10. os lugares do direito do consumidor na pauta … · exercício de posições vitais e sociais...
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10. OS LUGARES DO DIREITO DO CONSUMIDOR NA PAUTA HUMANITÁRIA
FERNANDO RODRIGUES MARTINS Doutor e Mestre em Direito Civil pela PUC/SP
Vice-presidente do Instituto de Direito Privado
Professor de Direito Civil da Universidade Federal de Uberlândia
Professor de pós-graduação da Universidade Federal de Uberlândia
Coordenador do Programa de Mestrado da Faculdade de Direito da UFU
Coordenador Pedagógico do Centro de Estudos e Aperfeiçoamento do MPMG
Promotor de Justiça em Minas Gerais
SUMÁRIO: 1. Introdução: a pessoa situada na globalidade e
o lugar do direito do consumidor 2. Mercado de
consumidores e mercado para consumidores 3. Lugares do
direito do consumidor no âmbito interno 3.1 Lugar de
experiência e cultura: fontes 3.2 Lugar político: das razões
de mercado às razões de Estado 3.2.1 Estado-governança e
o princípio da condução responsável dos assuntos
consumeristas 3.2.2 Estado-administração e
inadimplemento constitucional 3.2.3 Estado-nação: asilo
mundial 3.3 Lugar de justiça: dignidade 4. Lugar do
direito do consumidor no espaço global: a norma mais
favorável como elemento de conexão do direito
internacional dos consumidores 5. Considerações finais 6.
Referência bibliográfica
2
1. Introdução: a pessoa situada na globalidade e o lugar do direito do consumidor
O conceito de pessoa mesmo que reformulado, correspondente e em parte
tributário aos direitos humanos, especialmente na fase de internacionalização1, com ele
não se confunde. A despeito da forte interação recíproca2, pode-se afirmar sem
assombro de equívocos quanto à discrepância conceitual entre ambos, até porque
„pessoa‟, por si só, não constitui qualquer instituto jurídico, senão essência em
solidariedade (substância ontológica e subsistência)3 criadora do direito
4.
Eis a pessoa criadora e os „direitos criaturas‟5. Mas não se perca de vista que esse
sujeito real6 de direitos não é parte de situações jurídicas subjetivas tão somente nos
limites territoriais do Estado onde mora, onde exerce as atividades dia-a-dia. Ao
contrário, na sociedade de consumo (que também é de informação, em rede, de risco,
desterritorializada)7 está-se ante o „cidadão-mundo‟ à mercê da hipercomplexidade
informacional, da agressividade do mercado8, de redutos e monopólios tecnológicos e,
sobretudo, constantemente seduzido pelo consumismo insaciável9 e excludente
10.
1 PIOVESAN, Flávia. Temas de direitos humanos. 2ª ed. São Paulo: Max Limonad, 2003, p. 61.
Explica: “o sistema internacional de proteção de direitos humanos apresenta instrumentos de âmbito
global e regional, como também de âmbito geral e específico. Adotando o valor da primazia da pessoa
humana, esses sistemas se complementam, interagindo com o sistema nacional de proteção, a fim de
proporcionar maior efetividade possível na tutela e promoção dos direitos fundamentais”. 2 ARENDT, Hannah. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004. Para quem os
direitos partem da própria condição humana que é caracterizada pelo exercício de diversas atividades
fundamentais. 3 PERLINGIERI, Pietro, FEMIA, Pasquale. Nozioni introduttive e principi fondamentali del diritto
civile. 2ª ed. Napoli: Edizione Scientifiche italiane, 2004, p. 72. De perceber: “La persona è inseparabile
dalla solidarietà: la cura dell‟altro fa parte del concetto di persona”. 4 MENEZES CORDEIRO, Antônio Manuel da Rocha. Tratado de direito civil português. Parte geral.
Tomo I. Coimbra: Almedina, 2007, p. 371. Adverte: “O direito surge como obra humana, é utilizado por
pessoas, serve aos seus interesses e os seus fins e sofre as vicissitudes que a Humanidade lhe queira
imprimir. Neste sentido, a pessoa humana não constitui qualquer instituto jurídico”. 5 Magnífica expressão colhida nas aulas do Professor Renan Lotufo na Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo. 6 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho. 6ª reimp. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2004, p. 59. Ao se referir à atual linha de tendência dos direitos humanos que designa sujeitos
titulares de direito conforme situações particulares, como gênero (homem ou mulher), fases da vida
(infância e velhice) ou incapacidade (pessoas com deficiência), a qual alcunhou de „especificação‟, faz o
seguinte comentário: “com relação ao abstrato sujeito „homem‟, que já encontrara uma primeira
especificação no „cidadão‟ (no sentido de que podiam ser atribuídos ao cidadão novos direitos com
relação ao homem em geral)”. 7 BECK, Ulrich. Sociedade de risco: rumo a uma outra modernidade. Trad. Sebastião Nascimento.
São Paulo: Ed. 34. CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. Trad. Roneide Venancio Majer. São
Paulo: Paz e Terra, 1999. GONÇALVES, Maria Eduarda. Direito da informação: novos direitos e
formas de regulação na sociedade da informação. Coimbra: Almedina, 2008. 8 MARQUES, Cláudia Lima. A insuficiente proteção do consumidor nas normas de direito
internacional privado – da necessidade uma convenção interamericana (CIDIP) sobre a lei
3
Neste panorama, é visível que a busca de resguardo vital aos vulneráveis inseridos
no mercado radica no vastíssimo campo ocupado pelos direitos humanos11
: originários,
subservientes e decorrentes da concepção valorativa de pessoa12
e, via de consequência,
derivados da dimensão trípode da dignidade (solidariedade, igualdade e liberdade)13
.
Paralela a essa observação inicial, tem-se ainda transformação axiomática e teleológica
do direito internacional que aos poucos abandona o centralismo das relações entre
Estados para protagonizar como núcleo incindível de sua aplicação a concretude dos
direitos humanos nas relações entre Estados e pessoas. Trata-se do indivíduo dotado de
personalidade jurídica internacional14
e, por isso, situado juridicamente na
globalidade15
.
Cumpre também alinhavar que muito embora a consagração dos direitos humanos
perante a aldeia global seja ponto paradigmático de reconhecimento e garantia do
exercício de posições vitais e sociais básicas (essential standards) inerentes a toda
pessoa, transversalmente tem por consequência propiciar a releitura, readequação e
aplicável a alguns contratos e relações de consumo. In: Doutrinas essenciais de direito do
consumidor. v. 2. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 1.097/1.157. 9 Com apoio em Didier Ferrier, Cláudia Lima Marques e Bruno Miragem assim comentam: “Aqui há uma
cadeia de fornecedores/empresários envolvida, direta ou indiretamente, para „seduzir‟, conquistar e se
possível fidelizar”, in MARQUES, Cláudia Lima, MIRAGEM, Bruno. O novo direito privado e a
proteção dos vulneráveis. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 90. 10
SALAMA, Pierre. Novas formas da pobreza na América Latina. In: Globalização excludente:
desigualdade, exclusão e democracia na nova ordem mundial. Pablo Gentili (org.). Buenos Aires:
CLACSO, 2008, p. 181. 11
BARROSO, Luís Roberto. A dignidade da pessoa humana no direito constitucional
contemporâneo: a construção de um conceito jurídico à luz da jurisprudência mundial. 3ª
reimpressão. Belo Horizonte: Fórum 2014, p. 33. 12
Nesta esteira, verifica-se o conceito de pessoa como „valor-fonte‟, como „conexão existencial‟, como
„centro de imputação jurídica‟, respectivamente: REALE, Miguel. Teoria tridimensional do direito. 5ª
ed. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 95. PERLINGIERI, Pietro, O direito civil na legalidade constitucional.
Trad. Maria Cristina De Cicco. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 460; SILVA, José Afonso. A dignidade
da pessoa humana como valor supremo da democracia. Revista de Direito Administrativo. v. 212. Rio
de Janeiro: Renovar, 1998, p. 89/94. 13
PÉREZ LUÑO, Antonio. Derechos humanos. Estado de derecho y Constitución. Madrid: Technos,
1984. p. 48. Adverte o conceito de direitos humanos como: “conjunto de faculdades e instituições que, em
cada momento histórico, concretizam as exigências da dignidade, da liberdade e da igualdade humana,
as quais devem ser reconhecidas positivamente pelos ordenamentos jurídicos a nível nacional e
internacional”. 14
CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. O direito internacional em um mundo em
transformação. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 1.102. Analisa: “Ao longo da evolução do Direito
Internacional contemporâneo, a personalidade jurídica internacional deixou de ser monopólio dos
Estados. Tanto estes, como as organizações internacionais, como os seres humanos individual e
coletivamente, são titulares de direitos e portadores de deveres emanados diretamente do Direito
Internacional”. 15
LORENZETTI, Ricardo Luís. Teoria da decisão judicial: fundamentos de direito. Trad. Bruno
Miragem. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 209. Ensina: “O direito privado atual deve admitir
uma interrelação entre o marco institucional e os comportamentos individuais, e superar a noção de
sujeito ilhado‟ para chegar à ideia de „sujeito situado‟.
4
ressignificação dos incontáveis e circundantes ambientes necessários ao livre
desenvolvimento da personalidade.
A ideia aqui versada de ambiente não se atém exclusivamente à proposta de
autopoiese16
ou mesmo daquela designada como legitimidade (correção) do discurso17
,
conforme se percebe acentuadamente da sociologia e filosofia contemporâneas18
. Dito
de outra forma: ambientes equivalem a „lugares‟19
de inscrição20
, promoção e inserção
material do indivíduo eticamente considerado21
, se apresentando em diversas dimensões
(política, econômica, moral, jurídica, setorial, individual, comunitária, cyberspacial22
,
interna e internacional).
16
É perceptível na sociologia do direito (viés do observador externo) a categorização do sistema social
proposto por Luhmann (in LUHMANN, Niklas. Introducción a la teoría de sistemas. Trad. Javier
Torres Nafarrate. México: Universidad Iberoamericana: Iteso, 1996) ao indicar os subsistemas político,
jurídico e econômico. Também é possível verificar que os direitos humanos possam se valer da ideia de
autopoiese (ver a aproximação em TRINDADE, André Fernando dos Reis. Direitos fundamentais em
uma perspectiva autopoiética. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007). 17
HABERMAS, Jürgen. O discurso filosófico da modernidade: doze lições. Trad. Luiz Sérgio Repa.
