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Curso de Extensão
ESPAÇO SOCIAL: VISÕES EREVISÕES
Prof Dr Edvaldo Carlos de Lima
TEXTO 01
Modulo III
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ESPAÇO TERRITÓRIO E CONFLITOS NO
CAMPO: O MOVIMENTO DE LUTA PELA
TERRA
Os conflitos no campo, no Brasil, não são uma exclusividade de
nossos tempos. São, isto sim, uma das marcas do desenvolvimento e
do processo de ocupação do campo no país.
Ariovaldo Umbelino.
No inicio da década de 2000 o Professor Manoel Correia de Andrade
preocupado com as transformações da sociedade na estréia de um novoséculo e do segundo milênio, publicou um artigo na revista do Programa de
Pós-graduação em Geografia da Universidade de São Paulo intitulado Espaço
Agrário Brasileiro: Velhas formas, Novas funções, Novas formas, Velhas
funções13
. Nele, distinguia o século XX como o século da morte e do abandono
de velhas utopias e, ao tempo, o século no que se plantaram outras novas.
Alertando-nos da sua visão de síntese, Andrade lançou o seguinte
questionamento, fundamentado na implosão do socialismo real em 1989
14
: e ocapitalismo exacerbado, não tenderia da mesma forma a implodir?
Para este autor o mundo necessita e está permanentemente elaborando
utopias. Elas são indispensáveis ao homem, sustentadas em ideias que
dividiram, dividem e dividirão a humanidade e provocarão lutas tão cruéis
quanto às vividas nos séculos anteriores. A história da formação do espaço
agrário brasileiro, e nomeadamente, o nordestino está permeada de utopias,
logo, de lutas. Se hoje podemos afirmar que o espaço agrário nacional é um
grande produtor de grãos, de cana-de-açúcar e de outros produtos, quase
sempre destinados à exportação, maior é a quantidade de trabalhadores rurais,
camponeses, agricultores que precisam de terras e condições para viver,
trabalhar e plantar alimentos. Apesar disso, os veículos ideológicos do capital,
como a grande mídia, apenas propagam os rankings econômicos mundiais nos
13 GEOUSP – Espaço e Tempo, São Paulo, Nº 12, p.11 - 19, 2002 14 Dissolução da União Soviética.
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que o Brasil se destaca, sem levar em consideração a péssima situação que
ocupa quando observamos o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Para
Andrade (2002) esta posição lamentável é resultado, em grande parte, do
processo de colonização e a sua evolução política.
1.1 - A luta de classes no campo e a emergência dos movimentos sociais
rurais no Brasil
Na realidade, o processo de colonização deu origem à apropriação da
terra dividida em grandes lotes, as sesmarias, doadas pela Coroa Portuguesa a
pessoas que dispunham de recursos para explorá-las, utilizando a força de
trabalho sob coação de indígenas e negros africanos. Este sistema deu origem
a grandes latifúndios e a exploração das terras em função de uma economia de
exportação, no entanto originou ainda as disputas, sob diferentes formas no
decorrer da história do Brasil, pela posse e propriedade da terra (TARGINO,
2002).
Nos meados do século XIX, visando consolidar o poder dos proprietários
e abrir perspectivas aos colonos estrangeiros (europeus), estabeleceu-se o
acesso a terra por meio do contrato de compra e venda, consolidando-se o
poder do latifúndio. Segundo Andrade (2002):
Fechou-se assim o “círculo de ferro” em torno do acesso àpropriedade; embora políticos e estudiosos com visão social,como André Rebouças e Joaquim Nabuco, pregassem anecessidade de uma reforma agrária, esta não foi feita e asvelhas formas de apropriação e de conservação dapropriedade impediram o surgimento de novas funções. Apropriedade continuou a ser, sobretudo produtora de artigos deexportação – açúcar de cana, algodão, cacau, café ou deoutros que tiveram uma demanda em crescimento no mercadointerno, principalmente o urbano. (2000, pág.14).
A Lei de Terras de 185015 se pautou em princípios meramente
mercadológicos, ou seja, só poderiam adquirir terras públicas aqueles que por
elas pudessem pagar. Por esse motivo, a lei foi mais um estopim para o conflito
15 Lei de Terras de 1850, nº 601 de 18 de setembro de 1850
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com os trabalhadores rurais e camponeses sem recursos para a compra (LIMA,
2006). Além disso, transformou-se em um mecanismo de institucionalização do
latifúndio afiançando, segundo Lerrer (2003): “um novo direito de propriedade
pensado de modo a garantir o poder dos fazendeiros” (p. 34).
Ao lado das monoculturas para exportação desenvolveram-se, em
pequenas propriedades situadas, frequentemente, em áreas menos férteis e de
difícil acesso, lavouras destinadas ao autoconsumo e à comercialização local e
regional. Essa pequena produção feita em áreas marginais da grande
propriedade por trabalhadores sem terra (meeiros e foreiros)16 tinha uma
função suplementar: garantir o abastecimento local e reter força de trabalho,
permitindo a sua exploração quando necessária ao latifúndio. Segundo Targino
(2002) a feição da luta pela terra no Brasil Colônia diz respeito às disputas
entre sesmeiros e pequenos posseiros. Isto porque, apesar de se situarem nas
áreas marginais dos engenhos e das fazendas mantendo uma relação de
funcionalidade positiva com essas unidades, as situações conflituosas surgiam,
principalmente, nos momentos de crescimento da atividade canavieira, quando
os engenhos passavam a requerer as terras dos posseiros para expansão do
plantio. Todavia, como nos lembra Targino (2002), as formas que a luta pela
terra assumiram naquele período foram mais modalidades de ajustes à
implantação e à consolidação do modelo da organização fundiária colonial, do
que uma oposição a ele próprio. Para este autor, nem mesmo os movimentos
libertários como a Inconfidência Mineira colocaram em discussão ou
questionaram a organização fundiária vigente.
As revoltas de escravos negros e indígenas também se iniciaram no
período colonial, disseminando em todo o território nacional quilombos17 e
16 Assunto discutido com mais profundidade na obra de Emilia de Rodat e Ivan Targinointitulada “Capítulos de Geografia Agrária da Paraíba. João Pessoa: Editora da UniversidadeFederal da Paraíba/UFPB, 1997.
17 Nos quilombos a terra era considerada um bem coletivo, no obstante, as famílias pudessemexplorar as suas próprias lavouras. Essa forma de resistência não foi considerada durante operíodo colonial como um perigo, nem para a ordem escravocrata, nem para a ordemlatifundiária. Apenas o Quilombo de Palmares colocou em cheque tanto o domínio colonialsobre uma área significativa, quanto a formação de um espaço estruturado sobre uma fortedesigualdade social. Daí as sucessivas investidas militares até a sua completa destruição(TARGINO, 2002).
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locais de resistência indígena. Ambas as formas de resistência foram
praticamente as únicas reações à estrutura fundiária em vigor, embora sua
motivação fosse a procura de liberdade mais do que a contestação do modo de
distribuição da propriedade fundiária.
Para Andrade (2002) o crescimento populacional e a formação de
núcleos urbanos fizeram com que a produção marginal ganhasse importância,
levando a pensar em uma reforma social que beneficiasse aos pequenos
produtores, uma vez que
Os primeiros anseios neste sentido surgiram, ainda no períodoimperial, com o pedido expresso de Joaquim Nabuco (Andrade,2000) em favor de uma reforma agrária, e com os projetoslevantados no governo João Alfredo, em 1889, decomplementação da abolição com a desapropriação de terras àsmargens dos rios navegáveis e das estradas de ferro (2002,p.15).
O período imperial foi rico em movimentos sociais e políticos vinculados
à questão agrária. A Cabanagem no Pará aglutinou durante cinco anos a
população pobre lutando pelo fim da escravidão e a redistribuição de terras e
conseguiu instalar um governo popular na província. A Balaiada no Maranhão
foi protagonizada por vaqueiros, camponeses e escravos contra a opressão a
que estavam submetidos pelos grandes fazendeiros. E, a Campanha
Abolicionista, ainda que tenha sido um movimento restrito a membros da
classe dominante e do estamento burocrático, por razões humanitárias
empunharam a bandeira da libertação dos escravos. Entre os abolicionistas da
“ala moderada” destacou Joaquim Nabuco. Esta luta trouxe no seu bojo a
discussão sobre a questão da propriedade fundiária, segundo relata Targino
(2002):
Alguns grupos abolicionistas afirmavam ser necessárioconceder ao escravo liberto um pedaço de terra como garantiada sua liberdade econômica e social (...) pois a concessão deliberdade sem acesso à terra seria condenar os escravos a umnovo tipo de servidão. Essa posição foi severamente criticadapelo poder escravocrata e mesmo pelos abolicionistasmoderados, vez que implicaria, de um lado, na quebra dopoder político dos senhores da terra e, de outro lado, na
desestruturação produtiva da agricultura, pois implicaria na
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eliminação da oferta de trabalho nas fazendas e engenhos. Aposição dos abolicionistas “moderados” e dos escravocratasterminou prevalecendo, de modo que a abolição da escravaturafoi promulgada sem a concessão da propriedade fundiária aosnovos “livres” (p. 150)
Durante a República não foi feito nada em favor de uma Reforma
Agrária. A ordem republicana anterior a 1930, segundo Andrade (2002), limitou-
se a reprimir com violência movimentos populares e rurais, acusando-os de
monarquistas, retrógrados e fanáticos. O caráter excludente da estrutura
fundiária, por um lado, gerou uma massa de trabalhadores subordinados e, por
outro, permitiu o surgimento de movimentos sociais que, de uma forma ou de
outra, questionavam a ordem fundiária em vigor. Para Targino (2002) existem
três fases distintas de organização popular durante este período da história do
Brasil.
A primeira identifica-se com a República Velha, quando surgem
movimentos de caráter messiânico que, sem contestar diretamente a ordem
latifundiária, apresentavam formas organizativas baseadas na propriedade
coletiva da terra. São os movimentos de Canudos, Contestado e Caldeirão.
Todos eles tinham em comum a proposição de uma forma de organização
social alternativa, fundada no trabalho na agricultura com a posse coletiva da
terra. Não se trata de movimentos de contestação à ordem política em vigor
nem à ordem fundiária vigente. Para este autor, as formas coletivas de
apropriação da terra e dos seus frutos eram, muito mais, uma estratégia de
sobrevivência e garantia de alimentos do que uma revolta contra o latifúndio
em si mesmo.
Canudos foi o primeiro grande conflito da nova ordem republicana,
liderado por Antônio Vicente Mendes Maciel, o Antonio Conselheiro, quem fixouem Belo Monte, Bahia, uma comunidade de beatos alicerçada na vida
comunitária. Segundo este autor, Belo Monte, chegou a ter cinco mil casas e
vinte cinco mil moradores. Sua organização socio-espacial e econômica estava
assentada na propriedade coletiva da terra. Canudos representava uma
ameaça direta à república nascente, para a qual era visto como um retorno á
monarquia. Também era uma ameaça para a Igreja, já que era um movimento
religioso que se consolidava e fortalecia fora do seu alcance, e especialmente,
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para o latifúndio, pois ameaçava a ordem fundiária temerosa de invasões e
saques.
