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Jornal da ABI Órgão oficial da Associação Brasileira de Imprensa 329 MAIO 2008 SEGURANÇA PÚBLICA , O MAIOR NÓ A DESATAR UMA FESTA DA DEMOCRACIA Centenário da ABI é comemorado em grande estilo com recital da Orquestra Petrobras Sinfônica, sob a regência do Maestro Isaac Karabtchevsky, e show de Paulinho da Viola. Comissão de Honra do Centenário posou para foto histórica no palco do Teatro Municipal do Rio. Páginas 3, 4, 5 e 6 REVELAÇÃO DE SANDRONI: EU ME METI EM JORNAL PORQUE PRECISAVA DEMAIS DO SALÁRIO TAMBÉM ESCRITOR, ELE PRETENDE VOLTAR ÀS REDAÇÕES ASSIM QUE DEIXAR A PRESIDÊNCIA DA ACADEMIA DE LETRAS. PÁGINAS 24, 25 E 26 COMISSÃO DE ANISTIA FAZ SESSÃO HISTÓRICA NA ABI E DECIDE 20 PROCESSOS QUE ROLAVAM ANOS ENTRE ESSES, OS DAS VIÚVAS DE OCTÁVIO MALTA, GEORGE DE BARROS CABRAL E FÉLIX DE ATHAYDE. PÁGINAS 29, 30, 31 E 32 ADEUS A CANTALICE, ARTUR DA TÁVOLA, SÉRGIO DE SOUZA, HAROLDO DE ANDRADE A INDESEJADA DAS GENTES DE QUE FALAVA MANUEL BANDEIRA PRIVOU-NOS DESSES COMPANHEIROS. PÁGINAS 39, 40, 41, 42 E 43 SECRETÁRIO DE DIREITOS HUMANOS PAULO VANUCCHI DIZ NA ABI QUE ESSE É O GRANDE DESAFIO NO CAMPO DO RESPEITO ÀS PESSOAS. Páginas 34 e 35

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Jornal da ABIÓrgão oficial da Associação Brasileira de Imprensa

329MAIO2008

SEGURANÇA PÚBLICA, O MAIOR NÓ A DESATAR

UMA FESTA DA DEMOCRACIACentenário da ABI é comemorado em grande estilo com recital da Orquestra Petrobras Sinfônica, sob a regência do Maestro Isaac Karabtchevsky,e show de Paulinho da Viola. Comissão de Honra do Centenário posou para foto histórica no palco do Teatro Municipal do Rio. Páginas 3, 4, 5 e 6

REVELAÇÃO DE SANDRONI:EU SÓ ME METI EM

JORNAL PORQUE PRECISAVADEMAIS DO SALÁRIO

TAMBÉM ESCRITOR, ELE PRETENDE VOLTAR ÀSREDAÇÕES ASSIM QUE DEIXAR A PRESIDÊNCIADA ACADEMIA DE LETRAS. PÁGINAS 24, 25 E 26

COMISSÃO DE ANISTIA FAZSESSÃO HISTÓRICA NA ABI

E DECIDE 20 PROCESSOSQUE ROLAVAM HÁ ANOS

ENTRE ESSES, OS DAS VIÚVAS DE OCTÁVIOMALTA, GEORGE DE BARROS CABRAL E FÉLIX

DE ATHAYDE. PÁGINAS 29, 30, 31 E 32

ADEUS A CANTALICE,ARTUR DA TÁVOLA,SÉRGIO DE SOUZA,

HAROLDO DE ANDRADEA INDESEJADA DAS GENTES DE QUE FALAVAMANUEL BANDEIRA PRIVOU-NOS DESSES

COMPANHEIROS. PÁGINAS 39, 40, 41, 42 E 43

SECRETÁRIO DE DIREITOS HUMANOS PAULO VANUCCHI DIZ NA ABI QUE ESSE É O GRANDE DESAFIO NO CAMPO DO RESPEITO ÀS PESSOAS.Páginas 34 e 35

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2 Jornal da ABI 329 Maio de 2008

NESTE ABRIL DE 2008 a Associação Brasi-

leira de Imprensa está completando 100 anos

de existência, e exibe o justificado orgulho

de ser não apenas a mais antiga instituição

de imprensa do País,

mas também o de se tertransformado, ao lado

de outras instituições

da sociedade, como a

Ordem dos Advogados

do Brasil, numa das ci-

dadelas, num dos bas-

tiões de defesa dos di-

reitos civis e das liber-dades públicas. Entre estas, especialmente a

liberdade de imprensa, com os direitos que

a integram: o direito de informação, o direito

de acesso às fontes de informação, o direito

de opinião e, no âmbito deste, o direito de di-

vergir, de dizer não. Com propriedade, um dos

mais eminentes sócios da ABI, o jornalista

Edmar Morel, definiu a Casa como a trinchei-

ra da liberdade, reduto dos que não se confor-mam com qualquer forma de submissão.

ESTE PERFIL FOI ESCULPIDO pela adesão à cau-

sa da liberdade de quatro gerações de jorna-

listas e de trabalhadores da área de comuni-

cação, já que ao longo do século decorrido a

Casa acolheu não apenas repórteres, reda-

tores, revisores, editores e diretores de pu-blicações, mas a quantos emprestaram seu

esforço e sua qualificação, no âmbito e no

Jornal da ABIDIRETORIA – MANDATO 2007/2010Presidente: Maurício AzêdoVice-Presidente: Audálio DantasDiretor Administrativo: Estanislau Alves de OliveiraDiretor Econômico-Financeiro: Domingos MeirellesDiretor de Cultura e Lazer: Jesus ChediakDiretor de Assistência Social: Paulo Jerônimo de Sousa (Pajê)Diretor de Jornalismo: Benício Medeiros

CONSELHO CONSULTIVOChico Caruso, Ferreira Gullar, José Aparecido de Oliveira (in memoriam),Miro Teixeira, Teixeira Heizer, Ziraldo e Zuenir Ventura.

CONSELHO FISCALLuiz Carlos de Oliveira Chesther, Presidente; Argemiro Lopes do Nascimento,Secretário; Adail José de Paula, Adriano Barbosa do Nascimento, GeraldoPereira dos Santos, Jorge Saldanha de Araújo e Manolo Epelbaum.

CONSELHO DELIBERATIVO (MESA 2008-2009)Presidente: Fernando Barbosa Lima1º Secretário: Lênin Novaes de Araújo2º Secretário: Zilmar Borges Basílio

Conselheiros efetivos (2008-2011)Alberto Dines, Antônio Carlos Austregesylo de Athayde, Arthur José Poerner,Carlos Arthur Pitombeira, Dácio Malta, Ely Moreira, Fernando Barbosa Lima,Leda Acquarone, Maurício Azêdo, Mílton Coelho da Graça, Pinheiro Júnior,Ricardo Kotscho, Rodolfo Konder, Tarcísio Holanda e Villas-Bôas Corrêa.

Conselheiros efetivos (2007-2010)Artur da Távola (in memoriam), Carlos Rodrigues, Estanislau Alves deOliveiora, Fernando Foch, Flávio Tavares, Fritz Utzeri, Jesus Chediak, JoséGomes Talarico, José Rezende Neto, Marcelo Tognozzi, Mário AugustoJakobskind, Orpheu Santos Salles, Paulo Jerônimo de Sousa (Pagê), SérgioCabral e Terezinha Santos.

Editores: Maurício Azêdo e Francisco UchaProjeto gráfico, diagramação e editoração eletrônica:Francisco UchaEdição de textos: José Ubiratan Solino e Marcos Stefano

Fotos e ilustrações: Acervo Biblioteca da ABI (Biblioteca BastosTigre), Arquivo Jornal do Commercio, Arquivo Tribuna daImprensa, Folhapress, Agência O Globo, Folha Dirigida

Apoio à produção editorial: Alice Barbosa Diniz, Ana PaulaAguiar, André Lima de Alvarenga, Guilherme Povill Vianna, MariaIlka Azêdo, Mário de Freitas Borges.

Publicidade e Marketing: Francisco Paula Freitas(Coordenador), Queli Cristina Delgado da Silva, Paulo Robertode Paula Freitas.

Diretor Responsável: Maurício Azêdo

Associação Brasileira de ImprensaRua Araújo Porto Alegre, 71Rio de Janeiro, RJ - Cep 20.030-012Telefone (21) 2240-8669/[email protected]

Impressão: Taiga Gráfica Editora Ltda.Avenida Dr. Alberto Jackson Byington, 1.808Osasco, SP

Conselheiros efetivos (2006-2009)Antônio Roberto Salgado da Cunha, Arnaldo César Ricci Jacob,Arthur Cantalice (in memoriam), Aziz Ahmed, Cecília Costa, DomingosAugusto Xisto da Cunha, Domingos Meirelles, Fernando Segismundo, GlóriaSuely Alvarez Campos, Heloneida Studart (in memoriam), Jorge MirandaJordão, Lênin Novaes de Araújo, Márcia Guimarães, Nacif Elias HiddSobrinho e Pery de Araújo Cotta.

Conselheiros suplentes (2008-2011)Alcyr Cavalcânti, Edgar Catoira, Francisco Paula Freitas, Francisco Pedro doCoutto, Itamar Guerreiro, Jarbas Domingos Vaz, José Pereira da Silva (Pererinha),Maria do Perpétuo Socorro Vitarelli, Ponce de Leon, Ruy Bello, Salete Liusboa,Sidney Rezende,Sílvia Moretzsohn, Sílvio Paixão e Wilson S. J. de Magalhães.

Conselheiros suplentes (2007-2010)Adalberto Diniz, André Moreau Louzeiro, Arcírio Gouvêa Neto, BenícioMedeiros, Germando de Oliveira Gonçalves, Ilma Martins da Silva, JoséSilvestre Gorgulho, Luarlindo Ernesto, Luiz Sérgio Caldieri, Marceu Vieira,Maurílio Cândido Ferreira, Yacy Nunes e Zilmar Borges Basílio.

Conselheiros suplentes (2006-2009)Antônio Avellar, Antônio Calegari, Antônio Carlos Austregésilo de Athayde,Antônio Henrique Lago, Carlos Eduard Rzezak Ulup, Estanislau Alves de Oliveira,Hildeberto Lopes Aleluia, Jorge Freitas, Luiz Carlos Bittencourt, Marco AurélioBarrandon Guimarães (in memoriam), Marcus Miranda, Mauro dos SantosViana, Oséas de Carvalho, Rogério Marques Gomes e Yeda Octaviano de Souza.

COMISSÃO DE SINDICÂNCIAEly Moreira, Presidente; Carlos di Paola, Jarbas Domingos Vaz,Maria Ignez Duque Estrada Bastos e Maurílio Cândido Ferreira.

COMISSÃO DE ÉTICA DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃOAlberto Dines, Arthur José Poerner, Cícero Sandroni, Ivan Alves Filho e Paulo Totti.

COMISSÃO DE LIBERDADE DE IMPRENSA E DIREITOS HUMANOSAudálio Dantas, Presidente; Arcírio Gouvêa Neto, Daniel de Castro, Germandode Oliveira Gonçalves, Gilberto Magalhães, Lucy Mary Carneiro, Maria CecíliaRibas Carneiro, Mário Augusto Jakobskind, Martha Arruda de Paiva, OrpheuSantos Salles, Wilson de Carvalho, Wilson S. J. Magalhães e Yacy Nunes.

Número 329 - Maio de 2008

100 ANOS, E JOVEMquadro de empresas ou empreendimentos in-

dividuais, para a construção do nível de in-

formação que o País ostenta. Também para

a modelação desse padrão foi imensurável a

contribuição da ABI,

que já na primeira dé-cada de sua existência

sustentou a idéia de que

o exercício da ativida-

de profissional na im-

prensa exigia exigia for-

mação de nível superi-

or, capaz de dotar os

agentes do processo deinformação da qualificação técnica, cultural

e ética indispensável ao desempenho de tão

relevante missão social.

SERÁ POR ESTAS RAZÕES, a defesa das liber-

dades e a defesa da alta qualificação dos pro-

fissionais da informação, que a Casa recolhe

neste seu centenário as homenagens das mais

diversificadas representações da sociedade,como demonstra o amplo noticiário a esse

respeito publicado nesta edição do Jornal da

ABI. São manifestações partidas das diferentes

representações da sociedade, seja no campo

político-administrativo, seja no campo soci-

oeconômico e cultural. Este é outro motivo

de orgulho para a Casa: receber, merecida-

mente e por ter trabalhado e trabalhar paraisso, o reconhecimento por quanto fez pelo

País nestes seus 100 anos de existência.

EditorialEditorial

EM ATO REALIZADO NA ABI há cerca de uma

década e meia, outro destacado intelectual,

o jornalista, professor e escritor Edmundo

Moniz, assinalou que a idade das pessoas não

é a decorrente da consulta ao seu registro civil,

e sim a de suas idéias, da modernidade e con-temporaneidade de suas idéias. Assim é tam-

bém com as instituições. Por seu devotamento

à idéia da liberdade, bem de valor perene, a

ABI pode proclamar que chega aos 100 anos

com o sentimento de que permanece extre-

mamente jovem e assim se manterá.

A ABI trabalhou durante meses parafazer do SHOW DO CENTENÁRIO, prin-

cipal celebração dos seus 100 anos, o es-

petáculo considerado irretocável por

quantos o viram. Esse êxito foi possi-

bilitado pela colaboração que a Casa

obteve da REDE GLOBO DE TELEVISÃO,

de FURNAS CENTRAIS ELÉTRICAS S. A.,

da PETRÓLEO BRASILEIRO S. A.-PETRO-BRAS, patrocinadoras do evento, e da

ODEBRECHT S. A. e do BANCO BRADES-

CO, que concederam apoio à realização.

Reconhecida e sensibilizada, a ABI faz

a todas um agradecimento especial.

Um agradecimento especialaos patrocinadores

do Show do Centenário

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3Jornal da ABI 329 Maio de 2008

O centenário da ABI foi celebradoem noite de gala no dia 7 de abril, noTeatro Municipal do Rio de Janeiro,com a apresentação de um espetáculoimpecável, descrito pelas quase 2 milpessoas presentes com uma série deadjetivos: maravilhoso, sensacional,lindo!, lindo!. O Vice-Presidente daRepública, José de Alencar, represen-tando o Presidente Luiz Inácio Lula daSilva, o Governador do Estado do Rio,

UMA FESTA IMPECÁVELO Show do Centenário deu aos 100 anos da ABI notável dimensão de gala,com exibições primorosas da Orquestra Petrobras Sinfônica, sob a regênciado Maestro Isaac Karabtchevsky, e de Paulinho da Viola e sua banda, que

encantaram numerosa platéia no Teatro Municipal do Rio de Janeiro.

POR JOSÉ REINALDO MARQUES E CLAUDIA SOUZA

ANO DO CENTENÁRIO

Sérgio Cabral Filho, os MinistrosFranklin Martins e Edson Santos en-contravam-se entre as autoridades ilus-tres da platéia da festa, que reuniu jor-nalistas, acadêmicos, políticos e repre-sentantes de diferentes segmentos dasociedade civil. Vários deles vieram dedistantes pontos do País para assistirao Show do Centenário: São Luís, Bra-sília, Belo Horizonte, São Paulo

A classe artística — que se fez repre-

sentar por cineastas, escritores, cantorese compositores — prestigiou o evento,que teve como ponto alto os concertosda Orquestra Petrobras Sinfônica, sob aregência do Maestro Isaac Karabtche-vsky, e do cantor e compositor Paulinhoda Viola. No palco, os atores CristianeTorloni e Lázaro Ramos fizeram a apre-sentação cerimonial da festa.

A comemoração do 100º aniversá-rio da ABI não podia ter sido diferen-

te. Desde a escolha do Municipal comocenário à lista de convidados, a gran-de homenageada da noite soube reu-nir, para celebrar a data da sua funda-ção, dois dos elementos mais signifi-cativos de sua histórica trajetória: aimprensa e a cultura.

No início do programa, a platéia foiconvidada a ficar de pé para ouvir a exe-cução do Hino Nacional pela PetrobrasSinfônica. Em seguida, na abertura das

No palco, a Comissãode Honra do Centenário.Ao fundo, a logomarcacriada por Ziraldo.

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4 Jornal da ABI 329 Maio de 2008

saudações da noite, coube ao Presiden-te da ABI, Maurício Azêdo, dirigir-seaos convidados e às autoridades presen-tes em nome da Diretoria da entidade:

— É com emoção e alegria que a As-sociação Brasileira de Imprensa recebea todos nesta memorável noite, em quese realiza a mais destacada celebraçãodo seu centenário. A instituição funda-da por Gustavo de Lacerda no alvorecerdo século XX recebe platéia tão repre-sentativa do conjunto da sociedadecomo reconhecimento de que não foi vã,nem inútil, a caminhada empreendidapela geração de jornalistas que edifica-ram a densa história da ABI desde aquele7 de abril de 1908.

O anfitrião Maurício Azêdo fez umacitação do jornalista Cícero Sandroni— Presidente da Academia Brasileira deLetras e sócio da ABI — para se referiràs lutas empreendidas pela Casa doJornalista na defesa da democracia edas liberdades públicas:

— Na mensagem em que aceitou oconvite para participar da Comissãode Honra do Centenário, Cícero dizque a ABI combateu um bom comba-te ao longo deste século que hoje secompleta. Foi com perseverança, des-temor e altruísmo que ela se devotouàs idéias que marcam sua trajetória eaos valores que a inspiram no culto àsliberdades, à ética e à busca do progres-so material e espiritual do País e donosso povo.

No fim do seu discurso, o Presiden-te da ABI agradeceu ao cartunista Zi-raldo, pela criação da logomarca do cen-tenário, e ao publicitário Nizan Guana-

es, cuja agência foi responsável pelacriação de todas as peças promocionaisde divulgação do aniversário da Casa.Foram feitos agradecimentos tambémao Governador Sérgio Cabral, que éjornalista e sócio da ABI, pelo apoio doGoverno do Estado do Rio à realizaçãodo evento; à Petrobras; à Rede Globode Televisão e seus Diretores José Ro-berto Marinho e Luiz Erlanger; a LuizPaulo Conde, Presidente de Furnas; aRoberto Dias, Diretor da Odebrecht, ea Rose Santiago, do setor de RelaçõesInstitucionais do Bradesco. Ele exaltoutambém o trabalho dos publicitáriosFábio Seidl, Bruno Brasil e Luiz Gonza-ga, que, sob a liderança de Luiz RobertoPires Ferreira, Diretor do Grupo ABCde Nizan Guanaes e da agência África,projetaram as peças da campanha depromoção do centenário, entre as quaisuma aplaudida reflexão sobre a impor-tância da virgula nos textos impressosou falados.

Maurício Azêdo fez ainda uma ca-lorosa saudação ao Maestro Isaac Ka-rabtchevsky, aos músicos da Orques-tra Petrobras Sinfônica e ao compo-sitor Paulinho da Viola. Foram sauda-das também todas as personalidadesque aceitaram integrar a Comissão doCentenário da ABI, cujo Presidente deHonra é o arquiteto Oscar Niemeyer,a quem o Presidente da ABI se refe-riu como “um brasileiro luminoso ehumanista”.

A programação prosseguiu com aexibição de um vídeo sobre a trajetóriada ABI desde a sua fundação, exaltan-do a figura do fundador, Gustavo de La-cerda, e de ex-Presidentes como HerbertMoses, Prudente de Moraes, neto, Dan-ton Jobim, Dunshee de Abranches, Fer-nando Segismundo e Barbosa LimaSobrinho. O documentário reúne vts,fotografias e documentos que registrama participação da ABI em questões deimportância nacional, como as campa-nhas O petróleo é nosso e Diretas Já, a daAssembléia Nacional Constituinte de1987-1988 e a do impeachment do Presi-dente Fernando Collor.

Em seguida, o Governador do Esta-do do Rio, Sérgio Cabral Filho, se dis-se orgulhoso de participar da festa comojornalista e citou seu pai, o pesquisa-dor, Conselheiro da ABI e também jor-nalista Sérgio Cabral Santos:

— É uma honra participar da Comis-são do Centenário, é uma honra oGoverno do Estado estar presente nacelebração dos cem anos da AssociaçãoBrasileira de Imprensa e que o nossoTeatro Municipal abrigue este evento.Devo muito ao jornalismo, até a minhaexistência. Por isso, nestes cem anos daABI, quero homenagear todos os jorna-listas exatamente na figura dessa pes-soa que me ensinou em casa a amar ademocracia, a liberdade e o povo bra-sileiro, que é o Sérgio Cabral pai. A eleeu dedico este discurso e a minha sen-sibilidade para a causa pública. E que-ro dizer que com ele aprendi que nãohá nada mais importante na vida doque a liberdade.

ANO DO CENTENÁRIO

Sócio da ABI desde 1936, ex-Presidenteda Casa, Fernando Segismundo mereceucarinhosa menção especial no discurso

do Vice-Presidente José Alencar.

O Vice-Presidente Alencar (ao lado de Sérgio Cabral) encantou a platéia, que tinha naprimeira fila os Ministros Edson Santos e Franklin Martins (foto abaixo), pela espontaneidade

de suas manifestações: bem humorado, intercalou tiradas no texto impresso que leu.

Os atores Lázaro Ramos e Cristiane Torloni – que ficou visivelmente emocionadadurante sua elegante apresentação – fizeram o cerimonial da festa da democracia.

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5Jornal da ABI 329 Maio de 2008

Em seu discurso, o Vice-PresidenteJosé Alencar destacou que, apesar de osjornalistas não gostarem de virar no-tícia, muitos acabam como legítimosprotagonistas da História:

— Alguns, de maneira brilhante egrandiosa — como o Professor Fernan-do Segismundo, único ex-Presidente daABI vivo, em quem damos um abraçode calorosa homenagem. Ou como oPresidente Maurício Azêdo, a quemcabe o privilégio de estar à frente dascomemorações do centenário e de darcurso à obra de Gustavo de Lacerda,Herbert Moses e Barbosa Lima Sobri-nho, que deixaram marcas profundasna construção e na consolidação des-te patrimônio nacional.

José Alencar ressaltou que parte daHistória do Brasil e da imprensa tam-bém vem sendo escrita por um contin-gente de jornalistas quase anonima-mente, “a exemplo de tantos e tão va-lorosos repórteres, fotógrafos e redato-res de cada pequena redação das peque-nas cidades brasileiras”. E completou:

— É em homenagem a todos esses“proletários intelectuais”, na palavrado pai da ABI, o jornalista e libertárioGustavo de Lacerda, que nós estamosaqui reunidos. Cumprimento o ilustrePresidente da instituição, jornalista

Heitor Vila-Lobos; Maracatu do ChicoRei, de Francisco Mignone, e Mourão, deGuerra-Peixe e Clóvis Pereira.

O Maestro Isaac Karabtchevskytambém se pronunciou sobre a traje-tória da ABI e o exemplo que a institui-ção vem dando ao País com sua condu-ta democrática:

— Uma Casa que ostenta um pas-sado glorioso como a Associação Bra-sileira de Imprensa enaltece não só anós, como cidadãos brasileiros, comotambém ao conjunto de países demo-cráticos em todo o mundo. É umexemplo que tem que ser seguido.Numa época conturbada, cheia dedesvios, a conduta sempre justa daABI nos enche de orgulho e alegria desermos brasileiros.

porque, sabemos todos, sem liberda-de não há imprensa; sem imprensa nãohá informação; e sem informação nãoexiste exercício de cidadania. Toda aluta histórica da Associação Brasilei-ra de Imprensa não é de interesse ape-nas da própria imprensa: é a defesa detudo o que interessa à sociedade.

Após a fase solene do ato, o públicoque lotou o Teatro Municipal foi brin-dado com shows de Paulinho da Violae da Orquestra Petrobras Sinfônica. Adireção artística do espetáculo foi deTúlio Feliciano. Coube ao jornalistaSérgio Cabral chamar ao palco o sam-bista Paulinho da Viola, que encantoua platéia com alguns de seus maioressucessos, como Sinal fechado, Dança dasolidão e Foi um rio que passou em minha

vida, e também um samba mais recen-te, Talismã, feito em parceria com Ar-naldo Antunes e Marisa Monte.

Ao término de sua participação, Pau-linho fez um elogio à ABI:

— Eu me sinto muito honrado emparticipar desta festa em homenagema esta instituição que fez tantas coisasimportantes ao longo da sua história.E espero que ela continue, por muitosanos, dando seguimento ao que vemfazendo e que todos nós já sabemos efalamos aqui.

Na seqüência, a Orquestra PetrobrasSinfônica, sob a batuta do Maestro IsaacKarabtchevsky, interpretou Sinfoniapopular nº 1 — 3º movimento: Baião, deRadamés Gnattali; Bachianas Brasileirasnº 2 — Tocata (O trenzinho do caipira), de

Em vez de um discurso solene, o Governador fez a exaltação afetiva de seu mestre: o jornalista Sérgio Cabral, seu pai.

“Uma Casa que ostenta um passado como a ABI enaltece os países democráticos em todo omundo”, disse Karabtchevsky (ao lado). Também Paulinho da Viola (acima) fez o elogio da ABI.

Maurício Azêdo, e levo a todos os quemilitam no jornalismo minhas congra-tulações e minha homenagem pelo ad-mirável trabalho que realizam em fa-vor do Brasil e dos brasileiros.

Disse o Vice-Presidente da Repúblicaque a democracia é um valor universale a liberdade de informação não podeser um valor relativo, “pois ela foi umadas maiores conquistas históricas dahumanidade”, além de um dos bensmais preciosos da vida social:

— Sem ela, não seríamos o que so-mos, e talvez não pudéssemos alme-jar algo melhor do que temos. E ne-nhuma iniciativa da ABI foi mais du-radoura, em cem anos, do que a defe-sa da liberdade de imprensa. Essa lutaatravessa os tempos e é permanente,

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6 Jornal da ABI 329 Maio de 2008

ANO DO CENTENÁRIO

“Acho que foi uma festa muito bonitae à altura do que a ABI representacomo simbolismo e fixação da idéia daliberdade. Esta solenidade de hojedestacou esse traço importante datrajetória da nossa Casa, que é esseapreço à liberdade e a todos osvalores que ela proporciona, inclusive acriação artística, de que tivemos hojemaravilhosos exemplos, com aOrquestra Petrobras Sinfônica,Paulinho da Viola e esse maravilhosoMaestro Isaac Karabtchevsky. Foi paranós algo muito confortante e a ABI sesente engrandecida com esta noite.”MAURÍCIO AZÊDOPresidente da ABI

“Eu já estou lastimando muito nãochegar aos próximos cem anos paraestar feliz com os amigos ecompanheiros da Casa.”FERNANDO SEGISMUNDOEx-Presidente da ABI

A HISTÓRIA, COM PERSPECTIVA DE FUTUROImpressões de quem foi,

após a festa.

que é sempre atual, porquecuriosamente os governos sempretentam limitar a liberdade, mas estanão tem limites. É preciso que setenha essa consciência de que nãose regulamenta a liberdade, ela éincondicional. Então, essa foi a grandedemonstração que tivemos hoje.Temos uma instituição como a ABIpreparada para qualquerenfrentamento, que eu acho que nãodeve ocorrer. Mas quando osenfrentamentos acontecem,precisamos ter entidades preparadasa defender os direitos dos cidadãos,como é o caso da ABI.”MIRO TEIXEIRADeputado Federal/PDT-RJ

“Esta é uma festa magnífica, porque aABI completa cem anos de grandessacrifícios pela imprensa e pelo País.E hoje, com respeito às outrasorganizações, é reconhecida como agrande protagonista das lutas pelaliberdade.”CÍCERO SANDRONIPresidente da Academia Brasileira de Letras

“Foi uma festa muito bonita deconfraternização com a consolidaçãoda democracia em nosso País. Estasolenidade refletiu a grandeza daAssociação Brasileira de Imprensa.”EDSON SANTOSMinistro da Integração Racial

“Um evento fantástico este Centenáriode uma instituição consolidada combase na liberdade e que busca integrartodas as tendências. A ABI traz paranós uma renovação, um estímulo, namedida em que tantas coisas boastêm acontecido, outras talvez não, masela sempre registra e acompanha tudode forma contundente e com isenção.”BENEDITA DA SILVASecretária de Estado de Assistência Social do

Rio de Janeiro

“Foi um acontecimento emocionante,porque se juntou a História com aperspectiva de futuro. Tivemos aoportunidade de verificar, ao mesmotempo, a informação sobre a História ea reafirmação do compromisso de lutapela liberdade de imprensa. Uma luta MIRO TEIXEIRA

Sob a batuta do Maestro Isaac Karabtchevsky, a Orquestra Petrobras Sinfônica, começou a empolgar a platéia com uma execução primorosa do Hino Nacional, que abriu a récita.

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7Jornal da ABI 329 Maio de 2008

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8 Jornal da ABI 329 Maio de 2008

As comemorações do centenário daABI foram abertas na tarde do dia 1 deabril com um concerto especial do con-junto Bruce & Villa’s Voz, que deu umainterpretação jazzística às obras deHeitor Vila-Lobos. O recital, realizadono Palácio Itamaraty, integrou o pro-jeto Música no Museu, promovido pelaCasa França-Brasil, cujo Presidente,Embaixador Marcos Azambuja, teve aidéia de dedicar a apresentação aos cemanos da ABI. A sessão foi muito concor-rida: quem não obteve senha antes deo espetáculo começar teve de voltar daporta, porque o espaço não comportavamais assistentes.

Antes do recital, o Diretor do Mú-sica no Museu, Sérgio da Costa e Sil-va, fez uma breve introdução, agrade-cendo ao público pela presença e pas-sando a palavra ao Presidente da ABI,Maurício Azêdo, que agradeceu, anun-ciou os eventos seguintes das comemo-rações do centenário da ABI e prestouhomenagem a Vila-Lobos, que teve for-te presença na Casa, como sócio e co-laborador, desde 1921, quando ingres-sou na ABI, até sua morte, em 1959.Morador num edifício fronteiro à atualsede da ABI, Vila-Lobos em momentosde folga jogava bilhar no salão que hojetem seu nome e que exibe ao fundo umpôster dele com o taco na mão e o in-

Para começar, Vila-Lobosem ritmo de jazz

Concorrido recital no Palácio Itamaraty abriuas comemorações do centenário da ABI.

separável charuto nos lábios.Aplaudindo, na platéia, estavam Vir-

gilio Moretzsohn de Andrade, Chefe doEscritório de Representação do Minis-tério das Relações Exteriores no Rio deJaneiro, e Acurcio Rodrigues de Oliveira,Diretor-Presidente do Monitor Mercantil,e inúmeros associados da ABI.

O conjunto Bruce & Villa’s Voz deuinício ao concerto de forma lenta e har-moniosa. O músico norte-americanoBruce Henri abriu o espetáculo com seucontrabaixo e momentos depois passoua ser acompanhado pelo piano de Fer-nando Moraes. Logo em seguida já sepodiam ouvir os sons de Ricardo Cos-ta na percussão e bateria e, por fim, oviolino de Leo Ortiz. Os arranjos dasmúsicas de Vila-Lobos, executados emtons ritmados de jazz, foram feitos porBruce, que mora no Brasil desde a déca-da de 1970, já tocou com artistas comoTom Jobim, Gal Costa, Caetano Veloso,Gilberto Gil e Ney Matogrosso e é umdos poucos contrabaixistas dedicados aorepertório erudito brasileiro.

Obras como O canto do cisne negro,que o maestro compôs inspirado nopróprio Palácio Itamaraty, que abrigacisnes em seu lago, e a Pequena suíte1913 foram prestigiadas pelo público ejornalistas que cobriam o evento. (Ro-dolpho Terra)

O Chefe do Escritório do Itamaraty no Rio,Virgílio Moretzsohn, abriu o recital.

