2010__358_setembro

48
Órgão oficial da Associação Brasileira de Imprensa Jornal da ABI 358 SETEMBRO 2010 PÁGINAS 34, 35, 36 E 37 Páginas 20, 21, 22 e 23 A VISÃO DE UM MESTRE DO DESIGN: RICO LINS “UMA IDÉIA AINDA VALE MAIS DO QUE MIL PALAVRAS”, DIZ ESSE ARTISTA PREMIADO AQUI E NO EXTERIOR. PÁGINAS 40, 41 E 42 NA PAREDE, UM RETRATO DO AMOR AO CINEMA UM NÚCLEO QUE CULTIVA A MEMÓRIA DA IMPRENSA LEGISLADOR QUERIA ELEIÇÃO SEM GRAÇA A IMAGEM DE UMA SESSÃO HISTÓRICA, NA ABI, DA NASCENTE CINEMATECA DO MUSEU DE ARTE MODERNA DO RIO. PÁGINAS 12 E 13 É INSTALADA PELO SINDICATO DOS JORNALISTAS DO RIO INSTITUIÇÃO QUE FIXARÁ MOMENTOS DA PROFISSÃO. PÁGINAS 18 E 19 REAÇÃO DOS HUMORISTAS DERRUBA DISPOSIÇÃO DA LEI ELEITORAL QUE PROIBIA CRÍTICAS AOS CANDIDATOS. PÁGINAS 20 E 21 Foca na Rádio Roquette-Pinto, ele trabalhou em jornal, rádio e televisão e, talento multimídia, agora é um craque do jornalismo eletrônico. SIDNEY REZENDE SEU PORTAL TEM 1 MILHÃO DE ACESSOS A área central da cidade abriga importantes instituições que oferecem em caráter permanente cultura e lazer a dezenas de milhares de pessoas. DÉCADA DE Uma febre arde no Rio: Centros Culturais O INÍCIO EXPLOSIVO DA 1980 Há 30 anos uma carta-bomba matava a secretária da OAB Lyda Monteiro da Silva. Começava o terror da linha-dura contrária à abertura, o qual se estenderia por todo 1981. Páginas 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 e 10

Upload: associacao-brasileira-de-imprensa-abi

Post on 13-Mar-2016

310 views

Category:

Documents


49 download

DESCRIPTION

 

TRANSCRIPT

Órgão oficial da Associação Brasileira de Imprensa

Jornal da ABI358SETEMBRO

2010

PÁGINAS 34, 35, 36 E 37

Páginas 20, 21, 22 e 23

A VISÃO DE UM MESTREDO DESIGN: RICO LINS

“UMA IDÉIA AINDA VALE MAIS DO QUE MILPALAVRAS”, DIZ ESSE ARTISTA PREMIADO

AQUI E NO EXTERIOR. PÁGINAS 40, 41 E 42

NA PAREDE, UM RETRATODO AMOR AO CINEMA

UM NÚCLEO QUE CULTIVAA MEMÓRIA DA IMPRENSA

LEGISLADOR QUERIAELEIÇÃO SEM GRAÇA

A IMAGEM DE UMA SESSÃO HISTÓRICA, NAABI, DA NASCENTE CINEMATECA DO MUSEUDE ARTE MODERNA DO RIO. PÁGINAS 12 E 13

É INSTALADA PELO SINDICATO DOSJORNALISTAS DO RIO INSTITUIÇÃO QUE FIXARÁMOMENTOS DA PROFISSÃO. PÁGINAS 18 E 19

REAÇÃO DOS HUMORISTAS DERRUBADISPOSIÇÃO DA LEI ELEITORAL QUE PROIBIA

CRÍTICAS AOS CANDIDATOS. PÁGINAS 20 E 21

Foca na Rádio Roquette-Pinto, ele trabalhou em jornal, rádio e televisão e, talento multimídia, agora é um craque do jornalismo eletrônico.

SIDNEY REZENDE SEU PORTAL TEM 1 MILHÃO DE ACESSOS

A área central da cidade abriga importantes instituições que oferecem em caráter permanente cultura e lazer a dezenas de milhares de pessoas.

DÉCADA DE

Uma febre arde no Rio: Centros Culturais

O INÍCIO EXPLOSIVO DA

1980Há 30 anos uma carta-bomba matava a secretária da OABLyda Monteiro da Silva. Começava o terror da linha-duracontrária à abertura, o qual se estenderia por todo 1981.

Páginas 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 e 10

2 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

EditorialEditorial

DIRETORIA – MANDATO 2010-2013Presidente: Maurício AzêdoVice-Presidente: Tarcísio HolandaDiretor Administrativo: Orpheu Santos SallesDiretor Econômico-Financeiro: Domingos MeirellesDiretor de Cultura e Lazer: Jesus ChediakDiretora de Assistência Social: Ilma Martins da SilvaDiretora de Jornalismo: Sylvia Moretzsohn

CONSELHO CONSULTIVO 2010-2013Ancelmo Goes, Aziz Ahmed, Chico Caruso, Ferreira Gullar, Miro Teixeira, Nilson Lage eTeixeira Heizer.

CONSELHO FISCAL 2010-2011Jarbas Domingos Vaz, Presidente; Adail José de Paula, Geraldo Pereira dos Santos, JorgeSaldanha de Araújo, Lóris Baena Cunha, Luiz Carlos de Oliveira Chesther e Manolo Epelbaum.

MESA DO CONSELHO DELIBERATIVO 2010-2011Presidente: Pery CottaPrimeiro Secretário: Sérgio CaldieriSegundo Secretário: Arcírio Gouvêa Neto

Conselheiros efetivos 2010-2013André Moreau Louzeiro, Benício Medeiros, Bernardo Cabral, Carlos Alberto MarquesRodrigues, Fernando Foch, Flávio Tavares, Fritz Utzeri, Jesus Chediak, José Gomes Talarico,Marcelo Tiognozzi, Maria Ignez Duque Estrada Bastos, Mário Augusto Jakobskind, OrpheuSantos Salles, Paulo Jerônimo de Sousa e Sérgio Cabral.

Conselheiros efetivos 2009-2012Adolfo Martins, Afonso Faria, Aziz Ahmed, Cecília Costa, Domingos Meirelles, FernandoSegismundo, Glória Suely Álvarez Campos, Jorge Miranda Jordão, José Ângelo da SilvaFernandes, Lênin Novaes de Araújo, Luís Erlanger, Márcia Guimarães, Nacif Elias HiddSobrinho, Pery de Araújo Cotta e Wilson Fadul Filho.

Conselheiros efetivos 2008-2011Alberto Dines, Antônio Carlos Austregesylo de Athayde, Arthur José Poerner, Carlos ArthurPitombeira, Dácio Malta, Ely Moreira, Fernando Barbosa Lima (in memoriam), LedaAcquarone, Maurício Azêdo, Mílton Coelho da Graça, Pinheiro Júnior, Ricardo Kotscho,Rodolfo Konder, Tarcísio Holanda e Villas-Bôas Corrêa.

Conselheiros suplentes 2010-2013Adalberto Diniz, Alfredo Ênio Duarte, Aluízio Maranhão, Arcírio Gouvêa Neto, DanielMazola Froes de Castro, Germando de Oliveira Gonçalves, Ilma Martins da Silva, JoséSilvestre Gorgulho, Luarlindo Ernesto, Marceu Vieira, Maurílio Cândido Ferreira, SérgioCaldieri, Wilson de Carvalho, Yacy Nunes e Zilmar Borges Basílio.

Conselheiros suplentes 2009-2012Antônio Calegari, Antônio Henrique Lago, Argemiro Lopes do Nascimento (Miro Lopes),Arnaldo César Ricci Jacob, Ernesto Vianna, Hildeberto Lopes Aleluia, Jordan Amora,Jorge Nunes de Freitas, Luiz Carlos Bittencourt, Marcus Antônio Mendes de Miranda,Mário Jorge Guimarães, Múcio Aguiar Neto, Raimundo Coelho Neto (in memoriam) eRogério Marques Gomes.

Conselheiros suplentes 2008-2011Alcyr Cavalcânti, Edgar Catoira, Francisco Paula Freitas, Francisco Pedro do Coutto,Itamar Guerreiro, Jarbas Domingos Vaz,José Pereira da Silva (Pereirinha), Maria doPerpétuo Socorro Vitarelli, Ponce de Leon, Ruy Bello (in memoriam), Salete Lisboa, SidneyRezende,Sylvia Moretzsohn, Sílvio Paixão e Wilson S. J. de Magalhães.

COMISSÃO DE SINDICÂNCIAJosé Pereira da Silva (Pereirinha), Presidente; Carlos Di Paola, Marcus Antônio Mendes deMiranda, Maria Ignez Duque Estrada Bastos e Toni Marins (in memoriam).

COMISSÃO DE ÉTICA DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃOAlberto Dines, Arthur José Poerner, Cícero Sandroni, Ivan Alves Filho e Paulo Totti.

COMISSÃO DE DEFESA DA LIBERDADE DE IMPRENSA E DIREITOS HUMANOSLênin Novaes de Araújo, Presidente; Wilson de Carvalho, Secretário; Alcyr Cavalcanti, ArcírioGouvêa Neto, Daniel de Castro, Geraldo Pereira dos Santos, Germando de Oliveira Gonçalves,Gilberto Magalhães, José Ângelo da Silva Fernandes, Lucy Mary Carneiro, Maria CecíliaRibas Carneiro, Mário Augusto Jakobskind, Martha Arruda de Paiva e Yacy Nunes.

COMISSÃO DIRETORA DA DIRETORIA DE ASSISTÊNCIA SOCIALIlma Martins da Silva, Presidente, Jorge Nunes de Freitas, Manoel Pacheco dos Santos,Maria do Perpétuo Socorro Vitarelli, Mirson Murad e Moacyr Lacerda.

REPRESENTAÇÃO DE SÃO PAULOConselho Consultivo: Rodolfo Konder (Diretor), Fausto Camunha, George BenignoJatahy Duque Estrada, James Akel, Luthero Maynard e Reginaldo Dutra.

Jornal da ABINúmero 358 - Setembro de 2010

Editores: Maurício Azêdo e Francisco UchaProjeto gráfico e diagramação: Francisco UchaEdição de textos: Maurício Azêdo

Apoio à produção editorial: Alice Barbosa Diniz,Conceição Ferreira, Guilherme Povill Vianna, MariaIlka Azêdo, Ivan Vinhieri, Mário Luiz de Freitas Borges.

Publicidade e Marketing: Francisco Paula Freitas(Coordenador), Queli Cristina Delgado da Silva,Paulo Roberto de Paula Freitas.

Diretor Responsável: Maurício Azêdo

Associação Brasileira de ImprensaRua Araújo Porto Alegre, 71Rio de Janeiro, RJ - Cep 20.030-012Telefone (21) 2240-8669/2282-1292e-mail: [email protected]

Representação de São PauloDiretor: Rodolfo KonderRua Dr. Franco da Rocha, 137, conjunto 51Perdizes - Cep 05015-040Telefones (11) 3869.2324 e 3675.0960e-mail: [email protected]

Impressão: Taiga Gráfica Editora Ltda.Avenida Dr. Alberto Jackson Byington, 1.808Osasco, SP

O JORNAL DA ABI NÃO ADOTA AS REGRAS DO ACORDO ORTOGRÁFICO DOS PAÍSES DELÍNGUA PORTUGUESA, COMO ADMITE O DECRETO Nº 6.586, DE 29 DE SETEMBRO DE 2008.

CHAGAS AINDA ABERTASOS SETORES PROGRESSISTAS do Pais revive-

ram no fim de agosto e princípio deste mês desetembro a dolorosa lembrança dos episódiostormentosos que marcaram a vida nacional há30 anos, quando desalmados agentes do regi-me militar desencadearam uma seqüência deatentados terroristas, que deixaram entre suasvítimas Dona Lyda Monteiro da Silva, secretá-ria do Conselho Federal da Ordem dos Advoga-dos do Brasil, morta em 27 de agosto de 1980pela explosão de uma carta-bomba endereçadaao Presidente da instituição, Eduardo SeabraFagundes, como represália à sua firme atuaçãona luta pela restauração do Estado de Direitono Brasil. Nesse dia fatídico outro ato terroris-ta mutilou gravemente um assessor do Verea-dor Antônio Carlos de Carvalho (PMDB) naCâmara Municipal do Rio de Janeiro, tambémcomo revide à corajosa participação desse sau-doso parlamentar na luta contra a ditadura.

DECORRIDOS 30 ANOS, esses atos crimino-sos permanecem numa penumbra de mistério,como demonstrou reportagem do jornalistaChico Otávio, que levantou informações quepoderão conduzir à identificação da origem edos agentes desses atos criminosos, desde en-tão protegidos por intolerável impunidade. Di-ante dessas informações, o Presidente da Se-ção do Estado do Rio da OAB, Wadih Damous,reclamou a investigação sobre o brutal assas-sinato da desafortunada Dona Lyda Monteiroda Silva, a quem a instituição prestou homena-gens ao evocar tão triste acontecimento.

EM LEVANTAMENTO QUE o Jornal da ABI pu-blica nesta edição, o repórter Paulo Chico fez oinventário dos atos terroristas que infelicita-

ram o País nos anos 1980 e 1981, quando a cha-mada linha-dura militar se insurgia contra a aci-dentada caminhada que, cedendo à pressão dasociedade civil, o Governo Figueiredo empre-endia, dando continuidade à distensão gradu-al, lenta e segura de que falara o ditador que lheprecedera, General Ernesto Geisel. Esse é umregistro histórico valioso, que demonstra oencadeamento de ações que tinham um centroa concebê-las e agentes designados para execu-tá-las de Norte a Sul do País.

NÃO SE DIGA QUE não houve alertas acercadessa criminosa programação. Uma das gran-des vítimas dessa maquinação,o jornalista HélioFernandes, cujo jornal, a Tribuna da Impren-sa, fora alvo de uma ação terrorista que arra-sou suas instalações, revelou então em depoi-mento numa Comissão Parlamentar de Inqué-rito do Senado Federal que o centro responsá-vel pelos atentados era o Serviço Nacional deInformações, tristemente celebrizado pela siglaSNI. Ao longo de seis horas, Hélio Fernandescitou fatos, nomes e circunstâncias que des-vendavam a trama liberticida. Após sua im-pressionante exposição, nada foi feito. Ou me-lhor, fez-se, sim: deram sumiço à gravação deseu depoimento.

É IMPERIOSO QUE, como reclama a OAB-RJ,essa investigação seja retomada, e com serie-dade, porque as chagas abertas pelo terroris-mo ainda sangram na consciência cívica dacidadania e estão a demandar até mesmo re-paração material, como no caso, entre muitosoutros, da Tribuna da Imprensa, cujo colapsocomo empresa foi desatado pelo atentado quesofreu em 26 de março de 1981.

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

03 Especial - Centros Culturais, uma febre no Rio

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

11 Artigo - A fuga, por Rodolfo Konder

16 Depoimentos - “O colapso do JB começou

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

quando o jornal malufou”

18 Documentação - Um Centro para cultivar

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

a memória da imprensa

20 Mobilização - Por uma eleição

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

com mais graça

22 Ambiente - Brincando de queimar o mundo

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Por Paulo Ramos Derengoski

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

23 História - A Gazeta do Rio, nosso começo, aqui

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

34 Depoimento - Sidney Rezende

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

38 Celebrações - O ano da graça de Gullar

40 Design - A perfeição gráfica do acaso,

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

segundo Rico Lins

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

43 Centenário - Noel Rosa, sempre moderno

SEÇÕES

12 ACONTECEU NA ABI

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Um retrato do amor ao cinema

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

23 MENSAGENS

LIBERDADE DE IMPRENSA

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

26 Lúcio Flávio continua sob cerco dos Maiorana

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

27 Procurador viola sigilo da fonte

28 Narcotráfico do México mata jornalista

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

e até estagiários

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

29 Durou horas a rolha do Desembargador

DIREITOS HUMANOS

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

30 Estilhaços do terror no Brasil

LIVROS

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

46 Morel exalta o legado de Cipriano Barata

47 VIDASRicardo Alvarez, um militante social

DESTAQUES DESTA EDIÇÃO

3Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

ESPECIAL

Instituições públicas e privadas mantêm na cidade um conjunto de unidadesque dão dinamismo à cultura e à sua universalização: neste ano de 2010 a

previsão é de que elas recebam mais de 2 milhões de espectadores e usuários.

O privilégio de possuir tantos centros cul-turais no coração da cidade é uma riqueza queo Rio de Janeiro herdou de seu invejável pas-sado histórico. Do Rio emanavam as atitudese o pensamento dos cérebros que moldavame ditavam os rumos da opinião pública e dasconsciências de um Brasil Colônia, Metrópolee República. Muitos desses centros culturaissão tão importantes e centenários que contam,

POR ARCÍRIO GOUVÊA NETO

em cada uma de suas paredes e no desenho im-ponente de suas fachadas, também um pou-co da História do Brasil. São tão integrados àfisionomia da cidade que viraram monumen-tos, monumentos de que o carioca e mesmoo visitante, orgulhosamente, não abrem mão.

Quando em novembro de 1807 as velas lu-sitanas, sob escolta inglesa, rumaram para oBrasil, não supunham os viajantes as transfor-

mações que aqui suscitariam. Cerca de 15 milpessoas desembarcaram no Rio de Janeiro a 8de março de 1808. Um acréscimo de quase umterço numa população estimada em 50 mil pes-soas. A Corte Lusa se instala e a cidade se tor-na capital portuguesa. Em 1815 o status co-lonial do Brasil é alterado e surge o Reino dePortugal, Brasil e Algarves. É hora de mudan-ças; o Rio troca de roupa.

FERN

AN

DO

QU

EVEDO

/AG

ÊNC

IA O

GLO

BO

Centros Culturais,uma febre no Rio

Centros Culturais,uma febre no Rio

Centros Culturais,uma febre no Rio

A imponente fachada da Bilioteca Nacional,um centro cultural que abriga o acervo

centenário trazido pela Família Real em 1808.

4 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

Assim, em 1819, Dom João VI man-da Grandjean de Montigny, Diretor daMissão Artística Francesa, erguer o edi-fício onde hoje funciona a Casa França-Brasil, palco de eventos importantes denossa História. A obra, em si, já é umsignificativo documento. É o primeiroregistro do estilo neoclássico no Rio deJaneiro, que, a partir daí, iria invadir acidade, tingindo o barroco de nossas flo-restas e de nossas casas coloniais de umtom cosmopolita, à moda européia.

O prédio é projetado para sediar umaPraça do Comércio. Em 13 de maio de1820, aniversário de Dom João VI, o edi-fício é inaugurado. Quando Napoleão vaipara o degredo em Santa Helena, DomJoão resolve voltar a Lisboa e não hesi-ta em levar para Portugal, além de suaCorte, toda a riqueza acumulada nopróspero período em que esteve na maisrica de suas possessões ultramarinas,bem como em deixar leis rígidas que ga-rantissem controle jurídico e financei-ro sobre a colônia.

Às vésperas de sua partida, em 1821,numa reunião na Praça do Comércio, opovo rebela-se, solicitando, entre outrascoisas, a promulgação de uma Constitui-ção liberal. A ousadia é gravemente re-primida pelas tropas reais, com a inva-são do prédio e o ataque a tiros e baio-netas contra os amotinados. Em protes-to, os comerciantes abandonam a Praçae afixam uma faixa dando-lhe um novonome: “Açougue dos Bragança”. Daí emdiante pouco se sabe da repercussão doevento, que foi devidamente abafadopela Corte, mas guardou a fama de tersido a primeira revolução liberal do Riode Janeiro.

Com a Independência, em 1822, DomPedro I trata logo de dar uma função aobelo prédio e o incorpora, em 1824, àAlfândega. Em1852, iniciam-se obras deremodelação do edifício, sob a orienta-ção de André Rebouças e projeto do ar-quiteto português Rafael de Castro. AAlfândega funciona ali até 1944, quan-do se muda para um novo prédio naAvenida Rodrigues Alves, na Zona Por-tuária da cidade. Entre 1944 e 1952 é usa-do como depósito dos arquivos do ban-co Ítalo-Germânico. E de 1956 a 1978,passa a abrigar o II Tribunal do Júri.

No começo da década de 1980, surgi-ram as primeiras idéias de aproveitamen-to cultural do prédio. Várias propostasforam feitas até que, em 1984, Darci Ri-beiro, então Secretário de Cultura doEstado do Rio, articulou-se com JackLang, Ministro da Cultura da França, einiciou as conversas para a restauração ea implantação de um centro cultural nolocal, destinado ao intercâmbio culturalentre Brasil e França. Antes que fossetarde demais, pois, acreditem, existiaum projeto do arquite-to Lúcio Costa, um dosmodernistas que pro-jetaram Brasília, suge-rindo a demolição doimóvel.

Em 29 de março de 1990 a Casa Fran-ça-Brasil é inaugurada. Torna-se, a par-tir daí, um dos principais espaços cultu-rais do Rio de Janeiro e consolida-secomo um lugar privilegiado para a rea-lização de exposições, performances eapresentações musicais. Recentementeo prédio que abriga o centro culturalpassou por intenso processo de obrasestruturais e de nova restauração como objetivo de recuperá-lo, preservandouma construção de grande importânciahistórica e arquitetônica, e, ao mesmotempo, modernizando suas instalações.

ATRAÇÕES: MÚSICA, MESA-PALCO, SALA DE LEITURA E

ESPAÇO GASTRONÔMICO

O Projeto Música reúne músicos eprofissionais de outras áreas em encon-tros com música e bate-papo. Participamescritores, cronistas esportivos, chefes decozinhas, humoristas. O Mesa-Palcocompreende performances de dança con-temporânea e oficinas de arte. Nas ofici-nas, artistas plásticos propõem a experi-mentação dos processos artísticos, pormeio de atividades teóricas e práticas. ASala de Leitura oferece ao público a opor-tunidade de conhecer o que há de mais re-presentativo em arte contemporânea.Também realiza encontros de poesia.

O Espaço Gastronômico da CasaFrança-Brasil faz parte do novo perfil docentro cultural. Junto com a Sala deLeitura e o Espaço de Convivência, in-tegra um projeto que tem por objetivoproporcionar ao visitante opções de in-formação, entretenimento e lazer. Inau-gurado em novembro de 2009, o espa-ço é o endereço do mais novo Bistrô The

Line. O local ainda dis-ponibiliza o serviço deinternet sem fio para osvisitantes que desejemacessar a rede com seusnotebooks.

A Caixa Cultural Rio de Janeiro –antigo Conjunto Cultural da Caixa – écomposta por duas unidades localizadasno Centro do Rio de Janeiro: uma naAvenida Chile, 230, Anexo, e outra naAvenida Almirante Barroso, 25, junto àEstação Carioca do Metrô. A programa-ção da Caixa Cultural nestas duas uni-dades tem o objetivo de gerar oportuni-dades a novos talentos da arte contem-porânea e também possibilitar o acessoda população ao trabalho de artistasconsagrados nacional e internacional-mente.

Inaugurado em 1976 com o nome deTeatro BNH, o Teatro Nélson Rodriguesteve como espetáculo de estréia a peçaVestido de Noiva, do próprio Nélson. Foiincorporado pela Caixa a partir de 1989(após a extinção do Banco Nacional deHabitação-BNH), já com o nome TeatroNélson Rodrigues, em homenagem aogrande dramaturgo. O espaço passou porampla reforma em 2003 e foi devolvidoà população, em setembro de 2004, to-talmente modernizado.

O prédio onde está localizado o tea-tro é um marco da arquitetura da déca-da de 1970, com forma piramidal e fa-chadas decoradas com esculturas dos ar-tistas Carybé e Pedro Correia de Araújoe envolvido por jar-dins, passarelas e espe-lhos d’água. Interna-mente, as paredes dotérreo e segundo pavi-mento são revestidaspor gigantescos pai-néis entalhados emmadeira pelos artistasplásticos Ernâni Ma-cedo e Roberto Sá e, noterceiro pavimento,

um mosaico em vidro de Freda Jardim.O espaço foi criado em 1987 e é compos-to pelo Teatro Nélson Rodrigues – consi-derado um dos melhores palcos do Paíspara teatro e dança –, a Grande Galeria ea Minigaleria para exposições temporári-as, e também por um restaurante. Lotação:388 lugares, dois deles para cadeirantes.

Ostentando uma maravilhosa arqui-tetura moderna, é inaugurado em 29 dejunho de 2006, o espaço da Caixa Cul-tural no Rio de Janeiro, na Avenida Al-mirante Barroso, 25 (Estação Metrô).Situado no coração do centro da cidade,junto a importantes instituições públi-cas, como a Biblioteca Nacional, o Mu-seu Nacional de Belas-Artes, o TeatroMunicipal e a Câmara Municipal.

O espaço abriga em seus mais de 6.000metros quadrados um teatro de arena,dois cinemas, três galerias de arte, alémde salas de oficinas e ensaios. O Teatro deArena tem 226 assentos – sendo quatropara cadeirantes. Os novos e modernoscinemas dispõem de sistema de somDolby, e projetores 35mm e 16mm na salaCine 1, que possui 83 lugares, e projetordigital na sala Cine 2, de 85 lugares. Asgalerias 2 e 3 estão aptas a receber expo-sições de grande porte, atendendo a to-das as exigências internacionais de segu-rança, luminosidade e climatização.

Regina Ramos, gerente da Caixa Cul-tural, tem um imenso desafio a cada dia:gerir, com qualidade e competência, umdos grandes patrimônios culturais do

Rio e, por que não, doBrasil. Ela gosta doseu trabalho.

“A Caixa Culturalcresce a cada ano. E porquê? Por entregarmossempre ao públicoeventos de primeiragrandeza. E pensamossempre na arte e na cul-tura, seja de que seg-mento forem, desde o

ESPECIAL CENTROS CULTURAIS, UMA FEBRE NO RIO

Casa França-Brasil

CaixaCultural

FUNCIONAMENTOUnidade ChileDe terça a sexta, das 10h às 18hSábado, domingo e feriado, das 14h às 18hAvenida Chile, 230, Centro.Tel: (21) 2262-8152/ 5483/ 2240-7055

Unidade BarrosoDe terça a sábado, das 10h às 22hDomingo, das 10h às 21h.Avenida Almirante Barroso, 25, CentroTel: (21) 2262-5483

E-mail: [email protected]: www.caixa.gov.br

FUNCIONAMENTODe terça a domingo, das 10h às 20hRua Visconde de Itaboraí, 78 - CentroTel: (21) 2253-5366Site: www.fcfb.rj.gov.br

Os centros culturais do Rio destacam-se pela programação e também pela beleza das edificações onde funcionam, como a Casa França-Brasil, projetada pelo arquiteto francês Grandjean de Montigny na segunda década do século XIX por determinação de Dom João VI.

ASC

OM

-RIO

TUR

5Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

hip-hop, passando pelo samba e termi-nando no rock, basta que seja bom. Nãoconcordo quando se diz que o povo nãogosta de cultura. Gosta sim, é só lhe se-rem oferecidos programas de qualidade.Na Caixa Cultural pensamos sempre emfazer eventos que facilitem a presença dopúblico, seja com os horários acessíveisou com programas diferenciados.”

“A Caixa disponibiliza recursos daordem de R$ 50 milhões para Rio, São

O prédio tem um conjunto de carac-terísticas arquitetônicas que o fazemúnico no Brasil. Tombado pela Prefeitu-ra da Cidade do Rio de Janeiro, foi clas-sificado como de interesse nacional peloInstituto do Patrimônio Histórico e Ar-tístico Nacional (Iphan). Uma de suascaracterísticas marcantes é a estruturametálica, que, assim como os principaiselementos do prédio, foi importada dosEstados Unidos. Vencendo grandes vãose deixada aparente, determinou um con-ceito arquitetônico e administrativo pou-co usual para a época. O projeto era assi-nado pelo engenheiro norte-americano etambém presidente da empresa, FrederickStark Pearson (1861-1914). O edifício foiinaugurado em dia 13 de abril de 1912.

A fachada principal, responsável pelanobreza externa do prédio e um colíriopara os olhos, foi inteiramente fabrica-da nos Estados Unidos e trazida para oRio, onde as peças, previamente nume-radas, foram montadas. Numa volta notempo, podemos ver os bondes entran-do pelo vão central do térreo, atravessan-do o prédio e estacionando no pátio, sobgalpões. Os funcionários e visitantes, porsua vez, entrando pela porta da esquer-da. Pela entrada da direita chegavam osconsumidores, que faziam seus paga-mentos em guichês de bronze, que já nãoexistem. Uma tradição interrompida nadécada de 1980, mas retomada em 1990.

Em 1994, com o objetivo de difundira cultura e a informação entre a histó-ria do Rio de Janeiro e a da companhia,nasce o Centro Cultural Light (CCL),que teve um período de grande eferves-cência cultural até 1999, retomado compleno vigor a partir de 2006. As ativida-des do Centro Cultural Light reforçama ligação histórica da Light com a cultura.Além de ter sua presença no imagináriocarioca traduzida em marchinhas carna-valescas e outras músicas populares (Seucondutor, blim, blim/Seu condutor, blim,blim/Pára o bonde pra descer o meuamor), a companhia teve entre seus em-pregados vários artistas consagrados.Com vocação para a formação de platéi-as e integrado à sede da empresa, o Cen-tro Cultural Light promove atividadesdirigidas a estudantes das escolas públi-cas e privadas da cidade, além de apre-sentações musicais e de teatro, exposi-ções e eventos temáticos.

A Light possui em seu acervo icono-gráfico cerca de 18.000 imagens fotográ-ficas diferentes, distribuídas entre nega-tivos e papel, de autoria do fotógrafoAugusto Malta, contratado da empresa.As fotos, que não têm preço pelo seuvalor histórico, contam praticamentetoda a história de transformação do Rio,de uma cidade bucólica para uma gran-de metrópole. Delas, cerca de 1.500 sãonegativos de vidro e 2.680 em acetato.

As quase 14.000 fotografias restantes sãoreproduções em papel. Há ainda apro-ximadamente 10.000 documentos escri-tos, um catálogo contendo desenhos depostes antigos e sua distribuição nas ruasda cidade, além de uma coleção completada Revista Light, com 136 números, de1928 a 1940, na qual colaboraram nomescomo J. Carlos e Di Cavalcânti.

CCCCCENTROENTROENTROENTROENTRO C C C C CULULULULULTURALTURALTURALTURALTURAL L L L L LIGHTIGHTIGHTIGHTIGHT P P P P PARAARAARAARAARA E E E E ESSSSS-----TUDTUDTUDTUDTUDANTESANTESANTESANTESANTES - Visita monitorada por es-tagiários, que cobre um circuito comtrês horas e meia de duração. Os espa-ços que integram o circuito são: Plane-ta Energia, Sala Memória, Espaço doBonde, Caminhão Elétrico, Maquete daCidade de São João Marcos, Espaço DiCavalcânti e Praça Negrão de Lima (Pá-tio das Energias). Até agosto o progra-ma recebeu a visita de aproximadamen-te 4 mil estudantes.

MMMMMÚSICÚSICÚSICÚSICÚSICAAAAA NONONONONO M M M M MUSEUUSEUUSEUUSEUUSEU - Projeto musi-cal cujo objetivo é formar platéias e re-novar o público da música erudita bra-sileira. O projeto realiza mais de 500apresentações por ano, quase todos osdias da semana, em museus, igrejas, ins-tituições culturais e outros espaços. Noteatro do Centro Cultural Light, as apre-sentações ocorrem toda primeira sexta-feira de cada mês e o evento é aberto aopúblico.

CCCCCHOROHOROHOROHOROHORO A A A A APERITIVPERITIVPERITIVPERITIVPERITIVOOOOO – Apresentaçõesdo cavaquinista Ronaldinho do Cavaqui-nho. O projeto começa em março de2011, porém no dia 6 de dezembro de2010 haverá uma apresentação no CCL,a qual já está incluída no projeto itine-rante do artista.

TTTTTERÇASERÇASERÇASERÇASERÇAS M M M M MUSICUSICUSICUSICUSICAISAISAISAISAIS - Projeto musicalque resgata a vida e a obra de persona-gens que criaram tendências e ajudarama construir parte da história musical con-temporânea do Brasil. Realizado emparceria com a Sociedade Viva Cazuza!Até agosto de 2010 foram realizadas 11apresentações de artistas renomados,como The Fevers,Wanderley Cardoso,Renato e seus BlueCaps, Jerry Adriani,entre outros.

NNNNNOELOELOELOELOEL R R R R ROSAOSAOSAOSAOSA EEEEE OOOOO F F F F FEITIÇOEITIÇOEITIÇOEITIÇOEITIÇO DODODODODO S S S S SAMBAAMBAAMBAAMBAAMBA– O projeto, iniciado no mês de setem-bro, celebra o centenário de Noel Rosa(1910/2010) com uma série de espetácu-los musicais, que reunirão duas geraçõesde sambistas, interpretando os maioressucessos do Poeta da Vila. Nélson Sar-gento, Galocantô, Marcos Sacramento,Nilze de Carvalho, Batuque de Cozinhae a Velha Guarda da Vila Isabel são algunsdos nomes que se apresentarão até de-zembro.

MPB 12:30 MPB 12:30 MPB 12:30 MPB 12:30 MPB 12:30 EMEMEMEMEM P P P P PONTOONTOONTOONTOONTO - Projeto mu-sical, pelo qual são realizados shows,sempre às 12h30min no Teatro do CCL,com artistas consagrados da mpb. Vi-sitantes, empregados e público em ge-ral presenciam as apresentações. Nes-te ano o projeto começou neste mês desetembro. Zezé Motta, DNA do Sam-ba, Dicró, Noca da Portela, Nilze Car-valho e Monarco se apresentarão a par-tir de outubro.

BBBBBOTEQUIMOTEQUIMOTEQUIMOTEQUIMOTEQUIM DDDDDAAAAA R R R R RUUUUUAAAAA L L L L LARGARGARGARGARGAAAAA - Projetomusical que apresenta o grupo de sam-ba Botequim da Rua Larga, formado porfuncionários da Light. Toda a receita deingressos e da venda de alimentos e be-bidas durante o evento é destinada aoPrograma Light Voluntária, que a repassaaos projetos que possuem parceria como Programa. O evento é aberto ao públi-co. O início do projeto foi programadopara fim do mês de setembro e contem-plará uma apresentação por mês, duran-te seis meses.

3º C3º C3º C3º C3º CONCURSOONCURSOONCURSOONCURSOONCURSO DEDEDEDEDE S S S S SAMBAAMBAAMBAAMBAAMBA DEDEDEDEDE Q Q Q Q QUUUUUAAAAA-----DRADRADRADRADRA – Carnaval de todos os tempos -Com produção de Haroldo Costa e PauloRoberto Direito, o concurso visa ao res-gate do samba de quadra, incentivandonão apenas compositores experientes,mas também os jovens que se mostremmais interessados no gênero. Neste anoas inscrições acontecerão no período de15 de setembro a 15 de outubro e a finalestá prevista para 17 de fevereiro de

2011, com show docantor Diogo Noguei-ra. No ano passado, oConcurso recebeu qua-se 1.000 inscrições.

FUNCIONAMENTODe terça a sexta-feira, das 11h às 17h.Avenida Marechal Floriano, 168 - CentroTel: (21) 2211-7268/ 7529Site: www.light.com.br

Centro Cultural Light

Paulo, Curitiba, Belo Horizonte e Sal-vador e creio que é o suficiente para sefazer bons eventos. Aqui no Rio temosum espaço de seis mil metros quadra-dos onde mostramos espetáculos dedança, exposições, música, pintura,artes plásticas, e ainda analisamos mi-lhares de projetos a cada ano, para se-lecionar os melhores, com a única inten-ção de oferecer o belo ao público amanteda arte.”

��������������

Prestes a completar 100 anos (foi inaugurado em 1912), o prédio do Centro CulturalLight impressiona pela fachada nobre, fabricada totalmente nos Estados Unidos.

Um dos mais novos centros culturais do Rio foi instalado pela Caixa Econômica Federalnuma edificação de linhas modernas situada no ponto mais central da cidade.

DIVULGAÇÃO

DIVU

LGA

ÇÃ

O

6 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

O edifício do Centro Cultural Justi-ça Federal-CCJF foi projetado pelo arqui-teto sevilhano Adolpho Morales de LosRios, sendo um dos mais belos exempla-res da arquitetura eclética, em voga noBrasil do início do século XX. A constru-ção, iniciada em 1905, destinava-se àMitra Arquiepiscopal do Rio de Janeiro.Adquirida pelo Governo Federal, tor-nou-se sede do Supremo Tribunal Fede-ral de 1909 a 1960. Com a mudança doSTF para Brasília, o prédio foi ocupado,

sucessivamente, por varas de FazendaPública e pela Justiça Federal.

Na fachada, predominam elementosdo classicismo francês. As portas, ricasem detalhes referentes à Justiça, foramtalhadas pelo artista português Mano-el Ferreira Tunes. A escadaria em már-more de Carrara e ferro trabalhado re-vela o gosto art nouveau. As janelas re-tangulares lembram as góticas e as ba-laustradas remetem ao RenascimentoFrancês. A Sala de Sessões, o espaço mais

O imóvel onde funciona o CentroCultural Correios foi inaugurado em1922. As linhas arquitetônicas da fa-chada, em estilo eclético, caracterizamo prédio do início do século, constru-ído para sediar uma escola do LloydBrasileiro. Mas isto não ocorreu e oedifício acabou sendo utilizado, pormais de 50 anos, para funcionamentode unidades administrativas e opera-cionais dos Correios. Na década de 80o prédio foi desativado para reformas,sendo reaberto em 2 de junho de 1992,parcialmente restaurado, para recebera Exposição Ecológica 92. A inauguraçãooficial aconteceu em agosto do ano se-guinte, com a Exposição Mundial deFilatelia - Brasiliana 93.

O edifício, de 3.480 metros quadra-dos, é dotado de três pavimentos inter-ligados por um elevador, também doinício do século (comcharmosas portas pan-tográficas), de onde sepode ter uma visão pa-norâmica de todo oambiente interno. No

Centro Cultural Justiça Federal

FUNCIONAMENTODe terça a domingo, das 12h às 19h.Avenida Rio Branco, 241 - CentroTel: (21) 3261 2582E-mail: [email protected]: www.ccjf.trf2.gov.br

Centro Cultural Correios��������������

suntuoso do edifício, conserva o assoa-lho original de peroba e pau-roxo. Pos-sui belíssimos vitrais confeccionadospela Casa Conrado Sogenith, de SãoPaulo. No teto há dois painéis pintadospor Rodolfo Amoedo, um dos mais con-sagrados artistas da sua geração.

Durante um arrojado plano de refor-mas surgiu o teatro na antiga garagemsob o Salão Nobre, sendo refeitos ain-da as maravilhosas clarabóias, os vitraise a cinematográfica e imponente esca-daria principal das décadas de 30 e 40.Para quem entra no prédio, é significa-tiva e surpreendente a visão do conjun-to formado pelas escadarias, os vitraise a clarabóia; muitos dizem que somen-te esse cenário já justificaria uma visi-ta ao local. O conjunto foi reaberto nodia 4 de abril de 2001 como CentroCultural Justiça Federal. Atualmente, oCCJF dispõe de 14 amplas salas de ex-posições, teatro, biblioteca, lojinha e ca-feteria. Há ainda uma sala destinada àinstalação de um cinema.

