperismo(Jackson & Sherman, 1953). Por outro lado, os solosem estdio de intemperismo avanado so enriquecidoscom argilominerais com grupamentos anfteros(silanols e aluminols), alm de grupos funcionais damatria orgnica (cidos carboxlicos e fenlicos) esuperfcies hidroxiladas, nos xidos de Fe e de Al. Nes-tes ltimos, de carga varivel, H domina o e as varia-es de seu pH influenciam fortemente o desenvolvi-mento de cargas (Baldotto et al., 2010). Nesses casos,cada radical funciona como cido fraco, gerando cargasde superfcie negativas ou positivas, quando o pH estacima ou abaixo de seu potencial de dissociao (pKa),respectivamente (Sposito, 2008).

    Para a avaliao global dos constituintes do solo, ovalor do Ponto de Carga Zero (PCZ) indica o pH no qualo balano de cargas dos coloides do solo nulo, isto ,p = 0. Nesse valor de pH no existe carga lquida relati-va aos ons adsorvidos na camada difusa (Sposito, 2008),ou seja, P + D = 0. Essa condio pode ser experimen-talmente estabelecida, verificando-se, num determina-do campo eltrico, o valor de pH no qual as partculasdeixam de se mover (medida da mobilidade emeletroforese) ou, ento, o valor de pH no qual as part-culas sedimentam (medida da floculao). Esse pontode carga zero assinala a ausncia de ons adsorvidos,movendo-se livremente na camada difusa e, tambm, re-presenta a intensificao das foras entre as partculasresponsveis pelos feitos de coagulao. O PCZ desem-penha, portanto, papel importante na formao de agre-gados e na reteno de ons adsorvidos, contra os efei-tos da lixiviao, especialmente nos solos de carga vari-vel (Sposito, 2008).

    O ponto de carga lquida zero (PZNC - Point of ZeroNet Charge) pode ser definido como o pH no qual a cargalquida dos ons adsorvidos (outros que no H+ e OH-)zera. Se q

    + e q

    -

    , na equao (02), a seguir (q+ - q

    -

    = is +

    os + D = 0), representam cargas de ction e nion

    adsorvidos, respectivamente, ento q+ = q

    -

    no PZNC. Ovalor do PZNC depender da escolha do on ndice(index on), a ser trabalhado para determinar-se o po-tencial, sendo comumente utilizados os produtos dasolubilizao de KCl e de NaCl. O valor de PZNC pou-co afetado quando se utiliza um eletrlito indiferente.Ento, no PZNC, is no contribui, se o sistema estiversaturado com o eletrlito indiferente (Sposito, 2008).Portanto, ons mveis na camada difusa existem noPZNC, mas no no PZC, pois, por definio, neutrali-zam as demais cargas 0, H, is e os , como visto na equa-o (01).

  • 1014 Marihus Alto Baldotto & Ary Carlos Xavier Velloso

    Rev. Ceres, Viosa, v. 61, n.6, p. 1012-1021, nov/dez, 2014

    A formao de complexos com ctions na superfcieaumenta o PCZ, enquanto a formao de complexos comnions decresce o PCZ (Leal & Velloso, 1973; Chartlet& Sposito, 1987; Sposito, 2008). Esses deslocamentosdo PCZ no requerem adsoro especfica, mas somen-te complexao na superfcie. O deslocamento do PCZ,aps adsoro adicional de um on, no pode, portanto,ser interpretado como evidncia de adsoro especfi-ca. Esse deslocamento apenas evidencia que complexosforam formados na superfcie, em obedincia lei dobalano de carga (Sposito, 2008).

    O ponto de carca protnica lquida zero (PZNPC -Point of Zero Net Proton Charge) o pH no qual H = 0(Sposito, 2008). Como propriedade geral, H decresce(fica negativo) com o aumento do pH (i.e.,

    H/pH sem-pre negativo). Essa propriedade independe da composi-o ou da fora inica da soluo e, tambm, da naturezadas partculas do solo (inorgnicas ou orgnicas). OPZNPC e as cargas superficiais do solo de carga vari-vel (H) so, frequentemente, determinados pelo mto-do de titulao potenciomtrica, que se baseia numa s-rie de titulaes de suspenses de terra com onsdeterminantes de potencial (H+ ou OH-), numa determi-nada concentrao de eletrlito indiferente (Sposito,2008).