Um dos salões do belo Palácio Itamaraty (acima) foi o palco onde o violoncelistaBruno Henri (à direita) e seus colegas exibiram mestria como intérpretes de Vila-Lobos.

Sérgio da Costa e Silva (de frente), com Maurício e Acúrcio, foi o organizador do concerto.

FOTO: FOLHA DIRIGIDA/HENRIQUE HUBERT

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9Jornal da ABI 329 Maio de 2008

Com a presença de 24 acadêmicos,reunidos no Salão Nobre do Petit Tria-non logo após o tradicional chá dasquintas-feiras e que constituíram umrecorde em eventos do gênero, como ob-servou seu Presidente, jornalista e escri-tor Cícero Sandroni, a Academia Brasi-leira de Letras promoveu uma SessãoSolene em homenagem ao centenário daABI no dia 3 de abril, Cícero Sandronirecebeu os jornalistas Moacir Pereira,que falou sobre o fundador da ABI, Gus-tavo de Lacerda, Fernando Segismundo,que abordou aspectos da vida e da obrade Herbert Moses, Villas-Bôas Corrêa,que evocou a trajetória de Prudente deMoraes, neto, e Murilo Melo Filho, quediscorreu sobre a relação da ABL com aABI. Sandroni, por sua vez, descreveua trajetória do jornalista e acadêmicoBarbosa Lima Sobrinho, que presidiu aABI (1926 a 1927, 1930 a 1932 e 1978 a2000) e a ABL (1953 a 1954), onde ocu-pou a cadeira nº 6 de 1938 a 2000.

O Presidente da ABI, Maurício Azêdo,agradeceu à Academia a distinção de tãodestacada homenagem e ressaltou o dis-curso de Murilo Mello Filho sobre a for-te identidade das duas instituições:

— Fico honrado com a sessão espe-cialmente dedicada pelos acadêmicose jornalistas palestrantes à memória deGustavo de Lacerda, Herbert Moses,Prudente de Moraes neto e BarbosaLima Sobrinho, exemplos de dedicaçãoao bem comum e à coletividade. A ABIse sente especialmente confortada,emocionada e, com extraordinário re-conhecimento, recebe comovida a ho-menagem da ABL, o maior templo dainteligência brasileira.

Moacir Pereira, titular da cadeira nº 3da Academia Catarinense de Letras ereconhecido pesquisador da vida e obrade Gustavo de Lacerda, destacou: — Ofundador da ABI vem se agregar a nomesde projeção nacional e internacionalnascidos em Santa Catarina, tais comoVictor Meirelles, Cruz e Souza, AnitaGaribaldi, Jerônimo Coelho, Álvaro deCarvalho, Luiz Delfino e Lucas Boiteux.

Ele assinalou que, o movimento pelacriação da ABI projetou Gustavo deLacerda na vida pública brasileira emrazão “da batalha pela união dos repór-teres visando à melhoria das condiçõesde salário e de trabalho,do papel que

Na Academia, um recorde de presenças

POR CLAUDIA SOUZA

Depois do tradicional chádas quintas-feiras,

24 acadêmicosprestigiaram a Sessão

Solene em homenagemaos 100 anos da ABI.

vislumbrava na formação profissionale do desejo de ver os jornalistas maisprotegidos e valorizados”.

— O discurso de Gustavo de Lacer-da completa 100 anos, mas suas ban-deiras permanecem imutáveis, apesardas transformações ditadas pelos avan-ços da tecnologia. O extraordinário le-gado que nos deixou com a quase soli-tária campanha pela criação da ABIimpõe iniciativas que mostrem às no-vas gerações o valor de um ideal, o sig-nificado da ação coletiva, a importân-cia da solidariedade humana e corpo-rativa, a visão da imprensa na valori-zação da cidadania.

Fernando Segismundo, que ocupoua Presidência da ABI de 1977 a 1978 ede 2000 a 2004, lembrou aspectos davida e da obra de Herbert Moses, queesteve à frente da Casa entre 1931 e1964: — Antes uma entidade frágil, a ABItornou-se notável na gestão de Moses,homem de grandes ideais que lutou parafortalecer a entidade. A Polícia invadia aABI na época em que o exercício do jor-nalismo era uma atividade perseguida eperigosa: o repórter não tinha idéia sevoltaria para casa após o trabalho.

Disse Segismundo que Moses era umhomem de negócios que, entretanto,“dedicou-se à empreitada bem-sucedida

e prestigiosa em defesa do jornalismo”:— Trabalhei ao seu lado e muitas vezeso vi lacrimejar em função dos proble-mas políticos que atingiam o País e aimprensa. À frente da ABI, Moses se ex-pôs, teve muitos dirigentes presos etorturados. Contudo, conseguiu agre-gar a classe perante as turbulências.

A trajetória de Prudente de Moraes,neto, que ocupou a Presidência da ABIentre 1975 e 1977, foi realçada por Vi-llas-Bôas Corrêa, decano do jornalismopolítico brasileiro, que comemora 60anos de carreira. Companheiro de Pru-dente nas redações do Diário de Notíci-as e do Estado de S.Paulo, Villas-Bôas

Villas-Bôas Corrêa traçou o perfil de Prudente de Morais, neto, seu companheiro e seu mestre na cobertura política.

A partir da esquerda, diante da platéia repleta de acadêmicos: Villas-Bôas, Maurício, Sandroni, Presidente da ABL, Segismundo,Moacir Pereira e Murilo Melo Filho. Moacir, biógrafo de Gustavo de Lacerda, veio de Florianópolis para falar sobre seu conterrâneo.

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ANO DO CENTENÁRIO

A ABI foi homenagea-da na manha do dia 7 deabril – dia do seu centená-rio – com o lançamento deselo postal e carimbo co-memorativos, realizada naSala Belisário de Souza, noEdifício Herbert Moses. OPresidente da ABI, Maurí-cio Azêdo, compôs a mesade honra com o represen-tante do Ministério das Co-municações, jornalista Fran-cisco Câmpera, e o Diretorregional dos Correios, Mar-co Túlio Penzin Goulart. A cerimônia,prestigiada por jornalistas e associados,foi aberta com a execução do Hino Na-cional, seguida dos discursos de Tere-sa Bettoni, representante do Cerimo-nial dos Correios, Francisco Câmperae Marco Túlio Goulart.

Teresa Bettoni ressaltou que o obje-tivo da homenagem é registrar o mo-mento histórico da ABI, que “há cemanos contribui para o desenvolvimentopolítico, econômico e social do País”.Marco Túlio, por sua vez, destacou odesafio histórico e democrático da ABI,que durante anos exerceu “incessantee corajosa defesa da liberdade de im-prensa”. E estendeu a homenagem “àbravura de Gustavo Lacerda e dos novecompanheiros que ousaram instituiresta voz de defesa em 1908”:

— Ao receber este selo, a sociedadeé chamada a rememorar o papel prota-gonista da imprensa em questões cru-ciais, desde o movimento em prol daabolição da escravatura, passando pelas

sões que foram produzidas pelos artis-tas. O empenho de todos, disse, resul-tou “neste selo que nos enche de orgu-lho, já que marca a presença muitoforte do Estado nacional no campo deprestígio a uma instituição representa-tiva como a ABI, a primeira criada noPaís para a defesa dos jornalistas”.

— Gustavo de Lacerda e seus compa-nheiros definiram este modelo de repre-sentação, que a partir de então se alas-trou às diferentes categorias profissio-nais em todo o País, culminando com osistema de representação associativagremial e sindical que temos hoje.

Como éO selo traz em destaque a imagem

da atual sede da ABI, sua logomarca ea face de seu fundador, Gustavo de La-cerda. Ao fundo, a imagem esmaeci-da de uma página do jornal publicadopela ABI, com fotos de fachadas deprédios que ela ocupou até chegar a ga-nhar sede própria. As cores da bandei-ra do Brasil na logomarca e a tarja azulcom a respectiva legenda imprimembrasilidade ao conjunto. Foram utili-zadas as técnicas de ilustração a gua-che sobre papel, fotografia e compu-tação gráfica.

O carimbo circula nas peças filaté-licas e correspondências das institui-ções que pleiteiam sua emissão, propa-gando, por meio da imagem e da legen-da, o tema que lhe deu origem.

Para o Presidente da ABI, a amplatiragem do selo, em torno de 600 milunidades, “levará a imagem, a palavrae efígie do fundador Gustavo Lacerdaa centenas de milhares de brasileiros,fator positivo para o processo de afir-mação democrática e da liberdade de-fendidos pela Casa desde a sua funda-ção há exatos cem anos, em 7 de abrilde 1908”. (Claudia Souza)

Emissão filatélica especial põe em relevo a figura do fundador da ABI.

Num selo, o bravo Gustavo de Lacerdada ABI em direção a mais um século emdefesa da liberdade de imprensa.

Maurício Azêdo agradeceu aosmembros da mesa, ao Presidente daECT, Carlos Henrique Custódio, ao Mi-nistro, por sua intervenção junto à Co-missão Filatélica Nacional, e a todaequipe do Ministério, “que reveloucompetência no encaminhamento dasprovidências para a emissão do selo,que obedece a um ritual de alto teor de-mocrático na escolha do artista respon-sável pela execução do selo”.

Presente ao evento, o jornalista Hé-lio Fernandes Filho, Diretor da Tribu-na da Imprensa, afirmou que os cemanos da entidade na luta pela liberda-de de expressão são um marco a se co-memorar: — Como Conselheiro daentidade, estou muito satisfeito emprestigiar a ABI, que sempre será a Casado Jornalista.

O jornalista Luiz Carlos de Souza,sócio da ABI desde 1970 e que exercea profissão há 42 anos, foi um dos in-centivadores da homenagem:

— Eu colecionava selos quando eragaroto e imaginei que caberia um selono centenásrio da ABI. Levei a idéia aoMaurício Azêdo e hoje estou feliz emver a homenagem concretizada.

A escolhaAtravés de um concurso, são convo-

cados pelo menos três artistas, queapresentam suas propostas a uma co-missão especializada para a escolha doprojeto. Relatou Maurício Azêdo quea ABI forneceu subsídios para a elabo-ração dos projetos e teve acesso às ver-

campanhas O petróleo é nosso e DiretasJá, até importantes conquistas no cam-po da ética na política, na década de 90,sob o comando do missionário da demo-cracia, jornalista Barbosa Lima Sobri-nho. Com a homenagem, os Correioscontribuem para fortalecer ainda maiso reconhecimento da relevância da ABI.

Francisco Câmpera se disse honra-do e orgulhoso em participar da sole-nidade de lançamento do selo e agra-deceu a todos em nome do Ministro dasComunicações, Senador Hélio Costa —autor da iniciativa que resultou nahomenagem —, lembrando “o papelessencial da ABI na construção e con-solidação da democracia e dos direitoscivis no último século”:

— A ABI esteve presente nos princi-pais momentos históricos do País. O Mi-nistro Helio Costa faz questão de par-ticipar desta homenagem e parabenizaa ABI e o Presidente da entidade, jorna-lista Maurício Azêdo, cuja gestão vempromovendo o resgate e a reconstrução

destacou “a excelência de seu texto e aextraordinária gestão à frente da ABI,especialmente no período da ditadura,quando se registravam inúmeros casosde jornalistas exilados, perseguidos,ameaçados e torturados”: — Com Pru-dente, notável na tarefa de defesa dacategoria e dos ideais da sociedade, a ABIrepresentou uma frente de luta em fa-vor da classe e da liberdade de impren-sa. Assim como Barbosa Lima Sobrinho,ele enfrentou com grande bravura esteperíodo. E o atual Presidente da ABI,Maurício Azêdo, também vem promo-vendo uma administração exemplar,que, após longos anos, consegue atraira classe em torno de uma renovada ABI.

A forte relação entre a ABI e a ABLfoi destacada na palestra do jornalistae acadêmico Murilo Melo Filho.

— Ambas têm caminhado juntas aolongo de um século de vida em comum.Coesas, testemunharam e sobrevive-ram, nos últimos cem anos, a umaperigosa escalada de agruras e sucessi-vas crises políticas no País.

Murilo lembrou que na época da

fundação as entidades não tinham se-quer onde se reunir:

— A ABI hospedava-se no QuartelMilitar dos Barbonos, permitindo aojornalista Belisário de Souza reconhecer:“Pelo menos aqui estamos guardados eseguros”. Só em 1938 a ABI pôde inau-gurar a primeira sede própria, no Cas-telo. Mas jamais silenciou sua voz deprotesto e a mensagem de esperançasgravadas para sempre na gratidão e noreconhecimento dos brasileiros. Sob a

Presidência digna e correta de MaurícioAzêdo e de seus bravos antecessores, aCasa representa fortaleza indômita e in-dormida na defesa das conquistas de-mocráticas e da liberdade de imprensa.

O Presidente da ABL, Cícero Sandro-ni, que ocupou os cargos de Diretor,Secretário-Geral e Presidente do Con-selho da ABI, homenageou a trajetóriade Barbosa Lima Sobrinho, sublinhan-do os momentos em que atuaram jun-tos na entidade: — Como havia um de-

sinteresse da classe, quando recebía-mos pedidos de entrevista eu costuma-va estimular os repórteres a se associ-arem à Casa. Era preciso convencer oscolegas da necessidade de participar econtribuir para a luta da ABI.

Sandroni destacou a emoção de con-viver com “a bravura cívica de Barbo-sa e seu espírito pacifista e conciliador,que só era abalado quando o Fluminen-se perdia”: — Ele é eterno pelas pala-vras que deixou escritas, muito melho-res do que eu poderia fazer. Lembro queuma vez o questionei pela sua jornadade trabalho, por causa de sua idade, eele me disse: “O tempo que perdemosna ABI ganhamos pelo Brasil.”

O Presiente da Academia finalizousua exposição exortando à participaçãodos profissionais na vida da entidadejornalística: — A ABI é e sempre seráaquilo que os jornalistas fizerem dela.E será tão melhor quanto mais jorna-listas participarem de suas atividades.A ABI cresce e se fortalece sempre queconta com o apoio dos profissionais detodo o Brasil.

O poeta IvanJunqueira (defrente) foi umdos muitosacadêmicos queprestigiaram ahomenagem aocentenário daABI. Ao fundo,Villas-BôasCorrêa, umdos quatroconferencistas.

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11Jornal da ABI 329 Maio de 2008

A Biblioteca Nacional dedicou àABI, no dia 9 de abril, a abertura daprogramação 2008 do projetoQuarta às Quatro, concebido edirigido pelo jornalista e professorVítor Iório, da Universidade Federaldo Rio de Janeiro. . O Presidente daAssociação, Maurício Azêdo, foiconvidado a discorrer sobre o temaABI: momentos de tensão e esperança,no Auditório Machado de Assis, parauma platéia que contou com apresença de jornalistas como FichelDavit Chargel, Milton Temer, LilianNabuco e Nilo Braga e do ProfessorEmir Amed, além de estudantes,pesquisadores e professores.

Vítor Iório iniciou o encontrojustificando a homenagem à ABI,“uma das mais combativas entidadesda sociedade civil na defesa daliberdade de imprensa e dos direitoshumanos”:

— Criada em 7 de abril de 1908 eidealizada por Gustavo de Lacerdacomo uma associação destinada aassegurar à classe jornalística seusdireitos assistenciais e a funcionarcomo poderoso centro de açãopolítica que abrigasse ostrabalhadores da imprensa, a ABIrompeu a resistência no meiojornalístico, disperso na época,conquistou nomes representativosna vida nacional e se consolidoucomo uma instituição de prestígioprofissional e político.

A trajetória do atual Presidente daABI foi apontada como símbolo deluta pelas liberdades democráticas:

— A carreira no jornalismo e aluta política de Maurício Azêdo seconfundem com a trajetória da ABI,que sempre teve compromisso com adefesa das liberdades públicas, dosdireitos civis e dos direitos humanos— disse Iório.

Marca da entidadeDestacando que os cem anos da

ABI na luta pela liberdaderepresentam “a grande marca daentidade”, Maurício Azêdo iniciou apalestra exaltando o pioneirismo deGustavo Lacerda na fundação daentidade, a dedicação dos primeirosdirigentes na conquista da sedeprópria, o esforço para a construçãode uma sede para a ABI e o empenhode todos os associados para tornar aentidade referência nacional de lutapelas liberdades de imprensa e deexpressão e pelos direitos civis.

Maurício mencionou os períodosdo Estado Novo e da ditadura miitar1964-1985 como os mais dramáticose tensos vividos pela Associação:— Eu me lembro de que em 31 demarço de 1964 nós realizamos na ABIum ato com diversos jornalistas,visando à mobilização dos

profissionais para a resistência que setornava necessária ao golpe. Entre oscompanheiros jornalistas estavamOrlando Bonfim Júnior e Mário Alvesde Souza Vieira, membros do ComitêCentral do Partido ComunistaBrasileiro. Orlando Bonfimdesapareceu em 1976 e até hoje seucorpo não foi encontrado, nem hánotícias sobre as circunstâncias desua morte. Mário Alves foi preso etorturado no Doi-Codi e teve um fimbrutal: foi empalado.

Em 1976, o regime militar já tinhaderrotado a chamada resistênciaarmada, contou Maurício, e decidiuliquidar o Partido ComunistaBrasileiro, que pregava a união detodas as forças políticas para aderrubada da ditadura:

— O Partido era eficaz nestamissão e reunia importanteslideranças, como o jornalista eprofessor Luís Maranhão Filho, quetambém desapareceu. Outrosmomentos de tensão foram a bombaque explodiu no sétimo andar da sededa ABI, em 19 de agosto de 1976, e oato em memória de Vladimir Herzog,assassinado uma semana antes noDoi-Codi de São Paulo. Como aArquidiocese do Rio não permitiuque a missa de sétimo dia fossecelebrada na Igreja de Santa Luzia, noCentro do Rio, onde a ABI realizavatradicionalmente os ofícios religiosos

e comemorativos, a cerimôniaaconteceu na sede da entidade, sob apresidência de Prudente de Morais,neto, e de Barbosa Lima Sobrinho,então Presidente do nosso ConselhoDeliberativo. O Auditório OscarGuanabarino foi então cenário deprolongado silêncio em homenagem aHerzog: nada menos que 15 minutos.

Momentos de esperançaEntre os momentos de esperança

Na BN, evocação dastensões e da esperança

Projeto Quarta às Quatro de 2008começa com homenagem à ABI.

mais significativos para a ABI,Maurício citou a posse de HerbertMoses, o ato de assinatura peloPrefeito Pedro Ernesto da doação doterreno para a construção da sedeprópria da Casa, o concurso deprojetos de arquitetura para aconstrução do prédio, a unificaçãodas associações de imprensa, quepermitiu a doação do terreno na árearecém-urbanizada do Centro do Rioresultante da demolição do Morrodo Castelo. Ele destacou também aparticipação da ABI em lutas cívicas,como as campanhas O petróleo énosso e Diretas Já, pela AssembléiaNacional Constituinte, pela anistia epelo impeachment de FernandoCollor, decidido com base numapetição ao Congresso Nacional queteve como primeiro signatárioBarbosa Lima Sobrinho.

No fim do encontro, Iório falou desua relação estreita com a ABI e seuPresidente: — Freqüento a Associaçãodesde o início da minha carreira. Em1969, Maurício Azêdo foi meuprimeiro editor no Jornal dos Sports.Ele era um fantástico copidesque enão deixava passar nenhum erro.Todos nós que estávamos começandono jornalismo morríamos de medode entregar a matéria a ele. Estaexperiência foi fundamental, já queaprendi a não cometer erros logo noinício da profissão.

Encerrando a homenagem,Maurício Azêdo agradeceu ainiciativa da Biblioteca Nacional:

— Foi muito gratificante estecontato de hoje no projeto Quarta àsQuatro, criado e dirigido por ummembro do nosso quadro social, ojornalista Vítor Iório, que nosofereceu a oportunidade de contarpara uma platéia jovem, que muitasvezes não tem informações sobre oque nós relatamos, não apenas osfatos antigos sobre a fundação daABI, como também os mais recentesda nossa História política, recebendotalvez as primeiras informações defontes idôneas e de protagonistasdos acontecimentos, como oscompanheiros e sócios da ABI queparticiparam do debate, comoMilton Temer e o Professor EmirAmed, eminente historiador.(Claudia Souza)

Ao lado de Victor Iório, o Presidente da ABI abriu o ciclo 2008 de palestras da Biblioteca.

Iório apontou a ABI como uma das maiscombativas entidades da sociedade civil.

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Os cem anos da ABI foram homena-geados no dia 10 de abril pela Ordemdos Advogados do Brasil/Seção do Es-tado do Rio de Janeiro em sessão sole-ne conduzida pelo Vice-Presidente daentidade, Lauro Schuch. A mesa reuniuo Presidente da ABI, Maurício Azêdo,o jornalista Fernando Barbosa Lima,Presidente do Conselho Deliberativoda ABI, a Presidente do Instituto dosAdvogados Brasileiros, Maria AdéliaCampelo, e os advogados Modesto daSilveira; Marcus Vinicius Cordeiro,Diretor de Cultura e Eventos da OAB-RJ; Marcelo Chalréo, Secretário-Adjun-to da OAB-RJ; e Marco Luiz Oliveira deSouza, Secretário-Geral da OAB-RJ.

Lauro Schuch substituiu o Presidenteda OAB-RJ, Wadih Damous, ausente emvirtude de um compromisso forense, einiciou a saudação ressaltando que a ABIé uma entidade co-irmã da OAB, comdiversos traços históricos semelhantes:

— Constituídas inicialmente paraorganizar e garantir a defesa dos pro-fissionais, ambas trilharam o caminhode luta e sacrifícios para assegurar as li-berdades, o desenvolvimento e o pro-gresso da sociedade brasileira.

Schuch lembrou os momentos detensão enfrentados pelas duas entida-des na busca por justiça e democracia.

— Aqueles que jogaram bombas naOAB foram os mesmos que jogarambomba na ABI e com o mesmo propó-sito: calar os que se insurgiam contra aferocidade do sistema que avassalava osvalores mais elementares da civilização.

O Vice-Presidente da OAB destacoua vitalidade da ABI e seu compromis-so com a liberdade e a democracia aolongo de um século:

— Aos cem anos, a entidade se renovacom a presidência de Maurício Azêdo,companheiro e combativo militante dascausas humanas, que oferece o vigor àABI, tal qual a OAB, sempre pronta aresponder aos anseios do povo.

Acentuando a identidade das asso-ciações, Schuch citou os advogadosEvaristo de Morais e Evandro Lins e Sil-va, que tiveram passagens marcantespela imprensa:

— Compartilhamos os mesmos es-paços, as mesmas trincheiras, como nadécada de 30 e, mais recentemente, noimpeachment de Collor, quando Bar-bosa Lima Sobrinho e Evandro Lins eSilva lutaram juntos pelo compromissode devolver à Nação o cumprimento daConstituição. Esta simbiose nos faz ín-tegros e merecedores do respeito e dacredibilidade de nossa gente.

Em nome da ABI e do Presidente doseu Conselho Deliberativo, FernandoBarbosa Lima, Maurício Azêdo agrade-ceu a homenagem de Lauro Schuch,com quem batalha “há algum tempoem favor das mesmas causas voltadaspara o enaltecimento dos valores de-mocráticos e éticos na vida da nossacidade e estado”. Ele se disse conforta-do com a lembrança de momentos eprincípios que a ABI tem sustentado aolongo de cem anos, em especial a rela-ção forte com a OAB.

— Entre os Presidentes da ABI, cer-ca de 70% eram jornalistas e tambémadvogados. Raul Pederneiras, que diri-giu a Associação no fim dos anos 10, eraadvogado e também professor de Direi-to Internacional na antiga Faculdade deDireito do Rio de Janeiro, a famosaFaculdade do Catete. O jornalista e ad-vogado Barbosa Lima Sobrinho suce-deu a Pederneiras a convite do próprio,que precisava de um jornalista de den-sidade para ocupar a ABI. Na época,Barbosa Lima Sobrinho, que tinha ape-nas 29 anos e era redator-chefe do Jor-nal do Brasil, brilhava na crônica polí-tica. Ele deu à ABI o rumo fundamen-tal para a sobrevivência da entidade esua vitalidade aos cem anos.

Lembrou o Presidente da ABI queBarbosa Lima Sobrinho propôs a uni-

ficação das entidades jornalísticas en-tão existentes (Clube de Imprensa, ABIe Associação da Imprensa Brasileiera-AIB) para que o sonho de construçãoda sede própria se concretizasse:

— As autoridades públicas da épocase comprometeram a doar um terrenono Castelo, desde que elas se unificas-sem. Barbosa Lima propôs a renúnciados dirigentes das três associações e aescolha de um nome para a entidaderecém-criada. O escolhido foi o jorna-lista e também advogado Herbert Mo-ses, que nos anos 20 mantinha um es-critório com dez advogados, indicativode seu prestígio e responsabilidade.

Também ocuparam a presidência daABI os jornalistas e advogados DantonJobim, um dos introdutores do ensinode Jornalismo em nível universitário noBrasil, Prudente de Morais, neto, Elma-no Cruz e Fernando Segismundo.Maurício explicou que, como até adécada de 60 não era exigido o diplo-ma da categoria, “afluíam à imprensaos jovens advogados empenhados nodesejo comum a jornalistas e profissi-onais do Direito: a sede de justiça”.

— O advogado Evandro Lins e Silva,por exemplo, foi um dos fundadores doSindicato dos Jornalistas Profissionaisdo antigo Distrito Federal, hoje Sindi-

As duas entidades trilharam o caminho de luta e sacrifícios, assinala a Seção do Estado do Rio da Ordem dos Advogados.

Na OAB-RJ, lembrança da luta comum

cato do Município do Rio de Janeiro,e um dos redatores do primeiro estatu-to da instituição. Outro exemplo é obrilhante Antônio Evaristo de MoraisFilho, o saudoso Evaristinho, que co-meçou a vida profissional como repór-ter de polícia do jornal Última Hora naépoca de Samuel Wainer.

O Presidente da ABI agradeceu ahomenagem sublinhando a contribui-ção da OAB-RJ à restauração das ins-tituições democráticas e à denúncia dosatos de violência do regime militar:

— Nessa época, eu era chefe de re-portagem da sucursal Rio do Estado deS. Paulo e com freqüência pautávamosentrevistas e buscávamos informaçõescom o então Presidente da OAB-RJ,José Ribeiro de Castro Filho, um dosmais corajosos membros da advocaciabrasileira na luta pela ordem democrá-tica e a legalidade constitucional.

Na esteira dessa linha de atuação,Maurício citou ainda a atuação de Fran-cisco Costa Neto, Eugenio RobertoHaddock Lobo, Virgílio Donnici, Car-los Mauricio Martins Rodrigues, HélioSaboya, Nilo Batista, Cândido de Oli-veira Bisneto, Wadih Damous, LauroSchuch, Bernardo Cabral, EduardoSeabra Fagundes, Herman Baeta eRaimundo Faoro. (Claudia Souza)

Fernando Barbosa Lima (2º à esquerda), Maurício e Modesto (4º) representaram a ABI no encontro presidido por Lauro Schuch (3). À direita, Maria Adélia Campelo, do IAB.

Fernando eMauríciolembraramque 70% dospresidentesda ABI eramjornalistas eadvogados,como RaulPederneirase o próprioBarbosaLima, pai deFernando.

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Para festejar a fundação da AssociaçãoBrasileira de Imprensa, há cem anos, aAssembléia Legislativa do Rio de Janei-ro realizou no dia 11 de abril sessão so-lene no Plenário Barbosa Lima Sobrinho,para a entrega da Medalha Tiradentes àentidade. A iniciativa de condecorar aABI com a maior comenda do Estado doRio foi do Deputado André do PV, paraquem a entidade é “trincheira inexpug-nável da defesa da liberdade de impren-sa e dos direitos humanos”.

Presidida pelo parlamentar, a mesa dehonra reuniu o Presidente da ABI, Mau-rício Azêdo, o Diretor de AssistênciaSocial da Associação, Paulo Jerônimo deSouza, e a professora Dalva Lazaroni.André iniciou a cerimônia de entrega dacomenda dizendo-se feliz por homena-gear o centenário da Associação no Ple-nário Barbosa Lima Sobrinho, “grandebrasileiro que presidiu a Casa em vári-os mandatos e sempre em momentos deimportância para a vida nacional”.

Em seu discurso, ele destacou os cemanos de dedicação da ABI à causa dosjornalistas e à defesa dos direitos dacidadania, sublinhando episódios mar-cantes da história da entidade: — Nasede da ABI foram realizadas as reuniõespatrióticas que antecederam a lei de1953 que instituiu a Petrobras. Em 1976,um ato terrorista destruiu todo o séti-mo andar de sua sede. Também duran-te a ditadura, a entidade foi palco deprotesto e indignação contra o assassi-nato de Vladimir Herzog. Na mesmaépoca, recebia numerosas famílias dejornalistas desaparecidos que a procu-ravam em busca de ajuda.

O pioneirismo do fundador Gusta-vo de Lacerda e de destacados presiden-tes da Casa, como Herbert Moses eBarbosa Lima Sobrinho, foi lembradopelo Deputado:

— Certa vez, em entrevista a um jor-nal, Barbosa Lima Sobrinho disse quea imprensa desempenha um papel fun-damental na história do Brasil e quetem sido guardiã das liberdades públi-cas e dos interesses nacionais.

Sobre o papel da Associação nos diasde hoje, André do PV afirmou que a en-tidade, “tão bem dirigida pelo nobre jor-nalista Maurício Azêdo, segue cum-prindo à risca os rumos que a Histórialhe destinou, fazendo lembrar os esfor-ços de Gustavo de Lacerda, de Prudentede Moraes, neto e de Barbosa Lima So-brinho”.

IncansávelMaurício Azêdo agradeceu ao Depu-

tado, “parlamentar com destacado de-sempenho e incansável defesa do meioambiente e dos direitos humanos”, àprofessora Dalva Lazaroni — a quemelogiou pela iniciativa de escrever abiografia da maestrina e compositoraChiquinha Gonzaga — e ao Diretor daABI Paulo Jerônimo, “dono de longa ebrilhante trajetória no jornalismo bra-sileiro”.

O Presidente da ABI enfatizou quea realização da cerimônia no PlenárioBarbosa Lima Sobrinho realçou a sig-nificação da concessão da medalha àCasa do Jornalista.

— Como ele mesmo dizia, de um ladotemos o partido de Silvério dos Reis, queentrega as nossas riquezas e o patrimô-nio público, e de outro temos o partidode Tiradentes, daqueles que não aceitamqualquer forma de dominação e inter-venção no interesse público.

Maurício afirmou que a imprensa eo Poder Legislativo são os pilares do re-gime democrático que se dedicam àmissão comum em favor do crescimen-to da cidadania e dos direitos sociais:— No Legislativo se apresentam as an-gústias, necessidades e os projetos paraa comunidade. A imprensa transmiteao conjunto da sociedade as informa-ções necessárias para que cada cidadãoganhe consciência e, nos momentosoportunos, possa intervir nas decisões.

Segundo o Presidente da ABI, o Le-gislativo foi grande aliado da imprensatambém no começo da República, dian-te da ferocidade com que o Governo Flo-riano Peixoto tratava seus adversários,e nos anos 20, perante a violência do Go-verno Arthur Bernardes: — Nesses e em

POR CLAUDIA SOUZA

ABI condecorada coma Medalha Tiradentes

outros momentos, os parlamentares de-fenderam os interesses coletivos e tive-ram na imprensa o meio de divulgaçãode seus pronunciamentos em favor doavanço das conquistas sociais.