Aberta ao públi-co desde março de2004, o acervo daBiblioteca do CCL,especializado nasdiversas áreas das

artes e da cultura, é formado por três co-leções: Coleção Bibliográfica: livros, ca-tálogos artísticos, folhetos, obras de re-ferência e revistas especializadas; Cole-ção Iconográfica: material audiovisuale fotografias; Coleção Acervo Documen-tal Histórico da Justiça Federal: variadosdocumentos impressos que versam so-bre a criação, a História e a composiçãoda Justiça Federal, principalmente sobreo Tribunal Regional Federal da 2ª Região.

andar térreo está localizado o teatrocom 320 metros quadrados e capacida-de para 200 pessoas. O segundo e o ter-ceiro pavimentos têm dez salas de ex-posições. Ao fundo da Galeria de Artefica a Agência JK, que oferece servi-ços de correios e de conveniência, comfuncionamento de terça-feira a domin-go, do meio-dia às 19 horas. O CentroCultural dispõe também de um bistrô,que funciona durante a realização doseventos.

Os Correios, em média, recebem umpúblico anual de 400 mil visitantes epromove cerca de 50 eventos, com atra-ções variadas de teatro, música, dan-ça, cinema e vídeo, além das exposiçõesde diversos tipos de arte. Charmosa étambém a Praça dos Correios, uma áreaaproximada de 1,3 mil metros quadra-dos ao ar livre, com espelho d’água e

tudo. Há ainda supor-te de uma conchaacústica, que pode re-ceber um público nu-meroso para eventos acéu aberto.

FUNCIONAMENTODe terça-feira a domingo, das 12 às 19hRua Visconde de Itaboraí, 20 - CentroTelefones: (21)2253-1580/1570/1545E-mail: [email protected]: www.correios.com.br

Erguido num terreno de quina, o edifício do Centro Cultural Correios foi inaugurado em1922, para abrigar uma escola do Lloyd Brasileiro. Seu teatro tem 200 lugares.

Antiga sede do Supremo Tribunal Federal, na Avenida Rio Branco, a edificação do Centro Cultural Justiça Federal foi restaurada comrequinte de precisão, que devolveu a majestade aos seus espaços interiores, como o plenário, onde atuou, entre outros tribunos, Rui Barbosa.

FRAN

CISC

O U

CH

A

DIVU

LGA

ÇÃ

O

7Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

O Centro Cultural Banco do Brasilocupa o histórico nº 66 da Rua Primei-ro de Março, prédio de linhas neoclás-sicas que desde o século XIX esteve li-gado às finanças e aos negócios. Sua pe-dra fundamental foi lançada em 1880,materializando projeto de Francisco Jo-aquim Bethencourt da Silva (1831-1912),arquiteto da Casa Imperial, fundador daSociedade Propagadora das Belas-Artes edo Liceu de Artes e Ofícios.

Inaugurado como sede da AssociaçãoComercial, em 1906, a suntuosa rotun-da abrigava o pregão da Bolsa de FundosPúblicos. Na década de 1920, passou apertencer ao Banco do Brasil, que o re-formou para abertura de sua grandiosasede. Com isso, o banco passou a ter o

edifício mais emblemático e refinado domundo financeiro nacional, status queduraria até 1960, quando cedeu lugar àAgência Centro do Rio de Janeiro e de-pois à Agência Primeiro de Março, ain-da em funcionamento.

No final da década de 80, resgatandoo valor simbólico e arquitetônico do pré-dio, o Banco do Brasil decidiu pela sua pre-servação ao transformá-lo em um centrocultural. O projeto de adaptação preser-vou o requinte das colunas, dos ornamen-tos, do mármore que sobe do foyer pelasescadarias, e retrabalhou a cúpula sobrea rotunda. Inaugurado em 12 de outubrode 1989, logo transformou-se em pólomultimídia e fórum de debates. Com 17mil metros quadrados, o CCBB-RJ inte-gra muitos espaços num só, onde a arteestá permanentemente em cartaz. É atu-almente a principal sede de eventos cul-turais de variedade natureza do Rio.

Criada em 1931, a antiga Biblioteca doBanco do Brasil, originalmente voltadapara assuntos mais técnicos, é hoje umaimportante fonte de consulta nas áreasde Artes, Ciências Sociais, Filosofia e Li-teratura, com acervo de mais de 125 miltítulos informatizado, atualizado e peri-odicamente higienizado por uma equipeda APAE-Niterói. Pela importância estru-tural e pelo acervo, constitui uma das maisimportantes Bibliotecas do País.

Seus 2.200 metros quadrados abrigamum salão de leitura para 100 pessoas, trêssalas para a coleção geral, uma sala dereferências com enciclopédias e dicioná-rios, uma sala de literatura infanto-ju-venil com mais de dois mil títulos, umasala de multimídia, além de salas espe-

Centro Cultural Banco do Brasil

A SEREIAZINHA - CIA PEQUOD DE TEATRO DEANIMAÇÃOApresentação da sua mais nova criação: aadaptação do conto de Hans ChristianAndersen, com marionetes aquáticasembaladas pelas canções de mar de DorivalCaymmi (até 12 de outubro)

FRAGMENTOS DO DESEJO - CIA. DOS A DEUXA companhia franco-brasileira volta ao CCBBRio nesta aprofundada pesquisa cênica queexplora os fragmentos de vida de quatropersonagens (até 24 de outubro)

ÓPERA DOS VIVOS - CIA. DO LATÃOTraça um amplo painel de personagensligadas ao meio cultural, em épocas distintas,dos anos 60 aos dias de hoje. Cada atoprioriza uma linguagem: teatro, cinema,música e televisão (até 7 de novembro).

GALERIA DE VALORESA mostra cria um espaço interativo que contaa História da moeda, no Brasil e no mundo(permanente).

ICONOGRAFIA DE DOM JOÃO VIA mostra é composta por quadros a óleo,gravuras e objetos diversos que compõem umnovo espaço expositivo no corredor do quartoandar do CCBB (permanente).

O BANCO DO BRASIL E SUA HISTÓRIAA exposição, composta por peças do acervodo Museu e do Arquivo Histórico, conta aHistória do Banco do Brasil (permanente).

ACORDES DO RÁDIO: 90 ANOS DO VIOLÃOBRASILEIROA série enfoca a música brasileira de violão ea maneira como foi sendo difundida pelorádio ao longo do século XX até os dias atuais.Os espetáculos reunem alguns dos maisimportantes violonistas da atualidade ecantoras da nova geração da mpb (até 16 denovembro)

ONOMATOPÉIA NÃO É PALAVRÃOSérie de cinco shows, apresentados porHermínio Bello de Carvalho, com repertóriode música popular e instrumental brasileiraonde a onomatopéia, recurso de imitação desons por meio de vocábulos sonoros presentenas letras e arranjos instrumentais é valorizada(até 30 de novembro)

DE LUDOVICO GIUSTINI A PHILIP GLASSTRÊS SÉCULOS DE PIANOO evento apresenta, em oito concertos – soba responsabilidade de renomados artistas – aevolução e o desenvolvimento da técnicapianística, desde as primeiras obras escritaspara “fortepiano” até peças que representamas atuais vertentes da música no século XXI(até 21 de dezembro)

DESTAQUES DAPROGRAMAÇÃO

ciais: Salas de Edições Especiais e ObrasRaras, Sala Mozart de Araújo e Sala JoséGuilherme Merquior.

Para utilizá-la, é preciso prévio cadas-tramento em biblioteca conveniada (aABI é uma das conveniadas) com apre-sentação de autorização do bibliotecá-rio responsável. Têm direito funcioná-rios do Banco do Brasil e seus dependen-tes. Existe ainda empréstimo median-te cadastramento (ficha preenchida nobalcão da biblioteca). Funciona de ter-ça-feira a domingo, das 9h às 21h, no 5ºandar. Demais Informações podem serobtidas pelo telefone: (21) 3808-2030,de segunda a domingo,das 9h às 20h30.

O Gerente do CCBB,Marcos Mantoan, diz queo Centro mudou o modo

de se olhar cultura, nãosomente no Rio de Janei-ro, mas no Brasil.

“Sem dúvida nenhu-ma, demos início a umprocesso que se propa-gou pelo País, isto por-que o Centro CulturalBanco do Brasil foi a pri-meira entidade dessemolde entre nós. Bastacitar como exemplo estepedaço da cidade; quan-do nos instalamos aquinão havia nada e hoje éum belíssimo e impor-tante corredor cultural,formado pelos Correios,a Casa França-Brasil, oArco do Teles e todo esseacervo patrimonial, bemcuidado e preservado.Uma área que virou pólogastronômico e point de

todo mundo, principalmente de turistasestrangeiros, encantados com o lugar.”

“Isso muito nos orgulha. No ano pas-sado recebemos 2 milhões e meio de vi-sitantes e para este ano temos uma ver-ba do Banco do Brasil de R$ 25 milhõespara investimento em nossa grade cul-tural, como exposições, cinema, músi-ca, teatro, palestras etc. Procuramos darênfase a exposições históricas como ada Anita Malfati e a Expedição Langs-dorff. Acreditamos que a cultura devaser democratizada, com acesso a todasas classes sociais, especialmente juntoaos estudantes. Para isso, dispomos de um

serviço de transporte,que busca e leva alunosde regiões distantes paraconhecer nosso acervo enossos eventos.”

FUNCIONAMENTODe terça a domingo, das 10h às 21hRua Primeiro de Março, 66 - CentroTel: (21) 3808-2020/ 2101Site: www.bb.com.br/cultura

Com um pé-direito monumental (foto ao alto) e uma fachada ampla e imponente, a antiga matriz do Banco do Brasil passou a sediardesde o final dos anos 80 do século passado aquele que se tornaria o maior, o mais dinâmico e o mais freqüentado centro cultural do Rio.

ANA C

OLLA

DIVU

LGA

ÇÃ

O

8 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

Considerada pela Unesco uma dasdez maiores bibliotecas nacionais domundo, é também a maior da AméricaLatina. O núcleo original de seu pode-roso acervo, calculado hoje em cerca denove milhões de itens, é a antiga livra-ria de Dom José, organizada sob a ins-piração de Diogo Barbosa Machado,abade de Santo Adrião de Sever, parasubstituir a Livraria Real, cuja origemremontava às coleções de livros de DomJoão I e de seu filho Dom Duarte, con-sumida pelo incêndio que se seguiu aoterremoto de Lisboa, em 1º de novem-bro de 1755.

O início do itinerário da Real Biblio-teca no Brasil está ligado a um dos maisdecisivos momentos da História do País:a transferência da Rainha Dona MariaI, de Dom João, Príncipe Regente, detoda a Família Real e da Corte Portuguesapara o Rio de Janeiro, quando da inva-são de Portugal, em 1808. O acervo tra-zido para o Brasil, de 60 mil peças, en-tre livros, manuscritos, mapas, estam-pas, moedas e medalhas, foi inicialmenteacomodado numa das salas do Hospitaldo Convento da Ordem Terceira doCarmo, na Rua Direita, hoje Rua Primei-ro de Março.

A data de 29 de outubro de 1810 éconsiderada oficialmente como a dafundação da Real Biblioteca, que, noentanto, só foi franqueada ao público em1814. Quando, em 1821, a Família Realregressou a Portugal, Dom João VI levoude volta grande parte dos manuscritosdo acervo. Depois da proclamação daindependência, a aquisição da Bibliote-ca Real pelo Brasil foi regulada mediantea Convenção Adicional ao Tratado dePaz e Amizade, celebrado entre o Brasile Portugal em 29 de agosto de 1825.

O prédio atual da Fundação BibliotecaNacional teve sua pedra fundamentallançada em 15 de agosto de 1905 e foiinaugurado cinco anos depois, em 29 deoutubro de 1910. O projeto é do arqui-teto General Francisco Marcelino deSousa Aguiar. Integrado à arquitetura darecém-aberta Avenida Central, hojeAvenida Rio Branco, o prédio é de esti-lo eclético, em que se misturam elemen-tos neoclássicos. Em 1990 a BibliotecaNacional passou a constituir a FundaçãoBiblioteca Nacional-FBN, que possuiainda um Escritório de Direitos Autoraispara registro e averbação de direitos deautor e também é a Agência Nacional doISBN (International Standard BookNumber).

PRINCIPAIS COLEÇÕES

CCCCCOLEÇÃOOLEÇÃOOLEÇÃOOLEÇÃOOLEÇÃO C C C C CONDEONDEONDEONDEONDE DDDDDAAAAA B B B B BARCARCARCARCARCAAAAA OUOUOUOUOU C C C C COOOOO-----LEÇÃOLEÇÃOLEÇÃOLEÇÃOLEÇÃO A A A A ARARARARARAUJENSEUJENSEUJENSEUJENSEUJENSE - Adquirida em lei-lão em 1819. É constituída de 2.365 obrasem 6.329 volumes, em sua maior partedos séculos XVIII e XVII. Pertence a essacoleção o conjunto de estampas LeGrand Théâtre de l’Univers, reunido em125 grandes volume.

CCCCCOLEÇÃOOLEÇÃOOLEÇÃOOLEÇÃOOLEÇÃO D D D D DEEEEE A A A A ANGELISNGELISNGELISNGELISNGELIS - Adquiridaem 1853 a Pedro de Angelis, político e bi-

bliófilo napolitano, naturalizado argen-tino. Possui 1.717 obras em 2.747 volu-mes e 1.295 manuscritos. É do maior in-teresse para a História da Província Je-suítica do Paraguai e das questões de li-mites na região do Prata.

CCCCCOLEÇÃOOLEÇÃOOLEÇÃOOLEÇÃOOLEÇÃO T T T T THEREZAHEREZAHEREZAHEREZAHEREZA C C C C CHRISTINAHRISTINAHRISTINAHRISTINAHRISTINAMMMMMARIAARIAARIAARIAARIA - Doada em 1891 pelo ex-Impe-rador D. Pedro II com o desejo expres-so de que conservasse o nome da Impe-ratriz. É composta de 48.236 volumesencadernados e inúmeras brochuras,sem contar folhetos avulsos, fascículosde várias revistas literárias e científicas,estampas, fotografias, partituras musi-cais e mais de mil mapas geográficos im-pressos e manuscritos. Dão cunho es-pecial a essa importante coleção, amaior recebida pela biblioteca em todosos tempos, as numerosas dedicatóriasautografadas dos autores ao Imperadore à Imperatriz.

AAAAARQUIVRQUIVRQUIVRQUIVRQUIVOOOOO DDDDDAAAAA C C C C CASAASAASAASAASA DOSDOSDOSDOSDOS C C C C CONTOSONTOSONTOSONTOSONTOS -Com cerca de 50.000 documentos emuitos códices, a coleção é provenien-te da antiga Casa dos Contos de OuroPreto e se completa com duas outras damesma procedência que se encontramuma no Arquivo Nacional e outra noArquivo Público de Minas Gerais. Com-preende documentos da administraçãode Minas nos séculos XVIII e XIX, comprecioso material para o estudo da His-tória da mineração, quintos, contraban-do de ouro e diamantes, bandeiras e daInconfidência Mineira.

MANUSCRITOS

EEEEEVVVVVANGELIÁRIOANGELIÁRIOANGELIÁRIOANGELIÁRIOANGELIÁRIO - S - S - S - S - SÉCULOÉCULOÉCULOÉCULOÉCULO XI- XI- XI- XI- XI-XIIXIIXIIXIIXII –Exemplar em pergaminho com textos,em grego, dos quatro evangelhos. Letrasemi-uncial. É o mais antigo manuscri-to da Biblioteca Nacional.

LLLLLIVROIVROIVROIVROIVRO DEDEDEDEDE H H H H HORASORASORASORASORAS - S - S - S - S - SÉCULOÉCULOÉCULOÉCULOÉCULO XV XV XV XV XV – Per-gaminho em latim com letras góticas.Iniciais decoradas a ouro e cores. Con-tém treze miniaturas de página inteirae quatro menores, algumas com vistasdo Louvre e de Montmartre. Encaderna-ção do século XVI, em couro, com mo-tivos geométricos ornamentando asduas capas. Calendário em francês.

IMPRESSOS

BBBBBÍBLIAÍBLIAÍBLIAÍBLIAÍBLIA DEDEDEDEDE M M M M MOGÚNCIAOGÚNCIAOGÚNCIAOGÚNCIAOGÚNCIA (B (B (B (B (BÍBLIAÍBLIAÍBLIAÍBLIAÍBLIA L L L L LAAAAATINATINATINATINATINA)))))- Johann Fust e Peter Schoeffer, «in vigí-lia assumpcõis gl’ose virginis Marie», 14de agosto de 1462, 2v - A Biblioteca Na-cional possui dois exemplares. A Bí-blia de Mogúncia é o primeiro impres-so que contém data, lugar de impressãoe nome do impressor no colofão. Perga-minho, com letras capitais feitas a mãocom tinta azul e vermelha.

OOOOOSSSSS L L L L LUSÍADUSÍADUSÍADUSÍADUSÍADASASASASAS – de Luís de Camões,Lisboa, 1572, com a data de 1572 exis-tem duas edições de Os Lusíadas. Numadelas o 7º verso da primeira estância doCanto I é «Entre gente remota edifica-ram»; em outra, considerada realmentea primeira, o verso é «E entre gente re-mota edificaram». A Biblioteca Nacional

possui a edição chamada Edição E e, ouseja a primeira das duas de 1572.

CCCCCORREIOORREIOORREIOORREIOORREIO B B B B BRAZILIENSERAZILIENSERAZILIENSERAZILIENSERAZILIENSE, , , , , PRIMEIROPRIMEIROPRIMEIROPRIMEIROPRIMEIROJORNALJORNALJORNALJORNALJORNAL BRASILEIROBRASILEIROBRASILEIROBRASILEIROBRASILEIRO – Publicado em Lon-dres de 1808 a 1822 por Hipólito José daCosta. Defendia a união monárquico-constitucional do Império Luso-Brasilei-ro, só aderindo à Independência em ju-lho de 1822. Combatia a opressão, a cor-rupção e a ignorância. É uma fonte paraestudos históricos, políticos, sociais eco-nômicos e literários.

MMMMMESSIAHESSIAHESSIAHESSIAHESSIAH ANANANANAN ORAORAORAORAORATORIOTORIOTORIOTORIOTORIO INININININ SCORESSCORESSCORESSCORESSCORESASASASASAS ITITITITIT WWWWWASASASASAS ORIGINALLORIGINALLORIGINALLORIGINALLORIGINALLYYYYY PERFORPERFORPERFORPERFORPERFOR’’’’’DDDDD DEDEDEDEDEHHHHHANDELANDELANDELANDELANDEL - Exemplar da primeira ediçãodo Messias, de Haendel, publicada emLondres em meados do século XVIII.

IIIIILLLLL DISSOLDISSOLDISSOLDISSOLDISSOLUTOUTOUTOUTOUTO PUNTOPUNTOPUNTOPUNTOPUNTO OOOOO SIASIASIASIASIA D D D D DONONONONON G G G G GIIIII-----OOOOOVVVVVANNANNANNANNANN, , , , , DEDEDEDEDE M M M M MOZAROZAROZAROZAROZARTTTTT - Exemplar da pri-meira edição da famosa ópera publica-da em Leipzig, em 1801.

PPPPPARARARARARTITURASTITURASTITURASTITURASTITURAS ORIGINAISORIGINAISORIGINAISORIGINAISORIGINAIS DDDDDASASASASAS ÓPERASÓPERASÓPERASÓPERASÓPERASDEDEDEDEDE C C C C CARLOSARLOSARLOSARLOSARLOS G G G G GOMESOMESOMESOMESOMES - O Guarani, Fosca,Maria Tudor, Salvador Rosa.

EXPOSIÇÃO JORNAL DOBRASIL: DO PAPEL AO DIGITAL

Desde 1º de setembro, a BibliotecaNacional realiza a exposição Jornal doBrasil: Do Papel ao Digital. Coincidindocom a data em que o JB passa a ser pu-

blicado somente na internet, a mostratraz edições históricas dos quase 120anos do diário impresso, incluindo aprimeira, de 9 de abril de 1891, e a últi-ma. Lá estão notícias de eventos comoa morte de Dom Pedro II, a inauguraçãodo Cristo Redentor e a queda do Murode Berlim, além de marcos editoriais dojornal, como a criação do Caderno B, oprimeiro caderno de cultura da imprensabrasileira. Não ficou de fora a capa maiscélebre do JB, quando, ao anunciar aimplementação do AI-5 pela ditaduramilitar, é publicada uma previsão detempo “sufocante, tendendo a tempes-tades”, analogia crítica à tensão políti-ca em 1968.

Promovida pela Coordenadoria dePublicações Seriadas, além de fornecerum panorama sobre a História de um dosperiódicos mais importantes da impren-sa nacional, a exposição propõe umareflexão sobre o futuro do jornalismoimpresso após a popularização da inter-net. A exposição irá até outubro no halldo segundo andar na Avenida Rio Bran-co, 219, com entrada franca.

O Professor Muniz Sodré, Presiden-te da Fundação Biblioteca Nacional,destaca a importância da entidade: “ABiblioteca Nacional é fundamental nãoapenas por oferecer serviços a leitores

Fundação Biblioteca Nacional

ESPECIAL CENTROS CULTURAIS, UMA FEBRE NO RIO

Admirável por seu acervo, com 9 milhões de itens, e também por sua arquitetura, aBiblioteca Nacional ocupa uma edificação que vai fazer 100 anos agora em outubro.

LUC

IANA W

HITAKER/FO

LHAPR

ESS

9Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

No fim do século XIX, Afonso CelsoJúnior, ainda no Império, e Medeiros eAlbuquerque, já na República, manifes-taram votos por uma academia nacional,como a Academia Francesa. Depois demuita negociação e espera, inclusive coma recusa de participação do Estado, comohavia proposto Lúcio de Mendonça, aprimeira sessão foi realizada no dia 15de dezembro, às três da tarde, na sala deRedação da Revista Brasileira, Travessado Ouvidor, nº 31, centro do Rio de Ja-neiro, sendo logo aclamado PresidenteMachado de Assis.

A 28 de janeiro do ano seguinte, seriaa sétima e última sessão preparatória. Nelaestavam presentes, instalando a Academia:Araripe Júnior, Artur Azevedo, Graça Ara-nha, Guimarães Passos, Inglês de Sousa,Joaquim Nabuco, José Veríssimo, Lúcio deMendonça, Machado de Assis, Medeirose Albuquerque, Olavo Bilac, Pedro Rabe-lo, Rodrigo Otávio, Silva Ramos, Teixei-ra de Melo, Visconde de Taunay. TambémCoelho Neto, Filinto de Almeida, José doPatrocínio, Luís Murat e Valentim Maga-lhães, que haviam comparecido às sessõesanteriores, e ainda Afonso Celso Júnior, Al-berto de Oliveira, Alcindo Guanabara, Car-los de Laet, Garcia Redondo, Conselhei-ro Pereira da Silva, Rui Barbosa, SílvioRomero e Urbano Duarte, que aceitaramo convite e a honra.

Eram trinta membros, mas seriamnecessários quarenta, como na Acade-mia Francesa. Foi o que fizeram os de-zesseis presentes à sessão, elegendo osdez seguintes: Aluísio Azevedo, Barão deLoreto, Clóvis Bevilacqua, Domício daGama, Eduardo Prado, Luís GuimarãesJúnior, Magalhães de Azeredo, OliveiraLima, Raimundo Correia e Salvador deMendonça. Os Estatutos são assinadospor Machado de Assis, Presidente; Joa-quim Nabuco, Secretário-Geral; RodrigoOtávio, 1º Secretário; Silva Ramos, 2ºSecretário; e Inglês de Sousa, Tesoureiro.

A 20 de julho de 1897, numa sala doPedagogium, na Rua do Passeio, realizou-se a sessão inaugural, à qual comparece-ram dezesseis acadêmicos. O Presiden-te Machado de Assis, emocionado, fezum discurso preliminar. Rodrigo Otávio,1º Secretário, leu a memória históricados atos preparatórios, e o Secretário-Geral, Joaquim Nabuco, pronunciou odiscurso inaugural.

Em 1923, o governo francês doou àacademia um prédio, réplica do PetitTrianon de Versailles, construído no anoanterior para abrigar o pavilhão da Fran-ça na Exposição Internacional comemo-rativa do Centenário da Independênciado Brasil, no Rio de Janeiro. Primeira sedeprópria, o prédio funciona até os dias dehoje como local para as reuniões regu-lares dos acadêmicos e para as sessõessolenes comemorativas e de posse denovos membros da ABL.

No jardim, junto à entrada do PetitTrianon, encontra-se um dos mais co-nhecidos símbolos da Casa, a esculturaem bronze de Machado de Assis, deautoria de Humberto Cozzo. O saguão,com piso em mármore, lustre de cristalfrancês e peças de porcelana de Sèvres,conduz ao Salão Nobre, ao Salão Fran-cês e à Sala Francisco Alves. O andartérreo compreende também a Sala dosPoetas Românticos, a Sala Machado deAssis e a Sala dos Fundadores.

No lado oposto ao do Saguão, a Salados Poetas Românticos abre-se para umbelo pátio e reverencia Álvares de Aze-vedo, Casimiro de Abreu, Castro Alves,Fagundes Varela e Gonçalves Dias, imor-talizados em bustos de bronze. Na SalaMachado de Assis, organizada pelo Aca-dêmico Josué Montello, destacam-se ob-jetos pessoais do escritor, como livros desua biblioteca, a escrivaninha onde tra-balhava e um belo retrato a óleo de au-toria de Rodolfo Bernardelli.

No segundo andar do Petit Trianonestão a valiosa Biblioteca AcadêmicaLúcio de Mendonça, a Sala de Sessões eo Salão de Chá, onde se reúnem os aca-dêmicos, às quintas-feiras. Uma grandereprodução dos Estatutos da Academia,de 1897, assinados por Machado de

Assis, Joaquim Nabuco e membros daprimeira Diretoria, está afixada na Salade Sessões, que também possui dois pai-néis com retratos dos fundadores e dospatronos das 40 cadeiras.

O Presidente da Academia Brasileirade Letras, Marcos Vinicios Vilaça, expli-ca o fundamental e precioso papel exer-cido pela ABL no panorama cultural doRio de Janeiro:

“O papel da Academia é o de preser-var e valorizar a memória nacional: a lín-gua como instrumento do conhecimentoe da convivência; as letras como revela-doras e formadoras da identidade nacio-nal, sem deixar de foranada do que é huma-no: a ciência, que resi-de no espírito, que ob-serva e explica; e a po-

Quem entra no Centro Cultural PaçoImperial passa a respirar História portodos os poros. É que ela está impregna-da em todas as paredes, por todos osbalaústres, em cada sacada de suas inú-meras janelas. Situado no Centro da ci-dade do Rio de Janeiro, o Paço Imperialé um raro exemplo de monumento his-tórico que, em diferentes momentos, foipalco de importantes acontecimentosnacionais. A sua própria origem já é umasalada histórica. Abrigou a Casa daMoeda, a partir de 1699, e em uma plantadatada de 1713 aparece também comoo Armazém Del Rey, local onde eramguardadas armas e munições reais.

No início do Século XVIII, com asinvasões francesas de 1710 e 1711, a Casasofreu bastante. Em outras palavras,sobrou pra ela e muito. Em 1710, corsá-rios do francês Jean François Duclercforam vencidos em violenta batalha tra-vada no terreiro do Carmo, em frente àCasa. Parte dos prisioneiros ficou deti-da na Cadeia que ali também existia.Imaginem, a Cadeia ao lado da Casa daMoeda. Em 1712, durante a invasão de

(consulta a livros diversos, periódicos,microfilmes, obras raras a pesquisado-res), como também por ofertar umaextensa programação cultural à popula-ção do Rio de Janeiro. O Auditório Ma-chado de Assis, na Rua México, sinteti-za bem essa proposta: semanalmente,por ali, passam estudan-tes e intelectuais, que de-batem questões de litera-tura, música, política,etc., no programa Quar-ta às Quatro.”

Academia Brasileira de Letras

“O auditório é palco ainda de debatesmensais da Revista de História da Biblio-teca Nacional, cerimônias que valorizamautores, como o Prêmio Camões, cursose simpósios, encontros para restaurado-res e seminários do Programa Nacionalde Incentivo à Leitura e Sistema Nacio-

nal de Bibliotecas Públi-cas. Diariamente, passampela instituição, cerca de1.200 visitantes, entre lei-tores, turistas e visitantesde exposições”.

��������������

FUNCIONAMENTODe segunda a sexta,das 9h30min às 17h30minAvenida Rio Branco, 219 - CentroTel: (21) 2220-9484/ 4173Site: www.bn.br

esia, que habita a alma, que sente e com-preende. A Academia que temos hoje nãoé diferente disso, mas adotou tambémsua vocação de grande casa da cultura:aberta, democrática e criativa.”

“Hoje a instituição é um movimenta-do centro de atividades culturais, estu-dos e entretenimento, frequentado porjovens que lotam nossos eventos. O Riode Janeiro é uma cidade com muitas pos-sibilidades culturais. Temos muitas sa-las que foram adotadas para receberconcertos e música de câmara, muitosmuseus etc. As atividades culturais sãoas mais diversas e oferecidas tanto pe-

las autoridades quan-to pelas organizaçõesnão-governamentais,mas claro que semprese pode fazer mais.

FUNCIONAMENTODe segunda a sexta, das 9h às 18hAvenida Presidente Wilson, 231 - CasteloTel: (21) 3974-2552/2500/2220-6695Site: www.academia.org.br

PALESTRA222221/11/11/11/11/10 - M0 - M0 - M0 - M0 - MUUUUULHLHLHLHLHERERERERER BBBBBRRRRRASIASIASIASIASILEILEILEILEILEIRRRRRAAAAA HOHOHOHOHOJJJJJEEEEEPalestrantes: Ana Maria Machado, Maria SílviaCamargo, Miriam Leitão e Rosiska Darcy deOliveira, 17h30222225/15/15/15/15/11 - N1 - N1 - N1 - N1 - NOELOELOELOELOEL R R R R ROSAOSAOSAOSAOSA, , , , , UUUUUMMMMM PPPPPALPALPALPALPALPITEITEITEITEITE FFFFFELIZELIZELIZELIZELIZPalestrantes: Aldir Blanc, Carlos Didier,Martinho da Vila, Ricardo Prado e SérgioCabral, 17h30m

DESTAQUES DAPROGRAMAÇÃO

Centro Cultural Paço Imperial

��������������

Duguay-Trouin, o prédio foi fortemen-te bombardeado e teve as oficinas inu-tilizadas; depois, foram restauradas.

O Paço entra pra valer em cena a par-tir de 1733, quando o Governador GomesFreire de Andrade, Conde de Bobadela,pede ao Rei Dom João V licença paraedificar uma casa de governo no Rio. Porvolta de 1738, começa a construção doedifício, seguindo o projeto do engenheiromilitar português José Fernandes PintoAlpoim, no Largo do Carmo (ou da Polé),atual Praça XV, naqueles idos o centro ne-vrálgico da então modesta e insalubre ci-dade. A nova Casa dos Governadores foiinaugurada em 1743.

Desse ano até 1763, foi sede do gover-no colonial no Brasil. Com a transferên-cia da sede do Governo Geral para o Riode Janeiro, tornou-se Palácio dos Vice-Reis até 1808. A partir de então, passoua abrigar a Família Real, que se transfe-riu de Lisboa para o Rio, recebendo onome de Paço Real. Depois da proclama-ção da independência (1822), e até aproclamação da República (1889), pas-sou a ser chamado de Paço Imperial.

Doada à ABL pelo Governo da França em 1923, a antiga sede da Academia Brasileira deLetras é a ante-sala de vigoroso programa cultural da Casa de Machado de Assis.

DIVU

LGA

ÇÃ

O

10 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

Após a Proclamação da República, oprédio foi sede do Departamento deCorreios e Telégrafos.

Os cômodos voltados para o mar epara a praça constituíam a parte nobredo prédio, como a Sala do Trono, ondeocorriam as audiências reais; no corpoda frente e no centro da fachada volta-da para a praça, alojavam-se os membrosda Família Real. Construiu-se um pas-sadiço, agregando o Paço ao Conventodo Carmo e à Casa da Câmara e Cadeia,para facilitar a movimentação dos aco-modados nesses espaços. As celas doconvento foram transformadas em apo-sentos para a Rainha Dona Maria I e suasdamas. A antiga capela do convento foitransformada em Capela Real. Em 1817,foi erguido um terceiro pavimento nafachada voltada para o mar, dando aoprédio o aspecto palaciano. O local foidestinado aos aposentos reais.

“VOU MANDAR ESTASFLORES PARA MEU PAÍS.....”

De 1822 a 1890 o Paço foi palco detodos os eventos políticos, religiosos,econômicos e o local de onde se governavao País. Manteve sua importância na cida-

de, pela nobreza e imponência de suaarquitetura, sendo cenário de aconteci-mentos históricos fundamentais no pa-norama político/social brasileiro, comoa aclamação de dois imperadores, DomPedro I e Dom Pedro II; o Dia do Fico (9de janeiro de 1822) e a assinatura da LeiÁurea, pela Princesa Isabel, que aboliu aescravatura no Brasil (13 de maio de1888). A chuva de flores que se seguiu aoato emocionou o embaixador norte-ame-ricano no Brasil, James Rudolph Partrid-ge, que colheu algumas e pronunciou afrase que se tornaria célebre: “Vou man-dar estas flores a meu país, para mostrarcomo aqui se fez uma lei que lá custoutanto sangue”. A Guerra de Secessãocustara seiscentos mil mortos.

Em 1938, o Paço foi tombado peloSPHAN (atual IPHAN) e desde 1985, éum centro cultural vinculado ao Institutodo Patrimônio Histórico e Artístico Na-cional. O prédio sofreu inúmeras modi-ficações de nomes e de funções, passoupor diversas reformas arquitetônicas, masnão perdeu a beleza, a majestade e a con-dição, através dos séculos, de testemunhae protagonista da História do País. NoPaço Imperial, as expressões do mundo

Pelo seu prestígio nos meios intelectu-ais, pela beleza arquitetônica e o majestosobranco manuelino do edifício, pela impor-tância do acervo bibliográfico e ainda pe-las atividades que desenvolve, o Real Ga-binete Português de Leitura é uma notá-vel instituição que muito dignifica Portugalno Brasil. Na verdade, é um dos maiorespatrimônios que poderia nascer do dia emque os dois países se encontraram.

Em 14 de maio de 1837, um grupo de43 emigrantes portugueses do Rio de Ja-neiro – apesar de o Brasil já estar há 15anos independente do domínio português– reuniu-se na antiga Rua Direita, 20 (hojePrimeiro de Março) e resolveu criar umabiblioteca para ampliar os conhecimen-tos de seus sócios e dar oportunidade aosportugueses residentes na então capitaldo império de ilustrar o espírito.

Entre esses homens, cuja maioria eracomposta de comerciantes da praça,estavam alguns que haviam sido perse-guidos em Portugal pelo absolutismo eque tinham emigrado para o Brasil. Erao caso de José Marcelino Rocha Cabral,advogado e jornalista, que seria eleitoprimeiro presidente da instituição. Ins-piravam-se no exemplo da França, onde,logo a seguir à Revolução de 1789 come-çaram a aparecer as chamadas “bouti-ques à lire”, que nada mais eram do quelojas onde se emprestavam livros, porprazo determinado, mediante o paga-mento de determinada quantia.

É por essa altura que os dirigentescomeçam a pensar em construir uma

ESPECIAL CENTROS CULTURAIS, UMA FEBRE NO RIO

sede de maiores dimensões e condizen-te com a importância da instituição. Paraesse fim, é adquirido um terreno na an-tiga Rua da Lampadosa (hoje Luís deCamões). E as comemorações do tricen-tenário da morte do poeta (1880) vão sero grande pretexto para motivar a colô-nia portuguesa e levar adiante a idéia. Oprojeto escolhido foi o do arquiteto por-tuguês Rafael da Silva Castro, com seutraço neomanuelino, evocando a epopéiacamoniana.

Ramalho Ortigão, convidado para oorador oficial da solenidade, pronunciouentão um discurso notável, terminandodesta forma: “E se um dia o nome de Por-tugal houver de desaparecer da carta po-lítica da Europa, esta Casa será aindacomo a expressão monumental do cum-primento da profecia posta por Garrett

na boca de Camões: ... não se acabe a Lín-gua, o nome português na terra”. Em 1900o Gabinete Português de Leitura transfor-ma-se em biblioteca pública. É precisa-mente nesse ano que o Rei Dom Carlosatribui o título de “Real” ao Gabinete.

Para as comemorações do 1º centená-rio da Independência é constituída noReal Gabinete uma empresa com a fina-lidade de editar, em fascículos, a monu-mental História da Colonização Portu-guesa do Brasil. Os fascículos chegam aatingir cerca de 20.000 exemplares, com12.000 distribuídos no Brasil e 8.000 emPortugal – um número impressionantepara a época. Mas as décadas seguintesserão de grandes dificuldades financei-ras para a instituição. É quando grandesempresas nacionais passam a contribuir,através dos benefícios da Lei Rouanet,

com ajuda financeira parao desenvolvimento dainstituição.

OBRAS RARAS

Entre as obras mais ra-ras da biblioteca pode-secitar a edição “prínceps”de Os Lusíadas, de 1572,que pertenceu à Compa-nhia de Jesus; as “Ordena-ções de Dom Manuel” porJacob Cromberger, edita-das em 1521; os “Capito-los de Cortes e Leys quesobre alguns delles fize-

ram”, editados em 1539; “A verdadeira in-formaçam das terras do Preste Joam, se-gundo vio e escreveo ho padre FranciscoAlvarez”, de 1540. Possui ainda manus-critos autógrafos de Amor de Perdição, deCamilo Castelo Branco e o Dicionário daLíngua Tupy, de Gonçalves Dias, além decentenas de cartas de escritores.

ACERVO ARTÍSTICO

Ao entrar no edifício do Real Gabine-te, o visitante, depois de se recuperar etomar fôlego ante o esplendor da bele-za que lhe é oferecida, verifica o quantoestantes e escadas cercadas de livrospodem se aproximar do belo, quase ina-tingível. E percebe ainda que o interiordo prédio nada fica a dever à imponên-cia de seu exterior, destacando-se, des-

Real GabinetePortuguês de

Leitura

������

FUNCIONAMENTODe terça a domingo, das 12h às 18h.Praça XV de Novembro, 48 – CentroTel: (21) 2533-4207E-mail: paç[email protected]: www.iphan.gov.br

atual dialogam com as referências do pas-sado, convidando o visitante a passear pe-los tempos. Sua programação diversifi-cada inclui artes plásticas, cinema, teatro,música, biblioteca, atividades educativas,seminários, serviços delojas e restaurantes.

O Paço Imperial tor-nou-se referência no pa-norama cultural do Rioe inaugurou um novo

ciclo na Praça XV e suas imediações, ondeforam surgindo outros centros multicul-turais, atraindo um público de cerca de2 milhões de pessoas por ano em progra-mações que envolvem grandes exposi-

ções de artes nacionaise internacionais, even-tos musicais e literários,peças de teatro, espetá-culos de dança, filmes,cursos e seminários.

O Centro Cultural Paço Imperial tem o privilégio de ocupar uma das mais antigasedificações do Rio, construída no século XVII e sede de diferentes Governos na Colônia.

Orgulho de portuguesese brasileiros, o RealGabinete Português deLeitura foi inaugurado em1880 numa solenidadeque contou com umorador de grande renome:Ramalho Ortigão.

