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ALMADA FORMA a revista do centro de formação da associação das escolas de almada nº11| dez | 2015 ISSN 2183-4083

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Revista AlmadaForma 11 - "Ciência, Pensar o Presente, Construir o Futuro". A revista do Centro de Formação da Associação de Escolas de Almada.

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ALMADAFORMAa revista do centro de formação da associação das escolas de almada nº11| dez | 2015

ISSN 2183-4083

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ÍndiceEditorial 3Ciência, Língua, Tecnologia e Cidadania 4Uma Visão Ampla e Inclusiva da Ciência 10O Ensino de Ciências no Século XXI 14Piloto IBM - Teachers TryScience 22Digicl@sse 31Plantar Ciência na Infância 35 Sala de Aula do Futuro - Setúbal 39 Ensino Contextualizado 46O Projeto eTwinning e o Ensino das Ciências Naturais 50Irresistible 55O Ensino da Ciência de Base Experimental 57O Decifrador do Mundo, o Alquimista do Sonho 60Biblioteca da FCT 63Luís Aires por Carlos Fiolhais 65Dia Nacional da Cultura Científica 67Supporting Science Teachers Across Europe 69

Ficha Técnica

Directora: Maria Adelaide Paredes Silva

Colaboradores: Alunos do 11.º L - Curso de Design Gráfico/Escola Secundária de Cacilhas-Tejo, Andressa Souza (imagem da capa), António Gonçalves, António Moreira, Carlos Cunha, Carlos Fiolhais, Egídia Azevedo, Eleanor Hayes, Elvira Callapez, Horácio Neri, Joana Barros, Jocélia Albino, José Fanica, José Godinho, José Moura, Luís Aires, Marco Moreira, Maria João Horta, Rita Rato

Paginação e arranjo gráfico: Domitila Cardoso, Maria da Luz Vieira

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Editorial

O Centro de Formação AlmadaForma agradece e congratula todos os seus estimados colaboradores pelos preciosos contributos imprescindíveis à concretização e divulgação da 11ª edição da revista AlmadaForma online dedicada em exclusivo ao tema da Ciência - pensar o presente - construir o futuro para prazer de toda a comunidade educativa que se revê neste projeto de comunicação contínua.

Num verdadeiro espírito de advento, felicitamos a energia de todos os que continuam a ousar sonhar, pensar, criar e dar de si a si mesmo e a tantos outros, contribuindo para incentivar o gosto de questionar, compreender e descobrir futuro. Futuro fundado no ensino e nas aprendizagens significativas, na construção de conhecimento e desenvolvimento humano, na realização da pessoa, como profissional e cidadão.

A abordagem da ciência e da educação científica fundamenta-se na consciente necessidade de congregar esforços para oferecer um presente simbolicamente representativo do poder da bondade, do conhecimento e da vontade de muitos e bons amigos comprometidos e empenhados na construção de um mundo melhor. De uma educação melhor para este nosso tempo.

Tal como nos diz o poeta “só resta ao homem / pôr o pé no chão / do seu coração / experimentar / colonizar / civilizar / humanizar / o homem / descobrindo em suas próprias inexploradas entranhas / a perene, insuspeitada alegria / de con-viver”. (Carlos Drummond de Andrade)

Acreditamos que se iluminou o caminho, graças à valiosa participação de uma rede de parceiros de excelência que tornou possível partilhar com o universo que nos acolhe, desde a comunidade de Almada, um manancial de artigos de referência, com a intenção de promover e dar a (re)conhecer experiências, estudos e práticas pedagógicas, projetos e dinâmicas inovadoras, evidenciando processos de formação, de investigação, de reflexão e de ação desenvolvidos em situações e contextos educativos e formativos plurais.

Livres de pensar e agir, saberemos optimizar o legado de várias teorias unificadoras, como a lei periódica (química), a termodinâmica (física) e a evolução (biologia), as quais fundamentam o conhecimento científico e moldam a construção da sociedade humana. Saberemos encontrar as melhores vias para fazer face aos desafios titânicos que o próprio desenvolvimento científico e tecnológico nos coloca passo a passo, bem expressos nos problemas que enfrentamos com a industrialização, globalização, perda de biodiversidade e as afamadas alterações climáticas. Saberemos valorizar a educação científica na escola.

Sabemos que o sonho comanda a vida.

Festas Felizes!!

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EDUCAÇÃO

Ciência, Língua, Tecnologia e CidadaniaUma partilha interdisciplinar de projetos

Luís AiresProfessor de Biologia

Agrupamento de Escolas António Gedeão - AlmadaColaborador do CFECA

A escola tem de formar para a vida, transmi-tindo conhecimentos, moldando atitudes e inculcando valores. Entre eles, os científicos. As sociedades atuais são profundamente afe-tadas pelas inovações e produtos da ciência, daí que a literacia científica da população seja uma premissa fundamental para o bem-estar e qualidade de futuro de qualquer sociedade. A literacia científica envolve a necessidade de aprender ciências, de aprender a fazer ciência e de aprender acerca da ciência. É uma exigência do mundo moderno, onde as ciências influen-ciam o modo como as pessoas pensam, agem e vivem.

O ensino formal das ciências deve aproveitar a tendência inata das crianças para conhecerem o seu meio circundante, através dos olhos, das mãos, usando seus sentidos e inteligência para responder a questões colocadas verbalmente. A primeira atitude científica a transmitir na es-cola deve ser a experimentação, o contacto e a manipulação direta dos objetos.

Ciência no pré-escolar

De acordo com as orientações curriculares para o ensino pré-escolar (DEB, 1997), a área de Conhecimento do Mundo «enraíza-se na curiosidade natural da criança e no seu desejo de saber e compreender o porquê» (pág. 79), visando uma sensibilização às ciências através da exploração do meio próximo.

Infelizmente, os educadores portugueses afir-mam sentir-se pouco preparados para abordar

certos conteúdos, como a biologia, geologia, a química, física e a educação ambiental. Muitos esclarecem preocupar-se e recorrer à internet como fonte informativa para superar esta situa-ção, ainda que, acrescentem, vejam a educação pré-escolar como a primeira via de apropriação, pela criança, de “ferramentas” (linguagem e processos) do pensamento científico, acima da mera aquisição de conhecimentos factuais e conceptuais.

Um estudo recente, de Santos, Gaspar e Santos (2014), concluiu que os educadores necessitam de uma formação contínua em ciências que va-lorize esta área nas atividades desenvolvidas no jardim-de-infância, reforçando em especial um conjunto de conteúdos – biologia, geologia, química e física – que são reconhecidos como insuficientemente tratados. Como era de es-perar, defende-se também uma formação em contexto, ou seja, diretamente relacionada com as atitudes e práticas dos educadores, que aspi-ram ou tentam uma integração da “teoria” com as capacidades investigativas de interpretar, formular e testar hipóteses, explorar e planear projetos.

Ciência no 1º ciclo do ensino básico

Os dados disponíveis tendem a mostrar que os professores do 1º ciclo do EB, quando questio-nados sobre a respetiva conceção de ciência, concentram-se no “espírito” experimental, de verificação prática, e menos na vertente teóri-ca. Contudo, parecendo valorizar a descober-ta mais ou menos espontânea, acabam por menosprezar as rotinas procedimentais, tidas como pouco interessantes.

Os docentes do 1º ciclo estão conscientes de uma metodologia própria da ciência, embora revelem dificuldade em atingir unanimidade quanto à sua definição. O que é compreensível,

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já que a metodologia do trabalho científico en-volve a observação, a formulação de hipóteses, a atividade prática, entre outras tarefas, que ra-ramente são realizadas nas aulas de uma forma enquadrada e sistemática.

O anterior relaciona-se com uma outra dificul-dade, a de lidar com a exigência conceptual do ensino das ciências, por outras palavras, o nível de complexidade e abstração a promover na sala de aulas. Sabe-se que uma baixa exigência conduz frequentemente a uma aprendizagem da ciência como um conjunto extenso de nomes e factos relevantes mas em geral desligados, embora se saiba também que os alunos imer-sos em situações mais exigentes desenvolvem relações entre temas diferentes, a resolução de problemas e diferentes níveis de atividade ex-perimental, juntando à observação e medição as capacidades de previsão, controlo de variá-veis e até de planificação.

Tem sido posto em evidência (por exemplo, por Afonso, M. – coord., 2014) que os documentos orientadores e os programas oficiais são pouco explícitos, por vezes contraditórios, nos princí-pios científicos e pedagógicos que apresentam, entreabrindo a perceção de uma exigência con-cetual globalmente baixa. Nasce aqui, alimenta-da depois pela ausência de formação contínua

adequada, uma das mais importantes lacunas do atual ensino das ciências no nosso país: uma deficiente interligação entre o “que” e o “como”, entre a teoria e a prática.

Prémio Pequenos Cientistas de Almada

Numa sociedade marcada pela ciência e pela tecnologia, que imprimem grandes e acelera-das mudanças, urge repensar os currículos e a formação de professores nestes domínios para melhor corresponder a uma crescente comple-xidade da vivência humana.

É fundamental que qualquer educador pré-es-colar ou professor do 1º ciclo entenda a ciência como um corpo de conhecimentos coerente-mente organizado para dar uma explicação in-teligível sobre os objetos e fenómenos naturais. Esse conjunto de conhecimentos é construído numa relação dialética entre teorias racionais e a experimentação realizada.

Nestes níveis de ensino, as atividades práticas tem de ir além de despertar a curiosidade, o gosto e o sentido de observação do mundo em nosso redor. São também oportunidades únicas para as crianças dos 3 aos 9 anos começarem a compreender que há razões para o mundo ser como é, e que a ciência não vive só: acompa-

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nha-se da abertura a novas ideias, da leitura e escrita, do respeito e partilha por todas as pes-soas e do desejo de construir um mundo me-lhor com as novas tecnologias.

Não surpreende assim que se considere funda-mental pôr em ação um ensino-aprendizagem das ciências numa perspetiva multidisciplinar: prática, comunicação, novas tecnologias e cida-dania. Para o estimular, o Centro de Formação de Escolas do Concelho de Almada, em parceria com a Câmara Municipal de Almada e a Facul-dade de Ciências e Tecnologia (FCT) da Univer-sidade Nova de Lisboa, com o apoio da Porto Editora, criou em 2012 o Prémio Pequenos Cien-tistas de Almada para reconhecer o mérito de atividades de sala de aula inovadoras.

A ideia do Prémio germinou durante a realização da Oficina de formação, lançada em 2011, “Ci-ência, língua, tecnologia e cidadania – Partilha multidisciplinar de projetos”, onde se desenvol-veu uma dinâmica potenciadora da criatividade para um ensino experimental das ciências na

mencionada perspetiva multidisciplinar.

Ao longo dos três anos/edições que já têm de vida, o Prémio e a Oficina mobilizaram quatro formadoras do 1º ciclo e do ensino secundário, mais de 60 educadoras e professoras em forma-ção, 50 turmas e mais de mil alunos, bem como espaços comunitários como a Casa da Juventu-de Ponto de Encontro, a Casa da Cerca, a FCT – Edifício VII, o Solar dos Zagallos e o Convento dos Capuchos. De 2011/12 a 2013/14, os proje-tos vencedores foram:

a) no escalão educação pré-escolar,

“Uma viagem no mundo das dáfnias” – EB/JI Laranjeiro nº3 e EB/JI do Alfeite, do agru-pamento Comandante Conceição e Silva (2012)

“Casquinhas & minhocas” - EB1/JI Laran-jeiro nº 2, do agrupamento Prof. Ruy Luís Gomes (2013)

«Nhoca minhoca – um microprojeto de ver-

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micompostagem» - EB1/JI Cremilde Cas-tro e Norvinda Silva e EB1/JI do Feijó, dos agrupamentos da Trafaria e Romeu Correia (2014)

b) no escalão 1º ciclo do ensino básico,

“Ciências experimentais no 1º CEB” – EB Costas de Cão, do agrupamento da Trafaria (2012)

“Dáfniomania” - EB1/JI Laranjeiro nº3, EB1 Cova da Piedade nº1 e EB1 Cova da Pieda-de nº3, dos agrupamentos António Gedeão e Emídio Navarro (2013)

«Vem aí a Dáfnia» - EB1/JI Maria Rosa Co-laço, do agrupamento Francisco Simões (2014)

O trabalho realizado nos projetos vencedores, e restantes, pode ser visualizado no sítio da Web “Pequenos Cientistas – AlmadaForma” (http://pequenos.almadaforma.org/site/rosto.html), estando os links destacados no topo da página de rosto.

E agora, avaliar…

Chegados a este ponto (maio de 2015, a alguma distância da conclusão da 4º edição), as insti-tuições envolvidas e o autor do presente artigo, enquanto coordenador da Oficina e do Prémio, consideraram pertinente efetuar uma avaliação dos efeitos na prática profissional da participa-ção nestas iniciativas. O inquérito teve como ‘alvo’ (através de email) 20 educadoras e 40 do-centes do 1º ciclo do ensino básico; os instru-mentos elaborados para esse fim encontram-se em anexo.

Tendo sido devolvidos apenas 11 questioná-rios (cinco referentes ao pré-escolar e seis ao 1º CEB), não é possível apresentar conclusões validadas estatisticamente, pelo que nos limi-taremos a disponibilizar uma pequena súmula dos dados recolhidos. Começando pelas educa-doras, …

… foram unânimes em ‘afirmar’ que a frequên-

cia da Oficina não mudou a valorização antes atribuída a certas finalidades da educação pré-escolar. Todas as educadoras consideram nada importante o objetivo de “perseguir um desen-volvimento global da criança, pessoal e aca-démico, que não priorize determinadas áreas como as ciências ou a matemática”. Para quatro das cinco profissionais, a finalidade (entre as apresentadas) encarada como grande orienta-dora do trabalho é “a aquisição pela criança de algumas ‘ferramentas’ de pensamento, entre as quais a linguagem e os processos das ciências”.

… duas das inquiridas passaram a dar maior im-portância a temas de ciências naturais e físico-químicas e ao ‘método’ experimental, estando as restantes três agora mais atentas aos tópi-cos de “física/química”; as cinco educadoras assinalaram que, antes e depois da formação, aborda(va)m frequentemente a “saúde pesso-al” e o “ambiente”.

… a maioria das educadoras (4 em 5) pensa tra-balhar bem ou muito bem todas as competên-cias investigativas indicadas no questionário, com maior destaque no “colocar questões”, “observar”, registar” e “comunicar”; uma edu-cadora classificou o seu desempenho como in-satisfatório no desenvolvimento das competên-cias “interpretar/explicar” e “tirar conclusões gerais”.

… realizaram no período fevereiro → abril de 2015 diversas atividades práticas, relacionadas com o magnetismo, estados físicos da água, as-tronomia e seres vivos (características, habitats, germinação de sementes, etc). Todas as educa-doras manifestaram um elevado grau de satisfa-ção com os produtos educacionais dessas ativi-dades, apontando igualmente um bom nível de integração com outras dimensões (língua, TIC e/ou cidadania).

… as cinco educadoras “concordaram” ou “con-cordaram plenamente” com as afirmações A a D sobre a evolução profissional com a participa-ção na Oficina, pelo que, na sua opinião, a ação motivou um maior interesse, facilitou a imple-mentação e marcou uma mudança no exercício

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de um ensino prático das ciências, caracteriza-do agora por uma perspetiva integradora (ci-ências, língua, TIC, cidadania). Paralelamente, consideram que têm vindo a melhorar o seu desempenho neste ensino graças, sobretudo, a um esforço de autoformação, já que a oferta neste domínio (cursos, workshops, …) é enten-dida como escassa.

Relativamente ao 1º CEB, podemos partilhar que…

… quase todos os docentes (5 em 6) considera(va)m relevantes as três finalidades propostas para este nível de ensino, não obstante as finalida-des B (Proporcionar o desenvolvimento de ca-pacidades de pensamento ligadas à resolução de problemas, aos processos científicos e à tomada de decisões baseada em argumentos racionais sobre as grandes questões do mundo moderno) e C (O ensino básico terá sempre de veicular alguma informação, ainda que simpli-ficada, da natureza, conteúdos e processos das ciências, que permita ao aluno compreender alguns fenómenos importantes do mundo em que vive) expressarem – talvez de forma pouco óbvia… – graus diferentes de cultura científica no 1º CEB.

… passou a haver, com a formação, um maior investimento nos conteúdos de “biologia/geologia”, “química/física” e “metodologia experimental”, acompanhando assim os já fre-quentemente tratados domínios da “saúde” e “ambiente”.

… a maioria dos professores (4 em 6) percorre todo o ‘espetro’ de competências investigativas apresentado, apreciando o seu desempenho no ensino dessas competências como Bom – na maior parte – ou Satisfatório – em algumas, sobretudo o “questionar” e “tirar conclusões gerais”.

… quatro docentes realizaram atividades práti-cas no período fevereiro → abril de 2015, acer-ca das propriedades do ar, dos estados físicos da água, entre outras, tendo ponderado o sucesso da aprendizagem como Bom ou Muito Bom,

para o qual terá contribuído o facto de esses (4) docentes terem desenvolvido uma integração dos conteúdos científicos com a língua, TIC e a educação para a cidadania.

… as respostas aos indicadores de mudança após a frequência da ação “Ciência, língua, …” variaram entre 3 (“concordo”) e 4 (“concordo plenamente”), sendo de evidenciar a eleva-da consistência ao nível de cada questionário: cinco em seis docentes selecionaram o mesmo ponto da escala (3 ou 4) em todas as afirmações dos subgrupos A-D e E-F, o que valida o item em causa, bem como algumas das ilações expres-sas seguidamente.

Impressões finais

Perante o reduzido número de respostas, a ati-tude intelectual mais apropriada é a de recorrer ao verbo “parecer” e ao tempo “condicional” nesta fase de (tentar) extrair algumas conclu-sões gerais dos dados disponíveis.

Assim, as (ex-)formandas-educadoras da Ofi-cina “Ciência, língua, tecnologia e cidadania” aparentam ter uma noção clara das finalidades do trabalho desenvolvido no jardim-de-infân-cia, que não deve visar uma formação ‘amorfa’ das crianças mas antes uma aprendizagem de componentes temáticas bem definidas, em-bora interligadas. Os produtos (e processos) a promover com o ensino no 1ºCEB parecem não estar tão bem clarificados na mente dos formandos-professores deste nível. De qual-quer modo, podemos inferir, sem surpresa, que os conteúdos científicos ‘duros’ (biologia, física, …, método experimental) eram habitualmente secundarizados face à língua, matemática e às questões da saúde humana e ambiental.

Ainda que não possamos determinar se se trata de uma consequência direta da ação realizada, os formandos implementarão com alguma re-gularidade atividades práticas de física, química ou biologia, nas quais é provável o empenho em ir além de um caráter demonstrativo dos fenómenos, nutrindo ponderada e ativamente

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uma visão investigativa da ciência, que se faz de interrogações, hipóteses, manipulação de materiais ou variáveis, de observações e seu registo. O que acreditamos ser um efeito da participação na Oficina é a exploração de uma perspetiva integradora, multidisciplinar, nas re-feridas atividades, e um dos motivos de lança-mento deste projeto; a par da nossa experiência profissional e do ponto 2.3 do questionário, as respostas dadas à questão 3 contribuem igual-mente para justificar esse otimismo.

As informações recolhidas com a última per-gunta do questionário sugerem que os forman-dos deem como valiosa a participação na ação, por impacto positivo quer nos conhecimentos teóricos, quer na prática quotidiana na sala de ‘aulas’, no sentido de um ensino mais abrangen-te e enriquecedor das ciências. Tendo a Oficina/Prémio fomentado nas educadoras e profes-soras respondentes uma destreza e apetência crescentes por novas fórmulas pedagógicas, que a oferta institucional parece não satisfazer, o presente inquérito desenha uma tendência – de vontades e capacidades no ‘corpo’ educador e docente – que obriga o Centro AlmadaForma a perseverar no caminho iniciado e, também ele, a desbravar novas fontes e abordagens de pôr os alunos dos 3 aos 9 anos a “sonhar” o mundo, a descobrir «que o sonho [de saber] comanda a vida, que sempre que um homem sonha o mun-do pula e avança como bola colorida entre as mãos de uma criança» (António Gedeão).