    O PZNPC corresponde ao ponto de interseo dacurva H vs. pH, naquela concentrao de eletrlitos.Quando vrias concentraes de eletrlitos indiferen-tes so usadas, o ponto de interseo das vrias curvasH vs. pH representa o ponto de efeito salino nulo(PESN), isto , o ponto de carga varivel (H) no afetado pela variao da concentrao do eletrlito (I= variao fora inica), ou seja, H/I = 0(Sposito,2008).

    O PCZ um ponto de referncia para se avaliar osinal da carga lquida da superfcie, no pH atual do solo,ou seja, se ela est carregada positivamente (pH < PCZ),ou negativamente ( pH > PCZ ). Com o PCZ possveldeterminar o potencial da dupla camada eltrica (O,mV), pela equao (03), que a equao simplificada deNernst (O = 0,059 (PCZ - pH) descrita por Uehara &Gillman (1980), em que o PCZ pode ser estimado peloPESN e o pH medido em gua.

    Os valores de PCZ e de O tm diversas aplicaesimportantes, como as previses sobre a tendncia floculao e disperso dos coloides do solo, o grau deintemperismo e a formao de complexos de superfcie(Sposito, 2008).

    Um mtodo relativamente simples, para se estimarse a carga lquida dos coloides do solo negativa, zeroou positiva, consiste em analisar os valores de pH deter-minados em KCl 1 mol/L e em gua (Uehara & Gillman,1980 a, b). A estimativa dada por pH, que igual

    diferena entre pHKCl e pHH2O (Equao 04). O pH temsido utilizado na caracterizao de solos tropicais. Va-lor negativo ou positivo de pH indicativo de predo-minncia de cargas lquidas negativas ou positivas noscoloides, respectivamente. De acordo com Uehara &Gilman (1980a), uma estimativa do PCZ pode ser feitaindiretamente pela equao (05): PCZ = 2 pHKCl - pHH2Oem que os valores de pHKCl e de pHH2O provm da deter-minao do pH em KCl 1 mol L-1 e em gua, ambos narelao solo: extrator igual a 1: 2,5.

    Baldotto et al. (2010) estudaram a eletroqumicadas substncias hmicas, medindo sua capacidade detransferir eltrons, indicando a relao entre estas car-gas negativas e o PCZ. Para planejamento do aumentodos teores de carbono no solo (estabilizao, seques-tro, etc), fundamental conhecer a relao entre a den-sidade de carga e seu sinal. Assim, so necessrios es-tudos que relacionem propriedades termodinmicas damatria orgnica com a qumica de superfcie dos so-los, objetivando o entendimento dos mecanismos deinterao entre os compartimentos orgnico e minerale de estabilizao do hmus (Stevenson, 1994; Piccolo,2001; Struyk & Sposito, 2001; Sutton & Sposito,2005), nos ecossistemas tropicais (Baldotto et al.,2010).

    O objetivo deste trabalho foi revisar aspectos deeletroqumica de solos, determinar e relacionar os pon-tos de carga zero por diferentes mtodos, os potenciaisda dupla camada eltrica e a eletroqumica do hmus desolos modais brasileiros em uma sequncia tpica deintemperismo, visando a gerar informaes para o seumanejo e conservao.

    MATERIAL E MTODOSAmostras

    Foram amostradas as camadas superficial (0 a 20 cm)e subsuperficial (20 a 40 cm) de solos modais descritosdurante a I Reunio de Classificao e Correlao deSolos (Embrapa, 1980), em diferentes estdios deintemperismo, classificados como (Embrapa, 2013):Chernossolo Argilvico rtico vrtico, ChernossoloRndzico Saproltico tpico, Luvissolo Crmico Plicoabrptico, Argissolo Vermelho-Amarelo Distrfico eLatossolo Amarelo Coeso tpico (Tabela 1).