São Paulo: Martins Fontes, 2000, 414. 18
Está bem mais ligada à contribuição da sociologia evolutiva, porque crítica e transformadora e capaz de
um „diálogo social livre de domínio e que permite a emancipação de todos os seus membros‟ (com apoio
em Habermas, BÜLLESBACH, Alfred. Princípios de teoria dos sistemas. In: Introdução à filosofia do
direito e à teoria do direito contemporâneas. Arthur Kaufmann e Winfried Hassemer, org. Lisboa:
Fundação Calouste Gulbenkian, 2002, p. 439). 19
No âmbito da ciência do direito ver GARCIA, Maria da Glória Ferreira Pinto Dias. O lugar do direito
na protecção do ambiente. Coimbra: Almedina, 2007. Situando frente ao mercado transfronteiriço:
IRTI, Natalino. Norma e luoghi: problemi di geo-diritto. Roma: Editori Laterza, 2006. Em sentido
diverso: RODRIGUES, Cunha. Lugares do direito. Coimbra: Coimbra Editora, 1999. Ressalte-se que a
ideia de „lugar‟ como categoria de disciplina é utilizada também em outros campos, neste sentido o
magnífico texto de NORA, Pierre. Les lieux de mémories. Paris: Gallimard, 1997. 20
SANTOS, Boaventura Souza. Uma cartografia simbólica das representações sociais: prolegômenos
a uma concepção pós-moderna do direito. Revista brasileira de ciências criminais. v. 13. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1996, p. 253-277. Expressa: “Todos os conceitos com que representamos a
realidade e à volta dos quais constituímos as diferentes ciências sociais e suas especializações, a
sociedade e o Estado, o indivíduo e a comunidade, a cidade e o campo, as classes sociais e as
trajectórias pessoais, a produção e a cultura, o direito e a violência, o regime político e os movimentos
sociais, a identidade nacional e o sistema mundial, todos estes conceitos têm uma contextura espacial,
física e simbólica, que nos têm escapado pelo facto de os nossos instrumentos analíticos estarem de
costas viradas para ela mas que, vemos agora, é a chave da compreensão das relações sociais de que se
tece cada um destes conceitos. Sendo assim, o modo como imaginamos o real espacial pode vir a tornar-
se na matriz das referências com que imaginamos todos os demais aspectos da realidade”. 21
NERY, Rosa Maria de Andrade. Pensamento jurídico e teoria geral do direito privado. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2008, p. 65. Profliga: “O trabalho do jurista tem sempre uma vertente ética, um
querer constantemente preocupado com valores. A ciência do direito, como toda ciência se estrutura em
princípios que, por sua vez, são informados por valores” E também MORIN, Edgar. O método: ética.
Trad. Juremir Machado da Silva. 3ª ed. Porto Alegre: Sulina, 2007, p. 21. Abordando o princípio da
inclusão manifesta: “O princípio da exclusão garante a identidade singular do indivíduo; o princípio da
inclusão inscreve o Eu na relação com o outro, na sua linhagem biológica (pais, filhos família), na sua
comunidade sociológica [...] cada um vive para si e para outro de maneira dialógica, ou seja, ao mesmo
tempo, complementar e antagônica. Ser sujeito é associar egoísmo e altruísmo”. 22
MARQUES, Cláudia Lima. Confiança no Comércio Eletrônico e a Proteção do Consumidor. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004. p. 143.
5
A relação do direito com a noção de lugar23
é de ubiquidade e tem assento
autorreferencial24
. O direito é lugar de promoção da pessoa, através de seus próprios
elementos (normas, institutos jurídicos, jurisprudência, ciência etc.)25
. E ao mesmo
tempo o direito ocupa lugar na globalidade ao lado dos demais ambientes donde,
inclusive, interage interdisciplinarmente. O que significa dizer: o direito “deixa em nós
a marca que deixamos nele”26
.
Advirta-se não se tratar aqui de infirmar ou afrontar as abalizadas investigações
epistemológicas do direito em relevantes vertentes científicas (direito como norma27
,
ordenamento28
ou sistema29
), mas apenas contribuir com a constatação de que ao direito
também incorpora a perspectiva de ponto cartográfico-decisório30
na espacialidade
mundial, o que ajuda a compreendê-lo melhor enquanto ciência adequada à dignidade
da pessoa humana31
.
O direito do consumidor, mais especificamente, também é lugar. Locus
ambivalente (mas não incoerente) onde, num âmbito interno, a pessoa vulnerável está
„situada‟ e deve encontrar os elementos normativos e positivos essenciais ao livre
desenvolvimento e onde, num âmbito maior e externo, o próprio sistema se situa na
plataforma social estratosférica, ao lado de outros ambientes, especialmente o mercado,
empoderando os vulneráveis, mesmo porque expressão de direitos humanos.
23
MENEZES CORDEIRO, Antônio Manuel da Rocha. Tratado de direito civil português. Parte geral.
Tomo I. Coimbra: Almedina, 2007, p. 63. É o caso da tópica que ensina a encontrar os lugares
argumentativos. O estudioso lusitano, após tecer a evolução temporal do pensamento Aristotélico, indica
que a utilização da tópica é relativizada considerando três consequências: i) as proposições são endoxais
(opinião geral) desconsiderando as fontes a priori; ii) a concretude das proposições se dá apenas após
encontrada a solução (sendo que no plano sistemático as proposições interferem no resultado); iii) o
método apropriado é apenas o dedutivo (expulsando outros como analogia e indução). 24
LORENZETTI, Ricardo Luís. Comércio eletrônico. Trad. Fabiano Menke. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 2004, p. 30. 25
DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Trad. Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes,
2002, p. 4. Separando a teoria analítica do direito (neutra) com a teoria do direito ética (justa). 26
SANTOS, Boaventura Souza. Uma cartografia simbólica das representações sociais: prolegômenos
a uma concepção pós-moderna do direito. Revista brasileira de ciências criminais. v. 13. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1996, p. 253-277. 27
KELSEN, Hans. Teoria pura do Direito. Coimbra: Arménio Amado, 1979. 28
BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. 6ª ed. Trad. Maria Celeste C. J. Santos.
Brasília: Universidade de Brasília, 1995. 29
CANARIS, Claus-Wilhelm. Pensamento sistemático e conceito de sistema na ciência do Direito. 2ª
ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1996. 30
FACHIN, Luiz Edson. Teoria crítica do direito civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 245.
Especialmente ao tratar do fim da concepção insular das ciências e do homem. 31
GARCIA, Maria. Limites da ciência: a dignidade da pessoa humana, a ética da responsabilidade.
São Paulo: Ed. RT, 2004, p. 211.
6
Como „lugar‟ o Direito do consumidor pode ser investigado tanto internamente
quanto em âmbito externo, em amplitude global. É dever que se impõe o enfrentamento
ao tema, não sem antes, rapidamente, compreender o mercado voltado ao consumo.
2. Mercado de consumidores e mercado para consumidores
Pode-se dizer que o fenômeno da globalização32
não é exclusivamente tendente às
tratativas econômicas. Há também os tópicos ideológicos-culturais33
com densos efeitos
regulatórios nas sociedades capitalistas (sobretudo, as emergentes) no que concerne ao
sistema democrático e a fixação de direitos e garantias fundamentais34
.
Do ponto de vista mercadológico Jorge Mosset Iturraspe35
indica que a condição
pós-moderna36
está amplamente perfilhada na ausência do Estado e na demasiada
presença do mercado. Naturalmente o Estado se afasta onde o mercado avança,
mediante a lógica econômica. Valem os exemplos mais gerais: segurança pessoal
privada substituindo a força pública; educação, em todos os níveis, paga como qualquer
outra „mercadoria‟; saúde contratada junto a estabelecimentos privados com condições
fixadas unilateralmente pelo prestador de serviços especializados, que detém
conhecimento exclusivo do setor; prisões privatizadas.
De fato, o mercado ampliou fronteiras. Não mais se trata de comércio em limites
internos, mas de ambiente econômico da globalidade, da prestação de serviços
continuada e relacional37
, da virtualidade negocial eletrônica38
e do acendrado culto ao
32
MARQUES, Cláudia Lima. A proteção dos consumidores num mundo globalizado: studium
generale sobre o consumidor como homo novus. Revista de direito do consumidor. v. 85. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2013, p. 25-62. Apresenta três possibilidades de conhecimento da globalização: i)
processo histórico de seguidos impulsos, culminando na atual fase como a mais proeminente; ii)
diferenças qualitativas e independentes entre os seguidos processos históricos; iii) processo de
emancipação histórico para teoria sociológica da globalização. 33
BECK, Ulrich. O que é globalização? Equívocos do globalismo: respostas à globalização. Trad.
André Carone. São Paulo: Paz e Terra, 1999, p. 27. Se a tendência só for econômica tratar-se-á de
globalismo e não globalização. 34
CUNHA, Djason B. Della. Crise do direito e regulação jurídica nos estados constitucionais
periféricos. Porto Alegre: Sergio Fabris, 2003, p. 9 35
MOSSET ITURRASPE, Jorge. Cómo contratar en una economía de mercado. Santa Fe: Rubinzal-
Culzoni, 2005, p. 122. Veja que os exemplos fornecidos pelo ilustre Professor argentino todos dizem
respeito a direitos fundamentais: segurança pública, educação, saúde e tratamento de detentos. 36
LYOTARD, Jean-François. A condição pós-moderna. Rio de Janeiro: José Olympio, 2004. 37
MACEDO JÚNIOR, Ronaldo Porto. Contratos relacionais e defesa do consumidor. São Paulo: Max
Limonad, 1.998, p. 189. É esse grilhão temporal e vinculante entre as partes contratuais que ainda é mais
exigente de cooperação, a considerar a confiança gerada no consumidor (parte economicamente mais
fraca e dependente de seu companheiro contratual: o fornecedor). Explica o autor: “A confiança constitui,
pois, um dos elementos do conceito de solidariedade, (...) „o dever de solidariedade impõe a obrigação
7
capitalismo financeiro39
. A indústria pensada para a produção nacional foi superada pela
empresa transnacional que apenas mantém a nacionalidade da holding e, de resto, atua
no „escritório universal‟ mimetizando e assumindo a identidade jurídica de cada país em
que se instala.