Um fator crucial para o sucesso futuro é o esta-belecimento de parcerias. Na maioria dos pa-íses europeus procura-se implementar um en-sino das ciências em contexto, relacionando-o com tópicos sociais contemporâneos, como a cidadania, o ambiente e as novas tecnologias, e sustentado em parcerias muito variadas, em-bora existam algumas recorrentes, como as que envolvem as autarquias e as universidades, con-sideradas casos de notória sinergia dos esforços desenvolvidos. O Centro AlmadaForma já o ex-periencia. Assim, resta-nos agradecer profun-damente às formadoras, formandos e parceiros institucionais a disponibilidade e empenho de-dicados à Oficina e ao Prémio Pequenos Cientis-tas de Almada.

AnexosQuestionários -pré-escolar• Questionários - 1.º ciclo•

Bibliografia consultada

Afonso, M. (coord.), 2014, Que Ciência se Aprende na Escola? Lisboa: Fundação Francisco Manuel dos Santos.

DEB - Departamento da Educação Básica, 1997, Orientações Curriculares para o Ensino Pré-escolar. Lisboa: Ministério da Educação.

Martins, I. et al., 2007, Educação em Ciências e Ensino Experimental Formação de Professores (2ª ed). Lisboa: DGIDC-ME.

Santos, M., Gaspar, M., Santos, S., 2014, A Ciência na Educação Pré-escolar. Lisboa: Fundação Francisco Manuel dos Santos.

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EDUCAÇÃO

Uma Visão Ampla e Inclusiva da CiênciaUma partilha interdisciplinar de projetos

Joana Barros Associação Viver a Ciência

A escola desempenha um papel fundamental na construção da sociedade do conhecimen-to. Uma sociedade que precisa não só de uma comunidade científica extensa e diversa, com profissionais motivados e competentes, mas também de cidadãos cientificamente cultos, in-formados e participativos, que sejam capazes, entre outras coisas, de compreender as dimen-sões sociais, económicas, políticas e éticas da Ciência. Parece-me ser antes de mais importan-te tentar perceber em que ponto estamos na contrução dessa sociedade do conhecimento. E embora não haja ainda muitos dados sobre os últimos quatros anos, um período em que se as-sistiu a uma alteração substancial das políticas de ciência, muito contestada pela comunidade científica, julgo que os números já conhecidos nos podem guiar na reflexão sobre alguns dos desafios que enfrentamos.

Um aspecto muito positivo é a evolução do nú-mero de investigadores. Em 2011, Portugal ti-nha 9 investigadores (equivalentes a tempo in-tegral) por cada 1000 pessoas empregadas, um número acima da média europeia que ficava nos 6.71. No entanto, o número total de pesso-as ligadas a profissões de C&T em Portugal fica muito aquém do desejado. Em 2010, só 19.8% da nossa força de trabalho tinha uma ocupação em C&T e, embora esta percentagem tenha crescido ligeiramente desde 2007, contrasta com uma média europeia de 31%2. Se olharmos para a ratio entre o número de investigadores e o número total de pessoas que trabalham em I&D, ela subiu de 60% em 1988 para 84% em 20083. Isto significa que a estrutura de investi-gação está sem apoio suficiente.

A maneira como se faz ciência evoluiu muito desde os anos oitenta, mas o esforço que foi feito no sentido de optimizar a gestão e opera-cionalização do sistema de I&D não deu ainda lugar a uma estrutura profissional abrangente e especializada que apoie, partilhe e potencie o empreendimento científico. Mas começam a aparecer em Portugal comunicadores, empre-endedores, gestores, angariadores de fundos, consultores e escritores dedicados exclusiva-mente à área científica. Os seus percursos são muito diversos mas têm quase sempre em co-mum um percurso académico em ciência. É im-portante os jovens conhecerem estas oportu-nidades profissionais dentro da área científica. Essa poderá ser uma das formas de os cativar, abrindo os seus horizontes para além de uma carreira de investigação.

Olhando para a paridade de género, Portugal ocupa uma boa posição a nível europeu. Em 2012, 45% dos nossos investigadores eram mulheres (EU 33%), um crescimento de 13,9% desde 20054. Mas a distribuição entre áreas científicas e níveis de progressão de carreira é menos equitativa. Em 2010 o número de mu-lheres estudantes de doutoramento igualava ou ultrapassava o dos homens em quase todos os campos de estudo, excepto nas ciências, mate-máticas e informática (40%) e nas engenharias, produção e construção (26%)5. Também nas posições de topo as mulheres estão bastante sub-representadas; dados de 2010 mostram que 77,5% desses lugares são ocupados por ho-mens, uma modesta descida de 2% desde 2002, mas mesmo assim um pouco melhor do que a média europeia6. As razões para estes valores são diversas mas a evolução positiva a que se tem assistido nos últimos anos sugere que o es-forço de promover o papel da mulher na ciência deve ser continuado. Os role-models continuam a ser importantes para esse objectivo, quer em

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versão “ao vivo”, quer sob a forma de explora-ção biográfica do percurso de mulheres pionei-ras nos seus campos de investigação e nas suas carreiras profissionais ao longo dos tempos. Mas mais do que promover a igualdade de gé-nero, os role-models podem ajudar também a promover outros tipos de diversidade e inclu-são. É importante procurar mostrar um conjun-to de percursos e personalidades abrangente, homens e mulheres de diversas etnias e cultu-ras, pessoas portadoras de deficiência, pessoas com percursos invulgares, etc. Trata-se não só de uma questão de justiça social mas igualmen-te de uma prioridade para a ciência, que flores-ce na diversidade de curiosidades, paixões e in-telectos. Revelar a multiplicidade de interesses, origens e percursos de vida dentro do mundo científico, para além de poder levar mais jovens a se identificarem com o empreendimento cien-tífico, pode também ajudar a moldar positiva-mente atitudes e valores sociais.

Mas como referíamos no início deste texto, para além de captar mais recursos humanos para C&T, a escola tem também um papel mui-

to importante na formação de uma sociedade cientificamente culta. Conhecimentos relevan-tes sobre o mundo e um espírito crítico apura-do, que permitam tomar decisões informadas sobre questões que afectam o nosso bem-estar e o bem-estar da sociedade, são ferramentas úteis para todos. No entanto, a literacia cien-tífica dos portugueses é muito baixa7, e isto é particularmente desconcertante num momen-to em que a sociedade é convidada a participar no debate sobre as implicações éticas e sociais da ciência e da sua aplicação8. Este é um debate que a escola pode e deve introduzir, capacitan-do os jovens a nele participarem.

Mas para lograrem estes objectivos é funda-mental que os professores consigam captar o interesse de uma plateia abrangente e diversa. Para isso será importante procurar temas que ajudem a chegar às ‘Big Ideas of Science’9 que passam não só por ideias da ciência, mas tam-bém por ideias sobre a ciência e o seu papel na sociedade. É importante valorizar a natureza do processo científico e a sua índole tentativa. A base da ciência é a dúvida e é muito libertador

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pensar que não existe uma verdade precon-cebida a que se pretende chegar, apenas uma curiosidade por revelar o desconhecido, como nos lembra Richard Feynman10. É importante transmitir aos alunos essa natureza dinâmica do conhecimento assim como o valor relativo das evidências. Num mundo de informação, em que o conhecimento enciclopédico está à dis-tância de um click, a educação de ciência tem de apostar no desenvolvimento de competên-cias e atitudes que permitam contextualizar o conhecimento e a discussão da sua natureza. Essa discussão tem uma utilidade que se esten-de muito para além do domínio científico. Nas palavras de Dorothy Sayers “For the sole true end of education is simply this: to teach men how to learn for themselves; and whatever ins-truction fails to do this is effort spent in vain”11.

É importante encontrar temas que sejam re-levantes para os alunos. A UNESCO realça no relatório Repensando a Escola (2007)12 que a estratégia central de ensinar ciência requer a abordagem e investigação de “questões autên-ticas geradas pelas experiências dos alunos.” Isto pode ser feito nas salas de aula, fora delas ou nos laboratórios. É preciso que as escolas se envolvam mais com as comunidades locais, as

empresas e as organizações sociais. Que apro-veitem as oportunidades abertas por vários institutos de investigação que têm programas que trazem as escolas aos seus laboratórios e que levam os cientistas às escolas. O IBMC, IPATIMUP, ITQB e IGC são alguns exemplos na área da biologia, mas existem muitos outros um pouco por todas as áreas do conhecimento e por todo o país.

Outros recursos que poderão funcionar para interessar os alunos são os audiovisuais, desde documentários de ciência mais tradicionais, a trabalhos experimentais e conceptuais que po-dem ajudar a motivar os alunos e a introduzir novas variantes nas discussões das temáticas do curriculum. A inclusão destes recursos pode também funcionar como uma oportunidade para convidar cineastas, artistas e jornalistas a falarem do seu trabalho dentro da ciência.

Quanto a dinâmicas, é importante criar espaços de reflexão tanto a nível individual, para pro-mover a autonomia intelectual, como colectivo, para fomentar o trabalho em equipa, a comu-nicação efectiva e a auto-confiança13. Debates e propostas de resolução de problemas são recursos com um grande potencial para esse

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trabalho colectivo, e para além de promoverem a aprendizagem dos conteúdos, podem ser si-multaneamente oportunidades de desenvolver competências cognitivas gerais, sociais14.

É deste pool que surgirão os eventuais cientis-tas como o sugere António Cachapuz (2004): “a orientação e eventual selecção de alunos que desejam ser futuros especialistas deve ser feita a partir de uma população entusiasta de alunos, tendo já obtido com sucesso uma cultura cientí-fica/tecnológica geral.”15

A esses alunos interessados em serem cien-tistas importaria também dar uma orientação profissional mais formal que aborde aspectos da própria estrutura académica e profissional do meio de investigação para que o aluno co-nheça melhor o caminho que tem pela frente. Os potenciais cientistas devem ser também encorajados a participar em projectos de Uni-versidades de Verão e outros semelhantes que facilitem a sua inserção em ambientes reais de pesquisa. Promover a orientação profissional é muito necessário em Portugal, onde em 2014 59% das pessoas diziam nunca ter tido acesso a este tipo de ajuda, um dos números mais eleva-dos da Europa16.1European Comission - Researchers Report 2014 - Country Profile: Portugal, Figure 1: Key indicators – Portugal (source: Deloitte).2Europe in Figures — Eurostat Yearbook 2012, Ta-ble 13.2.4: PhD students (ISCED level 6), 2009; Table 13.2.2: Human resources in science and technology, 2007-2010.3Euraxess Researchers in Motion – Ciência e Tecnolo-gia em Portugal, Evolução de alguns indicadores do SCTN (Fonte: GPEARI/MCTES) http://www.euraxess.pt/jobs/research/research.phtml.pt#ove.4She Figures 2015 - Gender in Research and Innova-tion (Preliminary Results)- Table: Proportion (%) of women researchers (2012) and compound annual growth rate (%) for researchers, by sex, 2005-2011.5She Figures 2012 - Gender in Research and Innova-tion - Statistics and Indicators.6DG Research and Innovation - Researchers’ Report

2013, Scorecards, Table 9: Scorecard: Women as Gra-de A academic staff, EU-27, 2002 and 2010 (%); Table 10: Scorecard: Women as Grade A academic staff, Eu-rope, 2002 and 2010 (%).7Eurobarometer 401 Responsible Research and In-novation (RRI), Science and Technology (inc. Country Factsheet Portugal).8Responsible Research and Inovation (RRI) https://ec.europa.eu/programmes/horizon2020/en/h2020-section/responsible-research-innovation.9Ed: Wynne Harlen; Contrib: Derek Bell, Rosa Devés, Hubert Dyasi, Guillermo Fernández de la Garza, Pier-re Léna, Robin Millar, Michael Reiss, Patricia Rowell e Wei Yu, Principles and Big Ideas of Science Education, edited by Wynne Harlen, 2010.10Richard Phillips Feynman, Jeffrey Robbins, The Ple-asure of Finding Things Out: The Best Short Works of Richard P. Feynman, 2005.11Dorothy Sayers, The Lost Tools of Learning, Ed. Oxford City Press, 2010r, p.18.12Luiz Claudio R. de Carvallho, Bernard Charlot, Ridha Ennafaa, Mariana Fernandes, Walter Garcia, Candido Gomes, Divonzir Gusso, Vera Esther Ireland, Repen-sando a Escola: Um Estudo dos Desafios de Aprender, Ler e Escrever, Ed. UNESCO, 2007.13Cecília Galvão e Pedro Reis, “A promoção do inte-resse e da relevância do ensino da ciência através da discussão de controvérsias sociocientíficas”, in V Se-minário Ibérico / I Ibero-americano CTS no Ensino das Ciências, Universidade de Aveiro, 2008.14Eurico Carrapatoso, Maria Teresa Restivo, José Cou-to Marques, Aníbal Ferreira, Rui Mota Cardoso e José Ferreira Gomes, “Motivar os jovens para as areas de Ciência e Tecnologia – Reflexões da Universidade do Porto”, Global Congress on Engineering and Technolo-gy Education, 2005.15António Cachapuz, João Praia e Manuela Jorge “Da educação em ciência às orientações para o ensino das ciências: um repensar epistemológico”, Ciência & Educação (Bauru), 10(3), 363-381, 2004.16 Special Eurobarometer 417 European Area of Skills and Qualifications Report, 2014.

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INVESTIGAÇÃO

O Ensino de Ciências no Século XXI Science teaching in the XXI century1

Marco Antonio Moreira Instituto de Física, UFRGS

Caixa Postal 1505191501-970 Porto Alegre, RS, Brasil

http://[email protected]

Resumo

Este texto é uma espécie de resenha de um conjunto de artigos publicados na revista Science, em 2013, so-bre grandes desafios para o ensino de ciências na ed-ucação contemporânea. São transcritos literalmente alguns desses desafios e a seguir são comentados e interpretados pelo autor.

Palavras-Chave: ensino de ciências; grandes desafios; século XXI.

Abstract

This text is a kind of review of a set of papers published in the Science journal, in 2013, on great challenges for science teaching in contemporary education. Some of these challenges are transcripted, literally, and then they are commented and interpreted by the author.

Keywords: science teaching; great challenges XXI cen-tury.

Grandes desafios no ensino de Ciências2

Em abril de 2013, a revista Science dedicou boa parte de um volume (pp.290-323) ao tema Grandes Desafios do Ensino de Ciências. Nas primeiras páginas deste material, Carl Wie-man, Prêmio Nobel de Física em 2001 diz com destaque, referindo-se ao ensino superior:

A TRA�SFORMA��O � POSS��EL SE A U�I�ERSI- TRA�SFORMA��O � POSS��EL SE A U�I�ERSI-DADE REALME�TE QUISER3

O ensino na universidade

A maneira como a maioria das universidades de pesquisa ensina ciências na graduação é pior do que ineficaz. � não científica. (p.292)

Há toda uma indústria dedicada a medir quão importante é minha pesquisa, com fatores de impacto dos meus artigos e por aí vai. �o entan-to, nem sequer coletam dados sobre como estou ensinando. Isso não recebe atenção. (p.293)

Há muitos professores que acham totalmente apropriado dedicar mais tempo melhorando seu ensino, mas não é isso que se espera deles. (ibid.)

De fato, estamos vivendo uma época em que, na universidade, o que vale são as publicações, os “papers”. Embora a missão da universidade seja ensino, pesquisa e extensão, o que im-porta é a pesquisa que gera publicações. Com isso, o ensino não tem a menor importância. Os professores quase que invariavelmente usam a “metodologia” das aulas teóricas e listas de problemas. Repetem o que está nos livros e dão listas de problemas, muitas vezes já resolvidos por outros alunos em anos anteriores, como “temas de casa”. Assim fica fácil dar aulas, não é preciso gastar tempo, preparando aulas e sobra mais tempo para a pesquisa. Esse tipo de ensi-no é, realmente, não científico. É um absurdo formar futuros cientistas e futuros professores com essa “metodologia”, mas é a que predomi-na nas universidades de pesquisa. A aprendiza-gem é mecânica e não há uma formação inicial do espírito científico. Os futuros professores,

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embora possam cursar disciplinas de didática, acabarão ensinando exatamente como foram ensinados: aulas teóricas e listas de problemas, apesar de que o mundo hoje seja outro.

Aprendizagem ativa e ensino centrado no aluno

Criticando o ensino tradicional, Carl Wieman defende a aprendizagem ativa (active learning) e o ensino centrado no aluno:

O que funciona melhor do que aulas expositivas e temas (problemas) de casa, segundo numero-sos estudos, é ter os alunos trabalhando em pe-quenos grupos com a mediação de professores que podem ajudá-los a aplicar conceitos básicos a situações da vida real. (p. 294).

Segundo sua experiência, a melhor maneira de implementar a aprendizagem ativa e o ensino centrado no aluno é fundi-las com o conceito de prática deliberada (deliberate practice).

Prática deliberada

A prática deliberada envolve o aprendiz na re-solução de um conjunto de tarefas ou proble-mas que são desafiadores mas factíveis, viáveis, e que envolvem explicitamente a prática de ra-

ciocínio e desempenho científicos. O professor, ou mediador, oferece incentivos apropriados para estimular os alunos a dominar as compe-tências necessárias, assim como uma contínua realimentação para mantê-los ativos nas tare-fas. (ibid).

Ensino centrado no aluno não é novidade. Carl Rogers, em sua obra Freedom to learn, já propu-nha isso em 1969. Aprendizagem ativa também não tem nada de novo. É claro que o aluno deve participar ativamente de sua aprendizagem. Fundir ensino centrado no aluno e aprendiza-gem ativa é, sem dúvida, uma boa ideia. Mas ainda assim não é inovadora. O método de projetos, proposto por Paulo Freire (Pedagogia da autonomia) e outros autores, é muito seme-lhante à prática deliberada defendida por Carl Wieman. Apresenta bons resultados, mas não é usado na escola porque dificulta “cumprir o programa” das disciplinas da grade curricular. Ensino centrado no aluno, aprender a aprender, aprendizagem ativa, prática deliberada, projeto e outras abordagens fazem parte do discurso educativo, mas não chegam à escola porque nela a grande meta é preparar o estudante para as provas, o ensino para a testagem.

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Competências científicas

Desenvolver competências científicas não é uma questão de encher de conhecimentos um cérebro, mas sim de desenvolver esse cérebro. A educação em ciências não deve ser uma sele-ção de talentos, mas sim de desenvolvimento de talentos. (ibid.)

Aqui, outra vez, o discurso é uma coisa e prática é outra. Carl Wieman está falando de compe-tências como, por exemplo, modelagem, argu-mentação a partir de evidências, comunicação de resultados, ou seja, competências científi-cas. Mas as competências que hoje predomi-nam na escola, inclusive definindo o chamado “currículo por competências”, muitas vezes são os mesmos objetivos comportamentalistas de cinqüenta anos atrás. O importante é que o aluno apresente “tal competência”, que seja “capaz de”, sem preocupação com o significa-do do que sabe ou do que faz. A aprendizagem significativa não é o objetivo, a competência mecânica sim.

Laboratórios presenciais e laboratórios virtuais4

Outro desafio é o uso de laboratórios virtuais no ensino de ciências.

É claro que laboratórios tradicionais são impor-tantes no ensino de ciências, mas muitas vezes não são usados ou não existem nas escolas.

Laboratórios virtuais podem motivar os alunos e contribuir para o desenvolvimento de compe-tências científicas (p.305):

os alunos podem modificar características • dos modelos científicos;

podem criar modelos computacionais;•

podem fazer experimentos sobre fenôme-• nos não observáveis diretamente;

�o entanto, é importante determinar o balanço ideal entre atividades de laboratórios virtuais e presenciais. (p.308).

É surpreendente que laboratórios virtuais, em pleno século XXI, sejam considerados um gran-de desafio para o ensino de ciências. Os alunos vivem em um “mundo virtual” e seria natural que a escola fizesse parte desse mundo. Mas não é assim. O ensino de ciências na escola é ainda muito tradicional. As práticas de laborató-rio não existem ou são do tipo “receita de bolo”. O enorme potencial dos tablets e celulares, que estão cheios de sensores, é ignorado. As aulas são teóricas e voltadas para a memorização de respostas corretas. Pensar, experimentar, ques-tionar, não é importante. O treinamento para as provas, sim.