TUC

A VIEIRA/FO

LHAPR

ESS

MARCO ANTÔNIO TEIXEIRA/AGÊNCIA O GLOBO

11Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

fuga é uma voragem, um mergulho angus-tiado em águas turvas. Deixei para trás a fa-mília, os amigos, o apartamento, o carro, as

roupas, os Iivros, os quadros, os móveis. As referên-cias essenciais ficaram aqui, em São Paulo, e no Rio deJaneiro, enquanto eu seguia para um segundo exílio.Demitido da TV Bandeirantes, da Fundação Arman-do Álvares Penteado e da revista Visão (neste últimocaso, a meu pedido), ameaçado pelo “Braço Armadoda Repressão”, fugi para a Argentina.

Os feriados do Carnaval de 1976 levaram muita gentea Foz do Iguaçu. Hotéis lotados, restaurantes cheios,ruas apinhadas de criaturas vorazes que invadiam aslojas e tudo consumiam. Consegui um quarto sem ar-condicionado, numa espelunca qualquer. Na porta-ria, perguntei o que precisava fazer para visitar Puer-to Iguaçu. “Me dá sua carteira de identidade, que eupeço uma autorização oficial à Polícia. Amanhã, às 10da manhã, um carro da empresa de excursões vemapanhar os interessados.”

Entreguei a carteira, bebi uma Coca-cola – e passei anoite em claro, imaginando que a Polícia Federal logobateria à porta do quarto, para me prender. Todos osruídos pareciam suspeitos. O tempo gotejava como suor.Certamente me arrancariam dali a tapas e me trans-portariam de volta ao Doi-Codi, em São Paulo, para uminsuportável re-encontro com os torturadores de plan-tão. Talvez nem chegasse até lá, deixando-me pelo ca-minho, em alguma ravina perdida na paisagem desertaou às margens de um rio barrento e esquecido.

Às 9 da manhã, desci até a portaria, trêmulo e en-joado. Devolveram minha carteira e logo embarqueinuma caminhonete da Salvatti Turismo, com maissete pessoas, até à fronteira marcada pelo Rio Iguaçu.Milhares de turistas brasileiros fluíam, como uma ir-resistível maré humana, para o posto alfandegário, à

de logo, diversas obras de arte, como osbustos em mármore de Eduardo Lemose de Joaquim da Costa Ramalho Ortigão;e em bronze, do Conde Dias Garcia, deEduardo Severo e do Rei Dom Carlos I,de Portugal. É fascinante também o bus-to de Pedro Álvares Cabral, como que re-verenciando sua chegada.

ALTAR DA PÁTRIA

Obra de ourivesaria e escultura degrande significação e importância, estaobra de arte é única e de valor incalcu-lável, tendo em vista que não se encon-traria quem produzisse outra semelhan-te. Medindo 1,70 m de altura, a alego-ria assinala os fatos principais da epo-péia lusitana, desde as suas primeirasconquistas marítimas. Da sua base emmármore negro, formando belo con-traste com a prata de que é feito, apon-tam para os quatro pontos cardeaisoutras tantas naves: “Para buscar domundo novas partes”.

EXPOSIÇÕES

HHHHHERCULANOERCULANOERCULANOERCULANOERCULANO EMEMEMEMEM RELEVRELEVRELEVRELEVRELEVOOOOO: 1810-2010: 1810-2010: 1810-2010: 1810-2010: 1810-2010– Poder-se-ia dizer que foi poeta e ro-mancista, historiador, político, jorna-lista e polemista, e não seria suficientepara descrever seu papel na sociedadeportuguesa oitocentista, muito menossua ampla aceitação entre os leitoresbrasileiros.

PPPPPÓLOÓLOÓLOÓLOÓLO DEDEDEDEDE P P P P PESQUISAESQUISAESQUISAESQUISAESQUISA – O Pólo de Pes-quisa sobre Relações Luso-Brasileiras-PPRLB é constituído por professores epesquisadores de várias áreas do conhe-cimento, empenhados em aprofundar edar visibilidade aos estudos que contem-plam relações luso-brasileiras. Encontra-se vinculado ao Centro de Estudos do RealGabinete Português de Leitura e sediadonas dependências desta instituição cul-tural fundada em 14 de maio de 1837, quetem em seu patrimônio uma das mais im-portantes e belas bibliotecas brasileiras.

Para o presidente do Real GabinetePortuguês de Leitura, Antônio Gomes daCosta, o fundamental hoje para a enti-dade é se aproximar do estudante e rea-lizar palestras e cursos sobre a língua por-tuguesa.

“Temos um papel imprescindível eraro no cenário cultural brasileiro, queé o de preservar e lutar pelo idioma por-tuguês, sua cultura e sua purificação emum mundo cada vez mais globalizadoe sujeito a tantos modismos e neologis-mos estrangeiros. Por isso, temos hojeuma biblioteca aberta ao público emgeral, uma biblioteca que é uma verda-deira jóia e, como tal, tem em seu acer-vo também preciosidades como os ori-ginais de Amor de Perdição, de CamiloCastelo Branco e até um dente auten-ticado do escritor. De Machado de As-sis temos os originais de Só Tu Amor,além de 200 cartas, também originais,de Garcia Saraiva e Eça de Queirós.”

FUNCIONAMENTODe segunda a sexta-feira, das 9h às 18hRua Luís de Camões, 30 - CentroTel: (21) 2221-3138/ 2960E-mail: [email protected]: www.realgabinete.com.br

POR RODOLFO KONDER

Rodolfo Konder, jornalista e escritor, é Diretor da ABI em São Paulo e membrodo Conselho Municipal de Educação da Cidade de São Paulo e ConselhoDeliberativo da ABI.

A fuga

A margem do rio. A multidão cantava, dançava e se ar-rastava, caindo sobre as barcaças que faziam a traves-sia para a margem argentina. Os guardas haviamdesistido de recolher as autorizações. Nem pediam qual-quer documento. Quem chegasse até ali passava. Numdos barcos, entre homens bêbados e mulheres semi-despidas, fui virtualmente carregado para fora do Brasil.

Do outro lado do rio, olhei pela última vez para oterritório brasileiro, com uma enorme sensação de alívio.“Escapei”. Andei pela terra batida, subi um barrancoe vi uma fileira de automóveis e ônibus, parados numamplo estacionamento. Corri até um táxi. “Quantovocê quer para me levar a Posadas?” “Seiscentos cru-zeiros.” “Por 500, partimos agora mesmo.”

A viagem durou quase quatro horas, porque umaviolenta tempestade de granizo obrigou o motoristaa encostar o carro por algum tempo. Em Posadas, fomosdireto para o aeroporto, um minúsculo aeroporto tí-pico de cidade pequena. Comprei uma passagem paraBuenos Aires, esperei umas três horas – e parti ansi-oso por me afastar da fronteira.

Buenos Aires, a doce e suave Buenos Aires me rece-beu com o carinho civilizado de sempre. Visitei umaloja, comprei roupas, enfiei-as numa mala e procureium hotel decente. Até aquele momento, estava ape-nas com a roupa do corpo – e 5 mil dólares no bolso.

No dia seguinte, tomei um maravilhoso desayunoe saí para as ruas elegantes e ensolaradas do centro dacidade – Florida, Lavalle, Esmeralda, Suipacha, Mai-pu. Fui visitar um amigo, o jornalista Isidoro Gilbert.Ele me recebeu com muita alegria, mas com um ar deincredulidade: “Acabei de ler no La Nación a notícia doseu desaparecimento, no Brasil”.

ELIANE SO

ARES

12 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

Em singela e comovente cerimônia,a ABI realizou no dia 16 de setembrosessão especial para a inauguração deum quadro com a fotografia ampliadada platéia que compareceu à sessão daCinemateca do Museu de Arte Moder-na em 13 de maio de 1958, no Auditó-rio Oscar Guanabarino, para a exibiçãodo filme O Ferroviário, do diretor itali-ano Pietro Germi, um dos mestres doneo-realismo.

A imagem histórica, registrada porRobert Léon Chauvière, revela na pla-téia a presença de jovens cinéfilos quemais tarde se destacaram como gran-des nomes do cinema nacional e fun-dadores do Cinema Novo, entre osquais Cacá Diegues, Walter Lima Júni-or, Leon Hirszman, David Neves eMarcos Farias.

Prestigiaram a sessão comemorati-va estudantes, cineastas, fotógrafos,jornalistas, associados e membros dosConselhos da ABI, como Adail José dePaula, Alcyr Cavalcanti, Miro Lopes,José Pereira da Silva, Sérgio Caldieri,entre outros.

Aconteceu na ABIAconteceu na ABI

POR CLÁUDIA SOUZAE RENAN CASTRO

Na abertura da cerimônia, o Presiden-te da ABI, Maurício Azêdo, ressaltou opapel da Casa na cultura nacional:

“Este momento tem para nós da ABIum significado muito importante,porque é o seu reencontro com o papelque ela desempenhou e ainda desem-penha na cidade do Rio de Janeiro comouma das propulsoras da atividade cul-tural cinematográfica.”

Maurício sublinhou também a im-portância da fotografia feita por RobertLéon Chauvière como documento his-tórico para o cinema brasileiro:

“Naquela platéia estavam alguns dosjovens cinéfilos que atuariam depoiscomo criadores do Cinema Novo, quelevou a cultura cinematográfica brasi-leira ao exterior, com grande brilho.”

O jornalista Dejean Marco Pellegrin,autor do convite a Chauvière para fa-zer a fotografia em 1958, destacou ovínculo entre a história do cineclubis-mo e das cinematecas no Brasil com aABI, onde eram realizadas as sessões.

“Nós tínhamos um interesse muitogrande pelo cinema. Corríamos atrásde livros sobre o assunto, que eramescassos na época. Era um ideal, umamor total pelo cinema.”

Robert Léon Chauvière, autor daimagem histórica, também recordoucom alegria a sessão de 13 de maio de1958:

“Fiquei comovido porque esta fotofaz parte de uma etapa do cinema bra-sileiro que não era fácil. Nós importá-vamos filmes de vanguarda que a cen-sura muitas vezes não deixava passar.Naquela época era um amor com fina-lidade somente intelectual.”

Com mais de cinco décadas de ati-vidade no jornalismo, Roberto Muggi-ati, escritor, crítico de cinema e de jazz,também compareceu ao evento.

“Saí de Curitiba para estudar cine-ma na França, dois anos depois da re-alização desta foto histórica, em 1958.Em Paris, conheci Dejean Pellegrin,que me iniciou no mundo do cinema.Dois anos mais tarde, fui para a BBCde Londres. Quando retornei ao Bra-sil, caí nas garras da Manchete, ondetrabalhei ao longo de 35 anos, até àfalência da empresa. Sempre fui fã decinema. Trabalhei em revistas ilustra-das e com fotografia, como na Veja, nocargo de Editor de Artes e Espetácu-los, na Fatos & Fotos, como Editor, en-tre outras publicações. A minha paixão

pelo cinema sempre esteve muito en-volvida em tudo isso.”

Após a solenidade foi exibido o fil-me O Ferroviário, que conta a históriade Andrea Marcocci, um maquinistaitaliano, casado, com três filhos, queenfrenta problemas familiares. Suasdificuldades aumentam no momentoem que ele se desentende com o sindi-cato e se vê isolado, tanto no trabalhoquanto em casa.

O diretor Pietro Germi, nascido emGênova, mostra os dramas sociais dasociedade siciliana da época, utilizan-do a estética neo-realista. A obra ven-ceu diversos prêmios, entre eles, o demelhor filme no Festival de Cannes,melhor filme estrangeiro, Direção defilme estrangeiro e melhor atriz de fil-me estrangeiro (Luisa Della Noce), noFestival Internacional de San Sebasti-án, na Espanha.

Com pesquisa e texto de GabrielFontes, estagiário da sua Diretoria deJornalismo, a ABI editou breve sinop-se do filme, que está à disposição dosinteressados.

Renan Castro, estudante de Comunicação, éestagiário da Diretoria de Jornalismo da ABI.

Um retrato do amor ao cinema

ACERVO

ABI

13Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

Um dos cinéfilos presentes à histó-rica sessão, de que foi um dos organi-zadores, Ruy Pereira da Silva mandoude Brasília, por e-mail, uma mensagemde cumprimentos pela inauguração daampliação da fotografia que Chauvié-re fez em 1958. Fundador da Cinema-teca do Museu de Arte Moderna, cujoreconhecimento ocorreu em Antibes,em 1957, num congresso em que oBrasil foi representado por ele e pelocrítico de cinema Antônio Moniz Vi-ana, falecido no ano passado, Pereira daSilva aponta Herbert Moses, então Pre-sidente da ABI, como “um verdadeiropatrono” da sua iniciativa.

Diretor da Fundação Cultural doDistrito Federal no Governo Kubits-chek logo após a inauguração da capi-tal, Ruy foi também criador do Festi-val de Cinema de Brasília, que é, ao ladodo Festival de Gramado, o mais impor-tante do País. Radicado desde então nacapital, Ruy é sócio da ABI desde 1947;são 63 anos de amor à Casa.

“Senhor Presidente,Com grande prazer recebi o convi-

Um dos presentes à sessão de 13 demaio de 1958, o cineasta Walter LimaJúnior lembra que na época havia noCentro do Rio muitos cineclubes,mas o da ABI era o point, o preferidodos cinéfilos, como ele contou nestaentrevista:

CINEABI – DE QUE ASPECTOS O SENHOR

SE RECORDA DESSA SESSÃO? ELA TEVE ALGO

DE ESPECIAL?WLJr. – Essa sessão em particular

não teve nada de especial, a não ser umcamarada que subiu no palco e tirouessa foto. As sessões no auditório daABI viviam lotadas, era sempre assim,todo mundo que fazia cinema ou que-ria fazer andava por lá. E a sessão nãoterminava quando o filme acabava,sempre depois todo mundo se reuniaem algum bar ali por perto para tomarum chope e conversar. Se a sessão aca-bava umas 8 horas a gente ficava porlá pelo menos até meia-noite. Se osbares fechavam a gente passava para osbancos da praça. As pessoas eram sem-pre as mesmas.

CINEABI – MAS MESMO SENDO UMA

SESSÃO DE PRÉ-ESTRÉIA, ELA NÃO TEVE NADA

As instituições representativasda imprensa italiana estãointeressadas em estabelecer umintercâmbio permanente com asentidades dos jornalistasbrasileiros e os órgãos decomunicação do País. Estepropósito foi anunciado no dia 2de setembro ao Presidente daABI, Maurício Azêdo, pelo Vice-Presidente Nacional de La StampaSportiva e Secretário-Geral daOrdem dos Jornalistas da Regiãoda Campagna, GianfrancoCoppola, que é também Delegadoda Itália para a ImprensaEsportiva Internacional.

Coppola visitou a ABI emcompanhia de Massimo Cabiati,Coordenador das atividades daagência italiana que trata dasquestões do mercado de trabalho,e Pietro Petraglia, Diretor daRevista Communità Italiana,editada no Rio de Janeiro.

Ele aventou entre as iniciativasque poderão marcar esteintercâmbio a realização na ABIde uma mostra fotográfica sobrejogadores de futebol brasileirosque atuaram ou atuam na Itália,desde Altafini “Mazzola”,integrante da Seleção Brasileiracampeã mundial de 1958, aoscraques atualmente em atividadena Itália, como, por exemplo,Robinho.

Esta exposição, que poderárealizar-se em junho de 2011,compreenderia também aexibição de vídeos sobre estesjogadores brasileiros produzidoscom base no acervo da Rádio eTelevisão Italiana – RAI.

Outra iniciativa mencionadapor Coppola, no âmbito desteintercâmbio, seria a realização deum congresso da imprensaitaliana e brasileira, possivelmenteem outubro de 2011.

Coppola manifestou suaesperança de que o congressopossa ser aberto com umaconferência do escritor UmbertoEco, se o estado de saúde destepermitir.

Coppola é também repórter daRAI e, como tal, não perdeu aoportunidade de gravar umaentrevista com o Presidente daABI, abordando questõesrelacionadas, não apenas com ointercâmbio discutido noencontro, mas também à presençaitaliana na vida econômica ecultural do Brasil.

“A ABI era o point da época”

POR GABRIEL FONTES

A evocação de Walter Lima Júnior, um dos presentes à histórica sessão.

Moses, patrono da CinematecaUm depoimento de Ruy Pereira da Silva, fundador da Cinemateca do

Museu de Arte Moderna-Mam e criador do Festival de Cinema de Brasília.

te para a cerimônia de hoje,seguida de sessão dedescerramento de umahistórica fotografia daCinemateca do Mamno Auditório da ABIe da exibição do fil-me O Ferroviário.

Mais uma bri-lhante iniciativa deDejean Magno Pel-legrin, pioneiro docineclubismo no Riode Janeiro e meu gran-de amigo.

Guardo a lembrança deter criado o Departamento deCinema do Museu e da primeira sessão,programada para o dia 7 de julho de1955 no Auditório da ABI com todo oapoio do jornalista Herbert Moses. ODepartamento passou a ser chamado deCinema do Museu, com sessões men-sais na primeira fase, quinzenais depois,semanais em seguida, até chegarmos àssessões diárias no Festival de 1958, jáconsiderando Herbert Moses como um

verdadeiro patrono da mi-nha iniciativa.

Vale lembrar que,convidado pela Fiaf–Fédération Internati-onal des Archives duFilm, compareci,acompanhado pelocrítico Moniz Via-na, ao Congressoanual realizado na

cidade de Antibes,França, em outubro

de 1957, quando foiaprovado por unanimi-

dade o nosso projeto detransformarmos o Cinema do

Museu em Cinemateca do Mam/RJ.Dejean Pellegrin poderá apresentar

ao Senhor um texto completo sobrecomo começou a Cinemateca nos ines-quecíveis momentos da fase inicial atéoutubro de 1958.

Agradeço a atenção, com os meussinceros votos de contínuo sucesso e osmeus mais cordiais cumprimentos. (a)Ruy Pereira da Silva.

DE EXTRAORDINÁRIO? PORQUE ALI ESTAVAM

REUNIDAS MUITAS PESSOAS QUE POSTERIOR-MENTE REALIZARIAM MUITO PELO CINEMA

NACIONAL, COMO O SENHOR E O CACÁ DI-EGUES, POR EXEMPLO.

WLJr. – Não, naquele dia ninguémfoi ali porque era O Ferroviário ou por-que era um filme de Pietro Germi. Jus-tamente o que me chamou a atençãonesse dia foi um camarada que subiuno palco e tirou essa foto (o fotógra-fo era Robert Léon Chauviére). Mas euia sempre nas sessões na ABI, que ti-nha um auditório muito grande, mui-to bonito. Na verdade existiam mui-tos cineclubes por aquela área, mas oda ABI era o point. E eu ia sempre lá.Me lembro que uma vez eles passaramum ciclo de filmes do John Huston, noqual eu assisti a muitos filmes dele queeu não tinha visto. Dentre eles esta-va O Falcão Maltês, que eu não tinhavisto até então.

CINEABI – E QUAL FOI A IMPORTÂNCIA

DISSO PARA O INÍCIO DA CINEMATECA DO

MAM?WLJr. – Na verdade a Cinemateca

não existia direito naquela época. Ain-da não tinha um prédio como tem hoje,no Museu. A Cinemateca funcionavanuma estrutura montada nos pilotis do

prédio do antigo Ministério da Educa-ção. Era lá que ficavam os escritóriosimprovisados do pessoal de lá. Era maiscomo um cineclube, que aliás foramimportantíssimos para a nossa forma-ção naquela época.

CINEABI – O SENHOR PODERIA FALAR

UM POUCO DA IMPORTÂNCIA DOS CINECLU-BES DAQUELA ÉPOCA?

WLJr. – Naquela época não existi-am faculdades de cinema. Então todosos que faziam cinema ou queriam fa-zer só tinham os cineclubes para ir.Nosso estudo era assistir a filmes nes-sas sessões, que não se resumiam so-mente ao filme, porque, como eu já tedisse, elas se prolongavam por toda anoite. E era nessas reuniões que nas-ciam laços entre quem trabalhava nis-so. Para você ter uma idéia, eu só fuiconhecer o pessoal de Niterói, cidadeem que morava na época, aqui no Riode Janeiro, nessas sessões. Depois, in-clusive, fundamos juntos um cineclu-be lá em Niterói. E nessa época existiaum hábito muito comum, de se julgara pessoa pelo gosto dela. As afinida-des eram alimentadas pelo gosto cine-matográfico.

Italianospropõem

intercâmbio

Gabriel Fontes, estudante de Comunicação, éestagiário da Diretoria de Jornalismo da ABI.

ACERVO

ABI

14 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

15Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

16 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

Sérgio Fleury entrou para o Jornal doBrasil como estagiário em 1962 e saiu em1983, quando era Chefe de Reportagem.Ele conviveu na Redação com os gran-des profissionais que fizeram o prestígioe a credibilidade no jornal. De suasmuitas histórias, algumas aconteceramdurante a fase repressiva do golpe mili-tar. Da fase em que ele diz que o jornalesteve “moribundo” e depois “morreu”,tem uma opinião formada:

“Não sei por que, talvez os estudio-sos do assunto saibam, mas um veículode comunicação é a única empresa domundo que depois que cai ninguém maislevanta. Parece que o leitor, o público emgeral, cria uma ojeriza, um anticorpocontra esse vírus e foge dele como o di-abo da cruz.”

“Acho ainda, com relação à credibili-dade do JB, que quando ele “malufou”,durante um período do final da décadade 80 e início da de 90 do século passa-do (nossa, quanto tempo); abriu umafenda perigosa por onde começou a es-coar sua marca registrada, que era a cre-dibilidade, sua histórica isenção políti-co/ideológica. Depois de ter aberto aspernas para o Paulo Maluf, Nascimen-to Brito se arrependeu-se e voltou atrás,mas já era tarde. A partir daí começaramos problemas”.

Vanguarda da NotíciaFleury atribui também à Rádio JB um

papel de vanguarda no tratamento danotícia naquele tempo, que somente foicopiado muitos anos depois pela RádioCBN, do Sistema Globo de Rádio:

“A rádio, de certa forma, completavao jornal, era uma dupla eficiente, con-siderada e poderosa. Intercalávamosnotícia com música e o público adorava.Tínhamos ainda o Caderno B, tambémvanguardista, com uma paginação lin-da e leve e que foi o pai de todos os Ca-dernos Bs que vieram depois. Não haviaesse tratamento da noite, da vida sociale mundana, da cultura, da música, tea-tro, cinema como o JB criou. Foi notá-vel, veja você quantas vezes eu falei apalavra vanguarda”.

Ele cita com igual entusiasmo o De-partamento de Pesquisa:

“O JB foi pioneiro nisso. Nenhum re-pórter saía para a rua (lógico, havia ve-zes que não dava) sem consultar os ar-quivos. Queríamos dessa maneira paraele ter uma base boa, bastante informa-ção, na hora de escrever um texto. Comos fotógrafos era a mesma coisa, orien-távamos para que procurassem o depar-tamento e esmiuçassem lá o que pudes-

uma história para o padre de que meusobrinho, na hora de dar a esmola, emvez de colocar o dinheiro na caixa colo-cou uma carta, que era da minha mãe.Na mesma hora o padre abiu a caixa,nervosos, retiramos a carta e saímosapressados. Mas para nossa surpresa edesapontamento fomos interceptadosna calçada, por quatro policiais do Dops,que nos receberam já com a frase: “muitobem, passem a carta’. Depois soubemosque a carta avisava que seria seqüestra-do o embaixador da Suíça.”

Fleury revela que essas mensagenscodificadas e secretas chegavam ao jor-nal cotidianamente, pois, lembra, osgrupos que as enviavam sabiam queseriam noticiadas, servindo, muitas ve-zes, de comunicações cifradas entre elespróprios, aproveitando-se da força depenetração da rádio e do jornal:

“Eram mensagens deixadas em banhei-ros de botecos, latas de lixo, estátuaspúblicas, lojas de conveniência e por aí vai.No entanto, chegou uma hora em que aPolícia começou a desconfiar e a intercep-tá-las também. Tivemos que parar decolocá-las no ar e de publicá-las”.

O ex-Chefe de Reportagem do Jornaldo Brasil lembra que o jornal sofreu forte

boicote de publicidade oficial por terencampado a luta pelas Diretas Já; se-ria este também um dos motivos de suaqueda:

“É claro que foi uma sucessão de erros,vou citando alguns assim para seremanalisados, mas quando tomamos a fren-te das Diretas Já determinadas verbas ofi-ciais sumiram. O Globo, como todos sa-bem, no primeiro momento apoiou ogolpe, só muito tempo depois, quandoeles viram que a coisa estava realmentepreta e exagerada mudaram de rumo.Podem ter sofrido alguma represália tam-bém, só que eles tinham uma rede de rá-dio e TV, faziam promoções tipo ‘anun-ciem no jornal e ganhem dois anúnciosgrátis na rádio’. Então, ficou difícil a con-corrência. Embora tivéssemos os Classi-ficados JB, que eram um achado históri-co e nos davam muito retorno, eles sozi-nhos não eram suficientes.”

Embora não houvesse censura da di-reção da empresa, havia a censura ofi-cial, que, em inúmeros momentos pre-judicou demais a informação e a credi-bilidade do jornal:

“Recebíamos ligações telefônicas as-sim: ‘amanhã a Sunab vai aumentar acarne, mas vocês não vão poder divul-gar ’. Nós nem sabíamos do aumento.Outras vezes ligavam e diziam: ‘Fulanofoi preso, fulano morreu, fulano estásendo investigado, mas vocês não pode-rão noticiar nada, entenderam’? Tam-bém não sabíamos de nada, e era quasesempre a partir dessas ligações que co-meçávamos a correr atrás. Sem saber,achando que estavam nos censurando,e até nos supervalorizando, eles estavamera nos abastecendo de informação.”

A ida do jornal para o suntuoso pré-dio da Avenida Brasil,500, diz Sérgio Fleu-ry, foi outro dos fatores da decadência:

“Foi uma burrice total, um gasto ex-cessivo e desnecessário. Vou citar umapassagem, da qual fui testemunha, paradefinir isso: um dia o Presidente do NewYork Times foi visitar o jornal e se assom-brou com o tamanho do prédio. Pergun-tou para o Nascimento Brito quantosexemplares rodavam do Jornal do Brasil.Escutou um raquítico 150 mil. Não sa-tisfeito, indagou então quantas publica-ções eram feitas ali. Ouviu em resposta:nenhuma, havia apenas a rádio. Estupe-fato, o visitante concluiu afirmando queum prédio daquele porte nos EstadosUnidos abrigaria um conglomerado deveículos, tendo um com, no mínimo,dois milhões de exemplares.”

Decepcionado, Fleury diz não acredi-tar que possa se confiar no JB Digital,nem no JB Online:

“Isso é apenas um engodo, uma men-tira, é só pra dizer: ‘não vou acabar de vez,vou dar um tempo’. O ciclo de 119 anosdo Jornal do Brasil na História do nossojornalismo está acabado, não volta mais.Até porque falta confiabilidade ao SenhorTanure, que já vem de outros empreen-dimentos fracassados. Pergunto: quemvai confiar numa Redação como a de Bra-sília, centro político do País, com apenascinco repórteres trabalhando e possivel-mente estagiários? E ainda vai se pagarR$ 9,90 por isso? Infelizmente me des-peço dele aqui: Jornal? Bye, bye Brasil”.

DEPOIMENTOS

“O colapso do JB começouquando o jornal malufou”

Em 21 anos de trabalho na empresa, Sérgio Fleury recolheu provas da grandecredibilidade do jornal da Condessa Pereira Carneiro, a qual entrou em declínio, diz ele,

quando seu Diretor, Nascimento Brito, se vinculou ao projeto político de Paulo Maluf.

sem. Por falar em fotografia, tínhamosinegavelmente o melhor time do Rio,profissionais competentes e tarimbados,que prefiro não citar nomes para não co-meter injustiças”.

Havia uma bizarra competição entreos fotógrafos do JB e os de O Globo. Fleu-ry conta:

“Um dia percebemos que os fotógra-fos de O Globo tinham orientação de fa-zer fotos iguais às que os nossos faziam.Em qualquer acontecimento era assim.Se fazíamos uma foto, por exemplo, deum ventilador, eles disfarçavam iam láe faziam também. Muitas vezes, ferascomo o Rogério Reis, o Evandro Teixei-ra, o Ari Gomes, faziam fotos as maisesdrúxulas possíveis, que nada tinhama ver com a matéria, só pra gozá-los, e elescopiavam logo em seguida”.

Com coerência no encadeamento dosfatos, Sérgio Fleury revela ainda que aRádio JB noticiou muitos seqüestrospolíticos, como os dos embaixadores(pela ordem) norte-americano, alemãoe suíço em primeira mão, antes mesmoque a polícia soubesse, e garante que nãohavia nenhuma censura da empresa àdivulgação dessas notícias:

“Tínhamos total liberdade, não sofrí-amos nenhuma ingerência da direção.Nosso Departamento de Jornalismo,inclusive, sabia de muita coisa antesmesmo de a Polícia e do Dops saberem.O Dines sempre dizia:

“Escrevam tudo o que vocês viram”.Os seqüestros dos embaixadores são

um exemplo, soubemos antes, divulga-mos, porque recebíamos informações,provavelmente passadas pelo FernandoGabeira, que havia trabalhado lá. O pes-soal do Dops ficava doido, sem enten-der nada”.

Conta Fleury que muitas vezes as li-gações para a rádio ou o jornal vinhamem forma de códigos, que tinham que serdecodificados:

“Certo dia recebemos uma ligaçãotelefônica dizendo que deveríamos ir aIgreja do Sagrado Coração de Jesus, naRua Conde de Bonfim, Tijuca (ZonaNorte do Rio) e procurar uma carta cominformações valiosas dentro da caixa deesmolas. Fomos eu e o Ari Gomes. Acon-tece que chegamos lá na hora de umamissa e pensamos, caramba, como va-mos pegar a carta com toda essa genteaqui? Aos poucos fui me aproximandoda caixa, a retirei do lugar e, um tantoescondido atrás de uma coluna, fui ta-teando, tentando encontrar a carta, mashavia um cadeado atrapalhando. Espe-ramos então acabar a missa e inventei

Chefe de Reportagem do JB, Fleurysalienta o pioneirismo do jornal, como a

criação do Departamento de Pesquisa.

ANTO

NIO

BATALH

A

17Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

Em depoimento contundente, impreg-nado de emoção e sensibilidade, predica-dos que só poderiam coexistir em um re-pórter-fotográfico de talento e técnica,Rogério Reis conta sua chegada e vivên-cia, por vários anos no Jornal do Brasil:

“Centenas de fotografias de quase doismetros cada, distribuídas criteriosamentepelas paredes dos nove andares do novoprédio da Avenida Brasil 500, formavamuma solene galeria de fotos que discuti-am aspectos variados da condição huma-na e causavam um impacto premedita-do. Cada imagem era acompanhada pelonome do fotógrafo logo abaixo do qua-dro. Além de produzir encantamento eorgulho, a fotografia ali combinava comaquela arquitetura moderna.”

Rogério Reis continua sua narrativa: “Essa foi a percepção que tive ao

entrar pela primeira vez no Jornal doBrasil em 1977, como estagiário da Fa-culdade de Comunicação Gama Filho,levado pela crença de que trabalhar noJB era o sonho de todo cidadão ávido porliberdade. Romântico, não? Mas foi as-sim. Logo entendi que estava diante deum time de craques da imagem. A dire-ção da fotografia era do paraíbano Alber-to Ferreira, apaixonado pelo ofício e in-comparável na edição das grandes cober-turas. Trabalhar próximo aos experien-tes Campanella Netto, Rubens Barbosa,Antônio Teixeira, Ronald Theobald, Evan-dro Teixeira, Almir Veiga e Ari Gomes mefez ter uma base de entendimento domundo através da fotografia. Por issohoje não me arrependo de ter permane-cido no estágio durante um ano ganhan-do pouco.”

“No pior momento da repressão o JBfoi dirigido por Alberto Dines, que, deforma criativa e inteligente, soube due-lar com os censores e nos deixou um gran-de legado de resistência e combatividade.Creio que se fortaleceu aí um jeito de vere de mostrar fotos, um visor diferencia-do, inteligente e sutil, que gostava de sevingar da ditadura militar. O JB sempreestimulou seus fotógrafos no exercício dabusca de novos significados da imagem:Erno Schneider, com o seu distônico Jâ-nio Quadros de pernas trocadas (1962);Jair Cardoso, com a imagem do quepe doGeneral Danilo Venturini na cabeça doGeneral Figueiredo em traje civil, umailusão induzida pelo enquadramento so-breposto dos dois militares.”

“Quem não lembra da foto de Antô-nio Andrade sugerindo uma posturamendicante do Presidente JuscelinoKubitschek diante do Secretário de Es-tado americano, Foster Dulles (1958),todos bons exemplos de imagens diferen-ciadas porque são potencializadas peloolhar crítico do fotógrafo? Ou melhor,

“Saí antes que o cheiro docadáver ficasse insuportável”

Editor de fotografia do JB de 1991 a 1996, Rogério Reis viu logoao chegar ao jornal, em 1977, que estava diante de “um time decraques da imagem”. Quando a crise se aprofundou, ele tomououtra direção profissional, “com ajuda de um bom terapeuta”.

foram feitas e publicadas com a inten-ção de ironizar o contexto político. Oresultado tem o poder de síntese, críti-ca e humor da charge política. Isso era acara da fotografia do JB.”

“Olhando para o passado, posso di-zer que o time de fotógrafos do JB tra-balhou bem enquanto pôde. Prova dis-so é que ainda hoje se mantém recordistano Prêmio Esso de Jornalismo na cate-goria Fotografia. Cito aqui os três últi-mos ganhos pelos fotógrafos Luiz Mo-rier, Assalto a Turistas Estrangeiros na Flo-resta da Tijuca (1993); Michel Filho, Ti-roteio na Linha Vermelha (1995), ambasna minha gestão como Editor; e MarcoTerranova, Tiroteio no Calçadão de Ipa-nema em Pleno Domingo (1999).”

“Como todos sabem, essa curta e lon-ga história termina mal por má gestãoempresarial e disputa política. No iníciodos anos 80 chegaram os primeiros sinaisde fracasso. Nesse momento, parte dos

Um protesto na última ediçãoO fim do JB impresso foi marcado no

dia 31 de agosto por um protesto dedezenas de pessoas, que se reuniram naCinelândia, Centro do Rio, para lamen-tar o desaparecimento do diário no seu119º aniversário de vida. Eram jornalis-tas, a maioria ex-empregados do JB, re-presentantes de entidades sindicais e lei-tores de um jornal que chegou a ser umdos mais influentes do Brasil e ganhoudestaque com a postura corajosa emdefesa da democracia e das liberdades.

O empresário Nélson Tanure, detentordo direito de licenciamento da marca, pro-curou justificar a presença do jornal ape-nas na rede com um apelo ecológico:

Os custos econômicos e ambientaisdo papel são insustentáveis. São inclu-sive desnecessários. No primeiro ano daversão digital as áreas florestais preser-vadas corresponderão a 1.200 Maraca-nãs, disse Tanure, que calcula que cadaedição dominical impressa sacrifica 200árvores e consome 10 mil litros de águae 40 megawatts de energia.

A última edição impressa circulou deforma precária e se esgotou rapidamen-te. Algumas bancas não receberam umúnico exemplar. A circulação final de pou-co mais de 20 mil exemplares contrasta-va com a tiragem média, que costumavaultrapassar os 200 mil jornais diários.

Em seu último número, o jornal anun-ciou um artigo do Presidente Lula para

a primeira edição 100% digital, destacan-do que o projeto para o formato digitalfora apresentado na semana anterior aoSecretário de Comunicação Social daPresidência, jornalista Franklin Martins,que considerou o processo natural. “Háalguns anos pensava diferente. Não sa-bemos exatamente como será o futuro,mas acredito que, em 25 anos, mais oumenos, todos os jornais abandonarão opapel e vão se transferir para o meio di-gital,” disse Franklin.

A Presidente do Sindicato dos Jorna-listas Profissionais do Município do Riode Janeiro, jornalista Suzana Blass, ma-nifestou opinião contrária à do Ministro,durante o protesto na Cinelândia: “Nin-guém deve se conformar com o fim do Jor-nal do Brasil, porque a versão on-line doveículo só terá valor jornalístico se forproduzida por uma equipe constituídapor um número expressivo de jornalistasbem remunerados e qualificados.

Informou o Sindicato que, embora adireção do jornal informe que cerca de 100profissionais vão trabalhar na versão on-line, há informações de que a atual Re-dação foi reduzida a 25 profissionais,além dos cinco que trabalhavam nascolunas sociais. Nos 30 dias anteriores,um número equivalente de jornalistas foidemitido ou pediu demissão.

“O jornalismo online é uma incógni-ta e a tendência é que fracasse se for

produzido por apenas 20 ou 30 profis-sionais, sem nenhuma estrutura, comotodos imaginamos que vai acontecer”,criticou Suzana Blass.

Presente à manifestação na Cinelân-dia, o Deputado federal e jornalista Fer-nando Gabeira (PV), que chefiou o Depar-tamento de Pesquisa do JB, disse que acei-taria trabalhar de graça até que o novoveículo se firmasse financeiramente.

Norma Hauer, 85 anos, uma das maisantigas leitoras do Jornal do Brasil, ressal-tou a importância histórica do veículo:“Meu pai assinava o JB. Aprendi a ler fo-lheando as páginas do jornal. A versãoonline não é a mesma coisa. A perda paraos jornalistas será menor porque cada umdos ex-empregados pode ir trabalhar emoutros veículos no Rio de Janeiro, como ODia e o Extra. Mas nós leitores não temoscomo ir para outro jornal. Eu nunca pode-ria imaginar que o Jornal do Brasil fosseacabar um dia. Isso dói, é muito triste.”

As manifestações contra o fim da ver-são impressa do JB prosseguiram à noiteno restaurante Capela, na Lapa, duran-te o lançamento do livro Jornal do Brasil:Memórias de um Secretário. Pautas e fon-tes, do jornalista Alfredo Herkenhoff.

A partir de 1º de setembro, a leitura doJB na versão digital passa a ter conteúdoaberto. Para a leitura de matérias e infor-mações em todo o site o custo da assina-tura mensal é de R$ 9,90. (Claudia Souza).

nossos equipamentos de fotografia jánão era renovada e a palavra sucata co-meça a ser pronunciada. Como Editor deFotografia (1991-1996) passei apertos.Ao fim desse período, parte da nossaequipe de fotógrafos já comprava suaspróprias máquinas fotográficas parapoder trabalhar e suprir as deficiências

da empresa e não recebia aluguel nemcobertura de seguro por isso. Reconhe-ço o valor dos que lá ficaram, porém eu,não sozinho, mas com ajuda de um bomterapeuta, consegui apontar minha fo-tografia para outra direção antes que ocheiro do cadáver ficasse insuportável.”(Arcírio Gouvêa Neto)

DIVU

LGA

ÇÃ

O

Rogério lembraque o JB era orecordista devitórias do PrêmioEsso na categoriaFotografia, ostrês últimosconquistadospor Luiz Morier,Michel Filho eMarco Terranova.

18 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

Desde 23 de setembro está aberto eem funcionamento no Rio o Centro deCultura e Memória da Imprensa, cri-ado pelo Sindicato dos Jornalistas Pro-fissionais do Município do Rio de Janei-ro, com apoio da Petrobras, para preser-var a memória da imprensa brasileira apartir de um acervo constituído portextos, fotografias e vídeos produzidospor jornalistas, além de um programade memória oral com depoimentos dejornalistas. O material completo, queserá disponibilizado no site do projeto,está reunido num conjunto de salas doSindicato, no sétimo andar da Rua Eva-risto da Veiga, 16. O Centro colocará àdisposição dos usuários biblioteca, au-ditório, cursos e eventos.

