2014-03-15 - nos dias que correm
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Nos dias que correm...
A coluna desta semana vem num tom um pouco diferente das anteriores. Antes de mais: não,
o motivo não é uma bronca dos redatores da página pedindo a diminuição do tamanho para “atender
ao perfil do nosso leitor”. Antes fosse... O motivo é ue a vida, bonita e bonita como ela é !e viva o
"on#aguinha pra nos lembrar disso...$, nos obriga aos temas a partir da sua andadura. Andou pra lá,
é carnaval. Andou pra cá, é... %ois bem, vamos &untos ver o ue é.
'm ()*+, alguns meses antes de “o gigante acordar” no rasil, um grupo se reivindicando
neona#ista colou carta#es no prédio onde fica a sede do meu partido, o %- o mesmo prédio onde
também está a sede do %/01. Os carta#es, muito amigáveis e civili#ados, esbrave&avam algo como
ue “comunista bom é comunista morto” e ue abandonássemos a região sob pena de agress2es.
'm &unho dauele ano, o “gigante” acorda meio de mau humor e, muito nervoso com o
despertador, e3pulsa boa parte da esuerda !partidos e movimentos sociais$ de um grande ato na
%residente 4argas...
5as por ue diabos reuentar essa pauta6
%orue semana passada, no dia *( de março 7 apenas uatro dias depois do 8ia
9nternacional da 5ulher 7 aconteceu algo ue simplesmente não pode acontecer. -om a palavra, os
estudantes da 1: “8uas estudantes da 1niversidade foram alvo de mais uma tentativa de estupro
em frente ao bande&ão, agredidas e intimidadas uma delas pelo simples fato de ser comunista e estar
com o broche de sua organi#ação pol;tica< O agressor esbrave&ou ofensas anticomunistas,
machistas, intolerantes, além de defender a superioridade da raça ariana em pleno século ==9”.
O inaceitável se combina com o inadmiss;vel: alegando despre#o pela posição pol;tica das
camaradas, um homem se sente autori#ado a agredilas se3ualmente. 0oda forma e3pressa um
conte>do: aui, a forma 7 a agressão se3ual 7 e3pressa o conte>do de uma visão de mundo ue
internali#a o tratamento dos seres humanos como coisas, como mero meio para a consecução de fins
alheios a sua vontade. ', neste caso, como ob&eto pra canali#ar o e3travasamento de impulsos
irracionais. “/e for mulher então, melhor” 7 o senso comum, desconhecendo a ?ist@ria, acha ue
são frágeis, e portanto o covarde se sente mais seguro.
este caso espec;fico, mais uma ve# a vida mostra os limites do velho e bom senso comum:
um grupo de mulheres se reuniu, impediu ue o agressor fugisse e garantiu ue deva responder pelo
ue fe# diante da sociedade. ' é a; ue entramos n@s !obviamente, me diri&o Buelas e Bueles ue
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sacaram ue não, ue a pol;cia e o &udiciário não são “a sociedade”$: a hora é de prestar toda a
solidariedade Bs companheiras agredidas em iter@i semana passada. ' mostrar ue não: ue n@s
não vamos engolir o crescimento da irracionalidade, do conservadorismo e do machismo, nem na
1, nem em lugar nenhum. Cue n@s, com a pure#a da resposta das crianças, vamos continuar
fa#endo a vida ser bonita, pra todDs n@s, e do &eito ue a gente uer.
Es companheiras e aos companheiros ue não se curvam, saudaç2es de longe e um lembrete
sempre atual:
O -A59?O, -O5 5A9AFG4/F9
Assim como a criança
humildemente afaga
a imagem do her@i,
assim me apro3imo de ti, 5aiaH@svHi.
ão importa o ue me possa acontecer
por andar ombro a ombro
com um poeta soviético.
Iendo teus versos,
aprendi a ter coragem.
0u sabes,
conheces melhor do ue eu
a velha hist@ria.
a primeira noite eles se apro3imam
e roubam uma flor
do nosso &ardim.
' não di#emos nada.
a segunda noite, &á não se escondem:
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não di#emos nada.