Desordens neurocognitivas individuais5

Outro grande desafio para ensinar ciências no século XXI é desenvolver uma melhor compre-ensão sobre como diferenças individuais no de-

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senvolvimento cerebral interagem com a edu-cação formal. (p.304)

Compreender desordens do desenvolvimento cognitivo pode melhorar a educação para to-dos. Por exemplo, dificuldades de aprendizagem como dislexia, discalculia, déficit de atenção, hiperatividade e autismo. É urgente investigar nessa área.

O sistema educativo deveria ser capaz de mo-nitorar e fazer adaptações às desabilidades específicas de aprendizagem (specific learning disabilities – SLDs). Uma abordagem promis-sora envolve o uso de tecnologias capazes de adaptar o ensino de disciplinas básicas (e.g., matemática, ciências, língua) às diferenças in-dividuais. (ibid.)

Professores empreendedores6

Professores que lideram fora da sala de aulas, mas não perdem sua conexão com os alunos estão melhor posicionados para disseminar e implementar práticas e políticas educacionais. (p.309)

Assim como lousas empoeiradas ainda existem em muitas salas de aula, muitos professores en-volvidos nas reformas educacionais falham em imaginar que a escola hoje não é a mesma de quando eram professores ou alunos. (ibid.)

Por outro lado, embora sejam essenciais para promover a aprendizagem, poucas políticas públicas dão espaço de liderança a professores bem sucedidos nessa tarefa. (ibid.)

Isolados atrás de portas fechadas das salas de aula, professores tradicionalmente não têm tempo para observar e aprender com seus pa-res. (ibid.)

Professores de sala de aula devem também ter tempo, espaço e recompensas para divulgar suas práticas a colegas, gestores, políticos edu-cacionais, pais, líderes comunitários. (p.310)

Este é mesmo um grande desafio, pois os pro-fessores da educação básica, geralmente, não têm permissão para participar de congressos e seminários onde possam divulgar seu traba-lho. Também não têm licença para participar de pesquisas na própria escola ou em parceria com a universidade. O professor tem que “ficar na escola”, na sala de aulas. Qualquer atividade empreendedora ou de desenvolvimento profis-sional é mal vista pelos gestores e muitas vezes também pelos colegas.

Desenvolvimento profissional de professores de ciências7

Resultados de pesquisas, qualitativas e quan-titativas, com várias abordagens disciplinares, sugerem várias características que tornam mais efetivo o desenvolvimento profissional de pro-fessores: a) foco em conteúdos específicos, b) envolver professores na aprendizagem ativa, c) viabilizar a participação coletiva de professores em atividades de desenvolvimento, d) coerência com políticas e práticas educacionais e e) tempo de duração. (p.310)

Apesar disso e de outros fatores já identifica-dos, é preciso ainda muita pesquisa para enten-der melhor os mecanismos de como se aprende a ser professor e também de quais devem ser os conhecimentos de ciências que devem ter os professores para a sala de aulas. (p.311)

Muitos professores dizem que em seu desenvol-vimento profissional recebem mais oportunida-des de desenvolvimento genéricos do que de de-senvolvimentos específicos em ciências. (Online “just-in-time assistance” é uma potencialidade nesse sentido.) (p.312)

Há muita pesquisa sobre formação inicial e continuada de professores, mas praticamente todos acabam “ensinando como foram ensi-nados”, ou seja, daquela maneira não científi-ca criticada por Carl Wieman. As disciplinas de

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didática geral são feitas apenas por obrigação. O que “forma” mesmo o professor é a didática das aulas teóricas e listas de problemas, os “te-mas de casa”.

Repensando o ensino de ciências para não-cientistas8

Durante meio século, usando slogans como “al-fabetização científica” e “ciência para todos”, sistemas educacionais, em muitos países, de-fenderam que a ciência deveria ser ensinada para todos os estudantes, mesmo os que não seguiriam carreiras científicas. Os resultados foram modestos, não está claro em que medi-da isso melhorou a capacidade do cidadão em viver em uma sociedade altamente científica-tecnológica. (p.314)

Nessa linha, os grandes desafios para o ensino de ciências no século XXI são (p.316):

1. ajudar os alunos a explorar a relevância pessoal da ciência e integrar o conheci-mento científico a soluções de problemas, práticas e complexas, que muitas vezes não podem ser definidas em termos puramente científicos;

2. desenvolver nos estudantes a compreen-são da base social e institucional da credi-bilidade científica;

3. estimular e habilitar os estudantes a apren-der ciências desenvolvendo seus próprios interesses, curiosidades e práticas científi-cas para toda a vida.

A mensagem aqui é que slogans não funcionam. É muito bonito falar em alfabetização científica e ciência para todos, mas isso não tem sentido se o ensino de ciências é não científico. Para que serve memorizar mecanicamente fórmulas, al-goritmos, equações, reações químicas, taxono-mias? Para nada! Para fazer com que os alunos acabem “odiando” disciplinas como a Física.

Dificuldades previsíveis

Currículos escolares, expectativas dos pais, trei-namento para a testagem militam contra peda-gogias que sacrificam aprendizagens de curto prazo em favor de maior motivação, habilida-des complexas e menores, mas mais duradou-ros, corpos de conhecimentos. (p.316)

Cientistas podem ser aliados ou adversários nesse tipo de ensino. Alguns tiveram e têm um papel decisivo em mudanças curriculares e pe-dagógica. Outros defendem somente a aborda-gem de fatos, princípios e solução de proble-mas. (ibid)

A cultura educacional do século XXI é a do en-sino para testagem. As melhores escolas são as que melhor preparam os alunos para as provas locais, nacionais ou internacionais. A expectati-va é que os alunos passem nas provas. A educa-ção acaba confundida com o treinamento para as provas. No Brasil, por exemplo, as escolas se transformaram em centros de treinamento para o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), um único exame nacional, uniforme para todo o país, que decide “quem entra na universida-de”. Em outros países pode ser o treinamento para o PISA ou para alguma outra prova. Esse treinamento comportamentalista que domina a escola é o grande desafio para os grandes de-safios para o ensino de ciências focalizado nos artigos aqui apresentados e comentados. Como ensinar ciências, desde uma perspectiva cien-tífica, em uma cultura escolar treinadora, não científica?

Melhoria do ensino através da pesquisa e de-senvolvimento em sistemas educacionais9

A conexão entre pesquisa e prática no cam-• po da educação tem sido fraca. (p.317)

Como usar resultados de pesquisa para • buscar novas possibilidades e desenhar novos instrumentos e processos para

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melhorar o ensino? Através da pesquisa translacional. (ibid.)

O termo translacional sugere que os resul-• tados de pesquisa existem, estão na mão, mas devem ser traduzidos à linguagem da prática. (ibid.)

A metáfora da translação concilia a ma-• neira como a pesquisa que resolve proble-mas da prática é moldada e guiada pelo problema para produzir soluções deseja-das e utilizáveis. (ibid.)

A pesquisa educacional na universidade e • as agências que financiam essa pesquisa devem incentivar a pesquisa translacio-nal. (p.319)

Outro desafio é a criação de uma cultura • dentro do sistema escolar que favoreça a pesquisa e a experimentação em contex-tos reais de sala de aula, com a participa-ção de professores. (ibid.)

A pesquisa em ensino de ciências existe pelo menos desde a década de sessenta do século passado, mas o impacto de seus resultados na sala de aula de ciências, no ensino de ciências em condições reais de sala de aula, praticamen-te inexiste. Dizer que a conexão entre pesquisa e prática é fraca é atenuar a desconexão exis-tente entre as duas. Mas aqui é preciso distin-guir entre pesquisa básica e pesquisa aplicada. A pesquisa básica não tem compromisso com a solução de problemas do ensino de ciências,

seu objetivo é a produção de conhecimentos sobre ensino de ciências. A pesquisa aplicada, por sua vez, procura resolver problemas de en-sino, problemas de sala de aula. É obvio que de-veria haver uma articulação entre as duas, mas na prática o que existe é uma desarticulação, pois a pesquisa básica fica só nos “papers” e a pesquisa aplicada é considerada de menor valor do que aplicada. A pesquisa translacional tem muito a ver com a pesquisa aplicada e busca articulá-la com a pesquisa básica. Isso é muito importante para o ensino de ciências e deve contar com a participação de professores de ci-ências. Pesquisa em ensino sem participação de professores não tem sentido. É inócua.

A testagem10

Há uma desconexão entre o conhecimento • que os alunos têm sobre fatos e procedi-mentos científicos, tal como medido pelos testes, e sua compreensão sobre como esse conhecimento pode ser aplicado no raciocínio científico, na argumentação e na pesquisa. (p.320)

Conhecer ciência implica o entrelaçamen-• to de aspectos de conhecimento e compre-ensão. (ibid.)

Padrões e expectativas de desempenho • devem ser definidos de modo que a testa-gem dê evidências da habilidade do alu-no em aplicar e compreender conceitos transversais na solução de problemas,

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mas também no contexto disciplinar espe-cífico. (p.320)

A avaliação deve ir além da testagem, mas • esta direciona a prática escolar e torna-se um elemento chave da mudança e melho-ria do processo educativo. Bem feita, pode significar o que se espera que os alunos saibam e sejam capazes de fazer e ajudar os ambientes de aprendizagem a favore-cer essa aprendizagem. Mal feita, faz si-nalizações errôneas e distorce o ensino e a aprendizagem. (p.323)

Professores devem dispor de tempo, apoio • e instrumentos de testagem para criar am-bientes de aprendizagem onde seus estu-dantes tenham oportunidades adequadas de aprender o que se espera deles. (ibid.)

Como já foi dito insistentemente, a cultura edu-cacional de hoje é a do ensino para testagem. O termo “teaching for testing” já está consa-grado internacionalmente. Parece impossível fugir da testagem, o que fazer então? Onde fica a educação em uma escola treinadora para a testagem? O desafio, o maior de todos, é usar a testagem para direcionar uma mudança radical do processo educativo, focando-o na aprendi-zagem significativa de conhecimentos declara-tivos e procedimentais, não no treinamento, na aprendizagem mecânica desses conhecimentos. Como fazer isso? Mudando, ou abandonando, a testagem!

O ensino de ciências no século XXI: como é

Centrado no docente, na aprendizagem • mecânica de conteúdos desatualizados.

Tradicional baseado em aulas expositivas • e exercícios repetitivos.

Basicamente do tipo ensino para testa-• gem, focado no treinamento para dar res-postas corretas.

Pouco ou nenhum apoio aos professores • empreendedores, inovadores.

Desconectado da pesquisa em ensino de • ciências.

Ao invés de buscar as interfaces e integra-• ções entre disciplinas, as compartimenta-liza ou supõe que não existem.

O ensino de ciências no século XXI: como de-veria ser

Centrado no aluno e no desenvolvimento • de competências científicas como mode-lagem, argumentação, comunicação, vali-dação,...

Fazendo uso intensivo de tecnologias de • informação e comunicação, por exemplo, em laboratórios digitais.

Levando em conta resultados neurocog-• nitivos.

Incentivando e apoiando professores em-• preendedores e o desenvolvimento pro-fissional docente.

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Apoiado na pesquisa educacional transla-• cional.

Encarando a testagem desde outra pers-• pectiva, não a da resposta correta.

Concluindo

Este texto corresponde a uma conferência pro-ferida em congressos internacionais para pro-fessores de ciências, a partir de uma matéria (Grand Challenges in Science Education) publi-cada na revista Science em 2013. Se a Science, uma das revistas científicas mais bem concei-tuadas do mundo, e se cientistas altamente re-conhecidos, como Carl Wieman, se ocupam do tema Grandes Desafios para o Ensino de Ciên-cias no Século XXI é porque a maneira como se ensina ciências nas escolas precisa ser repensa-da, modificada. Assim como Carl Wieman disse que o ensino de ciências nas universidades de pesquisa é pior do que ineficaz, é não científico, o mesmo pode-se dizer do ensino de ciências nas escolas onde predomina o ensino para a testagem. Nós, professores de ciências, temos que ser contra isso. Treinar não é educar! Este texto é uma mensagem, uma esperança, nesse sentido. 1 Conferência proferida no XII Simposio sobre Investi-gación en Enseñanza de la Física, Asociación de Pro-fesores de Física de Argentina, Tandil, Argentina, 20 a 24 de outubro de 2014; na VIII Reunión Latinoameri-cana sobre Enseñanza de la Física, Salvador, BA, Brasil, 3 a 7 de novembro de 2014 e no IV Simpósio Nacional de Ensino de Ciência e Tecnologia, Ponta Grossa, PR, Brasil, 27 a 29 de novembro de 2014.2 Grand Challenges in Science Education, Science, 19 de abril de 2013, Vol.340, pp. 290-3233 Wieman, C. (2013). Transformation is possible if a university really cares. Science, Vol.340, pp.292-296.4 Jong, T., Linn, M. and Zacharia, Z.C. (2013). Physical and virtual laboratories in science and engineering education. Science, Vol. 340, pp. 305-308.5 Butterworth, B. and Kovas, Y. (2013). Understanding developmental disorders can improve education for all. Science, Vol. 340, pp. 300-404.

6 Berry, B. (2013). Teacherpreneurs: A bold brand of teacher leadership for 21st – century teaching and learning. Science, vol. 340, pp. 309 – 310.7 Wilson, S. M. (2013). Professional development for science teachers. Science, vol. 340, pp. 310-313.8 Feinstein, N., Allen, S. and Jenkins, E. (2013). Out-side the pipeline: Reimagining science education for nonscientists. Science, Vol. 340, pp. 314-316;.9 Donovan, S. (2013). Generating improvement through research and development in education sys-tems. Science, Vol. 340, pp. 317-319.10 Pellegrino, James W. (2013). Proficiency in science: Assessment challenges and opportunities. Science, Vol. 340, pp. 320-323.

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INVESTIGAÇÃO

Piloto IBM - Teachers TryScience Educação em Ciência e projetos transdisciplinares no 1.º Ciclo

Maria João HortaCentro de Competência TIC Educom

Educação em Ciência

A Educação em Ciência pode ser entendida de acordo com diferentes perspetivas, nomeada-mente em termos das suas finalidades. Tendo em conta literatura de referência na área, muitos autores consideram a existência de propósitos humanistas, sociais e económicos no ensino das Ciências. Ciência e Sociedade constituem entre si uma rede complexa de interações, sendo que o apelo à compreensão da Ciência, não é feito apenas enquanto corpo de saberes, mas tam-bém enquanto instituição social. Várias ques-tões de natureza científica, com implicações sociais, solicitam aos cidadãos que estes sejam interventivos e chamados a ter um papel ativo nas decisões políticas. Daí que o conceito de Literacia Científica tenha vindo a ganhar impor-tância na segunda metade do século XX: se o in-teresse na literacia científica surgiu nos Estados Unidos, nos anos 50 do século XX, quando a co-munidade científica reconheceu a importância do apoio da população para sustentar uma efe-tiva resposta científica e tecnológica deste país, perante o lançamento do Sputnik soviético, foi nos anos 80 que se reconheceu amplamente a importância da ciência e tecnologia como base fundamental para o progresso económico nas sociedades ocidentais (Bloch, 1986).

A Educação em Ciência contribui para um de-senvolvimento da literacia científica dos cida-dãos e é assim fundamental para o exercício pleno de cidadania. Para o desenvolvimento da

literacia científica, entendida aqui como o ex-presso pela OCDE, 2003, p. 15: “A Literacia cien-tífica é a capacidade de usar o conhecimento científico, de identificar questões e de desenhar conclusões baseadas na evidência, com o pro-pósito de compreender o mundo real e ajudar à tomada de decisões sobre as alterações nele causadas pela atividade humana.”, contribui o corpo de competências que se desenvolvem e revelam em diferentes domínios, tais como o conhecimento, o raciocínio, a comunicação e as atitudes.

O desenvolvimento de competências nestes diferentes domínios exige o envolvimento do aluno no processo de ensino e aprendizagem, o que lhe é proporcionado pela vivência de expe-riências educativas diferenciadas. Estas devem ir de encontro, por um lado, aos seus interesses pessoais e, por outro, deverão estar em confor-midade com o que se passa à sua volta, numa perspetiva de abordagem da Ciência por via da Sociedade, da Tecnologia e do Ambiente (San-tos, 2007).

Criar ambientes ricos do ponto de vista do en-sino e da aprendizagem no que respeita à Edu-cação em Ciência, implica proporcionar aos alu-nos situações reflexivas e investigativas, como nos indicam Galvão et al. (2006): “no ensino das ciências pretende-se desenvolver ambientes de aprendizagem onde a observação, a experimen-tação, a previsão, a dúvida, o erro, estimulem os alunos no seu pensamento crítico e criativo” (p.16).

É consensual a necessidade de promover nos alunos o interesse pela ciência e pela compre-ensão do mundo que os rodeia. Desde o ano 2000, ano em que foi realizado pela primeira

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vez um estudo PISA, uma amostra representa-tiva dos alunos de 15 anos a frequentar o 7.º ano de escolaridade ou mais realiza um teste escrito nos três domínios avaliados: leitura, matemática e ciências. Portugal tem vindo a melhorar os seus resultados ao nível das lite-racias científicas (OCDEa, 2010, OCDEb, 2010). Mas os resultados ainda não são satisfatórios e como tal é fundamental que se proceda à utili-zação de práticas pedagógicas capazes de dotar os alunos de um maior conhecimento e com-preensão científica e assim desenvolver a sua literacia científica para níveis mais elevados. A promoção de atitudes críticas fundamentadas, a criação de ambientes onde o confronto de opiniões e a discussão aconteçam, a realiza-ção de atividades experimentais, a observação rigorosa, a ligação ao ambiente, à tecnologia e à sociedade, promovendo o estabelecimento de relações entre estas áreas, numa perspetiva transdisciplinar deve acontecer no dia-a-dia do estudante. Como refere Galvão et al. (2006) “a articulação entre disciplinas é fundamental por-que as explicações que procuramos para enten-der as nossas interrogações sobre o mundo não se confinam, de um modo geral, a uma resposta simples” (p.17).

Ao nível do 1.º ciclo, a diversidade de temas existentes no currículo de estudo do meio, re-lacionados com as ciências naturais, permite desenvolver e relacionar as várias áreas discipli-nares, cruzando saberes com origem em dife-rentes áreas (Filipe, 2012). O Projeto “Teachers TryScience” é, nesta perspetiva, emblemático. É uma iniciativa da IBM que pretende facultar aos professores, estratégias e recursos que promo-vam o ensino das ciências em sala de aula em si-tuações reais de resolução de problemas. Existe uma comunidade online1 à qual os professores têm acesso e onde encontram desde planos de aula a recursos educativos diversos dentro da temática enunciada. Neste espaço online é pos-

sível criar sub-comunidades que estejam a de-senvolver em conjunto um projeto específico.

O Projeto-Piloto “Teachers TryScience” em Por-tugal foi no ano de 2014/2015 uma iniciativa promovida pela IBM Portugal e pela Direção-Geral da Educação (DGE), através da Equipa de Recursos e Tecnologia Educativas (ERTE). Este piloto que decorreu, como referido, no ano le-tivo de 2014/2015, pretendeu desafiar profes-sores a envolverem-se em projetos na área das ciências naturais e a apresentarem trabalhos originais, desenvolvidos pelos alunos, no âmbi-to da criação, em sala de aula do 1.º ciclo, de hortas verticais. O objetivo era o de promover a literacia científica de professores e de alu-nos e levar estes agentes a desenvolverem um conjunto de atividades, estratégias de ensino e recursos, desenhados especialmente para des-

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pertar o interesse dos alunos pela ciência e pela tecnologia. Associado a este projeto-piloto foi desde logo pensado um concurso que permitiu aos professores dos dois melhores projetos par-ticiparem, por convite, num seminário europeu de formação de professores. Os professores teriam que submeter um trabalho em formato digital que relatasse o desenvolvimento do pro-jeto e os resultados alcançados. Os critérios de seleção dos melhores projetos foram:

(a) criatividade; (b) clareza da abordagem; (c) correção científica e linguística; (d) multidisci-plinaridade e (e) diversidade dos recursos utili-zados na concretização do trabalho.