Um dos espaços de destaque do Cen-tro é a Sala Joel Silveira, que reúne li-vros, fotografias e objetos do acervo dojornalista e escritor Joel Silveira (1918-2007), um dos grandes nomes do jor-nalismo brasileiro. Reunido ao longo davida do jornalista, o conjunto foi doa-do por sua família. Durante mais deseis décadas de atividade profissional,Joel Silveira acumulou passagens emdiversas Redações do País, ocupandovários cargos. Reconhecido como umdos precursores do jornalismo literário,Joel foi designado para a cobertura daSegunda Guerra Mundial junto à For-ça Expedicionária Brasileira-Feb, pelojornalista Assis Chateaubriand, donodos Diários Associados, do qual rece-beu o apelido de “A Víbora”, pelo esti-lo contundente.

Autor de mais de 40 livros, Joel Sil-veira assinou grandes reportagens,entre as quais as memoráveis Eramassim os grã-finos em São Paulo e A mi-lésima segunda noite da Avenida Paulis-ta, que lhe renderam premiações comoJabuti, Esso Especial, Machado de As-sis, Líbero Badaró, Golfinho de Ouro,entre outras. Ao falecer, em 2007, elefoi apontado pelo jornalista Villas-BôasCorrêa como o maior repórter da im-prensa do País em todos os tempos.

“Uma nova etapa”Dezenas de jornalistas prestigiaram

a solenidade de inauguração, entre osquais Maurício Azêdo, Presidente daABI, Domingos Meirelles, da Direto-ria da Casa, e os Conselheiros Pery Cot-ta, Presidente do Conselho Deliberati-vo da ABI, Arcírio Gouvêa Neto, Miro

Lopes e Mário Augusto Jakobskind;Adail José de Paula, membro do Con-selho Fiscal, e Carlos Di Paola, membroda Comissão de Sindicância.

A mesa de honra da cerimônia foiformada pelos jornalistas Suzana Blasse Rogério Marques, respectivamentePresidente e Diretor do Sindicato, Eli-zabeth Silveira e Rodrigo Silveira, filhae neto do jornalista Joel Silveira, eCarolina Rocha, representante da Pe-trobras, patrocinadora do Centro.

Na solenidade também foi lançadoo livro Memória de Repórter: Lembran-ças, Casos e Outras Histórias de Jorna-listas Brasileiros – décadas de 1950 a1980 (Verso Brasil) que apresenta em136 páginas depoimentos de 60 jorna-listas de diversas gerações, além defotografias e ilustrações que resgatama história do jornalismo brasileiro.

Na abertura do evento, a Presiden-te Suzana Blass destacou o papel doCentro para o jornalismo brasileiro:

“Hoje estamos inaugurando o Cen-tro, que é um projeto que vem aconte-cendo desde 2007. Uma nova etapacomeça a partir de agora que temosuma sede física, um site e material para

gerar produto, como publicação de li-vros, vídeos, material de pesquisa. Jun-tamos a ação sindical com a questão damemória para a reflexão do jornalismoque fazemos hoje em comparação como que era feito no passado. O Centroserá um espaço crítico importante paracontinuarmos a praticar um bom jor-nalismo, melhorando as condições detrabalho, a qualidade da informação,e a luta pela formação específica dojornalista.”

“Venda, mas não desmembre”Muito emocionada, Elisabeth Silvei-

ra pediu ao filho Rodrigo para ajudá-la a ler o seu discurso, no qual subli-nhou o cuidado de Joel Silveira com acoleção:

“É com muita alegria que, hoje, 23de setembro, quando meu pai faria 92anos, estamos aqui reunidos para estamerecida homenagem. Já doente, elesempre me dizia: Minha filha, faça oque achar melhor com a minha bibli-oteca, se quiser, venda; só lhe peço quenão a desmembre. Comentava comoera triste ver livros autografados devários amigos nas calçadas, vendidosa qualquer preço. Conversei com meufilho e decidimos pela doação; afinalaqueles livros significavam a vida dele.Depois de várias conversas com Gene-ton Moraes Neto, que me apresentoua Rogério Marques, foi plantada a pri-meira semente. Surgiu a idéia de doar-mos ao Sindicato dos Jornalistas Pro-fissionais do Município do Rio de Ja-

neiro, que criaria o Centro de Culturae Memória do Jornalismo. Agradeço ocarinho e perseverança de todos paraque pudéssemos chegar a esta festa.Peço uma salva de palmas a ele e a to-dos os seus amigos, que certamenteestarão cantando parabéns lá em cima.”

Rogério Marques lembrou que oprojeto do Centro foi sugerido por Ge-neton Moraes Neto, que teve longa con-vivência com Joel Silveira:

“A idéia nasceu pouco depois do fa-lecimento do Joel Silveira, com Gene-ton Moraes Neto, que foi amigo do Joelaté os seus últimos dias. Além de ami-gos, os dois escreveram juntos algunslivros. Ao saber que o Sindicato iria terum Centro de Memória, Genetonachou que o próprio Joel gostaria queseu acervo ficasse por aqui, entre com-panheiros de profissão. A proposta foilogo abraçada pela Beth Silveira, queteve o apoio do seu irmão Joel e de seufilho Rodrigo. A presidente do Sindi-cato dos Jornalistas, Suzana Blass, vi-brou com a idéia, assim como toda aDiretoria, e nem poderia ser diferente:todos nós conhecemos e admiramosJoel desde muito jovens, através desuas reportagens.”

Rogério destacou ainda o valor his-tórico da coleção organizada por JoelSilveira:

“Além da farta literatura relaciona-da à Segunda Guerra Mundial, na qualo sergipano Joel Silveira esteve comocorrespondente dos Diários Associa-dos, a biblioteca do nosso Joel é com-

Um Centro para cultivara memória da imprensa

Sindicato dos Jornalistas instala instituição de pesquisa quecomeça com o acervo precioso de Joel Silveira (1918-2007),

considerado o maior repórter da imprensa brasileira.

POR CLAUDIA SOUZA

DOCUMENTAÇÃO

Foi de Geneton de Moraes Neto,amigo de Joel Silveira, a idéia de incorporar

seu acervo ao Centro de Memória.

FRAN

CISC

O U

CH

A

Além de uma biblioteca com 5 mil volumes, Joel Silveira reuniu preciosa coleção dedocumentos, cartas, fotografias e dedicatórias carinhosas de seus contemporâneos.

CAM

ILLA MAIA/AG

ÊNC

IA O G

LOB

O

19Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

Além das coleções de JoelSilveira e Evandro Teixeira, oCentro já recebeu materiais dojornalista Marcelo Beraba, quedoou sua coleção pessoal dosjornais Movimento e Opinião, quecircularam na década de 1970 e sedestacaram na luta em defesa dademocracia e das liberdades deimprensa e de expressão. Ojornalista André Motta Limatambém contribuiu com livros eperiódicos antigos. O acervo jáconta com 180 horas dedepoimentos de profissionais daimprensa gravados em vídeo emestúdios no Rio de Janeiro e emSão Paulo.

Já foram entrevistados peloCentro de Cultura e Memória deJornalismo Alberto Dines, AlbertoJacob, Álvaro Caldas, Ana ArrudaCallado, Arthur Poerner, AudálioDantas, Augusto Nunes,Bartolomeu Brito, Bertoldo deCastro, Carlos Alberto Caó, CacoBarcelos, Carlos Lemos, CíceroSandroni, Clóvis Rossi, DácioMalta, Domingos Meirelles,Evandro Teixeira, FernandoSegismundo, Ferreira Gullar,Flávio Damm, Fritz Utzeri, FuadAtala e George Vidor.

Também gravaram entrevistasGermana de Lamare, HenriqueCaban, Israel Tabak, Jorge deMiranda Jordão, José HamiltonRibeiro, Jânio de Freitas, JoséLouzeiro, Lan, Luarlindo Ernesto,Luís Edgar de Andrade, LuizAlberto Bettencourt, Luiz CarlosSaroldi. E ainda: Luiz Garcia, LuizMendes, Marcelo Beraba, Marcosde Castro, Maria Ignez DuqueEstrada Bastos, Mário Morel,Maurício Azêdo, Milton Coelho daGraça, Murilo Melo Filho, MyltonSeveriano, Oliveiros Ferreira,Otávio Frias Filho, Ozéas deCarvalho, Pedro do Coutto, Percivalde Souza, Pery Cotta, RenatoPompeu, Ricardo Kotscho, RobertoMüller Filho, Sandra Passarinho,Sérgio Cabral, Thomaz SoutoCorrêa, Villas-Bôas Corrêa, WilsonFigueiredo e Zuenir Ventura (foto).

“Seu Silveira,não me morra.Repórter é paramandar notícia,

não para morrer.”

Após o encerramento da solenidade,os convidados visitaram as dependên-cias do Centro. Vários deles salientarama importância da criação da instituição.Na opinião de Maurício Azêdo, o Cen-tro vai contribuir para uma das áreasmais carentes no campo da comunica-ção: “A criação e o funcionamento doCentro de Cultura e Memória do Jorna-lismo são muito importantes, porqueum dos setores da vida nacional quemais carece de documentação e organi-zação da documentação existente é osetor de jornalismo e comunicação.Toda iniciativa neste sentido é necessá-ria e bem recebida e folgo em ver que es-tamos diante de instrumento instituci-onal que vai ter a eficácia desejável nadireção da documentação da vida dosjornalistas e da imprensa do País.”

Geneton Moraes Neto aplaudiu ainiciativa e lembrou a responsabilida-de do jornalista na produção da memó-ria da imprensa e do País:

“Uma das principais funções do jor-nalista é produzir memória. Passamosa vida inteira testemunhando os fatos,conhecendo personagens, produzindomemória. Com alegria vejo aqui duascoisas que se completam: jornalistaproduzindo memória e o Sindicato dosJornalistas preservando esta memória.Tive o privilégio de ter uma convivên-cia íntima com o Joel Silveira ao longode 20 anos. Tenho certeza de que ele fi-caria felicíssimo em ver que todas ascoisas que reuniu não ficarão dispersas,estão fisicamente presentes aqui. Es-pero que esta seja a primeira sala demuitas outras dedicadas ao jornalis-mo e à preservação da memória da im-prensa. Tomara que seja lançada umacampanha nacional para a preservaçãoda memória do jornalismo, já que elanão é apenas a memória dos jornalis-tas, é a memória do País. Só faria bemao Brasil e ao Jornalismo.”

Primeira mulher a assumir o cargode chefe de Reportagem no Brasil, a jor-nalista Ana Arruda Callado sugeriu aampliação do projeto de memória paraoutros Estados:

“Esta iniciativa é fundamental. Achoque a imprensa brasileira dá 500 cen-

posta por cerca de 5 mil livros, de clás-sicos da literatura mundial a autoresbrasileiros contemporâneos, documen-tos, fotografias e manifestações decarinho ao Joel, externadas pela natada cultura brasileira do século passadoe do atual, na forma de cartas, bilhetes,dedicatórias e caricaturas de artistasgeniais como Nássara e Augusto Rodri-gues. Esse riquíssimo material será degrande utilidade para a pesquisa de to-dos, inclusive dos jovens estudantes deJornalismo, que o Joel recebia com omaior carinho em seu apartamento, emCopacabana, sempre que solicitado. Aopesquisar aqueles documentos essesjovens entenderão a responsabilidadeque os aguarda, de ser um jornalista,ou mesmo de ser um repórter como foiJoel Silveira ao longo de toda a sua vidaprofissional.”

tros de memória. Existe, inclusive, aRede Alfredo de Carvalho, da qual façoparte desde o início. Quanto mais tra-balhávamos e nos reuníamos em semi-nários e congressos, mais surgiam temasrelacionados à memória, sobre jornais,revistas e outros veículos maravilhososque desapareceram. É preciso que existaum Centro de Memória em cada cida-de brasileira. A ABI já faz um pouco isso.Quando a iniciativa de preservação par-te do sindicato de nós jornalistas, temum sentido diferente. Aquele que vaipara a rua batalhar pela notícia é quemdeve contar esta história.”

Mestre do fotojornalismo brasilei-ro, com mais de cinco décadas de ati-vidade na imprensa, Evandro Teixeiraé um dos incentivadores do resgate daHistória da Imprensa brasileira.

“Esta idéia brilhante já deveria tersido concretizada há muito tempo. Es-pero que as pessoas entendam quedevem fazer as suas doações para esteque será o verdadeiro centro da nossamemória, da memória do jornalismobrasileiro. Eu já estou fazendo partedeste Centro e pretendo reunir maisdoações. Estou organizando os meusarquivos e, futuramente, enviarei ou-tra documentação. Todos nós estamosde parabéns.”

No final de seu discurso,Rogério Marques recordou aexperiência de Joel Silveira nacobertura da Segunda GuerraMundial e citou um trecho dolivro Inverno na Guerra, que ojornalista escreveu sobre oconflito.

“É conhecida, e virou folclore,a advertência que o dono dosDiários Associados, AssisChateaubriand, fez a JoelSilveira às vésperas doembarque: “O senhor vai para aguerra, mas não me morra, seuSilveira, não me morra! Repórteré para mandar notícias, não paramorrer! Com apenas 26 anos, omais jovem correspondente deguerra brasileiro cumpriu aordem de Chateaubriand,felizmente, mas pagou um preçomuito alto. Diz ele, no livro:

“A guerra não foi um passeio.(...) A guerra é cheia de truques,todos nojentos. E um dos maisnojentos é fazer que alguém,que com ela conviveu durantemeses, acabe sendo condicionadopor ela. Por isso é que naquelesdias, véspera de voltar paracasa, eu sentia que não foraapenas a guerra que haviaacabado, mas também umaparte do que eu era antes dechegar à Itália. Por isso é que eucostumo dizer que cheguei àItália com 26 anos e voltei com40. A guerra, repito, é nojenta. Eo que ela nos tira (quando nãonos tira a vida) nunca mais nosdevolve.”

Quem doou,quem gravou

Jornalista produza memória alheia

Nas 180 horas de depoimentos já tomados pelo Centro de Cultura e Memória figuramos do repórter Domingos Meirelles (à esquerda) e do fotógrafo Evandro Teixeira.

Ana Arruda, primeira mulher a exerceruma chefia de Reportagem, defende a

criação de 500 centros de memória.

RENATO

VELASQ

UES

FRAN

CISC

O U

CH

A

FRAN

CISC

O U

CH

A

FRAN

CISC

O U

CH

A

20 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

A censura não tem graça alguma. Por isso mesmo,foi com indisfarçável sorriso de vitória que humoris-tas de todo o País receberam a notícia da derrubadada disposição legal que os proibia de falar sobre po-líticos durante o período eleitoral. Por maioria, o Ple-nário do Supremo Tribunal Federal referendou a li-minar concedida pelo Ministro Carlos Ayres Britto,no dia 26 de agosto, na Ação Direta de Inconstituci-onalidade nº 4.451. Em julgamento realizado em 2de setembro, os ministros suspenderam o inciso II ea parte final do inciso III do artigo 45 da Lei Eleito-ral (Lei nº 9.504/97), liberando a veiculação de sáti-ras e manifestações de humor contra os políticosdurante as eleições.

A liminar foi pedida pela Associação Brasileira deEmissoras de Rádio e TV-Abert, que em 25 de agos-to ajuizou ação questionando o artigo 45 da Lei Elei-

toral, segundo a qual “é vedado às emissoras de rá-dio e tv, em sua programação normal e noticiário, usartruncagem, montagem ou outro recurso de áudio evídeo que, de qualquer forma, possam degradar ouridicularizar candidato, partido ou coligação. As emis-soras também não podem produzir ou veicular pro-grama com esse efeito”.

Embora a solicitação para a derrubada da censu-ra ao humor tenha partido da Abert, a reação às res-trições teve início, e ganhou repercussão, não exata-mente nos tribunais, e sim na mídia. Tudo graças aospróprios humoristas.

“Fiquei surpreso quando li sobre essa disposiçãoabsurda em uma reportagem de jornal que, além danotícia em si, trazia os depoimentos de alguns cole-gas, todos em tom de lamentação e de resignação, comose essa fosse uma batalha perdida. Logo pensei, comoassim? Decidi reunir essas pessoas, mobilizar a clas-se. Liguei para vários humoristas, de todas as tendên-cias, formas de expressão e emissoras de tv, e a ade-são à causa foi total e imediata. Percebi, de cara, que oque faltava mesmo, naquele momento, era somentealguém que, de forma neutra, pudesse puxara manifestação”, conta Fábio Porchat.

A partir daí, teve início o ‘HumorSem Censura’, movimento da classeque culminou com uma grande pas-seata na Praia de Copacabana, no dia22 de agosto.

“Acho que, de uma maneira infor-mal, nós conseguimos mobilizar aprópria Abert, para que ela tomas-se as medidas judiciais possíveis, queterminaram por alterar a lei e devol-ver a nossa liberdade de atuação.Para isso, é claro, foi importante aunião inédita da classe, com a par-ticipação uníssona de grupos de te-atro, como o Comédia em Pé e dosprogramas de humor na televisão,como Casseta & Planeta, ComédiaMTV, CQC, Pânico na TV e Zorra To-tal. Também foi fundamental, paranos ajudar a fazer ‘barulho’, a cober-tura da mídia, dos jornais. Para você

ter uma idéia, cheguei a dar entrevistas sobre esse epi-sódio até para veículos internacionais, como a Reu-ters e a CNN”, destaca o humorista, Redator da TVGlobo e que em outubro estréia o programa Junto eMisturado, na mesma emissora.

União inédita“Mais que seu resultado imediato, a importância

maior deste momento foi justamente ter ocorridoessa união. Uma mobilização de humoristas é algoraro. Creio que a proibição eleitoral foi tão desme-dida e descabida que conseguiu até isto: dar umabandeira à classe que geralmente prefere, ao invés decarregar bandeiras, rir delas. E aí os humoristas, pornão poderem fazer piadas, piaram. Essa lei atirounuma regulamentação de possíveis utilizações par-tidárias por conglomerados de imprensa. Mas, devidoà mão pesada e ao chumbo grosso, acabou acertan-do na liberdade de expressão do jornalismo e na li-

A insubordinação dos humoristaschamou a atenção para a censura

que estava sendo imposta e ajudoua derrubar a disposição da legislação

que restringia o trabalho delesdurante o período eleitoral.

MOBILIZAÇÃO

Por umaeleição commais graça

POR PAULO CHICO

O cartunista Nani fez o cartaz do movimento mas foimuito criticado pelas charges que publicou em seu blog.

CHARGE PUBLICADA NO JORNAL A TARDE, DE SALVADOR.

21Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

berdade de criação dos humoristas”, avaliaRicky Goodwin, jornalista e desenhista espe-cializado em humor, e Redator do programaCasseta & Planeta Urgente, da TV Globo.

Para Ricky, a restrição ao trabalho dos humoristasignorava a importância do humor não apenas para avida cultural do País como um todo, mas para o pró-prio meio político. “O humorista tem um papel im-portantíssimo na sociedade: ele é o menino que cor-re em meio à parada real gritando que ‘o rei está nu!’.Decodifica o discurso dos candidatos. O humor fun-ciona como uma legenda que mostra o que realmenteos candidatos estão dizendo, como estão agindo,como um vento que levanta os véus da empulhação.E a lei ignorava a tradição do humorismo na políticabrasileira, principalmente no decorrer das campanhaseleitorais, desde o tempo do Império. Quando não sepode fazer piada com a política, corre-se o risco de apolítica tornar-se uma grande piada. Sem a mínimagraça”, diz Ricky.

Mesmo com a derrubada da restrição, os humoris-tas saíram prejudicados nestas eleições? “O que maisestá prejudicando os humoristas é a concorrênciadesleal promovida pelos candidatos e seus pretensospartidos políticos. Querem ser mais engraçados do queos humoristas! Estão fazendo mais palhaçadas do queos palhaços! No programa de humor onde escrevo,muitas vezes criamos situações cômicas que nósmesmos consideramos absurdas, para então descobrirque já existem na vida real. Mas os políticos não le-vam jeito para a coisa. Não é assim que funciona ohumor. Quem deve rir é o público. Com a casta polí-tica ocorre o contrário. Eles é que riem da nossa cara”,compara Ricky, que não tem visto a menor graça nascampanhas e no horário eleitoral obrigatório.

“Mais do que uma eleição sem riso, essa é um elei-ção sem siso. Os candidatos não têm juízo. No sen-tido mesmo da palavra, que é ‘estabelecer relaçõesentre conceitos’. Juízo de valores. Alega-se que oshumoristas desmoralizam a política, mas são os can-didatos que não levam suas campanhas a sério. Nãoaprofundam as propostas, não discutem questõesrealmente necessárias. Querem servir bolos só feitosde glacê, sem conteúdo. Aliás, é preciso relativizar essaliberdade devolvida aos programas humorísticos.Vejo-a com ressalvas. Saímos do pelourinho, há maisespaço para se movimentar com as correntes, mas eunão chegaria a falar exatamente em ‘liberdade humo-rística’ neste momento no Brasil. Imagine, por exem-plo, se aqui pudéssemos praticar o humor que se vênos programas de tv satíricos americanos... Outrasnormas rígidas persistem. Há os riscos de processospesados... A arrogância, tão peculiar às autoridadesbrasileiras, manifesta-se fortemente em relação às

críticas humorísticas. Elas são cheias de não-me-to-ques e não-me-gozes”, conclui Ricky Goodwin.

Fábio Porchat concorda com o colega. “Mesmoapós a concessão dessa liminar e a derrubada dasrestrições pelo Supremo, ainda custamos a entender,na prática, a situação em que nos encontramos. Nósnão sabemos, ao certo, até onde podemos ir. Sinto quea classe toma certos cuidados. Teme, por exemplo, seralvo de multas ou de processos judiciais”, diz ele, queprovoca: “Certamente, perdemos muitas boas piadasno início do processo eleitoral, enquanto estávamosimpedidos de explorar esses personagens políticos.Essa eleição só não é totalmente sem graça porquenós temos, na disputa pela Presidência da Repúbli-ca os mais feios candidatos do mundo.”

Chata, feia; boba e burra“A censura é chata, feia, boba e muito, muito bur-

ra. A cobertura sobre a restrição ao trabalho dos hu-moristas pode, sim, ter ajudado a mudar a lei. Mas,jornalismo, mídia e humor nem sempre são bonscompanheiros. Eu fui muito censurado em algunsjornais onde trabalhei.... Ou seja, boa parte da mídiaconfunde ‘liberdade de expressão’ com ‘liberdade damídia se expressar’. Ela, e até alguns coleguinhas, porvezes merecem uma ‘chargeada’. Faço charges sobreo Executivo, o Legislativo, o Judiciário. E por que nãosobre o ‘quarto poder’? Ele é tão poder quanto osoutros, tem tantos interesses quanto os demais. E,ao contrário dos outros, pode censurar. E o faz, mui-tas vezes simplesmente ignorando a tal ‘liberdade deexpressão’. O Judiciário também, de certa maneira,‘pode’ censurar, e o tenta através da lei... Vimos aí uma

tentativa. Mas leis estúpidas acabam revogadas”,pondera o cartunista Aroeira.

Para ele, que atua no jornal O Dia, a eleição tevemomentos hilariantes. Algumas vezes por talento doshumoristas. Em outras ocasiões, por conta dos can-didatos mesmo. “Ver um Serra pitbull e a Dilma nacadeirinha não tem preço... Não, nós não fomos pre-judicados. E gostaria que o Serra me explicasse por-que ele prefere um Estado mais ágil, porém mais fraco.E que a Dilma me contasse porque prefere um Esta-do mais lento, porém mais parrudo. E que o Plíniome descrevesse o mundo lá do século XIX, ou que aMarina me explicasse o Criacionismo. Isso só pracomeçar. E a reforma política, como será? E assim pordiante... E o que eu vi de positivo nos debates? Sólama. Argh”, detona Aroeira.

O veemente La PeñaEm um dos artigos mais contundentes contra as

restrições ao humor no período eleitoral, Hélio de LaPeña, do Casseta & Planeta, escreveu:

“Deixar o humor de fora do processo eleitoral nãoeleva o nível das campanhas, não esclarece a popula-ção e não torna nossos políticos mais respeitáveis. Pelocontrário, enfraquece o debate, tira a corrida presidencialdas conversas nas esquinas e nos cafés das empresas.Impede o candidato de rir de si e, quem sabe, corrigir orumo da campanha. Não estamos lutando pelo direitode difamar ou ferir a honra de ninguém, mas amorda-çar nossos candidatos ‘Dilmandona’, ‘José Careca’ e‘Magrina da Silva’ é um gol contra a democracia”.

La Peña saiu em defesa também dos colegas deoutros programas de humor:

“Eu acho patético impedir quea Sabrina Sato, do Pânico na TV,convença os presidenciáveis adançarem o ‘rebolation’, ou proi-bir que o CQC utilize recursosgráficos para nos fazer rir dospolíticos. Definitivamente, não éesta a forma de conscientizar oeleitorado sobre a importância dopleito. O público conhece os pro-gramas humorísticos, se identifi-ca com eles e sabe quais são suaspropostas. Cabe ao políticos apre-sentar as suas com seriedade, deforma que o povo não as confun-da com as dos humoristas.”

Colaboraram nesta matéria oscartunistas Nani (www.nanihumor.com);Simanca, do jornal A Tarde(www.oferraodohumor.com); Rico(www.ricostudio.com.br); Aliedo(aliedo.blogspot.com) e Son Salvador.

CHARGE PUBLICADA NOS JORNAIS O VALE, DE SÃOJOSÉ DOS CAMPOS E COLETIVO, DE BRASÍLIA-DF

22 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

O biturbo Bandeirante sacoleja vio-lentamente a mais de 900 m de altura,parecendo um pássaro frágil e doente,perdido em meio à fumaçabranca e venenosa que sobedas terras negras: o Brasilestá em chamas...

Deixamos para trás o Riodas Mortes e infletimos, len-tamente, sobre a Serra doRoncador mas no horizontejá não se desenham montanhas azula-das. Nem sequer há horizontes: só fuma-ça, fumaça, fumaça...

Daquelas alturas o vasto PlanaltoCentral, já em transição para a florestaamazônica, parece uma grande massamorta, petrificada. Observadas do alto,entre a neblina seca e cega, as serras seacachapam, perdem o relevo e até mes-mo os rios pertencem ao reino das imo-bilidades. Somente o véu – transparen-te e opaco – da fumaça determina asdistâncias. Do alto eu sei que as manchassangrentas de fogo manchando o lençoldas cinzas são flores traiçoeiras...

Elas indicam a passagem dos ventos. Equando sopra o vento é que o fogo se alas-tra. Então os sertões ardem de vez – tor-cidos e retorcidos como as tripas do demô-nio – labaredas que viram chamas, fogoque vira fogaréu. É o grande incêndio quese alastra, incontrolável e indomável, so-bre as terras de dentro – “the backlands”.

É voando que se vê o verde da flores-ta virar deserto. Verde-folha agora é ver-melho-e-negro. O deserto parece um vas-to mar de fogo: sobrevoamos Be-Ra-Zil,capital mundial da devastação e do cri-me de ecocídio.

Grandes queimadas: visões. Tenebro-sas visões de planalto e planícies casti-gadas pelo machado de pedra do tempo.Terras ignotas, até há pouco em estadode selvageria brutal, território livre doshomens nus, de repente nada mais sãopouco mais que cinzas nos tristes trópi-cos. Árvores seculares, gigantescas e jácalcinadas emergem das areias de cinzas,dando a sensação de que algo misterio-so ali um dia existiu, antes de desabarpara sempre sobre suas próprias entra-nhas infernais, envolvidas sobre a bar-ba escaldante de Ucaí – o diabo do fogodos índios. Afogadas em suas lavas quen-tes, viscosas, frias, mortais...

Voando num pequeno avião, perdidono vasto território das nuvens de fumaçada destruição, eu penso: “Teremos, nósbrasileiros, o direito de destruir de talmaneira a natureza, que é patrimônio da

Sul do País se lavram as magníficas pas-tagens naturais de capim nativo paraplantar “Pinus eliotti”.

Aliás, todos esses capins que são plan-tados na Amazônia depois das queima-das são importados da África. O “colo-nião”, as “branquiárias”, tudo vem defora – o que concorrerá ainda mais paraalterar nosso meio ambiente, criandonovas espécies de pragas e invasoras.

Com o fogo, o ecossistema inteiro ficacomprometido. Destroem-se variedadesdo mundo animal, ninhos de pássaros, mi-crofauna, microflora. Finalmente chega-rá a desertificação. Até o húmus da terraé consumido, com temperaturas abrasa-doras de centenas de graus ao nível do solo.

Os Estados Unidos derrubaram cer-ca da metade de sua área arborizada.Calcula-se que na América do Norte exis-tiam 365 milhões de hectares de flores-tas, com mais de mil variedades deárvores. De tudo issorestam hoje 18 mi-lhões de hectares comcobertura de 262 varieda-des de árvores.

Nas zonas intertro-picais da África,onde as plantaçõesindustriais visam obter o máxi-mo de lucro num mínimo de tem-po, a regressão da floresta é rápi-da e o empobrecimento do solo ful-minante pela ação de grandes chuvase até pela exportação de produtos (to-ras, grãos, minerais) que levam para o ex-terior matéria orgânica ou componentesquímicos extraídos do próprio solo.Basta dizer que a floresta em Gana, hoje,ocupa só 15% do território. No Quêniae Tanganica restam apenas 2 por centoda cobertura original da mata. Na Amé-rica do Sul, a devastação da floresta dearaucárias é irreversível, pois são árvo-res de crescimento muito lento. NaColômbia devastaram as encostas dosAndes. Sobre a Ásia, nem falar: restammenos de 10 por cento da cobertura flo-restal da China e Índia...

O ritmo das derrubadas é cada vez maisrápido. Há pouco, ainda se utilizava ma-chado individual para cortar árvores. Hojeas motosserras, ou tratores que arrastamcorrentes ou até tratores de lâmina e es-teiras de ferro arrancam-se e depenammilhares de árvores em questão de horas.Quanto ao fogo, é utilizado só depois daderrubada – na estação de seca – pois a flo-resta tropical não queima, quando em pé.

O fogo afasta a possibilidade de rege-

neração da mata, ao agir diversamentesobre as diversas espécies vegetais. Asgramíneas perenes, com vigorosos siste-mas radiculares, sobrevivem. As espécies“pirófitas” são favorecidas. As árvorescom tronco de madeira desaparecem.

Como a floresta obedece às leis gené-ticas de equilíbrio entre espécimes ma-chos e fêmeas (com a necessária polini-zação), a partir de determinado númeroas espécies não mais se reproduzem na-turalmente e as associações vegetais en-tram em colapso. Além da alteração quan-titativa, ocorre a alteração qualitativa.

Com a diminuição das espécies vege-tais, altera-se até o clima e pode se de-sencadear o processo de desertificação.Basta dizer que na Amazônia, por exem-plo, cerca de 70 por cento da chuva ja-mais atingem o solo, permanecendo aágua nas folhas e galhos das árvores. Ób-

vio que com desma-tamento as enxurra-

das, o assoreamento ea evaporação tendem a au-

mentar muito.O desflorestamento influirá tam-

bém na composição da fauna, fazen-do desaparecer todos os animais

que se alimentam de ve-getação silvestre, mas fa-

cilitando o aparecimentode pragas que se alimentam de

gramíneas: cigarrinhas, gafanhotos etc.Como não há rede de transporte or-

ganizada (na Amazônia) e a própria ex-ploração da madeira demanda tempo,tudo é consumido pelo fogo e transfor-mado em cinzas. Até mesmo espéciesnobilíssimas de madeira de lei, que po-deriam ser utilizadas para fabricar mó-veis, na construção civil e inúmerasoutras utilidades.

O fogo, quando utilizado na savana,no campo (como se faz há séculos nopampa sulista), pode conduzir ao esta-belecimento de pastagens estáveis, poisas gramíneas nativas protegem-se, e sãoregenerativas. Quando utilizado sobrea mata virgem, é criminoso.

A região amazônica tem inúmerosaproveitamentos econômicos altamenterentáveis, sem queimar matas: muitomais rentáveis, aliás, que o incêndio.

Entre eles a exploração racional de ma-deiras e seu replantio, a criação da maiorpiscicultura fluvial do mundo, a plantaçãode cacau, seringueira, guaraná, que exi-gem a manutenção da floresta circulante.

Brincando de queimar o mundoAMBIENTE

POR PAULO RAMOS DERENGOSKI humanidade?” As gerações do futuroresponderão...

O primeiro semestre no Brasil é a épocada derrubada das grandes árvores da flo-resta amazônica e do cerradão confinan-

te. As terras de dentro estãoencharcadas pelas águas dasgrandes chuvas de verão. Issofacilita o trabalho dos gigan-tescos tratores de esteiras emotonivelamento que arran-cam a vegetação pela raiz, es-traçalhados os troncos mais

grossos, despedaçando a galharia arras-tada por pesadas correntes. Feita a sala-da, como nas velhas receitas da vovó (ouseria do Tio Sam?), é só deixar secar...

O segundo semestre é a época dasqueimadas! A terra já estará seca e o en-tulho vegetal em ponto de combustão.Mas se ainda restar algo verde, bastaespargir sobre ele, em aviões agrícolas,algum desfolhamento químico qualquer– desses que se compram nas lojas agro-pecuárias sem receituário. E se ainda nãofor suficiente, sobre os monturos restan-tes mete-se o lança-chamas!

Lentamente o foguinho se transforma-rá em chama, em labareda, em fogaréu.

Aí vem a primeira network televisivae faz (de avião) a reportagem a cores. Osecologistas voltam a entrar em cena.Entidades internacionais protestam.Explode uma capa de revista. Cientistasadvertem o efeito-estufa. Velhos entre-guistas dizem que agora “a Amazônia énossa”. Tudo em vão. Até que a florestadesapareça sob as cinzas da devastação,envolta pela baba escaldante de Ucaí, odeus do fogo dos índios. E se cumpra aprofecia: o que já foi mar e um dia se trans-formou em sertão – voltará a ser mar. Ver-de mar-morto. Sob ele está enterrado,numa curva qualquer do grande rio quedescia dos Andes, o nosso coração.

Voando num pequeno avião perdidono vasto território das nuvens de fumaçada destruição, penso: – “Teremos nós(brasileiros) o direito de destruir de talmaneira a natureza, que é patrimônio dahumanidade?”

Cientistas provam: as queimadas sãomais prejudiciais em terrenos dobrados –por facilitarem a erosão – do que em áreasplanas. Mas os predadores nem isso sabem...

Iludem-se os que acham que o homemum dia reconstruirá tudo aquilo que hojeestá sendo destruído: o fogo afasta todae qualquer possibilidade de regeneraçãodas florestas.

Parece mentira que se destrói a mai-or floresta tropical do mundo, na Ama-zônia, para plantar capim – enquanto no

Paulo Ramos Derengoski, jornalista e sócio da ABI,é radicado em Lages, SC, sua terra.

ENTERREMMEU CORAÇÃONAS CINZAS DA

AMAZÔNIA.

UC

HA

23Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

HISTÓRIA

A Gazeta do Rio, nosso começo, aquiO 10 de setembro marca o aparecimento do primeiro jornal impresso

no Brasil, que circularia até o último dia do ano da Independência.

POR CLAUDIA SOUZA

Revistasfeministas

sobem 15,5%

MERCADO

MensagensMensagens

“Caringi fará muita falta”

A introdução da imprensa no País émarcada pela fundação, em 10 de se-tembro de 1808, da Gazeta do Rio deJaneiro, primeiro periódico editado noBrasil, a partir da institucionalizaçãoda Impressão Régia. Lançado comoinstrumento dos interesses monárqui-cos, o jornal garantiu a circulação deidéias, notícias e publicações, até entãocensuradas, viabilizando o espaço paraa crítica e o desenvolvimento dos pa-drões que selaram a história da impren-sa nacional.

Fundado em 10 de setembro de 1808,o primeiro jornal editado e impresso noBrasil, a Gazeta do Rio de Janeiro, com-pleta dia 10 de setembro 202 anos decriação, um marco na História da im-prensa brasileira, que surgiu por decretodo príncipe regente Dom João, em 13 demaio de 1808, a partir da ImpressãoRégia, cujo objetivo era publicar os atosoficiais do Governo que se instalou noRio de Janeiro em 7 de março de 1808.Até então, era proibido aos súditos ocontato com publicações.

"Ao desembarcar no Brasil em 8 demarço de 1808, Dom João começou atomar as providências para o estabele-cimento da tipografia. Em 13 de maiode 1808, data de seu aniversário, auto-rizou a criação da Impressão Régia,aproveitando os tipos e prelos que de-sembarcaram com a Família Real", con-ta a Professora Cybelle de Ipanema,Presidente do Instituto Histórico eGeográfico do Rio de Janeiro-IHGRJ,e 1ª Secretária do Instituto Históricoe Geográfico Brasileiro-IHGB.

A Impressão Régia foi inaugurada nopavimento térreo da casa nº 44 da Ruado Passeio, no Rio de Janeiro, na residên-cia do Conde da Barca, título criado pordecreto de 27 de dezembro de 1815, daRainha Dona Maria I de Portugal, emfavor de Antônio de Araújo Azevedo,diplomata, cientista e político.

"O Conde da Barca tomou a iniciati-va de trazer de Portugal o equipamen-to que se transformou na nossa primeiratipografia, de onde saiu, em 10 de setem-bro de 1808, o primeiro jornal impres-so do Brasil, que vai durar até 31 dedezembro de 1822", destaca Cybelle.

Com dois prelos iniciais e 28 caixas detipos, que vieram a bordo da nau Medu-sa, foram iniciados os trabalhos de im-pressão oficial no Brasil, como as primei-ras leis, alvarás, cartas-régias, congratu-lações, odes, atos episcopais, orações ecompêndios literários. Quatro meses de-pois da fundação, saía de suas oficinas oprimeiro jornal impresso no Brasil.

Publicado duas vezes por semana, ojornal oficial apresentava assuntos deinteresse do Governo, como os confli-tos napoleônicos, e a manutenção dasrelações entre Brasil, Portugal e a Ingla-terra. A Gazeta do Rio de Janeiro tambémchegava aos portos lusitanos e ingleses.

O conteúdo do jornal era editado ecensurado pelos diretores do periódi-co, de estrita confiança do Rei. Apesar

da censura, com o passar do tempo ojornal passou a interagir com o cotidi-ano da cidade e adotou padrões queorientaram o desenvolvimento daimprensa brasileira.

"Foi possível difundir as letras, idéi-as, notícias do mundo inteiro. Comoanteriormente havia a proibição deimpressos no Brasil, as notícias chega-vam de forma clandestina. A partir daGazeta, foram liberadas. Seus três reda-tores foram Frei Tibúrcio José da Rocha,o baiano Manoel Ferreira de AraújoGuimarães, e, no último período, outroreligioso, Francisco Vieira Goulart."

A Presidente do Instituto Históricoe Geográfico do Rio de Janeiro contaque, os jornais do século 19 eram muitograndes, de difícil manuseio. Já a Ga-zeta tinha apenas 19 centímetros dealtura e quatro páginas. As primeirasdedicadas às notícias da cidade, daCorte, da Família Real, e às matériastraduzidas de jornais estrangeiros. Naúltima página eram publicados osanúncios. Ao longo dos anos, o perió-dico cresceu e chegou a rodar com seisou oito páginas, além de encartes compublicações de terceiros e edições ex-traordinárias, sublinha Cybelle.

Em 14 anos de existência, o primei-ro jornal brasileiro publicou 7.494 pá-ginas em 1.791 edições. A partir de1821 foram criadas outras tipografiasparticulares. Em 29 de dezembro de1821, o periódico passou a se chamarGazeta do Rio. Com a Independência,em 1822, o jornal deixou de circular apartir de 31 de dezembro de 1822.

