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Jornal da ABI Junho de 2006 • Número 309 Órgão oficial da Associação Brasileira de Imprensa PARTICIPAÇÃO: Ministro da Cultura Gilberto Gil Deputada Jandira Feghali Gustavo Gindre Sérgio Gomes da Silva Ronald Siqueira Barbosa COORDENAÇÃO: Audálio Dantas

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Page 1: 2006__309_junho

Jornal da ABIJunho de 2006 • Número 309Órgão oficial da Associação Brasileira de Imprensa

PARTICIPAÇÃO:

Ministro da Cultura

Gilberto GilDeputada Jandira Feghali

Gustavo GindreSérgio Gomes da Silva

Ronald Siqueira Barbosa

COORDENAÇÃO:Audálio Dantas

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Jornal da ABI

2 Junho de 2006

EDITORIAL

Subsídios para a luta

Jornal da ABI

Associação Brasileira de Imprensa

Rua Araújo Porto Alegre, 71, 7º andarTelefone: (21) 2220-3222/2282-1292 Cep: 22.030-012Rio de Janeiro - RJ ([email protected])

Editores: Francisco Ucha, Joseti Marques e Maurício AzêdoProjeto gráfico, diagramação eeditoração eletrônica: Francisco UchaApoio à produção editorial: Ana Paula Aguiar,Fernando Luiz Baptista Martins, Guilherme Povill Vianna,Maria Ilka Azêdo e Solange Noronha.Diretor responsável: Maurício AzêdoImpressão: Gráfica LanceRua Santa Maria, 47 - Cidade Nova - Rio de Janeiro, RJ.

As reportagens e artigos assinados não refletemnecessariamente a opinião do Jornal da ABI.

DIRETORIA – MANDATO 2004/2007Presidente: Maurício AzêdoVice-Presidente: Audálio DantasDiretor Administrativo: –Diretor Econômico-Financeiro: Domingos MeirellesDiretor de Cultura e Lazer: Jesus ChediakDiretor de Assistência Social: Paulo Jerônimo de Souza (Pajê)Diretora de Jornalismo: Joseti Marques

CONSELHO CONSULTIVOChico Caruso, Ferreira Gullar, José Aparecido de Oliveira,Miro Teixeira, Teixeira Heizer, Ziraldo e Zuenir Ventura

CONSELHO FISCALJesus Antunes, Presidente; Argemiro Lopes do Nascimento,Secretário; Adriano do Nascimento Barbosa, Arthur Auto NeryCabral, Geraldo Pereira dos Santos, Jorge Saldanha e Luiz Carlosde Oliveira Chester.

CONSELHO DELIBERATIVO (2006-2007)Presidente: Fernando Segismundo1º Secretário: Estanislau Alves de Oliveira2º Secretário: Carlos Rodrigues

Conselheiros efetivos (2006-2009)Antônio Roberto Salgado da Cunha, Arnaldo César Ricci Jacob,Arthur Cantalice, Aziz Ahmed, Cecília Costa, Domingos AugustoXisto da Cunha, Domingos Meirelles, Fernando Segismundo,

Glória Suely Alvarez Campos, Heloneida Studart, Jorge MirandaJordão, Lênin Novaes de Araújo, Márcia Guimarães, Nacif EliasHidd Sobrinho e Pery de Araújo Cotta.

Conselheiros efetivos (2005-2008)Alberto Dines, Amicucci Gallo, Ana Maria Costábile, AraquémMoura Rouliex, Arthur José Poerner, Audálio Dantas, CarlosArthur Pitombeira, Conrado Pereira, Ely Moreira, FernandoBarbosa Lima, Joseti Marques, Mário Barata, Maurício Azêdo,Milton Coelho da Graça e Ricardo Kotscho

Conselheiros efetivos (2004-2007)Antonieta Vieira dos Santos, Arthur da Távola, Cid Benjamin,Flávio Tavares, Fritz Utzeri, Héris Arnt, Irene Cristina Gurgel doAmaral, Ivan Cavalcanti Proença, José Gomes Talarico, JoséRezende, Marceu Vieira, Paulo Jerônimo, Roberto M. Moura,Sérgio Cabral e Teresinha Santos

Conselheiros suplentes (2006-2009)Antônio Avellar, Antônio Calegari, Antônio Carlos Austregésilo deAthayde, Antônio Henrique Lago, Carlos Eduard Rzezak Ulup,Estanislau Alves de Oliveira, Hildeberto Lopes Aleluia, JorgeFreitas, Luiz Carlos Bittencourt, Marco Aurélio BarrandonGuimarães, Marcus Miranda, Mauro dos Santos Viana, Oséas deCarvalho, Rogério Marques Gomes e Yeda Octaviano de Souza.

Conselheiros suplentes (2005-2008)Anísio Félix dos Santos, Edgard Catoira, Francisco de PaulaFreitas, Geraldo Lopes, Itamar Guerreiro, Jarbas Domingos Vaz,José Amaral Argolo, José Pereira da Silva, Lêda Acquarone,Manolo Epelbaum, Maria do Perpétuo Socorro Vitarelli, Pedro doCoutto, Sidney Rezende, Sílvio Paixão e Wilson S. J. Magalhães

Conselheiros suplentes (2004-2007)Adalberto Diniz, Aluísio Maranhão, Ancelmo Gois, André Louzeiro,Jesus Chediak, José Silvestre Gorgulho, José Louzeiro, LílianNabuco, Luarlindo Ernesto, Marcos de Castro, Mário AugustoJakobskind, Marlene Custódio, Maurílio Ferreira e Yaci Nunes

COMISSÃO DE SINDICÂNCIAEly Moreira, Presidente, Jarbas Domingos Vaz, José ErnestoVianna, Maria Ignez Duque Estrada Bastos e Maurílio CândidoFerreira

COMISSÃO DE ÉTICA DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃOAlberto Dines, Artur José Poerner, Cícero Sandroni, Ivan AlvesFilho e Paulo Totti

COMISSÃO DE LIBERDADE DE IMPRENSA E DIREITOS HUMANOSArthur Cantalice, Arthur Nery Cabral, Daniel de Castro,Germando Oliveira Gonçalves, Gilberto Magalhães, Lucy MaryCarneiro, Maria Cecília Ribas Carneiro, Mário AugustoJakobskind, Martha Arruda de Paiva, Orpheu Santos Salles,Wilson de Carvalho, Wilson S. J. Magalhães e Yaci Nunes

A ABI inicia nesta edição a publica-

ção do texto integral das intervenções

feitas no debate que promoveu em tor-

no do tema A Questão da TV Digital, o

qual lançou luz sobre aspectos ainda

imprecisos ou nebulosos de uma te-

mática que, como assinalado na apre-

sentação das exposições efetuadas, vai

merecer as atenções dos segmentos da

sociedade preocupados com a influên-

cia que a radiodifusão, e especialmente

a televisão, tem na vida nacional. Em-

bora sujeita a decisão que se expressa

num ato administrativo aparentemen-

te comum, como outros que compõem

a rotina de gestão da coisa pública, a

discussão da questão não se esgotará

com esse édito, pois, pela relevância dos

múltiplos aspectos nela contidos, a de-

finição oficial ensejará reparos, críticas,

sugestões e, por certo, contestações.

Para falar sobre o estado em que o exa-

me do tema então se encontrava no in-

terior do Governo, a ABI convidou o Mi-

nistro da Cultura, Gilberto Gil, que des-

de o começo da atual administração as-

sumiu posição destacada em relação à

produção audiovisual no País e se tor-

nou excepcional protagonista do proces-

so oficial de reflexão sobre o tema. O

respeito que, como tal, o Ministro Gil

granjeou em relação à matéria ficou vi-

sível numa circunstância que marcou

sua passagem pelo Rio: no mesmo dia

ele foi chamado a participar de debate

sobre a tv digital não apenas na ABI, mas

também no Clube de Engenharia, acata-

da instituição gremial e técnica da socie-

dade civil, que, assim como a ABI, reco-

nheceu sua qualificação para discorrer

sobre questão tão complexa.

Embora o Ministro evitasse, por apre-

ço à ética e à desejável unidade gover-

namental, revelar a existência de enten-

dimentos diversos e até conflitantes no

âmbito do Governo, evidenciou-se para

os assistentes do debate que havia dis-

sonâncias na compreensão da matéria

entre o Ministério da Cultura e o Mi-

nistério das Comunicações, que tendia

a encarar a questão sob um prisma de

feição puramente tecnológica, em de-

trimento de fatores de caráter cultural,

social e político – este expresso na as-

piração de democratização da comuni-

cação social formulada e sustentada por

setores da sociedade que, ao contrário

do Ministro das Comunicações, têm

densa crônica de lutas em favor da de-

mocracia e do progresso social no País.

Como se verá na leitura do material

cuja publicação a ABI inicia nesta edi-

ção e conclui no próximo número de

seu jornal, o Ministro Gilberto Gil exi-

biu moderado otimismo, como se diz

na linguagem diplomática, ao discorrer

sobre o teor da decisão que o Presiden-

te da República adotaria. Admitia ele

que seria vitoriosa a posição fixada em

linhas essenciais nos grupos de traba-

lho que discutiram a matéria, integra-

dos por 12 Ministérios. Seu vaticínio

não se confirmou. Antes que junho fin-

dasse o Presidente editou um decreto

com sabor de prato-feito gestado no

Ministério das Comunicações, confia-

do a um titular cujo comportamento

ético foi objeto de questionamento no

debate, como se verá nas intervenções.

Com esta publicação a ABI quer pro-

porcionar subsídios para dotar de mais

informações quantos anseiam e lutam

por mais democracia no campo da co-

municação social. Em suma: munição

para um combate sabidamente difícil.

Aos leitores - Esta edição número 309 do Jornal daABI, com data de capa junho de 2006, foi produzidaeditorialmente e impressa na segunda quinzena desetembro de 2006.

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Jornal da ABI

Junho de 2006

omo parte das comemorações do

Dia da Imprensa, transcorrido a

1º de junho, a ABI promoveu no

dia 5 de junho um debate sobre

um tema que vai ocupar de for-

ma crescente as atenções dos se-

tores interessados na produção de comu-

nicação eletrônica e de instituições da so-

ciedade civil, finalmente despertadas para

uma polêmica e uma disputa até há pouco

circunscritas aos bastidores do Governo,

às empresas de comunicação e a segmen-

tos da comunidade jornalística: a questão

da tv digital, a nova tecnologia a ser im-

plantada no sistema de radiodifusão do

País, isto é, no rádio e na televisão.

O debate foi valorizado pela presença,

como principal convidado e expositor, do

Ministro da Cultura, Gilberto Gil, que fez

de improviso longa e fundamentada expla-

nação, na qual inseriu, lendo-o, o roteiro

da cronologia fixada no interior do Gover-

no para escolha do padrão tecnológico a ser

utilizado na implantação da tv digital. Gil,

que saiu da ABI para um debate sobre o

mesmo tema no Clube de Engenharia, dei-

xou entrever, ainda que sem admitir expres-

samente, a existência de opiniões conflitan-

tes no seio do Governo em relação ao pa-

drão a ser adotado. Ainda que sem revelar

A QUESTÃODA TV DIGITALA ABI pôs em debate um tema que vai absorver as atenções da área de comunicação e daárea cultural nos próximos meses ou mesmo anos: a questão da tv digital, a nova tecnologiaa ser adotada no sistema de radiodifusão do País — rádio e televisão. Entre os expositoresfigurou o Ministro da Cultura, Gilberto Gil, que travava nos bastidores do Governo umabatalha incruenta por um objetivo que ultrapassa o âmbito dos processos tecnológicos: ademocratização do acesso à produção de comunicação eletrônica no Brasil.

publicamente essa crença, ele acreditava que

seriam vitoriosas as proposições do segmen-

to do Governo a que se vinculava nessa

questão, empenhado em promover a demo-

cratização do acesso à produção e veiculação

de comunicação eletrônica no País.

Idealizador do evento, o Vice-Presiden-

te da ABI e Presidente da Representação

da ABI em São Paulo, Audálio Dantas, es-

merou-se no comando da organização do

debate, formulando o convite ao Ministro

Gilberto Gil, escolhendo e convidando os

demais expositores e, por fim, assumindo

o papel de moderador das intervenções,

que se estenderam por cerca de quatro ho-

ras, diante de uma assistência que lotou o

Auditório Oscar Guanabarino, o principal

da Casa. Apesar da exigüidade do tempo a

isso destinado, reduzido pela extensão com

que, entusiasmados, os expositores se en-

tregaram às suas intervenções, a platéia pô-

de formular perguntas aos integrantes da

mesa e fundamentá-las, em alguns casos

com revelações que impressionaram a as-

sistência e a própria mesa, como se deu

com a jornalista Ana Lúcia de Alvarenga

Silva, radicada há oito anos nos Estados

Unidos.

Após a abertura do tema pelo Ministro

Gilberto Gil, intervieram a Deputada

Jandira Feghali (PCdoB-RJ), que também

se retirou logo para participar do debate

promovido pelo Clube de Engenharia; o

Professor Gustavo Gindre, Diretor do Ins-

tituto de Estudos e Projetos de Comunica-

ção e Cultura-Index e membro do Inter-

vozes-Coletivo Brasil de Comunicação So-

cial; o jornalista Sérgio Gomes da Silva,

Diretor da empresa jornalística Oboré Pro-

jetos Especiais de Comunicação e Artes,

de São Paulo, e membro do Conselho Con-

sultivo da Representação da ABI em São

Paulo, e Ronald Siqueira Barbosa, Asses-

sor Técnico da Associação Brasileira das

Emissoras de Rádio e Televisão-Abert. Os

três últimos responderam ou comentaram

perguntas e intervenções da platéia.

Dada a extensão do debate, a Casa pro-

gramou a sua publicação em duas edições

especiais do Jornal da ABI, esta de núme-

ro 309, com data de capa junho de 2006, e

a de número 310, com data de capa julho

de 2006. Ambas as edições foram produzi-

das editorialmente e impressas na segun-

da quinzena de setembro, quando se ini-

ciou a sua circulação nacional. A ABI ad-

mite que a transcrição das intervenções

pode conter imprecisões de ordem técni-

ca, para cuja correção conta com a colabo-

ração dos leitores.

C

P A R TP A R TP A R TP A R TP A R T E 1E 1E 1E 1E 1

A degravação deste debate foifeita por Celeste Cintra.

A edição e montagem final do texto,por Maurício Azêdo.

A operação de som foide Neilson Lopes Paes.

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Jornal da ABI

4 Junho de 2006

Maurício Azêdo – A ABI tem a honrade receber na sua sede essa figura extraor-dinária da cultura brasileira que é o Minis-tro Gilberto Gil, a quem convidamos paraintegrar a mesa. Convido também o Vice-Presidente da ABI, jornalista Audálio Dan-tas, que será o mediador das discussões queapresentaremos. Convido ainda os Direto-res da ABI presentes, Domingos Meirelles,Diretor Econômico–Financeiro, Joseti Mar-ques, Diretora de Jornalismo, e Paulo Jerô-nimo de Souza, Diretor de Assistência So-cial. Convidamos também a integrar a mesaessa parlamentar que honra a representa-ção do Estado do Rio de Janeiro no Con-gresso Nacional, Deputada Jandira Feghali,do PCdoB. Não sei se já chegou mas ficaconvidado a integrar a mesa o DeputadoVanderlei Assis, que tem sido um aliado daABI na luta que ela trava contra a tentativado Governo Federal de se apossar do Edifí-cio Herbert Moses, sede da nossa Casa, atra-vés de uma cobrança indevida da contribui-ção previdenciária patronal relativa a cincoanos. Está presente um dos assessores doDeputado Vanderlei Assis, que nos dará ci-ência da chegada do parlamentar. Chamo,também, o Professor Gustavo Gindre, queserá um dos apresentadores do tema, e te-mos a perspectiva de chegar logo o jornalis-ta Sérgio Gomes da Silva, que vem de SãoPaulo especialmente para esta discussão.Convido ainda a integrar a mesa RonaldSiqueira Barbosa, Assessor Técnico da As-sociação Brasileira de Emissoras de Rádio eTelevisão–Abert. Sem mais delongas, passoa palavra a Audálio Dantas

Audálio Dantas – Quero primeiro agra-decer a presença do Ministro Gilberto Gil,que aceitou, sem um minuto de hesitação,o convite para debater esse tema tão atu-al, importante e fundamental para o Bra-sil que é a implantação de um sistema di-gital de televisão e rádio. Agradeço tam-bém a presença de Gustavo Gindre, que éDiretor do Instituto de Estudos e Projetosde Comunicação e Cultura–Index, uma dasentidades da sociedade civil que se empe-nham, há muito tempo, na necessidade dedebatermos profundamente essa questãode interesse nacional.

