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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO INTERUNIDADES DE ESTÉTICA E HISTÓRIA DA ARTE ANA PAULA CATTAI PISMEL Schenberg: em busca de um Novo Humanismo São Paulo 2013

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  • UNIVERSIDADE DE SO PAULO

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO INTERUNIDADES DE ESTTICA E HISTRIA DA ARTE

    ANA PAULA CATTAI PISMEL

    Schenberg: em busca de um Novo Humanismo

    So Paulo

    2013

  • 2

    ANA PAULA CATTAI PISMEL

    Schenberg: em busca de um Novo Humanismo

    Dissertao apresentada ao Programa Interunidades de Ps-Graduao em Esttica e Histria da Arte (PGHEA/USP) para obteno do ttulo de Mestre em Esttica e Histria da Arte.

    Orientadora: Prof. Dr. Elza Ajzenberg.

    Linha de pesquisa: Teoria e Crtica de Arte.

    So Paulo

    2013

  • 3

    AUTORIZO A REPRODUO E DIVULGAO TOTAL E PARCIAL DESTE

    TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRNICO, PARA

    FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE.

    Catalogao da Publicao

    Biblioteca Lourival Gomes Machado

    Museu de Arte Contempornea da Universidade de So Paulo

    Pismel, Ana Paula Cattai.

    Schenberg : em busca de um Novo Humanismo / Ana Paula Cattai Pismel ;

    orientadora Elza Ajzenberg. -- So Paulo, 2013.

    193 f. : il.

    Dissertao (Mestrado - Programa de Ps-Graduao Interunidades em Esttica

    e Histria da Arte) -- Universidade de So Paulo, 2013.

    1. Avant-Garde Brasil Dcadas de 1960 e 1970. 2. Novo Realismo. 3.

    Humanismo. 4. Bienais de Arte Brasil Dcadas de 1960 e 1970. 5.

    Schenberg, Mrio, 1914-1990. I. Ajzenberg, Elza. II. Ttulo.

    CDD 709.81

  • 4

    Nome: PISMEL, Ana Paula Cattai.

    Ttulo: Schenberg: em busca de um Novo Humanismo.

    Dissertao apresentada ao Programa Interunidades de Ps-Graduao em Esttica e Histria da Arte (PGHEA/USP) para obteno do ttulo de Mestre em Esttica e Histria da Arte.

    Orientadora: Prof. Dr. Elza Ajzenberg.

    Linha de pesquisa: Teoria e Crtica de Arte.

    Aprovado em:

    Banca Examinadora

    Prof. Dr. Elza Ajzenberg, Universidade de So Paulo

    Julgamento: Assinatura:

    Prof. Dr. Carmen Aranha Universidade de So Paulo

    Julgamento: Assinatura:

    Prof. Dr. Alecsandra Matias de Oliveira Universidade de So Paulo

    Julgamento: Assinatura:

  • 5

    minha famlia

    Aos que nada fazem sem alegria1

    1 Referncia frase do filsofo Michel de Mongaigne, Je ne fais rien sans gayet (No fao nada sem alegria), retirada da obra Des Livres, que foi tomada por Jos Mindlin como lema. Estampada na entrada da recm-inaugurada Biblioteca Jos e Guita Mindlin, essa frase foi um grande incentivo no decorrer da elaborao desta dissertao, na medida em que, apesar das dificuldades inerentes pesquisa, tambm ela foi feita com grande alegria.

  • 6

    Agradecimentos

    Aos brasileiros, que por meio da CAPES possibilitaram a realizao desta pesquisa.

    Universidade de So Paulo, pelo ambiente universitrio amplo e repleto de

    possibilidades de aprendizado, o qual pude viver intensamente enquanto estudante desde a

    graduao.

    Ao Programa Interunidades de Esttica e Histria da Arte USP, seu corpo docente e

    administrativo, pelo suporte oferecido. Aos colegas, pelo apoio mtuo em meio s alegrias e

    expectativas inerentes pesquisa e ps-graduao.

    Prof. Dr. Elza Ajzenberg, orientadora desta dissertao, pela pacincia e

    generosidade incomuns, pelos ensinamentos e pelo exemplo de seriedade e excelncia

    acadmica.

    Prof. Dr. Alecsandra Matias de Oliveira, que sempre esteve pronta a me ouvir,

    esclarecer minhas dvidas e me aconselhar nesse percurso. Pela competncia e

    desprendimento, agradeo imensamente.

    Prof. Dr. Carmen Aranha, pela ateno e disponibilidade mpares e pelos

    conselhos to relevantes para o andamento desta pesquisa. Ao Prof.. Dr. Francisco Alembert e

    Polyana Canhte, sou imensamente grata pela simpatia, pelo apoio e, claro, pelas preciosas

    pistas com relao s Bienais de So Paulo.

    Ao Centro Mario Schenberg de Documentao da Pesquisa em Artes ECA/USP e

    equipe, sem os quais este trabalho no teria sido possvel.

    Ao Arquivo Histrico Wanda Svevo da Fundao Bienal, em especial pesquisadora

    Ana Paula Marques, pela preciosa assessoria.

    Ao Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros e seus bibliotecrios que, com grande

    ateno, auxiliaram o de levantamento de parte das fontes primrias utilizadas nesta pesquisa.

    minha famlia: Maria Jos e Jos Jarbas, amados pais, pelos momentos de plenitude

    e apoio incondicional, pela presena reconfortante e pela compreenso das ausncias; a

    Adriana e Ana Cludia, queridas irms, pelas conversas, conselhos, companhia. A todos

    vocs, minha eterna gratido.

  • 7

    quele que, com serenidade e carinho imensos, soube comemorar pequenas

    conquistas e compreender grandes ansiedades. Paulo, obrigada por ser quem e estar a meu

    lado.

    Aos amigos que, prximos ou distantes, fizeram parte dessa caminhada, especialmente

    Amanda de Paula Costa Santos e Grasiele Pereira Jannuzzi, pela convivncia diria, pelas

    risadas e conversas sobre amenidades que fizeram um bem enorme nos momentos de cansao.

    No to prximos fisicamente, mas no menos importantes, so os amigos cuja

    presena sentida apesar da distncia. So eles, Juliana Braz Ferire, Juliana Isquerdo,

    Manuela Petschilies, Nathlia Fidncio e Bruno Arajo. A vocs, meus agradecimentos pela

    compreenso das ausncias e pelo nimo transmitido nos contatos limitados pelo espao e

    tempo que se interpem s nossas caminhadas individuais aps o Ensino Mdio e a

    Graduao.

  • 8

    Ttulo

    Schenberg: em busca de um Novo Humanismo

    Resumo

    Este estudo objetivou evidenciar a viso de Novo Realismo de Mario Schenberg, dada sua importncia no horizonte das Vanguardas Brasileiras das dcadas de 1960 e 1970, bem como sua relao com o Novo Humanismo, tambm desenvolvido pelo crtico de arte durante esse perodo. Foi analisado o envolvimento de Schenberg no debate das dcadas de 1960 e 1970, tendo por base sua atuao nas exposies Opinio 65, Propostas 65, Opinio 66, Propostas 66, bem como nas Bienais de So Paulo (1961, 1965, 1967, 1969 e 1971). O estudo tomou por fontes primrias as crticas originais do Centro Mario Schenberg de Documentao da Pesquisa em Arte ECA/USP escritas nas nessas duas dcadas, bem como os demais livros, artigos e entrevistas do crtico. Considerado por Mario Schenberg a expresso artstica do Novo Humanismo, o Novo Realismo foi definido a partir de um horizonte paralelo: fruto da sociedade industrial e reflexo da cultura ocidental em crise, essa tendncia refletiu um momento de ampliao de referenciais. Mario Schenberg soube compreender as demandas da arte nascente, na medida em que sua atividade crtica no se deu como julgamento e avaliao, mas como compreenso e incentivo.

    Patavras-chave: Mario Schenberg, Novo Realismo, Novo Humanismo, Vanguardas Brasileiras

  • 9

    Title

    Schenberg: In search of a New Humanism

    Abstract

    This Study had the objective of showing the vision of the New Humanism of Mario Schenberg, due to its importance in the horizon of the Brazilian Vanguards from the 1960s and 1970s decades, as well as its relation to the New Humanism, also developed by the art critic during this period. The involvement of Schenberg in the debate of the 1960s and 1970s decades was analyzed, based on his actuation on the expositions Opinio 65, Propostas 65, Opinio 66, Propostas 66, as well as in the So Paulo Biennials (1961, 1965, 1967, 1969 e 1971). This study considered by primary sources the original critics of the Centro Mario Schenberg de Documentao da Pesquisa em Arte ECA/USP written in these two decades, as well as the rest of the books, articles and interviews of the critic. Considered by Mario Schenberg the artistic expression of the New Humanism, the New Realism was defined from a parallel horizon: result of an industrial society and a reflex of an occidental culture in crisis, this tendency reflected in a moment of referential amplifications. Mario Schenberg knew how to comprehend the demands of the rising art, in which, his critical activities were not made by judgment and evaluation, but as comprehension and incentive.

    Key-words: Mario Schenberg, New Realism, New Humanism, Brazilian Vanguards

  • 10

    Lista de Imagens

    FIGURA 2 ALFREDO VOLPI, [COMPOSIO COM FAIXAS] , DC. 1960, TMPERA SOBRE TELA, 75 X 110,3 CM. COLEO PARTICULAR. REPRODUO FOTOGRFICA HORST MERKEL. ....................................................... 25

    FIGURA 1 - ALFREDO VOLPI, [VISTA DE ITANHAM] [MARINHA DE ITANHAM], DCADA DE 1940, TMPERA SOBRE TELA, 45 X 76 CM. COLEO PARTICULAR. REPRODUO FOTOGRFICA DE AUTORIA DESCONHECIDA. ....... 25

    FIGURA 3 - ALFREDO VOLPI, FACHADA COM BANDEIRAS, 1959, TMPERA SOBRE TELA, 116 X 72 CM. ACERVO DO MUSEU DE ARTE DE SO PAULO - MASP, DOAO DE ERNEST WOLF. ........................................................ 26

    FIGURA 5 - SALA DE SRGIO CAMARGO, VIII BIENAL DE SO PAULO. O ARTISTA RECEBEU O PRMIO DE MELHOR ESCULTOR NACIONAL NA EDIO. ................................................................................................................. 34

    FIGURA 4 - MARIA BONOMI, 1965, XILOGRAVURA SOBRE PAPEL DE ARROZ, 130 X 108. A ARTISTA GANHOU O PRMIO DE MELHOR GRAVADORA NACIONAL. ............................................................................................... 34

    FIGURA 7 JASPER JOHNS, TRS BANDEIRAS, 1958................................................................................................. 38 FIGURA 6 QUISSAK JNIOR, POLPTICO MVEL UM OU DO CAMPO VERDE, POLPTICO MVEL DOIS OU DO

    LOSANGO AMARELO, POLPTICO MVEL TRS OU DO CRCULO AZUL, POLPTICO MVEL QUATRO OU DA FAIXA BRANCA, POLPTICO MVEL CINCO OU DA PTRIA. 1967, LEO SOBRE TELA. ................................................. 38

    FIGURA 8 HLIO OITICICA, B15 BLIDE VIDRO 4 - TERRA, 1964, CUBA DE VIDRO, TERRA E TECIDO. PROJETO HELIO OITICICA (RIO DE JANEIRO, RJ). REPRODUO FOTOGRFICA AUTORIA DESCONHECIDA................... 43

    FIGURA 9 - MIRA SCHENDEL, ONDAS PARADAS DE PROBABILIDADE, 1969 (RECRIADA EM 2009), INSTALAO, DIMENSES VARIVEIS. FIOS DE NILON E TEXTO EM PLACA DE ACRTICO AFIXADO NA PAREDE. COLEO ADA SCHENDEL. ............................................................................................................................................ 53