Causas para o surgimento destas empresas transnacionais – que ocupam e
alastram por diversos países – não faltam e baseiam-se notadamente na concepção
utilitarista de redução de custos a partir de vantagens pontuais e que a olhos nus
colocam em xeque direitos sociais e econômicos compreendidos como humanos ou
fundamentais. Neste sentido, destacam-se: os benefícios obtidos a partir do setor de
empregabilidade e os baixos salários dele decorrentes; a lucratividade sem limites
oriunda da aposta em valores mobiliários; o „spread‟ auferido dos financiamentos
bancários abusivos e irresponsáveis que solapam estruturas econômicas básicas de
milhares de famílias expostas ao superendividamento; a necessidade em não perder o
espaço de comércio para demais concorrentes.
Mas não só isso: a proliferação das sociedades superavitárias mundiais igualmente
ganha fôlego pela renúncia fiscal praticada por Estados indulgentes que priorizam o
mercado e desfalcam a potencialidade orçamentária comprometida com as políticas
públicas de igualdade, sustentabilidade e promoção social.
Outro traço do mercado atual é a extensão alargada pela contratação em massa e
transfronteiriça, capitaneada pelo imediatismo dos meios eletrônicos donde não se
escapa da publicidade virtual, da constante persuasão plástica e estética, do hedonismo
midiático em oferta, da perseguição dos desejos dos internautas mediante o
rastreamento de interesses outrora manifestados, dando mostras que a rede não é neutra,
nem infensa à busca incessante de resultados econômicos, e, por vezes, posta-se com
extremados riscos à dignidade humana40
.
moral e legal de agir em conformidade com determinados valores comunitários, e não apenas segundo
uma lógica individualista de maximização de interesses de caráter econômico”. 38
RICHARDS, Jason. The future of e-commerce and Colorado's government electronic transactions
act. Technology Law and Policy Review. v. 29, p. 73. 39
KUMPEL, Siegfried. A proteção do consumidor no direito bancário e no mercado de capitais.
Revista de Direito do Consumidor. v. 52. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004. 40
MARTINS, Fernando Rodrigues. Sociedade da informação e promoção da pessoa: empoderamento
humano na concretude novos direitos fundamentais. Revista de Direito do Consumidor. v. 96. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. p. 225-257. Naquela oportunidade observamos: “A sociedade da
informação está „situada‟ neste ambiente, porquanto os bens, objetos do tráfego jurídico em espaço
caracterizado como desterritorializado, são virtuais, imateriais e indiscriminadamente utilizados para o
„hiperincremento‟ mercadológico global, que tenta justificar-se em bases próprias, unicamente por
ordens espontâneas. Esses bens têm, contudo, cariz valorativo, axiomático e essencial e estão designados
8
A tecnologia da contemporaneidade (disposta, ao lado de outras, por mídias
eletrônicas, mídias digitais, geoprocessamento, biometria) figura no dualismo entre o
avanço na estratégia de tráfego e no retrocesso por ausência de controle, extremando
posições antagônicas consistentes em „confiar‟ ou „desconfiar‟ e exigentes do forte
empenho do direito na redução da insegurança e da hipercomplexidade41
.
A perplexidade é ainda em linha ascendente quando se constatam as
consequências nefastas a partir do „laissez-faire‟ estatal omissivo na promoção do
vulnerável quanto aos direitos básicos de utentes-consumidores. Impactos sobre o
aumento da pobreza, que em termos jurídicos é o rebaixamento ao acesso aos direitos
fundamentais (alienação legal)42
, são vistos e admitidos com indiferença, como no caso
da prestação de serviços públicos essenciais explorada por concessionárias privadas e
que se valem da suspensão de atendimento como meio de imediato adimplemento,
mesmo frente a crédito contestável43
.
Enfim, o mercado da pós-modernidade é um „não-fixado‟ interno, melhor
delineado como „bazar-mundo‟, regulado consuetudinariamente (lex mercatoria) e
altamente sensível aos influxos econômicos internacionais, onde juristas e câmaras
arbitrais ganham notoriedade na fixação de princípios (UNIDROIT) e de mediações44
.
Identificado o mercado por tipos generalizados, resta investigar outro alicerce da
globalização: a pessoa consumidora como agente subjetivo e existencial permanente,
como dados (pessoais), informações e conhecimento científico vocacionados ao livre desenvolvimento da
personalidade, por serem, sobretudo, fundamentais”. 41
MARQUES, Cláudia Lima. Confiança no comércio eletrônico e a proteção do consumidor: um
estudo dos negócios jurídicos de consumo no comércio eletrônico. São Paulo: RT, 2004, p. 64. 42
GARGARELLA, Roberto. El derecho a resistir el derecho. Buenos Aires: Ciepp, 2005, p. 33.
Pobreza como privação aos bens básicos. Observe: “Si tomamos en cuenta una métrica como la señalada,
según entiendo, quedamos en condiciones de afirmar que aquellos que se encuentran privados de ciertos
bienes humanos básicos enfrentan, en la actualidad, situaciones de alienación legal. Las razones que nos
permitirían justificar dicha presunción tendrían que ver con la presencia de condiciones sustantivas y
procedimentales como las que los primeros constitucionalistas reconocieron como indicativas de una
situación de alienación legal”. 43
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. 50746114520144047000 PR. 24/06/2015. Ementa:
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. SUSPENSÃO DO SERVIÇO DE ENERGIA
ELÉTRICA. FRAUDE NO MEDIDOR DE CONSUMO. DÉBITO PRETÉRITO. IMPOSSIBILIDADE.
1. O corte de energia pressupõe o inadimplemento de conta regular, relativa ao mês do consumo. 2. Para
débitos consolidados, seja por infração administrativa, seja por falta de quitação de débitos antigos, não
pode a fornecedora suspender o fornecimento de energia elétrica, serviço público essencial, como forma
de coerção para o seu pagamento, por ser meio ilegal de cobrança, sobretudo pelo que dispõem os artigos
22 e 42 do Código de Defesa do Consumidor, aplicáveis à espécie. 44
MAYER FEITOSA, Maria Luiza Pereira de Alencar. Paradigmas inconclusos: os contratos entre a
autonomia privada, a regulação estatal e globalização dos mercados. Coimbra: Coimbra Editora,
2007, p. 510. Especialmente na importância da utilização dos princípios UNIDROIT para a celebração de
convenções internacionais em matéria de representação nos contratos de compra e venda de mercadorias,
factoring internacional, leasing internacional, transportes, arbitragem comercial, mercados públicos e
infraestruturas, contratos de construção.
9
compreendo-o em diversas nuances (econômica, sociológica, psicológica e
antropológica)45
.
No viés econômico por tempos a compreensão de consumo firmou-se na figura
do homo oeconomicus cuja base residia na racionalidade desencadeada pela
„ponderação‟ entre custos e benefícios quando da escolha do produto46
. Veblen47
,
todavia, indicou que o consumo de bens nem sempre é voltado às necessidades
utilitárias ou coberto pelo exercício racional, pois há demandas lastreadas em
ostentação. Na atualidade, dentre tantas concepções neste domínio, destaca-se aquela
que perfilha o consumidor como pessoa em constante mutação48
.
A abordagem sociológica do consumidor tem no comportamento das pessoas,
conforme as variantes de sociais e demográficas, o objeto de investigação. O exame que
se faz neste sítio refere-se aos hábitos, classes ou estilo de vida, o que inicialmente
desnuda os modos de interesse e, posteriormente, abre a probabilidade da manipulação
mercadológica49
. Daí também falar em consumo como diferenciação por signos,
desviando-se da ideia de necessidade para arbitrariedade cultural50
.
Ainda no mesmo âmbito, pode-se separar „sociedade de consumidores‟ de
„sociedade de produtores‟, sendo comum na primeira a práxis coletiva do consumismo –
que se alia à constante e inalcançável busca da felicidade (desejos crescentes e
insuperáveis) – e a forte característica do tempo fragmentado51
.
No contexto da psique constata-se a „psychology of social shopping‟52
indicativa
do aprendizado individual com a coletividade de consumidores. Em pauta a
compreensão das motivações e personalidades dos consumidores, bem como o exercício
45
DORTIER, Jean-François. Dicionário de ciências humanas. Trad. Márcia Valéria Martinez de Aguiar.
São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2010, p. 95. 46
MARQUES, Cláudia Lima. A proteção dos consumidores num mundo globalizado: studium
generale sobre o consumidor como homo novus. Revista de direito do consumidor. v. 85. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2013, p. 25-62. Citando Roland Barthes expressa que a racionalidade já não é mais
característica dos consumidores atuais. 47
VEBLEN, Thorstein. Why is Economics not an Evolutionary Science? [S.l.]: The Quarterly Journal
of Economics, 1898. Disponível em: http://archive.org/details/jstor-1882952. Acesso em: 24 agosto 2015. 48
MORGAN, Mary S. Economic man as model man: ideal types, idealization and caricatures.
Journal of the History of Economic Thought, v. 28, n. 01, p. 1–27, mar. 2006. 49
HERPIN, Nicolas. Sociologie de la consommation. Paris: La Découverte, 2004. 50
BAUDRILLARD, Jean. A sociedade de consumo. Portugal: Edições 70, 2008, p. 208. 51
BAUMAN, Zygmunt. Vida para consumo: a transformação das pessoas em mercadoria. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar, 2008, p.45. 52
MADHAVARAM, S., APPAN, R. Potential implications of web-based marketing communications
for consumers implicit and explicit brand attitudes: a call for Research. Psychology & Marketing (27
:2), 2010, pp. 186-202.
10
de juízo crítico através da cognição53
. Essa última assertiva merece cuidados
considerando o nível de vulnerabilidade sempre de essencial análise.
Por fim, antropologicamente o consumidor é visto a partir das peculiaridades
etnográficas (região, religião, raça, gênero etc.) carregando consigo e adquirindo para si
produtos visíveis e estáveis culturalmente, cujo escopo associa-se em estabelecer e
manter as relações sociais54
.