Contaremos com a presença do Minis-tro até por volta das 18 horas e portantonão vamos nos alongar, mas gostaria de fa-zer algumas referências a esse impor-tante fato que é a chegada da televisãoe rádio digital no País e os debates quese vêm dando no Brasil, há mais de umano, por várias entidades, que chamama atenção para um aspecto no meu en-tender fundamental, que é a questãoda democratização da comunicação noPaís. Essas lutas que estão se desenvol-vendo neste momento são continuaçãode outras que temos desenvolvido noCongresso Nacional, nos meios jornalísti-cos, nos sindicatos, na Federação Nacionaldos Jornalistas e nesta ABI sobre a neces-sidade de termos uma comunicação socialefetivamente democratizada que possibi-lite o acesso de todos os setores da socie-dade. O advento da tecnologia digital, dopadrão digital de televisão e rádio, é umaoportunidade para que discutamos, por

exemplo, a necessidade de termos novomarco regulatório das comunicações noPaís, uma vez que a legislação que rege oassunto é antiga, de 1962, e portanto ne-cessita, urgentemente, de uma atualização.

Além da discussão em torno do padrãotecnológico a ser adotado, a ABI entendeque é importante, cumprindo seu papel his-tórico de defesa das liberdades democráti-cas, discutir não só o acesso dos diversossetores da sociedade a essa nova tecnolo-gia, mas também o conteúdo dessa televi-são, que televisão o povo brasileiro espera,que não seja apenas uma televisão de altadefinição, mas uma televisão que permita,por exemplo, a regionalização da produção,o acesso de novos atores, produtores, en-tre outros aspectos.

Agradeço, em nome da ABI, a presença doMinistro Gilberto Gil, do companheiro Gus-tavo Gindre e de outros que participarãodeste debate. E passaremos, então, imedia-tamente, a palavra ao Ministro Gilberto Gil.

Gilberto Gil – Muito obrigado. Querosaudar o Presidente Maurício Azedo, nos-sos companheiros de diretoria, todos os queestão conosco aqui na mesa, nossa Depu-tada Jandira Feghali, estimada e conheci-da deputada do Rio de Janeiro, e todos osrepresentantes do sistema de comunicaçãosocial, todos os jornalistas reunidos em suaCasa, esta Casa que abriga o mundo, o pen-

samento e a própria institucionalidade domundo jornalístico.

Muito obrigado a todos pelo convite epela presença também, já que, exatamen-te como ressaltou Audálio, essa questão éaltamente relevante, como tantas outrasque dizem respeito ao mundo público, àsrelações entre o mundo público e a vidacomo um todo, especialmente as questões

que são da esfera pública, questões queenvolvem o Estado e o papel mediador doEstado. Todas essas questões precisam efe-tivamente da participação de todos, da dis-cussão de todos, especialmente quando tu-do isso se coloca sob a égide da vida demo-crática, do princípio democrático, do prin-cípio da participação social, da participa-ção de todos, do exercício da soberania am-pla, soberania múltipla, pulverizada nofragmento de cada indivíduo, de cada ci-dadão, e representada no sentido aglutina-dor, podemos assim dizer, exatamente peloEstado e suas várias áreas de representa-ção institucional.

O Audálio também se referiu ao fato deque eu de pronto aceitei o convite para viraqui e outra não foi a razão, exatamenteessa discussão de que estamos falando, anecessidade dessa discussão, a necessidadede que ela se amplie, a necessidade de queela se faça de forma abrangente, transbor-dante para todos os campos, para todas asáreas de interesse da sociedade, seja de in-teresses mais materiais, negociais, comer-ciais e todos os que exploram aspectos co-merciais, negociais envolvidos com essasquestões, seja pelos usuários, pelo públi-co, pelos cidadãos, pela ponta do consumodo bem cultural, da vida cultural, da di-mensão cultural. E que todos esses homens,mulheres, jovens, crianças desfrutem a co-municação social, de seus campos, dessemundo da comunicação social.

Portanto, vir debater, vir discutir, trazen-do a palavra, trazendo a posição, trazendoa visão de uma das partes importantes doGoverno envolvida nessa questão toda, éuma obrigação nossa, é um trabalho. Esta-mos aqui fazendo exatamente isso que es-tamos convocando a sociedade a fazer, de-bater a questão, discutir a questão, se in-formar, se instruir a respeito do que seja,dos aspectos inovadores de um novo mo-delo de televisão, daquilo que, ao mesmotempo, permanece, o que na televisão di-gital continua sendo a televisão de sempree o que na televisão digital passa a ser umaoutra coisa.

Há na sociedade uma divisão de imedia-to em relação a essa questão, porque hásegmentos da sociedade que envolvem de-tentores de direitos adquiridos, que envol-vem interessados na exploração industri-

“O advento do padrão digital de televisão e rádio é umaoportunidade para que discutamos a necessidade denovo marco regulatório das comunicações no País, umavez que a legislação que rege a matéria é antiga, de 1962,e portanto necessita, urgentemente, de uma atualização.”

Audálio Dantas

IDÉIAS EM CONFRONTOO Ministro Gilberto Gil feza intervenção de aberturado debate A Questão daTV Digital. À mesa, JosetiMarques, Gustavo Gindre,Jandira Feghali, MaurícioAzêdo e Audálio Dantas,moderador da discussão,que se estendeu por cercade quatro horas, noAuditório OscarGuanabarino, na ABI.

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Jornal da ABI

Junho de 2006

al, etc, e não só esses, como vários ou-tros do próprio público, muitos outrosdo próprio público defendem uma per-manência, uma transposição pura esimples do modelo analógico, que é omodelo de televisão que está em vigên-cia até agora, uma mera transposiçãodesse modelo para o modelo digital coma pura e simples garantia de direitos jáadquiridos nesse espaço, já ocupado pe-los atores que já estiveram e estão emcena e não mais que isso.

Já uma outra área da sociedade, porrazões evidentes também, por razões,exatamente, da defesa do interesse pú-blico, da compreensão da dinâmica dosprocessos, da transformação necessáriaque os tempos impõem a tudo o que éhumano, a todos os afazeres humanos,essa outra área da sociedade entendeque a televisão digital, por se tratar deum outro estágio tecnológico, de umaoutra oferta de possibilidades múltiplas,diferenciadas tal e tal, trata-se, portan-to, de um novo modelo, e, portanto,para ele, tem que merecer uma novaabordagem, uma nova oferta de espaços,um novo dimensionamento.

Nessa discussão, evidentemente, comolhe cabe uma série de definições, uma de-las, a primeira, logo, que é a questão domodelo técnico, a opção tecnológica, o Es-tado terá que se manifestar. E essa pauta éa pauta mais atual, é a pauta quente nomomento, é a pauta que tem provocadoas maiores discussões no geral da socieda-de, e, também, internamente no Governo:é exatamente a definição do modelo tec-nológico que a tv digital vai ter no Brasil.

Todos nós sabemos que há uma ofertainicial de três modelos: um modelo ameri-cano, que foi o primeiro, digamos assim, aser desenvolvido no mundo, a partir doqual, inclusive, se desenvolveram tanto omodelo europeu, num segundo momento,e o modelo japonês, num terceiro e já maisqualificado momento de utilização da acu-mulação adquirida. Todos três são, portan-to, modelos de uma matriz, essa primeiramatriz americana que deu o modelo euro-peu e, depois, o modelo japonês.

É preciso saber, também, que esses mo-delos não são os únicos a serem ofertados.Eles talvez apareçam como oferta mais vi-sível por estarem ligados a forças econô-micas, políticas e sociais poderosas, comoo caso dos Estados Unidos, da União Eu-ropéia e do Japão, que é uma das grandespotências econômicas, uma das grandespotências industriais, especialmente, nomundo moderno. Há outros modelos queestão sendo oferecidos.

Um deles é o ainda não completamentedesenvolvido, mas já em desenvolvimen-to, o modelo brasileiro. Há na China, porexemplo, só internamente na China, o de-senvolvimento de quatro modelos que elesdesenvolveram para eles, mas que eviden-temente estão ofertados também interna-cionalmente. É possível que haja outrosmodelos. Enfim, essa questão tecnológicaé uma questão portanto ampla, aberta.

Uma das necessidades, por exemplo, vis-ta como básica e imediata, é que o Brasil sepronuncie com relação a essa questão de sua

própria capacidade de modelagem, de umamodelagem para a televisão digital ou de suacapacidade de complementação dos mode-los em oferta no mercado com as tecnologi-as, enfim, com os aperfeiçoamentos desen-volvidos pelo próprio Brasil. Sabe-se, porexemplo, que além dos três modelos empauta –– americano, europeu e japonês ––há tecnologias desenvolvidas no Brasil, apartir de Porto Alegre, do Rio de Janeiro, daParaíba, de Minas Gerais; são 22 institutostécnicos envolvidos nisso, incluindo as uni-versidades, etc. O funcionamento otimiza-do desses modelos –– americano, europeu ejaponês –– só se dá, no caso das exigênciasbrasileiras, no caso de exigências geográfi-cas, topográficas, etc, com o acoplamentode dimensões de unidades técnicas, tecno-lógicas desenvolvidas no Brasil.

Tanto é que qualquer modelo que sejaadotado, dos três que estão em pauta ago-ra, porque parece que o Brasil finalmentedecidiu manter a possibilidade de escolhadentro da oferta desse três modelos, qual-quer dos três modelos que venha a ser es-colhido terá, necessariamente, que ser aper-feiçoado para uso no Brasil com as tecno-logias desenvolvidas no Brasil.

O que importa, no entanto, para a so-ciedade brasileira não é exatamente só essaquestão da dimensão tecnológica. É o quea televisão digital vai mostrar e para quemvai mostrar. Interessa saber se a nova tec-nologia permitirá maiores opções de esco-

lha de programas gratui-tos; se a nossa diversida-de cultural e a diversida-de cultural do mundo es-tarão acessíveis em todosos lares e escolas; se todaa população ou que per-centual dessa populaçãoterá acesso à nova mara-vilha da comunicação.

Interessa saber a quali-dade técnica da imagem edo som, mas interessamuito mais –– essa é umacrença do Governo brasi-leiro e eu acredito que éuma crença da parte maissignificativa da sociedadebrasileira –– o que estarádentro desse invólucromágico da televisão digital.

Os estudos de pesqui-sadores brasileiros no âm-bito do Sistema Brasileirode TV Digital, que tem asigla SBTVD, proporcio-naram ao Governo umavisão completa sobre asmuitas questões envolvi-

das na transição da televisão analógica paraa digital. Contudo, o debate atual na mí-dia tem focado apenas ou mais particular-mente o padrão de modulação, responsá-vel pela transmissão e recepção dos sinais,um dos aspectos-chaves de qualquer siste-ma de televisão digital, mas não o únicoaspecto importante.

Discute-se se o Brasil adotará o padrãonorte-americano, japonês ou europeu, oumesmo uma inovação inteiramente nacio-nal, que já tem até o nome de sorça, de-

senvolvido pela Puc do Rio Grande do Sul.É um debate ainda tímido, que não podese restringir ao Governo. Tímido, porqueretira o foco das principais questões envol-vidas na implantação da tv digital, como aestruturação de uma política industrialcalcada na microeletrônica. Essa é uma dasquestões básicas: o próprio mundo indus-trial brasileiro pode se beneficiar de umaimplantação desse tipo. Há a questão dasfábricas de semicondutores, toda a indús-tria de microeletrônica, dos aplicativos quevão não só para a televisão digital mas parauma série de outras utilizações dessas pe-quenas máquinas, desses pequenos eletrô-nicos, desses miúdos eletrônicos que temospor aí. A incorporação de tecnologia brasi-leira, como já venho falando, pode assegu-rar a otimização do uso do espectro de ra-diofreqüências e a construção de uma po-lítica para produção e difusão de conteú-dos audiovisuais nacionais.

Aí entram questões a que vamos nos re-ferir, e já referindo uma delas, a questãoregional e aqui está uma das defensoras daquestão da regionacionalização, através deum projeto de lei que já está em tramita-ção no Senado prevendo exatamente a ex-tensão das políticas industriais relativas àcultura e especialmente relativas à radio-difusão nas diferentes regiões, conferindoàs regiões a capacidade de produzir, distri-buir e portanto difundir produção televisi-va para todo o Brasil.

O espectro de radiofreqüências é umbem público escasso, cuja utilização deveresguardar o atendimento do interesse pú-blico. No mundo digital não há mais sen-tido em se falar em canais. Muito da con-fusão presente no tema, especialmente naforma como o público em geral apreende ecompreende os elementos dessa discussão,é causada por essa visão de que se trata exa-tamente de uma transposição de canaisanalógicos para canais digitais. Como refe-ri no início, muitos são a favor de que hajauma mera e simples transposição do mun-do analógico para o mundo digital, mas nãoé assim. No mundo digital não há mais sen-tido em falar em canais. Os mesmos 6 Mhque hoje dão vazão a uma programação detelevisão no mundo analógico possibilita-rão com técnicas de compressão que oitoprogramações digitalizadas cheguem à casados telespectadores, caso se opte pela trans-missão em definição padrão. Caso não seopte pela transmissão em alta definição, queé um dos benefícios que a tecnologia digitaltraz, os grandes radiodifusores de hoje vãoquerer adotá-la, inclusive porque na dispu-ta internacional precisam estar na alta defi-nição, na high definition; ainda que optempor alta definição para transmissão de par-te de sua programação, ainda assim é possí-vel a existência de programação de mais qua-tro chamados canais, hoje chamados canais,ou seja, quatro outras programações em de-finição padrão. Portanto, compartilhandoespectro entre alta definição para uma par-te dele e para o uso convencional como oanalógico de hoje para uma outra partedesse espectro.

A passagem do paradigma dos canais parao paradigma das programações exige que seponha na mesa uma análise sobre o mode-

ALÉM DA TECNOLOGIAA decisão sobre a tvdigital envolve aspectosque ultrapassam o âmbitode questões tecnológicas,sustentou Gilberto Gil.

“Há segmentos dasociedade quedefendem umatransposição pura esimples do modeloanalógico, que é omodelo de televisãoem vigência agora,com a pura esimples garantia dedireitos jáadquiridos nesseespaço, já ocupadopelos atores que jáestiveram e estãoem cena.”

Ministro Gilberto Gil

VALTER CAMPANATO/ABR

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Jornal da ABI

6 Junho de 2006

lo de exploração da televisão digital. É estauma discussão que independe da escolhada modulação, do padrão a ser adotado. Aotimização do uso do espectro abre espa-ço para que novas programações cheguemaos telespectadores. Emissoras de interes-se público hoje disponíveis apenas por as-sinatura poderão chegar às casas de mi-lhões de brasileiros, assim como emissorascomunitárias, universitárias e, natural-mente, novas redes de emissoras públicase comerciais. Abre-se aqui a discussão deuma nova política pública para o audiovi-sual brasileiro.

O dinamismo da indústria audiovisual,com a geração de mais e melhores empre-gos, depende da criação de novos instru-mentos legais para o setor que contemplempreceitos constitucionais, como o estímu-lo à programação regional e a veiculaçãoda produção independente brasileira nasemissoras públicas e comerciais, preceitosamplamente adotados já em vários países.