Ele lembrou ainda que a AssembléiaLegislativa foi palco de momentos his-tóricos do País, como a cassação dosdeputados após a Assembléia Constitu-inte de 1934 e a instalação, em 1946, daprimeira Legislatura da Câmara “apósum longo período de privação das liber-dades e dos direitos civis pela ditadurado Estado Novo”. Os nomes de AfonsoArinos e Carlos Lacerda foram destaca-dos como “memoráveis parlamentarese oradores” e os de Jorge Amado e Car-los Marighella, como importantes qua-dros da primeira bancada do PartidoComunista Brasileiro que teve assentono Palácio Tiradentes.

Ao fim da solenidade, André do PV,em nome da Assembléia, estendeu ashomenagens ao ex-Presidente da ABIFernando Segismundo, “democrata con-victo e valente historiador da Associ-

ação no correr de muitas décadas”; e aoatual Vice-presidente da entidade, Au-dálio Dantas, “mestre de muitas gera-ções de jornalistas, ex-Presidente doSindicato dos Jornalistas de São Pauloe defensor invulgar dos companheirosperseguidos e presos pelo regime deentão”. Outro homenageado da noitefoi o membro da Comissão Diretora deAssistência Social da ABI Eloy Santos,que recebeu o título de Cidadão Bene-mérito do Estado do Rio de Janeiro.

A comendaA Medalha Tiradentes foi criada por

decreto-legislativo estadual em agostode 1989. É concedida a personalidadesnacionais e estrangeiras que tenhamprestado serviços ao Rio de Janeiro, aoBrasil ou à humanidade. A comenda éacompanhada de diploma e traz, noanverso, a efígie de Joaquim José da SilvaXavier, o Tiradentes, e a legenda Alerj;e no reverso, a inscrição Libertas QuaeSera Tamem, dentro do contorno geográ-fico do Brasil.

A Câmara Municipal de Itapeva, SO,consignou em ata Voto de Congratulaçõesà ABI, na pessoa de seu Presidente e detoda a Diretoria pela passagem docentésimo aniversário da entidade.

A manifestação foi aprovada em sessãoordinária pela Câmara Municipal de Itapevae referendada por meio do Requerimentonº 229/08, sob a justificativa de que “éimportante ressaltar a atuação da ABI nosentido de lutar pela defesa da liberdade deimprensa, ocupando espaços e contribuindode forma decisiva para a consolidação dademocracia em nosso País”.

Além de destacar a trajetória da ABI, osvereadores mencionam o lançamento do

selo comemorativo do centenário, que temcomo ilustração imagens do fundador daCasa, Gustavo de Lacerda, e do EdifícioHerbert Moses, marco da arquiteturamoderna brasileira.

Assinam o Voto de Congratulações àABI os Vereadores Antônio Marmo Fogaça(PSDB), Áurea Aparecida Rosa (PTB),Geraldo Tadeu dos Santos Almeida (PT),Júlio César de Araújo (Dem), OtacílioFranco de Almeida-Ataíde Almeida (Dem),Paulo de La Rua Tarancón (PDT), PauloRoberto Tarzã dos Santos (PSDB), SidneyJosé S. Gonçalves (PMDB), Ulysses MárioTassinari (PV) e Walter Daniel da SilvaJúnior (PMDB).

A Casa é uma trincheira inexpugnável, diz o Deputado André do PV.

Câmara de Itapeva, SP, envia congratulações

Paulo Jerônimo (Pagê) e Mauricio recebem de André do PV o diploma da Medalha.

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14 Jornal da ABI 329 Maio de 2008

A ABI recebeu no dia 16 de abril, emcelebração ao seu centenário, a Medalhade Mérito Pedro Ernesto, a mais impor-tante comenda da cidade do Rio de Janei-ro, concedida pela Câmara Municipal aentidades e personalidades que se desta-cam no País. Para a ABI a Medalha PedroErnesto tem especial valor afetivo: foi elequem, como Prefeito do Distrito Federal,assinou em 1932 o ato de doação do ter-reno onde se ergueu o atual EdifícioHerbert Moses, a sede própria pela qualo corpo social lutava desde os primeio-ros anos de existência da Casa.

Presidida pelo Vereador Stepan Ner-cessian (PPS), autor dos requerimentosde concessão da Medalha e de convo-cação da sessão solene em que ela foientregue, a mesa de honra reuniu oPresidente da ABI, Maurício Azêdo, oex-Senador Bernardo Cabra, o advoga-do Modesto da Silveira, ambos sóciosda ABI, e Orpheu Salles, membro doCoselho Deliberativo da ABI e editorda revista Justiça e Cidadania.

Stepan abriu a cerimônia pedindoum minuto de silêncioem memória do Con-selheiro da ABI ArthurCantalice, morto navéspera, e destacou osserviços que ele pres-tou à imprensa e aoPaís ao longo de 81anos de vida: — De-fensor fervoroso da li-berdade de imprensa ede uma sociedade maisjusta e humanitária,Cantalice terá o nomeperpetuado tambémnesta Casa da Lei.

Modesto da Silveirainiciou os discursoscumprimentando o Pre-sidente da ABI pelo bri-lhantismo e a atuação àfrente da Associação: —Conheço Maurício des-de a faculdade, onde jáse destacava. Ele enfrentou o mais pesadoperíodo da ditadura lutando para o res-tabelecimento da democracia. Tecemosjuntos uma teia invisível para chegar aeste momento do País de horizontes de-mocráticos, em que podemos vislumbrare escolher os caminhos políticos.

Em seguida, Orpheu Salles elogiou ainiciativa de Stepan Nercessian em ho-menagear a ABI e seu Presidente: — Mau-rício Azêdo é um dos ícones da imprensabrasileira e teve atuação destacada comoVereador e Presidente da Câmara Mu-nicipal. Sua trajetória honra a todos osjornalistas pela luta que travou com al-tanaria e pompa contra as desgraças daditadura e em defesa do jornalismo.

gressou aos 11 anos: — Na época daditadura, as pessoas procuravam osjornais para se defender e pedir ajuda.Eu e minha família somos muito gra-tos ao jornalista Batista Custódio dosSantos, que, através de seus artigos, de-nunciou e ajudou a localizar minhairmã, presa pelo regime em 1965, quan-do seguia de Goiânia para Brasília.

No encerramento da solenidade,Maurício Azêdo agradeceu a homena-gem, afirmando que a ABI não é ape-nas a instituição fundada por Gustavode Lacerda, mas sobretudo aquilo queos grandes jornalistas, enfrentando di-ficuldades, ajudaram a alcançar: “Obem essencial que é a liberdade”.

— Como disse certa vez Prudente deMorais, neto, a liberdade é o nosso cli-ma, e a ABI é incansável nesta missão.Tudo isso só foi possível graças ao Pre-feito Pedro Ernesto, que em 1932 assi-nou o decreto de doação do terreno paraa construção da sede da ABI. Pedro Er-nesto permitiu que naquele espaço seconcentrassem décadas depois decisivas

ANO DO CENTENÁRIO

Pedro Ernesto, uma medalha de valor afetivoA Câmara Municipal do Rio confere à ABI uma comenda de especial significação: foi ele quem doou

o terreno onde se ergueu a sede própria da Casa, pela qual o corpo social lutou durante quase 30 anos.

Bernardo Cabral subiu à tribuna parao que considerou uma das mais justashomenagens ao longo de sua vida: —Maurício, velho companheiro e queri-do amigo, é uma das figuras públicasque, ao deixarem os cargos, carregamconsigo as orgulhosas cicatrizes do de-ver cumprido.

A luta contra a ditadura travada pe-los membros da mesa de honra e a atu-ação de Barbosa Lima Sobrinho em de-fesa da liberdade de imprensa e dos di-reitos civis foram destacadas pelo Sena-dor: — No período em que presidi a OAB,participei de inúmeros eventos pelo País,ao lado do então Presidente da ABI Bar-bosa Lima Sobrinho, denunciando a tor-

tura, as prisões e todas as atrocidades co-metidas pelo regime. Tive a honra de,junto com Barbosa, empunhar as bandei-ras da ABI e da OAB contra a repressão.

A gestão de Maurício Azêdo à fren-te da ABI e a renovação da entidadetambém foram enfatizadas: — Cemanos antes e cem anos depois de Mau-rício: assim a ABI será lembrada daquipra frente. A Associação estava perden-do o contato com seus companheiros,mas pelas mãos dele muitos voltaram,assim como eu também retornei.

Stepan Nercessian agradeceu a opor-tunidade de homenagear a ABI e con-tou que seu primeiro emprego foi nojornal goiano Cinco de Março, onde in-

batalhas, como as campanhas O petró-leo é nosso, pela anistia ampla, geral e ir-restrita, pelas Diretas Já, pela Assem-bléia Nacional Constituinte e ainda peloimpeachment de Collor, cujo primeirosignatário foi Barbosa Lima Sobrinho.

O Presidente da ABI completou seudiscurso falando sobre a emoção de re-ceber a homenagem em nome da Asso-ciação: — Este momento é, sem dúvi-da, um dos mais marcantes dentre ascomemorações pelo centenário da ABI.A Medalha Pedro Ernesto representaum patrimônio moral e cívico que aCasa transmitirá às novas gerações,cumprindo sempre o lema “ABI — cemanos de luta pela liberdade”.

Ao agradecer a homenagem do Vereador Stepan Nercessian, o Presidente da ABI lembrou que foi Pedro Ernesto que assinou o ato dedoação do terreno onde a Casa construiu sua sede. No fim, Nercessian chamou a delegação da ABI para uma foto de confraternização.

Nercessian, Maurício e Bernardo Cabral exibem o diploma da Medalha Pedro Ernesto.

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15Jornal da ABI 329 Maio de 2008

O Senado celebrou o centenário daABI na manhã do dia 24 de abril em ses-são especial na qual o autor da inicia-tiva da homenagem, Senador Inácio Ar-ruda (PCdoB-CE), salientou que “aAssociação Brasileira de Imprensa sur-giu não apenas para testemunhar aHistória do Brasil contemporâneo, masda necessidade, do clamor pela existên-cia de uma organização desse porte”

O Senador Inácio Arruda disse ain-da que os ideais do fundador da ABI,Gustavo de Lacerda, continuam moven-do a luta democrática e libertária dopovo brasileiro: — Ao completar cemanos, a ABI mostra-se cada vez maisjovem. Nunca perdeu seu viço e o vigorde seus primeiros anos de vida e jamaisse afastou do caminho traçado pelospioneiros que a constituíram e a conso-lidaram. É impossível desvincular a ABIde todos os momentos decisivos que seconsubstanciaram no Brasil de nossosdias. Ao mesmo tempo em que dava asmãos à cidadania, na busca incessanteda superação dos quadros de exceçãoque agrediam a consciência democráti-ca, a entidade defendia a integridade fí-sica e moral dos jornalistas.

A figura de Barbosa Lima Sobrinhofoi ressaltada pelo Senador como sinô-nimo de liberdade de imprensa e amorao Brasil.

— Ao longo de mais de cem anos devida, esse advogado, jornalista, ensaís-ta, historiador, professor, ex-Governa-dor, político que Pernambuco ofereceuao Brasil, não fez outra coisa senão darlições cotidianas de coerência de prin-cípios, de integridade pessoal e de de-voção absoluta às causas populares enacionalistas.

No fim do discurso, Inácio Arrudacumprimentou Maurício Azêdo porsua gestão, reafirmando que “a luta

A homenagem prestada à ABI peloConselho Estadual de Cultura do Esta-do do Rio de Janeiro, realizada por ini-ciativa da Presidente do Conselho, jorna-lista, professora e escritora Ana ArrudaCallado, no dia 16 de abril, ofereceu sub-sídios importantes para a recomposiçãoda trajetória da Casa no campo cultural,graças à memória de dois membros doConselho, o jornalista, historiador e pro-dutor cultural Haroldo Costa e o maes-tro e compositor Edino Krieger.

Diante dos Presidentes da Diretoriae do Conselho Deliberativo da ABI,Maurício Azêdo e Fernando BarbosaLima, convidados especiais da sessão,Haroldo e Edino expuseram em narra-tivas coloquiais, desprovidas de qual-quer pretensão de sofisticação, as ex-periências que tiveram na Casa aindamuito jovens, nos anos 50, quandofreqüentavam os espaços que a ABI deHerbert Moses franqueava para mani-festações culturais.

Contou Haroldo Costa que participouentão na ABI de movimentos e eventosque tiveram forte influência em sua for-mação cultural e política: o Teatro Expe-rimental do Negro, criado e dirigido porAbdias Nascimento, que mais tarde senotabilizaria na defesa dos direitos dosnegros e se tornaria senador da Repúbli-ca, e o Teatro Popular Brasileiro, criadoe dirigido pelo poeta Solano Trindade,que, tal como Abdias, buscava formar eaperfeiçoar talentos entre jovens negros.Tanto o Teatro Experimental do Negrocomo o Teatro Popular Brasileiro, disseHaroldo, tiveram papel destacado na va-lorização da cultura negra e na formaçãode jovens que conquistariam espaço im-portante no cenário artístico do País,como a atriz Ruth de Souza.

O Maestro Edino Krieger lembrouque a ABI sediava eventos importantesna área da música erudita, oferecendoo espaço de seu Auditório Oscar Guana-barino para ensaios e recitais de artistas,sobretudo iniciantes jovens ou aindaadolescentes. Além disso, recordou, aABI abrigava outras manifestações cul-turais, como eventos de caráter literá-rio. Entre esses, um ficou fortementegravado em sua memória: numa de suasvisitas ao Brasil, o poeta cubano Nico-lás Guillen deu um recital na ABI, emsessão organizada pelo escritor JorgeAmado, anfitrião do poeta. A convite deJorge Amado, Edino musicou três poe-mas de Guillén, o que para ele foi mo-tivo de honra para toda a vida.

Ao abrir a sessão, prestigiada pela

presença da quase totalidade dos con-selheiros, Ana Arruda Callado salien-tou a importante presença da ABI nãoapenas no campo da defesa da liberdadede imprensa e das liberdades em geral,mas também no campo cultural, numatradição iniciada por Herbert Moses econtinuada por seus sucessores, nota-damente Prudente de Morais, neto eBarbosa Lima Sobrinho. Ana Arruda,que presidiu o Conselho Deliberativoda ABI, manteve sempre forte ligaçãoafetiva com Barbosa Lima Sobrinho esua esposa, Maria José Barbosa Lima,de quem fez uma biografia.

Ao agradecer a homenagem, o Presi-dente da ABI confessou seu encanto ede Fernando Barbosa Lima diante dostestemunhos de Haroldo Costa e EdinoKrieger, com os quais, encerrado o ato,combinou a gravação posterior de depo-imentos, pela importância dos relatosque fizeram. Além de destacar a atua-ção de Barbosa Lima Sobrinho no cam-po intelectual, em que se notabilizoucomo polígrafo capaz de escrever sobreo povoamento do Piauí ou a formaçãode capitais no Japão, a importância daliberdade de imprensa ou a necessida-de de defesa do idioma nacional, algunsdos muitos temas de sua copiosa bibli-ografia, Maurício Azêdo lembrou a ini-ciação na vida cultural de outro Presi-dente da ABI, Prudente de Morais, neto,criador, ao lado de Sérgio Buarque deHolanda, de uma publicação do Movi-mento Modernista, a revista Estética, deque circulou apenas um número.

— O refinamento cultural do Dou-tor Prudente, como o chamávamos comrespeito e admiração — disse o Presiden-te da ABI —, não o impediu de cultuargrandes criadores de música popular,como Sinhô, Ismael Silva e Noel Rosa,sobre o qual fez considerações singula-res, como a de que Noel fez “uma ascen-são para baixo”: cresceu como criadorde arte à medida que se afastou de suaorigem social, a classe média, e se apro-fundou no conhecimento e na convivên-cia com as classes populares, para assimproduzir uma obra extraordinária.

Membro do Conselho Estadual deCultura, o cantor, compositor e escri-tor Martinho da Vila chegou quase nofinal da sessão, mas a tempo de ouvircom extremo interesse o relato do Pre-sidente da ABI acerca de Prudente deMorais, neto, que figura com especialrelevo na sua admiração. Após o ato,o Conselho promoveu discreto vind’honneur em homenagem à ABI.

No Conselho de Cultura,depoimentos reveladores

O historiador Haroldo Costa e o Maestro Edino Kriegerrecompõem momentos da atuação cultural da ABI durante

a homenagem prestada à Casa pelo órgão estadual.

No Senado, sete discursosde exaltação da ABI

Sessão especial requerida pelo Senador Inácio Arrudafoi prestigiada pelos principais partidos.

pela democratização da mídia e emdefesa da cultura nacional representauma bandeira estratégica, que exige amobilização da sociedade”.

Também enalteceram o centenárioda ABI os Senadores Pedro Simon, Ma-risa Serrano, Serys Slhessarenko, MãoSanta e o Presidente do Senado, Gari-baldi Alves Filho, que destacou o papelda ABI na busca por uma sociedademais democrática: — Temos consciên-cia de que se não fosse a imprensa anossa voz daqui não ganharia os espa-ços desta nação e, sobretudo, não inun-daria os corações dos brasileiros quegritam que a democracia é uma con-quista eterna do povo brasileiro — dis-se o Presidente do Senado.

O Senador Pedro Simon (PMDB-RS)lembrou o papel da ABI na luta pela li-berdade e em defesa da cultura nacio-nal. O primeiro cineclube do Brasil, res-saltou, foi criado pela associação. Aentidade também participou decisiva-mente, como recordou, em campanhaspolíticas como as da luta pela anistia,pelo fim da censura prévia, pelas eleiçõesdiretas e pela realização de uma Assem-bléia Nacional Constituinte: — Em umahora em que o Brasil vive sem referên-cias, nós prestamos uma homenagemcívica a nossas referências mais queri-das, mais puras. A ABI é um orgulho doBrasil, um orgulho de nosso povo.

A Senadora Marisa Serrano (PSDB-MS) concordou com Simon e afirmouque se precisa da ABI para “dar umrumo à sociedade brasileira”. Sua cole-ga Serys Slhessarenko (PT-MT) ressal-tou a necessidade de se buscar um jor-nalismo com responsabilidade; a im-prensa, a seu ver, “deve informar, nãojulgar e condenar indivíduos”. Já o Se-nador Mão Santa (PMDB-PI), ao lem-brar a contribuição de seu Estado para

Antes da sessão convocada pelo Senador Inácio Arruda, o Presidente do Senado, GaribaldiAlves Filho (à direita), recebeu o Presidente da ABI e o jornalista Joaquim Campelo.

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16 Jornal da ABI 329 Maio de 2008

O centenário da ABI, veículos im-pressos versus eletrônicos, as contra-dições da mídia antiga e atual e a obri-gatoriedade do diploma para o exercí-cio da profissão de jornalista centrali-zaram o debate da terceira edição dociclo de conferências A Imprensa discutea imprensa, realizado na noite do dia 28de abril no Auditório Dom João VI daImprensa Nacional, em Brasília. Diver-sos especialistas discorreram sobre otema 200 anos de imprensa, 200 anos dejornalismo: passado, presente e futuro, emconferências promovidas pela Associ-ação dos Servidores da Imprensa Na-cional-Asdin e pelo Correio Braziliense,com o apoio da Imprensa Nacional.

Como homenageada da noite, a ABI,representada por seu Presidente, Mau-rício Azêdo, foi reverenciada logo noinício, com placas de homenagem en-tregues pelo editor de Suplementos doCorreio Braziliense, Renato Ferraz; peloPresidente da Asdin, Humberto Borges,

ANO DO CENTENÁRIO

a História da imprensa brasileira, res-saltou o exemplo do jornalista CarlosCastelo Branco, que durante muitosanos foi titular no Jornal do Brasil damais importante coluna política já edi-tada no País.

Logo após participar de uma audiên-cia pública da Comissão de Educaçãoe Cultura do Senado, o Senador Eduar-do Suplicy (OT-SP) dirigiu-se ao Plená-rio para pedir um aparte à sua colegaSerys Slhessarenko, no qual se associouàs homenagens à ABI.

Maurício Azêdo agradeceu a home-nagem e a exaltação do compromisso

da ABI com a liberdade: — Nestes cemanos, a Associação e sua militância en-frentaram desafios, perigos, ameaças erepresálias para que a liberdade fosse eseja sempre um bem a cobrir e protegero conjunto dos brasileiros. Nós da ABIficamos muito sensibilizados com o des-taque que se dá a esse empenho da Casaem torno da questão da liberdade, quefoi erigida pela ABI como divisa das co-memorações do seu centenário, por pro-posta de um membro do nosso quadrosocial, o jornalista Rodolfo Konder: “ABI— cem anos de luta pela liberdade”.

O Presidente agradeceu ainda a men-

Um ciclo em que a imprensa se questionaCom o dobro da idade da ABI, a Imprensa Nacional chama a imprensa para discutir este tema: ela própria.

ção a pessoas que contribuíram para aconstrução da ABI e dedicaram suasvidas à defesa das liberdades no País:

— Os diferentes parlamentares quese pronunciaram aqui exaltaram figu-ras que sobrevivem na nossa memóriae na nossa admiração pela contribuiçãoque ofereceram ao jornalismo e à vidanacional, como Barbosa Lima Sobri-nho, que sempre dizia: “O meu patrãoé o Brasil. Todos os brasileiros deveri-am ter a disposição de servir apenas aoBrasil e ao povo brasileiro”.

À mesa tiveram assento, além doPresidente da ABI, a Subprocuradora-

Geral da República, Julieta Cavalcân-ti de Albuquerque, o Presidente daImprensa Nacional, jornalista Fernan-do Tolentino de Sousa Vieira, e o Sena-dor Inácio Arruda, a quem o SenadorGaribaldi Alves Filho passou a presi-dência dos trabalhos após instalar asessão e render homenagem à ABI.

Entre os presentes encontravam-seos jornalistas Domingos Xisto da Cu-nha e Tarcísio Holanda, membros doConselho Deliberativo da ABI radica-dos em Brasília, Chico Dias e JoaquimCampelo Marques, Diretor de Publica-ções do Senado. (Claudia Souza)

e pelo Diretor-Geral da Imprensa Naci-onal e mediador do debate, FernandoTolentino. Na abertura da conferência,Tolentino agradeceu a presença do Pre-sidente do Sindicato dos Jornalistas doDistrito Federal, Romário Schettino, eTrajano Jardim, da Diretoria da Asdin,e expliou o objetivo do ciclo:

— Ele homenageia a um só tempo os200 anos do Correio Braziliense, daImprensa Nacional e da Gazetal do Riode Janeiro, primeiro jornal editado noPaís, e muito especialmente o centená-rio da ABI.

Tolentino ressaltou a importância daABI para o País, marcada por campa-nhas sérias, como a luta em favor dapresença brasileira nas tropas que com-bateram o nazifascismo, as campanhasO petróleo é nosso e pela anistia, a con-vocação da Assembléia Nacional Cons-tituinte e o impeachment de Collor, queteve o então Presidente da ABI, BarbosaLima Sobrinho, como primeiro signa-

Diante de um plenário atento, o Senador Pedro Simon (PMDB-RS) disse que a ABI é uma das referências mais queridas, mais puras, um orgulho do nosso povo.

Presidente da Imprensa Nacional, Fernando Tolentino (à direita) destacou a importânciada ABI para o País pelas campanhas que desenvolveu, como a do petróleo.

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17Jornal da ABI 329 Maio de 2008

A ABI foi homenageada no dia 29 deabril durante a III Conferência Legisla-tiva sobre Liberdade de Imprensa, rea-lizada no auditório da TV Câmara, naCâmara dos Deputados, em Brasília, poriniciativa da Associação Nacional deJornais-ANJ e da Organização das Na-ções Unidas para a Educação, a Ciênciae a Cultura-Unesco, com o objetivo dedebater a liberdade de imprensa no Bra-sil e comemorar o centenário da ABI, os200 anos da imprensa no Brasil e o DiaMundial da Liberdade de Imprensa e deExpressão, instituído pela Unesco e quetranscorre em 3 de maio.

Com o apoio da ABI, da SociedadeInteramericana de Imprensa-Sip, daAssociação Nacional dos Editores deRevistas-Aner, da Associação Brasileiradas Emissoras de Rádio e Televisão-Abert e da Escola Superior de Propagan-da e Marketing, foram realizados ospainéis Conquista do direito à liberdadede imprensa e A imprensa na históriapolítica do País.

Na abertura do evento, o Presiden-te da ANJ, Nelson Sirotsky, destacoua homenagem à ABI, “um dos orgulhosnacionais, símbolo da luta pela liberda-de e do combate ao autoritarismo”, ea importância do debate sobre a liber-dade de imprensa dentro do Congres-so Nacional: — O Poder Legislativo ea liberdade de imprensa caminham jun-tos. Vivemos hoje no Brasil com amplaliberdade de imprensa, mas é essenci-al debater o tema e propagar sua impor-tância vital para a democracia. Hámuito a ser discutido e aperfeiçoado.

A ABI foi homenageada também nosdiscursos dos Presidentes da Câmara,Arlindo Chinaglia, e do Senado, Gari-baldi Alves Filho; do Vice-presidente daSociedade Interamericana de Imprensa, Enrique Santos; e do Coordenador doCentro de Comunicação e Publicações

Civita sustentou que a liberdade deimprensa e a democracia são valorespróprios das economias de mercado.

O Presidente da ABI, Maurício Azê-do, foi o moderador do segundo painel,que teve como expositores o SenadorMarco Maciel (Dem-PE), o DeputadoMiro Teixeira (PDT-RJ) e o PresidenteNacional da OAB, Cezar Britto.

Miro Teixeira, que integra o Conse-lho Consultivo da ABI, fez um históri-co de como as Constituições brasileirastrataram a questão da liberdade de im-prensa e advogou que pela Constituiçãode 1988 não há necessidade de legisla-ção para regulamentar a questão, ouseja, é totalmente desnecessária a exis-tência de qualquer Lei de Imprensa.

Maurício Azêdo agradeceu as home-nagens prestadas à ABI e disse que “aconferência foi uma bela oportunida-de para discutir um tema que não in-teressa apenas aos jornais e aos jorna-listas, mas a toda a sociedade”:

— Liberdade de imprensa não é umdireito da imprensa, mas dos cidadãos.É importante que se debata a questãopara buscar aperfeiçoamentos que ga-rantam o pleno exercício da liberdadede informar e ser informado.

A Câmara Federal põea liberdade em discussão

E a ABI é festejada por defendê-la há 100 anos.

da Unesco no Brasil, Célio da Cunha.No primeiro painel, moderado pelo

Presidente da ANJ, Nelson Sirotsky,falaram o Vice-Presidente das Organi-zações Globo, João Roberto Marinho;o representante do Conselho de Admi-nistração do Grupo Estado Júlio CésarMesquita; o Presidente da Folha deS.Paulo, Luís Frias; e o Presidente doGrupo Abril, Roberto Civita.

João Roberto Marinho criticou as de-cisões do Poder Judiciário que “signifi-cam, na prática, a censura prévia”, en-quanto Luís Frias sugeriu que o Congres-so vote uma nova Lei de Imprensa, sin-tonizada com a Constituição de 1988.Júlio César Mesquita historiou a censu-ra sofrida pelo jornal Estado de S. Pauloao longo da sua existência, sobretudodurante o regime militar, e Roberto

tário da petição submetida ao Congres-so.. Citou ainda a ABI dos últimos anos,conduzida por Maurício Azêdo, “cujatrajetória é marcada pelo destaque nacriação e edição de revistas como a Pla-car e saudosos títulos de jornais de re-sistência à ditadura militar, como Opi-nião e Movimento”.

O Presidente da ABI saudou compa-nheiros de luta presentes na platéia,como Trajano Jardim e o fotógrafo PedroTorre, agradeceu as homenagens da As-din, do Correio Braziliense e da Impren-sa Nacional e destacou a relevância dosveículos de comunicação em aconteci-mentos históricos do País, como os cita-dos por Tolentino: — Todos sublinhama importância da imprensa e dos meiosde comunicação na vida nacional, quecontam agora com um sistema de infor-mação muito amplo e variado.

No fim do pronunciamento, Maurí-cio ressaltou: — Para nós, tanto quan-to o centenário da ABI causa-nos muitoorgulho o bicentenário da ImprensaNacional, da Impressão Régia, da Tipo-graphia Nacional, do Departamento daImprensa Nacional, nomes que ela ado-tou através dos tempos, porque essa éa matriz do pensamento expresso emtermos gráficos do País desde 1808.

Na segunda parte do ciclo, a experi-ência dos debatedores contribuiu paraintensa participação da platéia, com-posta de estudantes de Comunicaçãoe profissionais. Raul Pilate, editor deEconomia do Correio Braziliense, acres-centou novos dados à discussão emtorno do futuro do jornalismo impres-so versus eletrônico, citando estudosque apontam o ano de 2034 como oúltimo do jornal em papel.

A Diretora do curso de Comunica-ção Social da Universidade Católica deBrasília, Elen Geraldes Cristina, con-centrou sua fala no “perfil contraditó-rio apresentado pelos jornais ao longode 200 anos de história” e, a partir daí,nas seguintes questões: como pensar aimprensa em um país que pouco lê,com mais escritores que leitores?Como o Brasil aparece na imprensa?Como conciliar interesses de gruposcom o desafio da notícia?

Professor do Instituto Superior deBrasília e repórter da revista CartaCa-pital, Leandro Fortes abordou a exigên-cia do diploma para o jornalista, guia-do por dados projetados em um telão.Disse ele que a “batalha” em torno doassunto apresenta um desrespeito to-lerado, o desprezo pela vida acadêmi-ca, a falácia da escola de redação, o dis-curso patronal, a síndrome da grandeimprensa, a pobreza de argumentoscontra o diploma e uma arrogânciaintelectual de jornalistas com maistempo de atuação.

No encerramento da terceira ediçãodo ciclo, Fernando Tolentino e Hum-berto Borges entregaram aos expolsi-tores um exemplar dos livros Macha-do de Assis, servidor público, editadonuma parceria da Imprensa Nacionalcom o Senado, e Imprensa Nacional, dalinotipia à era digital, de Jalmir Freitas.

Os Presidentesdo Senado,

Garibaldi AlvesFilho, e da

Câmara dosDeputados,

ArlindoChinaglia,

tiveramparticipação

destacada na IIIConferência

Legislativa sobreLiberdade de

Imprensa e nashomenagens

nesta prestadasà ABI.

O Senador Marco Maciel (ao centro) e o Deputado Miro Teixeira (à direita) no debate mediado pelo Presidente da ABI.

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18 Jornal da ABI 329 Maio de 2008

ANO DO CENTENÁRIO

A luta pioneira pela organização co-letiva dos profissionais de imprensacomo protagonistas na sociedade. Acampanha O petróleo é nosso, iniciadaem 1948 e que redundaria na criação daPetrobras, hoje uma das maiores em-presas do planeta. A resistência à cen-sura e às arbitrariedades da ditaduramilitar em um Estado de exceção. Amobilização pela anistia no fim dosanos 70, pelas Diretas Já e pela Cons-tituinte na década seguinte. A vexató-ria derrocada do primeiro presidenteeleito após a longa espera pela redemo-cratização do País.

São exemplos de capítulos da histó-ria brasileira escritos, no último sécu-lo, com a participação da AssociaçãoBrasileira de Imprensa (ABI), entidadeque nesta segunda-feira chega aos 100anos de atividades. E recebe homena-gens no Rio de Janeiro, onde desde1938 é sediada sob a marcante arqui-tetura do Edifício Herbert Moses, no nº71 da Rua Araújo Porto Alegre, noCentro da capital fluminense.