Até ue um dia,
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o mais frágil deles
entra so#inho e nossa casa,
roubanos a lu# e,
conhecendo nosso medo,
arrancanos a vo# da garganta.' &á não podemos di#er nada.
os dias ue correm
a ninguém é dado
repousar a cabeça
alheia ao terror.
Os humildes bai3am a cervi#:e n@s, ue não temos pacto algum
com os senhores do mundo,
por temor nos calamos.
o silJncio de meu uarto
a ousadia me afogueia as faces
e eu fantasio um levanteK
mas amanhã,
diante do &ui#,
talve# meus lábios
calem a verdade
como um foco de germes
capa# de me destruir.
Olho ao redor
e o ue ve&o
e acabo por repetir
são mentiras.
5al sabe a criança di#er mãe
e a propaganda lhe destr@i a consciJncia.
A mim, uase me arrastam
pela gola do palet@
B porta do templo
e me pedem ue aguarde
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até ue a 8emocracia
se digne aparecer no balcão.
5as eu sei,
porue não estou amedrontado
a ponto de cegar, ue ela tem uma espadaa lhe espetar as costelas
e o riso ue nos mostra
é uma tJnue cortina
lançada sobre os arsenais.
4amos ao campo
e não os vemos ao nosso lado,no plantio.
5as no tempo da colheita
lá estão
e acabam por nos roubar
até o >ltimo grão de trigo.
8i#emnos ue de n@s emana o poder
mas sempre o temos contra n@s.
8i#emnos ue é preciso
defender nossos lares,
mas se nos rebelamos contra a opressão
é sobre n@s ue marcham os soldados.
' por temor eu me calo.
%or temor, aceito a condição
de falso democrata
e rotulo meus gestos
com a palavra liberdade,
procurando, num sorriso,
esconder minha dor
diante de meus superiores.
5as dentro de mim,
com a potJncia de um milhão de vo#es,
o coração grita 5'09LA
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'81AL8O AI4'/ 8A -O/0A
iter@i, LM, *N+
ota: %oema publicado no livro POs -em 5elhores %oetas rasileiros do /éculoP, organi#ado por
Mosé Jumanne %into, pag. (*Q.
/ensato seria dei3ar isso pra trás, &á ue na seuJncia ficou claro uem estava na luta: os neona#i
dei3aram os atosK a esuerda voltou a poder empunhar suas bandeiras em pa# !feli#mente boa parte
dela não as bai3ou em momento algum$K os atos contra as remoç2es, a -opa e as Olimp;adas tJmsido importante espaço de mobili#açãoK e parece ue tudo ficou bem de novo na democrática
democracia representativa brasileira !há controvérsias... 5as ficam pra outros momentos, ue a vida
é longa$. %ois então: por ue retomar a bendita pauta6
'ste foi um dia marcante: e3pulsos embai3o de bombas e porrada, com companheiros machucados,
por figuras organi#adas e incapa#es de tolerar a pluralidade de ideias e a e3pressão aberta de
diferentes posiç2es pol;ticas num Ato p>blico.
A “livre e3pressão de posiç2es na#istas” não se inclui entre os direitos pol;ticos pela simples ra#ão
de ue pressup2e a eliminação f;sica do diferente ou sua submissão sem mais a uma elite definida
“por nascimento” no caso, o “diferente” são os comunistas, os afeitos a toda e ualuer orientação
se3ual ue não a “hetero”, os negros, os &udeus, os árabes e... em >ltima, a maior parte da
humanidade, e3istente pra servir a uma peuena elite de privilegiados. -omo se vJ, algo muito
diferente da sociedade atual.
ui, vale uma nota: na#ismo RO S posição pol;tica, RO deve poder ser e3presso
livremente e RO, não tem '?15A afinidade de pro&eto ou de visão de mundo com socialismo
ou comunismo. 'm caso de d>vida, aprofundamos o assunto numa pr@3ima coluna.
S p>blico e not@rio ue o capitalismo, em seu desenvolvimento, se apropria das formas mais
ab&etas de opressão de uma parcela da humanidade por outra pra garantir sua reprodução !tem gente
ue di# “arcaicas”, mas não concordo não: são bastante modernas$.