A regulamentação desses preceitos cons-titucionais assegurará a potencialização daprodução audiovisual brasileira e a expres-são da diversidade cultural do País na tele-visão aberta, meio de comunicação maisacessível aos brasileiros e, se puder dizer,acho que posso, meio de comunicação maisacessível a todas as populações do mundo.Está aí a Copa do Mundo que não me dei-xa mentir. Quase 2 bilhões de telespecta-dores assistirão aos 64 jogos da Copa naAlemanha.

A criação de novo marco regulatório pa-ra o audiovisual e para a comunicação so-cial brasileira envolve aspectos políticos,econômicos e culturais que antecedem,perpassam, acompanham e eu diria mes-mo sucedem a implantação da tv digital.Trata-se de um debate público necessáriocujos resultados são fundamentais para acultura e para a democracia brasileiras epara a consolidação do País como grandeprodutor de conteúdos na era das conver-gências e da economia digital.

Vou ler agora para vocês um resumo depontos que o Governo e o nosso Ministé-rio, como parte dos grupos, de vários, dealguns dos grupos de discussão intragover-no, vêm examinando nessa questão. Sãoposições que estão sendo emanadasdessas discussões que o Governo vemfazendo.

Desde o início do processo de desen-volvimento do Sistema Brasileiro de Te-levisão Digital se pactuou no âmbitodo Comitê de Desenvolvimento, que éformado por 10 ou 12 Ministérios, e doGrupo Gestor, que é um grupo de téc-nicos, envolvendo técnicos do Gover-no, técnicos de entidades do setor téc-nico brasileiro, universidades, os 22 ins-titutos que mencionei, que o que im-porta no caso do sistema digital são arobustez, a flexibilidade, a mobilidade,a portabilidade e a interatividade.

Essas são condições, digamos assim, quevão ser preechidas e buscadas pelo modelotécnico a ser adotado. Há modelos que sãomais robustos, outros que são mais flexí-veis e menos robustos, outros que têm mo-bilidade. Eu até me referi aqui no início àquestão da robustez que todos os três sis-

temas terão no Brasil ao adotarem técni-cas desenvolvidas no País. Os três sistemassó se tornarão suficientemente robustosem termos das necessidades brasileiras casoadotem tecnologias que forem desenvol-vidas aqui no Brasil.

Ao lado disso, se definiu que o SistemaBrasileiro de TV Digital deverá permitir ainclusão digital, portanto permitindo a ope-ração de outros serviços que não apenas aradiodifusão: serviços de saúde, de educa-ção, governo eletrônico, e assim por diante.Considerou-se ainda que ele abre oportuni-dades para a entrada em cena de novos agen-tes na radiodifusão brasileira, ao mesmotempo que exige, dado o cenário de conver-gência, marco regulatório claro para o setorda comunicação social eletrônica e por con-seqüência para o setor das telecomunicaçõesquando as empresas de telecomunicaçõesaspirem a operar serviços assemelhados.

Eis o caso: as telefônicas, através dos ce-lulares, etc, através de todas essas possibi-lidades eletrônicas que têm hoje, já dispu-tam espaços importantes na difusão deconteúdo, na difusão de programação emcompetição clara e aberta com os teledifu-sores, os radiodifusores tradicionais e os ou-tros novos jogadores, digamos assim, queestão surgindo por aí.

Segundo o decreto que disciplinou oprocesso do Sistema Brasileiro de TV Di-gital foram estabelecidos os objetivos quedevem ser atendidos com as pesquisas decapacidade nacional, com o trabalho doGrupo Gestor e com as decisões do Comi-tê de Desenvolvimento. Esse decreto evi-tou consagrar privilégios no início do pro-cesso, ao mesmo tempo que assegurou, eisso é importante que seja frisado, assegu-rou ao setor da radiodifusão o respeito aosseus direitos adquiridos. Toda a questãovem sendo discutida a partir dessas pre-missas básicas.

Com a percepção clara de que não é pos-sível o Brasil desenvolver a curto prazo umnovo padrão, os trabalhos do Grupo Gestorse orientaram para, por um lado, continuaras pesquisas no sentido de identificar as ino-vações brasileiras que poderão ser incorpo-radas a um dos padrões existentes; por ou-tro lado, para fazer os estudos necessários

para a implantação da televisão digital noBrasil. Trata-se portanto de um debate com-plexo, com diversas implicações.

As pesquisas realizadas apontaram ca-pacidade brasileira de chegar a inovaçõesque poderão a ser incorporadas a um dospadrões. Já falamos muito disso. Em geral,os grupos precisam de um pouco mais de

tempo para desenvolver protótipos e paraque os mesmos sejam integrados e testa-dos com os sistemas em questão, o euro-peu, o norte-americano e o japonês.

Há um problema que vem sendo supera-do com a extensão dos prazos iniciais, queé exatamente o problema dos prazos. Hou-ve naquele momento, quando o decreto foifeito, uma pressão de prazos. O prazo inici-al para que a decisão governamental fossetomada era até fevereiro deste ano; esse pra-zo já foi estendido. Essa pressão de prazos,portanto, já não é tão grande quanto eraantes. Havia também a pressão, e aí por in-teresses justificáveis dos radiodifusores, paraque já essa Copa do Mundo fosse transmi-tida no Brasil a partir da televisão digital, jácom o processo de tv digital. Isso tambémnão foi possível. E esse adiamento causouuma extensão favorável do prazo para queessas discussões, essas análises técnicas eesses aperfeiçoamentos fossem feitos.

E o que é esse processo?A- Esse processo implica em identificar

as inovações que poderão ser aproveitadas.Definir a partir do acompanhamento feitopelo CPqD e pelo Grupo Gestor quais asinovações têm maturidade para seremaproveitadas em qualquer dos sistemas pré-existentes.

B- Seguir a pesquisa. Continuar o desen-volvimento das inovações definidas paraque elas possam ser incorporadas em umdos sistemas a curto prazo e manter linhasde pesquisas que sigam investigando ou-tras possibilidades de inovação a médio e alongo prazo.

A tv digital é um mundo aberto a ino-vações, a desenvolvimentos, a transforma-ções, etc., etc. Portanto, o papel da políticaindustrial brasileira nesse campo não se es-gota na definição de qual padrão vai seradotado. É uma coisa que tem de seguiradiante. Esses institutos todos envolvidostêm de continuar suas bases de pesquisas,têm de aprofundar essas pesquisas, têm dedesenvolver novos produtos, têm de dar va-zão a essa extraordinária criatividade quedemonstraram ter até agora.

C- Negociar política industrial com asbases tecnológicas aprontadas e com o mo-delo arranjado. Negociar com a indústria aprodução e os tempos.

D- Indicar o modelo de negócios. Con-cluir qual o modelo de negócios emergecom a implantação da tv digital. O que sequer manter, o que se quer incentivar e oque se quer evitar.

E- Definir o arranjo regulatório. Decidirque modelo regulatório o País adotará naoperação da tv digital. Quem poderá pres-tar o serviço. Em que bases deverá prestaro serviço. O que poderá ser realizado alémde televisão aberta. Como será a conces-são da faixa de espectro necessária à trans-missão. Como estará definida a situaçãoda tv pública na tv digital. Que novos agen-tes poderão operar com base na tv digital.Que serviços poderão operar. Interface, re-de, regional quem programa, como progra-ma e assim por diante.

F- Política de apoio à produção de con-teúdo de forma complementar. É precisoarticular a implantação da tv digital como desenvolvimento de uma política de pro-

UM MUNDO ABERTOPara Gil, o que interessano sistema digital é o queele pode oferecer emrobustez, flexibilidade,mobilidade, portabilidadee interatividade. A tvdigital, disse, é um mundoaberto a inovações, adesenvolvimentos e atransformações.

“O dinamismo da indústria audiovisual, com a geraçãode mais e melhores empregos, depende da criação denovos instrumentos legais para o setor que contemplempreceitos constitucionais, como o estímulo à programaçãoregional e a veiculação da produção independentebrasileira nas emissoras públicas e comerciais,preceitos já amplamente adotados em vários países.”

Ministro Gilberto Gil

MARC

ELLO C

ASAL JR/ABR

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dução de conteúdos. Trabalhar com as no-vas possibilidades de formato, com o estí-mulo à formação de pólos de produção lo-cal, com a incorporação de produção inde-pendente, com o equilíbrio entre a produ-ção nacional e a produção local.

As ações imediatas que o Governo en-tendeu como necessárias naquele momen-to em que se definiu esse papel do Estado.Montar uma força-tarefa para as negocia-ções, força que deve conduzir as negocia-ções com os países vizinhos interessados.Ainda há pouco surgiu na imprensa a ques-tão da divergência argentina com relaçãoao padrão. A Argentina parece inclinar-sepelo padrão americano ou europeu, en-quanto o Brasil parece estar se inclinandopara o padrão japonês. Havia no início umaexpectativa de que a América do Sul fossetoda ela com um padrão só para possibili-tar compactuações conceituais, tecnológi-cas, produção de escala otimizada, etc. frui-ção da produção industrial dos países to-dos, criação de mercados externos e tal.Não se sabe se isso vai ser possível.

G- Diretriz para que o Grupo Gestor ul-time as definições necessárias para umaavaliação de conjunto pelo Comitê de De-senvolvimento, preparando uma tomadade posição conjunta do Governo, que é exa-tamente o que está se dando agora. EsseGrupo Gestor informou, instruiu, abaste-ceu o Comitê de Desenvolvimento forma-do pelos Ministérios de todas as informa-ções, de todos os dados necessários paraque eles tivessem uma base de apoio paraas suas decisões e é exatamente esse pro-cesso que estamos vivendo no momento.

H- Manter acompanhamento do proces-so em nível ministerial. Isso está sendo fei-to. Monitorar essa questão dos prazos, essaquestão dos compromissos, mais ou me-nos, parcialmente ou integralmente assu-midos entre o Brasil e algumas áreas doexterior.

Enfim, toda essa discussão vai ser mes-mo sobre o sistema japonês, a modulaçãojaponesa; a modulação européia; a modu-lação americana. Nós estamos agora em fa-se de decisão. A impressão que temos noGoverno é que há um amadurecimento re-lativamente grande com relação a questõestécnicas, porém há muito a amadurecer comrelação ao que sucederá à definição técnica,ou seja, a questão da lei das comunicaçõessociais, de que ela tratará, o que ela abran-gerá; a questão do marco regulatório, comoserá feito, se teremos uma agência, se nãoteremos uma agência, se a agência que jáexiste no âmbito das comunicações será do-tada do que precise se complementar paraessas tarefas ou se uma outra será criada.

Enfim, essa questão toda do marco re-gulatório: como serão tratados os novosplayers ou novos atores, as telecomunica-ções. Essa questão regulatória está sendotambém definida agora, e, portanto, aí noque diz respeito mais diretamente ao Mi-nistério da Cultura, como regulará a polí-tica de produção e difusão de conteúdosno Brasil; do audiovisual de modo geral e,em particular, daqueles que terão abrigo nadifusão, na produção mas especialmentena difusão via televisão digital.

Dei um apanhado geral de como as coi-

sas estão, como estamos vendo as questõeslá no Governo e como temos tratado essasquestões e gostaria de deixar um espaçopara que outros se manifestem.

Maurício Azêdo – Antes de passar adireção dos trabalhos novamente ao nos-so Vice-Presidente Audálio Dantas, a mesaregistra que chegou e está já com assentoà mesa o nosso companheiro jornalista Sér-gio Gomes da Silva. Sem desapreço a ou-tros membros da ABI, nós queremos regis-trar com especial carinho a presença entrenós na platéia do jornalista e ex-Senador Ar-thur da Távola, que foi o relator das maté-rias relacionadas com comunicação social

na Assembléia Nacional Constituinte, etambém a presença do nosso companheiroConselheiro da ABI, tal como Arthur da Tá-vola, Fernando Barbosa Lima, que foi o pio-neiro da televisão de qualidade no Brasilatravés de programas que criou em diferen-tes emissoras. Por fim, a mesa registra asmensagens de cumprimentos à ABI e aoMinistro Gilberto Gil enviadas pelo Secre-tário de Estado de Segurança Pública, Ro-berto Precioso Júnior, pelo Secretário Mu-nicipal de Obras, Carlos Eugênio Adegas,pelo Prefeito Municipal de Santo Antôniode Pádua, Luis Padilha Leite, dos Deputa-dos estaduais Alberto Brizola, Andréa Zito,Dica, Léo Vivas e Edna Rodrigues, da Ve-readora Tereza Bergher e dos Vereadores Je-rominho e Dr. Adilson Soares.

Devolva a palavra e a direção dos traba-lhos ao nosso companheiro Audálio Dantas.

Audálio Dantas – Agradecendo maisuma vez as palavras do Ministro Gilberto Gil,nós damos continuidade a esse debate dan-do a palavra à Deputada Jandira Feghali.

Jandira Feghali – Eu cumprimento eagradeço à Associação Brasileira de Impren-sa por ter me incorporado a este debate. Naspessoas de Maurício Azêdo e de Audálio eucumprimento todos os diretores da ABI eos Conselheiros como Arthur da Távola eFernando Barbosa Lima. Cumprimento onosso Ministro Gilberto Gil, que democra-ticamente, estimula este debate em todo oPaís de forma muito consistente e aberta.Cumprimento as entidades aqui represen-tadas e particularmente um parceiro de mui-tos debates, Gustavo Gindre.

E eu entraria aqui; rapidamente, num

primeiro conceito que me parece muito im-portante que é a compreensão de que de-bater a comunicação é debater a democra-cia, até porque nós lidamos – e até aquinesta Casa tão importante à democraciabrasileira na sua trajetória, como, também,no presente – nós temos a clareza absolu-ta de que comunicação é estratégia parademocracia, comunicação é uma conces-são pública, a produção pode ser privadaem muitas televisões, mas o transporte dainformação é público e tem que seguir, por-tanto, a caracterização da Carta Magna pe-la função social lá determinada. E o artigo221 é um parceiro nessa definição do que éa comunicação e do que ela deve atender.

Lá, nos incisos do artigo221, estão explicitados aregionalização, o espaçoà produção independen-te, a função educativa,cultural, ética, etc, etc enós sabemos o que a in-gerência política temproduzido, dependendode sua linha editorial, noresultado inclusive deeleições no Brasil, de des-tinos do País. Tudo issonós todos conhecemosaqui e não precisamosdelinear aqui esses aspec-tos fundamentais.

Nesse sentido, o deba-te sobre tv digital tem

tido, dentro do que nós enxergamos, umagrande parceria com o Ministério da Cul-tura numa posição avançada, como tam-bém da Ancine. Temos vivenciado esse de-bate de uma forma muito próxima na vi-são do que deve ser esse novo modelo datelevisão brasileira. Eu só fico triste por-que o rádio não está envolvido com tantaintensidade nesse debate e o rádio é uminstrumento importante também da co-municação no Brasil.

E esse debate da tv digital por algumtempo ficou extremamente enviesado. Sin-ceramente, nem ao Ministério da Cultura,nem à sociedade importa muito centrar odebate se o modelo é europeu, japonês ouamericano. O que importa é criar um sis-tema brasileiro de tv digital, em que o cen-tro do debate seja qual o modelo de explo-ração da nova televisão brasileira. De fatoeu nunca vi nenhuma manifestação na ruaem que a sociedade se mobilizasse com fai-xas sem fantasma.

Nossa preocupação maior é: que televi-são será essa? Será de fato mais democra-tizada ou se manterá concentrada com osmesmos radiodifusores de hoje? Abrirá es-paço para novos radiodifusores, para a ra-diodifusão comunitária, para a televisãoeducativa, para nova função. Hoje há ca-nais que ficam vendendo boi, jóias, tape-tes, a noite inteira. Esse não é um progra-ma que nós gostaríamos de continuar ven-do na televisão brasileira. Mas é que tipode programação, que público vamos atin-gir e qual o conteúdo?

Essa é uma palavra-chave para nós. Qualé o conteúdo da nova programação brasi-leira? E isso a tv digital proporciona: umamultiplicação de possibilidades, de demo-

QUE TV SERÁ ESSA?A Deputada JandiraFeghali questionou qual atv que virá com o sistemadigital: uma democráticaou concentrada, comoagora? Abrirá espaçospara novos radiodifusorese para a tv comunitária?

