2014 09-08 - ler e aprender gn sec - vencedor - conto um conto que contas - catarina alves - 12

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Uma viagem

-Matemática nem é uma disciplina difícil mas ainda não percebi para que

precisamos realmente dela.

-Então a menina Inês olha para as promoções e saldos e vê logo quanto vai

poupar, ou acredita piamente e é enganada imensas vezes?

-Não Tiago! Mas essa não é a preocupação da minha vida: eu compro o que

preciso e se estiver com promoções melhor, senão, pior.

-Pois, pois, meninas ricas é assim…

-Sabes bem que não é isso Tiago… Ok, eu admito que às vezes Matemática

pode ser útil mas para isso chega o 6º, 7º ano. O que não percebo é quando é que na

minha vida vou precisar de logaritmos, exponenciais, derivadas, fórmulas

trigonométricas e outras matérias assim!

-Isso não te posso dizer porque também não sei…

-O que estão os meninos a falar aí ao fundo? Inês e Tiago querem partilhar com

o resto da turma o que estão para aí a dizer?– Interrompe-os a professora de Química.

-Desculpe stora.– Respondem em uníssono.

Depois da chamada de atenção, os dois colegas de turma mantêm-se atentos ao

documentário que estava a passar sobre a biodiversidade. Mas porque estava a passar

tal documentário numa aula de Química do 12º ano? A verdade é que o tema não tinha

muito a ver com a matéria dada mas como o tema da escola do ano era o Planeta

Terra, desde o início do ano que volta e meia aparecia uma iniciativa invulgar

relacionada com o tema.

Mas o que os dois amigos não tinham consciência era que a sua conversa não

tinha só ido parar aos ouvidos da sua professora, nem sequer tinha só ficado na sala de

aula. A sua conversa tinha viajado, passado mares e oceanos, terras paradisíacas e

terras dantescas e tinha acabado por chegar a um sítio especial onde um alguém

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especial prestou uma especial atenção à conversa que supostamente especial não era.

O que esse ser decidiu fazer relativamente ao que ouviu é o que vamos ver a seguir.

Mas dado que o ser recebia 5! conversas por dia e dessas apenas via uma

conversa, qual era a probabilidade de ele ter visto precisamente a conversa da Inês e

do Tiago? Ambos, com facilidade, responderiam que como a probabilidade de algo é a

razão entre os casos favoráveis e os possíveis ia ser 1 sobre 5!=5*4*3*2*1 , que é

aproximadamente 0,83%, ou seja, uma probabilidade muito pequena.

Na segunda-feira já nenhum dos dois se lembra da conversa da aula de Química

e passeiam pelo recreio durante um intervalo.

-Adoro comer uma boa tosta mista logo pela manhã, o fiambre da escola é

mesmo bom!

-O fiambre é bom, mas já pensaste que isso há algum tempo atrás era um belo

porquinho rosado e feliz a rebolar na lama?

-Tás com inveja é? Queres um bocadinho Inês?

-Não, não é nada disso! É que matamos um porco só para tu te estares a

lambuzar agora e se tivéssemos dois porcos eles iam ter porquinhos e esses

porquinhos iam ter por sua vez mais filhos e a cada geração seriam mais e mais e

acabaste de comer não só essa parte de um porco mas toda uma família. – E dá uma

trinca na tosta mista.

-Então e quantos porquinhos dos mais novos comemos nós, então?

-Eu só comi um. Tu vamos ver… Supondo que começamos com 1 porco e que

cada porco dá origem a 4 porquinhos e que cada um desses dá origem a mais 4 temos:

1+4n porquinhos na geração n.

-Isso não faz sentido! Concordas que na 2ª geração de filhos tens 4 vezes 4

porquinhos, certo?

-Sim, tens razão, a minha resolução dava apenas 9…

-O que tu queres é 4 elevado a n pois por cada geração tens 4 vezes mais filhos.

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-E se limitarmos essa expressão quando n tende para mais infinito dá mais

infinito. Por isso tu acabaste por comer um porco que podia dar origem a mais infinitos

porquinhos.

-Só que o porco que eu comi era infértil, por isso apenas comi um!– Retorquiu o

Tiago, muito seguro e sério, o que levou a Inês a rir-se às gargalhadas.

-Isso era o que querias! Afinal, às vezes matemática é divertida…

E com este comentário continuam a caminhar pelo recreio, enquanto o Tiago

acaba a tosta mista. Quando a finaliza deita o guardanapo para o chão e a Inês,

reparando, acha normal essa atitude.

