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Edição especial

ISSN 0100-3364

Informe AgropecuárioUma publicação da EPAMIG

v.26 2005 Edição especialBelo Horizonte-MG

Apresentação

Editorial ........................................................................................................................... 3

Entrevista ......................................................................................................................... 4

O café num outro retrato do Brasil rural: o lugar da agricultura familiar

France Maria Gontijo Coelho .......................................................................................... 9

Abordagem sistêmica e pesquisa participativa na agricultura familiar:

ferramentas para o desenvolvimento

Carlos Armênio Khatounian e Dimas Soares Júnior ........................................................... 17

Sistemas de produção agroecológicos e orgânicos dos cafeicultores familiares

da Zona da Mata mineira

Paulo César de Lima, Irene Maria Cardoso, Helton Nonato de Souza, Waldênia de Melo

Moura, Eduardo de Sá Mendonça e Anôr Fiorini de Carvalho ........................................... 28

Pesquisas em sistemas agroecológicos e orgânicos da cafeicultura familiar

na Zona da Mata mineira

Waldênia de Melo Moura, Paulo César de Lima, Helton Nonato de Souza,

Irene Maria Cardoso, Eduardo de Sá Mendonça e Josete Pertel ...................................... 46

Tecnologias alternativas para o controle de pragas do cafeeiro

Madelaine Venzon, Edmar de Souza Tuelher, Antônio de Pádua Alvarenga e

Angelo Pallini ............................................................................................................... 76

Manejo das doenças do cafeeiro para a cafeicultura familiar

Vicente Luiz de Carvalho, Rodrigo Luz da Cunha e Sara Maria Chalfoun ........................... 86

Desenvolvimento de tecnologias de colheita e pós-colheita

para a cafeicultura familiar

Roberta Martins Nogueira, Sérgio Maurício Lopes Donzeles e Juarez de Sousa e Silva ..... 102

Certificação e comercialização de cafés da agricultura familiar

Sérgio Pedini ................................................................................................................... 118

SumárioSumárioSumárioSumárioSumário

Informe Agropecuário Belo Horizonte v. 26 p.1-124 2005

A agroecologia baseia-se nos elementos

da ciência moderna e no conhecimento dos

próprios agricultores. A partir da investiga-

ção participativa ocorre uma combinação de

saberes que resulta em uma série de prin-

cípios, que se transformam em tecnologias.

Os agricultores são tão importantes nes-

se processo quanto os pesquisadores. Isso

implica em troca de paradigma científico, de

prática, de métodos de trabalho, de relação

com a terra e com o seu produto.

Dentre as características mais marcantes

dos cafeicultores familiares estão o baixo uso

de insumos, a aversão ao risco e a preocupação

estratégica com a diversificação da produção.

Essas características garantem estabilidade

econômica e sustentabilidade da produção

e da família. Grande parte deles desenvolve

sistemas agroecológicos e orgânicos de pro-

dução. Essa perspectiva exige que os técni-

cos e pesquisadores repensem os conceitos e

procedimentos de pesquisa e de extensão.

Esta edição especial do Informe Agro-

pecuário foi elaborada a partir de conceitos

sobre agricultura familiar e das experiências

dos trabalhos participativos com cafeiculto-

res e cafeicultoras desenvolvidos por insti-

tuições públicas, ONGs, associações e sindi-

catos de produtores e agricultores rurais.

Paulo César de Lima

Waldênia de Melo Moura

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GOVERNO DO ESTADO DE MINAS GERAISAécio Neves da Cunha

Governador

SECRETARIA DE ESTADO DE AGRICULTURA,PECUÁRIA E ABASTECIMENTO

Silas BrasileiroSecretário

Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas GeraisPresidência

Baldonedo Arthur NapoleãoDiretoria de Operações Técnicas

Manoel Duarte XavierDiretoria de Administração e Finanças

Luiz Carlos Gomes GuerraGabinete da Presidência

Carlos Alberto Naves CarneiroAssessoria de ComunicaçãoRoseney Maria de Oliveira

Assessoria de Desenvolvimento OrganizacionalRonara Dias Adorno

Assessoria de InformáticaRenato Damasceno Netto

Assessoria JurídicaPaulo Otaviano Bernis

Assessoria de Planejamento e CoordenaçãoJosé Roberto Enoque

Assessoria de Relações InstitucionaisArtur Fernandes Gonçalves Filho

Auditoria InternaCarlos Roberto Ditadi

Departamento de Transferência e Difusão de TecnologiaCristina Barbosa Assis

Departamento de PesquisaMaria Lélia Rodriguez Simão

Departamento de Negócios TecnológicosArtur Fernandes Gonçalves Filho

Departamento de Prospecção de DemandasJúlia Salles Tavares Mendes

Departamento de Recursos HumanosFlávio Luiz Magela Peixoto

Departamento de Patrimônio e Administração GeralMarlene do Couto Souza

Departamento de Obras e TransportesLuiz Fernando Drummond Alves

Departamento de Contabilidade e FinançasCelina Maria dos Santos

Instituto de Laticínios Cândido TostesGérson Occhi

Instituto Técnico de Agropecuária e CooperativismoMarcello Garcia Campos

Centro Tecnológico do Sul de MinasEdson Marques da Silva

Centro Tecnológico do Norte de MinasMarco Antonio Viana Leite

Centro Tecnológico da Zona da MataJuliana Cristina Vieccelli de CarvalhoCentro Tecnológico do Centro-Oeste

Cláudio Egon FacionCentro Tecnológico do Triângulo e Alto Paranaíba

Roberto Kazuhiko Zito

A EPAMIG integra oSistema Nacional de Pesquisa Agropecuária,

coordenado pela EMBRAPA

A contribuição doagricultor familiar para o sucesso

da cafeicultura brasileira Esta edição especial do Informe Agropecuário sobre Cafeicultura

Familiar vem marcar os 30 anos desta publicação, com um tema de

extrema importância para a economia mineira e brasileira. É abordado

não só o produto de maior peso na agropecuária de Minas Gerais e

na balança de exportações do Brasil, mas também a importância do

agricultor familiar nessa cadeia produtiva.

A cafeicultura brasileira é constituída, em sua maioria, por pe-

quenos agricultores, que correspondem a 75% dos produtores de café.

Desse total, cerca de 60% referem-se à cafeicultura familiar, com

área de até cinco hectares. Esse segmento, que responde por 25% da

produção brasileira, segundo dados do Programa Nacional de Forta-

lecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), produzirá, aproximadamente

10 milhões de sacas de café em 2005, contribuindo com R$2,5 bilhões

para o PIB agrícola, nos preços atuais. A cafeicultura familiar emprega

em torno de 1,8 milhão de pessoas/ano e prioriza o desenvolvimento

de sistemas agroecológicos de produção.

Dados recentes indicam que o aumento crescente da demanda

por produtos livres de agrotóxicos tem impulsionado a agricultura agro-

ecológica e orgânica no Brasil, que privilegia a preservação ambien-

tal, a biodiversidade, os ciclos biológicos e a qualidade de vida do

homem.

A partir desses dados, a EPAMIG lança esta edição, comemorativa

de 30 anos, sobre Cafeicultura Familiar, com o objetivo de mais uma

vez cumprir sua missão de levar aos produtores e a toda a sociedade

conhecimento, tecnologia e informação gerados pela pesquisa agro-

pecuária.

Baldonedo Arthur NapoleãoPresidente da EPAMIG

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Governo do Estado de Minas Gerais

Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento

Sistema Estadual de Pesquisa Agropecuária - EPAMIG, UFLA, UFMG, UFV

Assinatura anual: 6 exemplares

Aquisição de exemplares

Setor Comercial de Publicação

Av. José Cândido da Silveira, 1.647 - Cidade Nova

Caixa Postal, 515 - CEP 31170-000 Belo Horizonte - MG

Telefax: (31) 3488-6688

E-mail: [email protected] - Site: www.epamig.br

CNPJ (MF) 17.138.140/0001-23 - Insc. Est.: 062.150146.0047

O Informe Agropecuário é indexado naAGROBASE, CAB INTERNATIONAL e AGRIS

© 1977 EPAMIG

ISSN 0100-3364

INPI: 006505007

Informe Agropecuário. - v.3, n.25 - (jan. 1977) - . - BeloHorizonte: EPAMIG, 1977 - .

v.: il.

Cont. de Informe Agropecuário: conjuntura e estatísti-ca. - v.1, n.1 - (abr.1975).

ISSN 0100-3364

1. Agropecuária - Periódico. 2. Agropecuária - AspectoEconômico. I. EPAMIG.

CDD 630.5

CONSELHO DEDIFUSÃO DE TECNOLOGIA E PUBLICAÇÕESBaldonedo Arthur NapoleãoLuiz Carlos Gomes GuerraManoel Duarte XavierCarlos Alberto Naves CarneiroMaria Lélia Rodriguez SimãoArtur Fernandes Gonçalves FilhoJúlia Salles Tavares MendesCristina Barbosa AssisVânia Lacerda

DEPARTAMENTO DE TRANSFERÊNCIA

E DIFUSÃO DE TECNOLOGIA

Cristina Barbosa Assis

DIVISÃO DE PUBLICAÇÕESEDITOR

Vânia Lacerda

COORDENAÇÃO TÉCNICA

Paulo César de Lima e Waldênia de Melo Moura

REVISÃO LINGÜÍSTICA E GRÁFICA

Marlene A. Ribeiro Gomide e Rosely A. R. Battista Pereira

NORMALIZAÇÃO

Fátima Rocha Gomes e Maria Lúcia de Melo Silveira

PRODUÇÃO E ARTE

Diagramação/formatação: Rosangela Maria Mota Ennes,Maria Alice Vieira e Fabriciano Chaves Amaral

Capa: Letícia MartinezFotos da capa: Erasmo Pereira eAcarpa (Associação dos Cafeicultores da Região de Patrocínio)

PUBLICIDADEDécio CorrêaAv. José Cândido da Silveira, 1.647 - Cidade NovaCaixa Postal, 515 - CEP 31170-000 Belo Horizonte-MGTelefone: (31) [email protected]

Informe Agropecuário é uma publicação daEmpresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais

EPAMIG

É proibida a reprodução total ou parcial, por quaisquer meios, sem

autorização escrita do editor. Todos os direitos são reservados à

EPAMIG.

Os artigos assinados por pesquisadores não pertencentes ao quadro

da EPAMIG são de inteira responsabilidade de seus autores.

Os nomes comerciais apresentados nesta revista são citados apenas

para conveniência do leitor, não havendo preferências, por parte da

EPAMIG, por este ou aquele produto comercial. A citação de termos

técnicos seguiu a nomenclatura proposta pelos autores de cada artigo.

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IA - O que motivou a criação da Amart

e da Apat?

Margarida Pinheiro – A Amart sur-

giu do movimento de mulheres rurais

organizado em Tombos, em 1987.

Inicialmente, o trabalho estava mais

relacionado com o reconhecimento da

profissão da mulher como agricultora

e trabalhadora rural. A partir de 1992,

com a criação da Apat, também passa-

ram a ser estimuladas a produção agrí-

cola agroecológica e o beneficiamento

dos produtos, visando à comercialização

e à geração de renda para as mulheres.

Em 1998, esse movimento teve parti-

cipação ativa na construção do Plano

Municipal de Desenvolvimento Rural

A importância do associativismona promoção da cidadania dos

agricultores familiares

Sustentável do município de Tombos.

Com a evolução de seus trabalhos e

com uma representação no Conselho

Municipal de Desenvolvimento Rural

do município, sentiu-se a necessidade

de criar uma estrutura jurídica própria,

fundando-se, em 10 de dezembro de 2000,

a Amart, para organizar e promover a

cidadania das trabalhadoras rurais.

Vanderli Pinheiro – A Apat foi fun-

dada em março de 1992, com a finalida-

de de trabalhar a produção, beneficia-

mento e comercialização dos produtos

da agricultura familiar, sem a utilização

de venenos. A criação da Associação

foi fruto de um trabalho mais antigo que

nasceu na década de 70. Os agriculto-

res tornaram-se dependentes do mer-

cado, deixaram de produzir o próprio

alimento e dedicaram-se à monocul-

tura do café. Outro problema sério na

época foi a perda da qualidade de vi-

da e da saúde desses agricultores, pela

carência alimentar e pelo uso intensi-

vo de agrotóxicos. Iniciamos o trabalho

nas comunidades refletindo sobre esses

problemas e propondo alternativas ao

uso de venenos e à dependência da mo-

nocultura do café. Começamos com as

experiências de comercialização cole-

tiva, com o apoio do Sindicato dos Tra-

balhadores Rurais e, na década de 90,

criamos a Associação como uma con-

seqüência do desenvolvimento dessa

Margarida Alves de Oliveira Pinheiro é pedagoga,

formada pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras

(Fafile), de Carangola, MG. É diretora da Associação

das Mulheres Agricultoras e Trabalhadoras Rurais (Amart)

e vice-presidente da Associação de Pequenos Agriculto-

res e Trabalhadores Rurais (Apat). É produtora de café

orgânico e agroecológico no Sítio Vista Alegre, no mu-

nicípio de Tombos, MG. Coordena trabalhos do curso

de extensão em Ciências Homeopáticas, da Universida-

de Federal de Viçosa (UFV).

Margarida exerce uma forte

liderança entre os agricul-

tores familiares da Zona da

Mata de Minas Gerais, coor-

denando o trabalho de gê-

nero daquela região.

Vanderli Pereira Pinheiro é agricultor familiar e conduz uma

pequena propriedade no distrito de Catuné, MG, onde mantém,

com sua família, uma produção diversificada, que inclui sistemas

de lavoura de café, banana, hortaliças e criação de pequenos

animais. Atuou como líder sindical até 1992, quando direcionou

os trabalhos para a estruturação da Associação dos Pequenos

Agricultores e Trabalhadores Rurais (Apat), de Tombos e Pedra

Dourada e exerce, atualmente, sua presidência. Participa de

fóruns regionais e estaduais de formulação de políticas públicas

para a agricultura familiar. Faz

parte da coordenação do Fórum

Nacional da Economia Solidária,

gestora da política nacional para

o setor, executada pela Secretaria

Nacional de Economia Solidária,

órgão do governo federal.

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proposta de organização dos agriculto-

res, especialmente para a comerciali-

zação dos produtos agroecológicos da

agricultura familiar.

IA - Quais são os objetivos dessas duas

Associações?

Margarida Pinheiro – A Amart tem

como objetivo construir uma política

de cidadania para as mulheres rurais

de Tombos, articulada com o Sindicato

dos Trabalhadores Rurais de Tombos e

Pedra Dourada, com a Apat, a Associa-

ção Regional dos Trabalhadores Rurais

da Zona da Mata e o Centro de Tecno-

logias Alternativas da Zona da Mata

(CTA/ZM), em torno de um projeto

solidário para a agricultura familiar.

A Amart atua no desenvolvimen-

to de trabalhos nas seguintes linhas:

formação e capacitação de agricultoras;

incentivo à produção agroecológica e

orgânica, com o uso de biofertilizan-

tes e preparados homeopáticos; promo-

ção da cidadania; beneficiamento e

comercialização da produção; grupo de

geração de renda; saúde e alimentação

alternativas e promoção da eqüidade nas

relações sociais de gênero e geração.

Vanderli Pinheiro – A Apat desen-

volve ações junto aos diversos grupos

de produção dentro dos princípios agro-

ecológicos, principalmente eventos de

formação, acompanhamento técnico e

experimentação participativa.

Na área de beneficiamento temos

uma agroindústria que hoje conta com

um laticínio, um setor de processamen-

to de cana, para produção de cachaça e

açúcar mascavo, um setor de beneficia-

mento de arroz, uma cozinha comuni-

tária e uma pequena torrefadora de café.

Atualmente, estamos buscando recur-

sos para estruturar melhor o setor de

processamento de café.

Na área de comercialização mante-

mos um mercado varejista no municí-

pio de Tombos, o Mercado do Produtor,

onde são fornecidos leite e derivados

para os mercados locais, e exportamos

produtos agroecológicos para o mercado

do Rio de Janeiro. Recentemente, entra-

mos também no mercado institucio-

nal e, através de uma parceria com a

Companhia Nacional de Abastecimento

(Conab) e com as prefeituras locais, esta-

mos fornecendo produtos agroecoló-

gicos para escolas, creches e Apaes dos

municípios de Tombos e Pedra Dou-

rada.

IA - Quais são os principais reflexos das

ações empreendidas pelas Associa-

ções?

Margarida Pinheiro – As principais

atividades econômicas do município de

Tombos eram a produção de café e de

leite. O trabalho de formação e capacita-

ção da agricultura familiar fomentou a

diversificação da produção. Com o for-

talecimento da estratégia de comerciali-

zação no varejo local, a partir da criação

do Mercado do Produtor, pela Apat,

organização da qual as mulheres tam-

bém participam, houve o incentivo à

diversificação da produção nas proprie-

dades rurais. Essa diversificação deixou

de ser apenas uma estratégia de segu-

rança alimentar da família e passou a

ser valorizada como estratégia de geração

de renda e sustentabilidade econômica,

assegurando produtos e comerciali-

zação ao longo de todo o ano e não ape-

nas na safra do café.

Com isso, grupos de mulheres têm

conquistado sua autonomia na família

e nas organizações locais. A vida das

famílias melhorou em vários aspectos,

assim como a vida nas comunidades e

nas organizações da agricultura familiar.

Vanderli Pinheiro – Os principais

produtos para o mercado da Agricultu-

ra Familiar da região são o café, o leite

e a cana-de-açúcar. Entretanto, com as

ações empreendidas de incentivo à di-

versificação da produção junto às famí-

lias participantes da Apat, outros sis-

temas de produção passaram a ser va-

lorizados nas propriedades dos agri-

cultores. A diversificação da produção

contribuiu para o aumento também da

participação das mulheres, que em nos-

sa região, tradicionalmente, são mais res-

ponsáveis pela produção de verduras

e pequenos animais. Nosso trabalho é

organizado em grupos de produção e,

embora a diversificação seja uma reali-

dade em muitas propriedades, a maioria

ainda é para o auto-abastecimento da

família. Para o fornecimento de produtos

para o Mercado do Produtor e para o

mercado institucional, existe um plane-

jamento da produção para a comer-

cialização com os grupos de produ-

ção.

IA - Por que a Amart e a Apat incen-

tivam a diversificação de culturas

e a utilização de sistemas agro-

ecológicos e orgânicos?

Margarida Pinheiro – A diversifi-

cação da produção com qualidade é a

saída para a agricultura familiar, pois

com as oscilações do preço do café e

do leite, os outros produtos garantem

renda, sustentabilidade e melhoria na

qualidade de vida da família.

A preferência por sistemas de pro-

dução agroecológico e orgânico deve-

se ao fato de considerarmos a proprie-

dade como um organismo vivo. Dessa

forma, preservamos a biodiversidade,

as matas, as nascentes e o solo. Esta-

mos buscando sempre o manejo susten-

tável dentro da propriedade, garantindo

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a produção de alimentos saudáveis, a

manutenção da saúde, a qualidade de

vida e a tranqüilidade da família, pois

na agricultura tradicional a produção

do agricultor fica muitas vezes compro-

metida com a compra de insumos.

Vanderli Pinheiro – Acreditamos

que não existe contradição entre a di-

versificação e a qualidade da produção.

Pelo contrário, ao pensar a propriedade

como um todo, na sustentabilidade do

sistema e nas práticas agroecológicas,

buscamos a qualidade em todos os pro-

dutos. Estamos profundamente envol-

vidos com a comercialização desses

produtos e entendemos que a questão

da qualidade diz respeito também às

exigências do mercado. Como as terras

da agricultura familiar são pequenas e

na impossibilidade de determinar o

preço de comercialização do café, nem

sempre produtividade e qualidade re-

presentam garantia de renda para a

família do agricultor. Também, por isso,

a diversificação é fundamental, sem des-

cuidar da qualidade de cada produto.

A produtividade do café é importante,

mas a viabilidade econômica da lavoura

e a sustentabilidade econômica do sis-

tema da agricultura familiar devem ser

constantemente avaliados. Não adianta

ter produtividade, se não cuidarmos da

saúde do ser humano, do futuro da ter-

ra e da qualidade do produto e se não

tivermos mercado diferenciado que

garanta a melhoria da renda da agri-

cultura familiar.

Com relação à adoção de sistemas

agroecológicos e orgânicos, acreditamos

que a produtividade das lavouras não

pode ser o único parâmetro para avaliar

se um sistema é bom para os agricul-

tores. Há muitos anos percebemos que

temos outras medidas igualmente

importantes para nossa vida e nosso

futuro. Nossas terras e recursos são pe-

quenos e temos que conservá-los para

nós e para nossos filhos; temos que pro-

duzir sempre e manter a saúde da famí-

lia. Muitos agricultores têm problemas

de saúde com o uso de agrotóxicos.

Assumimos também o compromisso

com o consumidor, que deseja ter um

produto de maior qualidade, livre des-

ses insumos químicos que têm trazido

problemas para a sua saúde. O merca-

do, atualmente, valoriza o produto livre

de agrotóxicos e esta é uma oportuni-

dade que consideramos importante,

oferecendo um produto diferenciado,

socialmente justo e de qualidade ali-

mentar.

IA - Quais os principais produtos da

agricultura familiar gerados pelo

trabalho dessas Associações?

Margarida Pinheiro – A Amart pos-

sui grupos de geração de renda que for-

necem hortaliças, frutas, frango, ovos,

temperos, produtos de panificação, do-

ces variados, multimistura, artesanatos

em tecido e palha, picles e outros pro-

dutos para a comercialização na Apat,

os quais são fornecidos para a rede de

intercâmbio ecológica do Rio de Janeiro,

para o mercado local e para o projeto

da Conab, que abastece entidades bene-

ficentes, como a Apae, os asilos e as

merendas escolares de Tombos e Pedra

Dourada, MG.

Vanderli Pinheiro – A Apat não

produz, mas incentiva a produção das

famílias agricultoras, beneficia os prin-

cipais produtos e organiza a produção

para a comercialização. Os principais

produtos são o café, a cana e o leite.

A diversificação para o mercado é gran-

de e inclui grãos, hortaliças, frutas, aves

e ovos, além de processados caseiros,

como doces e produtos de padaria.

IA - Qual a diferença entre os sistemas

agroecológico e orgânico?

Margarida Pinheiro – O sistema de

produção agroecológico considera a

propriedade como um todo. Preocupa-

se com a vida dos seres vivos e com a

natureza. Já o sistema orgânico, além

das preocupações citadas, não diversi-

fica a produção, pois pode-se certificar

apenas uma cultura, desde que sejam

cumpridas as exigências legais.

Vanderli Pinheiro – A visão agro-

ecológica é mais ampla, resultado de

uma mudança de visão da maneira de

produzir, de relacionar com a natureza,

com os meios de produção e com os

nossos semelhantes. O sistema orgâ-

nico, para nós, diz respeito a uma téc-

nica, a uma forma de produzir sem a

utilização de insumos químicos, que

resulta em um produto de melhor qua-

lidade nutricional. Um produtor pode

ter um sistema orgânico em uma parte

da propriedade, como uma horta por

exemplo, mas manter outros sistemas

convencionais de produção na mesma

propriedade. Nesse caso o produtor tem

um sistema orgânico, mas não agro-

ecológico.

IA - Quais os ganhos obtidos pelos agri-

cultores familiares com a adoção

dos sistemas agroecológico e orgâ-

nico de produção?

Margarida Pinheiro – Os ganhos,

em termos de produtividade, ainda não

podem ser quantificados. Agora, é rea-

lidade os ganhos em termos de preser-

vação da natureza, da água, das plantas

medicinais, da qualidade do solo, devi-

do ao reaparecimento de plantas nati-

vas, aumento de microorganismos e da

fauna, que contribuem de forma signifi-

cativa para o equilíbrio ecológico. Outro

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ganho diz respeito à saúde, devido ao

consumo de alimentos saudáveis, pelo

uso da fitoterapia e pela menor depen-

dência dos produtos alopáticos e quí-

micos.

Vanderli Pinheiro – Um ganho fun-

damental para todos foi verificado na

saúde dos agricultores. Há alguns que

até hoje sofrem as seqüelas do uso de

venenos, inclusive aqueles que nunca

usaram esses produtos, mas foram con-

taminados pelos dos vizinhos.

A nossa organização e a valorização

dos produtos agroecológicos da agri-

cultura familiar levaram a um ganho

importante da auto-estima dos agricul-

tores e agricultoras. Em nosso municí-

pio, isto é evidente, pois, até bem pou-

co tempo, ser da roça, do meio rural,

era sinônimo de atraso, de ignorância.

Hoje, temos conhecimento e uma cultu-

ra que tem seu valor reconhecido, não

apenas pela sociedade local, mas tam-

bém pelos próprios agricultores.

Outro ganho fundamental é a melho-

ria da renda das famílias, resultado da

diversificação da produção e da comer-

cialização organizada dos produtos da

agricultura familiar.

IA - No caso específico do café, como

ficou a produtividade com a ado-

ção de sistemas agroecológico e

orgânico?

Margarida Pinheiro – No início do

desenvolvimento desses sistemas ocor-

reu um período de transição, no qual a

produtividade caiu. Atualmente, com

o maior ganho de conhecimento e com

a melhoria da qualidade do solo, a pro-

dutividade passou a crescer gradativa-

mente.

Vanderli Pinheiro – A produtivida-

de diminuiu, mas obtivemos outros re-

sultados, outros ganhos que são impor-

tantes. A redução do custo da produção,

por exemplo, com a diminuição das

capinas, a melhoria na conservação do

solo e a maior estabilidade da produção,

em nossa avaliação, tem compensado a

redução de produtividade das lavou-

ras.

IA - Quais as principais dificuldades da

cafeicultura familiar, desde a pro-

dução até a comercialização?

Margarida Pinheiro – Existem difi-

culdades em várias fases: desde a produ-

ção e transporte de compostos orgânicos,

até a falta de infra-estrutura adequada

para secagem, armazenamento, benefi-

ciamento e questões de logística. Outro

problema é a inexistência da certificação

de produtos agroecológicos. No sistema

orgânico, há dificuldade na obtenção

de selos, dentro das condições da agri-

cultura familiar, que sejam reconheci-

dos nacional e internacionalmente.

Finalmente, vem a comercialização, que

é bastante comprometida, devido a pro-

blemas de infra-estrutura e de logística,

já mencionados.

Vanderli Pinheiro - Com relação ao

manejo agroecológico, a principal dificul-

dade é a adubação orgânica da lavoura.

As propriedades são muito pequenas

e não produzem matéria orgânica sufi-

ciente para a adubação dos sistemas

produtivos, obrigando o agricultor a

importar de outras regiões. O transporte

desse material para as lavouras repre-

senta um custo adicional para o sistema.

Nossa região tem dificuldades cli-

máticas para obtenção de um café de

qualidade. Chove muito e faltam estru-

turas de secagem em nível de proprie-

dades.

Na questão da comercialização, a

dificuldade é assegurar o mercado di-

ferenciado do produto orgânico, por

isso, estamos investindo em uma estru-

tura para o beneficiamento e a indus-

trialização do produto.

IA - Quais são as estratégias que os

agricultores familiares estão ado-

tando para enfrentar essas dificul-

dades?

Margarida Pinheiro – Nós agricul-

tores e agricultoras familiares estamos

nos organizando em associações e coope-

rativas, trabalhando a formação e a capa-

citação, através de cursos desde a for-

mação de mudas, passando pelo sistema

de manejo, como adubação orgânica e

verde, colheita, pós-colheita, armazena-

mento, beneficiamento, industrializa-

ção e buscando desenvolver um sistema

de comercialização conjunta.

A principal estratégia é fortalecer a

agricultura familiar tornando-a inde-

pendente. Para isso, estamos colocando

nossos produtos em mercados locais

de vários municípios da Zona da Mata

mineira com marcas próprias: Dapat,

em Tombos; Dom Divino, em Divino;

Chão Feliz, em Espera Feliz e Pedra

Redonda, em Araponga.

Vanderli Pinheiro – Com relação à

adubação orgânica, temos buscado alter-

nativas coletivas, como a do ano pas-

sado, quando realizamos uma compra

de torta de mamona da Bahia e conse-

guimos reduzir o custo e a dificuldade

de transporte para a lavoura, por ser

um produto mais concentrado e usado

em menor quantidade em relação ao

composto ou esterco de gado.

A obtenção de um café de bebida,

para a maioria dos agricultores, é um

desafio e temos buscado desenvolver

processos de formação com esse obje-

tivo. Faltam ainda recursos para um

trabalho mais ampliado nesse setor, que

viabilizem, além do conhecimento, as

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estruturas familiares e comunitárias

para o beneficiamento e industrialização

do café.

A comercialização do café, com a

criação da marca da Apat, é uma das

estratégias de inserção no mercado, a

qual busca também a superação das

dificuldades próprias a toda cadeia

produtiva desse produto da agricultura

familiar.

IA - Qual deve ser o papel do Estado na

resolução dos problemas enfrenta-

dos pelos agricultores familiares?

Margarida Pinheiro – Já existem li-

nhas de crédito como o Pronaf do go-

verno federal. Entretanto, essas linhas

já são direcionadas. O papel do Esta-

do é apoiar e fomentar linhas de cré-

dito, que contemplam a diversificação

da agricultura familiar, e oferecer tec-

nologias e assistência técnica gratui-

ta, com profissionais qualificados, que

atendam às necessidades dos agricul-

tores e agricultoras no processo de pro-

dução agroecológico. O atendimento às

necessidades da agricultura familiar

deve ser feito via organizações de agri-

cultores e não vinculados a interesses

políticos.

Vanderli Pinheiro – Um apoio fun-

damental pode ser dado no campo da

assistência técnica e da pesquisa, real-

mente adequadas à agricultura familiar,

atendendo às demandas a partir da nos-

sa realidade. O Estado deveria propor-

cionar mais acesso à formação técnica

e gerencial dos próprios agricultores,

em especial dos mais jovens. Temos que

ampliar o acesso ao crédito, ainda que

reconheçamos que o Pronaf represen-

tou um avanço muito importante nos

anos recentes. Uma dificuldade em re-

lação ao mercado é quanto à legislação.

É importante que haja um processo de

desburocratização da comercialização,

e um apoio do Estado seria fundamental

para multiplicar iniciativas de comercia-

lizações associativas da agricultura fa-

miliar.

Deveria também ser estudada uma

redução da tributação dos produtos

industrializados da agricultura familiar,

em especial do café, e uma adequação

da legislação sanitária, sem comprome-

timento da qualidade final dos pro-

dutos.

IA - A pesquisa científica tem contri-

buído para o desenvolvimento de

sistemas agroecológicos e orgânicos

de café?

Margarida Pinheiro – Tem contri-

buído por meio de trabalhos de pes-

quisa desenvolvidos em parceria com

a EPAMIG, CTA e a UFV. Agricultores

e agricultoras estão experimentando

cultivares de café adaptadas às condi-

ções edafoclimáticas da nossa região e

resistentes ou tolerantes às doenças e

às pragas; sistemas de adubação orgâ-

nica e verde; preparados homeopáticos

e biofertilizantes.

Vanderli Pinheiro – Há mais de três

anos temos participado de uma pesquisa

de variedades de café. Nessa pesquisa,

coordenada pela EPAMIG, foram plan-

tadas 36 variedades em um campo de

experimentação e, outras duas, em áreas

de agricultura familiar, com um número

menor de variedades. Nessa atividade

tem sido muito importante a formação

do agricultor e a troca de conhecimento

com os técnicos que acompanham o tra-

balho. Consideramos a pesquisa cien-

tífica uma escola, na qual os agricultores

têm aprendido muito. Nessa área, temos

tido conhecimentos novos sobre o ma-

nejo do solo, o uso de leguminosas e

outros. A lavoura das áreas experimen-

tais está muito bonita e ajudou a com-

provar a viabilidade do manejo orgânico

do café, sendo uma experiência práti-

ca muito válida para os agricultores da

região.

IA - O que vocês esperam da pesquisa

científica além do que já está sendo

desenvolvido?

Margarida Pinheiro – O que espe-

ramos é que cresça a pesquisa participa-

tiva não somente com o café, mas com

outras culturas como cana, arroz, milho

e criação animal. Esperamos também a

soma de esforços dos vários órgãos de

pesquisa, que já trabalham para gerar

tecnologias em conjunto com os agricul-

tores, com a aplicabilidade adequada

às nossas condições.

Vanderli Pinheiro – Nossa expecta-

tiva é a de que o que está sendo aprendi-

do nesse trabalho possa ser difundido

para um número maior de agricultores,

a partir da comprovação que estamos

tendo da viabilidade de produção de

qualidade de um café orgânico nas áreas

experimentais.

É importante que os órgãos de pes-

quisa continuem acompanhando os sis-

temas da agricultura familiar e apóiem

os sistemas diversificados e todos os

aspectos da cadeia produtiva, pois a

sustentabilidade dos sistemas diz res-

peito não só à produção, mas também

ao processamento e à comercialização

dos produtos. Acredito que, a exemplo

do trabalho que está sendo realizado

em nosso município, a pesquisa cientí-

fica deva ser realizada junto aos agricul-

tores e às agricultoras de maneira par-

ticipativa, respeitando o conhecimento

e a cultura locais.

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9Cafeicultura familiar

1D.Sc. Sociologia da Ciência e da Tecnologia, Prof. Adj. UFV-Depto Economia Rural, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: [email protected]

O café num outro retrato do Brasil rural:o lugar da agricultura familiar

France Maria Gontijo Coelho1

INTRODUÇÃO

Quando se fala em agricultor familiar,ainda vem na mente de alguns pesquisado-res a imagem do personagem típico do ladomais pobre do campo e que dele nada sepode esperar. De sol a sol, luta apenas pelasobrevivência de sua família. Seu esforço,apesar de grande, rende tão pouco que, como tempo, ocorrerá descapitalização natu-ral. Essa visão não permite que se penseno agricultor familiar como um cidadão quetem um papel importante no desenvolvi-mento do País.

Essa imagem e expectativa do que hojeé denominado agricultura familiar é a pre-sentificação do “fracassado pequeno pro-dutor”. Nos anos 80, ele foi contempladocom algumas políticas compensatórias emuito ocupou a mente de pesquisadores,que evidenciaram, nas estatísticas, uma ten-dência perversa de desaparecimento dessemodo de fazer agricultura, considerado,então, atrasado e pouco rentável. A moder-nização tinha um sentido indelével e des-truidor para esses pequenos produtores,que, necessariamente, seriam engolidoscom o avanço do capital no campo.

Resumo - O que significa a cafeicultura familiar para a agricultura em Minas Gerais?O que significa agricultura familiar? Pequeno produtor, conceitualmente, equivale aagricultor familiar? O esclarecimento dessas questões, no contexto atual, deixou de serevidente. Há necessidade de pensar as categorias conceituais e os procedimentos depesquisa que descrevem a paisagem socioeconômica agrária contemporânea de MinasGerais e que, também, orientam políticas públicas e pesquisas técnicas na agricultura.

Palavras-chave: Cafeicultura familiar. Economia. Sociologia rural.

O processo de modernização, com aintensificação no uso do capital na agricul-tura, trouxe grandes mudanças no espaçoagrário, mas algumas continuidades perma-necem. Conseqüentemente, são exigidosnovos conceitos para compreender essanova realidade.

O caso do café é exemplar. Como umproduto historicamente estratégico paraas exportações brasileiras, mesmo que emrazão da diversificação das commodities,tenha caído em importância relativa no qua-dro geral das receitas cambiais (de 50,64%em 1961, para 3,1% em 2001), ainda continuasendo um produto importante para o Paíse, mais ainda, para a agricultura familiar(Quadro 1).

A participação do café nas exportaçõestem garantido ao Brasil o primeiro lugarcomo produtor e exportador no mercadomundial, em 2005, além de ser o segundoPaís consumidor desse produto no mundo.A importância, a capacidade de resistênciae a persistência do produto são notáveis.

Contudo, a maioria dos dados ou estu-dos sobre café tem por base critérios não-diferenciadores das formas sociais de pro-

dução. Os dados são, normalmente, apre-sentados de forma genérica, agrupando aprodução familiar com a patronal. Algunsmostram a produção por tamanho dos esta-belecimentos, o que não caracteriza neces-sariamente uma produção familiar. Essasanálises podem representar um quadroenviesado, se considerarmos outras cate-gorias teóricas para a compreensão dasformas de produção na agricultura e espe-cificamente do café, um produto intensoem sazonalidade do trabalho.

Por isso, numa primeira questão,pergunta-se como as diferenças na formasocial de produção afetam os procedimen-tos analíticos, os resultados das pesquisase mesmo a interpretação da sustentabili-dade do processo produtivo? Ao se consi-derar a distinção entre agricultura familiare agricultura patronal, vê-se que os dadosda Fundação Instituto Brasileiro de Geogra-fia e Estatística (IBGE) ou de outras insti-tuições necessitam ser tratados de formadiferente para que possam revelar um outrosignificado para a agricultura familiar nacultura do café. Teoricamente, as estruturassociais de produção, ou seja, as formas de

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10 Cafeicultura familiar

trabalho (assalariamento, parceria, emprei-tada ou familiar) dão ao café, como a qual-quer produto agrícola, um gosto diferen-ciado.

QUEM SÃO OSAGRICULTORES FAMILIARESE O QUE REPRESENTAM?

Conforme pesquisa coordenada porGuanziroli e Cardim (2000), realizada pormeio do convênio Instituto Nacional deColonização e Reforma Agrária/Organiza-ção das Nações Unidas para Agricultura eAlimentação (Incra/FAO), na qual foramanalisados os dados do Censo Agropecuá-rio 1995-1996, a forma familiar foi destaca-da do conjunto de microdados do Censo eapresentou um outro retrato surpreendentepara o País. Mas isso só foi possível, quan-do se teve por base um outro quadro dereferência teórica. O desafio metodológicofoi grande, na medida em que esse estudotornou operacional um conceito de agricul-tura familiar no tratamento diferenciado dabase de dados do Censo Agropecuário de1995-1996.

Para melhor entender o que Guanzirolie Cardim (2000) chamaram de agricultoresfamiliares, é necessário admitir que os ter-mos agricultor familiar e pequeno produtor

remetem a olhares bem distintos sobre omundo rural. Perceber essa diferença é per-ceber o papel que desempenham e o sig-nificado político e histórico dessas duasdenominações. Essa reconceitualizaçãoteórica e empírica reorienta as ações depesquisa, pois coloca novos desafios, nãosó nas pesquisas socioeconômicas, mastambém nas pesquisas fitotécnicas. Essenovo contexto conceitual questiona pro-pósitos e perspectivas nas investigaçõese nas orientações técnicas de agricultores,pois o mesmo produto (café, por exemplo)adquirirá significados distintos na formapatronal de produção e na forma familiar.Tanto isso se faz necessário que o própriomercado já vem incorporando configura-ções e valorações sociais e ambientais antesimpensadas. Essas novas indagações abran-gem tanto o ponto de vista metodológico,quanto o técnico e o tecnológico.

No contexto familiar, o café, por exem-plo, não pode ser tratado mais como umproduto genérico, mas como uma cultura,uma cafeicultura, como já dizia Stolcke(1986), que varia em razão das diferençasnas relações de trabalho na produção, ta-manho das propriedades, disponibilidadede recursos, expectativas quanto ao futu-ro, tipos de mercado e valor do trabalho

humano, se trabalho de homens ou de mu-lheres.

Nesse sentido, ressalta-se que, quandoum agricultor familiar adoece, por exemplo,por intoxicação com agroquímicos, ou porqualquer outro motivo, a situação fica mui-to complicada. Não se trata de simplesreposição de um fator de produção (mão-de-obra), como acontece na agriculturapatronal. Não é apenas questão de gestãode um custo da produção ou de aumentode preço de um recurso. Objetivamente,outros valores circulam nesse contexto.A saúde do trabalhador e de sua família, asquestões de sanidade das plantas e dosanimais e a perpetuação da qualidade dosolo fazem parte de uma outra contabili-dade.

Problemas como esses não podem sertratados apenas como elementos de dis-curso ou de denúncias da insustentabili-dade social ou ambiental. No contexto daagricultura familiar, gente e ambiente for-mam um sistema interligado. Hoje, a incor-poração de uma visão crítico-social e eco-lógica dos sistemas de produção é umacompetência indispensável a qualquer agen-te de desenvolvimento ou de pesquisa.

Questões acerca de como fazer umaagricultura que não destrua o trabalhador

1o Pecuária de leite 279.201 11.866.534,2 788.753.982,00 1.356.495.413,51 2.186.547.882,00

2o Café 159.360 4.207.585,3 500.335.026,45 740.990.772,72 1.081.188.157,00

3o Pecuária de corte 176.905 8.537.632,8 398.254.134,00 947.648.757,75 1.468.865.733,00

4o Cana-de-açúcar 81.380 3.146.838,9 294.452.587,93 487.853.843,51 715.329.777,00

5o Hortaliças 134.189 3.447.224,5 281.009.608,00 625.847.521,16 1.001.341.615,00

6o Galinhas 337.324 10.805.337,9 258.149.807,00 1.314.902.826,45 2.094.876.393,00

7o Milho 280.868 9.351.943,9 257.955.584,43 1.021.899.003,62 1.714.044.459,00

8o Laranja 101.848 3.588.931,9 126.578.237,13 466.369.183,56 739.210.383,00

9o Banana 107.767 3.454.579,0 95.750.653,54 452.569.717,59 653.153.962,00

10o Tomate 17.700 356.989,9 91.309.378,84 109.631.638,65 208.397.979,00

QUADRO 1 - Dez principais produtos agricultura familiar - Região Sudeste

Valor de

produção total

(R$)

FONTE: Censo Agropecuário (1998).

NOTA: Projeto de Cooperação Técnica Incra/FAO - Tabulações especiais do Censo Agropecuário 1995-1996.

Classifi-

caçãoNome

Estabelecimento

(no)

Área total

(ha)

Valor de produção

do produto

(R$)

Renda total

(R$)

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11Cafeicultura familiar

e a terra na qual ele trabalha são um grandedesafio, depois da experiência de trabalhocom pacotes tecnológicos industriais. Con-siderando as diferenças e as estratégiastradicionais dos estabelecimentos familia-res, poder-se-ia, ainda, perguntar comocolocar o novo (a inovação), garantindo aperpetuação do tradicional, que, com cer-teza, dá segurança às decisões desses agri-cultores. Esses são aspectos a serem pen-sados não apenas no momento da difusãodos resultados da pesquisa, mas que estãopresentes em nossas ações investigativasdesde a construção dos problemas. É naconstrução partilhada dos problemas quereside a mais efetiva forma de pesquisa par-ticipativa, pois envolve pesquisadores/agentes de desenvolvimento com agri-cultores.

Para que essas questões sejam possí-veis de ser pensadas, um princípio gnosio-lógico (de conhecimento) torna-se indis-pensável aos agentes públicos, ou seja, queeles apostem nesse legítimo modo de vidafamiliar no campo. Essa hipótese poderáajudar a buscar, ou encontrar, saídas para asuperação dos limites de reprodução daagricultura familiar.

Em muitos casos, onde a degradaçãoambiental e a expropriação do trabalho sãomuito intensas, essa busca se faz tambémpara fundamentar outra questão, que o co-nhecimento agronômico ainda não conse-guiu responder de forma completa, qualseja: “Como produzir e recuperar ao mesmotempo, garantindo saúde e qualidade devida para quem trabalha e produz no cam-po?” Assim se introduz Agroecologia comouma ciência apropriada às condições doprocesso familiar de produção na agricul-tura. Para aceitar a possibilidade dessasquestões, uma dúvida criadora também secoloca para nossa reflexão: “Por que faze-mos assim e não de outro jeito?”.

Muitas previsões pessimistas sobre osfamiliares não se têm confirmado. Nos anos90, esses “bravos agricultores” permane-ceram agricultando e até mesmo aumenta-ram em número. Ao analisar o Censo Agro-pecuário 1995-1996, Guanziroli e Cardim

(2000), na medida em que as tabelas esta-tísticas, na forma como eram apresentadas,não permitiam distinguir a agricultura fa-miliar da agricultura patronal, em algunsdados, a superioridade da produção patro-nal parecia indiscutível.

Essas estatísticas, em sua forma brutaou agregada por valores indistintos, impli-caram definições e alocações privilegiadasde recursos e políticas públicas para aagricultura patronal, pois, com certeza, umEstado responsável e democrático neces-sita investir naquilo que traz maior retornoeconômico, não só para uns, mas tambémpara a sociedade como um todo.

Outra análise do quadro da agriculturasó foi possível, quando se partiu de outrahipótese, qual seja: que a categoria socio-econômica “agricultura familiar” poderia teruma importância econômica maior do quese acreditava.

Assim, os autores classificaram os esta-belecimentos como de agricultores fami-liares, aqueles marcados por relações detrabalho familiar como força básica de suaprodução. Estariam também incluídas nestacategoria as unidades de produção queutilizam o trabalho contratado (eventual oupermanente), desde que esses não suplan-tassem o esforço do trabalho familiar. Alémdisso, a dimensão territorial continuou sen-do tomada como critério na construção dacategoria, mas no limite de até 30 módulosregionais, pois, assim, seria evitado o viésde inclusão acidental de estabelecimentospatronais que utilizam apenas dois traba-lhadores contratados. Com esses critérios,percebe-se que não se pode falar de agricul-tura familiar sem distingui-la da patronal.

Conforme o Censo Agropecuário 1995-1996 (Censo..., 1998), existiam no Brasil4.859.864 estabelecimentos, ocupando umaárea de 353,6 milhões de hectares. Dessetotal, de acordo com a metodologia ado-tada para classificação dos estabelecimen-tos, os familiares seriam 4.139.369, ocupan-do uma área de 107,8 milhões de hectares.Ou seja, 85,2% das unidades produtivas,no Brasil, eram de agricultores familiares,mas ocupavam 30,5% da área.

O Valor Bruto da Produção (VBP) agro-pecuária, ou seja, tudo que se produziu,entre animais e vegetais, foi de R$ 47,8bilhões, em 1995-1996. Os agricultores fa-miliares foram responsáveis por R$ 18,1bilhões do VBP, ou seja, 37,9% do valortotal. Contudo, esses agricultores familiaresreceberam apenas 25,3% dos R$ 3,7 bilhõesdo financiamento total do governo federalpara a agricultura daquela época. Isso sig-nificou também que a chamada agriculturapatronal, que ocupava 67,9% da área e querepresentava 11,4% dos estabelecimentosagropecuários, recebeu 75% dos financia-mentos públicos da época e produziu 61%do VBP.

Por essa análise, fica evidente que asuperioridade produtiva das unidades pa-tronais de produção, no Brasil, não é umdado absoluto, mas relativo aos financia-mentos públicos. Além disso, se dividirmoso Valor Bruto da Produção dos patronaispela área ocupada, é possível ver que orendimento por área, entre os familiares, émais intenso.

Ainda dentro dos critérios de classifi-cação estabelecidos, considerando o Paíscomo um todo, observa-se que 76,9% dos esta-belecimentos familiares utilizavam apenasmão-de-obra familiar; apenas 4,8% utiliza-vam mão-de-obra familiar com temporáriae, menos ainda, 0,3%, utilizava mão-de-obrafamiliar, temporária com permanente.

Num levantamento do trabalho tempo-rário realizado em 31/12/1995, na agricultu-ra familiar ficavam 986.678 trabalhadores ena patronal, 800.235, como esclareceramGuanziroli e Cardim (2000):

Embora os familiares apresentem um

número superior ao patronal nesta da-

ta, isto não significa que os familiares

utilizam-se do emprego temporário com

maior freqüência e intensidade que os

patronais, ao longo do ano. Pelo contrá-

rio, a tendência, pela relação obtida entre

o percentual de trabalho dos membros

da família em comparação com o trabalho

contratado, demonstra que os patronais

utilizam-se com muita intensidade deste

tipo de trabalho.

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12 Cafeicultura familiar

Quanto ao trabalho, apenas 4,3% dosfamiliares contratavam empregados perma-nentes e 2,9% contratavam apenas um;0,8%, dois, e apenas 0,6%, mais de dois.Como serviços de empreitada, 7,4% dos fa-miliares contratavam esses serviços, massó para mão-de-obra, e poucos 5,9% con-tratavam empreitada de máquinas e de mão-de-obra.

Entre os patronais, 62,7% contratavamempregados permanentes; 23,4%, apenasum; 15%, apenas dois; 24,4%, mais de doise 29,1% contratavam empreitada de mão-de-obra.

O número de pessoas ocupadas porestabelecimento é maior entre os patronais,com média de 6,4 pessoas contra 3,3 entreos familiares. Contudo, ao se tomar a áreapor número de pessoas ocupadas, ficouclaro que os familiares ocupam númeromaior de pessoas. Assim, na agriculturapatronal são necessários 67,5 hectares paraocupar uma pessoa e, na agricultura familiar,7,8 hectares. Essa distribuição varia muitoao serem consideradas as regiões. Na Re-gião Centro-Oeste, por exemplo, entre ospatronais são necessários 217 hectares,para ocupar uma pessoa, e 25 hectares entreos familiares. No Sudeste, são 33 hectaresentre os patronais e 9 hectares entre os fa-miliares. Relativo à área, o número de pes-soas ocupadas na agricultura familiar émaior.

Como se vê, todos esses dados da agri-cultura familiar variam bastante por regiãoe por tipos de agricultores familiares, que,por isso, não podem ser entendidos comouma categoria totalmente homogênea. Den-tro da própria categoria, existem diferençassignificativas. Fatores como localizaçãoeconômica, script tecnológico e condiçõesde capitalização, em razão das possibili-dades de inserção no mercado (formal ouem redes de trocas solidárias) fazem dosagricultores familiares um universo prenhede indagações e de tipologizações.

Dentro da categoria, perpetua uma estru-tura fundiária muito desigual, pois apenas5,9% desses agricultores têm área superiora 100 hectares, mas ocupam 44,7% de toda

a área. Essas diferenciações intensificam-se em algumas regiões e está intimamenterelacionada com as possibilidades de traba-lho e renda desses agricultores. Os proprie-tários com menos de 5 hectares, no Nor-deste, por exemplo, chegam a ter inclusiverenda agrícola negativa. Mesmo assim, aose tomar o quadro do valor relativo da pro-dução familiar, em termos de Brasil, elaapresenta-se muito significativa.

A partir dessa análise do Censo Agro-pecuário 1995-1996, Buainain et al. (2002)revelaram que a Renda Total (RT) agro-pecuária dos agricultores familiares foi de50,9% do total do País, o que equivaleu aR$22 bilhões. Entre os familiares, nota-se adiferença entre o VBP já citado (37,9%) e ovalor dessa RT. Essa diferença indica umuso mais racional dos recursos e menor cus-to na gestão da produção. Contudo, entreos agricultores mais descapitalizados, suamanutenção só é possível com a inclusãode rendas não-agrícolas (aposentadorias etrabalhos fora da unidade de produção, porexemplo). Não se pode negar a existênciadesses extremos no conjunto da catego-ria.

Mesmo considerando a enorme variabi-lidade regional dos estabelecimentos fami-liares, em termos de área mínima, produçãoe renda, pode-se dizer que os agricultoresfamiliares: utilizam os recursos produtivosde forma mais intensiva que os patronais,pois, mesmo detendo menor proporção deterra e do financiamento disponível, relati-vamente, produziram e empregaram maisque os patronais (BUAINAIN et al., 2002).

Por isso, neste novo século, os agricul-tores familiares não são apenas unidadesque demandam políticas de socorro sociale nem tampouco adereços sociais na reali-dade agrária brasileira. Além de sua impor-tância econômica, os familiares são umacategoria social que desafia e demanda di-versas ações públicas e, principalmente,investimentos em novas pesquisas ade-quadas a uma perspectiva de perpetuaçãoeconômica desses personagens, que já secolocam no cenário como cidadãos de di-reitos e agentes econômicos importantes

para a autonomia alimentar e para a quali-dade de vida de parte significativa da popu-lação do País.

Como detalhe para atualizar a reflexão,em 2003/2004, o financiamento do governofederal para a agricultura como um todo foide R$ 32,5 bilhões, sendo R$ 5,4 bilhõesdesses destinados ao Programa Nacionalde Fortalecimento da Agricultura Familiar(Pronaf). Para o Plano Safra de 2005/2006,esse montante subiu para R$ 9 bilhões, jus-tificados da seguinte forma pelo governofederal:

Hoje, a agricultura familiar representa

38% da produção agropecuária nacio-

nal. Quando se considera a produção do

leite, feijão, banana, milho, mandioca,

cebola, suínos e fumo, esse percentual

aproxima-se ou ultrapassa os 50%. Além

disso, 77% da população empregada no

campo está em propriedades familiares

(CRÉDITO..., 2005).

ESCLARECENDO CONCEITOSE PENSANDO SOBRENOSSAS AÇÕES DE PESQUISA

O pequeno produtor, classificado pelotamanho de sua terra e pela rala produção,quase totalmente descapitalizado, voltadoquase exclusivamente para as atividadesde autoconsumo, com pouca ou nenhumarelação social para além do espaço domés-tico familiar, recebe, hoje, outro tratamentoanalítico, denominação e conceitualiza-ção.

Enquanto agricultor familiar, seguindoa tradição das teorias do campesinato, elenão pode ser descrito como aquele indiví-duo arredio, pejorativamente tradicional,que apenas vive “na e da roça” da família.Essa é uma imagem que congela e retira apossibilidade de criação de interpretaçõese pesquisas condizentes com os desafiosque esses agricultores enfrentam na suainsistente e gloriosa forma de vida no cam-po.

O campesinato, histórica e conceitual-mente, apareceu quando a divisão socialdo trabalho sustentou a criação de certacentralização administrativa, na qual alguns

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membros da sociedade colocaram-se comosubjugados. Assim, o camponês apareceusocialmente como aquele que, ao agricultar,era obrigado a entregar o excedente para opoder que se constituísse. Conceitualmen-te, isso se deu com o camponês na con-dição de servo, na Idade Média, ou depoysan, depois da Revolução Francesa,no final do século 18. Essa subordinaçãoé histórica, conforme Pessanha (2004).

Por isso, é importante perceber essacondição histórica dos camponeses na so-ciedade: como expropriado do excedenteque consegue produzir e não como umindivíduo isolado ou autônomo. Historica-mente, como categoria social, ele se man-tém não só porque luta, mas também porquea sociedade dele necessita, pois tem afunção de provedor social de alimentos eprodutos agrícolas para transformaçãoartesanal ou industrial.

No caso brasileiro, em sua especifici-dade histórica característica, nas diversasdiferenciações regionais, pela própria his-tória de enfrentamentos (como nenhumaoutra categoria social vivenciou), nossoscamponeses construíram, como disse Wan-derley (1999), uma enorme diversidade e“patrimônio sociocultural”, que os habilitaa adaptações criativas diante da pressãomodernizadora da sociedade.