No Teatro Municipal, reunindo di-versas personalidades escolhidas paracompor a Comissão de Honra do Cen-tenário da ABI, a noite de hoje ganhaos sons da Orquestra Petrobras Sinfô-nica, apresentando uma releitura ja-zzística para obras de Villa-Lobos, e docantor e compositor Paulinho da Vio-la. Também hoje será lançado pelosCorreios um selo alusivo à data, trazen-do a imagem da sede da Associação,junto à de seu primeiro presidente, ocatarinense Gustavo de Lacerda.

As homenagens se estendem tam-bém ao jornalista Barbosa Lima Sobri-nho, Presidente da ABI em quatromandatos — o primeiro, iniciado em1926. Ícone representativo das idéiasnacionalistas e da importância do jor-nalismo para a democracia e a consci-ência política e social, Barbosa Lima So-brinho teve papel preponderante naderrocada do Governo do PresidenteFernando Collor de Mello, como res-

ponsável pelo pedido de abertura deimpeachment e primeiro orador inscri-to para defender o processo.

Enquanto a programação da ABIpromete se prolongar ao longo de todoo ano de seu centenário, com exposi-ções, seminários e atividades em vári-os Estados brasileiros, as homenagensneste 7 de abril, Dia do Jornalista, seespalham pelo País, incluindo o Ceará.

Em Fortaleza, às 9h, a efemeridadeserá marcada por uma solenidade noplenário da Assembléia Legislativa, so-licitada pelo presidente da casa, Depu-tado Domingos Filho (PMDB), a par-tir de proposta feita em conjunto pelaAssociação Cearense de Imprensa-ACI, pelo Sindicato dos JornalistasProfissionais no Estado do Ceará- Sin-dijorce, pelo Sindicato dos Trabalha-dores nas Indústrias Gráficas no Esta-do do Ceará-Sintgrace e pela Associ-ação Cearense das Emissoras de Rádioe Televisão-Acert.

”Desde a sua fundação até os nos-sos dias, a ABI nunca se afastou do seupapel principal, que é a defesa da liber-dade de expressão e dos direitos huma-nos. É com essa linha de atuação queela tem estado na vanguarda de gran-des acontecimentos do jornalismo e dahistória do Brasil como um todo”,afirma Ivonete Maia, recentementeeleita Presidente da Associação Cea-rense de Imprensa.

Destacando que a entidade procurarátrazer a Fortaleza os eventos concebidospela ABI para marcar o centenário, Ivo-nete ressalta o papel desempenhadopela instituição nacional quando a dita-dura militar que perdurou de 1964 a1985 impôs intensa perseguição a jor-nalistas e a vigência da censura prévia.

“Na ditadura, a ABI acolheu e assis-tiu muitos jornalistas perseguidos, fezcom muita coragem o que precisava serfeito em um momento como aquele,dando apoio e proteção àqueles que es-tavam sendo procurados”, enfatiza ajornalista cearense. Na manhã da últi-

ma sexta-feira, o Auditório Oscar Gua-nabarino, no 9º andar do edifício da ABI,recebeu a Comissão de Anistia do Mi-nistério da Justiça, para a primeira ses-são especial de julgamento de pedidosde indenização de perseguidos políticospelo critério de categorias específicas.

Com a presença do Ministro TarsoGenro, foram julgados e deferidos 20 pro-cessos relacionados a jornalistas. Confor-me destaca a ABI em seu site oficial, asmaiores indenizações foram concedidasaos cartunistas Jaguar (R$ 1.027.383,29)e Ziraldo (R$ 1.253.000,24).

Na ocasião, também foi lançada aCaravana da Anistia, iniciativa da Co-missão para itinerar até 2010 por todosos Estados brasileiros, chamando aten-ção para a questão da violação dos di-reitos humanos. A ocasião marcou ain-da uma homenagem aos jornalistasDavid Capistrano (desaparecido em1974) e Vladimir Herzog, morto apósser torturado em dependências do Doi-Codi, em São Paulo, em 1975.

Jornalismo e conscientizaçãoEm nota oficial assinada em conjun-

to com a Federação Nacional de Jorna-listas- Fenaj, o Sindicato dos Jornalis-tas Profissionais no Estado do Cearádestaca que o centenário da ABI mar-ca “a luta histórica dos jornalistas bra-sileiros pela liberdade de expressão,pela valorização e pelo reconhecimentode uma profissão que, como diria oeterno presidente da ABI, BarbosaLima Sobrinho, tem como principalcompromisso levar à população a cons-cientização política e social”. O sindi-cato ressalta a luta por “salários dignos,condições de trabalho, qualificação per-manente, respeito profissional e, sobre-

tudo, regras claras que balizem a rela-ção da imprensa com a sociedade”.

A Presidente do Sindijorce, DéborahLima, lembra o pioneirismo da ABI naorganização de uma entidade represen-tativa dos jornalistas brasileiros:

— Paralelamente ao Sindicato dosGráficos, que era classista e precedeu aorganização dos jornalistas, a ABI teveesse papel histórico, de reunir a catego-ria, iniciar a organização dos jornalistascomo classe — sublinha.—Mais tarde,com o Barbosa Lima Sobrinho, a enti-dade se volta pra valorização da profis-são e pra defesa da responsabilidadesocial do jornalismo como ferramentade conscientização do povo brasileiro.

Presidente da Associação das Emisso-ras de Rádio e Televisão do Ceará, o jor-nalista e radialista Edilmar Norões, dire-tor-geral de programação das TVs Diá-rio e Verdes Mares e colunista do Diáriodo Nordeste, enfatiza a batalha históricada ABI pela liberdade de expressão:

— Não se faz democracia forte semliberdade de expressão. Esse sempre foio grande objetivo da ABI, em momen-tos difíceis como a ditadura. Só se fa-zem entidades como a ABI lutando, ba-talhando, como ela faz, afirma.

Para Edilmar Norões as comemora-ções em torno dessa data são extrema-mente necessárias: — O papel da ABI aolongo desses 100 anos precisa ser mos-trado à nação — acrescenta Edilmar. —Hoje a imprensa tem mais transparên-cia, e o veículo que não refletir a verda-de vai responder perante seu público.Por mais que se possa ter uma críticaaqui ou acolá, são os jornais que trazemas grandes denúncias. Um presidente daRepública foi cassado graças à repercus-são dada pela imprensa. A ABI lutou poressa liberdade, cumpriu e cumpre comesse papel. E, daqui pra frente, mais éque tem condições de cumprir.

Uma instituição pioneiraCriada em 7 de abril de 1908, a ABI

tinha como objetivo assegurar direitosassistenciais à classe jornalística e tor-nar-se um centro de ação. Nas palavrasde seu fundador, Gustavo de Lacerda,a instituição deveria ser “um camponeutro em que se pudessem abrigartodos os trabalhadores da imprensa”.

O primeiro projeto de estatuto daentidade foi elaborado por Mário Gal-vão e Amorim Júnior, juntamente comLacerda. De acordo com o históricomantido pela ABI, a Associação deman-dou muita luta para se consolidar, comseus fundadores muitas vezes tratadoscomo indesejáveis, entre o descaso e ahostilidade.

Quanto à estrutura física, a entida-de passou por diversos espaços aluga-dos ou cedidos pelo Poder Público, atéconstruir sua sede, na década de 30, emum edifício que se tornaria marcantepara a arquitetura moderna brasileira,sob influência do suíço Le Corbusier. O7º andar do edifício foi palco de umatentado a bomba em 1976, quando aABI se destacava entre as entidades deresistência ao regime militar.

Na sua edição do dia 7 de abril, o jornal Diário do Nordeste, o princi-pal do Ceará, dedicou matéria de capa do Caderno 3 às comemoraçõesdo centenário da ABI. O texto lembra a atuação da ABI em diversos atosem defesa da democracia e dos interesses do País e constitui uma dasmuitas manifestações da comunidade cearense em homenagem à Casa,exaltada por destacadas instituições locais, entre as quais a AssembleiaLegislativa do Estado, que realizou sessão solene em homenagem à ABI.A convite da ABI, a jornalista Adísia Sá representou a Casa na soleni-dade. Adísia, integrante da Comissão de Honra do Centenário da ABI,foi a primeira mulher a presidir um sindicato de jornalistas no País, odo Ceará. A seguir, a matéria do Diário do Nordeste.

No Diário do Nordeste,uma página para o centenárioHomenagens à ABI reúnem o principal jornal do Ceará e destacadasinstituições, incluída a Assembléia Legislativa, que fez sessão especial.

Barbosa Lima Sobrinho é o ícone das idéiasnacionalistas, diz o Diário do Nordeste.

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19Jornal da ABI 329 Maio de 2008

Ottoni Fernandes Jr., Subchefe daSecretaria de Comunicação Social daPresidência da República, foi às lágrimasao discursar depois de entregar à ABI otroféu Personalidade da Comunicação,recebido pelo Vice-Presidente da entida-de e Presidente de sua Representação emSão Paulo, Audálio Dantas, na noite de14 de maio, no Centro de ConvençõesRebouças, na capital paulista. Ele recor-dava o alento que sentiram, no Rio, ospresos políticos do regime militar em 31de outubro de 1975, quando souberamque, em São Paulo, mais de 8 mil pesso-as haviam participado do ato ecumêni-co contra a tortura e em memória dojornalista Vladimir Herzog, assassinadonos porões da ditadura seis dias antes.

Emocionadas lembranças daquelestempos tenebrosos também estiveramnas falas do próprio Audálio e do jorna-lista e escritor Rodolfo Konder, que re-presentou o Presidente da ABI, Maurí-cio Azêdo, impossibilitado de compa-recer à solenidade em homenagem aocentenário da entidade. Afinal, ambosestiveram direta e ativamente envolvi-dos no episódio, o primeiro, então Pre-sidente do Sindicato dos Jornalistas deSão Paulo e o segundo, companheiro deprisão de Herzog.

A cerimônia fechou o primeiro dia do11º Congresso Brasileiro de Comunica-ção Corporativa, que a Mega Brasil Co-municação realizou até o dia 16, com aparticipação de mais de 500 profissionaisde todo o País. Integraram a mesa quepresidiu a solenidade, além de Audálio,Konder e Ottoni — este representandoo Ministro Franklin Martins —, BrunoCaetano, Secretário estadual de Comu-nicação de São Paulo — representandoo Governador José Serra —, e CíceroSandroni, Presidente da Academia Bra-sileira de Letras, além dos representan-tes dos patrocinadores, respectivamente,

do Prêmio e do Congresso: FernandoFreitas, assessor de Relações Institucio-nais da Telefonica no Brasil, e NemércioNogueira, Diretor de Assuntos Institu-cionais da Alcoa América Latina.

Primeiro a discursar, Sandroni cha-mou a atenção para a semelhança dastrajetórias da ABL e da ABI, que parti-lharam inclusive diversos de seus mem-bros (ele próprio milita em ambas),assim como os feitos da entidade jorna-lística, lembrando as pressões que estasofreu dos Governos de Artur Bernar-des, de Getúlio Vargas e da ditaduramilitar. Fernando Freitas enfatizou a im-portância da ABI para o País, pois sem-pre esteve na linha de frente da liberda-de de expressão e da construção da de-mocracia brasileira.

Ao receber o troféu em nome deMaurício Azêdo, Konder prestou-lheuma homenagem, recordando episódiosda época em que ambos trabalharam naextinta revista Realidade, no fim dosanos 1970, e do período em que os jor-nalistas foram muito perseguidos (um

Emoção na entrega do prêmioPersonalidade da Comunicação

Dirigentes da ABI são agraciados com prêmio no 11º Congresso de Comunicação,que reuniu em São Paulo mais de 500 profissionais de todo o País.

POR WILSON BARONCELLI

Ao agradecer o convite para oShow do Centenário,comemorativo dos cem anos daCasa, os Presidentes dosTribunais de Contas do Estadoda Bahia, Conselheiro ManoelFigueiredo Castro, e de Goiás,Conselheiro Edson Ferrari,exaltaram a atuação da ABI emdefesa da cidadania, dademocracia, da ética e dosdireitos humanos.

Manoel Castro lamentou nãoter podido participar do“imperdível acontecimentopatrocinado pela ABI, entidadeque durante os seus cem anos deexistência tem sido ardorosadefensora da cidadania, dademocracia e da ética, nãodescurando, em um só momento,dos ideais e princípios lançadosnos alicerces da sua fundação,posto que o convite somente foirecebido no dia 8 corrente, cujoatraso, certamente, se deu emrazão da greve dos funcionáriosdos Correios”.

Também Edson Ferrarilamentou “a oportunidadeperdida de assistir àprogramação artística do maisalto gabarito, além da prazerosacompanhia dos ilustresdirigentes dessa Associação e deseus convidados”. Disse ainda oPresidente do TCE de Goiás:

“Aproveito o ensejo paramanifestar a V. Sa. meu respeito eespecial admiração à AssociaçãoBrasileira de Imprensa, uma vezque, antes de ser Conselheiro doTribunal de Contas do meuEstado e de ocupar outros cargosna administração pública, fuijornalista, homem decomunicação.

Daqui, do coração do País,acompanhei com interesse aprestigiada e respeitada atuaçãoda Associação Brasileira deImprensa, abraçando, empatamar de igualdade com aOrdem dos Advogados do Brasile outras instituições nacionais, adefesa de bandeiras como ademocracia, a do Estado deDireito e dos direitos humanos.A ponto de se constituir no que éhoje, com todo o mérito, umadas maiores instituiçõesdemocráticas do País.”

Tribunais de Contasexaltam atuação daABI pela democracia

Cortes de Contas da Bahia ede Goiás destacam a ação daCasa em defesa da cidadania,

da democracia, da ética edos direitos humanos.deles o próprio Presiden-

te da ABI, preso e barba-ramente torturado). Mastambém brincou: — Eudeveria agradecer aos mi-litares, pois o meu exíliome permitiu conhecer oCanadá, um país maravi-lhoso.

Audálio Dantas come-çou seu discurso de agra-decimento também comuma homenagem, masao sempre repórter JoséHamilton Ribeiro, queestava presente à ceri-mônia e foi o primeiro areceber o prêmio conce-dido agora à ABI. Depois,falou sobre as lutas daentidade ao longo desseséculo de vida:

— Estes cem anos não se restringemà retórica da liberdade de imprensa, masa uma ativa e concreta participação naconstrução dos destinos do País.

Uma das principais, segundo ele, teveinício com Gustavo Lacerda, criador doestatuto que daria origem à ABI, queconseguiu aprovar no primeiro congres-so da categoria, em 1918, a idéia da cri-ação de uma escola de profissionais daimprensa, que se concretizaria apenasem 1948, com o surgimento da primeirafaculdade de Jornalismo do Brasil, aCásper Líbero. Por fim, Audálio agrade-ceu o trabalho do Conselho Consultivoda ABI em São Paulo e homenageouVladimir Herzog, afirmando que “suamorte nos fez repensar e refletir sobrea situação do País da época”.

Além de se emocionar com as lem-branças daquele período, Ottoni Fer-nandes enfatizou a importância dopapel da Associação e sentenciou:

— Feliz é o país que tem uma entida-de como a ABI, que sempre prezou pelaliberdade de expressão e de opinião.

Os cem anos da ABI ganharam edição especial do infor-mativo eletrônico Jornalistas & Cia., que assinalou em edi-torial que “a epopéia do jornalismo brasileiro, que comple-ta 200 anos de vida em 2008, divide com o centenário da ABIas atenções de quem vê no exercício dessa profissão uma dasportas de entrada para a cidadania, na plenitude do termo”.

Em artigo escrito especialmente para essa edição, o PresidenteLuiz Inácio Lula da Silva diz que “os cem anos da AssociaçãoBrasileira de Imprensa são cem anos de luta pela liberdade de ex-pressão no País. E a luta pela liberdade de expressão é a luta pelaprópria democracia no Brasil”. Para ele, a democracia de umEstado só se consolida e se fortalece quando a imprensa é livre

Edição de Jornalistas & Cia. publica artigo de Lula sobre a ABI e seus 100 anos“e a ABI, ao longo de um século, tem-se portado como a guar-diã dos princípios mais altos da democracia, da liberdade de ex-pressão e do jornalismo independente, crítico e apartidário”.

A edição do Jornalistas & Cia. contém também uma en-trevista com o Presidente da ABI, Maurício Azedo, na qualele fala sobre o empenho da entidade em questões como li-berdade de imprensa, direito de acesso às fontes de informa-ção e direitos humanos. Sobre o legado da entidade para atrajetória do jornalismo brasileiro, ele diz que “a ABI intro-duziu um elemento novo no mundo do trabalho: uma as-sociação de trabalhadores, uma organização de classe paradefender os direitos da profissão”.

Rodolfo Konder, representando o Presidente da ABI, e AudálioDantas recebem o troféu Personalidade da Comunicação.

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20 Jornal da ABI 329 Maio de 2008

Ao iniciar a entrevista, Jô Soares in-dagou de Maurício se sempre preten-deu ser jornalista. Maurício revelou queseu objetivo era ser advogado, porémno terceiro ano do curso de Direito en-veredou para a área de jornalismo. Nofim do curso, trabalhava em quatro lu-gares — numa associação de assistên-cia à agricultura, no antigo IAPI (Ins-tituto de Aposentadoria e Pensões dosIndustriários), no Jornal do Commercioe no Diário Carioca – nos quais ganha-va mais do que perceberia se começassea trabalhar na advocacia, partindo doponto zero.

Jô Soares fez perguntas também so-bre as transformações sofridas pelo jor-nalismo ao longo dos 50 anos de ativi-dade profissional de Maurício, como odesaparecimento das edições vesperti-nas que os jornais mantinham. Mau-rício localizou o começo desse proces-so no início dos anos 70, quando os jor-nais foram retardando os horários defechamento e acabaram ocupando coma primeira edição o espaço que seria daedição vespertina.

Sobre o período da repressão, o Pre-sidente da Casa recordou as inúmerasvezes em que foi preso, a primeira vezem 1954, antes da morte de Getúlio,durante as agitações estudantis queentão ocorriam As sessões de torturapelas quais passou, objeto de pergun-tas de Jô, foram comparadas a “verda-deiras cerimônias diabólicas”, como sedeu com as sessões de suplício na “ca-deira do dragão”, em que o preso, en-capuzado, era atado a uma cadeiracomo as de um salão de barbeiro, com

os braços revestidos de me-tal, e submetido a choqueselétricos, que se repetiam àmedida que os torturadoresconsideravam insuficientesas respostas assim arranca-das. Do ritual de torturasfazia parte o recolhimentodo preso a uma cela de ummetro quadrado, se tanto,com ar-refrigerado ligado atoda força e a estridência deum ruído comparável ao dovolume do conjunto de mo-tores de veículos quando atra-vessam um túnel urbano. Ochão era revestido de umapasta pegajosa, para impedirque, apesar da fadiga de diase dias de intermináveis inter-rogatórios, o preso sentisseinsuperável desconforto aotentar se deitar. “Foi umadescida ao inferno”, disseMaurício.

No telão do programa, foiexibido um anúncio de 30segundos feito pela agênciaÁfrica, do publicitário Ni-zan Guanaes, com reflexões sobre a im-portância da vírgula no texto impres-so ou falado: o significado da mensa-gem pode ser radicalmente alterado de-pendendo da posição em que a vírgu-la é localizada. O texto foi aplaudidopela platéia, assim como seus criado-res, publicitários Fábio Seidl e BrunoBrasil, presentes à gravação do progra-ma. Convidados a se levantar por Jô,Fábio e Bruno foram aplaudidos inten-

A PLATÉIA DE JÔ APLAUDE O CENTENÁRIOUma entrevista com o Presidente da ABI, no dia 13 de maio, ensejou aplausos ao centenário da Casa pela numerosa platéia do Programa do Jô,

em que Jô Soares entrevistou Maurício Azêdo, que respondeu a perguntas tanto sobre a ABI como sobre sua trajetória pessoal e profissional.

samente pela assistência, composta so-bretudo por jovens – como eles dois.

Jô Soares lembrou a atuação da ABInos protestos contra o assassinato dojornalista Tim Lopes e destacou o pa-pel da entidade na luta pela apuraçãode importantes fatos de interesse da so-ciedade. A trajetória de Herbert Mosesfoi ressaltada como sinônimo da Asso-ciação, especialmente por seus esforçosna construção da sede da entidade.

Foram também projetadas no telãodo programa fotos de Maurício Azêdoao lado de destacados associados daABI, como Austregésilo de Athayde,Ancelmo Góis, Carlos Drummond deAndrade, Barbosa Lima Sobrinho, o ca-ricaturista Álvarus e Fernando Segis-mundo, entre outros.

A íntegra da entrevista está no Clip na Web do Siteda ABI (www.abi.org.br).

O centenário da ABI foi homenage-ado no dia 19 de maio em sessão ple-nária do Conselho Federal da OAB, emBrasília. A mesa de honra reuniu os Pre-sidentes da ABI, Maurício Azêdo; daOAB, Cezar Britto, e do Instituto dosAdvogados Brasileiros-IAB, Paulo Sa-bóia; os ex-Presidentes da Ordem Mar-celo Lavénère, Mário Sérgio Duarte Gar-cia, Ernando Uchoa Lima e Reginaldo deCastro; a Secretária-Geral da OAB, CléaCarpi da Rocha; e a ex-Presidente do IABMaria Adélia Campello.

A cerimônia contou ainda com aparticipação de Vladimir Rossi Lou-renço, Vice-Presidente do ConselhoFederal da OAB; do Diretor Ophir Ca-valcante Júnior; de Márcio Thomaz

Homenagem à ABI na Plenária da OAB federalO Presidente Cézar Britto ressalta a colaboração entre as duas instituições desde os anos 30, quando a Ordem dos Advogados foi fundada.

Bastos e Roberto Busato, membroshonorários vitalícios da Ordem; e Pau-lo Bonavides e Fábio Konder Compa-rato, ambos detentores da MedalhaRui Barbosa da OAB.

O Presidente nacional da Ordem dosAdvogados do Brasil, Cezar Britto,saudou a ABI e a OAB como institui-ções parceiras desde a década de 30,quando a Ordem foi fundada.

— Ambas partilharam lutas históri-cas que marcaram os últimos cem anosno País, sobretudo aquelas voltadaspara o restabelecimento e o aprimora-mento da democracia no Brasil apósduas ditaduras — Estado Novo e regi-me militar de 64 —, e têm em comuma sede de justiça.

gem, Lavénère destacou “o conjunto desentimentos e interesses comuns e amal-gamados das duas entidades”: — Nossasprofissões têm em comum o amor àindependência, a língua ferina, a inca-pacidade de aceitar injustiças e a deter-minação em não se quedar perante ospoderosos.

Lavénère citou ainda a parceria coma Conferência Nacional dos Bispos doBrasil-CNBB, “que forma, ao lado daABI e da OAB, um tripé em que seapoiou a sociedade civil”.

Ao fim da homenagem, Cezar Brit-to disse esperar que a parceria entre asduas instituições “perdure eternamen-te, pela sua importância para a demo-cracia e para o País”.

O Presidente da ABI ressaltou que ascampanhas travadas pelas duas entida-des pela convocação das AssembléiasConstituintes de 1946 e de 1986-87ajudaram a restaurar a ordem democrá-tica no País. Lembrou também comosímbolos de união das duas entidadesas lutas pela anistia na segunda meta-de dos anos 70, pelas eleições diretas em1983-1984 e pelo impeachment deFernando Collor de Mello. O pedido deabertura do processo contra Collor foiassinado por Barbosa Lima Sobrinho epor Marcelo Lavénère, então à frenteda ABI e da OAB, respectivamente.

Sentimentos comunsDesignado orador oficial da homena-

Jô Soares entrevista o Presidente da ABI: na pauta as transformações da imprensa.

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21Jornal da ABI 329 Maio de 2008

O Senador Eduardo Suplicy apresen-tava o documentário sobre sua viagemao Iraque para divulgar a proposta derenda básica de cidadania. No filme,um Ministro iraquiano pergunta se oprograma foi adotado no Brasil. Suplicyresponde “Ainda não, vai ser implanta-do em etapas.” Presente à exibição,outro Senador, Heráclito Fortes, nãoperdeu a oportunidade da piada: “A pri-meira etapa foi o cartão corporativo.”A viagem de Suplicy aconteceu em ja-neiro e a exibição do documentário,algumas semanas depois. Estávamosno auge da chamada crise do subprime(os empréstimos imobiliários sem las-tro adequado nos Estados Unidos),com as bolsas despencando no mundotodo e o Presidente Bush liberandomuitos bilhões de dólares para acalmaros mercados. Aqui, a Bovespa tambémdespencava e o escândalo da hora erao uso abusivo dos cartões corporativospor ministros e funcionários.

O chiste de Fortes pode ir para aconta do sarcasmo instintivo que podeacometer qualquer um. Afinal, a bolaestava quicando na frente do gol e oSenador da oposição não ia deixar pas-sar a oportunidade de provocar o colegapetista. Mas a verdade é que a cruza-da de Suplicy pelo programa de rendabásica não é levada a sério nem mesmopor lideranças do PT e do Governo. Aimprensa, quando dá espaço ao tema,quase sempre endossa o tom de des-crença e de ironiaque a idéia evoca,talvez por ignorân-cia ou porque ela res-soe generosidade, es-perança e utopia. Édisso mesmo que setrata. E ninguém parece a fim de dartrela a essas coisas tão fora de moda. Eo Senador Suplicy, embora bem robus-to, fica com ares de Dom Quixotequando defende a proposta.

A renda básica de cidadania, ou ren-da mínima, ou salário social é um di-reito que muitas pessoas, em todo omundo e há muito tempo, propõemnão só como remédio para os males dainjustiça social, mas também para amórbida exuberância irracional do sis-tema econômico global, com sua suces-são de crises e ameaças a tudo e a to-dos no planeta. Consiste em assegurara cada pessoa uma renda suficientepara atender às necessidades básicas,de forma incondicional e universal, ouseja, independentemente de idade,sexo, instrução, nível de renda ou de elaestar ou não trabalhando. Isso mesmo:um direito dos pobres e também dosricos, dos desempregados e dos quetrabalham. Esse direito existe há alguns

PROPOSTA

A cruzada do Quixote SuplicyPOR ALTAMIR TOJAL

anos no Estado norte-americano doAlasca. E — em formas mais restritase condicionadas de transferências dire-tas de renda aos mais pobres — come-ça a ser posto em prática em muitospaíses. Aqui, o Bolsa-Família pode serconsiderado um embrião de um progra-ma de renda básica, uma etapa impor-tante, que deve transcender interessesde partidos e governos.

A proposta consta — com diferen-tes formulações e mesmo propósitoscontraditórios — tanto de receituári-os de radicais comunistas como de re-formistas liberais. Professor de Econo-mia, o Senador Suplicy reúne, entre osque trouxeram fundamentos para aidéia, um time de pensadores pesos-pesados das mais diferentes tendênci-as, desde Thomas More, Karl Marx,Thomas Paine e Charles Fourier, pas-sando por Stuart Mill e Bertrand Rus-sel, até Paul Samuelson, Milton Fried-man, James Tobin e Antonio Negri.

cados financeiros e de câmbio ou inves-tindo em países com salários mais bai-xos. Em outras palavras, quanto maisaumenta a capacidade de produzir egerar riqueza, menos o capitalismo de-pende do trabalho e do próprio capital.E a riqueza, representada pelo dinhei-ro, transforma-se cada vez mais emameaça e não em solução para os desa-fios da vida. Esse drama, com vocaçãode tragédia, decorre da insistência empadrões de distribuição de riqueza fun-cionais para um sistema produtivo debase industrial e presos ao tempo detrabalho como referencial de valor, nomomento em que a reprodução do ca-pital depende mais do conhecimento doque das fábricas. A esse respeito, Gorzcita a terrível profecia do Prêmio NobelWassily Leontieff: “Quando a criação deriqueza não depender mais do trabalhodos homens, eles morrerão de fome àsportas do Paraíso, a menos que se esta-beleça uma nova política de renda cor-respondente à nova situação técnica.”

Portanto, o Senador Suplicy talveznão seja tão quixotesco. Não só por-que está na boa companhia de pensa-dores postos à prova em desafios deverdade, mas também porque gentetida como muito pragmática acaba sevendo forçada a endossar a sua causa,embora a contragosto e de forma fur-tiva e enviesada. Para amenizar o ar-rasador efeito econômico sobre a eco-nomia norte-americana (e do mundo)que a crise dos empréstimos subprimeprovocou, o remédio que o Presidente

Bush arranjou paraacalmar “os merca-dos” — essa entida-de suprema da eco-nomia pós-moderna— foi exatamentemandar cheques

para as casas de milhões de norte-ame-ricanos. Aliás, a mesma receita usadaem 2001, na crise das Torres Gêmeas.Do jeito que as crises se tornam fre-qüentes (já se fala na Bolha Chinesa),pode ser que a prática de mandar che-ques para as pessoas também vire ro-tina e se espalhe pelo mundo.

E o Iraque com isso? Quando o Pre-sidente Bush esteve em Brasília, em2005, o incansável Suplicy não perdeua oportunidade de vender seu peixe,citando o exemplo do Alasca. Bush res-pondeu: “No Alasca, eles têm muitopetróleo.” E Suplicy insistiu: “Mas po-demos ter a renda básica a partir detodas as formas de riqueza que são cri-adas.” E sugeriu que o Iraque — onde opetróleo foi transformado numa peste— seguisse o exemplo do Alasca comoforma de chegar à paz. Por que não?

Altamir Tojal, jornalista especializado em Economia,é sócio da ABI.

Outro que se junta a esses é AndréGorz, que, morto no ano passado, temsido mais comentado no Brasil nasúltimas semanas graças à recente edi-ção aqui, este ano, de sua bela Carta aD. (Cosac Naify).

Gorz, estudioso das mutações docapitalismo contemporâneo, aproxi-mou os temas da renda básica e dassucessivas crises financeiras globais nolivro Misérias do presente, riqueza dopossível, publicado na França em 1997e aqui em 2004 (Annablume). Graças aofantástico desenvolvimento técnico-científico, se produz atualmente umcrescente volume de riquezas com usodecrescente de capital e trabalho. Gorzobserva que, em conseqüência, a produ-ção remunera uma quantidade cada vezmenor de ativos produtivos e de traba-lho. Isso, por um lado, gera mais desem-prego e pobreza e, por outro, estimulao capital a se reproduzir sem a media-ção do trabalho, em operações nos mer-

A verdade é que a cruzada de Suplicy pelo programa de renda básica não é levada asério nem mesmo por lideranças do PT e do Governo. A imprensa, quando dá espaço

ao tema, quase sempre endossa o tom de descrença e de ironia que a idéia evoca.

JOSÉ C

RU

Z/ABR

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24 Jornal da ABI 329 Maio de 2008

chefe da revista Tendência. Mais tarde,já no Jornal do Brasil, fui editor de umsuplemento de livros e cronista, antesde assumir o Informe JB, no lugar de ElioGaspari. Na campanha das Diretas Já,passei para a Útima Hora, para assinara coluna Ponto de vista, em prol das elei-ções. Também fiz o semanário O País emuito freelance. Por fim, tive duas pas-sagens no Jornal do Commercio. Na pri-meira, na gestão de Nilo Dante, em 1995e 1996. Depois voltei em 2001, para serDiretor-adjunto, e sai em 2003, paraescrever o livro sobre o próprio jornal.

Jornal da ABI — O que o fez querer serjornalista?

Sandroni — O salário. Fiz Jornalis-mo na Puc e cursei também a Ebape,mas queria casar e precisava de umsalário. Meu primeiro emprego foi noCorreio da Manhã. Eu era um leitorávido de jornais, incluindo não sómatutinos, mas também os vesperti-nos. E tinha um grande desejo de co-nhecer bem os problemas brasileiros.Era para isso que eu fazia o Ebape, umcurso de Ciências Sociais voltado paraos problemas brasileiros.