    Atributos dos solos e da matria orgnicaOs atributos dos solos (Tabela 2) e da matria org-

    nica (Tabela 3), determinados e detalhadamente descri-tos em Baldotto et al. (2010), foram reunidos neste tra-balho para relacion-los aos pontos de carga zero e aospotenciais da dupla camada eltrica, determinados comodescrito a seguir.

  • 1015Eletroqumica de solos modais e de sua matria orgnica em ambientes tropicais

    Rev. Ceres, Viosa, v. 61, n.6, p. 1012-1021, nov/dez, 2014

    Determinao do pH e predio do ponto decarga zero

    A determinao do pH foi obtida pela equao (04).As determinaes do pH em gua e em KCl foram reali-zadas, preparando-se suspenses de solo e gua destiladae de solo e soluo de KCl 1 mol L-1, na relao solo:gua ou solo:soluo igual a 1:2,5, obtida pela adio de25 mL de gua ou de soluo a 10 cm3 de solo, seguida deagitao para completa homogeneizao e formao dasuspenso. Aps 30 a 60 minutos, foi determinado o pHdas suspenses. De posse dos dados de pH em KCl e emH2O, foi realizada a predio do PCZ pela equao (05).

    Determinao experimental do pontode carga zero

    Para este trabalho, os pontos de carga zero estima-dos experimentalmente foram obtidos pelos mtodos doponto de efeito salino nulo (PESN) e do ponto de cargaprotnica lquida zero (PCPLZ), conforme Sposito(2008).

    Para determinao do PESN, subamostras de solo de10 cm3 foram agitadas, por cinco minutos, em agitadorhorizontal, com 25 mL de gua deionizada ou 1,00 molL-1 de KCl. Depois de um tempo de equilbrio de 30 mi-nutos, as amostras foram suspensas, agitando-se combasto de vidro, e o pH foi medido, usando-se um ele-trodo previamente calibrado. O valor de pH foi obtidopela diferena entre o pH em KCl e o pH em H2O. Sen-do conhecidos os valores de pH para a construo doespao experimental, assumiu-se que pH < 0, pH = 0,pH>0 indicaram solos eletronegativos, no ponto decarga, e eletropositivos, respectivamente. Para cada solo,18 amostras de 5 g foram divididas em trs grupos deseis amostras, que receberam, em erlenmeyers, 25 mLde NaCl 0,1 mol L-1, NaCl 0,01 mol L-1 e NaCl 0,001mol L-1, respectivamente. As amostras de cada um des-ses grupos de concentrao salina receberam 0,0; 0,1;0,2; 0,3; 0,4 e 0,5 mL de HCl 0,4 mol L-1, para os soloseletronegativos; 0,3; 0,4 e 0,5 mL de HCl 0,4 mol L-1 e0,1; 0,2 e 0,3 mL de NaOH 0,4 mol L-1, para os solosprximos ao ponto de carga e 0,0; 0,1; 0,2; 0,3; 0,4 e 0,5mL de NaOH 0,4 mol L-1, para os solos eletropositivos.

    Tabela 1. Classificao, vegetao, coordenadas e localizao dos solos

    Classificao(1) Coordenadas

    USDA SiBCS Latitude Longitude 1 Typic Calciustoll Chernossolo Rndzico Saproltico tpico Pastagem 21 25 S 41 41 O 2 Vertic Argiustoll Chernossolo Argilvico rtico vrtico Pastagem 21 13 S 41 49 O 3 Typic Kanhaplustult Luvissolo Cromico Plico abrptico Pastagem 21 12 S 41 50 O 4 Ultic Paleustalf Argissolo Vermelho- Amarelo distrfico Pastagem 21 13 S 41 50 O 5 Typic Haplustox Latossolo Amarelo Coeso tpico Pastagem 21 43 S 41 20 O(1)

    Classificao: USDA = Soil Survey Staff (2006) e Sistema Brasileiro de Classificao de Solos (Embrapa, 2013); Predominantemente com braquirias.