Contudo, não se pode deixar de ver queesse mesmo contexto de modernidade queos controla e os condiciona promove suamudança em protagonistas de seu própriodestino, ou seja, em atores políticos viaassociativismo em organizações. Estejameles no Movimento dos Atingidos por Bar-ragens (MAB), no Movimento dos Tra-balhadores Rurais Sem-Terra (MST) oumesmo nas Associações de Agricultores,são evidentes as manifestações de que seumundo não é mais exclusivamente rural.A organização de agricultores familiares oude trabalhadores rurais, exclusiva ou não,explicita a busca por alternativas de sobre-vivência e reprodução mais confortáveisneste mundo internacionalizado e domi-nado pelo capital financeiro.

Essas ações os colocam diretamente no

bojo do universo político e de enfrenta-mento das forças do mercado oligopoliza-do ou monopsonizado. Essas organizaçõespodem ser mais ou menos autônomas, de-pendendo da história e dos interessesenvolvidos na mobilização e nos motivosde sua origem, pois variam quanto à na-tureza do movimento mais amplo no qualse engajam. Estes movimentos podem serfomentados por motivos ou interesses pró-prios aos agricultores, mas também porações personalistas de políticos tradicio-nais, que vêem nessas organizações formasde ganhos pessoais ou ideológicos, distan-tes da perspectiva de inclusão social ou adistribuição, mais eqüitativa, das oportu-nidades, tão necessárias aos agricultoresfamiliares.

Nesse processo, que é de luta constan-te por reconhecimento e resistência, se háalguma estagnação, talvez ela esteja noolhar daqueles habituados a ver nos fami-liares, ou camponeses, um beco sem saída.Para os que têm oportunidade de convivercom esses agricultores e suas organiza-ções, além de participar de suas formas desuperação de limites, nos espaços nos quaisjá conseguem se impor como cidadãos dedireitos, é possível ver como essa categoriasocial de agricultores é exemplar na tradi-ção da mudança.

Nesse contexto evidencia-se a impor-tância das políticas públicas de desenvol-vimento local. Essas políticas, ao visaremfacilitar maior autonomia decisória a essesagricultores e efetivamente dotá-los definanciamento público condizente comsuas demandas e papéis, só concretizarãoesses objetivos, se suas ações regerem-sepela transparência e sinceridade, que ga-rantem maior dialogicidade nas suas inte-rações, democratização e publicização dosatos coletivos. Mas, no entanto, quando,em nível local, instalam-se ações públicascompensatórias, personalistas e assisten-cialistas, as políticas só fazem minar a pos-sibilidade de um desenvolvimento localsustentável, autônomo e que favoreça ainclusão econômica e produtiva dos agri-cultores familiares. Somente na perspectiva

não paternalista é que essas políticas ten-dem a fortalecer a organização protagonistadesses agricultores.

O mundo capitalista muitas vezes tor-ce contra a existência dessa forma de vida.A manutenção do direito de acesso à terrae da estrutura familiar de produção, noBrasil, compõe o quadro tendente à exclu-são dos produtores familiares. Mesmoassim, muitos deles ainda encontram alter-nativas, que não poderiam surgir, ou nemmesmo ser imaginadas, aos olhos de agen-tes pertencentes a outros confortáveis lu-gares sociais.

Agricultura familiar, mesmo sendo umconceito analítico, tem de ser entendidacomo politicamente situada, diante do de-bate (ou do embate) brasileiro sobre os usose destinos dos recursos públicos. Diantedas lutas sociais no campo, o agricultor fa-miliar surge como expressão estratégicadiante do poder histórico da agriculturapatronal, que, por sua vez, tem por base aexploração e expropriação do trabalho assa-lariado, ou de algumas formas exóticas deparcerias e empreita eventual, que não ca-recem de contratos ou respeito aos direitostrabalhistas.

A denominação agricultura familiar vemnão só para garantir maior justiça social nocampo, mas também para sinalizar a pos-sibilidade de um outro modo de agricultura,que, necessariamente, tem de se valer dadiversidade e de maior eqüidade na distri-buição dos recursos, como terra, créditose apoio institucional público.

De acordo com Wanderley (1999), o ca-ráter familiar da propriedade dos meios deprodução e do trabalho na unidade produ-tiva não é mero detalhe ou algo superficialou descritivo. Essa característica marca nãosó sua estrutura produtiva interna, ao asso-ciar produção-trabalho, mas também deter-mina como essa unidade de produção ageeconômica e socialmente, ou seja, os prin-cípios que regem suas decisões são os daperpetuação do patrimônio familiar, em suarelação com a sociedade, o ambiente e o mer-cado. O universo familiar tem uma hierar-quia decisória, uma divisão de trabalho por

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gênero, uma tendência de expectativa deperpetuação por herança. A diversidade e asustentabilidade nesse contexto não podemser figuras de retórica. Elas se colocam co-mo elemento constitutivo e indispensável.

Na medida em que o sistema de trocaem nossa sociedade é regido pelos princí-pios do lucro e da acumulação, esse agri-cultor, como qualquer cidadão, não estádistante dessa realidade; sabe dela e tenta,a todo custo, conseguir sobreviver nummecanismo que ele conhece e tem controleapenas de algumas partes. Por isso, porsua consciência do controle de “apenasparte” dessa situação, sua autonomia é re-lativa e muitas de suas decisões podemsurpreender aqueles acostumados às posi-ções sociais pouco arriscadas. É por issoque apenas 19,3% dos agricultores familia-res, no Brasil, são muito integrados ao mer-cado e comercializam 90% do VBP; 34,4%comercializam entre 50% e 90%, e o grupomaior, de 44% dos estabelecimentos, co-mercializa menos de 50% (GUANZIROLI;CARDIM, 2000).

Se por um lado somos forçados a per-ceber a condição conceitual e empírica desubordinação do agricultor familiar, poroutro não há como negar as demandas dosmovimentos sociais e das organizações deagricultores. Minar o negativismo de pers-pectiva é o desafio do momento e evidenciatodas as dificuldades na luta dessa agricul-tura não só por razões humanitárias, mastambém econômicas e ambientais.

Essa discussão coloca-se no bojo dasreflexões atuais sobre os problemas so-ciais, ambientais e econômicos no campo.Na medida em que há possibilidade deexistência conceitual e empírica de uma agri-cultura familiar, positivamente considerada,cria-se a expectativa de que novos pesqui-sadores se engajem no desenvolvimentode pesquisas que favoreçam a descobertapartilhada, com esses agricultores, de alter-nativas mais sustentáveis. Esse novo con-texto epistemológico, ou seja, conceitual emetodológico da pesquisa e da extensãopúblicas, exige reestruturação institucio-nal em termos de valores, métodos e pro-

cedimentos de investigação, visando po-tencializar o apoio necessário às demandassociais dos agricultores familiares.

Com certeza, serão bem-vindos novosconhecimentos e pesquisas que viabilizemmaior autonomia e que não fragilizem asvantagens comparativas da agriculturafamiliar diante da concorrência patronalno mercado e no espaço político. Um dosaspectos importantes, que não se pode per-der de vista, é a vantagem da gestão do pro-cesso produtivo em unidades familiares deprodução. Qualquer inovação necessaria-mente tem que avaliar se as alterações queela provoca na estrutura dessas unidadesse dão, ou não, para obter maior autonomiae sustentabilidade. Hoje, não se pode ape-nas almejar aumento de produção e produ-tividade. Toda inovação tem de passar pelocrivo de sua apropriação social e de contro-le. Criar idéias e métodos que deixem esseprodutor familiar ainda mais dependente deforças e mecanismos que ele não domina écriar recursos que irão submetê-lo a maissituações de risco e falta de controle sobreseus destinos.

O CAFÉ E A AGRICULTURA FAMILIAREM MINAS GERAIS

De acordo com Guanziroli e Cardim(2000), no período analisado, o café era pro-duzido em apenas 6,2% dos estabelecimen-tos familiares do Brasil. Na Região Sudeste,essa porcentagem subia para 25,2%. Con-tudo, para os que lidam com pesquisas des-se produto, a impressão que se tem é queesses dados não batem com muitos outroscomumente divulgados, como, por exem-plo, os que tratam da microrregião da Zonada Mata de Minas Gerais, divulgados pordocumentos do Programa Pró-Café da Pre-feitura Muncipal de Viçosa, MG. O discursoanalítico do documento baseia-se no con-ceito de “pequeno produtor” e “pequenapropriedade”, ou “pequena produção”,que convive sem disputas com as grandesáreas de cultivo. Com certeza, esse é um ma-pa, uma forma de leitura do mundo agrário,como se pode ler em parte do texto repro-duzido a seguir:

Em Minas Gerais, maior produtor na-

cional de café (50,8% da produção na-

cional), a cafeicultura exerce grande

influência na economia do Estado e em

vários municípios produtores, as suas

economias locais são dependentes dire-

tas da atividade. A utilização dos serviços

de toda a família na cultura torna-se re-

levante sob o ponto de vista socioeco-

nômico, determinando grande aumento

da oferta de empregos e contribuindo de

certa forma para aliviar pressões sociais

estimuladas pelo êxodo rural. (...) “com

exceção do Triângulo Mineiro e Alto

Paranaíba, predomina a pequena pro-

dução, sendo que 50% das propriedades

produzem até 100 sacas de café beneficia-

do por ano e 83% produzem menos de

500 sacas.” (...) “A altitude média desses

cafezais situa-se entre 600 e 1.100 me-

tros, sendo que 71,78% são de pequenas

propriedades, 26,27 de médias proprie-

dades e 1,54% são de grandes áreas cul-

tivadas com café (ENCONTRO..., 2003).

Essas leituras do mundo agrário partemde conceitos diferentes da realidade e colo-cam alguns problemas não só para o uni-verso empírico da análise, mas tambémclamam por outra concepção conceitual daorganização social da produção agrícola.Dados da produção total por tamanho deárea e de preços e movimentação em redesde grandes mercados podem não revelar,ou até mesmo confundir, como são os agri-cultores familiares de café, seus problemase os desafios a que estão expostos.

Enquanto na agricultura patronal o caféapareceu como 6o produto de maior impor-tância em termos de VBP, na agriculturafamiliar ele significava o 10o produto, em1995-1996 (Gráfico 1). Contudo, na RegiãoSudeste, dentre os dez produtos mais impor-tantes na agricultura familiar, o café des-pontava como o 2o produto (12,4%) de maiorvalor na composição do VBP familiar, pre-cedido apenas pela pecuária de leite com19,5%, naquele período.

Diante dessa outra possibilidade deanálise, pergunta-se: o que significam osdados divulgados pelo documento ao qual

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15Cafeicultura familiar

se fez referência e que também diz que aárea média dos cafezais do Estado é de 18,6hectares e 36 mil cafeeiros? Além disso,o que significa e quais as implicações doconceito de trabalho numa análise fito-técnica como a que se segue?

Na medida em que um trabalhador seriaresponsável por 3 ha/ano, tem-se a expecta-tiva de que seriam absorvidos 352.300 traba-lhadores no segmento de produção. Admi-tindo que cada trabalhador teria em médiauma família com cinco pessoas, pode-se dizerque 1,75 milhão de pessoas são dependen-tes diretos do setor (ENCONTRO..., 2003).Tudo indica que a medida do esforço do tra-balho não parte da mesma concepção detrabalho utilizada para análise da dinâmicado trabalho familiar na propriedade familiar.

Observa-se que o tratamento de peque-na produção pode trazer vieses, na medidaem que algumas variações nas formas derelações de trabalho combinadas com tama-nho da propriedade não são levadas emconta. Além disso, é muito fácil incluir nosdados dos pequenos produtores estabele-cimentos patronais abandonados e movi-mentados por famílias de agregados, traba-lhadores temporários, ou permanentes emrelações precárias de trabalho. Esses esta-belecimentos, que produzem pouco e po-dem estar em pequenos estratos de terra,não caracterizam uma propriedade, ou sesustentam na mão-de-obra da família, masno esforço do trabalho alheio.

A imagem que fica de certas descrições

analíticas do mundo rural é de homogenei-dade social, mesmo que sejam consideradasas diferenças nos volumes da produção.Esse seria um problema presente em algunsestudos que se fazem sobre produtos agrí-colas, na medida em que eles podem produ-zir uma interpretação equivocada da paisa-gem socioeconômica e colocar em dúvidasa representatividade dos dados para revelarcertos problemas agrários que poderiamser objetos importantes de pesquisa.

Além disso, esse olhar pode delinearpolíticas públicas excludentes mesmo quepareçam inclusivas. Em algumas regiões,as ações públicas efetivas podem ser ape-nas estratégias de marketing municipal pa-ra obtenção de recursos de outros fundospúblicos e cujos beneficiários efetivos nãosão, necessariamente, estabelecimentosfamiliares, mas estabelecimentos típicos derelações de trabalho patronais. Já que existedotação federal de créditos para a categoriasocial dos familiares, aos trabalhos cientí-ficos passa a ser exigida maior precisão nosdados. Para uma real dotação orçamentáriacondizente com as necessidades das políti-cas locais distributivas e valorizadoras da“agricultura familiar”, as pesquisas socio-econômicas terão de investir no aprofunda-mento teórico-conceitual e metodológicoque distinga as categorias sociais a serembeneficiadas. Esse seria o papel mais téc-nico e, conseqüentemente, político que apesquisa poderia ter.

Essa preocupação conceitual necessita

perpassar os estudos comprometidos comuma visão mais crítica e transparente diantedas contradições presentes no dia-a-dia docampo brasileiro. A imagem de semelhan-ça regional nas estruturas fundiárias podecamuflar diferenças sociais muito fortes.

Contudo, é notório que os dados exis-tentes evidenciam a importância do caféno Estado e indicam que, de certa forma,a agricultura familiar, como definida noestudo de Guanziroli e Cardim (2000), seriaimportante no VBP, mesmo que ela apare-ça travestida de pequena produção.

Por isso, há necessidade de melhor pre-cisar, contextualizar e instrumentalizar oconceito de cafeicultura familiar para a com-preensão do processo, principalmente naprodução do café na Região Sudeste doEstado e em suas microrregiões marcadaspor pequenos estabelecimentos rurais.

Como contribuição para a construçãode hipóteses de pesquisa ou justificativade problemas, com base em observaçõesdo nosso cotidiano, é possível verificar quemuitas pessoas apenas moram na cidade,mas vivem de atividades agrícolas e não-agrícolas. Essa situação pode evidenciaras condições de instalação da pluriativida-de nos estabelecimentos familiares. Essa éuma característica que exige cuidados ana-líticos, como uma outra visão sobre a clás-sica divisão entre população urbana e rural.

Além disso, essa situação só identifica-ria um estabelecimento produtor de café co-mo familiar se, por exemplo, o trabalho da

Gráfico 1 - Porcentagem do VBP de produtos oriundos dos estabelecimentos familiaresFONTE: Guanziroli e Cardim (2000).NOTA: VBP – Valor bruto da produção.

2531

67

97

84

49

32

24

5258

40

Caf

é

Arroz

Feijão

Fum

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Mandio

ca

Milho

Soja

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família suplantasse o trabalho contratado.Fica a questão do significado das rendas não-agrícolas, ou seja, até que ponto elas suplan-tam as rendas agrícolas e o que isso signi-fica para esse agricultor. Muitos empresáriosurbanos (grande ou pequenos), profissio-nais liberais ou funcionários públicos (declasse alta ou baixa) atuam no ramo do cafée desenvolvem sua cultura em pequenasunidades produtivas, que são conduzidaspor empregados, trabalhadores assalariadosou em parcerias não-estabelecidas em con-tratos de trabalho explícitos. Nesses casos,a cultura não se sustenta no trabalho dafamília, mas no uso do trabalho contratado.

No caso do café, em razão da sazonali-dade no uso do trabalho, na colheita e emalguns tratos culturais, o levantamento dedados que pretender fazer a distinção entreos dois modos de agricultura, corre o riscode classificar como patronal um estabeleci-mento que, sem o esforço da família, não semanteria. Por isso, as estratégias metodo-lógicas de classificação estatística de estru-turas agrárias, como seria o caso da Zonada Mata, por exemplo, deverão então primarpor uma reflexão conceitual profunda quetem o trabalho familiar como princípio gera-dor de valor econômico. A teoria do valortrabalho teria de ser contemplada, primeira-mente, mais que o levantamento de dadosexclusivos sobre a produção ou preços deum produto. Além do mais, não se podeperder de vista aquilo que caracteriza osestabelecimentos familiares e que lhes con-fere vantagem comparativa (como a gestãofamiliar das atividades) e sustentabilidade,como são a multifuncionalidade e a diversi-dade de produção e de tipo de renda.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Essas idéias aqui propostas são temasde pesquisa para os quais a cafeiculturafamiliar torna-se um espaço rico para oesclarecimento dos problemas de repro-dução das formas familiares de agriculturano Brasil, na Zona da Mata ou em outrasregiões de Minas Gerais.

O café é mais que um produto, é umacultura e, em torno dele, pulsam modos devida e diferenças sociais. Essa cultura dife-

renciada fica evidente na fala de um agri-cultor familiar da região de Viçosa, MG,quando explicava sobre o que significavao café em sua propriedade:

A gente sempre tem um cafezinho. Ele

aqui é o esteio da propriedade. Sobe e

desce preço... qualquer coisa, a gente pega

um saco aqui e troca lá na rua. Ele sempre

salva a gente. Mas se o agricultor inventar

de arriscar com muita coisa, que ele nem

conhece direito, ele corre risco de perder

tudo que tinha. Agricultor familiar tem

de ser sábio, mais do que sabido. Aí é que

tá sua esperteza.

REFERÊNCIAS

BUAINAIN, A. M.; SOUZA FILHO, H. M. de;SILVEIRA, J. M. da. Inovação tecnológica na agri-cultura e agricultura familiar. In: LIMA, D. M.de A.; WILKINSON, J. (Org.) Inovação nastradições da agricultura familiar. Brasília:CNPq/Paralelo 15, 2002. p.47- 81.

CENSO AGROPECUÁRIO 1995-1996. Brasil.Rio de Janeiro: IBGE, v.1, 1998.

CRÉDITO para a agricultura familiar chega aR$ 9 bilhões na safra 2005-2006. Em Ques-tão, Brasília, n.340, ago. 2005. Disponível em:<http://www.brasil.gov.br>. Acesso em: 5 ago. 2005.

ENCONTRO DE AVALIAÇÃO TÉCNICA, 4.;ENCONTRO REGIONAL DE CAFEICULTO-RES, 1., 2003, Viçosa, MG. [Anais...]. Viçosa,MG: Pro-Café, 2003. 1 CD-ROM.

GUANZIROLI, C.E.; CARDIM, S.E. de C.S.(Coord.). Novo retrato da agricultura familiar:o Brasil redescoberto. Brasília: INCRA/FAO,2000. Disponível em: <http://www.incra.gov.br/sade/doc/AgriFam.htm>. Acesso em: 13 ago. 2005.

PESSANHA, D. Campesinato, reprodução e reen-quadramento social: os agricultores familiares emcena. In: REUNIÃO BRASILEIRA DE ANTROPO-LOGIA, 24., 2004, Olinda. [Anais...] Olinda, 2004.

STOLCKE, V. Cafeicultura: homens, mulheres ecapital (1850-1980). São Paulo: Brasiliense, 1986.410p.

WANDERLEY, M.N.B. Raízes históricas do campe-sinato brasileiro. In: TEDESCO, J.C. (Org.). Agri-cultura familiar: realidades e perspectivas. PassoFundo: Universidade de Passo Fundo, 1999. p. 21-25.

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1Engo Agro, Ph.D., Pesq. Iapar, Caixa Postal 481, CEP 86001-970 Londrina-PR. Correio eletrônico armê[email protected] Agro, M.Sc., Pesq. Iapar, Caixa Postal 481, CEP 86001-970 Londrina-PR. Correio eletrônico [email protected]

Abordagem sistêmica e pesquisa participativana agricultura familiar:

ferramentas para o desenvolvimentoCarlos Armênio Khatounian1

Dimas Soares Júnior2

INTRODUÇÃO

Um dos aspectos mais expressivos dodesenvolvimento agrícola no século 20 foio avanço da produção agrícola. Em largamedida, esse avanço deveu-se à pesquisaagrícola e a sua aplicação em sistemas deprodução simplificados, freqüentementemonocultores e em grande escala. O usoampliado de adubos minerais e de pestici-das após a 2a Grande Guerra permitiu ocontrole dos problemas de fertilidade e defitossanidade associados às monoculturas,propiciando a expansão da produção emníveis inimagináveis um século atrás.

Contudo, essa expansão na produçãoacarretou ou acirrou problemas ambientais,sociais, de saúde humana e éticos, em escala

igualmente sem precedentes. Nunca a agri-cultura poluiu e excluiu tanto socialmente,causou tantos problemas de saúde e levoua tantos questionamentos éticos (PRETTY,2002). Testemunhou-se o simultâneo cres-cimento da produção agrícola e o empobre-cimento das comunidades rurais, a pontode, no estado do Paraná, maior produtorde grãos do País, 71% da população agríco-la estar em municípios com índice de desen-volvimento humano abaixo da média na-cional (IPARDES, 2003).

Esse descompasso entre o sucesso naprodução em larga escala e o insucesso emvárias outras áreas é um dos temas maisatuais no que se refere à pesquisa agrícola.No aspecto social, uma pergunta-chave nas

Resumo - A abordagem sistêmica da agricultura familiar desenvolveu-se em fins dadécada de 70, com o intuito de melhorar a eficácia da pesquisa como suporte para odesenvolvimento, em face do relativo insucesso da investigação tradicional em melhoraras condições de vida dos agricultores pobres. Descrevem-se a marcha metodológica ealguns conceitos utilizados na abordagem sistêmica, destilados de seu exercício noInstituto Agronômico do Paraná (Iapar). Discutem-se a participação dos agricultores nageração de conhecimento por meio da abordagem sistêmica e a defesa da necessidadede métodos participativos na pesquisa sobre a arborização de cafezais no Brasil.Priorizam-se casos orientados para a produção orgânica e/ou com baixa utilização deinsumos externos. E, por fim, apresenta-se o trabalho em andamento de redes depropriedades de referência, a última e a mais recente iniciativa metodológica em pesquisaagrícola orientada para o desenvolvimento regional.

Palavras-chave: Agroecologia. Café sombreado. Auto-consumo. Agrofloresta.

três últimas décadas do século 20 e que con-tinua atual é: – por que a maioria dos agri-cultores familiares não se beneficiou dainvestigação agrícola na extensão que seriaesperada? As respostas a essa perguntaforam várias, incluindo a dificuldade deacesso à informação, o despreparo tecnoló-gico dos agricultores, a falta de recursosfinanceiros para a compra dos insumosindustriais, as dificuldades na comerciali-zação e a carência de políticas agrícolasorientadas para os agricultores pobres.

Outra ordem de respostas encontrou naprópria pesquisa agrícola a causa do seurelativo insucesso, o que resulta de doisfatos: primeiro, que as condições de solo ede insumos da experimentação foram, em

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regra, mais favoráveis do que aquelas, nasquais trabalham os agricultores pobres; se-gundo, que muitas soluções foram geradastendo como modelo a produção especia-lizada de uma única cultura ou criação, oque não era o caso na maioria dos sistemasde produção dos agricultores familiares.Esses sistemas são caracterizados pela po-licultura e pela complementação de ativi-dades, de modo que as soluções geradaspara a produção especializada, em mono-cultura, simplesmente não se encaixavam.

Para superar esses problemas, desen-volveu-se, a partir do final da década de70, uma tentativa de abordar os sistemasagrícolas na sua totalidade, que fosse ca-paz de identificar com precisão suas limi-tações e potencialidades. E incluir ambas,limitações e potencialidades, na geraçãode tecnologias agrícolas, orientadas parao desenvolvimento rural e agrícola. Tais li-mitações e potencialidades não são exclusi-vamente agronômicas, mas estendem-se atodas as esferas de atuação das famíliasagricultoras. Ao longo do tempo, essa ten-tativa de abranger a totalidade aprimorou-se metodologicamente, culminando com oque hoje se chama “abordagem sistêmica”(KHATOUNIAN, 2001).

Para atingir seu objetivo último de pro-moção do desenvolvimento, a abordagememprestou métodos e conceitos de váriosramos das ciências humanas e da ecologia,de modo que seu corpo conceitual e factualvai além das temáticas usuais na área agro-nômica. O presente artigo descreve sucin-tamente esse corpo conceitual e metodo-lógico. Focaliza-se a propriedade agrícolacomo sistema de produção, a seqüênciametodológica do trabalho, a participaçãodos agricultores e discute-se o potencialda abordagem sistêmica na pesquisa emarborização de cafezais. Expõem-se tambémas críticas mais usuais a essa abordagem edescreve-se o trabalho em redes de proprie-dades de referência conduzido, atualmente,no estado do Paraná.

PROPRIEDADE COMOUM SISTEMA DE PRODUÇÃO3

Para a finalidade da abordagem sistê-mica em pesquisa agrícola, um sistemacompreende-se de estrutura e funcionamen-to. Estruturalmente, o sistema é definidopor seus limites, componentes, interações,insumos e produtos. Funcionalmente, o sis-tema é caracterizado pelo manejo por meiodo qual os componentes, interagindo entresi, transformam os insumos em produtos.Numa pequena propriedade familiar, oscomponentes são a família e, usualmente,as explorações vegetais e animais. A com-posição dessa família, suas característicasculturais, escolaridade e aspirações influi-rão sobre o futuro da propriedade tantoquanto, ou até mais do que a fertilidadenatural do solo ou o clima.

Para a grande maioria das questões liga-das à produção, um limite interessante sãoas divisas da propriedade, porque define oespaço dentro do qual se exerce a açãoordenadora (ou desordenadora) do agri-cultor ou da família agricultora, ficandoassim estabelecido o “sistema proprieda-de”. É esse sistema, e não mais a lavourade milho ou a criação de galinhas, que passaa ser o ponto de partida e de chegada dosestudos para o desenvolvimento. Esse é oreferencial prioritário, quando se planeja,por exemplo, a conversão de propriedadesconvencionais para orgânicas, com a mí-nima dependência de recursos externos.

A família e as explorações vegetais eanimais interagem, definindo os ciclos eritmos de trabalho ao longo do ano e opotencial de geração de renda. Por sua vez,as explorações vegetais e animais tambéminteragem entre si, num padrão orquestradopelo agricultor. Numa propriedade ideal-mente organizada para o máximo de auto-sustentabilidade, as criações alimentam-sedo produto das lavouras e os dejetos dascriações retornam aos campos como ferti-lizante. Nos sistemas reais, em geral, essa

interação é fragmentada e parcial, o que osfragiliza.

MARCHA DO TRABALHOEM SISTEMAS DE PRODUÇÃO

O trabalho em sistemas voltados aodesenvolvimento de uma propriedade temuma marcha relativamente consensada,que consiste em diagnóstico, definição dosproblemas-chave e dos perfis das possíveissoluções, busca e validação das soluçõese, finalmente, sua incorporação à rotinados sistemas. Quando se trabalha comregiões ou grupos de agricultores, antesdo diagnóstico, realiza-se a caracteriza-ção da região a partir de dados censitários,esboçando-se, com isso, o pano de fundosobre o qual os agricultores operam. Comesses mesmos dados, realiza-se tambémuma tipologia preliminar do público visado,de modo que o diagnóstico a campo cubraos segmentos prioritários do público re-gional.

Diagnóstico

Consiste no levantamento de informa-ções que permitam esboçar o sistema talqual é trabalhado pelo agricultor, de formaque subsidie prospecções sobre sua evo-lução. As perguntas centrais são: como seestrutura esse sistema, como funciona epara onde tende a ir. Para respondê-las,levantam-se informações sobre a naturezae a organização do espaço físico (área totale sua ocupação, benfeitorias, tipo de soloe relevo, recursos hídricos, tipo climático eseus riscos), sobre os recursos humanos esuas relações sociais e econômicas (núme-ro de pessoas, parentesco, idade, sexo,aspirações, fontes de renda, ocupação) esobre as entradas (insumos agrícolas, má-quinas, alimentos, vestuário etc.) e saídas(produtos agrícolas, artesanato etc.).

Tenta-se perceber o sentido de sua evo-lução (forças de agregação/desagregação,conflitos internos, relações de poder), por-

3O conceito de “sistema propriedade” e a marcha de aplicação da abordagem sistêmica neste artigo baseiam-se fortemente em Khatounian(2001), onde esses temas são discutidos com maior detalhamento.

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que desse sentido depende a orientaçãoda sua batuta ordenadora. Os aspectosgerenciais, sobretudo o sistema de tomadade decisões e seu reflexo sobre as pessoasenvolvidas são especialmente importantes.É muito comum que o sistema não evolua,devido a problemas nessa esfera, tais comoheranças não resolvidas, disputas internasna família etc. No detalhamento dos sub-sistemas de produção animal e vegetallevantam-se os rebanhos ou plantéis (nú-mero, classe, raça), instalações, manejo,doenças, alimentação, índices de desempe-nho, destinação final, forma de comerciali-zação; culturas, rotações, áreas de pasto ede reservas naturais.

Há vários métodos de levantar essasinformações, desde os totalmente formais,via questionários previamente elaborados,até os completamente informais. Como re-gra, os métodos informais são mais confiá-veis, mas exigem maior experiência do téc-nico e aplicam-se melhor a grupos pouconumerosos. Um dos métodos informais maisseguros é o levantamento do histórico devida do agricultor ou família agricultora, eo histórico da propriedade. Desses histó-ricos costuma resultar uma imagem mentaldas aspirações e objetivos da família e decomo a propriedade vem sendo trabalhadapara alcançar tais objetivos.

Com essa visão mais geral e de possede informações sobre a condução das la-vouras, criações, entradas e saídas, pode-

se formular uma primeira hipótese sobre asprincipais limitações e potencialidades dosistema e traçar um primeiro esboço daspossíveis mudanças. Após a análise doscomponentes e a síntese de um primeiroconjunto de propostas, realiza-se nova vi-sita, na qual se discutem essas propostas.Nessa visita, normalmente emergem outrasinformações, que interativamente, por no-vas sínteses e análises, vão tornando maisnítido o aprimoramento necessário, tantopara o técnico como para o agricultor.

Tipificação

Quando se trabalha com grande núme-ro de agricultores num município ou numaregião, normalmente não é possível atendercada propriedade individualmente. Nessescasos, o trabalho é facilitado agrupando-se os agricultores com sistemas de produ-ção semelhantes em um mesmo tipo. Emgeral, os critérios para a tipificação prelimi-nar são as principais explorações, nível derenda, tamanho da propriedade, máquinasetc. De cada tipo, escolhe-se uma amostrade propriedades para ser visitada e estu-dada, como descrito anteriormente.

Essas visitas, normalmente, conduzema uma reavaliação dos critérios utilizadosna tipificação preliminar com base em dadossecundários, de modo que a tipificação de-finitiva resulte ser útil para os objetivos doprojeto. Por exemplo, se o objetivo do pro-jeto é difundir práticas vegetativas de con-

trole da erosão em culturas anuais, o tipode solo e a prática em uso podem ser crité-rios mais importantes do que o estrato deárea ou de renda.

Definição dos pontos-chave

Com freqüência, a conclusão do diag-nóstico é uma longa lista de problemas, queos agricultores raramente podem enfrentara um só tempo. Por isso, é indispensávelestudar o conjunto dos entraves à luz dosistema completo, de modo que identifi-que aqueles entraves cuja solução tenha omaior impacto possível para desencadeara solução de outros entraves.

Esse é um exercício difícil, que demandado técnico conhecimento, sensibilidade,visão de conjunto e, sobretudo, capacida-de de interagir com o agricultor. Posto queos sistemas normalmente apresentam va-riadas interações, não raro a solução estáem pontos cuja relação com o problemafocalizado não é visível a princípio (Exem-plos 1 e 2).

Na prática, nos sistemas agrícolas emandamento, parece existir um limite à assi-milação de mudanças em cada ciclo de pro-dução. De modo geral, três modificaçõesimportantes parecem ser o máximo exeqüí-vel por ano agrícola. Para reduzir o conjun-to de problemas a três pontos-chave, cos-tumam ser necessários muitos estudos ediscussões que envolvam atores relevantespara o problema focalizado.

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Esboço do perfildas soluções ideais

Uma vez que os problemas tenham sidoelencados, suas relações dentro do sistemasejam conhecidas e os problemas-chaveestejam definidos, o perfil das soluçõesemerge quase que naturalmente. O perfilnão é ainda a solução, mas é mais que ametade dela (Exemplo 1). Esse mesmo mé-todo de esboço do perfil da tecnologia ne-cessária pode ser aplicado em situaçõesque contrastam substancialmente com aanterior, por exemplo, na produção orgâni-ca de soja no norte do Paraná (Exemplo 2).

Esse método de trabalho contrasta for-temente com a rotina da maior parte dosserviços de aconselhamento agronômico,tanto os oficiais quanto os de OrganizaçõesNão-Governamentais (ONGs). O mais usualé tentar adequar a propriedade à tecnolo-gia. Por exemplo, ensina-se aos agriculto-res a criar minhocas e a fazer composto, oua utilizar um determinado adubo verde, por-que são boas técnicas. Contudo, a ques-tão não é se tal técnica é boa ou má, mas seela se encaixa no perfil da solução idealpara os problemas-chave do sistema foca-lizado.

Busca das soluções

Definidos os pontos-chave e os perfisdas soluções, passa-se à busca das solu-ções específicas. No caso de os pontos-chave envolverem questões tecnológicas,essa busca consiste em localizar, dentro doestoque tecnológico disponível, a opçãode melhor encaixe à situação visada.

Normalmente, essa busca exige incur-sões por áreas temáticas bem definidas. Porisso, técnicos com boa formação nas áreastemáticas envolvidas no sistema tendem arealizar com melhor qualidade esse traba-lho. Como vivemos num mundo de especia-listas, as equipes que trabalham com sis-temas de produção tentam compensar aslimitações de cada profissional compondoum grupo mínimo. No Instituto Agronômi-co do Paraná (Iapar), cada equipe idealmen-te inclui um fitotecnista, um zootecnista,um profissional da área de recursos natu-

Exemplo 1

Num estudo para melhorar o estado nutricional de agricultores familiares de baixa renda

na região central do Paraná, constatou-se baixo consumo de proteína animal. Quase toda a

proteína animal na dieta das famílias provinha das criações domésticas como porcos e galinhas,

cujo desempenho produtivo era baixo, devido ao arraçoamento insuficiente e desbalanceado,

apenas com milho. Por sua vez, a baixa disponibilidade de milho devia-se ao empobrecimento

progressivo dos solos e às elevadas perdas pós-colheita por insetos e roedores nos paióis

improvisados.

A solução mais simples poderia ser parar com as criações domésticas, concentrar esforços

nas atividades de renda e, com a renda extra, comprar os produtos de origem animal. Outra

linha de solução seria melhorar a disponibilidade de milho, aplicando adubos minerais,

construindo paióis melhores e utilizando raticidas e inseticidas. Ambos os casos implicariam

num aumento da dependência dos agricultores em relação ao mercado.

Contudo, o objetivo desses agricultores ao produzir para auto-consumo é justamente

reduzir as despesas monetárias, devido à sua baixa renda, que, por sua vez, resulta de pro-

blemas estruturais associados à inserção subalterna dessas famílias no sistema econômico

regional (KHATOUNIAN, 1994). A lógica depreendida da aplicação da abordagem sistêmica

indicava o perfil das soluções para melhorar a disponibilidade de proteína animal na dieta dos

agricultores: as soluções deveriam recuperar a baixo custo a fertilidade dos terrenos, usar

variedades de milho menos sujeitas a insetos, reduzir as perdas por ratos e melhorar o balan-

ço de aminoácidos nas rações. Tudo isso, sem aumentar as despesas monetárias.

Avaliando as vantagens e desvantagens das diversas possibilidades, a construção de

paióis melhores pareceu ser o ponto-chave para, já no primeiro ano, desencadear as mudanças

no sentido desejado. Para as safras seguintes, a utilização de variedades de milho menos

atacadas pelo gorgulho poderia ser trabalhada, bem como a adubação verde para recuperar os

terrenos. Um critério na escolha do adubo verde era que suas sementes contribuíssem para

o balanceamento das rações. No sistema de produção, esses perfis foram preenchidos por

uma variedade de milho melhorada para a qualidade de proteína, consorciada com guandu

como adubo verde.

Longe do que inicialmente se vislumbrava, o ponto-chave para melhorar o aporte de

proteína nas dietas dos agricultores era melhorar os paióis e, a prazo mais longo, a adubação

verde das áreas de milho.

Exemplo 2

A produção orgânica de soja no norte do Paraná é quase que totalmente mecanizada e os

sistemas agrícolas em que ela se insere são muito simplificados, com poucas interações inter-

nas, de modo que as limitações a esse sistema quase que coincidem com as limitações à soja.

Na soja, a limitação principal à conversão é o controle de invasoras, que até a conversão tinha

como base os herbicidas.

O controle mecânico das invasoras é a alternativa mais imediata, mas se choca com a

baixa disponibilidade de mão-de-obra. A tração animal não é usual na região. O cultivo meca-

nizado é difícil, devido à exigência de semeadura em espaçamento perfeito, que é dificultada

pelo relevo irregular. Nas situações em que pelo menos uma dessas opções é viável, o problema

está resolvido.

Contudo, na maioria dos casos, essas soluções não se enquadram, o que aponta para a

necessidade de alternativas não centradas no cultivo mecânico. Uma possibilidade é o

desenvolvimento de boas culturas de inverno, cuja palha pode diminuir a pressão de invasoras

na cultura de verão que a sucede. Idealmente, essa cultura de inverno deve produzir palha

abundante, que dure pelo menos dois meses depois de acamada e que esteja em ponto de ser

acamada na melhor época de semeadura da soja, que é a primeira quinzena de novembro.

Esse é o perfil da solução ideal, à luz do sistema de produção.

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rais e um da socioeconomia. A esse núcleo,agregam-se outros especialistas na medi-da da necessidade.

Na prática, esse trabalho em grupo éum grande desafio, de modo que um ge-neralista de boa formação parece ser umaopção mais eficaz e realista, quando sedispõe de poucos recursos. Por boa forma-ção entenda-se o domínio nas áreas bási-cas nas Ciências Agrárias, familiaridadecom a área socioeconômica e com as ques-tões ambientais. Em tempos de especiali-zação precoce como os de hoje, tal profis-sional precisa ser procurado com afinco.Não raro, na linha de frente do aconselha-mento agrícola, encontramos profissionaiscuja amplitude tecnológica restringe-se aosistema convencional de uma ou duas cul-turas. Por força dessa limitação, profissio-nais assim têm grande dificuldade em apro-veitar o estoque tecnológico na busca desoluções que se enquadrem no perfil de-sejado.

Validação das soluções

Uma vez identificada a tecnologia den-tro do perfil esperado, o passo seguinte éseu teste nos sistemas reais de produção,conduzidos pelos agricultores. O ideal éque a tecnologia seja discutida com o agri-cultor ou a família agricultora, de modo queeles mesmos possam conduzir o teste. Essejá é o primeiro crivo à sua adequação. Se oprocesso anterior foi bem conduzido nor-malmente não haverá problemas nessa fa-se, sendo o teste de validação quase umaunidade demonstrativa.

Contudo, é freqüente que mesmo a me-lhor solução encontrada não se encaixeperfeitamente no perfil ideal. Nesses casos,é preciso usar a criatividade para fazeros ajustes necessários e, iterativamente einterativamente, ir aprimorando a solução.Quando se trabalha com grandes gruposde agricultores, as propriedades focaliza-das, nas quais se concentram os estudos etestes, servem como referência, tanto paraos outros agricultores quanto para o pes-soal da pesquisa e da extensão.

Incorporação da inovaçãoà rotina dos sistemas

Após essa série de passos, do diagnós-tico da situação à validação, a inovaçãoestá pronta para ser incorporada ao siste-ma de produção. Quando se trabalha emgrandes grupos, desse ponto em diante, otrabalho com a inovação consiste na divul-gação pelos métodos usuais de difusão.

Quando se está focalizando a conver-são de uma propriedade individualizada, aincorporação da inovação permite um sal-to e a propriedade sofrerá um rearranjo,atingindo um novo patamar de sustenta-bilidade, supostamente acima do anterior.Havendo interesse, o processo pode entãoser repetido com outra inovação, objeti-vando um novo salto na safra seguinte.

A QUESTÃO DA PARTICIPAÇÃODOS AGRICULTORES

Dentro dos meios de apoio técnico àagricultura, corre há pelo menos três déca-das uma discussão, por vezes difícil, sobrea participação dos agricultores na pesqui-sa. Essa discussão freqüentemente resvalapor um alinhamento ideológico, que dificul-ta a apreciação objetiva da questão. Com oferramental da abordagem sistêmica, umpasso crucial para que ocorra desenvolvi-mento é compreender o processo de toma-da de decisões. A adoção ou não de umatecnologia supostamente melhor, a decisãode fazer ou não um treinamento, a iniciativade reorganizar-se etc. resultam de um pro-cesso de tomada de decisões. Em últimainstância, o desenvolvimento de uma re-gião, ou sua estagnação, resulta das deci-sões que vão sendo tomadas ao longo dotempo pelos agentes envolvidos. Por isso,é fundamental entender o processo de to-mada de decisão.

No caso dos agricultores familiares, oprocesso de tomada de decisões freqüen-temente envolve o grupo familiar. Para asfamílias agricultoras, como para quaisqueroutras famílias, os recursos materiais deque dispõem são meios para atingir seusobjetivos, que são muito variáveis. Os pe-

sos atribuídos ao dinheiro, ao lazer, à reli-gião, ao convívio social e a outros fatoresvariam de uma família para outra. E isso sereflete nas decisões tomadas sobre comoconduzir a propriedade, sendo esta apenaso meio de que as famílias dispõem paraatingir seus objetivos de vida. Mudandotais objetivos, pode mudar a condução dapropriedade. Esse tem sido um caso comumem famílias que fazem a conversão para aagricultura orgânica depois de testemunharintoxicações com agrotóxicos. O processode tomada de decisões nunca é definitivoe, freqüentemente, os membros da famíliaexercem pesos diferentes na decisão final.Esses pesos usualmente variam, dependen-do do assunto em questão.

Para que os projetos de desenvolvi-mento tenham sucesso e sejam includentes,a complexidade do processo de tomada dedecisões precisa ser compreendida e con-siderada. Decisões refratárias a inovaçõessupostamente favoráveis podem ser rigo-rosamente lógicas no contexto das variá-veis consideradas no processo de tomadadas decisões pelas famílias. Assim, a parti-cipação dos agricultores é essencial paraassegurar que as iniciativas de desenvolvi-mento tenham sucesso.

Quando a marcha da abordagem sistê-mica descrita neste artigo é seguida, as pers-pectivas dos agricultores são incorporadasnaturalmente, e as variáveis consideradasna tomada de decisão se revelam. A eficiên-cia no processo de participação dos agri-cultores depende mais do nível de intera-ção do que da participação formal nos pro-tocolos de pesquisa. Em outras palavras,importa mais o quanto um experimentoresponde às questões enfrentadas pelosagricultores do que se ele é conduzido emestação experimental ou área de produtor.

Nas unidades experimentais conduzi-das em propriedades há uma grande va-riação no nível de envolvimento dos agri-cultores, indo desde a simples cessão daárea até a definição e condução dos trata-mentos. Contudo, há hoje uma compreen-são mais ou menos generalizada de que

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devem ser conduzidas em propriedadesapenas as iniciativas experimentais, cujacomplexidade seja dominada pelos agricul-tores. Ainda assim, é usual ocorrer uma per-da da metade das unidades experimentais,por razões as mais diversas.

Um outro aspecto da experimentaçãoem propriedades é a recuperação da auto-confiança dos grupos de agricultores envol-vidos nessas iniciativas. Após várias dé-cadas em que os agricultores receberamas soluções prontas e com pouca margemde alteração, sua autoconfiança coletivaesmoreceu. Na perspectiva de que práticassustentáveis de agricultura exigirão umgrau elevado de ajuste local, o aprendizadocoletivo nos grupos de experimentação éfundamental. A pedra angular para a sus-tentabilidade dos sistemas agrícolas podeestar exatamente no desenvolvimento des-ses processos de aprendizado coletivo(PRETTY, 2002).

ARBORIZAÇÃOE PESQUISA PARTICIPATIVA

A recomendação de implantar nas pro-priedades apenas unidades experimentais,cuja complexidade seja dominada pelos agri-cultores, não significa que questões com-plexas não possam ser tratadas em áreasde produção. Hoje, a arborização é a áreade pesquisa mais promissora para melhorara sustentabilidade da cafeicultura brasileirae, por sua complexidade e pelo tempo ne-cessário para conclusões seguras, a pes-quisa participativa é a única opção viávelnuma escala de tempo realista.

A arborização modifica a estrutura doagroecossistema, incluindo um estrato fo-tossintetizante acima do café, que então sedesenvolve sob um ambiente de sombra,como o dos sub-bosques de seu hábitatoriginal. Dependendo da intensidade da som-bra, muitos aspectos agronômicos da cultu-

ra podem ser alterados. A grosso modo, asombra intensa reduz o número de flores eassim reduz a necessidade de adubação,reduz a infestação por bicho-mineiro, reduza infestação por plantas invasoras e melho-ra a reação do cafeeiro a doenças. Em som-bra intensa, o amadurecimento dos frutosé mais lento, fato que melhora a qualidadedo café. Para o meio ambiente, os agroecos-sistemas de sombra densa são tambémbenéficos: reduzem fortemente a erosão dosolo, protegem a biodiversidade e, por exi-girem menos insumos químicos, reduzem acontaminação por adubos e agrotóxicos(PERFECTO et al., 1996). Conjuntamente,esses fatores resultam em aumento na lon-gevidade do cafeeiro e melhoram a sustenta-bilidade do agroecossistema. Mas a sombraintensa também pode trazer conseqüênciasnegativas, particularmente a redução naprodução e o maior custo de colheita.

Assim, acumular conhecimento sobrea arborização dos cafezais no Brasil, encon-trando um ponto ótimo entre seus aspectospositivos e negativos, é um ponto-chavepara a criação de uma cafeicultura maissustentável4 . Contudo, a experimentaçãonecessária para embasar esse acúmulo deconhecimento é gigantesca e o tempo ne-cessário para sua conclusão conta-se emvárias décadas. As árvores, normalmente,levam entre cinco e dez anos para crescera ponto de modificar significativamenteo ambiente do cafezal para aspectos deimportância agronômica. Modificado oambiente do cafezal, necessita-se de maisuma década para acumular dados segurosquanto ao efeito desse ambiente sobre ocafeeiro. Ao final de duas décadas, tería-mos as informações para aquelas árvorestestadas, naquele espaçamento, com aquelemanejo das árvores e aquele manejo do café,naquele solo, para aquela condição climá-tica.

Considerando o número de espéciesarbóreas potenciais, a diversidade de climae solo nas regiões cafeicultoras no Brasil,e as possibilidades de manejo fitotécnico,com os delineamentos experimentais clás-sicos e trabalhando estações experimen-tais, a pesquisa levaria um tempo fora deconsideração e exigiria recursos astronômi-cos para acumular experiências que res-paldem recomendações seguras. Além dotempo e do custo, há questões metodoló-gicas associadas ao tamanho mínimo dasparcelas e à definição de sua área útil e debordadura. Porém, esses problemas nãosão apenas no Brasil. Mesmo na AméricaCentral, de onde provém a maior parte daliteratura científica sobre a cafeiculturaarborizada, permanecem muitas dúvidas.

Num exame crítico dos trabalhos con-duzidos ao longo de duas décadas no Cen-tro Agronómico Tropical de Invetigacióny Enseñanza (Catie), na Costa Rica, So-marriba et al. (2001) concluem que estudosde caso repetidos em propriedades de agri-cultores, focalizando as tecnologias jul-gadas mais promissoras, são preferíveisaos delineamentos experimentais clássicosem estação experimental. Do ponto de vis-ta da lógica da pesquisa, essa estratégiaimplica numa grande mudança: em lugar defocalizar o problema na estação experimen-tal e depois extrapolar as soluções para arealidade, passa-se a ver a realidade comoum grande laboratório, onde cada caso éuma unidade experimental. Nesse proce-dimento, o conhecimento necessariamenteé construído a várias mãos e há explicita-mente um nível de risco.

O ponto-chave nesses estudos de casoé a definição de quais são essas opçõestecnológicas supostamente mais promis-soras. Essa definição se alicerça em doispré-requisitos. Primeiro, os pesquisadoresprecisam ter um conhecimento detalhado

4De fato, nas regiões em que o clima permitia o cultivo do cafeeiro, a cafeicultura foi a maior responsável pela transformação da Mata Atlânticaem pasto ralo. E é sintomático que o interesse pela arborização no Brasil ganhou ímpeto na década de 50, em conseqüência do esgotamento das áreasde mata no estado de São Paulo. Posteriormente, a disseminação do uso de adubos minerais permitiu um novo fôlego à cafeicultura, até que osproblemas econômicos e agronômicos associados aos adubos minerais se tornassem aparentes.

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da cultura focalizada (p.e., o café) e com-preender com igual detalhe como ela seinsere no sistema propriedade e interagecom outras atividades, isso tudo associadoà capacidade de interlocução com os agri-cultores. Segundo, da parte dos agricul-tores, é preciso um perfil experimentador euma compreensão de que há um risco ine-rente à construção do conhecimento.

Sem o conhecimento detalhado sobreo ambiente do sistema de produção (cul-turas, solo, criações e interações) a marchametodológica descrita nesse artigo podeser de pouco valor. Nunca é demasiadoreafirmar que o exercício da abordagem sis-têmica exige conhecimento, experiência ecapacidade de interlocução. Phillipe Jouve,do Institute National de Recherche pourdes Regions Chaudes, um dos nomes maisconhecidos da abordagem sistêmica naFrança, faz a seguinte analogia5 : para diag-nosticar uma doença, o médico se vale doestetoscópio e do termômetro, mas o diag-nóstico resulta da sua experiência à luz doque os instrumentos indicam. Similarmente,o instrumental metodológico da abordagemsistêmica produz dados, mas, como umtermômetro nas mãos de um leigo, é insu-ficiente para um diagnóstico seguro.

Nada substitui a experiência e o proble-ma reside justamente nisso. Por um lado,os pesquisadores com mais experiênciatemática freqüentemente foram treinadosde maneira disciplinar e usualmente fizeramsuas carreiras científicas prescindindo daabordagem sistêmica. Por outro lado, osmais jovens freqüentemente mostram inte-resse na abordagem sistêmica, mas lhesfalta experiência temática. Montar equipesde trabalho conciliando ambos aspectostem sido um desafio.

Vale lembrar que a abordagem sistêmicae o uso de métodos participativos para oestudo da arborização são estratégias dedesenvolvimento com um componente deinvestigação, ou, em outras palavras, estra-tégias de pesquisa voltada para o desen-

volvimento. Podem produzir resultados dealto valor para o desenvolvimento, maspodem não responder perguntas especí-ficas sobre cada fator envolvido. Como apromoção do desenvolvimento regional ésensivelmente mais complexa que a condu-ção de um experimento sob condições con-troladas, o desafio para os pesquisadoresé proporcionalmente maior. De maneirasemelhante, a abordagem sistêmica e parti-cipativa tira os agricultores e extensionistasda posição confortável de recipientes deum conhecimento criado por terceiros, paratorná-los corresponsáveis na produção doconhecimento de que necessitam.

Para tornar realidade a cafeicultura arbo-rizada e colher as vantagens que ela ofere-ce, vislumbram-se apenas duas alterna-tivas. Ou coletivamente optamos por umaabordagem participativa mais ou menosnos moldes sugeridos por Somarriba et al.(2001), e colhemos resultados em duas outrês décadas, ou continuamos arranhandoo problema com a experimentação clássicapelos próximos séculos.

CRÍTICAS ÀABORDAGEM SISTÊMICA

Duas das críticas mais freqüentes à abor-dagem sistêmica são, primeiro, que ela nãovisa à pesquisa, mas à extensão; segundo,que ela não é científica. Quanto à primeiracrítica, não é falsa, embora não seja total-mente verdadeira. A abordagem sistêmicafoi desenvolvida para melhorar o índice deacerto nos projetos de desenvolvimentoregional, vale dizer, melhorar a eficácia dosinvestimentos em desenvolvimento. Seuuso em pesquisa visa à sintonia fina entreo que é pesquisado e o que é necessáriopara o desenvolvimento. De fato, muitasiniciativas de pesquisa bem-sucedidas emgerar desenvolvimento, sobretudo na indús-tria, seguiram, de modo intuitivo, a marchade aplicação da abordagem sistêmica, comampla participação e interlocução com osagentes produtivos.

Quanto a não ser científica, essa afirma-ção nos remete a um dos mais interessan-tes paradoxos da ciência: a ausência demétodo para definir o que pesquisar! O mé-todo científico, como um corpo conceitualpara testar hipóteses, desenvolveu-se emseus aspectos quantitativos, a tal pontoque hoje temos dificuldade em conceberciência sem estatística. Desenvolveu-setambém na lógica de delinear tratamentosde modo que venha a isolar os fatores estu-dados e suas interações com outros fato-res. Assim, uma vez definido um problemade pesquisa, o ferramental para estudo estábem fundado.

Porém, o primeiro passo da investiga-ção, que é a definição do problema a serpesquisado, carece totalmente de método.Na maioria das vezes, a definição do quepesquisar sai da cabeça do pesquisador,sem que ele tenha sido treinado para isso.Se o pesquisador estiver em contato íntimocom a realidade que ele visa transformar etiver boa intuição, há chance de o resultadoda investigação ser útil para o desenvolvi-mento. Porém, é infelizmente freqüente quea percepção dos pesquisadores abranjaparte da situação, contribuindo afinal paraas prateleiras repletas de informações depouco uso.

Uma terceira crítica, muito procedente,é que a abordagem sistêmica é cara. De fato,a prescrição de equipes multidisciplinarese o tempo relativamente longo para estudaráreas agrícolas, muitas vezes de reduzi-da dimensão populacional, econômica ouprodutiva, tornava o método oneroso. Emlarga medida, essa limitação tem sido con-tornada com o desenvolvimento de méto-dos mais expeditos, e com a incorporaçãono processo de agentes de desenvolvimen-to local. Dentre esses agentes, são freqüen-tes a extensão rural oficial, as cooperativasagropecuárias, sindicatos rurais, organi-zações não-governamentais e empresas.No Paraná, esses atores atuam com a pesqui-sa em redes de propriedades, que servem

5Exemplo usado por Phillipe Jouve em palestra na Universidade Estadual de Londrina, PR.

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como referência para a definição dos pro-blemas a estudar, para testes de validaçãode tecnologias e como ponto focal paradiscussões sobre o desenvolvimento agrí-cola.