Em Portugal as 11 escolas desafiadas a partici-par, localizam-se na zona de Lisboa e esta es-colha foi feita pela ERTE/DGE, tendo em conta a proximidade à sede da IBM Portugal, permi-tindo assim um melhor apoio presencial previs-to neste projeto-piloto. A IBM Portugal criou a Comunidade TTS Portugal, espaço online onde se pretendeu promover a discussão em torno dos projetos a serem desenvolvidos nas várias escolas participantes e onde estavam dispo-níveis vários recursos digitais de apoio ao de-senvolvimento do projeto. O projeto-piloto foi, deste modo, desenhado com a previsão de um acompanhamento às escolas participantes que pressupunha uma componente presencial e ou-tra a distância.

O Centro de Competência TIC Educom acompa-nhou desde janeiro de 2015, a pedido da ERTE/DGE, o desenvolvimento do projeto e desenhou instrumentos e procedimentos de monitoriza-ção com o objetivo de avaliar a implementação e o desenvolvimento do projeto. A metodolo-gia de trabalho desenhou-se e desenvolveu-se numa perspetiva de proximidade ao terreno e a Equipa do Centro de Competência esteve presente em várias iniciativas formativas e de visita às escolas e de interação com professoras

e alunos envolvidos, para além da construção e aplicação de instrumentos próprios para reco-lha de dados.

Atividades no âmbito do projeto-piloto “Tea-chers TryScience”

Inicialmente foi feita uma apresentação do pro-jeto aos professores, com concomitante sessão de formação e entrega dos kits de recursos às escolas, que aconteceu em dezembro de 2014. Os kits continham materiais diversificados que permitiriam aos alunos e professores construir uma horta vertical. Não havia indicações objeti-vas de como construir essa horta, apenas a indi-cação de que o sistema de rega deveria ser tão ecológico quanto possível, evitando ao máximo desperdícios. Os alunos, em grupo, deveriam discutir e desenhar protótipos de construção da horta seguindo o princípio básico acabado de enunciar. Depois de uma primeira fase de tra-balho dos professores, na sala de aula, com os

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seus alunos, fez-se a continuação da formação, dividida em várias sessões, que permitisse aos professores envolvidos ganhar autonomia na implementação do projeto com os seus alunos, em sala de aula e que promovesse a partilha e a discussão entre os intervenientes do projeto das diferentes escolas.

Resumidamente, as principais atividades de acompanhamento do projeto, para além da ses-são de dezembro, foram as seguintes:

Janeiro

- Discussão em sala de aula e com as famílias do projeto; desenho e discussão de protó-tipos, seleção do protótipo mais viável, em cada turma; construção da horta vertical e plantação das espécies vegetais distribuídas a partir dos kits recebidos;

- Inscrição na Comunidade TTS Portugal e par-tilha de experiências

(http://teacherstryscience.org/group/comuni-dade-tts-portugal)

Fevereiro

Balanço do trabalho desenvolvido e identifica-ção de necessidades de apoio (sessão presen-cial na IBM, com a presença de professoras e equipas IBM, ERTE/DGE e Centro de Competên-cia TIC Educom)

Abril

Ponto da situação/balanço do trabalho desen-volvido e sessão de formação para dar resposta às necessidades de apoio identificadas ante-riormente (sessão presencial numa das escolas

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participantes, com a presença de professoras e equipas IBM, ERTE/DGE e Centro de Competên-cia TIC Educom)

Visita às escolas para apreciação e acompa-nhamento do trabalho desenvolvido, observa-ção das hortas, registo fotográfico e recolha de dados junto de professores e alunos sobre os processos de desenvolvimento dos projetos nas várias escolas.

Submissão dos trabalhos a concurso

Maio

Anúncio dos vencedores

Junho

Sessão de Formação em Hasselt, Bélgica para os dois professores que ganharam o concurso.

Resultados do processo de acompanhamento e avaliação

O trabalho de acompanhamento deste projeto teve, desde o início, uma componente de ob-servação e de recolha de dados com o objetivo de compreender o potencial deste projeto. No questionário inicial de caracterização dos pro-fessores envolvidos obtiveram-se dados relati-vos a 11 professores (dos 13 inicialmente envol-vidos no projeto) que revelam o seguinte:

A média da faixa etária destes professores é de 44 anos e têm, também em média, 20 anos de serviço docente. São 11 professoras, 8 de-las licenciadas, uma tem uma pós-graduação e duas concluíram mestrado. As escolas onde lecionam têm em média 14 professores e 300 alunos que se organizam em turmas com cerca de 21 alunos. A maior parte das 11 professoras envolvidas no projeto “Teachers TryScience” não tinha experiência de participação em pro-jetos idênticos.

Estas professoras trabalharam maioritariamen-te com alunos de turmas do 3.º e do 4.º ano de escolaridade e, ao envolverem-se neste pro-jeto, tinham como objetivos: (i) desenvolverem competências na utilização das TIC, (ii) partici-parem num projeto que fosse motivador para os seus alunos, (iii) ganharem competências nas áreas do desenvolvimento da inovação e da criatividade, (iv) desenvolverem projetos que aproximassem os seus alunos da natureza, (v) terem oportunidades de desenvolvimento pes-soal e profissional e (vi) promoverem o sucesso dos alunos. Estas professoras anteviam vários fatores de sucesso associados a este projeto: (i) um projeto inovador e criativo que iria motivar os seus alunos, (ii) um projeto que traria para

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a sala de aula novos recursos e (iii) um projeto que iria promover a abordagem transversal de conteúdos. Relativamente a constrangimentos, as professoras antecipam: (i) falta de tempo, (ii) dificuldades técnicas, (iii) pouca utilidade do projeto para os alunos, (iv) dificuldade de implementação devido a turmas numerosas e (v) possível desinteresse dos Encarregados de Educação.

A observação e a interação com as professoras e também com alguns alunos aconteceu em vá-rios momentos ao longo do desenvolvimento do projeto. Para além dos registos de observa-ção nestas sessões presenciais, existia o espaço online da Comunidade “Teachers TryScience”. Os registos feitos e a sua análise mostram que há da parte das professoras participantes entu-siasmo relativamente à participação, mas são notórios alguns receios já evidenciados nas respostas que haviam dado às questões do in-quérito inicial: sentem que participar no proje-to lhes poderá trazer novas oportunidades de aprendizagem para a sala de aula e atividades motivadoras para os seus alunos mas receiam não ter tempo para se envolverem devidamente no projeto e receiam não ter formação suficien-te para desenvolverem as atividades previstas. Numa fase mais avançada do projeto há noto-riamente dois grupos distintos: as professoras que com os seus alunos avançaram a bom ritmo no desenvolvimento do projeto, tendo os seus alunos, bem como encarregados de educação,

um papel determinante nos resultados obtidos. Desde soluções mais elaboradas até soluções mais simples de implementação na sala de aula de uma horta vertical, é notório por parte dos alunos o papel ativo que tiveram e tal revela-se na forma clara com que apresentam a horta a quem os visita. Forma-se um outro grupo, mais reduzido, de professoras que não avança no de-senvolvimento do projeto, por receio, por fal-ta de tempo ou por não anteverem no projeto oportunidades de aprendizagens para os seus alunos. No entanto, algumas das poucas pro-fessoras que integram este segundo grupo, ad-mitem, que num próximo ano letivo, desde que tenham oportunidade de se preparar melhor, virem a integrar o projeto de forma ativa.

Os registos e as interações que aconteceram na Comunidade são escassos e demonstram clara-mente que nenhuma professora se apropriou deste espaço. As causas são difíceis de identi-ficar pois são poucas as professoras que fazem referência ou respondem claramente quando esta questão foi colocada. Aparentemente ne-nhuma das professoras envolvidas antecipou a importância da colaboração entre projetos de diferentes escolas.

A análise documental aos produtos apresenta-dos no âmbito do concurso e a sessão prévia que aconteceu a 14 de abril e que tinha por fi-nalidade dotar as professoras de competências tecnológicas que lhes dessem autonomia para

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prepararem o objeto a concurso, demonstram que a maior parte sente lacunas nesta área de formação. Ainda assim, várias levam a concurso produtos digitais de qualidade que são demons-trativos dos momentos ricos de aprendizagem vividos em sala de aula.

No questionário final apresentado às profes-soras participantes que teve como objetivo compreender a forma como as professoras se envolveram no projeto, as dificuldades que sen-tiram e os pontos fortes que encontraram no desenvolvimento do mesmo, conseguiram-se respostas de 7 participantes.

Assim, partindo das expetativas iniciais destas professoras, as mesmas foram inquiridas sobre o seu grau de satisfação, concluído o projeto, relativamente diferentes tópicos, utilizando a escala:

1- Nada satisfeita, 2- Pouco satisfeita, 3- Satisfei-ta, 4- Muito satisfeita, 5- Muitíssimo satisfeita.

Apresentam-se, de seguida, os principais resul-tados.

Quanto à clareza do Projeto, só uma professora manifesta achar que o mesmo foi pouco claro, sendo que a grande maioria afirma ser este um projeto muito ou muitíssimo interessante.

Os recursos disponibilizados foram considera-dos muito satisfatórios e, quer os apoios dis-ponibilizados pela IBM, quer pela ERTE/DGE

foram considerados maioritariamente muito ou muitíssimo satisfatórios. O apoio disponibiliza-do pelos pais e encarregados de educação foi considerado satisfatório ou muito satisfatório, o mesmo se verificando para os apoios que cada professora recebeu ao nível da escola onde de-senvolveu o projeto.

Ao nível da formação prestada nota-se desejo, por parte destas professoras, de um aprofunda-mento desta componente do projeto já que há notas de insatisfação demonstrada, ainda que a maioria afirme satisfação.

A qualidade das situações de aprendizagem proporcionadas aos alunos envolvidos, no âm-bito do desenvolvimento do projeto, são con-sideradas satisfatórias ou muito satisfatórias sendo os valores mais elevados de satisfação destas professoras revelado ao nível da motiva-ção dos alunos: a grande maioria das professo-ras coloca na motivação dos alunos a mais-valia deste projeto.

Já os resultados de aprendizagem dos alunos em função das atividades em que se envolveram, no âmbito do projeto, não acompanha a valo-rização dada à motivação, ainda que a maioria das respostas seja francamente positiva.

Relativamente à adequação dos conteúdos ao ano de escolaridade dos alunos participantes, parece haver maior consenso sobre a adequa-ção deste projeto aos alunos que frequentam o

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3.º ano de escolaridade.

A maioria das professoras encontra potencial no projeto do ponto de vista da sua integração curricular e valorizara muito positivamente a oportunidade de promoção do seu desenvolvi-mento profissional por terem estado ligadas ao projeto.

Todas as professoras respondentes ao inquéri-to final afirmam ter-se inscrito na Comunidade online de suporte disponibilizada pela IBM em http://teacherstryscience.org/group/comu-nidade-tts-portugal no entanto, a observação e análise desse espaço demonstra um franco despovoamento do mesmo sendo as poucas interações visíveis de cariz experimental e sem continuidade.

Relativamente aos principais objetivos do Pro-jeto, das 7 respondentes, 3 consideram que os atingiram completamente, 3 maioritaria-mente e 1 apenas minimamente. Quase todas (exceção de uma) as professoras consideram fundamental o papel que as Tecnologias de In-formação e Comunicação (TIC) podem ter no desenvolvimento deste tipo de projetos, nome-adamente ao nível da pesquisa de informação e posteriormente para organização e divulgação da informação e do conhecimento que vai sen-do produzido. Nenhuma professora menciona o potencial facilitador de comunicação e de deba-te que as TIC proporcionam.

Para 4 professoras a existência de um concurso e de um prémio associado foi motivador para o seu envolvimento no projeto mas 3 não leva-ram em conta a existência de um prémio como motivação para a participação.

Relativamente à possibilidade de no próximo Ano Letivo tornarem a envolver-se num Projeto idêntico, as professoras são unanimes em afir-marem que sim, no entanto algumas apontam limitações que gostariam de ver ultrapassadas,

nomeadamente, receberem o projeto no iní-cio do ano letivo e existir formação associada mais aprofundada, nomeadamente na área do papel das tecnologias de informação e comuni-cação. Algumas consideram ser necessária uma melhor clarificação dos objetivos do projeto e existir um maior apoio à implementação do mesmo.

As duas professoras que participaram na forma-ção final na Bélgica, fruto do prémio recebido no âmbito do concurso associado a este projeto, nos seus relatórios finais solicitados pela ERTE/DGE, sublinham a importância da colaboração e partilha efetuada no seminário onde estiveram. Realçam as aprendizagens feitas ao nível do contacto com novas ferramentas TIC mas desta-cam as possibilidades de virem a utilizar novas metodologias de trabalho em sala de aula que passarão pela adesão a projetos eTwinning, en-tre outros, que permitirão aos seus alunos no-vas experiências de aprendizagem em contexto real.

Notas finais

A Educação em Ciência desempenha um papel extremamente importante na formação dos alunos, assumindo as atividades práticas e ex-perimentais um papel formativo fundamental para o desenvolvimento de competências cien-tíficas e tecnológicas (Afonso, 2008). Os alunos, em sala de aula, devem ter oportunidades re-ais que lhes permitam investigar, questionar e utilizar os meios tecnológicos disponíveis, para que construam conhecimentos e soluções para os problemas que lhes são apresentados e, so-bretudo, para que adquiram a capacidade de resposta às novas situações problemáticas que surjam na sua vida diária e enquanto cidadãos que se querem interventivos e preocupados com o Meio Ambiente (Sousa, 2012).

O desenvolvimento de competências dos pro-fessores no que respeita à implementação do

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ensino das Ciências de base experimental no 1ºCiclo do Ensino Básico, bem como a pro-moção de condições nas escolas para que tal possa acontecer, são fatores imprescindíveis à melhoria da formação científica dos alunos e, consequentemente, indutores de uma maior apetência dos jovens para a escolha de carrei-ras relacionadas com a Ciência e a Tecnologia (Pisa, 2006). A ideia recorrente de que é preci-sa mais e melhor Educação em Ciência desde os primeiros anos e de que a Escola tem uma acentuada responsabilidade na concretização dessa meta, reforça a necessidade de se intervir na formação de professores nesta área (Martins et al, 2007).

Para Cachapuz (2009), um possível ponto de partida para motivar os alunos é fazer a relação do que se ensina (conteúdos) com o para que se ensina (finalidades) e para quem se ensina (destinatários).

O projeto “Teachers TryScience” revela-se in-corporador de todos estes princípios apresenta-dos na bibliografia de referência para a questão da Educação em Ciência. Através de um kit de recursos muito simples que visam a construção de uma horta vertical na sala de aula, são cria-das oportunidades que começam por ser moti-vadoras para os alunos e que, em simultâneo, permitem ao professor criar situações ricas do ponto de vista das aprendizagens. Foi isto que nos foi revelado pela maior parte das professo-ras envolvidas neste projeto. No entanto, algu-mas destas professoras não se sentem seguras nem têm práticas pedagógicas que façam recur-so ao desenvolvimento de projetos. Sublinha-se assim a importância da criação de ambientes de formação que promovam a mudança de práti-cas pedagógicas com o objetivo de promover metodologias de desenvolvimento de projetos e de resolução de problemas na sala de aula do 1.º Ciclo do ensino Básico.1http://www.tryscience.org/

Referências Afonso, M. (2008). A educação científica no 1º CEB.

Das teorias às práticas. Porto: Porto Editora.Andrade, C. (2011). Aprendizagem Cooperativa:

Estudo com alunos do 3.º CEB. Dissertação de mestrado em ensino das ciências, Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Bragança.

Bloch, E. (1986). Basic research and economic health — the coming challenge. Science, 232 (4750), 595–599.

Cachapuz, A. (2009). Questões e razões: Melhorar o ensino das ciências. Noesis, Julho/Setembro, 26-29.

Filipe, R. (2012). A Promoção do Ensino das Ciências Através da Literatura Infantil, Tese de Mestrado, Instituto de Educação, Universidade de Lisboa.

Gabinete de Avaliação Educacional (2007). Competências Científicas dos alunos portugueses. PISA 2006 – Programmme for International Student Assessment. Lisboa: ME.

Galvão, C., Reis, P., Freire, A.M, & Oliveira, M.T. (2006). Avaliação de competências em Ciências. Sugestões para professores do ensino básico e do ensino secundário. Lisboa: ASA.

Martins, I. P., Veiga, L., Teixeira, F., Tenreiro-Vieira, C., Vieira, R., Rodrigues, A.V. & Couceiro, F. (2006). Educação em Ciências e Ensino Experimental no 1.º Ciclo EB. Lisboa: Ministério da Educação.

OCDE (2003). The PISA 2003 Assessment Framework – Mathematics, Reading, Science and problem solving knowledge and skills. OCDE. http://www.oecd.org/edu/school/programmeforinternationalstudentassessmentpisa/33694881.pdf (em setembro de 2015)

OCDE (2006), Assessing Scientific, Reading and Mathematical Literacy: A Framework for PISA 2006, Paris: OECD Publications.

OCDE (2010a), PISA 2009 Results: What Students Know and Can Do: Student Performance in Reading, Mathematics and Science, volume I, Paris: OECD Publications.

OCDE (2010b), PISA 2009, Assessment Framework: Key Competencies in Reading, Mathematics and Science, Paris: OCDE Publications.

Santos, F.D. (2007). Que Futuro? Ciência, Tecnologia, Desenvolvimento e Ambiente, Gradiva.

Sousa, M. G. (2012) Ensino Experimental das Ciências e Literacia Científica dos alunos - Um estudo no 1º Ciclo do Ensino Básico, Tese de mestrado, Escola Superior de Educação de Bragança..

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INVESTIGAÇÃO

Digicl@sse Os tablet como recurso motivador de mais e melhores aprendizagens

António José GonçalvesEDUGEP, LDA

[email protected]

Óscar Leal dos SantosAgrup. de Escolas Barbosa du Bocage - Setúbal

[email protected]

Introdução

As escolas têm hoje alunos com características bastante diferentes (nativos digitais) das gera-ções anteriores (residentes digitais). Surgem en-tão novos contextos educativos que privilegiam a colaboração, interação e partilha, permitindo uma aprendizagem mais individualizada e mais autónoma por parte dos alunos. Cabe à escola tirar partido da tecnologia e procurar formas inovadoras de envolver os alunos e garantir que potenciem as suas aprendi-zagens.

É neste con-texto que surge o DI-GICLASSE®, projeto ino-vador na sua d i m e n s ã o e d u c a t i v a , mas também na sua géne-se, resultan-do da ambi-

ção das direções dos agrupamentos envolvidos e da vontade da EDUGEP, que liderou um grupo do qual faziam parte as escolas, as empresas, um CFAE e uma instituição de ensino superior.

Objetivos

O projeto DigiCl@sse, que foi desenvolvido du-rante o ano letivo de 2014/2015, contou com a participação de duas escolas de primeiro ciclo do conselho de Setúbal, englobando 8 turmas, num total de 205 alunos e 21 professores, con-sistiu na aplicação de um conjunto de recursos tecnológicos e digitais com o objetivo de pro-mover ambientes de aprendizagem de inteli-gências múltiplas; potenciar a apropriação das diferentes matérias por parte dos alunos; utili-zar os tablet como ferramenta educativa e ele-mento inovador e motivador; fazer dos alunos atores de experiências educativas e pró-ativos na busca de conhecimento; implementar novas soluções pedagógicas de promoção do sucesso educativo.

Metodologia

No final do primeiro ano do projeto, fez-se um estudo baseado numa abordagem metodológi-

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ca que genericamente se pode denominar como investigação mista, onde foram recolhidos, ana-lisados e combinados dados de natureza quali-tativa e quantitativa, com predominância para os dados quantitativos.