A guerra de Contestado aconteceu numa na região situada entre Santa
Cataria e o Paraná, no Sul do país, que era “contestada” entre esses estados.
Esta região de pequenos agricultores e trabalhadores de fazenda foi ameaçada
pela construção de uma estrada de ferro com a concessão, por parte do
governo brasileiro, das terras situadas às margens da ferrovia a duas empresas
americanas. Os trabalhadores ameaçados se organizaram em torno do Monge
João Maria e posteriormente do Monge José Maria, fundando a Monarquia
Celeste. Como Canudos, organizava-se segundo normas comunitárias e
igualitárias. Contra este movimento se organizaram os grandes proprietários da
região, as duas empresas estrangeiras e os governos estaduais e federais. A
guerra durou de 1912 a 1916 quando foram aniquilados militarmente os últimos
núcleos de camponeses insurgentes.
O Caldeirão foi um movimento que agrupou romeiros do semi-árido
nordestino ao redor do Beato José Lourenço sob a proteção do Padre Cícero
Romão. Segundo Targino (2002), José Lourenço era um negro forte de
Bananeiras, Paraíba, que migrou para Juazeiro do Padre Cícero por volta de
1890. Santa Cruz foi o povoado fundado com mais de duas mil famílias. A vida,
como em Canudos e Contestado organizava-se sob dois eixos, trabalho e
oração. O trabalho era exercido nas terras cedidas, e tomadas, por grandes
proprietários da região, a produção era distribuída coletivamente para atender
às necessidades da coletividade. Com a morte do Padre Cícero o governo do
estado do Ceará investe contra a comunidade e posteriormente o ministro da
guerra envia os seus soldados para massacrar os camponeses, já que “era
preciso acabar com a influência comunista no domínio do latifúndio” (2002,
pág. 152).
A República Velha manteve o poder da velha oligarquia rural sob a
forma de coronelismo18, fundado economicamente na exploração intensa do
trabalhador rural e dos camponeses sem terra e, politicamente, no seu controle
18 A contextualização deste processo é amplamente discutida na obra do jurista Victor NunesLeal, intitulada “Coronelismo, Enxada e Voto: o município e o regime representativo no Brasil.Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1997.
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e marginalização. As famílias de trabalhadores rurais e camponeses foram
durante todo o período, com as exceções dos movimentos messiânicos,
completamente subordinados ao poder dos grandes proprietários rurais locais e
às instancias governamentais por eles controladas.
A segunda fase de organização popular e camponesa inicia-se na
década de 1940, após Revolução de Trinta, com o processo de
“redemocratização do país”, estendendo-se até o golpe militar de 1964, quando
organizações de massa assumem a luta pela Reforma Agrária. Para Andrade
(2002) naquele período o Brasil procurou-se encontrar a si mesmo, e foi o
momento em que surgiram idéias também novas que procuraram difundir
novas formas de propriedade, como a familiar e até a cooperativa e a coletiva,
que lhe dessem novas funções. O problema foi tratado por diferentes
estudiosos que colocaram também soluções diversas, como Josué de Castro
(1946), Alberto Passos Guimarães (1968), Caio Prado Júnior (1979), Celso
Furtado (1986), Manuel Correia de Andrade (1986), entre outros. Segundo o
próprio Andrade (2002):
Também foram apresentados projetos de reforma agrária na
Câmara dos Deputados como, entre outros, um que foi muitodebatido, o de Coutinho Cavalcanti (1961)19. Foramorganizados movimentos de trabalhadores rurais com umagrande influência no país, sobretudo nos estados em que haviauma maior população e uma maior consciência política, comoocorreu no Nordeste do país, em Pernambuco e na Paraíbadepois expandidos por Goiás, com as chamadas LigasCamponesas, dirigidas por Francisco Julião e Zezé da Galiléia(pág. 15 -16).
Para Medeiros (2006) o debate sobre a Reforma Agrária no momento
em que surgem as Ligas forma parte de uma ampla discussão sobre asperspectivas de transformação econômica, política e social do Brasil:
Por alguns, ela era entendida como ferramenta central paravencer o chamado "atraso" da agricultura e um instrumento dedesenvolvimento econômico. Para o Partido Comunista, era um
19 O autor refere-se a CAVALCANTI, Coutinho. Reforma Agrária no Brasil. Autores Reunidos.São Paulo, 1961.
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componente da etapa "democrático burguesa" da "revoluçãobrasileira". Para a direção das Ligas, era um primeiro passo emdireção ao socialismo. Para os trabalhadores que se envolviamnas lutas, a palavra sintetizava o sonho do acesso à terra, sema exploração dos "patrões" (no caso dos foreiros, moradores deengenho etc) ou pressão dos "grileiros" e suas milíciasprivadas, nos casos das áreas de expansão da fronteira. Emqualquer de suas versões, a perspectiva de alterações naestrutura fundiária provocou uma rápida organização dosinteresses ligados à propriedade da terra. Foram eles uma dasimportantes bases de sustentação do golpe militar (p. 01).
Durante a redemocratização do país em 1946, inicia-se também o
processo de reorganização dos trabalhadores rurais. Inicialmente, o Partido
Comunista do Brasil (PCB) teve uma importantíssima atuação, organizando
trabalhadores rurais e camponeses em ligas e, em seguida, em sindicatosrurais. Para Medeiros (1989) o PCB se volta para o campo, naquele momento,
tentando fazê-lo uma base de apoio para o seu projeto de transformação
social.
No que se refere à participação do PCB na organização das Ligas, o
processo foi esfriado com o decreto de ilegalidade do PCB em 1947 que
provocou o desmantelamento inicial das Ligas, retrocedendo significativamente
no processo organizativo dos trabalhadores no campo20
. De acordo comTargino (2002), na primeira metade de 1950, numa tentativa de reorganização
dos movimentos dos trabalhadores, foram realizadas a 1ª e 2ª Conferência
Nacional de Trabalhadores Agrícolas, em 1952 e 1953, respectivamente. Na 2ª
CNTA foi criada ULTAB – União de Lavradores e Trabalhadores Agrícolas,
influenciada fortemente pelo PCB. Este autor chama a atenção:
(...) o 1º Congresso Nordestino de Trabalhadores Rurais,realizado sob forte coação policial, em 1954, na cidade deLimoeiro, Pernambuco [já que] a realização desse Congressopode ser entendida como um resgate do intenso trabalho deorganização das Ligas Camponesas em Pernambuco. Comefeito, nesse estado, o trabalho do Partido Comunista tinhadado atenção especial à organização dos trabalhadores rurais,onde as ligas “desenvolvem-se criando escolas e outras formasde assistência. Expande-se pelo interior do Estado, em Paud´Alho, São Lourenço da Mata, Escada, Goiânia, Vitória de
20 O PCB consolidou-se nos anos 1920 e inícios dos anos 1930 como a principal força que se
propunha a falar pelos trabalhadores no país (MEDEIROS, 1989).
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Santo Antão, constituindo um sistema de autodefesa dostrabalhadores do campo sobre os quais houvesse ameaça deexpulsão” (Silva, 1998, p.111). (2002, p. 152).
No contexto da mobilização do PCB, na segunda metade de 1950, cria-
se, pela primeira vez da Zona da Mata Nordestina, um movimento de massa
expressivo junto aos trabalhadores rurais, reivindicando explicitamente a
mudança na estrutura fundiária, isto é, organizado em torno da bandeira da
Reforma Agrária. Seu foco disseminador foi a Sociedade Agrícola de
Plantadores e Pecuaristas de Pernambuco (SAPPP) fundada no Engenho
Galiléia, sobre a liderança de José dos Prazeres no município de Santo Antão
em 1955. Seus objetivos principais eram a formação de um fundo mútuo para
assistência médica e jurídica, a criação de escolas e de uma caixa funerária
para os associados. Após o começo pacífico da Sociedade21 iniciou-se a
repressão contra os trabalhadores, elevando o valor do foro e assim
expulsando os posseiros e foreiros. Os trabalhadores, diante destas investidas,
procuram apoio na capital do estado. Em Recife é criada uma comissão
pluripartidária de deputados liderados pelo deputado estadual Sr. Francisco
Julião de Paula, eleito Presidente de Honra da Sociedade. Essa luta foi
finalmente solucionada com a desapropriação de parte das terras do EngenhoGaliléia pelo governo de Cid Franco em 1959 e, outra parte, pelo governo de
Miguel Arraes em 1963. Sem dúvida, essa luta desencadeou o processo
organizativo dos trabalhadores rurais em Pernambuco e no Nordeste. Em 1962
as Ligas Camponesas já estavam presentes em 13 dos 22 estados brasileiros
tendo, segundo Targino (2002), maior expressividade nos estados da Paraíba e
Goiás.
Na Paraíba as Ligas têm o seu inicio também na Zona da Mata,concretamente no município de Sapé, ampliando-se logo para outros
municípios tanto da Mata como do Agreste. Destaca-se no litoral norte da Zona
da Mata, o município de Rio Tinto, onde o movimento teve presença marcante,
elegendo em 1962 o seu prefeito, com o apoio dos operários da fábrica de
21 Inicialmente teve como Presidente de Honra o próprio proprietário do Engenho, Sr. Oscar de Arruda Beltrão, que foi sucedido pelo seu filho Sr. Oscar Beltrão, responsável pela repressão
contra os trabalhadores.
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tecidos que lá operava, propriedade da família de grandes latifundiários
Lundgreen.
No inicio da década de 1960 as relações entre as Ligas e o PCB
começam a se distanciar, e este último passa a atuar no processo de
sindicalização dos trabalhadores rurais, adotando como estratégias de luta o
salário mínimo, a redução do arrendamento de terras, a defesa jurídica dos
seus assegurados e a defesa de uma legislação trabalhista específica para o
campo.