    FIGURA 10 X BIENAL DE SO PAULO, EM 1969. EM PRIMEIRO PLANO, ESTRUTURAS TEMPORRIAS, EM FORMA DE OCA, CONSTRUDAS PARA ABRIGAR OS EVENTOS DA II BIENAL DE CINCIA E HUMANISMO. ......................... 63

    FIGURA 11 ESPAO EXPOSITIVO DE OPINIO 65, NO MUSEU DE ARTE MODERNA DO RIO DE JANEIRO. AGOSTO-SETEMBRO DE 1965. ...................................................................................................................................... 66

    FIGURA 12 CONVITE ORIGINAL DA EXPOSIO OPINIO 65. ................................................................................ 67 FIGURA 13 RUBENS GERCHMAN, CONCURSO DE MISS, 1965, ACRLICA SOBRE TELA, 140 X 280 CM. COLEO

    GILBERTO CHATEAUBRIAND MAM-RJ. REPRODUO FOTOGRFICA AUTORIA DESCONHECIDA. .............. 68

    FIGURA 14 WALDEMAR CORDEIRO, AMARGO, 1965, TECIDO E LMPADA, 20.5 X 28.3 X 3.9. .............................. 75 FIGURA 15 - HLIO OITICICA, TROPICLIA , 1967. PLANTAS, AREIA, PEDRAS, ARARAS, APARELHO DE TELEVISO,

    TECIDO E MADEIRA. PROJETO HLIO OITICICA (RIO DE JANEIRO, RJ). VISTA PARCIAL DA INSTALAO TROPICLIA PB2 (IMAGTICO) E PN3 (A PUREZA UM MITO) MOSTRA NOVA OBJETIVIDADE BRASILEIRA, REALIZADA NO MAM-RJ, EM 1967. REPRODUO FOTOGRFICA CSAR OITICICA FILHO. ..... 96

    FIGURA 16 - MAURCIO NOGUEIRA LIMA, NO ENTRE ESQUERDA, 1964, METAL E ESMALTE SINTTICO SOBRE AGLOMERADO, ACERVO MUSEU DE ARTE MODERNA SP. ......................................................................... 101

    FIGURA 17 -MAURCIO NOGUEIRA LIMA, NO AR, NO WAR, 1966. COLAGEM, GUACHE E TMPERA SOBRE CARTO, 40 X 51 CM................................................................................................................................................... 102

    FIGURA 18 - MAURCIO NOGUEIRA LIMA, "TCHAF" POSITIVO, 1967. ACRLICA SOBRE CARTO, 80 X 80 CM. COL. PARTICULAR. ............................................................................................................................................... 103

    FIGURA 19 -MAURICIO NOGUEIRA LIMA, MARILYN MONROE, 1969. SERIGRAFIA, 73 X 73 CM. ............................ 104 FIGURA 20 -JOS ROBERTO AGUILAR, IMAGEM (DPTICO) , 1967. ACRLICA SOBRE TELA, 114 X 292

    CM. REPRODUO FOTOGRFICA ROMULO FIALDINI. ................................................................................. 114 FIGURA 21 - JOS ROBERTO AGUILAR, SEM TTULO , CA. 1965. LEO SOBRE TELA, C.I.D. 73 X 92 CM.

    REPRODUO FOTOGRFICA ROMULO FIALDINI. ....................................................................................... 114 FIGURA 22 -MRIO GRUBER, RETRATO DE MRIO SCHENBERG , 1978. LEO SOBRE TELA, C.I.D. 64 X 53 CM.

    CENTRO MARIO SCHENBERG DE DOCUMENTAO DA PESQUISA EM ARTES ECA/USP. REPRODUO FOTOGRFICA AUTORIA DESCONHECIDA. .................................................................................................... 115

  • 11

    FIGURA 23 -MRIO GRUBER, FANTASIADO II , 1976. LEO E TINTA ACRLICA SOBRE TELA, C.I.D. 73,5 X 64 CM. PINACOTECA DO ESTADO (SO PAULO, SP). REPRODUO FOTOGRFICA RMULO FIALDINI. .................. 115

    FIGURA 24 - WESLEY DUKE LEE, O HELICPTERO, 1969, INSTALAO/POLIMATRICO, 400 CM. ................... 120 FIGURA 25 -HLIO OITICICA, RELEVO ESPACIAL , 1959. ACRLICO SOBRE MADEIRA, 16 X 63 X 150 CM. PROJETO

    HELIO OITICICA (RIO DE JANEIRO, RJ). REPRODUO FOTOGRFICA ANTONIO CAETANO. ........................ 120

    FIGURA 26 - LYGIA CLARK, BICHO, 1960, FOTOGRAFIA DE EXPOSIO DE LYGIA CLARK NO RIO, MESMO ANO. 125 FIGURA 27 - REGISTRO DA PERFORMANCE CAMINHANDO, FEITA POR LYGIA CLARK EM 1963, EM QUE A ARTISTA

    RECORTA FITA DE PAPEL .............................................................................................................................. 125

    FIGURA 28 -LYGIA CLARK, MSCARAS SENSORIAIS,1967. ..................................................................................... 126

    FIGURA 29 - LYGIA CLARK, ARQUITETURAS BIOLGICAS: OVO-MORTALHA, 1968. .............................................. 126 FIGURA 30 -JOS ROBERTO AGUILAR, SRIE DO FUTEBOL II , 1966. SPRAY SOBRE TELA, 114 X 146 CM. COLEO

    MAC-USP .................................................................................................................................................. 138 FIGURA 31 WALDEMAR CORDEIRO, MOVIMENTO, 1951. TMPERA SOBRE TELA, 90.2 X 95 CM. COLEO MAC-

    USP. ............................................................................................................................................................ 138 FIGURA 32 - WALDEMAR CORDEIRO, JOS LUIZ AGUIRRE / ESTEVAM ROBERTO SERAFIM, USP, A MULHER QUE

    NO B.B., 1971, COMPUTER GRAPHIC, 30,5 X 45,5 CM, COLEO PARTICULAR......................................... 139

    FIGURA 33 - A MULHER QUE NO B.B., 1971. ..................................................................................................... 139

    FIGURA 34 WALDEMAR CORDEIRO, O BEIJO, 1967. COLEO MAC-USP. ...................................................... 139 FIGURA 35 - CARTO POSTAL WESSEL. FOTOGRAFIA DO ANTIGO PALACETE SANTA HELENA, DEMOLIDO EM 1971,

    QUANDO DA CONSTRUO DA ESTAO DO METR DA S. ........................................................................ 141 FIGURA 36 -MANUEL MARTINS, PRAA DA S, CA. 1940. LEO SOBRE MADEIRA, C.S.E., 50 X 40 CM. REPRODUO

    FOTOGRFICA GERSON ZANINI.................................................................................................................... 144 FIGURA 37 - ALDO BONADEI, PAISAGEM , 1946. LEO SOBRE TELA, 50 X 63 CM. REPRODUO FOTOGRFICA

    ROMULO FIALDINI ....................................................................................................................................... 145

    FIGURA 38 - FRANCISCO REBOLO GONSALES. PAISAGEM COM FIGURAS, 1942. COLEO MAC USP. ................. 145 FIGURA 39 - MA YAN, PAISAGEM AO LUAR, C. 1200. ROLO SUSPENSO, PINTURA EM SEDA, 149,7 X 78,2 CM. MUSEU

    DO PALCIO NACIONAL, TAIP. .................................................................................................................. 147

    FIGURA 40 - MIRA SCHENDEL. MONOTIPIAS. LEO SOBRE PAPEL DE ARROZ, 1965, 46 X 172 CM. ........................ 149

    FIGURA 41 - MIRA SCHENDEL, SEM TTULO, 1964-65. MONOTIPIA (LEO SOBRE PAPEL DE ARROZ), 46 X 23 CM. 150 FIGURA 42 - FLVIO DE CARVALHO, RETRATO DE MRIO SCHEMBERG, 1968, LEO SOBRE TELA, C.S.D., 98 X 67 CM.

    COLEO PARTICULAR. .............................................................................................................................. 153 FIGURA 43 - VI BIENAL DE SO PAULO. REPRODUES DE QUADROS DE ALFREDO VOLPI. AUTORIA

    DESCONHECIDA, ARQUIVO HISTRICO WANDA SVEVO/FUNDAO BIENAL. ............................................. 184 FIGURA 44 -VI BIENAL DE SO PAULO. REPRODUES DE QUADROS DE ALFREDO VOLPI. AUTORIA

    DESCONHECIDA, ARQUIVO HISTRICO WANDA SVEVO/FUNDAO BIENAL. ............................................. 185 FIGURA 45 -VISTA EXTERNA COM OUTDOOR DA VI BIENAL DE SO PAULO. AUTORIA DESCONHECIDA, ARQUIVO

    HISTRICO WANDA SVEVO/FUNDAO BIENAL. ........................................................................................ 186 FIGURA 46 -X BIENAL DE SO PAULO, VISTA EXTERNA.. ESTRUTURAS TEMPORRIAS, EM FORMA DE OCA,

    CONSTRUDAS PARA ABRIGAR OS EVENTOS DA II BIENAL DE CINCIA E HUMANISMO. AUTORIA DESCONHECIDA, ARQUIVO HISTRICO WANDA SVEVO/FUNDAO BIENAL. ............................................. 187

  • 12

    Sumrio

    INTRODUO .............................................................................................................................................13

    PORQUE OPINAR PRECISO: SCHENBERG E SEU CONTEXTO......................................................20

    BIENAIS DE SO PAULO ..................................................................................................................................... 20

    OPINIES E PROPOSTAS ..................................................................................................................................... 64

    SCHENBERG E VANGUARDAS: UM NOVO HUMANISMO ..................................................................82

    NOVO HUMANISMO E NOVO REALISMO............................................................................................................. 82

    ARTE MGICA E ARTE DE PARTICIPAO .................................................................................................... 105

    DESDOBRAMENTOS: A DCADA DE 1970 ........................................................................................... 127

    ARTE E TECNOLOGIA, ARTE ECOLGICA E ARTE CATASTRFICA ................................................................... 127

    SCHENBERG: CRTICA COMO INCENTIVO .......................................................................................................... 151

    CONCLUSO ............................................................................................................................................. 158

    REFERNCIAS .......................................................................................................................................... 164

    ESPECFICAS .................................................................................................................................................... 164

    GERAIS ............................................................................................................................................................ 169

    ANEXOS...................................................................................................................................................... 176

    ANEXO A CURRCULO ARTSTICO DE MARIO SCHENBERG ........................................................................... 176

    ANEXO B AUTOBIOGRAFIA DE MARIO SCHENBERG ...................................................................................... 179

    ANEXO C MIRA SCHENDEL: BREVE BIOGRAFIA............................................................................................. 181

    ANEXO D LYGIA CLARK: BREVE BIOGRAFIA ................................................................................................. 182

    ANEXO E MAURCIO NOGUEIRA LIMA: BREVE BIOGRAFIA ........................................................................... 183

    ANEXO F BIENAIS DE SO PAULO: IMAGENS ARQUIVO HISTRICO WANDA SVEVO/ FUNDAO BIENAL.... 184

    ANEXO G CARTA DE MRIO PEDROSA A MARIO SCHENBERG, 02/02/1061. ................................................. 188

    ANEXO H MANIFESTO DOS 4 ......................................................................................................................... 189

    ANEXO I CARTA DE MAURCIO NOGUEIRA LIMA A FRANCISCO MATARAZZO SOBRINHO, 16/05/1969. ........ 190

    ANEXO J ATA DA PRIMEIRA REUNIO DO JRI DE SELEO PARA A X BIENAL DE SO PAULO, 27/05/1969. 192

    ANEXO K HISTRICO DO CENTRO MARIO SCHENBERG ECA/USP ............................................................ 193

  • 12

    Introduo

    Mario Schenberg (Recife/PE 1914 So Paulo/SP 1990) foi uma personalidade

    marcante, de amplos horizontes, inteligncia viva e intuio aguada. Mais conhecido

    por seus trabalhos em fsica terica e astrofsica, alm do Processo Urca (desenvolvido

    juntamente com George Gamow na dcada de 1940)1, o fsico terico de renome

    internacional foi tambm crtico de arte e militante poltico.