Os instrumentos usados para recolha de da-dos foram de duas topologias: questionários aos alunos (constituído por 9 itens positivos e 8 itens negativos), aos professores (construído com base no referencial da UNESCO ainda que elegendo os indicadores mais relevantes e com as necessárias aplicações a língua e realidade portuguesa), e aos encarregados de educação; entrevista aos diretores dos Agrupamentos de Escola envolvidos. Foi ainda feita uma análise de conteúdo a questões abertas formuladas nos questionários aplicados a alunos, pais e professores.

Apresentação de resultados

Alunos

Constitui a base para os resultados que aqui se apresentam, os dados recolhidos dos ques-tionários aos alunos, onde foram avaliadas as seguintes dimensões: 1) satisfação com a par-ticipação no projeto, 2) avaliação da qualida-de do equipamento e suas funcionalidades, 3)

compreensão do papel pedagógico das tecnolo-gias, 4) impacto na atenção e motivação para as aprendizagens e 5) impacto no comportamento e desempenho escolar.

Os resultados das 180 respostas obtidas, re-presentando 88% do total, demonstram que, num grau de concordância de 1 a 5 numa es-cala de Likert, todas as dimensões foram ava-liadas acima de 4, com destaque para as ques-tões 2) Compreendi que as tecnologias podem ser úteis para ajudar-me a aprender na escola (média=4,64), 6) Achei muito bom poder fazer exercícios no tablet. (média=4,83) e 9) Para os próximos anos, gostaria de continuar a apren-der com tablet (média=4,88).

Professores

Constitui a base para os resultados que aqui se apresentam, os dados recolhidos dos questio-nários aos professores, onde foram avaliadas as seguintes dimensões: 1) visão TIC, 2) currículo e avaliação, 3) pedagogia, 4) competências em TIC, 5) organização e administração e 6) desen-volvimento profissional.

Os resultados das 14 respostas obtidas, repre-sentando 67% do total, demonstram que, num grau de concordância de 1 a 5 numa escala de Likert, todas as dimensões foram avaliadas acima de 4, com destaque para as questões 20) As atividades desenvolvidas no âmbito do projeto Digiclasse foram uma oportunidade de atualização e desenvolvimento profissional (média=4,22); 21) organizar o meu próprio ra-ciocínio, solucionar problemas e aumentar os meus próprios conhecimento enquanto traba-lhava com os alunos (média=4,22); 11) dispor e organizar as tecnologias na sala de aula, de modo a reforçar as atividades de aprendizagem e a interação (média=4,11); 6) usar tecnologias no apoio à aquisição dos conteúdos curriculares e desenvolvimento de competências de apren-dizagem (média=4,33).

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Encarregados de Educação

Constitui a base para os resultados que aqui se apresentam, os dados recolhidos dos ques-tionários aos encarregados de educação, onde foram avaliadas as seguintes dimensões: 1) Ex-pectativas em relação ao projeto; 2) Os resulta-dos do projeto; 3) Impacto no futuro escolar do educando/a; 4) Continuidade do projeto.

Os resultados das 101 respostas obtidas, repre-sentando 40,4% do total, demonstram que, 54% dos encarregados de educação consideraram o projeto muito positivo, 42% consideraram o projeto positivo e 4% manifestaram-se neutros. De salientar que o total de respostas negativas foi zero.

Da análise de conteúdo efetuada às respostas abertas dos questionários aplicados aos encar-regados de educação, os mesmos referiram os seguintes aspetos:

Diretores

Constitui a base para os resultados que aqui se apresentam, os dados recolhidos da análise de

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conteúdo efetuada aos diretores dos dois Agru-pamentos de Escola. Dessa análise sobressaí-ram os seguintes aspetos:

“Uma nova ferramenta para adquirir apren-dizagens para os alunos e uma nova forma de trabalhar conhecimentos para os profes-sores.”

“Foi, sem dúvida, uma mais valia à formação profissional de cada uma das docentes impli-cadas (…) poderão partilhar a sua experiência com outras colegas do agrupamento.”

“Gostaria que fosse extensível a mais alunos e que fosse um facilitador de aprendizagens.”

Conclusões

No final deste primeiro ano de projeto, e após a análise aos resultados obtidos, pode-se chegar às seguintes conclusões:

Os níveis de satisfação verificados pelos alunos foram bastante elevados (m=4,43) aferindo-se, igualmente, que as aulas com recurso aos ta-blet tiveram influência nas suas aprendizagens (média=4,35);

Independentemente do ano de escolaridade em que o projeto foi implementado não se re-gistaram diferenças estatisticamente significati-vas - as melhorias registaram-se em igual nível;

O projeto foi uma oportunidade de desenvolvi-mento profissional e aquisição de novas compe-tências por parte dos docentes (média=4,22);

Verificou-se uma correlação positiva entre a motivação do professor e do aluno, confirman-do a importância do aspeto pedagógico da for-mação procurando manter o professor confian-te e preparado;

Os encarregados de educação confirmaram as expetativas sobre o projeto (média=4,46) mani-festando o interesse do mesmo continuar nos

anos subsequentes (média=4,52);

As direções consideraram que o projeto se reve-lou uma mais-valia para o Agrupamento, quer ao nível de equipamento, quer ao nível didático baseado numa nova forma de trabalhar conteú-dos em sala de aula.

Projeções futuras

O projeto Digicl@sse entrou no seu segundo ano, tendo sido alargado a mais 3 escolas em 3 diferentes Agrupamentos, dando continuidade ao modelo de implementação utilizado no ano anterior.

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ESCOLA

Plantar Ciência na Infância História, Línguagem e Cidadania

Maria Elvira CallapezCIUHCT-FCUL

Jocélia AlbinoEscola Secundária de Cacilhas-Tejo

Introdução

O presente artigo é parte integrante de um tra-balho desenvolvido por educadores e professo-res do Pré-Escolar e 1º Ciclo, em diferentes con-textos socioeconómicos, no âmbito da oficina de formação, sobre ciência, língua, tecnologia e cidadania - partilha de projetos multidiscipli-nares promovida pelo Centro de Formação de escolas do concelho de Almada - AlmadaForma. A referida ação realizou-se nas escolas Secun-dária Monte de Caparica, Emídio Navarro, An-selmo de Andrade e Cacilhas-Tejo, de abril a junho de 2015 e integra o projeto Prémio Pe-quenos Cientistas de Almada desenvolvido em parceria com a Câmara Municipal de Almada e a Faculdade de Ciências e Tecnologias do Mon-te de Caparica.

O plano de trabalhos consistiu de duas fases, tendo sido feito, na 1ª fase, uma abordagem dos conceitos sobre ciência, história da ciência, literacia científica e cidadania. Num 2º momen-to, foi levado a cabo um estudo exploratório com o envolvimento ativo dos alunos, com foco em múltiplos tópicos tais como, processos de argumentação, o contributo histórico da mu-lher no desenvolvimento da ciência bem como o trabalho em laboratório, enquanto local onde se pode fazer ciência com dinamismo, tendo presente que a ciência é dinâmica e não um conjunto de conhecimentos estáticos.

COMPREENDER A CIÊNCIA

Nos dias que correm, coloca-se a questão de saber se a educação em ciências fornece aos alunos, enquanto cidadãos, a literacia necessá-ria de que precisam. Num mundo de grandes transformações em que os cidadãos têm que enfrentar rápidas mudanças científicas e tec-nológicas, estarão os curricula sobre educação científica e tecnológica, nas escolas, proporcio-nando o conhecimento exigido para satisfazer tal desafio? Ora, uma resposta para o curricu-lum e para o professor é saber encontrar o ca-minho em que a ciência pode contribuir para educar o cidadão.

Observa-se um interesse cada vez maior pela Ciência e Tecnologia. No entanto, estas áreas não têm sido bem “plantadas” nas salas de aula do ensino básico, sendo por vezes negligencia-das. A “plantação”, o estímulo e a educação de ideias e práticas fundamentais da ciência deve começar quando os alunos são muito jovens, crianças e continuar ao longo da sua carreira académica. Se começarmos tarde, são perdidos anos de oportunidades de aprendizagem.

Figura 1 - Observação de dáfnias ao microscópio

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As crianças são exploradoras, aventureiras, de-vendo o professor capitalizar essas curiosidades e interesses. Nós, enquanto educadores, cabe-nos reavaliar a forma como ensinamos ciências. Para sentirmos que cumprimos com as nossas responsabilidade para com os nossos alunos, devemos prepará-los convenientemente para as realidades e desafios.

No coração da ciência residem palavras como “eu penso”, “eu questiono”, “eu compreendo”. A ciência significa entender o mundo. Envolve tentar compreender o porquê, o quê, o quando, o como dos acontecimentos, dos objetos, dos fenómenos à nossa volta, ou seja, os três Cs e o grande D – curiosidade, criatividade, pensa-mento crítico e descoberta.

CRIAR UMA CULTURA DE AULA CIENTÍFICA

Uma cultura de aula onde se dá prioridade às práticas científicas requer um afastamento da forma de pensar ciência como um corpo de memorização de factos. Tal leva os alunos a compreender melhor a natureza da ciència, valorizando e atribuindo um sentido ao mundo natural.

De uma maneira geral, as crianças são curiosas sobre o mundo que as rodeia e gostam de par-tilhar as suas descobertas. Porém, quando vão para a escola, verifica-se que algumas começam a perder o interesse pela ciência dado o sistema de educação formal privilegiar mais o ensino da memorização de factos do que ensinar o mé-todo de pensamento crítico. As consequências desta forma de aprendizagem tendem a “ma-tar” os “selos” da ciência, como sejam a moti-vação, a criatividade, a curiosidade.

Assim, a educação científica na infância precisa de atenção sistemática, sendo necessário ar-ticular a ciência com outros temas em sala de aula, como a tecnologia , a sociedade, a cidada-nia. Se a ciência começar a ser ensinada quando

as crianças entram na escola e continuar a fazer parte do seu percurso escolar, os alunos terão a oportunidade de ser fortes estudantes de ciên-cia, bons cidadãos e profissionais.

Infelizmente, algumas escolas do ensino básico ainda insistem em “ler” sobre ciência, em vez de fornecer experiências intelectuais e sociais sobre a ciência, o que reforçaria o seu papel fundamental no enriquecimento do conheci-mento quer dos alunos, quer do professor que ensina.

A mudança para uma cultura de aula científica requer, assim, por parte dos educadores um in-vestimento no desenvolvimento de ferramentas de avaliação para identificar os pontos fortes e as necessidades dos alunos para as práticas es-pecíficas de ciência e o seu aperfeiçoamento.

COMPREENDER A CIÊNCIA ATRAVÉS DA HISTÓ-RIA

A ciência é o processo de construir e aplicar co-nhecimentos sobre o mundo. Este “projeto de construção” atravessa muitas gerações e mui-tos lugares. Desta forma, as “vozes” da ciência do passado podem falar aos nossos alunos de

Figura 2 - Registo da Observação das dáfnias ao microscópio

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hoje sobre a natureza da ciência. Na literatura sobre educação da ciência, tem-se defendido e reconhece-se a importância e necessidade da inclusão da história e filosofia da ciência nos cursos de ciência dos ensinos básico e secun-dário. Porém, nos curricula não há lugar para essas matérias e os professores têm de ensinar conteúdos e programas para os exames, não ha-vendo tempo para mais. Os alunos memorizam uma série de factos que, do seu ponto de vista, têm pouca ligação com o passado, presente e futuro. Pensam na ciência mais como uma enci-clopédia e um corpo fixo de acontecimentos do que um processo contínuo, dinâmico levado a cabo por pessoas que procuram respostas.

Os professores, através da história, podem en-contrar uma profícua forma de ensinar a natu-reza da ciência. Os episódios e narrativas histó-ricas são ferramentas valiosas que aperfeiçoam os conceitos abordados nas aulas, tornando a aprendizagem interessante, estimulante e signi-ficativa, tanto para os alunos como para os pro-

fessores. No fundo, o maior objetivo é envolver os alunos na história a que chamamos ciência. Qualquer pessoa gosta de uma boa história e isso é visível quando nos entusiasmamos com bons livros, filmes e jogos. Por isso, o “contar histórias” poderia ser utilizada, pelos professo-res, como uma poderosa ferramenta para en-volver os alunos e não uma perda de tempo.

Com efeiro, os episódios históricos sobre ciência ajudam os alunos a fazer ligações entre o passa-do e o presente, mostrando como foram desen-volvidos os conceitos, incentivando o interesse pela ciência. Por outro lado, permitem analisar importantes atributos da ciência, realçando o processo da ciência e não apenas o produto do esforço humano, do cientista, servindo também de encorajamento para a leitura sobre ciência e sobre os cientistas.

Em suma, ensinar história da ciência contribui para ilustrar a importância do pensamento e criatividade individual no desenvolvimento da ciência, permite entender a natureza da ciência, promove uma melhor compreensão dos concei-tos e métodos científicos. Há que contrariar o ponto de vista de que a história da ciência não é um assunto legitimado para a educação em ciência, que não contribui para a aprendizagem dos aspetos técnicos da ciência e que não cabe nas cargas horárias escolares. Pelo contrário, é de grande valor!

TRABALHOS REALIZADOS POR ALUNOS DO PRÉ-ESCOLAR E 1º CICLO

A análise, bem como a conclusão dos resulta-dos alcançados pelos professores e alunos no decurso desta formação, será objeto da 2ª par-te do presente artigo. Todavia, a consulta aos trabalhos realizados pode ser acedida através dos links abaixo sinalizados:

Escola Básica Integrada da Quinta do Con-• de trabalho realizado por Amélia Pereira, Figura 3 Confeção de pipocas

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Ana Honrado, Helena Caçador e Prazeres Chambel.

Escola Básica do Alfeite • trabalho realizado por Ana Bela Monteiro, Anabela Rita, Paula Florindo, e Sílvia Marques.

Agrupamento de Escolas de Sampaio • tra-balho realizado por Célia Neves, Jesus Leão, Marta Afonso e Paula Gomes.

Trabalho de Ciência • - Projeto Multidiscipli-nar.

Agrupamento de Escolas António Gedeão• trabalho realizado por Sandra Coelho, Fer-nanda Marques, Cláudia Martins e Lurdes Baltazar.

EB1 J/I Feliciano Oleiro• trabalho realizado por Isabel Rosa, Lídia Fernandes, Manuela Soares e Rosa Gonçalves.

Agrupamento de Escolas Ruy Luis Gomes• – Escola Básica do Laranjeiro e Agrupamento de Escolas do Lumiar EB1/JI das Galinheiras trabalho realizado por Ana Alegria, Cecília Godinho, Helena Balseiro, Sara Martins e Teresa Terreira.

EB1 nº2 da Cova da Piedade• trabalho reali-zado por Manuel Pereira e Sónia Oliveira.

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ESCOLA

Sala de Aula do Futuro – Setúbal um ninho de desenvolvimento da metodologia Inquiry-Based Learning

Carlos CunhaEscola Secundária Dom Manuel Martins - Setúbal

[email protected]

Introdução

O processo de ensino – aprendizagem tem sofri-do uma forte e rápida evolução nas mais recen-tes décadas. O acesso às tecnologias de infor-mação democratizou-se e tornou-se acessível à maioria dos alunos. Por outro lado, a escola clássica deixou de dar resposta aos interesses e motivações dos alunos, nomeadamente em relação aos espaços de aprendizagem, que se tornaram demasiado rígidos para a utilização dos mais modernos equipamentos.

Os espaços de aprendizagem devem ser cada vez mais versáteis e adaptáveis, permitindo uti-lizações diversificadas e moldáveis às diversas metodologias de ensino. A sua concepção inclui agora equipamentos e ferramentas que permi-tam o acesso a diversas fontes de informação e aos mais variados eventos fora da escola, permitindo aos alunos uma participação direta no seu processo de aprendizagem, contextuali-zado pela realidade social e tecnológica, dando maior sentido às aprendizagens e tornando-as mais significativas.

A internet trouxe já imensas alterações às esco-las dos nossos dias. O fácil acesso a uma quan-tidade enorme de informação e às redes sociais tem enfraquecido a relação entre a escola e a aprendizagem, bem como o cenário tradicio-nal do binómio professor-aluno. O processo de aprendizagem tornou-se mais cooperativo, tendo o professor assumido um papel de mode-

rador e de orientador das aprendizagens, mas estando a aprendizagem centrada no aluno.

Manninen (2007, p. 27) classifica a aprendiza-gem de acordo com cinco diferentes contextos: físico, local, social, tecnológico e didático. Desde modo, os novos espaços de aprendizagem de-vem ser suficientemente adaptáveis e modula-res, resultarem de uma intervenção ao nível do design e da concepção de espaços, tornando-se espaços agradáveis e de fácil utilização, tecno-logicamente modernos e modernizáveis, uma vez que a tecnologia mantém um ritmo elevado de modernização e desenvolvimento.

É neste contexto que abriu em Bruxelas, em outubro de 2011, o Future Classroom Lab (FCL), espaço projetado para ajudar a visualizar como é possível reorganizar uma sala de aula conven-cional e outros espaços de aprendizagem, de modo a apoiar uma mudança nas formas de ensino – aprendizagem. Foi criada pela Europe-an Schoolnet, com o apoio de 30 Ministérios de Educação e de diversos fornecedores de mate-riais e equipamentos informáticos.

É um espaço modular, equipado com os mais modernos equipamentos de apoio ao ensino, e utilizado quer para a formação dos professores quer para a utilização em experiências peda-gógicas envolvendo alunos. Serve ainda como montra para os equipamentos disponibilizados pelos diversos fornecedores de equipamentos, podendo ser utilizados e testados em contexto pelos diversos intervenientes do processo de ensino – aprendizagem.

Num esforço de descentralização, de possibili-dade de formação dos docentes portugueses, de aplicação de métodos de ensino e aprendi-

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zagem diferenciados e de divulgação dos equi-pamentos entre outros parceiros educativos, procedeu-se à instalação e abertura de uma sala similar na Escola Secundária Dom Manuel Martins, com o apoio da Direção-Geral da Edu-cação e de diversos fornecedores nacionais de materiais e equipamentos.

Objetivos

A abertura e funcionamento da Sala de Aula do Futuro (SAF) tem diversos objetivos, quer de ca-ráter local, quer de carácter nacional.

A Escola Secundária Dom Manuel Martins é uma escola com uma população estudantil pro-veniente de um estrato social médio – baixo, apresentando os alunos elevados deficits de aprendizagem, o que tem por consequência um elevado nível de retenções no ensino básico, bem como uma prestação sofrível nos exames nacionais de 9º ano.

Estes alunos não têm, na sua maioria, acesso em casa às Tecnologias de Informação e Comu-nicação (TIC), pelo que não são conhecedores da utilização básica destes equipamentos e re-cursos.

Por outro lado, apresentam baixos índices de motivação para os estudos, pelo que os méto-dos mais tradicionais de ensino não constituem por si só uma garantia de aprendizagem, uma vez que os alunos desistem à primeira dificulda-de. Não podendo contar, na maioria dos casos, com um contexto familiar de suporte, são alu-nos que se perdem na escola, dificilmente pros-seguindo os seus estudos até ao final.

Assim, para estes alunos uma metodologia ba-seada na resolução contextualizada de proble-mas, com recurso às novas tecnologias de infor-mação, num ambiente mais informal, poderá constituir uma mais-valia na sua motivação e aprendizagem, dando sentido aos conceitos e aprendizagens em desenvolvimento, reforçan-

do a necessidade de aumentar o seu esforço pessoal no sentido de melhorar a aquisição de conhecimentos. São alunos que, na sua maio-ria, mostram elevado interesse em atividades de caráter prático, pelo que a utilização de me-todologias contextualizadas pelas suas vivên-cias potenciam as aprendizagens significativas e o interesse pela realização das atividades e aquisição de conhecimentos, reforçando, pela autonomia inerente, a necessidade de um maior respeito pelo trabalho desenvolvido pelo professor.

É neste contexto que a existência de uma sala como a SAF pode constituir uma mais valia para os alunos da escola, podendo ser utilizada como um complemento às metodologias mais formais e tradicionais de ensino, reforçando-as e amplificando os seus resultados. Pretende-se uma melhoria dos resultados escolares nos três anos do 3º ciclo, utilizando metodologias de in-quire-based learning, que permitam o aumento da motivação dos alunos para o estudo e para o seu esforço pessoal, melhorando os efeitos do ensino e potenciando a aquisição de conheci-mentos.