A Igreja Católica por sua vez, durante esta segunda fase, procurou
manter as famílias de trabalhadores rurais e camponeses em torno de si,
desenvolvendo, segundo Andrade (2002), uma forte ação em vários pontos do
país, por meio de movimentos de alfabetização de camponeses e de
organização sindical. Foi no ano de 1960 que a Igreja se voltou para um
trabalho organizativo e de mobilização, criando, inicialmente no Rio Grande do
Norte e por meio do SAR – Serviço de Assistência Rural do Rio Grande do
Norte, um setor de sindicalização rural que passou a mobilizar lideranças
sindicais e dar orientações sobre a formação de sindicatos22. Segundo
Medeiros (1989) foi a partir daí que o SAR desencadeou uma intensa
campanha de sindicalização, utilizando-se da rede de emissoras controladas
pela Igreja e os párocos locais, estendendo a experiência para outros estados
do Nordeste. Em 1961 surgiram o Serviço de Orientação Rural de
Pernambuco, a Equipe de Sindicalização Rural da Paraíba e a Equipe de
sindicalização e Planejamento da Arquidiocese de Teresina no Piauí. Um ano
depois foi criado o Serviço de Orientação de Alagoas. A orientação comum
vinda da CNBB foi a da criação de um sindicalismo cristão, afastado da luta de
classes, mas defensor de direitos dos trabalhadores e de uma Reforma Agrária, baseada na propriedade familiar. O objetivo central da CNBB era o
combate ao comunismo, por isso defendeu a extensão dessa sindicalização lá
onde supunha existir tal perigo. Porém, em cada estado e em cada região essa
orientação foi mediatizada pelo tipo de concepção da igreja local, que acabava
impondo a sua marca na organização emergente. Por isso, como coloca
22 Embora não houvesse ainda regulamentação legal para tanto, a Igreja se juntou às forças
que pressionavam ao Estado para obtê-la.
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Medeiros (1989): “(...) é difícil falar em homogeneidade de linha de ação
nessas entidades criadas a partir da ação eclesial” (p. 77).
Todavia, pela sua radicalidade, destaca-se no início dos anos sessenta,
a formação do grupo católico Ação Popular (AP). Esta organização era
propriamente política, à diferença da Ação Católica Brasileira e os seus
segmentos mais jovens, Juventude Universitária Católica (JUC) e Juventude
Estudantil Católica (JEC)23. A AP foi uma dissidência da Ação Católica que
entrou em atrito com a hierarquia da Igreja e que nasceu já em âmbito
nacional. Entretanto, no Nordeste, segundo Targino (2002), a sua ação merece
um destaque, por ser responsável pela formação de grupos de camponeses e
trabalhadores rurais sob a coordenação do Padre Joseph Servat. Trabalho que
germinou a organização de movimentos posteriores de resistência camponesa.
Da mesma forma, a ação da Juventude Agrária Católica (JAC) no
Nordeste coordenada pelos padres Nelson Araújo e Carmil Vieira, embora com
as limitações já apontadas, teve um papel importante na formação de
lideranças na continuidade da luta, seja por meio do movimento sindical, seja
por meio de novas formas de atuação da própria Igreja, como a CPT.
Ainda na segunda fase de organização dos trabalhadores proposta por
Targino (2002) e que finaliza no golpe de 1964 é importante lembrar, no final
dos anos de 1950, o movimento dos posseiros no norte de Goiás chamado da
Revolta de Trombas e Formoso, liderados pelo posseiro José Porfírio. Esses
trabalhadores e migrantes se organizaram, em conselhos, contra os interesses
de grileiros e as investidas da polícia, conquistando não apenas a terra senão
também a sua representação política, elegendo vereadores, prefeitos e até
deputados estaduais, como o próprio José Porfirio eleito em 1962. O Estado
Livre de Trombas e Formoso de caráter popular e socialista resistiu ate 1964(MEDEIROS,1989, GOHN, 1995).
23 Ambas eram organizações de leigos, o que lhes permitia certo grau de autonomia quanto àorientação hierárquica da Igreja. Isso possibilitou o engajamento dos seus militantes em lutascom orientação distinta à da CNBB, colocando-se do lado dos protestos por transformaçõesmais radicais na estrutura social. Os principais quadros do Movimento Eclesial de Base (MEB)
formaram parte dessas juventudes cristãs.
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Com o golpe militar de 1964 houve um desmantelamento dos
movimentos de massas presentes no campo. As Ligas foram desbaratadas e a
atuação dos partidos políticos, extremamente limitada.
A terceira e última fase na periodização sugerida, inclui tanto os
períodos de resistência à ditadura militar e redemocratização do país, quanto
os movimentos de lula pela terra e pela Reforma Agrária foram organizados
pela CPT, pela Confederação Nacional de Bispos do Brasil (CNBB); e pelo
MST, como a ação destes na atualidade. A partir dos anos de 1960 e em
virtude da expansão da fronteira agrícola nacional em direção às regiões Norte
e Centro-Oeste, orientada e sustentada pela ação do Estado, agravaram-se as
formas de exploração do trabalhador rural e atração/expulsão dos
trabalhadores rurais na área de fronteira. No Nordeste, a expansão da pecuária
subsidiada pelo crédito oficial e pelos incentivos fiscais foi reforçada pelo
crescimento do cultivo de cana-de-açúcar 24 (TARGINO, 2002). Diante destes
fatos várias figuras do episcopado brasileiro se engajam e protagonizam a luta
em defesa dos trabalhadores do campo25. Todos eles passaram por
experiências de forte repressão face ao contexto ditatorial da época, seja por
parte do Estado como de grupos privados, particularmente nas regiões
amazônica e nordestina.
Diante da repressão sofrida, surgiu a necessidade de dar organicidade
às lutas que estavam sendo realizadas isoladamente. Nesse contexto cria-se a
CPT.
Ao longo da década de 1970 foram formadas diversas pastorais no seio
da Igreja militante, para Martins (1986) apud Mitidiero Jr. (2010), a mudança de
posição da Igreja percebe-se em 1973
Até 1973, aproximadamente, a posição da Igreja parece tersido uma posição de expectativa, de apoio mais ou menos
24 Principalmente a partir de 1975 com a criação do PROÁLCOOL.
25 Dentre os padres mais combativos, inspirados pela Teologia da Libertação, podemosdestacar Dom José Maria Pires (João Pessoa), Dom Hélder Câmera (Olinda/Recife), DomPedro Casaldáglia (São Félix do Araguaia), Dom Antonio Fragoso (Crateús), Dom Francisco Austragésilo (Afogados de Ingazeira), Dom Tomas Balduino (Goias Velho) e Dom FernandoGomes (Goiania). Para maiores informações sobre a ação da Igreja católica na luta pela terra
consultar a tese de doutorado de MITIDIERO, Jr. (2010)
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claro, de esperança na aplicação do Estatuto da Terra e desolução dos problemas [...] após 1973 começa a prisão dospadres (p. 104)
Segundo Mitidiero Jr (2010), a partir desse momento foram vários os
clérigos que abandonaram definitivamente qualquer possibilidade interpretativa
que conciliasse o modo de produção capitalista à justiça social. Determinaram,
finalmente, que o capitalismo em hipótese alguma traria justiça para o campo.
Daí, a idéia de formar uma pastoral que apoiasse os camponeses e
trabalhadores rurais, o que significava estar integralmente junto a eles. Em
1975 e com esta proposta cria-se a CPT, que na interpretação de Pessoa
(1999, p.78) apud Mitidiero (2010):
(...) colocando-se como aliada dos trabalhadores, a IgrejaCatólica, dos anos 1970 abandonou a fixação anticomunista ea preocupação com o controle das organizações dostrabalhadores rurais, anunciando-se como suplência,propondo-se como serviço, como instrumento pastoral (p.104).
Desde a sua criação, a CPT se tornou uma importante força de
mobilização e organização dos trabalhadores rurais na luta pelo acesso à terra
e na luta pela permanência nela, em face da crescente investida do capital na
agricultura, que redundava na expropriação e expulsão dos camponeses e
trabalhadores. Segundo Targino (2002) devido à repressão sobre os partidos
políticos e outras formas de organização da esquerda, em torno da CPT se
agregaram forças sociais que não encontravam seus próprios canais de luta
pela transformação social. Entretanto, nos anos 1970 começa também a
fortalecer um movimento contra as lideranças sindicais estabelecidas no
regime militar. Para este autor, a realização em 1979 do III Congresso Nacional
de Trabalhadores Rurais, um marco desse movimento, já que, ao assumir o
controle dos sindicatos, principalmente, nas áreas onde se tinha intensificado o
assalariamento rural, as novas lideranças rearticularam o movimento dos
trabalhadores rurais em torno de questões especificamente trabalhistas, como
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foi a greve26 dos canavieiros no Nordeste, iniciada em Pernambuco, e na zona
açucareira paulista (MOREIRA, 1997).
Os anos 1980, além de ver a reorganização do movimento sindical,
vão assistir também ao surgimento do MST. Conforme Medeiros (1989)
No início dos anos 80, a luta pela terra na sua forma recorrenteem diversos momentos da história do país, ou seja, envolvendoposseiros e grileiros, rendeiros, foreiros ou parceiros eproprietários da terra e, mais modernamente, posseiros ebeneficiários de grandes licitações de terra feitas durante oregime militar, se intensificou. Mas a ela agregaram-se novospersonagens, gerados na expulsão de seringueiros dosseringais nativos, para transformá-los em pastagens, naconstrução de barragens para usinas hidroelétricas, ou pela
exclusão a que milhares de trabalhadores agrícolas foramcondenados frente ao rápido avanço da modernização docampo. Foi nesse caldo de cultura que novas formas de lutasurgiram e que a demanda por reforma agrária se intensificou(p. 139).
Para Stedile (1997) foram três forças sociais que deram origem ao
MST: o trabalho pastoral da CPT, o movimento de oposição sindical e a ação
de militantes e lutadores que viram na Reforma Agrária uma forma de luta
contra o regime militar. Sua constituição formal aconteceu no EncontroNacional dos Sem Terra, em Cascavel no estado do Paraná em 1984, quando
se apresentaram as bandeiras da sua luta: subordinação da propriedade à
justiça social; produção agropecuária voltada para a segurança alimentar e
para o desenvolvimento social do trabalhador; apoio à agricultura familiar por
meio de crédito; preço justo e seguro agrícola; desenvolvimento de tecnologia
adequada à pequena produção; melhoria das condições de vida e acesso dos
trabalhadores à educação; cultura, segurança e lazer; terra para quem nela
trabalha e fim do latifúndio no país (FERNADES, 2000; STEDILE, 1997).
Fazendo um paralelo com o contexto político e social no que
surgiram as Ligas, Medeiros (2006) aponta para as peculiaridades do Brasil, e
do seu campo, no momento de constituição do MST. Para esta autora:
26 O movimento grevista no início dos anos 1980 trouxe à tona o modelo sindical que se gestounas áreas rurais durante os anos da ditadura. Mais articulado, integrado, portador deconcepções objetivas de luta, buscou se atualizar por meio do modelo Pernambuco, umencaminhamento que explora as virtualidades da legislação vigente procurando buscar nela o
espaço para a mobilização e organização dos trabalhadores (MEDEIROS, 1989).
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O momento do MST é outro: o de uma agricultura modernizadatecnologicamente, que intensificou o processo de expropriação já em curso. Quando, no início dos anos 80, a demanda porterra ganhou os espaços públicos, a questão que se colocava
no debate era outra: qual o sentido de uma reforma agrária sea agricultura está cumprindo seu papel no desenvolvimento?No entanto, a demanda não só existia como conseguiumobilizar, de forma inédita, trabalhadores de norte a sul do país(p.01).