    O interesse pela arte, cultura e pelo ser humano fez de Schenberg uma

    personalidade muito querida e respeitada por artistas, intelectuais e crticos de arte

    principalmente entre as dcadas de 1940 e 1980, perodo no qual se dedicou crtica de

    arte, bem como a descobrir e incentivar novos artistas. O fsico Alberto Luiz da Rocha

    Barros, antigo assistente de Schenberg, comentou que a ele se pode aplicar a frase de

    Terncio, que Karl Marx citava: Sou humano, e nada que humano me estranho2.

    No se pode esquecer que para Schenberg, em sua cosmoviso, arte, cincia e poltica

    no estavam separadas, mas em proximidade e consonncia, visto que para o crtico no

    havia fronteiras entre elas.

    O crtico tornou-se, nas dcadas de 1960 e 1970, terico do Novo Realismo e do

    Realismo Fantstico3 (cujo sentido ser explicitado a seguir), tendo escrito muito sobre

    essas tendncias. Por meio de seus textos, constatou-se que esteve presente nos debates

    a esse respeito e manteve proximidade com artistas cujas pesquisas tomaram essas

    direes. O artista Maurcio Nogueira Lima apontou que o crtico deu muito apoio aos

    1 Alberto Luiz da Rocha Barros esclareceu que, no incio de sua carreira, Schenberg trabalhou com Enrico Fermi na Universidade de Roma e com Wolfgang Pauli em Zurique. Esses dois cientistas introduziram na fsica o neutrino, uma partcula com carga eltrica e massa evanescente (BARROS Alberto Luis da Rocha. Schenberg: Nada do que Humano lhe era Estranho. In Estudos Avanados, 11(5), 1991, p, 195). Na dcada de 1940, trabalhando com George Gamow nos Estados Unidos, Schenberg teve a intuio de introduzir o neutrino para explicar o colapso que inicia o processo explosivo em estrelas novas e supernovas, uma vez que os estudos dos quais Gamow partira tinham sido escritos antes de se ter ideia do neutrino. O que motivou o nome Processo Urca foi uma comparao feita por Gamow: este observou que as estrelas perdiam neutrinos assim como jogadores perdiam dinheiro no Cassino da Urca, famoso na poca, que havia visitado com Schenberg ao conhecer o Rio de Janeiro. (SCHENBERG, Mario. Formao da Mentalidade Cientfica. In Estudos Avanados, 12(5), 1991, p. 140). 2 BARROS Alberto Luis da Rocha. Schenberg: Nada do que Humano lhe era Estranho. In Estudos Avanados, 11(5), 1991. 3 OLIVEIRA, Alecsandra Matias de. Schenberg: crtica e criao. So Paulo: Edusp, 2011, p.119.

  • 13

    grupos de vanguarda nos anos de 1960, escrevendo sobre eles e refletindo acerca de

    suas caractersticas e intenes4.

    A atuao de Mario Schenberg como crtico de arte foi o objeto desta pesquisa.

    Suas reflexes sobre o Novo Realismo, durante as dcadas de 1960 e 1970, bem como

    sua concepo de um Novo Humanismo (termo que ser definido adiante) constituram

    as preocupaes do estudo ora apresentado. Na viso de Schenberg, o Novo

    Humanismo estaria estritamente ligado aos desdobramentos do Novo Realismo no

    Brasil durante o perodo delimitado. Cabe, aqui, investigar essa relao, bem como seu

    desenvolvimento pelo crtico.

    Mario Schenberg participou de momentos marcantes do cenrio artstico da

    dcada de 1960, tais como as exposies Opinio 65 e Propostas 655, bem como das

    Bienais Internacionais de Arte de So Paulo dos anos de 1965, 1967 e 1969, como

    membro do Jri Nacional de Seleo. Nesse nterim, o crtico manteve contato com

    artistas como Lygia Clark, Hlio Oiticica, Mira Schendel, Maurcio Nogueira Lima,

    Jos Roberto Aguilar, entre outros.

    As observaes sobre o desenvolvimento do Novo Realismo, do Realismo

    Fantstico e do Realismo Mgico continuaram presentes na crtica de arte de Schenberg

    na dcada de 1970, mas em menor medida. Suas consideraes apontaram com mais

    frequncia tendncias como Arte Primitiva, Catastrfica e Ecolgica (tambm definidas

    adiante), todas vistas por ele como desdobramentos do Novo Realismo.

    Cabe observar que as Bienais de So Paulo foram eventos representativos das

    tendncias das artes plsticas nesse nterim, tanto pela presena, quanto pela ausncia de

    artistas, crticos e intelectuais como na edio de 1969, com o incio do boicote

    4 Nessa poca, a principal caracterstica de Schenberg, foi a de apoiar os grupos de vanguarda que tentavam subverter a arte brasileira; principalmente na dcada de 60, quando eu e o Schenberg mais colaboramos com esses grupos. [...] Mrio nos deu um grande apoio, escrevendo vrios artigos; mas, infelizmente, no tinha acesso aos meios de comunicao (jornais, televiso etc). Os artigos eram publicados em catlogos de exposies e, s vezes, uma ou outra revista cedia espao para ele expor o seu pensamento. (LIMA, Maurcio Nogueira. Mrio Schenberg: incentivador e crtico. In AJZENBERG, Elza (org.). Schenberg Arte e Cincia. So Paulo, 1995, p. 42). Com relao s citaes diretas neste estudo, optou-se por manter sempre a grafia original da fonte, conforme se ver adiante. 5 Opinio 65 teve lugar no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, entre agosto e setembro de 1965. Foi organizada por Jean Boghici e Ceres Franco. A proposta da exposio era reunir artistas residentes em Paris e no Brasil, promovendo um confronto entre a produo daqueles e a dos jovens artistas de vanguarda no pas. Ambos tinham proximidade com a nova figurao, a Pop Art e o Nouveau Ralisme. Pouco tempo depois, em So Paulo, foi inaugurada a exposio Propostas 65, no Museu de Arte Brasileira da Fundao Armando lvares Penteado (MAB/FAAP), em dezembro, acompanhada de um seminrio. A mostra paulista foi a repercusso imediata da exposio carioca e, reunindo muitos dos artistas participantes de Opinio 65. No ano seguinte, Opinio 66, tambm no MAM do Rio, abria entre agosto e setembro de 1966, por iniciativa dos mesmos organizadores. Em dezembro do mesmo ano, teve lugar o seminrio Propostas 66, dessa vez na Biblioteca Pblica Municipal Mrio de Andrade.

  • 14

    internacional. Nesse perodo, Mario Schenberg esteve prximo da organizao desses

    eventos: para a edio de 1961, realizou a sala especial dedicada ao pintor Alfredo

    Volpi e nas edies de 1965, 1967 e 1969, foi membro do Jri Nacional de Seleo.

    Para essa funo, o crtico foi eleito pelos artistas6, que confiavam em sua atuao e

    acreditavam que ele poderia defender seus interesses junto ao jri do evento7. Na edio

    de 1971, apesar de no ter integrado o corpo de jurados, participou de uma Mesa-

    Redonda Internacional de Crticos de Arte, que discutiu a crise da Bienal8.

    O ano de 1965 significou a tomada de posio poltica e contestao, pondo fim

    ao breve silncio por parte dos artistas desde o golpe de 1964, marcado por prises

    arbitrrias, tortura e desaparecimentos. As exposies Opinio 65 (MAM-RJ) e

    Propostas 65 (MAB-FAAP) - e, no ano seguinte, Opinio 66 (MAM-RJ) e Propostas

    66 (Biblioteca Municipal - SP) - promoveram mostras de arte, conferncias e debates

    entre artistas e crticos que, tomando a palavra, demarcavam o caminho a ser seguido

    pela Vanguarda Brasileira at os anos de 1970. Essas exposies tiveram o mrito de

    proporcionar espao para conceituaes de vrios artistas e crticos de arte a respeito

    das mudanas pelas quais passavam as artes plsticas naquele momento. Nesse

    contexto, a contribuio de Mario Schenberg foi das mais significativas, dado que sua

    formulao do Novo Realismo influenciou vrios artistas, entre eles, os da Nova

    Objetividade Brasileira9.

    O contexto poltico da poca, no qual est a Ditadura Militar que, aps o golpe

    de 1964, passou a impor a Mario Schenberg perseguies e diversas restries. Em

    nvel internacional, a ameaa da guerra nuclear e da extino da humanidade que

    6 AGUILAR, Jos Roberto. O mundo de Mario Schenberg. So Paulo: Casa das Rosas, 1996. 7 OLIVEIRA, Alecsandra Matias de. Schenberg: crtica e criao. So Paulo: Edusp, 2011. 8 Cf. Arquivo Wanda Svevo/Fundao Bienal e ALAMBERT, Alambert & Polyana CANHTE. Bienais de So Paulo: da era do museu era dos curadores. So Paulo: Boitempo, 2004. 9 A discusso iniciada com Opinio 65 teve repercusso na formulao da Nova Objetividade Brasileira, vanguarda cujo marco inicial se deu com a exposio de mesmo nome, no MAM-RJ, em 1967. A mostra reuniu diversos seguimentos anteriores, como arte concreta, neoconcretismo e nova figurao, em torno da noo de nova objetividade, que comeou a ser definida por Hlio Oiticica na exposio Propostas 65. A criao de objetos e a perspectiva de elaborao de uma vanguarda nacional foram preocupaes que pontuaram o surgimento da Nova Objetividade Brasileira. (ALVARADO, Daisy Valle Machado Peccinini de. Figuraes Brasil Anos 60: Neofiguraes Fantsticas e Neosurrealismo, Novo Realismo e Nova Objetividade. So Paulo: Ita Cultural/Edusp, 1999; ITA CULTURAL. Enciclopdia de Artes Visuais Ita Cultural. Disponvel em: www.itaucultural.org.br Acesso em 02/02/2013).

  • 15

    perpassavam a ambientao da Guerra Fria tambm foram elementos significativos da

    ambincia do perodo, pois influenciaram a viso de mundo do crtico10.

    No campo das artes plsticas, os artistas brasileiros sentiram os impasses que

    envolviam o contexto nacional e internacional, buscando uma arte que, estando mais

    prxima da realidade cotidiana, fosse capaz de dialogar mais diretamente com o

    pblico, ao mesmo tempo em que, sem renunciar s conquistas das vanguardas

    anteriores, encontravam novos caminhos para responder s demandas da realidade que

    os cercava. Aliando elementos da Pop Art e do Nouveau Ralisme ao senso construtivo

    oriundo do Concretismo e do Neoconcretismo, os artistas brasileiros seguiram caminhos

    que os levaram nova configurao da Vanguarda Brasileira11.

    interessante ressaltar, nesse contexto, que a reflexo do Professor Mario

    Schenberg a respeito dessas tendncias orientou, por exemplo, o surgimento da Nova

    Objetividade Brasileira. O artista Hlio Oiticica12 afirmou que uma das bases tericas

    do grupo foi o Novo Realismo de Schenberg, e no o de Pierre Restany, crtico francs

    que refletiu sobre o Nouveau Ralisme europeu a partir do fim dos anos de 1950. Diante

    desse quadro, perguntou-se como pode ser entendido o Novo Realismo de Mario

    Schenberg e como ele estava relacionado sua viso de Novo Humanismo.

    A reflexo de Schenberg acerca da arte, dos artistas, e de seu momento histrico

    levou em conta elementos que mereceram aprofundamento, na medida em que foram

    relevantes para os rumos da Vanguarda Brasileira. Diante disso, este estudo objetivou,

    primeiramente, contribuir para ampliar o conhecimento do legado de Mario Schenberg

    como intelectual, principalmente sua contribuio enquanto crtico de arte.