O ser especial que tinha reparado na conversa dos amigos também viu o

guardanapo a ir parar ao chão mas não ficou indiferente, ficou indignado e decidiu que

não queria esperar mais. Assim, quando tocou para voltar a entrar na aula, o tempo

para.

Se quisermos ser mesmo precisos, o tempo não parou efetivamente pois, apesar

de poderoso, o ser não o podia parar sem criar um buraco negro e colocar tudo dentro

do horizonte de acontecimentos, por isso optou por apenas diminuir a velocidade de

tudo e criar bolhas que não fossem afetadas pela dilatação do tempo para ele e os dois

amigos poderem ser as únicas pessoas a moverem-se.

-Tiago, o que aconteceu? Aquele pássaro está parado no meio do ar!

-Não sei, mas não me parece nada bem…

Numa nuvem de fumo aparece-lhes à frente o controlador do tempo pois ele

sabe como é importante uma entrada majestosa para dar uma excelente primeira

impressão. Já andava neste negócio há uns anos e havia reparado que o espanto

variava exponencialmente com a quantidade de fumo, ou seja, quanto mais fumo, mais

espantadas ficavam as pessoas.

-Eu sou o maravilhoso, o fantástico, a obra-prima da natureza, o Complex.

-Eu sou a…

-Inês e o Tiago.

-Mas como…

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-Sem perguntas desnecessárias. Eu parei o tempo mas temos de nos apressar!

Com estes dizeres Complex agarra-os e teletransporta-os para uma ilha deserta

no meio de um oceano. Por acaso era o oceano Pacífico, mas isso não interessa.

-Estamos numa ilha porque…- Tenta o Tiago saber.

-Porque foi no oceano que tudo começou.

-Tudo o quê?– Pergunta a Inês, não conseguindo conter a curiosidade.

-A vida. Só se conhece vida no planeta Terra, por enquanto, e pensa-se que ela

começou no oceano.

-Nós aprendemos isso a Ciências.

-E falaram do quanto isso tem a ver com Matemática? De como a evolução pode

ser estudada através dela?

-Bem, não…

-Não temos muito tempo para isto, mas basicamente estuda-se através de

probabilidades de mutações, chances de certos genótipos nascerem e outros fatores. É

bastante complexo este estudo, mas foi através deste tipo de processos que hoje

estamos aqui tal como somos e há tantas espécies diferentes. O vosso objetivo é

chegar a terra firme.

-Mas estamos no meio do mar!

-Oceano. Alguns animais vão vos propor questões. Se as conseguirem resolver,

eles ajudar-vos-ão a chegar a terra. Tomem esta ampulheta e quando a areia cair toda,

o tempo recomeça a contar. Não querem estar no oceano quando isso acontecer. Têm

o equivalente a uma hora.

Deixo-vos a primeira pista: Devem dar 4! passos nesta direção e depois saltar um

quarto dos passos que deram enquanto clamam pelo número de saltos.- E dizendo isto,

Complex desapareceu numa nuvem de fumaça enquanto apontava numa direção.

-Fazemos o que ele disse? – Questiona o Tiago.

-Temos opção? 4!=4*3*2*1=24 passos. – E caminham até ao local.

-24/4=6 saltos. Seis!– Gritam, saltando.

Repentinamente surge uma língua de terra no meio do mar.

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-O último a chegar ao fim perde!– Desafia a Inês, começando a correr enquanto

o Tiago segue no seu encalço.

No fim do caminho estava um ser parecido com um macaco, mas que ao mesmo

tempo era diferente.

-Olá, vi que conseguiram chegar até aqui. Eu sou um Australopiteco. Ou era

porque já a minha espécie não existe, evoluiu e tornou-se no Homo Sapiens Sapiens,

ou seja, o Homem atual. Na natureza as espécies vão evoluindo, adaptando-se melhor

ao seu habitat ou às mudanças que nele ocorrem. Por vezes a mesma espécie

ramifica-se e dá origem a duas novas espécies. Foi através desse processo que se

passou de mim para vocês.

-Uau, nunca esperei conhecer um Australopiteco!

-Agora conheces. Mas estou aqui para o vosso próximo desafio. Quando eu sair

daqui vão aparecer 3 pares de tartarugas. Devem subir para cima do par que tiver

escrito na carapaça a resposta correta à minha questão. Qual é o limite quando x tende

para mais infinito de 1 sobre x?

Completa a charada o Australopiteco desvanece-se no ar, afinal de contas, ele já

não pertence a este mundo, a espécie dele já evoluiu. No momento do

desaparecimento veem à tona 6 tartarugas.

-Essa foi fácil!

-Sim, dá 0, logo são aquelas duas tartarugas.- Completa a Inês deslocando-se

até ao par escolhido.