ORGANIZAÇÃO DEREDES DE PROPRIEDADESDE REFERÊNCIA6

Nos últimos anos tem sido sistematica-mente ampliado o interesse na análise ediscussão dos chamados “relacionamen-tos interorganizacionais em redes”, aque-les que, na definição de Migueletto (2001)constituem-se em:

...um arranjo organizacional formado porum grupo de atores, que se articulam – ousão articulados por uma autoridade – coma finalidade de realizar objetivos complexos,e inalcançáveis de forma isolada. A rede écaracterizada pela condição de autonomiadas organizações e pelas relações de interde-pendência que estabelecem entre si. É umespaço no qual se produz uma visão compar-tilhada da realidade, se articulam diferentestipos de recursos e se conduzem ações deforma cooperada. O poder é fragmentadoe o conflito é inexorável, por isso se neces-sita de uma coordenação orientada ao for-talecimento dos vínculos de confiança e aoimpedimento da dominação.

Na chamada “era da informação”, as re-des são justificadas como resposta a umambiente cada vez mais concorrencial, sen-do utilizadas como estratégia para enfrentaras turbulências e incertezas que caracteri-zam o ambiente no qual operam as organi-zações, sejam elas públicas ou privadas.

Nesse novo ambiente, a necessidadede respostas cada vez mais rápidas paramudanças cada vez mais intensas, aumentaa interdependência entre as organizações,pois cresce a necessidade de recursos espe-cializados, processamento de informações,contato com clientes, surgindo por outrolado as novas tecnologias de informação e

comunicação para apoiar o relacionamentointerfirmas.

A realização de ações relacionadas commarketing, treinamento, aquisições conjun-tas de armazenagem/estocagem, equipamen-tos especializados, serviços profissionaise outros, além da pesquisa e desenvolvi-mento, são comumente identificadas comomotivadores para a organização das empre-sas em redes. Ou seja, trata-se de buscar acolaboração para a aquisição de recursose competências que individualmente aorganização não possui.

Esse contexto é particularmente verda-deiro para as pequenas e médias empresas(PMEs), uma vez que se torna impossívelpara estas possuírem a mesma capacidadeque as grandes empresas, a fim de dominartodas as atividades, cada vez mais comple-xas, de um ciclo de agregação de valor, per-mitindo então que as PMEs ganhem maiorescala, mais habilidade e maior capacidadeinovativa para fazer frente à competição.

Diante desses fatos, para enfrentar osdesafios inerentes ao desenvolvimento desistemas de produção agropecuários com-petitivos e sustentáveis, ganha força anecessidade de enfoques que consideremtambém aspectos relativos à gestão dasunidades produtivas rurais, como é o casoda organização e operacionalização de re-des interorganizacionais, dentro dos pro-pósitos e características descritas.

Neste contexto, a operacionalização deredes envolve uma metodologia de pesqui-sa adaptativa (validação) e difusão de tecno-logias, apoiada em redes de propriedades(grupo de 20 propriedades representativasdos sistemas de produção encontrados emuma dada região agrícola), analisadas eacompanhadas com o enfoque sistêmico,que após sofrerem intervenções para amelhoria dela, servem para o fornecimen-to de referências técnicas e econômicas(PASSINI, 1997).

Entre os objetivos deste dispositivoencontram-se: levantar demandas de pes-

quisa a partir de diagnósticos nas proprie-dades participantes; realizar testes, ajus-tes e validação de tecnologias, a oferta detecnologias e/ou atividades que ampliem aeficiência dos sistemas de produção; dis-ponibilizar informações e a proposição demétodos para orientar agricultores na ges-tão da propriedade rural; utilizar as proprie-dades participantes como pólo de difusãoe capacitação de técnicos e agricultores eainda, ofertar subsídios para a formulaçãode políticas de promoção da agricultura fa-miliar.

A metodologia de implantação das re-des contempla as diferentes etapas da pes-quisa em sistemas de produção descritasneste texto, tendo como início a elaboraçãode um estudo prévio sobre a região, ondese instalará o trabalho, visando à caracteri-zação dos recursos naturais e condiçõessocioeconômicas, seguindo-se da tipifica-ção dos agricultores, levando em conta asatividades econômicas mais importantes nageração de renda em suas propriedades esua categoria social, o que permite a iden-tificação dos principais sistemas de produ-ção, seja pela freqüência com que ocorrem,seja pelo potencial como opção para o de-senvolvimento regional.

De posse dessas informações, são sele-cionados os sistemas que integram a ini-ciativa, identificando-se, com o auxílio deextensionistas rurais da região, os agricul-tores que representarão esses sistemas deprodução, em número mínimo de quatropor sistema.

Os estabelecimentos escolhidos pas-sam por um diagnóstico expedito, com baseem informações dadas pelos agricultores,e por observações feitas por técnico res-ponsável pelo trabalho em visita de campo.Esse diagnóstico servirá de base para aformulação de um plano de melhorias decurto prazo, que visa, principalmente, a re-dução de perdas e a correção de possíveisincoerências entre os objetivos dos agricul-

6Os autores agradecem ao pesquisador Márcio Miranda as valiosas contribuições na elaboração desse tópico.

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25Cafeicultura familiar

tores e suas famílias e o sistema de produ-ção conduzido no estabelecimento.

No processo de implantação desse pla-no, dados e informações são registradosde forma que permita a confirmação dosresultados positivos em relação ao estadoinicial. Também este período de observa-ções permite a ratificação e/ou retificaçãodo diagnóstico inicial. Ao final de um anohá condições para a formulação de umprojeto a longo prazo, que busque a otimi-zação no uso dos recursos da propriedade,para obtenção dos melhores resultados, deacordo com os objetivos dos agricultorese de suas famílias. As propostas elaboradasem conjunto entre o técnico e o agricultorsão implantadas num processo que podelevar de três a cinco anos, dependendo dacomplexidade do sistema atual e daqueleque se pretende construir. Durante todoesse período, registros técnicos e econômi-cos são efetuados. Validadas as propostasimplantadas, esses dados irão constituir asreferências técnicas e econômicas que ser-virão para a orientação dos agricultorescom características semelhantes represen-

tados nas redes. As etapas metodológicasdescritas acima podem ser visualizadas naFigura 1.

A partir do acompanhamento das pro-priedades, elaboraram-se sistemas de pro-dução adaptados à região, possíveis de seradotados por um maior número de produ-tores. Os sistemas de produção são anali-sados no seu conjunto (produção animal,vegetal, florestal e recursos naturais, finan-ceiros e humanos), avaliando-se sua viabi-lidade a partir dos resultados econômicosgerados.

A integração entre agricultores, exten-sionistas e pesquisadores, proporcionadapelas redes, torna possível compreender ofuncionamento e a evolução dos sistemasde produção a curto e médio prazos e tam-bém fazer os ajustes e análises de sistemasinovadores. Podem-se, ainda, utilizar aspropriedades participantes como local deteste e validação de tecnologias desenvol-vidas em estações experimentais.

Em suma, as redes de unidades produ-tivas rurais implicam em uma reformula-ção dos métodos, técnicas e procedimen-

tos de pesquisa e extensão rural para queseja possível, ao se obterem referências eparâmetros técnicos e econômicos, sub-sidiar a agricultura familiar em tecnologiasapropriadas e novos arranjos de seus sis-temas de produção, os quais devem pos-sibilitar a melhoria da renda e da qualidadede vida.

No estado do Paraná, a implantação das“Redes de Referências para a Agricultu-ra Familiar”, teve início em junho de 1998,sendo conduzida pela Empresa Paranaensede Assistência Técnica e Extensão Rural(Emater-PR) e Instituto Agronômico do Pa-raná (Iapar), sob os auspícios do projetode Estado “Paraná 12 Meses”.

Atualmente, o trabalho encontra-se emexecução em 11 regiões administrativas daEmater-PR, contando em cada região comum extensionista rural daquela empresa,responsável pelo acompanhamento de umarede de 20 propriedades em média, técnicoque se convencionou chamar de extensio-nista de Redes.

Estas regiões são agrupadas em trêsmesorregiões: Norte, Noroeste e Oeste/Su-

Figura 1 - Etapas do trabalho das Redes de Referências para a Agricultura Familiar

FONTE: Miranda e Doliveira (2005).

Diagnóstico

Planejamento

Referências

(sistemas e modulares)

D

I

F

U

S

Ã

O

S

U

B

S

Í

D

I

O

S

. Políticas públicas

. Pesquisa

. Extensão

Caracterização

regionalTipificação

Escolha dos

sistemas

Seleção das

propriedades

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26 Cafeicultura familiar

Figura 2 - Estrutura e distribuição regional das Redes de Referências para a Agricultura Familiar no ParanáFONTE: Miranda e Doliveira (2005).

Cornélio ProcópioLondrina

ApucaranaParanavaí

Maringá

Umuarama

Campo Mourão

Toledo

Cascavel

Francisco Beltrão

Pato Branco

Curitiba

Coordenação estadual

Equipe mesorregional

Extensionistas das redes

doeste. Em cada uma delas há uma equipede três técnicos das áreas de socioecono-mia, fitotecnia e zootecnia, chamados arti-culadores mesorregionais. Sua função pri-mordial é dar apoio metodológico e técnicoaos extensionistas de Redes, consolidar eanalisar as informações dos sistemas deprodução em estudo na mesorregião e pro-mover a articulação com outros agentes,em especial com a pesquisa. Pesquisadoresdo Iapar, especialistas da Emater-PR e con-sultores estão cumprindo esta função.

Técnicos do Iapar, da Emater-PR e daUnidade de Gerenciamento do Paraná com-põem a coordenação estadual, a qual res-ponde pela unidade do trabalho e articula-ção do projeto no âmbito da Secretaria deEstado da Agricultura e do Abastecimento,instituições parceiras e outras organizaçõese atividades ligadas ao desenvolvimentorural. A estrutura e distribuição regionaldas Redes são apresentadas na Figura 2.

Participam do trabalho cerca de 200 agri-

cultores. A Figura 3 mostra os municípiosonde se encontram estabelecidas as Redese as atividades econômicas mais importan-tes na composição dos sistemas em estudoem cada região.

Diferentes produtos são gerados duran-te a execução de todas as etapas do trabalho.Alguns servem como material de difusão,tanto de tecnologias como de informaçõeseconômicas e métodos de gestão para instru-mentalizar agricultores e técnicos da assis-tência técnica na condução de suas ativida-des, enquanto outros podem subsidiar aformulação de políticas públicas e as açõesda pesquisa e da extensão rural.

No tocante à cafeicultura familiar, têmsido trabalhados sistemas de produção, nosquais o café encontra-se presente comoatividade complementar, combinado comoutras atividades, notadamente o cultivode grãos e a produção de leite, além da orga-nização de uma rede focada na produçãode café orgânico.

Na experiência paranaense, as caracte-rísticas pouco usuais do trabalho, especial-mente no tocante ao enfoque sistêmicoadotado, que se contrapõe à visão reducio-nista de grande parte dos técnicos e pro-jetos, e à forma de relacionamento institu-cional entre extensão e pesquisa, que nasredes é mais integrada em relação à tradicio-nal, foram os principais fatores dificulta-dores da implantação e desenvolvimentodos trabalhos (MIRANDA; DOLIVEIRA,2005).

Naturalmente, na operacionalização deredes de unidades produtivas rurais devemser consideradas as especificidades dosatores locais envolvidos na implementaçãoda proposta, adequando os procedimentosmetodológicos aqui descritos às condiçõesefetivas de trabalho, sem que se percam,contudo, os eixos fundamentais de suaexecução, quais sejam, a adoção do enfoquesistêmico e a ação em parceria entre agri-cultores, extensionistas e pesquisadores.

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27Cafeicultura familiar

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Uma idéia por vezes aflorada é que aabordagem sistêmica tem como fulcro anegação da experiência metodológica e doconhecimento factual desenvolvidos pelapesquisa agrícola tradicional. É uma idéiafalsa. A abordagem sistêmica e a partici-pação dos agricultores na geração de co-nhecimento não negam nem substituem apesquisa analítica, por produto ou disci-plina.

O objetivo último da abordagem sistê-mica com a participação dos agricultores éo desenvolvimento. Para atingir esse obje-tivo, esta abordagem constitui um novopasso da ciência e do conhecimento huma-no, um avanço sobre a pesquisa analítica.Contudo, os resultados da pesquisa ana-lítica são tijolos na construção de sistemasagrícolas mais sustentáveis, buscados pelaabordagem sistêmica. Assim, esta e a pes-quisa analítica se complementam.

Porém, também é verdade que a aplica-ção da abordagem sistêmica terminou porchamar a atenção para a relativa ineficáciada pesquisa analítica em gerar desenvol-

REFERÊNCIAS

IPARDES. Paraná: diagnóstico social e econô-mico. Curitiba, 2003. 159p.

KHATOUNIAN, C.A. A reconstrução ecoló-gica da agricultura. Botucatu: Agroecológica,2001. 348p.

______. Produção de alimentos para consu-mo doméstico no Paraná. Londrina: IAPAR,1994. 192p.

Figura 3 - Municípios onde existem estabelecimentos das Redes e principais atividades econômicas que compõem sistemas de produçãoem estudo

FONTE: Miranda e Doliveira (2005).NOTA: ORNA – Ocupação rural não-agrícola.

vimento. Ineficácia esta, devida, por umlado, à não representatividade da maioriadas estações experimentais em relação àscondições dos agricultores pobres e, poroutro lado, à carência de um método de de-finir os problemas de pesquisa. Ao se colo-car o dedo nessa ferida, não é raro que quemaponta se sinta superior e o responsávelpela ferida reage, negando o problema.

É impressão, contudo, que essa fasede atrito tenha passado. E que o conheci-mento agronômico, incrementado com aabordagem sistêmica, poderá contribuirmais e melhor para o desenvolvimento desistemas agrícolas mais produtivos, eqüita-tivos e sustentáveis.

MIGUELETTO, D.C.R. Organizações em Re-de. 96p. 2001. Dissertação (Mestrado) - EscolaBrasileira de Administração Pública, FundaçãoGetúlio Vargas, Rio de Janeiro.

MIRANDA, M.; DOLIVEIRA, D.D. Redes deReferências: um dispositivo de Pesquisa & De-senvolvimento para apoiar a promoção da agricul-tura familiar. Londrina: IAPAR, 2005. 1 CD-ROM.

PASSINI, J.J. Redes de propriedades de referên-cia. In: IAPAR. Enfoque sistêmico em P&D: aexperiência metodológica do IAPAR. Londrina:IAPAR, 1997. cap.6, p.111-127. (IAPAR. Circu-lar, 97).

PERFECTO I.; RICE R. A.; GREENBERG, R.;VOORT, M.E. van der. Shade coffee: a disappearingrefuge for Biodiverstiy. BioScience, Washington,v.46, p.598-608, 1996.

PRETTY, J. Agri-culture: reconnecting peo-ple, land and nature. London: Earthscan, 2002.261p.

SOMARRIBA, E.; BEER, J.; MUSCHLER, R.G.Research methods for multistrata agroforestrysystems with coffee and cacao: recommendationsfrom two decades of research at CATIE. Agro-forestry Systems, v.53, p.195-203, 2001.

Norte:

grãos, café, fruticultura,

ORNA (oficina de costura).

Noroeste:

leite, grãos,

fruticultura,

sericicultura,

café, mandioca.

Oeste:

leite, grãos, peixe,

pequenas criações.

Sudoeste:

leite, grãos,

fruticultura,

agroindústria.

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28 Cafeicultura familiar

1Engo Agro, D.Sc. Solos e Nutrição de Plantas, Pesq. EPAMIG-CTZM, Vila Gianetti, 46, Caixa Postal 216, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correioeletrônico: [email protected]

2Enga Agra, Ph.D. Ciências Ambientais, Profa UFV-Depto Solos, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: [email protected] Florestal, Mestrando UFV-Depto Solos, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: [email protected] Agra, D.Sc. Fitotecnia, Pesq. EPAMIG-CTZM, Vila Gianetti, 46, Caixa Postal 216, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico:

[email protected] Agro, Ph.D. Ciências dos Solos, Prof. UFV-Depto Solos, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: [email protected] Agro, M.Sc. Solos e Nutrição de Plantas, Prof. UFV-Depto Solos, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: [email protected]

Sistemas de produção agroecológicos e orgânicosdos cafeicultores familiares da Zona da Mata mineira

Paulo César de Lima1

Irene Maria Cardoso2

Helton Nonato de Souza3

Waldênia de Melo Moura4

Eduardo de Sá Mendonça5

Anôr Fiorini de Carvalho6

INTRODUÇÃO

Grande parte dos agricultores e agricul-toras familiares dos municípios de Arapon-ga, Divino, Ervália, Espera Feliz, Eugenó-polis, Pedra Dourada e Tombos desenvolvesistemas agroecológicos de produção. Essesagricultores adotam práticas de conserva-

ção do solo e de preservação dos manan-ciais. O controle fitossanitário de pragas edoenças é feito, utilizando métodos alter-nativos de manejo ecológico. Todas essaspráticas proporcionam uma grande diver-sidade de atividades nas propriedades, oque torna os sistemas produtivos integra-

dos e o trabalho familiar essenciais para apermanência do agricultor e de sua famíliano campo.

Ao observar o trabalho desses agricul-tores e agricultoras familiares é notado quemuito mais importante que a preocupaçãocom as elevadas produtividades obtidas

Resumo - A agricultura familiar que responde por 25% da produção brasileira de caféproduzirá, aproximadamente, 10 milhões de sacas, em 2005. Característica marcantedos cafeicultores familiares é fazer baixo uso de insumos. A diversidade da produção émais importante que a preocupação com as elevadas produtividades. A produçãodiversificada reduz as dificuldades financeiras em períodos de preços baixos pagos aocafé. A diversificação, um dos princípios da agroecologia, é fundamental para a manutençãoda propriedade. É encarada como base para a sustentabilidade. A agroecologia baseia-senos elementos da ciência moderna e no conhecimento dos próprios agricultores. A partirda investigação participativa ocorre uma combinação de saberes que resulta numa sériede princípios, que se transformam em tecnologias. Os agricultores são tão importantesnesse processo, quanto os pesquisadores. Isso implica em troca de paradigma científico,de prática, de métodos de trabalho, de relação com a terra e com seu produto. Na Zonada Mata de Minas Gerais existem várias experiências com sistemas agroecológicos deprodução, que envolvem parcerias entre agricultores, associações, sindicatos rurais, ONGse instituições públicas.

Palavras-chave: Agroecologia. Cafeicultura orgânica. Sistemas agroflorestais. Cafeiculturafamiliar. Agricultura familiar.

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29Cafeicultura familiar

pelas monoculturas desenvolvidas em uni-dades empresariais, é fundamental a di-versificação da produção. Essa estratégiareduz as dificuldades financeiras nos pe-ríodos de preços baixos pagos ao café, aprincipal fonte de renda para as unidadesfamiliares de vários municípios da região.Sendo menores as oscilações de renda, aestabilidade econômica da família é maisgarantida.

Um dos principais problemas enfren-tados por eles está na baixa fertilidade dossolos da região, causada pelas característi-cas naturais do solo e pelo grau de degrada-ção de algumas áreas. O limitado domíniodos processos de ciclagem de nutrientesdesses sistemas tem resultado em baixosníveis de input externo às lavouras, eviden-ciando a necessidade de traçar estratégiassustentáveis de adição de nutrientes, paraque os agroecossistemas sejam melhora-dos.

A nutrição e a adubação do cafeeirosob o paradigma agroecológico e orgânicopressupõem que a fertilidade do solo devaser mantida ou melhorada através da utili-zação de recursos naturais. Na medida dopossível, devem-se utilizar recursos locais,bem como subprodutos orgânicos que pro-porcionem o fornecimento de nutrientes aoscafeeiros, de forma ampla e diversificada.Deve-se priorizar a ciclagem de nutrientes,por meio de restos culturais, compostos eresíduos orgânicos, sistemas agroflores-tais (SAFs) e leguminosas, ou por plan-tas espontâneas. Trata-se de uma área doconhecimento, em que o envolvimento dapesquisa participativa faz-se necessário,para se ter uma avaliação de tais práticas ede seus benefícios, quanto à estabilidadeda produção.

SISTEMAS ORGÂNICOSDE PRODUÇÃO DE CAFÉ:PROPOSTA PARA AUMENTODE RENDA PARASISTEMAS AGROECOLÓGICOSDA ZONA DA MATA MINEIRA

As experiências com os sistemas orgâ-nicos de produção de café foram iniciadas

em 1998 com o engajamento da EPAMIG,nas parcerias já existentes entre os Sindi-catos dos Trabalhadores Rurais (STRs), aAssociação Regional dos TrabalhadoresRurais, o Centro de Tecnologias Alternati-vas da Zona da Mata (CTA-ZM), a Universi-dade Federal de Viçosa (UFV). As parceriascom várias instituições, tendo o enfoqueno produtor, resultaram em rápidos avan-ços das atividades e grande aumento decapilaridade institucional.

Naquela ocasião, era recente a criaçãode programas temáticos de Pesquisa & De-senvolvimento (P&D), na EPAMIG, entreeles os programas Agricultura de Mon-tanha e Agricultura Familiar, que atendemdemandas regionais do Estado. A agricul-tura de montanha ocorre em locais ou re-giões com grandes variações de ambientes,como, solos, faces de insolação e topogra-fia. São relevos sujeitos às erosões inten-sas e à degradação da paisagem em geral.Nessas áreas é que concentram a maior par-te dos agricultores familiares da Zona daMata e Sul de Minas, por exemplo. Desen-volver pesquisa para a agricultura de mon-tanha é, necessariamente, trabalhar com ofoco centrado na agricultura familiar.

Uma questão que vem ao encontro dosprogramas é que a cafeicultura de monta-nha é uma das principais fontes de rendadas propriedades familiares de vários mu-nicípios mineiros. Dentro desse contexto,os sistemas produtivos convencionais,embasados no monocultivo extensivo e noconsumo de insumos intensivos, tem-semostrado insustentáveis para o agricultorfamiliar. Os sistemas convencionais de-senvolvidos pelos pacotes tecnológicos daRevolução Verde não se enquadram à faltade recursos e à produção com baixo uso deinsumos.

Considerando os sistemas produtivosdiversificados dos agricultores familiarese as condições ambientais onde vivem, oenfoque agroecológico foi encarado comoalternativa para o desenvolvimento de sis-temas sustentáveis de produção. Os siste-mas orgânicos, a partir de modelos agro-ecológicos já conhecidos, e a melhoria da

qualidade de bebida poderiam ser alter-nativas para agregar valor aos seus produ-tos e promover melhoria da renda familiar,mantendo a preservação ambiental comofundamental para a sustentabilidade. Enten-dendo a sustentabilidade como a manu-tenção dos sistemas produtivos ao longode gerações, garantindo o sustento da famí-lia, a proteção ambiental e o atendimentodas demandas do consumidor. É, portanto,embasada na família, no ambiente onde elaestá inserida e na sociedade como origemdas demandas.

Dentre as mudanças promovidas peloplanejamento estratégico da EPAMIG, aadição de programas temáticos, junto aosprogramas já existentes por produto, intro-duziu um novo enfoque de trabalho e gerouuma nova filosofia de pesquisa e um novoparadigma metodológico, embasado nosmétodos participativos.

A agroecologia baseia-se nos elemen-tos da ciência moderna e no conhecimentodos próprios agricultores. A partir da inves-tigação participativa ocorre uma combina-ção de saberes que resulta numa série deprincípios, que se transformam em tecno-logias. Os agricultores são tão importan-tes nesse processo, quanto os pesquisa-dores. Isso implica em troca de paradigmacientífico, de prática, de métodos de traba-lho, de relação com a terra e com seu pro-duto (ALTIERI, 2002).

Tecnicamente, os sistemas agroecoló-gicos podem ser considerados como orgâ-nicos. Ambos buscam um novo paradigmapara a produção agrícola sustentada, apoia-dos na matéria orgânica do solo e suas trans-formações, na ciclagem e aquisição de nu-trientes pelas plantas, nos organismos dosolo, suas transformações e processos poreles mediados, na ecologia e controle bio-lógico com insetos e microrganismos, nomelhoramento genético e no uso eficientede nutrientes.

Existem diferenças básicas entre o agro-ecológico e o orgânico. Para que um pro-duto seja comercializado como orgânicohá necessidade de o produtor comprovarque o sistema produtivo atendeu às nor-

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30 Cafeicultura familiar

mas específicas e isso implica em gastoscom certificação. A vantagem seria a vendado produto com ágio, o que garante maiorrenda ao produtor. Embora haja estímulo àdiversificação na produção orgânica, issonão é uma condição expressamente impos-ta. Assim, alguns produtos orgânicos sãoproduzidos em monoculturas, que é com-pletamente diferente da diversificação pre-conizada pela agroecologia e que tem sidorealizada pelos agricultores familiares.Portanto, nem todo sistema orgânico pode-rá ser considerado como agroecológico.

Com relação à cafeicultura orgânica,conceitos como de Lopes de Leon e Men-donza Díaz (1999) propõem:

um sistema de produção que se baseie

no melhoramento e na conservação da

fertilidade do solo, no uso apropriado

de energia e no estímulo à biodiversi-

dade vegetal e animal, que promova um

manejo integrado mediante técnicas e

insumos compatíveis com o ambiente,

proibindo o uso de agroquímicos sinté-

ticos.

Essa proposta vem ao encontro dosprincípios da agroecologia.

Considerando então a possibilidade dedesenvolver sistemas orgânicos, seguindoos princípios agroecológicos dos agricul-tores familiares, foram propostas na Zo-na da Mata mineira a criação de UnidadesExperimentais de Cafeicultura Orgânica e arealização do Seminário Cafés Especiais daAgricultura Familiar.

Seminário Cafés Especiaisda Agricultura Familiar

O evento foi uma promoção conjuntados Sindicatos de Trabalhadores Rurais daZona da Mata, Associação Regional dosPequenos Agricultores da Zona da Mata;Federação dos Trabalhadores da Agricultu-ra do Estado de Minas Gerais (Fetaemg) –Pólo Regional da Zona da Mata; CTA-ZM;Departamento de Solos da UFV; Cooperati-va dos Cafeicultores de Queirozes e Secreta-ria Municipal de Agricultura de Eugenópo-lis, e contou com a colaboração do Centro

Tecnológico da Zona da Mata (CTZM), daEPAMIG, e foi realizado em Eugenópolis,MG, de 31 de maio a 2 de junho de 2000.

O Seminário teve como objetivos:

a) identificar possibilidades de introdu-ção dos agricultores familiares nosmercados diferenciados;

b) identificar exigências dos mercadosdiferenciados e encaminhar qualifi-cação da produção para ser colocadanesses mercados;

c) apresentar diagnóstico exploratóriodo volume de cafés hoje produzido,qualidade e número de agricultoresfamiliares diretamente ligados às ins-tituições representantes para verifi-car as chances de introdução no mer-cado;

d) avaliar possibilidades de certificaçãodos cafés hoje produzidos pelos agri-cultores familiares;

e) articular instituições representantesdos agricultores familiares para seintroduzirem em mercados de cafésdiferenciados e garantirem a comer-cialização diante da eminência dequeda dos preços prevista no mer-cado mundial, para os próximos anos.

Participaram do evento agricultores eagricultoras de dez municípios e técnicos epesquisadores de oito instituições públi-cas e Organizações Não-Governamentais(ONGs).

No diagnóstico exploratório apresen-tado no início do Seminário, constataram-se que, de uma população aproximada de3.550 agricultores de dez municípios daZona da Mata mineira, 46% dos cafés fo-ram produzidos em lavouras que receberamalguma adubação e defensivos (químicosou caldas caseiras), ambos com doses efreqüência normalmente aquém do reco-mendado, 53% receberam apenas aduba-ção, também abaixo das necessidades e 1%não recebeu adubação ou qualquer insu-mo químico (Quadro 1).

A adição de adubos ao solo, mesmoem doses aquém das que seriam recomen-dadas, demonstra que os agricultores per-cebiam a necessidade de adicionar nutrien-tes para produzir café em suas lavouras.Isso é indiscutível. A forma de adição denutrientes – ciclagem, adubação orgânica,rochas moídas ou adubação química – se-ria estratégia a discutir e a estabelecer.

Durante o Seminário, foram apresenta-das várias palestras sobre o conceito cafésespeciais, tipos de certificação e tendên-cias de mercado. A cafeicultura orgânicafoi bastante discutida durante esse evento.Após as palestras foram realizadas discus-sões em grupo sobre os temas e, no final,os resultados foram apresentados em ple-nária e alguns aspectos esclarecidos:

a) necessidade de o agricultor vendermelhor seu produto;

b) a comercialização de forma alternati-va à da submissão ao atravessador;

Adubos minerais e agrotóxicos 51.480 46

Somente adubos minerais 59.340 53

Sem adubos e agrotóxicos 1.095 1

Total 111.915 100

QUADRO 1 - Número de sacas de café produzido, em 1999, e distribuição de uso de insumos

obtida de 3.550 produtores de dez municípios da Zona da Mata de Minas Gerais1

FONTE: Lima et al. (2003).

(1) Diagnóstico apresentado durante o Seminário Cafés Especiais da Agricultura Familiar, realiza-

do em Eugenópolis, em maio de 2000, após consulta de quatro sindicatos e duas associações de

trabalhadores rurais.

PorcentagemTipo de insumos empregadosNúmero de sacas

produzidas

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31Cafeicultura familiar

c) criação de uma marca dos agriculto-res familiares;

d) melhoria da qualidade do café, vi-sando melhores preços e aumento derenda das famílias;

e) mais informações sobre cafeiculturaorgânica, já que o agricultor precisade mais segurança para mudar dosistema tradicional, para o novo, des-conhecido;

f) parte dos agricultores que já desen-volviam sistemas agroecológicos ma-nifestou interesse em experimentaros sistemas orgânicos.

O Seminário deixou algumas evidênciassobre os agricultores familiares: são adep-tos da agroecologia; não querem correr ris-cos; querem sempre ter uma clara noção dotrabalho e obter lucro em benefício da qua-lidade de vida da família (Fig. 1).

Dessa forma ficou demonstrado quea atuação de qualquer instituição, juntoaos agricultores, deveria ser por métodosparticipativos, observando a realidade daagricultura familiar. Os planos concebidosdentro das unidades de pesquisa poderiamaté ser importantes e interessantes, mas,

por falta de vivência do técnico, poderiamnão atender às necessidades dos agricul-tores como deveriam. Assim, em conjun-to com a família, é que deveriam ser reali-zados os diagnósticos, propor modelos deprodução, desenvolver os sistemas pro-dutivos e apresentar a resolução dos pro-blemas.

Unidades experimentais

As discussões sobre as Unidades Expe-rimentais foram iniciadas antes do Seminá-rio, em 1999, e o início dos trabalhos ocorreudepois. Essas Unidades tiveram como obje-tivo desenvolver sistemas orgânicos, coma participação dos agricultores agroecoló-gicos, seus conhecimentos, dentro de suaspropriedades e de acordo com suas possi-bilidades de trabalho.

O início das atividades nas Unidades Expe-rimentais envolvia um técnico da EPAMIGe um do CTA-ZM e quatro sítios dos muni-cípios de Araponga, Tombos e Eugenó-polis. O projeto foi financiado, inicialmente,pela Fundação Ford/Fundo Brasileiro paraa Biodiversidade (Funbio). A metodologiade trabalho envolvia a seqüência apresen-tada a seguir.

Fase inicial, pré-diagnóstico – envolviao conhecimento do meio físico regional:relevo, geologia, geomorfologia, clima, so-los, vegetação e uso da terra. Esses da-dos foram obtidos por mapas temáticos jáexistentes. O diagnóstico era feito na pro-priedade, considerando os ambientes, ossistemas produtivos, a família e o seu rela-cionamento com a comunidade. Com siste-matização dos dados obtidos pelas duasfases anteriores foram desenvolvidas aspropostas de sistemas. Trata-se de mode-los ou desenhos que estão sendo testados.

Como parte do diagnóstico um mapada propriedade foi desenhado pelo agricul-tor (Fig. 2). Nesse mapa foram representa-dos os ambientes, todas as atividades econstruções. Tentou-se, a partir daí, com-preender o uso da terra, suas potencialida-des e algumas limitações. No mapa, foramindicados, onde o sol nasce e onde se põe,durante o verão e o inverno, o que indicouo norte e as faces de exposição solar dentroda propriedade. Em topografias com muitadeclividade isso é útil, quando se avalia apossibilidade de arborização de cafezais(LIMA et al., 2002). São também dadas no-tas para potencial produtivo das áreas deacordo com o entendimento do agricultor.Inicialmente são dadas notas dez para asáreas consideradas como as mais produ-tivas, o restante das notas é comparativoaos locais de nota dez. Assim, são estratifi-cados os diversos ambientes da proprie-dade.

Outra fase do diagnóstico foi obter da-dos dos sistemas produtivos. No caso docafé, foram identificados lavouras, áreasocupadas, espaçamentos, cultivares e his-tórico de manejo de adubação e de produ-ção. Foram obtidos dados das criações, porexemplo, de gado de leite, como, númerode cabeças, manejo etc. Dos dados sobreas lavouras de café, por exemplo, foramcomuns espaçamentos de 4 x 2 m, 3 x 1,5 mou 2,5 x 1,5 m e lavouras com 20 anos oumais (LIMA et al., 2003). Todos os solosanalisados apresentaram baixos teores denutrientes e baixas produtividades, comopode ser observado no Quadro 2.

Produção

agroecológicaEvitar riscos

Clara noção

de trabalho

Produzir e obter

lucro

Agricultoras e agricultores

familiares

Diagnosticar

Propor modelos

Desenvolver sistemas de produção

Resolução de problemas emergentes

Resolução de problemas futuros

Pesquisa e

Desenvolvimento

Participativo

Figura 1 - Perfil de agricultores familiares e proposta de relacionamento das instituiçõesde P&D

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32 Cafeicultura familiar

Figura 2 - Mapa do Sítio Bela Vista – Eugenópolis, MGNOTA: Desenhado pelo proprietário, Sr. José Brás, onde estão representados o caminhamento aparente do sol no inverno e no

verão, as faces de exposição, uma estratificação do potencial produtivo dos solos por notas e a distribuição do uso da terra,contendo, construções, estrada, nascentes, córrego, lavouras etc.

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33Cafeicultura familiar

A produtividade do ano 2000 apresen-tada no Quadro 2 dobrou em relação a 1998e 1999, simplesmente porque os agricul-tores adicionaram uma pequena dose decalcário no final de 1999. O SAF em pou-co tempo proporcionou elevado teor dematéria orgânica, mas os teores de P e de Kestavam muito abaixo do necessário para aprodução do cafeeiro e a saturação porbases estava muito abaixo de 50%, indican-do um solo distrófico. Isso, certamente, estárelacionado com a baixa fertilidade naturaldesse solo.

Segundo Resende et al. (1988), é sabidoque a produção agrícola resulta da ação eda interação de diversos fatores, dos quaiso fornecimento de nutrientes, pelo solo oupor meio da adubação, ainda que muitoimportante, é apenas um deles. A capacida-de do solo em fornecer nutrientes dependede sua reserva nesses elementos. Esta re-serva por sua vez é função de um balançoexistente entre perdas e ganhos no sistema-solo.

As principais entradas de nutrientes noecossistema ocorrem via intemperismo, pre-cipitação, fixação assimbiótica e simbióti-ca de nitrogênio e adubação. As saídas denutrientes ocorrem via lixiviação, erosão,volatilização e remoção do material orgâ-nico (exploração de diferentes partes daplanta, retirada da manta florestal) (REIS;BARROS, 1990). Considerando que os so-los brasileiros são altamente intemperizados,com virtual ausência de minerais ricos emnutrientes, a contribuição do intemperis-mo deve ser muito pequena. Considerando,também, o desenvolvimento de sistemasde produção que permitam uma elevadaconservação do solo e minimizem as perdas

de nutrientes, ainda restará um balançoentre as entradas de nutrientes, a demandada planta – que varia ao longo do seu ciclo,e a saída de nutrientes – que varia com aqui-lo que é exportado do sistema. Para que essebalanço se equilibre, os componentes cicla-gem e adubação devem ser consideradosos mais importantes (LIMA et al., 2002).

Assim, para solos de baixa fertilidadecomo os da Zona da Mata mineira, em siste-mas agroecológicos a pleno sol (Fig. 3), ouSAFs (Fig. 4), deve-se considerar que umapequena parte dos nutrientes, que serãoabsorvidos pelas plantas, será reciclada dasreservas minerais do solo, da matéria orgâ-nica e da fixação biológica de nitrogênio.

A ciclagem deve ser maior nos SAFs > agro-ecológicos a pleno sol > monoculturas.Considerando a inevitável saída ou expor-tação de nutrientes pela extração de produ-tos e a baixa capacidade de reposição dosolo, a sustentação do sistema produtivoserá comprometida se não houver reposiçãode nutrientes, provavelmente, mais lenta-mente nos SAFs, devido a sua maior capa-cidade de reciclar. Mas o esgotamento dasreservas minerais ocorrerá mais ou menosintensamente, dependendo da diferençaentre a exportação de nutrientes via pro-dutos e a adição natural. A exportação éinevitável e a adição é muito baixa em solosaltamente intemperizados.

16,17 18,4 6,3 0,99 44,9 7,1 0,08 4 4 8

16,78 9,5 30,4 0,99 36,6 3,8 0,06

QUADRO 2 - Resultados das análises de solo sob sistema agroflorestal (SAF) com seis anos, em Latossolo Vermelho-Amarelo textura argilosa do

Sítio Pedra Redonda, município de Araponga, MG

0-20 4,9 5,34 1,1 42 2,16 0,70 0,20 13,20 2,97 3,17

20-40 4,6 5,14 0,7 29 1,17 0,36 0,70 15,18 1,60 1,60

pH MO P K Ca2+ Mg2+ Al3+ H+Al SB t T V m Zn Fe Mn Cu 1998 1999 2000

H2O dag/kg mg/dm3 cmolc/dm3 mg/dm3

Prof

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(cm

)

sacas beneficiadas/ha%

Figura 3 - Sítio Bela Vista – Eugenópolis, MG

NOTA: Sistema agroecológico de produção de café orgânico. Diversificação com feijão,

bananeiras, etc.

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34 Cafeicultura familiar

A proposta primária para atuar numacondição de baixa fertilidade natural éaplicar técnicas de manejo do solo que fa-voreçam a reciclagem de nutrientes com omenor custo possível, levando em conta acapacidade de investimento e de trabalhodo agricultor familiar. A partir disso, a

necessidade de importação de nutrientespara o sistema será menor. Se a proprieda-de ou a comunidade desenvolver sistemasde produção de compostos orgânicos e deaproveitamento de resíduos, a dependênciapor insumos de fora será reduzida aindamais.

Uma das finalidades dos diagnósticosrealizados nas Unidades Experimentais eraobter dados para tentar propor sistemasintegrados de produção. Assim, produtos ousubprodutos obtidos de um sistema con-tribuem para a obtenção de outro produto,de outro sistema, e permite, ainda, a distri-buição de trabalho ao longo do tempo emdeterminado espaço geográfico – proprie-dade, comunidade, município, etc. A inte-gração de sistemas pode implicar em redu-ção de custos, quando um produto serve deinsumo para a produção de outro. Por exem-plo, o esterco de curral, os adubos verdese a casca de café, são resultados das pro-duções de leite, de leguminosas e da cafei-cultura, que passam a se tornar insumospara a produção de café orgânico (LIMAet al., 2002).

A proposta de sistemas integrados deprodução tem sido bem absorvida por vá-rias propriedades, conforme apresentadono Sítio Pedra Redonda em Araponga, MG.Há um sistema de coleta de biomassa ve-getal e outro de produção de esterco utili-zados para montagem das medas de com-postagens. Os compostos orgânicos e osadubos verdes são empregados para aadubação e nutrição dos cafeeiros (Fig. 5).

O uso de leguminosas intercaladas noentorno e em faixas nos cordões de contor-

Figura 4 - Sítio do Alexandre – Divino, MG

NOTA: Um dos sistemas agroflorestais mais antigos da Zona da Mata de Minas Gerais,

desde 1994.

Figura 5 - Sistemas integrados na produção de café orgânico no Sítio Pedra Redonda – Araponga, MGNOTA: A – Palhada junto ao curral para produção de composto orgânico; B – Leguminosas nas ruas dos cafeeiros para adubação

verde.

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35Cafeicultura familiar

no (menor consumo de energia para trans-porte) poderá contribuir como a principalfonte de nitrogênio para a lavoura de café.O cultivo intercalar de leguminosas e cer-tas plantas espontâneas também protegeo solo contra a erosão e possibilita a incor-poração de matéria orgânica ao sistema.A prática da roçada e a cobertura mortasob o pé de café contribuem para a melhoriada fertilidade do solo e da retenção de água.

A partir da vivência com o sistema orgâ-nico surgiram as dificuldades, as observa-ções e foram desencadeadas as pesquisasem diferentes áreas, de acordo com as di-ficuldades apresentadas. Os experimentosinstalados dentro ou fora das Unidadesforam denominados experimentos satélites,sendo que os primeiros projetos elabora-dos e financiados consideraram:

a) as questões discutidas no Semináriode 2000 (agricultores);

b) as discussões dos problemas que sur-giram para a condução dos sistemasde produção (adubação e cultiva-res);

c) os princípios da agroecologia (pes-quisa participativa).

Todos os trabalhos que foram condu-zidos no campo passaram pela seqüênciametodológica a seguir:

a) uma rediscussão da problemática erapromovida antes das atividades eessas foram avaliadas após a suarealização;

b) o acompanhamento era realizado aolongo da condução do experimento,por técnicos e agricultores envolvi-dos na pesquisa e em atividades deformação;

c) a problemática era novamente dis-cutida na ocasião da avaliação doexperimento no campo, onde o agri-cultor apresenta suas observaçõese impressões;

d) algumas avaliações foram feitas nasunidades das empresas de pesqui-sa;

e) os resultados foram apresentados àcomunidade;

f) esses resultados deverão ser discu-tidos para se definir uma estratégiade aplicação da informação.

Os projetos em desenvolvimento den-tro dessa sistemática foram iniciados emfunção de questões cruciais apresentadaspelos agricultores, ou seja, como adubarno sistema orgânico, que exige elevadasdoses de estercos e compostos orgâni-cos?

Para tentar resolver essa questão, foiconsiderada uma outra pelos pesquisado-res: se as cultivares existentes no merca-do foram desenvolvidas para os sistemasconvencionais, com objetivo de atingirelevadas produtividades em condições demanejo intensivo, elas exigem elevadas do-ses de adubos para produzirem e a maioriadelas são suscetíveis a várias pragas edoenças.

Uma parte da problemática tem sidotrabalhada há décadas pelo melhoramentogenético. Já existem programas desenvol-vendo cultivares resistentes à ferrugem ejá foram lançadas várias delas como resul-tado desses programas (FAZUOLI et al.,2002; PEREIRA et al., 2002; SERA et al.,2002). Mas essas cultivares não foram tes-tadas em lavouras orgânicas ou em sistemasagroecológicos conduzidos pelos agricul-tores familiares.

Considerando ainda a elevada deman-da por nutrientes e a seleção de cultivaresadaptadas aos sistemas orgânicos e agro-ecológicos, encontram-se em fase de con-dução os primeiros projetos de pesquisacom os experimentos satélites. São proje-tos financiados com recursos do Conse-lho Nacional de Desenvolvimento Cien-tífico e Tecnológico (CNPq), da Fundaçãode Amparo à Pesquisa do Estado de MinasGerais (Fapemig) e do Consórcio Brasileirode Pesquisa e Desenvolvimento do Café(CBP&D-Café), envolvendo cultivares eadubação orgânica e verde. Por se tratarde cafeicultura seus resultados são avalia-dos ao longo de alguns anos.

Plano estratégico do café

Os trabalhos de capacitação e comer-cialização coordenados pelo CTA-ZM ti-veram entre seus objetivos estabelecer umplano de transformação de café agroecoló-gico em café orgânico agroecológico. O ca-fé agroecológico teve como principal metaa utilização de alternativas para minimizaro uso de insumos externos com exclusãode adubos de elevada solubilidade e agro-tóxicos, proibidos em sistemas orgânicos,com base no conhecimento do agricultor esua conjuntura local. O café orgânico de-verá atender às exigências da certificaçãoorgânica em âmbito nacional, inicialmente,e internacional a longo prazo.

A capacitação agroecológica da agri-cultura familiar foi fundamental para traba-lhar de forma intensiva na formação deagricultores e agricultoras sobre a cafeicul-tura orgânica. Esse trabalho foi iniciado jáno Seminário sobre Cafés Especiais, reali-zado em maio de 2000. A partir desse Semi-nário vários cursos e treinamentos sobreProdução de Café com Qualidade foramoferecidos.

Em 2001, foi realizado o Encontro deExperimentadores de Café Agroecológicoe Orgânico. No primeiro dia, alguns agri-cultores promoveram, em suas proprieda-des, transferência de conhecimento aosdemais (Fig. 6). No segundo dia, foram rea-lizadas palestras sobre as Unidades Experi-mentais e avaliação do encontro.

No mesmo ano, foi realizada uma excur-são ao Sul de Minas para visitar agricultoresfamiliares que já produziam o café orgânico(Fig. 7). O sucesso dessa viagem foi tal que,em seguida, tivemos a tarefa de convertermais de uma centena de cafezais para o sis-tema orgânico. A partir da conversão foirealizado um encontro para traçar estraté-gias de produção, de certificação e de co-mercialização desse café.

Esse evento traçou um Plano Estratégi-co para o Café Agroecológico Produzidopor Agricultores Familiares da Zona da Ma-ta do Estado de Minas Gerais (CARDOSO,2004). O Plano levantou dados sobre o mer-

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36 Cafeicultura familiar

gresso excepcional. Em 2003, de um total de42 produtores amostrados, 80% das amos-tras já apresentavam qualidade de bebidafina. Como estratégia de marketing, algunsagricultores participaram de concursos dequalidade de café promovidos pelas regio-nais da Empresa de Assistência Técnica eExtensão Rural do Estado de Minas Gerais(Emater-MG) da Zona da Mata, em 2003 e2004. Já foram conquistados onze troféuspelos agricultores que se classificaram entreos oito primeiros colocados.

Ainda, desde 2002 foi dado início aum programa de formação de agricultorese agricultoras. Este programa abrangeutoda a cadeia produtiva do café orgânico.Envolveu encontros temáticos, visitas àspropriedades, discussão sobre experimen-tação, participação de instalação e colheitade experimentos sobre adubação verde ecultivares nas Unidades Experimentais e orepasse do conhecimento para grupos deagricultores e agricultoras de cafés agro-ecológico e orgânico.

Na tentativa de comercializar de formacoletiva a safra de 2003, foram realizadosimportantes contatos e muito se aprendeusobre os mercados orgânico e Fair Trade decafé, tornando claro para os agricultores queé possível e vantajoso negociar e vendercafé do grupo coletivamente (CARDOSO,2004). Este grupo de agricultores aindaenfrenta três grandes dificuldades duran-te o processo:

a) custo de transporte para reunir o caféde todos os agricultores, tem que serdesembolsado num período, quan-do são muito baixas suas reservasde recursos financeiros (final de co-lheita);

b) falta de infra-estrutura adequada pa-ra armazenar, fazer rebenefício e pre-paro de blend para atingir a quali-dade desejada;

c) descapitalização dos agricultores,que não permite armazenar o café pormuito tempo, obrigando-os, muitasvezes, à venda do produto a preçodo mercado em baixa.

Figura 7 - Vista de uma das lavouras de café orgânico de Poço FundoNOTA: Visita durante excursão ao Sul de Minas.

Figura 6 - Encontro de Experimentadores do Café Agroecológico e OrgânicoNOTA: Agricultor João dos Santos demonstrando a importância da cobertura morta sob

o cafeeiro.

cado do café, identificou os problemas eas possibilidades de melhoramento dossistemas de produção, beneficiamento ecomercialização do café; definiu estratégiasconjuntas de ações, visando à identifica-ção de novas formas de escoamento e co-mercialização da produção de café dos agri-cultores familiares (Fig. 8).

Faz parte do plano estratégico, iniciadoem 2001, a qualificação do produto comocafé de bebida fina. Essa estratégia temcomo objetivo preparar a agricultura fami-liar da região para venda nos mercados maisexigentes e, assim, obter preços mais jus-tos. A qualidade da bebida vem sendo mo-nitorada desde 2002 e tem mostrado um pro-

CTA

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Cardoso (2004) acrescentou que énecessário conhecer mais sobre o mercado,devendo, nessa busca, preparar e enviaramostras para possíveis compradores.Também há a necessidade de capacitarassociações regionais para o comércio decafé, participar de feiras e eventos sobremercado orgânico ou solidário, investir emmarketing e incentivar a participação dosagricultores em concursos de qualidade decafé. Tudo como parte da construção deestratégias de comercialização.

SISTEMAS AGROFLORESTAIS:UMA PROPOSTAAGROECOLÓGICA PARAA ZONA DA MATA MINEIRA

A Zona da Mata de Minas Gerais estáinserida no bioma Mata Atlântica, uma dascinco primeiras entre as 25 reservas de bio-diversidade mais ameaçadas do planeta –os chamados hot-spots (MYERS et al., 2000).A região é declivosa e com solos profun-dos, características que associadas aosíndices de precipitação (média anual quevaria de 1.100 mm a 1.800 mm) propiciam aformação de inúmeras nascentes e peque-nos cursos d’água. Diante dessas caracte-

rísticas várias áreas são consideradas depreservação permanente e apresentam res-trição legal de uso e manejo (FREITAS etal., 2004). A altitude da região varia de 200a 1.800 m. Ao longo de sua história, a Zonada Mata mineira sofreu um desmatamentointenso, o que levou à alteração drásticada paisagem natural com fortes impactosambientais. O modelo de agricultura domi-nante na região, fundamentado na Revo-lução Verde, aprofunda ainda mais os pro-blemas ambientais, causando, por exemplo,a erosão do solo, a contaminação das águase a perda da produtividade dos agroecos-sistemas. A agricultura familiar é predomi-nante e os agricultores utilizam suas terras,principalmente, com pastagem e café, quasesempre consorciados com culturas desubsistência como milho, feijão e mandio-ca.

A agricultura familiar, além da perda deprodutividade dos seus agroecossistemas,enfrenta problemas relacionados com asoscilações freqüentes no preço do café, oque agrava a precária situação financeirados agricultores e agricultoras. O pequenotamanho das propriedades, junto com a fal-ta de infra-estrutura e a falta de assistênciatécnica contribuem para agravar a situação

das famílias. A necessidade de retomadada produtividade está sempre na pauta dasorganizações representativas dos agricul-tores e agricultoras.

Apesar dos problemas ambientais esociais, os agricultores e agricultoras fa-miliares continuam resistindo e buscandosoluções para seus problemas, as quaisconciliem preservação ambiental e pro-dução. É nessa região que está localizadoum dos últimos remanescentes contínuosda Mata Atlântica de Minas Gerais, hojeterritório priorizado pela Secretaria de De-senvolvimento Territorial, o Parque Estadualda Serra do Brigadeiro (PESB). Localiza-setambém na região, o Parque Nacional doCaparaó, dentre outras áreas protegidas.

Na busca de soluções e tendo a agro-ecologia como a base científica de trabalho,estabeleceram-se parcerias entre os STRs,a Associação Regional dos Trabalhado-res Rurais, o CTA-ZM, uma organizaçãonão-governamental que atua na região ealguns professores e estudantes da UFV.A base científica de atuação era a agroeco-logia, ciência que preconiza a valorizaçãodo conhecimento local e o uso de práticasque potencializam a biodiversidade e osprocessos biológicos (ALTIERI, 2002).

Com essa parceria realizou-se, em 1993,um Diagnóstico Rural Participativo (DRP)piloto no município de Araponga. Os da-dos do diagnóstico apontaram diversosproblemas enfrentados pelos agricultores eagricultoras do município, mas o enfraqueci-mento dos solos foi apontado como um dosprincipais problemas. Objetivando a formu-lação de propostas para os diversos proble-mas apontados e com uma forte integraçãoentre os agentes envolvidos, formaram-sealgumas comissões, compostas por mem-bros das comunidades sensibilizadas,CTA-ZM e UFV, dentre elas a comissão de-nominada Terra Forte. Esta comissão enca-minhou as questões referentes ao manejo eà recuperação dos solos. Várias propostaspreconizadas pela agroecologia foram dis-cutidas para superar tal problema. As propos-tas aprovadas para difusão e ou experimen-tação em pequena escala foram resgatadas

Figura 8 - Seminário para um Plano Estratégico para o Café AgroecológicoNOTA: Produzido por Agricultores Familiares da Zona da Mata do Estado de Minas Ge-

rais - Eugenópolis, 15 e 16 de março de 2002.

CTA

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38 Cafeicultura familiar

entre os próprios agricultores ou sugeri-das pelos técnicos (CARDOSO et al., 2001),sendo:

a) plantio de cordão de contorno comcana-de-açúcar;

b) uso de adubação verde;

c) reposição de cálcio e magnésio pormeio de calagem;

d) manejo de plantas espontâneas;

e) SAFs.

Tais propostas foram, em maior ou me-nor escala, implantadas em outros muni-cípios, como por exemplo Pedra Dourada,Divino, Tombos e Espera Feliz.

Com os SAFs, objetivaram-se me-lhorar os sistemas produtivos, principal-mente através da recuperação dos solos,diversificar a produção e aumentar a bio-diversidade, em um esforço de integraçãodos agroecossistemas com sistemas natu-rais, em especial com o PESB, já que muitaspropriedades localizam-se em seu entorno,como nos municípios de Araponga, Divinoe Miradouro.

Histórico da experimentaçãoparticipativa com SAFs

O processo de experimentação foi di-nâmico, mas com o resgate histórico foipossível caracterizar cinco fases distintas:sensibilização para a proposta; implantaçãodos SAFs; complexificação dos sistemas;avaliação e redesenho dos sistemas e sis-tematização participativa da experiência. Emcada uma dessas fases houve diferençasna intervenção institucional, na qualidadedo solo, na quantidade de árvores utiliza-das, nos custos e gastos, na produtividadee na qualidade do café nos SAFs. As princi-pais características dessas fases são apre-sentadas a seguir.

Como estratégia de sensiblização eimplantação da experimentação participa-tiva com SAFs, o CTA-ZM promoveu vá-rias atividades. Inicialmente agricultorese/ou técnicos visitaram propriedades comSAFs no Espírito Santo, Bahia, Colômbia eCosta Rica. Foram os primeiros contatos

com consórcio de árvores e café, desper-tando grande interesse local. Essa estraté-gia foi essencial para aumentar a consciên-cia entre os agricultores e técnicos sobreas potencialidades dos SAFs, mais particu-larmente sobre sua viabilidade para a regiãoe as técnicas utilizadas no manejo dos sis-temas.

Vários encontros e reuniões foram rea-lizados com os agricultores para discutiros desenhos, o manejo e a localização dosSAFs. Foi também realizado diagnóstico edesenho (D&D) de sistemas (ICRAF, 1983),em duas propriedades, o que permitiu a tro-ca e a socialização de saberes entre técnicose agricultores, aprofundando a discussãosobre quais espécies e desenhos seriamtestados. Os principais tipos possíveis desistemas foram discutidos nas proprieda-des dos agricultores interessados na expe-rimentação, porém o desenho de SAF e asespécies a serem utilizadas foram decididasde forma autônoma por família.