    A pesquisa analisou o envolvimento de Schenberg no debate das dcadas de

    1960 e 1970, tendo por base sua atuao nas exposies j apontadas. Evidenciou sua

    viso de Novo Realismo, dada sua importncia no horizonte das Vanguardas

    Brasileiras, e tambm alguns dos direcionamentos identificados pelo crtico, como a

    relao entre a Arte e a Poltica, o Pensamento Oriental e a Tecnologia, alm de outras

    10 Enfatiza-se que, em virtude da densidade desse momento artstico e cultural no Brasil, surgiu a necessidade de se fazer escolhas na apresentao desse contexto, trazendo ao percurso expositivo apenas os elementos que motivaram o pensamento e o posicionamento tomado por Mario Schenberg. 11 Cf. AJZENBERG, Elza. Exerccios Estticos da Liberdade. So Paulo: ECA USP, 1989 (tese de livre docncia) e GOLDFARB, Jos Luiz. Voar tambm com os Homens. So Paulo: EDUSP, 1994. 12 OITICICA, Hlio. Situao da Vanguarda no Brasil (Propostas 66). In FERREIRA, Glria (org.). Crtica de arte no Brasil: temticas contemporneas. Rio de Janeiro: Funarte, 2006. O texto foi publicado em 1966, na revista Artes: (So Paulo, 1966. Ano I, n. 9, nov.-dez, 1966).

  • 16

    tendncias emergentes poca, como Arte Mgica, Arte Ecolgica e Arte de

    Participao13.

    Integraram o corpo terico desta pesquisa os estudos anteriores sobre o crtico, a

    saber, Schenberg: crtica e criao de Alecsandra Matias de Oliveira (So Paulo:

    Edusp, 2011), que destacou sua trajetria intelectual, apresentando sua viso esttica

    sem perder de vista dados biogrficos; e Voar tambm com os homens: o pensamento

    de Mario Schenberg de Jos Luiz Goldfarb (So Paulo: Edusp, 1994), que se dedicou ao

    pensamento cientfico, artstico e filosfico do crtico. Tais fontes constituram alicerces

    importantes para o desenvolvimento deste estudo. Entretanto, tais estudos no tinham

    por objetivo ir diretamente ao projeto crtico de Mario Schenberg, mas lanar as bases

    para que estudos posteriores o fizessem. Nesse momento, o suporte fornecido por estes

    autores tornou possvel levar adiante a investigao de aspectos estticos de seu

    pensamento14.

    A metodologia empregada neste estudo envolveu a anlise dos textos crticos

    escritos no perodo, que continham reflexes estticas e propostas dos artistas

    pontuados por Schenberg. Muitos de seus escritos sobre arte foram publicados em

    catlogos de mostras e no livro Pensando a Arte (So Paulo: Nova Stella, 1988). Foram

    raras as publicaes desse tipo em jornais ou revistas. Uma grande parte de seus textos

    crticos est depositada nos arquivos do Centro Mario Schenberg de Documentao da

    Pesquisa em Arte ECA USP, somando mais de quatrocentos documentos, a maioria

    ainda indita. Neles, encontram-se textos dedicados a diversos artistas, grupos e

    movimentos que formaram o cenrio das artes plsticas durante as dcadas de 1940 a

    198015.

    A presente investigao tomou, como fontes primrias, dentre as crticas

    originais do Centro Mario Schenberg de Documentao da Pesquisa em Arte

    ECA/USP, os textos escritos na dcada de 1960 e 1970, bem como os demais livros,

    artigos e entrevistas nos quais o crtico exps seu pensamento. Foram utilizados, ainda,

    os relatrios de pesquisas j realizadas pelo Centro Mario Schenberg e estudos em nvel

    13 Cf. SCHENBERG, Mario. Arte de Participao. Arquivo do Centro Mario Schenberg de Documentao da Pesquisa em Arte ECA/USP. Texto no numerado e no datado. 14 Outro estudo importante sobre o crtico intitula-se Obra Cientfica de Mario Schenberg, de HAMBURGUER, Amlia Imprio (So Paulo: EDUSP, 2009). 15 Enfatiza-se que os textos e materiais de pesquisa referentes ao envolvimento de Schenberg com a Arte Primitiva no integraram o universo desta pesquisa, pois apesar de estarem entre as tendncias s quais Schenberg esteve atento no perodo, no teve relao com o Novo Realismo.

  • 17

    de ps-graduao existentes sobre o autor, alm de obras de referncia, artigos e outros

    documentos16.

    Com relao participao de Schenberg nas Bienais de So Paulo, bem como

    em exposies marcantes nesse perodo - Opinio 65, Propostas 65, Opinio 66,

    Propostas 66, alm das referidas Bienais paulistas foram utilizados catlogos e outros

    materiais. No que diz respeito s Bienais de So Paulo, foram utilizados os principais

    estudos realizados at o momento, a saber, Bienais de So Paulo: da era do museu

    era dos curadores, de Francisco Alambert e Polyana Lopes Canhte (So Paulo:

    Boitempo, 2004), a edio nmero 52 da Revista USP (dezembro-fevereiro, 2001-

    2002), que contm um dossi sobre a Bienal Internacional de So Paulo e, por fim, o

    estudo de Leonor Amarante intitulado As Bienais de So Paulo: 1951 a 1987 (So

    Paulo: Projeto, 1989). Outra fonte significativa para esta pesquisa foi a documentao

    encontrada no Arquivo Histrico Wanda Svevo, localizado na sede da Fundao Bienal,

    no qual foi realizada uma pesquisa em busca de mais detalhes do envolvimento de

    Mario Schenberg com as Bienais17.

    Com relao s exposies Opinio 65, Propostas 65, Opinio 66 e Propostas

    66, recorreu-se aos textos de crticos e artistas que participaram das exposies e

    seminrios, bem como a catlogos de eventos que tiveram como foco essas exposies.

    Os textos da poca foram encontrados na revista Artes:, que estava em circulao entre

    as dcadas de 1950 a 1960, e no peridico Arte em Revista, organizado pelo Centro de

    Estudos de Arte Contempornea da FFLCH-USP, cujos nmeros do ano de 1979 trazem

    um dossi sobre os aspectos culturais da dcada de 196018. Em 1995, o Centro Cultural

    Banco do Brasil realizou a exposio Opinio 65 30 anos (Janeiro: Centro Cultural

    Banco do Brasil, 1995), cujo catlogo foi utilizado nesta pesquisa. Dez anos antes, a

    Galeria de Arte Banerj realizara a quinta edio de seu Ciclo de Exposies sobre Arte

    no Rio de Janeiro, tendo por objeto Opinio 65 (Rio de Janeiro: Galeria de Arte Banerj,

    1985), cujo catlogo traz um importante texto de Frederico Morais, curador da mostra.

    Foi significativo, ainda, o estudo de Daisy V. M. Peccinini Alvarado, intitulado

    16 Para aprofundar esses aspectos, foram importantes tambm os livros Pensando a Fsica (So Paulo: Nova Sttela, 1990), Dilogos com Mario Schenberg (So Paulo: Nova Sttela, 1985) e Mario Schenberg: Entre-Vistas (So Paulo: Perspectiva, 1984). 17 No que tange ao contexto poltico e ao da ditadura militar na Universidade de So Paulo, foi relevante o estudo de CLEMENTE, Jos Eduardo Ferraz. Cincia e poltica durante a ditadura militar: o caso da comunidade brasileira de fsicos (1964-1979). Salvador: Universidade Federal da Bahia, Instituto de Fsica, 2005. (dissertao de Mestrado). 18 Esse material foi assinalado em AIZENBERG, Elza. Exerccios Estticos da Liberdade (So Paulo: ECA USP, 1989, tese de livre docncia).

  • 18

    Figuraes Brasil Anos 60: Neofiguraes Fantsticas e Neosurrealismo, Novo

    Realismo e Nova Objetividade (So Paulo: Ita Cultural/Edusp, 1999).

    Ao longo do percurso expositivo foram realizadas leituras de obras de arte

    envolvidas na investigao, a partir dos direcionamentos dados por Mario Schenberg.

    Tambm foram mobilizadas fontes que continham informaes sobre a biografia,

    trajetria artstica e imagens das obras analisadas.

    No presente estudo, destacou-se a obra de trs artistas com os quais Mario

    Schenberg manteve proximidade no perodo, a saber, Maurcio Nogueira Lima, Mira

    Schendel e Lygia Clark. Escrevendo sobre esses artistas, o crtico sublinhou conceitos e

    fez observaes que ajudaram a situ-los no contexto e aprofundaram conhecimento

    sobre os mesmos.

    Maurcio Nogueira Lima (Recife/PE 1930 Campinas/SP 1999) conviveu

    intensamente com Mario Schenberg, principalmente na dcada de 1960. Vindo da

    pesquisa formal do Concretismo, o artista explorou, na dcada de 1960, a relao entre

    Arte e Poltica utilizando elementos do Novo Realismo e da Pop Art. Mira Schendel

    (Zurique, Sua 1919 - So Paulo/SP 1988) trabalhou com um elemento que no

    participa apenas do projeto crtico de Mario Schenberg, mas tambm de sua viso de

    mundo: o contato com a Arte e o Pensamento do Oriente. Para o crtico, a obra da artista

    opera uma sntese entre Ocidente e Oriente19. Lygia Clark (Belo Horizonte/MG 1920

    Rio de Janeiro/RJ 1988) foi ligada ao movimento Concreto do Rio de Janeiro, ao

    Neoconcretismo e, depois Nova Objetividade Brasileira, seguindo os caminhos da

    Arte de Participao. Para Schenberg, a artista estava em profundo dilogo com os

    problemas universais e tenses de sua poca20.

    Com base nessa pesquisa, foi feita uma reflexo sobre a postura crtica de Mario

    Schenberg em relao aos artistas que encontravam seus caminhos em meio arte de

    vanguarda do perodo. Isso foi feito com base na anlise de seus escritos, bem como nos

    depoimentos de diversos artistas que conviveram com o crtico21.

    Dessa forma, foram organizadas as seguintes partes:

    O primeiro captulo, intitulado Porque opinar preciso, buscou evidenciar o

    contexto do envolvimento de Mario Schenberg nas Bienais de So Paulo enquanto

    19 SCHENBERG, Mario. Pensando a Arte. So Paulo Nova Stella, 1988. 20 SCHENBERG, Mario. Pensando a Arte. So Paulo Nova Stella, 1988. 21 Foi de extrema importncia, ainda, o estudo de FERREIRA, Glria & COTRIM Ceclia, que acompanha a coletnea Escritos de artistas: anos 60/70 (Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2009), tendo por assunto a importncia da conceituao na arte que nascia no perodo e da importncia dos textos que os artistas a respeito de suas prprias obras.

  • 19

    membro do Jri de Seleo (1965, 1967 e 1969), bem como sua contribuio ao

    momento efervescente das mostras Opinio 65, Opinio 66, Propostas 65 e Propostas

    66.

    O segundo captulo, Schenberg e Vanguardas: primeiras formulaes, realizou

    uma anlise das principais tendncias apontadas pelo crtico na dcada de 1960, na qual

    o crtico aprofundou seu conhecimento sobre o Nouveau Ralisme e a Pop Art, cujos

    encaminhamentos dirigiram o debate entre artistas, crticos e intelectuais para

    conceituaes a respeito do que se passava ento no meio artstico brasileiro. Foi

    analisado o ponto de vista de Schenberg a respeito dos artistas Maurcio Nogueira Lima

    e Lygia Clark.

    Em Desdobramentos: a dcada de 1970, o terceiro e ltimo captulo, surgiram

    formulaes de um perodo no qual Schenberg j tinha uma concepo mais

    consolidada acerca dos rumos da arte desde Opinio 65. Foram analisadas novas

    tendncias percebidas pelo crtico, a saber, Arte Ecolgica e Arte Catastrfica, ligadas

    relao entre Arte e Natureza. A partir disso foram analisadas as consideraes de

    Schenberg sobre a artista Mira Schendel. Por fim, realizou-se uma anlise da postura de

    Mario Schenberg enquanto crtico de arte diante das transformaes profundas pelas

    quais passou a arte do perodo.