-Boa tarde, eu sou Molly, a tartaruga e vocês acertaram. Eu e o meu amigo

Scuba iremos levá-los até à última etapa do vosso caminho, agarrem-se bem.

Durante a viagem marítima, a Inês e o Tiago reparam que os animais se moviam,

se bem que lentamente. Isto só podia querer dizer que o tempo deles se estava a

acabar e, quando olham para a ampulheta, veem as suas suspeitas serem confirmadas.

-Chegámos, podem descer.

-Mas isto é uma mini ilha!– Começa o Tiago.

-E não está cá ninguém!– Completa a Inês.

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-Não se preocupem que a Tentil e o Lhão já aparecem.

No momento que o Scuba fala surgem dois tentilhões que aterram em cima de

um pequeno arbusto que existe na pequena ilha. Enquanto isso, Molly e Scuba

despedem-se e retomam a sua viagem pelo oceano.

-Olá, eu sou o Lhão e esta é a Tentil. Somos tentilhões e estamos aqui para vos

dar o último desafio.

-Vocês têm bicos diferentes. São realmente da mesma espécie? – Questiona a

Inês.

-Sim, somos. O que se passa é que vivemos em ilhas diferentes. Vivemos ambos

nas Galápagos e foi ao estudar-nos que Darwin, um grande cientista, formulou a sua

teoria de evolução das espécies. Ele reparou precisamente que tínhamos bicos

diferente e que os tentilhões de cada ilha apresentavam características específicas de

acordo com as condições de cada ilha. Ou seja, cada um estava adaptado ao meio

onde vivia.

-Mas o Australopiteco já lhes deve ter falado disso tudo. – Comenta o Lhão.

-Mais ou menos…

-O que ele talvez não vos disse é que se o ambiente muda muito rapidamente as

espécies não têm tempo de se adaptar e extinguem-se.

-Isso aprendemos na escola. Temos de separar o lixo e não gastar água e esse

tipo de ações para preservar o mundo.

-Exatamente, mas vocês fazem isso?– Pergunta a Tentil.

-Às vezes…- Admite o Tiago.

-Mas também sendo só nós a fazer não serve de nada!

-Se todos pensarem como tu, Inês, aí é que ninguém ajuda e o mundo morre.

-Estamos num planeta, os planetas não morrem.

-Estamos no único planeta que sabemos ter vida. Se não houver vida quem vê a

beleza do mundo, do universo?

Os dois amigos ficaram sem fala, não sabiam como responder.

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-O mundo está a mudar, ele está sempre a mudar, mas não pode ser de maneira

abrupta, por isso devemos cuidar do nosso planeta, dar-lhe carinho, não o poluir, não

gastar muita água e reduzir, reutilizar e reciclar. Vocês não fazem ideia da quantidade

de animais que morre todos os dias devido à poluição, que asfixiam com sacos de

plástico deitados no oceano, que não conseguem respirar devido a derrames de

petróleo e situações assim.

-Têm razão, nós vamos mudar o nosso comportamento.– Comprometem-se a

Inês e o Tiago.

-Veremos, lembrem-se que o que importa são as ações. Agora, qual é a derivada

do cosseno de 3x?

-A derivada do cosseno é menos seno.

-E multiplicas isso pela derivada do que está dentro logo fica -3 seno de 3x.–

Completa a Inês.

-Está certo, até um dia amigos. – Despedem-se os tentilhões enquanto voam

para casa e Complex aparece numa nova nuvem de fumo.

-Parabéns, conseguiram completar a vossa missão. Vamos voltar.

E lá voltam eles para a escola, mas o tempo ainda está parado. Porque será?

-Porque fizemos esta viagem? Porque tinha matemática nos desafios mas os

animais não falavam dela?

-A matemática da evolução é difícil, precisam de aprender mais para a

compreender. Quanto à viagem, é uma metáfora para a vida: vida é descoberta e este é

o único planeta com vida. Há que aproveitar!

Apesar de tudo, matemática não deve ser vista como uma ferramenta, ela é um

fim em si mesma, é arte. É a arte de descobrirem com a razão um novo e divertido

mundo. Bem, já estou atrasado, até um dia crianças.– Explica Complex,

desaparecendo.

Os dois amigos estão estarrecidos com a aventura. Lembram-se do lixo que

tinham deitado fora e vão-no buscar para colocar no local certo.

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A partir desse dia tornaram-se mais conscienciosos e amantes de matemática.

Pelo menos durante uns tempos…

Catarina Sampaio Alves, nº 8, 12º A

Escola: Escola Básica e Secundária de Anadia

Professora responsável: Manuela Monteiro