E incrementa:
Num primeiro momento, a base social do MST era
principalmente pequenos agricultores que se pauperizaram justamente ao longo desse processo de modernização e quese viram impossibilitados de se reproduzir socialmente comoprodutores autônomos, em virtude do alto preço da terra,endividamento etc. Num momento posterior, e expandindo-sepelo Brasil todo, o MST passou a mobilizar assalariados ruraise mesmo populações das periferias urbanas que passam a verno acesso à terra uma alternativa à falta de emprego, àinsegurança. O sindicalismo rural também passou a seenvolver em acampamentos e ocupações de terra, ampliando amobilização (p.01).
As forças e interesses ligados à propriedade fundiária não assistiram
de mãos atadas a este movimento. A sua reação se concretizou na criação, em
1985, da União Democrática Ruralista (UDR) e da sua eficiente ação
parlamentar por meio da chamada “bancada ruralista”. A finalidade expressa da
UDR era “fazer pressão para que o governo pense duas vezes antes de meter -
se a desapropriar terras” conforme relata Targino (2002, p. 155) em alusão as
declarações de um dos seus fundadores em reportagem da revista Veja (nº
928, agosto 1986).
No mesmo ano de criação da UDR e um ano depois da constituição do
MST, José Sarney toma posse da (Nova) República encerrando-se o regime
militar 27 e assume o compromisso de dar continuidade aos planos já traçados
por Tancredo: a realização da Reforma Agrária. Assim, em maio de 1985 o
27 O candidato eleito foi Tancredo Neves, quem, por questões de saúde não conseguiu assumiro cargo. Um dos seus compromissos de campanha foi a realização da Reforma Agrária.
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presidente, por ocasião do IV Congresso da CONTAG lança a Proposta do
Plano de Reforma Agrária da Nova República, que cobriria o período de 15
anos. A sua elaboração e lançamento colocou na ordem do dia a discussão
sobre a Reforma Agrária no país. Os movimentos sociais fortaleceram a
representação dos trabalhadores rurais, agregando diferentes forças como:
MST, CPT, Organização dos Advogados do Brasil (OAB), CONTAG,
Associação Brasileira para a Reforma Agrária (ABRA) e Confederação
Nacional dos Trabalhadores da Indústria (CNTI). Porém, segundo Targino
(2002), embora se colocassem favoráveis ao Plano, as “dissensões entre as
forças não lhes possibilitaram sugerir nada de substancial para agregar”
(p.156).
O embate de classes no campo se acirrou durante o processo de
discussão do PNRA, aumentando o número de conflitos, ocupações e violência
armada dos proprietários. Essa discussão desembocará na Assembléia
Constituinte de 1º de fevereiro de 1987. As forças conservadoras, com um
significativo número de deputados constituintes, aglutinaram-se em torno do
chamado “Centrão” e conseguiram retroceder no que já estava estabelecido no
direito constitucional. Como coloca Targino (2002);
Embora o artigo 184 da Constituição tenha mantido o principioda desapropriação de terras para fins de reforma agrária, caso oimóvel rural não estivesse cumprindo a sua função social, aConstituição introduz alguns princípios que se tornaramimpeditivos para a ação mais contundente em relação à políticaagrária, a saber: a) reintroduz o critério da indenização prévia,que havia sido eliminado pela AI-928; b) determina que asbenfeitorias sejam indenizadas em dinheiro; c) considerainsusceptível de desapropriação as terras produtivas, deixandointeiramente em aberto o que seja terra produtiva (art. 185); d)
deixa vagos e ambíguos os critérios para determinar a funçãosocial da propriedade fundiária (art.186) (p. 156).
Não obstante aos ganhos expressivos da oligarquia e burguesia rural
no período, assiste-se também a expansão e consolidação de uma das forças
28 O autor se refere ao Ato Instituinte Número Nove editado em 25 de abril de 1969 eestabeleceu regras para a Reforma Agrária de cunho conservador. Este ato institucional davapoder ao presidente para delegar as atribuições para a desapropriação de imóveis rurais porinteresse social, sendo-lhe privativa a declaração de zonas prioritárias.
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da classe trabalhadora e camponesa extremamente atuante: o MST. Para este
autor, se a CPT foi primordial na aglutinação dos trabalhadores rurais sem terra
a na sustentação da sua luta durante a ditadura, a partir da Nova República
esse papel será cada vez mais desempenhado pelo MST, ultrapassando, no
cenário político, os limites do rural. Deste modo, durante os anos 1990, quando
no Brasil é imposta a subordinação total aos ditames do capital transnacional,
nos governos Collor e FHC, o MST se constrói como uma importante força
social que arregimenta massas, fazendo-se presente em todos os momentos
de confronto e de oposição à política praticada por aqueles governos.
A expressividade da luta durante esses anos é manifesta, infelizmente,
pela violência que envolveu os conflitos nas suas diferentes fases. Tais atos
estiveram sempre vinculados à certeza de impunidade, à fragilidade do Poder
Judiciário e à conivência deste com o Poder Político local (Targino, 2002).
Sem sombra de dúvidas, atendendo aos relatórios de conflitos
publicados anualmente pela CPT, o MST foi durante a década de 1990 a forma
como a classe trabalhadora unida no campo e na cidade, conseguiu
impulsionar o processo de desapropriação de terras para fins de Reforma
Agrária. Na década em curso, anos 2000, o governo do Partido dos
Trabalhadores (PT), assume a presidência da República, elegendo como
presidente Luis Ignácio da Silva, Lula, em 2003, reelegendo-se em 2007 e
dando continuidade ao governo do partido em 2010 com a candidata eleita
Dilma Roussef.
Para Medeiros (2006) durante o “primeiro mandato Lula” os
movimentos de luta pela terra, entre eles o MST e a CONTAG, enfrentaram
certa dificuldade política em lidar com a novidade de serem interlocutores
diretos do Governo Federal. Todavia, em 2003/2004, II Plano Nacional deReforma Agrária, considerado por Carvalho Filho (2006) tímido nas suas
metas, significou o abandono de realizar um processo de alteração radical na
estrutura fundiária. Mesmo assim, houve colaboração dos movimentos
acordando um conjunto de metas que significassem uma política fundiária
aceitável.
O II Plano teve duas versões: uma que ficou como a proposta da
equipe elaboradora coordenada por Plínio de Arruda Sampaio, que tinha como
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objetivo assentar um milhão de famílias em terras desapropriadas por interesse
social de Reforma Agrária, terras devolutas, terras públicas já incorporadas ao
patrimônio da União, permuta de terras, terras confiscáveis e compra e venda.
A outra versão, do Ministro Rosseto, tinha como objetivo assentar quatrocentas
mil famílias em terras novas, regularizar quinhentas mil famílias e beneficiar
cento e cinqüenta mil famílias com crédito fundiário (FERNANDES, 2010).
Dados do DataLuta (NERA, 2010) mostram que no Governo Lula entre
2003 e 2009 foram assentadas 228.335 novas famílias e regularizadas as
posses de 129.440 famílias e entre 2003 a 2008, foram atendidas 58.240
famílias com a política de Crédito fundiário, deixando um passivo de mais da
metade do Plano.
Na avaliação deste período para Gilmar Mauro, liderança nacional do
MST, deu-se continuidade, como política de governo, apenas a criação de
assentamentos29:
(...) Ou seja, aqui e acolá, pela força da pressão camponesa,desapropria algumas fazendas para aliviar os problemassociais. Mas isso não é reforma agrária. Tanto que o censo doIBGE de 2006 revelou que agora a concentração dapropriedade da terra é maior do que no censo de 1920, quandorecém saímos da escravidão. E no governo Lula não tivemosespaço para debater um processo de reforma agráriaverdadeiro, e nem tivemos força de massas para pressionar ogoverno e a sociedade. Por isso, a atual política deassentamentos é insuficiente por um lado, mas reflete acorrelação de forças políticas que há na sociedade.Lamentamos apenas que algumas forças dentro do governo seiludam a si mesmas, fazendo propaganda ou achando queessa política de assentamentos – insuficiente – fosse reformaagrária (MST, 2010).
Constamos que, no atual estágio de desenvolvimento, a Reforma
Agrária pela qual lutar não é mais, para o MST, um projeto que visa apenas a
distribuir terras aos camponeses para eles produzirem junto às suas famílias
para o mercado interno, como poderíamos entender a proposta na sua
29 Segundo o Núcleo de Estudos, Pesquisa e Projetos de Reforma Agrária – NERA/UNESP,embora as ocupações de terra tenham diminuído em alguns Estados nos últimos anos, emespecial em 2010, o número de famílias envolvidas na luta pela terra na Era Lula, não é tãodistante do da Era FHC - 570 mil famílias e 3.880 ocupações. Os dados do governo Lula,relativos aos dois mandatos indicam a participação de cerca de 480 mil famílias em 3.621
ocupações de terra ao longo desse período.
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concepção clássica. A alternativa apresentada pelo movimento social no
decorrer dos anos 2000 é lutar por um novo tipo de Reforma Agrária, definida
pelo MST como “popular”, pelo MPA como “Plano Camponês” e que a
CONTAG e FETRAF chamam de “agricultura familiar ”, que se fundamente na
reorganização do modelo de produção agrícola do país por meio de: uso da
natureza para a agricultura diversificada; a fixação de famílias no meio rural
com condições de vida; a eliminação dos latifúndios existentes por cima dos
1.500 hectares; a adoção de técnicas de produção agroecológica e a produção
de alimentos sadios para o mercado interno. Essa proposta, nas palavras de
Gilmar Mauro, depende: “de um novo modelo de desenvolvimento, que tenha
distribuição de renda, soberania nacional, rompimento com o domínio do
capital estrangeiro sobre a agricultura e a natureza” (MST, 2010).
A concepção do projeto de Reforma mudou da mesma forma que o
campo de forças políticas se transformou desde os primórdios da luta pela
terra. Concomitantemente, durante este período observamos novos
direcionamentos e formas de luta. As ocupações de terras improdutivas e
devolutas, e a mobilização de trabalhadores rurais e camponeses em atos
públicos como passeatas, romarias ou ocupações de prédios e órgãos oficiais,
continuaram e continuam sendo mecanismos de organização e construção de
consciência de classe na luta. No entanto, durante a década de 2000 os
protestos do MST contra as grandes empresas transnacionais do agronegócio
se intensificaram, e junto à Via Campesina, tomaram protagonismo. Esse
direcionamento da luta se fundamenta na nova proposta de Reforma Agrária
defendida por estes movimentos, já que não se trata mais de uma disputa entre
os pobres-da-terra e os latifundiários, senão de modelo de produção e uso da
natureza. Na atualidade o conflito se desenha entre, de um lado, a aliança dosgrandes proprietários e o capital financeiro; as grandes empresas
transnacionais que controlam a produção de insumos e sementes; o mercado
nacional e internacional e as empresas da grande mídia. Por outro lado, os
trabalhadores sem – terra, os camponeses com pouca terra e a agricultura
familiar como um todo. Nesse cenário de disputa para o MST hoje o “inimigo o
principal” são os bancos e as empresas transnacionais (MST, 2010). Todavia, a
luta de classes contra o agronegócio e o capital financeiro e transnacional não
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inviabiliza, para o MST, a luta por medidas setoriais que ajudem a acumular
força dentro da classe, como são as lutas por melhores condições de vida, a
conquista de novos assentamentos, a moradia rural, o programa luz para todos
etc.