  • 20

    Porque opinar preciso: Schenberg e seu contexto

    Eu sempre fui um homem de posies polticas definidas. Sempre que tenho certeza, alguma

    certeza, tomo posies polticas definidas. um dever que a gente tem. Mesmo que a gente

    erre. Assim acho que ajudamos mais as pessoas. Temos que dar opinies mesmo que no

    possamos provar, isso pode estimular nos outros a procura, para que tomem direes. o

    problema de Scrates, que era um partejador de idias, ele tirava as idias que estavam

    incubadas nas cabeas das pessoas. Eu gostaria de fazer isso. E fao, mas sem a eficincia

    dele1.

    Mario Schenberg

    Tudo o que realmente grande e inspirador criado pelo indivduo que pode

    trabalhar em liberdade2.

    Albert Einstein

    Bienais de So Paulo

    Retrospectiva de Alfredo Volpi - VI Bienal (1961)

    A VI Bienal do Museu de Arte Moderna de So Paulo teve lugar no Pavilho

    Armando Arruda Pereira (Pavilho da Bienal), entre 1 de outubro e 21 de dezembro de 1961.

    Tendo como diretor geral o crtico de arte Mario Pedrosa, a mostra reuniu 651 artistas

    provenientes de 50 pases, expondo ao pblico quase 5.000 obras3.

    1 In HAMBURGUER, Amlia Imprio. Nota biogrfica e entrevista com Mario Schenberg (Novembro, 1983). So Paulo: Instituto de Fsica, Universidade de So Paulo, 1984, p. 28. Foi mantida a grafia original. 2 COHEN, Marilene. Albert Einstein. Col. Personagens que marcaram poca. So Paulo: Globo, 2007. 3 FUNDAO BIENAL. Bienal a Bienal. Disponvel em: http://www.bienal.org.br/FBSP/pt/AHWS/BienalaBienal/Paginas/6BienalSaoPaulo.aspx?selected=6 Acessado em 15/01/2013.

  • 21

    Chegando a sua sexta edio, o evento j tinha suscitado diversas polmicas. Desde a

    repercusso do apoio de Nelson Rockefeller quando de sua criao, passando pelo gigantismo

    das sucessivas edies, at os debates acerca da abstrao versus figurao e da emergncia

    das vanguardas dos anos de 19604. Pode-se dizer que a cada dois anos, em maior ou menor

    medida, escolhas e renncias dos organizadores da Bienal de So Paulo catalisavam e

    inventariavam os debates em voga na esfera cultural e artstica do pas.

    Esta edio foi a ltima ligada ao Museu de Arte Moderna de So Paulo, (MAM-SP),

    fundado por Francisco Matarazzo Sobrinho (conhecido como Ciccillo Matarazzo) em 19485.

    Foi tambm a ltima edio que contou com uma organizao centralizada na figura de um

    Diretor Geral, funo ocupada ento por Mrio Pedrosa. Da VII Bienal em diante, a

    organizao do evento contaria apenas com Comisses de Assessoria e, a partir da XI Bienal,

    em 1971, com uma Assessoria Tcnica6. Aps a separao entre a Fundao Bienal e o MAM

    SP, o crtico de arte participou da organizao de algumas edies seguintes, porm

    ocupando outras funes.

    Com Mrio Pedrosa na direo geral da mostra, a expectativa era que a edio de 1961

    tivesse um carter fortemente pautado pelas pesquisas de vanguarda. Contudo, sua proposta

    foi mais tmida, apoiando-se em retrospectivas histricas. Vrias representaes

    internacionais tiveram carter museolgico. Sobre isso, a pesquisadora Leonor Amarante

    observou que:

    Seu brilho [de Mrio Pedrosa] incontestvel como crtico e terico no foi o mesmo na funo de curador. A exposio foi pouco instigante, faltou-lhe ousadia. O espao que dedicou para obras de carter histrico e museolgico foi excessivo. Embora a maioria das salas fosse interessante, exposies dessa natureza no se justificam em bienais que pretendiam enfocar o que acontecia na arte contempornea7.

    4 ALAMBERT, Alambert & Polyana CANHTE. Bienais de So Paulo: da era do museu era dos curadores. So Paulo: Boitempo, 2004. 5 Entre os anos de 1961 e 1966 deu-se o processo de desvinculao da Bienal em relao ao MAM-SP, passando o evento a ser organizado pela Fundao Bienal, que obteria recursos municipais e estaduais para financiar suas atividades, mas continuaria sob o comando de Ciccillo Matarazzo (ALAMBERT, Alambert & Polyana CANHTE. Bienais de So Paulo: da era do museu era dos curadores. So Paulo: Boitempo, 2004). 6 A comisso artstica deixou de existir, tendo sido substituda por uma comisso cujos integrantes eram indicados por Ciccillo Matarazzo, presidente da Fundao Bienal, criada no ano seguinte (1962). Nem sempre havia nessas comisses conhecedores de arte, o que comprometia a qualidade da mostra. Essa crtica acompanhou as Bienais desde sua separao do MAM-SP. Cf. ALAMBERT & CANHTE (2004); AMARANTE (1989). 7 AMARANTE, Leonor. As Bienais de So Paulo: 1951 a 1987. So Paulo: Projeto, 1989, p. 108.

  • 22

    Dentro desse projeto, estavam previstas, na representao brasileira, salas especiais

    para os laureados das primeiras edies da Bienal8. Coube a Mario Schenberg a organizao

    de uma retrospectiva da obra de Alfredo Volpi, que ocupou uma das salas especiais da

    representao brasileira da VI Bienal de Arte de So Paulo9. O pintor das bandeirinhas dividiu

    com Di Cavalcanti o Prmio Nacional de Pintura na II Bienal, em 1953, escolha que se deu no

    contexto do debate entre o realismo social e o abstracionismo emergente10.

    Schenberg era, j na poca, um dos maiores conhecedores da personalidade e da obra

    do artista, tendo sido o primeiro a perceber, por volta dos anos de 1940, a importncia da obra

    do pintor operrio de origem humilde11. Mario Schenberg havia organizado, em 1944, a

    primeira exposio individual de Alfredo Volpi, para a qual fotografara as obras e escrevera o

    texto de apresentao para o catlogo da mostra12.

    Em carta datada de 2 de fevereiro de 1961, Mrio Pedrosa escreve a Mario Schenberg

    confirmando o acerto prvio feito em conversa telefnica e manifestando satisfao em

    confiar ao crtico a organizao da retrospectiva de Volpi. Essa tarefa tinha sido proposta

    inicialmente a Theon Spanoudis, que foi escolhido pelo pintor, mas no pde aceitar a

    incumbncia, pois estaria em viagem no perodo em questo13.

    Para organizar a retrospectiva de Alfredo Volpi, Mario Schenberg teve que contornar

    uma dificuldade: reunir trabalhos de todas as fases de um pintor cuja carreira fora iniciada na

    dcada de 1920, junto ao Grupo Santa Helena. Contando ento com uma trajetria de quatro

    dcadas, que compreenderam inmeras fases, sua obra oferecia um desafio e tanto

    realizao de uma exposio retrospectiva. Essa dificuldade foi ainda maior com relao aos

    trabalhos anteriores dcada de 1940, que j estavam bastante dispersos. No texto de

    apresentao da mostra, o crtico observou que a [...] maior parte dos trabalhos de decorao

    8 O projeto foi apresentado por Mrio Pedrosa, nesses termos, aos crticos convidados para organizar as salas especiais, conforme o modelo da carta-convite enviada, com pequenas mudanas, a cada um deles (Arquivo Wanda Svevo/ Fundao Bienal). 9 FUNDAO BIENAL. VI Bienal. (catlogo de exposio) So Paulo: Fundao Bienal, 1961.

    10 AMARANTE, Leonor. As Bienais de So Paulo: 1951 a 1987. So Paulo: Projeto, 1989.

    11 AJZENBERG, Elza. Mario Schenberg O Crtico. In AGUILAR, Jos Roberto. O mundo de Mario Schenberg. So Paulo: Casa das Rosas, 1996. Em 1953, Schenberg havia retornado ao Brasil aps uma estadia de cinco anos na Blgica, nos quais lecionou na Universidade de Bruxelas, dedicando-se s atividades cientficas. Foi nomeado Diretor do Departamento de Fsica da ento chamada Faculdade de Filosofia, Cincias e Letras da USP, o que diminuiu sua disponibilidade de tempo para a crtica de arte. E, 1961, quando deixou o cargo, Schenberg pde retom-la de modo mais sistemtico, principalmente por meio do contato com Alfredo Volpi e Mrio Pedrosa. At 1969, quando foi afastado da Universidade de So Paulo, Schenberg atuou no meio artstico com menor intensidade, o que no quer dizer que sua crtica de arte tenha sido menos significativa. 12 OLIVEIRA, Alecsandra Matias de. Schenberg: crtica e criao. So Paulo: EDUSP, 2010, p. 108. 13 Carta de Mrio Pedrosa a Mario Schenberg, de 02 de fevereiro de 1961; carta de Mrio Pedrosa a Theon Spanudis, de 22 de dezembro de 1960 (Arquivo Histrico Wanda Svevo). A resposta de Theon Spanoudis no foi encontrada no Arquivo Histrico da Bienal, mas Pedrosa faz referncia a ela na primeira carta mencionada, bem como ao motivo que o levou a no aceitar o convite.

  • 23

    de residncias foram destrudos. Com grande esforo foi possvel reunir uma coleo reduzida

    de seus quadros do perodo de 1915-1940 para a presente retrospectiva14.

    Figuraram na mostra 95 obras, em ordem cronolgica, num percurso que cobriu desde

    1915, como a tela Casebre, pesquisa de 1961, com Bandeirolas no Espao15. Para Leonor

    Amarante, a sala especial teve o mrito de ter sido a primeira oportunidade de se ver quase

    todas as [...] fases do pintor16.

    Foram inmeras as negociaes com proprietrios de obras do pintor. No Arquivo

    Histrico Wanda Svevo esto depositados inmeros recibos de emprstimo e devoluo de

    obras pertencentes a diversos proprietrios, entre eles, Francisco Matarazzo Sobrinho, Mrio

    Pedrosa, o pintor Bruno Giorgi e o prprio Mario Schenberg17.

    No texto de apresentao da retrospectiva, o crtico busca dar ao pblico a dimenso

    das fases da pesquisa de Alfredo Volpi, apresentando alguns aspectos de sua extensa

    produo. Ao destacar a capacidade de sntese do pintor, seja na captao da essncia da

    atmosfera de cidadezinhas, subrbios e praias, seja nas composies da fase do

    abstracionismo geomtrico, Mario Schenberg utiliza elementos da pintura oriental: Volpi

    evoca a arte inefvel dos paisagistas msticos da China e do Japo [...], mas sempre como um

    homem do povo de So Paulo18.

    O crtico identifica a sntese operada pelo pintor, aliada musicalidade de suas

    composies, dimenso do trabalho dos artistas orientais que, no processo de seu

    aprendizado, buscavam na simplificao do desenho e no ritmo do trao uma expressividade

    mais profunda.

    Para Mario Schenberg, Volpi o pintor do espao metafsico, repleto de musicalidade,

    no qual a cor no est a servio da sensualidade (aqui entendida como aspecto do sensvel, da

    sensao visual, e no no sentido do senso comum), mas da expresso de uma espiritualidade

    fria e vibrante, um sentimento csmico transcendendo a sensualidade das aparncias19.