O aumento e melhoria da aquisição de conhe-cimentos e da motivação dos alunos, especial-mente do 3.º ciclo, constituem, assim, um dos objetivos da instalação desta sala na escola.

No entanto, a utilização destas metodologias implica um elevado grau de motivação e de apropriação por parte dos professores da es-cola. Saindo da sua zona habitual de conforto, os professores tendem a recusar as propostas de novas e mais arrojadas metodologias, espe-cialmente se estas envolverem uma mudança de paradigma: o ensino em contexto transfere a centralidade do ensino para o aluno, exigindo novas estratégias de ensino, uma forte prepa-ração científico–pedagógica e um grau de mo-tivação que permita o desenvolvimento de um

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trabalho integrado e verdadeiramente interdis-ciplinar. No entanto, pelas suas caraterísticas, o respeito dos alunos pelo trabalho do professor sai reforçado.

Estas características podem ser alcançadas através de uma forte componente de formação, quer na metodologia inquiry-based learning quer na tecnologia e nos equipamentos que serão utilizados no FCL. Esta formação, de pen-dor formal com a colaboração dos centros de formação continua de professores, quer infor-mal, dada por outros professores que já sejam utilizadores assíduos quer dos equipamentos que da metodologia que se defende para a sua utilização integrada.

A formação de professores, a nível nacional, é outro dos objetivos da instalação em Portugal de uma sala com estas características. Neste ponto, a colaboração da Direção Geral de Edu-cação, enquanto unidade orgânica do Ministé-rio da Educação e Ciência, cuja missão é “as-segurar a concretização das políticas relativas à componente pedagógica e didática(...)”, será de elevada importância para a mobilização dos professores para a promoção da formação, im-plementando a sua intervenção ao nível de “co-ordenar, acompanhar e propor orientações, em termos científico–pedagógicos, para a promo-ção do sucesso e prevenção do abandono es-colar(...)”. Esta formação estará devotada, entre outras, à divulgação da “Caixa de ferramentas para a criação de cenários da sala de aula do fu-turo”, desenvolvida no âmbito do projeto iTEC.

Finalmente, numa situação de falta de recursos a nível nacional, este projeto só pode ser im-plementado com a participação das diversas empresas fornecedoras dos equipamentos ne-cessários a uma sala com estas características. Do mobiliário ao equipamento informático, da conceção estética aos sensores, o equipamento e recursos necessários serão colocados à dispo-

sição do projeto pelas diversas empresas par-ceiras. A sala passará, assim, a constituir uma montra para estes produtos e equipamentos, podendo por isso ser visitada por potenciais clientes nacionais e estrangeiros, nos termos do acordo assinado pelas instituições envolvidas.

Este é outro dos objetivos da FCL: constituir uma montra das novas tecnologias ao serviço do en-sino e da aprendizagem, que possa ser testada em contexto de ensino por alunos e professo-res, retirando daí os ensinamentos práticos que advêm da utilização destas novas tecnologias. 

Recursos

A SAF está instalada numa sala da Escola Secun-dária Dom Manuel Martins. Trata-se de uma sala com aproximadamente 40 m2, no piso térreo da escola, que sofreu uma intervenção ao nível de pintura de paredes e renovação do piso, para que se pudessem instalar todos os equipamen-tos necessários para o funcionamento da SAF.

O inicial da sala apresenta-se na figura 1 na pá-gina seguinte.

Este layout foi o adotado e que está em fun-cionamento, apresentando apenas algumas pequenas adaptações, fruto das dimensões e disposição do equipamento entretanto disponi-bilizado pelos parceiros.

Assim, para as diversas zonas, os recursos e equipamentos instalados são os seguintes:

Zona APRESENTAR

Esta é uma zona de apresentação do problema inicial bem como do resultado obtido após o trabalho sobre o mesmo.

Esta zona conta com o seguinte equipamento:

• Quadro interativo;

• Blocos anfiteatro que permitem que os alunos estejam confortavelmente senta-

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dos num espaço reduzido;

• Computador de apoio ao quadro interati-vo.

Zona INVESTIGAR

Nesta zona podem ser feitas pequenas investi-gações de carácter laboratorial, ou com recurso a sistemas robóticos simples, de modo a dar resposta ao problema apresentado aos alunos.

Esta zona tem o seguinte equipamento:

• Computador integrado numa bancada de laboratório para utilização de sensores;

• Sensores;

• Máquinas de calcular gráficas com a possi-bilidade de ligação a sensores;

• Conjunto robótico;

• Material de vidro de laboratório;

• Carrinhos, massas, etc.

Figura 1 - Layout inicial da SAF.

Figura 2 - Zona Apresentar

Figura 2 - Zona Investigar

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Zona CRIAR

Nesta zona será possível criar uma apresenta-ção dos resultados obtidos, nomeadamente recorrendo à edição de vídeo e a diverso equi-pamento multimédia disponibilizado para o efeito.

Esta zona tem o seguinte equipamento:

• Computador de apoio;

• Câmara de vídeo com tripé;

• Software de apoio à criação e edição de ví-deo.

Zona PARTILHAR

Nesta zona poderá ser feita investigação e cria-

ção do produto final a apresentar, recorrendo a um quadro interativo e à internet. Podem ainda ser feitos inquéritos de resposta automática, quer para a modalidade de brainstorming quer para responder a perguntas de opinião, ou a pe-quenos inquéritos de avaliação da atividade.

Esta zona deverá ter o seguinte equipamento:

• Computador de apoio;

• Quadro interativo;

• Mesa interativa;

• Acessório de resposta automática a inqué-ritos, com ligação ao quadro interativo.

Zona DESENVOLVER

Nesta zona mais informal, os alunos podem fa-zer pesquisas autónomas e/ou individuais, reu-niões do seu grupo de trabalho para discussão de estratégias de abordagem ao problema ou de comunicação de resultados.

Esta zona tem o seguinte equipamento:

• Tablets com ligação à internet;

• Sofás, puffs, etc;

• Mesa de reuniões.

Este equipamento é fornecido pelos diversos parceiros que aderiram a este projeto, manten-do-se propriedade sua, nos termos do protocolo

Figura 2 - Zona Criar

Figura 2 - Zona PartilharFigura 2 - Zona Desenvolver

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de entendimento assinado entre as instituições parceiras e a escola. Pode por isso ser alterado, substituído ou removido, constituindo-se como uma montra da tecnologias à disposição para as mais modernas técnicas de ensino.

Funcionamento

A sala está em funcionamento durante 60 tem-pos de 45 minutos por semana, podendo ser requisitada por:

Professores da escola para trabalhar com • os seus alunos;

Direção da escola para ações informais de • formação;

Centro de Formação Ordem de Santiago • para implementar sessões de formação formais nas metodologias e equipamen-tos;

Direção-Geral da Educação, para imple-• mentação de ações de formação e de di-vulgação do projeto;

Parceiros do projeto, para ações de de-• monstração dos seus equipamentos e de

formação/informação de clientes.

A utilização da sala está sujeita a um regu-• lamento de utilização, a elaborado pela es-cola, desenvolvido com a colaboração dos parceiros envolvidos no projeto.

As atividades que se desenvolveram na sala in-cluíram:

Workshops• sobre os diversos projetos EUN/ERTE/DGE;

Formação de professores, promovida pelo • Centro de Formação de Professores Ordem de Santiago;

Apresentações e • workshops promovidas pelas empresas parceiras do projeto;

Utilização pelos professores da escola;•

Utilização pela DGE para formação•

Conclusões

Este projeto é um projeto de referência em Por-tugal, na linha estabelecida pelo Future Class-room Lab, de Bruxelas.

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Pretende dar resposta a um problema identifi-cado na Escola Secundária Dom Manuel Martins que consiste nos maus resultados dos alunos do 3º ciclo do ensino básico, na convicção de que, alterando as metodologias, podemos envolver os alunos nas suas aprendizagens e, com isso, tornar as aprendizagens significativas, promo-vendo a aquisição de conhecimentos e a cons-ciencialização de que o seu esforço promove a melhoria dos resultados.

Por outro lado, verifica-se uma necessidade crescente de formar os professores em meto-dologias inquiry-based, de modo a que se apro-priem das mesmas e as utilizem sem esforço no seu dia-a-dia. Esta formação deve ser feita em contexto, utilizando as mais modernas tecnolo-gias postas à disposição dos professores e das escolas, de modo a potenciar o ensino e a tor-nar o processo de ensino-aprendizagem mais fácil.

Para as empresas parceiras trata-se de uma oportunidade única para mostrarem os equi-pamentos que comercializam, de uma forma contextualizada pelo ambiente de uma sala de aula real, com utilizadores reais. Pode ainda constituir uma oportunidade para o desenvolvi-

mento e/ou melhoria de equipamentos, através do feedback obtido a partir dos utilizadores dos mesmos.

Finalmente, para a Direção-Geral da Educação será uma forma de iniciar a instalação em Por-tugal de um nicho de formação, permitindo a oportunidade de aplicar no nosso País as meto-dologias desenvolvidas para este equipamento pela EUN, organização da qual a DGE faz parte. Poderá assim dar-se início à formação dos pro-fessores nas metodologias inquiry-based, que fazem parte da mais recente tendência didática europeia para o ensino das ciências, tecnologia e matemática. 

ReferênciasUNESCO ICT COMPETENCY FRAMEWORK FOR

TEACHERS, 2011;PADRÕES DE COMPETÊNCIA TIC PARA PROFESSORES,

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Learning”, University of Manchester;Manninen, J., Burman, A., Koivunen, A., Kuittinen,

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ESCOLA

Ensino Contextualizado

José Fanica Professor de Ciências Fisico-Químicas

Agrupamento de Escolas Romeu Correia - [email protected]

Hodson (2011) defende um ensino contextua-lizado, capaz de envolver e motivar os alunos para agirem perante situações específicas, com as quais não só eles se identifiquem, mas tam-bém a sociedade. Trata-se de um modelo de ensino das ciências, centrado nos alunos e nos problemas que estes consideram interessantes e socialmente relevantes (Fanica, 2012; Reis, 2013) e em que os professores interpretam, ge-rem e adaptam o currículo em função dos alu-nos e dos contextos emergentes. Torna-se im-prescindível estimular e envolver os alunos em ação fundamentada como forma de contribuir para a resolução dos problemas que afetam o mundo atual.

Para Alsop e Bencze (2014), o rótulo de “ativis-mo” é associado acontecimentos sociais, envol-vendo espetáculo e muitas vezes violência e de-sacato. Mas em contexto didático, associamos o ativismo ao ensino/aprendizagem, onde os

alunos sintam o desejo de fazer mudanças pes-soais, sociais, políticas, económicas e ambien-tais, contribuindo para o bem comum e tendo a oportunidade de experimentar o sentimento de poder de intervenção na evolução da sociedade (Alsop & Bencze, 2014; Reis, 2013).

Ativismo fundamentado envolve propor, apoiar, criticar, avaliar e aperfeiçoar ideias, algumas das quais podem conflituar ou competir, acerca de um assunto científico, envolve trabalhar em conjunto para comunicar/divulgar e avaliar as suas ideias e descobertas. Assim, os alunos são vistos como cidadãos ativos e críticos, é impor-tante capacitá-los de modo a que se compro-metam com iniciativas de ativismo, habilitando-os a levar a mudança até ao seu seio familiar e/ou à comunidade em que vivem (Reis, 2013).

Diversos estudos referem um número cada vez maior de professores interessados em ensinar ciências fora da sala de aula, não só para esti-mular o interesse dos alunos pela ciência, mas também para formar alunos conscientes da rea-lidade que afeta a nossa sociedade e contribuir para o bem comum (Barton e Tan, 2014; Bencze e Carter, 2011; Fanica, 2012; Hodson, 2011; Le-vinson, 2013; Reis, 2014; Roth, 2014; Simonne-aux, 2014).

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O IRRESISTIBLE é um projeto de formação de professores, que combina a aprendizagem for-mal e informal, focado em Investigação e Inova-ção Responsáveis.

O IRRESISTIBLE é um projeto europeu dinami-zado em Portugal pelo Instituto da Educação, da Universidade de Lisboa que tem como finalida-de conceber atividades que promovam o envol-vimento dos alunos e do público no processo de Investigação e Inovação Responsáveis (IIR).

O projeto pretende sensibilizar para a IIR pro-movendo, nos alunos, a construção de conhe-cimento acerca da investigação científica. Este objetivo será alcançado a partir de uma abor-dagem que combine a educação formal (escola) e informal (centros e museus de ciência) tendo em vista a introdução de temas científicos rele-vantes e de ponta.

Através desta metodologia, pretende-se que os alunos se familiarizem com a ciência, pro-movendo-se ao mesmo tempo uma discussão sobre as questões da IIR.

No ano de 2015/2016 foi iniciada uma nova

etapa (etapa II) do projeto aberta a novos pro-fessores que irão testar os módulos nacionais e internacionais melhorados. Os módulos con-templam o planeamento e a construção, pelos alunos, de exposições interativas abordando o tópico científico trabalhado, segundo uma pers-petiva IIR. Exemplo de temas:

Geoengenharia do Clima•

Ciência Polar•

Extensão da Plataforma Continental Por-• tuguesa

Leite Materno (parceiro Holandês)•

Alterações Climáticas (parceiro Finlandês)•

Oceanografia e alterações climáticas (par-• ceiro Alemão)

Numa primeira fase, as exposições serão insta-ladas nas escolas, permitindo à comunidade es-colar o contacto com os temas científicos e com o resultado do processo investigativo levado a cabo pelos alunos. Numa fase seguinte, após uma etapa de seleção, as melhores exposições serão exibidas no Pavilhão do Conhecimento, em Lisboa.

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Os módulos de ensino estão também disponí-veis online e em diferentes línguas. As melhores exposições do projeto serão apresentadas ao público europeu durante uma sessão especial que terá lugar numa conferência internacional.

Este projeto conta com a participação de quatro turmas da escola secundária de Romeu Correia, permitindo aos alunos refletirem acerca do im-pacto social da investigação científica.

Se tiver questões específicas, ou se quiser sa-ber mais sobre os módulos disponíveis, ou caso queira integrar o projeto juntamente com a(s) sua(s) turma(s) − contacte: José Fanica da Esco-la secundária de Romeu Correia ([email protected]) e/ou Pedro Reis da Universidade de Lisboa ([email protected]).

O Projeto Arte e Ciência, coordenado pelos professores Ana Prates e José Fanica combina a aprendizagem formal (escola) e informal (mu-seus de arte e de ciência), focada em Investiga-ção e Inovação Responsáveis.

No ano letivo de 2008/2009 deu-se início a um conjunto de atividades anuais entre alunos do curso de Ciências e Tecnologias e do curso de Artes Visuais, envolvendo alunos do 10º, 11º e 12º anos. Estas atividades consistiram na visi-ta a museus de Arte e de Ciência em diversas cidades europeias. O sucesso destas iniciativas, evidenciado pelo número de inscrições anuais, pela qualidade dos diários gráficos e diários de

viagem produzidos e pela avaliação dos partici-pantes e respetivos encarregados de educação, permitiram reequacionar o projeto para os anos de 2012/2016.

A análise do currículo dos alunos de Ciências e Tecnologias mostra que, embora se preconize um ensino das ciências CTS-A (Ciência-Tecno-logia-Sociedade – Ambiente) são inexistentes orientações ou sugestões metodológicas que permitam gerir o currículo dos alunos de modo a contribuir para a formação global dos alunos ao nível da educação artística. O contato com o mundo artístico, ainda que de forma superficial, permite aos alunos desta área do conhecimen-to alargar a sua visão sobre o mundo e estimu-lar o pensamento divergente, fundamental no desenvolvimento da criatividade e no reforço do espírito crítico, objetivo fundamental desta área de estudos.

Pretende-se deste modo proporcionar outros espaços e momentos privilegiados, para além das visitas ao estrangeiro, para que os alunos dos Cursos de Artes Visuais e de Ciências e Tecnologias possam estabelecer relações en-tre as manifestações de natureza estética que são produzidas pelos artistas, trabalhadores de emoções e os cientistas, os investigadores que sonham com a conquista do conhecimento. Em cada um dos alunos letivos foram realizadas atividades de acordo com as seguintes temáti-cas: Luz: fenómenos óticos e perceção visual;

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Materiais e suas propriedades; Movimento real e movimento percecionado; Sensibilização de superfícies: processos químicos e técnicas de registo e expressão

O acompanhamento do desenvolvimento do projeto, ao longo do ano letivo, os resultados obtidos pelos alunos nas tarefas realizadas e a análise das respostas dadas pelos alunos ao questionário, permitem tirar as seguintes con-clusões:

O projeto teve grande impacto no desen-• volvimento de competências pessoais e sociais, na melhoria dos resultados esco-lares e na tomada de decisões mais cons-cientes quanto às opções escolares e ao prosseguimento de estudos. É de salientar também, que os alunos classificam muito positivamente todas as atividades realiza-das, tendo em conta a sua pertinência para o cumprimento dos objetivos do projeto.

Das razões apontadas pelos alunos para • inscrição no projeto, salientam-se algumas expressões-chave que ajudam a definir o projeto: aprendizagem, conhecimento, desenvolvimento de capacidades e gosto pela ciência e pela arte.

É de referir também, o espirito de solida-• riedade, patente na forma como todos os alunos se empenharam na angariação de fundos que permitiu a participação de cerca de uma dezena alunos, com dificul-dades económicas, participarem nas ativi-dades no estrangeiro.

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ESCOLA

O Projeto eTwinning e o Ensino das Ciências Naturais no 2º ciclo do ensino básico

Egídia AzevedoProfessora de Biologia e Geologia

Escola Secundária de Cacilhas-Tejo - Almada

Introdução

O projeto eTwinning nasceu em 2005 como a principal ação do programa e-Learning da Comissão Europeia e desde 2014 integra o pro-grama Erasmus +, o programa europeu para a Educação, Formação, Juventude e Desporto da União Europeia.

Nestes 10 anos de existência, o eTwinning expandiu-se, aumentou o número de alunos e docentes participantes e de projetos realizados, sendo hoje a maior comunidade educativa eu-ropeia. O eTwinning conta com a colaboração e ajuda dos serviços nacionais de apoio sedia-dos nos vários países intervenientes, sendo co-ordenado pelo serviço de apoio central, asso-ciado ao European Schoolnet.

A plataforma eTwinning é o ponto de encontro para os membros desta comunidade europeia. Neste ambiente virtual, são apresentadas ide-ias, partilhados recursos e ferramentas, desen-volvidos projetos, fornecido apoio e aconselha-mento e disponibilizados eventos formativos enriquecedores de boas práticas [1].

Os projetos eTwinning assentam na realização de trabalho colaborativo, operacionalizado pela partilha de práticas pedagógicas, realizadas com as escolas parceiras do projeto, com recurso a um leque de ferramentas digitais e à internet.

As vantagens do trabalho colaborativo eviden-ciadas em Roldão (2006), estão espelhadas no

eTwinning, designadamente o esforço conjunto em solucionar questões, a mobilização do saber individual para ajudar o grupo, o equacionar problemas e procurar soluções em conjunto. A utilização das ferramentas digitais no ensino das ciências facilita e enriquece o processo de ensino-aprendizagem.

Os projetos eTwinning apresentam um con-junto comum de objetivos gerais: promover a utilização das tecnologias de informação e co-municação na sala de aula; promover o desen-volvimento de um leque diversificado de com-petências, capacidades e atitudes inerentes à educação holística dos alunos; potenciar o au-mento da proficiência em línguas estrangeiras e ainda serem elementos promotores da con-strução da identidade europeia. Os objetivos específicos estão subjacentes às temáticas dos diferentes projetos e ao grupo de alunos par-ticipantes.

Projeto eTwinning “Animal around us”

O projeto “Animal around us” abordou o mundo animal nas suas múltiplas vertentes, com recur-so a um vasto leque de ferramentas digitais e da internet. As ligações entre Ciência, Tecnologia, Sociedade, Ambiente e Arte, foram os fios con-dutores para o desenvolvimento de leque di-versificado de saberes, competências e atitudes inerentes à educação holística dos jovens [2].