Ressalte-se que tanto das projeções mercadológicas como das tendências de
identificação do consumidor realizadas anteriormente fluem direitos humanos que
reconhecem a vulnerabilidade deste agente de mercado, até porque a marca comum
entre direito e mercado é a solidariedade. É como deriva da dogmática italiana: “o
mercado vale pelo que ele é; não simplesmente porque existe que ele merece um elogio
débil ou condicionado, não se podendo confundir razões econômicas com argumentos
éticos: são estes últimos que merecem prioridade e fornecem à economia um
fundamento ético que, na concreta realidade histórica, saiba conjugar eficiência
econômica e direitos humanos, mercado e democracia”55
.
E justamente nesse novo ambiente, o consumidor, compreendido na esfera dos
direitos humanos, tornou-se portador “de papel social decisivo na sociedade de
consumo pós-moderna e global, [...] consciente de sua própria identidade cultural e de
seus direitos, ao mesmo tempo com um forte desejo de comunicação com os demais e
uma fascinação pelas suas novas liberdades econômicas”56
.
3. Lugares do direito do consumidor no âmbito interno
53
BAUER, Raymond. Consumer behavior as risk-taking. Proceedings of the 43rd. Conference of The
American Marketing Association, p.389-398, 1960. Observe a teoria do risco percebido, mesmo que
atuante na literatura de marketing tem ímpeto psicológico. Evidente que referida teoria discrepa do
princípio da vulnerabilidade e tem amplas reservas no domínio dogmático consumerista. 54
DOUGLAS, Mary, ISHERROOD, Baron. El mundo de los biens: hacia uma antropologia del
consumo. México: Gijalbo, 1989. p. 74: “En lugar de suponer que los bienes son fundamentalmente
necesarios para la subsistencia y el despliegue competitivo, asumamos que son necesarios para hacer
visibles y estables las categorías de una cultura”. 55
PERLINGIERI, Pietro, O direito civil na legalidade constitucional. Trad. Maria Cristina De Cicco.
Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 539. 56
MARQUES, Cláudia Lima. A proteção dos consumidores num mundo globalizado: studium
generale sobre o consumidor como homo novus. Revista de direito do consumidor. v. 85. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2013, p. 25-62. Enfatiza: “Erik Jayme também destacou, em seu curso de Haia em
1995, com o título Integração Econômica e Identidade Cultural, estes dois aspectos: economia e cultura
são hoje os grandes condicionantes da humanidade”.
11
Internamente o direito do consumidor como locus de promoção de humana pode
ser visto por diversas estratégias dogmáticas. Aqui interessam três lugares jurídicos que
encontram vínculo com o tema desenvolvido: i) experiência e cultura (as fontes); ii)
política (ideologia e deveres do Estado); iii) justiça (tráfego harmonioso a partir da
dignidade humana).
3.1 Lugar de experiência e cultura (as fontes)
A relação entre história e direito pode ser contextualizada em dois ângulos
procedimentais interativos: compreendendo-se as leis e textos dos juristas quando do
momento evolutivo de aplicação do direito, com preponderância da hermenêutica
histórica57
; ou observando-se a história revelada através da experiência humana do
direito, com proeminência da hermenêutica jurídica58
. Nítida representação de
entrelaçamento interdisciplinar.
Os matizes conteudísticos deste „processo histórico‟ revelam a compreensão do
passado do sistema jurídico bem como oportunizam, via de consequência, a constatação
da permanente mutação dos valores humanos (critérios)59
aptos e básicos na afirmação
crítica de direitos60
. Verba gratia, a insuficiência do chamado direito repressivo trouxe o
novo corolário na contemporaneidade: flexibiliza-se a exclusividade do modo
estruturante de conformação social (e coercibilidade inerente) para capacitação do
direito como instrumento de transformação social61
.
A ultrapassagem da dicotomia clássica entre filosofia do direito e ciência jurídica
é outro distinto exemplo desse iter evolutivo. A filosofia do direito por tempos ocupou-
se em ser „discurso de justificação‟, enquanto a ciência jurídica valeu-se das formas
57
GADAMER, Hans-Georg. Verdad y metodo: fundamentos de una hermenéutica filosófica.
Salamanca: Sígueme, 1977, p. 53. Explica que “la historia representa desde luego una frente de verdad
muy distinta de la razón teórica”. 58
WIEACKER, Franz. História do direito privado moderno. Trad. A. M. Botelho Hespanha. 2ª ed.
Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1980, p. 5. Vale o destaque: “Na medida, porém, em que a
história do direito acaba por recorrer necessariamente à própria experiência do direito, tornam-se seu
objeto quaisquer domínios da história em que, em geral, possa ser encontrada a experiência humana do
direito. Ela acaba por ser a História, sob o ponto de vista da experiência humana do direito”. 59
ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Trad. Virgílio Afonso da Silva. São Paulo:
Malheiros, 2008, p. 149. Expressa o autor “valores como critérios de valoração”. Em igual sentido:
DUQUE, Marcelo Schenk. Curso de direitos humanos: teoria e prática. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2014, p. 138. 60
FLORES, Joaquín Herrera. Teoria crítica dos direitos humanos: os direitos humanos como
produtos culturais. Trad. Luciana Kaplan. Rio de Janeiro, 2009, p. 23. 61
NONET, Philippe, SELZNICK, Philip. Direito e sociedade: a transição ao sistema jurídico
responsivo. Rio de Janeiro: Revan, 2010, p. 71.
12
epistemológicas com destaque ao normativismo e à incessante busca da validade formal
dos enunciados prescritivos62
. Filosofia e ciência jurídica eram potências de saberes
alocadas em vasos estanques e incomunicáveis impedindo o acesso da teoria do direito à
eticidade, o que não faz sentido atualmente63
.
Neste seguimento, o decurso histórico é também revelador do direito enquanto
lugar de experiência e cultura propiciando verificar “a efetividade de comportamentos
sociais em função de um sistema de regras”64
. É, sobretudo, com a concreta
participação da comunidade que o direito se torna normalmente realizável, até porque a
tensão entre valores e fatos opera e aprimora as estruturas normativas65
. Dessarte, há
constante aprendizado entre os legisladores e julgadores com as tendências axiológicas
e dinâmicas do mundo dos fatos, respeitadas as variações das respectivas funções
institucionais.
Pode-se dizer, a par disso, que a experiência é causa subjacente do direito
provocando-o a se exprimir por fontes e modelos (esses últimos, quer sejam jurídicos,
dogmáticos e hermenêuticos)66
e demonstrando que sua origem advém „muito menos‟
da ordenação racional e procedimental e „muito mais‟ da cultura67
. Vale dizer, a
realidade normativa reage à realidade social.
Por hora, é de fixar a atenção às fontes, porquanto posteriormente adentrar-se-á ao
modelo pretendido.
As fontes do direito do consumidor, como forma de revelação desta posição
jurídica no sistema68
, são multifacetadas, cogentes e fundamentais. Difusamente
dispostas estão espargidas em documentos internacionais (ONU, Resolução nº 39/248);
cânones constitucionais (CF, art. 5º, inciso XXII e art. 170, V); e, leis
infraconstitucionais (Lei federal 8.078/90 e Lei federal 8.137/90). Portanto, é de
62
KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Trad. João Batista Machado. 4ª ed. São Paulo: Martins
Fontes, 1994, p. 113. Norma positivada em dispositivos gerais e abstratos aplicáveis pelo método
subsuntivo. 63
BOBBIO, Norberto. Teoría della scienza giuridica. Turin: G. Gianpichelli, 1950, p. 15. Para
posicionar, valorar e criticar (filosofia) deve-se conhecer, ter posse dos objetos (ciência). 64
REALE, Miguel. Lições preliminares do direito. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 58. 65
REALE, Miguel. Filosofia do Direito. 5. ed. Revista e aumentada. São Paulo: Saraiva 1969, p. 53. 66
REALE, Miguel. Fontes e modelos do direito: para um novo paradigma hermenêutico. São Paulo:
Saraiva, 1994, p. 39. 67
MENEZES CORDEIRO, Antônio Manuel da Rocha. Tratado de direito civil português. Parte geral.
Tomo I. Coimbra: Almedina, 2007, p. 112. Ao tratar da parte geral e partes especiais do BGB reflete que
enquanto a primeira situa numa lógica-axiomática jusracionalista a segunda (subdividida em família,
obrigações, direitos reais e sucessões) é síntese tipicamente cultural. 68
AMARAL, Francisco. Direito civil: introdução. Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 77
13
sublinhar que essa fonte normativo-formal tem objetivo infindável: a reforma ética e
democrática do direito privado obrigacional.
Destaque a Constituição Federal como fonte, já que legitimada pelos critérios de
autoridade e razoabilidade e incorporando abertamente direitos fundamentais de órbita
privada, supera a teoria das esferas independentes e projeta-se com aplicabilidade
imediata passando a orientar todo sistema pela função informadora de seus princípios69
.
Na órbita consumerista, essa estratégia significou o reconhecimento de direito
fundamental específico à pessoa constitucionalmente designada e, reflexivamente, o
dever do Estado em protegê-la70
.
Mas as fontes do direito do consumidor não param por aí. A considerar o enorme
fluxo de situações sociais no estágio pós-moderno evidencia-se correspondentemente o
vasto número de asserções normativas. As fontes podem ser observadas tendo em vista:
i) a competência (instâncias normativas internacionais, nacionais, regionais ou
municipais); ii) a validade (normas primárias e normas regulamentares); iii) a
colmatação de lacunas (princípios constitucionais como mandados de otimização de
direitos fundamentais e ensejadores de deveres de proteção em todo sistema)71
; iv) o
uso (gerador de costume, porquanto poder normativo dos sujeitos sociais).
Valem similarmente como fontes as experiências emanadas da dogmática
consumerista inovadora e analítica72
, assim como as decisões dos tribunais superiores.
Para a última hipótese, nas cortes judiciais, precedentes propositivos às causas de
consumo ganham força vinculativa consolidando confiança e segurança jurídica nos
lindes do mercado (como se observa da ADIn 2591): valoriza-se a ratio decidendi pela
exuberância do argumento na parte motivacional da sentença73
.