"Durante 14 anos a Impressão Régiareinou sozinha, soberana, assim comoa Gazeta, entre 1808 e 1822. Nessamesma época, Hipólito da Costa edi-tava em Londres o Correio Braziliense,que cobriu o mesmo período da Gaze-ta. Em 1º de janeiro de 1823, a Gazetado Rio foi sucedida pelo Diário do Go-verno, dando fim à fase heróica queagora se festeja.

O mercado nacional de revistas se-manais cresceu 5% no primeiro semes-tre de 2010. A alta resultou do segmen-to de publicações populares dirigidasao público feminino – cujo crescimentofoi de 15,5% –, com conteúdo focadonos bastidores de programas televisi-

vos e telenovelas. A informação é dojornal Meio&Mensagem na sua ediçãode 6 de setembro.

A revista que registrou a maior altano segmento popular foi a Viva Mais,que alcançou a circulação média de 245mil exemplares semanais (14,5%) e ul-trapassou Ana Maria, que cresceu 6%.

Puxado pelo avanço de 8% da revistaCaras, a circulação das revistas de ce-lebridades aumentou 10% no primei-ro semestre. As outras publicaçõesdesse nicho que registraram aumentode circulação foram Contigo, 4%; Quem,22%; e IstoÉ Gente, 18%.

No caso das revistas semanais de in-

formação houve uma oscilação médianegativa de 1%, índice semelhante aoda Veja, que representa 58% desse seg-mento com uma circulação média deum milhão de exemplares por edição.Época e CartaCapital apresentaramqueda de 2% e 8%, respectivamente;enquanto IstoÉ avançou 1%.

No segmento infantil a revista Re-creio registrou um recuo de 18% em suacirculação. Entre as revistas quinze-nais, a Capricho teve alta significativade 53%, alcançando a média de 205 milexemplares por edição, dado que paraespecialistas representa ampliação demercado entre o público adolescente.

"Meu caro presidente eméritoe amigo Maurício Azêdo,

Muito sensibilizado, agradeçoo encaminhamento de exemplarda edição nº 354 do excelenteJornal da ABI.

Expresso minha gratidão porter lembrado do nome do PauloCaringi para um registro tãosignificativo no jornal da classe.Ele bem merecia perfil como oque foi traçado em Vidas.

Apaixonado pelo jornalismo,pelas relações públicas e pioneirodo jornalismo radiofônico, atuouem tais campos com dedicação,eficiência e ética.

Muito frontal em seuscritérios, deixou a grandeherança da transparência emsuas atitudes. Fará muita falta.

Assim, meu caro Maurício,em nome da legião de amigos,discípulos (entre os quais eu meincluo) e admiradores de PauloCaringi, transmito as minhasexpressões mais sinceras deapreço pelo nobilitante gesto.

Como já disse ao próprioFrancisco, vocês foraminstrumentos de Justiça.

Aproveito a oportunidade, paraenviar as minhas congratulaçõespelo novo mandato. Foimerecido. Parabéns pela extremaqualidade do jornal, tanto naforma, quanto no conteúdo.

A admiração permanente (a)Edson Schettine de Aguiar."

"No Jornal da ABI nº 354 leioum tributo à memória de PedroMacário, o qual não conhecipessoalmente, mas o descobrilendo o conto Bolero nosuplemento Idéias & Livros doJornal do Brasil. Tomei ainiciativa de escrever-lhe,falamos por telefone uma vez,mas só descobri quãoimportante ele foi lendo a páginaa ele dedicada no Jornal da ABI.Pedro Macário, nome depersonagem de romance: quehomem bonito e que carreira ricade realizações! Uma vez faleicom uma filha dele por telefone.Tudo muito rápido e distante.Mas eis um companheiro doqual eu gostaria de ter sidoíntimo, um homem de bem, umbelo pai, um senhor artista.Deus o tenha.

(a) Rubens Nogueira, Rio, RJ".

Edson Schettine prestahomenagem ao amigo.

Pedro Macário

26 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

Liberdade de imprensaLiberdade de imprensa

Ganhador de alguns dos mais im-portantes prêmios nacionais de Jor-nalismo, Lúcio Flávio Pinto, Editor doJornal Pessoal, continua sendo pres-sionado e impedido de exercer seusdireitos de ir e vir e de liberdade deexpressão. O motivo é a sua ousadiaem denunciar desvios de conduta degrupos poderosos do Pará, inclusivedo setor de mídia.

O cerco ao jornalista já foi denun-ciado pela ABI em várias matérias pu-blicadas no Jornal da ABI. Recentemen-te, Lúcio Flávio Pinto não pôde compa-recer ao 1º Encontro de Blogueiros Pro-gressistas, porque tinha de apresentarna Justiça um agravo a um dos inúme-ros processos judiciais que lhe foramimpostos pela família Maiorana, donado Grupo Liberal, que edita um jornalcom o mesmo nome, no Estado do Pará.

Lúcio Flávio foi representado no even-to por seu filho Angelim Pinto, que leusua mensagem – cujo texto reproduzi-mos a seguir – endereçada aos participan-tes do encontro. No comunicado, LúcioFlávio Pinto relata os episódios de cen-sura e perseguição que vem sofrendodesde os anos 80, quando ainda trabalha-va na sucursal de O Estado de S. Paulo, emBelém, e fala da criação do seu JornalPessoal, há 23 anos. Um veículo que, se-gundo ele, é “um blog impresso no pa-pel, que exerceu na plenitude o direito deproclamar a verdade, sobretudo as maisincômodas aos poderosos”.

A mensagemFoi esta a mensagem por ele envia-

da ao Encontro de Blogueiros:“Caros amigos blogueiros,Sinto-me muito honrado pelo con-

vite, que devo ao Azenha e à Concei-ção Lemes, para participar deste En-contro. É uma iniciativa generosa egentil para com um analfabeto digital,como eu. Garanto que sou capaz deligar e desligar um computador, de

enviar e receber mensagens. Não ga-ranto nada a partir daí.

Como, então, estou aqui? Sou – di-gamos assim – um blogueiro avant laléttre. Não podendo ser um tigre, postoque sou Pinto, fui precursor na condi-ção de blogueiro de papel – e no papel.Às vezes, por necessidade, também umtigre in fólios – e nada mais do que isso.

Em 1987, eu tinha 38 anos de idadee 22 de profissão e me vi diante de umdilema. Numa vertente, a carreira pro-fissional bem assentada em O Estadode S. Paulo, então com 16 anos de “casa”,e também no Grupo Liberal, a maiorcorporação de comunicação do Nortedo País, no qual tinha 14 anos, com umrompimento pelo meio, quando tenta-ram me censurar, logo superado pelorestabelecimento da minha liberdadede expressão.

Na outra vertente, uma matériapronta, importante, mas que não en-contrava quem a quisesse publicar. Erao desvendamento do assassinato do ex-Deputado estadual Paulo Fonteles, pormorte de encomenda, executada naárea metropolitana de Belém, o primei-ro crime político em muitos anos nacapital do Pará. O Estadão publicaratodas as matérias que eu escrevera atéentão sobre o tema. Mas aquela, quearrematava três meses de dedicaçãoquase exclusiva ao assunto, era, segun-do o editor, longa demais.

Já O Liberal a considerava impubli-cável porque ela apontava como envol-vidos ou coniventes com a organizaçãocriminosa alguns dos homens mais po-derosos da terra, dois deles listados en-tre os mais ricos. Eram importantesanunciantes. Ao invés de me submeter,decidi ir em frente.

Aí, há 23 anos nascia o Jornal Pesso-al, sem anunciantes, feito unicamen-te por mim, assemelhando-se aos blo-gs de hoje. Um blog impresso no papel,que exerceu na plenitude o direito deproclamar a verdade, sobretudo as maisincômodas aos poderosos.

Em janeiro de 2005, depois de mui-tas ameaças por conta desse compro-misso, fui espancado por Ronaldo Mai-orana, um dos donos do Grupo Liberal,que na época era simplesmente o Pre-sidente da Comissão em Defesa da Li-berdade de Imprensa da OAB do Pará.Eu estava almoçando ao lado de ami-gos em restaurante situado num par-que público de Belém, quando o agres-sor me atacou pelas costas, contandocom a cobertura de dois policiais mili-tares, que usava – e continua a usar –como seus seguranças particulares.

Qual a causa da brutalidade? Um ar-tigo que publiquei dias antes sobre oimpério de comunicação do agressor.O texto não continha inverdades, não

era ofensivo, nem invadiaa privacidade dos perso-nagens. Mas desagradavaaos senhores da comuni-cação. Embora tendo aemissora de televisão demaior audiência do Esta-do, afiliada à Rede Globo,o jornal que ainda era olíder do segmento (já nãoé mais) e estações de rá-dio, não usaram seus veí-culos para me contraditarou mesmo atacar com oproduto que constitui seunegócio, a informação.

O que resultou dessa agressão? Daminha parte, a comunicação do fato àpolícia, que enquadrou o criminoso naforma da lei. Mas o agressor fez acordocom o Ministério Público do Estado,entregou cestas-básicas a instituições decaridade (uma delas ligada à famíliaMaiorana) e permaneceu solto, com suaprimariedade criminal intacta. Já o agres-sor, com a cumplicidade do irmão maisvelho e mais poderoso, ajuizou contramim 14 ações na Justiça, nove delas pe-nais, com base na Lei de Imprensa daditadura militar, e cinco de indenização.

O objetivo era óbvio: inverter os pó-los, fazendo-me passar da condição devítima para a de réu. Em quatro dasações eu era acusado de ofender os ir-

Seu jornalismo independente é perseguidopelos barões da mídia do Pará, seu Estado.

Lúcio Fláviocontinua sob

cerco dosMaiorana

POR JOSÉ REINALDO MARQUES

“O LIBERAL CONSIDERAVA A MATÉRIAIMPUBLICÁVEL PORQUE ELA APONTAVA

COMO ENVOLVIDOS OU CONIVENTESCOM A ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA

ALGUNS DOS HOMENS MAIS PODEROSOSDA TERRA, DOIS DELES LISTADOS ENTRE

OS MAIS RICOS. ERAM IMPORTANTESANUNCIANTES. AO INVÉS DE ME

SUBMETER, DECIDI IR EM FRENTE.”

27Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

mãos e sua empresa por ter dito que fuiespancado, quando, segundo eles, eu fui“apenas” agredido. Mais um dentrevários absurdos aviltantes, aos quais ajustiça paraense se tem prestado – e nãoapenas aos Maiorana, já que me conde-nou por ter chamado de pirata fundiá-rio o maior grileiro de terras do Pará edo universo, condição provada pelaprópria Justiça, que demitiu por justacausa todos os funcionários do cartó-rio imobiliário de Altamira, onde a frau-de foi consumada, colocando ao alcancedo grileiro pretensão sobre “apenas”cinco milhões de hectares.

Os poderosos, que tanto se incomo-dam com o que publico no Jornal Pes-soal, descobriram a maneira de meatingir com eficiência. Já tentaram medesqualificar, já me ameaçaram demorte, já saíram para o debate públi-co e não me abateram nem interrom-peram a trajetória do meu jornal. Por-que em todos os momentos provei averdade do que escrevi. Todos sabemque só publico o que posso provar.Com documentos, de preferência ofi-

Com procedimentos que o ConselhoFederal da Ordem dos Advogados do Bra-sil classificou de “iniciativas intimidató-rias”, o Procurador da República emMato Grosso do Sul Ramiro Rockenba-ch da Silva Matos Teixeira de Almeidaintimou quatro emissoras de televisão,dois jornais diários e dois portais jorna-lísticos do Estado a revelar as fontes deinformação de matérias relacionadascom a Penitenciária Federal de CampoGrande, capital do Estado. Através deportaria datada de 26 de julho passado,Rockenbach deu prazo de dez dias paraque esses veículos fornecessem as infor-mações requisitadas.

Na portaria, que tomou o número233/2010, o Procurador fundamenta emsete considerandos sua decisão de instau-rar inquérito civil “visando adotar todasas medidas possíveis e necessárias, judiciaise extrajudiciais, no intuito de transcrevero texto assinalado na folha 002 de Cam-po Grande-MS”. Foram por ele intimadasa prestar informações as emissoras TVGuanandi, afiliada da Rede Bandeirantes;TV Morena, afiliada da Rede Globo; TVMS, afiliada da Rede Record; TV CampoGrande, afiliada do SBT; jornais Correio doEstado e O Estado de MS; portais eletrôni-cos Campo Grande News e Midiamax.

Pretende o Procurador Rockenbach quecada um desses veículos informe se: 1. teveacesso ou recebeu documentos a respeitodo tema escutas telefônicas em parlatóriose/ou salas de visita íntima, conversas deadvogados e presos em relação à Peniten-ciária Federal de Campo Grande, 2. em casopositivo, remeter cópia integral do mate-rial recebido/acessado; 3. o material rece-bido/acessado foi divulgado? Quando e deque modo? (remeter cópia das matériasjornalísticas respectivas); 4. o materialrecebido/acessado foi remetido a esse ór-gão de imprensa por quem?

A iniciativa do Procurador Rockenba-ch foi comunicada à ABI pelo Presidentedo Conselho Federal da Ordem dos Ad-vogados do Brasil, Ophir Cavalcante Jú-nior, que informou que em sua sessão deagosto o Conselho Federal “aprovou porunanimidade, em aclamação do Plenário,apoio incondicional ao Presidente da OABde Mato Grosso do Sul, Leonardo Aveli-no Duarte, pela defesa das prerrogativasprofissionais diante das iniciativas inti-midatórias perpetradas pelo Procuradorda República Ramiro Rockenbach da Sil-va Matos Teixeira de Almeida”.

Em ofício à ABI, o Presidente da OABlembrou as “lutas históricas e vitoriosasem conjunto com a Ordem” e pediu àCasa que, “informando-se na luta oraempreendida em defesa da Constituiçãoda República”, “adote as providências

Procurador violasigilo da fonte

Ramiro Rockenbach, de Mato Grosso do Sul, intimou quatro emissorasde televisão, dois jornais diários e dois portais jornalísticos a revelarem

quem lhes deu informações sobre uma penitenciária federal.

cabíveis de proteção da liberdade deimprensa e das fontes do jornalista”.

Diante da denúncia da OAB, a ABI di-rigiu-se ao Procurador Rockenbach ques-tionando sua iniciativa, que no entenderdas duas instituições fere a liberdade deimprensa, assegurada pelo inciso IX doartigo 5º, e o sigilo da fonte, resguarda-do pelo inciso XIV do mencionado arti-go 5º. O expediente ao Procurador Ro-ckenbach, divulgado no ABI Online nodia 23 de setembro, tem o seguinte teor:

“Ilustre Procurador da República Ra-miro Rockenbach,

Com a devida vênia, a Associação Bra-sileira de Imprensa dirige-se a Vossa Ex-celência para assinalar a carência de em-basamento constitucional de sua inici-ativa de intimar oito veículos de comu-nicação de Mato Grosso do Sul a pres-tar informações e fornecer documentosrelacionados com a Penitenciária Fede-ral desse Estado, exigência que no enten-dimento desta Associação Brasileira deImprensa fere a liberdade de imprensa,assegurada pelo inciso IX do artigo 5º daConstituição da República, e o sigilo dafonte, resguardado pelo inciso XIV domencionado artigo 5º.

Essas disposições constitucionaistêm nitidez de clareza meridiana e nãopodem ser contornadas ou ignoradasmesmo quando relevante o objeto quese persegue. Dizem esses preceitos daCarta Magna:

“Art. 5º – ..., nos termos seguintes:IX – é livre a expressão da atividade in-

telectual, artística, científica e de comunica-ção, independente de censura ou licença;

XIV – é assegurado a todos o acesso àinformação e resguardado o sigilo da fonte,quando necessário ao exercício profissional;

A ABI foi alertada para a providênciade Vossa Excelência pelo Presidente doConselho Federal da Ordem dos Advo-gados do Brasil, Dr. Ophir Cavalcante Jú-nior, que condenou as “iniciativas inti-midatórias perpetradas” por Vossa Ex-celência, como constante do Ofício nº128/2010/GOC/COP, de que estamosanexando cópia.

A ABI confia na revisão por Vossa Ex-celência dos procedimentos que possammacular o papel que cabe ao MinistérioPúblico de “zelar pela guarda da Cons-tituição, das leis e das instituições demo-cráticas”, como assinalado nos conside-randos da Portaria 233/2010, que instau-rou o inquérito civil ora em curso.

No ensejo, Senhor Procurador, apre-sentamos as expressões do nosso eleva-do apreço.

Atenciosamente(a) Maurício Azêdo, Presidente.

ao seu cinto de mil utilidades para meisolar e me enfraquecer.

Não posso contar nem mesmo como compromisso da Ordem dos Advo-gados do Brasil. Seu atual Presidentenacional, o paraense Ophir CavalcanteJúnior, quando Presidente estadual daentidade, firmou o entendimento deque sou perseguido e agredido não porexercer a liberdade de imprensa, o di-reito de dizer o que sei e o que penso,mas por “rixa familiar”.

No entanto, dos sete filhos de Rô-mulo Maiorana, criador do império decomunicações, só três me atacam, compalavras e punhos. Dos meus sete ir-mãos, só eu estou na arena. Nunca faleida vida privada dos Maiorana. Só merefiro aos que, na família, têm atuaçãopública. E o que me interessa é o quefazem para a sociedade, inclusive nousufruto de concessão pública de ca-nal de televisão e rádio. E fazem mui-to mal a ela, como tenho mostrado –e eles nunca contraditam.

Crêem que, me matando em vida,proibindo qualquer referência a mim e

“CRÊEM QUE, ME MATANDO EM VIDA, PROIBINDOQUALQUER REFERÊNCIA A MIM E MEUS PARENTES, E

SILENCIANDO SOBRE TUDO QUE FAZEM CONTRA MIM NAPERMISSIVA E CONIVENTE JUSTIÇA LOCAL, A HISTÓRIA DESSAINIQÜIDADE JAMAIS SERÁ ESCRITA PORQUE O QUE NÃO ESTÁ

NOS SEUS VEÍCULOS DE COMUNICAÇÃO NÃO ESTÁ NO MUNDO.”

ciais ou corporativos. Nunca fui des-mentido sobre fatos, o essencial dostemas, inclusive quando os abordo pi-oneiramente, ou como o único a regis-trá-los. Não temo a divergência e acontradita. Desde então, os Maioranajá me processaram 19 vezes.

Nenhuma das sentenças que me fo-ram impostas transitou em julgadoporque tenho recorrido de todas elase respondido a todas as movimenta-ções processuais, sem perder prazo,sem deixar passar o recurso cabível, re-agindo com peças substanciais. O quesignifica um trabalho enorme, profun-damente desgastante.

Desde 1992, quando a família Mai-orana propôs a primeira ação, procureioito escritórios de advocacia de Belém.Nenhum aceitou. Os motivos apresen-tados foram vários, mas a razão verda-deira uma só: eles tinham medo de de-sagradar os poderosos Maiorana. Nãoqueriam entrar no seu índex. Pretendi-am continuar a brilhar em suas colunassociais, merecer seus afagos e ficar à dis-tância da sua eventual vendetta. Con-tei apenas com dois amigos, que se su-cederam na minha defesa até o limitede suas resistências, de um tio, que mor-reu no exercício do meu patrocínio, e,agora, com uma prima, filha dele.

Apesar de tantas decisões contrári-as, ainda sustento minha primarieda-de. Logo, não posso ser colocado atrásdas grades, objeto maior do empenhodos meus perseguidores. Eles recorrem

meus parentes, e silenciando sobre tudoque fazem contra mim na permissiva econivente Justiça local, a história dessainiqüidade jamais será escrita porque oque não está nos seus veículos de comu-nicação não está no mundo. Não chega-ria ao mundo porque o controlam, a pon-to tal que tem sido vão meu esforço defazer a Unesco, que tem parceria com aAssociação Nacional de Jornais, incluirmeu caso na relação nacional de violaçãoda liberdade de imprensa.

O argumento? Não se trata de liber-dade de imprensa e sim de “rixa fami-liar”. O Grupo Liberal, por mera coin-cidência, é um dos seis financiadores doportal Unesco/ANJ.

Após os Maiorana, o dilúvio. A maiorglória do Jornal Pessoal é nunca ter sidoderrotado no terreno que importa à his-tória: o da verdade. Enquanto for pos-sível, as páginas do Jornal Pessoal con-tinuarão a ser preenchidas com o queo jornalismo é capaz de apurar e divul-gar, mesmo que, como um Prometeu depapel, o seu ventre seja todo extirpadopelos abutres.

Eles são fortes, mas, olhando em tor-no, vejo que há mais gente do outro lado,gente que escreve o que pensa, apurasobre o que vai escrever e não dependede ninguém para se expressar, mesmoem condição de solidão, de individuali-dade, como os blogueiros, que hoje, ge-nerosamente, me acolhem nesta cidadeque fiz minha e que tanto amo, como seestivesse na minha querida Amazônia.”

28 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

Um dia após a assinatura do protocolo de segurançapara jornalistas, no dia 6 de setembro, em Chihuahua,México, o jornalista Marcelo Tejero Ocampo, 64 anos,locutor de uma emissora de rádio, foi morto no interiorde sua residência no Município de Carmen, Estado deCampeche. A Polícia informou que o corpo apresenta-va sinais de asfixia. Dez dias depois foi morto o jovemestagiário de fotografia Luís Carlos Orosco, que seriaefetivado quatro dias depois pelo jornal El Diario.

O crime eleva o ranking da violência contra profis-sionais da imprensa no México, no dia seguinte à so-lenidade que reuniu representantes de associações dejornalistas e autoridades de Chihuahua, para o lança-mento do Protocolo de Segurança para Jornalistas emcoberturas de risco. Localizado na fronteira dos Esta-

Depois dos atentados que já mataramdois de seus funcionários, o jornal mexi-cano El Diario pediu uma trégua às orga-nizações criminosas que atuam em Ciu-dad Juárez, no texto de um editorial pu-blicado no dia 19 de setembro. Sob o tí-tulo O que eles querem de nós, o editorialassinala que a perda de dois de seus repór-teres assassinados – José Armando Rodri-guez, executado em 2008, e Luis CarlosSantiago Orozco – representa “um danoirreparável” e que os jornalistas estãoapreensivos e desejam saber o que osnarcotraficantes querem da categoria.

O texto também critica as autoridadesmexicanas, principalmente o Presidentedo México, Felipe Calderón, que é acusa-do de não ter tomado as providênciasdevidas para impedir que os jornalistascontinuem sendo executados. Desde queele assumiu o Governo, há quatro anos,28 mil pessoas foram assassinadas emcrimes ligados ao narcotráfico no país.

O editorial ressalta que a iniciativatomada pelo jornal não é uma rendiçãoaos grupos que se impõem pela força,mas uma maneira de tentar entender oque se espera de um órgão de mídia, quenão deseja mais mortes dos seus jorna-listas ou dos seus colegas de profissão:

“Não queremos mais ferimentos ouaté mais intimidação. É impossível exer-cer o nosso papel nessas condições. Diga-nos, portanto, o que querem que publi-quemos ou o que devemos parar de pu-blicar, o que esperam de nós como meio(de comunicação).”

Narcotráfico do México matajornalista e até estagiários

Dez dias após o assassinato do jornalista Tejero Ocampo, locutor de umarádio, os cartéis da droga mataram um estagiário de Fotografia que não

chegou a trabalhar duas semanas. Ele seria contratado quatro dias depois.

dos Unidos, Chihuahua é considerado uma das regi-ões mais perigosas no mundo para jornalistas, em ra-zão da violência relacionada ao tráfico de drogas.

O Protocolo inclui medidas para ampliar a segurançados jornalistas e compromissos das autoridades emrelação à imprensa, como o respeito à liberdade deexpressão e ao direito à informação. Entre outros itens,o documenta recomenda, por exemplo, que os jorna-listas evitem o uso de fontes anônimas.

Participaram da assinatura do Protocolo represen-tantes de entidades jornalísticas, profissionais de im-prensa autônomos e autoridades de Chihuahua, entreelas o Governador Reyes Baeza Terrazas e os Presidentesdo Tribunal de Justiça, Rodolfo Acosta, e da ComissãoEstatal de Direitos Humanos, José Luis Armendariz.

Encurralado pela violência homicida dos cartéis das drogas, importante jornal mexicanodenuncia o poder dos criminosos, num suposto apelo-rendição aos traficantes.

El Diario pede trégua a narcotraficantes

A mensagem do El Diario destacatambém que o México se tornou umambiente que não oferece garantias su-ficientes para os cidadãos desenvolve-rem as suas vidas e atividades com se-gurança, e que o resultado disso é que ojornalismo tem-se tornado uma das prá-ticas profissionais “mais perigosas” dese exercer no país.

“Vazio de poder”O atentado que matou o estagiário do

El Diario e o editorial endereçado às or-ganizações criminosas despertaram aatenção de diversos setores, inclusive degovernantes locais. Para o Prefeito JoséReyes Ferri, os Governos devem dargarantias aos trabalhadores dos veícu-los de comunicação. “A comunicação éuma parte essencial de qualquer socie-dade democrática, temos de proteger osjornalistas que desempenham esta im-portante função”, declarou o prefeito àreportagem do El Diario.

Na opinião de Elia Baltazar — mem-bro do Conselho de Administração doCentro de Jornalismo e Ética Pública-Cepet, sediado na Cidade do México—, um fator grave é que a ausência doEstado e a impunidade estão provo-cando um vazio de poder institucio-nal em regiões como Ciudad Juárez,onde a violência tem sido acentuada.Segundo ele, isso dificulta o trabalho daimprensa, que não encontra no Exérci-to nem na Polícia parceiros a que possarecorrer: “E se isso não é grave parauma democracia, me diga então o queé mais grave”.

Participaram do encontro entidadescomo Associação Brasileira de Jornalis-mo Investigativo-Abraji, a AssociaçãoNacional de Jornalistas Hispânicos, aSociedade Interamericana de Imprensa-Sip e o Comitê para Proteção de Jorna-listas, entre outras.

O jornalista Mauri Konig, do jornalGazeta do Povo e membro da Abraji foi umdos debatedores do painel “Iniciativasregionais, transfronteiriças e globais so-bre cobertura do crime organizado”, queteve a participação de Osmar Gómez, dojornal ABC Color e do Fórum de Jornalis-tas Paraguaios; Gabriel Michi, do Fórumde Jornalismo Argentino; Giannina Seg-nini, do jornal La Nación da Costa Rica;e Paul Radu, do Centro Romeno para oJornalismo Investigativo.

Durante o fórum discutiu-se tam-bém, entre outros assuntos, o que podeser feito para ajudar repórteres e edito-res que trabalham em ambientes hostis,sob condições perigosas e estressantes,e quais medidas práticas os jornalistaspodem tomar quando estiverem cobrin-do a violência. A violência no México foium dos temas centrais do encontro.

Como desdobramento do Fórum, foianunciado que de 25 a 28 de novembroserá realizada a primeira reunião regio-nal de jornalismo para as fronteiras daArgentina, Brasil e Paraguai, que iráacontecer em Ciudad Del Este, no Para-guai. O principal objetivo do evento épromover palestras sobre jornalismoinvestigativo, uma vez que os jornalis-tas da região têm muito pouca oportu-nidade de capacitação nesse sentido.

Em seu discurso, Reyes Baeza Terrazas reconheceuo papel da imprensa na sociedade e os perigos aos quaisos jornalistas estão expostos na missão de informar.

“Destaco a importância dos meios de comunicaçãopara a democracia. Precisamos continuar cumprindo odever de levar informação à sociedade”, disse Terrazas.

Armendáriz disse que a assinatura do documento re-presenta “um marco na luta contra o crime organizado”:

”Através deste Protocolo será possível capacitar osjornalistas para ações preventivas contra a onda de vi-olência que assola o país”.

O primeiro encontro para a elaboração do Protoco-lo aconteceu em 26 de julho passado, reunindo jorna-listas, representantes do Governo e da Polícia, com o ob-jetivo de facilitar a cobertura de eventos de risco eproteger os profissionais da imprensa.

“Por causa da falta de conhecimento dos policiais emilitares sobre os direitos dos jornalistas, grande par-te dos responsáveis pela proteção das áreas de riscoconsidera fotógrafos e repórteres inimigos em poten-cial”, ressaltou o jornalista Ernesto Avilés, do Diariode Chihuahua.

O Presidente da Federação das Associações de Jor-nalistas do México, Roberto Piñón, enfatizou que, alémde melhorar as relações entre a imprensa e a polícia, épreciso capacitar os repórteres para a cobertura de si-tuações de risco. O Protocolo, em sua opinião será ummanual para evitar o perigo. (Claudia Souza)

As palavras de Baltazar coincidiramcom a observação de Carlos Lauria,Coordenador do Programa das Américasdo Comitê para Proteção dos Jornalistas-CPJ, que alertou sobre o envolvimentode setores do Estado com o narcotráfi-co e para a incapacidade das autoridadesgovernamentais, que permite que osgrupos criminosos em conflito consigamos seus objetivos de controlar a circula-ção de notícias.

Ao El Diario o coordenador do CPJdisse que os traficantes de drogas ope-ram em várias frentes “e são conectados”com as autoridades, forças de seguran-ça e o Judiciário: “Sabemos que a infor-mação (a notícia) é um bem precioso eque pode ser usada para prejudicar areputação de cartéis rivais, e é isso queeles estão conseguindo, de um Estadoque está cada vez mais ausente, eviden-temente incapaz de oferecer garantiasaos jornalistas”, afirmou Carlos Lauriaem entrevista ao jornal mexicano.

A cobertura em debateA atuação dos jornalistas que cobrem

áreas de conflito de narcotraficantes éuma preocupação que cada vez mais vemsendo debatida pelas entidades ligadas àcategoria. Esse foi o tema central do fó-rum realizado pelo Centro Knight parao Jornalismo nas Américas na Universida-de Austin no Texas nos dias 17 e 18 de se-tembro, que debateu a cobertura do trá-fico de drogas e do crime organizado naAmérica Latina e no Caribe, com a parti-cipação de 40 organizações dedicadas à ca-pacitação e segurança de jornalistas.

Liberdade de imprensaLiberdade de imprensa

POR JOSÉ REINALDO MARQUES

29Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

Afinado com o interesse da Coligação Força do Povo,que patrocina a candidatura à reeleição do Governa-dor Carlos Gaguim (PMDB), o Desembargador Libe-rato Póvoa impôs censura prévia a 84 veículos de co-municação do Estado do Tocantins, mas sua agressãoao texto constitucional teve vida curta: menos de 48horas depois, o Tribunal Regional Eleitoral, por qua-tro votos a dois, derrubou a sua decisão. Liberato fir-mou o ato castrador no dia 23 de setembro, uma quin-ta-feira; no segundo dia útil seguinte, 26 de setembro,o TRE-TO revogou.

A proibição determinada pelo Desembargador atin-giu o jornal O Estado de S. Paulo e mais 83 veículos decomunicação, através de uma decisão que amordaça aimprensa no território tocantinense. Todos, foram im-pedidos de divulgar informações sobre investigação pro-movida pelo Ministério Público do Estado de São Pau-lo que cita o Governador Carlos Gaguim, como inte-grante de organização criminosa destinada a fraudarlicitações. O silenciamento da imprensa foi requeridopela Coligação Força do Povo.

A decisão do Desembargador Liberato Póvoa proí-bia a divulgação de notícias sobre o caso por oito jor-nais, seis emissoras de televisão da capital, Palmas, ecinco da cidade de Araguaína, cinco sites do Estado,42rádios comunitárias e 22 emissoras comerciais de di-ferentes Municípios. Se descumprisse a ordem judici-al, o veículo seria punido com multa diária de R$ 10 mil.

Em e-mail dirigido ao Desembargador Póvoa, a ABIclassificou a decisão de “grave transgressão” do textoda Constituição, que no parágrafo 2º do seu artigo 220estabelece que “é vedada toda e qualquer censura denatureza política, ideológica e artística”. Dizia a men-sagem da ABI que no “clima exacerbado da campanhaeleitoral” no Tocantins era previsível que o Desembar-gador Póvoa não reconsiderasse sua decisão, que “passa

JORNAISO Estado de S. PauloCorreio do PovoA NotíciaCocktailMira JornalO Paralelo 13Jornal OpçãoTribuna do Planalto

a integrar os fastos das violências contra a Constitui-ção da República sob o Estado Democrático de Direi-to que penosamente tentamos construir”.

É esta a declaração da ABI:“Ilustre Desembargador Liberato Póvoa,Vossa Excelência cometeu grave transgressão do

texto da Constituição da República ao impor a censu-ra prévia ao jornal O Estado de S. Paulo e a 83 veículosde comunicação do Estado do Tocantins, em atendi-mento a postulação igualmente inconstitucional docandidato Carlos Gauguim e dos partidos por ele reu-nidos na chamada Coligação Força do Povo.

Ignorou Vossa Excelência que a Constituição esta-belece no parágrafo 2º do artigo 220 que “é vedada todae qualquer censura de natureza política, ideológica eartistica”. Esse preceito da Lei Maior, esculpido com ni-tidez, não pode ser contornado por qualquer invoca-ção de “segredo de justiça”, como fez Vossa Excelên-cia ao justificar a violação da norma constitucional.

Causa também espécie o ato de Vossa Excelência pelacircunstância de que lhe cabia declarar-se suspeito paradecidir o pleiteado pelo Governador Carlos Gauguim,que nomeou sua esposa e sua sogra para cargos comis-sionados da administração estadual, como informouo jornal O Estado de S. Paulo em sua edição de hoje, 27de setembro, ao noticiar sua decisão, por isso altamentecensurável sob o aspecto ético.

É previsível que o clima exacerbado da campanhaeleitoral no Estado do Tocantins não lhe permitirá re-ver e reconsiderar sua decisão, que passa a integrar osfastos das violências cometidas contra a Constituiçãoda República sob o Estado Democrático de Direito quepenosamente tentamos construir, a despeito dos equi-vocos cometidos por membros do Poder Judiciário, entreos quais Vossa Excelência agora se inclui.

Atenciosamente (a) Maurício Azêdo, Presidente.”

Os tiros que mataram Luís Orozco, quetinha completado 21 anos recentemente,foram disparados contra o seu carro porvários homens armados não identificados.Ele estava acompanhado de outroestagiário de fotografia do El Diario, CarlosSanches Colunga, que ficou gravementeferido no atentado.

O crime aconteceu por volta das 15h nopátio do estacionamento de um shopping,localizado próximo à sede do jornal. Toda aação foi registrada pelas câmeras desegurança do prédio comercial, mas osbandidos ainda não foram encontrados. Deacordo com as investigações iniciais, oassassinato de Luis Orozco tem o mesmoestilo daqueles encomendados pelos cartéisde drogas do México.

Falando à organização Repórteres SemFronteiras-RSF, o editor Pedro Torres disseque o motivo do ataque não foi esclarecido,e que o jornal não recebera quaisquer tipode ameaças. Os dois estagiários não estavamtrabalhando em nenhuma cobertura do ElDiario sobre a guerra contra os cartéis dedrogas deflagrada no México.

Luís Orozco começou a estagiar comofotojornalista em maio deste ano, com apromessa de que seria contratadodefinitivamente em 20 de setembro.Sanches tinha apenas duas semanas nafunção. Informou Pedro Torres que no diado crime os dois passaram a manhã em umcurso de fotografia promovido pelo jornal:

“Eles não estavam cobrindo o caso (doscartéis de drogas). Nós não sabemos quempode estar por trás deste ataque”, disse oeditor à RSF.

A onda de violências contra jornalistasno México alcançou um nível tão absurdoque vem provocando protestos dasorganizações de proteção à categoria juntoao Presidente Felipe Calderón. Em junho, aRSF encaminhou às Nações Unidas umpedido formal de proteção aos profissionaisda mídia em atividade no país.

O atentado contra os estagiários do ElDiario é o segundo ato criminoso queatinge a equipe de reportagem do veículo.Em 2008, ocorreu o assassinato do repórterJosé Armando Rodriguez, cujo inquéritonunca identificou os culpados. PedroTorres disse à RSF que espera que aapuração da morte de Luís Orozco não sigao mesmo caminho:

“Ao contrário do assassinato deArmando, desta vez o crime ocorreu em umlugar público, com câmeras de vigilância ena presença de testemunhas”, declarou.

Em dez anos foram registrados 68assassinatos de jornalistas e trabalhadoresda mídia no México. Desde 2003, 11profissionais estão desaparecidos. O paísé onde a liberdade de imprensa está maisameaçada na América Latina e uma dasregiões mais perigosas do mundo para oexercício do jornalismo. (José ReinaldoMarques)

A morte deOrozco, aos

21 anos

Durou horas a rolhado Desembargador

Juiz eleitoral, Liberato Póvoa impôs censura prévia a 84 veículos do Estadodo Tocantins, mas dois dias depois o TRE derrubou a sua decisão contrária àConstituição, que amordaçava veículos de comunicação da capital do interior.

TELEVISÕESEm PalmasTV Anhanguera (Globo)Rede RecordTV PalmasTV BandeirantesTV Capital (SBT)TV GurupiEm AraguaínaTV Anhanguera (Globo)TV Araguaína (SBT)TV GirassolTV LíderTV Palmas

SITES DO TOCANTINSCleber ToledoEcos do TocantinsConexão TocantinsRoberta TumPortal Stylo

RÁDIOS COMUNITÁRIASAparecida do Rio NegroRio Verde FMGoianorte FMCidade FMMiracema FMNova FM

Luz FMLiberdade FMFormoso FMCriativa FMCultura FMBoas Novas FMNatureza FMPlaneta FMPalmeiras FMCiclone FMFM PequizeiroColméia FMVale FMNatividadeFM 104,9Rádio SucessoPorto Alegre FMAlmas FMCombinado FMCidade FMItamaraty FMLagoa FMCidade FMJovem FMDimensão FMA Voz do MelTaipas FMGoiatinsEsperança FM

A decisão doDesembargador LiberatoPóvoa não temprecedentes em matériade abrangência: nunca sobo império da Constituiçãode 1988 foi tão numerosoo conjunto de órgãos decomunicação colocadossob censura prévia peloPoder Judiciário. É esta alista, segundo publicado naedição de 27 de setembropelo Estado de S. Paulo:

Os veículoscondenadosao silêncio

Educativa FMRádio Aliança FMRadio Entre Rios FMAssociação Brasileira deRádios Comunitárias doEstado do Tocantins

RÁDIOS COMERCIAISDO TOCANTINSTerra FMCidade FMMirante AM e FMTocantins FMAraguaia AM e FMNativa FMTocantins AM e FMCidade FMGuaraí AMTocantins FMAraguaia FMSerra da Mesa FMCristal AMIndependência AM e FMRádio Cultura de MiracemaAraguaia FMJovem Pan FM96,1 – Palmas FMJovem Palmas AM e FMNova Era FM (Antiga Galileia)

30 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

Direitos humanosDireitos humanos

ia 27 de agosto de 1980. Orelógio marca 13h40min. Nasede da Ordem dos Advoga-dos do Brasil-OAB, no Rio deJaneiro, a secretária Lyda

Monteiro abre uma carta, como tantasoutras, dezenas, endereçadas ao Presi-dente do Conselho Federal da entida-de, Eduardo Seabra Fagundes. Aquela,no entanto, trazia uma mensagem di-ferente. Tratava-se de uma correspon-dência do terror. O estrondo que seseguiu foi ouvido em todo o País, numclaro sinal de alerta de que o processode abertura política que se iniciava nãoestaria livre de percalços. Havia, sim,nas alas mais radicais dos militares, nopoder desde o golpe de 1964, represen-tantes dispostos a tudo para a manu-tenção do regime ditatorial. Capazes dematar. Na verdade, um expedientequase usual no Estado ausente de Di-reito, estabelecido naqueles tempos.