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cratizar essa informação, de mexer no con-teúdo como nunca antes na história de paísnenhum. E eu acredito que esse debate, naminha opinião, ainda está pequeno, atéporque a televisão de maior audiência noBrasil não tem na sua programação umprograma de debates, nem para debaterisso. Não tem. Nem meia hora de progra-ma de debate.

Então, nós não temos muitas vezes comofazer a sociedade brasileira entender quetema é esse que nós estamos debatendo. Éo modelo tecnológico que estamos debaten-do? Não é. E esse é para mim um aspectomuito definidor. Essa questão da outorga eda concessão, se nós vamos passar a ter umatransição, se vamos ter por um bom tempoainda a chamada tv analógica e nós vamospassar a ter num período largo de transiçãoà tv digital, o que vai importar muito nonovo marco regulatório, que será necessá-rio, é como será feita a outorga.

E isso é que a grande radiodifusão nãoquer debater. Agora se vê: eu já tenho 6 Mhna tv analógica e quero continuar tendonovos 6 Mh na tv digital. E com isso a pró-pria Anatel diz que nos próximos 10 anosnão entra mais ninguém na radiodifusãobrasileira. E esse é o problema que a gran-de radiodifusão não debate. TV Globo, TVBandeirantes, SBT, todos só querem deba-ter como ficará a outorga da tv digital .

TV Cultura também entra, como disseo Deputado Miro Teixeira?. Todo mundosó quer debater isso. Terei novas outorgaspara novos radiodifusores ou vou ampliarna medida em que eu comprimo a infor-mação num espaço menor? Pela tecnolo-gia digital eu posso multiplicar a entradade novos radiodifusores, de uma nova pro-gramação de conteúdo.

E aí, de fato, é irmã gemea desse debate aregionalização da produção cultural, artísti-ca e jornalística porque essa é a possibilida-de de você democratizar e interferir no con-teúdo da tv aberta, porque o Brasil tem 93%da população com tv aberta. A tv por assi-natura é 7%, caindo inclusive pelo preço.

Então é essa televisão diferentemente doJapão, de países da Europa.

Nós temos de fato aqui uma tv demo-crática no sentido do acesso, o proble-ma é que conteúdo não é e quem faz aprogramação também não é, é concen-trado e isso é poder. Esse para mim é ogrande embate que precisamos fazer epara isso precisa de fato de um novo mar-co regulatório. Eu estou no CongressoNacional desde 1991, lá se vão 16 anos,e a todo momento em que esse debateentra ele é paralisado.

Já teve a Lei de Informação Demo-crática – a Lide –, ficou lá, está lá na ga-veta desde então. A Frente Parlamentarda Radiodifusão Comunitária avançouna legislação mas ainda é uma legisla-ção dificílima que está levando milha-res de rádios comunitárias a não conse-guir se manter. A regionalização da pro-dução nós conseguimos pensar, andou,aprovou na Câmara, está no Senado en-gavetada há três anos e meio. Agora nósestamos tentando desencavar de novocom a ajuda do Ministério da Cultura.

Vai se discutir tv digital, que é umdebate que está na Comissão de Ciên-cias e Tecnologia há mais de dez anos.Eu tenho participado de todos esses pro-cessos da Lide, da radiodifusão comunitá-ria, etc e tal, mas na hora da definição nósprovocamos o Presidente da Câmara numseminário e isso não foi feito. Mas nós que-remos participar das definições. Queremosdecidir o novo marco regulatório. E o de-creto que o Governo venha a fazer por de-finir um padrão tecnológico não pode,como decreto, entrar em questões da lei,porque vai começar uma briga jurídica ab-surda, a partir inclusive do Ministério Pú-blico.

Um decreto não pode mudar a lei. E a leide 1962 está absolutamente ultrapassada,mas no que está em vigor ela proíbe inclusi-ve uma dupla autônoma (?) E isso não podeser mudado por decreto. Então, o novo mar-co regulatório é decisivo para nós. Outro diao Gindre lembrava como esse debate é difí-cil no Congresso. Em 1962 foram coloca-

dos 50 vetos pelo Governo Jango na leide 1962. E os 50 foram derrubados noCongresso. Para ver como esse emba-te no Congresso é difícil, a gente sabecomo os lobbies funcionam, princi-

palmente nessa área, porque issotem relação direta com o poder.

A lei geral da comunicação es-tá sendo produzida, mas nós

não podemos aguardar isso. Achoque precisamos avançar no mar-co regulatório da digitalização,que dá imensas possibilidades,

como Gil estava dizendo. A in-teratividade, você ter internetna televisão, é um programa

de inclusão digital brutal. Émuito importante que tenha-mos isso. Então todo o pro-cesso de um novo momentoda televisão brasileira temque levar em conta paraquem e para quê.

E esse é um debate que,na minha opinião, está

curtinho. Se você perguntar ali na rua oque é tv digital, o que está em jogo, nin-guém sabe. É porque o debate ainda estáintramuros e assim limitado às iniciativasdemocráticas das entidades ou a um semi-nário do Congresso Nacional, que só foicoberto pela TV Câmara. Nenhuma gran-de televisão fez uma divulgação do semi-nário que se fez lá.

Uma outra questão que eu quero levan-tar é que a gente fala em reforma política.Será que é possível uma reforma políticaestrutural com o debate democrático con-centrado assim? Tudo tem relação. Se eunão democratizo a comunicação, eu nãoconsigo debater uma reforma política ade-quada, porque a opinião pública sempre vaiachar que cláusula de barreira é bom, querestringir partido é bom, que ter dois par-tidos é mais democrático; isso é que pegaporque é isso que a grande mídia divulga.

E a gente não tem o mesmo espaço deconfrontar esse tipo de discussão, cuja con-seqüência é deixar lá dois ou três ou quatropartidos no Congresso Nacional. Aliás naditadura só havia dois e não me parece queera um período de muita liberdade. Entãoesse debate a gente não consegue desenvol-ver e fazer. Uma outra questão em que omarco regulatório tem que avançar é a rela-ção produção-transmissão. Eu não sei se háoutro país no mundo em que quem trans-mite é quem produz tudo. Eu não sei se há.

Pelo menos pelos dados que a gente temé que no Canadá é zero. A televisão é trans-missora apenas, não é ela que produz a pro-gramação. Nos EUA deve estar lá por 50%.Na Europa, 25%. Aqui é 100%. Quemtransmite é quem produz e fecha o cerco evocê não tem como entrar. Então, essaquestão do conteúdo tem uma relação di-reta com a concessão de outorga e quemvai explorar o novo modelo da televisãobrasileira.

E por fim para não demorar muito por-que o Ministro tem pouco tempo e ele pre-cisaria estar à disposição aí para o própriodebate, eu sei que há uma disputa que podeinterferir muito nas definições. Uma é a dis-puta telecomunicação com radiodifusão, atéporque em 1997, quando se fez a lei sepa-rando a telecomunicação para poder priva-tizar, para ter a possibilidade de privatiza-ção, acabou-se separando aquilo que na tvdigital não deveria mais estar com esse graude separação, inclusive na legislação.

Então há uma disputa. As teles dispu-tam fatias de digitalização e a radiodifu-são também. Essa é uma disputa que vaiinterferir certamente na definição. A ou-tra que sinto que é uma preocupação doGoverno brasileiro, expressa pela Ministrada Casa Civil, Dilma Rousseff, é a questãoda política industrial porque hoje há umaevasão de 8 bilhões por ano na importaçãode meios eletrônicos para a produção detelevisão, particularmente na tecnologia di-gital. Certamente isso interfere tambémnas definições.

A questão da pesquisa que já foi desen-volvida: é bom que a gente tenha em men-te que isso estava no âmbito da Anatel noGoverno anterior; no início do Governo Lu-la se puxou para o Ministério das Comu-nicações e se fez o decreto de criação do

“Hoje há canais queficam a noite inteiravendendo boi, jóias,tapetes. Esse não éum programa quegostaríamos decontinuar vendo natelevisão brasileira.Que tipo deprogramação e quepúblico vamosatingir e com qualconteúdo? Estamosdebatendo muitomais que o modelotecnológico.”

Deputada Jandira Feghali

DEBATE IGNORADOJandira Feghali lamentouque o debate acercada tv digital tenha sidoignorado pela grandemídia. Um semináriodo Congresso Nacionalsobre o tema foidivulgado e cobertoapenas pela TV Câmara,que não tem o alcancedas grandes redes.

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Sistema Brasileiro de TV Digital, no qualmais de 50 instituições se envolveram e de-senvolveram a tecnologia brasileira, e issonão pode ser jogado fora, porque no Siste-ma Brasileiro de TV Digital muito do que sedesenvolveu pode ter a complementaçãodo que há de melhor nos outros modelos.

Não temos que importar tecnologia pro-prietária para pagar royalties para o Japãoou para quem quer que seja. E depois a ma-téria saiu do âmbito puro do Ministério dasComunicações porque o atual Ministro dasComunicações passou a desrespeitar oConselho Consultivo e os fóruns democrá-ticos construídos e passou para um fóruminterministerial, de que participam, se nãome engano, nove ministérios ou até mais,para que essa definição tenha um contra-ponto, o que é uma evolução interessantedo processo.

Mas nós precisamos fazer que o Congres-so seja de fato o responsável pela definiçãodo marco regulatório, porque isso não po-derá ser feito por decreto. Isso é uma ques-tão que colocamos de público porque é im-portante que não se avance esse sinal sobpena de uma briga jurídica indefinida.

Então para fechar, o que eu acho, pri-meiro, não é o modelo tecnológico que estáem debate, e sim o modelo de exploraçãoda tv brasileira relacionada diretamentecom a democracia, com a cidadania, com apossibilidade de inclusão da sociedade emnovas formas de comunicação e de di-gitalização.

Segundo, é necessário avançar comum marco regulatório, que seja um mar-co regulatório construído junto com oParlamento brasileiro, com a sociedadecivil, para que ele se adeque a esse obje-tivo democratizador, de mudança deconteúdo, de regionalização da produ-ção e difusão.

Em terceiro lugar que a gente consi-ga evitar que uma definição de política

industrial se afaste dessa discussão do pa-pel da comunicação brasileira e leve emconta a sociedade e o Congresso Nacionalpara que a gente não tenha uma definição,eu até brinco um pouco, que não seja tãorápida que pareça covardia e que não sejatão lenta que pareça provocação. Então nósprecisamos ter um tempo adequado.

E um ano eleitoral não é um ano bompara esse tipo de definição porque a pres-são vem muito grande para cima do Go-verno, não é um bom momento para essadefinição. Talvez fosse mais cauteloso eprudente acumular um certo debate e de-finir sem a pressão do processo melhor, quea gente define melhor. Ninguém está que-rendo jogar para a indefinição porque é ine-vitável que o Brasil digitalize e digitalizebem, mas também não pode ser uma deci-são tão apressada que impeça esse debate,essa adequação de um novo modelo de te-levisão brasileira que atinja a populaçãobuscando maior cidadania, maior inclusãoe maior descentralização de poder. E é depoder mesmo e isso tem uma ingerênciapolítica e ideológica que todos nós aqui co-nhecemos. Agradeço a vocês .

Audálio Dantas – Agradecemos a con-tribuição ao debate da Deputada Jandira Fe-ghali. Aliás nós estamos vendo que os te-mas centrais estão sendo colocados em to-das as palavras e antes de passarmos aos de-

batedores eu gostaria de chamar a atençãopara o fato que também aqui foi registradoque raro é o dia em que não apareça em man-chetes ou em notícias de colunas, várias co-lunas, notícias plantadas no sentido de queo Presidente da República já decidiu qualvai ser o padrão tecnológico ou que vai deci-dir na próxima semana ou que vai decidirnos próximos 15 dias, etc.

Isso significa que há interesses que es-tão aí jogando e por isso este debate emque a ABI hoje se engaja de maneira maisefetiva deve prolongar-se além do jogo deinteresses que porventura esteja ocorren-do aí.

Eu queria chamar, não sei se está pre-sente, o representante da Abert, Ronald Si-queira Barbosa. Não. O Deputado Vander-lei Assis. Também não está presente.

Sobre o representante da Abert, eu gos-taria de dizer que nós tomamos o cuidado,este é o entendimento da ABI, de tornareste debate o mais amplo possível, de con-vidar as partes envolvidas nessa questão, ea Abert, por ser representante das emisso-ras de rádio e televisão no Brasil, foi pornós convidada. Há cerca de 15 dias foi in-dicado um representante que seria Evan-dro Guimarães e, hoje, pela manhã, porvolta das 11 horas, recebemos a informa-ção de que ele não poderia vir e que no lu-gar dele estaria Ronald Siqueira Barbosa.Infelizmente, ambos não estão aqui.

E nós damos continuidade ao nosso de-bate convidando o Professor Gustavo Gin-dre, que é diretor do Instituto de Estudose Projetos em Comunicação e Cultura- In-dex, dizendo que cada debatedor tem 20minutos para a sua intervenção.

Gustavo Gindre – Eu queria agradecero convite da ABI na figura do PresidenteMaurício Azêdo e do Vice, Audálio Dan-tas, a oportunidade de estar aqui debaten-do nesta Casa, nesta Casa histórica, essetema fundamental que é o tema da tv di-gital, e a honra de poder estar na mesa compessoas que são importantíssimas nesseprocesso, que têm inclusive se tornado li-deranças na luta pela democratização dacomunicação, tanto a Deputada Jandira Fe-ghali, quanto o Ministro Gilberto Gil noMinistério da Cultura, na Ancine, na áreada cultura desse Governo, quanto um ir-mão que a vida me deu, que é Sérgio Go-mes, que está ali do outro lado da mesa.

Ao mesmo tempo que agradeço a opor-tunidade de estar aqui, eu lamento que oEvandro Guimarães não tenha vindo, em-bora já esperasse esse tipo de posição. OEvandro, para quem não sabe, é o Vice-Pre-sidente de Relações Institucionais da RedeGlobo. Era esperado que ele não viesse a essetipo de debate, eu pelo menos esperava. En-fim, a emissora que não tem nem o bate-bola, nem aquela chatíssima mesa de deba-te nos domingos à noite para discutir fute-bol, ou seja, onde a opinião só chega edita-da, a opinião não chega a partir dos emisso-res dessas opiniões, obviamente não estariaaqui com a cara a tapa para este debate.

Eu também lamento, infelizmente, quea posição do Ministro Gilberto Gil, que éuma posição forte, é uma posição coerentenesse sentido, acabe não sendo, por exem-

“Será possível uma reforma política estrutural com odebate democrático concentrado? Se não se democratizaa comunicação, não se consegue uma reforma políticaadequada, porque a opinião pública sempre vai acharque cláusula de barreira é bom, que restringir partidosé bom, que ter só dois partidos é mais democrático.”

Deputada Jandira Feghali

OS QUE DECIDEMA Ministra Dilma Rousseff,Chefe da Casa Civil, eraconsiderada pelo MinistroGil como uma garantia deque o Presidente Lulalevaria em conta asconclusões do debate quese travava no Governo. Nofim de junho viu-se queGil errou na previsão.

JOSÉ C

RU

Z/ABR

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plo, a posição do Ministério das Comuni-cações, Ministério esse que tem cumpridoum papel importante para sabotar o pro-cesso democrático de definição da tv digi-tal. Processo esse que, hoje, é tocado noMinistério das Comunicações por um rá-diodifusor, por uma pessoa que desrespei-ta o artigo 54 da Constituição Federal, quediz que um parlamentar não pode ter ne-nhuma ligação com uma empresa conces-sionária de serviço público. Pois o parla-mentar, Senador Hélio Costa, é dono deuma rádio. O Ministro das Comunicações,responsável por fiscalizar as rádios e as te-levisões no Brasil, é dono de uma rádio fis-calizada por ele próprio. Pois esse Minis-tro simplesmente deixou de convocar oConselho Consultivo do Sistema Brasilei-ro de TV Digital, do qual eu fazia parte,onde a sociedade civil estava presente parapoder participar desse debate. E, nesse sen-tido, o Ministro Hélio Costa desrespeita odecreto do próprio Presidente Lula que de-fine que no Sistema Brasileiro de TV Digi-tal a decisão só pode ser tomada depois deouvido o Conselho Consultivo.