Gize-se, como fonte singular, o Código de Defesa do Consumidor (Lei federal nº
8.078/90): dotado de cláusulas gerais que exigem a participação „ativa‟ do juiz mediante
69
LOREZENTTI, Ricardo Luís. Teoria da decisão judicial: fundamentos de direito. Trad. Bruno
Miragem. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 83. 70
MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no CDC: o novo regime das relações contratuais. 4ª ed. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 776 71
SILVA, Virgílio Afonso da. A constitucionalização do direito: os direitos fundamentais nas
relações entre particulares. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 146. Faz observação de que a doutrina
constitucional alemã utiliza a expressão deveres de proteção (e não direitos de proteção), muito embora
entenda ser tese incompatível com a melhor interpretação dos direitos fundamentais. 72
Ver por todos BENJAMIN, Antônio Herman Vasconcelos, MARQUES, Cláudia Lima, BESSA,
Leonardo Roscoe. Manual de direito do consumidor. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. 73
PULIDO, Carlos Bernal. O direito dos direitos: escritos sobre a aplicação de direitos
fundamentais. São Paulo: Marcial Pons, 2013, p. 144. MARINONI, Luiz Guilherme Bittencourt.
Eficácia vinculante: a ênfase à ratio decidendi e à força obrigatória dos precedentes. In: Revista de
processo. v. 184. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 9-41.
14
o reenvio de dispositivos de modo inter e intra sistêmicos, viabilizando decisões
sincrônicas e diacrônicas; metodologicamente compreendido como código (e não
consolidação) até porque modulado com parte principiológica e parte dispositiva;
teleologicamente (ratio legis) voltado apenas para o direito privado obrigacional a partir
da sociedade de consumo (sem o desiderato de alcançar outros ramos como família,
sucessões etc.); escrito com linguagem apropriada ao setor; vocacionado ao amplo
diálogo com as demais fontes (art. 7º), muito embora goze de preponderância
adjudicante dado o reconhecimento valorativo da qualidade de „norma de ordem pública
e interesse social‟.
É verdade, todavia, que a exuberância de fontes anuncia o desafio da
complexidade do ordenamento a ensejar e exigir coerência. Para tanto cabe observação
prudente: é a Constituição Federal que concede unidade ao sistema através dos
princípios, os quais, dotados de densa carga axiológica, conformam as demais
disposições e legislações e harmonizam as interfaces discrepantes rumo à solução
congruente e adequada74
. Esse pluralismo, posteriormente, será abordado.
Enfim, as fontes jurídicas relativas ao direito do consumidor refletem a realidade:
o trunfo da minoria no ambiente do mercado. Observe-se que, a despeito da quantidade
de consumidores ser arrasadoramente superior ao número de fornecedores, de forma
qualitativa não expressa a mesma força nos tráfegos econômicos75
, o que torna exigente
a defesa desse agente. Jorge Reis Novais76
explicita: “sem Estado de Direito, a minoria
seria inevitavelmente discriminada e as concepções minoritárias suprimidas ou
perseguidas, mas, no final, e como a história exuberantemente demonstra, isso
ocorreria não apenas, e só isso seria decisivo, em violação ao princípio da dignidade
74
PERLINGIERI, Pietro, O direito civil na legalidade constitucional. Trad. Maria Cristina De Cicco.
Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 205. 75
CANARIS, Claus-Wilhelm. A liberdade e a justiça contratual na sociedade de direito privado. In
Contratos: Actualidade e evolução (Congresso Internacional organizado pelo Centro Regional do Porto da
Universidade Católica Portuguesa), Coord. Antônio Pinto Monteiro, Porto: Universidade Católica
Portuguesa, 1997. Posição contrária, a considerar que “assim, por exemplo, o pequeno consumidor pode,
em princípio, dirigir-se a outro vendedor, escolher uma outra mercadoria ou renunciar à conclusão do
contrato; até que ponto é que esta pode ir, é particularmente revelador nos casos em que a concorrência
e o mercado forçam grandes empresas a vendas sem lucro e mesmo com perda”. 76
NOVAIS, Jorge Reis. Direitos fundamentais: trunfos contra a maioria. Coimbra: Coimbra Editora,
2006, p. 36. Em sentido semelhante LORENZETTI, Ricardo Luís. Teoria da decisão judicial. São
Paulo: 2003, p. 103 ao tratar do „paradoxo da positivação‟, explica; “há alguns direitos que são baseados
na maioria, já que sobre eles não pode opiniões razoavelmente contrárias, como por exemplo o direito à
vida [...] No entanto, há numerosos direitos que não gozam de aceitação majoritária, e que têm categoria
normativa por serem expressões das minorias ou da concepção pluralista da sociedade. Assim, os
direitos fundamentais não têm necessariamente fundamentação majoritária”.
15
da pessoa humana que funda as nossas comunidades políticas, mas também em prejuízo
do progresso moral, científico, político ou artístico da sociedade no seu conjunto”.
3.2 Lugar político: das razões do mercado e às razões de Estado
Neste ponto cumpre perscrutar três projeções reflexivas quanto ao envolvimento
político e ideológico na permanente construção do direito do consumidor. Inicialmente,
propõe-se constatar a participação da sociedade civil na realizabilidade da legislação
pertinente ao direito do consumidor. Em passo seguinte, se examinará a expansão do
número de pessoas consumidoras pela adoção de políticas públicas e a necessidade de
promovê-las neste estágio. Por fim e em rápida divisão por tópicos, cabe enfrentar as
posições institucionais-normativas do Estado no cumprimento dos deveres
constitucionais a ele tocados nesta seara.
Direto ao primeiro ponto é de ressaltar que a dogmática não pode ser indiferente à
conclusão de que o direito é forma de manifestação política e ideológica. É que, como
ensina Bobbio77
, a ordem jurídica pressupõe a existência de um poder político provido
de legitimidade (democracia) e que, sobretudo, realize a pacificação social pelo ideal de
justiça.
Referida opinião reflete exatamente o direito do consumidor como lugar de
política, mesmo porque “toda estrutura jurídica reproduz o jogo de forças sociais e
políticas, bem como os valores morais e culturais de uma dada organização social”78
,
sendo que a lei é “expressão de interesses e de práticas do poder”79
.
Entretanto, cuida-se consignar que a constituição jurídico-cultural e notadamente
política (antes que deontológica) do direito do consumidor deu-se muito mais por
intenso exercício de cidadania (status activus)80
do que por origem exclusiva do
beneplácito de legisladores. Diversamente da grande maioria das leis, o locus legis do
direito do consumidor descende de inúmeros fatores enraizados no plexo da sociedade
pós-moderna, os quais vão desde a „ordem espontânea popular‟81
, passando por
77
BOBBIO, Norberto. Teoria geral da política: a filosofia política e as lições clássicos. Michelangelo
Bovero (org.). Trad. Daniela Beccaccia Versiani. Rio de Janeiro: Elsevier, 200, p. 232. 78
WOLKMER, Antônio Carlos. Ideologia, Estado e Direito. 4ª ed. São Paulo: RT, 2003, p. 155. 79
WARAT, Luiz Alberto. Introdução geral ao direito: interpretação da lei: temas para uma
reformulação. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1994, p. 22. 80
ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Trad. Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: 2004,
p. 267. 81
ALPA, Guido. Il diritto dei consumatori. Roma-Bari: Laterza, 1995, p. 3.
16
posicionamentos setoriais, institucionais, intelectuais, amplamente baseados na
mobilização social como forma de precipitar efeitos no clássico direito privado82
.
Em outras palavras, o direito do consumidor é exemplo vivo e concreto que
desnecessário o recurso a subterfúgios como o „uso alternativo do direito‟83
, isto porque
a ciência jurídica dotada de eticidade e democracia pode atender exatamente aos anseios
de justiça, de igualdade e responsabilidade abandonando a perspectiva reduzida outrora
existente entre direito dos „dominadores‟ para dever dos „dominados‟84
.
Em segunda referência, interessa a receptividade do direito do consumidor aos
carentes. Ao tratar do „homo novus‟, Cláudia Lima Marques anuncia que “ao analisar o
desenvolvimento do Brasil, percebe-se que essa sociedade, extremamente complexa,
procura se desenvolver e transformar seu modelo histórico de atraso, através da
inclusão de uma grande parcela de sua população na sociedade de consumo global.
Isso esclarece, de certa forma, o porquê de a proteção do consumidor ser tão
importante (tanto econômica, quanto politicamente) no Brasil (como atesta sua
inclusão na lista de direitos fundamentais coletivos e do cidadão, art. 5. °, XXXII,
da CF de 1988)” 85
.
Neste ponto, o entrelaçamento entre política e direito do consumidor se encontra
em avanço pleno. Com as políticas públicas de admissão a bens e serviços nos últimos
vinte anos, os componentes das classes sociais menos favorecidas atingiram a posição
jurídica de pessoas consumidoras. Planos de habitação e moradia, inclusão digital,
ingresso promocional no ensino superior privado, saúde do trabalhador em contratos
empresariais coletivos, titularidade em pequenas propriedades rurais, plataformas de
capacitação e fomento de crédito, entre outras medidas difundidas pelos poderes
82
RIOS, Josué. A defesa do consumidor e o direito como instrumento de mobilização social. Rio de
Janeiro: Mauad, 1998, p. 41. Há excerto interessante: “a década de 70, assim, caracteriza este cenário de
grande desenvolvimento da nossa economia e industrialização e marca também, em nosso país, o início
da defesa do consumidor como reivindicação da sociedade civil. E, como conseqüência, é a partir de
então que começam a ser discutidos os projetos para uma real legislação de proteção ao consumidor que
se tornarão concretos mais tarde”. 83
LYRA FILHO, Roberto. O que é Direito. São Paulo: Brasiliense, 1982. Ver ainda
BARCELLONA, Pietro. O egoísmo maduro e a insensatez do capital. Trad. Sebastião José
Roque. São Paulo: Ícone, 1995. Observe: “os direitos sociais não são expressão da justiça
exatamente porque parece impossível definir, no quadro de referência institucional caracterizado pela constituição dos direitos civis e políticos, uma ideia de justiça que possa ser partilhada por
todos e que não assinale uma passagem a um outro tipo de organização social, a um outro tipo de socialização do indivíduo”. 84
GOMES, Orlando. A crise do direito. São Paulo: Max Limonad, 1955. 85
MARQUES, Cláudia Lima. A proteção dos consumidores num mundo globalizado: studium
generale sobre o consumidor como homo novus. Revista de direito do consumidor. v. 85. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2013, p. 25-62.