    AmostraN Vegetao(2)

    Em seguida, os frascos foram agitados por 5 minutos,em agitador horizontal, e deixados em repouso, por 24horas. Ao final deste perodo, sem agitar os frascos, de-terminou-se o pH do sobrenadante. As curvas de titulaoforam obtidas, relacionando-se, em um grfico, os valo-res de pH determinados nos seis pontos de cada con-centrao do eletrlito (NaCl), em funo da adsorode OH- ou H+, obtida de acordo com as quantidades decido/base (HCl/NaOH) adicionadas, expressa em cmol

    c/

    kg. O ponto de cruzamento das trs curvas foi definidocomo o valor de pH equivalente ao PESN do solo emquesto.

    Os PCPLZ das amostras foram determinados de for-ma anloga, porm relacionando ao pH apenas asadsores de H+ ou de OH- na concentrao de 0,01 molL-1 de NaCl. Ao invs do ponto de interseo das curvas,em diferentes concentraes, como no PESN, o PCPLZfoi obtido no ponto no qual a curva que relacionou a va-rivel independente, adsoro de H+ (y), corta o eixo davarivel independente pH (x) (Sposito, 2008).

    Potencial da dupla camada eltricaA partir da estimativa experimental do PCZ pelo

    mtodo do PESN, foi determinado o potencial da duplacamada eltrica (O, mV), pela equao (03), empre-gando-se o valor de pH medido em gua.

    Anlises estatsticasA anlise dos dados fundamentou-se na estatstica

    descritiva, por se tratar de amostras aleatrias simples(fatores aleatrios). Estimou-se a correlao linear dePearson entre as variveis estimadas para a eletroqumicado solo e da matria orgnica (Steel & Torrie, 1980).Foi, tambm, realizado o teste de agrupamento pelavarincia mnima com distncia euclidiana, usando-se aanlise multivariada dos dados (Cruz, 2006).

    RESULTADOS E DISCUSSOOs resultados das estimativas dos pontos de carga

    zero e dos potenciais da dupla camada eltrica foramdiferentes entre os solos modais (Embrapa, 2013)amostrados (Tabela 4).

  • 1016M

    arihus Alto Baldotto &

    Ary Carlos X

    avier Velloso

    Rev

    . Ceres, Viosa, v

    . 61, n.6, p. 1012-1021, nov/dez, 2014

    Tabela 2. Atributos qumicos e fsicos dos solos amostrados

    Atributos(1)

    C AF AH H AH/AF EC Ki Areia Silte Argilag kg-1 Mg ha-1 g kg-1

    Chernossolo Rndzico 22,6 1,21 3,44 19,2 2,9 47,9 2,6 400 180 420Chernossolo Argilvico 17,2 2,42 3,66 10,8 1,5 35,8 1,9 300 230 470Luvissolo Crmico 16,2 3,33 3,11 6,6 1,0 48,6 1,8 400 330 270ArgissoloVermelho- Amarelo 13,6 3,32 1,90 9,3 0,6 27,5 1,8 600 160 240Latossolo Amarelo 13,1 2,14 0,83 8,9 0,4 35,6 1,6 600 20 380(1) Atributos: C, AF, AH e H = carbono total, cidos flvicos, cidos hmicos e huminas, respectivamente; EC = Estoque de carbono (0-0,20 m); Ki = relao molar SiO2/Al2O3; Areia, silte e argila = fraes granulomtricas.

    Atributos(1)