É preciso resgatar que o decreto que criouo Sistema Brasileiro de TV Digital é um de-creto bem avançado. É um decreto que de-fine direitos e deveres de maneira bem coe-rente com o princípio da democratizaçãoda comunicação, da inclusão digital, só queisso não está sendo levado a cabo por esseMinistro das Comunicações, que simples-mente deixou de convocar a sociedade e des-respeita o que o Presidente Lula definiu nodecreto.

É lamentável infelizmente a posição doMinistro. É preciso registrar a posição co-rajosa da Deputada Jandira, que denuncioulá na mesa dos debates na Câmara dos De-putados que o sistema japonês não estariadisposto a fazer uma transmissão em tes-te. O Ministério simplesmente mandoucancelar os testes que seriam feitos pelopadrão europeu, pelo padrão norte-ameri-cano e pelo sorça, desenvolvido pela Pucdo Rio Grande do Sul.

Ou seja, se o padrão que o Ministro de-fende, se o padrão que as emissoras de te-levisão defendem não aparece, ninguémmais pode fazer essa transmissão. Essa in-felizmente tem sido a conduta do Mi-nistro, o que nos deixa preocupados.Preocupados em que essa decisão venhaa ser tomada com o apoio desse Minis-tério num ano eleitoral, num ano emque os radiodifusores têm um poder depressão sobre o Governo muito maior.

Por isso, entre outras coisas nós pe-dimos o adiamento dessa decisão, nãoo adiamento ad eternum, mas o adia-mento até o ano que vem, de modoque a gente possa tomar essa decisãode forma mais pensada, de forma maispausada. E isso não significa atraso ne-nhum. A China com 1 bilhão e 200 mi-lhões de pessoas decidiu que só vai colo-car a sua tv digital no ar em 2008. Ne-nhum país do mundo tem consolidadoum modelo de tv digital aberto, nem naEuropa, nem nos Estados Unidos e muitomenos no Japão.

Portanto, jogar esse debate para o anoque vem não significa jogá-lo para as calen-

das, nem significa relegar o Brasil ao atraso.Dito isso, é preciso fazer um pouco uma di-visão, que acho uma divisão importante,meio óbvia, mas infelizmente escamotea-da pelos grandes meios de comunicação emque eu diria que uma coisa é uma coisa eoutra coisa é outra coisa.

Uma coisa é a discussão tecnológica.Essa discussão é importantíssima, porquedefine o futuro da ciência e da tecnologiabrasileira em duas áreas que são transver-sais à economia nacional, a área de micro-eletrônica, que está presente desde o sinalde trânsito ao carro popular, passando pelaaviação, pela indústria petrolífera, por se-tores de ponta da economia brasileira, ondea microeletrônica está presente, e a áreado software, que também é transversal aquase tudo o que a gente consome, hoje,de bens eletroeletrônicos.

Portanto, definir o padrão tecnológicoda tv digital é impactar diretamente nes-sas duas áreas, e é impactar no desenvolvi-

mento nacional. E isso é importante. É im-portante definir uma política industrialque até agora não apareceu de forma claranas sinalizações do Governo. Quais serãoos acordos off-set, ou seja, quais serão ascontrapartidas que nós teremos, se viermosa adotar tecnologia estrangeira? Transfe-rência de tecnologia? Vão transferir tecno-

logia para que a gente possa produzir anossa própria tecnologia?

A gente vai ter inserção no board direti-vo desses padrões tecnológicos para que asfuturas inovações não venham a sabotarnosso mercado interno, para que a gentenão fique à mercê do desenvolvimento tec-nológico de outro país? Por exemplo, o per-fil de consumo do Japão é radicalmente di-ferente do perfil de consumo brasileiro. Látroca-se de telefone celular a cada seis me-ses, joga-se fora.

Se nós adotarmos um padrão e ficarmosa reboque do desenvolvimento tecnológi-co de um outro país, provavelmente issoterá impacto significativo em nossa balan-ça comercial, terá impacto significativo nobolso do consumidor, nas nossas exporta-ções. Vamos pagar royalties por isso? É pre-ciso definir. Os softwares que vão habitaressas tvs digitais e aquelas caixinhas quenós vamos comprar para que nossas tvspossam receber a tv digital, esses softwa-res serão softs proprietários ou serão softslivres?

Tudo isso precisa ser definido antes queo decreto sobre a escolha do padrão tecno-lógico venha a ser tomado. E precisa ser de-finido como? Com audiências públicas, comuma consulta pública. Antes de essa deci-são ser tomada, pelo impacto que terá, afi-nal trata-se de um meio de comunicação queorienta a contemporaneidade, está presen-te em quase 95% dos lares brasileiros, en-quanto a tv paga está presente em 8%.

É uma relação completamente diferente.Só para vocês terem uma idéia, em Berlim95% têm tv paga, no Brasil são 8%. No Ja-pão, quase a totalidade. Enfim, dado o pesodesse meio de comunicação é preciso queessa decisão passe antes por consulta públi-ca, por audiência pública, é preciso que asociedade discuta, que a sociedade esteja in-formada. Mas essa é uma parte do debate.

Esse debate, em tese, não impacta so-bre o modelo exploratório de televisão. Em

“O Ministério das Comunicações tem cumprido um papelimportante para sabotar o processo democrático dedefinição da tv digital. O Senador Hélio Costa, Ministro dasComunicações, é dono de uma rádio fiscalizada por elepróprio. Ele desrespeita o artigo 54 da Constituição, quediz que um parlamentar não pode ter nenhuma ligaçãocom uma empresa concessionária de serviço público.”

Gustavo Gindre

UM PRATO-FEITOO Ministro dasComunicações, SenadorHélio Costa, jactou-senuma audiência públicano Senado de queencaminhara aoPresidente um textoirretocável de decretosobre a tv digital. Houvequem achasse que eleestava blefando.

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tese o que é possível ser feito com o pa-drão tecnológico japonês, é possível serfeito com o padrão europeu, com algu-mas adaptações, é possível ser feito como padrão brasileiro. Eu, particularmen-te, preferiria o desenvolvimento nacio-nal. Mas, enfim, é possível ser feito comqualquer um desses padrões.

A grande questão que está por trás,a outra coisa que é outra coisa, que nãoé uma coisa, e que os meios de comu-nicação confundem o tempo inteiro, é omodelo regulatório que vai administraresse processo. E aí qual é o nosso medo?E nós já sinalizamos isso para o Governo,sinalizamos em uma audiência públicacom a Ministra Dilma Rousseff. O nossomedo é que o decreto, ao definir questõestecnológicas, permita às emissoras faze-rem teste.

Afinal de contas, definida a tecnologia,elas têm que começar a testar essa tecno-logia. E aí conceda espectro a essas emis-soras, nem que seja de maneira provisória,Enfim, conceda a essas emissoras espectropara que elas comecem a funcionar. Se issofor feito, babau democratização dos mei-os de comunicação, porque depois que ou-torgar, mesmo que seja provisoriamente,espectro para a Globo, para a Bandeiran-tes, para a TV Record, não há poder políti-co instituído neste País capaz de retomaresse espectro.

E aí a questão dançou. Aí a democrati-zação da comunicação foi para o espaço. Eo nosso medo é a estratégia Martinho daVila, é o devagar, devagar, devagarinho,concede para teste, vai fazendo, quando agente perceber está com a mesma lei de1962, está com tudo como era antes e estátudo na mão dos radiodifusores. Por quê?Porque são as potencialidades que podemir para o ralo e que fazem da tv digital umaquestão tão estratégica.

Hoje, o espectro eletromagnético do rá-dio e da televisão é como se fosse uma ré-gua. A cada seis unidades, no caso Mh, maspoderia ser outra coisa, a cada seis unida-des coloca-se um canal de televisão. Entãoo canal 2 entra de 54 a 60, o canal 3, de 60a 66, assim vai até o canal 69 do UGF. Poisbem, nesse mesmo espaço onde antes en-trava um canal de televisão, hoje, se eu co-locar uma imagem com a qualidade de umdvd, sem chuvisco, sem fantasma, sembombril na ponta da antena, com a quali-dade de um dvd, isso é suficiente para 90%da população, se quiser, ir nas Casas Bahiae comprar lá seu home teather.

Se eu quiser, com qualidade dvd e somdigital, transmito nesse espaço de 6 Mh oitocanais de televisão. A questão é: quem vaiser dono desse latifúndio? A gente vai bo-tar a casinha e meia dúzia de bois para di-zer que esse terreno é produtivo ou vamosrealmente fatiar esse espaço e dar esse es-paço para a sociedade que precisa ocupá-lo?

Se já é crítico conceder todo esse enormelatifúndio para as organizações Globo comtodos os malefícios que já conhecemos, ima-ginem conceder esse espaço para a CNT fi-car vendendo anel e tapete a madrugadainteira ou culto evangélico ou o que querque seja, ao invés de abrir esse espaço paraque a população possa falar. Nós temos a

possibilidade de colocar dezenas de novoscanais de televisão na tv aberta. E quandoestou falando de dezenas é a possibilidadede TV Câmara, TV Senado e também tvscomunitárias, tvs universitárias, tvs de bai-xa potência, tvs de bairro, tvs locais que pos-sam ser geridas publicamente.

A Venezuela está lá com uma experiên-cia em que distribuiu ilhas de edição portoda Caracas para que a comunidade pro-duza e transmita de uma única emissorasua produção comunitária. Nós aqui temospossibilidade de fazer isso e ir além, por-que você vai poder colocar esse espaço deprodução e transmitir localmente, e fazero que já hoje é a rádio comunitária, é pos-sível fazer com a televisão. Óbvio, isso nãointeressa aos meios de comunicação demassa, que querem manter esse espaço.

A proposta da Abert é que cada emisso-ra de televisão que, hoje, tem um canal ana-lógico receba mais um inteiro. Se isso forfeito em cidades como Rio de Janeiro, SãoPaulo, toda a Baixada Santista e Porto Ale-gre, dados do próprio do Governo, não en-tra mais nenhuma emissora de televisão

enquanto durar o processo de transmissãosimultânea entre analógico e digital.

Ou seja, temos de um lado um projetode democratizar a comunicação, da aber-tura de dezenas de canais, e do outro lado,manter os mesmos Abravanel, Saad, Ma-rinhos, o bispo Macedo, que estão aí e quedominam as capitanias hereditárias da co-municação no Brasil. Essa é uma das ques-tões que está em jogo e que não vai apare-cer nos grandes meios de comunicação.

Em outra mesa de debate, em que oEvandro Guimarães por acaso esteve, pro-pus a ele: dê um Globo Repórter sobre isso.Vamos discutir essa questão na Rede Glo-bo, coloca gente para debater lá. Deixa agente perguntar para a população o que elaprefere. Colocar alta definição, o que sig-nifica uma imagem muito melhor que aimagem do dvd, mas uma imagem que oolho humano só percebe se você conseguirassistir numa tela acima de 36 polegadas.Abaixo de 36 polegadas você não identifi-ca a qualidade da alta definição, o que sig-nifica uma tela que hoje não custa menosde 10 mil reais. Pede para a população es-colher se ela prefere as mesmas emissorascom essa qualidade só para aqueles que po-dem pagar por essa imagem. Faz um bigbrother, pede para a população escolher, fazlá a Telemar para discar, disque pelo SMSde O Globo, lá ainda ganha uns caramin-guás por isso, manda as pessoas escolhe-rem se elas preferem isso ou se preferemoito programações no mesmo espaço.

Eu não tenho dúvida do que a popula-ção brasileira vai preferir se ela for infor-

mada sobre isso. Essa éuma questão. A segun-da questão, só para nãome alongar, é a questãoda interatividade. O queestá colocado hoje? A tvdigital pode ter um ca-nal de retorno, ou seja,a tv, que hoje só recebeconteúdo, pode devolveresse conteúdo, pode co-meçar a ser interativa.

Como eu tenho dito,a tv pode começar umnamoro com a internet.A tv não será internet,mas tv e internet vão co-meçar a ir ao cinema,pegar na mão, trocar unsbeijos e em algum mo-mento, lá na frente, te-rão filhos. Que não serãointernet como nós co-nhecemos e não serão atelevisão como conhece-mos, serão um híbridodesse processo. Pois bem,

é possível começar isso agora. Como?Primeiro, garantindo que as pessoas te-

nham acesso a um canal de retorno, por-tanto a banda larga. Vocês vão dizer: issocusta dinheiro. Mais ou menos, porque, se-gundo dados do próprio Governo e estudodo CPqD, é possível colocar acessos semfio – wimax, que é uma tecnologia sem fio,banda larga – em todo o território brasilei-ro por R$ 400 milhões.

O que acontece? Todos nós pagamos te-

“O espectro eletromagnético do rádio e da televisão é como se fosse uma régua. A cadaseis unidades, no caso Mh, coloca-se um canal de televisão. Com a tv digital, nesse espaçode 6 Mh cabem oito canais de televisão. Quem vai ser dono desse latifúndio? A gente vaibotar a casinha e meia dúzia de bois para dizer que esse terreno é produtivo ou vamosrealmente fatiar esse espaço e dar esse espaço para a sociedade que precisa ocupá-lo?”

Gustavo Gindre

NO MESMO RITMO?Nem tanto. Após abrir odebate, o Ministro Gildisse acreditar que asposições do Ministério daCultura por ele expostascorresponderiam à visãodo Governo sobre a tvdigital. Sua esperança sefrustrou dias depois. Luladecidiu diferente.

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lefone. Do telefone tiramos 1% para o Fust-Fundo de Universalização dos Serviços deTelecomunicações. O Fust, hoje, que é odinheiro que vai garantir a inclusão digi-tal, tem quase R$ 6 bilhões lá. Dá para fa-zer com 400 milhões que as pessoas te-nham acesso à internet banda larga. OuroPreto está fazendo isso. Ouro Preto come-çou a colocar internet sem fio wimax. Aíeu fui perguntar para o pessoal da Anatel.Como é que estão botando lá? Pela lei atu-al, aquela desgraceira de 1962 e, depois, ade 1997, que foi feita exclusivamente paraprivatizar a Telebrás, com essa lei não dápara fazer, o que vocês vão fazer? O pes-soal da Anatel disse que vamos fingir quenão estamos vendo, porque o processo étão interessante, que se a gente for inter-vir, a gente mata. Se a gente for agir deacordo com a lei a gente mata. Então, épreferível não ver.

É possível tecnologicamente fazer issoe é possível financeiramente, e esses recur-sos estão disponíveis nessa rubrica. Nãoprecisa tirar dinheiro de lugar nenhum. Ésó pegar do Fust e investir e dá para garan-tir acesso banda larga para as pessoas. Quetipo de serviço eu vou disponibilizar paraessas pessoas? A UnB desenvolveu umaplicativo que faz do possuidor de cadacaixinha de tv digital um cliente de e-mail.Significa que cada televisão passa a poderenviar e receber e-mail.

Nós saímos, hoje, de uma base instala-da de 6% das residências do Brasil combanda larga, de apenas 20% das residên-cias do Brasil usando internet, exceto o usodo trabalho cada vez mais confirmado. En-tão, no uso privado de sua casa apenas 20%das residências do Brasil têm acesso a e-mail. Nós saímos dessa base instalada para95% das residências no Brasil com televi-são; portanto, 95% das residências no Bra-sil disponíveis para ter e-mail.

Outros tipos de serviços que podem sercolocados, serviços de governo eletrônicopara que as pessoas que estão excluídas,hoje, da possibilidade de pagar imposto derenda, descontem imposto de renda pelainternet, ter acesso ao prontuário médico,ao boletim escolar de seu filho, à educa-ção, à educação a distância, serviços inte-rativos de educação, portanto serviços in-dividualizados. Eu estive conversando coma direção da Fiocruz e eles estão bolandoserviços interativos de saúde que podemestar disponíveis na internet e podem es-tar disponíveis na televisão.