No final de 1994 e início de 1995, iniciou-se a implantação das experiências (Fig. 9).Foram implantadas 39 experiências, com-preendendo 25 comunidades de 11 municí-pios (dentre eles Araponga, Tombos, Divi-

no, Carangola, Eugenópolis, Espera Felize Miradouro). Foram 37 sistemas com cafée dois em áreas de pastagem. Cada experi-ência com café possuía em média 1.000 m2

e as árvores foram plantadas preferencial-mente entre as linhas do café. Ao todo,utilizaram-se áreas com, aproximadamente,9.300 pés de café, com espaçamento geral-mente de 3 x 1,5 m, perfazendo em tornode 41.800 m2, totalizando em torno de 9.400árvores introduzidas, além daquelas quesurgiram espontaneamente (CARDOSO etal., 2001).

Para a implantação dos SAFs foramescolhidas as áreas consideradas piores,ou seja, áreas mais degradadas dentro daspropriedades. Os desenhos dos SAFs fo-ram planejados para atender ao conjuntode critérios previamente levantados, prin-cipalmente no que se refere às funções docomponente arbóreo, como sombreamento,ciclagem de nutrientes, diversificação daprodução, produção de lenha e madeira,conservação de redes de drenagem e con-servação/melhoria de pastagens (sistemassilvipastoris), principalmente, nas áreasde produção de café, para a conservação erecuperação do solo (Fig. 10).

Figura 9 - Implantação de experiência no sítio do Sr. Amauri – Espera Feliz, MG

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Para o aprofundamento da experimen-tação com SAFs, o CTA-ZM contratou, porcurto prazo, Ernst Götsch como consultorexterno. Com esta consultoria promoveram-se capacitações de técnicos e de agriculto-res sobre agrofloresta e foram dadas novasorientações sobre o desenho e o manejodos SAFs. Os desenhos conjuntamenteconstruídos anteriormente foram substituí-dos por outros, diminuindo o espaçamentoe inserindo novas espécies, algumas comcomportamento desconhecido regional-mente. Em conseqüencia, com essa novaproposta, aumentou-se a complexidade decada SAF.

Em 1996, também em Araponga, iniciou-se o monitoramento participativo pilotodas experiências, através de parceria como Instituto Internacional para Meio Ambi-ente e Desenvolvimento – Reino Unido(IIED-UK). Os objetivos a serem monito-rados, os indicadores e a metodologia aser utilizada foram decididos coletivamen-te. Os objetivos e os indicadores prioriza-dos foram:

a) custos de produção – indicador:custo das despesas variáveis comomão-de-obra, fertilizantes e correti-vos, etc.;

b) diversidade da produção – indica-dor: número de espécies vegetais nosistema;

c) produção – indicador: quantidadede cada produto como café, frutas,lenha e etc.;

d) cobertura do solo – indicador: por-centagem de solo coberto;

e) saúde do solo e ciclagem de nutri-entes – indicadores: análises maisaprofundadas sobre o solo.

Os pesquisadores da UFV envolvidoscom o trabalho acreditavam que para aten-der ao pedido dos agricultores pesquisasacadêmicas em qualidade do solo e ciclagemde nutrientes deveriam ser feitas (CARDOSOet al., 2001). Desde então, vários projetosdesenvolvidos principalmente em parce-ria entre CTA-ZM, STRs, EPAMIG e UFVe várias teses foram realizadas nas áreasexperimentais dos agricultores.

Sistematização das experiências

A sistematização participativa das expe-riências, que aconteceu de 2003 a 2004,tinha como um dos seus objetivos o sub-sídio ao plano estratégico do café (PEC).

A hipótese era a de que vários resultadoshaviam sido alcançados e várias lições apren-didas com a experimentação e que estasemergiriam no processo de sistematização,permitindo então com a reflexão coletiva aconstrução de um conhecimento novo, ne-cessário para o fortalecimento da agricul-tura familiar e a consolidação das propostasagroecológicas na região.

No total, 18 agricultores e agricultorasexperimentadores participaram do processode sistematização. O método adotado foiadaptado de Diez Hurtado (2001) e constoude leitura, organização e síntese de todo omaterial bibliográfico existente, visitas àspropriedades, entrevistas semi-estruturadas,encontros que envolveram técnicos, agri-cultores, pesquisadores, professores eestudantes da UFV (Fig. 11, 12 e 13). Foramutilizadas técnicas do Diagnóstico RápidoParticipativo, como mapas, diagramas deVenn e análises de fluxos (GUIJT, 1999) sem-pre quando apropriado. Foram compilados,sintetizados e discutidos com os agricul-tores dados de várias pesquisas que envol-veram os agricultores experimentadores.Tais pesquisas abordaram aspectos de uso,manejo, ocupação e conservação dos so-los, decomposição e ciclagem de nutrientespelas plantas (leguminosas e espontâneas).

O que mostroua sistematização?

A observação dos agricultores sobre opapel das espécies arbóreas e sua auto-nomia no manejo dos SAFs gerou grandecomplexidade de desenhos e manejos dossistemas. Ao longo das experiências muitasespécies foram eliminadas e outras privile-giadas. Entretanto, o critério principal deintrodução ou retirada de espécies arbóreasdo sistema foi a compatibilidade das árvo-res com o café, o que significa baixa compe-titividade por água, luz e nutrientes. Alémda compatibilidade com o café, outros cri-térios para a escolha das espécies arbóreasforam a produção de biomassa, cujo indica-dor foi a quantidade de resíduo produzido,seja através da queda natural das folhas,seja através da poda; facilidade de poda,

Figura 10 - Ao fundo, sistema silvipastoril com gado e abelha na propriedade do Sr.

Vicente Donizete – Araponga, MG

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Figura 11 - Encontro para sistematização das experiências com SAFs

Figura 13 - Dinâmica da matriz histórica da experimentação dos SAFs, confeccionada no encontro para a sistematização

Figura 12 - Dinâmica da matriz de critérios e opções das espécies vegetais

arquitetura dos ramos e aquisição de mudas;e a diversificação da produção, indicadapela quantidade e qualidade da produçãode alimentos para o ser humano, animaisdomésticos ou silvestres e para a produçãode madeiras para construções rurais e/oulenha.

Atualmente, em torno de 82 espéciesdiferentes são encontradas nos SAFs,com média de 12 árvores por SAF além docafé. A área manejada varia de 1.000 m2 a5.000 m2, havendo grande diversidade deespécies por área, sendo grande parte des-sas espécies nativa. As principais espéciesárboreas utilizadas são: abacate (Persea sp.);açoita-cavalo (Luehea speciosa); ameixa(Eriobotrya japonica); banana (Musa sp.);cajá-manga (Spondias lútea); capoeira-branca (Solanum argenteum); castanha-mineira (Bombax sp.); cedro-toona (Toonaciliata); embaúba (Cecropia hololeuca);eritrina (Erythrina verna); fedegoso (Sennamacranthera); flor-de-maio (Tibouchinasp.); ingá (Inga vera); ipê-preto (Zeyheriatuberculosa); mamão (Carica papaya);mulungu (Erythrina mulungu); papagaio(Aegiphila sellowiana); pau-mulato(Calycophylum spruceanum); uva-do-japão (Ovenia dulcis). As mais rejeita-das por apresentarem alta competição como café foram o angico (Annadenantheraperegrina) e o jacaré (Piptadeniagonocantha).

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O componente herbáceo, seja como plan-ta de cobertura do solo, seja como plantaalimentícia, é tão importante que os agri-cultores o incluem na definição de SAFs.Importantes não só pelo papel específicoque exercem, mas por desempenharem papel-chave na biodiversidade associada, comopor exemplo, na atração de polinizadores.Especificamente como planta alimentícia(batata-doce, inhame, cana-de-açúcar, etc.)é importante não só para o ser humano,mas também para animais domésticos ousilvestres.

Como planta de cobertura de solo, ocomponente herbáceo funciona como adu-bação verde, protegendo o solo contraerosão e ciclando nutrientes. As espéciesespontâneas podem exercer esse papel, di-minuindo a necessidade de introdução deoutras espécies, como no caso das legumi-nosas. O plantio de leguminosas pode repre-sentar, em relação às espécies espontâneas,aumento da mão-de-obra, em especial emterrenos declivosos como os encontradosna região da Zona da Mata. Porém, o ma-nejo de determinadas espécies espontâ-neas pode ser mais difícil do que algumasespécies de leguminosas. Sendo assim, umaassociação das duas práticas (manejo dasespécies espontâneas e de leguminosas)pode ser importante para uma maior sus-tentabilidade da propriedade.

Segundo os agricultores, a partir dosSAFs o manejo de suas propriedades foialterado, ocorrendo uma maior diversifica-ção e integração entre os agroecossiste-mas, aumentando a relação custo/benefícioda produção do café com reflexos no orça-mento familiar. A forma diferenciada demanejo influenciou agricultores vizinhoslevando-os a manter as árvores tambémem suas propriedades. Houve então efeitopositivo na cobertura florestal na regiãopromovendo, em alguns casos, impactospositivos em quantidade e qualidade daágua.

A comparação entre os sistemas de caféem monocultivo (convencional) e em agro-florestal foi realizada de forma expedita e, atítulo de exemplo, em quatro propriedades

(duas convencionais e dois SAFs). Embo-ra a produção de café tenha sido menor naagrofloresta, o retorno econômico, semconsiderar a mão-de-obra, foi maior, devidoao menor custo de produção e maior ofertade outros produtos.

A diversificação de espécies com a intro-dução das frutíferas potencializou aindamais os SAFs, diversificando os alimentospara a família, para a criação animal, para afauna, ou para a venda. Muitos agriculto-res mantêm espécies frutíferas nas lavou-ras destinadas exclusivamente à faunalocal. Alguns produtos têm sobressaídonos SAFs, como a banana e o abacate,demandando futuramente atenção maisdetalhada para o seu melhor aproveita-mento.

As áreas manejadas tiveram papel impor-tante no suprimento de madeira para mui-tas famílias, enquanto que para outrasdemonstrou seu potencial para este tipode necessidade. A madeira retirada foi usa-da para a melhoria da infra-estrutura da pro-priedade (por exemplo, mourões, pequenasconstruções e lenha). Em caso de exceden-tes, houve venda de espécies de maior valoreconômico (especialmente o cedro austra-liano). O suprimento de lenha e de madeirapara as famílias é um aspecto ambiental eeconômico relevante, pois elimina a pres-são de uso sobre os remanescentes demata, enquanto recursos energéticos e deinfra-estrutura, conjugando alternativa derenda e orçamento familiar.

Resumidamente, o aporte orgânico intro-duzido no sistema pela vegetação arbórea,arbustiva ou herbácea contribuiu paraelevar a matéria orgânica no solo. Houveum incremento de matéria orgânica leveresponsável pela estabilidade dos agrega-dos do solo, o que favorece a resistência àerosão. Verificou-se também aumento nasdiferentes formas de matéria orgânicaresponsáveis pela ciclagem de nutrientes.Da mesma forma, houve uma redução naacidez trocável do solo, diminuindo a neces-sidade de calagem. Com isso, promoveram-se melhorias na capacidade do solo em dis-ponibilizar nutrientes, como o cálcio, mag-

nésio, fósforo, nitrogênio. Os SAFs tam-bém melhoraram a atividade micorrízica dosolo em profundidade, fundamental para aciclagem de fósforo no sistema. Carvalho eFerreira Neto (2000) demonstraram que nosSAFs houve menor perda de solo, quan-do comparados a sistemas convencionais(monocultivos), ocorrendo, em conseqüên-cia, menor perda de matéria orgânica enutrientes.

A diversificação da vegetação revalori-zou atividades como a apicultura, os cuida-dos com a pastagem e promoveu a integra-ção entre sistemas. Porém, de forma geral,ainda há pouca integração com a criaçãoanimal na propriedade. O conforto no localde trabalho no dia-a-dia ocasionado pelosombreamento é um benefício também res-saltado pelos experimentadores. No últimoperíodo da experimentação, embora nãomensurada, os agricultores relatam reduçãono ataque de pragas e de doenças no café,possivelmente pela existência em maior nú-mero de inimigos naturais, melhorias noestado nutricional das plantas, aumento delesmas e minhocas refletindo a condiçãode umidade e porosidade do solo, aumentono número de lagartos, de variedade deespécies herbáceas, arbustivas, arbóreas(madeireiras e frutíferas), aumento em quan-tidade e diversidade de pássaros e presen-ça eventual de animais de pequeno e médioporte (mão-pelada, jaguatirica, macacos,cobras, tatu, etc.).

A área de experimentação trouxe ensi-namentos que serviram para toda a famí-lia, com as atenções voltadas para a pro-priedade e a comunidade, de forma geral.No entanto, a experiência com SAFs foi pre-dominantemente masculina e personifica-da no papel do responsável pelo SAF: oexperimentador. Esta situação gerou poucaparticipação da família nas definições eorientações ao longo do processo, o quecaracteriza uma desigualdade nos papéispara a tomada de decisões. Talvez na fa-mília, mulheres, filhos, parentes, possamexistir diferentes expectativas e aspiraçõesindividuais para culturas e manejo diferen-tes daqueles adotados pelo responsável.

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A igualdade dos papéis e o maior envolvi-mento familiar tendem a gerar um aumentoda cumplicidade para com o SAF, gerandoimpactos positivos nas relações internas eexternas, considerando todos os seus be-nefícios.

Resumidamente, pode-se dizer que aexperimentação gerou uma consciênciaprofundamente agroecológica, manifestadanas práticas, tais como redução/eliminaçãoda capina, manutenção de espécies arbó-reas espontâneas, mesmo nas lavouras decafé em monocultivo, preocupação comqualidade e quantidade da água na proprie-dade, abandono do uso de agrotóxicos,importância da cobertura do solo e da ma-téria orgânica, etc.

A sistematização das experiências con-tribuiu para a reflexão coletiva de todo oprocesso desenvolvido, incorporação denovos aprendizados, revisão de conheci-mentos, reunificação de grupos de atorese promoção de trocas de experiências sobreos aspectos ligados aos SAFs, à agroeco-logia e à agricultura familiar. Contribuiuainda para a compreensão de processosrelacionados com o uso dos solos, utiliza-ção dos espaços da propriedade rural, valo-rização dos recursos naturais disponíveis,com a perspectiva de obter alternativas paraa melhoria do sistema de produção da agri-cultura familiar, aliadas à conservação domeio ambiente, coerentes com hábitos ecostumes locais.

Potencialidades e limitesdos SAFs

As potencialidades e os limites dosSAFs podem ser discutidos tendo comobase os indicadores de sustentabilidadeadaptados de Altieri (2002), quais sejam,produtividade, eqüidade, estabilidade/resi-liência, flexibilidade e autonomia.

Produtividade

Com os SAFs há melhora significativado solo. Isto leva os agricultores a teremmais áreas com maior capacidade produti-va dentro das suas propriedades, refletindona produção do café e na diversificação deprodutos alimentícios e madeireiros.

A maior diversificação da produção per-mite maior segurança e soberania alimen-tar, reduzindo os riscos, ao diversificar osprodutos a serem ofertados no mercado;os SAFs permitem uma maior diversifica-ção da vegetação revalorizando atividadescomo a apicultura; a melhoria das pasta-gens tem o potencial de aumentar a integra-ção entre sistemas; a maior diversificaçãoda produção, com excedentes, exige a bus-ca de alternativas de mercado e de proces-samento da produção, exigindo maioreshabilidades da família envolvida no pro-cesso; com os SAFs há também melhorianos recursos ambientais, como aumento dafauna, produção de água e conforto ambi-ental para o trabalho, porém esses benefí-cios ainda não trazem retorno econômicodireto às famílias.

Eqüidade

O comportamento dos agricultores temuma dimensão social que os faz estabele-cer relações com o ambiente externo dosSAFs, correlacionando com aspectos posi-tivos da prática agroecológica em toda apropriedade e comunidade. A conduta agro-ecológica proporcionada pelos SAFs gerabenefícios na comunidade toda, inicial-mente a partir do respeito que é estabele-cido com o meio ambiente. O abandono depráticas como queima, uso de agrotóxicosreflete positivamente no convívio harmo-nioso das relações sociais/ambientais. Noentanto, por ser em vários locais uma expe-riência nova, pode gerar desconfiança ecríticas por parte dos vizinhos. A presençade espécies nativas no meio da lavoura docafé pode gerar dúvida quanto à dedicaçãoda família ao trabalho.

É preciso estar sempre potencializandoos espaços da participação familiar consi-derando gênero e gerações, no desenho,manejo e compreensão de processos envol-vidos nos SAFs, contribuindo, assim, paraa formação de todos envolvidos.

Estabilidade/Resiliência

O período relativamente extenso da expe-rimentação proporcionou o reconhecimen-

to da resiliência dos SAFs enquanto um pro-cesso dinâmico, resultando, nas fases finais,num comportamento estável. A apropria-ção do manejo das áreas, através das espé-cies vegetais utilizadas, selecionadas aolongo da experiência, do planejamento ereplanejamento das atividades adquirindoadequações individuais, propiciou a esta-bilidade dos SAFs.

A fase da complexificação, introduzidapor Ernst Götsch, ilustra uma intervençãodrástica que poderia comprometer a estabi-lidade dos SAFs. Mesmo assim, as expe-riências não foram abandonadas após asdificuldades. Suportar uma mudança brus-ca e retornar ao ritmo natural, sem grandesseqüelas é uma característica difícil de veri-ficar em muitas tecnologias utilizadas nocampo.

A estabilidade é também exemplifica-da, pelo sistema de um agricultor (João dosSantos). Esse sistema, após as lavouras daregião terem sofrido com um período de secaprolongado, não mostrou prejuízo em suaprodução de café. Possivelmente a cobertu-ra das árvores criou um microclima favorá-vel à dinâmica da lavoura sem prejuízo àsua produtividade. Esse mesmo agricultorsofreu com a falta de produção na fase decomplexificação, tendo superado as dificul-dades e permanecido com a experiência.

Em termos da estabilidade econômica,a diversificação da produção garante o ofe-recimento de outros produtos para além docafé. É o caso da produção de banana, cana-de-açúcar, mandioca (polvilho, farinha), mel,etc. Os bens e serviços internos passarama ser otimizados e integrados, como é o ca-so crescente da criação animal para supri-mento de esterco (principalmente de bovi-no). Essas mudanças foram e vem sendoimplementadas de forma lenta e gradual,não causando grandes rupturas.

Esta estabilidade econômica não acon-tece desde o primeiro momento e, portan-to, é preciso planejamento de atividades acurto, médio e longo prazos, incluindo, senecessário for, subsídios financeiros e espa-ços constantes para troca de informaçõese solução de dúvidas.

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Flexibilidade

As alterações que ocorreram nos dese-nhos como a introdução, substituição e elimi-nação de várias espécies arbóreas por repe-tidas vezes, a oferta sazonal de produtos,conforme as necessidades, a demanda va-riável de mão-de-obra, conforme as caracte-rísticas físicas das propriedades, a possibi-lidade de localização espacial em diferentespaisagens (face norte, face sul, encosta,baixada, diferentes altitudes) são exemplosque demonstram a flexibilidade da propos-ta.

Há, entretanto, uma necessidade de maiordisponibilidade de sementes e/ou mudas,assim como um maior conhecimento dopotencial das espécies a serem utilizadasnos sistemas. Além de uma maior necessi-dade de mão-de-obra para a implantaçãodo sistema, alguns trabalhos desenvolvi-dos diferem daqueles normalmente prati-cados pelos agricultores (por exemplo apoda), o que pode gerar insegurança. Entãodeve haver um bom planejamento do tra-balho, discutir previamente todos essespossíveis problemas e, se possível, procu-rar evitá-los.

Autonomia

Ao relembrar toda a trajetória da experi-mentação dos SAFs nas diferentes fases,é possível perceber que a partir da observa-ção continuada nas áreas, aliada à incorpo-ração de práticas de manejo, das capacita-ções ocorridas ao longo do processo, astrocas de informação permitiram aos agri-cultores a apropriação total de dinâmica econtrole dos seus sistemas. A metodolo-gia adotada no tempo evidenciou etapasimportantes para a construção e apropria-ção do conhecimento que levam à autono-mia na condução dos SAFs, como: aberturaà proposta tecnológica, definição de obje-tivos específicos, observação e experimen-tação (práticas), incorporação do manejo,reflexão e análise, compreensão de proces-sos e mudanças de comportamento. Entãoa autonomia gerada não foi fruto da pro-posta de SAF em si, mas sim da metodo-logia participativa utilizada.

Para aumentar a autonomia em relaçãoà utilização de insumos externos, principal-mente estercos, é necessário aumentar aprodução de estercos na propriedade e apro-fundar os mecanismos de ciclagem de nu-trientes, para potencializar a utilização dabiomassa e da autofertilização dos sistemas.Para isso, é necessário maior integração coma criação animal na propriedade e tambémpesquisas participativas que aprofundemos mecanismos de ciclagem de nutrientese indicadores da qualidade do solo (bioló-gicos, por exemplo), assim como a identifi-cação das espécies nativas com potenciaisde desenvolver funções-chave no siste-ma, contribuindo, dessa forma, com os agri-cultores na descoberta de novas espéciespotenciais a serem utilizadas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Uma das grandes limitações e ao mes-mo tempo um dos grandes potenciais paraa implantação dos SAFs na Zona da Matasão as características ambientais da regiãoe a legislação florestal. Esta contradição sedá porque grande parte das áreas das pro-priedades é considerada de preservaçãopermanente, porém, devido ao pequeno ta-manho das propriedades, tais áreas sãocontinuamente utilizadas pelos agricultorese agricultoras. Entretanto, pelas caracterís-ticas ambientais e adaptabilidade do café epastagens à sombra, a região pode ser con-siderada apta aos sistemas agroflorestais.Isto evidencia a necessidade de flexibiliza-ção da legislação para que o potencial daregião seja utilizado, isto é, o uso pelos pe-quenos agricultores, das áreas de preser-vação permanentes (APPs) com sistemasagroflorestais.

As árvores são consideradas um com-ponente essencial nos sistemas produtivosagroecológicos e seu potencial e funçãonão se restringe ao fornecimento de som-bra dentro dos cafezais, mas ao aumentoda biodiversidade (associada e planejada),água (quantidade e qualidade) e diversifi-cação da produção, com potencial, portan-to de contribuir para o reestabelecimento

da paisagem da Zona da Mata. Os SAFs,como desenhado na Zona da Mata, possuium caráter integrador das propostas vis-lumbradas pela Comissão Terra Forte, parao fortalecimento dos solos da região. O ma-nejo da vegetação espontânea e das legumi-nosas introduzidas, o plantio de plantasalimentícias e de árvores com o objetivo deproteção e conservação do solo, ciclagemde nutrientes, diversidade de produçãoentre outros ocorrem de forma integradano tempo e no espaço, constituindo, semdúvida, uma alternativa de manejo, de usoe de ocupação do solo, que concilia aspec-tos produtivos e de conservação ambien-tal, tão necessários à região. Porém, faltaainda um reconhecimento desse potencial,por parte das instituições e, como conse-qüência, ações regionais para a utilizaçãodele, inclusive para interligar unidades deconservação importantes como o ParqueEstadual da Serra do Brigadeiro, o ParqueNacional do Caparaó e outras.

Entretanto, a participação dos agricul-tores, dos pesquisadores e dos técnicos,os quais permitem uma abordagem realistana projeção, monitoramento, avaliação,análise, sistematização e ajustes dos siste-mas agroflorestais, que se tornaram umprocesso dinâmico de aprendizagem, deveser perseguida. Isso também tem sido oenfoque no aprendizado das Instituiçõesno desenvolvimento dos sistemas orgâni-cos. Essa abordagem participativa requermodificações com os progressos do traba-lho, com o aprendizado dos agricultores ecom as mudanças nas circunstâncias eco-nômicas das famílias, sem tempo definido.Assim, os círculos de modificações no de-senho de sistemas que surgem é uma partebem-vinda e essencial do processo.

Apesar das exigências para a certifica-ção do sistema produtivo, os agricultoresforam capazes de desenvolver e certificarsuas produções como orgânicas. Há aindaa necessidade de obtenção de selos reco-nhecidos no exterior. A vantagem que sebusca é a da venda do café com ágio, sejano mercado orgânico, seja no Fair Trade,que garante maior renda ao produtor.

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44 Cafeicultura familiar

Existe ainda uma nítida luta para comer-cializar os cafés especiais dos agricultoresfamiliares, embora tenham realizado impor-tantes contatos e muito se aprendeu sobreos mercados orgânico e Fair Trade de café,tornando claro que é possível e vantajosonegociar e vender café do grupo coletiva-mente.

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46 Cafeicultura familiar

1Enga Agra, D.Sc. Fitotecnia, Pesq. EPAMIG-CTZM, Vila Gianetti, 46, Caixa Postal 216, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico:[email protected]

2Engo Agro, D.Sc. Solos e Nutrição de Plantas, Pesq. EPAMIG-CTZM, Vila Gianetti, 46, Caixa Postal 216, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correioeletrônico: [email protected]

3Engo Florestal, Mestrando UFV-Depto Solos, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: [email protected] Agra, Ph.D. Ciências Ambientais, Profa UFV-Depto Solos, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: [email protected] Agro, Ph.D. Ciência do Solo, Prof. UFV-Depto Solos, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: [email protected] Agra, D.Sc. Fitotecnia, Bolsista CBP&D-Café/EPAMIG, Vila Gianetti, 46, Caixa Postal 216, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico:

[email protected]

Waldênia de Melo Moura1

Paulo César de Lima2

Helton Nonato de Souza3

Irene Maria Cardoso4

Eduardo de Sá Mendonça5

Josete Pertel6

Pesquisas em sistemas agroecológicos e orgânicosda cafeicultura familiar na

Zona da Mata mineira

Resumo - O processo de modernização com a intensificação no uso do capital na agriculturapromoveu grandes diferenças entre as formas sociais de produção na Zona da Mata mineira.A falta de recursos financeiros dos agricultores familiares e sua cultura desencadearam aprocura por técnicas alternativas e sustentáveis para o manejo de suas propriedades e porparceiros em instituições que contribuíssem para enfrentar essa problemática. Nessecontexto, a cafeicultura agroecológica e orgânica vem-se destacando como alternativa parabeneficiar a agricultura familiar e para agregar valor ao produto. São necessárias pesquisase desenvolvimento de tecnologias apropriadas a essa realidade. Trabalhos dessa naturezaexigem conhecimentos multidisciplinares, sendo fundamental a integração entre instituiçõesde pesquisa, organizações não-governamentais e comunidades agrícolas. São abordadosresultados de pesquisas e adaptações tecnológicas voltadas para a cafeicultura familiar quevem sendo desenvolvida de forma participativa em comunidades na região da Zona daMata de Minas Gerais.

Palavras-chave: Café. Agricultura familiar. Pesquisa participativa. Recursos genéticos.Cultivares. Adubação orgânica. Adubação verde. Sistemas agroflorestais.

INTRODUÇÃO

A maioria dos agricultores das regiõesmontanhosas de Minas Gerais, como daZona da Mata, é formada por pequenosproprietários rurais que vivem em unidadesonde prevalece a mão-de-obra familiar, ca-racterizada como agricultura familiar.

Devido à problemática ambiental dessasregiões, boa parte de agricultores e agricul-toras dos municípios de Araponga, Divino,Ervália, Espera Feliz, Eugenópolis, PedraDourada, Tombos, entre outros, efetivou,por meio dos seus Sindicatos de Trabalha-dores Rurais e Associações de Produtores

Rurais, parcerias com organizações não-governamentais e instituições de ensinoe/ou pesquisa, visando o desenvolvimentode tecnologias para a agricultura familiar.

A base dessas parcerias é o desenvol-vimento de sistemas de produção que con-textualiza com os princípios agroecológicos,

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de baixo risco, pouco uso de insumos eque tenha sempre uma clara noção do tra-balho, visando obter lucro em benefício daqualidade de vida da família e da susten-tabilidade da unidade produtiva. Dessaforma, ficou evidente que a atuação de qual-quer instituição deveria ser em conjuntocom os agricultores, por métodos participa-tivos.

Ao observar o trabalho desses agricul-tores e agricultoras familiares nota-se que,muito mais importante que a preocupaçãocom as elevadas produtividades obtidaspelas monoculturas desenvolvidas em uni-dades empresariais, é fundamental a diver-sificação da produção. Essa estratégia pro-porciona, por exemplo, a multiplicação desementes de feijão, milho, hortaliças, etc.Também reduz as dificuldades financeirasnos períodos de preços baixos pagos aocafé, a principal fonte de renda para as uni-dades familiares da região. Sendo menoresas oscilações de renda, a estabilidade eco-nômica da família é mais garantida.

Junto à diversificação da produção, aconservação do ambiente também é enca-rada como base para a sustentabilidade.A maioria dos agricultores familiares desen-volve sistemas agroecológicos de produ-ção. Esses agricultores adotam práticas deconservação do solo, de preservação dosmananciais e o controle fitossanitário depragas e doenças é feito utilizando métodosalternativos de manejo ecológico. Todasessas práticas proporcionam uma grandediversidade de atividades nas proprieda-des, tornando os sistemas produtivos inte-grados e o trabalho familiar essenciais paraa permanência do agricultor e de sua famíliano campo.

A produção de café em sistema orgâ-nico tem despertado interesse em váriosprodutores, em virtude do crescimento dademanda dos mercados nacional e interna-cional. Existem relatos mais recentes sobreprodução orgânica de café no Brasil de pou-co mais de uma década. As instituições depesquisa dos principais Estados produto-res de café têm constatado que a cafeicul-tura orgânica é uma boa alternativa para os

agricultores familiares. Dentre as demandasque têm sido apresentadas pelos agricul-tores familiares, são consideradas emer-gentes para a produção de café em sistemaorgânico, a seleção de cultivares, o manejoda adubação e o controle de pragas e doen-ças, fundamentais para produzir em níveisrazoáveis de produtividade e taxa de retor-no satisfatório. Nesse sentido, têm sidodesenvolvidos projetos que propõem ava-liar, obter e desenvolver tecnologias para aprodução de café em sistemas orgânicos.Para isso estão sendo executados projetosem parceria com os agricultores e agricul-toras familiares por meio dos Sindicatosde Trabalhadores Rurais e Associações deProdutores Rurais, parcerias com o Centrode Tecnologias Alternativas da Zona daMata (CTA-ZM), a Universidade Federalde Viçosa (UFV) e a Empresa de PesquisaAgropecuária de Minas Gerais (EPAMIG).

Ao longo de alguns anos, por meio deexperimentação participativa, análises emlaboratórios, análises estatísticas e valida-ção de tecnologias, foram disponibilizadosresultados para sistemas orgânicos, agro-ecológicos a pleno sol e sistemas agroflo-restais (SAFs). Estão sendo conduzidosexperimentos nos mais diversos agroecos-sistemas, com objetivos de:

a) avaliar, identificar a variabilidade ge-nética e selecionar cultivares de cafépromissoras para o cultivo orgâni-co;

b) avaliar espécies de leguminosas esuas interações em sistema de culti-vo para a adubação verde de cafeei-ros em diferentes condições edafo-climáticas;

c) obter e disponibilizar índices de con-versão dos nutrientes contidos emdiferentes materiais orgânicos paraa forma mineralizada;

d) oferecer informações sobre a libera-ção de nutrientes do solo, por efeitode ácidos orgânicos;

e) apresentar fórmulas que permitam aocafeicultor obter alta produtividade

e qualidade do café, longevidade emenor agressão ao meio ambientepor meio do uso de produtos alter-nativos de controle de doenças e pra-gas associadas ao sistema orgânico;

f) avaliar formas de manejo de SAFscontendo o cafeeiro em unidades fa-miliares de produção orgânica e, combase no cultivo associado com árvo-res, plantas espontâneas e legumi-nosas para adubação verde.

Esse trabalho, de longo prazo, forneceráconhecimento ao meio científico, técnico eprodutivo, e está sendo divulgado em dis-sertações de teses, artigos científicos, bo-letins técnicos, dias de campo e cursos decapacitação para técnicos e produtores.Dessa forma contribui de maneira signifi-cativa para os avanços tecnológicos re-lativos à produção de café em sistemasorgânicos, permitindo, principalmente aoagricultor familiar, produzir e obter produti-vidade com a melhoria dos sistemas pro-dutivos, da qualidade ambiental e de vidadas comunidades de agricultores em geral.Algumas dessas pesquisas que estão sen-do conduzidas na Zona da Mata de MinasGerais serão apresentadas neste artigo.

PRESERVAÇÃO DEGERMOPLASMA DE CAFÉEM COMUNIDADES DEAGRICULTORES FAMILIARES

Bancos ativos de germoplasma de caféem condição de campo são de extrema impor-tância, principalmente pelo fato de as se-mentes de café apresentarem comporta-mento intermediário entre as sementes orto-doxas e recalcitrantes, não tolerando arma-zenamento com segurança por longo prazo,sendo esta uma fonte segura de preserva-ção das cultivares. Representam também,um mecanismo para contínua evolução decaracterísticas genéticas e para a geraçãode novas variabilidades que possam serutilizadas em programas de melhoramentogenético. Bancos de germoplasma de caféconduzidos no sistema orgânico em nívellocal, junto a agricultores, são raros e per-

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mite que estes possam selecionar cultivaresempregando critérios próprios de acordocom a disponibilidade de recursos e dascondições edafoclimáticas da região.

Para incrementar a segurança em suaslavouras de café os agricultores etíopesplantam variedades locais ao longo doentorno dos campos cultivados com linha-gens mais uniformes, distribuídas peloProjeto de Melhoramento do Café. Dessemodo, seus estabelecimentos agrícolastornam-se bancos ativos de germoplas-ma, auxiliando o Centro de Recursos Ge-néticos, especialmente na coleta e identi-ficação de material vegetal (WOREDE,1994).

Com o objetivo de preservar cultivaresde café junto às comunidades de agricul-tores familiares, o Centro Tecnológico daZona da Mata (CTZM) da EPAMIG, emparceria com o CTA-ZM, e com os Sindi-catos de Trabalhadores Rurais de Arapon-ga e Espera Feliz, e a Associação de Peque-nos Agricultores e Trabalhadores Ruraisde Tombos, instalaram três bancos de ger-moplasma contendo 36 cultivares, sendo9 antigas e 27 melhoradas.

O resgate das cultivares antigas de caféfoi realizado com a participação dos agri-cultores e agricultoras familiares do entor-no dos municípios de Araponga, EsperaFeliz e Tombos. Através de reuniões foramrealizados levantamentos das propriedadesonde havia cafeeiros antigos. Posterior-mente, essas cultivares foram identificadase as sementes coletadas pelos própriosagricultores e agricultoras (Fig. 1). Comoresultado foi possível resgatar as seguin-tes cultivares:

a) ‘Typica’, ‘Nacional’, ‘Comum’,‘Crioulo’, ou ‘Brasil’, primeira va-riedade de café cultivada no Brasil,constitui o padrão da espécie Coffeaarabica. Introduzida em 1727, porFrancisco Melo Palheta;

b) ‘Bourbon Vermelho’, também co-nhecida como café ‘Java’, originá-ria da Ilha Reunião, introduzida noBrasil, em 1859;

c) ‘Bourbon Amarelo’, provavelmentesurgiu do cruzamento natural entreas cultivares Amarelo de Botucatu ea cultivar ‘Bourbon Vermelho’;

d) ‘Maragogipe’, conhecida como va-riedade macrocarpo, possui um fatorgenético que condiciona o aumentoem todas as partes da planta, sendo,portanto, maiores que as cultivaresBourbon e Typica. Surgiu no estadoda Bahia, no município Maragogipe,em 1870, e possivelmente originou-se de uma mutação da variedadeTypica;

e) sementes de outras cultivares anti-gas foram coletadas no município deManhuaçu, tais como, ‘Laurina’,‘Villa Lobos’, ‘San Ramon’, ‘CaturraAmarelo’ e ‘Caturra Vermelho’.

Todas essas cultivares possuem fatoresgenéticos peculiares e foram substituídasao longo dos anos pelas cultivares melho-radas.

As sementes das cultivares melhora-das, empregadas nesse trabalho, foramadquiridas da EPAMIG, do Instituto Agro-nômico de Campinas (IAC), do InstitutoAgronômico do Paraná (Iapar), e da Fun-dação de Apoio Tecnológico à Cafeicultura(Procafé).

Trabalhos dessa natureza possibilitama reintrodução das cultivares antigas, bemcomo a introdução de novas cultivares aosistema de cultivo orgânico, o que contribuipara ampliar o número de cultivares plan-tadas de café, garantindo maior estabilidadeno sistema de produção e na aquisição desementes. Esses trabalhos constituem umaexperiência extremamente rica em organi-zação comunitária, que poderá dar umagrande contribuição em momentos futurosna seleção de cultivares mais bem adapta-das às suas condições locais.

FORMAÇÃO DE MUDAS DECAFÉ NO SISTEMA ORGÂNICO

Para a formação de mudas de café nosistema orgânico alguns cuidados foramfundamentais para o sucesso do viveiro,

devido às exigências para atender às nor-mas do cultivo orgânico.

Os viveiros de mudas orgânicas foraminstalados e conduzidos em propriedadesde agricultores familiares e contaram com aparticipação deles. Foram utilizadas as se-mentes de cultivares resgatadas e de culti-vares adquiridas em instituições de pesqui-sas, contendo, assim, 36 cultivares de café.

No preparo do substrato, ao contráriodo que normalmente é feito em sistemasconvencionais, o tratamento da terra érealizado antes da mistura da terra com osadubos e não são empregados estercos innatura. A terra utilizada foi coletada nascamadas subsuperficiais (terra de barran-co) do solo longe de lavouras de café,evitando-se problemas com infestação desementes e patógenos. Para a desinfecçãoda terra foi empregado o processo de solari-zação, utilizando a energia solar. Por esseprocesso a terra foi espalhada em camadasfinas sobre lona plástica preta, levementeumedecida e coberta com lona plástica trans-parente, bem esticada e fixada por cerca de50 dias, elevando sua temperatura em níveisletais para os patógenos, porém com menordano aos organismos benéficos (Fig. 2).

Para o preparo de 1.000 litros de subs-trato, utilizaram-se:

a) 700 litros de terra peneirada (já so-larizada);

b) 300 litros de composto orgânico cur-tido e peneirado;

c) 6,0 kg de P2O;

d) 0,6 kg de K2O.

Pelo fato de não ser permitido no cultivoorgânico os adubos supersimples e o clore-to de potássio, tradicionalmente utilizados,estes foram substituídos pelo termofosfa-to e sulfato duplo de potássio e magnésio,respectivamente. O composto orgânicobem curtido traz a vantagem de não neces-sitar de tratamento para controle de pató-genos e de sementes de invasoras, po-dendo ser misturado ao substrato após asolarização, evitando, assim, perdas denitrogênio.

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Figura 1 - Cultivares antigas de café resgatadas na Zona da Mata de Minas Gerais

NOTA: A – ‘Crioulo’; B – ‘Bourbon Vermelho’; C – ‘Maragogipe’; D – ‘Crioulo’: detalhe do tronco; E – ‘Crioulo’: detalhe da copa;

F – Maragogipe’: detalhe dos frutos (maiores) em comparação ao ‘Crioulo’ (menores).

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50 Cafeicultura familiar

Figura 2 - Processo de solarização

NOTA: A – Terra de barranco; B – Preparo da terra; C – Terra espalhada sob lona preta; D – Umedecimento do solo; E – Coberturada terra com plástico transparente; F – Fixação das bordas do plástico transparente.

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Na instalação e condução do viveiro,os cuidados foram de suma importância,utilizou-se local seco e ligeiramente incli-nado, ensolarado, observando o sentidodo movimento do sol, protegido de ventos,distante das lavouras de café, de fácil aces-so e com disponibilidade de água e nãosujeito à geada. O controle de doenças epragas foi feito de forma preventiva pormeio de pulverizações com biofertilizantes.Quando as mudas apresentaram três paresde folhas definitivas, selecionaram-se asmais uniformes de cada cultivar e, poste-riormente, foram transplantadas em campo(Fig. 3).

Para comprovação da adaptação tecno-lógica da formação de mudas em sistemaorgânico, um dos agricultores familiares,onde foram formadas as mudas para os expe-rimentos, Sr. Joaquim Franco, de EsperaFeliz, foi credenciado pelo Instituto Minei-ro de Agropecuária (IMA), como produ-tor de mudas, as quais foram fiscalizadas,obtendo comprovação de qualidade e Cer-tificado Fitossanitário de Origem e Guiasde Trânsito Vegetal, em dezembro de 2003.

AVALIAÇÃO DE CULTIVARESDE CAFÉ NO SISTEMAORGÂNICO DE PRODUÇÃOEM COMUNIDADES DEAGRICULTORES FAMILIARES

Como no cultivo orgânico, não é permi-tido o uso de adubos de alta solubilidade edos agrotóxicos, é fundamental que as cul-tivares de café para esse sistema de produ-ção possam produzir bem, absorver e utilizaros nutrientes de forma eficiente e conviverem equilíbrio com os agentes causadoresde doenças e pragas. Na implantação delavouras orgânicas, deve existir a preocu-pação na escolha da cultivar mais apro-priada, preferencialmente, as resistentes outolerantes a doenças e pragas. Cultivarescom tais características já existem no mer-cado, porém desenvolvidas em programasde melhoramento tradicionais, ou seja, emcondições ótimas de fertilidade e controlede doenças e pragas (exceto às destina-das a resistência a doenças e pragas), não

se conhecendo ainda o comportamentodestas cultivares em sistemas orgânicos.Assim, com base no fato de que ainda nãoexistiam pesquisas no País na área de me-lhoramento genético que contemplem essenovo ambiente de cultivo, propõe-se estu-dar o comportamento das cultivares anti-gas e melhoradas, como também desenvol-ver novas cultivares adaptadas ao cultivoorgânico. Nesse sentido, a EPAMIG, emparceria com o CTA-ZM, e Sindicatos eAssociações de Produtores Rurais, vemconduzindo trabalhos desde o ano de 2002,nos municípios de Araponga (Comunidadede São Joaquim), Tombos (Comunidade doCatuné) e Espera Feliz (Córrego São Felipe)(MOURA et al., 2005ab). Tais municípiosforam selecionados por apresentar caracte-rísticas edafoclimáticas diferentes e, prin-cipalmente, por já possuírem uma conscien-tização em termos de produção com basenos princípios orgânicos e agroecológicos,além da experiência em desenvolvimentode trabalhos comunitários das Associa-ções e Sindicatos dos referidos municí-pios.

Para a execução dessa proposta foramadotados os princípios metodológicos depesquisa participativa, em que os produ-tores, pesquisadores e técnicos partici-param ativamente de todas as atividadespropostas. A princípio foram realizadasreuniões em cada município, envolvendoo máximo de agricultores, onde foram esta-belecidas as propostas de trabalho, discu-tidas e definidas as estratégias de ação.Nessa ocasião também foram identificadasas propriedades onde os experimentos de-veriam ser executados.

Nesses experimentos estão sendo ava-liadas 36 cultivares de café, compreenden-do antigas (resgatadas junto a comunida-des de agricultores familiares) e melhoradas,com diferentes características agronômicas(Quadro 1).

Todas as atividades propostas, desdea implantação até a colheita dos experimen-tos, quando possível, foram realizadasatravés de dias de campo, compreendendoo plantio, o manejo do mato, plantio e con-

dução de leguminosas para a adubaçãoverde, adubações de cobertura com com-postos orgânicos, avaliação e colheita.Essas ocasiões foram de suma importância,não só pela realização de práticas concre-tas, mas também pela oportunidade de dis-cussão do processo e trocas de experiên-cias (Fig. 4 e 5).

Após dois anos de cultivo foram realiza-das as primeiras avaliações com o acompa-nhamento dos agricultores, considerandoas seguintes características: vigor vege-tativo, produtividade, coloração e épocade maturação dos frutos, porcentagem defrutos com lojas vazias, incidência de ferru-gem (Hemileia vastatrix), bicho-mineiro(Perileucoptera cofeella), cercosporiose(Cercospora coffeicola) e seca de pon-teiro.

Em geral, as cultivares apresentaramvariabilidade para a maioria das caracte-rísticas avaliadas, independente do localestudado. Quanto à incidência de ferru-gem, observaram-se variações entre as cul-tivares, desde a ausência de sintomas atéataques moderados. Outro aspecto obser-vado é que algumas cultivares suscetíveisà ferrugem não apresentaram sintomas dadoença. A incidência de cercosporiose ede bicho-mineiro variou em função dosmunicípios, observando-se ataques maisintensos de cercosporiose em Araponga eataques mais intensos de bicho-mineiro nomunicípio de Espera Feliz. Em todos oslocais observaram baixa incidência de secade ponteiro. Tais comportamentos podemestar associados às condições edafoclimá-ticas da região de plantio, como também,devido ao estado nutricional dos cafeeirose à variabilidade genética das cultivares.

Considerando que a média nacional deprodutividade de café está em torno de14 sacas de café beneficiado/ha, observou-se que, na primeira colheita (catação aosdois anos) realizada no município de Espe-ra Feliz, as cultivares Catuaí Amarelo IAC62, Catucaí Vermelho 20/15, H 518-3-6-1,IBC Palma 1, Oeiras MG 6851, Catucaí Açue Paraíso MG H 419-1 destacaram-se porapresentar produtividades médias de 34,

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Figura 3 - Formação de mudas orgânicas de café

NOTA: A – Preparo do substrato; B – Mistura do substrato; C – Semeio do viveiro; D – Vista geral do viveiro; E – Detalhe da mudaorgânica; F – Seleção das mudas para plantio.

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Acaiá Cerrado MG 1474 Vermelho Suscetível Alto Média EPAMIG

Mundo Novo IAC 379-19 Vermelho Suscetível Alto Média IAC

Bourbon Amarelo Amarelo Suscetível Médio a Alto Precoce Zona da Mata

Bourbon Vermelho Vermelho Suscetível Médio a Alto Precoce Zona da Mata

Crioulo Vermelho Suscetível Alto Média a tardia Zona da Mata

Maragogipe Vermelho Suscetível Alto Média Zona da Mata

Topázio MG 1190 Amarelo Suscetível Baixo Média EPAMIG

Rubi MG 1192 Vermelho Suscetível Baixo Média EPAMIG

Catuaí Amarelo IAC 62 Amarelo Suscetível Baixo Média a tardia IAC

Catuaí Vermelho IAC 15 Vermelho Suscetível Baixo Média a tardia IAC

Ouro Verde IAC H 5010-5 Vermelho Suscetível Baixo Média IAC

San Ramon Vermelho Suscetível Baixo Precoce a média Zona da Mata

Laurina IAC 870 Vermelho Suscetível Baixo Precoce a média Zona da Mata

Villa Lobos Vermelho Suscetível Baixo Média Zona da Mata

Caturra Vermelho Vermelho Suscetível Baixo Precoce Zona da Mata

Caturra Amarelo Amarelo Suscetível Baixo Precoce Zona da Mata

Icatu Amarelo IAC 2944 Amarelo Moderadamente Alto Média a tardia IAC

suscetível

Icatu Vermelho IAC 4045 Vermelho Moderadamente Alto Média a tardia IAC

suscetível

Icatu Precoce IAC 3282 Amarelo Moderadamente Alto Precoce IAC

suscetível

Oeiras MG 6851 Vermelho Moderadamente Baixo Média EPAMIG

resistente

Canário Amarelo Resistente Alto Precoce Procafé

Híbrido H 518-3-6-1 Vermelho Resistente Baixo Precoce a média EPAMIG

Híbrido H 514-7-4-5 Vermelho Resistente Baixo Precoce a tardia EPAMIG

Paraíso MGH 419-1 Amarelo Resistente Baixo Média EPAMIG

Obatã IAC 1669-20 Vermelho Resistente Baixo Média a tardia IAC

Tupi IAC 1669-33 Vermelho Resistente Baixo Precoce IAC

IAPAR 59 Vermelho Resistente Baixo Precoce Iapar(1) Catucaí 785-15 Vermelho Resistente Baixo Média Procafé

Catucaí Vermelho 20/15 Vermelho Resistente Baixo Média Procafé

Catucaí Amarelo 20/15 Amarelo Resistente Baixo Média Procafé

Catucaí Açu Vermelho Resistente Baixo Precoce Procafé(2) Acauã Vermelho Resistente Baixo Média a tardia Procafé(3) IBC- Palma 1 Vermelho Resistente Baixo Média Procafé(3) IBC- Palma 2 Vermelho Resistente Baixo Tardia Procafé

Sabiá Médio Vermelho Resistente Baixo Média Procafé(4) Siriema 842 Vermelho Resistente Baixo Precoce Procafé

Quadro 1 - Cultivares de café dos experimentos de avaliação em sistema orgânico de produção, nos municípios de Araponga, Espera Feliz e Tombos,

na Zona da Mata de Minas Gerais

Origem

FONTE: Moura (2005a).NOTA: IAC - Instituto Agronômico de Campinas; Iapar - Instituto Agronômico do Paraná; Procafé -Fundação de Apoio Tecnológico à Cafeicultura.(1) Apresenta boa resistência ao nematóide M. exígua. (2) Boa tolerância à seca e ao nematóide M. exígua. (3) Boa tolerância à seca. (4) Boa tolerânciaao bicho-mineiro.

Cultivares Cor

dos frutosReação à ferrugem Porte

(altura)

Época

de maturação

dos frutos

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Figura 4 - Atividades desenvolvidas no experimento de avaliação de cultivares de café no sistema orgânicoNOTA: A – Reunião com agricultores familiares; B – Implantação de experimento; C – Plantio de leguminosas; D – Corte de leguminosas.

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17, 17, 16, 15, 15 e 15 sacas de café beneficia-do/ha, respectivamente. Enquanto que nomunicípio de Tombos sobressaíram-se ascultivares: H 518-3-6-1, Sabiá 708, IAPAR59, com produtividades médias de 33, 18 e14 sacas de café beneficiado/ha, respecti-vamente. Com relação à porcentagem defrutos com lojas vazias (frutos chochos), amaioria das cultivares apresentou baixos va-lores (<10%). Observou-se também, que nes-ses municípios, as cultivares apresentaram-se mais vigorosas. Já no município deAraponga não foi possível obter dados deprodutividade, pelo fato de as cultivaresainda não estarem em fase de produção.

Constatou-se, diante dos resultados obti-dos, variabilidade genética entre as cultiva-res de café em resposta ao cultivo orgânico,que pode contribuir com informações a se-rem exploradas futuramente em progra-mas de melhoramento genético, visando àobtenção de cultivares adaptadas ao sis-tema de produção orgânico. No entanto,há necessidade de continuidade da pesqui-sa, uma vez que as informações obtidasaté o momento baseiam-se em avaliaçõesiniciais, sendo necessárias, pelo menos,quatro colheitas, quando então serão acresci-das as avaliações de eficiência nutricional,para a obtenção de resultados mais seguros.

Experimentos como esses, conduzidosno sistema orgânico, em nível local, em dife-rentes ambientes e de forma participativa,contribuem para a avaliação de cultivaresde café de forma simultânea de acordo coma realidade dos agricultores e das condiçõesedafoclimáticas de cada região. Permitemtambém, que os agricultores possam con-tribuir no processo de seleção empregandocritérios próprios, que muitas vezes fogemdos critérios adotados nas pesquisas tra-dicionais.

Por tratar-se de uma pesquisa participa-tiva, será promovido um encontro dos agri-cultores familiares, para apresentação e

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Figura 5 - Experimento de avaliação de cultivares de café no sistema orgânico

NOTA: A – Leguminosas nas entrelinhas do cafeeiro; B – Vista parcial do experimento após adubação verde; C e D – Produção daprimeira colheita.

A B

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discussão dos resultados obtidos, respei-tando suas opiniões individuais e aondeestes poderão contribuir com sugestões,compartilhando acertos e possíveis errosque a experimentação possa trazer, e dessaforma, contribuindo para o enriquecimentode pesquisas futuras.

ADUBAÇÃO VERDE COMLEGUMINOSAS E DECOMPOSIÇÃOE MINERALIZAÇÃO DENUTRIENTES

Um dos principais problemas enfrenta-dos pelos agricultores familiares da Zona

da Mata está na baixa fertilidade dos solosda região, causada pelas característicasnaturais do solo e pelo grau de degradaçãode algumas áreas. O limitado domínio dosprocessos de ciclagem de nutrientes des-ses sistemas tem resultado em baixos ní-veis de input externo às lavouras, eviden-ciando a necessidade de traçar estratégiassustentáveis de adição de nutrientes paraque os agroecossistemas sejam melho-rados.

Considerando solos de baixa fertilida-de como os da Zona da Mata mineira, emqualquer sistema de produção de baixo

input de nutrientes (orgânicos ou agro-ecológicos a pleno sol, ou sistemas agro-florestais (SAFs), ou mesmo os sistemastradicionais dos agricultores familiares),deve-se ter em mente que apenas uma peque-na parte dos nutrientes que serão absor-vidos pelas plantas poderá ser recicladadas reservas minerais do solo, da matériaorgânica e da fixação biológica de nitrogê-nio. Considerando a demanda das plantaspara crescimento e produção - que variamao longo de seus ciclos, a inevitável saí-da ou exportação de nutrientes (perdas eextração de produtos) e a baixa capacidade

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de reposição do solo, a sustentação do sis-tema produtivo será comprometida, se nãohouver reposição de nutrientes e o esgota-mento das reservas minerais ocorrerá maisou menos intensamente dependendo dadiferença entre a exportação de nutrientese a adição natural. A exportação pode seramenizada, mas é inevitável, e a adição émuito baixa em solos altamente intempe-rizados.

A proposta primária para atuar numacondição de baixa fertilidade natural é apli-car técnicas de manejo do solo que redu-zam as perdas e que favoreçam a reciclagemde nutrientes com o menor custo possível,considerando a capacidade de investi-mento e de trabalho do agricultor familiar.A partir disso a necessidade de importaçãode nutrientes para o sistema será reduzida.Se a propriedade ou a comunidade desen-volver sistemas de produção de compostosorgânicos e de aproveitamento de resí-duos, a dependência por insumos de foraserá reduzida ainda mais.

A nutrição e a adubação do cafeeirosob o paradigma agroecológico e orgânicopressupõem que a fertilidade do solo deveser mantida ou melhorada através da utili-zação de recursos naturais (GUIMARÃESet al., 2002). Na medida do possível, devem-se utilizar recursos locais, bem como sub-produtos orgânicos, que proporcionem ofornecimento de nutrientes aos cafeeiros,de forma ampla e diversificada, devendopriorizar a ciclagem deles, seja por meio derestos culturais, compostos e resíduosorgânicos, sistemas agroflorestais e legumi-nosas ou plantas espontâneas. Trata-se deuma área do conhecimento em que o envol-vimento da pesquisa participativa faz-senecessário, para se ter uma avaliação detais práticas e de seus benefícios quanto àestabilidade da produção.