Jornal da ABI — E como as redaçõesse envolvem nisso?

Sandroni — Eu tinha a certeza de quepara compreender os problemas brasi-leiros não havia melhor alternativa que

Jornal da ABI — Como tudo começou?Cícero Sandroni — Como todo foca

em minha época, o início ocorreu semsalário e foi na Tribuna da Imprensa, deCarlos Lacerda. Na época, havia lá gran-des nomes, como Newton Carlos, Nil-son Viana, Hermano Alves, gente queteve papel no crescimento da impren-sa brasileira. Mais tarde, trabalhei como José Guimarães, que fez o primeirosuplemento cultural da imprensa bra-sileira, e com profissionais como LuizAlberto Bahia, Antônio Callado e JoséCondé, na minha primeira passagempelo Correio da Manhã. No Globo, tiveo prazer de trabalhar com Alves Pinhei-ro, grande chefe de Reportagem. Lá fizcobertura do Itamaraty e matérias noexterior e tornei-me repórter políticoaté 61, quando fui para Brasília.

Jornal da ABI — Sua temporada emBrasília foi também dinâmica?

Sandroni — Lá eu trabalhei com oPrefeito Paulo de Tarso dos Santos, quetinha também a Fundação Cultura deBrasília, onde atuava o Ferreira Gullar.Depois do Governo Jânio, fui para OCruzeiro e em 1965, voltei ao Correio deManhã, onde estreei a coluna Quatrocantos, de oposição ao regime militar.Quando o jornal foi vendido, eu o dei-xei. Depois do AI-5, acabou o jornalis-mo político no Brasil. Então, mudei-mepara a Bloch Editores, onde fui redator-

DEPOIMENTO

CÍCERO SANDRONI

A intimidadecom as letras

Atual Presidente da ABL, Sandroni escolheu o jornalismo para ter um salário e discutir problemas brasileiros.O domínio do idioma o levou a repórter e colunista político e a escrever livros, inclusive sobre jornais.

POR VAGNER RICARDO

jornalismo e a literatura são duas paixões à prova dotempo para Cícero Sandroni, atual Presidente da Aca-demia Brasileira de Letras (ABL). Estagiário sem sa-lário no início da carreira na Tribuna da Imprensa, di-rigida pelo polêmico Carlos Lacerda em 1955, passoupara o Correio da Manhã na seqüência e retornou aos

dois jornais mais tarde: no primeiro, já sob a direção de Hélio Fer-nandes; no segundo, como titular da coluna política Quatro can-

tos, com a qual conquistou admiradores e adversários nos anos dechumbo, com sua posição firme contra o regime militar.

A intimidade com as “pretinhas” (como se dizia nos tempos damáquina de escrever) e o curso de Ciências Sociais (além de Jor-nalismo na Pontifícia Universidade Católica do Rio, Sandroni cur-sou a Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas-Eba-pe, da Fundação Getúlio Vargas) obrigaram o jornalista a “refugi-ar-se” nas redações para discutir os grandes problemas nacionais:

— Eu tinha a certeza de que, para compreender os problemas,não havia melhor alternativa que essa. E isso de certa forma ocorreuporque eu encontrei nos jornais as pessoas que tinham uma visãomuito profunda do País — explica.

O curioso é que transformar essa busca em carreira foi escolhapragmática: Sandroni abraçou o jornalismo porque precisava deum salário justo para casar – mas isso já é outra história. Hoje, en-quanto se encarrega de cuidar da administração da ABL (“mais umavez sem salário”, brinca), ele mantém os olhos voltados para o jor-nalismo, atividade a que pretende voltar depois do término de suagestão na Academia, “se houver convites”. Autor de oito livros, oex-colunista político faz planos também de escrever novas obras.

O

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“Ditado francês diz

que o jornalismo

leva a tudo, mas você

tem de sair dele.

Isso não funciona

comigo, que me sinto

jornalista mesmo como

Presidente da ABL.”

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* Matéria publicada no Site da ABI em 20 demarço de 2008. No dia 3 de abril a AcademiaBrasileira de Letras realizou a homenagem aocentenário da ABI referida por Sandroni, conformeregistramos nesta edição.

as redações de jornais. E isso de certaforma ocorreu porque encontrei nasredações as pessoas que tinham umavisão muito profunda do País. Não querdizer que hoje elas não existam, masnaquela época as chamadas “enciclopé-dias ambulantes” eram mais numero-sas, como Jayme Magrassi de Sá. O jor-nalismo oferece isso ao homem. Há umditado francês que diz que o jornalismoleva a tudo, mas você tem de sair dele.Isso, na verdade, não funciona comigo,que me sinto jornalista mesmo comoPresidente da ABL. E espero, assim quedeixar essa cadeira, voltar ao jornalismo,se o jornalismo me quiser.

Jornal da ABI — Em seu início deprofissão, o senhor concorda em queconviveu com extremos na carreira, daliberdade de expressão à censura?

Sandroni — Comecei no jornalismona época de euforia de Juscelino Kubits-chek. Em 1960, era repórter de fato e,naquele momento, havia completa eabsoluta liberdade de imprensa noBrasil. Você tinha a percepção de desen-volvimento da imprensa muito gran-de. Tínhamos contato com correspon-dentes estrangeiros. Tanto que nessaépoca ocorreu a criação do Clube deCorrespondentes Estrangeiros e umintenso intercâmbio de idéias emtrejornalistas brasileiros e estrangeiros,salvo aqueles do Leste Europeu. O jor-nalismo passava por um momento deprofissionalização que não tinha nosanos anteriores. A geração que fez oDiário Carioca, o Jornal do Brasil, OGlobo e o Correio da Manhã nos anos 50e 60 era a primeira que tinha empregopúblico e trabalhava em jornais paraganhar um dinheiro extra.

Jornal da ABI — O senhor concordaem que o jornalismo dos anos 50 era gue-to de partidos políticos?

Sandroni — Não concordo com apalavra “gueto”. Havia jornais composições definidas, mas não partidári-as. Eram posições políticas definidas.

Jornal da ABI — O jornalismo mudou?Sandroni — Mudaram as pessoas, só

isso. Quer dizer, o jornalismo, desde ocomeço, mudou um pouco o estilo.Como diz o Millôr Fernandez sobresexo, desde o pecado original só mudoudo original o estilo de cada um.

Jornal da ABI — O senhor concordaem que aumentou o nível da profissiona-lização?

Sandroni — Sim, o jornalismo tor-nou-se mais profissional. Hoje são rarosos jornalistas que têm outra profissão,como ocorria antigamente. Os veículosprecisam informar bem seu público e,para isso, precisam também da dedica-ção integral de seus profissionais. Des-

sa forma, se não for uma empresa for-te, não oferecerá bom jornalismo.

Jornal da ABI — E sua chegada àAcademia Brasileira de Letras, comoocorreu?

Sandroni — Estou na Academiamais pela bondade dos acadêmicos queme elegeram. Com o tempo, fui indi-cado para a Tesouraria, trabalhei na Se-cretaria-Geral e agora estou na Presi-dência. Vale lembrar que esses cargosde Diretoria na ABL são funções de tra-balho voluntário. Não recebemos porisso. É um trabalho fascinante, umdesafio diário, e também um grandeprazer e um grande júbilo, ao terminaro dia, ver que cumpri o meu dever. Semcontar que é uma honra que jamaisimaginei, a de substituir personalida-des tão brilhantes como os últimospresidentes da ABL, notadamente oMinistro Marcos Vinicios Vilaça, aquem servi como Secretário-Geral.

Jornal da ABI — O senhor tem ditoque 2008 é um ano de efemérides na ABL

Sandroni — Sim, e mais importan-te é lembrar o centenário de morte deMachado de Assis, o primeiro Presiden-te da ABL e um de seus fundadores.Esse centenário será comemorado comuma série de eventos, como conferên-cias, seminários e concertos de músi-cas dos temposmachadianos.Vamos repetir oClube Beethoven,que reunia escri-tores e jornalistas.Além disso, esta-mos publicandovários livros quetêm relação como autor, como umDicionário Ma-chado de Assis, acargo de UbiratanMachado; a reu-nião da correspon-dência de Macha-do, sob orientação do acadêmico SergioPaulo Rouanet; e uma obra dedicada aoléxico, o “Índice vocabular de Macha-do de Assis”.

Jornal da ABI — E os outros even-tos importantes de 2008 na ABL?

Sandroni — Lembramos os 400 anosde nascimento do Padre Antônio Vieira,um dos consolidadores do portuguêsescrito no Brasil e em Portugal; teremosquatro conferências sobre a chegada daFamília Real ao País e também concer-tos de música da época do Padre JoséMaurício Nunes Garcia, grande com-positor do século XIX. Temos o cente-nário de Guimarães Rosa. E vamosrecordar os cem anos de morte de Ar-tur Azevedo com algumas leituras dra-

máticas. Não esqueçamos os cem anosde nascimento de Otávio Faria e os 120de Álvaro Moreira. A Academia é hojeum centro de produção de saber e cul-tura: realiza eventos, edita livros e estána internet, com transmissão dos even-tos online.

Jornal da ABI — A ABL fará* umasolenidade pelo centenário da ABItambém...

Sandroni — Vamos comemorar oscem anos da ABI com mesa-redondaaqui na ABL. O evento ocorrerá noSalão Nobre da Academia, dia 3 deabril, e contará com a participação dejornalistas e acadêmicos. Instituiçãoimportantíssima, a ABI é e sempre seráaquilo que os jornalistas fizerem dela.Ela será tão melhor quanto mais jorna-listas participarem dela. A Associaçãocresce e se fortalece se tem o apoio dosprofissionais de todo o Brasil.

Jornal da ABI — O senhor tem oitolivros publicados, entre romances,como O peixe de Amarna, um perfil deCarlos Heitor Cony e a história doJornal do Commercio, o mais recente. Háplanos de escrever outros livros sobreperiódicos nacionais?

Sandroni — Trabalhei no Jornal doCommercio e comecei a estudar sua his-tória por acaso — na época estava en-

volvido com umverbete para o Di-cionário Históri-co-Bibliográficode 1930 aos diasatuais, solicitadopela Fundação Ge-túlio Vargas. Aoiniciar as pesqui-sas, apaixonei-mepela história dojornal e formei umgrupo, com trêsauxiliares, para meaprofundar mais.O livro saiu noano passado e, a

partir dele, tenho projetos de escreveroutros dois. Um é uma leitura do Jor-nal do Commercio sob o comando de SanTiago Dantas, ou seja, entre 1957 e1959, quando ele vendeu o jornal. Ofoco da pesquisa são os editoriais queele escreveu e a idéia é relacioná-los eperfilar o pensamento do autor, quetinha visão muito clara sobre os proble-mas brasileiros e suas soluções — quenão teve tempo de pôr em prática de-vido a um câncer devastador.

Jornal da ABI — E o segundo livro?Sandroni — O outro projeto é uma

biografia de José Carlos Rodrigues, quecomprou o Jornal de Commercio em1890, depois da Proclamação da Repú-blica. O antecessor de Rodrigues era

monarquista e o jornal passava poruma fase difícil, quando Rodrigues eraseu colaborador, em Londres. Em 25anos, ele transformou radicalmente apublicação. Eu precisaria de 24 horas amais por dia para terminar meus pro-jetos literários. Outro, de ficção, é umanovela chamada Morrer em Casablan-ca, que tem como subtítulo A históriado homem que nasceu no dia em que oBrasil perdeu a Copa (a de 50). E há olivro Batman não foi a Búzios. Se eu ti-ver tempo e saúde para terminar isso,lanço no meu tempo de vida.

Jornal da ABI — A ABI é também si-nônimo de Barbosa Lima Sobrinho,com quem o senhor teve um contatomuito intenso.

Sandroni — O primeiro foi quandoele completou 80 anos. Fui encarrega-do pela revista Status para fazer umperfil do Dr. Barbosa em 1977. Já o co-nhecia, mas pouco. A Status era da Edi-tora Três e tentava concorrer com asrevistas masculinas que, comparadas aoque se faz hoje, seriam publicações paraadolescentes. Quando um neto dele oquestionou sobre o fato de falar parauma revista em que apareciam mulhe-res em trajes sumários, Barbosa respon-deu que a qualquer veículo que lhe fi-zesse um pedido de entrevista ele con-cedia, porque tinha uma mensagem atransmitir. A partir daí, ele me convi-dou para o Conselho da ABI, onde fi-quei quase 30 anos, sempre próximodele. Depois, integrei a Diretoria, fuiSecretário-Geral e Presidente do Con-selho da Associação, após sua morte.

Tive no Dr. Barbosa um mestre,uma pessoa com quem a conversa erasempre proveitosa. Ele tinha uma in-crível capacidade de ouvir e tambémde convencer os que discordavam delesem se exaltar. Sempre dizia ser naci-onalista, sem ser xenófobo. Se os ca-pitais estrangeiros vierem para ajudara economia nacional, ajudar os brasi-leiros, não tenho nada contra, dizia.Mas se for capital gafalhoto, dispos-to apenas a pegar juros e depois ir em-bora... Tenho grande honra de ocupara cadeira que um dia foi dele na ABL.Quando ele faleceu, alguns acadêmi-cos sugeriram que eu me candidatas-se, mas eu sempre disse que não tinhaa estatura intelectual para substituí-lo. Tanto que, quando o Dr. Raimun-do Faoro se candidatou, achei umaexcelente solução. E foi de lá da ABIque surgiu o documento pedindo acassação do Presidente Collor, proces-so de que participei de uma formaquase irrelevante, mas até o fim.

“O jornalismo tornou-se mais profissional, com tempo integral. Hoje, sãoraros os jornalistas que têm outra profissão, como ocorria antigamente.”

CÍCERO SANDRONI A INTIMIDADE COM AS LETRAS

“Tive no Dr. Barbosaum mestre, uma

pessoa com quem aconversa era sempre

proveitosa e quetinha incrível

capacidade de ouvire de convencer.”

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27Jornal da ABI 329 Maio de 2008

A eleição para um terço do Conse-lho Deliberativo e para a totalidade doConselho Fiscal da ABI, realizada no dia25 de abril, apresentou um quórumemblemático, coincidente com a come-moração que a entidade faz desde oprimeiro dia do mês: comparecerampara votar exatamente cem associa-dos. Foi esse o mais baixo quórum re-gistrado nas eleições da Casa do Jorna-lista nos últimos anos:

– Infelizmente – disse o Presidente daABI, Maurício Azêdo –, a correspondên-cia que expedimos para o quadro soci-al chegou muito em cima do dia da elei-ção, o que prejudicou enormemente afreqüência dos associados. A semana daeleição teve dois feriados, um em cimado outro, nos dias 21 e 23, e um enfor-camento do expediente, no dia 22, o queretardou demais o envio da comunica-ção aos sócios acerca tanto da data davotação como, na véspera, da sessão daAssembléia-Geral de apresentação doRelatório da Diretoria e das Contas deGestão do Exercício Social 2007-2008.

O Presidente da ABI lembrou queoutro fator negativo foi o trauma cau-

bém o associado Kepler Alves Borges,igualmente de 84 anos e sócio da ABIhá 61, atendeu à convocação eleitoral:mesmo caminhando com dificuldadee apoiando-se numa bengala, ele com-pareceu para votar no fim da tarde.Sócio remido, ele não se considera de-sobrigado da obrigação de votar nemabre mão desse direito. Entre os primei-ros presentes à votação, iniciada às 10h,estava o ex-Senador Bernardo Cabral,relator-geral da Constituinte, que,atendendo a convite da atual Direto-ria, se reintegrou à Casa, na qual ingres-sou nos anos 60, quando exercia o jor-nalismo. Foi esta a primeira vez em quevotou após seu retorno à ABI.

Encabeçada pelo Presidente da ABI,a Chapa Prudente de Moraes, neto foiintegrada pelos jornalistas Alberto Di-nes, Antônio Carlos Austregésilo deAthayde, Arthur José Poerner, CarlosArthur Pitombeira, Dácio Malta, ElyMoreira, Fernando Barbosa Lima, LedaAcquarone, Mílton Coelho da Graça,Pinheiro Júnior, Ricardo Kotscho, Ro-dolfo Konder, Tarcísio Holanda e Villas-Bôas Corrêa, que concorreram a mem-

Aconteceu na ABIAconteceu na ABI

Quórum emblemático, prejudicado pela sucessão de feriados e falta de comunicação aos sócios.

100 ELEITORESN O C E N T E N Á R I O ,

Quarenta jogadores de Xadrez doprimeiro time no ranking do Rio, comoArthur Cruz e os mestres na categoriaFide Ricardo Teixeira e Sadi Dumont,participaram em 12 de abril no Salão deEstar do Edifício Herbert Moses do Tor-neio de Xadrez do Centenário da ABI,organizado pela Federação de Xadrez doEstado do Rio de Janeiro e patrocinadopela Diretoria de Cultura e Lazer daCasa. Da primeira à terceira colocação naClasse A foram vencedores EduardoThelío Limp, Alexandre Campos e Wag-ner Peixoto. Leonardo Mano foi o primei-ro colocado na Classe B.

Outro destaque, na opinião da comis-são organizadora, foi a participação deLucas Peixoto, de nove anos, que foicampeão brasileiro em torneio escolarcom apenas seis anos e já é consideradouma das maiores promessas do xadreznacional. Seu pai, Wagner, não escondeo orgulho: — O xadrez entrou na vida doLucas de forma natural. Ele me via che-

sado pelo falecimento, na semana an-terior, do jornalista Arthur Cantalice,que teve um infarto fulminante quan-do discursava na sessão do ConselhoDeliberativo da ABI, no dia 15. A reu-nião foi suspensa para ser reiniciadasomente dois dias depois, após o sepul-tamento de Cantalice, um dia antes:

— A rotina administrativa da ABIfoi muito afetada por todos esses fato-res, que dificultaram a comunicaçãoaos sócios. Isto sem contar que estavainscrita na eleição apenas uma chapa,a Prudente de Moraes, o que desesti-mula o comparecimento dos eleitores,que sabem que a eleição já está decidi-da. Na próxima vamos planejar melhoro envio da comunicação aos sócios —disse Maurício.

Quando informados, os eleitoresresponderam à convocação para com-parecer à votação. O associado UlyssesLonzetti, de 84 anos e sócio da ABI há61, foi o terceiro a votar, nas primeirashoras da manhã, e exibiu com orgulhosua fidelidade à Casa: salvo quando nãose encontrava no Brasil, nunca deixoude comparecer às eleições na ABI. Tam-

bros efetivos do Conselho Deliberativo.Para suplentes foram eleitos os asso-

ciados Alcyr Cavalcanti, Edgar Catoira,Francisco Paula Freitas, Francisco Pedrodo Coutto, Itamar Guerreiro, JarbasDomingos Vaz, José Pereira da Silva(Pereirinha), Maria do Perpétuo Socor-ro Vitarelli, Ponce de Leon, Ruy Bello,Salete Lisboa, Sidney Rezende, SílviaMoretzsohn, Sílvio Paixão e Wilson S.J. de Magalhães. O mandato dos eleitosé para o triênio 2008-2011.

Para o Conselho Fiscal foram eleitosos jornalistas Adail de Paula, AdrianoBarbosa do Nascimento, ArgemiroLopes do Nascimento, Geraldo Pereirados Santos, Jorge Saldanha de Araújo,Luiz Carlos de Oliveira Chesther eManolo Epelbaum, com mandato parao exercício social 2008-2009.

Além de eleger os membros do Con-selho Deliberativo e do Conselho Fis-cal, a Assembléia-Geral OrdináriaAnual aprovou o Relatório da Direto-ria relativo ao Exercício Social 2007-2008 e as contas de gestão da Direto-ria, ratificando a decisão adotada no dia15 de abril pelo Conselho Deliberativo.

Torneio de Xadrez do Centenário reúne 40 do primeiro timeEntre os participantes, Lucas

Peixoto. Idade: 9 anos.

gar em casa com troféus e passou a meobservar. Aos quatro anos estreou numtorneio em Vassouras, com dez concor-rentes, e ficou em sexto lugar. Para mim,o mais importante é que o xadrez o aju-da em outras áreas. Na escola, ele é con-siderado um aluno acima da média.

Terceiro colocado no Torneio Cente-nário da ABI, Wagner elogiou o nível dosconcorrentes: — Jogo xadrez há 22 anos

e acho que a minhacolocação foi boa emfunção da qualidadedos competidores.

O Diretor de Cul-tura e Lazer da ABI,Jesus Chediak, disseque o campeonatode xadrez é uma dasações com que pre-tende dinamizar aprogramação cultu-

ral da ABI. Ele agradecu aos membros daDiretoria de Cultura e Lazer que estive-ram envolvidos na organização da com-petição: — O sucesso do Torneio do Cen-tenário se deve principalmente à capa-cidade do Presidente da Federação, Ricar-do Barata, de agregar as pessoas. Agra-deço também ao José Rezende e ao Ro-berto Sander, meus colaboradores, quecom as suas experiências no jornalismo

esportivo vêm dando uma excelente con-tribuição à ABI. Faço questão também decitar nosso prestativo funcionário Neil-son Paes, presente em todas as nossasatividades.

Ricardo Barata ressaltou que a compe-tição atraiu jogadores de outras cidadesdo Estado do Rio e até uma participaçãointernacional, a do dominicano GustavoHernández. A premiação de R$ 1 mil aosprimeiros colocados, revelou, contribuiupara a participação de jogadores de pon-ta no torneio: — Quando recebi a propostado Jesus Chediak, aceitei de imediato. Paraa Federação, foi uma honra realizar umacompetição na Casa da Democracia. Comseu histórico de luta contra a ditadura, aABI demonstrou nestes cem anos porqueé uma entidade histórica e combativa.

No fim da solenidade, o ex-Presiden-te da Federação Reinaldo Veloso propôsque o órgão faça uma parceria com a ABI,para que o xadrez seja mais divulgadonos meios de comunicação: — Essaunião das duas instituições foi excelen-te e pode dar grande contribuição à di-fusão da importância da prática do xa-drez. (José Reinaldo Marques)

Thelmo Limp(à direita) e

Alexandre Camposvenceram na

Classe A do torneio.

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28 Jornal da ABI 329 Maio de 2008

O jornalista J. Guedes de Oliveiralançou no dia 30 de abril na Casa daPalavra, em Maceió, o livro OctávioBrandão — Dispersos e inéditos (EditoraBrascolor, Recife), que reúne artigos,ensaios, crônicas e outros escritos dointelectual e político alagoano, faleci-do em 1980.

A trajetória de Octávio Brandão in-clui, além de vasta produção intelec-tual, militância de destaque no anti-go Partido Comunista Brasileiro. Eletraduziu em 1923 o Manifesto Comu-nista, de Marx e Engels, e participouda fundação de diversos jornais de es-querda, entre os quais A Classe Ope-rária, em 1925, de que foi o primeiroeditor, e de A Nação, órgão de estudose informações sobre o PCB, de que foiredator-chefe.

Perseguido por suas idéias, foi depor-tado em 1931, juntamente com suamulher, a poetisa Laura Brandão, e trêsfilhas, para a Alemanha, de onde seguiupara a União Soviética. Ele e a mulherparticiparam da luta de resistência àsforças nazistas que invadiram o país.Laura, considerada heroína, morreu noexílio, em 1942.

De volta ao Brasil, Octávio Brandãoteria papel importante nas lutas inter-nas do PCB. Seu segundo casamento,com Lígia Prestes, irmã de Luís CarlosPrestes, não o impediu de divergir aber-tamente das posições do líder comunis-ta, a quem acusava de centralizador.Tornou públicas as divergências numaentrevista ao diário O Jornal, que ter-minaria censurada, mas circulou numpanfleto que ele mandou imprimir, noqual afirmava: “Explicaremos sem ces-sar às massas laboriosas que elas nãopodem ser libertas pelos ‘heróis’, pelos‘cavaleiros da esperança’. Só poderãoser libertas por suas próprias organiza-ções revolucionárias.”

Por essas posições Octavio Brandãoseria “exilado” também do PCB. Afas-tado da cúpula, não abandonaria as idéi-as que expunha em artigos e ensaios,muitos dos quais, inéditos, foram reu-nidos por J. Guedes de Oliveira em seulivro. As preciosidades foram descober-tas no Arquivo Edgard Leuenroth, daUnicamp, e incluem um ensaio cientí-fico, Canais e lagoas, pelo qual OctávioBrandão é considerado pioneiro dosestudos sobre ecologia no Brasil.

Com a ambição de levantar a histó-ria de jornais e jornalistas, foi lançadono dia 9 de abril na Academia Brasilei-ra de Letras o Centro de Cultura e Me-mória do Jornalismo, fruto de uma par-ceria do Sindicato dos Jornalistas doMunicípio do Rio de Janeiro com a Pe-trobras. Sua missão será registrar amemória oral do jornalismo e fazer umlevantamento das principais fontes,documentos e acervo da imprensa bra-sileira nos seus 200 anos, mostrandosuas transformações e motivações.

O lançamento contou com a presen-ça da Presidente do Sindicato, SuzanaBlass, e dos ex-Presidentes Aziz Filhoe Janice Caetano; da Diretora da Fede-ração Nacional dos Jornalistas-Fenaj e

PARCERIA

Um centro para levantara memória do jornalismo

Sindicato dos Jornalistas do Rio e Petrobrás criam órgãopara estudar e documentar a trajetória da imprensa.

BIOGRAFIA

Jornalista reúnetextos dispersos

e inéditos deOctávio BrandãoFundador do PCB, ele traduziu

Marx e Engels, criou jornais, viveuanos no exílio, brigou com Prestes efez estudos pioneiros sobre ecologia.

Presidente do Sindicato dos Jornalistasdo Espírito Santo, Suzana Tatagiba; dorepresentante da ABL, Murilo Melo Fi-lho; do Gerente de Imprensa da Petro-bras, Lúcio Pimentel; do Coordenador deComunicação Social do Governo do Es-tado do Rio, Ricardo Cota; da Secretáriade Comunicação Social do Município doRio de Janeiro, Agatha Messina; e doPresidente da ABI, Maurício Azêdo.

O Centro será instalado em umimóvel cedido pelo Governo do Rio deJaneiro. Nele serão realizados cursos,debates, exposições e seminários, como objetivo de estimular a reflexão pú-blica acerca do jornalismo.

Uma empresa foi contratada parapesquisar e reunir o acervo. Os jornalis-

tas Marcelo Beraba, Luiz Garcia, Cíce-ro Sandroni, Ana Arruda Callado, Evan-dro Teixeira e Regina Zappa serão con-sultores do desenvolvimento do Centro.

O Gerente de Imprensa da Petrobras,Lúcio Pimentel, considera que patrocinaro Centro de Cultura e Memória do Jor-nalismo é a certeza de estar contribuin-do para a liberdade de expressão e o aces-so à informação: –Este é um projeto quecontará a história de quem vem contandoa história diariamente – afirmou LúcioPimentel. – A campanha O petróleo é nossonasceu com o apoio da imprensa. Hoje,a empresa não poderia deixar de patro-cinar um projeto relacionado com a His-tória de quem vem contando a Históriado Brasil e da Petrobras.

A Presidente do Sindicato dos Jorna-listas, Suzana Blass, apontou o Centrode Memória como “o nosso sonho quecomeça a se materializar”. Para o Pre-sidente da ABI, ”a iniciativa cobre umahistórica lacuna de falta de informaçãosobre a trajetória da imprensa e dos jor-nalistas e é essencial para se conhecermelhor a História do País”.

O trabalho de constituição do acer-vo estará aberto à colaboração de todaa comunidade jornalística.

LITERATURA

A Academia mostra até dezembro as muitas faces do seu fundador.

Machado vive em ciclos da ABL

No ano do centenário damorte de Machado de Assis,a Academia Brasileira de Le-tras promove de abril a de-zembro o evento Machadovive. Serão 23 conferências,em quatro ciclos, incluindoexposição, lançamentos de li-vros, espetáculos de músicaerudita e popular, lei-turas dramatizadas,encenações teatraise exibição de fil-mes. A coordena-ção é do acadêmi-co Ivan Junquei-ra, que recebe es-

Portella (a crônica), Cláudio MuriloLeal (a poesia), Antônio Maura (a crí-tica) e João Roberto de Faria (o teatro).Com exceção da quinta, 24 de abril,todas as palestras serão às terças-feiras.

Machado será celebrado na ABLtambém com sessões de cinema orga-nizadas por Nélson Pereira dos Santos,com a exibição de filmes ligados à obrado homenageado e o lançamento doprimeiro volume das 700 cartas rece-bidas pelo escritor, organizado porSergio Paulo Rouanet, Diretor do Ar-quivo da instituição.

Mais informações no site www.academia.org.br, oupelo telefone 3974-2500, código 21.

pecialistas no Teatro R. MagalhãesJr. (Avenida Presidente Wilson,203, Centro do Rio) para abordaros principais gêneros da produçãomachadiana. A estréia foi no dia15 de abril, às 17h30min, com oacadêmico Alfredo Bosi falandosobre o romance na obra do es-

critor. A entrada é franca.O ciclo teve prosse-

guimento nos dias 24e 29 de abril e 6, 13e 20 de maio, comos conferencistasDomício Proen-ça Filho (o con-to), Eduardo

No ato na ABL, Maurício Azêdo, Murilo Melo Filho, Suzana Blass, Ricardo Cota, Ágata Messina, Suzana Tatagiba, Lúcio Pimentel, Aziz Filho e Janice Caetano.

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29Jornal da ABI 329 Maio de 2008

Na pauta, 20 processos de jornalistas. Nos discursos, antes,homenagens a companheiros mortos, como David Capistrano

e Vladimir Herzog, e reafirmação pelo Ministro da Justiça,Tarso Genro, de que as indenizações não são uma bolsa-ditadura,nem perdão nem reparação, porque tortura, morte, humilhação

e perda de emprego são danos irrepáráveis.

Em ato público dominado pela emo-ção, no dia 4 de abril, a Comissão deAnistia do Ministério da Justiça reali-zou na ABI a primeira sessão especialde julgamento de pedidos de indeniza-ção de perseguidos políticos pelo crité-rio de categorias específicas. A escolhada ABI para a realização dos julgamen-tos de 20 processos cujos requerentessão jornalistas foi uma iniciativa daComissão para homenagear o centená-rio da Casa, que seria comemorado trêsdias depois.

O evento marcou também o lança-mento da Caravana da Anistia, com aqual a Comissão pretende percorrertodos os Estados até 2010, para chamara atenção da sociedade para a política dedireitos humanos que vem sendo desen-volvida pelo Ministério da Justiça.

A mesa que coordenou os trabalhosfoi formada pelo Presidente da ABI,Maurício Azêdo; o Ministro da Justi-ça, Tarso Genro, que veio especialmen-te ao Rio de Janeiro para participar dacerimônia; o Presidente da Comissãoda de Anistia, Paulo Abrão Pires Júni-or; e a Presidente da União Nacionaldos Estudantes-Une, Lúcia Stumpf.

Toda a programação aconteceu noAuditório Oscar Guanabarino, locali-zado no 9º andar do Edifício HerbertMoses, que recebeu enorme platéia,formada por jornalistas, parlamenta-res, parentes de vítimas da ditadura,militantes dos movimentos sociais,estudantes e representantes de entida-des de defesa dos direitos humanos.

Pela manhã, na solenidade de aber-tura, além da Caravana da Anistia ocor-reu o lançamento da bandeira-símbo-lo das Liberdades Democráticas, queserá confeccionada ao longo do percur-so da Caravana da Anistia. A peça, disseo Presidente da Comissão de Anistia,será dedicada à sociedade como símbo-lo da luta pela democratização do País.Coube ao Presidente da ABI e à Presi-dente da Une unir os primeiros retalhospara a confecção da bandeira.