Então, estamos falando de um admirá-vel mundo novo que agora pode estar dis-ponível absolutamente para todas as pes-soas do Brasil usando a plataforma de meiode comunicação mais inclusiva que nós te-mos. Mas qual é o projeto dos radiodifu-sores? É manter isso confinado e usar parabig brother, para você decide. Porque aí omedo é: se for abrir, vai colocar as teles nomeio e teles nós não queremos. E a descul-pa da Globo é a desculpa de que, afinal decontas, teles é capital estrangeiro e nós so-mos capital nacional.

Se a Globo acha que é realmente impor-tante o capital nacional, eu gostaria de per-guntar, e já perguntei ao Evandro Guima-rães, privadamente, e pergunto aqui, por

que é que a Globo tentou comprar o saté-lite brasileiro, que é estratégico, junto coma Italia Telecom? Por que a Globo vendeua sua rede de integração por satélite – aVicom – para a maior operadora de satéli-tes dos Estados Unidos, a Comsat? Por quea Globo comprou telefonia celular juntocom a Itália Telecom e depois vendeu paraa Itália Telecom a Maxitel, que operava naBahia e em Sergipe?

Se a Globo acha estratégico o capital na-cional, por que afinal de contas se tornouminoritária na Sky, permitindo que Sky eDirectv se fundissem e que o Rupert Mur-doch, que é o Roberto Marinho do mun-do, que é um sujeito que não pode botaros pés na Inglaterra, onde a Sky opera,porque tem processo contra ele, que o Ru-pert Murdoch passasse a deter 97% da tvpor satélite no Brasil, asfixiando a únicaoperadora brasileira, que é a TecSat, quepassa a ter 8% do mercado?

Se é estratégico o capital nacional, porque a Globo se tornou minoritária na NetServiços e permitiu que a Telmex, do quar-to homem mais rico do mundo, se tornassedona dos cabos de transmissão da Net, tor-nando a Rede Globo minoritária? Se a Glo-bo acha tão importante o capital nacional,por que ela transmite na Net Nickelodeon,Disney, Jetix, Discovery Kids, Boomerang,Cartoon Network, mas não transmite a TVRá Tim Bum, que é a única tv para criançasno Brasil, mas transmite todo o lixo im-

portado? Então não se trata de defesa docapital nacional. Trata-se de outra coisa,de reserva de mercado. E aí reserva de mer-cado nesse sentido, para mim, é tão nefas-ta sendo do Rupert Murdoch quanto doRoberto Marinho. Enfim, só para concluir,pois acho que já falei demais, quero dizerque são essas as questões que estão por trásna definição da tv digital no Brasil.

E se trata de algo muito mais importan-te do que o tal do Fla-Flu entre europeus ejaponeses que a mídia especializada temtratado. E aí o que nós queremos é sinali-zar para o Governo, e especificamente paraum setor do Governo que tem avançado osinal, especialmente na figura do MinistroHélio Costa, é que se a decisão que pareceque se avizinha for tomada no sentido daestratégia Martinho da Vila, tão devagari-nho mas a gente vai mantendo a atual le-gislação, que é a legislação de 1962 – coita-do do Martinho da Vila – e se ela for man-tida nesse sentido devagar, devagarinho, ese algo avançar no sentido de manter osprivilégios atuais, concedendo o espectropara os atuais radiodifusores, a sociedadecivil vai à Justiça.

E vai à Justiça junto com o MinistérioPúblico Federal, que já sinalizou, publica-mente, aqui no Rio, por exemplo, na audi-ência do Crea, que esse tipo de posição nãoserá aceito. E a sociedade civil já está mo-bilizada. Na semana passada, nós tivemosuma reunião, em São Paulo, preparamosestratégia para ir ao TCU sobre o desper-dício de bem público que é o espectro ele-tromagnético, preparamos estratégia parair ao Supremo, preparamos estratégia parair aos Tribunais de Justiça e nós vamos bri-gar por isso, mesmo que saia o decreto; mes-mo que vocês leiam o decreto na imprensa,não pensem que essa batalha acabou.

Ela está longe de acabar porque a socie-dade civil não vai desistir dessa briga en-quanto não conseguir reverter esse proces-so de concentração dos meios de comuni-cação. Então, não se deixem arrefecer sevocês lerem no jornal qualquer decisão quepareça significar que o monopólio mais umavez ganhou, porque não ganhou. Essa ba-talha continua e a gente não vai desistir.

Audálio Dantas – O Professor Gindrefoi na marca dos 20 minutos. Eu quero di-zer que ele voltará porque o debate conti-nuará. Nesse momento, o Ministro Gilber-to Gil quer dizer algumas palavras porqueele terá de sair.

Gilberto Gil – Queria me despedir equeria dizer ao Gindre que, ainda que a po-sição do Ministério da Cultura, nesse con-junto de manifestações que o Ministériotem tido, seja diferente de posições que ou-tros Ministérios possam ter em relaçãotambém a esse conjunto de questões, eudiria que espero estar representando aquicom as posições do Ministério da Culturaa visão do Governo. Enfim, sou suficiente-mente abastecido, digamos assim, nessaminha confiança pelo fato de que o Comi-tê de Desenvolvimento formado pelos 12,se não me engano, hoje, 11, pelos menos11 Ministérios, vem-se debruçando sobreo conjunto dessas questões, o que antece-

CRIAÇÃO SOLITÁRIANo alto, Bum,personagem da TV RáTim Bum, único canalinfantil da televisão paga.Abaixo, sede da TecSat,de São José dos Campos,empresa de tecnologia deponta, também solitária,única operadora de tv porsatélite do País, a qualperdeu mercado para aSky do milionário RupertMurdoch.

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AÇÃO

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de, o que é contemporâneo e o que su-cederá à mera definição do aspecto téc-nico da modulação, ou seja, do sistematecnológico a ser adotado.

A questão dos prazos, também, comrelação ao decreto presidencial que vocêadmite, a Jandira, também, que é umdecreto positivo no seu conjunto, con-templando no seu conjunto todas es-sas questões importantes. A nossa po-sição, a nossa expectativa é de que a po-sição do Governo em relação à escolhado sistema que já tem, como você colo-cou muito bem, algumas implicaçõesdiretas na maior ou menor democrati-zação em que a coisa possa sair, resul-tar. Mas que esse decreto, enfim, sejacontemplado na sua essência.

Que a posição do Governo venhacom relação à escolha do sistema e aposição dos trabalhos do Governo nosentido do aperfeiçoamento do marcolegal e do aperfeiçoamento do marcoregulatório e da garantia do aperfeiçoa-mento das políticas de conteúdo, deprodução e difusão de conteúdo no Paísque esses aspectos todos que já estãocontemplados na origem, na base, noarcabouço, como esqueleto do decreto,que tudo isso seja honrado.

Que tudo isso seja realmente confir-mado e que o Governo tome a posiçãoconvergente com a expectativa demo-crática que nós temos no País. Essa é anossa expectativa e eu diria pelo traba-lho, pelo modo com que a Ministra Dil-ma Rousseff vem conduzindo os traba-lhos, pelo modo como o conjunto dosMinistérios envolvidos vem encarandoas questões, não vejo como não manter-mos essa expectativa. Expectativa de queo Governo venha a criar no Brasil, sejapela implantação do modelo tecnológi-co, seja pelos aspectos que sucedem a ele,venha a plantar, venha a garantir no Bra-sil a implantação – porque não é o Go-verno quem implanta, ele garante a im-plantação – de um sistema de tv digitalmoderno, contemporâneo, democrático,aberto, enfim, contemplando todas as ne-cessidades propostas já pela vida tecnológi-ca moderna, como seja a interatividade, aparticipação, a produção independente, aprodução local; enfim, a autogestão da in-formação, digamos assim se é que se podechegar a um neologismo desse tipo, a auto-gestão da informação pelo povo brasileiro.

Essa é a nossa expectativa. Na quarta-feira agora nós vamos com o Presidente daRepública assinar um projeto com urgên-cia. O Presidente vai enviar para o Con-gresso um projeto, com urgência constitu-cional, exatamente dando, ampliando osbenefícios da Lei do Audiovisual para o se-tor televisivo, que é uma demanda justa,que é um progresso, um avanço justo. Egarantindo algumas outras conquistas naLei do Audiovisual para o fomento da pro-dução de audiovisual no Brasil, enfim, por-que essa lei se extinguirá agora, no finaldo ano, em dezembro, e é preciso exata-mente a sua renovação.

Nós estamos providenciando isso comtodo o apoio do setor de audiovisual brasi-leiro, produtores, difusores, exibidores, etc

Dizendo isso só para dar um pouco contada nossa atuação, no que o Ministério vemprovidenciando junto ao Governo, juntoao Congresso Nacional em benefício de umsetor importantíssimo da cultura brasilei-ra que é o setor de audiovisual.

Com relação ao Grupo Gestor e ao Co-mitê de Desenvolvimento do Sistema Bra-sileiro de TV Digital, nosso Ministério con-tinua firme com as suas posições, posiçõesque foram apresentadas em linhas geraisaqui. São posições convergentes, coinciden-tes com a grande demanda da democraciabrasileira, com a grande demanda da socie-dade brasileira. Esperamos que o Ministé-rio da Cultura honre a sua posição e assimo faça o Governo brasileiro como um todo.

Audálio Dantas – O debate continua.Mais uma vez queremos agradecer a pre-sença e a participação do Ministro da Cul-tura, Gilberto Gil, que será acompanhadopelo Presidente da ABI na sua saída. E pros-seguir com o debate e antes do companhei-ro Sérgio Gomes da Silva, vamos anunciara presença do Deputado federal VanderleyAssis e da Vereadora Sílvia Pontes.

Nós vamos ouvir a intervenção do jor-nalista Sérgio Gomes da Silva, que é diretorda Oboré, uma instituição que se envolveno debate, há muitos anos, com relação àdemocratização dos meios de comunicaçãoe principalmente a uma parte que não vemsendo muito discutida dessa questão da che-gada da tecnologia digital, que é a questãodo rádio, principalmente as rádios comuni-tárias. Sérgio Gomes da Silva, 20 minutos.

Sérgio Gomes da Silva – Agradeço àdiretoria da ABI e a todos os que estão aqui.É a primeira vez que estou aqui nesse cai-xote de tanta História. E me sinto cores-ponsável porque faço parte da equipe, capi-taneada pelo Audálio, que está trabalhan-do pela reconstrução da ABI lá em São Pau-lo depois de dez anos em que ela ficou ina-tiva.

E essa questão de debater as questões li-gadas às novas possibilidades tecnológicaspela democratização é absolutamente fun-damental. Eu não sei como será isso. Ain-da hoje é um debate estimulante, de abrir,jogar uns raios, ainda que seja na base dever apenas os vultos mas que as pessoaspossam começar a ter a noção do que seestá tratando.

As grandes instituições que têm o quedizer, como é o caso da ABI, da AcademiaBrasileira de Letras, Instituto Ethos, Insti-tuto Ayrton Senna, MST, Fiesp, etc, tudoisso tem mais que direito, têm necessida-de de acesso aos meios de comunicação eesses protagonistas até agora não foramchamados.

Eu queria sair daqui e me valer de umaimagem do João Guilherme Vargas Ne-to, que é um amigo comum que temosGustavo Gindre e eu em São Paulo,mas é um carioca. Ele estavausando esta imagem: essa luta to-da que temos para travar é meioparecida com luta de sumô, emque se põem num tablado semcordas aqueles gordões, que se es-tudam, ficam se olhando, mas a

luta mesmo é resolvida muito rapidamen-te: basta empurrar o cara para fora daqui-lo, e está resolvido. Às vezes, e ali basica-mente, é uma luta de entender quem é oadversário, de estudá-lo.

Portanto este debate que está se dandoaqui pode ser comparado ao sumô. Nós es-tamos estudando e eles estão nos estudan-do. Quando o pessoal da Globo é chamadopara um debate na ABI com o Ministro daCultura e ainda assim não vem, isso signi-fica alguma coisa. Tem um significado di-ferente de alguém fazer de conta que estáchamando a Abert e a Globo para um de-bate num centro acadêmico de uma facul-dade; como sabe que vai ser massacrado, osujeito não vai.

Aqui não, aqui é outra coisa. Nesta Casa,houve todo o cuidado do Audálio de fazeros contatos, dar telefonemas, enviar cartapessoal; volta, reafirma, confirma os no-mes depois às 11 horas da manhã. Por quenão vêm? Tem alguma coisa aí. Isto, por-tanto, já faz parte dessa luta de sumô, em-bora o desfecho vá ser muito rápido, emalgum momento se decidirá se o padrão vaiser este ou aquele.

Às vezes tenho ficado as madrugadas as-sistindo às vezes à TV Câmara, às vezes àTV Senado, para acompanhar esse debate.Numa dessas madrugada tive ocasião deassistir à apresentação do Ministro HélioCosta numa audiência pública no Senado.Isto depois que ele tinha participado doprograma Roda Viva lá em São Paulo. Eleconseguiu dominar a cena e estava se sen-tindo absolutamente à vontade; pensouque seria uma caminhada como se fosseuma excursão escolar para esperar a Sele-ção Brasileira no aeroporto; uma caminha-da que tinha uma data de desfecho; pen-sou que era possível encantar as pessoascom a idéia da nova tv já por conta da Copado Mundo, o que era mentira, era só umacoisa experimental

Mas havia mesmo uma banalização dasdificuldades para eles. A certa altura es-

“Se algo avançar nosentido de manteros privilégios atuais,concedendoo espectroeletromagnéticopara os atuaisradiodifusores,a sociedade civil vaià Justiça, vai juntocom o MinistérioPúblico da União,que já sinalizou queesse tipo de posiçãonão será aceito.Mesmo que vocêsleiam o decreto naimprensa, nãopensem que essabatalha acabou.A sociedade civil nãovai desistir dessabriga enquanto nãoconseguir reverteresse processode concentraçãodos meios decomunicação.”

Gustavo Gindre

UMA LUTA DE SUMÔJornalista e empresárioda área de comunicaçãoe artes, Sérgio Gomes(à direita) usou umaimagem para definir adisputa em torno da tvdigital: é como no sumô,em que os lutadoresse olham, se estudame de repente um derrubao outro.

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tou assistindo a essa audiência pública naTV Senado, 2h30-3 horas da manhã, e elediz assim: – Olha, já tomei todas as pro-vidências como Ministro do Governo Lulae coloquei a bola na risca do gol. Agorabasta o Lula chutar. É só assinar, já estátudo resolvido.

Um senador do PFL, nordestino, muito àvontade, afinal de contas estavam todos elesali em casa e às vezes eles esquecem que atelevisão está gravando tudo, diz assim:

– Mas vem cá, e se de repente o Lulachutar fora, não tomar a decisão pelo pa-drão japonês?

Hélio Costa replica:– Impossível, porque a bola está na ris-

ca, basta o Lula chegar lá, dar um toqui-nho, e fazer o gol. É impossível. Não háoutra coisa a fazer.

Nessa hora, quem é de São Paulo e acom-panha o Lula há muitos anos, vê, conhece,sabe que nesse momento o Hélio Costa co-meteu um erro gravíssimo, que é subesti-mar a possibilidade de Lula ter outra alter-nativa que não seja esse fato consumado.Eis o que antigamente se chamava de caga-da. O sujeito comete uma cagada. E houveessa cagada do Hélio Costa. A partir daí Hé-lio Costa começou a ter dificuldades, já nãopôde ser liberado para ser vice do Aécio Ne-ves, etc. Agora eu vejo assim: nós estamostão acostumados com más notícias...

Audálio Dantas (interrompendo) –Quero anunciar que acaba de chegar Ro-nald Siqueira Barbosa, Assessor Técnico daAssociação Brasileira de Emissoras de Rá-dio e Televisão-Abert.