Além da adição de resíduos orgânicosao solo, uma forma eficiente de promoverciclagem de nutrientes é por meio da adu-bação verde. O uso de leguminosas pode-rá contribuir como a principal fonte de ni-trogênio para a lavoura de café. O cultivointercalar de leguminosas e certas plantas

espontâneas também protege o solo contraa erosão e possibilita a incorporação dematéria orgânica ao sistema (LIMA et al.,2002) (Fig. 6). É preciso, entretanto, testardiferentes espécies para esse fim, conside-

rando que em função de condições climá-ticas e de solo haveria diferentes respostasdas leguminosas quanto à adaptação, pro-dução de biomassa, capacidade de fixaçãode N, imobilização de nutrientes e veloci-

Figura 6 - Leguminosas nas entrelinhas de cafeeiros

NOTA: A – Cobertura do solo e adubação verde; B – Nódulos de rizóbios na raiz parafixação biológica de nitrogênio.

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dade de decomposição e de mineralizaçãoapós o seu corte.

Com base nesse pressuposto está sen-do conduzido um experimento em quatrounidades experimentais, instaladas em áreasde agricultores familiares com os seguintesobjetivos (LIMA et al., 2005abc):

a) comparar espécies de leguminosascultivadas nas entrelinhas de cafeei-ros quanto à produção de biomassae acúmulo de nutrientes em diferen-tes condições edafoclimáticas;

b) avaliar a velocidade de decomposi-ção e da mineralização de nutrientesprovenientes da adubação verde deespécies de leguminosas para a cul-tura do cafeeiro sob diferentes con-dições edafoclimáticas.

O experimento foi instalado em parce-ria com agricultores de quatro comuni-dades dos municípios de Araponga (SítioPedra Redonda e Sítio Praia D’Anta), PedraDourada (Sítio União) e Eugenópolis (SítioBela Vista). Em cada unidade foram plan-tadas quatro cultivares de cafeeiros resis-tentes à ferrugem (Oeiras, Icatu, Obatã eCatucaí) e sete espécies de leguminosas:Crotalaria juncea (crotalária), Cajanuscajan (guandu-anão), Dolichus lablab (lab-labe) e Stylozobium aterrimum (mucuna-preta), de ciclo anual, e Calopogoniummucunoides (calopogônio), Arachis pintoi(amendoim-forrageiro) e Stylozanthesguyanensis (estilozantes), de ciclo perene,intercaladas com as linhas de plantio doscafeeiros. Quando as leguminosas atingi-ram o florescimento, as partes aéreas fo-ram cortadas, determinadas as massas dosmateriais frescos em quilogramas e unifor-memente dispostas sob os cafeeiros. Umaamostra de material fresco de cada parcelafoi secada e analisada quanto à concentra-ção de macro e micronutrientes. Uma outraparte do material fresco foi pesada e acon-dicionada em sacolinhas com malha de4 mm e disposta também sob os cafeeiros(Fig. 7 e 8). Essas amostras foram novamen-te pesadas aos 15, 30, 60, 120 e 240 dias

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58 Cafeicultura familiar

Figura 7 - Experimento com leguminosas para adubação verde de cafeeiros

NOTA: A – Reunião com agricultores e discussão da metodologia; B – Demonstração do preparo do solo; C – Preparo do solo;D – Semeadura; E – Vista parcial do experimento e carga dos cafeeiros; F – Corte das leguminosas.

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59Cafeicultura familiar

Figura 8 - Avaliação do experimento

NOTA: A – Pesagem; B – Separação de amostra para análise de nutrientes; C – Preparo de sacolinha para avaliar decomposição;D – Sacolinhas sob a adubação verde; E – Deposição dos adubos verdes sob as saias dos cafeeiros; F – Carga do cafeeiro.

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60 Cafeicultura familiar

após a deposição sob os cafeeiros, paradeterminação da velocidade de decompo-sição da matéria orgânica, teores e conteú-do de nutrientes. Os principais resultadosserão apresentados a seguir.

Produção de biomassadas leguminosas

As leguminosas de ciclo perene apre-sentaram crescimento mais lento com pro-duções de biomassas inferiores às dasleguminosas de ciclo anual, que obtiveramcrescimento mais rápido (Quadro 2).

As produções obtidas em Arapongaforam maiores que as obtidas em Pedra Dou-rada e Eugenópolis, municípios mais pró-ximos. A precipitação média anual podeter sido uma condição climática que afetouesse resultado, pois em Araponga é de1.320 mm e Pedra Dourada e Eugenópolisde, aproximadamente, 1.270 mm. A distri-buição das chuvas é semelhante nas duasregiões, com os meses mais secos entre ju-nho e agosto.

Comparando a produção de biomassadas leguminosas entre os sítios e municí-pios, guandu-anão, mucuna-preta e crota-lária foram as que apresentaram as maioresproduções em Araponga, enquanto que nomunicípio de Pedra Dourada, o Sítio Uniãofoi o único local em que uma leguminosa

de ciclo perene, o estilozantes, produziumaior biomassa que as demais, na ordemde 17 t ha-1. No Sítio Bela Vista, em Eugenó-polis, por sua vez, a leguminosa guandu-anão apresentou a maior produção médiade biomassa, 14 t ha-1.

Vários fatores são responsáveis pelasdiferenças entre as espécies e dentro deuma mesma espécie em diferentes locais,que não podem ser analisados de formaisolada, mas em seu conjunto. O crescimen-to e o desenvolvimento de um organismosão resultantes da ação conjunta de trêsníveis de controle (LUCHESI, 1987):

a) intracelular ou genético – relaciona-do com o código genético de cadaindivíduo;

b) intercelular ou hormonal – intera-ções entre ambiente, substâncias quí-micas constituintes das células ehormônios que sofrem interferênciados fatores ambientais, modifican-do processos fisiológicos nos ve-getais;

c) extracelular ou ambiental.

Os resultados obtidos nas duas proprie-dades localizadas em Araponga apresen-taram marcantes diferenças. A propriedadeSítio Praia D’Anta, com altitude de 790 m,

está situada sobre um Latossolo Vermelho-Amarelo distrófico A moderado, em relevosuave-ondulado. O Sítio Pedra Redondaestá a 950 m de altitude em um LatossoloVermelho-Amarelo A moderado/proemi-nente, em relevo forte-ondulado. Com basenas características edafoclimáticas dosdois sítios é possível sugerir que a menoraltitude da propriedade Sítio Praia D’Antaimplicaria em maiores médias anuais de tem-peraturas e a baixa declividade permitiriauma maior infiltração e armazenamento deágua. Por sua vez, na propriedade SítioPedra Redonda, a altitude mais elevadaconferiria menores temperaturas médias ea elevada declividade resultaria em me-nor retenção de água pelo sistema, fatoresque teriam contribuído para as menoresprodutividades desse sítio em relação aoanterior.

A profundidade do solo deve ter sidoum dos principais fatores que propicioumenores produtividades na propriedadeSítio Bela Vista. O experimento está insta-lado em solo com várias propriedades fí-sicas dos horizontes A e B dos Latosso-los. Porém, por estar em terreno sobre lajerochosa com solo mais raso, formado dasedimentação de partículas originadas daerosão de um grande paredão de rocha,existente no final da área experimental, foiclassificado como Cambissolo Háplico Tbdistrófico, A proeminente. Nesse local, amenor profundidade de enraizamento, amenor capacidade de armazenamento deágua para ser absorvida nos períodos deestiagem e a maior facilidade de encharca-mento nos períodos chuvosos, teriam redu-zido a capacidade produtiva das espécies,com exceção do guandu-anão, que mostrouser mais tolerante a esse tipo de estresseambiental, produzindo tanta biomassaquanto o Sítio Pedra Redonda e mais queo Sítio União, sendo, então, uma espécie aser considerada nessa condição ambien-tal.

De modo geral, as baixas produtivida-des apresentadas pelas espécies perenesnos diferentes locais, estão, certamente, re-lacionadas com as características genéticas

Guandu-anão 14,7 a 14,0 a 22,7 b 7,8 b 14,0 a

Mucuna-preta 14,4 a 16,8 a 19,6 b 15,3 a 5,8 b

Crotalária 14,2 a 12,1 a 29,9 a 12,6 a 2,4 b

Lablabe 9,3 b 11,4 a 14,0 c 10,3 b 1,4 b

Estilozantes 7,7 b 7,7 b 5,2 d 17,3 a 0,7 b

Calopogônio 7,6 b 10,1 a 8,2 d 7,7 b 4,4 b

Amendoim-forrageiro 3,7 c 4,3 b 3,8 d 4,3 b 2,2 b

QUADRO 2 - Produção de biomassa (t ha-1) de sete espécies de leguminosas, cultivadas nas

entrelinhas de cafeeiros, em quatro sítios (municípios) da Zona da Mata de Minas

Gerais

FONTE: Lima et al. (2005b).NOTA: Médias seguidas pela mesma letra, na coluna, não diferem entre si pelo teste de Scott-

Knott, a 5% de probabilidade.

Leguminosa Média

Pedra

Redonda

(Araponga)

Praia

D’Anta

(Araponga)

União

(Pedra

Dourada)

Bela Vista

(Eugenó-

polis)

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61Cafeicultura familiar

dessas espécies. Por serem de ciclo longo,o primeiro ano após o plantio não apresen-taria a produção potencial dessas plantas.Sendo então necessário repetir o experi-mento após a manutenção dessas espéciespor um ano nas entrelinhas dos cafeeiros,quando estariam apresentando uma maiorcobertura do solo e maior produção de bio-massa.

Acúmulo de nutrientes nabiomassa das leguminosas

Analisando todas as leguminosas, nasquatro propriedades estudadas, notou-seque o guandu-anão e a crotalária foram asque mais incorporaram nutrientes nos so-los, seguidos pela mucuna-preta, calopo-gônio, estilozantes, lablabe e amendoim-forrageiro (Quadro 3). Isso teve relação comas biomassas produzidas. O guandu-anãoe a crotalária foram as leguminosas queapresentaram as maiores quantidades denitrogênio, em torno de 115 kg/ha. Se todoesse conteúdo fosse liberado para o solodurante o período de demanda dos cafeei-ros, o guandu-anão seria capaz de forne-cer, aproximadamente, 66% de nitrogênio e48% do potássio exigidos pelo cafeeiro etodo o fósforo necessário para os níveisde produtividade de 20 a 30 sacas/ha. Emcada propriedade pelo menos uma legumi-nosa seria capaz de fornecer mais da metadeda quantidade de nitrogênio recomendadapara o cafeeiro para os níveis de produ-tividade de 30 a 40 sacas/ha e, em geral, oguandu-anão foi a leguminosa que imo-bilizou maiores quantidades de N, P e Knas condições desse experimento (Qua-dros 4 a 7).

Esses resultados servem para indicar opotencial das leguminosas como fonte denutrientes para o cafeeiro, mas não é o sufi-ciente, é preciso determinar a liberação des-ses nutrientes para as plantas. A liberaçãode nutrientes das leguminosas para asculturas por meio da adubação verde de-pende da sua imobilização na biomassa mi-crobiana e posterior mineralização. A imobi-lização e a mineralização são reguladas, emgrande parte, pela composição bioquímica

QUADRO 4 - Produção de matéria seca (kg ha-1) e conteúdos de N, P, K (kg ha-1) provenientes da

incorporação de leguminosas cultivadas no Sítio Pedra Redonda - Araponga, MG

FONTE: Lima et al. (2005c).NOTA: Médias seguidas pela mesma letra, na coluna, não diferem entre si pelo teste de Scott-

Knott, a 5% de probabilidade.

Leguminosa Matéria seca N P K

Amendoim-forrageiro 1.040,3 b 28,5 c 11,1 a 23,3 b

Calopogônio 2.343,1 a 70,3 b 4,2 a 52,7 a

Crotalária 3.183,2 a 89,4 a 8,0 a 48,1 a

Guandu-anão 3.237,5 a 132,4 a 10,4 a 66,3 a

Lablabe 1.963,0 a 65,0 b 6,2 a 47,2 a

Estilozantes 1.702,0 b 52,4 b 4,2 a 39,7 b

Mucuna-preta 3.173,7 a 107,4 a 8,7 a 64,3 a

QUADRO 5 - Produção de matéria seca (kg ha-1) e conteúdos de N, P, K (kg ha-1) provenientes da

incorporação de leguminosas cultivadas no Sítio Praia D’Anta - Araponga, MG

FONTE: Lima et al. (2005c).NOTA: Médias seguidas pela mesma letra, na coluna, não diferem entre si pelo teste de Scott-

Knott, a 5% de probabilidade.

Leguminosa Matéria seca N P K

Amendoim-forrageiro 518,8 d 14,0 c 1,6 c 13,0 c

Calopogônio 1.590,0 c 43,6 c 4,4 c 35,7 b

Crotalária 7.020,4 a 208,7 a 21,5 a 101,9 a

Guandu-anão 4.969,5 b 194,6 a 16,1 b 91,2 a

Lablabe 2.024,2 c 65,0 c 6,7 c 44,0 b

Estilozantes 937,3 d 25,9 c 2,6 c 21,5 c

Mucuna-preta 3.821,9 b 131,7 b 11,8 b 79,9 a

Amendoim-forrageiro 805,8 c 22,1 d 4,3 c 16,5 d

Calopogônio 1.941,7 b 59,5 c 5,4 c 38,5 c

Crotalária 3.821,5 a 116,3 a 11,4 a 53,6 b

Guandu-anão 3.882,5 a 115,1 a 12,9 a 65,4 a

Lablabe 1.583,7 b 52,0 c 5,1 c 36,2 c

Estilozantes 1.674,9 b 52,2 c 4,4 c 33,8 c

Mucuna-preta 2.807,8 a 94,2 b 8,1 b 52,7 b

QUADRO 3 - Média da produção de matéria seca (kg ha-1) e do conteúdo de N, P, K (kg ha-1) pro-

veniente da incorporação de leguminosas cultivadas em quatro sítios da Zona da

Mata de Minas Gerais1

FONTE: Lima et al. (2005c).NOTA: Médias seguidas pela mesma letra, na coluna, não diferem entre si pelo teste de Scott-

Knott, a 5% de probabilidade.(1) Sítios: Pedra Redonda e Praia D'anta - Araponga, MG; União - Pedra Dourada, MG e BelaVista - Eugenópolis, MG.

Leguminosa Matéria seca N P K

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62 Cafeicultura familiar

dos materiais orgânicos. Segundo a Fun-dação Cargill (1984), os compostos orgâ-nicos encontrados nos tecidos vegetaiscomo hidratos de carbono (açúcares e ami-dos – 1% a 5%, hemicelulose – 10% a 28%e celulose – 20% a 50%), gorduras, ceras etaninos (1% a 8%), ligninas (10% a 30%) eproteínas (1% a 15%), são submetidos aoprocesso de decomposição, mas não se de-compõem com a mesma velocidade. Os açú-cares, amidos e proteínas simples, são osque se decompõem mais facilmente, se-guidos pela proteína bruta e hemicelulose.Compostos como a celulose, lignina e gor-duras, são mais resistentes ao processo dedecomposição.

Estima-se que num período de 150 dias,50% do N proveniente do adubo verde sejamineralizado, o restante mais lentamente(FRANCO; SOUTO, 1984). Mas isso pre-cisa ser mais bem investigado, dadas asvariações das composições entre as espé-cies e as variações na atividade microbia-na em função de características de solo,de altitude e de clima em diferentes regiões.A velocidade de mineralização dos mate-riais orgânicos e as quantidades de nutri-entes disponibilizados são dados impor-tantes para cálculos de recomendação deadubação em sistemas orgânicos. Isso pre-cisa ser considerado na estimativa de áreade plantio de leguminosas, para atender à

demanda de cada hectare de café em fun-ção da fase da lavoura (plantio, formação eprodução).

Decomposição dasleguminosas

A biomassa residual decresceu ao lon-go do período avaliado para todas as le-guminosas estudadas (Gráfico 1). Esse de-créscimo apresentou duas fases bastantedistintas com relação à velocidade de de-composição da matéria orgânica. Uma fasede decréscimo mais acentuado ocorreu nosprimeiros quinze dias após a deposição doslambris. Num período seguinte, a decompo-sição foi mais lenta que na segunda e numritmo constante entre 15 e 240 dias.

Considerando todos os locais estuda-dos, a crotalária e o estilozantes estão entreas leguminosas que apresentaram maioresvelocidades de decomposição. Os resulta-dos observados entre os locais e as espé-cies podem estar associados às condiçõesambientais, relativas a altitude, clima e solo.Observou-se também, que nas proprie-dades de menor altitude ocorreu decom-posição mais rápida da matéria orgânica.

Nos primeiros 60 dias, de 40% a 60% dabiomassa residual já havia sido decompos-ta. Considerando a data de corte das espé-cies, haveria disponibilidade de 40% a 60%dos nutrientes no mesmo período chuvo-so, ficando o restante como residual sobas saias dos cafeeiros para o próximo pe-ríodo chuvoso.

Composição bioquímicae liberação de nutrientesdas leguminosas

A decomposição dos adubos verdes,a liberação de nutrientes e a relação dissocom a composição bioquímica de quatrodessas leguminosas foram mais bem estu-dadas nos Sítios Pedra Redonda e PedraDourada (MATOS et al., 2005) (Quadro 8).Os teores de N e P na parte aérea variaramde 2,57 a 3,7 e de 0,24 a 0,30 dag/kg, res-pectivamente, com C. mucunoides (calo-pogônio) e S. aterrimum (mucuna-preta),apresentando os maiores teores de N em

QUADRO 6 - Produção de matéria seca (kg ha-1) e conteúdos de N, P, K (kg ha-1) provenientes da

incorporação de leguminosas cultivadas no Sítio União - Pedra Dourada, MG

FONTE: Lima et al. (2005c).NOTA: Médias seguidas pela mesma letra, na coluna, não diferem entre si pelo teste de Scott-

Knott, a 5% de probabilidade.

Leguminosa Matéria seca N P K

Amendoim-forrageiro 955,0 b 27,0 b 2,5 b 21,1 b

Calopogônio 1.767,2 b 60,4 b 5,2 b 33,8 b

Crotalária 3.232,3 a 114,1 a 11,3 a 42,0 b

Guandu-anão 2.525,2 a 114,4 a 9,4 a 44,2 b

Lablabe 1.793,0 b 62,3 b 5,6 b 43,7 b

Estilozantes 3.785,2 a 123,0 a 9,8 a 70,1 a

Mucuna-preta 1.759,2 b 60,5 b 4,9 b 31,8 b

QUADRO 7- Produção de matéria seca (kg ha-1) e conteúdos de N, P, K (kg ha-1) provenientes da

incorporação de leguminosas cultivadas no Sítio Bela Vista - Eugenópolis, MG

FONTE: Lima et al. (2005c).NOTA: Médias seguidas pela mesma letra, na coluna, não diferem entre si pelo teste de Scott-

Knott, a 5% de probabilidade.

Leguminosa Matéria seca N P K

Amendoim-forrageiro 709,1 b 19,1 c 2,2 b 8,8 c

Calopogônio 2.066,6 b 64,1 b 6,5 b 31,9 b

Crotalária 1.850,0 b 52,9 b 5,0 b 22,5 c

Guandu-anão 4.797,8 a 179,0 a 15,5 a 59,8 a

Lablabe 554,8 b 15,5 c 2,0 b 9,8 c

Estilozantes 274,9 b 7,7 c 0,9 b 7,8 c

Mucuna-preta 2.476,2 b 77,2 b 7,1 b 34,7 b

Page 65: 1 - sumário - sapc.embrapa.br · lecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), produzirá, aproximadamente 10 milhões de sacas de café em 2005, contribuindo com R$2,5 bilhões para

I n f o r m e A g r o p e c u á r i o , B e l o H o r i z o n t e , v . 2 6 , p . 4 6 - 7 5 , 2 0 0 5 . E d i ç ã o e s p e c i a l

63Cafeicultura familiar

Gráfico 1 - Biomassa residual de leguminosas em decomposição sob cafeeiros em quatro sítios da Zona da Mata de Minas GeraisFONTE: Lima et al. (2005a).NOTA: A – Média dos sítios; B – Pedra Redonda; C – Praia D’Anta; D – Bela Vista; E – União.

0,0

5,0

10,0

15,0

20,0

25,0

30,0

0 15 30 60 120 240

Período de decomposição (dias)

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Período de decomposição (dias)

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Período de decomposição (dias)

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Período de decomposição (dias)

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Período de decomposição (dias)

Bio

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Amendoim

Calopogônio

Crotalária

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Lablabe

Estilozantes

Mucuna

Bio

ma

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sid

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A

B C

D E

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64 Cafeicultura familiar

ambas as áreas. O S. guianensis (estilozan-tes) apresentou os menores valores de lig-nina e das relações lignina/N, lignina/poli-fenol e (lignina+polifenol)/N. Os valores depolifenóis totais solúveis variaram de 1,19a 1,86 e de 1,30 a 2,04 dag/kg para Arapongae Pedra Dourada, com C. mucunoides, queapresentaram os menores e S. aterrimumos maiores valores, respectivamente. A taxade decomposição de matéria seca foi 50,7%menor, em Araponga, e esteve relacionadacom as diferenças climáticas entre as pro-priedades. As maiores taxas de liberaçãode nutrientes foram observadas para o Pem todas as espécies avaliadas e ocorre-ram nos primeiros 15 dias, quando mais de60% do P foi liberado para o sistema (Grá-ficos 2 e 3). Em média, 32% do total de Npresente no material vegetal foi liberadonos primeiros 15 dias. Até os 360 dias, fo-ram liberados 77,5% e 88,5 % do N, em Ara-ponga e Pedra Dourada, respectivamente.Ao contrário das características edafocli-máticas, as diferenças na composição quí-mica e bioquímica dos adubos verdes ti-veram pouca influência nas variações dastaxas de decomposição e liberação de nu-trientes.

Produtividade dos cafeeiros

Os efeitos da adubação verde sobre aprodutividade dos cafeeiros foram nota-dos no ano de 2005, já que em 2004 o pe-ríodo entre o corte das leguminosas e a co-lheita dos cafés foi inferior a 30 dias. Comoo experimento será repetido por quatro co-lheitas, em 2005 foi a segunda coleta dedados após replantio das espécies de ciclocurto, no final de 2004. Quanto às espéciesde ciclo longo, o replantio foi realizado nasfalhas das parcelas anteriores, já que elasforam mantidas nas parcelas após as rebro-tas. As produtividades variaram com as legu-minosas e com as cultivares de café (Qua-dro 9). A média geral de produtividade ficouem 52 sacas beneficiadas/ha, demonstran-do que a adubação verde foi eficaz paraa nutrição dos cafeeiros no segundo ano.A leguminosa que proporcionou a maiorprodutividade dos cafeeiros foi lablabe, com56 sacas beneficiadas/ha e a menor produ-tividade ocorreu com calopogônio, 47 sacasbeneficiadas/ha. Entre as cultivares de ca-fé, a maior produtividade ocorreu com ‘Icatuprecoce IAC 3282’, com 56 sacas beneficia-das/ha e a menor foi obtida por ‘Obatã IAC1669-20’, com 47 sacas beneficiadas/ha.

PLANTAS ESPONTÂNEAS COMOADUBOS VERDES

Outra forma simples de fazer uma adu-bação verde é através da vegetação quecresce espontaneamente na lavoura, ouplantas espontâneas. Essas são elemen-tos importantes para os agroecossistemas,porque promovem, em proporções diferen-ciadas, efeitos similares das leguminosasintroduzidas sobre a cobertura do solo, pro-dução de biomassa e ciclagem de nutrien-tes (FAVERO, 1998). Podem funcionar comoadubos verdes, diminuindo a necessidadede introdução de outras espécies, como nocaso das leguminosas. O plantio de legumi-nosas pode representar aumento da mão-de-obra em relação às espécies espontâ-neas, em especial em terrenos declivososcomo os encontrados na região da Zonada Mata. Porém, o manejo de determinadasespécies espontâneas pode ser mais difícildo que algumas espécies de leguminosas.Sendo assim, uma associação das duaspráticas (manejo das espécies espontâ-neas e de leguminosas) pode ser impor-tante para uma maior sustentabilidade dapropriedade.

Em visitas realizadas em oito proprie-

Amendoim- 40,8 2,57 0,24 2,30 1,12 0,45 12,3 27,8 8,4 1,82 170 15,9 3,3 4,6 0,71 4,0

forrageiro

Calopogônio 42,1 3,09 0,24 2,24 0,82 0,22 12,4 28,2 7,8 1,19 175 13,6 2,5 6,6 0,38 2,9

Estilozantes 43,1 2,95 0,25 2,30 1,13 0,24 12,7 32,3 6,1 1,54 172 14,6 2,1 4,0 0,52 2,6

Mucuna-preta 43,3 3,56 0,28 2,05 0,91 0,22 13,2 31,4 10,5 1,86 155 12,2 2,9 5,6 0,52 3,5

Amendoim- 42,7 2,72 0,27 2,26 1,09 0,50 12,1 31,2 7,8 1,68 158 15,7 2,9 4,6 0,62 3,5

forrageiro

Calopogônio 44,1 3,52 0,30 2,1 0,83 0,20 16,6 26,7 9,0 1,30 147 12,5 2,6 6,9 0,37 2,9

Estilozantes 43,7 3,20 0,26 1,72 1,17 0,25 12,9 29,8 4,8 1,72 168 13,6 1,5 2,8 0,54 2,0

Mucuna-preta 45,3 3,70 0,26 1,97 0,82 0,20 16,9 31,7 8,6 2,04 174 12,3 2,3 4,2 0,55 2,9

FONTE: Matos (2005).NOTA: HM – Hemicelulose; CL – Celulose; LG – Lignina; PP – Polifenóis totais solúveis.

QUADRO 8 - Composição química e bioquímica de quatro dos adubos verdes dos Sítios Pedra Redonda (Araponga, MG) e União (Pedra Dourada, MG)

Sítio Pedra Redonda (Araponga)

Sítio União (Pedra Dourada)

LeguminosaC N P K Ca Mg HM CL LG PP

dag kg-1C/P C/N (LG + PP)

NLGN

LGPP

PPN

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65Cafeicultura familiar

Gráfico 2 - Porcentagem de C, N e P remanescentes ao longo de 360 dias nas propriedades de Araponga (Sítio Pedra Redonda) ePedra Dourada (Sítio União), respectivamente

FONTE: Matos (2005).NOTA: A e B – Porcentagem de C; C e D – Porcentagem de N; E e F – Porcentagem de P.

Barras verticais representam o erro padrão em relação à média (n = 4).

0 15 30 60 120 240 360

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Araponga

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Pedra Dourada

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Tempo (dias)

0 15 30 60 120 240 360

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A. pintoi S. guianensis S. aterrimumC. mucunoides

A B

C D

E F

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66 Cafeicultura familiar

Gráfico 3 - Porcentagem de K, Ca e Mg remanescentes ao longo de 360 dias nas propriedades de Araponga (Sítio Pedra Redonda)e Pedra Dourada (Sítio União), respectivamente

FONTE: Matos (2005).NOTA: A e B – Porcentagem de K; C e D – Porcentagem de Ca; E e F – Porcentagem de Mg.

Barras verticais representam o erro padrão em relação à média (n = 4).

Araponga

0 15 30 60 120 240 3600 15 30 60 120 240 360

Kre

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100Pedra Dourada

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Tempo (dias)

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60

80

100

A. pintoi S. guianensis S. aterrimumC. mucunoides

E F

C D

A B

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67Cafeicultura familiar

dades familiares, localizadas nos municí-pios de Araponga e Tombos, foram levanta-das as espécies espontâneas encontradasnas áreas e o manejo dado a essas espécies(OLIVEIRA; OLIVEIRA, 1982). Foi consta-tado que os agricultores utilizavam e mane-javam as espécies espontâneas, com o fimde proteger o solo e a ciclagem de nutrien-tes. Além disso, essas plantas eram consi-deradas boas indicadoras de qualidade dosolo. Devido à escassez de resultados so-bre o manejo e o potencial dessas plantase do valor dado a elas pelos agricultores,seriam necessários estudos mais aprofun-dados com a finalidade de potencializar ouso delas, valorizando e reconhecendo osaber local, procurando encontrar alternati-vas para uma agricultura mais sustentável.

O benefício dessas plantas como cober-tura do solo e ciclagem de nutrientes podeser maximizada se estiver associado a umpadrão conhecido de velocidade de decom-posição e liberação de nutrientes, em sin-cronia à necessidade da cultura principal(MYERS et al., 1994). Uma opção de manejoinclui a seleção de materiais vegetais comdiferentes composições químicas (qualida-de), com o conhecimento do tempo, quan-tidade e melhor forma de aplicação no solo(PALM, 1995).

DECOMPOSIÇÃO ELIBERAÇÃO DE NUTRIENTESDE DIFERENTESRESÍDUOS VEGETAIS

Existe uma gama de outros materiais quepodem ser considerados fontes de nutri-

entes com potencial para ser utilizados naadubação orgânica, tais como: estercos,compostos, restos culturais, tortas, fari-nhas, vinhaças, produtos e resíduos agro-industriais e urbanos. Entre as limitaçõespara utilizá-los existe a definição de doses,que por sua vez dependem das diferentescomposições dos materiais e da velocidadeem que os nutrientes serão disponibiliza-dos no solo na forma mineral. Embora exis-tam indicações sobre Índices de Conver-são, que permitiriam prever a velocidadede decomposição da matéria orgânica e amineralização de nutrientes ao longo dotempo (KIEHL, 1985; RIBEIRO et al., 1999;VALE et al., 1995), a caracterização básicadesses materiais mostram que as taxas deliberação de nutrientes são extremamentevariáveis, o que torna questionáveis as ge-neralizações desses índices, sem que sejamcategorizadas as diferenças entre os mate-riais. Essas diferenças precisam ser avalia-das, quantificadas e agrupadas em cate-gorias. Isso permitirá a produção de tabelasque darão maior segurança aos cálculosde recomendação de adubação orgânica emgeral.

A qualidade do material vegetal podeser considerada como um dos principaisfatores que afetam a decomposição e a li-beração de nutrientes (HEAL et al., 1997).Quantidades altas de nutrientes no materialvegetal têm sido geralmente relacionadascom altas taxas de decomposição (COBOet al., 2002). De acordo com Palm e Sánchez(1991), a concentração de polifenóis, porexemplo, pode influenciar a decomposição

e a liberação de nutrientes nas legumino-sas.

Considerando as diferentes fraçõesda matéria orgânica, Chacón et al. (2005b)verificaram que os valores do carbono to-tal foram maiores nos adubos verdes emenores nos resíduos industriais em mé-dia 43,64 e 19,95 dag kg-1, respectivamente.As frações fúlvicas variaram de 6 a 34,8 eas húmicas de 0,3 a 2,3 g kg-1. Em geral, afração fúlvica foi maior que a húmica, indi-cando que a matéria orgânica desses mate-riais não se encontrava completamente hu-mificada (Quadro 10).

As taxas de evolução relativa de C-CO2

correlacionaram-se positivamente com ocarbono solúvel em água (r2 = 0,95), e comos carboidratos (r2 = 0,89), indicando queesses parâmetros estão diretamente rela-cionados com as quantidades de carbonofacilmente mineralizáveis. Entre os ester-cos, as maiores taxas foram obtidas para oesterco de galinha e de coelho; nos resí-duos industriais, para a farinha de carne ede osso, e lodo de esgoto; nos adubos ver-des para Amaranthus e Crotalaria; nos com-postos para muscilagem + chorume e cascade café (Quadro 11). Assumindo-se umaeficiência de assimilação de C pelos mi-crorganismos de 60%, determinou-se queos maiores índices de carbono total oxida-do relativo em cada categoria correspon-deram a: esterco de galinha 86,96% e suíno63,53%; farinha de carne e osso 97,90% etorta de filtro 33,62%; Crotalaria juncea128,58% e Brachiaria decumbens 115,49%;muscilagem + chorume 74,75% e casca de

Oeiras 50 48 46 51 56 54 48 51

Obatã 42 50 56 41 43 54 44 47

Catucaí 58 55 54 49 60 54 42 53

Icatu 57 60 55 52 49 61 55 56

Média 52 53 53 48 52 56 47 52

QUADRO 9 - Produtividade de cultivares de café em lavouras conduzidas em sistema orgânico de produção em função de adubação verde com

leguminosas em quatro Sítios da Zona da Mata de Minas Gerais1

(1) Sacas beneficiadas/hectare.

Mucuna Crotalária Mineirão GuanduAmendoim-

forrageiroLablabe Calopogônio MédiaCultivar

Page 70: 1 - sumário - sapc.embrapa.br · lecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), produzirá, aproximadamente 10 milhões de sacas de café em 2005, contribuindo com R$2,5 bilhões para

I n f o r m e A g r o p e c u á r i o , B e l o H o r i z o n t e , v . 2 6 , p . 4 6 - 7 5 , 2 0 0 5 . E d i ç ã o e s p e c i a l

68 Cafeicultura familiar

Esterco bovino 91,1 41,3 0,85 0,44 2,08 1,95 0,64 0,61 1,28 0,28 23 55 393

Esterco suíno 74,4 41,9 1,82 0,41 2,74 3,19 5,61 0,99 1,82 0,39 18 34 287

Esterco de galinha 69,2 31,3 2,12 0,49 4,03 1,95 6,72 0,46 2,90 0,35 9 41 239

Esterco de coelho 85,1 40,6 1,42 0,44 1,83 1,29 0,96 0,71 1,25 0,21 26 81 517

Farinha de carne e osso 51,8 30,5 18,0 4,90 282 1,60 1,89 1,12 5,55 10,2 17,9 0,35 0,19 0,26 6 8 314

Lixo domiciliar 20,2 13,1 16,6 7,00 107 5,33 0,34 0,09 0,87 1,09 1,81 0,30 0,61 0,24 18 31 146

Torta de filtro 71,5 35,8 32,7 9,70 315 2,70 1,43 0,40 1,73 1,91 0,75 0,23 0,12 0,34 24 49 281

Lodo de esgoto 47,7 27,6 16,3 7,60 251 2,75 0,52 0,08 3,47 1,34 0,88 0,10 0,16 1,19 9 53 62

Brachiaria decumbens 91,4 42,2 5,64 2,46 1,78 0,18 0,60 0,66 1,03 0,15 28 606 751

Amaranthus spinatum 80,2 37,6 5,25 5,11 3,94 0,40 2,34 0,50 4,38 0,30 11 243 335

Leucena leucocephala 91,2 44,2 4,75 1,81 4,51 0,21 1,54 0,31 1,57 0,31 11 545 381

Crotalaria juncea 96,0 46,8 6,10 3,96 3,42 0,19 0,81 0,25 1,36 0,13 16 637 961

Vermicomposto 22,6 13,2 13,6 3,00 115 2,26 0,19 0,07 1,03 0,36 0,91 0,22 0,16 0,19 15 95 187

Casca de café 94,6 48,6 35,0 21,0 430 4,31 3,24 0,60 1,56 0,17 0,37 0,09 1,57 0,11 36 740 1.180

Muscilagem + 46,8 26,2 6,0 6,2 250 2,35 4,12 0,80 1,74 1,09 2,59 0,32 0,55 0,17 18 62 412

chorume

Esterco bovino + 79,6 45,6 34,8 23,0 398 5,03 0,74 0,09 1,95 0,34 1,21 0,42 2,17 0,20 27 347 609

casca café

QUADRO 10 - Diferentes frações e parâmetros de estabilidade da matéria orgânica de diversos materiais utilizados na cafeicultura orgânica –Viçosa, MG1

FONTE: Chacón et al. (2005b).

NOTA: MO – Matéria orgânica; Ct – Carbono total ; Cff – Carbono da fração ácidos fúlvicos; Cfh – Carbono da fração ácidos húmicos; Cfhu – Carbono

da fração humina; IH – Índice de humificação; Csa – Carbono total solúvel em água; Carb – Carboidratos; Nt – Nitrogênio total; Pt – Fósforo

total; C/N – Relação atômica de carbono e nitrogênio; C/P – Relação atômica de carbono e fósforo; C/S – Relação atômica de carbono e enxofre.

(1) Resultados expressos com base na matéria seca.

SubstratosMO Ct Cff Cfh Cf hu IH Csa Carb Nt Pt Ca Mg K S C/N C/P C/S

dag kg-1 g kg -1 dag kg -1

café 50,34%. As estimativas sugerem queas massas dos resíduos B. decumbens eC. juncea foram totalmente oxidadas e aindafavoreceram a oxidação adicional do carbo-no da matéria orgânica do solo efeito priming.

Os materiais facilmente biodegradá-veis produziram altas taxas de C-CO2 emcurto tempo, provavelmente imobilizandonitrogênio, até atingir o equilíbrio na rela-ção C/N do sistema, e mineralizando-seposteriormente. Assim, materiais com fra-ções de carbono mais recalcitrantes perma-neceriam por mais tempo no solo, induzin-do uma melhoria física e mineralizando-semais lentamente.

Em outro trabalho, diferentes resíduosvegetais foram avaliados em ensaio de mi-neralização do nitrogênio em ambiente con-

trolado, os materiais com mesma relação C/Ntiveram padrões de mineralização diferentes.A Leucaena leucocephala e o Amaranthusspinatum com mesmas relações C/N (C/N =11) apresentaram diferenças significativasnas quantidades de N-NH4

+ + N-NO3- mi-

neralizados (Gráfico 4). Esses resultadosindicaram que para um melhor entendimen-to da dinâmica de decomposição dos resí-duos vegetais devem-se considerar, alémda relação C/N, as relações C/P/S, formasde carbono, carboidratos, hemicelulose, ce-lulose, lignina, teor e a capacidade dos poli-fenóis para complexar proteína (CHACÓNet al., 2005a).

Investigações que consideram os ma-teriais diferentes utilizados pelos agricul-tores familiares dentro de diversos siste-

mas de produção, como SAFs ou a plenosol e variações edafoclimáticas em abran-gência local, não são encontrados e são deextrema importância, visto serem variáveisdeterminantes para o processo de ciclagemde nutrientes no solo.

PESQUISAS, ESTUDOSE LEVANTAMENTOS EMSISTEMAS AGROFLORESTAIS

As condições para o estabelecimentoda agricultura familiar na Zona da Matade Minas Gerais, em especial para as la-vouras de café, cultura principal nessa re-gião, sempre apresentaram limitações paraos pequenos agricultores em suas pro-priedades. Tais dificuldades ocorrem pelascondições topográficas adversas, tamanho

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Esterco bovino 11,83 440,94 I 661,41 1.102,35 47,02

Esterco suíno 14,02 573,00 G 859,50 1.432,50 63,53

Esterco de galinha 20,77 760,50 E 1.140,75 1.901,25 86,96

Esterco de coelho 15,37 515,64 H 773,46 1.289,10 56,36

Farinha de carne e osso 32,76 848,12 D 1.272,18 2.120,30 97,90

Lixo domiciliar 10,08 147,56 L 221,34 368,90 10,34

Torta de filtro 8,96 333,76 J 500,64 834,40 33,62

Lodo de esgoto 11,62 227,36 K 341,04 568,40 20,32

Brachiaria decumbens 51,80 988,68 B 1.483,02 2.471,70 115,49

Amaranthus spinatum 61,60 890,96 C 1.336,44 2.227,40 103,27

Leucena leucocephala 48,44 748,16 E 1.122,24 1.870,40 85,42

Crotalaria juncea 52,36 1.093,40 A 1.640,10 2.733,50 128,58

Vermicomposto 10,22 83,94 M 125,92 209,86 2,39

Casca de café 27,58 467,49 HI 701,23 1.168,72 50,34

Muscilagem+chorume 38,64 662,76 F 994,14 1.656,90 74,75

Esterco bovino + casca café 9,38 133,90 L 200,84 334,74 8,64

Solo (Testemunha) 2,44 64,80 M 97,20 162,00

QUADRO 11 - Taxa máxima (Tmax) de evolução relativa, carbono assimilado, total oxidado absoluto, e total oxidado relativo, durante o período de

incubação de materiais orgânicos com solo em ensaio de respirometria

FONTE: Chacón et al. (2005b).

NOTA: Médias seguidas de pelo menos uma mesma letra na coluna carbono evoluído C-CO2 , não diferem pelo teste Tukey com α = 5%.

(1) Análise de respirometria. (2) Eficiência de assimilação de 60%. (3) C-CO2 + C.

Substratos

(1)Tmax de evolução

relativa de

C-CO2

(mg g-1 d-1)

(1)Carbono evoluído

C-CO2

(mg)

(2)Carbono assimilado

C(mg)

(3)Carbono total

absoluto oxidado

Cox

(mg)

(4)Carbono total

relativo oxidado

C-CO2 ox

(%)

Gráfico 4 - Mineralização de nitrogênio em diferentes materiais em função do tempo deincubação em amostra de solo

FONTE: Chacón et al. (2005a).

diminuto das áreas, ocasionado pelos par-celamentos familiares subseqüentes, res-trições legais ao uso relacionado com áreasde preservação permanente, seja em fun-ção da extensa malha hídrica com inúme-ras nascentes e corpos d’água, seja pelainclinação elevada (FREITAS et al., 2004).Acrescenta-se ainda a esses fatores a ocor-rência de solos bastante intemperizados,predominando os Latossolos Vermelho-Amarelo, com elevada acidez, baixa ferti-lidade natural (KER, 1995) e pronuncia-dos processos de erosão principalmentelaminar. A conjuntura no meio rural mos-tra uma região considerada estagnada ouem decadência que estimula o êxodo rural(FERRARI, 1996).

0

200

400

600

800

1000

1200

1400

1600

1800

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9

Semanas de incubação

NH

4++

NO

3-m

gk

g-1

Brachiaria Amaranthus Crotalaria Leucena Solo

(4) % C-CO2 ox =(C – CO2 total oxidado do solo + material orgânico) – (C – CO2 total oxidado do solo – material orgânico)

C adicionado pelo material orgânico * 100

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70 Cafeicultura familiar

Nessas condições ambientais encontram-se agricultores e agricultoras familiares, combaixa capacidade de investimentos, porémdispostos a encontrar soluções que conci-liem agricultura e preservação ambiental.Tais agricultores são verdadeiros experi-mentadores, pois com organizações sociais,governamentais e não-governamentais, depesquisa e de assistência técnica, desen-volvem práticas piloto em suas proprie-dades, de onde, freqüentemente, se tiramlições. Dentre essas práticas e com o objeti-vo de melhorar a capacidade produtiva dossolos, os sistemas agroflorestais com café(SAFs) foram experimentados em váriosmunicípios da Zona da Mata mineira emdiversos agroecossistemas familiares.

Sistema agroflorestal é aqui conside-rado como uma forma de cultivo múltiplo,onde pelo menos duas espécies de plantasinteragem biologicamente, pelo menos umaespécie é arbórea e pelo menos uma espé-cie é manejada para produção agrícola oupecuária (SOMMARIBA, 1992). As inte-rações entre o solo, as plantas, o ser hu-mano e o ambiente, que ocorrem nessessistemas precisam ser compreendidas e osprocessos biofísico-químicos que nelesocorrem precisam ser aprofundados, paraisso várias pesquisas, que envolvem omanejo dos SAFs e os aspectos metodoló-gicos dessa intervenção foram realizadas.

Estudos durante a fase deimplantação dos SAFs

O planejamento dos desenhos paraatender aos objetivos específicos de cadapropriedade foi realizado por Franco (1995),utilizando a técnica do Diagnóstico e De-senho (D&D) (ICRAF, 1983), uma formade Diagnóstico Rápido Participativo (DRP)adaptado para planejamento de SAFs. Estetrabalho contribuiu para o arranjo e seleçãode espécies arbóreas mais adequadas, con-siderando os fatores como histórico de usodas terras, disponibilidade hídrica, espé-cies arbóreas e arbustivas tradicionais con-sorciadas junto aos cafezais e demanda deaportes externos para a propriedade.

Durante a fase de implantação dos

SAFs, discutia-se também a implantaçãodo Parque Estadual da Serra do Brigadeiro(Pesb). Para isso, Gjorup (1998) fez o levan-tamento de informações geográficas queserviu para o reconhecimento da posiçãogeográfica e a localização dos municípios edas propriedades rurais no entorno do Pesb,o que foi fundamental para as negociaçõesda delimitação da área do parque. Além disso,tais informações subsidiaram a localizaçãodas áreas de experimentação na paisagemenquanto face norte, sul, encosta e baixa-da, pois, seguramente, o comportamento ea localização de SAFs nas propriedades emfunção da exposição solar incidente regu-lam maiores e menores quantidades de indi-víduos arbóreos (LIMA et al., 2002).

Outros estudos também concluíram quehavia a necessidade de suprimento de re-cursos madeireiros nas comunidades loca-lizadas no entorno do Pesb, o que reduzi-ria a pressão sobre as manchas dos frag-mentos florestais da Mata Atlântica aindaexistentes (CASALI, 2001), isso poderia serconseguido através dos SAFs. Esses per-mitem a conciliação da prática da agriculturade forma sustentável concernente aos usospossíveis na zona de amortecimento dasunidades de conservação (UC) definidospela legislação (BRASIL, 2002). Entretanto,há um desconcerto entre as práticas, entreelas e os SAFs, da agricultura sustentáveladotada por pequenos agricultores e agri-cultoras, a legislação ambiental vigente ealguns setores da assistência técnica rural,o que desestimula a utilização de tais prá-ticas. Existem avanços para o uso de SAFsnas zonas de amortecimento das UCs, umavez que vários projetos são submetidos àsinstituições de financiamentos e aprova-dos para implementação. Contudo, níveishierárquicos inferiores dos órgãos com-petentes, que são aqueles que lidam nodia-a-dia do campo, carecem mais de infor-mação e instruções.

Erosão do solo

O levantamento de perdas de solos foirealizado para avaliar a eficiência das prá-ticas agroecológicas, para a conservação

e melhorias do solo. Para tal, foi desenvol-vida uma metodologia simples e de baixocusto, que demonstrou ser possível aliarpesquisas simples com as demandas deestudos no campo da agroecologia, ofere-cendo resultados concretos e de fácil com-preensão para os agricultores. Uma calhacoletora feita de zinco com um saco plásticorecipiente na extremidade foi colocada emáreas com manejo convencional e com SAF.A quantificação de terra perdida por anonos sistemas era avaliada por pesquisado-res e agricultores. Demonstrou-se maiorperda de solo nas áreas de práticas agríco-las convencionais, ou seja, nos SAFs hou-ve menor perda de terra. A quantidade dematéria orgânica e de nutrientes perdidosna terra levada pela erosão, verificados nosresultados de análises do solo, demonstrouque os sistemas convencionais perderammais matéria orgânica e nutrientes, além deapresentarem maior presença de microssul-cos, indicativo de erosão já bastante avan-çada nas áreas das lavouras. Dentre os nu-trientes, mostrou-se, por exemplo, que ofósforo lábil perdido dos SAFs estava namédia 1,6 g/ha/ano, enquanto que no sis-tema convencional foi de 46,5 g/ha/ano(CARVALHO; FERREIRA NETO, 2000).

Inicialmente, a compreensão por partedos agricultores era de que a erosão esta-ria vinculada apenas à física do solo, porémo processo de discussão com as famíliassobre os resultados da pesquisa permitiu acompreensão também dos processos deperda de água e nutrientes, ampliando oentendimento da importância da coberturado solo, reforçando a necessidade de açõese de práticas preventivas a partir dos dadosanalíticos e quantitativos. O aprendizadoadquirido a partir das observações perma-nentes e da abordagem científica, aliada auma linguagem acessível serviu para todaa propriedade, atingindo a família e até osvizinhos (CTA-ZM, 2005).

Matéria orgânicae ciclagem de nutrientes

A matéria orgânica tem uma funçãoessencial na qualidade dos solos e na pro-

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dutividade. Nos sistemas agrícolas familia-res com baixo aporte de insumos, a ação damatéria orgânica no sistema é essencial pa-ra a autonomia e soberania dos agricultorese agricultoras sobre o manejo com vistas àrecuperação dos solos. Sobre ela os agricul-tores podem ter pleno domínio de sua dinâ-mica e aplicação. O incremento de árvorespromove a manutenção do teor de matériaorgânica do solo, a partir da cobertura ve-getal (MENDONÇA et al., 2001).

A cobertura vegetal e o manejo adequa-do dos resíduos das podas, especialmentefolhas e galhos, contribuem para elevar osteores e as quantidades de matéria orgânicado solo, principalmente da matéria orgânicaleve. Esta é responsável pela estabilidadedos agregados do solo, que é responsávelpela resistência à erosão. Essa fração damatéria orgânica serve também de substra-to para os organismos do solo, que favore-cem o seu equilíbrio biológico. Em estudosrealizados foi verificado também o aumentonas diferentes formas de matéria orgânicaresponsáveis pela ciclagem de nutrientes,que permitem o máximo aproveitamentodas espécies no local e promovem, comisso, o seu melhoramento. Ainda comoefeito da alteração da dinâmica da matériaorgânica, houve redução na acidez trocável(quantidade de Al com potencial para sertóxico para as plantas), o que diminui a ne-cessidade de calagem. Com isso, promovem-se melhorias na capacidade do solo em reternutrientes que podem ser absorvidos pelasplantas como o cálcio (Ca), magnésio (Mg),P e N (MENDONÇA et al., 2001). Assim, oaumento do aporte orgânico, aliado à diver-sificação de plantas, está acarretando maio-res teores de bases trocáveis e fósforo dispo-nível, o que melhora a fertilidade do solo.

Está havendo, também, maior equilíbrioentre a taxa de mineralização de C e nu-trientes e a demanda desses pelas plantasconsorciadas (FREITAS, 2000; FIRME,2000). Verificou-se, de forma geral, que osSAFs avaliados acarretam melhorias na qua-lidade do solo (PEREZ et al., 2004). Men-donça e Stott (2003) mediram o índice de C,

de N, de P, de Ca, de Mg, de K, de lignina,de celulose, de hemicelulose e de polifenóissolúveis nos resíduos provenientes daspodas de cinco espécies arbóreas usadasnos SAFs da Zona da Mata. As espéciesestudadas foram Cajanus cajan (legumino-sae, guandu), Solanum variable (Solana-ceae, capoeira-branca), Cassia ferruginea(leguminosae, canafístula), Piptadeniagonoacantha (leguminosae, jacaré), Crotonurucurana (Euphorbiaceae, adrago) eMelinis multiflora (Gramineae, capim).O guandu teve a quantidade mais elevadade P na matéria seca. As plantas estudadasapresentaram altos teores de polifenóis ebaixos teores de P, indicando que são estesos principais fatores de controle da decom-posição dos materiais orgânicos podados,levando a uma baixa taxa de decomposi-ção deles. Devido a estas características,as espécies estudadas apresentam grandepotencial para controlar a erosão e aumen-tar o teor de material orgânico do solo.

As inúmeras espécies vegetais apre-sentam características peculiares e impor-tância específica nos SAFs. A diversi-ficação das espécies permite interaçõescomplexas nos agroecossistemas, que seexpressam nos estratos sob o dossel dasárvores, em função do porte adquirido, dafenologia e do perfil do solo. As árvorespresentes nos sistema agroflorestal aumen-tam a disponibilidade de nutrientes, pormeio da liberação destes, provenientes damatéria orgânica, dos resíduos orgânicosreciclados (MENDONÇA; STOTT, 2003) eda melhoria da atividade biológica dos so-los em profundidade, que intensifica, porexemplo, a ciclagem de P. Os SAFs mantêmfrações maiores de P disponíveis às cultu-ras agrícolas e influenciam a dinâmica de P,com a conversão da parte do Pi (fósforoinorgânico) no Po (fósforo orgânico), que éprovavelmente conseqüência de uma maioratividade biológica no solo (CARDOSO,2002; CARDOSO et al., 2003). Contudo, osmateriais podados das espécies citadasno parágrafo anterior apresentaram baixoteor de nutrientes não atendendo à deman-

da do café, quando utilizados sozinhos(MENDONÇA; STOTT, 2003).

Para melhoria dos solos, objetivo ini-cial de quase todas as experiências realiza-das com SAFs na Zona da Mata mineira,verificou-se que ela ocorre em função domanejo específico e da dedicação de cadaagricultor para com a terra e a propriedade.É consenso que o solo fraco não possuicondições de manter uma produção semadubação e necessita de correção inicialcom calcário. Entretanto, o uso de legumi-nosas contribuiu para reduzir os efeitos daacidez nos solos. Já se reconhece, porém,que as espécies espontâneas, indicadorasda melhoria do ambiente, também cumpremesse papel. A utilização e o manejo conjuntode espécies herbáceas espontâneas (tra-poeraba, picão, amargosinho) e legumino-sas introduzidas contribuem para a reduçãonos custos de mão-de-obra, por aproveitara capacidade das espontâneas em desem-penhar funções semelhantes às espéciesleguminosas, mas sem o trabalho de plan-tio, coleta de sementes, etc. Quanto às árvo-res, com o manejo adequado em tempo eperíodo satisfatórios, sua eficácia manifesta-se de forma diferenciada: no curto prazo,para a proteção dos solos, e a médio e longoprazos, para a melhoria da estrutura do soloe a ciclagem de nutrientes. Isto permite queo solo seja recuperado em profundidade eextensão, abrindo novas áreas para produ-ção nas propriedades familiares (ALTIERI,2002).

Manejo agroecológico

Os experimentadores destacaram oaumento de água e o reaparecimento denascentes após as mudanças no manejoda propriedade a partir dos SAFs (CTA-ZM, 2005). Além da importância que a águapor si só contém, na Zona da Mata ocor-re uma extensa malha hídrica, onde nas-cem dois rios importantes: o Doce e o Paraí-ba do Sul. O fato de os SAFs contribuí-rem para a proteção dos corpos d’água enascentes corrobora sua viabilidade parapequenas propriedades familiares nesta

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72 Cafeicultura familiar

região tão privilegiada em termos hidro-lógicos. O manejo agroecológico em escalaregional tende a devolver a qualidade na-tural das águas com a eliminação do usode fertilizantes e agrotóxicos e a reduçãodo assoreamento dos rios.

Na última fase da experimentação, oimpacto na biodiversidade a partir das áreasdos SAFs não foi quantificado, mas foiacompanhado por um conjunto de famíliasde agricultores e agricultoras, e podem-seregistrar: redução no ataque de pragas ede doenças no café, possivelmente pelaexistência em maior número de inimigosnaturais; melhorias visíveis esteticamenteno estado nutricional das plantas; aumentode lesmas e minhocas refletindo a condiçãode umidade e porosidade do solo; aumen-to no número de lagartos, de variedade deespécies herbáceas, arbustivas, arbóreas(madeireiras e frutíferas); aumento em quan-tidade e diversidade de pássaros e pre-sença eventual de animais de pequeno emédio porte (mão-pelada, jaguatirica, ma-cacos, cobras, tatu, etc.).