17
públicos com a ampla participação da iniciativa privada desobstruíram parte do
subconsumo86
elevando o volume de incluídos no mercado.
Essa significativa expansão da população de consumidores enseja cuidados
diversos, dos quais se destacam quatro variantes: concretude ao princípio do crédito
responsável, prevenção ao superendividamento e à insolvência do consumidor face à
extrema facilidade na celebração de negócios jurídicos de natureza financeira87
; risco de
extinção de políticas públicas de igualdade88
com rebaixamento dos favorecidos às
classes anteriores; insuficiência no atendimento pelos órgãos de defesa do consumidor;
e, principalmente, incremento da massa crítica e volume de reclamações.
Por óbvio que mencionadas consequências provindas daqueles que mais sofrem
repercutirão na órbita dos órgãos públicos de promoção e defesa dos consumidores e,
especialmente, nas comunidades acadêmicas e científicas, desencadeando posturas
analíticas e propostas políticas. Uma e outra reagem cada qual na respectiva
funcionalidade. Os órgãos públicos, sempre com menor estrutura frente à demanda, se
articulam mediante conclaves, audiências públicas, expedientes administrativos, mas
não deixam de apresentar projetos para o aperfeiçoamento do nível de tutelas89
. As
instituições de ensino (responsáveis pela produção, preservação e transmissão de
conhecimento científico) operam através de escritórios de assessoria jurídica popular,
grupos de pesquisas, amostragens por estatísticas e aprofundamento no direito
comparado90
, com resultados exitosos na adequação da legislação de consumo.
86
MOSSET ITURRASPE, Jorge. Cómo contratar en una economía de mercado. Santa Fe: Rubinzal-
Culzoni, 2005, p. 138. Enfrenta problema a ser resolvido na área de consumo. Observe: “preocupa el „no
consumo‟ y el „subconsumo‟. Los marginados del mercado. Los que no tienen acceso al mismo. Los que
son vulnerables, no por estar em el mercado sino por ausência”. 87
LIMA, Clarissa Costa de. O tratamento do superendividamento e o direito de recomeçar dos
consumidores. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. 88
FRISCHEISEN, Luiza Cristina Fonseca. Políticas públicas: a responsabilidade do administrador e
do Ministério Público. São Paulo: Max Limonad, 2000, p. 36. Justifica: “(...) a ordem
social constitucional estabelece obrigações para o Estado, mas também para toda a coletividade.
Orienta a administração na implementação das políticas públicas necessárias ao efetivo exercício dos
direitos sociais, fixando pontos que não podem ser descumpridos e tampouco modificados, sob pena de
inconstitucionalidade ou ilegalidade, resguardando o cidadão, oferecendo-lhe garantia quanto à omissão
do Estado”. 89
A criação da rede PROCON em Minas Gerais é exemplo de articulação política e crítica de agentes que
atuam na promoção dos consumidores. Igualmente, o Fórum Nacional de PROCON‟s, acompanhado de
departamentos ligados ao Ministério da Justiça (SENACON, DPDC), permite a formatação de políticas
nacionais de incremento no atendimento ao consumidor e resolução de conflitos consumeristas de grande
dimensão territorial. 90
Melhor exemplo não há que os grupos de pesquisa científicos liderados por Cláudia Lima Marques na
UFRGS os quais têm contribuído significamente com propostas jurídicas lege ferenda na promoção da
pessoa humana consumidora (mais detidamente no combate ao superendividamento e na disciplina do
comércio eletrônico) bem como a louvável apresentação da proposta brasileira de convenção
interamericana de direito privado internacional para promoção do consumidor junto à OEA.
18
Não há dúvidas, portanto, da reorientação socioeconômica das populações outrora
afastadas do espaço-consumo. Pierre Bourdieu91
em pesquisa quanto ao lugar social (tão
próxima ao presente estudo) disserta: “o espaço ou, mais precisamente, os lugares e os
locais do espaço social reificado, e os benefícios que eles proporcionam são resultados
de lutas dentro dos diferentes campos. Os ganhos do espaço podem tomar a forma de
ganhos de localização, eles mesmo susceptíveis de ser analisados em duas classes: as
rendas (ditas de situação) e os ganhos (de posição ou de classe)”.
É como se alerta: são direitos que uma vez conquistados92
não podem retroceder.
Por consequência está-se diante da proibição de retrocesso de direitos fundamentais
sociais (irreversibilidade do espaço jurídico adquirido e ocupado), a partir da qual
alçada à posição jurídica de pessoa consumidora é dever que se impõe a manutenção
neste „status novus‟93
.
A terceira e última vertente é analisada em tópicos e respeita à posição jurídica do
Estado (enquanto manifestação de poder) na promoção do consumidor, o que demonstra
a existência não apenas de razões de mercado, mas igualmente razões de Estado. Os três
estágios são discrepantes, contudo entre eles viceja algo em comum: o dever de
proteção do consumidor.
Por conseguinte, o dever de proteção surge da exigência constitucional dirigida ao
Estado de garantia ao consumidor, enquanto direito fundamental e humano, contra as
possíveis agressões propiciadas por terceiros. Tenha-se que os direitos fundamentais
não contêm apenas imposições de não intervenção estatal, mas, além disso,
objetivamente postulados de proteção, justamente a evitar a proibição de omissão94
ou
lacunas de proteção95
. Em qualquer das posições a seguir comentadas poderá haver
quebra do dever de proteção por parte do Estado.
91
BOURDIEU, Pierre. A miséria do mundo. Vários tradutores. p. 163 92
CAMBI, Eduardo, LIMA, Jairo Néia. Constitucionalismo inclusivo: o reconhecimento do direito
fundamental à inclusão social. Revista de Direito Privado. v. 60. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2014, p. 11/35. 93
QUEIROZ, Cristina. O princípio da não reversibilidade dos direitos fundamentais sociais:
princípios dogmáticos e prática jurisprudencial. Coimbra: Coimbra Editora, 2006, p. 69. 94
MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: estudos de
direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 12. Classifica os deveres de proteção em: dever de
proibição; dever de segurança; dever de evitar riscos. Noutro sentido NOVAIS, Jorge Reis. Direitos
sociais: teoria jurídica dos direitos sociais enquanto direitos fundamentais. Coimbra: Editora
Coimbra, 2010, p. 41. Na concepção deste autor os deveres estatais são subdivididos em dever de
respeitar (condutas negativas a favor da liberdade); dever de proteção (obrigação positiva para que os
direitos fundamentais não sejam violados por terceiros); dever promoção (prestações positivas do Estado
para garantia de direitos). 95
MARQUES, Cláudia Lima e MAZZUOLI, Valério de Oliveira. O consumidor-depositário infiel, os
tratados de direitos humanos e o necessário diálogo das fontes nacionais e internacionais: a
19
3.2.1 Estado-governança e o princípio da ‘condução responsável’ dos assuntos
consumeristas
Enquanto governo cumpre ao Estado, por intermédio dos respectivos chefes do
poder executivo, legislativo e judiciário a realização de políticas vocacionadas à ampla
tutela do consumidor. Numa visão clássica, além de a ideia de governo estar tão
somente ligada à figura do executivo, percebe-se que neste caso há maior liberdade do
agente político: apenas segue as pautas ideológicas próprias e a conveniência do jogo
partidário.
Contudo, a grandeza do „comando‟ político – a bem da democracia – é apenas
verificada quando se abandonam pretensos paradoxos (governo/oposição;
maioria/minoria) para eticamente adotar as melhores soluções legiferantes e éticas ao
cidadão, independentemente da versão partidária ou institucional interna que for
predominante.
Põe-se em relevo, pois, a boa governança no lugar do governo. Observa-se,
evolutivamente, no centro das decisões o princípio da condução responsável96
de
assuntos que respeitam ao consumidor como agente econômico qualificado pelos
direitos humanos. Os poderes da República devem se guiar mediante os seguintes
termos: incessante respeito aos direitos humanos, aos princípios democráticos e ao
Estado de Direito; adoção do princípio do desenvolvimento sustentável e equitativo
pressupondo gestões transparentes e responsáveis com os recursos naturais, humanos,
econômicos e financeiros; processos de decisão fundamentados e claros; primado do
direito na gestão de recursos; combate constante à corrupção.
A boa governança logra axiologicamente sentido mais humanizado, impondo aos
agentes políticos a prática accountability, ou seja, o dever duradouro de prestação de
contas entre os órgãos públicos mutuamente (horizontal) e a partir da iniciativa popular
(vertical)97
.
primazia da norma mais favorável ao consumidor. In: Revista de Direito do Consumidor. v. 70. São
Paulo: Revista dos tribunais, 2009, p. 93-138. 96
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. ‘Brancosos’ e interconstitucionalidade: itinerários dos
discursos sobre a historicidade constitucional. 2ª ed. Coimbra: Almedina, 2008, p. 329. 97
BENTO, Leonardo Valles. Governança e governabilidade na reforma do Estado: entre eficiência e
democratização. Barueri: Manole, 2003.
20
No Brasil a boa governança ainda é simbólica. Projetos de leis essenciais à
melhoria da qualidade de vida dos consumidores estacionados no parlamento, sofrendo
impactos de „lobbies‟ que tumultuam o agir democrático e ético; ausência de varas
judiciais especializadas nas relações de consumo; dotação de melhor estrutura aos
órgãos públicos especializados para a efetiva promoção do consumidor, são, entre
outros, quadros que evidenciam a necessidade de gestões públicas responsáveis na área
de defesa do vulnerável.
3.2.2 Estado-administração e inadimplemento constitucional
Sendo a democracia regime de leis para a promoção humana e não de
arbitrariedade do homem, faz-se necessário que a administração pública cumpra os
ditames constitucionais e infraconstitucionais que refiram ao consumidor, enquanto
agente econômico desigual e vulnerável.