    Tambm so examinadas no texto as influncias do abstracionismo geomtrico e do

    concretismo, enquanto movimentaes mais recentes de sua obra naquele momento. Mario

    14 SCHENBERG, Mario. Alfredo Volpi. In FUNDAO BIENAL. VI Bienal. (catlogo de exposio) So Paulo: Fundao Bienal, 1961, pp.38-39. 15 FUNDAO BIENAL. VI Bienal. (catlogo de exposio) So Paulo: Fundao Bienal, 1961. 16 AMARANTE, Leonor. As Bienais de So Paulo: 1951 a 1987. So Paulo: Projeto, 1989, p. 117. 17 Arquivo Histrico Wanda Svevo, Fundao Bienal. 18

    SCHENBERG, Mario. Alfredo Volpi. In FUNDAO BIENAL. VI Bienal. (catlogo de exposio) So Paulo: Fundao Bienal, 1961, p. 37. 19

    SCHENBERG, Mario. Alfredo Volpi. In FUNDAO BIENAL. VI Bienal. (catlogo de exposio) So Paulo: Fundao Bienal, 1961, p. 37.

  • 24

    Schenberg indica que, de incio, elas pareceram nocivas ao desenvolvimento da pesquisa de

    Volpi, preocupao que, mais tarde, foi afastada pelo

    poderoso temperamento artstico de Volpi pde [que] receber a influncia do abstracionismo geomtrico e do concretismo sem perder as suas caractersticas prprias. O resultado foi uma maior liberdade, aliada a uma depurao da composio e do colorido, que lhe deram uma admirvel capacidade de sntese20.

    Essa libertao da representao, prossegue o crtico, permitiu ao pintor desenvolver

    ainda mais seu senso de espacialidade pura, notvel desde suas marinhas de Itanham (1940-

    1942). O pintor conseguiu plasmar, usando grandes massas de tons puros, uma espacialidade

    de vibrao belssima que, segundo o crtico, foi criao original sua. Os espaos, coloridos

    uniformemente, buscavam afastar a impresso de matria.

    Nos desdobramentos dos dois anos anteriores, porm, Volpi vinha se afastando do

    concretismo: estava voltando procura de matria, e mesmo da pincelada, retomando de

    modo novo mtodos tradicionais da pintura ocidental. [...] [N]as composies semi-abstratas

    ou abstratas surgem cada vez mais linhas e curvas irregulares21.

    Apesar de apresentarem muitas qualidades, como a beleza da composio, a pureza do

    colorido e os temas populares, o conjunto da obra de Volpi produzida sob encomenda se

    apresenta menos interessante, para o crtico, que as telas pintadas na trilha de sua pesquisa

    pessoal abstrata ou semi-abstrata do mesmo perodo.

    Mario Schenberg conclui a apresentao da sala especial mencionando a formao do

    pintor, autodidata por excelncia, isolada das tendncias artsticas de ento (primeiro tempo

    Modernista: dcadas de 20 e 30). Apesar de ter podido, nos anos de 1950, viajar Europa e

    aprimorar seu aprendizado, tendo conhecido os primitivos italianos que tanto o

    impressionaram, e de ter sido depois influenciado pelo concretismo, o sentimento popular no

    deixou Volpi: seus ecos estavam presentes nas hoje famosas bandeirinhas dos anos de 1950 e

    1960.

    20

    SCHENBERG, Mario. Alfredo Volpi. In FUNDAO BIENAL. VI Bienal. (catlogo de exposio) So Paulo: Fundao Bienal, 1961, p. 38. 21

    SCHENBERG, Mario. Alfredo Volpi. In FUNDAO BIENAL. VI Bienal. (catlogo de exposio) So Paulo: Fundao Bienal, 1961, p. 38.

  • 25

    Figura 1 Alfredo Volpi, [Composio com Faixas] , dc. 1960, tmpera sobre tela, 75 x 110,3 cm. Coleo Particular. Reproduo fotogrfica Horst Merkel.

    Figura 2 - Alfredo Volpi, [Vista de Itanham] [Marinha de Itanham], dcada de 1940, tmpera sobre tela, 45 x 76 cm. Coleo Particular. Reproduo fotogrfica de autoria desconhecida.

  • 26

    Figura 3 - Alfredo Volpi, Fachada com Bandeiras, 1959, Tmpera sobre tela, 116 x 72 cm. Acervo do Museu de Arte de So Paulo - MASP, doao de Ernest Wolf.

  • 27

    Jri de Seleo: VIII, IX e X Bienais (1965, 1967 e 1969)

    1965: Manifesto dos 4

    Para Mario Schenberg, cuja esfera de atuao orbitava entre sua atividade acadmica

    como docente na ento FFCL (Faculdade de Filosofia, Cincias e Letras da USP), a militncia

    poltica e a crtica de arte, o ano de 1965 foi bastante intenso e repleto de acontecimentos

    marcantes. Exposies significativas tiveram lugar nesse ano: Opinio 65, no Museu de Arte

    Moderna do Rio de Janeiro, e Propostas 65, na Fundao Armando lvares Penteado22.

    Todas contaram, em maior ou menor medida, com a sua participao.

    Comunista assumido23, Mario Schenberg tambm teve que lidar com a perseguio

    poltica. As complicaes decorrentes do momento poltico de ento prejudicaram tambm o

    exerccio de suas atividades enquanto pesquisador e docente na Universidade de So Paulo.

    nico convidado latino-americano para um importante congresso no Japo, Mario Schenberg

    s conseguiu participar do evento por causa da repercusso internacional decorrente de sua

    priso, pois seu status de renomado cientista projetou internacionalmente a arbitrariedade do

    regime militar recentemente instaurado no pas.

    Nesse momento de agitao poltica e cultural, Mario Schenberg voltou a se envolver

    com a organizao das Bienais, dessa vez como membro do Jri Nacional de Seleo.

    Participou, assim, da organizao da VIII, IX e X bienais de Arte de So Paulo (em 1965,

    1967 e 1969), para a qual foi eleito pelos prprios artistas (AGUILAR, 1996).

    A VIII Bienal de Arte de So Paulo, formalmente desvinculada do Museu de Arte

    Moderna, esteve aberta entre 4 de setembro e 28 de novembro de 1965. A mostra foi

    organizada pelas assessorias de artes plsticas (Geraldo Ferraz, Srgio Milliet e Walter

    Zanini), teatro (Aldo Calvo e Sbato Magaldi), arquitetura (Oswaldo Corra Gonalves) e

    artes grficas (Jannar Murtinho Ribeiro). Em seus quase trs meses de durao, foram

    apresentados ao pblico 653 artistas de 54 pases, totalizando 4.054 obras24.

    22 A participao de Schenberg nessas duas exposies, alm de Opinio 66 e Propostas 66, ser explorada no segundo momento deste captulo. 23 Na dcada de 1960, Mario Schenberg foi membro titular do Comit Central do Partido Comunista. Cf. Dina Kinoshita. A Poltica para Mario Schenberg, s.p. (texto digitado Arquivo do Centro Mario Schenberg de Documentao da Pesquisa em Artes ECA/USP). 24 FUNDAO BIENAL. Bienal a Bienal. Disponvel em: http://www.bienal.org.br/FBSP/pt/AHWS/BienalaBienal/Paginas/6BienalSaoPaulo.aspx?selected=6 Acesso em 15/01/2013.

  • 28

    Nessa edio, j era possvel perceber que mudanas profundas ocorreriam na arte, o

    que apareceria com mais fora na IX Bienal. A Pop Art j despontava como tendncia

    emergente, assim como a Arte Povera (que trabalhava com sucata, refugos e materiais

    semelhantes) e a quebra dos suportes tradicionais. Para Leonor Amarante, a mostra estava

    bem distribuda, abrigando as novas figuraes, concretismo, surrealismo e arte fantstica25.

    A sala especial internacional Do Surrealismo Arte Fantstica, de carter histrico,

    foi o destaque da VIII Bienal, e teve um catlogo parte, rico em imagens das obras exibidas.

    Nela figuraram sessenta artistas, entre os quais estavam Marcel Duchamp, Max Ernest, Jean

    Arp, Marcel Chagal, Joan Mir, Man Ray, Paul Klee, Magritte, Francis Picbia e Frida Kahlo.

    J a representao brasileira, apesar de ter recusado 80% dos artistas submetidos ao

    Jri de Seleo (superando as bienais anteriores)26, era bem maior que as estrangeiras, como

    ocorria desde sua primeira edio. O elevado nmero de artistas recusados representava uma

    tentativa, por parte da Bienal, de elevar a qualidade da representao brasileira e, ao mesmo

    tempo, reduzir suas dimenses. Esses dois aspectos organizacionais vinham sofrendo ataques

    por parte de artistas e crticos de arte.

    Enquanto os artistas criticavam a falta de critrio de avaliao que transparecia nas

    escolhas do Jri de Seleo, o alvo dos crticos de arte, embora com diferenas de opinio, era

    o inchao da representao brasileira, que aceitava artistas que no estavam altura da Bienal

    e parecia no saber separar o joio do trigo.

    Contudo, era fato reconhecido que, nas condies oferecidas ao corpo de jurados,

    apesar da boa vontade com que desenvolviam os trabalhos de seleo, era inevitvel se chegar

    a decises totalmente acertadas. Paulo Mendes de Almeida reconhece que, nesse contexto, o

    veredito do Jri era frequentemente injusto, por mais isento que seja, embora animado dos

    melhores propsitos, conforme acreditava ser o caso da VIII Bienal. O crtico acrescentou,

    ainda: [v]endo quatrocentas obras, em mdia, por dia, que critrio, que metro, que medida de

    relao podem observar os membros desse colgio?27

    A isso era atribuda a falta de unidade da representao brasileira, ressaltada por Aracy

    Amaral, que a comparava a um salo, no qual havia de tudo um pouco, como se o Brasil

    tivesse a preocupao de mostrar que pode apresentar de tudo para todos os gostos28. Nesse

    sentido, o conjunto brasileiro, constitudo por grande nmero de artistas participantes, cada

    25 AMARANTE, Leonor. As Bienais de So Paulo: 1951 a 1987. So Paulo: Projeto, 1989. 26 O corte foi duro, registrado o maior ndice de recusa de todas as bienais: 80% dos inscritos foram recusados. Correio da Manh (Estado da Guanabara), 19/05/1965. 27 ALMEIDA, Paulo Mendes de. A prxima Bienal. O Estado de So Paulo, So Paulo (capital), 26/06/1965. 28

    AMARAL, Aracy. Reviso da VIII Bienal. O Estado de So Paulo, 11/12/1965.

  • 29

    um com poucas obras, tornava-se confuso e assemelhava-se a uma feira de arte. Segundo a

    autora, essa estrutura j estava superada e precisava ser revista pela Fundao Bienal29.

    A mostra abria as portas ao grande pblico um ano e meio depois do golpe militar de

    1964. Apesar de a censura ter sido mais intensa a partir de 1968, em decorrncia do Ato

    Institucional n 530, a represso j comeava a fazer parte do horizonte cultural e poltico do

    pas. Repercutindo imediatamente na estrutura de poder da Universidade de So Paulo, foi no

    ambiente acadmico que a perseguio poltica atingiu Mario Schenberg.

    O eminente fsico foi preso durante a primeira operao militar efetuada aps o golpe,

    denominada Operao Limpeza, cujo intuito era limpar o Pas da ameaa comunista,

    recolhendo todos aqueles que representassem uma ameaa Segurana Nacional31. O

    catedrtico da USP e crtico de arte foi preso em 2 de abril de 1964, mas voltou liberdade

    cerca de 50 dias depois.

    Em outubro do mesmo ano foram instaurados novos inquritos e, mais uma vez, foi

    decretada a priso preventiva de Mario Schenberg, que iria participar de um importante

    evento cientfico no Japo no ano seguinte, quando o fsico pediu permisso para viajar. Isso

    porque, devido ao fato de estar respondendo a processos, no poderia sair do pas32. O crtico

    permaneceu foragido durante alguns meses at que, em atitude estratgica, entregou-se

    polcia, j em 196533.