Sérgio Gomes da Silva – Acabou dechegar? Então, vamos lá. Você chegou de-pois que o Ministro Gilberto Gil saiu. Bem,tudo bem, vamos ver se terei de engolir al-

gumas das minhas palavras.Nós estamos tão acostumados com más

notícias que essa é mais uma boa notícia,aquilo tudo que Gustavo Gindre colocouaqui, que a Jandira colocou, que o Minis-tro Gilberto Gil colocou; nós estamos tãoacostumados com as más notícias que, àsvezes, isso tudo, essas possibilidades atéparecem mentira. Até parece mentira quea universidade brasileira, convocada aço-dadamente, com aquele pouquinho de di-nheiro, fosse capaz de produzir tanta in-teligência útil.

Até parece mentira que temos essapossibilidade, nesse mundo perplexoque está aí, de nos situarmos nesse ta-buleiro de outra maneira, não de cos-tas, nem de forma subalterna, mas defrente. Há possibilidade de economizar-mos esses bilhões mencionados aqui pe-la Jandira. Há possibilidade de desen-volvimento, de termos o nosso FMI,que é Fortalecer o Mercado Interno. Hápossibilidade de gerar mercadoria queseja compatível com a possibilidade deconsumo. Há possibilidade de termosnesse horizonte não muito longo o me-lhor da idéia do Darci Ribeiro, quequando aprovou a Lei de Diretrizes eBases foi para Lisboa passar 20 dias paraestudar o Projeto Erasmus, para estu-dar essa coisa da universidade européiade integração. Para se ter uma idéia, há1,5 milhão de estudantes universitári-os tirando diploma no fim em projetode educação à distância. E estamos fa-lando de dez anos atrás, quando aindanão existia internet.

Há possibilidade de os centros de ex-celência de todas as áreas, de Engenha-ria, de Química, de Matemática, deEducação, de Física, de Economia, deComunicação, poderem com esses re-cursos inimagináveis estender esse tra-balho de maneira interativa para que agente possa elevar no quadro de umadécada o nível escolar deste país-conti-nente, etc, etc.

Tudo isso é real. Nós estamos tãoacostumados a uma espécie de consci-ência infeliz que quanto mais a gentesabe mais a gente se sente perplexo, im-potente, incompetente, incapaz, mas derepente percebe que é perfeitamentepossível. Não estamos fazendo blabla-blá, estamos falando de coisas reais que

podem se incorporar a um outro padrão deexistência da nossa nação, do nosso povo,da nossa sociedade. Isso é real.

Mas teremos que ter tempo para isso.Qualquer coisa açodada desta vez signifi-ca uma precipitação que pode nos custar otipo de futuro que a sociedade brasileiraterá ou poderia ter tido. Isso é real. Nessesentido, é importante essa contribuição doIntervozes – eu estou com a camiseta doIntervozes para manifestar meu apoio a es-ses jovens, um grupo de 70 e 80 jovens,recém-formados, há três ou quatro anos,

que têm conseguido articular vários alia-dos e produzir. Esse documento ficou pron-to ontem ou anteontem e circulará encar-tado na revista Caros Amigos. Aqui estáuma parte considerável do que existe depensamento sobre tv digital e, portanto,merece que muitos dos que estão aqui exa-minem depois essas dez razões para umadecisão mais ponderável.

Foi dito aqui pela Jandira e o Gilberto Gilacertou comigo e com o Audálio que vamosfazer um debate como este em São Paulo,em cuja Assembléia Legislativa temos umafrente parlamentar de 27 deputados e 13partidos, uma frente sobre a questão das rá-dios comunitárias. O mesmo acontece naCâmara Municipal de São Paulo. Estou fa-lando de uma coisa que existe em São Pauloe que é inimaginável no Rio.

O que acontece é que São Paulo ainda con-tinua sendo uma província, tem que ser umacoisa muito importante para chegar a Tau-baté. Para ter repercussão e chegar aqui noRio de Janeiro tem que ser uma coisa muitoespetacular. Há grandes iniciativas ocorren-do nos últimos anos a favor da democratiza-ção que não são de conhecimento geral por-que São Paulo continua sendo uma provín-cia e o Rio continua sendo a capital.

Eu trago aqui esta notícia: este mapa dáconta de 269 escolas públicas municipaisque já têm equipamentos de rádio a bor-do. O artigo 266 do Plano Diretor de SãoPaulo (abro parêntesis: imaginem que du-rante os anos nefastos de Maluf, Pitta, Jâ-nio, etc nós ficamos 22 anos sem Plano Di-retor, no reino da especulação, à vontade.Finalmente há cinco anos atrás a CâmaraMunicipal conseguiu estabilizar e aprovouum Plano Diretor Estratégico, criaram-se31 subprefeituras e a cada dois anos essePlano Diretor é revisado em sua implemen-tação), o artigo 266, repito, estabelece queo Executivo municipal, ou seja a Prefeitu-ra, deve implantar o Plano Diretor de Ra-diodifusão Comunitária. Isto significa queas rádios que já existem nos bairros, maisesses ovos galados, que são as emissorasintramuros dentro da escola, constituema possibilidade real de uma rede na área decomunicação, educação e cultura que temtudo a ver.

E não é televisão, porque televisão é carapara montar e para manter, enquanto o rá-dio é barato para montar e manter. Enquan-to nós estamos falando, enquanto nós nãotivermos aqui informação para que a gentepossa fazer interpretação e, ao cabo, cadaum tenha a opinião que achar que deva ter,há necessidade de nos pormos a par do queaconteceu em São Paulo nos últimos qua-tro ou cinco anos, que são coisas indicati-vas de uma linha de democratização efeti-va dos meios de comunicação.

Apesar de São Paulo e dos 32 Municípi-os em volta, a Grande São Paulo é a únicaregião do País que oito anos depois da exis-tência da restritiva Lei da Radiodifusão Co-munitária não tem uma emissora legaliza-da. Nenhuma. Não houve sequer um cha-mamento do Ministério das Comunica-ções. Todas as emissoras são ilegais, nãoporque queiram ser, mas simplesmenteporque até hoje não foram chamadas a selegalizar. Isso é um fato brutal.

“Uma rádiocomunitária podeexistir mas não podese auto-sustentar.Para que semantenha ela teráque se valer derecursos de quemtem grana naperiferia, o quesignifica narcotráfico,crime organizado,igrejasfundamentalistas emgeral, políticos ricospadrão RobertoJefferson coma mala cheia ouquem tiver maiscontatos, ongs quemantenham contatosinternacionaisnaquele esquema:meu pobre, meuprojeto, meu gringo.”

Sérgio Gomes da Silva

UMA ONDA NO ARNo filme sob esse título(foto), o diretor mineiroHelvécio Ratton mostracomo uma rádiocomunitária muda avida dos jovens de umacomunidade popular,afastando-os dadroga, do tráfico e dacriminalidade em geral.

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A lei foi aprovada na Câmara dos Depu-tados pela Comissão de Ciência, Tecnologiae Comunicação. Quando isto se deu, 70%dos membros da Comissão eram proprietá-rios de grandes emissoras de televisão. Estálá, é real. Como não era possível deixar deaprovar uma lei, aprovaram uma lei que éuma barbaridade. Ela diz, por exemplo, queuma rádio comunitária pode existir mas nãopode se auto-sustentar. Ela não pode ter pu-blicidade, porque é comunitária. Na concep-ção desse pessoal, comunidade é o local demoradia, de vizinhança, visão absolutamen-te precária do que é comunidade. Por isso alei diz que só pode ter apoio cultural de ins-tituição que tenha sua sede debaixo do guar-da-chuva de um quilômetro de raio de ondeestá a emissora. Ou seja, uma instituição queesteja na Avenida Paulista, na Cidade Uni-versitária, etc. não pode dar nenhum apoiocultural a uma emissora.

Significa que uma emissora comunitáriacriada, o que é muito barato, para que semantenha terá que se valer de recursos dequem tem grana na periferia. O que, hoje,no Brasil significa narcotráfico, crime orga-nizado, igrejas fundamentalistas em geral,políticos ricos padrão Roberto Jefferson coma mala cheia ou quem tiver mais contatos,ongs que tenham contatos internacionais,porque aí é aquele esquema: meu pobre,meu projeto, meu gringo. O sujeito juntaas três coisas: um pobrinho específico, umprojeto específico e um gringo para finan-ciar. E mantém esse negócio. Nada de nos-so povo, de políticas públicas, etc. Estamosfrente a uma situação que precisa ser rom-pida, a começar por informar às pessoas oque se passa. Eu venho aqui como uma es-pécie de porta-voz da província de São Pau-lo para dizer o que está rolando por lá. E eutrouxe aqui para a ABI a revista A Rede, queé nacional, embora editada em São Paulo.Nós temos aqui uma matéria de duas pági-nas chamada Educação em sintonia, que con-ta exatamente: isso não é um projeto de lei,é uma lei, aprovada pela Câmara Munici-pal, sancionada pela Prefeita Marta Suplicye regulamentada pelo Prefeito José Serra. OComitê Gestor disso é formado pelo Sindi-cato dos Jornalistas, Sindicato dos Radia-listas, Universidade de São Paulo, grêmiosestudantís, professores, mais as Secretariasde Educação, Cultura, Saúde, Meio Ambi-ente e Lazer, que se reúnem agora, 12 de ju-nho, à tarde. É importante que fossem vero que é esse Comitê Gestor, que implanta-rá essa rede de emissoras a partir da rede deensino público.

Audálio Dantas – Você tem três mi-nutos. Nós voltamos depois no debate.

Sérgio Gomes da Silva – Eu tenho trêsminutos. O caso da mudança do rádio deanalógico para digital é uma barbaridade.Esse assunto não aconteceu, passou bati-do, eles rezam a cada dia que não apareça.Não vou entrar aqui nos detalhes técnicosdo rádio analógico para digital, porque aexposição ficaria comprida, é uma chatice,mas basicamente é aquilo que o Gindre dis-se. Eu tenho aqui uma posição, que é aemissora, e existe um terreno baldio à di-reita e à esquerda, que é exatamente para

que você faça no analógico a sintonia pas-sar de uma emissora para outra, até vocêcalibrar direitinho. Esse terreno baldio échamado de canal adjacente. Então, natransição do rádio analógico para o digital,e essa transição demorará dez anos, elesocupam temporariamente esse terreno bal-dio que não lhes pertence, em que a con-cessão é dessa posição, para fazer a transi-ção. Em seguida, ficam com ele.

Portanto, o que está para acontecer como rádio é o maior seqüestro de freqüênciade toda a História, desde o Padre Landellde Moura, que foi o brasileiro que inven-tou o rádio. Aliás, nome do CPqD. Não foio Marconi, que lamentavelmente carregoua fama, quem inventou o rádio. Do mes-mo jeito que aconteceu com Santos Du-mont, devo informar que também no rá-dio o inventor foi um brasileiro, um brasi-leiro que foi enterrado como louco. Lan-dell de Moura era um jesuíta, produzia coi-sas estranhas, falava que a voz dele saíasem fio por oito quilômetros. Esse homeminventou a fibra óptica. Landell com doiseles, gaúcho de Santa Maria.

Tenho a dizer que desde maio, junho, aCBN, a Bandeirantes, no caso tanto a Abertquanto a Abra se unificaram e decidirampelo sistema e-bock, que é um sistema queainda está em transição também nos Esta-dos Unidos. Para não dizerem que estoudivulgando informação de cocheira, isso foipublicado às claras na revista Meio & Men-sagem, semanalmente, desde maio do anopassado, há um ano, portanto. Diziam cla-ramente assim: – A gente cria um fato con-sumado e dane-se, não vou esperar lei ne-nhuma. Vamos aproveitar essa crise do Go-verno Lula e passar batido; bate a carteira,grita pega ladrão e manda ver.

Isto tem sido feito sistematicamente,sem que as universidades debatam a ques-tão, inclusive nas faculdades de Educação.

Audálio Dantas – Tempo esgotado.Convido o representante da Abert, Ronald

Siqueira Barbosa, para a sua intervenção.Antes eu queria dar um esclarecimento so-bre a não chegada a tempo no nosso debatedo Senhor Ronald Barbosa. Ele diz que oconvite se referia a 18h30min e efetivamen-te o primeiro convite, feito há cerca de 20-30 dias, falava em 18h30min porque era essaa nossa decisão interna. Depois, em razãodos compromissos do Ministro Gilberto Gil,esse horário foi antecipado para 16h30min,mas isso foi comunicado à Abert. Lamenta-velmente, parece que houve um ruído nacomunicação, já que tratamos do assunto ea mudança de horário talvez não tenha che-gado ao conhecimento da direção da Abert.Quero dizer que independentemente dessedesencontro a participação da Abert é bem-vinda, porque pretendemos que esta discus-são seja efetivamente democrática; comodemocrática que deve ser, a discussão temnecessariamente de chegar à sociedade bra-sileira como um todo e não ficar apenas res-trita aos gabinetes. Agradeço a presença deRonald Siqueira, a quem cedo a palavra, por20 minutos

Ronald Siqueira Barbosa – Quero medesculpar profundamente pelo equívoco,mas na verdade tenho uma correspondên-cia aqui do Senhor Audálio de 22 de maio,de uma semana atrás, que fala de 18h30min.Eu não recebi outro e-mail mudando essehorário e vim de Brasília para cá tranqüiloporque pela primeira vez chegaria cedo numevento; quando chego o Ministro estavasaindo e já estavam discutindo. Eu fiqueimuito constrangido, mas isso acontece.

Quero agradecer o convite em nome dadiretoria da Abert e dizer da satisfação deestar participando de um debate. O Gus-tavo Gindre eu conheço há muito tempo,a gente já trabalhou bastante no ComitêConsultivo do SBTVD. E a gente sabe queestamos presentes nessa discussão em to-das as áreas, em todos os setores em queapareça discussão sobre radiodifusão. Emnome do Presidente da Abert, José Inácio

PENSAMENTO COMUMEmbora adversários,Serra e Marta Suplicyrevelaram identidade depensamento em relaçãoà implantação deemissoras de rádio emescolas públicas de SãoPaulo. Ela sancionou alei e ele a regulamentou,permitindo sua aplicação.

WILSON DIAS/ABR ANTONIO CRUZ/ABR

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18 Junho de 2006

Pizane, agradeço o convite e quero para-benizar vocês pela reunião que estão pro-movendo neste momento.

Para falar um pouco sobre esse assunto,queria começar, dada a minha formaçãoum pouco mais técnica, por duas palavrasque considero emblemáticas neste séculoque começou agora, que é a questão da glo-balização e a questão da sociedade da in-formação. A primeira, globalização, acabousendo uma palavra desgastada porque eranecessário que os países tivessem umaidentidade para participar da globalização,porque senão eles se perdiam e acabavamsimplesmente como um portador de tec-nologia, de produtos e serviços que com-pravam o tempo todo e não faziam nada.Vocês podem perceber que essa palavra sedesgastou um pouco com o tempo.

Mas a outra palavra ficou na cabeça demuita gente – sociedade da informação –porque você em qualquer lugar do planetapoderia receber informação e estar infor-mado em qualquer mídia, em qualquermeio que você tivesse. E logicamente queisso não poderia acontecer enquanto to-das as mídias de comunicação utilizassema transmissão analógica. Isto só pôde serpensado em 1998, quando a Europa já es-tava digitalizada seja nas telecomunica-ções, seja nas transmissões por satélite enas transmissões a cabo, e os Estados Uni-dos já tinham definido seu padrão em 1996.

Começou-se a pensar na possibilidadeda convergência, da interatividade, da in-teroperabilidade e palavras que surgiram elogicamente nós já conhecíamos na con-vergência há muito tempo; não surgiramcom a digitalização. Quem não conheceum receptor que tem FM-AM, onda mé-dia e onda curta? Quem não conhece tam-bém o sistema de usar a telefonia para fa-zer a complementação de uma cobertura,seja de rádio ou de televisão?

A interoperabilidade, a interatividade,a convergência são palavras que nós já co-nhecemos no nosso dia-a-dia. Mas, na ver-dade, elas tomaram um vulto muito gran-de. E com isso, em Mineápolis, em 1998, aOnu resolveu tratar da questão da socie-dade da informação de forma oficial. E pe-diu que a UIT, que é a União Internacio-nal de Telecomunicações, incluísse naagenda da Onu uma questão sobre a so-ciedade da informação.