Não faz sentido ao poder público incumprir as disposições normativas que
garantem ao consumidor a concretude de seus direitos, isto porque é na lei que se
encontra não apenas o limite de atuação, senão a própria condição e base justificante da
administração coexistir junto ao demais elementos do Estado.
Como em outra oportunidade foi afirmado o desrespeito às disposições de
proteção ao consumidor “pela administração configura hipótese de inadimplemento
constitucional. Como visto trata-se de observação não recente na dogmática jurídica,
especialmente no âmbito do direito constitucional, porquanto a própria Constituição
estabelece não apenas direitos, mas igualmente deveres, obrigações e garantias, que na
maioria das situações jurídicas são tocadas ao próprio Estado. A título de ilustração, os
deveres já são convocados na chamada do Capítulo I do Título II da Constituição
Federal, portanto deveres fundamentais”98
.
Impende nesta oportunidade relembrar que a Constituição Federal cria para o
Estado o dever de promover a defesa do consumidor (CF, art. 5º, inciso XXXII). Essa
significativa inserção positiva no principal texto normativo do país revela que
reflexivamente, ao consumidor, socorrerão direitos. Há a dinâmica de „troca de lugares‟
na evolução conceitual do Estado liberal para o Estado solidário, porquanto o portador
98
MARTINS, Fernando Rodrigues. Controle do patrimônio público. 5ª ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, p. 92.
21
do direito fundamental passa a ser o titular que exige deveres, enquanto a administração
vê-se como destinatária reciprocamente desse encargo.
Enumeram-se as possibilidades: direito à administração pública transparente
(evitando-se a nebulosidade de matérias que traduzam conteúdo consumerista); direito à
administração pública dialógica (especialmente para garantir aos consumidores e
fornecedores ampla defesa e contraditório nos processos em que forem partes); direito à
administração pública preventiva (para atuar antecipadamente aos possíveis danos
oriundos de riscos conhecidos por produtos e serviços introduzidos no mercado); direito
à administração pública precautória (interventiva positivamente nas hipóteses de riscos
desconhecidos em produtos e serviços); direito à administração pública protetiva (como
instituição voltada aos direitos fundamentais na classificação procedimentalista99
);
direito à administração pública sancionatória (na fiscalização da produção,
industrialização, distribuição e publicidade de produtos e serviços no mercado e
aplicação dos dispositivos relativos aos tipos administrativo-consumeristas
desrespeitados); direito à administração pública corretiva (na atuação administrativa e
judicial de controle às cláusulas contratuais abusivas); direito à administração pública
informativa (na obrigatoriedade de informar sobre produtos ou serviços perigosos à
vida, saúde e segurança do consumidor); direito à administração pública diretiva
(presente no mercado como resultado da política nacional de relações de consumo);
direito à administração proba e eficiente (agindo mediante condutas éticas universais e
com alcance de resultados na resolução de conflitos da área de consumo)100
.
Gize-se que o incumprimento dos inúmeros direitos dos consumidores pela
administração pública pode corresponder à quebra do princípio da legalidade e, via de
consequência, a eventualidade de imputação por improbidade administrativa do agente
público. Todavia, evidente que para tal conclusão há ampla necessidade de sindicar os
fatos, afastando-se do legalismo estrito rumo à interpretação sistêmica pelo bloco da
legalidade101
.
3.2.3 Estado-nação: asilo universal
99
ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Trad. Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: 2004,
p. 488. Propõe: “é condição de uma proteção jurídica efetiva que o resultado do procedimento proteja os
direitos materiais dos titulares de direitos fundamentais envolvidos”. 100
FREITAS, Juarez. Discricionariedade administrativa e o direito fundamental à boa
administração pública. São Paulo: Malheiros, 2007, p.20. 101
SUNDFELD, Carlos Ari. Direito administrativo ordenador. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 22.
22
No âmbito externo cumpre ao Estado honrar os tratados internacionais que é parte.
Até então, para uma visão meramente conservadora, os tratados serviam às relações
entre Estados, sendo aplicados e interpretados à luz da ordem pública interna
exclusivamente valorativa à soberania. Tem-se direito internacional onde as forças
estatais ignoravam a pessoa102
.
O advento da globalização, como se viu, não brandiu apenas efeitos
mercadológicos, mas, sobretudo, axiomas humanitários. No campo mundial o
conhecido Direito das Gentes revelou-se o direito internacional dos direitos humanos,
onde as normas internas e internacionais devem ser coordenadas no sentido de maior
efetividade à dignidade da pessoa humana.
Da observação acima concluiu-se que as garantias fundamentais à pessoa estão
situadas na globalidade, cabendo a qualquer Estado-nação obedecê-las, porquanto a
ordem universal é aquela provida na base ontológica por direitos humanos. Neste
sentido, a anterior máxima de Montesquieu declinando “quando vou ao país, não
examino se há boas leis, mas se as lá que existem são executadas, pois boas leis há em
toda parte”103
, faz jus à seguinte releitura: quando vou a outro país examino se os
direitos humanos internacionais são respeitados.
Corrobora esse raciocínio, a propósito, o princípio estabelecido pelo art. 28 da
Declaração Universal de 1948, pelo qual „toda a pessoa tem direito a que reine, no
plano social e no plano internacional, uma ordem capaz de tornar plenamente efetivos
os direitos e as liberdades enunciadas na presente Declaração‟. Efetivamente, isso
cabe ao direito do consumidor reconhecidamente direito humano, conforme assento
havido em 1973 pela Comissão de Direitos Humanos das Organizações das Nações
Unidas e corroborado sucessivamente pelo rol de diretrizes editadas pela mesma
organização internacional através da Resolução 39/248 de 10.04.1985104
.
102
PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos, o princípio da dignidade humana e a Constituição
brasileira de 1988. In doutrinas essenciais de direitos humanos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011,
p. 305. Reflete sobre a passagem da soberania hobbesiana (Estado) para a soberania kantiana (cidadania
universal). 103
MONTESQUIEU. O espírito das leis. São Paulo: Nova Cultural, 1997. 104
Além do reconhecimento da vulnerabilidade, decorrem as diretrizes: i) proteção aos consumidores
frente aos riscos e prejuízos à sua saúde e segurança; ii) promoção e proteção dos interesses econômicos
dos consumidores; iii) acesso à informação adequada para escolha; iv) educação para o consumidor; v)
reparação e compensação do consumidor; vi) liberdade de constituição de grupos e organizações para
defesa coletiva.
23
Portanto, a menção ao Estado-nação tem por desiderato intensificar o discurso do
direito internacional dos direitos humanos e posicionar o país no cenário mundial com
destaque, permitindo ampla atividade nas tratativas da órbita global de consumo e
proporcionando adequado tratamento normativo aos estrangeiros (mesmo que não
residentes no país) já que justamente no tráfego internacional a vulnerabilidade ainda
mais se agrava, considerando a diferença da língua, do sistema jurídico, os problemas de
entrega e garantia.
Por enquanto, a legislação brasileira ainda não se emancipou como asilo universal
para resolução dos conflitos internacionais referente aos contratos de consumo. A Lei de
Introdução das Normas no Direito Brasileiro se mostra vetusta, incompatível com a
carga de direitos humanos adotada pela Constituição Federal e inadequada para a
melhor proteção do consumidor105
. Mas já há solução porvir, inclusive junto a OEA106
.
De qualquer forma é visível que a Constituição Federal tem avanços a serem
explorados, consoante se vê das cláusulas de abertura para reconhecimento e
internalização dos tratados de direitos humanos (CF, art. 5º, §§ 2º e 3º) como direitos
fundamentais, o que identicamente ocorre com os „princípios‟ nela adotados (CF, art. 5,
§ 2º c/c CF, art. 4º, inciso II), ao lado do rol principal (CF, art. 5º ut CF, art. 17),
construindo um conceito de bloco da constitucionalidade107
.
3.3 Lugar de justiça (dignidade)
O direito do consumidor é lugar de justiça ou de realizabilidade de equilíbrio
possível. Com apoio em Habermas108
percebe-se que o conceito filosófico de dignidade
105
MARQUES, Cláudia Lima. A insuficiente proteção do consumidor nas normas de direito
internacional privado – da necessidade de uma convecção interamericana (CIDIP) sobre a lei
aplicável a alguns contratos e relações de consumo. In: doutrinas essenciais de Direito do consumidor.
v.2. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 1097-1157. 106
Ver neste sentido a proposta brasileira de convenção interamericana de direito internacional privado
sobre a lei aplicável a alguns contratos com consumidores (CIDIP): temas e discussões no fórum de
expertos da OEA, liderada por Cláudia Lima Marques junto a UFGRS. 107
MARQUES, Cláudia Lima e MAZZUOLI, Valério de Oliveira. O consumidor-depositário infiel, os
tratados de direitos humanos e o necessário diálogo das fontes nacionais e internacionais: a
primazia da norma mais favorável ao consumidor. In: Revista de Direito do Consumidor. v. 70. São
Paulo: Revista dos tribunais, 2009, p. 93-138. 108
HABERMAS, Jürgen. The concept of human dignity and the realistic utopia of human rights. In.:
Metaphilosophy, v. 41, n. 4. Oxford, July, 2010, p. 465. Manifesta: “É um fato interessante que foi
somente após a segunda guerra mundial que o conceito filosófico da dignidade humana, que tinha já
existia na antiguidade e adquiriu sua atual expressão canônica em Kant, encontrou sua maneira em
textos de direito internacional e as constituições nacionais recentes. Por outro lado, a noção de
dignidade humana caracterizado como um conceito jurídico, nem nas declarações do século XVIII
clássica dos direitos humanos nem nas codificações do século XIX”. Do original: “It is an interesting fact
that it was only after the Second World War that the philosophical concept of human dignity, which had
24
da pessoa humana existe desde a antiguidade, entretanto como valor jurídico apenas
após a segunda guerra mundial foi possível observá-lo. O conteúdo da dignidade passa
da abstração para a concretude justamente através dos direitos humanos cujo escopo é a
resolução das repetidas formas de humilhação, opressão e exclusão no meio social. E o
alcance dos direitos humanos origina-se pela problematização, discurso e organização
dos menos favorecidos para posterior acesso às entidades internacionais.