Seguiram-se homenagens em memó-ria dos jornalistas David Capistrano e

Vladimir Herzog. O primeiro desapare-ceu em 1974, durante a ditadura mili-tar, entre a cidade de Uruguaiana, RS,e a capital paulista, após um período detrês anos de clandestinidade. Herzogmorreu vítima de tortura nas dependên-cias do Doi-Codi, na capital paulista, em25 de outubro de 1975.

A luta, desde 1945Maria Augusta de Oliveira, viúva de

David Capistrano, recebeu do Minis-tro Tarso Genro o documento que anis-tiou o jornalista (Portaria nº 722, de 4de abril de 2008, assinada pelo Minis-tro), o qual lhe assegura o direito a umapensão mensal de R$ 3.444,52, comefeitos retroativos a 4 de abril de 2001,o que equivale a R$ 283.484,00.

Após cumprimentar a platéia, DonaMaria Augusta falou sobre a solenida-de, que considerou uma vitória de todoo povo brasileiro: — Fico feliz por es-tar participando deste ato de solidari-edade que, para mim, representa opensamento do povo brasileiro e que

Direitos humanosDireitos humanos

Comissão de Anistia fazuma sessão histórica na ABI

POR JOSÉ REINALDO MARQUES

Tarso Genro, que assinou na ABI, diante da viúva de Capistrano, a portaria que o anistia (foto abaixo), e o Presidente da Comissão de Anistia,Paulo Abrão, aplaudem a bandeira-símbolo das Liberdades Democráticas, erguida por Maurício e Lúcia Stumpf, Presidente da Une.

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contamina os verdadeiros patriotas.Estou com 90 anos e comecei a agirpoliticamente desde a época em quecursava a Escola Normal, em 1945,momento de trauma e lutas pela anis-tia dos anos terríveis por que passavao Brasil.

Concluído o processo de anistiadaquela época, movimento do qualparticipou como estudante, Dona Ma-ria Augusta achava que o País jamaisvoltaria a sofrer danos políticos, até quefoi deflagrado o golpe militar de 1964:— E nós voltamos a sofrer repressõesterríveis por mais de 20 anos de dita-dura, mas o povo novamente levantou-se e dessa segunda vez participei an-dando pelo Brasil, debatendo a neces-sidade da redemocratização. Acho quefomos vitoriosos em parte. Todos con-tinuamos a lutar, organizando umnovo movimento pela anistia, em fun-ção do trabalho exercido pelas forçasdemocráticas do País.

Disse Dona Maria Augusta que o atoem realização na ABI representa a ca-pacidade de luta do povo brasileiro,para conseguir uma nação mais digna,onde não se tenha mais que lidar comas condições terríveis da repressãopolítica: — Por isso a Comissão deAnistia faz mais um ato de justiça emum momento desses, trazendo a vidados que foram torturados e mortos,mantendo viva a chama do ideal detodos os que morreram pelo Brasil —declarou Dona Maria Augusta, que foiovacionada pela platéia.

Herzog, parte da HistóriaEm seguida, Maurício Azêdo entre-

gou a Ivo Herzog a placa em homena-gem a seu pai, Vladimir. Ivo exaltou ofato de a homenagem a seu pai estaracontecendo nas dependências da ABIe lembrou a atuação do jornalista pelademocracia: — A história de VladimirHerzog é parte da História do Brasil, éde todos nós, e como tal deve ser ensi-nada às novas gerações, para que elaspossam entender o que aconteceu e

acontece no nosso País. Acho que semeu pai estivesse vivo hoje estariamuito ocupado, lutando contra a im-punidade, trabalhando mais do quenunca, fazendo o que cabe a toda aclasse jornalística fazer. Se fosse neces-sário, ele morreria mais uma vez poraquilo em que acreditava.

Ao se referir a David Capistrano eVladimir Herzog, o Presidente da ABIafirmou que o ato pela anistia se carac-terizava por forte emoção por causa daevocação de heróis da luta da liberda-de do Brasil. Ele lembrou que no audi-tório da ABI, após a morte de Herzog,Prudente de Moraes, neto, então Pre-sidente da Casa, e Barbosa Lima Sobri-nho, Presidente do Conselho Adminis-trativo, presidiram uma cerimônia emmemória do jornalista.

Emocionado, Maurício Azêdo afir-mou que a iniciativa da Diretoria daABI transformou um evento religiosoem homenagem a Herzog, no que se-ria a missa de sétimo dia de seu faleci-mento, em um ato cívico de luta pelarestauração das liberdades públicas doPaís: — Devo inicialmente dizer que es-tamos tomados de emoção pela a evo-

cação de heróis da luta pela liberdadedo Brasil, como Davi Capistrano e Vla-dimir Herzog. E essa emoção não de-corre apenas da magnitude ética e po-lítica deste ato, mas por lembrançasque se agigantam na nossa memória demomentos traumáticos das nossasexistências individuais e da nossa exis-tência nacional.

Contou Maurício que, por determi-nação do Cardeal Dom. Eugênio Sales,não pôde ser celebrada a missa de sé-timo dia que havia sido encomendadapela ABI na Igreja de Santa Luzia, noCentro do Rio, onde habitualmenteeram realizados os atos religiosos daentidade: — Então foi aqui neste audi-tório que, dias após o sacrifício, a tor-tura e a morte de Vladimir Herzog, Pru-dente de Mores, neto e Barbosa LimaSobrinho presidiram um ato em suamemória. Nós então orientamos oscompanheiros para se dirigirem à ABI,onde transformaríamos o culto emação de denúncia da violência que gol-peou o nosso companheiro e de reivin-dicação da restauração das liberdadespúblicas do País. Com o auditório su-perlotado, permanecemos de pé e emsilêncio, manifestando o nosso empe-nho, o nosso propósito e a nossa deter-minação de lutar para que aquela fasehedionda da nossa História fosse final-mente riscada do mapa.

Maurício concluiu dizendo que aABI se sentia confortada em ser o ce-nário do ato de deflagração da Carava-na da Anistia, “que haverá de percor-rer o Brasil difundindo as idéias liber-tárias que desembocam na Comissãode Anistia do Ministério da Justiça”. Eacrescentou: — Nosso conforto emrealizar este ato é ainda maior porqueele representa mais um galardão que aCasa de Gustavo de Lacerda, HerbertMoses, Prudente de Moraes, neto,Barbosa Lima Sobrinho e FernandoSegismundo acrescenta à sua densa efecunda atuação em defesa dos direitosdo povo brasileiro e do progresso ma-terial e espiritual do País.

Referindo-se às comemorações docentenário da ABI, o Presidente desta-cou que a Casa do Jornalista comple-ta cem anos reafirmando o seu compro-misso com a luta pela liberdade.

Nem perdão, nem reparaçãoAo se dirigir à platéia, o Ministro da

Justiça, Tarso Genro, disse que qualquerreferência sua à ABI poderia soar comoredundância, porque a História da Casado Jornalista se integra à da Repúblicae à da democracia do País. E falou sobreo significado da anistia: — Ela não é umperdão nem reparação, é um elementomaterial importante, pois tortura,morte, humilhação e perda de emprego

Direitos humanosDireitos humanos

Após o lançamento da Caravana da Liberdade, Tarso Genro foi assediado para falarsobre a CPI do Dossiê, então em curso. Antes, recebeu o jornalista Moacir Pereira (à

direita), que veio de Florianópolis para falar sobre Gustavo de Lacerda, fundador da ABI.

Presidente da Une, Lúcia Stumpf (à esquerda) reclamou a abertura dos arquivos daditadura. Ivo Herzog (ao centro) recebeu uma placa de homenagem a seu pai, Vladimir

Herzog. Paulo Abrão (à direita) prometeu decidir logo os processos de anistia de jornalistas.

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são danos irreparáveis. Por isso, julgo aanistia um processo de reconhecimen-to e pedagogia democrática para livraro Estado dos que cometem crimes, ile-galidades e barbaridades.

Disse o Ministro que apesar da dita-dura ninguém no Estado estava auto-rizado a torturar. Por isso a anistia é aconsolidação de um projeto democrá-tico de uma República que ainda estáse constituindo. Como a relação do Es-tado com a sociedade é opaca, obser-vou, o ato na ABI tem como maior sig-nificado a transparência, a valorizaçãoda fiscalização da cidadania, o respei-to aos direitos humanos e a valores daRepública democrática que combate adesigualdade:

— Com iniciativas como esta, que-remos fazer que os jornais tenham ver-gonha de dizer que a anistia é bolsa-di-tadura. Mas todas essas questões se re-solvem com mais liberdade de impren-sa e capacidade de dialogar e convencer.Por isso este é um ato de convencimentopúblico, um projeto que faz que dita-dura, censura, tortura e morte sejamirretornáveis.

Dinheiro não pagaO Presidente da Comissão de Anis-

tia, Paulo Abrão Pires Júnior, falou daexistência de várias razões para que aComissão de Anistia programasse olançamento da Caravana na sede daABI. E destacou que pela primeira vezo público teria a oportunidade de apre-ciar a realização de uma sessão da anis-tia fora de Brasília, com o crivo da fis-calização e crítica da sociedade brasi-leira e reforçando cada vez mais a trans-parência dos trabalhos do órgão:

— Não é sempre que um tribunaladministrativo brasileiro se dispõe arealizar suas sessões de forma públicae transparente. Outro ponto importan-te é o fato de estarmos hoje retoman-do os julgamentos dos processos dejornalistas dentro da Comissão deAnistia, que estiveram parados por trêsanos pelas razões que nós já conhece-mos. Estaremos apreciando 20 reque-rimentos e fazendo justiça a esses ci-dadãos que foram perseguidos peloregime militar. E isso tudo acontece naABI, palco de tantas lutas pela resistên-cia à ditadura, onde agora realizamosmais um capítulo dessa história que seiniciou em 1964, quando o regimemilitar ceifou as liberdades públicas noBrasil.

Paulo Abrão fez questão de assina-lar que a medida que a Comissão vemadotando é um ponto de partida paraum diálogo mais profundo sobre o res-gate de uma dívida política que o Esta-do brasileiro tem com inúmeros cida-dãos. Sobre o valor das indenizações(R$ 3.758), disse que não é ponto cen-tral da anistia, “porque dinheiro algumpaga o sofrimento de brasileiros queforam vítimas do Estado que tinha odever de protegê-los”.

Até o momento, informou, a Comis-são de Anistia realizou 110 sessões dejulgamento, analisando 10.228 reque-

rimentos, de um total de 35 mil. Ou-tras duas caravanas estão previstas paraabril, a primeira no dia 15, na Associa-ção dos Anistiados de São Paulo. Nosdias 25 e 26 é a vez de São Domingosdo Araguaia, no Sul do Pará, onde se-rão julgados os requerimentos de cam-poneses e outras pessoas acusados departicipação na chamada Guerrilha doAraguaia.

A palavra da UneA Presidente da Une, Lúcia Stumpf,

disse que, além da consolidação do pro-cesso de anistia, uma das principais ati-

A organização da pauta da sessão realizada na ABI pelaComissão de Anistia foi objeto de negociação entre a Pre-sidência da Casa e o Presidente da Comissão, Paulo AbrãoPires Junior, ao qual Maurício Azêdo dirigira expedientepedindo a apreciação de 20 processos pendentes de deci-são, vários deles formados há mais de cinco e até seis anos.

Na antevéspera da reunião o Presidente da ABI verifi-cou, com surpresa e frustração, que constavam da pautaapenas dois dos processos incluídos na lista, os de RosaGomes Malta, viúva do jornalista Octávio Malta, e Tamarde Castro Oliveira, viúva do jornalista Félix Athayde.

Diante do propósito anunciado pelo Presidente da ABIde manter a Casa como sede da sessão mas dela não par-ticipar, pelo constrangimento em que ficaria pela omis-são dos processos cujo exame pleiteara, o Presidente PauloAbrão determinou a realização de buscas na Comissãopara localização de alguns desses processos.Na vésperada sessão, Paulo Abrão comunicou à ABI que tinhamsido acrescidos à pauta os processos de interesse deMaria Inês Duque Estrada Bastos, Jorge Saldanha deAraújo, Nilson Nobre de Almeida, Pery de Araujo Cottae Julieta Moreira Cabral, viúva do jornalista GeorgeMoreira Cabral. Esse último processo estava desapare-cido há anos e foi encontrado, esquecido, sob uma pi-

Uma cordial batalha de bastidores,na antevéspera da sessão na ABI.

UMA PAUTAFORMADAA FÓRCEPS

tudes da entidade nomomento é engrossar ocoro das exigências paraa abertura imediata dosarquivos da ditadura:

— Nós temos direitoa resgatar a memóriadeste País e fazer umareverência a todos oslutadores e lutadorasque tombaram na defe-sa da construção de umBrasil melhor e maisjusto para todos nós. Epara isso é também in-dispensável que tenha-mos uma imprensa li-vre. Por isso é muitosimbólico que o inícioda nossa Caravana da

Anistia aconteça na ABI.A coordenadora do projeto das cara-

vanas, Flávia Carlet, informou que elasdeverão permanecer pelo menos doisdias em cada local: no primeiro dia ha-verá um seminário cultural e no segun-do, a sessão de julgamento. Ela lembrouque a proposta surgiu após sessão rea-lizada num congresso da União Nacio-nal dos Estudantes, no ano passado,durante o julgamento dos requerimen-tos de Aldo Arantes e Jean Marc van derWeld, ex-presidentes da entidade. Naocasião, Flávia disse que ouviu dos re-presentantes da Une que a ação “tinha

lha de outros num armário da Comissão.Os cinco processos citados somaram-se aos 15 incluí-

dos originalmente na pauta da Comissão e que tambémforam julgados nessa sessão. Além dos processos de Jaguare Ziraldo, foram aprovados esses cinco processos e os deJoana D’Arc Bizzotto Lopes, Maria Regina Pedrosa de Sen-na Figueiredo, Carlos Guilherme de Mendonça Penafiel,Ricardo de Moraes Monteiro, Sinval Itacarambi Leão,Maria José Rios Peixoto da Silveira Lindoso, Félix Augustode Athayde-Tamar de Castro Oliveira, Orlando MarettiSobrinho, Ari Cândido Fernandes, Amaro Alexandrino daRocha, Josail Gabriel de Sales, Reynaldo Jardim Silveirae Rosa Gomes Malta.

Dois dias antes da sessão na ABI, a Comissão de Anis-tia realizou em Brasília uma sessão em que apreciou 17 pro-cessos e concedeu anistia aos seus requerentes: Helena Sa-lém, José Fernandes do Rego Filho, Antônio Correia Jo-sué e outros, Glaucy Marise Aranha de Moraes, Germâ-nia Felix, Marta Schonfeld do Valle, Flavy Ribeiro Phol,Virginia Lopes, José Gregório Gorender, Jorge Pinheiro dosSantos, José Seabra Neto, Roberto Ricardo Cômodo, Cláu-dio Maya Monteiro, João Máximo Ferreira Chaves, LuizEduardo Prado de Oliveira, Ricardo Frota de AlbuquerqueMaranhão, David Capistrano-Maria Augusta de Olivei-ra. Foi o relativo a esse último que o Ministro Tarso Gen-ro assinou a portaria no ato na ABI. Helena Salém fale-ceu anos antes desse julgamento.

Antes da sessão realizada na ABI, o Presidente da Co-missão de Anistia informou que nela seriam julgados pro-cessos pendentes de apreciação em primeira instância, en-quanto os processos de recursos seriam apreciados emreunião que a Comissão realizaria em maio em Brasília,a qual, porém, foi adiada para julho. Paulo Abrão infor-mou que esperava que no primeiro semestre deste anopossam ser decididos todos os processos de anistia reque-ridos por jornalistas.

sido muito importante para a formaçãopolítica e conhecimento da História”.

Criada em 2003, a Comissão de Anis-tia é responsável por julgar os pedidosde indenização e, com base na Lei nº10.559, de 2002, conceder reparaçãoeconômica a todos os que comprovaremterem sido privados de emprego, nainiciativa privada, ou cargo ou função,no serviço público, por razões políticas.Para tanto, os requerentes têm de com-provar não só a perseguição política,mas também os prejuízos financeiros oufísicos que sofreram, com o corte em suavida profissional ou funcional.

Informações do Ministério da Justi-ça repassadas à Agência Brasil dão contade que, além das Caravanas da Anistia,a Comissão continuará realizando, emBrasília, as sessões temáticas em que nãohá julgamento dos processos, e simcoleta de documentos e informações dosgrupos requerentes de indenização. Em2007, a comissão realizou dez sessõestemáticas. Foram ouvidos, entre outros,ex-trabalhadores do Banco do Brasil, dascompanhias siderúrgicas Nacional eBelgo Mineira, da Petrobras, da Gene-ral Motors, da Cosipa, do Pólo Petroquí-mico de Camaçari e dos Correios.

Os julgamentosApós o ato da Caravana, a Comissão

de Anistia julgou e deferiu todos os 20processos de jornalistas que estavam na

Tarso: A anistia é a consolidação de um projeto democráticode uma república que ainda está se constituindo.

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Os julgamentos de processos de anistia de jornalistas reali-zados no Rio ensejaram um noticiário crítico e pejorativo de OGlobo, que, com chamada na primeira página, dois dias segui-dos, classificou as indenizações de “bolsa-ditadura”, como se osrequerentes estivessem usufruindo algo imoral e indevido.

O tom do noticiário, repelido com veemência por Ziral-do, exposto à execração pública pelo jornal, motivou deze-nas de cartas de leitores, todos indignados com a suposta be-nemerência concedida aos anistiados. O Globo publicou, po-rém, apenas as cartas afinadas com a linha do seu noticiá-rio e não registrou as que contestavam a impressão que ojornal procurou incutir na opinião pública.

Entre as cartas renegadas estava uma do jornalista ArthurJosé Poerner, transcrita a seguir. Membro do Conselho Delibe-rativo da ABI, Poerner teve os direitos políticos cassados quandotinha 26 anos, sofreu prisões e torturas e teve de se exilar naAlemanha, onde viveu dez anos. Disse Poerner no texto rejei-tado, enviado ao jornal às 18h41min do dia 14 de abril:

“Não posso deixar de me solidarizar com Ziraldo e Jaguar,valorosos companheiros da resistência cultural n’O Pasquimao obscurantismo ditatorial, diante do linchamento morala que vêm sendo submetidos por alguns leitores, nesta seção.Acionado pelos mesmos princípios éticos e democráticos queme fizeram repudiar o golpe militar desde que surpreendidopor ele, com menos de dois anos de profissão, no Correio daManhã. Por expressar esta rejeição, sempre e só no que escrevi,tornei-me, aos 26 anos, o caçula dos punidos com a suspen-são dos direitos políticos por 10 anos; respondi a IPM; fui

HÁ UMA EXPLORAÇÃO INDEVIDAem torno da anistia concedida aos jor-nalistas Jaguar e Ziraldo, que estãosendo execrados por uma campanhajornalística de teor moralóide, masque no fundo retrata o inconformis-mo de setores saudosos da ditaduradiante das conquistas que a luta dopovo brasileiro obteve, à custa demuitos sacrifícios, na busca de justi-ça para as vítimas das perseguições edos crimes da ditadura. Entre os ins-piradores da campanha encontram-seáulicos que privaram da intimidade deum dos cérebros da ditadura, o Gene-ral Golbery do Couto e Silva, que sópoderia doar seus arquivos, comodoou, a quem coonestasse suas açõesantidemocráticas e o incensasse.

O móvel da campanha é o valormensal fixado para a indenização dereparação moral devida a esses doiscombatentes das resistência demo-crática, assim como a outros vítimasda ditadura, que só agora, após maisde 40, 30 e 20 anos de sofrimento,recebem do Estado nacional o reco-nhecimento de que seus direitos decidadãos e de pessoas foram barba-ramente violados e sonegados. Ja-guar e Ziraldo vão receber como in-denização uma prestação mensal deR$ 4.357,88, valor muito distantedaquele que perceberiam se os ór-gãos de imprensa em que trabalha-ram não tivessem sido riscados domapa pela fúria liberticida do regi-me militar. Como o Estado nacionaldemorou mais de 20 anos para fazerjustiça, ambos devem receber asprestações atrasadas em montanteem torno de R$ 1 milhão e 52 mil,caso de Jaguar, que encontra essareparação depois de longa vida detrabalho e num momento em quevive problemas de saúde.

Os inimigos desse ato de justiçaprocuram apresentar essa confissãode culpa do Estado nacional, como di-zem na primeira página de noticiárioaltamente manipulado, sob a deno-minação ofensiva de Bolsa-Ditadura,numa paráfrase indevida com o pro-grama Bolsa-Família. Nós dizemosque essa é a Bolsa-Sofrimento, a Bol-sa-Angústia dos que sofreram horro-res enquanto muitos se regalavamcom os favores da ditadura militar.

Direitos humanosDireitos humanos

pauta do dia, requerendo reparação eindenização pelos traumas que sofre-ram como vítimas da ditadura militar.As maiores indenizações foram conce-didas aos cartunistas Jaguar (R$ 1.027.383, 29) e Ziraldo (R$ 1.253.000,24).Esses valores são resultantes do atra-so com que o Estado nacional concedereparação às suas vítimas.

Sérgio de Magalhães Gomes Jagua-ribe, o cartunista Jaguar, trabalhou nojornal Última Hora. Juntamente comZiraldo, foi um dos fundadores do Pas-quim, e figurou nos arquivos da ditadu-ra militar como “comunista, suspeitode exercer atividades esquerdistas”.

Ziraldo Alves Pinto trabalhou em

Bolsa-Ditadura, não.É Bolsa-Sofrimento

POR MAURÍCIO AZÊDO

A pedido de O Dia do Rio deJaneiro, o Presidente da ABIelaborou o artigo a seguir,publicado pelo jornal naedição de 11 de abril, sobo título Bolsa-Sofrimento.

diversos veículos de imprensa que fo-ram empastelados e fechados pelo go-verno militar, entre eles O Sol, editadonos anos 60 pela empresa que manti-nha o Jornal dos Sports. Atuou tambémnas revistas O Cruzeiro e Visão, até queem julho de 1969 fundou o Pasquim,censurado a partir da sua 25ª edição. Ojornal sofreu dura perseguição da dita-dura, a ponto de as bancas em que eradistribuído terem sido incendiadas.

A jornalista Maria Inês Duque Estra-da, membro do Conselho da ABI, foimilitante do Partido Comunista Brasi-leiro, em que ingressou em 1964, anoem que os militares tomaram o poder.Em 1973, foi presa pelo Doi-Codi, onde

foi torturada. Na época, era repórter doJornal do Brasil e trabalhava também naEnciclopédia Britânica. Em 1975, teveseu visto de saída do País negado, porcausa da sua “orientação ideológica”.Sobre a Caravana da Anistia na ABI eo deferimento do seu requerimento, ajornalista comentou: — Fiquei emoci-onadíssima, foi um ato muito bonito.Gostei de ver a participação dos estu-dantes, de ver o jovem nessa luta queeu considero que não é individual, masuma conquista coletiva que marca umaetapa de luta por uma vida mais justa.No caso da indenização, ela é apenasparcial, porque a vida que dos que seforam não pode ser resgatada.

A carta do anistiadoPoerner que O Globo

deixou de publicar

processado pelo Ministro Suplicy de Lacerda; tive que fugirpela janela - com Edmundo Muniz e o exímio editorialistaFranklin de Oliveira - na noite em que forças policiais-mili-tares invadiram o jornal, enquanto o Alberto Cury lia, em ca-deia nacional, o AI-5; acabei preso na Redação, em 1970,demitido, após mais de três meses de prisão no inferno do Doi-Codi da Barão de Mesquita, e, ante a impossibilidade de so-breviver aqui, exilado, por quase 10 anos, na Alemanha.

Como contabilizar perdas e ganhos (que os houve, em-bora não bafejados pela ditadura, na qual alguns vêem,equivocadamente, a grande musa dos cartunistas)? Incluirna conta os infartos, o romance inspirado na tortura, o co-nhecimento de outros povos e idiomas? Recebo, mensalmen-te, R$ 1.549,57 de aposentadoria de anistiado, ora rebati-zada de “bolsa-ditadura” (certamente, por quem não viven-ciou os anos de chumbo ou optou por vivê-los por caminhosmenos perigosos do que os da resistência).

Agora, o massacre do Jaguar e do Ziraldo levanta a ques-tão: sou um “bolsista da ditadura”? Sei que agi movido pelaminha consciência, sem visar a ganhos financeiros, que nãofoi “investimento”, mas, também, que, em todos os paísesregidos pelo Direito, o Estado deve reparações pelos danosque ocasiona. A esses malefícios, que podem ser erros mé-dicos ou balas perdidas em tempos democráticos, se agre-gam, nas ditaduras, desde prejuízos profissionais e materi-ais causados pela censura e pela repressão cultural a mor-tes e seqüelas físicas e mentais resultantes de tortura. Cal-cular o custo de uma carreira interrompida (a não ser noscasos de militares, diplomatas e outros funcionários públi-cos) é quase tão difícil quanto avaliar o preço de uma vida.Mais uma razão para que o nosso Estado jamais volte a cedera tentações ditatoriais. Gera custos de reparação. Que osleitores zelosos com o erário e com a destinação dos seusimpostos também pensem nisso.

ARTHUR POERNER (por e-mail, 14/4), Rio.”

Jaguar (à esquerda) e Ziraldo: crucificados pelo valor da indenização aprovada, que se elevou pela demora do Estado de pagá-la.

FOTOS: FOLHAPRESS

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A ABI fez-se presente no lançamen-to do Memorial da Anistia Política, emato sob a presidência do Ministro daJustiça, Tarso Genro, no dia 15 de maio,na antiga sede da União Nacional dosEstudantes, no Rio de Janeiro. Cominauguração prevista para 2010, o lo-cal abrigará o acervo de documentos doperíodo de repressão no País, abrangen-do quase meio século de perseguiçõespolíticas.

A solenidade, durante a qual TarsoGenro assinou a portaria que cria o Me-morial da Anistia Política no Brasil, tevecomo cenário o terreno que abrigou aUne, na Praia do Flamengo, 132, ondefuncionava a sede destruída pela dita-dura militar. Participaram da mesa doevento o Presidente da ABI, MaurícioAzêdo, o Presidente do Conselho Fede-ral da OAB, Cézar Britto, e a Presidenteda União Nacional dos Estudantes,Lúcia Stump.

Durante a cerimônia, foi prestadahomenagem post-mortem ao líder estu-dantil Honestino Guimarães, dirigen-te assassinado pela repressão cujo cor-po jamais foi encontrado, e à militan-te política Elza Monnerat, membro doComitê Central do Partido Comunis-ta do Brasil-PCdoB e participante dafase inicial da guerrilha do Araguaia.Após o ato, o grupo de teatro Tá NaRua, criado por Amir Haddad, apresen-tou esquetes relacionadas à anistia eaos direitos humanos .

“Anistia não é esquecimento”O Memorial vai abrigar um centro

de divulgação e de documentação, comacervos históricos dos períodos de re-pressão entre 1946 e 1988 e todos os ar-quivos da Comissão de Anistia: — Aanistia não é um esquecimento, nemcontribuição financeira, porque o Es-tado nunca vai pagar todos os tipos deprejuízo que as pessoas que se opuse-ram ao regime militar tiveram. É umprocesso integrante da constituição doEstado Democrático de Direito e o mo-mento pelo qual o País está passandoé importante para a consolidação da de-mocracia e da república — disse oMinistro Tarso Genro.

O Presidente da Comissão de Anis-tia, Paulo Abrão, disse que a iniciativade criação desse Memorial vai entrarpara a História: — A sede da UNE noFlamengo foi um dos lugares onde arepressão atuou de forma veemente. Aanistia é o reconhecimento da dívida

Reunidas no dia 12 de maio noAuditório Evandro Lins e Silva, da Or-dem dos Advogados do Brasil/SeçãoRio de Janeiro, entidades da socieda-de civil, entre as quais a ABI, firmaramuma Declaração de Princípios em quecondenam a proibição judicial da cha-mada Marcha da Maconha e defen-dem o “direito de quaisquer segmen-tos da sociedade propugnarem amudança da legislação vigente”.

Organizado por iniciativa daOAB-RJ, o ato contou com a parti-cipação de Ricardo Pedreira, da As-sociação Nacional de Jornais-ANJ;Lúcia Stumpf, Presidente da UniãoNacional dos Estudantes-Une; PauloSaboya, Presidente do Instituto deAdvogados do Brasil; do Deputadofederal Chico Alencar (Psol-RJ); doVereador Roberto Monteiro (PCdoB);do professor Daniel Sarmento; e doPresidente da ABI, Maurício Azêdo,que compuseram a mesa presididapelo advogado Wadih Damous, Pre-sidente da OAB-RJ.

Entre os oradores figurou o organi-zador do movimento no Rio de Janei-ro, sociólogo Renato Cinco, que reve-lou que foram programadas marchasem 11 capitais, das quais apenas a deRecife foi autorizada pela Justiça.

Nos incidentes que marcaram emvários Estados os protestos contra aproibição da marcha, foram presascentenas de pessoas, das quais 16 fo-ram autuadas e submetidas a proces-sos por desacato à autoridade. EmCuritiba-PR, a PM local prendeucem pessoas.

O Deputado Chico Alencar anun-

Proibição de marcha,da maconha ou não,ofende a democracia

Quaisquer segmentos da sociedade têm o direito depropor a alteração da legislação, diz Declaração de

Princípios firmada pela OAB-RJ, ABI e várias entidades

Um memorial paraa anistia no terreno

que foi da UneO espaço abrigará o acervo de documentos da repressão

entre 1946 e 1988, anuncia o Ministro Tarso Genro.

política que o País ainda tem e é umdireito constitucional.

Estudantes punidosÀ tarde, integrando a terceira pro-

gramação do projeto Caravanas daAnistia, foi realizado o julgamento deanistia dos seguintes requerentes, ví-timas de perseguições na época em queeram estudantes:

Edson Menezes da Silva - Integrouo movimento estudantil contra a dita-dura quando cursava Economia na Uni-versidade Federal da Bahia-Ufba. Mi-litante da Ação Popular (AP), ajudou afundar o Instituto dos Economistas daBahia, alvo constante de repressão porparte dos militares.

Dione Damasceno - Presa em 1972,acusada de praticar atividades subver-sivas, quando cursava Medicina na Uni-versidade Federal de Goiás. Foi interro-gada e torturada. Exilou-se na Suécia em1975 e retornou ao Brasil em 1983.

Mário Magalhães Lobo Viana - Tevesua matrícula suspensa na UniversidadeFederal do Rio de Janeiro por ser consi-derado subversivo. Foi um dos nove es-tudantes presos no Maracanãzinho du-rante show de Geraldo Vandré, por dis-tribuir panfletos que conclamavam opúblico a apoiar o músico, compositorde canções que criticavam a ditadura.

Solange Lourenço Gomes - CelsoPohlmann Livi requereu a declaração deanistiada política post-mortem de suaesposa. Solange teve destacada militân-cia política nos anos 1960 e 70. Foi pre-sa e submetida a sessões de tortura. AComissão Especial de Mortos e Desapa-recidos Políticos, instituída pela Lei nº.9.140/95, reconheceu a responsabilida-de do Estado brasileiro pela tortura econseqüente morte de Solange Louren-ço Gomes.

Ana Maria Santos Rocha - Aluna daPsicologia na Universidade Federal daBahia, foi militante estudantil e atuouno PCdoB a partir de 1973. Por contadas perseguições, perdeu o emprego.Exilou-se na Albânia e retornou aoBrasil em 1980.