A bomba fez de Dona Lyda, 59 anos,sua vítima fatal. Os estilhaços do arte-fato feriram em cheio o Brasil, a comu-nidade dos advogados e, em especial, aOAB, nicho de resistência e relato dasarbitrariedades cometidas pelos suces-sivos governos militares. Ali lutava-seabertamente pela volta do Estado deDireito. Eram denunciados atos comoprisões arbitrárias, torturas e desapare-cimentos. O estrago feito naquela tar-de foi tão grande que, 30 anos depois dedetonado o explosivo, restam aindaferidas abertas. Dúvidas no ar. A dispo-sição inarredável da OAB de esclarecero caso e de responsabilizar os culpados.

Não por acaso, o Presidente da OAB-RJ, Wadih Damous, anunciou, no dia27 de agosto, que a entidade vai soli-citar a reabertura do inquérito que in-vestigou o atentado. Em ato que mar-cou as três décadas da morte da ex-funcionária, Wadih Damous disse queo pedido terá como base as revelaçõesdivulgadas em reportagem de O Glo-bo, publicada naquela mesma data, deautoria do jornalista Chico Otávio.

“Quem ordenou o crime? Quem oexecutou? E onde se encontram, hoje,esses funcionários de um dos aparatosda administração pública brasileira?Nós não podemos mais conviver sob osigno dessa conveniente ignorância”,questionou Damous. “Quando lança-mos a ‘Campanha pela Verdade e pelaMemória’, a maioria dos jornais publi-cou reportagens sobre a nossa iniciativa

Três décadas após a explosão da bomba na sede da Ordem dos Advogados doBrasil, o Presidente da Seccional do Estado do Rio da entidade, Wadih Damous,

reclama a reabertura do inquérito policial sobre o caso, para identificação epunição dos responsáveis pelo ato, que matou a funcionária Lyda Monteiro daSilva, chefe da Secretaria da instituição. A iniciativa da OAB aviva a lembrançade outras ações terroristas praticadas pela direita linha-dura, que resistia ao

processo de retorno do País ao Estado de Direito. Os atentados não pouparamórgãos de imprensa e atingiram outras entidades, como a própria ABI.

POR PAULO CHICO

D ESTILHAFOTOS ROGÉRIO REIS/TYBA

31Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

e várias emissoras de televisão veicu-laram gratuitamente os nossos filmescom os depoimentos de atores de gran-de importância, como Fernanda Mon-tenegro e Osmar Prado. Agora, a ma-téria de O Globo foi fundamental paratrazer à tona novas informações sobreo atentado. E ainda delineou uma redede ligações entre os vários agentes darepressão e seus superiores, apontan-do figuras carimbadas nas listas denotórios torturadores.”

Ainda segundo o Presidente daOAB/RJ, a reportagem trouxe impor-tantes revelações sobre o atentado quevitimou Dona Lyda, confirmandoaquilo que todos desconfiavam: mili-tares lotados no Doi-Codi foram osresponsáveis pelo crime. “Acredito queagora a apuração do caso siga em frente.Os acusados foram identificados; se asociedade se mobilizar, a investigaçãoconseguirá as provas necessárias paracondená-los. É nosso dever procuraresclarecer o crime. O Secretário Espe-cial de Direitos Humanos, MinistroPaulo Vannuchi, prontificou-se a soli-citar à Polícia Federal ajuda para loca-lizar os agentes que investigaram ocrime na época, para que eles contemaquilo que sabem. O Presidente doConselho Federal da OAB, Ophir Ca-valcante, está constituindo comissãopara propor as ações judiciais necessá-rias. O pedido de reabertura do inqué-rito será extensivo ao atentado do Rio-centro, em 1981.”

A reportagem revelou indícios deque os autores da bomba enviada àOAB pertenciam ao mesmo grupo en-volvido com os artefatos que explodi-ram em outros atentados, como o doRiocentro. Avesso a debates, o segmen-to obscuro do regime militar tinha noterror a forma acabada de sua manifes-tação de descontentamento. Foramdiversos, por exemplo, os casos de bom-bas instaladas em bancas de jornal. Em23 de março de 1981, uma foi detona-da na oficina da Tribuna da Imprensa,no Rio. As reações dos opositores aoprocesso de redemocratização do Bra-sil não pouparam sequer a ABI, ondeum artefato explodiu no banheiro dosétimo andar, em 19 de agosto de 1976.Felizmente, não houve vítimas.

“Onde houvesse manifestação con-trária ao regime que, durante décadas,amordaçara nosso povo, lá estavameles, os verdadeiros terroristas, emis-sários de um regime que agonizava,mas que podia contar com o maiortrunfo de que o transgressor pode sevaler: a crença na impunidade. Reabriro inquérito deste caso é uma forma denão se calar, de a advocacia afirmar, altoe bom som, que não compactua com aimpunidade. E é sempre bom não es-

conder debaixo do tapete os períodostenebrosos da História de um país, paraque os fatos que nos envergonharamjamais voltem a acontecer. Passados 30anos, nossas instituições democráticassão sólidas e nos permitem conhecer averdade sobre aqueles anos terríveis,dando nomes aos que cometeram cri-mes de lesa-humanidade”, afirmaWadih Damous.

O Presidente da OAB/RJ não temeque, a exemplo de outros polêmicoscasos recentes de crimes cometidospela ditadura militar, uma equivocadainterpretação da Lei de Anistia possaimpedir a responsabilização dos culpa-dos. Wadih Damous considera que nãohá espaço jurídico para isso. “Nessecaso em particular, ninguém poderáalegar que os criminosos devem serbeneficiados pela Lei de Anistia, poisos atos terroristas e os assassinatosaconteceram depois da promulgação daLei. A bomba foi detonada em agostode 1980. A Lei de Anistia fora aprova-da no ano anterior.”

JORNALISTAS RECORDAMOS DESAFIOS DA

COBERTURA NA ÉPOCA“Participei da cobertura da morte da

Dona Lyda Monteiro na OAB e cobri apasseata e o enterro dela no CemitérioSão João Batista. Eu e o Marcelo Bera-ba, ambos de O Globo na época, passá-vamos por perto e fomos dos primeiros

a chegar ao local da explosão. Foi umavisão assustadora. Participei tambémum pouco da cobertura da explosão deuma bomba na Câmara dos Vereadoresdo Rio, que mutilou um funcionário eferiu outros. Foi um atentado nos mes-mos moldes do ocorrido na OAB, exe-cutado pelo mesmo grupo de extremadireita, ligado a militares da linha dura.Também foram eles que explodiramvárias bancas de jornal para impedir avenda dos jornais alternativos, que com-batiam o regime”, recorda José LuizAlcântara, Chefe de Redação da Sucur-sal/Rio de O Estado de S.Paulo.

Alcântara descreve ainda o ambien-te nas principais Redações diante dosdiversos casos de terror. “É claro que oclima era de medo em todos os setoresda sociedade, e mais ainda nas Redações.Me lembro do atentado e invasão dojornal Hora do Povo. Estive lá como re-pórter e fiquei chocado com a violência.Lembro da tentativa de golpe do Gene-ral Sílvio Frota contra o Presidente Er-nesto Geisel e a intimidação que a equi-pe do Jornal do Brasil sofreu no Aeropor-to Internacional por parte da seguran-ça do Comandante do I Exército. Umdos nossos colegas chegou a ser agredi-do. Pessoalmente, nunca fui ameaçado,mas é óbvio que o clima de trabalho,principalmente em coberturas dessetipo, era permanentemente tenso”,conta Alcântara, que ressalta a impor-tância de matérias como a publicada

pelo O Globo no dia 27 de agosto passa-do. “Vale lembrar que nunca se chegouaos autores dos atentados contra a OAB,a ABI e a tantas outras instituições.”

Citado pelo colega José Luiz Alcân-tara, Marcelo Beraba também faloucom o Jornal da ABI. “Naquela época euera repórter especial de O Globo. Estescasos marcaram o período e envolve-ram na cobertura quase todos os repór-teres da Geral. Foi um período de muitoinvestimento em investigação jornalís-tica. Cobri lateralmente o Riocentro.Participei mais da cobertura do aten-tado à OAB. Foi um período de grandedescontrole institucional e o acesso àsinformações era muito difícil. Não melembro de ameaças diretas a jornalis-tas. Tenho bastante viva a memória dasRedações de O Globo e do JB, então osdois grandes jornais do Rio de Janeiro,completamente empenhadas em apu-rar cada caso. Depois de anos de cerce-amento, a cobertura daqueles atenta-dos, naquela fase de distensão políti-ca, permitiu o exercício da investiga-ção jornalística e a maior preparaçãodas Redações para o período de abertu-ra e transição democrática que se segui-ria”, avalia Beraba, Editor-Chefe de OEstado de S.Paulo.

Fotógrafo de O Globo no início dosanos 1980, João Roberto Ripper reve-la as peculiaridades do trabalho jorna-lístico naqueles tempos. “Tínhamosuma ida diária ao espaço militar onde

ÇOS DO TERROR NO BRASILRO

GÉR

IO REIS/TYB

A

Cerca de 10 mil pessoas conduziram o corpo de D. Lyda Monteiro da Silva numa passeata que percorreu os 9 km do Centro do Rio aoCemitério São João Batista, em Botafogo. Próximo ao Consulado dos Estados Unidos, manifestante pixa a parede em sinal de protesto.

32 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

Direitos humanosDireitos humanos

estava o processo. Já havíamos desen-volvido táticas para o máximo aprovei-tamento dos poucos minutos de con-sulta, naqueles poucos dias em que oprocesso era liberado. Recordo que umdia o Marcelo Beraba passava rapida-mente as páginas do processo e eu iafotografando cada uma delas. Depoisdo filme revelado, as páginas eramcopiadas. Somente aí conseguíamos lercom a calma devida as informações.”

Ripper diz nunca ter se sentidoameaçado nas coberturas dos chama-dos anos de chumbo e conta um episó-dio que ocorreu alguns anos mais tar-de. “Me recordo que fui detido algumasvezes, reprimido no momento das co-berturas... Muitas delas tinham umclima pesado. De fato, só fui me sen-tir ameaçado, algumas vezes, mais tar-de , quando comecei a denunciar tra-balho escravo e crimes do latifúndio.Há muito o que se investigar no Bra-sil, e não só no período do regime mi-litar. Ainda hoje há abusos cometidospelo Estado, nos governos estaduais,nas Polícias civil e militar e no próprioExército. A violência de que são vítimasos moradores de favelas, por exemplo,está longe de ser explicada”, diz Ripper.

O CHOQUE DE UMAJOVEM REPÓRTER QUE SEINICIAVA NA TELEVISÃO

Uma das mais destacadas jornalis-tas do País, Leila Cordeiro estreou natelevisão em 1979. Teve passagens pelaTV Aratu, da Bahia, TV Globo, TVManchete e SBT. Desde 1997 mora nosEstados Unidos, onde trabalhou comoâncora e repórter da CBS TelenotíciasBrasil. Atualmente, escreve nos blogsConexão América e Direto da Redação.

“No dia 30 de abril de 1981, tiveminha primeira grande experiênciacomo jornalista. Eu trabalhava na TVGlobo, sem horário fixo, já que esta-va começando. Era meio ‘pau pra todaobra’, como todo iniciante. Ia onde memandavam, sem hora pra começar emuito menos pra acabar. E foi assimque fui parar no Riocentro, na véspe-ra do Dia do Trabalhador. Já havia ter-minado oficialmente o meu horáriocomo repórter, estava em casa, quan-do uma ligação da Redação me convo-cou para estar a postos para cobrir um‘acontecimento inesperado’, ocorridono estacionamento do Riocentro”,lembra Leila.

“Era tarde, mais ou menos dez danoite. Já estava deitada, pronta pradormir. Pulei rápido da cama e aindasonolenta vesti-me com a primeiraroupa que encontrei, até porque o carroda Globo chegou em seguida ao telefo-nema. Quando estacionamos no Rio-centro senti algo estranho no ar, ape-sar de não ver nenhuma movimentação.Vimos que havia fumaça num determi-nado lugar e fomos até lá. Quando che-gamos ao local vimos, em primeiramão, um Puma destruído, com umapessoa lá dentro também completa-mente destroçada. Era sangue por todolado. O cinegrafista e eu não entende-

mos nada. Nós não sabíamos sequerpor que estávamos ali. Aliás, naquelemomento, ninguém sabia. Nem a che-fia de Reportagem da Globo. Mas issologo se resolveu”, conta.

Em poucos minutos, carros da Polí-cia, do Exército e dos bombeiros cerca-ram toda a área. “Eles nos empurrarampara fora e começaram a perguntar oque tínhamos visto. Logo em seguidachegaram repórteres de vários jornaise cada um correu para o seu lado paraapurar os acontecimentos. Naqueledia, eu sabia que estava aprendendoalgo mais... Fiquei cobrindo o fato atéo dia seguinte, quando chegou outraequipe para me render. Dali fui diretopara a Redação da TV Globo, onde fi-quei à disposição dos editores e da di-reção para escrever o texto e ajudar naedição. Não vi, não posso afirmar comcerteza, mas soube que representantesdo alto escalão do Exército estiveramna emissora, nos andares poderosos daTV Globo no Jardim Botânico, paraacompanhar as informações. O queposso dizer é que tive que mudar otexto umas três vezes e quase ‘testemu-

nhar ’ o que vi no estacionamento”,conclui Leila.

No caso do Riocentro, o tiro saiu pelaculatra. Os ataques, é claro, seriamatribuídos pelo regime aos brasileirosque enfrentavam a ditadura, mas aprimeira bomba daquela noite de 30 deabril de 1981 explodiu, literalmente, nocolo dos militares, por volta das 21horas, antes de ser instalada. O artefatomatou um sargento e feriu gravementeum capitão. Assim, ficou bastanteóbvio de quem era a autoria dos atosterroristas. Como se não bastasse, umasegunda explosão ocorreu, poucosminutos depois, numa estação de ener-gia responsável pelo abastecimento doRiocentro. A bomba foi jogada porcima do muro, explodindo no pátio,sem prejudicar a eletricidade do pavi-lhão, o que certamente causaria pâni-co entre o público de cerca de 20 milpessoas. Apesar das evidências contrá-rias, um inquérito policial militar, aber-to para apurar o caso, chegou a divul-gar a versão oficial de que as bombasforam implantadas no carro para ma-tar os militares, e não trazidas por eles.

A EXPERIÊNCIA DEUM FOTÓGRAFO EMSEU OFÍCIO DIÁRIO

De máquina em punho, RogérioReis participou como fotógrafo do Jor-nal do Brasil das equipes que cobriramos atentados à OAB e ao Riocentro.

“Para sobreviver àquela obscura fasede medo e desconfiança, nós, jornalis-tas, desenvolvemos o saudável hábitode discutir regularmente nossas estra-tégias de atuação profissional. O prin-cípio básico de checar todas as informa-ções e versões apresentadas era exerci-do como nunca, de forma rigorosa. Essanossa postura foi fundamental para es-clarecer a opinião pública e restaurar emgrande parte a verdade dos fatos.”

Rogério, que cedeu algumas ima-gens da época para o Jornal da ABI, lem-bra de detalhes do episódio do Riocen-tro. “Logo na manhã seguinte à bom-ba, o repórter Israel Tabak e eu fomosà caça do maldito automóvel Puma,para tentar entender o ocorrido atra-vés dos estragos feitos pela explosão noveículo. Depois de algumas voltas, lo-calizamos o carro abandonado em umarua deserta bem próxima à delegacia daBarra da Tijuca. Sem a presença deoutros jornalistas e da Polícia, percebe-mos que estávamos sós: Israel, eu e oPuma. Excitados com o inesperadoencontro, logo iniciamos nossa períciacom todo cuidado para não imprimirnossas digitais no carro”.

Além de imagens gerais, RogérioReis fotografou importantes detalhesdo painel fronteiro ao motorista e o dobanco do carona. “Estava em perfeitascondições, o que desmascarava a pri-meira versão oficial de que a bombateria sido colocada debaixo dele. Melembro da cena do Israel com uma varade bambu pescando no assoalho o ti-cket de estacionamento, que determi-nava a hora de chegada dos dois mili-tares ao Riocentro, como se eles fossempessoas comuns. Naquela época, nos-sa principal dificuldade era vencer odesafio constante de voltar para a Re-dação com o dever jornalístico cumpri-do de forma ética, apesar das barreirasimpostas pelo regime.”

Nas passeatas e manifestações, comoocorreu no enterro de Dona Lyda, sem-pre apareciam falsos fotógrafos, infil-trados com credenciais desconhecidas.“Tudo isso produzia tumulto e tensãono ambiente. Para evitar o confiscoarbitrário dos nossos filmes, tínhamoso hábito de esconder, não dinheiro, masfilmes na cueca e nas meias, ou enter-rá-los provisoriamente em algum jar-dim da cidade. Me lembro de que, naEra Geisel e no Governo Figueiredodurante as coberturas de eventos coma presença dos Presidentes era comumchegar em casa com marcas dos belis-cões dos seguranças de Brasília, queassim nos provocavam para justificaro cancelamento da nossa credencial detrabalho. Acho que aprendemos a con-viver com sabedoria e a resistir comhumor a todos esses dissabores daque-las coberturas. Afinal, o que passáva-

ROG

ÉRIO

REIS/TYBA

Foi assim que o repórter Israel Tabak e o fotógrafo Rogério Reis encontraram o Puma ondeexplodiu a bomba que deveria ser usada no atentado no Riocentro: parcialmente destruído.

33Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

mos nas ruas era café- pequeno dian-te da barbárie ocorrida nos porões daditadura”, diz Rogério. que cita outrocaso emblemático da época.

OS ATENTADOS CONTRA ATRIBUNA E A ABI

Diante de outros atentados, a sensa-ção de medo, por vezes, se instalava. “Ocaso da bomba na Tribuna da Imprensafoi uma espécie de aviso. Vivíamos apre-ensivos e já sabíamos que estávamospisando em um terreno minado, peri-goso. De uma forma geral, esse ambien-te intimidou muita gente e deixoumarcas morais e psicológicas em algunsjornalistas. Por outro lado, grande par-te das Redações resistia e acreditava queo regime de exceção e os excessos come-tidos pelos militares estavam com osdias contados”, lembra Rogério Reis.

Certamente ninguém sofreu ou serevoltou mais com esse ato terroristado que Hélio Fernandes, jornalista eDiretor da Tribuna da Imprensa. “Oassassinato de Dona Lyda emocionouo País e era a tentativa de atingir umórgão em especial, a OAB, que sempreresistiu às ditaduras. No Riocentro,quase uma catástrofe, podiam termorrido milhares de pessoas que assis-tiam ao show de mpb comemorativodo 1º de Maio. Até hoje não se expli-cou a razão do atentado e do seu fra-casso. Entre esses dois casos, ocorreuem 26 de março de 1981 a destruiçãoda Tribuna da Imprensa, também como mesmo objetivo criminoso e terroris-ta. O jornal, instalado na Rua do Lavra-dio, foi totalmente destruído, devasta-do, destroçado, impedido de circular.”

Em texto publicado na internet,Hélio Fernandes conta o desfecho dasinvestigações sobre o atentado. Oumelhor, torna evidente que a investi-gação, ao menos de fato, nunca ocor-reu. “Quando foi praticado o crimeterrível contra a Tribuna da Imprensa,funcionava no Senado a ‘CPI do Ter-

A era das bombas: a linha-dura resiste

ror’, presidida pelo Senador MendesCanale e tendo como relator FrancoMontoro, mais tarde Governador deSão Paulo. Este me telefonou no diaseguinte ao ataque, combinou que vi-ria conversar comigo. Como o jornal,naquele momento, não existia mais,nos encontramos no gabinete do Bar-bosa Lima Sobrinho, a grande figuraque presidia a ABI naquela época.”

Hélio descreve a cena da qual foipersonagem central e na qual, bem aseu estilo, falou durante seis horas se-guidas, sem beber um gole de água.

“Fui interrompido apenas por per-guntas, que não deixei sem resposta.Citei nomes, revelei que tudo haviasido planejado, preparado e executadopelo SNI, que com isso tentava tornarsem efeito o que agora ministros do Su-premo Tribunal Federal, equivocada-mente, seguem a rotina, chamando deanistia ampla, geral e irrestrita. Dissetextualmente: ‘Esse é o golpe do SNI,para prorrogar a ditadura!’. E nadamelhor para isso do que destruir o jor-nal que se jogou inteiro na resistênciaa ela. Gostaria de fornecer esse depoi-mento histórico aos ministros do STF,que se negaram a indenizar o jornalpelos prejuízos decorrentes deste aten-tado. Infelizmente, não é possível. Nãodemorou muito e o depoimento desa-pareceu dos anais do Senado.”

Na mesma tarde em que ocorreu oatentado contra a OAB, no dia 27 deagosto de 1980, foi desativada uma car-ta-bomba deixada no 8º andar do pré-dio da ABI, onde funcionava uma repa-rição do Governo, a SuperintendênciaNacional de Abastecimento-Sunab. Oartefato, dessa vez, era dirigido ao Su-perintendente do órgão, General Glaucode Carvalho, mas por sorte não foi de-tonado. Sua secretária, que recebeu a en-comenda, precavida com o que haviaocorrido instantes antes na OAB, des-confiou e não abriu o pacote que acom-panhava o documento, evitando que omecanismo de ativação fosse acionado.Ainda nesta data, explodiram outrasduas bombas, no jornal Tribuna da LutaOperária e no prédio da Câmara Muni-cipal do Rio de Janeiro, esta última fe-rindo seis pessoas, uma com gravidade:um assessor do Vereador Antônio Car-los de Carvalho, um dos mais atuantesadversários da ditadura.

No primeiro ataque ao prédio da ABI,ocorrido na manhã de 19 de agosto de1976, houve diversos danos. “Colocadano banheiro masculino do sétimo an-dar, no mesmo lado onde ainda hojefuncionam a Diretoria e o Conselho daAssociação, a bomba destruiu boa par-te desse pavimento, mas não todo ele.A explosão não chegou até o lado opos-to, isto é, à Secretaria e à Tesouraria. Am-bas passaram incólumes por toda aquelaprovação”, relatou recentemente o Pre-sidente da ABI, Maurício Azêdo.

“O que aconteceu na nossa sede nãotem resposta. Quem deve respostas sãoas autoridades de segurança”, protes-tou na época o então Presidente daCasa, Prudente de Moraes, neto.

1980JANEIRO18 – Desativada bomba noHotel Everest, no Rio, ondeestava hospedado LeonelBrizola, recém-chegado doexílio de 15 anos.27 – Bomba explode naquadra da Escola de SambaAcadêmicos do Salgueiro, noRio, durante comício doPMDB.

ABRIL26 – Show 1º de maio –Bomba explode em uma lojado Rio que vendia ingressospara o espetáculo.30 – Em Brasília, Rio, PortoAlegre, Curitiba, BeloHorizonte, Belém e São Paulo,bancas de jornal começam aser atacadas, numa ação quedurou até setembro.

MAIO23 – Bomba destrói aRedação do jornal EmTempo, em Belo Horizonte.29 – Bomba explode nasede da ConvergênciaSocialista, no Rio de Janeiro.30 – Explodem duas bombasna sede do jornal Hora doPovo, no Rio de Janeiro.

JUNHO27 – Bomba danifica a sededa Casa do Jornalista, emBelo Horizonte.

AGOSTO11 – Bomba é encontradaem Santa Teresa, no Rio deJaneiro, num local conhecidopor Chororó. Em São Paulo,localizada uma bomba noTeatro da UniversidadeCatólica-Tuca, horas antes darealização de um ato público.

incendiária em Belém.

1981JANEIRO5 – Outro atentado a bombaem supermercado do Rio.7 – Na Cidade Universitária,no Rio, uma bomba explodeem ônibus a serviço daPetrobrás.16 – Bomba danifica relógiopúblico instalado noHumaitá, no Rio.

FEVEREIRO2 – É encontrada, antes deexplodir, bomba colocada noaeroporto de Brasília.

MARÇO26 – Atentado às oficinas dojornal Tribuna da Imprensa,no Rio.31 – Bomba explode noposto do INPS, em Niterói.

ABRIL2 – Atentado a bomba naresidência do Deputadofederal Marcelo Cerqueira, noRio.3 – É parcialmente destruídacom a explosão de umabomba a Gráfica Americana,no Rio.28 – O grupo Falange PátriaNova destrói, com bombas,bancas de jornais de Belém.30 – Ocorre o maisrumoroso atentado, noPavilhão do Riocentro, naBarra da Tijuca, Rio deJaneiro, durante show comartistas como Chico Buarque,Caetano Veloso, Gilberto Gil,Gal Costa, MiltonNascimento, Elba Ramalho eGonzaguinha, emhomenagem ao Dia doTrabalhador.

12 – Bomba fere aestudante Rosane Mendese mais dez estudantes nacantina do Colégio Social daBahia, em Salvador.27 – No Rio, explodebomba-carta enviada aojornal Tribuna da LutaOperária. Outra bomba-cartaé enviada à sede da OAB,no Rio, e na explosão morrea secretária da ordem, DonaLyda Monteiro. Ainda nestadata explode outra bomba,esta na Câmara Municipaldo Rio de Janeiro. Outra édesarmada na Sunab, nomesmo prédio da ABI.

SETEMBRO4 – Desarmada bomba noLargo da Lapa, no Rio.8 – Explode bomba-relógiona garagem do prédio doBanco do Estado do RioGrande do Sul em Viamão,no interior do Estado. 12 – Duas bombas em SãoPaulo: uma fere duaspessoas em um bar emPinheiros e a outra danificaautomóveis no pátio da 2ªCia. de Policiamento deTrânsito no Tucuruvi.14 – Bomba explode noprédio da Receita Federal emNiterói.

NOVEMBRO14 – Três bombas explodemem dois supermercados doRio.18 – Bomba explode edanifica a Livraria Jinkings emBelém, Pará.

DEZEMBRO8 – O carro do filho dodeputado Jinkings édestruído por uma bomba

TRIB

UN

A DA IM

PREN

SA

Perseguido com prisão e confinamento, Hélio Fernandes foi alvo do atentado terrorista que destruiu as instalações da Tribuna da Imprensa.

34 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

Sidney Rezende começou nojornalismo em 1985 na RádioRoquette-Pinto. Ao longo dos 24anos de carreira trabalhou emjornais, emissoras de rádio e detv e, mais recentemente, nainternet, com o portal de no-tícias SRZD, que em trêsanos de atividade atingiu amarca de 1 milhão de usuá-rios na rede. A consagradatrajetória multimídia é mar-cada pela competência, éti-ca, responsabilidade social epelo espírito empreendedor,revelado já no início da profis-são em projetos e iniciativasinéditas que contribuíram para arenovação do modelo noticioso norádio e na TV.

DEPOIMENTO

Com seu talento multimídia– trabalhou em jornal, rádio,televisão e, agora, internet –,ele criou um veículo que éum arraso em audiência.

POR BERNARDO COSTA

DIVU

LGA

ÇÃ

O

35Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

JORNAL DA ABI – COMO UM JOVEM QUE

SONHAVA COM A CARREIRA DE CINEASTA SE

TORNOU JORNALISTA?Sidney Rezende – Acho muito bo-

nito quando a pessoa tem em mente asua vocação desde a infância. Isto nãoaconteceu comigo, mas eu percebia quetinha aptidão para a comunicação.Quando eu estava no primário, a pro-fessora de Geografia pediu para os alu-nos apresentarem a matéria escolar emformato de telejornal. No final da mi-nha apresentação, ela falou que eu ti-nha talento para ser um jornalista.Mais tarde vi que a professora tinhaacertado o prognóstico. No período daditadura militar, eu tinha a preocupa-ção de não ter vínculos com a chama-da burguesia. Para mim, naquela épo-ca, estudar em uma universidade repre-sentava uma atitude burguesa. Deci-di, então, não fazer faculdade. Opteipor um curso introdutório de Filosofia,na Universidade Santa Úrsula, ondeconheci a freira Maria Edna Brito, daIgreja Progressista. Ela me convenceua ingressar na universidade, argumen-tando que eu era jovem e que um cur-so superior poderia abrir as portas paramim. Entrei para a Faculdade de Comu-nicação Social da PUC-RJ, mas comolá não havia curso de Cinema tive queoptar entre Publicidade e Jornalismo.Para alguém que não queria cursar umafaculdade porque julgava ser coisa deburguês, estudar Publicidade seria ide-ologicamente inaceitável. Então, fuipara o Jornalismo meio que empurra-do, conduzido por uma mão invisível.

JORNAL DA ABI – COMO FOI O INÍCIO DA

CARREIRA NA RÁDIO ROQUETTE-PINTO?Sidney – Me formei em Jornalismo

em 1983 e comecei a trabalhar no finalde 1985. A Roquette foi uma escolapara mim, pois a equipe, chefiada porRegina Boldstein, era formada por jor-nalistas experientes oriundos da RádioJB, com os quais aprendi muito. Eu nãotinha estagiado antes, não tinha expe-riência alguma. O começo foi muitodifícil, mas eu apresentava uma van-tagem: estava sempre bem informado,eu lia sobre tudo, especialmente sobreos fatos relacionados à política. Alémdisso, eu conseguia reconhecer facil-mente as pessoas, o que foi muito útilna cobertura do calvário do Presiden-te Tancredo Neves. Quando as perso-nalidades chegavam ao hospital paravisitá-lo, eu as identificava imediata-mente, ao contrário de alguns colegas.Severo Gomes, empresário eleito sena-dor pelo Estado de São Paulo, muitasvezes passava incólume durante asvisitas a Tancredo Neves. Eu me apro-ximava dele e fazia perguntas. Obtivemuita informação de bastidor, que euusava na Rádio. Com isso, fui levandoinformações para o ouvinte, um dife-rencial do meu trabalho.

JORNAL DA ABI – O QUE REPRESENTOU

A COBERTURA DO ESTADO DE SAÚDE DE TAN-CREDO NEVES EM SUA CARREIRA?

Sidney – Foi a mais importante co-

bertura do início da minha trajetória.Ao longo dos 17 dias em que permanecino Instituto do Coração, em São Pau-lo, onde Tancredo estava hospitaliza-do, tive a oportunidade de observar otrabalho dos repórteres mais experien-tes do Brasil e do exterior, que atuavamem diversos meios de comunicação.Nessa época eu não sabia fazer nada.Tanto é que me foi dado o horário damadrugada, de pouca visibilidade e au-diência. Por coincidência, no dia em queAntônio Brito, então porta-voz da Pre-sidência da República, comunicou ofi-cialmente a morte de Tancredo Neves,fui eu quem deu a notícia na Roquet-te-Pinto, uma emissora pequena, masque com essa cobertura subiu da 25ªpara a 5ª posição em audiência.

JORNAL DA ABI – O AMADURECIMENTO

PROFISSIONAL FOI CONQUISTADO NA RÁDIO JB?Sidney – Em função do programa

Encontros com a Imprensa, nessa emis-sora, eu vivia no centro dos aconteci-mentos. Diariamente, às 13h, entrevis-távamos grandes personalidades bra-sileiras, como o Presidente da Repúbli-ca, líderes políticos, o dicionarista Au-rélio Buarque de Holanda, o Presiden-te da ABI, Barbosa Lima Sobrinho, es-critores e intelectuais importantes comoFernando Sabino, Adélia Prado, Austre-gésilo de Athayde. Amadureci muitoem função do contato com essas pes-soas. Foi um momento fantástico. Pudeconversar, por exemplo, com Luís Car-los Prestes sobre assuntos delicados,como a relação dele com a Olga Bená-rio e o Governo Getúlio Vargas. Fize-mos um programa cujo tema da discus-são era a tortura. Entrevistamos ummédico acusado de ser torturador, aolado de Cecília Coimbra, do GrupoTortura Nunca Mais. Foi um climaemocionante e pesado, já que Cecíliao reconheceu como sendo seu tortura-dor no estúdio da emissora. Ao mesmotempo, foi uma situação bastante es-clarecedora, especialmente naqueleperíodo em que o País precisava passara limpo a repressão militar para seguirem frente. Diversos personagens quemarcaram a História do Brasil foramentrevistados no programa, como Bar-bosa Lima Sobrinho, que foi Presiden-te da Associação Brasileira de Impren-sa. Tive a chance de conversar com cadaum deles, ouvir seus relatos. Uma ex-periência engrandecedora, que estabe-leceu a base para o meu prestígio pro-fissional.

JORNAL DA ABI – EM 1991, ESTA EXPE-RIÊNCIA FOI TRANSFORMADA EM LIVRO.

Sidney – Sim. A produtora do pro-grama, Clarice Abdalla, que morreurecentemente – lembro como se fossehoje sua dedicação –, reuniu os gran-des momentos do programa na publi-cação As Entrevistas do Encontro com aImprensa. Nós dois, com o auxílio deoutras pessoas da equipe, decupamostodo o material, que é referência his-tórica do período entre a pós-ditadu-ra e a abertura política.

JORNAL DA ABI – E VOCÊ ESTAVA SÓ INI-CIANDO A CARREIRA.

Sidney – Com certeza. Quando saída Roquette-Pinto, dois amigos luta-ram muito para que eu fosse para aRádio JB, o Augusto Fonseca, que hojese dedica ao marketing político, e o Mar-cos Gomes, que atualmente está naRádio Nacional. Eles achavam que,apesar de eu estar no início, de certaforma tinha conseguido me destacar naRoquette Pinto, especialmente pelavontade e a disposição para trabalhar.Eu tinha muito entusiasmo em relaçãoà minha profissão. Isso fez a diferença.

JORNAL DA ABI – ALÉM DO ENTUSIASMO

E DA DISPOSIÇÃO, VOCÊ SE DESTACOU TAM-BÉM PELO PERFIL EMPREENDEDOR. QUANDO

SURGIU A IDÉIA DE IMPLANTAR O CHAMADO

SISTEMA ALL NEWS NO RÁDIO BRASILEIRO?Sidney – Em 1989, eu propus ao

Carlos Drummond que era o chefe deRedação da Rádio JB, a ampliação doconteúdo informativo na programaçãoda emissora. Ele se esforçou para implan-tar o projeto, mas não conseguiu sensi-bilizar o diretor e os donos da empresa.Nessa época a emissora se destacavapelo prestígio e credibilidade, mas aprogramação jornalística ocupava ape-nas horários definidos, com o Jornal doBrasil Informa (JBI), que apresentava osprincipais acontecimentos do dia emboletins com duração de 20 minutos a30 minutos, e com algumas entradasesporádicas de repórteres e comenta-ristas, como a Sônia Carneiro. A minhaidéia era uma Rádio JB-AM com mui-to mais informação. Achei que haviaespaço para isso, mas minha propostanão foi aceita. Comecei a perceber quenão estava me realizando ali. Não erao tipo de jornalismo que eu gostaria defazer. Por outro lado, eu estava em umaposição confortável, apresentando oprincipal programa da emissora e rece-bendo um salário expressivo para aépoca. Tentei implantar o mesmo pro-jeto na Rádio Alvorada-FM, que per-tencia a um grupo de banqueiros deMinas Gerais, e tinha uma programa-

ção essencialmente musical. Mas látambém não compraram a minha ideia.Até que um dia, fiquei sabendo por umcolega locutor que o dono da RádioPanorama-FM, Wellington David, gos-tava muito do meu trabalho e achavaque eu era um ótimo entrevistador. Fuiaté Nilópolis, na Baixada Fluminense,onde funcionava a emissora, e apresen-tei o projeto para ele, que ficou encan-tado e aceitou a minha proposta. Estafoi a primeira iniciativa no radiojorna-lismo brasileiro mais próxima do sis-tema all news. Foi também a primeiravez em que se incluiu o jornalismo nafm. Na época, o que se dizia, e faziasentido, é que o som na frequênciamodulada, por ter qualidade superior,era ideal para a programação musical.Nós quebramos este paradigma. Leveicomigo mais da metade da equipe dejornalistas da Rádio JB, como PatríciaMaurício, Nicolau Maranini, MarcoAntônio Monteiro, e a própria ClariceAbdalla, que ficou um tempo conosco,além de um grande número de repór-teres. Um mês após a estréia do progra-ma Panorama Brasil, foi anunciado oPlano Collor que congelou o dinheirode todo mundo e dificultou a captaçãode patrocinadores. Um dos nossosanunciantes não honrou o contrato,afetando drasticamente a folha de pa-gamento. Diante deste cenário, restou-nos começar do zero. Investimos o di-nheiro do nosso Fundo de Garantia daRádio JB para tocar o novo programa.Ficamos pouco mais de um ano no ar efoi um sucesso.

JORNAL DA ABI – VOCÊ CONSIDERA OPANORAMA BRASIL SUA INICIATIVA MAIS

OUSADA?Sidney – Posso citar dois momentos

marcantes nesse sentido. Um foi esteprograma, já que nunca havia sido feitonada semelhante. Quando não se temnenhum parâmetro o momento é fas-cinante e ao mesmo tempo assustador.Ninguém sabe o que vai acontecer.Hoje, mais amadurecidos, olhamospara trás e perguntamos o que nosmotivou a tomar aquela iniciativaousada e pioneira. O que atualmenteé oferecido no programa Pânico, norádio, ou no CQC, na televisão, nós jáfazíamos em 1990. EntrevistamosEduardo Dussek dentro do banheiro doteatro onde ele estava apresentandoum show. Entrevistei Cássia Eller, aportas fechadas, dentro de um quartode hotel. Foi realmente um sucesso, umfenômeno na fm. Nossa audiência eramaior do que a das rádios JB e Globo fm.Importantes personalidades da políticabrasileira estiveram em Nilópolis paraconceder entrevistas como RobertoCampos, César Maia e Garotinho. Lem-bro do Senador Nélson Carneiro, muitovelhinho, subindo com dificuldade asescadas da emissora. Optamos pela li-nha editorial que mesclava informaçãoe humor e o conceito A liberdade é adiferença slogan dado pelo Milton Te-mer. As grandes emissoras, muitasvezes comprometidas com interesses

36 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

empresariais, tinham dificuldades paracobrir os assuntos com total liberdade.Nós não. Nosso único compromisso eracom o público. Fazíamos uma cobertu-ra divertida, interessante, moderna,atualizada, com profundidade e con-teúdo. A editoria de Política era chefi-ada por Marco Antônio Monteiro;Economia, por Ricardo Bueno e Patrí-cia Maurício; Cultura, inicialmentecom Waldir Leite e depois com SidneyGarambone. Entre os colunistas tive-mos Hermeto Pascoal, Nélson WerneckSodré, Jânio de Freitas, Maria LúciaDahl, Ricardo Noblat, entre outros. Foimais ou menos o modelo adotado maistarde pela CBN, mas sem o humor.