É importante também o papel da bio-diversidade na reestruturação da paisagem,imprescindível para uma região, onde, atual-mente, se localizam vários fragmentos deremanescentes isolados de Mata Atlântica,mas ainda com possibilidades de conexão.São reconhecidos dois tipos de componen-tes essenciais da biodiversidade que sepodem expressar nestas situações: a biodi-versidade planejada traduzida pela con-formação dos desenhos, formas de mane-jo, tipos de cultivos, objetivos e a bio-diversidade associada que incorpora osbenefícios indiretos decorrentes das asso-ciações estabelecidas entre os integrantesdos sistemas no ambiente (VANDERMEER;PERFECTO, 1995).

Monitoramento: instrumentalpara análise e ações

As mudanças ocorridas com a experi-mentação dos SAFs foram acompanhadase analisadas com a realização do monitora-mento participativo (GUIJT, 1999). Os obje-

tivos iniciais da experimentação forammelhorar a terra, diversificar a produção,diminuir custos (mão-de-obra/insumos),aumentar e manter a produção, melhorar aqualidade da produção (CARDOSO et al.,2001). O monitoramento participativo obje-tivou levantar os dados de forma qualitativae quantitativa para subsidiar as tomadasde decisões. Esse processo gerou reflexãosobre os objetivos propostos inicialmentepara os SAFs. Identificou-se, por exemplo,que, embora houvesse melhoria na conser-vação e na recuperação dos solos, a pro-dução continuava baixa.

Tais resultados geraram dúvidas quan-to à viabilidade dos SAFs para a região,mas o processo participativo, onde houvesempre a preocupação com os aspectosmetodológicos a serem utilizados, refle-tindo na construção coletiva do conheci-mento e na apropriação das informaçõespelos agricultores, garantiu espaços demo-cráticos para reflexão, troca de informaçõese tomada de decisões com transparência.Assim, tendo em vista os objetivos propos-tos de cada desenho inicial dos experimen-tos, os agricultores avaliaram as necessi-dades de modificar novamente a forma decondução e o manejo dos SAFs, partirampara a diversificação que atendia a outrosobjetivos que não somente os aspectosda qualidade do solo, mas a soberania e asegurança alimentar das famílias.

Um monitoramento da sustentabili-dade econômica nos sistemas familiares(FERRARI, 2002) foi também realizado.Considerou-se o tipo de manejo adotadoem quatro propriedades familiares: duaspropriedades mais agroecológicas (manejoe cobertura do solo, SAFs, diversificação,resgate, conservação e uso de variedadeslocais, recuperação de nascentes, dentreoutras) e duas mais convencionais (utiliza-ção intensiva de insumos químicos, mono-cultura, capina, uso de agrotóxicos, dentreoutras). Verificou-se a importância de siste-mas mais diversificados de uso do solo (po-licultivos) para as pequenas propriedades.Justamente nas áreas mais diversificadas,

a recuperação da fertilidade e a estruturados solos são mais viáveis. Em termos com-parativos entre propriedades monitoradas,aquelas agroecológicas tiveram melhor de-sempenho em todas as variáveis conside-radas para avaliação: flexibilidade, produ-tividade, autonomia, eqüidade e resiliência.Entretanto, variáveis econômicas clássicascomo valor, renda e lucro foram limitadaspara expressar a contingência de relaçõese benefícios dos sistemas familiares. Nessecaso, carecem de aprofundamento os servi-ços ambientais advindos das práticas agro-ecológicas. Para Ferrari e Almeida (2005), opensamento econômico atual mostra-seincapaz de considerar a dimensão econô-mica inserida no contexto dos ecossiste-mas, através dos seus limites naturais, dacapacidade de suporte e de equilíbrio eco-lógico.

As informações e dados de pesquisastendem a subsidiar políticas públicas dire-cionadas para o campo, onde ainda há umvácuo de informação específica e coerente,principalmente no que se refere às ques-tões legais. As leis ambientais têm criadoobstáculos para o avanço da adoção depráticas para a recomposição da paisagematravés do aumento da cobertura vegetal,utilizando espécies arbóreas. O confrontocom a legislação acontece quando os SAFsestão estabelecidos e as árvores necessi-tam de corte, seja para uso doméstico, sejapara cobertura, seja para incorporação dematéria orgânica ao solo. É preciso suscitaro debate e promover alterações ou adequa-ções legais regionais mais pertinentes.Quando configurado o manejo de SAF emárea de proteção permanente (APP), a pos-tura dos órgãos ambientais tem sido puni-tiva e restritiva, e deveria ser mais instrutivae informativa. A permanecer tais conflitos atendência é que se mantenha a insegurança,beirando a rejeição por parte dos agricul-tores, em introduzir espécies arbóreas nassuas propriedades. O prejuízo recai sobretoda a sociedade pela dificuldade de avançarem medidas exeqüíveis adaptadas para areal conservação e recuperação ambiental.

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Recomendaçõespara pesquisas com SAFs

As lições aprendidas apontadas pelasistematização das experiências com SAFsem relação às parcerias e pesquisas mos-tram que são necessárias pesquisas queaprofundem os mecanismos de ciclagem denutrientes, indicadores da qualidade do so-lo (biológicos, por exemplo), quantificaçãoe valoração dos serviços ambientais a partirde análises econômicas dos serviços pres-tados pelos pequenos sistemas familiares.Para isso, é preciso uma melhor adaptaçãode metodologias científicas e técnicas, queassegurem relevância, mesmo quando seperde em precisão, dos resultados em nívellocal e a construção de parcerias e aliançasmais coerentes e permanentes durante todoo processo de intervenções institucionaisno campo. Da mesma forma existe a neces-sidade do acompanhamento e do envolvi-mento sistemático dos agricultores em todoo desenvolvimento das pesquisas, não sóna fase de campo. A pergunta geradora dapesquisa deve ser compreendida e aliadaàs demandas mais emergentes, com totalcompreensão das partes. É preciso pes-quisar, identificar e entender melhor quaisnutrientes são chave e estão faltando nasculturas (CTA-ZM, 2005). Retornar os re-sultados aos agricultores e difundi-los aopúblico interessado são formas de avançarna adoção em larga escala das inovaçõesagroecológicas (ALTIERI, 2002).

Os agricultores são cientistas natos ehá uma fonte de informações em suas pro-priedades, especificamente em relação aosSAFs, há exemplos de manejo bem conso-lidado, que se caracterizam como verda-deiros “faros agroecológicos” (ALTIERI;NICHOLLS, 2005). Esses sistemas sãoimportantes para compreender quais sãoas interações e os sinergismos ecológicosque explicam o porquê do bom funciona-mento do sistema, que se expressam a partirdo retorno obtido, da satisfação, quandose alcança o equilíbrio e a harmonia dossistemas. A partir da evolução das práticasadotadas tornam-se referências para novasdescobertas e aprofundamento das ques-

tões agroecológicas. Portanto, a partir dosproblemas por eles vivenciados ocorre oestabelecimento constante de suas pró-prias hipóteses e partem, ao seu modo, paratestá-las, num ambiente altamente com-plexo de reações e respostas.

Tradicionalmente, os estudos, levanta-mentos e pesquisas analisam fenômenosem condições circunstanciais. A neces-sidade de aprofundar-se nos processos-chave, dentro dos agroecossistemas, devecontar com a participação das famíliasagricultoras que detêm um acúmulo valiosoe indiscutível de observações que perpas-sam gênero e gerações. A incorporação dosdiferentes saberes é condição sine qua nonpara desvendar as intrínsecas relações nossistemas agroecológicos. Através de meto-dologias e pesquisas participativas, é pos-sível encontrar soluções coletivas e apon-tar diretrizes sobre bases mais sustentáveispara a agricultura familiar brasileira.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Zona da Mata de Minas Gerais é cons-tituída em sua maioria por agricultores fami-liares, que enfrentam a limitação impostapelas condições de relevo, a baixa fertili-dade natural dos solos e a falta de recursospara adoção de tecnologias avançadas deprodução. Diante desta complexidade, ossistemas de produção agroecológicos eorgânicos têm sido apontados como alter-nativas, tanto para garantir a diversidadede produção como para agregar valor aoproduto. Pesquisas voltadas para a reali-dade da região e desenvolvidas de formaparticipativa, onde os agricultores, pesqui-sadores e técnicos atuem em conjunto,contribuirão de forma significativa para osavanços na produção e na qualidade devida dos agricultores.

REFERÊNCIAS

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______; NICHOLLS, C. I. Sistema agroecologicorápido de evaluación de calidad de suelo y salud de

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1Enga Agra, Ph.D., Pesq. EPAMIG-CTZM, Vila Gianetti, 46, Caixa Postal 176, CEP 36570-000 Viçosa - MG. Correio eletrônico: [email protected] Agro, Mestrando, UFV - Depto Biologia Animal, CEP 36570-000 Viçosa - MG. Correio eletrônico: [email protected] Agro, D.Sc., Pesq. EPAMIG-CTZM, Vila Gianetti, 46, Caixa Postal 176, CEP 36570-000 Viçosa - MG. Correio eletrônico: [email protected] Agro, Ph.D., Prof. UFV - Depto Biologia Animal, CEP 36570-000 Viçosa - MG. Correio eletrônico: [email protected]

Tecnologias alternativaspara o controle de pragas do cafeeiro

Madelaine Venzon1

Edmar de Souza Tuelher2

Antônio de Pádua Alvarenga3

Angelo Pallini4

INTRODUÇÃO

Um dos desafios da cafeicultura é ma-nejar adequadamente o surto populacionalde pragas, o qual ataca a cultura. Depen-dendo da severidade do ataque, o cultivopode ser inviabilizado, quando medidas decontrole não são empregadas. Ataques dobicho-mineiro do cafeeiro, Leucopteracoffeella (Guérin-Mèneville) (Lepidoptera:Lyonetiidae), uma das principais pragas dacultura, podem causar prejuízos de até 42%na produção, quando comparado com aprodução de plantas tratadas com inseti-cidas (REIS; SOUZA, 1996). Outra praga-chave, a broca-do-café, Hypothenemushampei (Ferrari) (Coleoptera: Scolytidae),pode causar além de prejuízos quantita-

tivos, como a perda de peso dos grãos equeda de frutos, redução na qualidade, atra-vés da alteração no tipo e na bebida docafé. Cerca de 20% a 22% de perdas queocorrem no beneficiamento são devidas àfragilidade que o grão atacado pela brocapassa a apresentar (LUCAS et al., 1989).

Além das pragas citadas, o ácaro-vermelho, Oligonychus ilicis (McGregor)(Acari: Tetranychidae) e o ácaro-plano,Brevipalpus phoenicis (Geijskes) (Acari:Tenuipalpidae), vetor da mancha-anular docafeeiro, têm causado prejuízos em váriasregiões produtoras de Minas Gerais (REIS;CHAGAS, 2001; REIS et al., 2002). As cigar-ras que atacam as raízes do cafeeiro, princi-palmente dos gêneros Quesada, Fidicina

e Carineta, também podem causar pre-juízos consideráveis na produção e, emataques severos, a perda total da lavoura(SOUZA et al., 1983).

Nos sistemas convencionais de produ-ção de café, o controle de pragas baseia-sena aplicação de pesticidas, no entanto,apesar da facilidade de uso e do efeito rápi-do, muitos produtos atualmente utilizadossão altamente tóxicos e alguns possuemproblemas sérios de resistência (REIS;SOUZA, 1996; FRAGOSO et al., 2002).Alternativas menos tóxicas, que causemmenor impacto ambiental e que sejam efi-cientes para o controle de pragas, são bus-cadas pelos produtores, especialmente pe-los agricultores familiares e por produtores

Resumo – Apresentam-se estratégias de controle alternativo de pragas do cafeeiro combase no manejo dos recursos naturais e na utilização de insumos de baixo custo e quepossam ser produzidos na propriedade. O controle cultural e físico e a utilização deprodutos alternativos ao uso exclusivo de agrotóxicos, como a calda sulfocálcica, a caldaviçosa, os biofertilizantes e o extrato de nim são práticas que podem ser utilizadas paramanter as populações das pragas em níveis economicamente aceitáveis. A manutençãodos inimigos naturais por meio do controle biológico conservativo e da utilização dosprodutos alternativos em dosagens e formulações seletivas aos inimigos naturais sãopráticas que devem ser preconizadas para o manejo de pragas na agricultura familiar eorgânica.

Palavras-chave: Café. Cafeicultura familiar. Diversificação da vegetação. Caldasulfocálcica. Calda viçosa. Biofertilizante. Nim. Predadores. Praga.

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de café, cujo sistema de produção não per-mite a utilização de agrotóxicos, como oorgânico.

A maioria das práticas utilizadas na ca-feicultura familiar privilegia a utilização deinsumos produzidos na propriedade e omanejo estratégico dos recursos naturais,visando à sustentabilidade do sistema e àconseqüente diminuição dos custos deprodução. O desafio, no contexto de ma-nejo de pragas, é o desenvolvimento depráticas que atendam esses requisitos e quemantenham eficientemente as pragas abai-xo do nível de dano econômico. Neste arti-go serão abordadas estratégias alternativasao uso exclusivo de agrotóxicos para con-trole de pragas do cafeeiro. As estratégiasapresentadas são especialmente recomen-dadas para a utilização na agricultura fa-miliar, pela simplicidade de uso e pelo custoreduzido, e na cafeicultura orgânica, poissão aceitas pela maioria das certificadoras.

ESTRATÉGIAS ALTERNATIVASPARA O MANEJO DE PRAGASNA CAFEICULTURA

Diversificação da vegetação

A diversificação dos agroecossiste-mas tende a reduzir o ataque de pragas(ANDOW, 1991; ALTIERI, 1994; BARBO-SA, 1998). Estas, geralmente, têm maior difi-culdade em localizar e colonizar seus hospe-deiros em sistemas diversificados, devidoaos estímulos olfativos e visuais associa-dos às diversas plantas não-hospedeiras.Já, os inimigos naturais são favorecidosnos sistemas diversificados, devido à maiordisponibilidade de recursos (ex: pólen, néc-tar, presas alternativas, microclima e refú-gio). No entanto, o aumento da diversida-de por si não significa, necessariamente,redução populacional de herbívoros, poisem alguns casos, os herbívoros tambémpodem-se beneficiar dos recursos forneci-dos pelas plantas associadas. É necessá-rio, portanto, o aumento estratégico davegetação para que ocorra o incrementoda população de inimigos naturais e a con-seqüente redução da população de herbí-voros.

Em experimentos realizados em Helio-dora, no Sul de Minas Gerais, verificou-seque em sistema de café orgânico diversifi-cado com leguminosas houve uma relaçãopositiva entre o aumento da diversidadedas plantas e a porcentagem de minas dobicho-mineiro predadas por vespas. A inci-dência de minas predadas foi maior, quan-do o cafeeiro foi associado ao guandu, aoamendoim-forrageiro, à crotalária e ao esti-lozantes, cultivados simultaneamente nasentrelinhas do cafeeiro (AMARAL et al.,2004).

Outras estratégias que estão sendo de-senvolvidas pela pesquisa incluem a sele-ção de plantas que forneçam seletivamentealimento suplementar aos inimigos natu-rais. Venzon et al. (2004) verificaram que oguandu [Cajanus cajan (L.) Millsp.] e a cro-talária [Crotalaria juncea (L.)] produzempólen de qualidade nutricional suficientepara promover o crescimento populacionaldo inseto-predador Chrysoperla externa(Hagen) (Neuroptera: Chrysopidae) e doácaro-predador Iphiseiodes zuluagai, doisinimigos naturais de ocorrência freqüenteem agroecossistemas cafeeiros (Fig. 1 e 2).

No entanto, o sucesso reprodutivo dessespredadores foi incrementado, quando umafonte de carboidrato foi adicionada ao pólen.Em experimentos recentes, verificou-se quena presença de flores de trigo-mourisco[Fagopyrum esculentum (Moench)], osadultos de C. externa tiveram sua longe-vidade aumentada (VENZON et al., 2005a).Apesar de o bicho-mineiro também acessaras flores do trigo-mourisco, a alimentaçãocom o néctar não influenciou na fecundi-dade da praga. Possivelmente, a associação

Figura 1 - Adulto do predador Chrysoperla externa

Figura 2 - Ácaro-predador Iphiseiodeszuluagai

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de plantas fornecedoras de pólen e de néc-tar para a diversificação do cafezal repre-sentará um incremento na população deinimigos naturais (VENZON et al., 2005a).

A implantação de quebra-ventos tam-bém é uma técnica que adiciona diversida-de ao sistema. Algumas plantas podemser utilizadas para essa finalidade como oabacateiro, a seringueira, a macadâmia, abananeira, entre outras (REIS et al., 2002).No entanto, deve-se evitar a diversificaçãodos sistemas com plantas que sejam hos-pedeiras das mesmas pragas do cafeeiro,em regiões onde há registro de ocorrênciade pragas, como por exemplo, a grevílea,que hospeda as cigarras. A conservaçãode mata nativa próxima a áreas de cultivocontribui para a conservação e aumentodas vespas-predadoras que nidificam nes-sa vegetação (GRAVENA, 1992; REIS et al.,2002).

PRODUTOS ALTERNATIVOS

Calda sulfocálcica

Esta calda é obtida pelo tratamento tér-mico do enxofre e da cal. Tradicionalmen-te, tem sido utilizada como fungicida e pa-ra o controle de cochonilhas e de ácarosem algumas fruteiras (GUERRA, 1985;PENTEADO, 2000). O efeito tóxico da caldasulfocálcica aos insetos e ácaros é devidoà liberação de gás sulfídrico (H2S) e enxofrecoloidal, quando aplicada sobre as plan-tas (ABBOT, 1945; POLITO, 2001). Segun-do Prates (2005), as vantagens do uso dacalda sulfocálcica no controle de pragassão:

a) custo reduzido para a aquisição euso;

b) baixa a inócua agressividade ao ho-mem e à natureza;

c) efeito nutricional do cálcio e do enxo-fre;

d) simplicidade quanto ao manejo e àaplicação.

No cafeeiro, a calda sulfocálcica tempotencial de uso para o controle de ácarose do bicho-mineiro. Resultados de experi-mentos conduzidos no Centro Tecnológicoda Zona da Mata (CTZM), da EPAMIG de-monstraram que em plantas de café tratadascom calda sulfocálcica, na concentração de3,4%, houve redução de 96% na oviposiçãodo bicho-mineiro (AMARAL et al., 2003b).Além desse efeito, a calda possui efeito re-sidual sobre ovos do bicho-mineiro, sendoque a concentração de 1,5% de uma caldade 30º Baumê foi capaz de causar alta mor-talidade e baixa eclosão de larvas5 . Comrelação ao efeito acaricida, a concentraçãode 0,35% foi capaz de causar mortalidadeem 95% da população do ácaro-vermelhoO.ilicis (Fig. 3) (TUELHER et al., 2005b).

Um dos inconvenientes relatados paraa calda sulfocálcica é a falta de seletividadea alguns inimigos naturais. Em pesquisasrecentes, no entanto, verificou-se que autilização de concentrações menores doproduto (< 2,5%), além de ser eficiente pa-ra o controle do ácaro-vermelho e de ovosdo bicho-mineiro, é pouco tóxica a doisácaros-predadores de ocorrência freqüen-te em agroecossistema cafeeiro, I. zuluagaie Amblyseius herbicolus (Chant) (Acari:Phytoseiidae) (Fig. 4). A toxicidade diferen-cial, obtida através do quociente entre aConcentração letal (CL50) para os ácaros-predadores e a CL50 para O. ilicis, foi 6,60 e

3,98 vezes para I. zuluagai e A. herbicolus,respectivamente, demonstrando que osácaros-predadores foram mais tolerantesà exposição à calda sulfocálcica do que oácaro-vermelho (Gráfico 1) (TUELHER etal., 2005b). Para outro predador, C. externa,houve aumento da duração do primeiroinstar na concentração de 1%, mas esta eoutras concentrações inferiores testadasnão refletiram em efeito significativo sobreas outras fases de desenvolvimento doinimigo natural. Somente concentraçõesacima de 2,5% afetaram o desenvolvimentodo predador, não havendo ecdises larvaisno primeiro e segundo instar (TUELHER etal., 2005a). As concentrações altas da caldasulfocálcica, além de não serem seletivas aalguns inimigos naturais, podem tambémcausar fitotoxicidade. Portanto, devem serutilizadas concentrações inferiores a 2,5%,as quais são eficientes para o controle daspragas.

Para o preparo de 100 L de calda sulfo-cálcica são necessários 25 kg de enxofreventilado, 12,5 kg de cal virgem e 100 L deágua (Fig. 5). A calda ideal possui densi-dade de 32º Baumê, mas densidades de 29ºou 30º Baumê são consideradas boas. Naimpossibilidade de adquirir a cal virgem,pode-se utilizar a cal hidratada, no entan-to, deve-se aumentar a quantidade de calhidratada a ser adicionada para a prepa-ração da calda sulfocálcica. A utilização da

Figura 3 - Ácaro-vermelho do cafeeiroOligonychus ilicis

Figura 4 - Ácaro-predador Amblyseiusherbicolus

5Informação concedida por E.S. Tuelher e R.S.T. Tinoco, da Universidade Federal de Viçosa e M. Venzon da EPAMIG-CTZM, em agosto de 2005.

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mesma quantidade de cal hidratada indi-cada para a cal virgem resultará em umacalda de baixa densidade, e, portanto, commenor quantidade de polissulfetos emsuspensão.

Outro fator que influencia na qualidadeda calda a ser produzida é a pureza da calhidratada. Deve-se procurar utilizar calesde alta pureza e, preferencialmente, aquelasoriginárias de rochas calcíticas. Estas apre-sentarão alto teor de hidróxido de cálcio[Ca(OH)2], necessário à formação dos polis-sulfetos de cálcio que estarão presentesna calda final. Como exemplo, o preparo dacalda sulfocálcica realizado na EPAMIG-CTZM, com a utilização de cal hidratadaobtida no comércio local e com as mesmasdoses indicadas para a cal virgem, resulta-ram em densidades máximas de 18º Baumê.Essas baixas densidades provavelmenteestão relacionadas com a baixa qualidadeda cal, quanto à presença de muitas impu-rezas e à menor quantidade de hidróxidode cálcio adicionada, se comparada à calvirgem.

Segundo Prates (2005) e Penteado (2000)algumas recomendações importantes parao uso da calda sulfocálcica são:

a) a faixa de temperatura deve ser 18ºCa 30ºC; temperaturas muito baixasprejudicam a ação fumigante e, muitoaltas, podem acarretar injúrias nostecidos mais sensíveis da planta;

b) a ocorrência de chuvas até 4 horasapós a aplicação da calda altera asua eficácia, pois aumenta a quanti-dade de água, interferindo na reaçãodesejada;

c) não misturar a calda com produtosque não tolerem meio alcalino, nãomisturar com óleo mineral ou vegetal,com sais micronutrientes ou fertili-zantes foliares e respeitar o intervalode 15 dias para aplicações subse-qüentes com outros produtos;

d) antes da aplicação, a calda deve serbem agitada, mantendo-se boa agi-tação no tanque do pulverizador tam-bém durante a sua aplicação;

Gráfico 1 - Toxicidade da calda sulfocálcica a Oligonychus ilicis e aos ácaros-predadoresIphiseiodes zuluagai e Amblyseius herbicolus

NOTA: Observar as concentrações letais médias para cada espécie.

Figura 5 - Resumo do processo de fabricação da calda sulfocálcicaFONTE: Penteado (2000).

Misturar o enxofre com um pouco de água quente

formando uma pasta

Colocar 80 litros de água quente e aquecer.

Quando atingir 50º C, adicionar a cal

Mexer durante uma hora após o início da fervura,

sempre completando com água fria

até o nível de 100 litros

Quando a coloração da calda ficar pardo-avermelhada,

retirar do fogo e deixar descansar

Coar em pano de algodão, diluir e aplicar

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e) não pulverizar com floradas abertase durante as horas mais quentes dodia, principalmente no verão;

f) armazenar a calda em embalagem devidro ou plástico, bem vedados;

g) antes da utilização da calda, o equi-pamento de pulverização deverá serprotegido com óleo diesel ou simi-lar;

h) após diluir o produto no tanque depulverização, deve-se aplicá-lo nomesmo dia;

i) após o uso, lavar o pulverizador comsolução de ácido cítrico anidro a 20%,ou solução de vinagre ou limão a 10%.

Calda viçosa

A calda viçosa consiste na mistura desulfato de cobre e cal (calda bordalesa) emicronutrientes (CRUZ FILHO; CHAVES,1985). Foi desenvolvida inicialmente parao controle da ferrugem-do-cafeeiro, mastem sido utilizada para o controle de outrasdoenças e para complementar a nutriçãodas plantas. Seu uso sistemático tem si-do associado à redução da população dobicho-mineiro (CRUZ FILHO; CHAVES,1985), embora haja controvérsias (HERRE-RA, 1994).

Resultados de experimentos conduzi-dos na EPAMIG-CTZM demonstraram queem plantas de café tratadas com calda viço-sa, houve redução de 76% na oviposiçãodo bicho-mineiro (AMARAL et al., 2003b).É possível que a camada depositada sobreas folhas após a pulverização das plantastenha agido como uma barreira física ouquímica tornando-as menos atrativas aobicho-mineiro. Para o ácaro-vermelho, a cal-da viçosa apresentou efeito ovicida, e ape-nas 17% dos ovos eclodiram após serem tra-tados, sendo que na testemunha a eclosãofoi de 94% (AMARAL et al., 2003a). Comrelação ao aumento de resistência de plan-tas tratadas com calda viçosa, proposto co-mo um dos mecanismos responsáveis pelaredução do ataque do bicho-mineiro, estãosendo conduzidos estudos pela EPAMIG-CTZM, para verificar tal hipótese.

Na Figura 6, estão apresentadas as eta-pas para a preparação da calda viçosa,propostas por Penteado (2000), adaptadasde Cruz Filho e Chaves (1985). Os ingre-dientes para 100 L de calda são:

a) 500 g de sulfato de cobre (25% de Cu);

b) 300 g de sulfato de zinco (21,9 % de Zn);

c) 200 g de sulfato de magnésio (16% a17% de MgO);

d) 100 g de ácido bórico (17,5% de B);

e) 400 g de sulfato de potássio (50 % deK2O);

f) 500 g de cal hidratada (88% de CaO).

O ideal é que a mistura apresente umacor azul-celeste ao final da preparação. Sea solução estiver muito esbranquiçada ésinal de que tem muita cal e o pH ficarámuito alto; se a solução estiver muito esver-

deada é sinal de que há excesso de sulfatode cobre e o pH está muito baixo. Os reci-pientes para o preparo devem ser de plás-tico ou similar, nunca de cobre, alumínioou ferro (CRUZ FILHO; CHAVES, 1985).

Biofertilizantes

Um dos biofertilizantes mais difundi-dos e utilizados em adubação foliar noBrasil é o supermagro, que foi desenvolvi-do por Magro (1994), no Centro de Agricul-tura Ecológica Ipê, Rio Grande do Sul. O su-permagro caracteriza-se pela fermentaçãoanaeróbica do esterco bovino com a adi-ção de micronutrientes durante o processo(SILVA; CARVALHO, 2000). No entanto,apesar do uso difundido do produto, exis-tem poucos resultados científicos que com-provam a eficiência do supermagro em con-trolar pragas do cafeeiro.

Figura 6 - Resumo do processo de preparação da calda viçosaFONTE: Penteado (2000).

Dissolver os sulfatos e o ácido bórico em um recipiente

com 50 litros de água

Dissolver a cal em outro recipiente com 50 litros de água

Despejar o conteúdo do primeiro recipiente

dentro do recipiente que contém a cal

Agitar a mistura fortemente para obter a calda,

cuja cor ideal é azul celeste

Aplicar a calda no mesmo dia do preparo

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Em experimento realizado em casa de ve-getação, plantas de café tratadas com super-magro inibiram a oviposição do bicho-mineiro,e somente 17% dos ovos foram deposita-dos nessas plantas e 83% em plantas tra-tadas com água (AMARAL et al., 2003b).No entanto, nenhum efeito tóxico residualfoi observado para essa praga (AMARALet al., 2003b); para o ácaro-vermelho foiobservado somente redução na porcenta-gem de eclosão dos ovos tratados com super-magro (VENZON et al., 2004). Não obstanteà falta de efeito tóxico, há relatos da dimi-nuição da população de pragas em outrasculturas tratadas com biofertilizantes, pos-sivelmente, devido à melhoria do estadonutricional das plantas (NUNES; LEAL,2001). Portanto, há ainda a possibilidadede o biofertilizante afetar negativamente apopulação das pragas do cafeeiro via resis-tência induzida pela nutrição da planta.

Nim

Azadirachta indica A. Juss. (Meliaceae),conhecida por nim, é uma planta origináriada Índia. Possui em suas sementes, e emmenor escala na casca e nas folhas, a aza-diractina, um limonóide solúvel em água eálcool, responsável pelos efeitos tóxicos so-bre os insetos (MORDUE; NISBET, 2000).Os inseticidas naturais de nim são biodegra-dáveis, portanto não deixam resíduos tóxi-cos nem contaminam o ambiente; possuemação repelente, anti-alimentar, reguladora decrescimento e inseticida, além de acaricida,fungicida e nematicida (MARTINEZ, 2002).

A aplicação do extrato de semente denim (10 g/L de azadiractina) em plantas decafé não teve efeito repelente sobre a ovipo-sição do bicho-mineiro; no entanto, quan-do os ovos foram tratados com concentra-ções de 0,025 a 0,1 g/L de azadiractina, asminas não evoluíram e não houve formaçãode pupas (VENZON et al., 2005b). Quandoo extrato foi aplicado sobre folhas com mi-nas em estádio inicial, houve paralisaçãodo desenvolvimento do bicho-mineiro, emtodas as concentrações testadas, indican-do que o produto teve ação translaminar.Martinez e Meneguim (2003) verificaram

que em plantas de café tratadas com óleode nim em concentrações que variaram de0,125% a 2,5% foi observada redução napostura e na sobrevivência de ovos dobicho-mineiro. As diferenças observadasnesses trabalhos podem ter sido, devido adiferenças no produto utilizado e na metodo-logia empregada. No entanto, plantas tra-tadas com nim provavelmente terão baixainfestação do bicho-mineiro, quer seja pelarepelência, quer seja pelo efeito negativodo nim no desenvolvimento das pragas.Para o ácaro-vermelho, a aplicação do extratode semente de nim em doses superiores a0,065 g/L de azadiractina causou declínio nastaxas de crescimento populacional do ácaroem experimentos de laboratório (VENZONet al., 2005b). Com relação à broca-do-café,Depieri et al. (2003) verificaram reduçãosignificativa da quantidade de frutos bro-queados, quando estes foram tratados comemulsão de óleo de nim e com extratos aquo-sos da semente e das folhas de nim, emrelação aos frutos tratados com água.

De maneira geral, os inimigos naturaissão menos suscetíveis ao nim, devido ao seucomportamento e fisiologia (MARTINEZ,2002). A seletividade do nim está relaciona-

da também com a dose e a formulação empre-gada. Para o ácaro predador I. zuluagai, osextratos de folha e de semente foram poucotóxicos, já o extrato de óleo da torta de nimfoi altamente tóxico (MOURÃO et al., 2004).O óleo de nim (0,5% de azadiractina) foi sele-tivo ao predador Cycloneda sanguinea (L.)(Coleoptera: Coccinellidae), exceto na máximadosagem (5 mL/L) testada, quando apresen-tou toxicidade média às larvas do predador(SILVA; MARTINEZ, 2004). Em agroecossis-temas, onde o fungo Beauveria bassianaexerce papel importante em epizootias dabroca-do-café, ou quando o fungo é aplica-do de forma inundativa, deve-se utilizarpreferencialmente o extrato de sementes denim e não o óleo, pois este pode ser tóxicoao fungo (DEPIERI et al. 2005).

É importante salientar que ao utilizarprodutos à base de nim devem ser verifi-cadas a concentração de azadiractina, a pu-reza do produto e adquirir os subprodu-tos do nim de fabricantes idôneos, para seter sucesso na utilização desse inseticida(CIOCIOLA JUNIOR; MARTINEZ, 2002).A solubilidade da azadiractina em água per-mite que os extratos possam ser produzidosde forma simples e de baixo custo (Fig. 7).

Figura 7 - Resumo do processo de preparação do extrato de nimFONTE: Martinez (2002).

Triturar 30-40 g de sementes secas de nim

em um litro de água

Deixar a mistura descansar por 12 horas

Filtrar o líquido

Pulverizar sobre as plantas infestadas

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NeemAzal-T/S Quinabra

www.quinabra.com.br

(12) 3925-0400

OrganicNeem Dalquim

www.daquim.com.br

0800-474848

Natuneem Natural Rural

www.naturalrural.com.br

(16) 3335-4277/8124/7037

Bioneem Bioneem

www.bioneem.com.br

(33) 3733-2082

Neem Agronem Agrícola

www.neemdotriangulo.com.br

Neemseto Cruangi Neem do Brasil

[email protected]

(81) 3603 5077

QUADRO 1 - Alguns extratos e óleos de nim comercializados no Brasil

Empresa/EndereçoProduto comercial

O óleo emulsionável é retirado das semen-tes, que têm 40% de óleo, descascadas eprensadas; de cada 4 kg de sementes têm-se 0,5 L de óleo inseticida, com 0,1% deazadiractina. O produtor que tiver dificul-dade em adquirir as sementes e/ou folhasdo nim tem a alternativa de adquirir no mer-cado o produto industrializado (Quadro 1).Alguns cuidados para a utilização de sub-produtos do nim no controle de pragassão:

a) evitar a aplicação nas horas maisquentes do dia;

b) não misturar com produtos alcali-nos, ácidos ou cúpricos;

c) usar água com pH neutro;

d) manter o produto em local fresco eao abrigo da luz.

CONTROLE MICROBIANO

O fungo B. bassiana ocorre naturalmen-te e é um dos principais agentes de controle

biológico natural da broca-do-café (ROSAet al., 2000). No entanto, de acordo comNeves et al. (2005), na maioria das vezes háa necessidade da introdução do fungo pormeio da aplicação de isolados virulentosdo patógeno em intervalos regulares detempo, para que se obtenha um controlesatisfatório. São encontrados no mercadoprodutos à base de B. bassiana para ocontrole da broca, cuja recomendação é ade aplicar no período de trânsito da broca,com os frutos na fase de chumbinho. Noentanto, é necessário que existam condiçõesambientais que favoreçam a infestação,como a alta umidade relativa do ar e o tem-po nublado (TICHELER, 1963 apud REISet al., 2002). Nos sistemas de café orgânicosombreados, adensados, ou com legumi-nosas associadas, é provável que a eficiên-cia de controle da broca pelo fungo sejaaumentada.

Outro patógeno que pode ser utiliza-do no cafeeiro para controle da lagarta-dos-cafezais, Eacles imperialis magnifica

(Walker), é a bactéria Bacillus thuringiensis.Esta é seletiva aos outros agentes de con-trole biológico natural das pragas do cafeei-ro (REIS et al., 2002). Existem formulaçõescomerciais disponíveis no mercado.

CONTROLE FÍSICO

Armadilhas que contêm a mistura deetanol e metanol, a qual é atrativa à broca(MENDOZA MORA, 1991), podem servirpara o monitoramento e captura da praga.A eficiência dessas armadilhas pode sermelhorada com a adição de óleo de café(VILLACORTA et al., 2001). As armadilhassão confeccionadas com garrafas descar-táveis de refrigerante tipo polietileno terefta-to (PET), contendo no interior um pequenofrasco de vidro (10mL), com uma tampa deborracha com furo (2 mm) na parte central,suspenso na extremidade superior, conten-do a mistura de etanol e metanol e o óleode café (Fig. 8). Na extremidade inferiorda garrafa coloca-se cerca de 200 mL deágua com 5% de sabão líquido, para que as

Figura 8 - Armadilha para broca-do-café, modelo IaparNOTA: Iapar – Instituto Agronômico do Paraná.

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brocas atraídas morram afogadas. Devemser colocadas no mínimo 25 armadilhas porhectare (VILLACORTA et al., 2001).

CONTROLE CULTURAL

É um dos métodos mais eficientes pa-ra o controle da broca-do-café (REIS etal., 2002). A colheita do café deve ser mui-to bem-feita e iniciada nos talhões, ondehá maiores infestações, devendo evitarque fiquem frutos nas plantas e no chão,nos quais a broca poderá sobreviver naentressafra. Caso tenham ficado muitosgrãos nas plantas e no chão, é recomen-dável fazer o repasse ou catação dos frutosremanescentes da colheita (REIS et al.,2002).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A produção de café orgânico em sistemafamiliar, ou não, demanda novas ferramen-tas para o controle de pragas. Algumasestratégias apresentadas não são finais esim propostas para sistematizar metodolo-gias alternativas àquelas da cafeiculturaconvencional. Muito ainda precisa ser feitopara dar certificação científica às práticasempíricas em uso, no entanto, foram apre-sentadas também técnicas que possuemeficiência comprovada e que estão disponí-veis aos cafeicultores. Deve-se salientarque pelo fato de os produtos alternativosserem de baixo custo e de fácil manipula-ção não significa que possam ser utiliza-dos indiscriminadamente e seu uso deveser de acordo com as recomendações téc-nicas. A seletividade aos inimigos naturaisdeve ser preconizada sempre, e o agricultordeve saber que essa seletividade é obtidade acordo com a dosagem a ser estabele-cida para cada praga, como foi apresen-tado. Finalmente, a utilização de produtosalternativos na cafeicultura é o primeiropasso para que os agricultores possamproduzir sem o uso de agrotóxicos, e con-seqüentemente, com um maior valor agre-gado ao produto café no mercado consu-midor.

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86 Cafeicultura familiar

1Engo Agro, M.Sc., Pesq. EPAMIG-CTSM, Caixa Postal 176, CEP 37200-000 Lavras-MG. Correio eletrônico: [email protected] Agro, D.Sc., Pesq. EPAMIG-CTSM, Caixa Postal 176, CEP 37200-000 Lavras-MG. Correio eltrônico: [email protected] Agra, D.Sc., Pesq. EPAMIG-CTSM, Caixa Postal 176, CEP 37200-000 Lavras-MG. Correio eltrônico: [email protected]

Manejo das doenças do cafeeiropara a cafeicultura familiar

Vicente Luiz de Carvalho1

Rodrigo Luz da Cunha2

Sara Maria Chalfoun3

INTRODUÇÃO

Diante de um mercado cada vez maisexigente, o cafeicultor familiar necessitade conhecimento, para ser mais competiti-vo, melhorar a produção e a qualidade doseu café, a custo compatível com a ativi-dade.

A adoção de um conjunto de práticasculturais é fundamental e está ao alcancedos cafeicultores familiares, desde que lhessejam apresentadas alternativas tecnoló-gicas adaptadas às escalas e às possibili-dades de sua produção.

O controle fitossanitário figura entre as

práticas culturais que devem ser aplicadascriteriosamente, através de estratégias quevisem aliar o sucesso no controle das pra-gas e das doenças, ao desenvolvimentosustentado da atividade cafeeira.

Dessa forma, danos causados por doen-ças que afetam os cafeeiros devem ser evi-tados, utilizando-se esquemas que envol-vem a integração de medidas, tais como,métodos de prevenção para evitar ou ate-nuar a incidência de doenças; monitora-mento das doenças; determinação de pos-síveis correlações entre patógenos, hos-pedeiro e ambiente; seleção de produtos

menos tóxicos ao ambiente de cultivo eaplicadores; possibilidade de medidas inte-gradas de controle e controle simultâneode mais de uma doença, inclusive as de ca-ráter não infeccioso, deficiências e/ou de-sequilíbrios nutricionais.

Para que o manejo integrado das doen-ças voltadas ao cafeicultor familiar sejaempregado corretamente, são apresenta-dos as principais doenças do cafeeiro, ossintomas, os danos, os fatores que favore-cem o seu desenvolvimento, algumas prá-ticas culturais e táticas de controle, paraevitar ou atenuar danos.

Resumo - Cafeeiros estão sujeitos à incidência de várias doenças. A ocorrência e os prejuízosque essas doenças podem causar dependem dos fatores que atuam no sistema cafeeiro-patógeno-ambiente, que são variáveis entre regiões, ou mesmo dentro de uma região.Entre os vários fatores que determinam uma epidemia estão a virulência do patógeno, asuscetibilidade ou a resistência das plantas, a densidade de plantio, o grau de enfolhamento,a carga pendente, o estado nutricional das plantas e, ainda, os fatores ligados ao ambiente,como temperatura, chuva, intensidade dos ventos, umidade relativa, molhamento foliar,luz, disponibilidade de nutrientes no solo, etc. Todos esses fatores podem influenciarcom maior ou menor intensidade, na severidade das doenças que, de alguma forma,podem ser manejados pelo cafeicultor familiar, obtendo-se, assim, uma diminuição dopotencial de inóculo, um aumento na resistência dos cafeeiros às doenças ou umapromoção das condições menos favoráveis ao desenvolvimento dos patógenos. Paraque o manejo integrado das doenças seja empregado corretamente pelo cafeicultorfamiliar, é necessário que ele conheça bem as principais doenças da cultura, os sintomas,os fatores que favorecem o seu desenvolvimento, algumas práticas culturais e táticas decontrole, que visam reduzir os danos causados por essas doenças, com menor agressãoao ambiente e ao homem.

Palavras-chave: Café. Doença. Manejo integrado. Agricultura familiar.

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87Cafeicultura familiar

PRINCIPAIS DOENÇAS

Os cafeeiros estão sujeitos ao ataquede várias doenças. Algumas delas causamconsideráveis perdas para os cafeicultorese são consideradas mais importantes comoa ferrugem e a cercosporiose. Além dessas,as manchas-de-Phoma, Ascochyta, aureo-lada, anular, a rhizoctoniose e o amarelinhopodem ou não ocorrer dependendo dascondições climáticas.

Ferrugem-do-cafeeiro

Dentre as doenças que ocorrem nocafeeiro, a ferrugem causada pelo fungoHemileia vastatrix Berk e Br. é a mais impor-tante, por causar grandes prejuízos à cafei-cultura. Ela ocorre em todas as regiões pro-dutoras de café, no Brasil.

O fungo ataca todas as cultivares de ca-fé, porém, dentro do gênero Coffea, são obser-vadas diferenças quanto à patogenicidade.

A resistência e a suscetibilidade à do-ença encontram-se presentes em cultiva-res das espécies Coffea arabica e Coffeacanephora.

O principal dano que a ferrugem causaao cafeeiro é a desfolha e, conseqüentemen-te, a perda na produção que pode chegaraté a 50%. Além disso, indiretamente, apósanos de ataque, a ferrugem pode causarperdas de ramos laterais e menor longe-vidade das plantas.

Os primeiros sintomas da doença são pe-quenas manchas circulares de cor amarelo-alaranjada, com diâmetros de 0,5 cm, que

aparecem na face inferior da folha. Sobre amancha forma-se uma massa pulverulen-ta de uredosporos. No estádio mais avan-çado, algumas partes do tecido foliar sãodestruídas e necrosadas (Fig. 1).

A ocorrência da doença é favorecidapor fatores ligados ao hospedeiro (cafeeiro),ao patógeno (fungo) e relacionados com oambiente. Entre os fatores relacionados coma planta e com o ambiente, que permiteminferir sobre a ocorrência e a intensidadedo ataque, estão: o enfolhamento, a cargapendente (produção) e a densidade de plan-tas por área. Esses fatores são importantesna hora de definir o controle da doença, jáque quanto maior o enfolhamento, maiorserá o inóculo residual para o próximo cicloda ferrugem e quanto maior a carga pen-dente, maior será a intensidade da doença,como pode ser observado no Quadro 1.

No sistema de cultivo adensado ou arbo-rizado, o microclima é plenamente favorá-vel ao desenvolvimento da ferrugem-do-cafeeiro.

Nos últimos anos, a necessidade de umamelhor utilização das áreas, em busca demaiores rendimentos e retornos financeirosmais rápidos, tem feito com que plantiosmais adensados sejam bastante utilizados.O aumento do número de plantas, por uni-dade de área, altera o ambiente ao redor daplanta, formando um microclima que inter-fere em outros fatores como: luminosida-de, taxa de evaporação e ação dos ventos(JARAMILLO-ROBLEDO, 1996). As con-

dições de ambiente nesse sistema de plan-tio tornam-se plenamente favoráveis aodesenvolvimento da ferrugem-do-cafeeiro(Quadro 2).

Além desses fatores para orientar natomada de decisões, é importante que se-jam conhecidos os índices de incidência ea evolução da doença através da Curva deEvolução e do Monitoramento, para quepossam ser aplicadas as medidas culturaise/ou controles alternativos, que visem re-duzir a doença a níveis economicamenteaceitáveis.

Curva de evolução da ferrugem

O período de ocorrência da ferrugemvaria pouco entre as regiões cafeeiras e deum ano para outro. As condições climáticasque favorecem a doença ocorrem normal-mente a partir de novembro/dezembro, compico de incidência entre os meses de maioa julho (Gráfico 1).

Figura 1 - Folhas de cafeeiro com sintomas de ferrugem nas faces ventral e dorsal

QUADRO 1 - Influência da produção do cafeeiro

no índice de infecção da ferrugem

0 8,33 22,00 27,33 32,83

50 7,67 26,31 59,66 80,66

100 8,99 36,33 70,33 89,33

Níveisde

produ-ção(%)

Folhas com ferrugem

(%)

Dezem-

broMarço Maio Julho

Fonte: Carvalho et al. (1993).

Foto

s: V

icen

te L

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de C

arva

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88 Cafeicultura familiar

QUADRO 2 - Porcentagem relativa de ferrugem-do-cafeeiro em três densidades de plantio e duas

cultivares - São Sebastião do Paraíso1, MG, no período 1997-1998

Catuaí 10.000 64,0 256,0 72,8 130,0

5.000 43,0 172,0 55,4 98,0

2.857 25,0 100 56,0 100

Mundo Novo 10.000 72,5 195,9 72,9 135,2

5.000 55,5 150,0 64,0 118,7

2.857 37,0 100 53,9 100

CultivarDensidade

deplantio

(plantas ha-1)

1997 1998

Folhas comferrugem

(%)

Relativa(%)

Relativa(%)

Folhas comferrugem

(%)

FONTE: Carvalho e Chalfoun (2001).(1) Fazenda Experimental de São Sebastião do Paraíso (FESP) da EPAMIG.

O controle químico da doença devecomeçar com o início de sua evolução, atémarço/abril, a partir de quando pouco ouquase nada pode-se fazer.

Monitoramento

A quantificação da ferrugem é feita pe-lo monitoramento, através de medições desintomas ou sinais da doença dentro da la-voura.

Através do monitoramento é possívelfazer um programa de controle eficiente,utilizando-se práticas culturais apropria-das e defensivos corretos para cada situa-ção. Com isso, serão evitados desperdíciosde insumos e mão-de-obra e danos causa-dos pela ocorrência de índices elevadosda doença, bem como menor agressão aomeio ambiente.

Para fazer o monitoramento é necessárioamostrar os talhões, fazendo-se um cami-nhamento ao acaso, em ziguezague, entreas plantas (Fig. 2).

A seqüência de trabalho deve ser:

a) dividir as lavouras em talhões uni-formes;

b) coletar cinco a dez folhas por planta(no terceiro ou quarto par), no terçomédio da planta, perfazendo um to-tal de 100 a 300 folhas por talhão;

c) contar o número de folhas com fer-rugem e determinar a porcentagemde infecção, conforme a fórmula aseguir:

Gráfico 1 - Curva de evolução da ferrugem-do-cafeeiro em função da precipitação e datemperatura média

FONTE: Carvalho et al. (2002b).NOTA: Dados médios dos anos de 1997 a 2000 - EPAMIG-Fazenda Experimental de

São Sebastião do Paraíso (FESP), MG.

Figura 2 - Como caminhar no talhão e onde coletar as folhas para avaliação da ferrugem

Terço mé diodo pé de café Terceiro ou quarto

par de folhas

Caminhamento de amostragemOnde amostrar

400

350

300

250

200

150

100

50

0

80

70

60

50

40

30

20

10

0

PrecipitaçãoTemperatura médiaInfecção (%)

Infe

cção

(%

)

Pre

cipi

taçã

o (m

m)

jan. fev. mar. abr. maio jun. jul. ago. set. out. nov. dez.

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89Cafeicultura familiar

no total de folhas% de infecção (I) =

no de folhas com ferrugem x 100

d) a porcentagem de infecção (I) mos-tra a evolução da doença na lavoura;

e) este levantamento deve ser realiza-do pelo menos uma vez por mês apartir de dezembro.

Conhecendo a porcentagem de infecção,através do monitoramento, pode-se definirqual grupo de fungicida deverá ser usado,uma vez que no uso de produtos de conta-to como os cúpricos, as aplicações devem-se iniciar quando ainda não foi constatadaa ferrugem nas lavouras ou quando o índiceestá próximo de 0% de folhas com ferrugem.

Medidas gerais de controle

a) fazer adubações equilibradas;

b) plantar linhagens resistentes ou tole-rantes;

c) fazer desbrotas, evitando o excessode hastes e conseqüentemente o auto-sombreamento;

Oeiras MG 6851 Vermelho Média Porte baixo com altura de planta 2,58 m e diâmetro de saia 1,65 m.

Paraíso MG H 419-1 Amarelo Média Porte baixo com altura de planta 1,95 m e diâmetro de saia 1,92 m.

Pau-Brasil MG 1 Vermelho Média Porte baixo com altura de planta 1,30 m e diâmetro de saia 1,48 m, aos 38 meses de plantio.

Araponga MG 1 Vermelho Média Porte baixo com altura de planta 1,70 m e diâmetro de saia 1,70 m.

Catiguá MG1 e MG2 Vermelho Média Porte baixo com altura de planta 1,40 m e diâmetro de saia 1,70 m, aos 48 meses de idade.

Sacramento MG1 Vermelho Média Porte baixo com altura de planta 1,40 m e diâmetro de saia 1,85 m, aos 48 meses de idade.

Icatu Amarelo e vermelho Precoce Porte alto com altura de planta que varia de 3,0 a 4,0 m e diâmetro de saia entre 2,0 e 2,8 m,

e média de acordo com a progênie.

Obatã IAC 1669-20 Vermelho Tardia Porte baixo.

Tupi IAC 1669-33 Vermelho Média Porte baixo com diâmetro de copa menor que o Obatã.

Iapar 59 Vermelho Precoce Porte baixo com altura de plantas de 2,0 m e diâmetro de saia 1,7 m.

IPR 98 Vermelho Média Porte baixo.

IBC Palma Vermelho Média Porte baixo e ligeiramente superior ao Catuaí.

Catucaí Amarelo e vermelho Média O porte varia de baixo a médio com diâmetro da copa semelhante à cultivar Catuaí.

QUADRO 3 - Características de algumas cultivares de café com resistência específica e não específica à ferrugem

Porte/Altura e diâmetro das plantasCultivar Cor do frutoMatura-

ção

d) fazer podas periódicas;

e) adotar espaçamentos mais largos naentrelinha;

f) evitar o cultivo de cultivares suscetí-veis à doença em sistemas sombrea-dos ou arborizados.

Controle genético

Usar cultivares resistentes ou toleran-tes à ferrugem é, sem dúvida, a melhoropção de controle da doença em qualquersistema de cultivo (adensado, orgânico) etamanho de propriedade, principalmentepara o cafeicultor familiar, por apresentarmenor custo, sem causar danos ao meioambiente e ao homem. Hoje já existem nomercado várias cultivares disponíveis comprodutividade semelhante às melhores cul-tivares de Mundo Novo e Catuaí. As prin-cipais cultivares resistentes/tolerantes dis-poníveis no mercado são apresentadas noQuadro 3.

Controle químico

O maior grupo de fungicidas ao alcancedos agricultores familiares é à base de cobrechamado cúprico (sulfatos e hidróxidos decobre). As aplicações devem-se iniciar, quan-do ainda não for constatada ferrugem naslavouras, ou com índices da doença próxi-mos a zero. Os intervalos de aplicações de-vem ser seguidos rigorosamente, assim co-mo o número de aplicações recomendadas.

Entre as caldas mais empregadas estãoa bordalesa e a viçosa.

Em anos de carga pendente alta e lavou-ra adensada, a incidência da ferrugem é maior,dessa forma o produtor deverá ter mais cui-dado nas medidas de controle. Ao contrá-rio, em anos de carga pendente baixa, o con-trole pode ser simplificado com a reduçãodo número de pulverizações. Outro aspectoa ser considerado é a possibilidade decontrolar-se simultaneamente a ferrugem ea cercosporiose. Os fungicidas cúpricos eoutras formulações são recomendados parao controle simultâneo dessas doenças.

Cercosporiose

A cercosporiose é uma das doençasmais antigas do cafeeiro, tanto na América

;

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90 Cafeicultura familiar

do Sul, como na América Central. Na Co-lômbia, essa doença é considerada a princi-pal enfermidade dos cafeeiros por ser ampla-mente distribuída e ocasionar as maioresperdas na produção. No Brasil, pode serconsiderada a segunda doença mais impor-tante, pois causa perdas de 15% a 30% naprodutividade do cafeeiro.

Com a implantação de lavouras na re-gião dos Cerrados, ou em solos de baixafertilidade natural e alterações nas condi-ções de clima que se tornaram mais adver-sas aos cafeeiros, os prejuízos com a doen-ça ganharam maior importância, pois há umagrande relação entre a incidência da cercos-poriose, a nutrição mineral das plantas eos fatores climáticos.

O agente causal dessa doença é o fungoCercospora coffeicola Berk & Cook, querecebe várias denominações, dependendoda região onde incide, como: cercosporio-

Figura 3 - Sintomas de cercosporioseNOTA: A – Sintomas nas folhas; B – Sintomas nos frutos; C – Sintomas em mudas.

A B

C

se, mancha-de-olho-pardo, olho-de-pomba,olho-pardo e Brown-eye spot.

Os sintomas característicos que conferi-ram essas denominações à doença são man-chas circulares de coloração castanho-claraa escura, com o centro branco-acinzentado,quase sempre envolvidas por um halo ama-relado. Nos últimos anos, têm sido obser-vados sintomas diferentes nas folhas,caracterizados por manchas escuras semhalo amarelado, que, em algumas regiões,têm-se denominado cercospora-negra. Nosfrutos, ocorrem lesões deprimidas de colo-ração escura, as quais se desenvolvem nosentido polar. Podem ocorrer, também, emfrutos verdes o que causa maturação preco-ce da casca em torno da mancha (Fig. 3).

Presente em todas as regiões cafeeirasdo Brasil, essa doença causa prejuízos tan-to na fase de viveiro (mudas), como na decampo (plantas novas e adultas).

Os principais danos provocados pelacercosporiose são:

a) viveiros: queda de folhas e raquitis-mo das mudas;

b) pós-plantio: desfolha e atraso nocrescimento das plantas;

c) lavouras novas: após as primeirasproduções, pode causar queda defolhas, frutos e seca de ramos produ-tivos;

d) lavouras adultas: queda de folha, ama-durecimento precoce e queda prema-tura de frutos, chochamento. As le-sões funcionam como porta de entra-da para outros fungos que depre-ciam a qualidade do produto.