Olivia Rangel Joffily — Militante domovimento estudantil paulista, tam-bém atuou na Ação Popular (AP). Foiperseguida, abandonou o curso de Ci-ências Sociais na Universidade Estadu-al de Campinas-Unicamp e o emprego.Passou a viver na clandestinidade epartiu para o exílio. Retornou ao Bra-sil em 1979.

ciou que proporá ao Psol, seu partido,que ingresse no Supremo TribunalFederal (STF), com uma ação direta deconstitucionalidade para interpreta-ção do texto constitucional sobre a li-berdade de reunião, conforme propos-ta apresentada pelo professor DanielSarmento.

Durante o ato, o Presidente da OAB-RJ leu mensagem recebida da Associ-ação Juízes pela Democracia, que con-denou a proibição judicial das mar-chas programadas.

É este o teor da Declaração de Prin-cípios aprovada na reunião:

”Diante da proibição judicial paraa realização da marcha em defesa dalegalização da maconha, que estavamarcada para o dia 4 de maio último,as entidades presentes ao ato públicorealizado no Auditório Evandro Linse Silva, na sede da Ordem dos Advo-gados do Brasil, Seccional do Rio de Ja-neiro (OAB/RJ), afirmam:

1) seu inquebrantável compromis-so com a democracia;

2) sua defesa incondicional do di-reito de quaisquer segmentos da so-ciedade propugnarem a mudança dalegislação vigente;

3) seu repúdio a quaisquer atos quevenham a tolher a liberdade de expres-são, tão duramente conquistada.

Tal posição, reafirmada pelas entida-des signatárias deste documento, é con-soante com nossos princípios democrá-ticos e não entra no mérito das bandei-ras encampadas pela caminhada queteve sua realização impedida por forçada decisão do Poder Judiciário.

Rio de Janeiro, 12 de maio de 2008.”

WILSO

N D

IAS-ABR

Em frente à Catedral de Brasília, manifestantes pró-descriminalização damaconha reagem à decisão judicial que proibiu a realização da Marcha.

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34 Jornal da ABI 329 Maio de 2008

Em palestra realizada em 5 de maiona sede da ABI, no encerramento doseminário Mídia, segurança e direitoshumanos, o Ministro Paulo Vannuchi,Secretário Especial de Direitos Huma-nos da Presidência da República,, dis-se considerar que direito humano é omesmo que direito à vida e que, porisso, é fundamental que o Estado e so-ciedade lutem articulados para garan-tir que não haja ataques à liberdade deimprensa e ao direito de ir-e-vir de todocidadão. Declarou também que a segu-rança pública é talvez o maior nó a serdesatado pelo Brasil na busca da con-solidação e afirmação da sociedade ci-vil na luta pelos direitos humanos:

— O tema está em processo de refor-mulação, passamos a construir uma novamentalidade sobre direitos humanos.Antes de 1964, eles não eram tão difun-didos no Brasil, como acontece hoje. Issose deu a partir da ditadura militar, emfunção da prisão e repressão a presospolíticos. Por isso, acho que esse temadeva ser incluído na estrutura do ensinofundamental, para implantar a semen-te dos direitos humanos nas crianças.

Ao falar sobre a agenda da Secreta-ria Especial de Direitos Humanos em2008, Vannuchi anunciou a realizaçãoda I Conferência Nacional de GLBT(Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transgê-neros), que deverá acontecer no iníciode junho, o lançamento do ProgramaNacional de Defesa dos Direitos Huma-nos dos Policiais e um encontro do Pre-sidente Lula com empresários, em ju-lho, para discutir responsabilidadesocial nas empresas. As políticas públi-cas de direitos humanos, disse, deveminterpretar todas as lutas, como as dasminorias e contra a exploração sexual.

Ao discorrer sobre a importância datotal integração do Estado com a soci-edade de maneira geral para dialogarsobre os direitos humanos, o Ministrodeclarou que a SEDH trabalha combase no tripé Poder Executivo-mídia-Poder Judiciário, que “se encontra de-fasado”: — Entendo o debate sobredireitos humanos como uma coligaçãoentre diferentes setores, para construirum Brasil que começa a consolidar aconvivência pacífica.

Seminário na ABI coloca em discussão questões tormentosas:direito à vida, direitos das minorias, índices de mortes nos centros

urbanos, como a imprensa cobre as comunidades populares.

No início da reunião, dizendo-se sa-tisfeito com a escolha da Casa para se-diar o ato, o Presidente da ABI lembroua importância da Declaração Universaldos Direitos Humanos e citou o jorna-lista Vladimir Herzog, para lembrar arelevância da participação da imprensano caso, durante a ditadura: — O assas-sinato do Herzog foi um episódio trau-mático que marcou de forma vigorosao País. E a ABI desde então tem levan-tado a bandeira dos direitos humanos,de maneira abrangente que se manifestaamplamente e não apenas para garan-tir a vida de jornalistas.

Giancarlo Summa, por sua vez, con-tou que começou a vida profissionalcomo jornalista e falou sobre a influ-ência da mídia na postura adotadapelos Governos em relação aos direitoshumanos: — As políticas de seguran-ça são desencadeadas de acordo com acobertura que a mídia faz. As priorida-des são eleitas segundo o tratamentoque a mídia dá. Esse é um poder que amídia tem no Brasil e no mundo.

Os números da violênciaCoube à psicóloga Silvia Ramos,

doutora em Saúde Pública e pesquisa-dora do Centro de Estudos de Seguran-ça e Cidadania da Universidade Can-dido Mendes, fazer a palestra introdu-tória do seminário, em que apresentouresultados da pesquisa Mídia e violên-cia, do CESeC. A partir de entrevistascom 90 especialistas das duas áreas, otrabalho levou três anos para ser con-cluído (de 2004 a 2007) e faz um diag-nóstico sobre segurança e o tratamentodado ao tema pela imprensa: — A idéiade realizar a pesquisa partiu do princí-pio de que a mídia cumpre um papeldecisivo para que os brasileiros dêemuma resposta às demandas na área desegurança pública. Chegou-se à conclu-são de que o ideal seria fazer um diag-nóstico sobre a cobertura que a impren-sa dá atualmente a assuntos como vi-olência, segurança e direitos humanos.

O principal objetivo, disse SílviaRamos, era abrir um canal de diálogoentre a universidade, os centros de pes-quisa e os profissionais e órgãos queproduzem a notícia. Para que fosseestabelecido um padrão, inicialmenteforam ouvidos os nove maiores jornais

Direitos humanosDireitos humanos

Também participaram da mesa dedebates Maurício Azêdo, Presidente daABI; Giancarlo Summa, Diretor doCentro de Informação das Nações Uni-das-Unic para o Brasil, instituição quepropôs a realização do encontro ; SilviaRamos, do Centro de Estudos de Segu-rança e Cidadania da UniversidadeCândido Mendes; André Luiz Azevedo,repórter da Rede Globo de Televisão;Angelina Nunes, Presidente da Associ-ação Brasileira de Jornalismo Investiga-tivo-Abraji e Editora-Assistente de OGlobo; Adauto Soares, Coordenadorinterino do Programa de Comunicação

e Informação da Unesco; Evandro VieiraOuriques, professor da Escola de Comu-nicação-Eco da UFRJ; e Ana Miguez,Editora-Executiva do jornal O Dia.

O encontro aconteceu na Sala Beli-sário de Souza, no 7º andar da ABI, ereuniu grande platéia de jornalistas, re-presentantes de organizações não-go-vernamentais, estudantes e comunica-dores de veículos alternativos do inte-rior do Estado do Rio. O evento foirealizado em comemoração do 60ºaniversário da Declaração Universaldos Direitos Humanos e do centenárioda ABI, festejado em 7 de abril.

Segurança pública é o maiornó a ser desatado, diz o Secretário

de Direitos Humanos Vanucchi

POR JOSÉ REINALDO MARQUES

Vanucchi defende a inclusão do tema direitos humanos na estrutura do ensino fundamental,para implantar a semente da noção desse bem na mente das gerações mais novas.

ELZAFIÚZA/AB

R

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35Jornal da ABI 329 Maio de 2008

O Consulado-Geral do Uruguai noRio de Janeiro, o Instituto CulturalBrasil-Uruguai e a ABI vão promoverem 10 de setembro próximo uma con-ferência com o cientista político uru-guaio Gerardo Caetano, que fará umaexposição sobre a evolução dos direi-tos humanos em seu país durante aditadura militar. O conferencista éprofessor da Faculdade de Humanida-des da Universidade da República doUruguai e foi incumbido pelo Presi-dente Tabaré Vázquez de pesquisar asocorrências que marcaram o período.

De acordo com a programação, emelaboração, o evento será aberto comuma exposição de Gerardo Caetanoe terá seqüência com intervenções deconvidados especiais: Frei Betto e osprofessores Jesse Jane, Diretora doInstituto de Filosofia e Ciências Soci-ais da Universidade Federal do Rio de

Janeiro, e Henrique Rodríguez Larre-ta, da Universidade Candido Mendes.A realização do evento foi discutidana tarde do dia 25 de abril na sede daABI pelo Cônsul-Geral do Uruguai noRio de Janeiro, Alberto Guani, e pelaPresidente de Honra e a Presidente-Executiva do Instituto Cultural Bra-sil-Uruguai, Nenê Rodrigues e BeatrizBissio, respectivamente.

Em encontro com o Presidente daABI, Maurício Azêdo, o Cônsul sali-entou a importância do conhecimen-to da vida em seu país durante o re-gime ditatorial, como parte dos esfor-ços para a integração sul-americana.Guani, que está no Brasil há mais detrês anos, é diplomata de carreira des-de 1986, mas estreou profissional-mente como jornalista, no jornal ElDía, que foi fundado por José Batlley Ordoñez e deixou de circular em1987. Além de jornalista, Batlle(1856-1929) foi Presidente do Uru-guai por dois mandatos (1903-1907e 1911-1915) e teve papel destacadona estruturação do Estado nacionalde seu país.

do Brasil: três do Rio de Janeiro, três deSão Paulo e três de Minas Gerais. Deacordo com a pesquisa, 50 mil pesso-as são assassinadas no Brasil a cada ano.Em 1984, o índice de homicídios era de15,2 por 100 mil habitantes. Em 2004,o número aumentou para 26,9 homi-cídios por 100 mil habitantes, colocan-do o País entre os mais violentos domundo. Na maioria dos países euro-peus, por exemplo, essa taxa é de doishomicídios por 100 mil habitantes.

Outro dado relevante, na opinião dapesquisadora, é analisar esses crimesitem a item. Por exemplo: por faixa etá-ria, no Rio a taxa de homicídios de jo-vens com idade entre 22 e 23 anos é amaior do Brasil; por etnia, anualmentesão assassinados 88 jovens brancos por100 mil e 200 jovens negros por 100 mil.

— São números impactantes e essadistribuição acontece há muitos anos.A pesquisa mostra que há um padrãolocal de violência. Em Ipanema, a taxaé de 7 por 100 mil habitantes; na peri-feria, é de 100 por 100 mil habitantes.Esse quadro também se repete em SãoPaulo e Minas Gerais. A cobertura so-bre o assunto vem melhorando, masainda é muito frágil. Veículos que tra-tam a violência com sensacionalismosão fadados ao fracasso. Isso aconteceucom jornais como O Povo, no Rio, e oDiário Popular, em São Paulo. Há umatendência positiva na mudança depostura da mídia no tratamento detemas como direitos humanos. E essatransformação se deve também ao pro-cesso de qualificação do jornalista.

Apesar de considerar que houve umagrande melhora na produção das notí-cias policiais, Silvia Ramos diz que háum paradoxo nessa cobertura:

— Recentemente, em conversa comum editor de Cidade do Globo, ele medisse que, por ser morador da ZonaNorte, observa coisas no trajeto parao trabalho que outros editores, da Barraou da Zona Sul, não vêem. Aquele re-pórter que cobria polícia e se confun-dia com policial está em extinção nasredações, dando lugar a outros maisbem-formados, de classe média, quevivem em áreas onde a violência temque ser silenciada, porque não é o focoprincipal. Além disso, mesmo nosmelhores veículos, 29% do noticiáriopolicial têm como fonte única a polí-cia. Outro dado que preocupa, aponta-

do pela pesquisa, é que muitos jorna-listas não sabem ler dados estatísticos.

O repórter, esse inimigoPara o repórter André Luiz Azevedo,

acostumado a fazer coberturas em áre-as de risco, houve uma mudança con-siderável na relação das comunidadescom a mídia: — Há 35 anos, quando eutrabalhava na Rádio JB, as comunida-des não sabiam falar. Houve uma mu-dança nesse processo, pois os indivídu-os aprenderam a se comunicar, mas aimprensa abandonou essas pessoas.

André Azevedo considera que a co-bertura atual está, ao mesmo tempo,“mais honesta, perigosa e frágil”. Nopassado, segundo ele, a imprensa tinhaque fazer acordos com o tráfico paraentrar em qualquer comunidade. Hoje,é mais difícil: — Atualmente, os ban-didos nos vêem como inimigos e issotorna o nosso trabalho muito maisperigoso. Temos que ter consciência deque os criminosos atiram para nos atin-gir e a Polícia não nos protege, porquetambém nos enxerga como opositores.Carros blindados, colete à prova debala, tudo isso não tem valor absolu-to na hora do conflito. Há também ocaso da censura imposta pelo tráfico,que é o grande dilema que a imprensavive nesse momento, por causa danegociação que as equipes têm quefazer para trabalhar em áreas de risco.

Fim ao egoísmoAngelina Nunes, Presidente da

Abraji e Editora-Assistente de O Glo-bo, expôs a proposta da Associação Bra-sileira de Jornalismo Investigativo deincentivar o investimento na formaçãodo profissional de imprensa: — Umadas prioridades da entidade é lutar pelamelhoria da qualificação jornalística,incentivar as melhores técnicas de re-portagem, trocar informações, dissemi-nar conhecimentos e pôr fim ao anti-go comportamento do jornalista quenão gosta de partilhar sua agenda. Estaprática tende a acabar.

Nesse contexto, a Abraji tem reali-zado congressos, palestras e cursos queensinam os jornalistas a lidar com es-tatísticas e transformá-las em pauta.Isso contribui para que os repórteresapurem índices de criminalidade que asautoridades não gostam de divulgar. Épreciso aprender a compreender o que

está por trás dos dados e não aceitarapenas o que a fonte diz: — Não é oobjetivo do jornalista ser um reprodu-tor do que a autoridade está divulgan-do. O jornalista precisa diversificar seutrabalho para estar muito mais quali-ficado. Quando o repórter estiver caraa cara com uma fonte oficial, vai enten-der exatamente o que ela quer dizercom as suas palavrinhas mágicas.

Angelina disse que a Abraji tambémse preocupa com o jornalismo em áreade risco e investe na capacitação do pro-fissional em situação de conflito:

— Essa é uma prática diária da pro-fissão no Rio de Janeiro, que não é tãodiferente do que acontece em São Pauloou em Minas. Na rede de comunicaçãoem que os repórteres estão sempre sefalando, só mudam os nomes dos ban-didos, mas os relatos são os mesmos.

“Bandidos têm que morrer”Ana Miguez, de O Dia, relatou um

episódio, ocorrido em 2004, em que umfotógrafo do jornal acompanhava umaequipe da Coordenadoria de RecursosEspeciais-Core da Polícia Civil, numafavela no subúrbio, quando o helicóp-tero do grupo quase foi atingido pordisparos de fuzis e metralhadoras vin-dos do Morro da Providência:

— Mesmo com medo de ser atingi-do, o fotógrafo pôs o braço pra fora edisparou a máquina, fazendo as fotossem olhar no visor. Quando voltou àRedação é que foi ver a seqüência, emque dois moradores do morro, desarma-dos, estavam sendo intimidados porpoliciais, que depois apareciam descen-do a favela com um corpo sendo carre-gado num tapete. Com a publicação dasimagens, o delegado que comandava aoperação e mais seis policiais foramafastados de suas funções. Esse fatogerou uma crise entre a Polícia e o jor-nal e entre o jornal e os leitores, queenviaram uma enxurrada de cartas e e-mails para a Redação, protestando con-tra a decisão de publicar as fotos e ale-gando que “ bandidos têm que morrer”.Além disso, o fotógrafo passou a sofrerameaças e foi obrigado a sair de férias.

Para Ana Miguez, em casos assim aimprensa exerce um papel fundamen-tal e acaba mudando o rumo da histó-ria: — Se não fosse a intervenção dosjornalistas, episódios como esse teriamtido outro desfecho.

Na mesa do debate: Evandro Ouriques, Ana Miguez, Giancarlo Summa, Paulo Vanucchi, Maurício, Sílvia Ramos (encoberta) e Angelina Nunes.

COMO FOI ANOITE DA

DITADURA NOURUGUAI

Pesquisador uruguaio vai falarsobre direitos humanos no país

vizinho. Será em setembro, na ABI.

O Cônsul doUruguai no Rio,Alberto Guani:A integração

sul-americanaexige mais

informaçõessobre nossos

países.

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36 Jornal da ABI 329 Maio de 2008

Liberdade de imprensaLiberdade de imprensa

Já se vão mais de seis meses desdeque o jornal Folha de S. Paulo publicoua reportagem Universal chega aos 30anos com império empresarial, de auto-ria da jornalista Elvira Lobato, mas ocalvário a que o veículo e a profissio-nal estão sendo submetidos continua.Isso porque, desde então, pastores efiéis da Igreja Universal do Reino deDeus, orquestrados por uma espécie decentro de coordenação, começaram aentrar na Justiça pleiteando indeniza-ções por danos morais. Segundo dadospublicados pelo próprio jornal, atéagora foram movidas 97 ações nos maisdistantes pontos do País em nome deseguidores da Iurd que se dizem ofen-didos pela matéria. Todas as 37 decisõesjá proferidas são favoráveis ao jornal.A truculência, que tentou ser disfarça-da como “guerra santa”, atingiu alémda Folha e de Elvira, outros três jornais:O Globo e Extra, do Rio, e A Tarde, deSalvador. No capítulo mais recente doembate, foi a vez do editor do Cader-no Brasil, da própria Folha de S. Paulo,Fernando de Barros Silva, ser acionadopor ofensa à honra em nova ação mo-vida pela Igreja por causa do artigo Fédo bilhão, publicado também em de-zembro e que comentava a reportagemde Elvira.

Apesar de a grande maioria dos pro-cessos movidos pelos seguidores daIurd contra Elvira e a Folha serem in-dependentes, os textos são muito pa-recidos, com citações e expressões idên-ticas. Além disso, a possibilidade deampla defesa é praticamente impossí-vel de ser praticado. Um levantamen-to feito pela ABI indicava que as açõesestão espalhadas nas mais distantes ci-dades de 20 Estados brasileiros, deXapuri (AC) a Jaguarão (RS). Impetra-das em Juizados de Pequenas Causas,a ausência dos réus na audiência deconciliação dá como procedentes asalegações do autor. O problema é queem diversas oportunidades houve au-diências marcadas para os mesmos diase horas próximas em localidades extre-mamente distantes.

Em Santo Ângelo (RS), houve umcaso emblemático nessa disputa. Ale-gando difamação, Jadson Tiago Roballo,pastor da Igreja na cidade, processou ojornal e Elvira. Ao julgar a questão, o juizGiancarlo Caminati Baretta considerou

Juízes vêem litigância de má-fé nasações de seguidores da Universal

do País. Ao chegar lá, ainda viajei ou-tras cinco horas e meia de carro até Ja-guarão, na divisa do Brasil com o Uru-guai para uma audiência. Depois, via-jei por outras duas horas e pernotei emPelotas. Na manhã seguinte, por maistrês horas, fui de carro até Porto Ale-gre. Passo dias na estrada e de aeroportoem aeroporto – conta ela.

Mais do que o prejuízo financeiro eo desrespeito profissional, as ações evi-denciam um ataque à liberdade de im-prensa. Isso se torna ainda mais eviden-te quando se observa o valor pífio dasindenizações pleiteadas. Na maioria doscasos não passa de R$ 1.000 e só em umou outro chega a R$ 10.000 e R$ 12.000.Com isso, a Universal diminui o valorque terá de gastar caso seja negado opedido de benefício da justiça gratui-ta. Percebendo os ardis, alguns juízesestão indeferindo as ações, condenandoos requerentes a pagar custas judiciaiscomo despesas processuais e multaspor litigância de má-fé e uso do PoderJudiciário de forma indevida.

No meio de toda essa trama, a ABIexternou em nota divulgada ainda emfevereiro sua preocupação por conside-rar a tática uma grave ameaça à liber-dade de informação e de expressão.Também luta junto à Anistia Interna-cional por um movimento mundial emdefesa dos jornalistas e dos veículos.

– O que foi desencadeado contra es-ses profissionais e órgãos é uma campa-

a ação improcedente e disse que na re-portagem não há qualquer tipo de dis-criminação religiosa.

– Se queria se defender, a Igreja de-veria vir a público esclarecer os fatos.Vejo nas ações com alegações iguais, emdiversas comarcas, uma orientaçãosuperior para obter vantagem financei-ra e impossibilitar a defesa – declarouBaretta em sua decisão.

A reportagem Universal chega aos 30anos como império empresarial, publica-da em 15 de dezembro de 2007, traziainformações sobre sua receita e mos-trou que a Igreja é atualmente a deten-tora do maior número de emissoras eretransmissoras de televisão no Brasil.Repórter especial da Sucursal da Folhano Rio, na qual trabalha há 22 anos,Elvira Lobato reclama de perseguiçãoe diz que continua sendo praticamen-te impedida de realizar seu trabalho porconta dos processos. Em entrevistaexclusiva ao Jornal da ABI, a jornalis-ta disse que já não pode mais executarsua especialidade: a reportagem inves-tigativa.

– Sou obrigada a fazer as pautas dodia-a-dia, porque as viagens para asaudiências ocupam grande parte domeu tempo e da minha emoção. Comofazer reportagens especiais em situa-ções assim? Para exemplificar: num diaacordei às 4h30. Precisava estar noAeroporto Internacional Tom Jobim às5h30 para ir a Porto Alegre (RS), no Sul

nha de intimidação e coerção sem pre-cedentes na história da comunicação noBrasil. Já enfrentamos a fúria repressi-va do Estado e de regimes ditatoriais,mas nunca uma investida partida daprópria sociedade civil com a abrangên-cia e o conteúdo mostrados por meiodessas ações. É ainda mais grave e pre-ocupante que tudo isso se faça sob opálio de uma confissão religiosa, que sepõe acima do olhar dissonante dos quenão a professam e não admite que aencarem com visão crítica – diz a nota,assinada pelo jornalista Maurício Azêdo,presidente da ABI.

As decisões tomadas até agora sãoelucidativas e mostram que a Justiçaestá no caminho certo. Ainda assim épreciso atenção. O pedido da Folha deS. Paulo para que todas as ações fossemjuntadas em um único processo foiindeferido, o que continua a dificultara defesa. Apesar de respeitar a posiçãoda Universal, que se diz ofendida porfrases das reportagens citando o usodos recursos que arrecada, a ABI con-sidera inaceitável que o assunto sejatratado na base da pressão e da enge-nhosidade e não dos argumentos. De-ferir esse tipo de ação pode causar da-nos irreparáveis à democracia brasilei-ra, ainda em construção. Esse proces-so deixou na recente História do Bra-sil não poucas vítimas e mártires. Operigo hoje é confundir quem é quemnessa trama.

Judiciário condena requerentes pela forma ardilosa como os processos contra imprensa foram orquestrados

Juiz Giancarlo Caminati Baretta acredita que os processos movidos por seguidores da igreja Universal têm uma orientação superiordevido à grande semelhança entre os textos. Que interesse teria o bispo Macedo (acima, de branco) em calar a imprensa?

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O 3º Congresso Internacional deJornalismo Investigativo foi aberto nodia 8 de maio, em Belo Horizonte, comuma cerimônia comemorativa do cen-tenário da ABI, que recebeu homena-gens do jornal Estado de Minas, quefesteja seus 80 anos, e dos organizado-res do conclave, que convidaram o Pre-sidente da Casa para proferir a pales-tra de abertura do encontro, promovi-do pela Associação Brasileira de Jorna-lismo Investigativo-Abraji e pelo Cen-tro Universitário de Belo Horizonte-UNI-BH, com o apoio do Knight Cen-ter for Journalism in the Americas, daBBC, do Centro Cultural da Espanha,do Instituto Ayrton Senna, da Funda-ção Avina e dos jornais Estado de Mi-nas e Correio Braziliense.

Na abertura do Congresso, o Presi-dente da ABI, Maurício Azêdo, agrade-ceu a homenagem e destacou a impor-tância da troca de experiências entrejornalistas promovida pelo evento:

— A ABI funciona para a troca deexperiências entre os jovens e os maisvelhos. A prática de conversas entreprofissionais de diferentes idades setornou rara no ambiente de trabalho.O barulho e o falatório das redações deantigamente deu lugar hoje à troca si-lenciosa de mensagens instantâneas eao pouco contato entre os jornalistas.A Abraji surgiu em um momento espi-nhoso e favorece o povoamento de umahumanidade profissional nas redações.

Maurício destacou a importância daqualificação e a necessidade de forma-ção superior para o exercício do jorna-lismo: — Não defendemos a exigênciado diploma, que, tal como no poema deDrummond, pode ser apenas um qua-dro na parede, e sim que o jornalistatenha capacitação de alto nível técni-

No Congresso da Abraji, um clamorem defesa da liberdade de imprensa

Encontro em Belo Horizomte presta homenagem ao centenárioda ABI e manifesta solidariedade aos jornalistas processados.

co, ético e cultural, correspondente àdimensão do ofício que tem que exer-cer, já que o jornalismo é de fundamen-tal importância na vida social do País.

Durante a cerimônia, realizaram-seainda um ato em solidariedade aos jor-nais Folha de S.Paulo, Extra e A Tarde e aosjornalistas Elvira Lobato, Bruno Thys eValmar Hupesel Filho, recentementeprocessados por danos morais, e umahomenagem aos 80 anos do jornal Esta-do de Minas, representado pelo Diretorde Redação Josemar Gimenez. Josemarsentou-se à mesa do Congresso ao ladode Angelina Nunes, Presidente da Abraji,Suely Maria Dias, Reitora do UNI-BH eAloísio Lopes, Presidente do Sindicatodos Jornalistas de Minas Gerais.

Em relação à tempestade de proces-sos que se abateu sobre alguns jornalis-tas e veículos de comunicação, a Abra-ji reagiu e deixou clara a sua posição, naspalavras do Diretor Plinio Bortolotti: “AAbraji não é contra o acionamento daJustiça quando alguém se sente ofendi-do, mas não aceita que essa instituiçãoseja usada como instrumento persecu-tório para constranger jornalistas.”

Ranulfo Bocaíuva, do jornal A Tar-de, ressaltou o papel da imprensa parao avanço da democracia:

— É preciso reconhecer a importân-cia do nosso trabalho para a manuten-ção da liberdade conquistada após anosde obscurantismo. A Justiça está con-seguindo reconhecer a má-fé nas açõescontra a imprensa.

Elvira Lobato, repórter da Folha deS.Paulo, foi representada na cerimôniapor seu irmão, Geraldo Francisco deAraújo, que afirmou que “a intimida-ção de alguns órgãos não atinge apenasElvira, mas todos os jornalistas queinvestigam desvios de conduta”.

Sob as vistas de Angelina Nunes e da Reitora Suely Maria Dias, o Presidente da ABIrecebeu de Josemar Gimenez (à direita) a placa de homenagem do Estado de Minas.

Numa decisão proferida em ape-nas 15 dias após a petição inicial —um verdadeiro recorde para os pa-drões cronológicos da Justiça do Es-tado — o Juiz Airton Luís CorrêaGentil, da 10ª Vara Cível e de Aciden-tes de Trabalho do Amazonas, proi-biu o Blog do Holanda, editado pelojornalista Raimundo Holanda, de pu-blicar “quaisquer notícias” sobre oempresário Otávio Raman Neves,criticado naquele espaço.

Raimundo de Holanda denunciouem seu blog que o empresário do se-tor de Comunicações seria o dono daConstrutora Pampulha e teria recebi-do pagamento por obras não realiza-das no Amazonas. Otávio Raman Ne-ves entrou com ação indenizatória pordano moral e exigiu direito de respos-ta. A empresa Locaweb também foiacionada, “por permitir que em seusite sejam hospedados blogs utiliza-dos unicamente para denegrir a ima-gem das pessoas”.

Duas semanas após o ingresso daação, o Juiz concedeu liminar que foimais além do que o pedido pelo quei-xoso, proibindo que o blog divulguequalquer notícia envolvendo seu nome.

Diante da decisão, o Sindicato dosJornalistas Profissionais no Estado doAmazonas (SJPAM) e a Federação Na-cional dos Jornalistas-Fenaj assinaramdocumento considerando a liminar“um ataque frontal à liberdade de ex-pressão e à democratização dos mei-os de comunicação, objetos de luta dosjornalistas e de toda a sociedade”.

Raimundo Holanda, por sua vez,divulgou nota, informando que pre-tende “dar o exemplo de respeito àsinstituições, especialmente o Judici-ário”, porém vai recorrer da decisão,a qual considerou “um retorno à cen-sura e às práticas de cerceamento daliberdade”. Eis a íntegra da nota:

“Este blog tem defendido ao longoda sua existência o respeito à legali-dade. Não seria coerente, nem demo-crático, a desobediência a uma ordemjudicial, mesmo que a entenda comoo restabelecimento da censura.

Assim, por compreender que mes-mo equivocada, a decisão de um juizexpressa, em tese, o desejo da socie-dade, e é um dos instrumentos da de-

Em tempo recorde, decisãojudicial impõe censura

a blog de jornalistamocracia, está substituindo por sím-bolos qualquer citação ao megaem-presário de comunicação e do setorde construção civil, autor de ação,com pedido de tutela antecipada,concedida pelo juiz Airton Luís Cor-rêa Gentil, da 10ª Vara Cível e deAcidentes de Trabalho, que determi-nou sejam retiradas quaisquer notí-cias constantes no blog que envol-vam o nome da parte autora da ação.

A medida judicial impede que oblog faça citação ao nome do empre-sário. O blog já retirou os pôsteresque relacionam o empresário à em-presa Pampulha, conforme determi-nação judicial.

O blog está interpondo recursopara reverter a medida, que consideraum excesso, mas como veículo quecompartilha informações com a so-ciedade também quer dar exemplo derespeito às instituições, especialmen-te ao Judiciário.

Para não ficar numa mera nota me-lancólica, queremos lembrar aos lei-tores que o jornalista que edita esteblog sentiu na pele os efeitos da cen-sura nos anos de chumbo. Trabalhouem jornais nos quais tinha que subme-ter seus textos a um agente federal. Fo-ram tempos de exclusão e de negaçãoda inteligência e da liberdade.

Reviver esses tempos num mo-mento em que parte substantiva daLei de Imprensa é revogada é doloro-so, pois vai na contramão de refor-mas importantes pelas quais passa asociedade brasileira.

O País não pode continuar convi-vendo com o atraso, nem com a mãopoderosa dos que se julgam donos docapital e da liberdade alheia.

O blog acredita no Judiciário ama-zonense, mas também está ciente deque a justiça não se esgota no Palá-cio da Avenida André Araújo.

Irá às últimas instâncias para verrestabelecido o direito de informar, de-nunciar, nominar os autores de delitos,de apontar enriquecimento ilícito, dedizer quem fez o bem e quem fez o mal.

Não será a condição a social do in-divíduo, nem o poder que ele tem,que vai impedir que a informaçãochegue aos leitores com nome, lugare os fatos que fazem a notícia.”