    Estratgica, pois Schenberg foi o nico cientista latino-americano convidado para o

    Congresso Internacional de Partculas Elementares que seria realizado em Tquio (Japo). Ao

    se apresentar polcia, apostou na fora da repercusso internacional que a priso de um

    renomado cientista atrairia, o que de fato aconteceu34. O depoimento da artista Lourdes

    Cedran35 demonstra a conscincia do crtico a respeito do desfecho de sua atitude:

    29 AMARAL, Aracy. Reviso da VIII Bienal. O Estado de So Paulo, 11/12/1965. 30 SCHWARZ, Roberto. Cultura e Poltica, 1964-69, in O Pai de Famlia e outros estudos. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978. 31 CLEMENTE, Jos Eduardo Ferraz. Cincia e poltica durante a ditadura militar: o caso da comunidade brasileira de fsicos (1964-1979). Salvador: Universidade Federal da Bahia, Instituto de Fsica, 2005. (dissertao de Mestrado), p. 97. 32 Comeava uma batalha judicial pela liberdade, pela defesa da Ctedra de Mrio Schenberg e at mesmo pelos vencimentos cortados durante o perodo em que esteve ameaado de priso. Chegou a ter, durante esse perodo, a sua biblioteca destruda e os seus quadros [...] dilacerados pelos policiais que conduziam as investigaes em busca de provas que pudessem incrimin-lo. CLEMENTE, Jos Eduardo Ferraz. Cincia e poltica durante a ditadura militar: o caso da comunidade brasileira de fsicos (1964-1979). Salvador: Universidade Federal da Bahia, Instituto de Fsica, 2005. (dissertao de Mestrado), p. 102. 33 Schenberg foi preso anteriormente, em 1948, sob acusao de subverso ordem pblica, tendo sido liberado alguns meses depois. Logo aps, retornou Europa, mais precisamente Blgica, onde permaneceu at 1953 (AGUILAR, Jos Roberto. O mundo de Mario Schenberg. So Paulo: Casa das Rosas, 1996). 34 (...) [Schenberg] resolveu ento se entregar no exrcito do Ibirapuera porque sabia que no momento em que se entregasse, chegariam centenas de telegramas do mundo inteiro pedindo sua presena no congresso. Assim, fez com que o exrcito fosse obrigado a dar o passaporte para ele ir ao congresso. (GOLDFARB. Jos Luis.

  • 30

    Naqueles dias, Mrio deveria viajar para o Japo para um encontro cientfico da maior importncia. Ele era o nico latino-americano convidado. Em um lance estratgico ele decidiu entregar-se polcia, e com isso chamou a ateno da comunidade cientfica internacional para as arbitrariedades do regime brasileiro. Em seguida telefonou para a Escola e me disse: j estou preso, venha visitar-me no batalho da Rua Jorge Miranda. Embora estranhando o fato, fui ao seu encontro. [...] Contou-me que seu advogado, Dr. Aldo Lins e Silva, j estava tratando de tudo e que provavelmente seria libertado no mesmo dia. Disse ento que ficasse calma e que esperasse na Bienal. [...] s nove da noite ele chegou na Bienal para alegria e surpresa de todos e no dia seguinte embarcou para o Japo, pois lhe foi concedido um habeas-corpus.

    O crtico obteve uma ordem judicial que suspendeu sua priso e pde chegar ao seu

    destino a tempo de assistir ao fim da conferncia. Ainda nesse ano, foi absolvido nos

    processos que haviam sido instaurados contra ele e retornou Universidade de So Paulo.

    Durante a dcada de 1960, Schenberg encontrou entre os artistas o apoio que

    possibilitou sua atuao, mesmo sob os mandados de priso e a perseguio poltica de que

    foi alvo. Apesar de ter vivido entre a priso e a ilegalidade em vrios momentos, o crtico se

    recusou ao exlio no exterior por no poder tirar passaporte e por causa de seu senso de

    cidadania36.

    Durante o perodo em que esteve foragido, contou com a acolhida de diversos artistas

    que o esconderam da polcia, como mostraram vrios depoimentos. Entre eles, o de Lourdes

    Cedran37:

    Conheci o Mrio na dcada de 60, num perodo de muita agitao poltica ps-64. [...] Houve muitas prises. Na poca em que lanaram o Manifesto dos 4 (Mrio Schenberg, Leite Lopes, Cruz Costa e Florestan Fernandes) foi anunciada a priso de Mrio. Neste dia ele havia combinado de me encontrar num curso de arte que eu fazia numa escola na Rua Augusta. Ele chegou com o Mrio Gruber, que estava com o p quebrado. Apesar de estar com priso decretada, ele entrou calmamente, e disse que fssemos jantar juntos. Em verdade, fomos lev-lo para um esconderijo a prpria casa do Gruber. [...] Fui informada depois que o Mrio j no se encontrava na casa do Gruber, mas sim na casa de outros amigos.

    Jos Luis Goldfarb. In AJZENBERG, Elza. In Shenberg: Arte e Cincia. So Paulo: ECA/USP, 1997, p.45). A solidariedade da comunidade cientfica em nvel nacional e internacional j havia se levantado quando de sua ltima priso, logo aps o golpe. (CLEMENTE, Jos Eduardo Ferraz. Cincia e poltica durante a ditadura militar: o caso da comunidade brasileira de fsicos (1964-1979). Salvador: Universidade Federal da Bahia, Instituto de Fsica, 2005. (dissertao de Mestrado), p. 98). 35 CEDRAN, Lourdes. Lourdes Cedran. In SCHENBERG, Mrio. Mrio Schenberg: Entre-Vistas. So Paulo: Perspectiva, 1984, pp.68-70. 36 Schenberg foi aposentado e diferentemente da maioria dos cientistas que foram cassados pela ditadura dos militares no saiu do Brasil. Ele tinha propostas para trabalhar em qualquer pas do mundo, mas tinha uma enorme determinao de ficar no Brasil. Foi o tpico caso que deu trabalho aos militares. (GOLDFARB. Jos Luis. Jos Luis Goldfarb. In AJZENBERG, Elza. In Shenberg: Arte e Cincia. So Paulo: ECA/USP, 1997, p.44). 37 CEDRAN, Lourdes. Lourdes Cedran. In SCHENBERG, Mrio. Mrio Schenberg: Entre-Vistas. So Paulo: Perspectiva, 1984, pp. 66-8.

  • 31

    Nesse perodo tumultuado, tambm foi importante o contato entre Schenberg e os

    artistas com os quais conviveu. Quando no estava sendo procurado, eram comuns as reunies

    em sua residncia na Rua So Vicente de Paula, nas quais muito se conversava sobre arte e

    poltica. Alm disso, tais oportunidades permitiram ao crtico conhecer mais profundamente

    os artistas sobre os quais escreveu. Muitos deles apontaram que as conversas com Schenberg

    foram extremamente produtivas e marcantes em sua trajetria artstica.

    Cabe dizer que at o ano de 1969 quando, por fora do Ato Institucional n 5, foi

    aposentado compulsoriamente de seu cargo na Universidade de So Paulo, Mario Schenberg

    conciliava a atuao como cientista, a militncia poltica e a crtica de arte. Somente aps esse

    afastamento, passou a ter nessa ltima sua principal atividade38.

    Ao integrar o Jri de Seleo da VIII Bienal, Mario Schenberg estava enfrentando

    diversos processos judiciais. Foi em meio a essa tenso que o crtico participou, no decorrer

    de maio de 1965, de algumas das reunies para selecionar as obras que participariam da

    edio daquele ano.

    Segundo o regulamento da VIII Bienal, o Jri de Seleo era composto por cinco

    membros, todos escolhidos pelos artistas. Tinham direito a voto apenas aqueles que j haviam

    participado de pelo menos uma bienal anterior. Cada um deles indicava dois nomes no ato de

    sua inscrio que, depositados numa urna, aguardavam o dia marcado para apurao39.

    Em 27 de abril de 1965, foram conhecidos os nomes dos representantes dos artistas:

    Jos Geraldo Vieira (71 votos), Walter Zanini (64), Geraldo Ferraz (38), Fernando Lemos

    (33) e Mrio Pedrosa (31). Em seguida, Srgio Milliet (25) e Mario Schenberg (22), ficaram

    como suplentes40. Em 30 de abril, Walter Zanini escreve Din Lopes Coelho, secretria da

    Fundao Bienal informando que viajaria para o Japo, a fim de participar do Jri de Seleo

    da Bienal de Tquio, e no conseguiria retornar ao pas a tempo de integrar o jri brasileiro41.

    Conforme o regulamento, o crtico Srgio Milliet foi chamado para substitu-lo, mas

    pde comparecer apenas primeira reunio do Jri, no Museu de Arte Moderna do Rio de

    Janeiro, em 06 de maio. Nas reunies posteriores, Mario Schenberg esteve presente em seu

    38

    OLIVEIRA, Alecsandra Matias de. Schenberg: crtica e criao. So Paulo: EDUSP, 2010. 39 FUNDAO BIENAL. VIII Bienal. (catlogo de exposio) So Paulo: Fundao Bienal, 1965, p.20. At a III Bienal, em 1955, a indicao dos dois nomes para o Jri era feita em espao destinado a isso na prpria ficha de inscrio. A partir da IV Bienal, a votao passou a ser feita em cdulas no identificadas, conforme descrito acima. (Arquivo Histrico Wanda Svevo, Fundao Bienal) 40 ZANINI, Ivo. Indicado o Jri da VIII Bienal. Folha Ilustrada (So Paulo Capital). 27/04/1965. 41 Carta de Walter Zanini a Din Coelho Lopes, de 30 de abril de 1961 (Arquivo Histrico Wanda Svevo, Fundao Bienal).

  • 32

    lugar42. Tanto na ata final do Jri Nacional de Seleo, quando em nota divulgada imprensa

    ao final dos trabalhos, o nome de Mario Schenberg que consta no lugar do de Walter Zanini,

    como membro eleito pelos artistas43.

    Uma vez integrando o Jri, Mario Schenberg no hesitou em defender os artistas com

    os quais mantinha contato, notadamente aqueles que estavam alinhados com tendncias como

    as novas figuraes, a saber, Jos Roberto Aguilar, Cludio Tozzi e Rubens Guerchmann,

    entre outros; e a arte primitiva, como Waldomiro de Deus. Aps a finalizao dos trabalhos de

    seleo das obras para a VIII Bienal, Aracy Amaral traa um perfil das interaes dos

    membros do Jri, na qual aponta Mrio Pedrosa e Mario Schenberg como maiores definidores

    das escolhas feitas pelo grupo, no interior das discusses to comuns nesse tipo de

    Seleo44.

    O crtico, contudo, no pde comparecer inaugurao da VIII Bienal de So Paulo

    em 4 de setembro, pois estava preso. O Congresso Internacional de Partculas Elementares se

    aproximava: Mario Schenberg no tinha obtido permisso para viajar ao Japo e estava com

    priso preventiva decretada h meses. O Professor Schenberg foi libertado pouco tempo

    depois e conseguiu embarcar devido, em grande parte, solidariedade da comunidade

    cientfica nacional e internacional, que fez chegar ao governo do pas inmeras mensagens

    pedindo sua libertao45.