Foram feitas então aquelas duas confe-rências, após três pré-conferências, de quevocês já devem ter conhecimento, e sur-giu a conferência da cúpula mundial. Nes-sa conferência, as primeiras questões eramque mídia poderia atender num determi-nado país a toda a sua população. Tenta-ram com a internet, e viram que a inter-net não atingia nem 10% da populaçãomundial. Tentaram com satélite, tentaramcom cabo, tentaram com a telefonia, e vi-ram que só 20% da população mundial ti-nham acesso ao telefone.

A única mídia que podia atender a todauma população em qualquer país, fosse umpaís de Primeiro Mundo, fosse um de Ter-ceiro Mundo, era a radiodifusão. O rádio ea televisão atingem 80% da populaçãomundial. Essa população mundial temacesso a mais de 80% da mídia. Então, lo-

gicamente, todos os olhos da sociedade dainformação se viraram para rádio e televi-são, principalmente para radiodifusão.

No Brasil não foi diferente. Por quê? Por-que a radiodifusão terrestre brasileira, to-do mundo sabe, tem uma audiência fan-tástica. Ela atende a mais de 90% dos la-res. Se ela atingisse 2% não estaria nin-guém discutindo nada, porque ninguémdiscute nada sobre digitalização das tele-comunicações, embora as telecomunica-ções, com a telefonia celular, se propo-nham a fazer também um serviço demulticast. Mas ninguém procura sabercomo ela se digitalizou.

E a telefonia é um setor vital da eco-nomia brasileira.Quando você fala emreceita da comunicação, 93% da recei-ta da comunicação do Brasil, que é emtorno de 39 bilhões, ficam na mão datelefonia. Só 7% ficam na mão da ra-diodifusão. E por que essa incoerênciatoda, se a gente não tem nem 10% dareceita nacional de comunicação? Porque atrair tanto?

É que nós temos uma coisa fantásti-ca que se chama audiência. Essa pene-tração a telefonia não tem no Brasil. Sevocê pegar os celulares, os 80 milhõesde celulares que existem no Brasil, pos-so garantir que 80% são pré-pagos e pré-pagos de 20 reais. Quem vai colocar al-guma coisa a mais para você pagar, sevocê só pode pagar 20 reais?

Você não tem condição de oferecerum novo conteúdo nessa mídia. Porqueo in tone que você quer é 4 reais. Se vocêquer mandar um torpedo, uma mensa-gem, vai pagar 2 reais. Agora, quem podesuportar isso em termos de nação, emtermos de país? Mas radiodifusão não,porque é uma coisa que você simples-mente negocia com a loja que você temao seu lado e compra um receptor; porisso a gente fala que é livremente, dire-tamente recebida pelo público.

Isso não é um conceito nacional, um con-ceito brasileiro, é um conceito internacio-nal, está na UIT. Isso foi feito por acordo. AUIT é formada por acordo internacional, éfeita por recomendação, por resoluções, éum organismo da Onu. As coisas não nas-cem. Radiodifusão não é um serviço criadopelo Governo brasileiro e nem genuinamen-te brasileiro, mas um serviço adotado peloEstado brasileiro. Ele está na Constituiçãobrasileira, e a Constituição garante à Uniãoo direito de legislar sobre radiodifusão.

Mas o que vemos é que as pessoas es-tão, a partir de um apelo tecnológico que édigitalizar um serviço, querendo criar ummarco regulatório e discutir um modelo desistema de radiodifusão e tudo, quando,na verdade, isso é uma discussão que nósestamos dizendo posterior. A telecomuni-cação é que está interessada nessa desre-gulamentação. Ela quer um marco regula-tório. Ela quer uma regulamentação paradesregulamentar.

Na Europa eles estão desregulamentan-do toda a telecomunicação. Então, eles que-rem desregulamentar aqui também. É umdiscurso, e muitas vezes a gente precisaentender como funciona a coisa. Então, apartir, como eu estava dizendo, dessa so-

ciedade da informação e da UIT criando egerando essa discussão em cima da radio-difusão, o Brasil começou a mexer com oprocesso de digitalização de suas emisso-ras, a partir de um evento que houve emBrasília, da UIT, em que eles já traziam no-vos aspectos tecnológicos para radiodifu-são, através de um americano.

Criamos então um grupo chamadoAbert–Set e queríamos tratar da migraçãodos radiodifusores da transmissão analó-gica para a transmissão digital. Com isso,o que foi feito? Nós não fizemos escolhade padrão nesse momento. Nós buscamosquais eram os padrões que a UIT recomen-da. E não somos contra nenhum padrãobrasileiro, desde que esse padrão seja sub-metido a um crivo internacional, atravésde um organismo reconhecido como a UIT,e que se submeta a discussão de intercâm-bio de comunicação com outros padrõesque existem no mundo.

É isso que acontece. Então, se esse pa-drão for submetido à UIT, é lógico que eleserá também testado no Brasil exaustiva-mente porque temos interesse de testaraquilo que está oficial. Então, o que exis-tia: um padrão americano, um padrão eu-ropeu e um padrão japonês reconhecidospela UIT. A Anatel fez uma consulta pú-blica e foi feito teste nos três padrões.

Esses testes muitas vezes as pessoas nãoconhecem, mas nós pegamos todo o me-morial de teste de cada padrão e fomos acada detentor do padrão e perguntamos seaquilo que nos propúnhamos a fazer esta-va de acordo com aquilo que ele achava quedeveria ser feito. Ele disse, então, estar deacordo e assinou embaixo.

Nós viemos, testamos e mostramos queo padrão que dava mais flexibilidade ao ra-diodifusor, porque esse foi um princípioque nós adotamos, era o padrão ISDB.

Eu poderia ter uma alta definição, eu po-deria ter uma definição padrão, eu poderiatransmitir dados em baixa velocidade, po-deria suportar distribuir meu sinal digitalpara outras mídias. E, com isso, nós che-gamos para a Anatel, conseqüentementepara o Governo, e dissemos que o modeloque melhor atende às necessidades do ra-diodifusor brasileiro é o padrão japonês.

Com isso foi criado o USBTVD, que nãomudou o conceito de padrão, não determi-nou um outro padrão novo, no sentido deque você superasse o padrão japonês quefoi apresentado, apenas ele inovou na ques-tão do midware, em que a interatividade éuma inteligência nacional. Nós não pode-mos adotar um padrão japonês com umainteratividade, um midware dele, japonês.Isso vai ter que depender de cada país, vaidepender do Brasil e nós vamos utilizar ainteligência nacional. Só que radiodifusãoé um setor produtivo no Brasil em que mi-lhões de pessoas trabalham direta ou indi-retamente. Esse setor não pode ficar para-do enquanto se pesquisa numa universi-dade. Era como se o Governo decidisse fa-zer uma reforma de ensino superior e asuniversidades tivessem que fechar até quea discussão se completasse.

É isso que nós pensamos. Temos pes-soas que compram equipamentos, temosuma indústria que vende equipamentos,

“A radiodifusãoterrestre brasileiratem uma audiênciafantástica. Elaatende a mais de90% dos lares.Se atingisse 2%ninguém estariadiscutindo nada,porque ninguémdiscute nada sobredigitalização dastelecomunicações,embora astelecomunicações,com a telefoniacelular, seproponham a fazertambém um serviçode multicast. Masninguém procurasaber como ela sedigitalizou.”

Ronald Siqueira Barbosa

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que precisa vender equipamentos e essa in-dústria está parada, está todo mundo para-do. Por quê? Porque se discute o padrão eisso daí está atrasando e a indústria estáatrasando o setor como um todo. Esse é opensamento que nós temos. Então, nósqueríamos que isso tudo acontecesse para-lelamente.

Por que não aconteceu isso na telefoniadigital? Ela anoiteceu analógica e amanhe-ceu digital e ninguém discutiu nada, nin-guém falou nada, ninguém participou denada e ninguém quer participar de nada.Discute-se muito na questão da radiodifu-são quando você entrega porque você vaiter a multimídia, você vai entregar o seusinal digitalizado para diferentes mídias.

E você vai entregar para telefone celu-lar, para internet, para satélite, para qual-quer um. Você precisava ter uma qualida-de. Porque vai chegar num ponto que vocênão precisa entregar mais. Porque todomundo vai estar com seu receptor dedica-do recebendo de outras mídias. Nós temoso IPTV, nós temos o iPod misturado combluetooth. Tem muita gente já fazendo oacesso à internet via iPod. Então, o que vocêvai dizer? Você atrasa um setor em detri-mento de uma pesquisa a que você muitasvezes não garante os recursos durante oano. Não existe um planejamento de re-cursos. Não existe uma política indus-trial para o setor e você acaba atravan-cando todo um processo de algo que dácerto e é reconhecido internacional-mente como é a radiodifusão.

Nós queremos discutir qualquer tipode marco regulatório, qualquer tipo deregulamentação, nós sempre discutimosisso. Agora nós não queremos atrasar adecisão. Isso daí, como é uma questãode Estado, deve ser conduzido até den-tro do Congresso Nacional, assim comocomeçou pelo Congresso Nacional a cria-ção do serviço de radiodifusão comuni-tária e o serviço de radiodifusão. Essa dis-cussão deve ser iniciada pelo CongressoNacional, mas posteriormente à decisãosobre a digitalização. Até que essa dis-cussão esteja concluída, o setor já teráum prejuízo muito grande. Esse é o pen-samento da radiodifusão.

Queria trazer para os senhores esteinício de considerações, porque a mesame deu 15 minutos. Queria só fazer umcomentário com relação ao rádio comu-nitário em São Paulo, que foi citado aquina mesa. A cidade de São Paulo temuma distribuição de plano em que sevocê considerar do canal 201, que é acanalização de FM, até o canal 300, vocênão tem como entrar com um canal deFM naquela banda de FM como está aliem São Paulo.

O que fez a Anatel? Ela criou trêscanais – 198, 199 e 200 – anterior à ban-da para que pudesse acomodar o radio-com dentro da cidade de São Paulo. Etem feito uma reconfiguração do planoem todo o Brasil para acomodar o radi-ocom. O radiocom é um serviço oficial,é um serviço reconhecido que tem lei,que tem decreto, que tem norma, e éum serviço de radiodifusão.

Existe, sim, uma preocupação de aco-

modar esse serviço na cidade de São Paulo.Só que São Paulo é uma cidade muito gran-de e muito complicada para você colocarqualquer coisa. Não é só esse canal de FM,não. É canal de televisão, é canal de rádiode onda média, qualquer coisa. Se você qui-ser passar uma posteação para colocar maisemissoras de outro serviço qualquer, SãoPaulo é uma dificuldade. Se você quiser pas-sar cabeação em São Paulo é uma dificul-dade. É uma cidade que se resolve por sisó. Ela não pode ser levada num planeja-mento digamos nacional, porque o Brasilnão é exceção de São Paulo, não pode ficaresperando por uma decisão para São Pau-lo. E, também, a cidade de São Paulo se re-solve em si mesma, ela tem solução paraos seus problemas. Este é um ponto quequeria esclarecer.

O outro ponto é que o Padre Landell deMoura fez o primeiro transmissor, mas oserviço de radiodifusão como serviço de ra-diodifusão, em que você tem um planeja-mento, tem uma cobertura, esse realmen-te a gente tem desde a Rádio Pittsburg e oMarconi tem uma participação efetiva. Agente não pode descredenciar isso. Eu va-lorizo o Landell de Moura. Sei que é muitodifícil ter um brasileiro reconhecido e fa-zendo alguma coisa. E ele fez. Fez o pri-meiro transmissor reconhecido no mundotodo. Foi o Landell de Moura. Agora, comoserviço de radiodifusão, a gente ainda ficacom o Marconi e a rádio de Pittsburg.

Eu queria começar colocando essas coi-sas no debate.

Audálio Dantas – Antes de iniciarmoso debate, que começa e promete aqui namesa entre os debatedores, que farão per-guntas uns para os outros, depois estende-remos o debate à platéia, quero apenas re-gistrar que quase metade das pessoas saiulogo após as palavras do Ministro GilbertoGil, mas isso é natural. Muita gente saiudaqui com muita informação, mas eu gos-taria de continuarmos este debate com aparticipação do auditório. Antes de come-çarmos esta parte dos trabalhos, eu anun-cio que a Deputada Jandira Feghali e o Pre-sidente da ABI, Maurício Azêdo, têm que

se ausentar em razão de outros eventos,inclusive um deles relativo ao mesmo tema.Com a palavra a Deputada Jandira Feghali.

Jandira Feghali – Eu lamento porquegosto mesmo é de um debate, mas, infe-lizmente, tenho de me retirar. Eu adoroquando ele esquenta, aí é que fica bom.Aliás, eu sempre proponho às entidades eninguém cumpre que sempre se comecepelo debate, depois a gente fala. Eu nuncaconsigo essa inversão, que é bem mais in-teressante. É que o Clube de Engenhariatambém está promovendo debate sobre tvdigital agora e eu estou na mesa de lá e defato preciso ir porque está marcado paraàs 19 horas.

Mas eu gostaria de agradecer muito eespero de alguma forma ter trazido algu-ma informação que tenha contribuído. Eapenas dizer ao representante da Abert queo fato de a telefonia ter sido digitalizadasem debate tem muito a ver com o con-texto do Governo anterior, em que as coi-sas saíam sempre de surpresa e nós não ti-vemos a chance de fato de debater e defi-nir. Isso foi um fato consumado na telefo-nia, que apesar de sua função social nãotem o poder político da comunicação datelevisão e mesmo do rádio. Como tam-bém o rádio tem um fato consumado quea gente não conseguiu evitar porque tam-bém foi autorizado um teste e ficou. Issonão significa que continuemos desrespei-tando a democracia criando novos fatosconsumados.

Se o poder político da televisão pode serregulado, democratizado pelo Congresso,não vejo por que o desrespeito de se deci-dir primeiro o que se faz para depois per-guntar ao Congresso qual o marco regula-tório que terá. Acho que esse é um proces-so que tem que ser feito de forma coletivae democrática, porque o que está em jogoé muito. E o muito significa a possibilida-de de se democratizar serviços e informa-ções para o povo brasileiro.

Maurício Azêdo – Eu queria deixarminha saudação de despedida aos mem-bros da mesa e aos integrantes da platéiaporque vou ter que me retirar para partici-par na Câmara Municipal do Rio de Janei-ro da solenidade de entrega póstuma daMedalha de Mérito Pedro Ernesto ao nos-so pranteado companheiro Tim Lopes, poriniciativa da Vereadora Andréa GouveaVieira. Esse é um ato a que a ABI se associanão só pela imposição do convite formula-do pela Vereadora mas pela adesão que temà memória desse nosso grande companhei-ro. O resto da sessão será dirigido pelo nos-so companheiro Audálio Dantas, que foi oidealizador deste ato e deste debate e queo conduzirá com a proficiência que marcasua atuação à frente de entidades gremiaisde jornalistas, entre as quais o Sindicatodos Jornalistas no Estado de São Paulo, aFederação Nacional dos Jornalistas e a Re-presentação da ABI em São Paulo, cujo res-tabelecimento será inaugurado no próxi-mo dia 20, como fruto de um trabalhoexemplar do nosso companheiro AudálioDantas. A todos, a nossa saudação maiscordial. Muito obrigado.

“Queremos discutirqualquer tipo demarco regulatório,qualquer tipo deregulamentação,sempre discutimosisso. Como essa éuma questão deEstado, tem de serdiscutida noCongresso Nacional,mas posteriormenteà decisão sobre adigitalização, paranão atravancar adigitalização até queessa decisão estejaconcluída, senão osetor terá umprejuízo muitogrande. Esse é opensamento daradiodifusão.”

Ronald Siqueira Barbosa

DISPUTA ANTIGAIdealizador do debate eresponsável pelo conviteao Ministro da Cultura, oVice-Presidente AudálioDantas disse que adisputa em torno datv digital é continuaçãoda luta que há muito setrava para democratizara comunicação social.

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