Para a CPT a Reforma Agrária na “era Lula” não foi uma prioridade
para o Governo Federal:
A Reforma Agrária que deveria ser assimilada enquanto umProjeto de nação e de desenvolvimento sustentável,transformou-se em um precário programa de assentamentos, emnível bastante aquém das reais demandas dos homens emulheres do campo (CPT, 2010).
Para este movimento a Reforma Agrária, entendida como o conjunto de
medidas estratégicas para enfrentar a concentração da propriedade da terra e
para promover o desenvolvimento do campo, transformou-se em um programa
de assentamentos bastante aquém das propostas do II Plano Nacional de
Reforma Agrária. A CPT denuncia:
A histórica disputa no Brasil entre dois projetos para o campo
brasileiro está sendo desequilibrada em favor dos poderososde sempre. De um lado, se favorece com recursos públicosabundantes o agronegócio agroexportador e destruidor doplaneta. De outro lado, praticamente se relega a um planoinferior a agricultura familiar e camponesa que é responsávelpela produção dos alimentos, do abastecimento do mercadointerno e pelo emprego de mais de 85% da mão-de-obra docampo, segundo o último Censo agropecuário de 2006 (CPT,2010).
Em relação à atuação do Governo Federal na Zona da Mata
pernambucana, a CPT amplia:
(...) não questionou o domínio territorial do decadenteagronegócio canavieiro. Nem a tragédia ambiental, com ainundação de dezenas de cidades em Alagoas ePernambuco30, em decorrência da devastação provocada pelacana de açúcar, sensibilizou os Governos Federal e Estadual.Embora o IBAMA tenha ajuizado ações civis públicas paraobrigar as Usinas de Açúcar e Álcool de Pernambuco a repor
30 Fatos acontecidos nesses estados em junho de 2010.
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os seus passivos ambientais, a forte pressão do setor e o apoiodo Ministério Público Federal, fez com que houvesse umatrégua da Justiça para com essas Empresas seculares,enquanto a população mais pobre perdia tudo que tinha nadevastadora enchente de 2010. Diante desses fatos, areconstrução das cidades está se dando em áreasdesapropriadas das Usinas, sem que qualquer medidapreventiva ou estrutural de recomposição da Mata Atlânticadestruída tenha sido tomada (CPT, 2010).
Uma das novidades deste período é a ênfase com preocupação da
natureza e a degradação do ambiente como pautas de reivindicação da
Reforma Agrária, tanto no MST como na CPT. Para este movimento, o mundo
se volta hoje para as questões ambientais e elas têm que estar presentes no
processo e projeto de Reforma Agrária para o Brasil, porém, o Governo Lula,na formatação e tramitação do novo Código Florestal apenas beneficiou o
latifúndio.
No balanço positivo do Governo Lula os movimentos reconhecem uma
série de avanços, tais como: a) a transformação do Programa Nacional de
Agricultura Familiar (PRONAF) e do Programa Nacional de Educação na
Reforma Agrária (PRONERA) em políticas públicas; b) a reestruturação da
Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) que se transformou em um
importante instrumento da agricultura camponesa – familiar; e: c) o cesse do
papel do Governo Federal como agente ativo da criminalização dos
movimentos e as suas lideranças.
Contudo, a luta prossegue e a demanda por um de posicionamento do
Governo Federal diante: da necessidade da realização da Reforma Agrária; da
defesa da agricultura camponesa – familiar; da ampliação do orçamento
compatível com as demandas do campo; da priorização da soberania
alimentar; da limitação do tamanho da propriedade da terra; da aprovação do
projeto de emenda constitucional que prevê o confisco de terras escravagistas;
da garantia da função social da terra; e da atualização dos índices de
produtividade.
Dos caminhos trilhados pela classe trabalhadora no campo na
construção do processo de luta histórica que produziu e produz o espaço
agrário brasileiro, cabe destacar, em face da continuidade das lutas que, se
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bem ainda não se tem conquistado a ruptura dos mecanismos tradicionais de
dominação, nos seus arranjos clientelistas, a luta por terra foi um dos canais
que permitiu que muitos trabalhadores do campo tivessem: uma forma de
contato direta e propositiva com as instancias estatais; sentissem nas suas
próprias vidas a importância da organização e mobilização; construíssem
consciência de classe; agissem na reivindicação do direito histórico e fossem
protagonistas por meio da sua pressão, das tensões que definem a dinâmica
de produção do espaço agrário neste país. O que nos permite constatar que o
processo de Reforma Agrária é uma condição importante para a redução das
desigualdades sociais na sociedade brasileira. Assim sendo, e concordando
com Lima (2006) podemos afirmar que historicamente a questão agrária, e os
embates dos trabalhadores sem terra, se confundem com o processo de
produção do espaço agrário no Brasil.
1.2 - O espaço do capital sucroalcooleiro da “Zona da Cana” e os
territórios da luta de classe
A luta de classe no campo brasileiro responde, historicamente, às
péssimas condições de vida as que camponeses e trabalhadores rurais foram
submetidos, determinadas pelo modo como o espaço agrário foi sendo
produzido e (des)organizado. Pelas suas condições objetivas de produção o
espaço agrário, desde o ponto de vista do trabalhador, é um espaço de
exploração e expropriação, contudo prenhe de territórios de insurgências e
contestação. Como pudemos observar, no decorrer do resgate histórico da luta
pela terra no Brasil, a forma de exploração e expropriação de camponeses e
trabalhadores tem sofrido alterações ao longo do tempo, à medida que oespaço agrário se transforma e reestrutura. Assim, o escravo, morador de
condição, posseiro, meeiro, bóia-fria, trabalhador temporário, informal são
expressões que assumem a exploração no campo, correspondentes, isso sim,
a diferentes momentos do processo de acumulação do capital na agricultura,
introduzindo modificações no processo produtivo e no espaço agrário.
A concepção de espaço que permeia esta discussão está fundamentada
no pensamento de Henry Lefebvre, a partir tanto da sua obra (2008) como da
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releitura feita por geógrafos da abordagem crítica no Brasil, que fundamentam
teórico – metodologicamente a nossa proposta.
Para este autor existem vários métodos, várias abordagens no que
concerne ao espaço, e eles se correspondem com diferentes níveis de
reflexão, de recorte da realidade objetiva. Contudo, para ele:
Não se pode dizer que o espaço seja um produto como umoutro, objeto ou soma de objetos, coisa ou coleção de coisas,mercadoria ou conjunto de mercadorias. Não se pode dizer quese trata simplesmente de um instrumento, o mais importantedos instrumentos, o pré-suposto de toda produção e de todatroca. O espaço estaria essencialmente ligado à produção dasrelações (sociais) de produção (...) a reprodução das relaçõesde produção, e não a produção no sentido restrito doseconomistas, isto é, o processo de produção das coisas e deseu consumo (2008, p.48).
Lefebvre aponta para o entendimento do espaço produzido pela
sociedade fundamentada no modo de produção e reprodução das relações
capitalista de produção, não apenas limitado a um determinado ambiente onde
as relações sociais de produção e de consumo de mercadorias acontecem, ou
mesmo, um mero palco das atividades e ações humanas. Ao contrario, ele é
essencialmente parte constitutiva das mesmas. Para este autor, nesse
processo ainda existem contradições, mesmo que dissimuladas ou
mascaradas, pois:
Nessa sociedade o “real” encontra-se no fim e não no inicio. (...) ascontradições do espaço não vem de sua forma racional, tal comoelas se revelam nas matemáticas. Elas advêm do conteúdo prático esocial, e especificamente do conteúdo capitalista. (...) o espaço dasociedade capitalista é comercializado, despedaçado, vendido emparcelas. Ele parece lógico e é absurdamente recortado (2008, p.56-7).
O autor faz do conceito uma crítica direcionada à fragmentação e
comercialização capitalista do espaço socialmente produzido, composto por
contradições, dissimuladas e mascaradas, de conteúdo capitalista. Exemplo
deste processo hoje é a forma como a expansão do espaço do agronegócio da
cana-de-açúcar se apresenta, mascarado pela valorização da produção de
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energias limpas para o Brasil. Essa camuflagem possibilita a negação do real
vivido pela classe trabalhadora, parafraseando a Thomaz Jr. (1996), por trás
dos canaviais.
Lefebvre (2008) acrescenta que:
(...) há no espaço a reprodução da sociedade e uma sociedadesó se torna concreta através de seu espaço, do espaço que elaproduz, e por outro lado, o espaço só é inteligível através dasociedade (p.41).
Portanto, existe uma relação dialética entre espaço e a sociedade. A
partir desta interpretação, entendemos, de acordo com Dabat (2008), que o
debate sobre a sociedade açucareira nordestina e o seu espaço deve ser feitopelo
(...) viés interdisciplinar, principalmente no sentido de entenderque, na medida em que, no mundo moderno ocidental, oaçúcar, é uma das “substancias duradouras” (MINTZ, S.2003)31 isso implica uma cadeia de produção e consumoenvolvendo inúmeras dimensões, principalmente aquelasvoltadas para as precárias relações de trabalho eassalariamento no espaço canavieiro. (p.7, grifo nosso).
Da mesma forma, para Correia (2007), na linha de argumentação de
Lefebvre, o espaço é concebido como lócus da reprodução das relações
sociais de produção, isto é, a reprodução da sociedade como um todo,
independente do modo de produção que a rege. Para este autor,
Uma sociedade só se torna concreta através de seu espaço, doespaço que ela produz, e por outro lado, o espaço só é
inteligível através da sociedade. Não há, assim, por que falarem sociedade e espaço como se fossem coisas separadas quenós reuniríamos a posteriori , mas sim de formação sócio-espacial (p.26-7).
Nesta acepção, entendemos o espaço como construção social, como
objetivação: projetada e planejada pela sociedade, sendo a atual a sociedade
31 Refere-se ao trabalho de Sidney Mintz intitulado “O poder amargo do açúcar. Produtores
escravizados, consumidores proletarizados”. Recife: Editora Universitária, UFPE, 2003.