Este projeto foi aplicado durante o ano letivo 2013/2014, envolvendo 170 alunos da faixa etária dos 10-12 anos, 16 docentes de dez es-colas de países europeus: Croácia, Eslovénia, Estónia, Eslováquia, Grécia, Lituânia, Letónia, Portugal, Polónia e Turquia. [2].

No Agrupamento de Escolas D. Filipa de Lencas-

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tre, o projeto foi aplicado em 3 turmas do 5º ano de escolaridade, num total de 91 alunos, nas disciplinas de Ciências Naturais, Educação Musical, Educação Visual e Educação Tecnológi-ca. Os alunos eram oriundos maioritariamente de uma classe social média a média alta, apre-sentavam em sala de aula um comportamento satisfatório, havendo casos pontuais de indisci-plina. A maioria apresentava elevadas expetati-vas escolares, traduzidas num aproveitamento global bom às diferentes disciplinas. Contudo, nas diferentes turmas existia um conjunto de alunos, com dificuldades de aprendizagens notórias e de concentração.

Objetivos

Os objetivos delineados foram: fornecer aos alunos uma visão multidimensional do mundo animal; potenciar o desenvolvimento de sa-beres e competências promotoras de apren-dizagens significativas; promover interligação entre Ciência, Tecnologia, Sociedade, Arte e Ambiente; incrementar o uso das novas tecno-logias e informação e comunicação em difer-entes contextos educativos e ainda dinamizar espaços educativos online exemplificativos de boas práticas pedagógicas, inovadoras, integra-das nos currículos e abertas à participação de todos os alunos participantes.

Atividades e ferramentas

A figura 1 apresenta a calendarização das ativi-

dades do projeto realizadas ao longo do ano letivo nas escolas participantes.

As aulas de Ciências Naturais foram o cenário de várias atividades realizadas, pela estreita articulação com o tópico do programa “Diversi-dade dos animais” e apostou-se em metodolo-gias ativas, objetivas, ajustadas ao público-alvo e passiveis de serem trabalhadas com recurso a ferramentas digitais.

No lançamento de cada atividade procedia-se à sua apresentação, definia-se os objetivos a atin-gir, estabelecia-se o prazo para a sua realização e utilizava-se um recurso multimédia de moti-vação: um pequeno filme, um vídeo, os quais eram os pontos de partida para a realização de “brainstorming” envolvendo a turma, com registo dos termos no quadro ou em folhas de cenário. As pequenas atividades investigativas “descobre os animais do solo”, “descobre os animais que vivem num lago”, “O registo fo-tográfico dos animais da cidade”, o “workshop” em parceria com o jardim zoológico foram mo-tivantes para a realização das atividades e para o ensino das ciências.

Cada atividade representava um novo desafio com um grau de exigência e complexidade diferente, exigindo a mobilização de saberes, empenho, criatividade, responsabilidade e au-tonomia. Durante este processo, foram imple-mentadas em sala de aula, estratégias de refor-

Figura 1 – Calendarização das actividades

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ço positivo, com feedback frequente aos alunos sobre os trabalhos produzidos. Assim, as con-quistas realizadas foram peças fundamentais no fortalecimento do seu autoconceito, da sua auto-estima, especialmente notória nos casos de alunos com necessidades educativas especi-ais ou dos alunos com perfis de aprendizagem de maiores dificuldades.

A escolha das ferramentas digitais e comunica-cionais orientou-se por critérios de rigor, simpli-cidade e adequação aos alunos. Visava-se que as ferramentas digitais fossem elementos facili-tadores da execução de tarefas e simultanea-mente fossem elos de ligação e comunicação entre as escolas parceiras. Assim, destaca-se a exploração do: “PowerPoint”, “Prezi”, “Automo-tivator”, “Storyjumper”, “Pizlr”, “Google docs”, “Zondle”, “MovieMaker”, “Google Drive”, “Vim-eo” os quais foram essenciais para a realização das tarefas delineadas.

As atividades de pesquisa orientada foram pe-dras basilares na construção dos dicionários. Estes foram construídos para as categorias previamente estabelecidas “animais de estima-ção”, “animais da quinta, “animais marinhos” e “animais de água doce”, “animais de ambiente terrestre”, “animais em vias de extinção”, tendo os alunos sido direccionados para a exploração da alimentação, da locomoção, da reprodução para os animais integrantes das categorias es-tabelecidas.

Durante o projeto, os alunos realizaram em grupo questões de escolha múltipla, abrangen-do diferentes tópicos patentes no currículo de ciências naturais, que serviram para a elabora-ção do “quiz” interativo inicial e dos jogos. Na criação dos jogos utilizaram o “Zondle”, uma ferramenta divertida e fácil de utilizar. Nestas atividades a associação das componentes lúdica e interativa foram estimulantes para as apren-dizagens e forneceram ainda a possibilidade de

melhoria dos resultados obtidos, pela visualiza-ção do erro e pela competitividade gerada.

Sendo a Ciência e a Arte, dois eixos estrutur-antes do projeto, dinamizou-se uma visita de estudo ao Museu do Nacional do Azulejo. Esta visita estimulou um olhar mais atento às suas peças, que refletem a diversidade de uma colecção criada ao longo do tempo, levando os alunos a descobrirem relações temáticas inesperadas com as ciências, com a natureza e com a diversidade animal presente na colecção. Explorou-se, ainda os materiais que serviram de base à construção das peças, estabelecendo uma ligação clara e inequívoca entre natureza, ciência, tecnologia e a arte. Com realização da pintura de azulejos convidou-se os alunos a pintarem um animal imaginário ou real, um ex-ercício imaginativo e criativo de descoberta de cores, texturas e capacidades, uma experiência emocionante e original.

Os postais, os logotipos, as actividades de na-tal, e a escrita da história dos animais, animais imaginários, contribuíram para os alunos de-senvolverem as suas competências artísticas e utilizarem novas ferramentas digitais: “Automo-tivator” “Pixlr” e o “Storyjumper.

Destacam-se as atividades de comunicação, operacionalizadas via “Skype” com as escolas parceiras: polaca e grega, como momentos vi-venciados com particular entusiasmo e alegria. Nestas atividades, distribuídas em três momen-tos distintos, os alunos realizaram a sua apre-sentação, a dos animais estudados e uma per-formance musical com canção e sons de flauta. Pelos laços de empatia e amizade criados, pela partilha da informação, pelo vencer de obs-táculos linguísticos, estes momentos ficaram registadas na memória dos alunos. O fórum e o chat associados ao “twinspace” foram as ferra-mentas de comunicação utilizadas com sucesso pelos todos intervenientes.

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Durante a realização das várias etapas do pro-jeto, a participação oral foi estimulada e direc-cionada para a abordagem de concepções alter-nativas dos alunos sobre conceitos importantes da matéria, permitindo a estes vencer obstácu-los inerentes à apropriação e mobilização dos conhecimentos científicos e desenvolvimento de competências artísticas.

Salienta-se que neste projeto o trabalho co-laborativo ganhou amplitude, ultrapassou a mera colaboração na realização de tarefas e es-tendeu-se a uma maior partilha e interação en-tre os parceiros. Esta é sem sombra de dúvida uma grande vantagem dos projetos eTwinning, confirmando-se assim, o referido por Miguela (2007), o caracter atractivo, inovador e motiva-dor da colaboração online presente no eTwin-ning.

Pela facilidade de acesso e utilização, a plata-forma Moodle da escola foi a ferramenta sele-cionada para envio de trabalhos realizados em contexto extra-escolar.

Resultados e produtos

Como produtos finais foram apresentados um conjunto de materiais exemplificativos dos vári-os tópicos constituintes do projeto: apresenta-ções, postais, “quiz”, logotipos, dicionários, car-toons, questionários, jogos, cartazes, pintura de azulejos, canções, vídeos, escrita de histórias de animais [3].

Os diferentes produtos construídos evidenciam um processo ativo de aprendizagem, expresso no levantamento de questões, no saber obser-var e registar informação, no saber seleccionar informação e resolver diferentes problemas e melhorar a comunicação na sala de aula e com os parceiros de projeto.

Os trabalhos realizados foram difundidos no “twinspce” [3]. A figura 2 mostra alguns exem-plos (postais, logotipo, dicionário, azulejos, ani-mal imaginário)

Divulgação

A divulgação das atividades foi ampla e op-eracionalizada através do twinspace, do blog, dos cartazes afixados nas sala de aula, das ex-posições realizadas na escola e abertas à comu-nidade educativa.

Avaliação

Os alunos realizaram um questionário para avaliar o impacto da sua participação no pro-jeto, onde salientaram a utilização de um vasto leque de recursos digitais, a diversidade de tarefas realizadas, o elevado empenho e in-teresse que tiveram na sua realização, o con-tributo que o projeto deu para a melhoria dos resultados escolares. As principais dificuldades evidenciadas foram: o cumprimento dos prazos para a realização das tarefas, o envio dos tra-balhos realizados pela plataforma moodle, o reduzido número de computadores na sala de informática; a utilização do “twinspace”.

Figura 2 – Exemplos de trabalho produzidos

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Durante o projeto, em conjunto com a colega Agnieszka Halicka, como fundadoras monitor-izamos a sua evolução e no final foi elaborado um balanço final. Os docentes participantes realçaram que o projeto tinha superado as ex-petativas iniciais, pela elevada participação e empenho dos alunos, tendo sido um excelente contributo para a motivação nas tarefas esco-lares e consequente melhoria de resultados. O projeto fomentou a partilha de boas práticas pedagógicas entre os docentes das escolas en-volvidas, tendo as ferramentas de comunicação utilizadas sido eficazes na promoção do tra-balho colaborativo.

Considerações finais

O projeto eTwinning “Animals around us”, contribuiu para consecução dos objetivos pro-postos, facultou a realização de aprendizagens baseadas na descoberta, no saber fazer, fomen-tou a cooperação, a interajuda, possibilitou o intercâmbio e a partilha de experiencias numa escala mais lata, promovendo assim o desen-volvimento holístico dos alunos.

A cooperação dos pais e encarregados de edu-cação nas várias etapas foi um elemento es-sencial na superação de dificuldades inerentes ao envio de materiais via plataforma Moodle e para a concretização de algumas das tarefas propostas como trabalho extra-aula.

Este projeto deu um contributo para a projeção da imagem da escola, como uma escola inova-

dora, dinâmica e projetada para o futuro.

O mérito e a qualidade do trabalho desenvolvi-do foram reconhecidos com a atribuição do selo de qualidade nacional e selo de qualidade europeu e ainda com a atribuição da bandeira eTwinning ao Agrupamento de Escolas D. Filipa de Lencastre.

Com eTwinning, as palavras de Paulo Freire “En-sinar não é transferir conhecimento mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção”, ganham maior expressão, vivacidade e valor.

AgradecimentosA todos alunos e docentes participantes.

A Direcção do Agrupamento de Escolas D. Filipa de Lencastre.

Referências[1]www.etwinning.net[2]https://www.etwinning.net/en/pub/profile.

cfm?f=2&l=en&n=99466[3]http://new-twinspace.etwinning.net/web/

p99466/welcomeFreire P. 2003 Pedagogia da autonomia - saberes

necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 2003.

Miguela, A. (2007). Models of Telecollaboration (3): eTwinning. In Robert 0‟Dowd (Ed.). Online Intercultural Exchange. An Introduction for Foreign Language Teachers. Canada: Great Britain by The Crown well Press Ltd. Pp. 85-106.

Roldão M. 2006. Trabalho colaborativo. O que fazemos e não fazemos nas escolas? Revista Noesis: 71: 22-23.

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ESCOLA

IRRESISTIBLE Investigação e Inovação Responsáveis em sala de aula

Rita RatoProfessora de Físico-Química

Agrupamento de Escolas Carlos Gargaté - Almada

No ano letivo de 2015/2016, três turmas do 8º ano (B,C e D) do Agrupamento de Escolas Car-los Gargaté vão desenvolver várias atividades relacionadas com a investigação em Ciência no âmbito do projeto IRRESISTIBLE. O projeto IR-RESISTIBLE é um projeto financiado pela União Europeia e tem como parceiros Portugal (cuja coordenação está a cargo do Instituto de Edu-cação da Universidade de Lisboa), Holanda, Fin-lândia, Alemanha, Grécia, Israel, Itália, Polónia, Roménia e Turquia. A sua finalidade é conceber atividades que promovam o envolvimento dos

alunos e do público no processo de Investigação e Inovação Responsáveis (IIR).

O projeto tem como objetivo sensibilizar para a IIR promovendo, nos alunos, a construção de conhecimento acerca da investigação científi-ca a partir de uma abordagem que combine a educação formal (escola) e informal (centros e museus de ciência). Através desta metodologia, pretende-se que os alunos se familiarizem com a ciência, promovendo-se ao mesmo tempo uma discussão sobre questões da IIR.

O tema científico que os nossos alunos irão explorar será os “Plásticos no Oceano”. As ati-vidades que os alunos desenvolvem estão de-lineadas num módulo já construído pelo par-ceiro Alemão. Os alunos constroem, a início, o conhecimento necessário acerca do problema dos plásticos nos oceanos. Será com base nes-

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se conhecimento básico que os alunos desen-volverão a sua própria pesquisa e investigação acerca do tema. O módulo pretende também desenvolver a tomada de consciência para a IIR envolvendo os alunos numa discussão acerca da necessidade de responsabilidade no modo como se lida com os resultados da investigação e desenvolvimento.

O módulo de ensino segue o modelo dos 6E (7E em Portugal) o que implica a sua estrutu-ração em sete etapas: na etapa “Envolvimento” estimula-se o interesse dos alunos para o tema “Plásticos nos Oceanos”, levando-os à elabo-ração de questões, que serão formuladas na etapa “Exploração”. Na etapa “Explicação” os alunos constroem o conhecimento necessá-rio sobre o problema. Na etapa “Ampliação” os alunos lidam com questões de investigação mais específicas, relacionadas com a problemá-tica dos plásticos nos oceanos atendendo a um contexto mais local. Nesta etapa os alunos rea-lizam as suas próprias investigações, analisam

publicações científicas acerca do tema e recor-rem a outras pessoas para além da comunidade escolar para obter informações. Na etapa “Par-tilha” (e Ativismo - o 7º E português, de Em-powerment) será desenvolvida uma exposição pelos alunos com a finalidade de os envolver ativamente numa ação coletiva fundamentada em investigação, com a finalidade de educar a comunidade e alertar para a problemática dos plásticos nos oceanos. Na última etapa, “Ava-liação”, o conhecimento dos alunos é posto à prova através de um teste.

Os nossos alunos encontram-se ainda na fase do “Envolvimento” tendo já realizado um workshop e uma visita guiada sobre os Oceanos no Oceanário de Lisboa.

It is a coordination and support action under FP7-SCIENCE-IN-SOCIETY-2013-1, ACTIVITY 5.2.2 Young people and science: Topic SiS.2013.2.2.1-1 Raising youth awareness to Responsible Research and Inno-vation through Inquiry Based Science Education.

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ESCOLA

O ensino da ciência de base experimental

Horácio Neri Professor do 1.º CEB

Agrupamento de Escolas Carlos Gargaté- Almada

É por todos reconhecido que a Ciência atual-mente, deixou de ser um assunto exclusivamen-te de cientistas, e diz respeito aos cidadãos em geral e em particular aos mais pequenos nos quais desperta enorme curiosidade. E a escola é o local ideal para dar respostas à sua curiosi-dade, contribuindo para a sua formação cientí-fica, desde os primeiros anos de escolaridade. Nesse sentido o agrupamento de escolas Carlos Gargaté há vários anos que incluiu no seu Plano Anual de Atividades uma semana dedicada às Ciências Experimentais, incluindo os três ciclos de escolaridade, na qual os alunos apresentam

aos colegas algumas experiências realizadas ao longo do ano letivo. As experiências são tantas que vou referir-me somente às realizadas nos últimos 3 anos, no 1º ciclo, sob a coordenação do professor Horácio Neri. Os alunos ao longo deste período realizaram pequenas investiga-ções e várias sessões experimentais seguindo os protocolos definidos, contemplando diferen-tes temas e usando metodologias apropriadas (Situação Problema – hipóteses de resolução – experimentação – avaliação da experiência numa perspetiva CTS (Ciência Tecnologia Socie-dade.)

Os temas abordados foram os mais variados flu-tuação, ar, luz, sombras, eletricidade, circuitos elétricos, observações microscópicas, dissolu-ção , combustão, estados da matéria, mecânica, etc…

Sombras chinesas Decomposição da luz branca Material opaco

Ano letivo 2012/13

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Globo de Plasma Circuito elétrico Espelho infinito (reflexão) da luz

Ar em movimento Energia solar Eólica (movimentado pelo ar)

Energia hídrica/flutuação Observação microscópica Produção de energia a partir de limões

Ninho de abelhas Dissolução Combustão

Ano letivo 2013/14

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Decomposição da luz branca (arco-íris) Roldanas

Experimentando Exposição final de ano

Ano letivo 2014/15

Puderam ainda visualizar filmes sobre os oceanos, preservação do meio ambiente, seleção de se-mentes e paisagens terrestres.

São estes momentos que fazem os nossos alunos felizes sentindo-se por momentos verdadeiros cientistas. O CE apoiou incondicionalmente todas as atividades.

A Ciência e os cientistas vista pelos alunos:

“Os cientistas às vezes também se enganam.” – Ricardo Pedrosa

“..há cientistas loucos.” - Frederico

“…pessoa que explora o universo e sabe muito.” - Ricardo

“… pessoa que investiga coisas de todos os sítios.” - �asco

“ …pessoa que sabe um bocadinho de tudo e faz experiências.” - António

“O cientista descobre medicamentos para tratar doenças.” - Guilherme Andrade

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REFLEXÃO

o Decifrador do Mundo, o Alquimista do Sonho*

José Godinho Diretor

Agrupamento de Escolas António Gedeão - Almada

Do Homem com maiúscula, intelectual bifron-te que é Rómulo de Carvalho/António Gedeão, podemos dizer sem exagero que ele represen-ta, nesta segunda metade do século XX, a ânsia de saber e o antropocentrismo do século XVI, a sua multidisciplinaridade projectados numa era de incessantes e vertiginosas descobertas cien-tíficas, que infelizmente não coincidem com o aperfeiçoamento moral e cívico da nossa espé-cie.

De Rómulo de Carvalho, Professor no liceu Camões de físico-químicas, diz quem com ele aprendeu, que foi o mais respeitado e amado desse estabelecimento de ensino. Na verdade, há registo do pedagogo excepcional, do gosto pela pesquisa e talento para a divulgação, mal escondendo já o seu alter António Gedeão- poeta sereno e hiperlúcido, e ao mesmo tempo comovido, das relações tão profundas da ciên-cia e da arte e da solidariedade humana, como quem diz dos diversos modos complementares de aprender a vida e o universo.

Foi António Gedeão quem veio estabelecer, com a sua poesia, um espaço de conciliação, de interrelação dinâmica entre a cultura literária e humanística, por um lado, e o conhecimento científico, por outro. Os seus poemas lírico-di-dácticos, de constatação das coisas, de explica-ção dos fenómenos conseguem a fusão de duas atitudes habitualmente separadas: o Cantar e o Experimentar. A sua viva inteligência, a sua

palavra serena invadem a mecânica do mundo físico e criam os seus correlatos no jardim das ideias e das sensações.

António Gedeão só aos cinquenta anos surge como poeta, na plenitude dos seus dons, e vem inserir-se num espaço literário em que Miguel Torga, Vitorino Nemésio, José Régio, Sofia de Mello Breyner Andresen ocupam já uma posi-ção cimeira e em que se afirmaram ou come-çam a afirmar-se talentos tão diversos como os de Jorge de Sena, Ruy Cinatti, Mário Cesa-riny, Eugénio de Andrade, José Gomes Ferreira, Carlos de Oliveira, Ramos Rosa, David Mourão-Ferreira.