    pH P K+ Ca2+ Mg2+ Na+ Al3+ H+Al SB t T V m mg dm-3 cmol

    c kg-1 %

    Chernossolo Rndzico 7,0 10,2 0,12 43,3 0,4 0,14 0,0 0,8 44,0 44,0 44,8 98 0Chernossolo Argilvico 7,2 7,3 0,21 18,2 0,4 0,10 0,0 2,8 18,9 18,9 21,7 87 0Luvissolo Crmico 6,6 7,5 0,10 9,9 0,2 0,06 0,0 2,4 10,3 10,3 12,7 81 0Argissolo Vermelho -Amarelo 6,4 5,4 0,15 4,7 2,6 0,09 0,0 3,3 7,5 7,5 10,8 70 0Latossolo Amarelo 5,5 5,3 0,19 1,8 1,9 0,09 0,1 4,6 4,0 4,1 8,6 46 2(1)Atributos: pH obtido em relao solo: gua igual a 1:2,5; P e K = Extrator Mehlich-1; Ca2+, Mg2+ e Al3+ = Extrator KCl 1 mol L-1; H+Al = Extrator CaOAc 0,5 mol L-1 a pH 7,0; SB = soma de bases; t e T = capacidade detroca de ctions efetiva e potencial (pH 7,0), respectivamente; V = saturao por bases; m = saturao por Al3+.

    AmostraClasse

    AmostraClasse

  • 1017Eletroqumica de solos modais e de sua matria orgnica em ambientes tropicais

    Rev. Ceres, Viosa, v. 61, n.6, p. 1012-1021, nov/dez, 2014

    A Figura 1 um exemplo das titulaes para deter-minao do PESN. O grfico mostra que, nos pontos quereceberam cido (HCl), o pH aumentou na medida emque a concentrao da soluo salina (NaCl) diminuiu.Isso pode ser explicado pelo efeito salino, segundo oqual os ons H+ se expressam menos, num ambiente comelevada concentrao de sais (menor atividade). Soma-se a isto a provvel atividade biolgica mais baixa e, por-tanto, menor interferncia na atividade de H+ (Sposito,2008).

    Os valores de PCZ, estimados experimentalmente oucalculados (Equao 05), no foram concordantes (Ta-bela 4). Essas discrepncias ocorreram, possivelmente,em funo de a concentrao de KCl 1 mol L-1 ser muitoelevada. Por exemplo, 25 mL de KCl 1 mol L-1, adicio-nados 10 g de solo, levam concentrao de 250 cmol

    c

    kg-1 de K+. Essa concentrao dobra, se padronizada aum teor de argila de 50%. Por exemplo, para um solocom 500 g kg-1 de argila, ocorreria adsoro de 500 cmol

    c

    kg-1 de K+. Alm disso, as argilas predominantemente en-contradas em solos em estdio avanado de intempe-rismo apresentam, geralmente, CTC entre 10 a 25 cmol

    c

    kg-1, dezenas de vezes menor do que aquela magnitudede concentrao adicionada a partir do KCl 1 mol/L-1.Assim, o estudo de concentraes mais baixas de KClou a alterao do fator 2 da frmula devem ser busca-dos, no sentido de melhorar a capacidade preditiva domtodo, visando avaliao do PCZ do solo com maiorexatido. Outro fator que poderia explicar a diferenaentre os valores de PCZ calculado e medido a comple-xidade do sistema. Se somente o KCl estivesse presenteem soluo, sendo um eletrlito indiferente, poderiahaver maior aproximao dos PCZ calculado e experi-mental. Entretanto, outros ons esto presentes nos so-los, sujeitos, por exemplo, adsoro especfica. Seforem nions, esse fato leva diminuio do valor doPCZ e, consequentemente, gera incrementos de carganegativa na superfcie do coloide.

    Segundo Raij & Peech (1972), de forma geral, a pre-sena de xidos de ferro e de alumnio tendem a aumen-tar o PCZ, enquanto a presena de minerais de argilasilicatada, com cargas negativas estruturais ou perma-nentes, tende a diminuir o PCZ. A presena de matriaorgnica, especialmente em solos tropicais muitoimtemperizados, tende a reduzir o PCZ, pois seus gru-pos carboxlicos se dissociam em valores de pH maisbaixos que o dos xidos de ferro e de alumnio. Assim,o PCZ reflete a composio mineralgica e o contedode matria orgnica de um solo.