    Tambm os artistas manifestaram seu apoio: na inaugurao da VIII Bienal, aps a

    cerimnia de premiao, os artistas Maria Bonomi e Srgio Camargo (ambos premiados

    naquela edio) foram ao encontro do presidente da repblica, o militar Castelo Branco, e

    entregaram a ele uma carta que ficou conhecida como Manifesto dos 4. Este documento,

    assinado por vrios artistas, continha o pedido para que o presidente intercedesse em favor de

    42 Srgio Milliet teve de ser substitudo s vsperas de viajar ao Rio de Janeiro para o prosseguimento dos trabalhos do Jri devido a um mal-estar. (Schenberg em Vez de Milliet. Correio da Manh (Estado da Guanabara). 07/05/1965). 43 Em 19 de maio, Francisco Matarazzo Sobrinho envia a Vasco Mariz, chefe da diviso de difuso cultural da Fundao Bienal, a lista de artistas que foram aceitos na oitava edio do evento, na qual constava a composio final do Jri de Seleo (Arquivo Histrico Wanda Svevo, Fundao Bienal). 44 O trabalho do Jri, alm de difcil, duro e intenso, foi marcado por discusses to comuns nesse tipo de seleo. Mario Pedrosa e Mario Schenberg, ao que tudo indica, definiam as escolhas, parece ter havido pouca identidade de pontos de vista entre Geraldo Ferraz e Fernando Lemos. Jos Geraldo Vieira, como sempre, atuou como poder moderador (AMARAL, Aracy. Terminada a Seleo da Bienal. A Gazeta, So Paulo (capital), 18/05/1965). 45 Resta saber com mais detalhes como foi possvel a Mario Schenberg participar das diversas reunies do Jri sob ameaa de priso. Isso, contudo, no pde ser realizado durante o andamento desta pesquisa, devido s limitaes de tempo e ao assunto delimitado.

  • 33

    Mario Schenberg, Florestan Fernandes, Joo Cruz Costa e Fernando Henrique Cardoso,

    docentes da Faculdade de Filosofia, Cincias e Letras da Universidade de So Paulo46.

    46 O texto integral do Manifesto dos 4 foi includo entre os Anexos deste estudo.

  • 34

    Figura 5 - Maria Bonomi, 1965, xilogravura sobre papel de arroz, 130 x 108. A artista ganhou o prmio de melhor gravadora nacional.

    Figura 4 - Sala de Srgio Camargo, VIII Bienal de So Paulo. O artista recebeu o prmio de melhor escultor nacional na edio.

  • 35

    1967: A Bienal do Pop

    Momento final de um perodo de efervescncia cultural no pas, 1967 foi o ano de

    Terra em Transe, O Rei da vela, da exposio Nova Objetividade Brasileira, assim como de

    Tropiclia, o ambiente de Hlio Oiticica e da exploso do tropicalismo na msica,

    manifestaes que marcaram os anos de 196047. Cinema, teatro, msica e artes plsticas

    manifestavam o anseio de dar uma contribuio original esfera da cultura, seja em nvel

    nacional, seja internacional. O crescendum dessa movimentao, iniciado na dcada de 1950 e

    perturbado com o golpe de 1964, seguiria at a decretao do AI-5, quatro anos depois.

    Em 1967, a Pop Art48 norte-americana, que marcou presena na Bienal anterior, deu o

    tom da mostra. No foi por acaso que a IX Bienal ficou conhecida como a Bienal do Pop.

    Apesar da repercusso da sala dos Estados Unidos ter sido significativa, outros pases tambm

    trouxeram para a Bienal desdobramentos da Pop Art49.

    Assim como na Bienal anterior, a representao brasileira foi criticada pela

    heterogeneidade dos trabalhos selecionados, bem como pelo grande nmero de artistas. Foi,

    nas palavras de Leonor Amarante, uma Bienal generosa, que tinha de tudo um pouco, sem

    47 FAVERATO, Celso. A outra Amrica. Folha de So Paulo, 09 de junho de 2001. Terra em Transe: filme de 1967, com direo de Glauber Rocha. O Rei da Vela: pea escrita por Oswald de Andrade em 1933, cuja montagem dirigida e encenada por Jos Celso Martins Corra junto ao Teatro Oficina em 1967 ficou conhecida internacionalmente. Nova Objetividade Brasileira: exposio realizada em abril de 1967 no MAM-RJ, com participao de diversos artistas e crticos, em torno da ideia de nova objetividade, que comeou a ser delineada por Hlio Oiticica na exposio-seminrio Propostas 65, reconhecendo a contribuio de Mario Schenberg em sua formulao. Tropiclia: ambiente elaborado por Hlio Oiticica, composto por um labirinto no qual estavam dois Penetrveis PN2, 1966, Pureza um Mito e PN3, 1966/1967, Imagtico junto a plantas, areia, poemas-objeto, capas de parangol e um aparelho de televiso. (ITA CULTURAL. Enciclopdia de Artes Visuais Ita Cultural. Disponvel em: www.itaucultural.org.br Acesso em 09/05/2013). 48 Tendo surgido na Inglaterra nos anos 50, mas polarizada e difundida pelos norte-americanos, a partir de 1962, a Arte Pop se consolidou como uma tela de fundo poderosa qual se remetiam como ressonncias a maioria das manifestaes figurativas e realistas dessa poca (Cf. PECCININI, Daisy. Figuraes no Brasil: anos 60. In: Projeto Visitando o MAC na Web). Na Europa, essa vertente marcou presena com o Novo Realismo. Alguns elementos precursores do Pop, ainda no fim dos anos 50 foram, segundo Archer, o interesse pelo corriqueiro, a disposio de abarcar o acaso (no apenas por uma herana do Dadasmo, mas tambm o reconhecimento de que na vida as coisas simplesmente acontecem) e um novo senso visual (ARCHER, Michael. Arte Contempornea. So Paulo: Martins Fontes, 2008,, p. 5). A noo de assemblage, proveniente do Dadasmo, teve desdobramentos na Arte Pop: tanto pelo fato de se retirar imagens e objetos de seu lugar no mundo comum, reorganizando-os na obra de arte, quanto pelo fato de que essa conexo com o cotidiano, desde que no nos envergonhemos dela, deixa o caminho livre para uma vasta gama de materiais e tcnicas at (...) o momento no associados ao fazer artstico (ARCHER, Idem, Ibidem, p. 4). O caminho livre em potencial, aberto por essa nova sensibilidade, j bastante perceptvel por volta de 1962, nas obras de artistas como Roy Lichtenstein, Andy Warhol, Claes Oldenburg, Tom Wesselman e James Rosenquist (ARCHER, Idem, Ibidem, p. 6), na medida em que as imagens e materiais provenientes da cultura visual de massas nos Estados Unidos eram a matria-prima constante. 49 AMARANTE, Leonor. As Bienais de So Paulo: 1951 a 1987. So Paulo: Projeto, 1989, p. 161. Um dos destaques da representao dos Estados Unidos foi a sala especial dedicada ao pintor Edward Hopper, falecido cinco messes antes da exposio e, ento, recentemente reconhecido como precursor da Pop Art. (Idem, Ibidem, p. 167).

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    rigor conceitual50. Trs anos mais tarde, Mario Pedrosa manifestaria sua discordncia em

    relao constituio das salas brasileiras, para as quais um jri da seleo de missionrio,

    sob a ascendncia de Mrio Schenberg, deixou passar tudo, o bom e o mau, o achado e o

    inacabado, bastando para tanto que um embrio de idia despontasse51. Contudo, havia nesse

    conjunto artistas jovens cuja qualidade era j ento reconhecida, a saber, Wesley Duke Lee,

    Carlos Vergara, Nelson Leirner, Jos Roberto Aguilar, Cludio Tozzi, Flvio de Carvalho,

    Marcelo Nietsche, Jos Resende, Frans Weissemann, Fayga Ostrower e Maria Bonomi.

    No texto A Representao Brasileira na IX Bienal de So Paulo, Schenberg afirmou

    que o jri foi capaz de compreender que o momento atual da arte brasileira se caracteriza por

    uma irrupo macia de artistas jovens que encontram novos caminhos52, refletindo com

    propriedade a extrema variedade de direcionamentos tomados pelos novos artistas e pelas

    novas tendncias realistas. Observou, ainda, que a presena de objetos e esculturas foi maior

    que na bienal anterior, tanto pela orientao diferenciada do jri de seleo, quanto pelo

    aumento das pesquisas de artistas nessa direo53.

    Foi singular na histria das bienais a intensidade da participao do pblico, que nessa

    edio foi como nunca antes, e no se repetiria nas mostras posteriores. A IX Bienal foi a

    nica em que se permitiu tocar nas obras, em que houve participao do pblico, at mesmo

    em relao s obras que no tinham essa proposta. Leonor Amarante comenta que, dias depois

    da abertura da mostra, no se encontrava nenhuma obra intacta. As engrenagens estavam

    quebradas, mquinas e motores fora de uso, interruptores e lmpadas queimados,

    equipamentos de som mudos54. Para Mario Pedrosa, a quem a participao do pblico

    agradou, isso era um sinal de que o povo consagra a arte nova55. O crtico observa que, na

    Bienal de 1967, o pblico compreendeu que a arte estava passando por uma profunda

    transformao, tornando-se algo diferente do que foi visto nas primeiras edies56.

    Outra novidade foi a unificao dos prmios: conforme um acordo assinado entre a

    Fundao Bienal e o Itamaraty, no haveria mais separao entre as premiaes nacionais e

    50 AMARANTE, Leonor. As Bienais de So Paulo: 1951 a 1987. So Paulo: Projeto, 1989, p. 168. 51 PEDROSA, Mrio. A Bienal de C para L. In Mundo, Homem, Arte em crise. (Org. Aracy Amaral). So Paulo: Perspectiva, 1975, p. 301. 52 SCHENBERG, Mario. A Representao Brasileira na IX Bienal de So Paulo. In Pensando a Arte. So Paulo: Nova Stella, 1988, p. 183. 53 SCHENBERG, Mario. A Representao Brasileira na IX Bienal de So Paulo. In Pensando a Arte. So Paulo: Nova Stella, 1988, p. 183. 54 AMARANTE, Leonor. As Bienais de So Paulo: 1951 a 1987. So Paulo: Projeto, 1989, p. 154. 55

    PEDROSA, Mrio. A Bienal de C para L. In Mundo, Homem, Arte em crise. (Org. Aracy Amaral). So Paulo: Perspectiva, 1975, p. 301. Cf. tambm A Bienal e a participao...do povo, no mesmo livro. 56

    PEDROSA, Mrio. A Bienal de C para L. In Mundo, Homem, Arte em crise. (Org. Aracy Amaral). So Paulo: Perspectiva, 1975, p. 300.

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    internacionais57. Essa mudana pode ser vista como uma resposta ao momento de crise pelo

    qual passava a mostra, desde o Golpe Militar de 1964, que trouxe, em seu bojo, a censura.

    Conforme j foi apontado, no eram novidade as crticas ao sistema organizacional das

    bienais e, tambm por isso, as circunstncias pediam mudanas.

    A IX Bienal teve lugar entre 22 de setembro de 1967 e adentrou em 1968, indo at 8

    de janeiro. Foi uma edio de grandes propores, trazendo 956 artistas de 63 pases,

    somando 4.338 obras expostas58. Tais dimenses, sobretudo relativas representao

    brasileira (366 artistas, entre os quais contavam 253 estreantes), foram um dos aspectos

    criticados nessa edio. Critica essa, que j era tecida desde as primeiras bienais.

    Esta foi a ltima edio do evento antes do Ato Institucional Nmero 5, decretado no

    fim de 1968 e que, no ano seguinte, causaria estragos vida cultural do pas. Antes mesmo da

    inaugurao da mostra, algumas obras foram retiradas pelos militares, por terem-nas julgado

    ofensivas. Alguns jornalistas foram impedidos de circular livremente pela Bienal.

    interessante notar que, enquanto a obra Polptico mvel gnese do pavilho nacional do

    artista Quissak Jnior, foi censurada por ter retrabalhado a bandeira nacional, smbolo ento

    vetado para uso popular pelo governo; a obra Trs Bandeiras, de Jasper Johns, que

    sobrepunha imagens da bandeira norte-americana, foi premiada59.

    57 AMARANTE, Leonor. As Bienais de So Paulo: 1951 a 1987. So Paulo: Projeto, 1989, p. 171. 58 FUNDAO BIENAL. Bienal a Bienal. Disponvel em: http://www.bienal.org.br/FBSP/pt/AHWS/BienalaBienal/Paginas/6BienalSaoPaulo.aspx?selected=6 Acesso em 15/01/2013. 59

    AMARANTE, Leonor. As Bienais de So Paulo: 1951 a 1987. So Paulo: Projeto, 1989, p. 157.

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    Figura 6