Diz Urbano que a poesia de António Gedeão é órfica na busca da melodia e do ritmo e em par-te por isso, mas sobretudo pela força e genero-sidade da mensagem, e por isso (e tanto mais) virá ele a ser mais tarde cantado por Manuel Freire e Carlos do Carmo. «Pedra Filosofal» pode considerar-se, dentro do seu género, uma obra-prima, pela fluidez, pelas sonoridades lu-minosas, pela singeleza dos arranjos sintáticos e rítmicos, lineares, sem transportes, pela rique-

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za e originalidade das enumerações que lhe dão a respiração, a robustez e o alento, a força mo-triz, com qualquer coisa de primitivo, mas tam-bém de sofisticado, num trajeto que percorre a história da epopeia humana, conclui o saudoso literato.

É, efetivamente, um extraordinário poema, um cântico ao sonho, onde associado à ideia de progresso se combina a terminologia científi-ca e técnica (a cisão do átomo, o radar, o alto-forno, a geradora, o foguetão que desembarca na superfície lunar), com o vocabulário bucólico tradicional (o ribeiro manso, os pinheiros altos), e ainda com a surpresa de certas antíteses e imagens (os serenos sobressaltos, as aves que gritam em bebedeiras de azul).

A epopeia humana a que se refere Urbano Tava-res Rodrigues inclui, decerto, privilegiadamen-te a aventura marítima dos portugueses; e as longas enumerações que estruturam o poema, após a descrição do locus amenus inicial, não deixam de incluir a rosa-dos-ventos, as Carave-las e o Infante, o Cabo da Boa Esperança, vários dos tópicos comuns a Camões e a Fernando Pessoa. Não deixa de ser curioso que o Poeta Gedeão escolha ainda como metro favorito a redondilha maior.

O efeito de choque que a poesia de António Ge-deão produziu aquando da sua estreia derivava em grande parte da sua interpretação da física, da química e da biologia do mundo, associada a uma reflexão filosófica, patente em muitos dos seus títulos e a que não eram estranhos um certo humorismo suave e uma clara esperança, oferecida como estímulo, como ânsia de trans-formação e também como lenitivo, esperança que mais tarde ele nos dirá ter sido então «ne-cessária» (era o tempo do fascismo e da escrita como missão). Lembremos que antes de José Saramago ter escrito as suas páginas de home-nagem aos trabalhadores que ergueram pedra

a pedra o mosteiro de Mafra, no Memorial do Convento, já António Gedeão nos dera o «Po-ema da Pedra Lioz», mencionando logo de en-trada os nomes de «Álvaro Góis / Rui Mamede, / filhos de António Brandão / naturais de Canta-nhede; / pedreiros de profissão, / de sombrias cataduras». Nestes versos se projetam o talen-to e o esforço desses artesãos quase anónimos, lavrando o calcário sob a abóbada românica. Cântico ao trabalho de onde a beleza vai britar e projectar-se no tempo, para além da morte que iguala os nobres e os plebeus. Vislumbra-se o Homem da solidariedade social que Gedeão soube encarnar.

A este associam-se ainda e sempre o cientista,o professor, o poeta, o espectador crítico e dila-cerado, que sonha com a harmonia do mundo, com a igualdade na desigualdade, a fraternida-de na competição, que cultiva o lirismo na luta de instintos e na defesa da liberdade íntima e cívica, só alcançadas através de um aperfei-çoamento incessante e progressivo da espécie humana.

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Mas António Gedeão não se fica por aqui....não perde de vista, na sua poesia de amplitude cósmi-ca, o passado português, sem se resumir às proezas de príncipes e heróis: o seu conhecimento da história e grandeza de caráter vol-ta-o para o coletivo, para o povo e para as grandes mudanças opera-das na natureza pelos homens. É o poeta da arraia-miúda na expan-são marítima lusitana que aparece com colorido rigor no seu Poema da Malta das Naus, com o riso de dentes podres e o escorbuto, e muitas vezes suor e valentia. É o poeta dos homens que moldaram as chaves do mundo.

O ambíguo, polissémico poema «Ballet», que tanto pode referir--se a uma bailarina, como a uma estátua, à arte em geral, traduz a ideia da própria do progresso hu-mano.

É assim António Gedeão...o Poe-ta/Professor/ Aprendiz confesso da beleza do Mundo.

Hoje, perante as desigualdades, o desemprego, as monstruosidades sociais e intercontinentais que nascem dos modelos de globalização, sob a tutela de um pensamento único – o do neo-liberalismo venerador do dinheiro acima de tudo –, sentimos a falta de mais vozes como a de António Gedeão... Contudo, não temos o direito de perturbar a sua paz, solicitando-lhe que volte, que torne a dizer-nos do sonho e da esperança. Mas outras vozes virão talvez na sua mesma linha, trazer-nos a luz da ciência e da bondade, virão bater-se serenamente pela vida contra a morte, pela liberdade contra a opressão, pela inteligência generosa contra a vã

cobiça e tudo o que gera ou acrescenta a dor dos outros, sentida como nossa.

*Nota importante: o texto acima inclui citacões do saudoso e Emérito Prof. Dr. Urbano Tavares Rodrigues, Humanista,/Jornalista, Investigador,/Escritor, proferidas na sessão plenária e pública da Academia das Ciências de 28 de �ovembro de 1996 e publicado in Memórias da Academia das Ciências de Lisboa. Classe de Letras, Lisboa, t. 33 (1966-1997), p. 157-169

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COMUNIDADE

Biblioteca da FCT potencialidades e perspetivas de colaboração com a comunidade envolvente

José MouraAna Pereira

Biblioteca da FCT-U�Lwww.biblioteca.fct.unl.pt

A Faculdade de Ciências e Tecnologia da Univer-sidade Nova de Lisboa (FCT/UNL) tem sido uma mais-valia em todo o espaço urbano e cultural na zona de Almada. Uma minicidade onde se desenvolve uma intensa atividade de ensino e progresso tecnológico e científico, uma cidade de conhecimento que cruza e interatua com a grande cidade.

A Biblioteca da FCT/UNL entrou em funciona-mento, no seu novo edifício, em setembro de 2006 e tem procurado ser um desafio “a quem passa pela” e “vive na” Faculdade, sempre olhando atentamente para a comunidade en-volvente. Desempenha um papel diversificado no Campus de Caparica, como Biblioteca no sentido habitual, mas também como um polo cultural e artístico. Engloba diversas infraestru-

turas: Laboratório de Design e Inovação, audi-tório com 72 lugares, salas de exposições, bar e pátio.

A FCT/UNL tem protocolos assinados, que en-volvem a Biblioteca, com a CMA, Embaixada dos EUA (no âmbito da parceria American Corner), Ar.CO, Fundação Museu Berardo, vários grupos de Teatro (TMJB, Teatro Extremo) entre outros. Exposições, seminários, concertos, teatro e ci-nema são algumas das atividades desenvolvi-das e que podem ser consultadas no Blog da biblioteca em http://bibliotecaunl.blogspot.pt

O Campus da FCT tem vindo a afirmar-se no mundo do empreendedorismo, do ensino e investigação, e na transferência de tecnologia e know-how, tornando-se cada vez mais num centro de convergência das comunidades vizi-nhas, que usam a Biblioteca não só pela oferta de recursos bibliográficos mas, também, pela forte componente cultural oferecida. Um es-paço aberto, de passagem e de permanências, cada vez mais integrado e integrante da comu-nidade. A Biblioteca coordena-se com o portão norte de entrada no Campus, dando as boas

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vindas aos viajantes, amenizando a relação Ci-dade/Campus. De modo natural, a Biblioteca da FCT/UNL promove fluxos de conhecimento e revaloriza ambientes internos e envolventes, tendo uma palavra a dizer na promoção de re-lações privilegiadas entre utente(s), espaço(s), ciência(s), arte(s), cultura(s) e vida(s). Assim, a espaçosa zona envolvente da Biblioteca apre-senta-se como uma interface aos que nela pas-sam e circulam, como uma verdadeira zona de fruição e reflexão.

Vários projetos que procuram a ligação direta com as escolas do concelho vão ocorrendo. O Dia Aberto da FCT/UNL é um acontecimento reconhecido. A Biblioteca tem procurado, tam-bém, atrair alunos de várias camadas etárias realizando visitas guiadas a exposições, mostras científicas, cedendo espaços expositivos (Proje-to Geração Cool).

Dois exemplos atuais, de polos de interesse para a comunidade, são a celebração do Ano Internacional da Luz (AIL) abordando temas relacionados e baseadas na luz com uma larga abrangência e em vertentes como Arte, Cultura, Ciência, Educação, Tecnologia, Natureza, Ener-gia, Agricultura, Saúde e Sustentabilidade.

Neste âmbito, em conjunto com outros setores departamentais (Departamento de Conserva-ção e Restauro, Departamento de Engenharia e Ciências do Ambiente, Departamento de Enge-

nharia Eletrotécnica, Departamento de Física, Departamento de Química, Departamento de Matemática e Departamento de Ciências da Terra), a Biblioteca da FCT/UNL coordenou uma série de atividades que cobrem uma vasta gama de propostas. Em Outubro nos dias 26, 27 e 28, os alunos do ensino secundário foram convida-dos para virem passar uma tarde à FCT e par-ticipar em experiências científicas relacionadas com a LUZ.

Outro evento abrangente será a comemoração da Semana da Cultura Científica, com duas da-tas a agendar: 23 novembro com a apresenta-ção da peça “Depois de Darwin” pelo Teatro Extremo e 24 novembro, dia em que será reali-zado um colóquio para assinalar o Dia da Cultu-ra Científica e lembrar Mariano Gago e a poesia de António Gedeão.

Deste modo, ao proporcionarmos o cruzamen-to de saberes interdisciplinares e procurando acompanhar o(s) interesse(s) das comunidades, as instituições e o público em geral muito be-neficiam destas atividades integradas. Para es-tes projetos terem sucesso são precisas ideias e, sobretudo, pessoas em contacto/interação, ‘perturbando’ o quotidiano estático estabele-cido. Tentamos identificar, cada vez mais, estes pontos de contacto e o Centro de Formação AL-MADAFORMA adivinha-se como um dos possí-veis parceiro a ser tido em conta.

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NOTÍCIA

Luís Aires por Carlos Fiolhaisno blogue “De Rerum Natura” - A natuteza das coisas1

Luís M. Aires, biólogo, mestre em Fisiologia e Bioquímica de Plantas e professor do ensino secundário em Portugal, é autor de cerca de meia dúzia de livros numa pequena editora (Edições Sílabo, em Lisboa) que, apesar de não se encontrarem facilmen-te nas livrarias (cheios de “bes-tas céleres”, O’Neill dixit) que ninguém quer, se apanham facil-mente em livrarias online, como a da Wook.

Ligado ao ensino as suas preo-cupações são eminentemente pedagógicas. As suas obras des-tinam-se a ser lidos por profes-sores embora aproveitem tam-bém a quaisquer curiosos pela ciência.

Os dois livros mais recentes, “Planeta Verde” (2013) e “Infini-to + 1” (Janeiro de 2015, escrito com Marina Almeida, professora de Matemática) mostram a ne-cessidade de cruzamento de sa-beres, a fim de que a pedagogia possa ser efectiva. A separação

das disciplinas não serve à pedagogia. Na primeira das obras referidas é exibida a ligação íntimas das Ciências da Vida, designadamente a Botânica, com a Química, com as Ciências da Terra e com as Ciências do Ambiente. E, na segunda obra, a ligação da Matemática com as outras ciências.

Em “O Planeta Verde” discute-se a relação entre plantas e ambiente. Na primeira parte definem-se plantas, desenvolvendo as suas características e, na segunda parte, fala-se da inserção delas com o ambiente natural conseguida através da fotosíntese. O ciclo de Calvin-Benson-Bassham, ou “a arte de transformar dióxido de carbono em glicose”, apesar de ser vital para toda a bioesfera, está longe de ser simples. Para todos aqueles que, neste Ano Internacional da Luz, estão interessados em sa-ber como é, recomendo vivamente a explicação de Luís M. Aires, com figuras elucidativas.

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Em “Infinito + 1” (o Infinito surge no tí-tulo como um oito deitado, dificultan-do a vida aos bibliotecários que têm de catalogar o livro) é a matemática que se revela atractiva nas mãos de um biólogo. Repare-se no subtítulo “Uma jornada de (re)descobertas da matemática à boleia do mundo em que vivemos”, que signifi-ca que quem já saiba alguma matemáti-ca pode aproveitar a boleia. Os exemplos são muito interessantes, como o capítulo das “regularidades”, que fala dos coelhos de Fibonacci. O estilo é sugestivo, à ma-neira de Rómulo de Carvalho, invocado logo no início do prefácio (ou não fosse o autor professor na Escola Secundária António Gedeão, em Almada).

É muito claro o fascínio do autor pela matemática, algo que não é muito co-mum no mundo das ciências da Vida. De resto, Luís M. Aires já tinha escrito antes, na mesma editora, “Uma História da Ma-temática” (2010) e é autor de “Conceitos de Matemática - Fundamentos para as Ciências da Vida” (2013).

A dimensão pedagógica do autor é revelada em particular nas outras suas duas obras “Disciplina na Sala de Aulas” (2010) e “19 Argumentos para Reconst(ruir) a Escola Pública” (2011). Este último livro tem prefácio de Nuno Crato, do tempo em que parecia que ele tinha um projecto para a escola pública (todos vimos, com mágoa, ao longo dos últimos quatro anos, que não tinha).

Last but not least, nestes tempos de dificuldades económicas. Todos estes livros têm um preço muito acessível, a menos de dez euros com a única excepção de “O Planeta Verde”, que custa um pouquinho mais.

Apraz-me muito divulgar a produção bibliográfica de um professor que, não contente, em dar as suas aulas, anseia por ter um magistério à distância, partilhando os seus prazeres, as suas reflexões e as suas inquietações.

1O Professor Carlos Fiolhais autorizou a divulgação deste texto que consta no Blogue da sua autoria - Rerum Natura.

In: http://dererummundi.blogspot.pt/2015/09/os-livros-de-luis-m-aires.html 30 de setembro de 2015

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NOTÍCIA

Dia Nacional da Cultura Científica Celebrar o divulgador Rómulo de Carvalho e poeta António Gedeão

No dia 24 de novembro de 2015 foi comemorado, no auditório da Biblioteca da FCT-UNL, Campus de Capari-ca, o Dia da Cultura Científica, uma iniciativa instituída em 1997 para comemorar o nascimento de Rómulo de Carvalho e difundir o seu trabalho na promoção e ensino da ciência.

O programa incluiu a comunicação “Lembrar Mariano Gago”, por Cândido Marciano e Fernanda Rollo, a fim de homenagear outra figura incontornável da cultura cien-

tífica portuguesa, físico de partículas e ministro da Ciência em governos socialistas, e considerado unanimemente como o responsável por colocar a investigação científica na agenda política do nos-so país.

No presente ano, a direção da Biblioteca da FCT-UNL decidiu dar relevância à dimensão poética da personalidade Rómulo de Carvalho, que procurou ao longo de vários anos e livros, sob o pseudóni-mo António Gedeão, uma simbiose elegante entre a ciência e a escrita versejada.

Ciente do legado que assumiu dignificar, o Agrupamento de Escolas António Gedeão, no Laranjeiro, contribuiu para o evento com a dramatização do poema Pedra Filosofal, meritoriamente prepa-rada e desempenhada por professores e alunos do 1º ciclo da Escola Básica do Laranjeiro n.º 3.

A participação do referido Agrupamento nesta iniciativa teve o apoio do Centro AlmadaForma e da Câmara Municipal de Almada, que agradecem o estímulo e abertura intelectuais revelados pelo Prof. José Moura, diretor da Biblioteca FCT-UNL, no âmbito de uma desejável colaboração escola-universidade, que se desenvolverá em 2016 com uma exposi-ção e conjunto de atividades dedicadas ao ensino prático das ciências no pré-escolar e 1º ciclo do ensino básico.

Luís AiresAgrupamento de Escolas António Gedeão

Almada

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Pedra Filosofal

Eles não sabem que o sonho

é uma constante da vida

tão concreta e definida

como outra coisa qualquer,

como esta pedra cinzenta

em que me sento e descanso,

como este ribeiro manso

em serenos sobressaltos,

como estes pinheiros altos

que em verde e oiro se agitam,

como estas aves que gritam

em bebedeiras de azul.

eles não sabem que o sonho

é vinho, é espuma, é fermento,

bichinho álacre e sedento,

de focinho pontiagudo,

que fossa através de tudo

num perpétuo movimento.

Eles não sabem que o sonho

é tela, é cor, é pincel,

base, fuste, capitel,

arco em ogiva, vitral,

pináculo de catedral,

contraponto, sinfonia,

máscara grega, magia,

que é retorta de alquimista,

mapa do mundo distante,

rosa-dos-ventos, Infante,

caravela quinhentista,

que é cabo da Boa Esperança,

ouro, canela, marfim,

florete de espadachim,

bastidor, passo de dança,

Colombina e Arlequim,

passarola voadora,

pára-raios, locomotiva,

barco de proa festiva,

alto-forno, geradora,

cisão do átomo, radar,

ultra-som, televisão,

desembarque em foguetão

na superfície lunar.

Eles não sabem, nem sonham,

que o sonho comanda a vida,

que sempre que um homem sonha

o mundo pula e avança

como bola colorida

entre as mãos de uma criança.

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NOTÍCIA

Supporting Science Teachers Across Europe

Laura HowesCo-editor “Science in School”

The European Journal for Science Teachers

Science teachers across Europe might teach to different syllabuses but many challenges will be the same for a teacher in Portugal, or Germany, or Greece. At Science in School we work to help teachers by sharing cutting edge science that can show how the science you teach is relevant to actual research, and we also share activities and practicals developed by teacher’s for their own classrooms.

As editor of Science in School, I have recently returned from an event that confirmed to me just how inspirational teachers in Europe are. The Science on Stage festival is a biennial festival held in a different country each time and this year around 350 primary and secondary school teachers met in London to share ideas and inspiration. Suddenly I was seeing what we do at Science in School playing out before my eyes. And in some cases I could see how the impact of our journal was helping science teachers as they set out their displays.

Some teachers had printed out articles they had written for the journal, others explained to be how they had taken in-spiration from an article or activity they had read in our journal and developed the work further. For example, a German team had simplified a microbial fuel cell that they found in our pages, and a Brit-ish teacher had been inspired by reading about old medicines used in monasteries

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to work with his students to investigate antimicrobial plants in the surrounding area. This is exactly what we hope for every time we put together an issue, asking ourselves and our reviewers if the articles we publish will help teachers in the classroom.

Every year we publish four issues of helpful resources and fascinating science. We send the print issue out for free across Europe but we also have everything we’ve ever published on our website. Not only this but we work with teachers to translate our materials into the European languages online, including Portuguese, and we always need more translators.

Science in School is published by EIROforum, a group of eight European research institutions, and so we have the excellent science of these organisations backing as up, as well as their financial commitment. Today, EIROforum has just committed to continuing our funding for another 5 years, so you can be sure that we will still be there to support you in the coming years. If you have articles or ideas of things that you would like published do contact us, I’m continually seeing how involvement with Science in School can help teachers improve their teaching and make connections across Europe.

And what of the Portuguese delegation at Science on Stage? Well Two Portuguese projects re-ceived a highly commended: Meet our Neighbours! – A tactile astronomy experience from Liliana Fernandes (EB de Gême in Vila Verde, Braga) (More information here) and Undertake and learn from Honorata Pereira (PTOLIVA - Escola Profissional de Oliveira do Hospital, Tábua e Arganil). If you would like to get involved, the contact details for the Portuguese organization via the Science on Stage website (http://www.science-on-stage.eu/page/display/2/2/101/PT/Portugal) and perhaps I’ll see you at the next event in two years time.

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Lágrima de preta

Encontrei uma preta

que estava a chorar,

pedi-lhe uma lágrima

para a analisar.

Recolhi a lágrima

com todo o cuidado

num tubo de ensaio

bem esterilizado.

Olhei-a de um lado,

do outro e de frente:

tinha um ar de gota

muito transparente.

Mandei vir os ácidos,

as bases e os sais,

as drogas usadas

em casos que tais.

Ensaiei a frio,

experimentei ao lume,

de todas as vezes

deu-me o que é costume:

Nem sinais de negro,

nem vestígios de ódio.

Água (quase tudo)

e cloreto de sódio.

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