    A Figura 2 mostra o dendrograma, obtido pela anli-se multivariada de todos os dados apresentados nas Ta-belas 1, 2, 3 e 4, no qual os solos aparecem agrupadosde acordo com a sua verossimilhana, determinada pelaTa

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  • 1018 Marihus Alto Baldotto & Ary Carlos Xavier Velloso

    Rev. Ceres, Viosa, v. 61, n.6, p. 1012-1021, nov/dez, 2014

    distncia Euclidiana (Cruz, 2006). Observa-se, nodendrograma, que os solos em estdio menos avanadode intemperismo (Chernossolos e Luvissolos) aparecemnum mesmo grupo, separados dos solos em estdio avan-ado de intemperismo (Argissolo e Latossolo), os quaisforam agrupados juntos. Assim, o dendrograma, consi-derando-se todo o conjunto de dados, converge para asdiferenas observadas nos pontos de carga zero e nospotenciais da dupla camada eltrica, estimados nesteestudo, bem como sua ordenao em funo dos atribu-tos do solo. Essas correlaes (Tabela 5) possibilitam aobteno de indicadores de manejo de solos, emecossistemas naturais e agrrios, a partir das proprieda-des eletroqumicas. Baldotto et al. (2010) apresenta-ram uma discusso detalhada desses atributos, evidenci-ando a relao entre a gnese, a qumica, a fertilidade dosolo e a qumica e a eletroqumica do hmus extrado.Neste trabalho, a eletroqumica dos solos estudadacomo um todo (fraes mineral e orgnica), por meiodos pontos de carga zero e dos potenciais da dupla ca-mada eltrica. Os resultados, portanto, confirmam, tam-bm, que a qumica de superfcie do solo um signifi-cativo indicador de gnese, intemperismo, formao emanejo de solos tropicais.

    Todos os solos estudados apresentaram maior poten-cial da dupla camada eltrica na camada 0 a 20 cm. Osaumentos dos estoques e da composio de grupos fun-cionais doadores de carga da matria orgnica dos solos(que foi muito diferente entre os solos modais) foramacompanhados por diminuio dos valores de PCZ e pormais negativos O (Tabela 5). Esse efeito indica que apreservao e o aumento dos estoques de carbono soprimeiro passo para a recuperao das propriedades dosLatossolos (aumentos de CTC e da disponibilidade denutrientes, simultaneamente diminuies da adsoroespecfica de P e da atividade txica do Al3+).

    Alm das correlaes j mencionadas, a Tabela 5revela que os atributos fundamentais para o estudo desolos (fsicos e qumicos) esto intimamente relacio-nados com os fenmenos biolgicos. Especialmente,a qumica das substncias hmicas tambm um refle-xo da qualidade ecolgica dos sistemas estudados, ten-do tanto a estabilizao dos seus estoques quanto suacapacidade de gerar carga sido beneficiadas pela eleva-da disponibilidade de bases, baixa acidez e alta densi-dade de carga negativa dos solos menos intemperizados,em relao aos altamente intemperizados, pobres emnutrientes, de baixa CTC e cidos (Baldotto et al.,2010).

    Contudo, os resultados tambm mostraram que nossolos mais intemperizados, a despeito de sua maior ne-cessidade de incrementos da quantidade e da qualidadeda matria orgnica, para melhorar sua fertilidade, ocor-Ta

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  • 1019Eletroqumica de solos modais e de sua matria orgnica em ambientes tropicais

    Rev. Ceres, Viosa, v. 61, n.6, p. 1012-1021, nov/dez, 2014

    rem os menores estoques de carbono, com a menor dis-ponibilidade de cargas negativas. Infere-se, assim, queproduo e a preservao das formas de carbono mai-or nos solos menos intemperizados, de maiores reasuperficial especfica, capacidade de troca inica (argi-las de maior atividade), disponibilidade de bases, almde menores adsoro de P e acidez. Nos solos muitointemperizados, como o Argissolo e o Latossolo, os fa-tores climticos intensos e a baixa disponibilidade denutrientes resultaram em matria orgnica com menorgrau de humificao. Nesses sistemas com mais avana-do estdio de intemperismo (Jackson & Sherman, 1953),especialmente nos Latossolos, os processos de perdatendem a superar os de ganho e a resultante confere umambiente biolgico menos diversificado e mais especi-alizado, com ao regulada pelos ciclos climticos, da-

    das as maiores intensidades a que este submetido(Baldotto et al., 2010). Como exemplos, podem-se ci-tar as menores rea superficial especfica, gerao decargas eltricas, capacidade de reteno de ons doscoloides e estabilizao dos estoques de carbono no solo,indicando desfavorecimento humificao (Baldotto etal., 2010).