JORNAL DA ABI – QUAL FOI O SEU PAPEL

NA CRIAÇÃO DA RÁDIO CBN?Sidney – Eu estava no Clube de

Engenharia e, em função do sucesso naPanorama-FM, fui abordado por JoséRoberto Marinho, que era o Diretor doSistema Globo de Rádio. Ele me con-vidou para fazer parte do grupo queestava começando a ser formado parauma nova rádio, que viria a ser a CBN.Eles não sabiam ainda qual seria onome. A rádio que existia na época eraa Eldorado. O primeiro contratado foio Jorge Guilherme, responsável pelojornalismo. Eu fui o segundo contrata-do e assumi o cargo de Editor-Execu-tivo. Ao lado de Marco Antônio Mon-teiro e Ramiro Alves, criei a grade deprogramação do Jornal da CBN, quesubstituiu o Jornal Eldorado, e existeaté hoje. Fui um dos fundadores e a pri-meira voz da Rádio CBN, que nasceuaqui, no Rio de Janeiro. Arildes Cardo-so, que era locutor da Eldorado, ficoucom medo de perder o emprego com acriação da nova rádio. Para garantir olugar dele, tive a ideia de ter um locu-tor e um âncora, solução ainda hoje uti-lizada no Jornal da CBN. Mantive oemprego dos antigos funcionários, quese entusiasmaram e colaboraram mui-to com o novo projeto. Depois de ummês com a nova programação, ainda naRádio Eldorado partimos para a inaugu-ração da CBN. Heródoto Barbeiro eracontra a mudança do nome da rádio emSão Paulo, que se chamava Excelsior. Eledizia, com razão, que aquele nome jáestava sedimentado junto ao público. Apedido de Jorge Guilherme e de José Ro-berto Marinho, fui a São Paulo para ten-tar convencê-lo a mudar o nome e ob-tive sucesso. Então, a CBN começou noRio e depois foi para São Paulo. Destaforma foi sendo montada em todo o Bra-sil e hoje é esta potência.

JORNAL DA ABI – DEPOIS ESTE MODELO

DE JORNALISMO MIGROU PARA A TV. COMO

SURGIU O CONVITE PARA INTEGRAR A EQUI-PE DA GLOBO NEWS?

Sidney – Cinco anos após a criaçãoda CBN, a diretora de tv Alice Maria,que estava montando a equipe da Glo-bo News, durante um almoço com Jor-ge Guilherme manifestou interesse emconhecer os âncoras que faziam partedaquele projeto bem sucedido da rádio.

Ela realizou testes comigo e com outrosapresentadores e achou que o meudesempenho tinha sido superior ao queela esperava. Fui contratado e perma-neço lá apresentando uma edição doConta corrente e o Em Cima da Hora.

JORNAL DA ABI – CONTE UM POUCO SO-BRE A SUA CARREIRA NA TV.

Sidney – Desde o inicio da profissãoeu sempre tive dois ou três empregos.Enquanto eu estava na Roquette Pin-to, e depois na Rádio JB, fui pauteirona Rádio Mec, posteriormente, co-mentarista da Rádio Globo, apresen-tador do Jornal do Rio, da TV Bandei-rantes, colaborador do programa SemCensura. Atuei ainda em alguns pro-gramas na antiga TVE, hoje TV Bra-sil, como o Baleia Verde, com Fernan-do Barbosa Lima. Até o momento, de-

vistas inteligentes, para novos talen-tos. Fui um dos beneficiados, mas nãoera exatamente aquele profissionalcom quem ele contava mais. Fernandotinha muitas parcerias com o RobertoD’Ávila e o Osvaldo Sargentelli. Tra-balhei um bom tempo com ele. Fizemoso programa Baleia Verde durante maisde um ano e alguns outros. Ele tambémme dava a oportunidade de apresentara edição do programa Conexão França,no formato do bem sucedido ConexãoInternacional, quando o Roberto D’Ávilaprecisava viajar.

JORNAL DA ABI – QUAL FOI O OUTRO MO-MENTO MARCANTE DE SUA CARREIRA APÓS OPANORAMA BRASIL?

Sidney – Foi a criação do portal SRZDhá três anos. Um segundo momento deousadia por se tratar de um portal de

diquei 30% da minha carreira à tele-visão e 70% ao rádio.

JORNAL DA ABI – FALE SOBRE A EXPERI-ÊNCIA DE TRABALHAR COM FERNANDO BAR-BOSA LIMA EM UM PROGRAMA PIONEIRO.

Sidney – Foi a primeira vez em quese produziu uma revista ecológica natelevisão brasileira. O Fernando era umcriador, um empreendedor. Ele tinhaesta vocação. Eu lembro que o CláudioPereira, sócio dele na Intervídeo, dissepara mim uma vez que o Fernando eraum menino, uma criança, e que a ca-beça dele, mesmo com os cabelos bran-cos, era a de um garoto, em relação àcriatividade. O Cláudio tinha razão.Fernando Barbosa Lima criou diversosprogramas pioneiros. Com sua inven-tividade, era um diretor que possibili-tava a abertura de espaços para entre-

Formado em 1983 pelaPontifícia UniversidadeCatólica do Rio, Sidney

escolheu o curso deComunicação porque não

existia lá aquele que elequeria fazer: o de Cinema.

Seu começo profissional,no final de 1985, foi na

Rádio Roquette-Pinto, ondeteve a sorte de ser foca de

uma equipe experienteoriginária da Rádio JB, queliderava o radiojornalismo

no Rio. Jovem, cheio degás, não temia entrevistarmonstros-sagrados, como

Chico Anísio.

DEPOIMENTO SIDNEY REZENDE FOTOS: DIVULGAÇÃO

37Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

notícias atuando em meio a outrosvinculados a grandes veículos de comu-nicação.

JORNAL DA ABI – FOI UM MOVIMENTO

SEMELHANTE AO DE SUA SAÍDA DA RÁDIO JBPARA A PANORAMA FM?

Sidney – Com certeza a mesma idéia.Os grandes conglomerados de comuni-cação estão sempre no meu caminho eeu sempre, de alguma forma, identifi-cado com grupos independentes. É umasaída para o mercado de comunicaçãono Brasil a existência de produções in-dependentes, experiências alternativas,até mesmo para alimentar os grandesconglomerados em termos de criativi-dade e novas propostas. Muita genteacredita que portais como o meu, ouprogramas como o Panorama Brasil ri-valizam com os grandes grupos de co-municação, mas na verdade represen-tam forças de renovação.

JORNAL DA ABI – COMO SURGIU O PRO-JETO DO PORTAL?

Sidney – Eu já tinha trabalhado naTribuna da Imprensa, no Jornal do Bra-sil, em rádio quase todo o tempo, e emtelevisão. Mas não tinha experiênciacom a internet. Meu filho, FranciscoRezende, que hoje dirigi a empresa, meestimulou a entrar nesta área. Minhaprimeira atitude neste sentido foi bus-car a oportunidade dentro da Globo.Como não foi possível, pedi permissão,firmada em contrato, para criar meupróprio portal de notícias.

JORNAL DA ABI – E QUANTO AO SEU BLOG?Sidney – Nós optamos por fazer o site

primeiro e depois o blog, como comple-mento. Não só o meu, mas também osdos demais blogueiros que participamdo nosso portal. O site e os blogs for-mam o portal SRZD. Desde o iníciorecebemos o retorno do público. Inici-almente contabilizamos cerca de 2.600acessos mensais. Hoje, alcançamos amarca de um milhão. Um salto expo-nencial em três anos. É fascinante, poiso público é heterogêneo, inclusive ide-ologicamente. E eu gosto que seja as-sim. O pluralismo sempre permeou omeu trabalho. Não me sinto bem ematuar em um veículo no qual eu nãopossa exprimir opinião, dizer o quepenso. É muito ruim ser pressionadopelos patrões, pela publicidade, pordificuldades operacionais. Acreditoque a minha liberdade é proporcionalà liberdade do público e vice-versa.

JORNAL DA ABI – O PORTAL SRZD AL-CANÇOU A MARCA DE UM MILHÃO DE USU-ÁRIOS, UMA META SUA. QUAIS SÃO OS PRÓ-XIMOS PROJETOS?

Sidney – A nossa meta agora é, nospróximos 12 meses, permanecer nestepatamar. Nos esforçamos muito parasubir até um certo platô da montanha.Agora, vamos parar um pouquinho,respirar, trabalhar, melhorar o produto,para ganhar fôlego de novo e continu-ar crescendo. Temos a intenção de emalgum momento criar uma webrádio. Já

temos os estúdios, só falta adquirir al-guns equipamentos. Estamos levantan-do o orçamento, mas é preciso ter cau-tela, já que a crise econômica afastou ospatrocinadores tradicionais do merca-do. Todo mundo está tendo um poucomais de calma. As empresas internacio-nais consultam suas matrizes e elas pe-dem mais cautela. Estamos esperandoo melhor momento.

JORNAL DA ABI – A EDITORIA CARNAVA-LESCO DO PORTAL SRZD OBTEVE GRANDE

SUCESSO NA COBERTURA DO CARNAVAL.FALE SOBRE ESTA EXPERIÊNCIA.

Sidney – Através do Carnavalescotemos a oportunidade de noticiar oCarnaval o ano inteiro. A equipe daeditoria, chefiada pelo jornalista Alber-to João, é formada por pessoas verda-deiramente apaixonadas pelo carnaval,daí o sucesso. No dia da apuração doresultado dos desfiles tivemos dificul-dades pois dois servidores exclusivosficaram congestionados, tornando oacesso lento. A apuração do GrupoEspecial foi perfeita, mas na do Grupode Acesso, percebemos o site mais len-to, em função da grande quantidade depessoas que recorreram ao Carnavales-co para obter informações. Isto já foicorrigido. Agora temos um servidormaior e no ano que vem vamos dispo-nibilizar mais espaço para que o pro-blema não se repita.

JORNAL DA ABI – NA SUA OPINIÃO, OJORNALISMO NA INTERNET ESTÁ ESTRUTURA-DO E PODE SER UM BOM CAMINHO PARA AIMPRENSA?

Sidney – A internet é fantástica jus-tamente por estar se estruturando. Éuma obra aberta que está sendo cons-truída. Pode ser uma enciclopédia paraa qual todo mundo colabora, ou um pro-duto que não deu certo e alguém trans-formou em algo extraordinário, ou umespaço aberto para idéias antigas comnovas roupagens. Não tenho a menordúvida de que a internet é o caminho.Eu, que amo os livros, compreendo asdificuldades das novas gerações paradesenvolver o hábito da leitura. Masvale lembrar que eles estão lendo narede. Aí podem citar as deficiências noaprendizado da gramática. Sim, mas éimportante destacar que hoje há maisacesso à informação a partir dos sitese portais. Quanto mais incontrolávele desestruturada for a internet, melhorserá para a liberdade de criação do ho-mem, dos jornalistas.

JORNAL DA ABI – VOCÊ JÁ TRABALHOU EM

JORNAL, RÁDIO, TV E INTERNET. EM QUE TIPO

DE VEÍCULO VOCÊ SE SENTE MAIS À VONTADE?Sidney – Até eu ser demitido da

CBN, nunca tinha deixado de trabalharno rádio. São 25 anos dedicados aoveículo, trabalhando paralelamente emoutros lugares. Eu tenho uma grandeidentificação com o rádio.

JORNAL DA ABI – VOCÊ RETORNOU AO

RÁDIO RECENTEMENTE. COMO SURGIU ESTA

OPORTUNIDADE NA MPB FM?

Sidney – Por contrato, eu tenhoimpedimento de fazer ancoragem emqualquer emissora de rádio que nãopertença às organizações Globo. Então,na MPB FM faço dois comentários, às9h e às 18h. O portal SRZD vai produ-zir o conteúdo nos moldes de umaagência de notícias. A MPB FM segueuma programação cultural com a qualeu me identifico muito. Uma bela opor-tunidade para aproximar a internet dorádio. Alimentamos com notícias osboletins informativos que vão ao ar às7h e às 18h, o MPB Notícia, e, no meioda tarde, o MPB Finanças. Atendemostambém o rush, quem está indo parao trabalho e quem está voltando. Como tempo, sentindo a receptividade dopúblico, pensaremos em novas idéias.

JORNAL DA ABI – EM 1993, VOCÊ RE-TORNOU À PUC PARA DAR AULAS DE JORNA-LISMO. QUE ENSINAMENTOS VOCÊ PRIORI-ZOU PARA TRANSMITIR AOS ALUNOS?

Sidney – Comparo a profissão dejornalista à de garçom. Levamos a in-formação da cozinha para a mesa. Nãosomos o chefe de cozinha que prepa-rou a refeição, nem o dono do restau-rante. Somos apenas aquele indivíduoque oferece ao público a informaçãoque ajudará as pessoas a tomarem assuas decisões. É muito importante queo jornalista tenha consciência destepapel. A leitura é essencial para a pro-fissão. Millôr Fernandes costuma dizerque jornalista tem de ler até bula deremédio. Concordo. Quanto mais in-formação o profissional reunir, maisqualificada e correta será a coberturados fatos. Não creio que existam ape-nas duas versões de um acontecimen-to. Tampouco acredito na neutralida-de. Acredito, sim, na isenção e na mul-tiplicidade de leituras de um determi-nado fato. O nosso dever, como jorna-listas, é fazer uma profunda apuração.Quanto melhor a apuração, melhor areportagem. É preciso ter paciênciapara apurar, humildade para entendera profissão e consciência de que o ob-jetivo é informar o maior número depessoas possível, principalmente aque-

las que pertencem às classes sociaismenos favorecidas. É para elas quedevemos atuar como fiscais do poder.Este é o nosso dever.

JORNAL DA ABI – POR QUE VOCÊ DECI-DIU ESCREVER UM LIVRO ABORDANDO O

TEMA SUCESSO?Sidney – Antes de escrever o livro

Deve ser bom ser você, eu tinha umadúvida: como dois irmãos, às vezesgêmeos, educados no mesmo univer-so, na mesma escola, acabam traçan-do caminhos opostos? Um consegueprosperar, enquanto o outro fracassa.Ao escrever o livro, entendi que famanão é sinônimo de sucesso, e que quan-do se trabalha com metas o sucessochega mais rápido, especialmente nosplanos de curto prazo. Quem opta porobjetivos muito ambiciosos, pode levara vida inteira para alcançá-los. O indi-víduo que percorre metas de curto pra-zo, ganha motivação a cada conquista.Aprendi também que dinheiro não éindicador de sucesso e que só a felicidadenos leva ao estado de consagração.

JORNAL DA ABI – VOCÊ SE CONSIDERA

UM PROFISSIONAL BEM SUCEDIDO?Sidney – Não me sinto realizado. Eu

confesso que sinto orgulho da minhaorigem em Campo Grande, Mato Gros-so do Sul. Sou o caçula de uma famíliade cinco filhos, e minha mãe enfrentoutodas as adversidades para me criar. Omeu início na profissão foi marcadopor muito esforço, trabalho, noites maldormidas, plantões e outros problemas.Posso dizer que sou bem sucedido aoobservar de onde eu vim e estou ago-ra. Ao longo da minha carreira, sem-pre acompanhei as experiências de ou-tros colegas, as coisas que eu gostariade ter feito, mas não sei se teria a mes-ma capacidade. Isto em relação a umtexto bem feito, uma matéria bem aca-bada, um equilíbrio harmonioso entreimagem e texto, uma coluna que trazuma nota que eu poderia ter apuradoe não apurei. Enfim, todos os dias en-contramos a guém que fez algo melhordo que nós.

Segundo jornalista contratado pela Rádio CBN do Rio, depois de ter trabalhado naTribuna da Imprensa e no JB, Sidney foi um pioneiro do chamado jornalismo multimídia.

38 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

A parte mais efêmera de mimÉ essa consciência de que existoÉ todo existir consiste nistoÉ estranho!.Esse é um dos versos de Perplexida-

de, um dos poemas inéditos do livro Emalguma parte alguma (Editora JoséOlympio), de Ferreira Gullar, que nodia 10 deste setembro está completan-do 80 anos de idade.

O livro acaba se tornando um pre-sente duplo: para o autor, pela criaçãode mais uma obra; para os admirado-res da sua poesia, pela oportunidade dematar as saudades de seus poemas reu-nidos em uma única publicação, poiso último lançamento aconteceu há dezanos, com Muitas vozes.

Dividido em quatro partes, o livroreúne 59 poemas inéditos, compostos

nos últimos dez anos, nos quais o au-tor aborda diversos temas, entre osquais arte, universo e exílio. Todas ascaracterísticas dos versos do poeta, quesegundo ele nascem do “espanto, doinesperado, como sentir o cheiro de umjasmim ou esbarrar em um móvel”, sãoanalisadas na obra por Antônio CarlosSecchin e Alfredo Bosi, em dois textoscríticos.

“Com 61 anos de ofício, a poesia deFerreira Gullar torna-se cada vez maisnova. Neste arrebatador Em algumaparte alguma pulsa a urgência da vida,por meio de um olhar que se lança tantomicroscopicamente à textura espessadas frutas condenadas ao apodreci-mento, quanto telescopicamente àsolidão esquiva e silenciosa do cosmo”,diz Antônio Carlos Secchin, poeta,

CELEBRAÇÕES

Gullar

Este 2010 está sendo generosocom o poeta, que conquistou o

Prêmio Camões, brilhou naFeira Literária Internacional

de Parati-Flip, lançou um livrode poemas após dez anos de

abstinência e fez 80 anossaudável e admirado.

POR JOSÉ REINALDO MARQUES

professor, membro da Academia Bra-sileira de Letras e um dos maiores es-pecialistas da obra de Gullar.

Um ano fecundoO ano de 2010 tem sido especial

para o poeta Ferreira Gullar, pois ce-lebra o seu octagésimo aniversário es-banjando a mesma fecundidade poé-tica que o elegeu um dos maiores dogênero no Brasil. Em junho, conquis-tou o 22º Prêmio Camões, o principalda língua portuguesa, pelo reconheci-mento alcançado pelo conjunto da suaobra. Em agosto, foi festejado comuma mesa especial de debates na Fes-ta Literária Internacional de Paraty-Flip, em Paraty.

Poeta, jornalista, teatrólogo, pintore crítico literário, Ferreira Gullar nas-

ceu em São Luís, no Maranhão, em 10de setembro de 1930. Seu primeiropoema publicado foi O trabalho, im-presso no jornal O Combate, em 1948.No mesmo ano, estreou como locutorda Rádio Timbira e colaborador doDiário de São Luís. Em seguida, contan-do com recursos próprios e o apoio doCentro Cultural Gonçalves Dias, pu-blica Um pouco acima do chão, seu pri-meiro livro de poesia.

Em 1951, mudou-se para o Rio deJaneiro, onde desde então desenvolveuo seu brilhante dom artístico e literá-rio e se tornou amigo de Mário Pedro-sa, Oswald de Andrade, Décio Pagna-tari, Augusto e Haroldo de Campos.Ainda nos anos 50, trabalhou nas re-vistas O Cruzeiro e Manchete, no Diá-rio Carioca e teve também uma parti-

O ano dagraça de

DIVU

LGA

ÇÃ

O

39Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

O dvd Poema Sujo, produzido edistribuído por iniciativa doInstituto Moreira Sales, é o cinemadocumental em seu estado maisbruto. Praticamente não há edição,com todas as hesitações normais deuma produção – tanto diante comopor trás da câmera – captadas damaneira mais fluida possível,assumindo erros e ruídos com totalnaturalidade. Tudo para registrar,sem retoques, o poeta Ferreira Gullarlendo aquela que é uma de suasobras mais significativas: PoemaSujo, de 1975, verdadeiro clássico danossa literatura recente.

Cabe aqui uma explicaçãohistórica: forçado ao exílio peladitadura militar, Gullar morava naépoca em Buenos Aires, onde tinha

cipação no Suplemento Dominical doJornal do Brasil.

A partir dos anos 60, Ferreira Gullarpassa do texto poético considerado ex-perimentalista para uma poesia maisengajada de vanguarda. Isso aconteceudepois da sua passagem pelo DistritoFederal como Diretor da Fundação Cul-tural de Brasília, nomeado pelo Presi-dente Jânio Quadros. Lá criou o projetodo Museu de Arte Popular.

Em 1962, o poeta ingressou no jor-nal O Estado de S.Paulo, onde trabalhoupor 30 anos. No mesmo ano filiou-seao Centro Popular de Cultura da UniãoNacional dos Estudantes-CPC. Nessaépoca publicou João Boa-Morte, CabraMarcado Para Morrer e Quem MatouAparecida, cujos textos são pistas doseu engajamento político ideológico.

Engajado, sempreUma das principais características

da trajetória de Ferreira Gullar é o seusenso crítico que faz dele, para além doambiente literário, um dos maiorespensadores do País. Entre suas obrasmais importantes estão Poema sujo(1976), Argumentação contra a morte daarte (1993) e Muitas vozes (1999).

Duas vezes indicado para o PrêmioNobel de Literatura (2002 e 2004), Fer-reira Gullar já foi agraciado com o Prê-mio Jabuti e o Prêmio Alphonsus deGuimarães, da Biblioteca Nacional,ambos em 1999. Conquistou o PrêmioMulticultural 2000, do Estadão, e o

Prêmio Príncipe Claus, da Holanda,dado a artistas, escritores e instituiçõesculturais de fora da Europa que tenhamcontribuído para mudar a sociedade, aarte ou a visão cultural de seu país.

Em 1964, filiado ao Partido Comu-nista Brasileiro-PCB, foi uma das vo-zes que protestaram contra a ditadu-ra militar e que defenderam o socialis-mo como a única alternativa digna para“o capitalismo selvagem que oprimia aclasse operária”. Foi um período degrande efervescência da criação artís-tica de Ferreira Gullar, que tinha comoparceiros Oduvaldo Viana Filho, Pau-lo Pontes e Teresa Aragão, entre outros,com os quais fundou o Grupo Opinião.

O engajamento social em um tem-po de nebulosidade política no País lheimpôs um período no exílio (1971 a1977), passado na antiga União Sovi-ética, Peru, Argentina e Chile, ondeacompanhou a derrubada de SalvadorAllende (Chile, 1973) e, disse, ter-sedado conta de que a esquerda acaboucometendo um equívoco:

Eu aprendi na minha luta política,no preço que paguei no exílio, a ter umavisão diferente do marxismo que nãotenho medo de expressar. Eu vi a extre-ma esquerda e o Partido Socialista deAllende trabalharem a favor do golpe,pensando que estavam sendo mais deesquerda do que todo mundo. Na ver-dade, colaboraram com a CIA paraderrubar Allende. O marxismo temuma visão política generosa, mas equi-vocada “, afirmou Gullar em entrevis-ta ao jornal Folha de S.Paulo.

Gullar diz que não se arrepende detodas as lutas sociais e políticas queapoiou. Costuma dizer que as frustra-ções e as tristezas ele supera com a po-esia. Seus escritos são como um com-bustível para o recomeço. Esse com-portamento está refletido no poema

Toada à toa, que faz parte do livro re-cém-lançado:

A vida, apenas se sonhaQue é plena, bela ou o que for.Por mais que nela se ponhaÉ o mesmo que nada por.Pois é certo que o vivido- na alegria ou desespero –Como o gás é consumido...Recomeçamos de zero.

De bem com a vida e com os poemasque escreve, Ferreira Gullar diz que apoesia lhe traz felicidade e discordadaqueles que dizem que escrever poe-sia é um sofrimento: “Pode ser pra eles,para mim é uma alegria”, declarou àFolha, revelando que Poema Sujo, umdos mais importantes que escreveu,nasceu no exílio de um “transe, umbarato que durou por cinco meses”:“Sentia-me impelido a escrever”.

Com uma trajetória repleta de expe-riências inusitadas em vários camposde atuação (jornalismo, política e arteliterária), Ferreira Gullar afirma que éum poeta que não dá bola para o sofri-mento, que para ele não tem nenhumvalor: “Não quero saber do sofrimen-to, quero é felicidade. Não gosto defazer lamúrias. Detesto o passado”.

“Poema Sujo” passado a limpo em dvdCriação de Gullar

chega ao mercadocom imagens dopoeta e sua voz.

POR CELSO SABADIN

medo de “desaparecer”, junto atantos outros “desaparecidos”vítimas das várias ditadurasmilitares instaladas na América doSul. Um temor que o motivou aescrever aquela que deveria ser umaespécie de “obra resumo” de suavida, caso ele de fato sumisse pelosporões da truculência daquelemomento. Gullar tinha medo demorrer sem deixar um legado, ePoema Sujo deveria ser, por assimdizer, seu “testamento literário”.

Assim, entre maio e outubro de1975 Gullar dedicou-se a escreverseu longo poema, que desembarcouno Brasil no mesmo ano, gravado emuma fita cassete trazida pelo poetaVinícius de Moraes. Naqueles anosde chumbo, seria muito arriscadopassar pela alfândega brasileira comum texto de autoria do poetaexilado, e gravá-lo em fita pareceuser uma boa idéia. E de fato foi: agravação passou despercebida pelasautoridades, e em pouco tempo, játranscritos, os versos de Gullarcomeçaram a correr pelo País comoum manifesto pela liberdade.

A força dos seus versos e a

divulgação de sua obra motivaram opoeta a tomar uma atitude corajosa:deixar o exílio por conta própria evoltar ao Brasil mesmo sendoproscrito, desafiando a ditadura depeito aberto. E avisando a todos, deantemão, que estava voltando. Aousadia deu certo, com o retorno dopoeta sendo tolerado pelos militares:

a repercussão de seu Poema Sujo lheserviria de escudo.

Em 2005, comemorando os 30anos desta história com final feliz, opoeta Fernando Franceschi, entãoDiretor do Instituto Moreira Sales,teve a idéia de registrar em vídeo aíntegra do poema, gravado pelopróprio Ferreira Gullar. Agora em2010, esta gravação chega aomercado no formato dvd.Mercadologicamente, serve tambémcomo parte das comemorações pelos80 anos de Gullar, completados nodia 10 deste mês de setembro.

Por mais despojado que seja otrabalho, as filmagens foramcoordenadas por profissionais degrande talento: o documentaristaJoão Moreira Sales e o Diretor deFotografia Walter Carvalho, um dosmelhores do País, o mesmo deCentral do Brasil. Não bastasse oregistro histórico das imagens dodvd, a edição ainda traz umcaprichado encarte com reproduçõesde textos de Paulo Mendes Campos eVinícius de Moraes, publicadosrespectivamente no Jornal do Brasil ena revista Manchete em 1976.

40 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

“A obra gráfica de Rico Lins de-monstra como são imprecisos os limi-tes entre a arte e o design. Mais ain-da: arte e vida”. A frase é de AgnaldoFarias, professor da Faculdade de Ar-quitetura e Urbanismo da Universida-de de São Paulo e curador da exposi-ção Rico Lins: Uma Gráfica de Frontei-ra, em cartaz na Galeria da Caixa Cul-tural, em Curitiba/PR, até 24 de ou-tubro, com mais de 100 obras. Não poracaso a mesma definição foi escolhi-da para dar início a esta matéria, quese ocupa de traçar o perfil deste artis-ta de 54 anos, carioca radicado em SãoPaulo, respeitado no mundo e forma-

tativa de compreender os fundamen-tos de um talento tão apurado quan-to diversificado, entra em cena o pró-prio Rico Lins.

“Acho saudável quando as artes plás-ticas banham a linearidade da metodo-logia projetual com a ambigüidade, oerro, o acaso. Considero isto uma pre-sença indissociável do meu trabalho.Aliás, acho que isto é o que o torna in-teressante. A criação deve sempre pri-mar pela liberdade, em qualquer ativi-dade”, define Rico Lins, que costumarepetir em entrevistas que “o perfeitoé péssimo”.

Menos que eficiente frase de efeito,a máxima ajuda a entender a trajetó-ria e o estilo de Rico. Quando retornou

ao Brasil em 1994, depois de 15 anos deestudo e trabalho na França, na Ingla-terra e nos Estados Unidos, ainda pre-valecia por aqui a pregação da perfei-ção não somente como meta, mascomo regra geral a ser obedecida. Ovalor residia no rigor, na precisão, nalimpeza, na funcionalidade e em outrosprincípios quase sempre assépticos.

“Acredito que, apesar de estarmoscada vez mais submersos em um uni-verso de imagens descartáveis, umaimagem ainda vale mais do que milpalavras. Sou uma espécie de intérpreteocular da História e me identificomuito com a vanguarda antropofági-ca brasileira, que se abastecia de tudosem a menor culpa. Sou um profissio-nal que mantém o compromisso cria-tivo com a pluralidade de expressões ea diversidade que compõem a identi-dade cultural brasileira. E considerofundamental ampliar o repertório econtribuir para a educação visual dopúblico”, diz.

A variedade de formatos nos quaisé possível admirar sua arte comple-menta essa linha de raciocínio, segundoa qual o artista tudo pode, tudo quer.“O que mais me atrai nos projetos é aabordagem criativa de um tema nabusca de uma solução de comunicação.E comunicação não é mera informação,é uma via de mão dupla, que provocae convida à interação. O que torna osprojetos mais ou menos interessantesé a possibilidade de explorar este diá-logo. É difícil dizer qual me atrai mais– entre cartazes, capas de livros e ilus-trações, por exemplo. Pois cada umdeles tem características específicas etodos podem, em princípio, ser explo-rados criativamente.”

A arte no jornalismo,uma necessidade

É natural que aqui, no Jornal da ABI,sua produção para jornais e revistasmereça um capítulo à parte. “Não achoapenas que existe espaço para a arte nojornalismo. Acredito, mesmo, que hánecessidade dela. Por não me apoiar emum estilo, mas buscar a solução gráficaque melhor se encaixe a cada tema, sem-pre consegui experimentar graficamen-te de um modo híbrido. Como capista,isso permitia não apenas garantir a va-riedade das capas, mas trafegar da co-lagem à fotografia, à ilustração, de for-ma analógica ou digital, com muitaautonomia. Sob este aspecto, a revistaacadêmica alemã KulturRevolution, aBravo e a Time eram tratadas da mesmaforma, independentemente do públicoe dos mercados nas quais atuam”, con-ta ele, que segue em seu relato.

“A Newsweek, por exemplo, é a se-gunda maior revista semanal de infor-mação dos Estados Unidos e circulamundialmente em quatro edições:América do Norte, América Latina,Europa e Ásia. As características deprodução de uma publicação desseporte exigem logística sofisticada e aprodução simultânea de material edi-torial exclusivo para os quatro merca-

DESIGN

“A comunicação não é mera informação, é uma via de mão dupla, que provoca e convida à interação”,diz esse artista gráfico, um dos mais premiados do País, que ganha retrospectiva de sua fecunda carreira.

A perfeição gráfica doacaso, segundo Rico Lins

POR PAULO CHICO do pela Escola Superior de DesenhoIndustrial-Esdi-Rio, em 1976.

Designer, diretor de arte, ilustradore educador, Rico Lins desenvolveu pre-miada carreira junto a instituições eempresas de destaque, no Brasil e noexterior. Um talento que amplia asfronteiras das artes plásticas, engloban-do outras manifestações artísticas,como música, dança, arquitetura, fo-tografia, moda e poesia. Ao mixar, emdefinitivo, as formas de expressão aca-dêmica às populares, criou novas pos-sibilidades para cartazes de teatro ecinema, capas de revistas, livros e dis-cos, ilustrações, comunicação visual demuseus e projetos gráficos, inclusivepara programas de televisão. Na ten-

ROD

RIG

O H

AMAM

41Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

dos. Esse contexto exige a criação se-manal de várias opções de capa paraas diferentes edições, cujos prazos defechamento devem ser rigorosamen-te obedecidos: os temas das capas sãodefinidos na tarde de terça, para seremcriadas, aprovadas, editadas e impres-sas até a madrugada de sábado, paracirculação mundial no fim de semana.Assim, podem vir a ser solicitadasmais de 20 diferentes capas por sema-na. Eu atuava como ilustrador, desig-ner ou diretor de arte para matérias oucapas”, completou.

Rico Lins cultivou relação estreitacom grandes jornais diários, como oThe New York Times, The Boston Globe,

The Washington Post, além de revistassemanais. Também trabalhou espora-dicamente para publicações como Ro-lling Stone e New Yorker. “Grande par-te destas publicações mantém umaequipe composta por duplas de Editore Diretor de Arte para cada uma de suasseções editoriais. Mas, mesmo assim,muitos trabalhos eram resolvidos soba pressão das atualidades semanais.Algumas vezes, a solução gráfica eraencontrada durante um telefonema doDiretor de Arte, na hora do fechamentoda edição. Fui agenciado pela PushPinStudio por vários anos, o que contribuiupara que eu colaborasse com publica-ções variadas em diversos pontos dos

Estados Unidos. Morei em Nova Yorkdo final de 1987 até minha volta aoBrasil, em 1994.”

Outro período importante da carrei-ra de Rico foi registrado numa tempo-rada na Europa que, na verdade, ante-cedeu sua ida para os Estados Unidos.“Cheguei na França em 1979, turbina-do pela imprensa alternativa de opo-sição no Brasil e os desafios criativosimpostos pela censura. A colaboraçãono Tendências e Cultura, do Opinião, eo experimentalismo de jornais como OBeijo, estimulavam o exercício com aambigüidade da imagem para garantira crítica e a reflexão. O papel da ima-gem na imprensa e as infindáveis dis-

cussões com jornalistas, intelectuais eartistas me deram musculatura parachegar na imprensa de oposição daFrança pré-Mitterand, com discurso eolhar crítico muito afiados”, recorda.

Um Editor e Diretor de Arteem cada seção editorial

Nessas discussões, o quanto havia deconflito entre designers e editores, istoé, entre forma e conteúdo? Como ga-rantir harmonia e complementaridadeentre esses dois aspectos? “Palavra eimagem articulam-se de formas diver-sas e o domínio do texto na grande im-prensa coloca a imagem num papel su-postamente secundário e decorativo,

Acima, colagem publicada na capa do caderno Arts&Leisure do The New York Times combina ícones da cultura pop, e dois cartazes que participaram de eventos gráficos: um alusivo àDeclaração dos Direiros Humanos e outro comemorativo do centenário de Bertolt Brecht. Abaixo, três capas de revistas: a Big Brasil, de 1999; a Business Week, e a Newsweek.

42 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

com alguma exceção para o fotojorna-lismo. Meus melhores trabalhos na im-prensa foram feitos com jornalistas vi-sualmente inteligentes e cultos, queaceitavam explorar as mensagens visu-ais de forma completa, autônoma ecomplementar, mesmo que tomandoposições diferentes das do texto escri-to”, revela.

Na Europa, Rico trabalhou para umleque de publicações, que ia do Le Mon-de e Libération a jornais e revistas de di-versos grupos de oposição da França eda Alemanha. “Só fui para os EstadosUnidos após um período sabático quepassei em Londres, onde morei entre oinício de 1986 e o final de 1987. Lá fuialuno do Royal College of Art, o que medeu a possibilidade de experimentarnovas mídias, técnicas e linguagens.Foram estes aprendizados brasileiro e

europeu que levei para os EstadosUnidos, um enorme mercado editori-al marcado pela liberdade de opinião epela produção industrial da cultura.”

O interesse de Rico pelas imagens sur-giu ainda na infância. “Este universo sem-pre me atraiu. Na adolescência, fui mui-to estimulado por meu tio, o jornalistaDarwin Brandão, que tratou de me colo-car em contato com a arte, a música, ocinema e os artistas. Nesta fase, eu respi-rava rock, mas minha guitarra não encon-trava nem amplificador nem músico àaltura... Assim, desde cedo mergulhei decabeça nas imagens. Só não sei se foi poropção, ou justamente pela falta de opçãoem fazer algo que me atraísse mais”.

Tendo recebido os mais importantesprêmios da área, e com trabalhos emexposição regular em grandes museuspelo mundo, Rico é consultor de design

e comunicação empresarial, coordenaseu estúdio de criação, no bairro de Per-dizes, em São Paulo, e desenvolve pro-jetos para clientes como TV Globo,Rede Bandeirantes, GNT, SporTV,WEA, Banco do Brasil, Santista, Roche,Zoomp, Alliance Française, GoetheInstitut e Fundação Roberto Marinho,entre outros. Além disso, promovecursos, palestras e oficinas no Brasil eno exterior.

Uma avaliação daimprensa brasileira

E qual a visão do artista sobre a im-prensa brasileira? “Acho que há umacerta padronização definida não só pe-las tecnologias de impressão gráfica,mas pelos meios de comunicação, ape-sar de isto não ser privilégio do Brasil.Isto se evidencia mais na grande im-

prensa, onde o investimento na tecno-logia gráfica é infinitamente maior doque no design gráfico. E como não exis-te projeto gráfico novo sem projetoeditorial novo, vemos que o designeditorial mais interessante está naspublicações que valorizam e conside-ram o design como elemento que vaialém da estética. O bom design é ele-mento fundamental para a imprensae a linguagem jornalística.”

DESIGN A PERFEIÇÃO GRÁFICA DO ACASO, SEGUNDO RICO LINS

Acima, três capas da revista acadêmicaKulturRevolution, criada e editada por

professores da Universidade de Bochum,na Alemanha, se caracteriza pela liberdade

gráfica. Rico Lins é colaborador dapublicação desde sua fundação em 1982.

Embaixo, cartaz do filme Labirinto dePaixões para o mercado norte-americano;e duas capas da revista Bravo!, onde Rico

também colabora desde a primeira edição.

43Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

Avaliar a obra de Noel Rosa é mergu-lhar em outra dimensão, além, muitoalém da rotineira. Uma dimensão quepossa explicar tão brilhante talento, ex-pressão do mais absoluto sentimento daarte. E vinda de alguém que morreu comapenas 26 anos, deixando uma obra quepaira no campo do mistério e do incom-preensível, tamanha a sua extensão eprofundidade psicológica, realizada emapenas seis anos de vida artística.

Noel rompeu com as convenções po-éticas e melódicas de seu tempo e aindadeu o tom para os acordes que viriam 30anos depois com a Bossa Nova, sendo“bossa” um termo usado por ele paradesignar a irreverência do carioca. A ge-nialidade de Noel não repousa apenas emsuas letras e rimas riquíssimas, nas crô-nicas sobre o Rio e seus personagens, naaguda análise da sociedade brasileira, nacrítica político/social e observação doscostumes, na forma anti-romântica defalar do amor. A genialidade de Noeltambém vem de sua musicalidade, poisele foi um excepcional músico, que noslegou composições belíssimas e de har-monias avançadas para a década de 30.

Neste ano em que se comemoram os100 anos de seu nascimento, renovamosa convicção de que passados mais de 70anos desde que ele nos deixou sua presen-ça é mais forte do que nunca, mostran-do, sem dúvida, que ele continua vivo emoderno entre nós. Como exemplificamalguns desses comentários sobre Noel:

“Noel Rosa, na música popular bra-sileira, pode ser ou não ser o mais psico-lógico, o mais poético, o mais harmoni-oso, o mais romântico, o mais realista,o mais ritmado etc, indiscutivelmente,ele é apenas o maior compositor popu-lar brasileiro.” (Paulo Mendes Campos, po-eta, escritor e jornalista).

“Noel é o marco fundamental da mú-sica brasileira. Letras de simplicidade ab-

soluta, fazendo uso da palavracom propriedade extraordi-nária. Humor excepcional,espontâneo, sem armação.Noel é a cultura popular au-têntica”. (Millôr Fernandes, jornalis-ta, escritor e teatrólogo).

“Noel é o mais moderno dos com-positores brasileiros.” (Aldir Blanc,compositor).

“A obra de Noel Rosa é, sem dúvida,a mais surpreendente da música popu-lar brasileira, pois nela não há altos e bai-xos, somente obras-primas.” ( ( ( ( (TimRescala, compositor e maestro).

Show FilosofiaNessas homenagens aos 100

anos de Noel, uma peça se des-taca: Filosofia de Poeta, de autoriade Nélson Laranjeira, ex-integrante daBanda Veludo e atualmente líder de umabanda de blues, a Original Band.Nelsinho (entre amigos) é um dosmaiores admiradores de Noel:

“Olha, não tenho palavras pa-ra exprimir o que sinto por ele.Noel é simplesmente fantástico,com tudo de fantástico que a palavra fan-tástico comporta.