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capitalista, dividida em classes antagônicas. De acordo com esta análise
Moreira (2002) adverte que:
(...) estudar o espaço como uma unidade autônoma e
homogênea, como um suporte da ação do homem, implicanecessariamente em omitir as relações que se estabelecementre os homens, em negar as diferenciações internas nelasexistentes tais como classes sociais e relações de dominação-subordinação, em excluir as diferentes formas de produzir e emnão reconhecer as questões ideológicas e políticas que estãocontidas no espaço. Implica também em desprovê-lo de suadimensão histórica, na medida em que a ação do homem éconsiderada como algo genérico, desvinculada das condiçõesconcretas materiais de vida que são, como se sabe,historicamente datadas (p.6).
O espaço é um produto/processo heterogêneo que engloba, desde as
dimensões históricas, até a realidade social contemporânea. Leitura que nos
possibilita analisar as diversas relações que sustentam a dinâmica do espaço
agrário da Zona da Cana em questão. Face às relações sociais de trabalho
estabelecidas entre latifundiários/usineiros e trabalhadores com e sem terra, o
setor sucroalcooleiro se fundamenta na relação dominação-subordinação
discutida por Moreira (2002).
Voltando a análise feita por Lefebvre (2008) e Correia (2007) o espaço
social é, portanto, um produto da sociedade, constatável e dependente, antes
de tudo, dessa constatação. Para ambos os autores o espaço é concebido por
diversas atividades, por exemplo: agrícola, artesanal, industrial. Isso quer dizer
que o “espaço resulta do trabalho e da divisão do trabalho” (2008, p. 44). O
espaço é, portanto um produto do trabalho humano, e como tal acha-se
intrinsecamente relacionado ao modo por meio do qual os homens e as
mulheres produzem as condições materiais e simbólicas necessárias à sua
existência. Para Marx (2008), o trabalho é um processo no que participam o
homem (ser genérico) e a natureza. Nesse processo, os homens, com a sua
própria ação, impulsionam, regulam e controlam seu intercâmbio material com
a natureza. Por isso, para este autor, o homem defronta-se com a natureza
como uma soma das suas forças. Ou seja, por meio do trabalho, coloca em
movimento a força natural do seu corpo a fim de apropriar-se dos recursos da
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natureza, imprimindo-lhes forma útil à vida humana. Nesse movimento de
transformação da natureza o próprio homem também se transforma. Ao
produzir valores de uso modifica a natureza seguindo um projeto previamente
idealizado. Atendendo a este processo, Moreira R. (2007) coloca que:
A natureza social do espaço geográfico decorre do fato simplesde que os homens têm fome, sede, frio, necessidades deordem física decorrentes de pertencer o homem ao reinoanimal, ponte de sua dimensão cósmica. No entanto, àdiferença do animal, o homem consegue os bens de quenecessita intervindo na primeira natureza, transformando-a.Transformando o meio natural, o homem transforma-se a simesmo. Ora, como a obra de transformação do meio é umarealização necessariamente dependente do trabalho social (a
ação organizada da coletividade dos homens), é o trabalhosocial o agente de mutação do homem, de um ser animal paraum ser social, combinando estes dois momentos em todo odecorrer da história humana (p.72).
Além do mais, é o trabalho que transforma os meios de produção em
algo útil. No entanto, na sociedade capitalista, o espaço se acha subordinado
ao modo de produção capitalista. O espaço é, antes de tudo, subordinado às
necessidades de acumulação de capital e este processo de acumulação é
desigual (SMITH, N; 1971). O que significa que ele ocorre de maneira
diferenciada quer entre setores de atividade, quer nas diferentes regiões,
territórios que configuram o espaço geográfico, seja na escala nacional, sejam
em quaisquer escalas geográficas em foco de análise (SMITH, N; 2002). A
acumulação de capital, sem dúvida, sempre foi uma questão profundamente
geográfica, já que, sem as possibilidades inerentes à expansão geográfica, à
reorganização espacial e ao desenvolvimento geográfico desigual, o
capitalismo, segundo Harvey (2004), há muito tempo teria deixado de funcionarcomo sistema econômico-político. A permanente realização de arranjos
espaciais das contradições internas do capital, associada a uma desigual
inserção dos territórios criou, o que este autor denomina a geografia histórica
global de acumulação de capital.
O conteúdo de classe é fundamento, também, do espaço do capital e as
suas contradições internas. Para Moreira, R. (2007) são as relações de classe
em cada fração do espaço, em cada território, que orientam a dialética do
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espaço do lugar. Já, no entendimento de Lefebvre (2008), o modo de produção
está sempre “nas mãos de alguém”, os donos do espaço, os donos do poder,
nas mãos do Estado e/ ou da classe dominante. O controle do espaço do
agronegócio canavieiro na Zona da Cana estudada é de posse da burguesia
agrária e as suas alianças de classe com os capitalistas transnacionais,
escoradas no Estado.
De acordo com a leitura dos autores apresentados, podemos apreeder,
que o espaço agrário condensa o trabalho social objetivado no decorrer do
tempo histórico, configurando-o em função dos conflitos, das tensões entre as
classes envolvidas. O recorte do espaço agrário nordestino que focamos na
nossa discussão é, portanto, resultado e parte de: a) os conflitos entorno da
propriedade fundiária; b) a luta de classes pela terra e pela Reforma Agrária; c)
a organização dos movimentos sociais; d) as políticas, programas e ações do
Estado que sustentam os interesses de uma das classes envolvidas; e) o
processo de valorização da renda da terra; f) a mecanização das relações de
produção e trabalho; g) as dissidências político-ideológicas inerentes as
classes; h) a fragmentação da classe trabalhadora; i) o domínio do espaço pelo
capital e o latifúndio; j) o agronegócio exportador e; k) da expropriação,
exploração e precarização do trabalhador rural.
Todavia o conjunto de relações apresentadas dá forma e o conteúdo não
apenas ao nosso recorte espacial, senão ao espaço agrário brasileiro como um
todo, sendo a questão agrária - a penetração e desenvolvimento do capitalismo
no campo - a centralidade do seu movimento. Lembrando que:
a questão agrária passou a ser discutida no âmbito de umaquestão mais fundamental, a questão nacional. Por sua vez aquestão nacional chegou a ser entendida como uma questãointernacional, cuja resolução era sujeita a uma dialética deforças internas e externas (YEROS, 2007, p.151).
Contudo, no espaço do capital agro-industrial da cana-de-açúcar no NE,
mais concretamente, no espaço do agronegócio sucroalcooleiro da Zona da
Cana dos estados de Alagoas, Paraíba e Pernambuco a luta pela terra insere,
em frações desse espaço, a sua permanente territorialização. É o conflito que
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gera a forma e o conteúdo dos territórios dos sem terra acampados; dos
camponeses expropriados assentados; dos trabalhadores rurais despossuídos;
dos indígenas e quilombolas.
De acordo o ponto de vista teórico – metodológico entendemos que todo
território deve ser estudado, tomando como referência o espaço, pois é a partir
deste que ele se forma. Contudo, no debate conceitual atual na geografia
brasileira, a idéia de território não é consenso, mas objeto de divergências,
assentadas nas influências sócio-históricas em que cada pesquisador se
insere. Segundo Lima (2010), dentre as diferentes raízes conceituais deste
termo na geografia brasileira, as que merecem destaque são a naturalista e a
idealista. A primeira centra-se na defesa de uma determinada área, como
reflexo espontâneo do desejo de proteção imanente aos seres vivos. A partir
desta concepção, realizaram-se elaborações teóricas que buscavam atribuir ao
homem uma compulsão instintiva na posse e defesa de seus territórios. Este
autor nos lembra como tal noção serviu de instrumento legitimador das
incursões expansionistas do Estado alemão, e mais tarde, colocou-se ao
serviço da justificação de uma suposta propensão humana a todo domínio
territorial, cujo pano de fundo é a defesa da propriedade privada.
A concepção idealista de território é aquela que se formula a partir da
presença de representações simbólicas e culturais que os indivíduos formam,
associados ao seu meio físico. Com esta visão, genuína da antropologia
cultural, trabalham inúmeros geógrafos destacando, entre outros, pela sua
repercussão: Raffestain (1993) e Haesbaert (1997). Todavia, para Saquet
(2007), este último construiu uma concepção híbrida entre as dimensões
material e ideária do território, com ênfase nos processos culturais e políticos.
Maciel (2004) e Fernandes (2005) se apóiam na proposição de Haesbaert nasua análise do território. Aliás, Fernandes utiliza-se desta concepção para
construir o conceito de movimento socioterritorial na sua obra. De qualquer
maneira, estaríamos diante da compreensão do território como uma parcela do
espaço geográfico determinada por ações objetivas ou subordinada a valores
simbólicos e culturais. Para Fernandes (2005);
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o território é uma fração do espaço e ou de outros espaçosmateriais ou imateriais (...) o território imaterial é também umespaço político, abstrato. Sua configuração como territóriorefere-se às dimensões de poder e controle social que lhes sãoinerentes. Desde essa compreensão, mesmo sendo umafração do espaço também é multidimensional (p.27)
Para este autor, o território é, portanto, uma categoria que pode ser
compreendida apenas a partir de um olhar que capte a sua
multidimensionalidade, ou seja, que considere que a existência do mesmo se
pauta em múltiplas intencionalidades.
Entretanto, na nossa pesquisa nos apropriamos de outra possibilidade
de pensar o território. A leitura crítica fundamentada no materialismo histórico –
dialético nos leva a compreender o território, inscrito no espaço geográfico, de
acordo com a proposta de Lima (2010), para quem este conceito está:
(...) essencialmente marcado por relações de poder. Estas sãoconcretizadas a partir da apropriação e domínio do espaçoabsoluto, enquanto espaço relacional. Neste sentido, estáno plano do trabalho social (material), arregimentadonuma sociedade [de classes] que tem a propriedadeprivada [ a divisão social do trabalho] como um patrimônio
inviolável, o poder da territorialização (p. 112).
Considerando esta análise, pensar o território sem base material, ainda
que sejam atribuídas algumas relações de poder, é truncar o entendimento do
espaço, questão que entendemos inviável, pois como colocado anteriormente o
território nasce, indissociavelmente, vinculado ao advento da apropriação
individual do espaço, na forma de propriedade privada.
O território ainda que sob a égide do capital tenha assumido novos
contornos, ele não é um fenômeno recente na história. A sua origem data das
primeiras manifestações da divisão social do trabalho. Para Moraes e Costa
(1982):
(...) para Marx a categoria precipuamente geográfica seria a deterritório (em nenhum momento paisagem, região, habitat ouárea) que aparece em toda a sua obra como sendo o processode apropriação de determinadas porções do globo terrestre. Tal
definição apreende, desde logo, o território como processo
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histórico e social, isto é, dotado de sentido pela ação doshomens, o que não pode ser confundido com qualquer acepçãonaturalista do espaço em que este existe externamente aosprocessos sociais (p.121).