    No entanto, aumentos de fertilidade e da concen-trao de SH foram observados, por Cunha (2005),em alguns solos antropognicos da regio Norte doBrasil. Nesses sistemas, os Latossolos, mesmo sobambientes favorveis decomposio da matria or-gnica do solo (Amaznia), apresentaram horizonte Aantrpico (Embrapa, 2013), com elevados estoquesde carbono, enriquecido em bases trocveis, com pHem torno de 6,5, alta CTC, estrutura bem desenvolvi-

    Figura 1. Adsoro de H+ e de OH- de acordo com os valores de pH para as trs curvas de titulao de 5 g de TFSA de um Chernossolosuspenso em 25 mL das diferentes concentraes de NaCl. O valor de pH no ponto de cruzamento das curvas definido como o deefeito salino nulo (PESN = 4,35).

    Figura 2. Dendrograma, utilizando a distncia Euclidiana, obtido pela anlise multivariada de todos os atributos dos solos amostradosapresentados nas Tabelas 1, 2, 3 e 4.

  • 1020 Marihus Alto Baldotto & Ary Carlos Xavier Velloso

    Rev. Ceres, Viosa, v. 61, n.6, p. 1012-1021, nov/dez, 2014

    da, possibilitando adequados fluxos da atmosfera e dasoluo do solo e elevados teores de P, ou seja, altafertilidade. A natureza da estabilizao do hmus nes-ses sistemas ainda no foi totalmente esclarecida.Existe, contudo, razovel convergncia sobre a for-mao de estruturas condensadas de carbono nohmus, advindas do uso contnuo e conjunto de res-duos minerais e orgnicos (queimados ou no), emreas de Latossolos. Nesse sentido, os resultados des-te trabalho convergem para a necessidade de incre-mentar a qualidade e a quantidade das formashumificadas de carbono orgnico, nos solos tropicais,pois estes tendem s diminuies de CTC e de dispo-nibilidade de bases e aos aumentos de adsoro de P ede acidez, fatores antagnicos fertilidade do solo.Infere-se, portanto, que alm das tradicionais prti-cas de manejo e de conservao do solo, incluindo aintegrao de florestas lavoura e pecuria, o de-senvolvimento de novos fertilizantes, combinandofontes orgnicas, minerais e biolgicas (Baldotto etal. 2011; 2012a, 2012b), seja a alternativa fundamen-tal para, ciclo aps ciclo, inverter o processo de de-gradao de muitas reas tropicais, como os solosantropognicos, os quais so o registro de sucessotecnolgico de adubaes orgnico-minerais, em sis-temas agroflorestais (Baldotto et al., 2006).

    CONCLUSESOs resultados possibilitaram concluir que os mto-

    dos de estimativa do ponto de carga zero (PCZ) apre-sentam a mesma tendncia entre os solos, porm tendomagnitude de resultados variada, evidenciando que a in-terpretao do valor depende do mtodo usado.

    Todos os solos estudados mostram carga lquida ne-gativa, em ambas as camadas amostradas, com meno-res valores de PCZ e mais negativos O na camada su-perficial.

    Os solos mais imtemperizados apresentam maioresvalores de PCZ (tendncia ao carter mais eletro-positivo), valores menos negativos de O (menor densi-dade de carga negativa) e menor estoque de carbono.

    Os valores estimados para o PCZ e para o O relaci-onam-se, significativamente, com outros atributos fsi-co-qumicos fundamentais dos solos e, especialmente,com a eletroqumica da matria orgnica dos solos, in-dicando sua forte participao na gerao de cargas ne-gativas (capacidade de transferir eltrons).

    AGRADECIMENTOSOs autores agradecem ao CNPq, Faperj, Fapemig

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  • 1021Eletroqumica de solos modais e de sua matria orgnica em ambientes tropicais

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