Além das condições climáticas, comoumidade relativa alta, temperaturas amenas,excesso de insolação e déficit hídrico, qual-quer condição que leve a planta a um estadonutricional deficiente ou desequilibradofavorece a doença. Algumas dessas condi-ções são: substrato pobre para a formaçãode mudas, textura de solo inadequada (argi-loso ou muito arenoso), sistema radiculardeficiente, compactação do solo, deficiên-cia de nitrogênio, excesso de potássio oudesequilíbrio da relação N/K.

Vários trabalhos (Quadro 4) mostramque a deficiência de nitrogênio ou excessode potássio, direta ou indiretamente, favo-recem a incidência da cercosporiose. Nota-se, portanto, que uma nutrição adequada,principalmente quanto ao nitrogênio e ao po-tássio, pode reduzir a incidência da doença,condição essencial para o manejo integra-do da cercosporiose do cafeeiro.

Ao contrário do que ocorre com a ferru-gem, a incidência da cercosporiose é menornos plantios adensados (Quadro 5). Da mes-ma forma, em cultivos sombreados ou arbo-rizados, usados nos sistemas agroflores-tais, a menor incidência da cercosporiosesoma-se como vantagem.

Medidas gerais de controle

a) no viveiro:

- instalar os viveiros em lugares se-cos e arejados,

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- controlar o ambiente do viveiro,evitando alta umidade, baixa tem-peratura, vento frio e excesso deinsolação,

- encher os saquinhos com solo deboa porosidade e textura. O subs-trato deve ser rico, preparado comesterco puro, bem curtido e comple-mentado com adubos químicos emmistura,

- evitar o excesso ou a falta de umi-dade nos canteiros,

- fazer as adubações em coberturaou foliares complementares, quan-do necessárias;

b) nas fases de plantio e pós-plantio:

- fazer a correção necessária do solo,um bom preparo das covas e sulcosde plantio, seguindo um plano deadubação e nutrição adequado,

- ficar atento à realização do contro-le químico, principalmente se oplantio for feito no final do períodochuvoso, pois o excesso de inso-lação, ventos e a deficiência hídri-ca nesse período predispõem asplantas ao ataque da cercosporio-se,

- fazer adubações nitrogenadas decobertura após o pegamento dasmudas, o que reduz a intensidadedo ataque da cercosporiose;

c) nas lavouras adultas:

- fazer adubações equilibradas, prin-cipalmente por ocasião das primei-ras produções dos cafeeiros, a fimde evitar o desequilíbrio da relaçãoparte aérea e sistema radicular, con-dições que favorecem a doença,

- fazer o acompanhamento do estadonutricional das plantas, periodica-mente, através de análises foliares,

- fazer adubações equilibradas, emlavouras adultas e em anos de car-ga pendente alta.

Catuaí 10.000 1,6 66,6 1,4 68,1

5.000 1,5 68,7 3,4 22,7

2.857 4,8 100 4,4 100

Mundo Novo 10.000 2,0 55,5 1,1 62,6

5.000 1,6 64,5 2,4 25,0

2.857 4,5 100 3,2 100

QUADRO 5 - Porcentagem relativa de cercosporiose do cafeeiro em três densidades de plantio eduas cultivares - São Sebastião do Paraíso1, MG, no período 1997-1998

FONTE: Carvalho e Chalfoun (2001).(1) Fazenda Experimental de São Sebastião do Paraíso (FESP) da EPAMIG.

CultivarDensidadede plantio

(plantas ha-1)

1997 1998

Folhas comcercospora

(%)

Relativa(%)

Folhas comcercospora

(%)

Relativa(%)

Doses de fertilizantes Incidência de cercosporiose nos Fernandez-Borrero et al. (1966)

(kg ha-1 de 12.12.17) frutos

0 32,8

60 13,8

120 10,4

180 4,4

Efeito de nutrientes NPK Incidência de cercosporiose nos Miguel et al. (1976)

frutos

Apenas N 21,65

Apenas P 37,06

Apenas K 37,29

Testemunha 37,36

Efeito da interação N e K Incidência de cercosporiose nas Fernandez-Borrero e Lopes-

folhas em mudas de café Duque (1971)

Apenas N 3,34

Apenas K 35,01

N e K 9,42

Testemunha 36,73

Coeficiente de correlação: (1)-0,78 Carvalho et al. (2002a)

cercosporiose dos frutos x N

QUADRO 4 - Relação de trabalhos que envolve a nutrição e a incidência de cercosporiose

Fonte

(dados básicos)Nutrição

Incidência

de cercosporiose

(%)

(1)Significativo ao nível de 1% de probabilidade.

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92 Cafeicultura familiar

Controle químico

Quando o controle cultural não for su-ficiente para reduzir a cercosporiose, tantono viveiro como em lavouras no campo, énecessário que se faça o controle dirigidocom produtos específicos. Entre as caldasmais empregadas estão a bordalesa e a vi-çosa.

As aplicações podem ser feitas de de-zembro/janeiro a março/abril, pois, a épocade maior incidência da doença é março/abrilconforme mostra o Gráfico 2.

Mancha-de-Phoma

Causada pelo fungo Phoma costarricensisEch., esta doença foi identificada pela pri-meira vez em Costa Rica e necessita de feri-mentos prévios na planta, para que ocorramas infecções (ECHANDI, 1957). Entretanto,trabalhos realizados na Colômbia demons-traram que o fungo Phoma sp. é capaz depenetrar e causar infecções nos brotos, fru-tos e folhas na presença ou na ausência deferimentos (FERNANDEZ, 1961).

No Brasil, além da Phoma costarricensis,estudos mais recentes confirmam a ocorrên-cia de outras espécies do fungo (SALGADOet al., 1997).

A doença foi constatada no País, inicial-mente, em cafezais localizados em altitudes

iniciando-se a partir dos folíolos ou do pon-to de abscisão das folhas. Nos ramos ata-cados, observam-se lesões deprimidas eescuras. Estas lesões podem ocorrer tam-bém nos botões florais, flores e frutos, noestádio de chumbinho e causar a morte e amumificação desses órgãos atacados.

Medidas gerais de controle

a) evitar a instalação de lavouras emáreas sujeitas a ventos frios;

b) programar a instalação de quebra-ventos provisórios e/ou definitivosdesde a implantação da lavoura;

c) fazer adubações equilibradas e emquantidades adequadas;

d) fazer o controle preventivo, principal-mente nas fases pós-florada (chum-binho), nas áreas onde a doença ocor-re sistematicamente.

Mancha-de-Ascochyta

Na cultura do cafeeiro, o fungo Ascochytacoffeae foi identificado inicialmente comocausador da doença denominada canela-seca, devido ao ressecamento que provocano caule da plântula e, conseqüente, tomba-mento das mudas no viveiro. Atualmente,o fungo vem causando manchas foliaresde tamanho variável e de coloração castanho-pardo a castanho-escuro, que provocam aqueda das folhas do cafeeiro, seu principaldano à cultura (Fig. 5).

Os sintomas nas folhas são semelhan-tes aos causados por Phoma sp. e não seobservam diferenças em nível de campo,

Gráfico 2 - Curva de evolução da cercosporiose do cafeeiroFONTE: Carvalho (2003).NOTA: Dados médios dos anos de 1997 a 2000 – EPAMIG-Fazenda Experimental de

São Sebastião do Paraíso (FESP), MG.

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35

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5

0jan. fev. mar. abr. maio jun. jul. ago. set. out. nov. dez.

Infe

cção

(%

)

elevadas (acima de 900 m), no estado doEspírito Santo, e em regiões do Triângu-lo Mineiro e Alto Paranaíba, no estado deMinas Gerais. No entanto, a doença temsido encontrada em outras regiões, emlavouras expostas a ventos fortes e frios,com as faces voltadas para o sul, sudestee leste.

A penetração do fungo é facilitada pordanos mecânicos nos tecidos da planta,produzidos por insetos ou pelo roçar defolhas tenras causado pelos ventos. A tem-peratura tem grande influência no ataquedesse fungo, pois o micélio é infectivo a24oC e os picnidiósporos a 18oC-19oC. Pe-ríodos intermitentes de frio, ventos frios echuva favorecem a doença. Essas condi-ções ocorrem, geralmente, nos meses deagosto a outubro e março a maio. Nessasépocas, podem ocorrer surtos da doença,porém, dependendo da região e das con-dições de clima específico, ela pode evoluirem outros meses. Os sintomas nas folhasnovas são manchas circulares de coloraçãoescura e de tamanho variado que podemchegar a 2 cm de diâmetro. Quando as le-sões atingem as bordas das folhas, estasencurvam-se e podem apresentar racha-duras (Fig. 4).

Os sintomas podem ocorrer nos ramos,

Figura 4 -Sintomas de incidência de Phomasp. em folhas do cafeeiro

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93Cafeicultura familiar

sendo necessárias diagnoses laboratoriaiscom o auxílio de técnicas específicas paraidentificar suas estruturas reprodutivas.

A temperatura ideal para o desenvolvi-mento do fungo situa-se próximo a 24ºC(20°C a 25°C) e o seu crescimento é estimu-lado pela alternância de temperaturas altase baixas.

Medidas gerais de controle

a) evitar a instalação de lavouras emáreas sujeitas a ventos frios;

b) programar a instalação de quebra-ventos provisórios e/ou definitivosdesde a implantação da lavoura;

c) fazer adubações equilibradas;

d) fazer o controle com fungicidas espe-cíficos durante os períodos favorá-veis à doença.

As lavouras instaladas em locais demaiores altitudes e desprotegidas da açãodos ventos estão mais sujeitas à doença.Os ventos promovem ferimentos nas fo-lhas e ramos novos, abrindo portas para apenetração da bactéria. A ocorrência de chu-vas de granizo e do frio intenso pode provo-car lesões nas plantas, o que também faci-lita a entrada da bactéria. As condições detemperatura, umidade relativa e precipita-ção que favorecem a ocorrência da doençavão de outubro a dezembro.

O controle da bactéria normalmenteé feito por meio de antibióticos, uma boaopção para muda e lavoura nova. Mohan eCardoso (1977) sugerem que a mistura deantibióticos com cúpricos (oxicloreto decobre) aumenta a eficiência de controle e

que mudas atacadas a pleno sol recuperam-se mais rapidamente.

Medidas gerais de controle

a) fazer o controle preventivo;

b) construir viveiros protegidos de ven-tos frios;

c) evitar a formação de lavouras emáreas sujeitas a ventos frios e for-tes;

d) programar a formação de quebra-ventos junto à implantação da la-voura.

Rhizoctoniose

O agente causal da rhizoctoniose é ofungo Rhizoctonia solani Künn, que habi-ta o solo e sobrevive por longos períodosem restos de culturas. A doença pode cau-sar perdas econômicas consideráveis emsementeiras, viveiros de mudas e em plantasum ano após o plantio.

O fungo pode incidir sobre as mudinhasno viveiro e não causar as lesões no colo.Quando essas mudas contaminadas forempara o campo, um ano após o plantio, e seas condições forem favoráveis, a infecçãopode desenvolver-se e causar lesão no coloe morte das plantas. Nessa fase, a doençadenomina-se rhizoctoniose tardia.

Os sintomas característicos da doen-ça em viveiros são lesão do colo, murcha emorte de plântulas e, até o primeiro par defolhas, devido à lesão e ao estrangulamento

Figura 5 - Sintomas de manchas-de-AscochytaNOTA: A - Sintoma de Ascochyta em folhas de cafeeiro; B - Semelhança entre os sintomas de Phoma e Ascochyta.

Figura 6 - Folhas de café com sintomas de incidênciade mancha-aureolada

Mancha-aureolada

A mancha-aureolada do ca-feeiro é uma doença causada pelabactéria Pseudomonas syringaepv garçae e pode ocorrer tantoem mudas no viveiro, onde cau-sa maiores prejuízos, como emplantas adultas.

A denominação mancha-aureolada é em decorrência daformação de um halo amarelo quecircunda as lesões. As áreas lesio-nadas normalmente desprendem-se das bordas das folhas, dandoum aspecto rendilhado (Fig. 6).

A BPhoma sp. Ascochyta sp.

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94 Cafeicultura familiar

do colo, causa o tombamento das plan-tinhas em forma de reboleira (Fig. 7).

No campo, após um ano de plantio oumais, as plantas murcham, secam e podemtombar, devido ao roletamento do caule naregião do colo.

Medidas gerais de controle

a) desinfestar os substratos, por exem-plo, por meio de solarização;

b) não reaproveitar as sacolinhas;

c) mudar os viveiros de local, periodica-mente;

d) evitar excesso de umidade e sombranos canteiros;

e) eliminar as reboleiras e plantas queas circundam;

f) suspender a irrigação e diminuir asombra após o aparecimento da do-ença.

Figura 7 - Mudas com sintomas de rhizoctonioseNOTA: A - Reboleira no canteiro; B - Detalhe do sintoma.

Para a desinfestação do solo, uma alter-nativa é o emprego da solarização. A co-bertura do substrato com filme plásticotransparente eleva a temperatura a níveisletais a patógenos, porém com menor danoaos organismos benéficos (MIZUBUTI;MAFFIA, 2001). Isso pode ser feito espar-ramando o substrato em camada fina sobreum terreiro cimentado ou sobre lona plás-tica preta. Sobre o substrato, previamenteumedecido, é aberta uma lona plástica trans-parente, bem esticada e fixada que é man-tida sob o sol por 40 a 50 dias.

Mancha-anular

Esta doença causada por vírus, conhe-cida por mancha-anular, leprose ou Cofferingspot virus, apesar de conhecida no Brasil,desde 1935, não era considerada importan-te para o cafeeiro.

Nos últimos anos, foram constatadosataques severos em algumas lavouras do

Alto Paranaíba e, hoje, a doença já pode serobservada em lavouras no Sul de Minase no estado da Bahia. Segundo Figueira etal. (1996), algumas das áreas demonstraram100% de plantas infectadas e 20% de redu-ção na produção.

A doença causa desfolha intensa, dedentro para fora, o que se denominou plan-ta oca (MATIELLO et al., 1995).

A virose causa manchas, quase sempreao longo das nervuras principal e secundá-ria das plantas, de cor verde-amarelada.Nos frutos em estádio cereja, verificam-se círculos irregulares pardo-amarelados(Fig. 8).

A intensa ocorrência da virose nosúltimos anos, no Brasil, pode ser devida aum aumento na população do ácaro-vetorBrevipalpus phoenics (Geijskes), que, nor-malmente, é constatado nas lavouras ata-cadas. A elevação na população do ácaro,por sua vez, pode ser atribuída à ocorrênciade condições climáticas favoráveis (estia-gem prolongada) e/ou desequilíbrios pro-vocados pelo uso contínuo de algum agro-químico.

Medidas gerais de controle

a) buscar o equilíbrio biológico na lavou-ra, preservando espécies de ácaros-predadores;

b) controlar o ácaro-vetor através deóleo de nim, menos nocivo aos ácaros-predadores, nas áreas onde se de-tectou a doença.

Amarelinho

A doença amarelinho é causada pelabactéria sistêmica Xylella fatidiosa, queataca várias culturas, como alfafa, pesse-gueiro, ameixeira, videira, amendoeira, pe-reira e citros.

Trata-se de uma bactéria imóvel, quese multiplica no xilema da planta e causaobstrução física dos vasos, necessitando,para isso, de grande quantidade delas.

Esse processo é lento e não causa, por-tanto, a morte súbita dos cafeeiros.

A doença é transmitida por vetores, quesão as cigarrinhas das famílias Cicadellidae

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95Cafeicultura familiar

(subfamília Cicadellinae) e Cercopidae, quese alimentam dos ramos e das folhas.

No cafeeiro, foi primeiramente descritapor Paradela Filho et al. (1995), no estadode São Paulo, sendo associada a condiçõesde estresse das plantas (ataque de nematói-des e plantas submetidas a longos períodosde estiagem), predispondo-as à infecçãopela bactéria e outros patógenos.

Os principais sintomas da doença sãonecrose e abscisão foliar, redução do cresci-mento, declínio de vigor e, finalmente, amorte da planta. Cafeeiros infectados porXylella fastidiosa apresentam ramos comentrenós mais curtos, quando comparadosaos daqueles sem sintomas, o que lhes con-

fere um aspecto semelhante à deficiên-cia de zinco (PARADELA FILHO et al.,1999).

Medida geral de controle

Evitar as causas do estresse sobre asplantas, como o ataque de nematóides, demosca-das-raízes, o desequilíbrio nutricio-nal e a estiagem, que são medidas, dentreoutras, que certamente reduzirão os efeitosda bactéria.

DOENÇAS DE MENORIMPORTÂNCIA

A fusariose, mancha-manteiga e aroseliniose ocorrem com menor freqüência

e em condições mais específicas e restritaa focos ou em lavouras isoladas. A primei-ra doença é causada por Fusarium sp. queatua infectando o sistema vascular da plantaatravés de ferimentos por danos mecânicos,podas ou ferimentos causados por pragasde raízes. A ocupação dos vasos e a produ-ção de toxinas causam murcha, amareleci-mento e morte da planta de cima para baixo.A fusariose foi diagnosticada em cafezaisdo Paraná, no Sul de Minas e Sul do Espí-rito Santo (MATIELLO; BARROS, 1993).A segunda doença, mancha-manteiga, é cau-sada pelo fungo Colletotrichum coffeanumNoak. É denominada também mancha-oleosa e considerada de pouca importânciaem Coffea arabica. O patógeno atua nasfolhas com sintomas iniciais, que apresen-tam pequenas lesões arredondadas de corverde-clara e de aspecto oleoso, bem distri-buídas no limbo foliar. Esta doença ocorre,normalmente, em plantas isoladas e tambémpode atacar os frutos, quando ocasiona suaqueda.

A roseliniose é uma doença do sistemaradicular do cafeeiro causada pelo fungoRosellinia sp., também conhecida por mal-de-quatro-anos, porque ocorre principal-mente em lavouras novas e em plantiosrealizados em terras ocupadas antes porflorestas, de onde não foram eliminadostocos, raízes e/ou restos vegetais, onde ofungo se desenvolve bem.

Os sintomas iniciam-se com amarele-cimento e murcha das plantas, queda dasfolhas e morte dos ramos. No sistema ra-dicular, o fungo causa escurecimento dasraízes e desprendimento fácil da casca.Sobre o lenho e abaixo da casca das raízes,observam-se filamentos esbranquiçadosque são as estruturas de crescimento dofungo, chamadas rizomorfos, que podempenetrar na região do coleto das plantassadias ou nas raízes localizadas próximas àsuperfície.

O controle deve ser preventivo. Deve-se fazer destoca total em áreas recém-desmatadas, catação rigorosa das raízese pedaços de madeira antes e depois daaração, uma boa calagem na área total, o

Figura 8 - Sintomas de incidência de mancha-anularNOTA: A - Sintomas nos frutos; B - Sintomas nas folhas.

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96 Cafeicultura familiar

que favorecerá a decomposição da matériaorgânica, uma boa observação das raízesdas árvores, para verificar a presença dofungo, aplicar cal viva (700 g/m) em áreascom alto grau de infestação, arrancar e quei-mar cafeeiros atacados pela doença. O re-plantio deve ser feito três meses após opreparo e tratamento das covas.

As doenças fisiológicas ou abióti-cas, causadas por fatores relacionados comambientes e/ou manejo inadequado da cul-tura, podem apresentar sintomas muitosemelhantes aos causados por patógenos.Conhecer os fatores ambientais e de mane-jo, que podem causar distúrbios fisioló-gicos nos cafeeiros, e os sintomas decor-rentes desses fatores evitarão avaliaçõese recomendações errôneas de controle dasdoenças. As doenças de natureza abióti-cas são seca de ramos, murcha, declínio naprodução, queda de frutos, amarelecimentodas plantas e outras. Esses distúrbios po-dem estar relacionados com ventos frios,excesso de insolação, déficit hídrico e nutri-cional. Estão incluídos também nos fatoresabióticos a faísca elétrica, canela de geada,sistema radicular deficiente, canela de gea-da e toxidez da planta, devido à aplicaçãoincorreta de qualquer agroquímico.

QUEBRA-VENTOS COMOPROTEÇÃO DE CAFEEIROS

Os ventos frios são extremamente da-nosos à lavoura de café. Além dos efeitosdiretos à planta, como ferimentos nas folhase ramos, diminuição no vingamento das flo-radas, queda dos frutos, lesões no colo dasplantas jovens pela constante distensão etorção, causam ainda os efeitos indiretos,pois, os ferimentos causados nos ramos efolhas propiciam a penetração de fungos ebactérias que podem causar seca de ramosou ponteiros. Áreas sujeitas a ventos cons-tantes e fortes vai ter um maior consumode água pela planta, maior ressecamento

do solo e menor preservação dos lençóisd’água.

Além disso, a seca de ponteiros quenormalmente é atribuída a patógenos, namaioria da vezes não é causa primária doproblema e sim os ventos frios. Por isso, éimportante o diagnóstico correto da origemdo problema. O conjunto desses efeitos no-civos vai resultar na diminuição da produ-ção e da vida útil da lavoura.

Segundo Fernandes (1986), os ventosmais prejudiciais são aqueles resultantesde entradas de massas de ar frio e polares,direção sudeste em terrenos elevados, queocorrem durante a estação de inverno eprimavera.

Uma forma de evitar esses prejuízoscausados pelos ventos frios é plantar fi-leiras de árvores (renques de vegetação),com a finalidade de interceptar a direçãodos ventos dominantes, para diminuir a suavelocidade ou modificar o seu rumo.

Os quebra-ventos podem ser:

a) temporários: normalmente implan-tados no meio das linhas do cafezalem formação. São usadas plantasarbustivas, como guandu, crotolária,capim-camerun, sorgo-forrageiro, etc.Ou cultivo intercalar de culturas deexpressão econômica como milho,arroz, sorgo, girassol, etc.;

b) permanentes: podem ser usadas espé-cies de plantas florestais, frutíferas,nectíferas como seringueira, bananei-ra, abacateiro, grevília, ingá, Acáciamangium e outras.

Os quebra-ventos devem ser implanta-dos por ocasião da instalação do cafezal,evitando os transtornos de implantá-losem lavouras adultas.

O produtor deve buscar orientação téc-nica para planejar os quebra-ventos, já quepara isso exigem-se cuidados especiais.Quebra-ventos malconstruídos terão efeitocontrário, pois canalizam o vento.

PRODUTOS ALTERNATIVOSUTILIZADOS NOMANEJO INTEGRADODE DOENÇAS DO CAFEEIRO4

Além das práticas culturais, como me-didas de reduzir os danos causados pelasdoenças nos cafeeiros, faz parte do manejodessas doenças o uso de produtos como cal-das, cúpricos, preparados biodinâmicos, etc.Alguns desses produtos já são usados ecomprovadamente eficientes; outros, neces-sitam de maiores estudos, para verificar asua eficácia. Deve-se lembrar que, para o usodesses produtos na cafeicultura orgânica,a entidade certificadora deve ser consultada.

Biofertilizante

O biofertilizante é um produto da disges-tão aeróbica ou anaeróbica de materiaisorgânicos de origem animal ou vegetal emmeio líquido. O resultado da fermentaçãopode controlar as doenças de várias manei-ras: antibiose, competição, parasitismo epredação (pela presença de microrganis-mos antagônicos), indução de resistên-cia bioquímica e/ou mecânica (tanto pelapresença de microrganismos, como peloscompostos químicos presentes) e pela açãodireta dos elementos minerais sobre os pa-tógenos, ou indireta, como nutrientes, man-tendo o equilíbrio nutricional das plantas.

A composição dos biofertilizantes va-ria conforme o método de preparo, sendo aprincipal característica, a presença dos mi-crorganismos responsáveis pela decompo-sição da matéria orgânica. Como resultadodessa decomposição, são produzidos vá-rios metabólitos e macro e micronutrientessão mineralizados, além da presença de umagrande flora microbiana.

Com relação ao uso de biofertilizantesno controle de doenças do cafeeiro, pou-cos estudos foram realizados. Entre eles ode Tratch e Bettiol (1997), que apresentouuma inibição total da germinação dos espo-ros e uma diminuição do tubo germinativo

4As indicações de defensivos contidas neste artigo não esgotam nem excluem outros produtos e não significam a preferência deles por parte dosautores deste artigo ou da EPAMIG.

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97Cafeicultura familiar

do fungo Hemileia vastatrix com a aplica-ção do biofertilizante em estudo na concen-tração de 1%.

As alternativas para se produzir um bio-fertilizante são variadas. Segundo Pinheiroe Barreto (1996), não existem receitas paraproduzir um biofertilizante, sendo seu prin-cipal componente o esterco. Podem-se adi-cionar: cinzas, fígado moído de boi, leite,melaço, sangue, farinha de concha, calcá-rio, açúcar, sais, etc.

Penteado (1999), Bettiol et al. (1998),Pinheiro e Barreto (1996), Theodoro et al.(1999) e Tratch e Bettiol (1997) são algunsautores que descrevem sobre a formulaçãode biofertilizantes.

Supermagro (PEDINI, 2000)

O biofertilizante (supermagro) é um adu-bo orgânico líquido, proveniente de umprocesso de decomposição da matéria orgâ-nica (animal ou vegetal) por meio de fermen-tação anaeróbica (fermentação bacterianasem a presença de oxigênio), em meio líqui-do. O resultado da fermentação é um resí-duo líquido, utilizado como adubo foliar,defensivo natural, chamado supermagro.É um resíduo sólido, utilizado como aduboorgânico. A receita do supermagro foi de-senvolvida no Rio Grande do Sul, pelotécnico agropecuário, Delvino Magro, epor agrônomos do Centro de AgriculturaEcológica Ipê (CAE).

O supermagro é utilizado como adubofoliar, complementar à adubação orgânicado solo, fornecendo micronutrientes (saisminerais essenciais ao metabolismo, cresci-mento e produção das plantas, porém exigi-dos em pequenas quantidades). O bioferti-lizante também atua como defensivo natu-ral por ser meio de crescimento de bactériasbenéficas, principalmente Bacillus subtilis,que inibe o crescimento de fungos e bacté-rias causadores de doenças nas plantas,além de aumentar a resistência contra inse-tos e ácaros.

Esse biofertilizante é composto de ester-co, água, sais minerais (micronutrientes),

outros resíduos animais, melaço e leite. Essacomposição é variada e rica, para que o bio-fertilizante (supermagro) sofra um completoprocesso de fermentação e seja nutritivoàs plantas (Quadros 6, 7 e 8).

Preparo

Em um recipiente de 200 L (tambor)devem ser colocados os 40 L de esterco,

100 L de água, 1 L de leite e 1 L de melaço.Misturar bem e deixar fermentar por trêsdias. A cada cinco dias dissolver um dossais minerais em 2 L de água morna, juntarcom 1 L de leite, 1 L de melaço (ou 0,5 kg deaçúcar) e um dos ingredientes complemen-tares (Quadro 8) e misturar com o estercoem fermentação.

Após adicionar todos os sais minerais,na ordem sugerida (Quadro 7), completaraté 180 L e deixar fermentar. No verão: por30 dias, no inverno: por 45 dias.

Modo de usar

A diluição recomendada é de 5% (mu-das) a 10% e a pulverização mensal.

Calda bordalesa

A calda bordalesa5 é um defensivo agrí-cola alternativo de fácil preparo na proprie-dade e baixa toxidez para o homem. É cons-tituída da mistura de sulfato de cobre e cal.Essa calda, se corretamente preparada eaplicada, atua sobre várias doenças do ca-feeiro principalmente a ferrugem e a cercos-poriose.

A composição para 100 L de água é aseguinte:

a) 1 kg de sulfato de cobre;b) 1 kg de cal virgem;c) 100 L de água.

Como preparar a calda bordalesa:

a) dissolver 1 kg de sulfato de cobreem 25 L de água. Para dissolver maisrápido, deixar o sulfato de cobre naágua de um dia para o outro;

b) dissolver 1 kg de cal apagada em 25L de água;

c) despejar lentamente a solução desulfato de cobre sobre a solução decal, e nunca ao contrário, agitandobem a mistura. Completar até 100 L ecoar a solução antes de colocar nopulverizador.

Cuidados especiais no preparo dacalda:

5Existe calda bordalesa pré-fabricada no mercado.

Esterco fresco de vaca kg 40

Água L 140

Leite L 9

Melaço L 9

QUADRO 6 - Ingredientes orgânicos, água e

quantidades

Quanti-

dadeIngredientes Unidade

Farinha de ossos kg 0,2

Restos de peixe kg 0,5

Sangue L 0,1

Restos moídos de fígado kg 0,2

QUADRO 8 - Ingredientes complementares e

quantidades

Quanti-dade

Ingredientescomplementares

Uni-dade

1 (1)Sulfato de zinco 3,0

2 Sulfato de magnésio 1,0

3 Sulfato de manganês 0,3

4 Cloreto de cálcio 2,0

5 (1)Bórax 1,5

6 Molibdato de sódio 0,2

7 Sulfato de cobre 0,3

QUADRO 7 - Ingredientes minerais e quanti-

dades

Quanti-dade(g)

Ordem Sais minerais

(1) Devem ser divididos em duas vezes.

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98 Cafeicultura familiar

a) usar cal de boa qualidade e de eleva-da pureza;

b) utilizar vasilhames de plástico, ci-mento ou madeira e nunca de ferro,latão ou alumínio, por reagirem como sulfato de cobre;

c) não armazenar a calda para ser utili-zada em outras aplicações;

d) lavar bem todo o equipamento, poisé um produto corrosivo;

e) não adicionar à calda outros produ-tos, devido a sua alcalinidade;

f) corrigir a acidez da calda, que podecausar fitotoxidez.

Calda viçosa

A base da calda viçosa é a calda borda-lesa acrescida de outros nutrientes, comoo boro e o zinco, essenciais ao cafeeiro,além do cobre (Quadro 9). A calda viçosavia foliar servirá para o controle da cercos-poriose e da ferrugem, correção de defi-ciência dos micronutrientes na planta, alémde preservar o enfolhamento e, conseqüen-temente, resultar em maior produção docafeeiro (Quadro 10).

Os sais devem ser dissolvidos separa-damente da cal, numa caixa de amianto,plástico ou alvenaria. Em outro recipiente,com mais de 100 L de capacidade, preparar50 L da suspensão de cal. Em seguida, des-pejar a calda com sais sobre a suspensãode cal sob forte agitação.

Hoje, a calda viçosa está sendo prepa-rada e distribuída por empresas que comer-cializam os sais em mistura, com texturabastante fina, com quase 100% de solubi-lidade.

Produtos à base de cobre

Segundo Chalfoun (1999), o largo espec-tro dos fungicidas cúpricos, o menor riscode indução de resistência à ferrugem, de-monstrado através de 50 anos de sua utili-zação, sua menor fitotoxidade e toxidadeaos inimigos naturais e insetos entomopa-togênicos e menor risco de danos ao meio

ambiente, foram alguns dos motivos que omantiveram como componente indispensá-vel na prática de manejo integrado de doen-ças e nutrição do cafeeiro. Além disso, oscúpricos exercem um “efeito tônico” sobrea cultura do café, dificilmente reproduzidopor outros grupos químicos de fungicidas.

No trabalho de Cunha et al. (2004), verificou-se que os tratamentos com cúprico e caldaviçosa foram eficientes no controle da fer-rugem e cercosporiose, quando se iniciou

a aplicação com baixa incidência das do-enças, além de preservar o enfolhamentoe, conseqüentemente, proporcionar bonsíndices de produtividade (Quadro 10).

Assim, pode-se afirmar que a utilizaçãode fungicidas cúpricos na cafeicultura fami-liar é uma ferramenta indispensável para oPrograma Integrado de Manejo das Doen-ças do Cafeeiro.

Para a utilização dos produtos à basede cobre (óxido cuproso, sulfato tribásicode cobre e hidróxido de cobre) no cultivoorgânico, a entidade certificadora deve serconsultada previamente.

Outros produtos alternativos

Produtos naturais estão sendo avalia-dos em experimentos no controle de doen-ças do cafeeiro como a calda viçosa, rocksil(pó de rocha), pironat (extrato pirolenhoso),ecolife (ácidos orgânicos e bioflavonóides),biofertilizante, hipoclorito de cálcio, silica-to de cálcio e trichonate (Trichoderma sp.).Nos resultados com um ano de avaliação,os produtos mais eficientes em relação àtestemunha foram a calda viçosa, o rocksile o ecolife que apresentaram, respectiva-mente, 19,7%, 24,0% e 27,3% de incidênciade ferrugem, no período de maior ocorrên-cia da doença, enquanto que a testemunhaatingiu 37,5% em cafeeiros com carga pen-dente alta6 .

Calda viçosa 5.500 b 6.380 b 616 a 635 84 b 58 a 42 a 43

Oxicloreto de cobre 3.800 b 7.580 b 580 a 618 85 b 66 a 43 a 48

Epoxiconazole e cobre 1.130 a 2.700 a 588 a 586 92 b 73 a 38 a 42

Testemunha 14.540 c 7.940 b 920 b 685 117 a 14 b 72 b 45

QUADRO 10 - Valores médios da área abaixo da curva de progresso de incidência de ferrugem(AACPIF), de cercosporiose (AACPIC), produção e desfolha em cafeeiros sub-metidos a diferentes tratamentos químicos - Lavras1, MG em 2005

NOTA: Médias seguidas de mesma letra na coluna, em cada ano, não diferem entre si pelo Teste

de Scott-Knott ao nível de significância de 5%.

(1) Fazenda Experimental de Lavras (FELA) da EPAMIG.

TratamentosAACPIF AACPIC

Produção(sacas

beneficiadas/ha)

Desfolha(%)

2001 2001 2001 20012002 2002 2002 2002

QUADRO 9 - Composição da calda viçosa para

100 L de água

Sulfato de cobre pentaidratado 1.000

Sulfato de zinco 300

Sulfato de magnésio 400

Ácido bórico 100

(1)Cloreto de potássio 400

(2)Óxido de cálcio ou hidróxido

de cálcio 350-550

Quanti-dade(g)

FONTE: Zambolim et al. (1999).NOTA: Corrigir pH para 6,0-6,5.(1) Em sistemas orgânicos é substituído porsulfato de potássio. (2) A quantidade de óxidode cálcio ou hidróxido varia com a qualidade doproduto.

Componentes

6Trabalho em andamento dos autores.

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99Cafeicultura familiar

Tem-se estudado, também, extratos defolhas e de sementes de Coffea arabica eAzadirachta indica, fertilizantes foliares ehipocloritos como protetores na ocorrênciada ferrugem-do-café. Barbosa et al. (2004)estudaram o efeito desses produtos em mu-das de cafeeiro e verificaram que extratos fo-liares aquosos de Coffea arabica, Azadirachtaindica e de hipoclorito de sódio atenuarama incidência e a severidade da doença igual-mente, mas não superior ao Epoxiconazole+ piraclostrobin (Quadro 11). Outros estu-dos com esses produtos, em lavouras adul-tas e em produção, necessitam ser reali-zados.

O uso de silício na agricultura é umatecnologia cada vez mais utilizada pelosprodutores. Os efeitos que os silicatos deCa e Mg promovem nas plantas são vá-rios. O de aumentar a resistência ao ata-que de doenças (principalmente fungos)(KORNDORFER et al., 2003) é um deles.Em cafeeiros, os primeiros trabalhos mos-tram a redução do nível de infecção da cer-cosporiose em mudas, até a dose de, aproxi-madamente, 0,60 g de SiO2 por kg de subs-trato (SANTOS, 2002). Pozza e Pozza (2003)atribuíram a menor intensidade da cercos-poriose nas plantas tratadas com silício,à cutícula mais espessa com cerosidadeepicuticular mais desenvolvida, também, àalteração na nutrição do cafeeiro estimula-da pelo silício.

Trabalho realizado em laboratório porPereira et al. (2001) concluiu que o própolisna concentração de 2 mL/L de água, pro-porcionou uma inibição de mais de 99% dagerminação dos esporos.

MÉTODOS CULTURAISDE CONTROLE DASPRINCIPAIS DOENÇAS

O Quadro 12 apresenta o resumo dosmétodos culturais de controle das princi-pais doenças do cafeeiro.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O sucesso do controle das doenças docafeeiro pelo cafeicultor familiar passa pelo

Coffea arabica (F, A) 100 mL 1,47 a 0,94 a

Azadirachta indica (S, M) 100 mL 1,67 a 2,24 b

Ecolife 25 mL 16,44 c 5,74 c

P2O5, K2O, S, Mn, N, Fe, Mo, aminoácidos (AF) 200 g 8,08 b 2,84 b

NaclO (CI) 1200 mL 2,11 a 1,05 a

Epoxiconazol + piraclostrobin 60 mL 0,03 a 0,02 a

Testemunha 1 (água) _ 60,25 d 27,75 d

QUADRO 11 - Efeito de extratos de folhas (F) e de sementes (S), de Coffea arabica e Azadirachta

indica, obtido com água (A) e metanol (M); adubos foliares (AF), hipoclorito de

sódio (CI), ecolife (ácidos orgânicos e bioflavonóides) e fungicidas na incidência e

severidade da ferrugem em mudas de café

FONTE: Dados básicos: Barbosa et al. (2004).

NOTA: Médias seguidas de mesma letra na coluna, não diferem entre si pelo Teste de Scott-Knott

ao nível de significância de 5%.

Tratamentoskg ou L/100L

de águaSeveridadeIncidência

A integração de todos esses conheci-mentos permitirá ao cafeicultor convivercom as doenças sem que elas causem danoseconômicos a sua atividade. Não basta ape-nas empregar fungicidas de última geração,sem a devida atenção às práticas culturais.

conhecimento das doenças, dos sintomasque elas causam nas plantas, dos fatoresambientais que as favorecem, das práticasculturais que atenuam os seus danos, domomento correto e racional do controle quí-mico etc.

No campo

Destoca e preparo bem-feitos do solo Roseliniose (mal-dos-quatro-anos)

Genético Ferrugem

Fertilização adequada Ferrugem, cercosporiose, mancha-de-Phoma

e Ascochyta, amarelinho

Quebra-vento Manchas-de-Phoma e Ascochyta, mancha-

aureolada e antracnose

Adensamento Cercosporiose

Espaçamentos abertos Ferrugem

Desbrotas e podas Ferrugem

Evitar estresse hídrico e nutricional Amarelinho, cercosporiose

Equilíbrio ambiental Ferrugem, mancha-anular

Nos viveiros

Proteção contra ventos frios Cercosporiose e mancha-aureolada

Substrato rico e solo com textura adequada Rhizoctoniose e cercosporiose

Controle da umidade (irrigação e ambiente) Cercosporiose, mancha-aureolada e rhizocto-

niose

QUADRO 12 - Métodos culturais para controle de doenças

DoençaMétodos de controle

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100 Cafeicultura familiar

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Por outro lado, as pesquisas com produ-tos alternativos (naturais, artificiais menostóxicos, biológicos, etc.), para o controlede doenças do cafeeiro, ideal para cafei-cultores de economia familiar, ainda são li-mitadas e recentes e necessitam de con-tinuidade e abertura de novas linhas depesquisa por parte dos agentes financia-dores, visando o desenvolvimento de no-vos produtos.

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102 Cafeicultura familiar

1Estudante Engenharia Agrícola e Ambiental, Bolsista FAPEMIG, UFV - Depto Engenharia Agrícola CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correioeletrônico: [email protected]

2Engo Agrícola, D.Sc., Pesq. EPAMIG-CTZM, Vila Gianetti, 46, Caixa Postal 216, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: [email protected] Agro, Ph.D., Pesq. EMBRAPA Café/UFV - Depto Engenharia Agrícola CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: [email protected]

INTRODUÇÃO

O atual panorama da cafeicultura fami-liar brasileira revela que não há um planonacional eficiente para o desenvolvimentoda atividade, haja vista que os benefíciosoferecidos aos produtores agrícolas nãotêm atingido a esse segmento. Sem acessoao crédito, técnicas e insumos modernos,a atividade cafeeira em nível familiar ficacom reduzidas condições de prosperida-de, visto que os pequenos produtores têmpoucas possibilidades de comercializar aprodução diretamente com os mercados

consumidores, ou de retê-la, aguardandomelhores preços. Em geral, vendem o pro-duto aos atravessadores, que percorrem asunidades produtivas, desqualificando epagando pelo produto o preço que melhorlhes convém.

Contudo, essas propriedades, mesmosem os benefícios ou incentivos governa-mentais, quando computados conjunta-mente, geram produções expressivas, prin-cipalmente para atender à demanda internade café.

O conceito do café produzido pelo agri-

cultor familiar revela, muitas vezes, umproduto com baixa qualidade, altos níveisde contaminação e, conseqüentemente,baixo valor agregado. Para que essa realida-de possa ser mudada, a palavra qualidadedeve ser incorporada ao processo produ-tivo. A qualidade dos grãos de café nãopode ser exclusividade dos grandes produ-tores, mas sim de todos os cafeicultoresque estão realmente preocupados com oproduto inserido no mercado, seja ele umagricultor familiar, seja ele um grande empre-sário agrícola.

Desenvolvimento de tecnologias de colheita e pós-colheitapara a cafeicultura familiar

Roberta Martins Nogueira1

Sérgio Maurício Lopes Donzeles2

Juarez de Sousa e Silva3

Resumo - A cafeicultura familiar brasileira não tem um fácil acesso aos benefíciosoferecidos aos produtores agrícolas. Em geral, vendem o produto aos atravessadorescom qualidade e preço inferiores. Nesse aspecto, o desenvolvimento de técnicas decolheita e pós-colheita é de suma importância para o desenvolvimento de umacafeicultura de sucesso. Na colheita seletiva apanha-se apenas o café no ponto ideal decolheita, o que facilita a realização das operações subseqüentes. Na pré-limpeza, sãoretiradas as impurezas mais grossas, sendo a utilização da abanadora mecânica comacionamento manual, uma alternativa de baixo custo e alta eficiência. Já para o processode lavagem, pode-se aplicar o lavador Maravilha com recirculação de água ou o lavadorportátil, ambos facilmente construídos e que permitem um plano de pós-colheita maiseficiente. Para a secagem, apresenta-se o terreiro híbrido, onde se adapta um sistemade ventilação ao terreiro convencional; a secagem em silos, que utiliza o próprio silo desecagem para o armazenamento do produto e o secador Flex, que apresenta váriasformas de utilização de energia. Por fim, o armazenamento do produto deve serrealizado de forma que se assegurem as características obtidas após a secagem doproduto evitando deteriorações.

Palavras-chave: Café. Colheita. Secagem. Armazenamento. Agricultura familiar.

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103Cafeicultura familiar

Nesse aspecto, o desenvolvimento denovas técnicas de colheita e pós-colheitaé de suma importância para o desenvolvi-mento de uma cafeicultura racional, ondesão preservadas as características qualita-tivas desejáveis para a comercialização doproduto, além de associar investimentoinicial compatível com a atividade e funcio-nalidade operacional comprovada.

TÉCNICAS DE COLHEITAE PÓS-COLHEITA

As etapas de colheita e pós-colheita,se bem conduzidas, apresentam contribui-ções expressivas sobre a qualidade finaldo produto.

Colheita

O método de colheita utilizado na maio-ria das propriedades familiares é a derri-ça manual, onde os frutos são derriçadossobre um pano ou diretamente no chão edepois varridos. O emprego desse méto-do origina uma mistura de frutos verdes,maduros (cereja e verdoengos), passase secos, folhas, ramos, torrões e pedras,devendo ser limpo e separado nas suasdiversas frações, para que possam sersecados separadamente.

Uma opção para os cafeicultores fami-liares é a aplicação da técnica de colheitaseletiva (Fig. 1), onde se colhe apenas ocafé no ponto ideal de colheita, o que facilitaa realização das operações subseqüentes.

Figura 1 - Colheita seletiva

Se por um lado essa técnica requer um maiorconsumo de mão-de-obra, devido às váriaspassadas pela lavoura, por outro há um me-nor investimento nas operações de pré-limpeza. Essa tecnologia apresenta uma altaaptidão para aplicação familiar, onde a mão-de-obra conta basicamente com pessoasda família. Outro ponto relevante é a redu-ção do volume colhido em uma só etapa.Nesse caso há um menor esforço no proces-samento do lote e maior probabilidade deum controle mais eficiente, devido à rea-lização das etapas de pós-colheita comlotes mais homogêneos. Assim, é notada amelhoria na qualidade dos grãos quanto àcontaminação e à qualidade de bebida.

Pré-limpeza

Nessa etapa do processamento, são re-tiradas as impurezas maiores como folhas,galhos e pedras. Em nível familiar, geral-mente, essa operação é realizada por pe-neiramento manual ou abanação (Fig. 2).A abanação do produto colhido é uma dasoperações que demandam mais tempo dosapanhadores de café e exigem um maioresforço físico.

Uma alternativa tecnológica de baixocusto e acessível ao cafeicultor familiar é autilização da abanadora mecânica com acio-

namento manual (Fig. 3), cuja proposta édeixar ainda na lavoura boa parte das impu-rezas, além de reduzir o esforço físico e ainsalubridade, quando comparada com oprocesso convencional. Nesse tipo de equi-pamento é adaptado sobre um cavalete umconjunto de peneiras que possui um sis-tema vibratório acionado manualmente oupor um motor de 0,5 cv de baixa rotação euma moega responsável por sua alimenta-ção. O seu funcionamento é com base nasdiferenças, nos tamanhos dos grãos e impu-rezas. Nesse caso, os grãos caem na primei-ra peneira, que retém e encaminha as impu-rezas para a lateral do equipamento. Os grãoslimpos ficam retidos na segunda peneira,onde são encaminhados para um cesto decoleta do produto. Esse equipamento é facil-mente levado à lavoura por ser muito levee portátil e sua utilização fica ainda maiseficiente, quando avaliamos os benefíciosdos restos culturais deixados na lavoura.

Separação hidráulica(lavagem)

Essa etapa do processamento de caféé imprescindível, quando se fala de cafésde qualidade. Na lavagem, separam-se asimpurezas que não foram retiradas na pré-limpeza e também faz-se a separação do ca-

Figura 2 - Limpeza e abano manual em peneira

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fé bóia dos cafés pesados (cafés verdes ecerejas). No âmbito da cafeicultura fami-liar não é comum encontrar esse tipo deequipamento. Infelizmente, o que a indústriabrasileira tem a oferecer aos agricultoressão equipamentos caros, de difícil manu-tenção e elevado custo operacional. Nes-ses termos, alguns equipamentos de baixocusto, fácil construção e manejo foram

Uma das grandes desvantagens do la-vador Maravilha tradicional é o consumoexagerado de água, que, dependendo doprojeto e do estado de impureza do café,pode chegar a dez litros de água para cadalitro de café. Entretanto, dependendo dadisponibilidade de água, pode ser cons-truído para grandes capacidades de sepa-ração.

Havendo escassez de água, pode-se adap-tar um sistema de recirculação total ouparcial da água de lavagem com posteriortratamento antes de lançá-la nos cursosd’água. O alto consumo aparente de águado projeto deve-se ao fato de, no lavadortipo Maravilha, grande parte da água serusada para o transporte do café pela bicade separação.

O sistema completo consiste em umtanque de recepção, calha de separação,tanque de recirculação com gincanas parapurificação da água de lavagem e uma bom-ba com rotor semi-aberto para recirculaçãoe descarga do efluente.

Lavador portátil

O lavador portátil é um modelo muitosimples e ideal para pequenas produçõese consta simplesmente de dois depósitos.O primeiro retém a água de lavagem, sendoconstruído em chapa metálica e fixo em

Figura 3 - Abanadora portátil com acionamento manual

Figura 4 - Lavador Maravilha modificado

desenvolvidos para suprir essanecessidade.

Lavador Maravilha

O lavador Maravilha (Fig. 4)consiste basicamente de um tan-que de alvenaria e uma calha me-tálica ou de madeira, com saídaramificada e provida de fundo fal-so, onde cai o material denso (ce-reja, verdoengos e impurezas pe-sadas que não foram separadasdurante a abanação). Possui ain-da um sistema de turbilhonamen-to (injetor de água sob pressãocontrolada), que separa os caféspesados das pedras, retornando-os à superfície pela calha de ce-rejas pesadas.

rodas. O segundo é móvel (basculante) econstruído com chapa perfurada ou comtela e serve para reter o café com maior den-sidade (Fig. 5). A grande vantagem desselavador é a facilidade de ser transportado,sendo, portanto, uma ferramenta muitoprática numa propriedade familiar. Umamodificação que pode ser feita é a cons-trução do primeiro depósito em alvenaria,

que por um lado delimita a porta-bilidade do equipamento, mas poroutro reduz os custos de cons-trução (Fig. 6). No manejo do la-vador, o café bóia é retirado comuma peneira comum ou com umapá construída em chapa perfura-da. Outra modificação que podeser feita para reduzir ainda maisseu custo e que é utilizada pelosprodutores de baixa renda, é asubstituição do basculante por umbalaio. Sua operacionalização con-siste em encher a caixa d’água atéo nível não superior ao da alturado balaio, depois coloque o caféno balaio, até sua terça parte, esubmerja-o na caixa d´água, reti-rando a bóia com o auxílio de um

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dutos, em virtude de seu elevado teor deágua inicial, geralmente próximo de 60% b.u.Com isso, a possibilidade de ocorrer fer-mentações durante a primeira fase de se-cagem é maior, causando redução na qua-lidade do produto.

Um dos problemas encontrados no pro-cesso de secagem de café reside no fato dea operação ser realizada em secadores pro-jetados para outros grãos e adaptados parao café, resultando em alto custo operacio-nal e em baixa eficiência energética. Nesseaspecto, algumas tecnologias de secagemde café enquadram-se perfeitamente nopanorama da cafeicultura familiar e atendeàs exigências das peculiaridades do pro-duto.

Terreiro

O uso exclusivo do terreiro por muitoscafeicultores deve-se à falta de informaçãotecnológica, muitas vezes à não-preocupaçãocom as características qualitativas do pro-duto depois da secagem, ou ao baixo po-der aquisitivo e nível técnico da proprie-dade.

No terreiro, o desenvolvimento de mi-crorganismos na superfície dos frutos, de-vido ao alto teor de umidade e da tempera-tura do produto pode acelerar o processode fermentação. No processo de secagemem terreiro, o café é seco pela ação dos raiossolares. É aconselhável, durante o pro-cesso, trabalhar com lotes homogêneos,considerando-se tanto a época de colhei-ta quanto o estádio de maturação ou teorde umidade, para obtenção de um produtofinal uniforme e de boa qualidade.

O terreiro convencional pode ser cons-truído de cimento, tijolos, asfalto e chãobatido, devendo o produto ser distribuídosempre em camada fina. O terreiro com pi-so de terra apresenta menor rendimento desecagem e pior aspecto visual do produtoem relação àquele secado em terreiros compiso de outros materiais de construção. Pre-ferencialmente, a secagem deve ser feitaem terreiros concretados, que são mais efi-cientes e apresentam menores riscos decomprometimento da qualidade.

Figura 5 - Lavador tipo “basculante” portátil

Figura 6 - Lavador para café tipo“basculante” fixo

caneco feito de chapa perfurada. Caso nãohaja água corrente suficiente para renova-ção contínua da água de lavagem do ca-fé, a do depósito deve ser trocada a cada300 litros ou a cada cinco caixas de café deroça lavado.

Secagem

A secagem do café é uma operação de-cisiva para a qualidade final do produto,portanto a escolha adequada do método éde suma importância para o pequeno ca-feicultor obter produtos com maior valoragregado.

De acordo com Silva et al. (2005), a se-cagem do café é, comparativamente, maisdifícil de ser executada que a de outros pro-

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A realização do manejo do café no ter-reiro de forma correta é tão fundamental,quanto sua construção adequada. O cafévindo do lavador ou direto da lavoura apre-senta um elevado teor de umidade que, noinício da secagem, deixa a superfície do ter-reiro completamente molhada. O excessode umidade na parte inferior da camadadeixa o produto altamente suscetível à con-taminação. Para reduzir esse risco, deve-seabrir a camada de café pelo menos nos cincoprimeiros dias até formar pequenas leiras.As leiras devem ser quebradas e refeitascontinuamente ou em intervalos regularesde tempo nunca superior a 60 minutos. Essetrabalho deve ser realizado com o auxíliode um raspador-enleirador (Fig. 7), cons-truído em chapa no 12. Em todos os casos,o operador deve ter cuidado para que partedo terreiro seja raspada, de modo que fiqueexposta ao sol, a fim de propiciar, indireta-mente, a secagem do café na próxima virada.Ao abrir as leiras de café, o operador deveter o cuidado com a orientação ou posiçãodo sol. As leiras de café devem ficar para-lelas ou no mesmo sentido da sombra dooperador.

uma fácil rotação. O próprio produto asecar (café) constitui o material absorve-dor de calor nesse tipo de secador (Fig. 8).A ventilação natural é o meio que retira ocalor absorvido e elimina a umidade, comoacontece nos terreiros tradicionais ou seca-dores suspensos. Nesses secadores, o ca-fé passa simultaneamente por operaçõesde secagem e limpeza, dispensando, assim,a utilização de terreiros e não requerendooutra forma de energia.

A operação do secador solar rotativoUFV-JPC1 consiste em, depois de lavado,o café ser colocado diretamente nos se-cadores rotativos. Esses secadores devemser direcionados para norte-sul, ocupandoquatro posições durante o dia, como indi-cado na Figura 9. Antes de colocar o seca-dor em determinada posição, o produtodeve ser homogeneizado, por meio de pelomenos cinco giros no secador. Ao girar osecador, o operador deve ter o cuidado de

Figura 7 - Raspador-enleirador

Secador solar rotativo

O secador solar rotativo, registrado co-mo UFV-JPC1, é um melhoramento do seca-dor solar suspenso e fixo e consta apenasde uma caixa formada por laterais de madei-ra, com frente e fundos em tela de aço commalha quadrada de 4 mm. A caixa possuium eixo central, que é apoiado em doispequenos pilares de madeira, para permitir

Figura 8 - Vista geral dos secadores solares rotativos (UFV-JPC1)

Figura 9 - Diferentes posições do secador rotativo durante a secagem

Coberta de plástico

Noite

14 - 17 horas

10 - 14 horas

7 - 10 horas

45º45º

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fazê-lo de maneira lenta, para que o produtofique bem misturado.

Se as condições forem favoráveis, de-pois de cinco dias de exposição ao Sol, nocaso do café, o volume do material dentrodos secadores rotativos deverá estar emtorno de 60% do volume inicial. Nesseponto, o material de um secador deve sertransferido para outros dois, e o primeiroimediatamente recarregado, de acordo como esquema da Figura 10.

Terreiro suspenso

O terreiro suspenso ou secador tipotelado suspenso (Fig. 11), fruto da criativi-dade do cafeicultor brasileiro, já vem sen-do empregado com sucesso nos principaispólos da cafeicultura nacional. Por nãoestarem em contato direto com o piso doterreiro, que apresenta problemas de limpe-za e desinfecção, os grãos têm menor chan-ce de ser contaminados por microrganis-mos indesejáveis. As injúrias causadas aosfrutos normalmente provocadas pelo ma-nuseio do café no terreiro tradicional sãoreduzidas. Outras vantagens que se podecitar é a redução da mão-de-obra de seca-gem e seu custo de implantação.