Não é porque tenho uma banda deblues que não adoro o samba, aliás, sambae blues tem muito a ver, nos seus compo-nentes africanos, e a obra de Noel tem umpouco de tudo. Na minha peça, que es-pero ver encenada ainda este ano, contoo lado irreverente do Poeta da Vila e asmúsicas que refletem essa irreverência.O que torna o espetáculo uma explosãode bom-humor e alegria, que era a visãoque Noel tinha da vida”, explica Nelsinho.

Martinho: “Na Vila Noel é Deus”Depois de escrever enredo e samba-

enredo sobre Noel Rosa para a Unidosde Vila Isabel no Carnaval deste ano,

CENTENÁRIO

Noel Rosa,sempre

modernoNo 2010 em que completaria100 anos e 73 anos após suamorte, o poeta de Vila Isabelsobrevive como merecedorda definição de outro poeta

(Paulo Mendes Campos): ele éapenas o maior compositor

popular brasileiro.

POR ARCÍRIO GOUVÊA NETO

Martinho da Vila acaba de lançar o cdPoeta da Cidade, incluindo a obra nashomenagens prestadas pelo centenáriode nascimento do compositor.

Martinho canta Noel só com músicasde Noel, sem parceria, exceção feita aFilosofia, música que leva a assinaturatambém de André Filho. Se hoje é um es-pecialista em assuntos noelinos, Marti-nho reconhece que não era no início desua carreira:

“Ouvia e gostava de Feitiço da Vila, massó quando cheguei na Vila é que fui pes-

quisar, porque todo mundo falava deNoel. Lá, ele é Deus”, relembra Marti-nho, que prossegue:

“O Deus da Vila teve uma morte pre-matura – aos 26 anos, de tuberculose –,mas o fato não impediu que sua obrafosse reconhecida. Se não tivesse mor-rido tão cedo, Noel seria um grande com-positor de samba-enredo. Ele não pegoua Vila Isabel escola de samba. Em rela-ção a Noel, sou um santo. Ele era o ca-peta (risos). Na juventude, deu muitotrabalho para Dona Marta, sua mãe. Era

44 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

avesso à escola, abandonou a faculdadede medicina. Em poucos anos de vida foimais boêmio do que eu na minha vidatoda”, diverte-se Martinho.

Entrevista concluída, ele vibra com apaixão por Noel Rosa. Entre goles decerveja, explica à filha Mart’nália quãoavançado era o compositor 80 anos atrás:

“Ele tinha uma postura contra todosos preconceitos, sem falar e sem botarna música. Foi o primeiro a tratar dopreconceito contra homossexuais, fezuma música (Mulato Bamba, gravada porMário Reis) e dedicou a Madame Satã. Ossambistas de morro eram discriminados,Noel ia lá, fazia parceria com eles, dor-mia com elas. O cara era branco, feio,mas arranjava as mulheres que queria.”

Martinho não deixa de aproveitar aoportunidade para falar do que maisgosta: escola de samba. Militante histó-rico do Carnaval, ele defende a relevân-cia cultural de enredos, que na ditadu-ra enfrentavam acusações de ser ofici-alescos e/ou pernósticos:

“Falavam de independência, abolição.As escolas tiveram uma importânciamuito grande na integração contra opreconceito. Foram sempre discrimina-

Noel nasceu em 11 de dezembro de1910, na Rua Teodoro da Silva, 130, VilaIsabel, bairro da Zona Norte do Rio deJaneiro. Por amar as coisas da França, seupai, Eduardo de Medeiros Rosa, lhe deuo nome de Noel, Noël de Medeiros Rosa(com trema e tudo) e ainda por estarpróximo do Natal. Nasceu em uma ci-dade amedrontada pela Revolta da Chi-bata, comandada pelo marinheiro JoãoCândido contra os maus tratos pratica-dos pela oficialidade. O episódio apavo-rou sua mãe, Marta, o suficiente paraprovocar dificuldades no parto. Comisso, acabou retirado a fórceps, procedi-mento que ocasionou fratura do seumaxilar direito, fato que o marcaria parao resto da vida.

QUEM NASCE LÁ NA VILANEM SEQUER VACILA

AO ABRAÇAR O SAMBA...

Ele foi uma criança inquieta, que sem-pre chegava em casa com as roupas ras-gadas e o corpo suado das brincadeirasde rua. A rua...rua, que juntamente comos botequins e bordéis seria mais seu lardo que sua própria casa e sua companhiamais do que qualquer amigo ou namo-rada. Passarela de suas dores e conquis-tas, amores e desilusões, palco de suaglória, principalmente quando ouviaseus sambas cantados na época do Car-naval. Lugar onde ele construiria boaparte de sua personalidade...

Um gênio perduláriocom a saúde

Ele esbanjou talento e criatividade e dissipou a vida.

AGORA VOU MUDAR MINHA CONDUTAEU VOU PRA LUTA

POIS EU QUERO ME APRUMARVOU TRATAR VOCÊ COM FORÇA BRUTA

PRA PODER ME REABILITARPOIS ESTA VIDA NÃO ESTÁ SOPA

E EU PERGUNTO: COM QUE ROUPA?...

Quem dá mais?Noel deu várias versões para essa le-

tra. Em uma delas revela que em conver-sa com o pai teria dito a ele que a letra éuma crítica contra a falta de dinheirocrônica do brasileiro, principalmente ofuncionário público, que no fim do mêsrecebia uns “poucos vinténs”. E aindauma crítica à falta de emprego e oportu-nidade que milhões de trabalhadores empotencial sofriam no dia-a-dia. Aliás,com relação à “bancarrota coletiva”,Noel fez dezenas de músicas, entre elasQuem dá Mais, que diz em um trecho: ...

“Quanto é que vai ganhar o leiloeiroQue é também brasileiroE em três lotes vendeu o Brasil inteiro?...” Ele estava sempre pronto a pregar

uma peça em alguém. Assim, quando omotorista de táxi Malhado, que faziaponto no Café Nice, Centro da cidade,e para onde iam invariavelmente as ce-lebridades do Rio toda a noite, lhe pedepara fazer uma música inédita que can-tariam juntos em uma serenata para umagarota lá pelos lados da Rua Barão do BomRetiro, no Andaraí, Zona Norte do Rio.O pai da moça era militar; Malhado tinhamedo de ir sozinho, aceita na hora.

Logo no dia seguinte, Noel aparececom a música, uma valsa, e combinamque quando fosse meia-noite soltariamos pulmões embaixo da sacada da casaonde ela morava. Lá chegando, Noel dizpara Malhado entrar que ele esperaria na

calçada, pois a casa era a última de umavila. Mas Malhado insiste para ele irtambém; afinal, era Noel quem sabiatocar violão. Depois de muita insistên-cia, Noel entra na vila, desconfiado. Pegao violão, Malhado pigarreia; Noel lim-pa a garganta e ataca:

“Eu saí da tua alcovaCom o prepúcio doloridoDeixando o teu clitóris gotejanteCom volúpia emurchecidoPorém o gonocócus da paixãoAumentou minha tesãoDe gonorréia latejanteE espermatozóide perfurante”Logo abre-se uma janela e um homem

esbraveja:“Seus canalhas, biltres, sem-vergo-

nhas, isso é coisa que se cante para umamulher e ainda mais para a minha filha?”.

De revólver em punho, vara a noitecom dois ou três tiros para cima deles.Noel dispara e espera Malhado na rua.Continuam correndo até o antigo JardimZoológico, sempre olhando para trás. Lá,param, ofegantes. É quando Malhado sevira para Noel e sentencia

“Sabe Noel, essa gente sem sensibili-dade não entende poesia”...

SEU GARÇOM, FAÇA O FAVORDE ME TRAZER DEPRESSA

UMA BOA MÉDIA QUENÃO SEJA REQUENTADA,UM PÃO BEM QUENTE

COM MANTEIGA À BEÇA,UM GUARDANAPO,

UM COPO D’ÁGUA BEM GELADA...

Desencontros amorososterminam em samba

Seus desencontros amorosos resulta-vam também de uma total infidelidadecom as mulheres, de um inexistente

comprometimento. Ele não tinhaqualquer responsabilidade

para com o sexo femi-nino; quem caísse narede era peixe; de seus

relacionamentos fugazes econfusos de positivo deixa-vam somente as músicas.Um dos seus sambas maisricos em achados poéticos

fala justamente dessesdescaminhos, o clássicoTrês Apitos, compostopara sua namorada Jose-

fina (a Fina), que trabalhavana fábrica de tecidos Confiança,

fundada em 1885, no bairro da Tiju-ca, Zona Norte do Rio. O prédio da fa-

mosa fábrica já extinta (hoje um super-mercado) é tombado pelo PatrimônioHistórico e mantém por tradição a cha-miné com seus apitos que soam diaria-mente da mesma forma que outrora...

QUANDO O APITODA FÁBRICA DE TECIDOS

VEM FERIR OS MEUS OUVIDOSEU ME LEMBRO DE VOCÊ...

Quando sóbrio, Noel eraacanhado. Não cobrava aosque lhe deviam (principal-

mente Francisco Alves), enru-bescia quando elogiavam suascomposições e dificilmente to-

das, e nunca discriminaram. “Vamos pre-parar lindos mamulengos pra comemorar alibertação’, ecoavam os versos de Ondeo Brasil Aprendeu a Liberdade, sexto lu-gar no desfile de 1972".

Afirmando-se um otimista (“as revo-luções foram feitas pelos otimistas, nãopelos conformistas”), Martinho destinadiscreto elogio ao Brasil atual:

“Na política, não tivemos grandes exem-plos, com exceção de Getúlio Vargas, Jus-celino Kubitschek e, agora, de Lula”.

Há muito o que se dizer de Noel Rosa.Um dos maiores arquitetos do samba, quecaminhou da cidade ao morro para bebernas fontes de outros tão grandiosos, comoCartola e Ismael Silva, além de Braguinha(João de Barro) e Lamartine Babo, e trans-formou para sempre um dos estilos bra-sileiros mais conhecidos do mundo.Como disse Paulinho da Viola:

“Noel Rosa é o pioneiro de uma for-ma na qual a poesia popular, altamentesofisticada, embora saindo de maneirasimples, junta-se a uma melodia de fili-grana, de grande refinamento, dando asuas composições uma dimensão pou-cas vezes atingida na história da nossamúsica popular.”

QUEM ACHA VIVE SE PERDENDOPOR ISSO AGORA

EU VOU ME DEFENDENDODA DOR TÃO CRUEL DESTA SAUDADE

QUE POR INFELICIDADEMEU POBRE PEITO INVADE...

Com Que Roupa?Um dia dona Marta, sua mãe, re-

clama das noitadas do filho, que,além de não comer direito, bebe, fumae chega em casa sempre de madruga-da. Mas essa noite ela tomaria umadecisão: esconderia todas as roupas delee assim quando seus amigos chegassemNoel não poderia sair. Dito e feito; à noi-te eles aparecem e o convidam para umaniversário. Do quarto, ele responde comuma pergunta: “Com que roupa?”

Em 1931, sua música Com Que Rou-pa foi a mais executada. Sucesso retum-bante no Carnaval. O Rio de Janeiro todoa cantou. Serviu para ilustrar anúncio dejornal e de rádio e foi ainda motivo deinúmeras entrevistas e reportagens.Então com 20 anos, a partir daí, ele pas-saria a incorporar o bairro de Vila Isabelao cenário artístico brasileiro, mudan-do a vida da sua comunidade.

Noel transformou suas ruas pacatas,casas, moradores, botequins e o Boule-vard 28 de Setembro, tipicamente cari-ocas e de classe média, em imagens quepassariam a povoar a imaginação co-letiva brasileira, projetando-o interna-cionalmente.

CENTENÁRIO NOEL ROSA, SEMPRE MODERNO

45Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

Pesquisando trechos de entrevistasde Noel Rosa concedidas a jornais erádios do Rio e de Belo Horizonte, con-sultando depoimentos de amigos e ain-da trechos de livros sobre música popu-lar que abrangem a década de 1930,pode-se montar uma entrevista dele,que seria exatamente esta.

NOEL, AOS 13 ANOS VOCÊ ERA UM GAROTO

AMARGURADO QUE SOFRIA COM O SEU PROBLE-MA FÍSICO. NA ESCOLA, ERA CHAMADO IMPIE-DOSAMENTE DE “QUEIXINHO” PELOS COLEGAS.COMO É QUE VOCÊ SUPEROU ESSE PROBLEMA?

A música foi fundamental. Antes detocar violão eu comecei tocando o ban-dolim de minha mãe. Levava o instru-mento para a escola e sentia a sensaçãode ser importante e, para te confessar umsegredo, ser o centro das atenções. Erauma necessidade que eu tinha pra com-pensar meu problema físico, necessida-de que me acompanhou o resto da vida.No recreio, começava a tocar e logo a ga-rotada se reunia em volta de mim. Asmeninas me olhavam com assombro e cu-riosidade. E eu adorava, embora soubes-se que tudo ficaria apenas nos olhares.

QUE RELAÇÃO JULGA EXISTIR ENTRE O

AMOR E A MÚSICA?É a mesma que existe entre a casca de

banana e o escorregão. Brincadeiras àparte, a música expressa o amor; se eleé profundo e sincero a música refletiráisso; se é falso e fugaz, também. Nestesversos defino minha visão do assunto:o primeiro, Faz de Conta que eu Morri diz:“Amar deve ser para nós um divertimen-to/E não o eterno ciúme/ Que nos trazsofrimento...”; o segundo, Silêncio de umMinuto, fala: “Luto preto é vaidade nes-

maria alguma decisão que magoasse al-guém. Evitava comer perto dos outros,pois mastigava com dificuldade; porisso, alimentava-se de caldos, ovos e co-midas leves. Passando as noites em cla-ro, comendo pouco, bebendo muito efumando mais ainda, já apresentavaameaçadoras manchas nos dois pul-mões. É mandado para Belo Horizon-te, a fim de desfrutar de seu clima sau-dável. Mas lá não chegava para tantoscompromissos. Imagine, uma celebri-dade como ele na ainda ingênua e ma-nhosa Belo Horizonte.

Um dia é convidado para uma entre-vista na Rádio Mineira. Ao chegar, ficade bate-papo com um dos funcionáriose percebe intrigado que ele a todo mo-mento ligava para alguém e dizia: “Alô,é o embaixador Bill!” e desligava. Curi-oso, Noel pergunta o que significava aqui-lo e o funcionário explica tratar-se de umapessoa importantíssima da capital, umdesembargador, que não deixava nin-guém namorar sua filha. Sabendo que issoo irritava, o rapaz passava o dia inteironessa brincadeira. Noel pega o caso paraele e volta e meia ligava para o homem eatacava, já à sua maneira: “Alô, aqui é oembaixador Bill, vai pra p.....”

O ORVALHO VEM CAINDOVAI MOLHAR O MEU CHAPÉU

E TAMBÉM VÃO SUMINDOAS ESTRELAS LÁ NO CÉU

TENHO PASSADO TÃO MALA MINHA CAMA É

UMA FOLHA DE JORNAL...

Palpite infeliz: recadopara Wilson Batista

Em 1934, Noel inicia um embate mu-sical com o compositor Wilson Batista,que revida. A polêmica vai aumentandoaté que este lança Frankstein da Vila, deextremo mau gosto e insensibilidade. Acrítica e o público, que até então gosta-vam da contenda, recebem mal, muitomal, a apelação de Wilson, que nem pre-cisava disso, pois era um excepcionalcompositor.

Contrariado, Noel responde com Pal-pite Infeliz, mostrando que rivalidadeentre sambistas se resolve com elegân-cia e sutileza. E a questão termina aí.Mais tarde, ficam amigos...

QUEM É VOCÊ QUENÃO SABE O QUE DIZMEU DEUS DO CÉU

QUE PALPITE INFELIZSALVE ESTÁCIO, SALGUEIRO,

MANGUEIRAOSWALDO CRUZ E MATRIZ...

Certo dia, chegando em casa ao ama-nhecer, Noel troca o leite do vizinho pelasua cerveja e ainda deixa um bilhete quediz: “Amigo, envenene-se com a minhacerveja que eu vou me envenenando comseu leite”. Com relação ao espírito irre-verente e bem-humorado de Noel, emque situações inusitadas podem aconte-cer, vale a pena citar uma delas.

É Carnaval, um bloco vai abrindo pas-sagem, imenso, pela Avenida Maxwell,na Tijuca. Em dado momento surge Noel,vestido de mulher e dando enormes cam-

balhotas e plantando demoradas bananei-ras. Gargalhada geral, confusão, aplausos,um guarda aparece, pega Noel pelo bra-ço e o leva para fora do turbilhão:

“Seu Noel, o que é isso, não fica bempara uma pessoa como o senhor.

“Ora, seu guarda, qual é o problema?É Carnaval! Não se pode fazer umaspiruetas?”

“Poder pode, seu Noel, mas sem nadapor baixo?”

UM PIERRÔ APAIXONADOQUE VIVIA SÓ CANTANDO

POR CAUSA DE UMA COLOMBINAACABOU CHORANDO,ACABOU CHORANDO...

Uma fita amarela gravadacom o nome dela

O Poeta da Vila precisava realmentemudar de vida se quisesse continuarvivo. Até tentou. Depois de Belo Hori-zonte foi saborear uma temporada emNova Friburgo. Mas se afastar da boemiaé que era O Xis do Problema, como eleadvertia em uma de suas músicas. Assim,um dia tomava calmamente duas cerve-jas em um bar de Vila Isabel. O grandepoeta e compositor Orestes Barbosa, seuamigo, ao vê-lo naquelas condições, seaproxima e reprova sua atitude:

“Noel, você não sabe que não podebeber e ainda mais cerveja gelada, Noel

Impassível, Noel lhe mostra umanotícia no jornal:

“Leia, meu caro Orestes, descobriu-se na Alemanha que uma cerveja vale poruma refeição. Pois então, como já tomeiduas cervejas, estou repetindo o prato.”

QUANDO EU MORRERNÃO QUERO CHORO NEM VELA

QUERO UMA FITA AMARELAGRAVADA COM O NOME DELA...

“O maior castigo que te dou é não tebater, pois sei que gostas de apanhar” (OMaior Castigo que te Dou). Ele sempreesteve envolvido com mulheres: Clara,Josefina (Fina), Julinha, que ele chama-va de Meu barracão da Penha, bairro queacabou ganhando mais músicas suas doque Vila Isabel, a esposa Lindaura, de 13anos, que juntamente com Clara foraaluna de sua mãe. Mas foi inegavelmenteCeci, de 16 anos, o grande amor e pai-xão de sua vida. Bela e acessível, dança-rina do Cabaré Apolo, da Lapa, zona

boêmia do Centro do Rio, foi o seu maiordesengano amoroso.

Desse relacionamento, conturbado edoloroso, nasceram talvez as suas melho-res músicas. Último Desejo é uma delas. Elejá sabia que ia morrer, tentou construirum monumento de sua dor e desilusãocom essa música, mas Araci de Almeidasó a gravou seis meses após sua morte...

NOSSO AMOR QUE NÃO ESQUEÇOE QUE TEVE O SEU COMEÇONUMA FESTA DE SÃO JOÃOMORRE HOJE SEM FOGUETE

SEM RETRATO E SEM BILHETESEM LUAR NEM VIOLÃO...

Deixa a música para entrar na HistóriaMaio de 1937, dia 4, 11h30min da noi-

te, Rua Teodoro da Silva, 130, Vila Isabel.Noel está deitado em sua cama, sem for-ças para nada, espantosamente magro earquejante, olhar fixo no teto, quem sabeprocurando a Lua; talvez, ao lado da rua,sua única e verdadeira companheira, não

Arcírio Gouvêa Neto, jornalista, é 2º Secretário daMesa Diretora do Conselho Deliberativo da ABI

Noel, por ele mesmoUma entrevista montada com trechos do que

ele disse em entrevistas a jornais e rádios.

é por acaso que elas rimam. Ao lado desua casa, um vizinho dá uma festa, masantes pede à família de Noel autorizaçãopara o arrasta-pé. Seu irmão, Hélio, queo velava no quarto, vai atender o vizinhono portão

Ao voltar, Hélio conta o que aconte-ceu. Noel então pede a ele que vá até àcasa e peça para tocarem De Babado (Debabado sim/Meu amor ideal/Sem baba-do não...), sua música preferida. Quan-do o irmão volta, ele já escutava os acor-des amigos e bem-vindos da canção. Écom ela que deseja fazer uma grandeviagem, em sua companhia viajaria fe-liz e sem medo. Diz ao irmão:

“Estou me sentindo mal, quero virarpara o outro lado.

Ao virar, seus dedos tamborilam algunsinstantes sobre uma mesinha; a morte paraele também era um samba. As batidas vãodiminuindo... diminuindo... diminuindo.Pela primeira vez Noel atravessava umsamba. Já não mais vivia, mas morriasambando, ao atravessar a História.

te funeral de amor/ O meu luto é a sau-dade/E saudade não tem cor...”.

VOCÊ TEVE VÁRIOS CASOS AMOROSOS, SEM-PRE BEIRANDO A DESILUSÃO. COMO SEU CO-RAÇÃO CONVIVEU COM TANTA TURBULÊNCIA?

Vou te responder com outro samba,chamado Coração: “A paixão faz mal aocrânio/ Mas não afeta o coração...”. Naverdade, o samba é o melhor remédiopara estas moléstias, não dói e nem temcontra-indicação Administrando-o emdoses homeopáticas, conseguia mantersob controle os efeitos desse mal. Emconjunto com outro bom remédio cha-mado boemia então não há vírus dessetipo que nos destrua.

SEUS ÚLTIMOS DIAS FORAM DE MUITO SO-FRIMENTO, AFINAL, A TUBERCULOSE JÁ SE TOR-NARA IRREVERSÍVEL E MESMO ASSIM VOCÊ

CONTINUOU COMPONDO MÚSICAS BEM-HU-MORADAS, FALANDO COM IRREVERÊNCIA DO

SEU DIA-A-DIA. TEM EXPLICAÇÃO?Amigo, a vida não é para ser levada a

sério. O mundo é para ser desfrutado,quem complicou e criou todas as con-venções e formalidades foi o ser huma-no, na ambição insana de obter o vilmetal. Por isso, eu preferi viver e cantarcomo a cigarra, mesmo vivendo poucotempo, a ser uma formiga, refém da pri-são de um buraco-formigueiro dentro daterra. Mas sofri muito sim, como digoem um de meus sambas, Eu Sei Sofrer:

Quem é que já sofreu mais do que eu?Quem é que já me viu chorar?Sofrer foi o prazer que Deus me deuEu sei sofrer sem reclamar...

REPR

OD

ÃO

46 Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

A Biblioteca da ABI passou a contarem seu acervo com exemplar do livroCipriano Barata – Sentinela da Liberda-de e Outros Escritos (Edusp, 2008), or-ganizado e editado pelo jornalista ehistoriador Marco Morel. Trata-se deobra que, segundo o próprio organi-zador, reúne uma variedade de tex-tos que permitem, pela primeiravez, que se tenha uma visão doperíodo de emancipação do Brasil– fase de construção do Estado e daNação brasileira e do surgimento daimprensa no País –, quando a colô-nia deixa esse status e se transfor-ma em um império.

O volume apresenta 88 números dejornais redigidos por Cipriano Barata,além de sete manifestos/dissertações,alguns deles inéditos, três textos diversose os pronunciamentos nas Cortes de Lis-boa. Todo esse precioso conteúdo é apre-sentado pelo organizador por critériocronológico e pelo contexto em que sur-giu cada um dos escritos, enriquecidoscom comentários esclarecedores sobre asprincipais questões em debate.

O primeiro número do jornal Sentine-la da Liberdade foi publicado em 1823,época em que pela primeira vez no Paísa imprensa pôde circular sem censuraprévia. Cipriano Barata, seu idealizador,contava então mais de 60 anos, poisnasceu em 26 de setembro de 1762, nafreguesia de São Paulo, em Salvador.Marco Morel aponta-o como um dosprimeiros e principais líderes políticosbrasileiros no período em que “o Brasilse formava como nação”.

No texto de abertura, Morel ressaltaque a liderança exercida por CiprianoBarata tinha algo de especial, pois, dife-rentemente do lugar-comum do perío-do, não se baseava no poder econômico,militar ou até mesmo burocrático, “masatravés do carisma e do convencimen-to, da pregação da palavra pública im-pressa e falada”, marcadas pelo tom ex-pressivo de suas aspirações idealistas.

RevolucionárioA seguir, Marco Morel fala sobre o pi-

oneirismo do livro e a importância de Ci-priano Barata para a História do Brasil:

“Realmente, pela primeira vez os tex-tos, nunca publicados em livro, são impres-sos desde a morte do autor, há 172 anos.Cipriano Barata era famoso, figura centralna cena pública, mas aos poucos foi cober-to com o manto do esquecimento histó-rico. Ele foi uma das primeiras liderançaspolíticas de nível nacional no Brasil, logoapós a Independência. Exerceu tal lideran-ça através do carisma (paixão e razão) e,sobretudo, pela imprensa. Foi um dos pi-oneiros da imprensa no País e encarnavaum amplo projeto alternativo de socie-

e irmã Maria Helena Guimarães Pereira,jornalista que trabalhou ainda mais doque eu, o livro não se concretizaria. Es-távamos todos irmanados em trazer à luzuma parte importante da História revo-lucionária do Brasil, como disse Caio Pra-do Jr. em relação a Cipriano. Claro queum revolucionário dentro das limita-ções de seu tempo, como ocorre paraqualquer personagem histórico.”

InfluênciaSobre a importância histórica do

jornal Sentinela da Liberdade, Mar-co Morel diz que foi tão grande queacabou influenciando o surgimen-to de outros periódicos em diversasprovíncias do País, inclusive com o

mesmo título:“Lançado em 1823, foi tamanha a in-

fluência desse periódico que surgiram vá-rios, com o mesmo título, em diversas Pro-víncias e até no exterior, criando uma dasprimeiras redes de comunicação impres-sa no Brasil, interligada por um ideário deluta política”, conta Marco Morel, afir-mando que o jornal era revelador “de umBrasil que poderia ter sido”.

“Era a época dos primeiros passos,disputas e ensaios de construção de umEstado e uma Nação”. Por meio do Sen-tinela da Liberdade, foram levantadasalgumas bandeiras que acabaram não secristalizando (“algumas naquele perío-do, outras ainda hoje”) para a formaçãodo Estado-nação idealizado por Cipria-no Barata. Marco Morel assinala as prin-cipais críticas publicadas pelo veículo:

“A crítica ao predomínio do Poder Exe-cutivo sobre o Legislativo e o Judiciário;a denúncia de corrupção política; a im-plantação do federalismo enquanto des-centralização provincial; aumento e ga-rantia da liberdade de expressão; colocarlimites na grande propriedade fundiária

e redefinir a posse das terras; desmante-lar o aparelho repressivo das prisões exis-tentes; republicanismo e antiaristocratis-mo; liberdade de culto; fim do tráficoatlântico de escravos; eliminação gradualdo trabalho escravo; combate ao predo-mínio britânico na economia e nos cos-tumes e, também, ampliação dos direitosde cidadania para expressivos contingen-tes oprimidos do ponto de vista étnico esocial. Há problemas de longa duraçãoque ainda nos desafiam.”

PreciosidadesNa opinião de Morel, o principal le-

gado do Sentinela da Liberdade para aimprensa atual é que o jornal lançado porCipriano Barata estava “ao lado e à frenteda luta por liberdade de expressão e jus-tiça social, por transformações que que-brassem as estruturas de dominação, embenefício da maioria da população”.

No entendimento de Marco Morel, háum grande distanciamento, mais do quecronológico, entre a chamada grandeimprensa atual e a que Cipriano Baratae seus aliados faziam:

“Todos os jornalões e muitos dos jovensjornalistas atuais estão distantes da linha-gem de Cipriano Barata, à qual pertenceu,por exemplo, meu avô Edmar e, ainda hoje,aparece na comunicação (impressa, fala-da ou digital) de movimentos sociais e depropostas alternativas e críticas, bemcomo na atuação da ABI. Precisamos re-tomar, recriar e ampliar esta linhagem”.

Durante a sua pesquisa para livro,Marco Morel diz que se deparou compreciosidades, entre as quais manuscri-tos nunca impressos, incluídos algunsescritos no período em que CiprianoBarata esteve na prisão:

“Temos a corajosa dissertação sobretorturas nas prisões militares no governode Dom Pedro I na presiganga (navio-pri-são), bem como um manifesto lúcido econtundente contra a criação da primei-ra condecoração honorífica brasileira, aOrdem do Cruzeiro, prenúncio em 1822de uma nação desigual. Dos 186 núme-ros de jornais que sabemos redigidos porBarata, estão transcritos os 88 localiza-dos, sobretudo na Fundação Bibliote-ca Nacional e em outros acervos, comoo do bibliófilo José Mindlin, doado àUniversidade de São Paulo. Há tam-bém sete manifestos, além de cartase debates parlamentares. Ciprianodefine conceitos como legitimida-de, liberdade, pátria e povo e a idéiade república.”

Cipriano Barata esteve presonos períodos colonial, imperiale regencial; mesmo assim con-seguiu lançar o periódico docárcere. A prisão dificultou seutrabalho intelectual e sua açãopolítica, mas não impediramque fosse expressiva:

LivrosLivros

Criador da série de jornais intitulados Sentinela da Liberdade, ele sustentou há quase 180 anos idéias libertárias, denunciando a torturanas prisões, e reformas sociais, como o limite à propriedade de terras. Um historiador estrangeiro considerava-o o Che Guevara brasileiro.

Morel exalta o legado de Cipriano Barata

POR JOSÉ REINALDO MARQUES

dade, que não foi o predominante. Ain-da que não sistematizados numa obraorgânica, os escritos de Barata expressamo pensamento político radical (no bomsentido, de quem vai à raiz dos proble-mas) daquela época. Esta edição visa afacilitar o acesso aos pesquisadores e aquem se interessa em compreender cri-ticamente as matrizes do Brasil.”

Marco Morel explica que organizar eeditar esta obra era um sonho antigo, demais de 30 anos, aparentemente impos-sível de se concretizar devido à amplitu-de do trabalho. O projeto começou atomar forma com um pequeno livro,escrito em 1986:

“Publiquei o livro e defendi omeu mestrado sobre o tema em1990, sob a importante orientaçãoda Professora Célia Freire, que tam-bém pretendia esta publicação. O li-vro ficou com 936 páginas em gran-de formato, pode-se dizer que é lite-ralmente um trabalho de peso!”

Diz Morel que o livro só existiu por-que contou com a “extraordinária con-tribuição” do historiador István Jancsó,coordenador, com Pedro Puntoni, daColeção Documenta, da Edusp:

“O István, que faleceu recentemente,era uma pessoa generosa, lúcida e empre-endedora. Ele costumava dizer que Ba-rata era o “Che Guevara brasileiro”. Nofundo acho que foi por isso que organi-zei esta obra, durante cinco anos, traba-lho gigantesco pelo qual recebi uns R$1 mil até agora. E se não fosse tambéma imensa generosidade de minha amiga

Cipriano Barata e seu Sentinela daLiberdade (abaixo): denúncias de corrupção

política e crítica ao predomínio do PoderExecutivo sobre o Legislativo e o Judiciário.

47Jornal da ABI 358 Setembro de 2010

A vocação para o jornalismo foiuma herança do avô materno,Pedro Mota Lima, que junto comCarlos Drummond de Andrade eoutros integrava a “direçãocoletiva” da Tribuna Popular, jornallançado em 22 de maio de 1945para ampliar a ação política doPartido Comunista Brasileiro-PCB,que retornara à legalidade.

Ricardo Mota Lima Alvarez,nascido em 25 de abril (dia daRevolução dos Cravos, emPortugal) de 1948, também seguiuos passos do avô na luta política:por muitos anos teve militânciaativa no PCB. O Sindicato dosJornalistas Profissionais doMunicípio do Rio se orgulha detê-lo em seus quadros como umdiretor extremamente dedicado,durante a segunda gestão de CarlosAlberto de Oliveira, o Caó, iniciadaem 1980, após a derrota da diretoriaque fugia o jogo da ditadura.

Sempre preocupado emcolaborar para a construção de ummundo igualitário e mais justo,Ricardo integra a lista dostrabalhadores que morreram e nãoreceberam a indenização a quetinham direito como ex-empregados da TV Manchete, doimpério editorial de Bloch Editores,falido em agosto de 2000. Cerca de3 mil foram indenizados no anopassado, mas ainda faltam 400para receber seus créditos. RicardoAlvarez estava entre esses.

Estudante de Economia, cursoque não chegou a concluir, optoupelo jornalismo. Inicialmentetrabalhou no Correio da Manhã ena revista técnica Portos e Navios.Depois chegou à Rede Globo deTelevisão. Na Editoria de Esportes,entre outras atividades, foi chefede Reportagem e participou dacobertura das Olimpíadas de Seul,na Coréia do Sul, em 1988.Permaneceu na emissora até 1998,por 14 anos. Depois foi para a TVManchete e lá ficou até à falênciada empresa.

Durante dois anos, RicardoAlvarez chegou a morar em SãoPaulo, onde trabalhou como Editorda uma publicação na área deagricultura. Nos últimos anos,realizou uma série de trabalhosautônomos, como Editor do jornalda Associação de Moradores deLaranjeiras-Amal onde morava,escrevendo resenhas para publicaçõesda Petrobras ou fazendo revisão delivros e outras publicações.

“Cipriano nos permite ler a Históriade maneira exótica, isto é, fora da óticapredominante. Ao lidar com os textosficou mais clara para mim a estreita li-gação entre palavra impressa e palavrafalada, mostrando que os impressos nãoficavam restritos a uma pequena elitealfabetizada.”

CríticaAo comparar seu livro a outros estu-

dos sobre a História da imprensa noBrasil, Marco Morel disse que atualmen-te estamos vivendo uma nova fase des-sa produção historiográfica, mas é bas-tante crítico quando afirma que existedescaso de grande parte da imprensaatual sobre o assunto:

“Procurei ao mesmo tempo registrar ecompilar os documentos, mas tambémfazer uma edição crítica com informaçõescomplementares, análises e estudo, alémde acrescentar imagens da época. O recente

VidasVidas

Ricardo Alvarez,um militante social

Atuante na resistência à ditadura militar, ele integra a Diretoriado Sindicato após a derrota dos colaboracionistas do regime.

Filho de Damaso BarreiraAlvarez e Judith da Mota LimaAlvarez, servidores públicos,Ricardo deixa o filho Fernando,que mora em Barcelona, de 36anos, nascido no primeirocasamento com a jornalistaWalkiria Dutra de Oliveira, eMarina, de 26 anos, da união com ajornalista Mônica Horta. Ficatambém entre nós a namoradaHelena Ferraz Soares Lopes, queamava e o acompanhou mais deperto em seus últimos dias, alémde muitos amigos e admiradores.

O jornalista Rogério Marques,Vice-Presidente do Sindicato, falousobre o amigo: “O Ricardo foi umadas pessoas mais interessantes queconheci. Fazia aniversário em 25 deabril, dia da Revolução dos Cravos.Adorava a vida. Conheci o Ricardono PCB, por volta de 1979, quandoum grupo de jornalistas fazia oBoletim Pró-Cut, no Sindicato dosEngenheiros. Sempre preocupadoem construir um mundo melhor,mais justo, morreu levando umavida simples, sem receber odinheiro a que tinha direito comoex-funcionário da TV Manchete,assim como tantos outros colegasque por lá passaram.

No dia 27 de julho, Ricardosubmeteu-se a uma cirurgia para aretirada de um câncer no pulmão,mas no sábado seguinte, à noite,foi vítima de hemorragia seguidade uma parada cardíaca.Submetido a coma induzido,permaneceu nesse estado atémorrer na tarde do dia 5.(Fonte: Site do Sindicato dosJornalistas Profissionais doMunicípio do Rio de Janeiro)

bicentenário da Imprensa no Brasil (2008)não gerou movimento editorial expressi-vo, apesar de alguns trabalhos interessan-tes. Mas um importante passo vem ocor-rendo através de reedições de jornais doséculo XIX, desde a monumental ediçãodo Correio Braziliense (1808 -1822), porAlberto Dines, há oito anos, seguida deoutros, como também pela digitalizaçãoe acesso on-line de jornais antigos.

O mais importante na visão do histo-riador Marco Morel – professor adjun-to da Universidade do Estado do Rio deJaneiro e pesquisador associado da Uni-versité Paris 1 (Panthéon-Sorbonne) – éque estão sendo criadas bases para umaprofunda renovação da História da im-prensa e da própria História do Brasil:“Além do acesso aos documentos, é im-portante manter esforço intelectual einstitucional, renovar e afinar nossasreflexões, abordagens e métodos. Esta-mos percorrendo o caminho”.

Em tempos de e-books e aceleradastecnologias para a digitalização dosacervos de grandes bibli-otecas, o historiador eprofessor Robert Darn-ton, Diretor da Bibliote-ca da Universidade deHarvard, reúne em AQuestão dos Livros (Com-panhia das Letras) onzeensaios que mostram aoleitor a complexidade dasdiscussões acerca de nos-sa relação com os livrosneste início de século.

O autor que confessasua “apologia descaradaem favor da palavra impressa” logo naprimeira página surpreende o leitorcom dados e argumentos que vão de en-contro a mitos e preconceitos enraiza-dos – tanto entre grupos que se procla-mam “defensores” dos livros, quantoentre as gerações que pressupõem aevolução tecnológica a todo custo.

Mais do que discutir se o livro im-presso acabará ou não com a chegadadas novas mídias, o objetivo de Darn-ton é expor as camadas de interpreta-ção e as efetivas conseqüências de todoesse período de transição, que histori-camente nem se apresenta tão inusita-do quanto parece.

É claro que o texto considera todas asespecificidades do livro em sua materi-alidade, que implica não somente memó-rias sensoriais do ato da leitura, comotambém desdobramentos econômicos,políticos e sociais em diferentes épocas.

Um momento marcante da obra jáse dá quando Darnton, ao descrever o

Muito além dos e-booksEnsaios de professor de Harvard enriquecem a discussão sobre a permanência

do livro em sua forma tradicional e as versões eletrônicas que eliminam o papel.

POR RITA BRAGA momento em que foi nomeado diretorda Biblioteca de Harvard, sem imaginarque nas semanas seguintes mergulha-ria no universo espinhoso das leis de

direitos autorais e políti-cas públicas, com a pro-posta do Google de digi-talizar o acervo que pas-sava então à sua respon-sabilidade. Leis, emen-das, influências, até Mi-ckey Mouse foi citadopara exemplificar o graude especificidade entrediferentes detentores decopirraite.

Darnton revela quenão demorou que vies-sem à tona os interesses

comerciais em “disponibilizar o aces-so a livros raros” por meio de assinatu-ras – um processo que o autor comen-ta a partir de comparações pertinentescom casos de revistas de pesquisa eoutras propostas que surgiram com amesma bandeira de “democratizaçãoda leitura”. Como ele é também funda-dor do Programa Gutenberg-e, para adivulgação de teses no meio digital, orepertório de ocorrências e considera-ções alimenta a reflexão do leitor demaneira aberta, apontando controvér-sias, referências e espaços de aprofun-damento das questões levantadas.

Os ensaios contêm ainda discussõespolêmicas acerca da preservação dedocumentos e reflexões sobre o papelda bibliografia na preservação e, prin-cipalmente, na produção do conheci-mento em qualquer área de pesquisa.Enfim, A Questão dos Livros é um mer-gulho no conceito sempre atualizadode “era da informação”.

REPR

OD

ÃO