A crítica levantada por Lima (2010), e que dá fundamento à nossa
análise, pondera que a compreensão da relação homem-natureza é possível a
partir do entendimento das relações que concorrem à produção material da
vida. Diante disso, não se pode atribuir a essência do poder a valores
absolutos, como se existisse uma metafísica do poder. Para este autor, deve-
se inserir no bojo da produção e reprodução social da vida onde: “os sujeitos
históricos são investidos de força para coagir e manipular o trabalho pelo
monopólio da apropriação privada dos seus resultados” (p. 113). O que não
indica que a ideologia não contribua para a existência e legitimidade do poder.
Porém, este não se sustenta sem um lastro material. Destarte, as relações
sociais de produção e trabalho sujeitadas à produção de valor (de troca) é o
primeiro passo para o entendimento do que nesta pesquisa definimos como
território, pois é o conflito capital x trabalho que possibilita o constante processo
de territorialização/desterritorialização na luta pela terra.
Todavia, longe de defender a tendência homogeneizante do
desenvolvimento do capitalismo, que prevê a subordinação total de todo
trabalho à forma assalariada, apropriamo-nos da compreensão de Oliveira
(1999) para quem o território:
(...) deve ser apreendido como síntese contraditória, comototalidade concreta do processo/modo deprodução/distribuição/circulação e consumo e suas articulações
e mediações supraestruturais [políticas, ideológicas esimbólicas] em que o Estado desempenha a função deregulação. O território é, assim, produto concreto da luta declasses travada pela sociedade no processo de produção dasua existência [...] são as relações sociais de produção e oprocesso contínuo/contraditório de desenvolvimento das forçasprodutivas que dão a configuração histórica específica aoterritório (p.74).
De acordo com esta análise, o espaço geográfico seria composto por
diversos territórios que o influenciam, ao tempo que, são influenciados por ele,
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numa relação dialética e contínua. Tal confirmação se fundamenta na seguinte
análise de Haesbaert (2002):
O espaço, na sua expressão territorial, abarca a totalidade
concreta dos processos de produção, distribuição/circulação econsumo, articulados com as dimensões política e ideológica(superestrutura). A luta de classes insurge como síntesecontraditória entre as práticas e interesses das três classessociais fundamentais: a burguesia, o proletariado e osproprietários de terra. A contradição entre classes é contínua,assim como é contínua a transformação do território. Damesma forma que a configuração territorial manifesta as estratégias de reprodução do capital ele envolve as lutas deemancipação e resistência da classe trabalhadora. O conceitode território, entendido como expressão espacial da luta declasses, é definido, então, a partir das relações de poderensejadas pelo conflito permanente entre capital e trabalho.(p.13, grifo nosso).
Concordamos também com a leitura crítica sobre os limites da
concepção de território em Fernandes apresentada por Franco García (2004),
para quem a noção de movimento sócio-territorial elaborada por Fernandes
(2000), forma parte dos caminhos teóricos da geografização de um conceito,
caro a outras formas de discurso, e que renovam epistemologicamente a nossa
disciplina, porém:
(...) parece-nos uma contradição em termos utilizar o conceito de“movimento sócio-territorial”, já que, acaso o território não ésempre uma entidade social? Se bem que nem todo movimentosocial é territorial, como por exemplo, (...) o Movimento deMulheres Camponesas do Brasil ( MCC-Brasil) entre outros, mastodo movimento territorial é social. Sob a denominação de“movimento territorial” entendemos aquele que na sua estrutura,organização e consecução depende “sobretudo” da apropriaçãosimbólica, ou não, do território. O que significa entender oterritório como um espaço , ao mesmo tempo, de apropriação ereprodução concreta e simbólica. Entendemos que novoconceito de “movimento sócio-territorial” esvazia o significadopolítico do espaço singularizado no conceito de território. Comisto queremos colocar que o binômio “sócio” e “territorial” não éuma mera repetição ou reiteração de termos, senão que é aanulação do significado social que o conceito de territórioconcretiza. A sua vez, isso implica aceitar a idéia de um territóriohomólogo a um espaço cartesiano, neutro e objetivo, que justamente ansiamos superar (p.20).
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Os territórios da luta pela terra sejam acampamentos, assentamentos,
comunidades de sitiantes posseiros ou qualquer outra configuração territorial
que a luta assume, passam pela produção de múltiplos significados que, de
maneira geral, se colocam entre dois extremos: a interpretação desses
territórios como favelas rurais onde a marginalidade no campo se concentra e a
sua compreensão como resistências e frentes de luta pela terra e pela Reforma
Agrária dos trabalhadores mobilizados. A primeira interpretação está
desprovida de dimensão teórica e prática, correspondendo à manipulação
ideológica da sociedade do capital e ao senso comum preconceituoso que
gera. A segunda acepção nos coloca diante de um desafio que exige reflexão,
pois entendemos que estes espaços são, isto sim, possibilidades reais dostrabalhadores manifestarem articulações territoriais de resistência, em
contraposição ao espaço homogeneizante, imposto pela ordem social e política
dominante.
As territorialidades da luta pela terra desde o ponto de vista do trabalho -
os acampamentos, assentamentos, as terras indígenas e quilombolas - são
instrumentos políticos no conflito entre as classes envolvidas nessa luta. Isso
porque esses territórios são embates diretos contra uma forma demanifestação do espaço hegemônico, concretamente a do capital
sucroalcooleiro, no recorte da nossa pesquisa. De acordo com Haesbaert
(2002), compreendemos que são construções territoriais que se aliam à
esperança por uma nova forma de organização da sociedade; são também
instrumentos de autonomia social, iniciativa de construção de um espaço
igualitário e democrático. São, igualmente, parte do processo de constituição
de territórios de esperança discutido por Moreira e Targino (2007).
A discussão sobre o território como categoria de análise da geografia é
um importante caminho para a compreensão da dinâmica espacial da
fragmentação da luta pela terra no espaço do capital sucroalcooleiro nos
estados de Alagoas, Paraíba e Pernambuco dado que, para os movimentos de
trabalhadores rurais, o acesso à terra constitui novas possibilidades de
reterritorialização.
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Contudo, a partir da leitura de Raffestin (1993), enfatizamos que o
território se apóia no espaço, mas não é espaço. É uma produção a partir do
espaço. Ora, produção por causa das relações que envolvem e se inscreve
num campo de poder, sendo central na nossa compreensão a relação de
classe. Para este autor:
(...) o espaço é de certa forma, “dado” como se fosse umamatéria-prima. Local de possibilidades, é a realidade materialpreexistente a qualquer conhecimento e a qualquer prática dosquais será o objeto a partir do momento em que um ator[grupos sociais organizados, movimentos sociais] manifeste aintenção dele se apoderar. (RAFFESTIN, 1993, p.144).
Uma parte significativa dos movimentos sociais que atuam na Zona da
Cana analisada nesta pesquisa, organiza as famílias de trabalhadores rurais
para que por meio da sua luta e resistência se concretizem projetos de
transformação da realidade social. O instrumento para isso é a ocupação da
terra e a constituição de acampamentos. Essa ação implica no conhecimento
de uma prática territorial. Isto é, a defesa da posse da terra para uso
democrático. A construção da realidade se transforma assim no instrumento de
poder desses movimentos sociais.Compreendemos, então, que os acampamentos e os assentamentos
dos sem terra são formas de configuração territorial do espaço, mas é
importante lembrar, segundo Thomaz Jr. (1996), que:
o espaço e o território não protagonizam o movimentocontraditório da sociedade como um todo, tampouco aproblemática da questão agrária brasileira responde a isso,mas revelam os conteúdos, os significados e os papéis que
fazem com que o trabalho ocupe centralidade neste contexto (p.34, grifo nosso).
No caso especifico dos assentamentos, é evidente para Fabrini (2003), o
uso do espaço na construção do território. Não temos dúvidas a esse respeito.
Concordamos com o autor ao conceber o assentamento como um território dos
trabalhadores do campo. Segundo ele, o assentamento se constitui no espaço
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de realização de ações coletivas e comunitárias em que os camponeses
constroem o território. Para este autor, o assentamento rural é:
um território porque o espaço do assentamento é politizado, ou
seja, os assentados têm a posse, controle, domínio, podersobre este espaço que antes pertencia ao latifundiário (p.10).
Para Fabrini (2003), trata-se de um território de resistência camponesa
já que a luta não é apenas para entrar na terra, mas para nela permanecer e
produzir, o que nos coloca diante do permanente conflito de classe32.
Recuperando o pensamento do Thomaz, Jr. (1993), nossa discussão
aponta, necessariamente, para a centralidade que o trabalho, na forma como
hoje se expressa no campo, tem no processo de luta pela terra e pela Reforma
Agrária, do mesmo modo na própria fragmentação dessas lutas.
Em suma, ao longo dos capítulos que seguem poderemos observar
como os conceitos de espaço geográfico e território são fundamentais para se
compreender o processo de dissidência e fragmentação dos movimentos
sociais no campo, assim como suas representações territoriais no espaço
sucroalcooleiro na tentativa da resistência e o embate, seja por meio das
ocupações de terras, seja nas reivindicações por melhores salários.
1.3 - Polissemia de uma ação: a Reforma Agrária no aguardo
A luta pela terra se confunde com a luta pela Reforma Agrária, todavia,
se uma é imanente à outra, ambas remetem a processos e ações distintos. A
questão agrária e a luta pela terra, como resgatamos no início da nossa
introdução, têm mais de 500 anos no Brasil. Ambas decorrem do conjunto de
problemas relativos ao desenvolvimento da agropecuária e da resistência dos
32 O autor discute e propõe como exemplo a situação dos camponeses russos no início doséculo XX. Ele discute que a Reforma da estrutura agrária naquele país tratou-se de umaproposta que compreendia a necessidade de criar uma sólida “classe” proprietária individual daterra para garantir a manutenção da ordem e estabilidade social. A manutenção e conquista daterra pelos trabalhadores era vista como uma contra-revolução, pois, enquanto pequenosproprietários estabilizados, a força revolucionária dos camponeses seria silenciada (FABRINI,2003).
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trabalhadores e camponeses, inerentes ao processo desigual e contraditório
das relações capitalistas de produção. Já a Reforma Agrária no Brasil,
enquanto política territorial de transformação da estrutura agrária com objetivos
de justiça social na distribuição de terras e renda agrícola, e as origens do seu
debate no pensamento social, podem ser situadas na década de 1950. Foi
durante o governo Vargas, dentro do debate sobre o caráter que deveria
assumir o desenvolvimento econômico do país, que a agricultura - logo o
campo. Tornou-se o centro da questão.