Terreiro híbrido

De acordo com Donzeles (2002), o terrei-ro híbrido ou terreiro secador, é um terreiroconvencional, preferencialmente concreta-do, adaptado com um sistema de ventilaçãode ar aquecido por uma fornalha para asecagem do produto na ausência de radia-ção solar direta ou em período chuvoso.

Cada módulo do terreiro híbrido deveser constituído com as dimensões de 10 mpor 15 m, aproximadamente. Na direção docomprimento do terreiro convencional éadaptado, sob o piso, um duto de ventila-ção (duto principal), com seis saídas parao ar quente. Sobre estas saídas de ar, namesma direção do duto principal, é adapta-do um duto trapezoidal metálico perfurado(20% de perfuração). Os grãos são entãouniformemente distribuídos sobre o dutode aeração.

10%Vazio

40%Vazio

1º dia

5º dia

Disponível

Figura 10 - Esquema de funcionamento dos secadores rotativos

Figura 11 - Secador em telas suspensas para secagem solar

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A secagem do café em terreiro híbri-do pode ser feita continuamente, usando aenergia solar nos dias ensolarados (da ma-neira tradicional em terreiro, das 9 h até15 h) e ar aquecido por uma fornalha a car-vão durante à noite, ou em períodos chu-vosos (das 16 h às 8 h do dia seguinte)(Fig. 12 e 13). Durante o período chuvoso,o produto deve ser coberto por uma lonaimpermeável (polietileno) e sem perfura-ções, fixada ao longo da leira do produtode maneira que o ar de exaustão só escapepelas extremidades (Fig. 14). Assim, a seca-gem poderá ser realizada durante as 24 ho-ras, por meio da utilização da energia solar

em dias ensolarados e da energia proveni-ente da combustão de biomassa (lenha oucarvão vegetal) ou gás, durante a ausênciada radiação solar direta. Na ausência de ra-diação solar direta, incidência de chuvas edurante o período noturno, o café foi enlei-rado sobre os dutos para secagem com araquecido e a camada de grãos, cuja espes-sura é de, aproximadamente, 0,40 m, foirevolvida manualmente por meio de rodosmetálicos, em intervalos regulares de trêshoras. Esse revolvimento teve como finali-dade reduzir o gradiente de umidade esta-belecido entre a camada inferior e a camadasuperior das leiras durante a secagem e,

conseqüentemente, proporcionar maioruniformidade no teor de água dos grãosdurante a secagem.

O estudo foi realizado utilizando-seterreiros híbridos com 150 m² ou 7.000 L decapacidade para a secagem de café. Paraos terreiros estudados, o ar quente foi for-çado a passar através da leira de grãos decafé por um ventilador com motor de 5 cvacoplado a uma fornalha capaz de aquecer1,5 m³.s-1 de ar até, aproximadamente, 60°C.Em média, os tempos necessários para asecagem dos cafés nos terreiros híbridosforam 4,6 e 5,6 vezes menor do que o tem-po necessário para secar o café natural e o

Figura 12 - Terreiro híbridoNOTA: A – Vista geral do terreiro híbrido, antes da montagem dos tubos de aeração; B – Detalhe da tomada de ar para o duto de

aeração; C – Entrada de ar do duto do sistema de ventilação; D – Colocação do duto no sistema de ventilação.

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Figura 13 - Detalhes do terreno híbridoNOTA: A e B – Detalhe da montagem dos dutos de aeração; C – Detalhe da formação da leira; D – Leira pronta para ser coberta.

A B

cereja descascado, respectivamente, emterreiro convencional para as condiçõesda Zona da Mata de Minas Gerais, comisso pode-se concluir que há necessidadede, aproximadamente, 800 m2 de terreiroconvencional para cada terreiro híbrido.

Secador Flex

O secador Flex (Fig. 15) é uma fusão dosecador de camada fixa tradicional com osecador por convecção natural e, ainda,com secador solar.

O ar de secagem pode ser aquecido

com a energia de combustão da lenha, docarvão, do gás, com energia solar ou coma mistura de energia solar e energia decombustão. Pelo fato de usar diferentesfontes de energia, a denominação secadorFlex foi uma homenagem à indústria auto-

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Figura 14 - Terreiro híbrido com cobertura de polietileno para o período chuvosoNOTA: A – Cobertura da leira por causa das chuvas; B – Sistema de ventilação em funcionamento.

A B

Figura 15 - Secador Flex com “telhado coletor” de energia solar e os demais componentesNOTA: A – Vista geral; B – Vista com detalhamento interno.

BA

mobilística brasileira que produziu o impor-tante motor bicombustível (flex), para qual-quer proporção, álcool ou gasolina, comocombustível.

Basicamente, o secador Flex, à seme-lhança do secador por convecção natural,é composto por uma fornalha comum, umtrocador de calor de tubo único e uma cha-

miné. Ao conjunto, foi adicionado um ven-tilador para forçar a convecção do ar e ven-cer facilmente a resistência oferecida pelascamadas de grãos mais profundas. Nessecaso, o secador funciona como se fosse decamada fixa tradicional com uma fornalhapara o aquecimento indireto do ar de se-cagem.

Além de forçar a convecção na câmaraplenum do secador, outra função do ven-tilador é fazer com que o ar de secagempasse pelos canais do telhado coletor e sejaaquecido pela energia solar. Como ditoanteriormente, o aproveitamento dessaenergia, além de reduzir substancialmenteo consumo de outros combustíveis, não é

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poluidora e o telhado coletor é apenas umpouco mais caro que um telhado comum.

É importante observar que na ausênciade eletricidade, fato muito freqüente nomeio rural, a secagem não será interrompi-da, pois o secador terá funcionamento con-tinuado pela convecção natural. Nesse ca-so, deve-se reduzir a altura da camada degrãos ou revolvê-la com mais freqüência.

Secagem à baixa temperatura

Quando a temperatura do ar de seca-gem estiver até 10ºC acima da temperaturaambiente, os sistemas de secagem são debaixas temperaturas. Dentre as alternativasdisponíveis para a secagem na fazenda,aquela que usa o ar a baixas temperaturasem silos tem-se mostrado de grande poten-cial para a manutenção da qualidade dosgrãos e para a redução de energia utilizadapara o aquecimento do ar de secagem.

Na secagem a baixas temperaturas, força-se, com o auxílio de um ventilador, o ar nascondições ambientais a passar pela camadade grãos para a retirada do excesso de água.Fatores como as condições ambientes e,em alguns casos, dependendo do produto,a velocidade de colheita podem levar aoinsucesso no uso da tecnologia. Entretan-to, nenhum dos fatores mencionados temgrau de limitação que impeça a adoção dosistema na maioria das regiões brasileiras ea secagem com temperatura do ar próximada temperatura ambiente pode, facilmente,ser aplicada em pequenas propriedades, seo agricultor decidir construir o seu própriosilo secador.

Um sistema de secagem com ar natu-ral, geralmente, envolve a secagem em silosou tulhas. Devido ao pequeno fluxo de arutilizado, apresenta baixa velocidade desecagem e necessita de mais tempo parafinalizar o processo que os sistemas tra-dicionais com o ar aquecido a altas tempe-raturas. Esse tipo de secagem é, portanto,muito dependente das condições atmosfé-ricas do local onde está a unidade secadora-armazenadora. Em boa parte das regiões pro-dutoras de grãos, o potencial de secagemdo ar ambiente e o pequeno aquecimento

Figura 16 - Silo secador-armazenador

provocado pelo ventilador (3ºC a 4ºC) sãosuficientes para propiciar a obtenção doteor de umidade final recomendado paraum armazenamento seguro.

O silo secador-armazenador, como mos-trado na Figura 16, apresenta algumas ca-racterísticas especiais que não são exigidaspara os silos empregados apenas para aarmazenagem.

O piso deve ser construído com chapasmetálicas perfuradas, ou com material alter-nativo como tela de arame ou ripado, comno mínimo 20% de área livre, para promovera distribuição uniforme do ar.

O ventilador deve fornecer quantida-de de ar suficiente para realizar a secagemde toda a massa de grãos sem que ocorraa deterioração nas camadas superiores.As dimensões do silo (diâmetro e altura) eas características iniciais do produto deter-minam a potência do ventilador para o sis-tema.

No sistema tradicional de secagem comar natural (enchimento em camada única),depois de transcorrido determinado tempode secagem, distinguem-se três faixas deumidade. Na primeira, formada pela massade grãos já secos, o produto já atingiu oequilíbrio higroscópico com o ar de seca-gem e o ar não ganha nem perde umidade.Na segunda, denominada frente de seca-gem, está ocorrendo a transferência de umi-

dade do grão para o ar de secagem. A ter-ceira ou última faixa é formada por grãosúmidos, cujo teor de umidade está próximoda umidade inicial. Ao passar por essa sub-camada, o ar está com sua capacidade desecagem esgotada e pode, dependendoda umidade inicial, provocar um pequenoaumento no teor de umidade das camadassuperiores. A temperatura na última faixa éinferior à temperatura do ar de secagem,visto que o ar é resfriado, devido à troca decalor com o produto na frente de secagem.Dentro do silo, a secagem com ar naturalinicia-se na subcamada inferior, rente àchapa perfurada que forma o fundo falsodo silo e, com o decorrer do tempo, atingea superfície superior da camada de grãos.

O silo pode ser carregado de duas for-mas:

a) enchimento em uma etapa: consisteem carregar o silo em até três dias.Esse tempo é curto em relação aotempo total de secagem, o qual, de-pendendo das condições atmosféri-cas, pode durar mais de 20 dias:

- vantagens: poucos danos mecâni-cos, em virtude da redução no ma-nuseio do produto; baixo custo emregiões de baixa umidade relativa;pouca mão-de-obra; recebimentodo produto não está condicionadoao andamento da secagem do mate-rial carregado,

- desvantagens: elevado tempo desecagem; risco de deterioração dascamadas superiores com alto teorde umidade, podendo haver conden-sação de umidade; risco de secagemexcessiva das camadas inferiores,quando for usada uma fonte suple-mentar de aquecimento sem con-trole adequado;

b) enchimento por etapas: uma cama-da só é colocada, se a última já esti-ver parcialmente seca. Acrescentam-se camadas até o limite estabelecidopela capacidade do silo e pelo fluxodo ar de secagem:

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- vantagens: secagem mais rápidaque a do método de enchimento emuma etapa; menores riscos de dete-rioração; o fluxo mínimo necessárioé menor que o do método de umaetapa,

- desvantagem: exigência de maioratenção no controle do processo.

Operação do ventilador

O manejo da ventilação durante a seca-gem depende do teor de umidade do produ-to no silo e do clima da região. O ventiladordeve ficar ligado continuamente, enquan-to o produto da camada superior estivercom umidade superior a 17% de base úmi-da (b.u.). Para teor de umidade inferior, ligaro ventilador somente quando a umidaderelativa estiver abaixo de 70%. O monito-ramento consiste na inspeção periódica(diária ou semanal) da temperatura e daumidade da massa de grãos, verificando sea massa está secando ou sofrendo algumaforma de deterioração. Ao final da secagemcom ar levemente aquecido, insufla-se arnatural para manutenção do produto a umatemperatura próxima à do ambiente.

O cálculo da quantidade do ar de seca-gem e a escolha dos equipamentos devemser feitos com muito cuidado. A vazão dear deve ser tal que permita que a frente desecagem alcance as camadas superioressem ocorrência de deterioração do produtoou que uma nova subcamada seja adicio-nada, quando a anterior já estiver seca.

DETERMINAÇÃO DOTEOR DE UMIDADE DO CAFÉ

Método Edabo

Apesar dos vários tipos de determina-dores de umidade (diretos ou indiretos) dis-poníveis no mercado, eles são, em geral,de custos relativamente elevados e, muitasvezes, os fornecedores não oferecem a de-vida assistência técnica. Como necessitamde aferição ou calibração periódicas e porcausa das dificuldades de operação e custode um sistema-padrão, foi desenvolvido ométodo de Evaporação Direta da Água emBanho de Óleo (Edabo), uma variação do

método de destilação, de baixo custo e demesma precisão do método-padrão. Na Fi-gura 17, vê-se um esquema simplificado dométodo Edabo, que pode ser construídocom os recursos de uma carpintaria sim-ples. Caso contrário, pode-se montar umsistema Edabo com utensílios domésticosou de laboratório, termômetro e uma balan-ça com capacidade para pesar 500 g comprecisão de 0,5 g (Fig. 18 e 19).

Determinação do teor deumidade de um lote de café

Para determinar a umidade por meio doEdabo, o operador deve proceder de acor-do com os exemplos a seguir:

a) fazer amostragem correta do lote;

b) pesar 100 g do café e colocar emum recipiente com aproximadamente10 cm de diâmetro e 20 cm de altu-ra (leiteira de um litro), resistente aaltas temperaturas, dotado de tampaperfurada (tipo ralo), com um furomaior para inserir um termômetrograduado até 200°C;

c) adicionar óleo de soja até cobrir acamada de grãos;

d) pesar o recipiente + produto (grãos)+ óleo + termômetro e anotar a massainicial (Mi);

Figura 17 - Esquema simplificado do método Edabo de determinação de umidadeconstruído em madeira

Figura 18 - Esquema de um Edabo para laboratório

Termômetro

Óleo e grãos

BalançaAquecimento

Peso inicial

1

Evaporação

2

Peso final

3

458,9 g 445,4 g

PesoEscala

Balança

Termômetro

Grão + óleo

Aquecedor a álcool

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e) aquecer o conjunto, por, aproximada-mente, 15 minutos, até atingir a tem-peratura indicada no Quadro 1 (nocaso do café beneficiado, 190oC).A seguir, retirar a fonte de calor, espe-rar que cesse o borbulhamento e, porpesagem, obter a massa final (Mf);

f) o resultado de Mi - Mf é o teor deumidade em porcentagem, base úmi-da.

Por exemplo, se

Mi = 458,9 g e Mf = 445,4 g,

Ma = Mi – Mf = 13,5 g,

ou seja, o teor de umidade do lote éde 13,5% b.u.

QUADRO 1 - Temperatura para determinação do teor de umidade pelo método Edabo

Arroz em casca 200

Arroz beneficiado 195

Café em coco 200

Café descascado 195

Café beneficiado 190

ProdutoTemperatura

(oC)

ARMAZENAMENTO

Após a secagem, os grãos e principal-mente o café (coco, descascado e benefi-ciado) devem ser armazenados em lugaresapropriados para que não sofram alteraçõesna qualidade inicial. Apesar de pouco co-mum em propriedades de agricultura fami-liar, a armazenagem a granel de café benefi-ciado é um procedimento que vem sendoadotado por produtores com avançado ní-vel tecnológico e algumas empresas comgrande mercado de café com característicasuniformes.

Uma das objeções ao armazenamentode café a granel é a dificuldade de reali-zar inventários, ou quantificar o produto

estocado. Qualquer pequena variação nadensidade aparente do produto pode cau-sar grande erro na avaliação do estoque.Tal fato não se verifica, quando o produtoé armazenado em sacos que permitem acontagem individual.

A importância para se realizar avalia-ção do estoque reside no alto valor do sacode café que é, em geral, quinze vezes maiorque o mesmo peso do milho. Uma outragrande vantagem do armazenamento docafé a granel se refere à possibilidade de me-canização, principalmente para as coope-rativas que poderão diminuir sensivelmentea mão-de-obra para movimentação da sa-caria.

O local para a construção de silos, emfazendas, deve ser de fácil acesso e, prefe-rencialmente, próximo à unidade de benefi-ciamento dos grãos. No caso de café, deve-se verificar a seqüência operacional daunidade de preparo, secagem e beneficia-mento. O ideal é que a construção seja reali-zada sob uma área coberta, o que possibilitacarga e descarga independentes das con-dições climáticas, além de permitir melhorproteção do produto armazenado.

O silo apresentado neste trabalho temcapacidade para armazenar 60 sacos de60 kg e, segundo a necessidade, o agricul-tor poderá construir silos maiores ou vá-rios pequenos silos, lado a lado (Fig. 20).Além de atender à necessidade de arma-zenagem, deve-se optar por uma dimensãotal, que o custo por tonelada de produtoarmazenado seja cada vez menor. Quantomaior o silo, menor é o custo por toneladaestocada. Apesar de mais caro, vários silospequenos proporcionam maior opção demanejo da safra armazenada e, no caso docafé, pode-se facilmente, armazenar o pro-duto por classes diferenciadas.

Na impossibilidade de construir umacobertura (componente altamente impor-tante), os silos podem ser construídos aoar livre. No entanto, as mesmas condiçõesde preparo do local devem ser observadas,ou seja, o terreno deve ser plano, e bemdrenado, limpo e arejado, evitando-se lo-cais próximos a árvores; se o piso não for

Termômetro

Óleo e

grão

Fogo

Álcool

Vista lateral

Vista superior

Figura 19 - Sistema Edabo para três repetições

Milho 195

Soja 135

Sorgo 195

Trigo 190

Feijão 175

ProdutoTemperatura

(oC)

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cimentado, deve ser feita uma boacompactação para o caso de des-carga por gravidade. Caso o si-lo seja construído diretamentesobre o solo, deve-se ter o maiorcuidado na construção da base,que deve ser bem impermeabili-zada.

A construção de um silo teminício com a marcação e o posi-cionamento do seu elemento desustentação (parede para o silocom descarga central) ou (basecircular para o silo secador ousilo armazenador com diâmetrosuperior a 2,50 m).

As paredes ou a base de sus-tentação dos silos devem ser cons-truídas em terreno compactadocom tijolos maciços e sobre umalicerce de concreto (verificar as

ser contínua e construída da maneira con-vencional, diretamente sobre as paredes.

O local para a construção da laje deveser marcado nas dimensões especificadase uma fôrma de madeira deverá ser construí-da. Na construção de silos maiores, podem-se confeccionar vários segmentos de lajespara diminuir o esforço e facilitar a suacolocação nas partes de suporte do silo.No segmento central ou no meio da divi-são da laje para silos com descarga central,um elemento circular com 150 a 200 mm dediâmetro deixará um furo central na laje.É por esse furo que o produto será descar-regado.

Se as divisões forem feitas por meio deripas, a espessura destas deverá ser consi-derada na largura final da laje, mantendocada metade com 1,10 x 2,20 m, no caso dosilo pequeno. Todas as marcações devemser bem-feitas para evitar correções futurase assegurar que o furo fique no centro dalaje.

Para a confecção dos segmentos de lajesdevem-se usar nove vergalhões de 3/4”,com 2,15 m, e oito vergalhões de 3/8”, com1,05 m. Os vergalhões maiores devem seramarrados transversalmente aos menorescom arame recozido, procurando manter uma

distância de 12 a 28 cm, respectivamente,entre eles. Para fundir a laje, a ferragem de-ve ser apoiada no fundo da fôrma, colocando-se sobre ela uma pequena camada de con-creto. Puxa-se um pouco a ferragem, demodo que esta fique, aproximadamente, a1 cm da base da laje. Aconselha-se colocarantes da concretagem uma forração complástico ou papel no fundo da fôrma, parafacilitar a retirada da laje. Terminada a con-cretagem, aguarda-se pelo menos cinco diaspara desenformar a laje, que deve ser molha-da duas vezes ao dia, durante esse período.Após esta etapa, a laje pode ser retiradae colocada sobre as paredes de sustenta-ção.

O esqueleto de sustentação do silo éconstruído basicamente de uma armaçãofeita com tela de arame (para cercado) evergalhões que servem para facilitar a cons-trução e dar resistência evitando o rompi-

Figura 20 - Silo armazenador com descarga central

Juar

ez d

e So

usa

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lva

condições do solo para dimensionar e cons-truir o alicerce). A argamassa para a constru-ção das paredes ou base deve ter o traço(1,5:6:2) ou 1,5 parte de cimento, para 6 par-tes de areia e 2 partes de terra de barrancopeneirada.

Quando da marcação e construção dasparedes do silo com descarga central, deve-se buscar uma posição no terreno que fa-cilite a retirada do produto. As paredes po-dem ser rebocadas com o mesmo traçousado para assentamento dos tijolos (1:6:2).

No caso de silos maiores e com descar-ga central, pode-se optar pelas paredes desustentação com vigas de ligação, para re-forçar a segurança.

Na construção do silo com descargacentral, deve-se fundir uma laje em concre-to armado com ferragem 3/8 de polegadanas dimensões de 2,20 x 2,20 x 0,07 m (silode 3,5 t). No caso de silos maiores, a lajedeve ser 0,40 m superior ao diâmetro externodo silo. Deve-se utilizar concreto com traçode 1:3:3, isto é, uma parte de cimento paratrês partes de areia lavada e três partes debrita no 1. A laje poderá ser fundida em doissegmentos (facilidade de manejo), preferen-cialmente, em uma área limpa e plana. Casonão se disponha dessa área, a laje poderá

mento da parede do silo. A tela recomen-dada é aquela feita com arame no 14 e malhaigual ou menor que 50 mm.

A tela deverá ter as dimensões de 1,80 x6,30 m (11,4 m2). Separadamente, devem-sepreparar cinco pedaços de arame liso (ova-lado), com comprimento de 6,4 m, e oitovergalhões de 6,35 mm (1/4’’), com com-primento de 1,8 m. Os arames lisos, numaetapa posterior, serão utilizados na cons-trução de aros que ficarão dispostos emvolta da tela, no sentido de sua largura,dando-lhe a forma cilíndrica.

Com a tela aberta, atravessa-se em suasmalhas os oito vergalhões, no sentido dalargura da tela, distanciados, aproximada-mente, 0,80 m. O primeiro vergalhão deveser colocado a uns 0,40 m das extremidadesda tela. A finalidade desses vergalhões ésustentar verticalmente a armação da tela.Após a colocação dos vergalhões, faz-se acostura da tela, isto é, a união de suas extre-midades. Para realizar a costura da tela,basta retirar o último arame, aproximar asduas extremidades, de modo que os vérticesdas malhas fiquem alternados, e inserir no-vamente o arame retirado entre elas.

Terminada a costura, unem-se as pon-tas do arame costurador com aquelas das

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extremidades da tela. A partir desse ponto,a armação está pronta para receber os cincoarames ovalados que serão colocados hori-zontalmente e entre as malhas da tela demodo que dê o formato cilíndrico à armaçãoda tela. Esses arames devem ser distribuí-dos de forma que fique um em cada extre-midade e os outros três distanciados de0,50 m, aproximadamente. As duas extremi-dades devem ter 5 cm a mais, para que oaro fique no diâmetro correspondente daarmação.

Na amarração não deve ficar nenhumaponta de arame para dentro do esqueletocilíndrico. Essa observação é muito impor-tante, pois é por dentro do aramado queficará a lona plástica que dará impermeabi-lidade e envolverá o produto a ser armaze-nado e, em hipótese alguma, essa lonapoderá ser danificada, para que não com-prometa a hermeticidade e a conservaçãodo produto no silo.

Para concluir a armação do silo, faz-seum corte longitudinal ao longo de umamangueira plástica (3/4’’), com 6,3 m decomprimento, adaptando-a e fixando-a, pormeio de arame, na extremidade superior daarmação.

O dispositivo de descarga do silo é sim-ples. Pode ser feito com tubo de PVC comtampão ou constituído de um pedaço decâmara de ar usada (pneu de caminhão) ede um pequeno aro de vergalhão. Paraconstruí-lo, corta-se a câmara com aproxi-madamente 60 cm de comprimento numaparte que não contenha furos. Com umvergalhão de ¼’’ e com 0,8 m de compri-mento, constrói-se um anel que deve sercolocado internamente numa das extremi-dades do pedaço de câmara de ar. Faz-seum furo, com o diâmetro da câmara de ar,no centro da lona plástica e adapta-se odispositivo de descarga, fazendo com queparte da câmara fora da lona passe pelofuro da laje.

A lona de revestimento interno é neces-sária para a construção da parede do silo eé responsável pela proteção temporária doproduto armazenado, principalmente duran-

REFERÊNCIAS

DONZELES, S.M.L. Desenvolvimento e ava-liação de um sistema híbrido, solar e bio-massa, para secagem de café (Coffea arabicaL.). 2002. 122p. Tese (Doutorado em EngenhariaAgrícola) – Universidade Federal de Viçosa, Viçosa,MG.

SILVA, J. de S.; NOGUEIRA, R.M.; ROBERTO,C.D. Tecnologias de secagem e armazenagempara a agricultura familiar. Viçosa, MG: Su-prema, 2005. 138p.

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

GUIMARÃES, A.C. Secagem de café (Coffeaarabica L.) combinando sistemas em altas ebaixas temperaturas. 1995. 64p. Dissertação(Mestrado) - Universidade Federal de Viçosa, Vi-çosa, MG.

SAMPAIO, C.P. Desenvolvimento de um se-cador com reversão do fluxo de ar e com sis-tema de movimentação pneumática de grãos.2004. 97f. Tese (Doutorado em Engenharia Agrí-cola) – Universidade Federal de Viçosa, Viçosa,MG.

SILVA, J. de S. Secagem e armazenagem decafé: tecnologias e custos. Viçosa, MG: Jard, 2001.161p.

_______; BERBERT, P.A. Colheita, secageme armazenagem de café. Viçosa, MG: AprendaFácil, 1999. 146p.

_______; NOGUEIRA, R.M.; LOPES, R.P. Umsistema ideal para secagem de café. In: ZAM-BOLIM, L. (Ed.). Produção integrada de café.Viçosa, MG: UFV, 2003. 709p.

te a primeira vez que o silo é usado. É atra-vés dela que o silo torna-se impermeável,isto é, o produto não deverá estar em con-tato direto com o meio ambiente, para re-duzir o seu metabolismo. A lona deve sernova, de boa qualidade e estar em perfei-to estado, ou seja, não deve apresentarperfurações. Para segurança, devem-se usarduas camadas de lona plástica, de 6 x 6 mcada, para o silo em questão.

A armação telada é colocada sobre alaje e a lona plástica dentro da armação,para revesti-la internamente. A extremida-de vedada (com o dispositivo de descarga),deve ficar dentro do furo central da laje.Observar que o comprimento da lona deveser maior que a altura do silo, para que, de-pois de cheio com o produto a ser armaze-nado, se possa fechar o produto como sedentro de um grande saco.

Esse modelo de silo só será revestidoexternamente, quando já estiverem comple-tamente cheios e vedados. Isto se deve aofato de o conjunto lona plástica/produtoarmazenado servir como anteparo internopara a aplicação da argamassa que formaráa parede do silo. Essa argamassa, com tra-ço de 1:6:2 (cimento:areia:terra peneirada),tem a finalidade de dar proteção à lonaplástica, para que não venha a ser perfura-da por qualquer agente externo e dar com-pleta proteção ao produto armazenado.

A argamassa é aplicada à semelhançada técnica de estuque e terá uma espessurade, aproximadamente, 2,5 cm, quando aca-bada, e deve ainda receber uma pintura pararevestimento externo. Para a safra seguin-te ou após o esvaziamento do silo, a lonaplástica deverá ser cuidadosamente re-movida e recolocada depois da aplicaçãodo revestimento interno de argamassa notraço 1:6:2 e pintura interna à semelhançada externa. Após este procedimento o siloestará definitivamente construído.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em nível de agricultura familiar foi obser-vado que todas as propostas citadas obti-

veram resultados satisfatórios no que tan-ge o aspecto da qualidade final do produtoe facilidade de construção e aplicação dastecnologias. Sendo assim, é válido ressal-tar a importância do desenvolvimento denovas técnicas de colheita e pós-colheitade café para a Agricultura Familiar, poisgrande parte do mercado consumidor decafé no País é abastecido pelas pequenasproduções que ainda necessitam de orien-tações sobre a importância de produzir umcafé de qualidade.

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1Engo Agro, M.Sc., Prof. Escola Agrotécnica Federal de Machado (EAFM), Caixa Postal 49, CEP 37750-000 Machado-MG. Correio eletrônico:[email protected]

INTRODUÇÃO

A agricultura familiar é responsável poraproximadamente 25% da produção nacio-nal de café (AGRICULTORES..., 2005). Talmagnitude de produção, no entanto, nãose tem revertido numa atenção especial domercado a essa categoria de produtor, que,via de regra, se vê à mercê dos canais tradi-cionais de reconhecimento da produção ede comercialização que o excluem e expro-priam com freqüência. Vale nesse caso atradicional lógica da eficiência de ganhosem escala, aliadas às condições topográ-ficas que normalmente tais produtores seencontram. Baixa produção, “pressão” fun-diária para as regiões de montanha, poucaou nenhuma capacidade de mecanizaçãodos processos produtivos, falta de acesso

Certificação e comercialização de cafésda agricultura familiar

Sérgio Pedini1

direto aos mercados. Esse quadro faz comque a produção familiar de café no Paísencontre-se em desvantagem, quando com-parada com as produções latifundiárias, deperfil empresarial, altamente vinculadas àsestruturas de comercialização.

Existem, no entanto, experiências de pro-dução e comercialização certificadas querompem com esse quadro de exploração efazem com que o café da agricultura familiarbrasileira alcance o mercado com uma valo-rização mais justa e adequada às condiçõesdos produtores envolvidos, com ou sem oapoio das políticas públicas e organismosoficiais. Neste artigo, são descritas umadessas experiências com os processos nelaenvolvidos e uma discussão final acercade seu potencial de multiplicação.

CERTIFICAÇÃO ORGÂNICA

O agricultor orgânico recebe este nomenão só porque utiliza intensamente matériaorgânica, animal e vegetal, mas principal-mente porque sua produção deve ser con-duzida de modo semelhante à vida de umorganismo (um sistema articulado, inter-relacionado e complexo), que tem ritmos elimites naturais, que devem ser respeitadospelo homem.

Para que se possa diferenciar uma lavou-ra de café orgânico, de uma lavoura con-vencional, torna-se fundamental o apro-fundamento de conceitos que superam anoção de produto, para o de sistema deprodução, que envolvem componentesecológicos, sociais e até mesmo políticos.Mais importante do que controlar uma

Resumo - A agricultura familiar é responsável por, aproximadamente, 25% da produçãonacional de café, e o agricultor familiar se vê à mercê dos canais tradicionais dereconhecimento da produção e de comercialização que o excluem e expropriam comfreqüência. Existem, no entanto, experiências de produção e comercialização certificadasque rompem com esse quadro de exploração e fazem com que o café da agriculturafamiliar brasileira alcance o mercado com uma valorização mais justa e adequada àscondições dos produtores envolvidos. A diferenciação de produtos como o café orgânicoe do mercado solidário constitui-se, hoje, em saídas reais para a valorização da produçãofamiliar e, conseqüentemente, na elevação da renda e da qualidade de vida das famílias,conforme observado na experiência de Poço Fundo. Um grande desafio será promovero consumo de cafés orgânicos e o do mercado solidário internamente e a superação daforma tradicional de comercialização de café verde (cru), ao invés do processado (torradoe moído).

Palavras-chave: Cafeicultura familiar. Café orgânico. Controle de qualidade. Comércio.

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praga é saber se o manejo nutricional ado-tado foi o responsável por seu apareci-mento; quais as condições de trabalho dosfuncionários da empresa; defender as rela-ções comerciais transparentes como baseda negociação dos produtos, etc.

Segundo Pedini (2001), diversas são asdenominações dos sistemas de produçãoagrícola que têm por objetivo produzir ali-mentos perturbando o menos possível oequilíbrio do meio ambiente: orgânica, bio-dinâmica, natural, ecológica e biológica. Pa-ra tal, todos incorporam como princípiosbásicos a não utilização da maior parte doschamados produtos agroquímicos elabo-rados industrialmente, sejam os fertilizan-tes na forma solúvel, sejam os agrotóxicos,propriamente ditos, denominados eufe-misticamente de defensivos agrícolas e aeconomia de energia. Diferem, no entanto,entre si em aspectos específicos de algunsitens como a organização da produção, re-lações, solo, planta, animais, homem, filo-sofia.

Para que um café seja considerado orgâ-nico ele deve ser originado de uma proprie-dade certificada. A certificação é o processode acreditação da produção, ou seja, é ne-cessário que alguém ateste que determina-do produtor é realmente orgânico. O pro-cesso de certificação consiste de váriasetapas, sendo a inspeção a mais importante.Na inspeção, um técnico visita a proprie-dade e verifica se o produtor pode ou nãoser considerado orgânico. A avaliação nãopoderia ser, evidentemente, subjetiva, ouseja, determinado técnico considera a pro-priedade orgânica e outro não. É por issoque foram criadas as Normas Técnicas deProdução. Trata-se de documentos que de-finem os critérios mínimos que o produtortem para se adequar e ser considerado orgâ-nico.

Normalmente, são Organizações Não-Governamentais (ONGs), que efetuam acertificação e cada qual tem suas normasespecíficas. Os critérios variam de organi-zação para organização de acordo com suacaracterística de formação e as variaçõessão pequenas, mas todas têm em comum a

proibição do uso de agrotóxicos, adubosquímicos industrializados e práticas consi-deradas não ecológicas, como queimadaindiscriminada, desproteção de mananciais,entre outras (PEDINI, 2001).

Segundo Portugal (2002) a agriculturafamiliar detém cerca de 20% das terras doPaís, distribuídas em 4,5 milhões de proprie-dades, respondendo por 30% da produçãoglobal. Este autor aponta a agricultura orgâ-nica como um dos principais caminhos pa-ra a valorização da produção familiar, viaintrodução direta no mercado de alimentosin natura ou processados, como no casodo café. Segundo o Ministério de Desen-volvimento Agrário a agroecologia (for-ma ampliada da agricultura orgânica) já épraticada por mais de 50 mil agricultoresfamiliares brasileiros. Para incentivar aindamais esse segmento, o Ministério lançouno início deste ano o Programa Nacionalde Apoio à Agricultura de Base Ecológicanas Unidades Familiares de Produção (Pro-grama Nacional de Agroecologia). O obje-tivo é fortalecer as iniciativas realizadas pelaagricultura familiar, criando condições deestímulo à transição da produção tradicio-nal para modelos sustentáveis, por meioda implementação de políticas, programase projetos (BRASIL, 2005).

MERCADO SOLIDÁRIO

Mercado solidário, ou Fair Trade, é umprocesso de reconhecimento social da pro-dução e da estrutura de comercialização dealguns produtos, normalmente origináriosdos países pobres do Sul, criado por con-sumidores preocupados com as condiçõesem que esse produto foi produzido. No ca-so do café, tais consumidores estão dispos-tos a pagar mais pelo produto produzidopor agricultores familiares que atendam apadrões mínimos de qualidade e de orga-nização. As organizações de Fair Tradeestão-se tornando um importante canalde distribuição de produtos orgânicos naEuropa, englobando hoje produtos comobananas, cacau, mel, chá e café (SOUZA etal., 2002).

Segundo Matos (2002), a principal preocu-pação do mercado solidário é a situaçãosocial e econômica dos produtores de paí-ses em desenvolvimento. Mesmo não fo-calizando a agricultura orgânica como umideal, os movimentos orgânico e Fair Trademostram uma convergência de interesses,na medida em que contribuem para a sus-tentabilidade da produção. Esse aspectotem sido muito associado ao uso de méto-dos orgânicos de cultivo, processamentoe produção. Produtores de comunidadestradicionais geralmente utilizam poucosinsumos externos à propriedade, o que tor-na fácil a conversão para métodos orgâ-nicos, e o crescimento da demanda nessemercado possibilita geração de empregose ampliação do mercado potencial dos pro-dutos, caso a produção seja certificada.

O objetivo é melhorar o padrão de vi-da das famílias dos produtores de café empaíses em desenvolvimento, mediante umsistema que permita a eles vender o café,na medida do possível, diretamente aos tor-refadores e varejistas, eliminando interme-diários. O arranjo permite que os produtorescoloquem seu café em lojas de produtossofisticados nos países desenvolvidos eganhem até US$ 175.00 por saca de café(60 kg), ao invés dos US$ 65.00, que recebe-riam dos intermediários (preços de 2005).

História

O crescimento do comércio alternativonos anos 60 esteve associado principal-mente aos movimentos políticos de solida-riedade, como a compra de café da Nicará-gua, para apoiar os sandinistas. Por outrolado, grupos religiosos, que trabalham compopulações carentes nos países periféricosdesenvolveram práticas de mercado justopara artesanato, considerando-as comoatividade complementar à agricultura.

Durante os anos 70, essas organizaçõescomeçaram a reunir-se para conferências.Nos anos 80, houve o movimento pela for-malização desta relação. Foram fundadasduas entidades na Europa: a European FairTrade Association (EFTA), que reúne as12 maiores importadoras da Europa com a

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missão de aumentar a eficiência e a eficáciana condução dos trabalhos, e a Internatio-nal Federation for Alternative Trade (IFAT).Esta define-se como uma rede global de150 organizações em 47 países, voltada pa-ra melhorar as condições de vida da popu-lação marginalizada, através, do comérciojusto, promovendo um fórum para troca deinformações e idéias. Atua a partir de umcódigo de ética, no que diz respeito aocomprometimento com o comércio justo,questões éticas, condições de trabalho quegarantam no mínimo regulamentações lo-cais, igualdade de oportunidade de empre-go a todos, preocupação social e ambiental,respeito à identidade cultural dos produ-tores, educação dos consumidores e defesadas condições de vida dos povos margi-nalizados, além de as relações de trabalhoterem sempre de se desenvolver com basena solidariedade. Este Código de Prática ésubscrito por todos os seus membros, se-gundo Carvalho (2000).

Na América do Norte, o movimentoorganizou-se em 1994, criando a organi-zação North American Alternative TradeOrganization, cuja denominação muda noano seguinte para Fair Trade Federation.A partir de 1996, esta federação passou aestabelecer normas para a participação demaneira que ser associado é um certificadode realizar comércio justo. Comercializam,principalmente, artesanato, e café e chá,quando disponíveis no mercado. No casodo café, é geralmente orgânico e sombrea-do. Em 1998, retirou-se da entidade a funçãode educação do consumidor e foi criada aFair Trade Education Fund para desem-penhar este papel.

A primeira certificadora a surgir foi aMax Havelaar, fundada em 1988, a partir dogrupo Solidaridad, na Holanda. Este gru-po optou por trabalhar com café, devido àexperiência de trabalho com a Nicaráguasandinista, à importância dos produtoresfamiliares na produção global e à grandeoscilação no preço do grão. A iniciativalevou ao surgimento de outras entidades: aFairtrade Labelling Organization na Ingla-terra e a Transfair, primeiro na Alemanha e

depois em vários países incluindo Japão,que resultou na Transfair International,produto de interação entre unidade alemãe a EFTA.

Em 1997, foi criada a Fairtrade LabellingOrganizations Internacional (FLO), umainstituição guarda-chuva, semelhante à Inter-national Federation of Organic AgricultureMovements (Ifoam), voltada à coordena-ção do registro, monitoramento e promo-ção das entidades dedicadas ao comérciojusto. Os critérios são definidos para cadaproduto, mas se referem a questões comopreço mínimo garantido, aquisições exclu-sivas de grupos democraticamente orga-nizados de pequenos produtores, previsãode crédito para a pré-colheita e acordo decompra por prazos longos e não a cada ano.

A criação da FLO trouxe uma mudançafundamental na forma de trabalho do movi-mento. Esta organização voltou-se para amelhoria na distribuição do produto, bus-cando colocá-lo em todos os pontos de ven-da. Decidiram trabalhar ao longo da cadeiaprodutiva, cuidando para que as margenscobradas não prejudicassem o produtore voltassem para a criação de um merca-do diferenciado, visando associar a marca,à qualidade e à confiança (CARVALHO,2000).

Situação atual

O movimento Fair Trade surgiu naEuropa e já chegou aos Estados Unidos.Este ano, estima-se que o consumo sejade 5% dos US$ 18 bilhões movimentadosanualmente pelo mercado americano decafé. Na Europa, esse tipo de café é ven-dido em 35 mil lojas, com vendas anuais deUS$ 250 milhões, conforme Souza et al.(2002). Além da produção, o processamen-to também é monitorado para garantir apresença dos atributos desejados.

Ainda, segundo Souza et al. (2002), aAlemanha tem um importante nicho demercado para produtos Fair Trade, entreeles o café. A Transfair, por exemplo, umaorganização independente, sem fins lucra-tivos, que licencia o uso do seu selo, intro-duziu o café TransFair no mercado alemão,

em 1993. Hoje é vendido em 25 mil super-mercados e sua crescente parcela de mer-cado alcança 4%. Os consumidores podemencontrar mais de 50 variedades de caféoferecidas por mais de 30 fornecedoreslicenciados. Na Inglaterra, pode-se encon-trar blends de café orgânico torrado naHolanda e comercializados com o selo FairTrade em alguns atacadistas, lojas de de-partamento e de produtos naturais. Umadas marcas que comercializa café FairTrade, a Café Direct, alcançou 4% do ca-fé consumido no Reino Unido em 1996.A Suécia, que apresenta o maior consumomundial per capita de café, tem o Brasilentre seus fornecedores.

NORMAS PARA CAFÉ DA FLO

A FLO estabeleceu um processo de nor-matização que norteia todo seu processode certificação, de acordo com o produto aser reconhecido. De maneira geral, os se-guintes aspectos são considerados comopré-requisitos para a certificação:

a) produção estritamente familiar: osprodutores que solicitarem a certifi-cação da FLO têm que ser pequenose a mão-de-obra estritamente fami-liar;

b) organização: os produtores devemser, obrigatoriamente, organizadosem cooperativas e associação e é aorganização o ente que será certifi-cado, não o produtor individualmen-te;

c) transparência: todos os segmentosda cadeia deverão ser certificados eos preços e margens deverão estarclaros e transparentes;

d) projetos sociais: parte do ágio (ousobrepreço) recebido pelos produ-tores deve ser investido em projetosou programas sociais dentro da orga-nização certificada.

As organizações de cafeicultores fami-liares são abundantes no País, localizadas,em sua maioria, no sul e leste de Minas Ge-rais, serra e norte do Espírito Santo (café

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Robusta), Paraná, além de experiências nonorte do Ceará e Rondônia. Praticamentetodas possuem um perfil adequado aoscritérios da FLO, bastando apenas a certi-ficação orgânica para complementar a agre-gação de valor orgânico-solidário que omercado tem demandado.

Vale lembrar que toda a cadeia deve sercertificada e que no caso do café ela repre-senta, além dos produtores, os exporta-dores, os importadores, os torrefadores eos distribuidores. A FLO estabeleceu umatabela de referência de preços que tem sidoutilizada nos processos de comercializaçãodo café solidário, conforme descrito noQuadro 1. Os preços são mínimos de refe-rência, ou seja, dependendo da qualidadedo café e das características de negociação,tais preços podem oscilar, desde que sem-pre para cima. Outro dado importante é quetais preços podem sofrer algum tipo deredução ou desconto de taxas e comissões,dependendo da forma como foi comercia-lizado.

OUTRAS CERTIFICAÇÕES DOMERCADO SOLIDÁRIO

Atualmente, existem outros processosde certificação voltados para o mercado so-lidário, os quais não seguem o padrão FLO.Um exemplo é a CTM Altromercato2 , orga-nização italiana que certifica produções con-sideradas équo solidárias. A diferençabásica da FLO é o processo de comerciali-

zação diferenciada, pois diferente dos pri-meiros, a CTM comercializa seus produ-tos apenas em bodegas ou pequenas lojasdestinadas à venda e representação de pro-dutos com esse perfil (Fig. 1).

Ainda na Itália existe a DelegaçãoEuropéia da Agricultura Familiar Brasilei-ra (Deafab), com sede em Milão, que temtrabalhado, além da valorização do merca-do équo solidário, o respeito à origem dosprodutos familiares brasileiros, muitasvezes esquecida pelas grandes certifica-doras internacionais.

O Fórum de Articulação do ComércioÉtico e Solidário (FACES) do Brasil temtrabalhado esse tema. O Faces é um grupode diversas organizações de representa-tividade nacional, que tem por objetivo fo-mentar a criação e implementação de umsistema de Comércio Ético e Solidário (CES),no Brasil, para promover a igualdade e ainclusão social. O objetivo do projeto é tornar-se uma referência nacional e internacionalna articulação de uma rede de atores paraconsolidar uma cultura e um sistema de CESno Brasil, em busca do desenvolvimentosustentável.

As principais características do CES(IMAFLORA, 2004) têm como base as re-lações éticas e transparentes para alcan-çar:

a) remuneração justa;

b) construção de relações solidárias nointerior da economia;

c) respeito às diversidades culturais ehistóricas;

d) reconhecimento do valor e da ima-gem das comunidades.

EXPERIÊNCIA DE POÇO FUNDO,MINAS GERAIS

Uma experiência a ser citada é da Asso-ciação dos Pequenos Produtores da Comar-ca de Poço Fundo e Região (Sul do estadode Minas Gerais), que é hoje referência naoferta mundial de café orgânico Fair Tradebrasileiro.

A Associação foi criada em 1991 e tempor objetivo promover a organização e acooperação entre os agricultores para me-lhorar o seu nível de vida. Possui 74 sócios,distribuídos em 16 bairros e a maioria dosprodutores associados adota o sistema deprodução orgânica de café, hortaliças, entreoutros produtos (Fig. 2).

Desde 1997, a Associação vem passan-do por processos de certificação solidáriaatravés da Max Havelaar e orgânica atravésda Associação de Agricultura Orgânica(AAO). Em 2002, a entidade passou a serinspecionada pela Certificadora Sapucaí eobteve o certificado da BCS Öko-Garantie,entidade orgânica reconhecida internacio-nalmente. Outro certificado também obtidofoi o da FLO.

Em 2000, os diretores apresentaram seutrabalho na 1a Conferência Internacional deMercado Justo e Café Orgânico, na EscolaAgrotécnica Federal de Machado (EAFM),com a qual a Associação mantém parceriadesde 1997, e, a partir de então, vem toman-do contato com o mercado internacionalde café orgânico e Fair Trade, principal-mente com cooperativas de consumidoresdo Japão e empresas européias e ameri-canas.

Desde então a Associação vem rece-bendo inúmeras visitas de produtores devárias regiões do País, interessados em co-nhecer essa experiência de produção orgâ-nica e solidária e os respectivos processos

Arábica lavado 167 164 186 183

Arábica não lavado 158 158 178 178

Robusta lavado 145 145 165 165

Robusta não lavado 140 140 160 160

QUADRO 1 - Preços mínimos de referência para comercialização de café no mercado solidário

NOTA: Todos os preços em US$/saca de 60 kg, FOB porto de origem.

Tipo de café

Convencional Orgânico certificado

América Central,

México, África

e Ásia

América do

Sul

e Caribe

América Central,

México, África

e Ásia

2Informaçoes disponíveis no site: www.altromercato.it

América do

Sul

e Caribe

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de certificação, mas acima de tudo interes-sados em conhecer uma história de organi-zação e luta em prol da agricultura familiare da proteção do meio ambiente.

Em dezembro de 2002, a Associaçãorealizou sua primeira comercialização no

mercado americano, onde obteve preçosacima dos do mercado. Esse fato tem auxi-liado na capitalização de associados e tem-se projetado no mercado mundial. Em fe-vereiro de 2003, foram representados pe-la Associação de Cafeicultura Orgânica

do Brasil (Acob), na Feira BioFach, emNurenberg, Alemanha, com apoio da Agên-cia de Promoção de Exportação (Apex) e,em setembro, estiveram presentes na FeiraSana, em Bolonha, com apoio do Ministériodo Desenvolvimento Agrário e FundaçãoLyndolpho Silva.

Recentemente foi criada a Cooperativados Agricultores Familiares de Poço Fun-do e Região (Coopfam) (Fig. 3) que passoua ser o braço comercial da Associação epossui 175 famílias como cooperadas, dosmunicípios de Poço Fundo, Campestre eAndradas. A Cooperativa tem firmado con-tratos com compradores de café Fair Trade,nos Estados Unidos e na Europa. Partedo valor recebido a mais pelo café (ágio) éinvestido em projetos sociais no município.A Coopfam criou uma escola de informáti-ca para filhos de cooperados e criançascarentes do município, que tem auxiliadoórgãos assistenciais da região, e passourecentemente a financiar um projeto deprevenção de saúde bucal na periferia dePoço Fundo.

EXPERIÊNCIA DAESCOLA AGROTÉCNICAFEDERAL DE MACHADO (EAFM),MINAS GERAIS

A EAFM é uma instituição educacionalautárquica federal, vinculada ao Ministé-rio da Educação (MEC), com autonomiaadministrativa, patrimonial, financeira, di-dática, técnica e disciplinar. Caracteriza-sepor ministrar cursos técnicos em nível mé-dio (2o grau), nas áreas de Agropecuária,Agroindústria, Enologia, Zootecnia, entreoutras, em regime aberto, de internato esemi-internato, sempre com uma finalida-de e um perfil. Buscando a reestruturaçãoda Escola diante das novas Diretrizes eBases da Educação e acreditando que asEscolas Agrotécnicas Federais devem tersua identidade própria, ditada pela vocaçãoda região, onde se situa, a EAFM definiu,após ampla discussão com toda a comuni-dade escolar, sua missão: Participar e Con-tribuir para o Desenvolvimento Rural doSul de Minas Gerais.

Figura 1 - Bodega na Itália

Figura 2 - Família de produtor da Associação dos Pequenos Produtores da Comarcade Poço Fundo e Região

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A região do Sul de Minas é compostabasicamente por pequenos produtores, queproduzem em áreas de topografia acidenta-da, em meio a problemas ambientais sérios

Figura 3 - Sede da Coopfam

NOTA: Coopfam - Cooperativa dos Agricultores Familiares de Poço Fundo e Região.

e com poucos recursos financeiros. Essequadro retrata um cenário delicado, ondeessa clientela sobrevive sob situação dealto risco, pois a sua característica fundiá-

ria e topográfica não a tem viabilizado eco-nomicamente, devido à perda de competiti-vidade com outras regiões produtoras.

A EAFM foi criada em 1947 e vem, des-de 1997, apostando no aprimoramento dossegmentos temáticos do café, da agro-indústria e do meio ambiente como alterna-tivas de desenvolvimento sustentável paraa região e a conseqüente capacitação dostécnicos para se tornarem aptos a dar odevido suporte a esse desenvolvimento.Exemplos dessa trajetória podem ser desta-cados: Fórum de Desenvolvimento Regio-nal, em 1997, curso pós-técnico em Agro-ecologia, em 1999, Conferência Interna-cional de Mercado Justo e Café Orgânico,em 2000, e o projeto Aperfeiçoamento daFormação Profissional Relacionada com aIndustrialização do Café e Análise da Be-bida (Fig. 4), financiado pela AssociaçãoVitae (financiadora de projetos) em 2002,com apoio também da Fundação Banco doBrasil, MEC e Prefeitura de Machado.

O projeto foi crucial na concretizaçãoda proposta que vinha sendo construídadesde 1997, pois possibilitou uma melho-

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REFERÊNCIAS

AGRICULTORES familiares terão verbas do Fun-café. InvestNews Online, São Paulo, 14 maio2005. Disponível em: <http://www.investnews.com.br/ultimasnoticias/default.asp?id_editoria=2345&id_noticias=431538>. Acesso em: 14 set.2005.

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Agrário.Alimentos orgânicos serão o foco de eventosna próxima semana. Brasília, 2005. Disponívelem: <http://www.mda.gov.br/index.php?sccid=134&ctuid=7212>. Acesso em: 14 set. 2005.

CARVALHO,Y. M. de. Agricultura orgânica e ocomércio justo. In: AMBROSANO, E.J. et al.(Org.). Adubação verde para agricultura orgâ-nica: dia de campo. Piracicaba: Degaspari, 2000.p.123-149.

IMAFLORA. Faces do Brasil: apresentação.[2004]. Disponível em: <http://www.imaflora.org/?fuseaction=content&IDassunto=19>. Acessoem: 8 jan. 2004.

MATOS, M.C.D. Diferenciação de cafés: umdesafio para o mercado solidário. 2002. 43p. Mo-nografia (Curso de Agronomia) - Escola Agro-técnica Federal de Machado, Machado.

PEDINI, S. Apostila de cafeicultura orgânica.Machado, 2001. 33p.

PORTUGAL, A.D.O desafio da agricultura fami-liar. Agroanalysis, Rio de Janeiro, v.22, n.3,p.23-24, mar. 2002.

SOUZA, M.C.M. de; SAES, M.S.M.; OTANI, M.N.Pequenos agricultores familiares e sua inserçãono mercado de cafés especiais: uma abordagempreliminar. In: SIMPÓSIO LATINO-AMERI-CANO SOBRE INVESTIGAÇÃO E EXTEN-SÃO EM SISTEMAS AGROPECUÁRIOS, 5.;ENCONTRO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DESISTEMAS DE PRODUÇÃO, 5., 2002, Flo-rianópolis. Anais... Florianópolis: EPAGRI,2002. v.1.

Figura 4 - Detalhe da torrefação da Escola Agrotécnica Federal de Machado

ra visível na qualidade de ensino nas áreasde Agroindústria e Qualidade de Café eproporcionou um contato direto dos alunoscom a produção de cafés diferenciados, emespecial os orgânicos, pois a escola tempossibilitado desde a inauguração, em 2002,a prestação de serviços nas áreas de rebe-nefício e industrialização de cafés para osprodutores da região, notadamente os deorigem familiar, com o acompanhamentototal por parte dos alunos. Em 2004, foramrebeneficiadas 272 sacas de café de 53 pro-dutores e torrados 14.520 kg de café de 22produtores, que têm exportado para o Ja-pão, EUA e Alemanha. Nos últimos anos,no entanto, o segmento café e em especialo setor de industrialização do produto vêm-se modernizando rapidamente e exigindouma melhor adequação de currículos e estru-turas para fazer face a essa evolução. Trata-se de uma possibilidade de transformaruma unidade agroindustrial, com fins peda-gógicos, em uma ação concreta de inserçãosocial da instituição.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A diferenciação de produtos, como osdescritos no caso do café orgânico e domercado solidário, constitui-se hoje emsaídas reais para a valorização da produçãofamiliar e, conseqüentemente, da elevaçãoda renda e da qualidade de vida das famí-lias, conforme observado na experiênciade Poço Fundo. Torna-se necessário, noentanto, que a produção seja totalmentecertificada e cabe aos organismos públicose privados (como as ONGs de assessoria)e às certificadoras o papel de orientar essesegmento da produção, para que se preparepara ingressar nesses mercados diferen-ciados.

Por fim, um desafio maior será promo-ver o consumo de cafés orgânicos e domercado solidário internamente, pois, hoje,quase que a totalidade desses produtossão destinados ao mercado internacional.Outro desafio é a superação da forma tra-dicional de comercialização de café verde(cru), ao invés do processado (torrado e

moído), o que impossibilita o agricultorfamiliar a agregar maior valor ao seu produ-to. Cabe, assim, um apoio governamental eprivado para viabilizar a estrutura e a qua-lidade necessárias a esse propósito.

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