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e o rádio brasileiro tivesse umacara, qual seria? Difícil dizer,já que nesse universo multifa-cetado há tantos rostos – evozes – inconfundíveis. Mas e

a alma? Ah, essa certamente tem ummuito de Haroldo de Andrade. A no-tícia da morte do empresário e radia-lista, em 1º de março deste ano, aos 73anos, caiu como uma bomba no univer-so do rádio. Com mais de 50 anos decarreira, Haroldo dominou imbatível odial das 9 às 12 horas da manhã durantemuito tempo no Rio de Janeiro. Inova-dor, conseguia fazer um programapopular com interatividade e conteú-do. Mas também foi um lutador emdefesa da liberdade de opinião e da idéiade que o veículo deve ter ligação e ser-vir à comunidade.

Seu Programa Haroldo de Andrade,criado no começo dos anos 60, foi umadas atrações mais tradicionais e bem-sucedidas do rádio brasileiro. Foi pionei-ro na participação dos ouvintes por te-lefone. As pessoas ligavam e participa-vam ao vivo, sem cortes. Pediam músi-cas, faziam perguntas aos convidados econcorriam a prêmios. Algo novo parauma época em que as atrações seguiamum formato bem mais fechado. Comvários quadros de utilidade pública eprestação de serviços, o programa uniadicas caseiras, previsão meteorológica,notícias e entrevistas.

Mas nem o sucesso de público e decrítica o impediram de defender aqui-lo em que acreditava. Os Debates Popu-lares, quadro criado no auge de suacarreira, durante a fase mais repressi-va da ditadura militar, se tornou rapi-damente o ponto alto de seu programa,reunindo personalidades da sociedade

VidasVidas

HAROLDODE ANDRADE

como médicos, juristas, artistas e polí-ticos para tratar de assuntos que eramdestaque em jornais e revistas.

“Tem muita gente por aí que não gos-ta de rádio. Não entendem dele. Estãoaí apenas esperando uma vaga na tele-visão”, costumava dizer Haroldo, coma experiência de quem já trabalhou emdiversas mídias, mas viveu e respirousempre o rádio. Nascido em Curitiba(PR), ele começou cedo a trabalhar.Com 13 anos, fez amizade com umlocutor da cidade que trabalhava emserviços de alto-falantes, anunciandoprodutos do comércio local. Logo, tam-bém ele estava nos microfones fazen-do anúncios para o comércio curitiba-no. O tom de voz firme e a dicção cla-ra chamaram a atenção e abriram-lheas portas das rádios locais.

O reconhecimento só viria nos anos50, quando deixou sua cidade natal paratentar a sorte na então capital federal.A ligação com o Rio de Janeiro foi ime-diata. Nascia ali um caso de amor queduraria até o final de sua vida, assimcomo a paixão pelo Flamengo e pelosfilhos. Em 1954, ingressou na RádioMauá (1060 AM). Eram tempos emque o rádio ainda era o veículo mais po-pular do País e por causa disso as gran-des emissoras mantinham auditóriospara que os ouvintes pudessem acom-panhar os programas ao vivo. Comosua emissora era pequena e não tinhaplatéia, Haroldo buscou alternativas.Nascia ali o Musifone , com ouvintespedindo músicas por telefone e concor-rendo a prêmios.

O primeiro lugar na audiência atraiua atenção das emissoras maiores e em1961 tinha início o Programa Haroldode Andrade, na Rádio Globo, em que a

interação com os ouvintes foi estendi-da. Donas de casa, aposentados, moto-ristas de táxi e estudantes formavama maioria da audiência. Todos os dias,na entrada da emissora, formavam-sefilas de fãs e aspirantes a artistas quequeriam conversar com ele, pedir au-tógrafos ou uma chance para divulgarseu trabalho.

lém de se tornar responsávelpelo surgimento de vários ar-tistas hoje consagrados, Ha-roldo também colecionou ex-periências curiosas. Além de

ouvir tragédias pessoais e sonhos conta-dos por gente que via nele sua única es-perança, costumava ajudar sempre quepodia. Perdeu a conta de quantas cadei-ras de rodas e vestidos de noiva ganhoupara seus ouvintes. De tão inusitados,certos pedidos eram impossíveis de aten-der. Foi o caso de uma moça que duran-te cinco anos esteve diariamente à por-ta da rádio, sempre vestida de noiva, paratentar casar com o radialista. Numa oca-sião, chegou até a agarrá-lo.

Toda essa atenção e cuidado com aspessoas também o levaram para outrasmídias. Haroldo comandou programasnas TVs Excelsior, Tupi e Globo. Tam-bém colaborava regularmente comjornais. Ainda assim, a antiga paixãopelo rádio sempre o reconquistava e elenão conseguia ficar longe dos microfo-nes. Passou ainda por emissoras comoJornal do Brasil, Tupi e Bandeirantes.

Já no final da década de 1990, uma crisede outro tipo teve início. Com queda deaudiência, a direção da Rádio Globo AMdecidiu nacionalizar a programação darede. Completamente identificado como público fluminense e carioca, Haroldo

comprou briga com a emissora. Para ele,esse tipo de programação causaria mui-tas demissões e impediria o rádio de cum-prir uma de suas principais missões: pres-tar serviço à população local. Sua demis-são em 2002 foi um duro golpe, até por-que não pôde se despedir desses mesmosouvintes a quem servia na ocasião.

Há três anos, o comunicador conse-guira voltar novamente à ativa. Dessavez em sua própria emissora, a RádioHaroldo de Andrade, que funcionavano mesmo dial de sua primeira emis-sora no Rio, o 1060 AM. Ao reuniroutros comunicadores de sua geraçãoafastados das grandes emissoras, Ha-roldo mostrou que era possível fazerprogramação local de qualidade e terboa audiência. A rádio chegou a ser aterceira mais ouvida na região metro-politana da cidade.

Porém, debilitado pela diabetes, elepassou a ter problemas cardíacos e re-nais que o afastaram novamente dosmicrofones em 2007. Internado pormais de um mês no Hospital Pró-Car-díaco, em Botafogo, ele não resistiu emorreu em decorrência de falênciamúltipla dos órgãos. Durante o tempode seu afastamento, a rádio foi coman-dada pelos filhos, até que neste mês demaio ela foi vendida para a rede cató-lica Canção Nova.

“Um grande intérprete da vida comoela é que ensinou muita coisa”, foramas palavras usadas pelo governadorSérgio Cabral para definir Haroldo deAndrade durante o enterro. Sintético,mas preciso. Afinal, o rádio brasileironão perdeu apenas parte de sua histó-ria e um grande comunicador. Perdeutambém um homem que ajudou aconstruir parte de sua alma. (MS)

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Um grande intérprete da vida

Haroldo de Andrade e seu fartosorriso em julho de 2002, época

em que deixava o Sistema Globode Rádio: para ele, o rádio

deveria manter a missão deprestar serviços à comunidade.

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40 Jornal da ABI 329 Maio de 2008

Amante de bons textos,criador de publicações,

entre as quais CarosAmigos, ele era um

expoente da imprensaindependente, do respeitoao profissional e da altaqualidade da redaçãojornalística, da qual foi

um grande artesão.

“Você sabe qual é a última do Serjão?”Durante mais de uma década, sem-

pre que essa frase era ouvida na Reda-ção da revista Caros Amigos, em SãoPaulo, podia-se saber: algo novo e irre-verente estava para começar no jorna-lismo brasileiro. Uma das últimas ve-zes que foi dita, em meados do anopassado, resultou, no mês de outubro,no 1º Anticurso Caros Amigos de Jorna-lismo. “Anticurso”? Isso mesmo. Portrês sábados, gente vinda de todos oscantos do País se reuniu com alguns dosprincipais jornalistas brasileiros daatualidade não para assistir a aulas oupalestras, mas para trocar idéias e ex-periências sobre os mais variados te-mas, da ética à grande reportagem e,claro, para aprender “como não enri-quecer na profissão”.

Esta última frase – que serviu de sub-título para o curso – também saiu dacabeça do jornalista Sérgio de Souza. Erauma espécie de lema na vida de umhomem de talento, mas que preferiu osideais ao dinheiro e à fama. “Inventor”por natureza, Serjão é considerado umcriador de novos projetos, de publica-ções, um expoente da imprensa inde-pendente, do respeito ao profissional eao bom texto. Sem exagerar, não dá parafalar sobre jornalismo por aqui nasquatro últimas décadas sem citar o seunome. Assim como não é possível dei-xar de lamentar sua morte no último dia25 de março, aos 73 anos.

Amante de bons textos, antes demais nada, Sérgio de Souza escreveuseu nome na história do jornalismo

brasileiro criando publicações. Bondi-nho, Grilo, Fotochoq, Ex-, Domingão, MaisUm, Canja, Idéia Nova, Carametade,Revista de Fotografia, Jornalivro são ape-nas algumas das revistas que ele editouou de que participou na pequena im-prensa. No final dos anos 60 e começode 70, a pressão da ditadura militar fezcom que as grandes empresas se livras-sem daqueles jornalistas mais comba-tivos. Os “exilados das Redações” sereuniram e fizeram sua própria impren-sa, precursora das atuais publicaçõessegmentadas. Vários desses jornalistasestiveram sob a batuta de Sérgio, umtipo de papa dessa prática, para faze-rem não uma imprensa alternativa,muito menos nanica – “palavrões” de-testados por ele – mas a imprensa in-dependente.

Romântico? Idealista? Ou um prag-mático que prezava pela manutençãode uma equipe e buscava sempre novoscaminhos como forma de fazer seutrabalho? É difícil explicar esse lado umtanto quanto quixotesco desse fazedorde textos que começou sua carreira em1958 na Folha de S. Paulo. Nessa época,Sérgio dava expediente pela manhã noBanco do Brasil e aceitou trabalharcomo revisor à noite. A desculpa oficialpara o novo emprego era o casamentocom Martha, que se avizinhava; parasaldar as dívidas, uma graninha a maisiria muito bem. Mas para o amigo eadvogado Marco Túlio Bottino confi-denciou: “Estou mesmo é feliz. Semprequis ser jornalista”.

Depois de ser promovido a repórter,ele ainda passou por Manchete, Fatos &Fotos, Notícias Populares e Quatro Rodas.Até 1966, quando foi chamado por PauloPatarra para fazer parte da equipe quemarcou época no jornalismo brasileiro,responsável pela qualidade editorial darevista Realidade. Entre seus novos co-legas figuravam Narciso Kalili, Hamil-ton de Almeida Filho, Mylton Severia-no, Roberto Freire e José Hamilton Ri-beiro. Mas a demissão coletiva de 14jornalistas do grupo, dois anos maistarde, não apenas acabou com o proje-to de Realidade, como também levouSérgio de Souza a buscar o caminho daspublicações independentes.

Mas em 1974 nem isso era mais pos-sível. “Não senti mais ânimo de fazernem grande nem pequena imprensa emSão Paulo. A cidade parecia – ou estava

VidasVidas

S É R G I O D E S O U Z A

POR MARCOS STEFANO

Independente!

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41Jornal da ABI 329 Maio de 2008

mesmo? - coberta de censores. A carreiraestava acabando”, disse Sérgio em 1977ao Jornal da ABI. A saída para não pararfoi se mudar para Ribeirão Preto, nointerior paulista, e assumir ao lado doamigo José Hamilton Ribeiro a direçãode O Diário. “A princípio não pareciamuito empolgante, mas nos nove me-ses seguintes conseguimos estabeleceruma competição entre os quatro jornaisda cidade, os salários dos jornalistas dei-xariam de ser tão aviltantes, a informa-ção ganharia maior respeitabilidade ecamadas mais ativas da população e apolítica local receberiam uma injeção deoxigênio”, completou ele.

Foi novamente o idealismo que olevou a tentar implantar sua visão forada mídia impressa. No final daqueladécada, Sérgio foi para emissoras derádio, como Globo e Excelsior, e de te-levisão, como a Tupi e a Bandeirantes.Nesta comandou o 90 Minutos, progra-ma ao vivo, ancorado pelos atores PauloCésar Pereio e por Ana Maria Nasci-mento e Silva. Em um dos primeirosprogramas, logo exibiram uma entre-vista de Fidel Castro, que Ruth Esco-bar havia trazido de Cuba. Sem perdo-ar, Pereio logo foi dizendo no ar: “Ago-ra, vamos ouvir o nosso comandante”.Era uma visão muito avançada para atelevisão daquela época. Antes, porém,de fundar a Caros Amigos, em 1997,com Roberto Freire, João Noro e Fran-cisco Vasconcellos, ainda foi Diretor deRedação do Jornal da Bahia, em Salva-dor, no ano de 1978, e em 1986 criououtra revista, a Globo Rural.

Apesar das andanças, Sérgio de Sou-za se definia como um antigo “copides-que”. Nada mais injusto. Diz José Ha-milton Ribeiro que , por causa do esti-lo e técnica apurada, ele foi “o inventordo editor de texto”. “Com justiça, era

considerado o melhor texto da impren-sa brasileira”, concorda o repórter Per-cival de Souza. Realmente, não havianada que lhe desse mais prazer. Dissecerta vez:

“Se pudesse, ficaria trancado numasalinha com uma bic ou um lápis pretoe textos, muitos textos. Meus sentidosse aguçam quando ‘pego’ um texto,quando tenho que ‘trabalhar’ uma re-portagem. E vibro, intimamente esmur-ro o ar como o jogador que acabou demarcar o gol, quando ‘acerto’ um títu-lo, uma abertura, uma chamada, umalegenda, uma manchete. Melhor queisso, só ser caseiro de casa de praia”.

Mylton Severiano, o Myltainho, agoraencarregado de levar seu bastão em CarosAmigos, é uma testemunha disso. Conhe-ceu o amigo na Folha em 1960, mas sódescobriu de fato quem era em Realida-de. Myltainho fez uma matéria sobreClaudia Cardinale com o título A hora ea vez de Claudia, parafraseando o con-to A hora e a vez de Augusto Matraga, deJoão Guimarães Rosa. Quando Sérgioolhou o título disse: “Não vamos usaressas facilidades. Deixa isso para a Man-

chete”. Manteve a idéia original, masbuscou algo mais simples: Agora éa vez de Claudia Cardinale.

Era apenas o começo. “Serjãoera dono de uma ética e de umsenso estético fantástico. Ao tra-tar o texto, ele também tratavaseu autor. Com isso, provava queeditar não é somente pôr vírgulasnos lugares certos, acentuar, sabera gramática”, conta Myltainho.Enquanto um copidesque passa-va a caneta no texto alheio e nor-malmente reescrevia tudo, sem seimportar com o traço autoral, Sér-gio de Souza era um artesão dasletras. “Ele não desconsiderava o

autor. Primeiro lia o texto e com seulápis número 1, aquele mais leve e fá-cil de apagar, fazia anotações. Depoischamava o repórter e dava as sugestõese orientações. Quando a pessoa lia otrabalho final, tinha certeza de que eraobra sua, mas com um resultado mui-to melhor”.

Muito econômicos, os dois costuma-vam passar horas juntos sem falar nada.Mas no silêncio os amigos diziam tudo.A grande lição do mestre para o jovemMyltainho aconteceu em 1970. “Naque-le tempo, eu tinha um Opel alemão.Uma jóia. Um dia, o Narciso Kalili, tru-culento como só ele, foi querer mexerno carro e saiu com o câmbio na mão.Imediatamente, fui reclamar para oSerjão. ‘Eu ganho pouco, estou com osalário atrasado e ainda vou ficar semcarro’, protestei. Mas ele respondeu:‘Myltainho, é verdade, mas você estácom medo de ficar pobre. Você sabe quepode enriquecer. É só ir trabalhar numagrande emissora de televisão. Mas éesse jornalismo que deseja fazer em suavida?’. Aquelas palavras me quebraram.Ali estava o sujeito mais velho lapidan-

do o caráter do mais novo. Tive sortede ter uma figura como ele em minhavida”, diz o hoje veterano jornalista.

Poucas pessoas desfrutraram tantoda intimidade de Sérgio quanto LanaNowikow, sua segunda esposa e mãede três de seus sete filhos. “Não se tra-tava apenas de um ganha-pão para ele.Sérgio punha o coração naquilo quefazia e se dedicava com tesão. Era umotimista inveterado, um cara de esquer-da, que sempre acreditou até o fim.Depois que o Lula assumiu em 2003,todo mundo pensou que tudo iriamudar repentinamente, inclusive naimprensa. Como não mudou, muitagente na revista queria uma oposiçãodrástica. Conciliador como só ele, Sér-gio não deixou e comprou briga comtodos. Ele podia até fazer críticas edesgostar em muitos pontos, mas nãoperdia a esperança”, diz ela.

Talvez muitos pensem que seu traba-lho na revista Realidade tenha sido omais importante de sua carreira, masLana acha que não. “Realidade foi ummarco no jornalismo do Brasil, maspenso que aquilo que ele estava fazen-do no momento era o melhor”, afirmou.“Família, turma da Redação, publicaçãoque estivesse fazendo... Todos eramimportantes e mereciam sua atenção.Algumas vezes, nos finais de semana, elese sentava ali no canto e ficava respon-dendo a entrevistas dos alunos de facul-dades com o mesmo esmero com o qualtrabalhava os textos”, disse, apontandoo sofá no canto da sala.

Nos últimos tempos, no entanto, eleestava muito angustiado. As dificulda-des financeiras crescentes da revista eas dívidas que se acumulavam até opescoço foram minando sua saúde. Hátrês anos, ele já não havia participadode uma festa de aniversário de CarosAmigos. Foi internado por conta de umacrise causada por úlcera hemorrágica.Conseguiu se recuperar na época e nin-guém falou mais disso. Mas agora,próximo de outra festa da publicação,a sorte não foi a mesma. Estressado, foilevado às pressas para o hospital porcausa de outra úlcera que estourou,desta vez no duodeno. Debilitado poruma cirurgia, não conseguiu resistir.

Este ano não houve festa, não hou-ve palestras para comemorar mais umaniversário, os 11 anos de Caros Ami-gos. Mas houve um arrepiante “viva”em seu enterrro, a pedido da filha maisnova, Júlia. Afinal de contas, o homemse vai, mas seu exemplo e trabalhopermanecem. Permanecem por tudoque fez nestas quase cinco décadas dejornalismo e nas novas gerações deprofissionais que ajudou a formar e queestão ainda em formação na Redaçãode Caros Amigos. Também não serãoesquecidos quando se pedir para defi-nir Sérgio de Souza em apenas umafrase – ou título, como provavelmen-te ele preferiria: “Pegando gancho noque disse o Jornal da ABI tempos atrás:‘Semeador de Revistas’. Esse foi o Sér-gio”, completa Lana, sem conseguiresconder as lágrimas e o sorriso.

Idealista, criador da revista Caros Amigos(acima, edição em sua homenagem) e dediversas publicações, Sérgio de Souza se

via como “um antigo copidesque” e sabia“como não enriquecer” sendo jornalista.

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42 Jornal da ABI 329 Maio de 2008

VidasVidas

Estreante da política em 1962 comseu nome civil, Paulo Alberto Monteirode Barros tornou-se conhecido nacio-nalmente como Artur da Távola, pseu-dônimo dado por Samuel Wainer paraque ele pudesse exercer a profissão dejornalista depois que retornou do exí-lio a que o empurrara ogolpe militar de lº de abrilde l964. Como jornalista epolítico ele se impôs à ad-miração pública pela cul-tura, pela retidão no de-sempenho de mandatosparlamentares e pela voca-ção de ensinar.

O jornalismo, a cultura,os amantes da música po-pular e da música eruditaperderam em 9 de maiouma das grandes expres-sões brasileiras nesses campos: PauloAlberto Moretzsohn Monteiro de Bar-ros, o Artur da Távola, que deixou suapassagem pela imprensa, pela criaçãode programas musicais e pela vida par-lamentar – ele foi deputado estadual noantigo Estado da Guanabara, deputa-do federal e senador, membro da As-sembléia Nacional Constituinte de1987-1988 – marcada por sua sólida eabrangente cultura, pela retidão noexercício de encargos públicos e pelavocação de ensinar, pela ânsia e preo-cupação de promover a difusão de co-nhecimentos.

Paulo Alberto, que tinha 72 anos, so-fria de problemas cardíacos e chegou acomunicar em seu blog que estava do-ente e não continuaria a escrever. Elemorreu em casa e deixa viúva — Míri-an Ripper Nogueira Lobo, sua segun-da mulher — e três filhos. Sócio da ABI

Artur da Távola, avocação de ensinar

desde setembro de 1973. ao longo des-ses 34 anos ocupou vários cargos naCasa, entre os quais o de Vice-Presidentenuma das gestões de Barbosa Lima So-brinho. Integrante do Conselho Delibe-rativo, para o qual fora reeleito em abrilde 2007 para um mandato de três anos,

Paulo Alberto deixara departicipar das sessões doCoinselho há vários meses,em decorrência de proble-mas de saúde que o obriga-ram a repetidas interna-ções nos últimos anos.

Logo que soube de suamorte, o Presidente daABI, Maurício Azêdo, de-clarou que a Casa recebe-ra a notícia com profundopesar. — Além de grandeintelectual e jornalista no-

tável – disse —, Paulo Alberto era umacriatura humana excepcional. Comomembro do nosso Conselho Delibera-tivo, enquanto teve saúde ele partici-pava de tudo. Seu desaparecimento noscausa forte dor, seja por seus atributosintelectuais, que deixam um vácuo nainteligência brasileira, seja por ser umapessoa extremamente afetiva.

Nascido no Rio de Janeiro, em 3 dejaneiro de 1936, filho de Paulo de DeusMoretzsohn Monteiro de Barros e deMagdalena Koff Monteiro de Barros,Artur da Távola formou-se em Direi-to pela Puc-Rio em 1959, tendo parti-cipado do movimento estudantil du-rante a vida acadêmica. Eleito deputa-do estadual em 1962 pelo antigo Par-tido Trabalhista Brasileiro, o PTB deJoão Goulart, Leonel Brizola e Doutelde Andrade, Paulo Alberto iniciou umatrajetória que o conduziria â Câmara

dos Deputados, ao Senado Federal, aoexílio e, de volta, ao jornalismo comcaráter profissional, atividade que pas-sou a desenvolver porque, com os di-reitos políticos cassados por dez anospelo primeiro Ato Institucional baixa-do pela ditadura, em 1964, estava pri-vado de exercer a advocacia, como ba-charel formado pela Puc-Rio.

O jornalistaEntre 1957 e 1960, Paulo Alberto tra-

balhou como produtor de programaseducativos da Rádio Mec. Em 1960, ain-da usando seu nome de batismo, foi elei-to deputado constituinte no recém-cri-ado Estado da Guanabara, pelo PTN.Em 62, foi reeleito e ingressou no PTB.Sua atuação parlamentar foi marcadapela oposição ao então Governador

Carlos Lacerda, da União DemocráticaNacional-UDN. Cassado após o golpemilitar de 1º de abril de 1964, PauloAlberto asilou-se na Bolívia e no Chile.Na volta ao Brasil, em 1968, passou ausar o pseudônimo de Artur da Távo-la, por sugestão do então dono da Ulti-ma Hora, Samuel Wainer, que o contra-tou como crítico de televisão do jornal.

Jornalista e escritor respeitado, lan-çou 23 livros e foi colunista de várias pu-blicações, como O Globo, O Dia e Jornaldo Commercio. Também dirigiu revistasda Bloch Editores, assinou crônicas di-árias no programa Plantão da madruga-da, da Rádio CBN, e era Diretor da Ro-quette-Pinto. Desde 1957 na Rádio Mec,de que era o mais antigo funcionário ematividade, apresentava na emissora oprograma Quem tem medo de música clás-

Paulo Alberto teveuma iniciação

política precoce:elegeu-se jovem

(à esquerda)deputado àAssembléia

Constituinte donascente Estadoda Guanabara e

foi deputadoestadual,

deputado federal(embaixo, à

esquerda)e senador

(à direita). Era umorador admirado

pela lógica e origor da análise.

JOSÉ CRUZ-AGÊNCIA SENADO

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43Jornal da ABI 329 Maio de 2008

“A Diretoria e o Conselho Delibera-tivo da Associação Brasileira de Impren-sa receberam com forte sentimento depesar o falecimento do jornalista, pro-dutor musical, escritor e professor PauloAlberto Monteiro de Barros, membro doseu Conselho Deliberativo, eleito emabril de 2007 e com mandato que se es-tenderia até abril de 2010, o qual gran-jeou merecido renome como jornalistae homem público sob o pseudônimo deArtur da Távola, por ele adotado inici-almente no exercício da atividade jorna-lística e depois na vida pública, graçasà notoriedade que justamente alcançouassinando seus trabalhos na imprensasob esse heterônimo.

Paulo Alberto, como ainda o chama-vam os amigos mais antigos, tinha comonatural destinação a advocacia e a vidapública, que iniciou em 1960, pouco apósconcluir o curso de Direito na PontifíciaUniversidade Católica do Rio de Janei-ro, e viu sua trajetória modificada pelaeleição para deputado constituinte noantigo Estado da Guanabara. Eleito peloantigo Partido Trabalhista Nacional(PTN), Paulo Alberto elegeu-se depois,em 1962, deputado estadual à Assem-bleia Legislativa da Guanabara, agorapelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB).

Assim se integrou ao conjunto deforças que apoiavam o Governo JoãoGoulart e seu programa de reformas eteve seu mandato cassado e seus direi-tos políticos suspensos por dez anosapós o golpe militar de 1° de abrilde 1964, que o incluiu na primei-ra lista de punidos pelo regimediscricionário que então se instala-va. Por sua forte oposição ao GovernoCarlos Lacerda e diante do risco de

O jornalista Arthur Cantalice,de 81 anos, passou mal às 16h30min do dia 15 de abril quando dis-cursava na reunião do ConselhoDeliberativo da ABI. Socorrido pe-los companheiros, entre os quaiso jornalista Fritz Utzeri, que é mé-dico, ele não resistiu a um fulmi-nante ataque cardíaco.

Cantalice era sócio da ABI des-de 1973, foi Diretor da Casa na ges-tão de Prudente de Morais, neto(1975-1977) e era membro do Con-selho Deliberativo desde 2006. Ar-ticulista do semanário Correio daLavoura, de Nova Iguaçu, no qualmantinha a coluna política O negó-cio é o seguinte”, ele começou nojornalismo em 1957 como críticode programas de rádio do jornal co-munista Imprensa Popular, que dei-xou de circular um ano depois.

Após essa iniciação no jornalis-mo, Cantalice passou a trabalharno porto do Rio de Janeiro, ondeteve posições de liderança que olevaram à direção da antiga Uniãodos Portuários do Brasil. Por essamilitância, foi preso, processado edemitido da extinta Administraçãodo Porto do Rio de Janeiro. Com apromulgação da Constituição de1988, foi anistiado, reintegrado eaposentado compulsoriamente pormotivo de idade.

Torcedor do América FutebolClube, que lhe deu nos últimos diasa tristeza do rebaixamento para asegunda divisão do futebol cario-ca, ele editava numa dependênciado Salão de Estar da ABI, no 11°andar do Edifício Herbert Moses,um jornal mural que comentavacom atualizações diárias assuntosvariados, da política ao esporte, daeconomia à moda, do meio ambi-ente à política internacional.

Os Presidentes da ABI, MaurícioAzêdo, e do Conselho Deliberati-vo, Fernando Barbosa Lima, emiti-ram declaração lamentando o seufalecimento. “Cantalice era devo-tado ao interesse público e ao pro-gresso social, muito seguro na ex-posição de suas idéias e coerenteem seus opinamentos, com fre-qüência revestidos de extremadafranqueza”, diz a declaração.

Ele honrou opseudônimoque Samuel

sugeriuDeclaração da ABI exalta a

retidão com que Paulo Albertoexerceu o ofício de seu

heterônimo Artur da Távola.

prisão e violência por parte da PolíciaPolítica a serviço deste, Paulo Albertoexilou-se na Bolívia e no Chile, ondeviveu alguns anos.

Após seu retorno ao Brasil, no fimdos anos 60, e impedido de exercer ati-vidades de repercussão pública com seunome de batismo, Paulo Alberto foiacolhido em 1968 pelo jornalista Sa-muel Wainer, proprietário do jornalÚltima Hora, que também regressara doexílio, inicialmente no Uruguai e de-pois na França. Wainer idealizou duasformas de proteger Paulo Alberto con-tra eventuais perseguições: ele escreve-ria sobre televisão e com um pseudô-nimo que o próprio Wainer sugeriu, ode Artur da Távola, o que poderia co-locá-lo a salvo de perseguições dos ini-migos políticos, o que se confirmou.

Paulo Alberto iniciou então umanotável carreira como jornalista. Como restabelecimento do Estado de Direi-to, elegeu-se deputado federal e parti-cipou da Constituinte de 1987-1988, naqual teve destacada atuação comomembro da comissão de sistematiza-ção, que elaborou o Anteprojeto daConstituição. Foi Presidente da comis-são temática encarregada de definir asdisposições relacionadascom comunicação, cul-tura, família, edu-cação, esporte,

ciência e tecnologia. Em 1994 elegeu-se senador, cargo em que teve granderelevo e em que exerceu a liderança doGoverno Fernando Henrique Cardoso.

Como jornalista, escritor e produtormusical, destacou-se na Rádio Ministé-rio da Educação e Cultura, de que era umdos mais antigos redatores, na qual in-gressou em 1957; na Rádio Senado, coma qual colaborava há 11 anos, desde quedeixou o mandato de senador, e naRádio Roquette-Pinto, do Governo doEstado do Rio de Janeiro, cuja direçãoassumiu a convite do Governador Sér-gio Cabral e para a qual concebera umasérie de projetos, visando a revitalizá-la e a lhe devolver o antigo prestígio,parte dos quais não pôde implantar, emrazão das repetidas internações que so-freu ao longo do último ano.

Paulo Alberto Moretzsohn Montei-ro de Barros, seu nome civil, deixoudensa obra em livros, ensaios e estudosassinados com o pseudônimo que Sa-muel Wainer concebeu e que ele hon-rou ao longo de sua exemplar vida deintelectual e homem público.

É a esse companheiro que a ABI ren-de homenagens neste dia de grandetristeza.

Rio de Janeiro, 9 de maio de 2008.(a) Maurício Azêdo, Pre-

sidente.”

sica?, que depois levou também para aTV Senado.

O políticoUm dos fundadores do PSDB, Artur

da Távola liderou a bancada tucana naAssembléia Constituinte, em 1988, epresidiu a Subcomissão de Educação eEsporte na Câmara Federal, através daqual apresentou proposições sobre ati-vidades esportivas que foram incorpo-radas ao texto constitucional.

Deputado federal de 1987 a 1995 esenador de 1995 a 2003, presidiu o

PSDB de 1995 a 1997. Em 1996, lançou-se pré-candidato a prefeito do Rio, maso partido optou pelo nome de SergioCabral Filho. Em 1998, perdeu paraLuiz Paulo Corrêa da Rocha a candida-tura para a sucessão do GovernadorMarcelo Alencar.

Em 1999, anunciou seu desligamen-to da legenda, que estaria, segundo ele,se distanciando dos ideais da social-de-mocracia. Não chegou, porém, a deixaros tucanos, já que a divergência foicontornada por outros líderes do PSDB,que o convenceram a permanecer.

Em janeiro de 2001, deixou a lideran-ça do Senado para assumir a Secreta-ria de Cultura do Município do Rio,cuja denominação propôs que fossemudada para Secretaria Municipal dasCulturas, a fim de refletir a diversida-de cultural da cidade, proposta aprova-da pelo Prefeito César Maia.

Em 2002 não foi reeleito para o Se-nado. No ano seguinte, a convite doGovernador Sérgio Cabral, assumiu adireção da Rádio Roquette-Pinto, paraa qual concebeu projetos que a morteo impediu de executar.

CANTALICE SAI DO AREM CENA ABERTA

Ele discursava na reuniãodo Conselho Deliberativo

quando um infarto fulminanteinterrompeu sua fala para sempre.

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