Segundo Stédile (2005), podemos diferenciar, dentro do pensamento
crítico brasileiro, quatro correntes clássicas a respeito. A primeira delas
defendia a Reforma Agrária como o mecanismo de alteração do uso e a posse
da terra no país, visando ao desenvolvimento mais rápido das forças produtivas
no campo. A realidade agrária era um entrave ao desenvolvimento do
capitalismo e até apresentava resquícios feudais. Oliveira (1999) concorda com
esta afirmação e acrescenta que para os defensores dessa tese, para que o
campo se desenvolvesse, seria preciso acabar com essas relações feudais, ou
semi-feudais, e ampliar o trabalho assalariado no campo. O PCB, que na época
era o principal partido de esquerda no Brasil, apoiava esta corrente. Para os
seus seguidores, a luta camponesa contra o latifúndio exprimia o avanço da
sociedade na extinção do feudalismo33. Para o campo, o PCB pregava a
implantação da Reforma Agrária para eliminar o latifúndio, pois este era
entrave ao desenvolvimento econômico. Com a Reforma Agrária, portanto,
seria possível assentar as bases para o desenvolvimento da agricultura, baixar
os preços dos alimentos, baixar os custos com a mão-de-obra urbana e,
portanto, financiar a industria brasileira. O sindicalismo nacionalista, segundo
Ricci (1990), foi forjado nesse momento pelo PCB, mas apenas a partir de1958 que a organização de sindicatos rurais é encarada seriamente. As lutas
organizadas neste período pelos sindicatos comunistas eram marcadas pelo
discurso nacionalista e pela garantia de cumprimento de leis sociais. Para este
autor, esta política teve ressonância nos setores tradicionais da indústria, no
setor público e no campo, devido às péssimas condições de trabalho. A
33 Para os seguidores desta corrente, o feudalismo se concretizava no campo nas relações
sociais não capitalistas como a parceria e o arrendamento.
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elaboração teórica do PC neste período derivava das teses da III Internacional
para os países coloniais atrasados, para quem:
a sociedade brasileira era tida como semi-colonial e semi-
feudal, dominada pelo latifúndio e o imperialismo, ondesomente por meio de uma revolução nacional e democráticaseria possível romper com o atraso econômico e político esaltar para uma nova fase de desenvolvimento (RICCI, 1990, p.13).
Já a segunda corrente do pensamento agrário, na proposta de Stédile
(2005), se fundamenta no círculo de dissidentes do PCB, principalmente
autores que defendiam as teses de Caio Prado Júnior. Para estes autores no
Brasil nunca havia existido feudalismo e o capitalismo no campo era
predominante e se desenvolvia. O campo não era, de modo algum, feudal ou
atrasado, mas sim um ambiente onde predominava relações de trabalho
capitalistas deficientes e pouco desenvolvidas. A Reforma Agrária deveria ser
feita apenas em alguns lugares necessários e teria, portanto, o objetivo de
melhorar o padrão de vida da massa trabalhadora rural, principalmente por
meio do exercício efetivo e moderno dos direitos trabalhistas. Segundo esta
tese, as relações sociais de produção existentes não eram, portanto, entraves
ao desenvolvimento capitalista, e sim o caracterizavam como: concentrador e
dependente.
Quanto à terceira corrente, conhecida como “escola cepalina”, devido ao
papel central da Comissão Econômica para América Latina e o Caribe
(CEPAL), estava fortemente influenciada pelas idéias de Keynes. Seus
seguidores defendiam a participação do Estado como agente destacado de
execução dos projetos de desenvolvimento para o país e entendiam o
subdesenvolvimento como resultado da preponderância da produção agrícola
primário-exportadora, a baixa integração dos setores produtivos e o baixo nível
de sindicalização. A saída da CEPAL era uma política de desenvolvimento
industrial baseada na Reforma Agrária. O Estado deveria prover a
infraestrutura para o desenvolvimento industrial e transformar a estrutura
arcaica do campo, baseada em latifúndios e nas atividades pré-capitalistas
associada ao imperialismo comercial. Celso Furtado foi talvez o principal
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promotor desta análise no Brasil. Este afirmava que a monocultura prática no
país era antagônica com o processo de industrialização. Para este pensador
cepalino, a agricultura deveria priorizar a oferta de alimentos para abastecer os
centros urbanos, evitando-se a importação.
Finalmente, a quarta corrente de pensamento agrário, segundo Stédile
(2005), do ponto de vista interpretativo passou por certa influência da corrente
“cepalina”, mas do ponto de vista político estava articulada à chamada
esquerda brasileira do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), liderada por Leonel
Brizola.
Após o golpe militar de 1964, essas correntes de pensamento que
lutavam pela Reforma Agrária foram fortemente reprimidas. Mesmo assim, o
governo militar em 30 de novembro de 1964 promulgou, através de decreto, a
primeira Lei de Reforma Agrária do Brasil, a Lei 4.554 que passou a se chamar
Estatuto da Terra. Porém, o Estatuto da Terra permitiu que a elite agrário-
industrial acelerasse o desenvolvimento do capitalismo no campo, e sua
(má)interpretação possibilitou que o problema-chave da questão agrária fosse
a modernização do latifúndio. Para isso, foram implementados alguns
instrumentos de estímulo à modernização da agricultura brasileira como crédito
rural, a pesquisa agropecuária com a criação da EMBRAPA, a assistência
técnica com a EMBRATER, o seguro agrícola e o programa de preços
mínimos. Isso gerou, principalmente na década de 1970, intensas relações
entre o capital e o trabalho, a mecanização agrícola e a redução da mão-de-
obra nas fases do processo produtivo como o preparo do solo, capina e,
posteriormente, na colheita. Com isso, grande parte da população foi expulsa
pela modernização, o que passou a gerar um grande problema social que
tomou grandes proporções na década de 1980 (MARTINS, J.S, 2010). Essesproblemas de cunho social, resultantes da modernização sem a alteração da
estrutura fundiária do país fizeram ressurgir o movimento pela reforma agrária
nos anos 1980.
Para Stédile (2005) foi na década de 1980 quando os debates sobre a
Reforma Agrária marcaram a pauta da esquerda brasileira. Destaca no início
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do período a publicação do documento “A Igreja e os problemas da terra” 34 da
CNBB, que ligou problemas do campo com as discussões iniciadas durante as
décadas anteriores 1960 - 1970. O significado da Reforma Agrária ganha
conotações diferentes a partir de década de 1980, no contexto de retomada
das lutas sociais.
Contudo, como sabemos e a história agrária mostra, essa Reforma
Agrária não foi feita. Não existiu redistribuição de terras, até pelo contrário,
dados recentes (Dataluta, 2009), apontam que a concentração fundiária
aumentou e que os trabalhadores do campo se tornaram mais miseráveis
(THOMAZ, Jr. 2010). O debate sobre a Reforma Agrária para o Brasil
continuou desde então, tanto na academia como nas ruas e dentro dos
movimentos sociais. Na atualidade se apresenta, não apenas com outra forma,
senão também outros conteúdos. Ela não é mais uma reivindicação do
desenvolvimento do capitalismo no campo e sim um questionamento e
rebatimento da forma que assumiu esse desenvolvimento. Por isso,
encontramo-nos diante de uma questão eminentemente política capaz de
unificar, como bandeira, não só os trabalhadores do campo, mas se estender
aos trabalhadores urbanos. Essa dimensão política é a mais “temida” pela
ordem estabelecida, pois nela radica a potencialidade de união e da força de
uma classe. Entretanto, a fragmentação dos trabalhadores em concepções e
formas de luta que dizem respeito a como deve ser efetivada esta política
territorial agrária e agrícola, é um fato no campo. A emergência de um número
sem fim de siglas, de movimentos, de fissuras e dissidências é sintomático,
bem da efervescência da luta – os trabalhadores no campo não estão parados
– como da forma que o “discurso da ordem” fragiliza, coopta e desmonta a luta
unificada. Essa tensão permanente na que a composição de classe vive tem osseus reflexos no território, fragmentando-o também.
A partir destas constatações nos posicionamos a favor do entendimento
e efetivação de uma Reforma Agrária Estrutural no pais, como caminho
indispensável para a superação da miséria no campo. Uma Reforma Agrária
que modifique radicalmente a estrutura fundiária do país, portanto, uma
34 Documento aprovado pela 18ª Assembléia da CNBB , Itaici, 14 de fevereiro de 1980
(STÉDILE, Vol.02, 2005)
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Reforma Agrária, no aguardo. Como ilustra Garcia (1969) pensando em uma
Reforma Agrária para a América Latina:
(...) reforma agrária estrutural é realizada por meio de
transformações revolucionárias fundamentadas na substituiçãoou até mesmo na alteração profunda das relações tradicionaisde poder, seja o poder do Estado ou dos latifundiários quecontrolam as terras agricultáveis. Para isso devem seralteradas e modificadas varias regras e legislações queasseguram o significado da propriedade privada da terra (p.11).
Neste sentido é válida a tese de que o que está posto no Brasil hoje “é
uma operação negociada” entre as classes dominantes do campo e os
Governos Estaduais e Federal. Trata-se de uma lógica perversa que une as
velhas estruturas alimentadas pela burguesia agrária e o Estado, parte das
Igrejas e Movimentos sociais partidários.
Essa complexa trama de relações que estabelecem no campo, em torno
da obrigação da Reforma Agrária, é “lida geograficamente” por Thomaz, Jr.
(2010) para quem é necessário inserir as dimensões do trabalho e da
soberania alimentar, como:
(...) cenários a serem construídos com base nas formulaçõesde alternativas que visem à edificação de uma sociedadeemancipada, que sejam explicitados os horizontes para aradicalização do projeto societário socialista (p.980).
Todavia, se focamos as estratégias do capital sucroalcooleiro atreladas
ao Estado no enfrentamento aos movimentos sociais de luta pela terra e pela
Reforma Agrária na Zona da Cana dos estados de Alagoas, Pernambuco e
Paraíba podemos observar que, além do constante processo de fragmentação
dos movimentos sociais no campo prevalece a expansão da produção e das
áreas de plantio de cana para produção de etanol. Esse processo exige
intensificar a disponibilidade de recursos como terra e água para exploração da
produção monocultora da cana irrigada.
Ressaltamos que os impactos negativos da concentração fundiária, que
opera ao serviço do capital e a necessidade da Reforma Agrária gestaram
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inúmeros movimentos na região em análise. Isso nos leva a entender que a
emergência dos movimentos sociais no campo, como formas de organização
dos trabalhadores, não respondem apenas a processos de construção de
identidades, de afinidades culturais ou de outros mecanismos propostos pela
leitura dos “novos movimentos sociais” (GOHN, 2000). Senão que são as
formas concretas da luta de classes no campo no decorrer da história agrária
brasileira como foi apresentado. Esta luta está construindo as pegadas do
presente na história e na geografia do campo, como resgataremos no capítulo
dois. Nele destacamos os territórios construídos pelos movimentos, por meio
das formas de organização, relações e as ações que acontecem nos diferentes
espaços em disputa. É a isso que chamamos de territórios de luta pela terra
Zona da Cana dos estados de Alagoas, Paraíba e Pernambuco. Todavia no
próximo capitulo apresentamos as nuances da produção e do trabalho no
espaço do capital sucroalcooleiro na Zona da Cana.