O direito do consumidor brasileiro, como exaustivamente se viu, tem parte desta
estratégia filosófica comunicacional e situa-se como hábil modelo de materialidade da
dignidade da pessoa humana. Os traços desta afirmação são tranquilos de evidenciar:
reconhecimento da vulnerabilidade; tratamento pela igualdade substancial; modelo
propositivo de evitabilidade de danos; tutela da confiança como marco de objetivação
das legítimas expectativas despertadas; repressão à publicidade enganosa; proteção
contra práticas mercadológicas caracterizadas pelo exercício inadmissível de posição
jurídica; hermenêutica tendente ao consumidor; positivação de rol aberto para
consecução de nulidades de cláusulas abusivas (portanto, opressoras e de exclusão)109
.
Não apenas pela entrada em vigor do Código de Defesa do Consumidor que se
percebe „novus locus‟ de justiça. É que o direito do consumidor também se eleva
axiologicamente como assaz princípio de política econômica. Observe que a ordem
econômica encartada na Constituição Federal compreende a atuação dos conglomerados
empresariais e demais agentes de mercado, estabelece o poder de regulamentação do
Estado e fixa diretrizes de concessões e permissões de prestação de serviço público,
desde que legitimados por determinados princípios, dentre eles a defesa do consumidor
(CF, art. 170, V).
A reflexão acima expressa relevo em argumentar justamente que o direito do
consumidor tem lugar como vetor de equilíbrio das posições no mercado, o que
already existed in antiquity and acquired its current canonical expression in Kant, found its way into
texts of international law and recent national constitutions … By contrast, the notion of human dignity
featured as a legal concept neither in the classical human rights declarations of the eighteenth century
nor in the codifications of the nineteenth century”. 109
MIRAGEM, Bruno Nubens Barbosa Miragem. Nulidade das cláusulas abusivas nos contratos de
consumo: entre o passado e o futuro do direito do consumidor brasileiro. Revista de Direito do
Consumidor. v. 79. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 41-77. Quanto à análise da abusividade
menciona que o direito consumidor brasileiro adotou o critério da subjetividade e não materialidade,
potencializando a tutela do vulnerável. Observe: “No caso do direito brasileiro, trata-se de uma
discriminação justificada e constitucionalmente assegurada para que se estabeleça uma igualdade por
intermédio do Direito, sem prejuízo da identificação de situações de abuso, e mesmo de cláusulas
abusivas em relações jurídicas entre iguais, pela incidência da norma geral do art. 187 do CC/2002”.
25
enfraquece discursos individualizados de que a órbita econômica é cosmos, provida de
regulação própria e independente do sistema jurídico110
.
Aqui cabe último aviso, a realizabilidade da justiça tanto pela aplicação –
incidência do Código de Defesa do Consumidor – como pela ponderação – enquanto
princípio de ordem econômica – jamais será indicativa de que para determinada
hipótese única solução ou adjudicação é prevista, até porque como se constata da
metodologia francesa quanto à existência ou não de determinado direito três alternativas
são sempre possíveis: “la réponse affirmative, la réponse alternative, la réponse
dubitative”111
.
Assim o arrimo em que se assenta o CDC como lugar da justiça é inverso à causa
que lhe deu origem: a sociedade de massa. A razão da pós-modernidade é delirante,
longe de julgamento, automática, caracterizada pelo desejo passageiro e pela
despersonalização, apagando a subjetividade do consumidor; mera racionalidade
técnica112
. Mas a razão embutida normativamente na lei protetiva é mesmo aquela
problematizada, ponderada, argumentativa, aristotélica, enfim phronésis113
.
4. Lugar do direito do consumidor no espaço global: a norma mais favorável como
elemento de conexão do direito internacional dos consumidores
O direito tem como premissa o território onde está incorporado.
Mas também se lança além-fronteiras, basta verificar as questões relativas à
contratação eletrônica, contratos internacionais, contratos de turismo, tudo a caracterizar
o contínuo processo de globalização. Daí possível entreolhar as hipóteses do „geo-
direito‟114
.
Não retornando a tantas linhas já escritas, é prudente relembrar que justamente
nos tratados de direitos humanos se verifica o „espaço-mundo‟ do consumidor. Além
das determinações da Organização das Nações Unidas, podem ser vislumbrados
110
IRTI, Natalino. L’ordine giuridico del mercato. Roma: Laterza, 2004, p. 102. Na dicotomia naturalis
e artificialis quanto ao mercado aposta na liberdade à luz da solidariedade. Ressalta que a luta contra o
monopólio, abuso de posição dominante a acordo de redução ou supressão da concorrência garante ao
mesmo tempo a liberdade de iniciativa econômica e a liberdade escolha do consumidor. 111
GRIDEL, Jean-Pierre. La dissertation le cas pratique et la consultation em droit privé: méthodes
– illustrations. Paris: Dalloz, 1996, p. 173. 112
ADORNO, Theodor W., HORKHEIMER, Max. Dialética do esclarecimento. Trad. Guido Antonio
de Almeida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985, p. 113. 113
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco – V, 1 – 30. Trad. Pietro Nassetti. São Paulo: Martin Claret, 2007. 114
IRTI, Natalino. Norma e luoghi: problemi di geo-diritto. Roma: Editori Laterza, 2006.
26
exemplos havidos na União Européia (Ato Único Europeu, Tratado de Maastricht,
Tratado de Amsterdã) que conferem promoção a esse agente vulnerável forçando a
reunião dos Estados Europeus na unidade de desígnios, inclusive considerando a
hierarquia supraconstitucional e a aplicação imediata de referidos documentos.
É verdade que do ponto de vista das Américas os dois grandes blocos comerciais
caminham separados. O NAFTA mesmo disciplinando questões acerca de
consumidores, o faz em forma de fomento. Perante o Mercosul observa-se o Tratado de
Assunção que criou mercado comum entre Argentina, Brasil, Uruguai e Paraguai, no
entanto não disciplinou à época a promoção do consumidor. Esse último Tratado foi
adendado pelos Protocolos de Las Leñas e de Ouro Preto. Tenha-se, contudo, que no
Protocolo de Santa Maria que houve maiores referências à proteção do consumidor,
contudo de forma precária se comparada à legislação interna brasileira.
Não há dúvidas que para a economia globalizada há necessidade de direito
humanitário globalizado. E, por isso, não deve haver dualismo entre o direito interno e o
direito internacional no que respeita aos tratados de direitos humanos, o que, aliás, se vê
com tranquilidade a partir do art. 7º do Código de Defesa do Consumidor que estimula o
diálogo entre as normas internas e as internacionais. Neste sentido, é a própria
legislação citada que torna hermeneuticamente aceitável a aplicação da norma que seja
mais favorável ao vulnerável, titular que é de direitos humanos.
Explica Cançado Trindade: “no presente domínio de proteção a primazia é da
norma mais favorável às vítimas, seja ela norma de direito internacional ou de direito
interno. Este e aquele interagem em benefício dos seres protegidos. É a solução
expressamente consagrada em diversos tratados de direitos humanos, da maior
relevância por suas implicações práticas”115
.
5. Considerações finais
O escopo do presente estudo não foi o de adentrar a fundo nos tratados de direitos
humanos existentes na globalidade especialmente a favor dos consumidores. Nem
mesmo dissertar sobre a internalização dos mesmos, muito embora se refira à
Constituição aberta e ao bloco da constitucionalidade.
115
CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Direito internacional e direito interno: sua
interpretação na proteção dos direitos humanos. Instrumentos internacionais de proteção dos direitos
humanos. São Paulo: Centro de Estudos da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo, 1996, p. 34
27
O objetivo proposto é demonstrar que o direito do consumidor ocupa denso
espaço na pauta humanitária quer seja no âmbito interno, quer no internacional,
revelando-se como ciência jurídica compatível com o atual paradigma da
contemporaneidade, centrado na pessoa humana.
No Brasil o Código de Defesa do Consumidor demonstrou-se norma altamente
propositiva para a promoção do mais fraco e mesmo vigente há mais de vinte e cinco
anos consegue ser atualíssimo no acompanhamento das demais disciplinas, como no
caso do direito internacional dos direitos humanos.
Pois bem, deixou-se para última abordagem a questão do modelo jurídico,
derivativo do direito do consumidor como lugar de experiência e cultura. A proposta é
clara: o modelo que se opta está metodologicamente ligado à hermenêutica dialógica
das fontes, com apoio nas lições de Erik Jayme e que tem por base o pluralismo, a
identidade cultural, as normas narrativas e o retorno dos sentimentos116
, o que garante a
subjetividade num espaço tão globalizado.
Esse modelo se coordena e complementa os elementos de conexão ainda
existentes (e insuficientes) no direito internacional privado brasileiro (domicílio, local
da coisa, lugar de celebração do contrato: LINDB, art. 7º): é o modelo jurídico
normativo previsto no art. 7º do CDC que abre campo de incidência para qualquer outro
dispositivo que seja mais benéfico à tutela do vulnerável. O interessante é que estando
numa „lei de ordem pública‟ (CDC, art. 1º) acaba por nos ensinar que a ordem pública
não está na norma, senão no que ela tutela.
Portanto, é de compreender que experiência e cultura na mundialidade e no lugar
sistêmico do direito permitem a formatação de novo modelo jurídico de auxílio à
solução de conflitos: a norma mais favorável ao vulnerável, não importando se o
conflito se dê entre normas de âmbito internacional e normas de âmbito interno ou
mesmo em duas ou mais normas de âmbito interno.
O que chama a atenção, o que diferencia a investigação científica, o que dá novo
sentido ao direito é qualidade humanitária do melhor direito ao vulnerável, o que, de
certa forma, é comum às normas favor debilis.
Enfim, não se trata de subverter a ordem a favor do „discurso pontual dos direitos
116
MARQUES, Cláudia Lima. Diálogo das fontes como método de interpretação e aplicação das leis.
In: Diálogo de fontes: do conflito à coordenação de normas no direito brasileiro. Cláudia Lima Marques
(coord.). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 26.
28
humanos‟, mas de efetivar o sistema jurídico como lugar de habitação, promoção e
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